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COMUNICAÇÃO, INFORMAÇÃO E COMPUTAÇÃO:
EXPERIENCIAS INTERDISCIPLINARES NO ENSINO,
PESQUISA E EXTENSÃO
Benedito Medeiros Neto – [email protected] & Márcia Márques –
1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é apresentar os primeiros resultados de uma experiência de
ensino, pesquisa e extensão feita a partir da reflexão sobre a dimensão pragmática,
para pessoas e coisas, da imbricada relação que Comunicação, Informação e
Computação mantêm na sociedade presente, em rede, e também na perspectiva do
futuro, com a consolidação da Economia Digital. Este trabalho se faz a partir da
perspectiva de experimentação interdisciplinar na Faculdade de Comunicação, da
Universidade de Brasília, desde o segundo semestre de 2015, em torno de pesquisas
aplicadas à gestão da memória e que envolvem professores, alunos e servidores destes
três campos do conhecimento.
Nos últimos 25 anos do século XX, a economia passou por uma transição
potencializada pela informação e conhecimento, tornou-se global e distribuída em
rede, fortemente direcionada para o setor de serviços. Ainda que as tecnologias
tenham criado condições para a ampliação do conhecimento no planeta, elas ainda são
utilizadas com mais intensidade por um pequeno grupo com objetivos particulares,
apropriadas por alguns Estados, por algumas empresas ou pelo terceiro setor, o que
aprofunda a desigualdade (SANTOS, 2011, MARQUES, 2015).
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Vivemos a era da modernidade líquida (BAUMAN, 2001), também denominada
fluida, pós-modernidade, última modernidade, hipermodernidade ou apenas “hiper”
tudo. Ela é marcada pela comunicação e computação ubíqua, pelo crescimento
exponencial de informação e conhecimento que movem a economia digital, pela
expansão da mobilidade das redes on-line e pelo crescente número de dispositivos
móveis. Em 2017, os telefones celulares alcançarão a marca de 2 bilhões de remessas.
década, segundo o Gartner Group1. A conexão das “coisas”, ou internet das coisas,
tem se ampliado mesmo em países com carências sociais básicas. Como
consequência, no campo científico, evidencia-se a necessidade de aprofundar
investigações e pesquisas sobre este complexo ambiente híbrido, fluido, ubíquo, e
convergente.
Poder falar com máquinas inteligentes, estar grudado em celulares, pairar por aí no ciberespaço é misturar nossa humanidade com objetos performativos, ao mesmo tempo fascinantes e desconcertantes. (DEMO, 2012, p. 94)
As primeiras décadas do século XXI são marcadas por uma economia global que se
constitui de trocas e fluxos quase instantâneos de informação, capital e comunicação
cultural: tem lógica de organização que independe da localização; abrangência global;
está organizada em rede; tem cultura de virtualidade real; e a característica da
transformação permanente das condições materiais da vida, do espaço e do tempo
(SANTAELLA; LEMOS, 2010; MARQUES, 2015).
Para além das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), as redes mediadas
por computadores, com uso mais intensivo de dispositivos móveis, envolvem a
linguagem algorítmica e a websemântica, e pede uma denominação que abarque a
relação interdisciplinar-chave, a C[CIC] – Comunicação, Informação e Computação.
Neste contexto, as disciplinas dos campos da Ciência da Informação, da Comunicação
1 http://idgnow.com.br/mobilidade/2015/09/25/usuarios-estao-trocando-menos-de-smartphones-e-tablets-diz-gartner/. 2 Disponível em: http://caosmose.net/candido/unisinos/textos/textos/carta.pdf. Acesso em fev. 2016 3 Análise de Redes Sociais, metodologia de caráter estatístico que observa as redes pelas relações entre
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e da Ciência da Computação, quando em conjunto, podem ser vistas como
formadoras, amalgamadoras e organizadoras de relações de comunicação e de
informação nas redes sociais em ambientes mediadas por dispositivos tecnológicos.
Ainda que mantenham as especificidades, essas disciplinas, quando articuladas,
proporcionam múltiplos pontos de observação para avaliar, planejar, executar e
acompanhar processos em rede mediadas pela computação, que envolve aparatos,
linguagens, programação. Esta ação colaborativa entre os campos também oferece
múltiplos pontos de vista para promover a reflexão sobre essas relações em rede que,
por esta estrutura interconectada interdisciplinar, comporta uma proposta de
construção colaborativa de conhecimento.
Esta proposta alinha-se às imposições éticas do saber como inscrito na Carta da
Transdisciplinaridade 2 (NICOLESCU; MORIN; LIMA de FREITAS, 1994),
documento que indicou rumos para o saber no século XXI. Estas ciências, e suas
áreas de conhecimento, têm na mediação a melhor prática, além de serem
multidisciplinares, interdisciplinares e transdisciplinares por natureza.
A intermediação da informação não é algo que possui uma linearidade, nem significa
que a influência de um ator mediador no processo de comunicação seja cristalizada. O
conceito de intermediação, quando se analisa na perspectiva estatística da Análise de
Redes Sociais3, diz respeito aos papéis que podem ser desempenhados por atores ou
grupo de atores em rede, que podem tanto facilitar quanto atuar para constranger o
fluxo de relações, de comunicação de informação (NOOY et al, 2005) numa rede.
Demo (2012) diferencia este ator em dois tipos: intermediadores, responsáveis pelo
transporte de significado de forma linear, sem transformação; e mediadores, atores
múltiplos e híbridos, que deslancham dinâmicas e agem de modo performativo e
2 Disponível em: http://caosmose.net/candido/unisinos/textos/textos/carta.pdf. Acesso em fev. 2016 3 Análise de Redes Sociais, metodologia de caráter estatístico que observa as redes pelas relações entre os atores.
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transformador. Para Martín-Barbero (in SIGNATES, 1998), são mediadores os
agentes que atuam como seletores de conteúdos e de formas de diferentes
procedências e que também atuam como construtores de nexo em instituição e lugar
social definido. (MARQUES, 2015).
O filósofo Bruno Latour na obra “Jamais fomos modernos”, de 2009, observa que
vivemos uma revolução que éramos incapazes de fazer e que agora está presente na
ciência, na técnica, na política ou filosofia. Há uma acelerada convergência dos meios
de comunicação, com reflexo nas ciências em campos afins. Por este movimento
acentuado e que se universaliza com uso de diferentes dispositivos de acesso,
participa-se, até compulsoriamente, de uma sociedade conectada.
2 UM MAPA DE CONVIVÊNCIA ENTRE OS TRÊS CAMPOS DO
CONHECIMENTO: COMUNICAÇÃO, INFORMAÇÃO E COMPUTAÇÃO
C[CIC]
Para alcançar a interação dos campos, torna-se necessário observar a perspectiva de
cada um deles neste imbricamento de conhecimentos, e avançar do conceito de TIC
(Tecnologias da Informação e Comunicação), para a relação interdisciplinar de
C[CIC] (Comunicação, Informação e Computação). À Comunicação cabe promover
uma relação de entendimento – de navegação, de busca, de troca, de sentido.
Comunicação vem do latim: communicare – tornar comum, partilhar, trocar opiniões
– e communicatio – participação, no sentido de troca de mensagens, intercâmbio de
informações e notícias, procedimentos interativos desta troca. É difícil separar
informação e comunicação: ...a mesma dificuldade que se tem em separar forma e conteúdo subsiste na distinção entre comunicação e informação, sobretudo porque não se deve procurar definir uma ou outra pelo que ela é, e sim para que serve, incorporando-a à sua própria natureza de ação acabada. Desse modo, pode-se facilmente compreender que uma informação, em si, nada significa, nada tem de informação se
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ninguém é informado ou se a informação recebida pode ser inutilizada por quem a recebe – e isso é o que ocorre, também, com uma comunicação. (BAHIA, 2010, p. 88)
O verbete comunicação ocupa 17 páginas do Dicionário de Comunicação (RABAÇA;
BARBOSA, 2001): é a ação, o processo de relação entre indivíduos e/ou grupo de
indivíduos e/ou redes de indivíduos; é o resultado deste processo; também é o
conjunto de conhecimentos sobre esses processos; é a disciplina que trata desses
conhecimentos; é, igualmente, atividade profissional com muitas especializações –
como jornalismo, publicidade – e fronteiras fluidas de campos do conhecimento que
envolve.
Os estudos sobre Comunicação são tão antigos quanto a Filosofia, os problemas deste
campo foram abordados por Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), ao tratar da retórica
voltada à natureza da comunicação; nas primeiras décadas do século XX, o debate em
torno do tema aparece como suplemento à Filosofia para responder aos aspectos da
sociedade industrial e a partir das décadas de 1940/1950 sobressaem-se as
investigações em torno da emergência dos meios de comunicação de massa e da
propaganda.
Para Saracevic (1996), pesquisador da Ciência da Informação, a palavra comunicação
tem mais conotação, maior uso em muitos e diferenciados contextos e também tem
mais motivos de confusão do que a palavra informação. Nesta observação ressalta que
comunicação significa tanto o processo (como objeto de investigação) quanto o
campo (onde este objeto é investigado). Saracevic defende o estreitamento de relações
entre os campos da Ciência da Informação e da Comunicação, destacando que é
crescente a compreensão de que o fenômeno da informação e os processos de
comunicação devem ser estudados juntos.
A Ciência da Informação pode ser definida, como propôs Wersig (1997), como o
conjunto de modelos desenvolvidos sob o ponto de vista do problema do uso do
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conhecimento nas condições pós-modernas de informatização. Há, como apontou
Saracevic (1996), três características gerais da informação: é interdisciplinar;
umbilicalmente ligada à Tecnologia da Informação; participante ativa e deliberada da
sociedade da informação. O conceito de “recuperação da informação” é cunhado
inter-relacionado com o campo tecnológico: refere-se a capacidades de
armazenamento, entrada de dados, transmissões externas, medidas em bits e
megabytes e tem sua efetividade avaliada pela relevância dos documentos, o que se dá
no campo do sentido. Nascida em torno dos anos 1950, a Ciência da Informação tem
componente de ciência pura, na pesquisa dos fundamentos, e componente de ciência
aplicada, no desenvolvimento de produtos e serviços.
Buckland (1991), ao categorizar a informação em três instâncias – como coisa, como
processo e como conhecimento – propôs orientá-la à resolução de processos, no
campo social e tecnológico. Ao abordar a questão a partir de perspectiva de relações
interdisciplinares, muitas teorias e abordagens em Ciência da Informação vêm de
outras áreas do conhecimento. Capurro e Jørland (2007) ressaltam, em artigo sobre o
conceito de informação, que quase toda disciplina científica utiliza este conceito, seja
no campo das ciências naturais, seja no das ciências humanas. No primeiro caso,
incluem-se a matemática (com ênfase na Teoria Matemática da Comunicação, de
Shannon e Weaver), a física e a física quântica, a biologia. No segundo, as disciplinas
focadas no papel do indivíduo e da sociedade do conhecimento. Os autores destacam
o papel da Ciência da Informação no trabalho em rede de disciplinas e metadisciplinas
que lidam com comunicação, tecnologia, sistemas e processos. Capurro, em texto
recente, aponta a irrelevância que divisões ou oposições entre as disciplinas podem
ter, em razão deste campo híbrido em que a informação transita: En este contexto es importante observar que las divisiones u oposiciones entre informática, ciencia de la información, biblioteconomía, archivística y museología van perdiendo cada vez más su relevancia (CAPURRO, 2014)
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Os usos das Tecnologias da Informação e Comunicação - TIC aceleram o ritmo de
vida e podem abarcar o cotidiano mais trivial do indivíduo, como por exemplo ter
competência computacional frente a um caixa automático do lado de fora da agência
bancária, ou a um terminal de transporte, ou ser capaz de fazer sozinho o seu “check-
in” em um aeroporto, estação de trem, ou no dispositivo móvel (celular, tablet,
notebook). A eclosão da comunicação e troca de informação das redes sociais em
ambientes digitais é fruto da multiplicação de possibilidades e facilidades de
utilização de suportes fixos ou móveis com conexão imediata para textos, imagens,
som e vídeo. É possível acessar informação em tempo real, interagir com ela –
comentar e compartilhar – ou mesmo participar de uma disputa mundial de jogos
eletrônicos.
Ao estudar o reflexo da inovação tecnológica para o campo da comunicação em
relação aos movimentos sociais, Martín-Barbero destacou, em 2004, o fato de as
tecnologias operarem ativamente sobre a realidade socioeconômica que a demanda e
desenha. A perspectiva ou reflexão não pode ser outra, deve-se acreditar que pessoas
em estado de vulnerabilidade, nos países em desenvolvimento, têm na apropriação das
TIC uma alternativa viável de crescimento cognitivo e ganho de habilidade para os
desafios das novas mídias da comunicação. Mas restaria saber se a melhoria deste
bem-estar, saúde e educação estaria assegurada e se a participação democrática seria o
contorno final após a inclusão digital e informacional destes indivíduos anteriormente
excluídos (Castells et al, 2007; Medeiros Neto, 2012).
Os computadores, no final do século passado, aumentaram a capacidade de fazer a
computação de dados e textos, e, a partir de dados e informação computados, a
internet levou a informação e o conhecimento para mais perto das pessoas, em casa ou
no trabalho, primeiro por meio do fio de cobre e depois pela fibra ótica. A expectativa
é de que, em pouco tempo, a universalização dos celulares e a presença da rede
permitam ao usuário em qualquer lugar, a qualquer hora e a partir de qualquer
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dispositivo ter acesso aos sistemas de informação. Este tema é uma das preocupações
da Ciência da Informação, do ponto de vista da estrutura de organização para permitir
o acesso a dados e informações, e da Ciência da Computação, a partir do prisma de
quem deve proporcionar à rede as conexões necessárias e serviços de acesso a fontes
e bases de referências.
Esta aproximação entre as duas ciências – Informação e Computação – por um lado
traz um ganho social importante em termos de ampliação da capacidade de
conhecimento coletivo, e de produção de conhecimento a partir de uma inteligência
coletiva. Por outro, ainda há necessidade de ajustar este relacionamento no campo
científico, a partir da construção de conceitos comuns – ou de equivalências – que
melhorem a comunicação entre ambas. A esta relação, deve, juntar-se, ainda, a
Comunicação, também transversal às questões que envolvem a busca, acesso, uso e
propagação da informação e as relações de indivíduos e grupos de indivíduos em
redes digitais.
Outra questão importante, que se reflete na confluência dos três campos aqui
analisados, é que a Comunicação é bilateral, exige troca – é transmissão e é recepção
– entre indivíduos/grupos/redes. Ao analisar a estrutura e funcionamento do discurso
– do homem (o animal que fala) pelo uso da retórica ( a arte da persuasão) –
Aristóteles oferece o modelo zero da comunicação: locutor, o indivíduo (ou
indivíduos) que produz a mensagem; discurso, o que o locutor produz para transmitir
informações, idéias; ouvinte, aquele que ouve ou a quem se destina a mensagem.
A relação entre as pessoas nas redes – digitais, ou físicas – se dá por meio da
comunicação. O conceito de aldeia global, cunhado por McLuhan nos anos 1960, é
uma realidade para a tecnologia e para a informação, mas não se pode falar em
informação sem comunicação, sem a relação com o outro, sem a relação – com
sintonia ou não – entre emissor e receptor. A segunda metade do século XX foi de
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investimento em TIC, que devem ser vistas como parte das redes, como atores
(LATOUR, 1996; DEMO, 2012) que podem funcionar como facilitadores ou
complicadores da comunicação.
Onipresentes em nossas vidas, as tecnologias desempenham papel essencial na emancipação individual e coletiva. Paradoxalmente, em um mundo saturado por informação, esta onipresença não é suficiente para reduzir as dificuldades lógicas para a comunicação. Não basta informar sempre mais, muita informação torna a comunicação mais difícil (WOLTON, 2010, p. 12). Por esta ótica, informação se concentra em mensagem, conteúdo, forma e meio; comunicação é relação: na comunicação, o mais simples tem a ver com informação e tecnologia e o mais complexo com o indivíduo e as sociedades. A comunicação diz respeito às relações em sociedade. (MARQUES, 2015, p. 96)
A ubiquidade na computação afeta a cognição, produz repercussões cruciais na
educação, segundo a autora, e permite novas maneiras de processar a cultura. As
relações sociais com suporte na computação implicam novos hábitos mentais no
cotidiano do cidadão, que é compulsoriamente desafiado a aprender,
permanentemente, ao longo da vida. Este novo quadro coloca em xeque o sistema
educacional no formato em que se encontra organizado, a partir de uma lógica
cartesiana, de conhecimento compartimentado, em um planeta de relações fluidas,
conectado, que produz colaborativamente, em rede.
3. C[CIC] E A VIDA DAS PESSOAS
A ocupação dos espaços públicos pelos movimentos sociais ganharam amplitude e
força na última década graças ao apoio ou suporte das tecnologias computacionais e
das TIC, seja pela fácil interatividade em ambientes digitais seja pela fácil
mobilização de participantes com indignação e esperança nas redes sociais,
principalmente com o uso de dispositivos móveis. Uma realidade que se apresenta um
pouco diferente dos movimentos dos estudantes franceses de 1968, e saem dos
modelos tradicionais de luta de classe operária da Europa e das Américas do século
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passado. Aos movimentos agregam-se grupos com interesses e preocupações comuns,
para abrigar novas causas políticas, ambientais, ecológicas, de direitos humanos, de
educação, de arte e cultura, e de reivindicar a oferta de serviços de melhor qualidade.
a) Da informação que acessamos aos serviços que queremos e podemos
Há várias interpretações de cientistas políticos e sociais de direita ou de esquerda a
respeito das manifestações de rua que eclodem no Brasil em 2013, que tinham como
denominador comum a reivindicação de qualidade nos serviços públicos, a crítica ao
modelo de representatividade política e à ausência do Estado como regulador da
prestação de serviços pelos prestadores privados. Ao analisar os movimentos sociais
que foram às ruas em todo o mundo entre os anos de 2010 e 2013, Castells destacou o
que os cartazes destas manifestações criticavam: o alto custo dos planos de saúde
privada e dos serviços de telefonia móveis e internet, as deficiências das empresas
prestadoras de serviços de transportes, os lucros volumoso dos bancos, o desemprego
na Europa e a falta de mão-de-obra qualificada na América Latina e Caribe
(CASTELLS, 2013).
Embora a inclusão digital e a ação governamental nos meios digitais não estejam
sendo reivindicadas com a ênfase como foram há 10 anos, como política pública, o e-
gov e ciberdemocracia (e-cidadania) “são as duas faces e uma mesma moeda e, sem o
acesso à rede, é o próprio direito à cidadania que está sendo negado à maior parta da
população“ (BECKER, 2009, p. 163).
b) A Educação com foco no aprender a aprender
A participação no GPCI, o grupo de pesquisa do programa de Pós-Graduação da
Ciência da Informação da Universidade de Brasília, promoveu o encontro de
pesquisadores oriundos da Comunicação e da Ciência da Informação e Computação
interessados nesta conexão entre os campos. Nasceu aí a proposta de criação de uma
interdisciplina, orientada à pesquisa empírica com base em CIC.
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A relação interdisciplinar, com resultados transdisciplinares em torno da formação de
competências em informação e em tecnologias, especialmente no uso de dispositivos
móveis, foi vivenciada no contexto do Projeto de Literacias, aplicado em 2013 e 2014
na formação de indivíduos de comunidades vulneráveis, da periferia da Brasília, em
duas regiões administrativas do Distrito Federal: Paranoá e Itapoã. Coordenada pelos
professores Fátima Ramos Brandão e Benedito Medeiros Neto, da Ciência da
Computação, esta formação com foco no aprender a aprender, utilizou os dispositivos
móveis e a internet para promover a compreensão dos processos de busca, acesso, uso
e propagação da informação. Outra questão igualmente importante suscitada no
contexto da experiência no Paranoá- DF, se refere às perspectivas de trabalho
transdisciplinar entre as áreas da Ciência da Informação, Computação e
Comunicação. Isto significou principalmente diálogo e não necessariamente fusão ou
descaraterização dessas áreas. A figura 1 mostra como o processo de inclusão digital
e literacias desenvolveu-se neste projeto da UnB.
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Figura 1: Desenvolvimento do Projeto Literacias no Paranoá e Itapoã - DF
Neste contexto, urge indagar acerca da inter-relação dos conteúdos (Informação e
Registro) da internet, precipitado com a web móvel, e as possibilidades de uma nova
linguagem numa perspectiva híbrida. O que se prevê é a hibridização das mídias,
aproximação de linguagens e aumento de conteúdos. Outras perguntas semelhantes
podem ser feitas para os vários impactos da computação em nuvem do planeta, e
poder das redes sociais amparadas pelas TIC. Tudo isto está à espera de estudos e
pesquisas mais aprofundada, esteja ou não a mídia dando destaque (MEDEIROS
NETO; BRANDÃO, 2015).
Uma outra experimentação interdisciplinar, também a partir do GPCI, começou a ser
feita a partir do segundo semestre de 2015. A professora Márcia Marques,
pesquisadora do GPCI, criou a disciplina com o nome Comunicação, Informação e
Computação: fundamentos e aplicação (CIC) no Departamento de Jornalismo da
Faculdade de Comunicação, que contou com a participação de professores4 e alunos
das três áreas. A disciplina foi criada para promover pesquisa aplicada,
interdisciplinar, aberta à participação de professores e alunos de graduação e de pós-
graduação com objetivo de observar problemas empíricos que envolvem a
comunicação e informação em rede em ambientes digitais, bem como a apresentação
de propostas de soluções e elaboração de conceitos que atendam a este território
híbrido da transdisciplinaridade. Em sua primeira edição, no segundo semestre de
2015, estudaram-se conceitos e metodologias, em torno da análise da rede da FAC, a
4 Participam do projeto, professores: Márcia Marques (Comunicação); Maria de Fátima Ramos Brandão (Ciência da Computação); Elmira Simeão e Antonio Miranda (Ciência da Informação); Liziane Guazina (Comunicação Organizacional). Professores voluntários e pesquisadores de pós-graduação: Benedito Medeiros Neto (Computação) e Marcelo de Jesus (TIC para extração de dados de pesquisa), Mônica Peres e Fabiane Freitas (Biblioteconomia – formação de competência em informação e gestão da informação).
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partir desta perspectiva multidisciplinar e buscou-se definir o objeto da pesquisa
empírica a ser desenvolvida no semestre seguinte.
No primeiro semestre de 2016 a disciplina foi ofertada novamente, e, a partir do
diagnóstico obtido com o trabalho da primeira turma, a pesquisa teve como foco o
espaço do Cedoc/FAC, onde estão guardados documentos produzido nos 52 anos de
existência da Faculdade. O objetivo definido para esta segunda etapa da pesquisa foi
estruturar o projeto de transformação do Cedoc/FAC em laboratório multidisciplinar
de pesquisa de Gestão da Memória na Comunicação. Para orientar a pesquisa, o
Cedoc/FAC foi tratado como hub para redes de documentos, de repositórios e de
usuários interessados nessas redes e nesses documentos em ambientes digitais e
também presenciais. Neste processo, imbricaram-se metodologias e bibliografia dos
três campos, reunidos na pesquisa aplicada ao hub da rede capaz de oferecer acesso às
informações relacionadas com Ensino, Pesquisa e Extensão na FAC.
As ações previstas para o primeiro semestre de 2016 relacionaram-se com o
levantamento das questões que envolvem a o acesso, uso e disseminação das
informações/documentos depositados no Cedoc/FAC foram definidas pelo conjunto
de alunos, a partir da produção de mapa mental e mapa conceitual, e elaboradas com o
uso de ferramentas de produção coletivas e colaborativas. Eis o que o Cedoc/FAC
precisa fazer para efetivar-se como hub de informação da rede FAC, como organizado
pela turma, formada por alunos de Biblioteconomia, Arquivologia, Jornalismo,
Publicidade, Audiovisual e Comunicação Organizacional:
i) oferecer a prática física do compartilhamento por meio da elaboração de um projeto
para criação e manutenção de uma sala livre de leitura para a FAC. Este espaço,
distribuído em corredores específicos da faculdade, será organizado a partir de regras
coletivas de uso e manutenção do acervo, patrimônio coletivo, sem registros de
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empréstimos. A primeira etapa consiste no levantamento dos livros que estão
guardados no Cedoc e que não são guardados neste tipo de repositório.
1 .1. possibilitar a compreensão do papel da biblioteca como patrimônio institucional
para compartilhamento do acervo com a rede da UnB, com regras institucionais para
o uso coletivo do acervo mantido pelos servidores da BCE.
ii) Fazer o inventário do acervo do Cedoc/FAC, levando em conta que são materiais
em diferentes suportes em texto, imagem, audiovisual e/ou áudio – nas múltiplas
linguagens (que o professor Antonio Miranda denomina animaverbivocovisuais);
TCCs – monografias e memorial de produtos.
Isto significa fazer levantamento do acervo:
a) livros – sala de leitura, biblioteca, doações
b) documentos acadêmicos – TCCs, documentos de memória da FAC (e da antiga
Faculdade de Comunicação de Massas e do departamento de Comunicação)
c) produtos acadêmicos – jornal Campus (impresso), Campus Online, Campus
Repórter, Campus TV, programas de rádio e audiovisuais, produtos de publicidade, de
comunicação organizacional (Comorg), de pós-graduação
iii) Pesquisar quais repositórios vão guardar (ou serão espelho) do Cedoc/FAC
iv) Elaboração de levantamento sobre digitalização/recuperação de documentos.
Para dar suporte ao trabalho de pesquisa junto ao Cedoc/FAC, foram definidos os
seguintes temas apresentados pelos professores: Competência em Informação e sua
articulação com as Redes de Conhecimento Colaborativo; Web 3.0 – o futuro da
internet – computação e esfera semântica para a construção coletiva e colaborativa de
conhecimento; a informação jornalística e a informação científica como ferramentas
de ação comunicativa para inserção do Cedoc/FAC nas redes; publicação de artigo
científico, uso de bases de dados científicas, normas ABNT.
Outra característica desta pesquisa é a produção de artigos, capítulos de livros ou
outros trabalhos com os resultados acadêmicos em formato aberto, com licença de uso
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Creative Commons 4.0 International, acessível a toda a sociedade. O projeto propõe-
se a transformar o Cedoc em espaço de pesquisa e hub para informações acadêmicas –
artigos, TCCs, dissertações, teses – e para a oferta de produtos na linguagem do AV3
(SIMEÃO, MIRANDA, 2012), fruto das pesquisas empíricas empreendidas pelos
cursos e habilitações da Faculdade de Comunicação, no âmbito da graduação e da
pós-graduação.
c) Ciberdermocracia e governo eletrônico
No contexto atual de mobilização em rede por meios digitais ou em relações
presenciais, percebe-se que a e-cidadania deve aumentar a abrangência, de local para
nacional ou internacional, pois o direito à informação e à comunicação perpassa os
territórios, ou melhor, localiza-se no conceito de territórios informacionais. O desafio
mais profundo da governança eletrônica poderia bem ser a resposta a estas perguntas:
Como os governos devem assumir a nova relação de autoridade sobre os sujeitos? E
por que ela está diminuindo para uma relação de prestação de serviços aos cidadãos?
Qual a razão de os governos terem cada vez mais deveres para prestar contas do que
o direito de serem propositivos?
Não existem respostas prontas para estas perguntas, pelo contrário, existem mais
questões na cabeça do cidadão consciente e crítico. Os programas e projetos que se
multiplicam para permitir o uso das TIC e o acesso à internet e à informação, e mais
recentemente, os dispositivos móveis nas mãos de mais pessoas, têm contribuições
para alterar este quadro de governança tutelada. O conhecimento do uso da
informação e as melhores práticas de logística de países desenvolvidos da Europa e
América do Norte terminam por servir de “benchmark” ou de parâmetro para
comparações nas cobranças dos reivindicadores latinos da América, uma vez que os
governos dos países em desenvolvimento, abaixo do Equador, continuam insistindo
com uma burocracia resistente às reformas profundas dos modelos de práticas
políticas e em manter os diretos dos cidadãos tutelados pelas elites e poder econômico
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mantendo as desigualdades sociais (SORJ, 2007). O fato é que os custos das
transações e serviços dos países da América Latina não declinam devido à baixa
eficiência operacional dos agentes públicos e gestão ineficiente dos agentes
econômicos, e baixa qualificação da mão-de-obra e pouco uso de TI na logística
(Castells, 2013).
4 AS PERSPECTIVAS DA DESEJADA INTERDISCIPLINARIDADE
O certo é que nossas vidas transitam de uma sociedade industrial para uma sociedade
futura com predominância de serviços, evidentemente, passando pelo surgimento da
Informação em massa nos repositórios com suporte computacional em nuvem,
crescimento do fluxo informacional em todos segmentos da população, crescimento
exponencial de usuários de dispositivos móveis, aprendizado permanente dentro e
fora da escolas, comunicação ubíqua, convergência das mídias e “transmídias” (voz,
texto, imagem, som e vídeos), e formação da inteligência coletiva, quase sempre indo
do singular e homogêneo para o geral e heterogênea.
Os visionários e os que ganham dinheiro com a venda de tecnologia e serviços
adoram fazer previsão visando lucros, mas algo pitoresco sempre acontece, como por
exemplo, a Web 1.0 caracterizou-se por melhorar com a chegada e pela diferenciação
com a Web 2.0, mesmo assim, é tentadora esta prática de prognóstico ou de desenhar
os dias vindouros, sabendo-se que jamais deixará de ser um terreno movediço, apenas
uma alerta. Algo que já acontece hoje com as tentativas de caracterização da Web 3.0.
a) Comunicação ubíqua na perspectivas dos serviços
A computação em nuvem, entendida como o fornecimento de recursos de computação
à distância, via internet, é uma tendência que fortalece a chegada da Web 3.0, mas isto
acontece em passos e caminhos diferentes (Lévy, 2014). O mundo empresarial aos
poucos adota a computação em nuvem e os arranjos econômicos correm para oferecer
17
estes serviços. Mas, por que isto é significativo? Simplesmente porque os serviços de
informação e comunicação são a cada dia mais mediados pela tecnologia digital, e a
computação em nuvem é um segmento das TIC para facilitar a prestação deste serviço
em conjunto. Pode-se citar outros serviços como os financeiros, médicos ou de saúde,
como também no âmbito da sociedade discute-se o uso das TIC para apoiar a
participação política e democrática dos cidadãos e cidadãs, bem como a necessidade
de definir um redesenho do modelo de representatividade parlamentar. A lista vai
crescendo com convergência, ganham com esta mediação de um ou mais segmentos
das TIC, e são favorecidos pelos hibridismo, convergência e mobilidade. Hoje,
equipado de navegador Web com ligação com a internet, a nuvem permite que os
usuários tenham acesso aos serviços de qualquer lugar, a qualquer hora, e de qualquer
dispositivo.
Outra tendência para indivíduos, comunidades e organizações será custear apenas os
serviços que usam, e não o rateio das estruturas que lhes oferece o mesmo, revendo
costumeiro papel de proprietário, para divisor de todos custos, para usuário do
serviço. Estes tipos de entendimento e comportamentos já são amplamente aceitos
pelos usuários domésticos e pequenas empresas de telecomunicações e de tecnologia
da informação, que aos poucos vai ganhar espaços em outras partes da economia. A
meta ou “the bussines” parece ser a de buscar oferecer serviços direto aos usuários, e
consequentemente, aumentar a possibilidade de utilização da Web, rede de
computadores e informações nas grande bases de dados como partida, inteligência
coletiva de Lévy (2014).
A pesquisa no Cedoc/FAC parte desta perspectiva para a organização dos dados e a
gestão da memória da FAC para no futuro transformar-se em espaço colaborativo de
organização da informação acadêmica e dos produtos resultantes do trabalho de
ensino, pesquisa e extensão na faculdade.
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b) “What is the future of mobile learning in education? “
Voltando-se à perspectiva do aluno e do professor na nova sociedade de alta
mobilidade, para tentar responder à pergunta: What is the future of mobile learning
in education? Santaella (2013) se fixa nas repercussões dos processos de
comunicação ubíqua na cultura e na educação, para afirmar que eles realizam suas
tarefas em situações fluidas, múltiplas camadas, e não apenas no interior das redes,
como também nos deslocamentos espaço-temporais efetuados pelos indivíduos.
O que se divisa como expectativa da sociedade para o futuro é o melhor acesso e uso
da informação, o aproveitamento da ubiquidade, convergência da comunicação e a
presença do poder de cálculo da computação (a linguagem algorítmica), e a não
confirmação do conhecimento ampliado e disponível para todas as classes da
sociedade. O fato é que as tecnologias da informação e comunicação (TIC) que
rodeiam o ser humano, e as suas interfaces que se adaptam a cada dia, para, algumas
vezes, serem integradas no próprio corpo.
c) A linguagem algorítmica
Estamos agora no início de uma quarta revolução, segundo Lévy (2014) da sociedade
interconectada e as redes quase onipresentes, a maioria das pessoas vive em
ambientes repletos de símbolos – ou seja, de dados – de todos os tipos (música, voz,
imagens, textos, programas, etc.) que estão sendo transformados automaticamente por
algoritmos. Com a democratização da análise de mega dados, as próximas gerações
verão o advento de uma nova revolução científica, mas desta vez nas ciências sociais
e humanas. A nova ciência humana será baseada na riqueza de dados produzidos por
comunidades humanas e um crescente poder da computação. Isto levará, num plano
ideal, à inteligência coletiva reflexiva, onde as pessoas vão se apropriar da análise de
dados e onde os sujeitos e objetos de conhecimento serão as próprias comunidades
humanas.
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No meio algorítmico, a comunicação torna-se uma colaboração entre pares para criar,
categorizar, criticar, organizar, ler, promover e analisar os dados por meio de
ferramentas algorítmicas. Não há mais nenhuma autoridade transcendente e é por isso
que o pensamento crítico e a responsabilidade são tão importantes de serem
desenvolvidos. Mesmo que as pessoas dialoguem e falem umas com as outras, o
principal canal de comunicação é a própria memória comum, uma memória que todos
transformam e exploram. Habilidades em análise de dados estão no cerne da nova
alfabetização algorítmica5.
d) Requisito para nova cidadania (e-cidadania)
Domenico de Masi (2013) retrata este contexto como parte da sua perspectiva, e como
requisito para nova cidadania (e-cidadania), tendo a competência em informação,
computação e comunicação como figura de mérito (MEDEIROS NETO, 2015a). Para
ele, no plano social, emerge da necessidade de superar, através da meritocracia e da
igualdade de oportunidades, uma possível reconfiguração das tradicionais
democracias ocidentais, freando os grupos de interesse, e equilibrando o egoísmo
liberal e o materialismo marxista.
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