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DA FILANTROPIA AO TERCEIRO SETOR A E X P E R I Ê N C I A D A F U N D A Ç Ã O ANTONIO-ANTONIETA CINTRA GORDINHO

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ISBN 978-85-87454-12-6

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DA FILANTROPIA AO TERCEIRO SETORA E X P E R I Ê N C I A D A F U N D A Ç Ã O

ANTONIO-ANTONIETA CINTRA GORDINHO

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FUNDAÇÃO ENERGIA E SANEAMENTO

Conselho CuradorPresidenteRicardo Toledo Silva

Vice-presidentePaulo Fares

Superintendência ExecutivaMariana de Souza Rolim

FUNDAÇÃO ANTONIO – ANTONIETA CINTRAGORDINHO

Conselho Administrativo Consultivo Presidente de HonraEgberto Lacerda Teixeira

Presidente ExecutivoIsmar Augusto Procópio de Oliveira

Vice-presidenteMaria Thereza Passos Gordinho Amaral deOliveira

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DA FILANTROPIA AO TERCEIRO SETORA E X P E R I Ê N C I A D A F U N D A Ç Ã O

ANTONIO-ANTONIETA CINTRA GORDINHO

Marco Aurélio Mattos | Maiza Garcia | Marcelo Fonseca

São PauloFundação Energia e Saneamento

2009

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Fundação Energia e SaneamentoSede e Museu da Energia de São PauloAl. Cleveland, 601 – Campos Elíseos 01218-000 – São Paulo, SP – Brasil55 (11) 3333-5600patrimonio@energiaesaneamento.org.brwww.energiaesaneamento.org.br

Gerência de Documentação e ProjetosMarcia Pazin

Coordenação EditorialIsabel Regina Felix

Pesquisa e textoMarco Aurélio Mattos, Maiza Garcia, Marcelo Fonseca

Entrevistas de história oralMarcelo Fonseca

Transcrição de entrevistasCibele Camargo de Oliveira

Transcriação de entrevistasCibele Camargo de Oliveira, Maiza Garcia, Marcelo Fonseca

EdiçãoIsabel Regina Felix, Maiza Garcia

Revisão de textoElaine Martins

Normalização bibliográfica Cibele Camargo de Oliveira

ApoioMarisa Coelho Vaz, Patricia Razza

FotografiaPatrícia Ikeda

Projeto gráficoDesenhológico

Fotolito, impressão e acabamentoPancrom Indústria Gráfica

As fotos da primeira parte deste livro pertencem ao Acervo FAACG.

1ª. edição

1ª. impressão (2008): 3.000 exemplares

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Mattos, Marco Aurélio. Da filantropia ao terceiro setor : a experiência da Fundação

Antonio – Antonieta Cintra Gordinho / Marco Aurélio Mattos, Maiza Garcia, Marcelo Fonseca. – São Paulo : Fundação Energia e Saneamento, 2009.

1. Assistência social 2. Organização Não Governamental 3. Terceiro setor I. Garcia, Maiza II. Fonseca, Marcelo III. FundaçãoAntonio - Antonieta Cintra Gordinho (São Paulo, SP) IV. FundaçãoEnergia e Saneamento (São Paulo, SP) V. Título.

ISBN 978-85-87454-12-6 CDD 361.76CDU 061.2

Índice para catálogo sistemático:

Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

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Prefácio

envolvimento das empresas e daspessoas com a área social, origina-riamente assistencialista, começou a

ser feito de maneira estratégica e a ganhar adimensão que tem hoje, a partir do final dadécada de 1980 e, com maior ênfase, no iníciodos anos 1990.

Essa guinada de comportamento é derivadadas profundas transformações no cenário po-lítico-social e no mercado brasileiros. A Cons-tituição de 1988, a Lei de Política Nacional deMeio Ambiente, o Estatuto da Criança e doAdolescente, a Lei Orgânica da Assistência So-cial e o Código de Defesa do Consumidor, pa-ra exemplificar, revitalizaram a sociedade civilorganizada, ampliaram os espaços de partici-pação social e possibilitaram ao brasileiro serum cidadão muito mais consciente e exigente.

O Brasil é considerado um dos países mais

avançados no envolvimento da iniciativa pri-vada com a área social, mesmo quando utili-zados como parâmetro os Estados Unidos eos países europeus.

Os empresários brasileiros vêm perceben-do que é inconciliável, tanto do ponto de vis-ta ético, como dos negócios, um cenário soci-al em que coabitam empresas saudáveis e emcrescimento, inseridas em uma sociedade en-ferma, com um fosso cada vez maior a sepa-rar cidadãos ricos e pobres. Ao mesmo tem-po vêm se conscientizando que só a práticaassistencialista, ou seja, simplesmente doardinheiro para entidades e pessoas físicas nãoé o suficiente para alterar as condições de vi-da da população. Também sabem que atuarna área social exige projetos estruturados,muito profissionalismo, objetivos transpa-rentes e metodologia.

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Mas muito ainda tem de ser feito. Há umdeterminado segmento engajado com a pro-blemática social de forma consciente, procu-rando realmente trabalhar em prol da trans-formação desta realidade, como é o caso daFundação Antonio-Antonieta Cintra Gordi-nho, que educa crianças e adolescentes para odesenvolvimento de sua identidade plena e oexercício da cidadania.

Os desafios brasileiros neste século XXI sãocomplexos demais para serem superados como trabalho de apenas um ou outro setor da so-ciedade.

Uma das características mais marcantes daatuação das fundações e dos institutos de ori-gem empresarial no campo social é que elestransferem aos projetos sua lógica de gestão derecursos, de planejamento de ações e, princi-palmente, a busca da eficiência e resultadosefetivos. Só isso já seria uma contribuição im-portante para o campo social, que, historica-mente, tem pouca experiência em planeja-mento, gestão, monitoramento e avaliação –práticas comuns no campo dos negócios.

Nesse ponto, o Brasil ainda carece de maiorvolume e maturidade de experiências em filan-tropia familiar – como é o caso da FundaçãoAntonio-Antonieta Cintra Gordinho –, comu-nitária e independente, que têm o importantepapel de complementar o investimento dasempresas e tratar de temas e estratégias que fo-gem do padrão corporativo. Uma sociedade ci-vil forte e diversa também necessita de um se-tor de investidores sociais fortes e igualmentediversos. Tal desenvolvimento depende tantode mudanças culturais como legais, buscandoincentivos e leis que não beneficiem apenas

empresas mas também famílias e comunidadesna organização de sua mobilização social.

Outra área em que o investimento socialprivado faz a diferença, junto com toda a so-ciedade civil organizada, é na continuidadedas políticas públicas. Hoje já há um conjuntobastante consistente de soluções para os desa-fios sociais brasileiros. O grande problemanão é tanto o que fazer, mas implementar po-líticas de longo prazo – que é a única forma derealmente transformar a sociedade.

A questão é que a rotatividade de gover-nantes provoca uma rotatividade de projetos.No campo da educação, por exemplo, impres-siona a freqüência com que se utiliza a expres-são “reforma”, quando o que a educação brasi-leira precisa hoje é a mesma estabilidade epriorização que a economia vem recebendono mundo todo.

Enquanto as políticas públicas sociais fo-rem vistas como sendo parte do plano políti-co ou estratégia deste ou daquele grupo, en-quanto não tiverem qualidade e continuidade,será muito difícil conseguir mudar a realidadesocial do país. Os governos passam, mas a so-ciedade civil organizada fica. E quanto mais osempresários e as empresas estiverem envolvi-dos na construção das políticas sociais, maissustentabilidade elas tendem a ter.

FERNANDO ROSSETTI

Secretário-geral do Gife – Grupo de Institutos,

Fundações e Empresas e presidente do Comitê

Coordenador da Wings – Worldwide Initiatives

for Grantmakers Support

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Apresentação

ngressei na Fundação Antonio-Antonie-ta Cintra Gordinho em março de 1989.Fui eleito conselheiro a convite de d. An-

tonieta. Nós mantínhamos laços fortes deamizade e estreita convivência, pois minhamulher, Maria Thereza, é sua sobrinha-neta.Aprendi a admirar essa senhora que se des-pojou de todos os valores materiais para edifi-car uma extraordinária obra social e atender amilhares de crianças carentes. Seu trabalhotranscendia o mero assistencialismo, pois sa-bia e acreditava que a formação dos jovens be-neficiava pais e familiares também.

Com a renúncia do sr. Carlos Alberto Pe-reira, assumi o cargo de vice-presidente emdezembro de 1998. Cerca de um ano e meiodepois, sr. Vail Chaves – então presidente –faleceu e foi eleito, para substituí-lo, o ilustrejurista Egberto Lacerda Teixeira, um homem

brilhante que, nos momentos difíceis datransição do comando da Fundação, foi umlutador incansável pela recuperação e con-servação dos bens da entidade. Fincadas asraízes por d. Antonieta, recuperado e manti-do o patrimônio por dr. Egberto, assumi aPresidência em agosto de 2006, cargo queexerço até hoje.

Inicialmente, a Fundação era um projetopessoal de d. Antonieta e dr. Antonio. Depoisdo falecimento dele, ela ficou à frente do pro-jeto e subvencionou-o com recursos próprios.Naquela fase inicial, houve a ligação com ospadres salesianos, que administravam o inter-nato para meninos. Foi o momento funda-mental da Fundação, no qual d. Antonietaplantou os alicerces dessa obra assistencialúnica. Aos poucos, com a nova direção, naocasião presidida por Egberto Lacerda Teixei-

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As instituições sem fins lucrativos – ainda que tenham e vivam de doações de pessoas queestão vitalmente interessadas nelas – dependem do seu público, dependem do trabalhovoluntário de muita gente, dependem de gente que acredita no país.

Ruth Cardoso, em mensagem de abertura do 1º Fórum Social Ética

e o 3º Setor – Jundiaí, promovido pela FAACG em 2007

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ra, a Fundação foi se transformando, mu-dando de atitude.

Nessa segunda fase, procuramos, principal-mente, uma integração maior com a socieda-de. Concluímos que o internato da Cidade dosMeninos já não fazia mais sentido – o Estatu-to da Criança e do Adolescente proíbe, inclu-sive –, então extinguimo-lo e recebemos asmeninas para que a entidade se tornasse deensino misto. Depois, criamos o ensino semi-profissionalizante para encaminhar ao merca-do de trabalho as crianças que saíam aos 14,15 anos.

Atualmente atendemos a quase 2 mil pes-soas direta e indiretamente – através de proje-tos especiais – e pretendemos implantar o en-sino médio profissionalizante. Dessa maneira,iremos acompanhar as crianças desde os 6meses, que é a nossa creche e escola de educa-ção infantil, até os 17, 18 anos, fechando assimo ciclo educacional. Criar, encaminhar, for-mar esses pequenos cidadãos são movimentosque se irradiam, pois os alunos transmitemensinamentos para a própria família. Achoque na próxima década não existirá institui-ção ou empresa que não necessitará – até poruma questão de sobrevivência – desenvolveruma ação social. Temos absoluta convicção econhecimento do que significa o nosso traba-lho dentro de um contexto social de integra-ção, formação de seres humanos.

Temos assistido a muito discurso e poucaprática, inclusive por parte das autoridadespúblicas e da classe empresarial. Essa integra-ção que queremos não se faz apenas com re-cursos financeiros, mas também com a parti-cipação dos empresários, do governo e da

Construção da Cidade dos Meninos. Ao centro,vê-se o prédio dos dormitórios e refeitório,

por volta de 1970

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população como um todo. Não é dinheiro pu-ro e simplesmente: precisamos que a mão-de-obra seja absorvida, que os interessados parti-cipem da própria gestão da Fundação, nosorientando, porque eles sabem das necessida-des do mercado de trabalho. Pretendemos nosvaler do magnífico patrimônio imobiliárioque nos foi legado pelos fundadores para bus-car parcerias comerciais que contemplem obenefício de nossos alunos. Vale dizer que pri-vilegiaremos os parceiros com atitudes sociais.

Procuramos transmitir às crianças um mo-do ético de se encarar a vida. Não há saída pa-ra um país que não adquira esses fundamen-tos básicos – ética ligada a uma formação quemostre que o individualismo não funciona,que a corrupção tem que ser combatida, queas pessoas têm que ser muito mais participati-vas. A educação vem no bojo disso tudo eacredito que, se conseguirmos passar umaparte desses valores para as crianças, iremoscriar gerações melhores e, aos poucos, tudovai mudando.

Esse processo de crescimento do terceirosetor na última década é cultural, um proces-so educativo de evolução. D. Antonieta desen-volveu um projeto pessoal que deu as raízespara que as outras gerações, como a nossa,possam evoluir. O fascinante do terceiro setoré que ele proporciona ao cidadão comum, quejá viveu seu projeto de vida pessoal, a possibi-lidade de vivenciar um projeto humanitáriocomplementar, desfocado das vaidades pesso-ais e ambições materiais.

Nós, da Fundação Antonio-Antonieta Cin-tra Gordinho, dentro de nossas limitações ecom muita humildade, perseguiremos o que

acreditamos ser a essência do trabalho volun-tário, que é procurar fazer o bem com absolu-to desprendimento.

Eu vejo d. Antonieta como uma luz que bri-lha em cada aluno da Fundação. Hoje são mi-lhares formando um verdadeiro farol. Vamossegui-lo e aproveitaremos os alicerces solida-mente plantados para inserir outros jovens nasociedade. Rogamos a Deus e a d. Antonietaque nos iluminem.

ISMAR AUGUSTO PROCÓPIO DE OLIVEIRA

Presidente Executivo da Fundação

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Mensagem do Patrocinador

iquei extremamente honrado ao serconvidado para falar sobre a Funda-ção Antonio-Antonieta Cintra Gor-

dinho. Primeiro por se tratar de uma enti-dade que, desde sua criação, em 1957, prestaserviços essenciais para a formação de cida-dãos brasileiros. Segundo porque meu pai,Jorge Queiroz de Moraes, foi um dos conse-lheiros fundadores da instituição. E, por úl-timo, porque segui os passos de meu pai,não só no setor elétrico brasileiro, mas tam-bém na responsabilidade social ao criar aFundação Aquarela e, mais tarde, o RedeAtletismo.

A Fundação Antonio-Antonieta CintraGordinho foi pioneira na arte de formar pes-soas. No início, eram apenas 30 crianças. Aelas e a todas as outras que as sucederam fo-ram ensinados princípios básicos de cidadaniacomo o de ler e escrever. As 30 crianças vira-

ram 100, depois 200, 300 até que, em 2007, aFundação atendeu mais de 2 mil pessoas entrecrianças, adolescentes e adultos. A todas elasforam ensinados direitos. E, a cada uma delas,foram ensinados deveres.

Desde a época em que meu pai era conse-lheiro da Fundação, a instituição teve comometa "educar crianças e adolescentes, cultivara prática de valores éticos e morais essenciaispara o desenvolvimento de sua identidadeplena e o exercício da cidadania". E é isso queela vem fazendo, mesmo sem saber que umdia a filantropia de então seria aperfeiçoada aponto de tornar-se o grande diferencial deuma empresa do século XXI. Hoje é impossí-vel que uma empresa privada exista sem de-senvolver simultaneamente algum projeto so-cioeducativo.

O que antes era uma opção, hoje é umaobrigação para o setor privado de todo o

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mundo. O chamado terceiro setor cresceu trêsvezes mais que o das organizações públicas eprivadas, entre 1996 e 2005, no Brasil. Segun-do dados do Instituto Brasileiro de Geografiae Estatística (IBGE) e do Instituto de PesquisaEconômica Aplicada (Ipea), em 2006, a ex-pansão do terceiro setor foi de 215,1% en-quanto as organizações públicas e privadascresceram 74,8%. Mal sabia o casal CintraGordinho que estava fazendo história quandocriou a Fundação.

Das 930 mil empresas então existentes noBrasil, 600 mil fizeram doações ou apoiaramprogramas estruturados. Segundo o Ipea,essas ações envolveram o desembolso de R$ 4,7 bilhões – o equivalente a 0,27% doProduto Interno Bruto (PIB) brasileiro. AFundação Antonio-Antonieta Cintra Gordi-nho cresceu junto com a necessidade das po-pulações com baixo Índice de Desenvolvi-mento Humano (IDH) e hoje, além decrianças, ela atende jovens e adultos em suasseis unidades de ensino.

Além de educação formal, a entidade for-ma pessoas de nível técnico para que elas te-nham um meio de sobrevivência. Algunsaprendem como transformar o leite em pro-dutos lácteos, outros são qualificados em pa-nificação, há os que fazem opção pela marce-naria, pela informática, pela edificação, pelamoda, enfim, são capacitados para o que gos-tam e sabem fazer. Com essa infinidade detrabalho, a instituição tem dado condições deuma vida melhor às pessoas. Antonieta e An-tonio Cintra Gordinho educaram e forma-ram filhos de muitos outros casais e imortali-zaram seu trabalho com a Fundação, que

certamente será ainda mais conhecida depoisda publicação deste livro.

JORGE QUEIROZ DE MORAES JÚNIOR

Presidente do Conselho de Administração

da Rede Energia

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15 Raízes históricas Percursos da filantropia no BrasilA cidade de JundiaíAntonio e AntonietaO Conselho FundadorAs primeiras décadas da Fundação Antonio-Antonieta Cintra Gordinho A FAACG no contexto do terceiro setor

47 Vidas que contamEunice Guimarães TeixeiraMaria Thereza Passos Gordinho Amaral de OliveiraToshiko Ikeda IkuharaAntonio José da Silva FilhoIrmã TeclaTherezinha Paula DominguezIrineu Silva JúniorWaldeci Dutra CastelhanoRenato MartinsMeyri Tedde FrezzaEliana Regina Picchi Piccolo ZotiniMaria das Graças da Silva FerreiraRodrigo do Prado CaetanoAlessandra Santos Amaral

115 A Fundação hoje, para o amanhãCidade dos Meninos e Meninas (Escola Antonio Cintra Gordinho e Centro de Educação Tecnológica Eloy Chaves)Creche e Escola de Educação Infantil Almerinda Pereira ChavesTalita Kum Oficinas EducacionaisNúcleo Comunitário Jardim Novo HorizonteFazenda São JoséFazenda Ermida

141 Mensagens

150 Referências

Sumário

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Almerinda Pereira Chaves e Eloy Chaves, tendo à esquerda a filha Antonieta Chaves Cintra Gordinho, ao lado do marido Antonio Cintra Gordinho; e à direita o filho Vail Chaves e a esposa Isabel Fernandes Chaves, s/d

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Raízes históricas

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o começo de 1957, um casalconcretizou um projetolongamente amadurecido.

Ambos tinham cerca de 60 anos eprovinham de famílias abastadas etradicionais de São Paulo. Estavamcasados desde 1922. A memória familiarregistrou que a empreitada teve suainspiração no filme Boys Town, de 1938,que conta a história verídica do padreEdward Flanagan, fundador de umacomunidade, nos Estados Unidos,destinada a crianças abandonadas,batizada Cidade dos Meninos. A entidadefilantrópica que então se criou – este era o projeto do casal – tomou deempréstimo o nome de seus fundadores.

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Ao centro, de bengala, Antonio Cintra Gordinho, quando secretário da Fazenda (1945-1947), ao lado do governador do Estado de São Paulo,

Macedo Soares, em visita ao Monumento às Bandeiras, ainda em construção

Antonieta, ao centro e de óculos, visita a creche do Dispensário São José,no bairro do Jabaquara, em São Paulo, s/d

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Percursos da filantropia no Brasil

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o criarem a Fundação Antonio-An-tonieta Cintra Gordinho, em meadosdo século XX, o casal dava prossegui-

mento a uma secular tradição – que remontaao Período Colonial – das camadas privilegia-das da sociedade brasileira de se dedicarem àfilantropia. Naquele período, a assistência aospobres e necessitados estava entregue às San-tas Casas da Misericórdia. Espalhada pelo Im-pério português, a Misericórdia constituía-sena mais prestigiosa irmandade religiosa for-mada por homens brancos. A primeira Mise-ricórdia foi fundada em 1498, em Lisboa, porobra da rainha regente, D. Leonor – esposa deD. Manuel I. Na realidade, esta instituição se-guia a tradição cristã, presente desde o Perío-do Medieval, das confrarias de caridade. ASanta Casa da Misericórdia de Lisboa dedica-va-se a construir hospitais e a cuidar de pre-

sos, viúvas, órfãos, marinheiros, escravos emendigos.

Já no século XVI, as Misericórdias haviamse disseminado pelo mundo português: Ma-cau, Goa, Luanda, Salvador, Rio de Janeiro eoutras localidades. Nesse amplo espaço geo-gráfico, elas desempenhavam um papel fun-damental, ao praticarem a assistência e a filan-tropia, que não eram desempenhadas peloEstado.

No Brasil Colônia, assim como no restantedo Império português, a Santa Casa da Mise-ricórdia era, em grande medida, formada porhomens pertencentes às camadas altas da so-ciedade, como vice-reis, governadores, verea-dores, grandes proprietários de terras e ricosmercadores. O amplo rol de ações assistencia-listas desenvolvidas no Brasil pelas Misericór-dias era sustentado por recursos advindos das

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contribuições dos irmãos, de heranças em di-nheiro, terras e escravos, das rendas das pro-priedades e dos juros proporcionados por em-préstimos concedidos. Ao lado de outrasirmandades religiosas, a Santa Casa represen-tava uma das mais relevantes formas de orga-nização social na colônia, tendo grande poderpolítico e econômico.

As Misericórdias construíram os primei-ros hospitais da América portuguesa, ondemédicos residentes, enfermeiras e capelãesatendiam pessoas de todas as origens sociaise raciais.

Além do tratamento hospitalar, as Miseri-córdias prestavam outros serviços de desta-cada importância social. Ofereciam dotes pa-ra que viúvas e órfãs pudessem se casar,contribuindo, assim, para elevar o número decasamentos na colônia. Davam assistência apresos, cuidando de sua alimentação, auxi-liando-os juridicamente e acompanhando-osquando condenados. Organizavam, com ex-clusividade em muitas vilas e cidades, os ritosfúnebres. E, por fim, acolhiam, por meio daroda de expostos, crianças órfãs, enjeitadas oupobres.

A roda dos expostos, que sobreviveu atémeados do século XX, foi, por muito tempo, aúnica forma de assistência à criança desampa-rada no Brasil. Inventada na Europa medieval,esta instituição possibilitava a preservação doanonimato da mãe que não queria ou não po-dia ficar com seu filho, mas evitava que acriança fosse abandonada nas ruas, no lixo,nas portas das casas e das igrejas, morrendo defrio, de fome ou tornando-se comida de ani-mais, como era comum.

Eloy Chaves, s/d

Antonieta com sua mãe, Almerinda Pereira Chaves,década de 1910

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Em São Paulo, a Santa Casa de Misericórdiafoi criada, possivelmente, em 1599. Assim co-mo suas similares no restante da colônia, elasocorria aos doentes, por meio da administra-ção de um hospital, aos pobres, por meio daoferta de esmolas, e às órfãs, por meio da con-cessão de dotes. Entretanto, a instituição nãotratava das crianças abandonadas – o queacontecerá apenas depois da Independênciado Brasil.

Desde o Período Colonial, o abandono decrianças era um grave problema em São Pau-lo. Entre 1741 e 1845, 15% das crianças nasci-das livres na cidade foram abandonadas. Paraenfrentar essa situação, instalou-se, em 1825,uma roda de expostos na Misericórdia de SãoPaulo, que, então, se localizava na Chácara dosIngleses, no Largo da Glória. Em 1884, a rodamudou de endereço, acompanhando a Miseri-córdia, que passou a ocupar a área da antigachácara do advogado e político Antônio Pintodo Rego Freitas, no bairro de Santa Cecília,onde permanece até hoje. A roda de expostosde São Paulo foi desativada apenas em 1951,tendo sido a última no país a ser extinta. A Mi-sericórdia de São Paulo criava as crianças dei-xadas na roda até os seus 7 anos. Quando elescompletavam essa idade, a instituição encami-nhava os meninos para o Seminário de Santa-na e as meninas para o Seminário da Glória.

Durante o Império (1822-1889), o Estadobrasileiro preocupou-se, sobretudo, em evitarque as crianças abandonadas caíssem na de-linqüência (o que, parcialmente, já acontecia),transformando-se em agentes de desordemsocial. A solução seria inculcar nas criançasvalores morais e oferecer-lhes formação pro-

fissional. Assim, o governo imperial propôsaos presidentes das Províncias a criação deAsilos de Educandos, que se dedicariam à ins-trução formal e profissional, promovendo acapacitação de crianças e jovens para o traba-lho em obras públicas e na produção agrícola.

Nesse período, as ordens religiosas conti-nuaram a exercer um papel importante nafundação de asilos e orfanatos. Os salesianosestabeleceram Liceus de Arte e Ofícios volta-dos para crianças abandonadas. Por meio de-les, pretenderam prevenir e emendar vícios einfrações, proporcionando ensino profissionale remunerado. A Ordem de São Carlos criouestabelecimentos para filhos de imigrantes eu-ropeus órfãos e desamparados, como o Orfa-nato Cristóvão Colombo, em São Paulo.

Além daquelas mantidas por congregaçõesreligiosas, no Estado de São Paulo funciona-vam também instituições assistencialistascriadas pelo empresariado. Nelas ministrava-se ensino profissionalizante para filhos deoperários e trabalhadores do comércio.

Nos últimos anos do Império, a questãoda infância desamparada agravou-se, sobre-tudo nas grandes cidades do país. A urbani-zação, a industrialização e o empobrecimen-to das classes populares transformaramcrianças e jovens em trabalhadores em ofici-nas e fábricas. Como nem todos conseguiamocupação no setor produtivo, crescia o nú-mero de meninos e meninas que se dedica-vam ao roubo, ao furto, à prostituição e àmendicância para garantir a própria subsis-tência e a de sua família.

Em São Paulo, o governo viu-se obrigado afundar, em 1902, uma instituição – o Instituto

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(Funabem), encarregada de formular e imple-mentar em cada Estado uma política inte-grada de assistência à infância. Ainda que a in-tenção declarada da nova instituição fossevalorizar a educação em vez da repressão narecuperação dos jovens infratores, o trata-mento dispensado pelo Estado permaneceumarcado pela violência e estigmatização.

A redemocratização do país favoreceu aspropostas defendidas por setores da sociedadecivil para que o paradigma de assistência àscrianças e jovens se alterasse. A ConstituiçãoFederal de 1988 e o Estatuto da Criança e doAdolescente (ECA) consagraram a defesa dainfância como uma das prioridades do Estado.A nova legislação pretendeu garantir o exercí-cio de uma cidadania plena por crianças e jo-vens, assegurando-lhes educação, alimentação,lazer, saúde e proteção contra maus-tratos. Aomesmo tempo, procurou-se evitar o interna-mento, erigindo um modelo de atendimentodescentralizado e em meio aberto.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, emvigência desde 1990, atribuiu um papel cen-tral ao Estado na proteção à infância, respon-sabilizando-o pela orientação e supervisão dasações com este fim. Mas, ao mesmo tempo,possibilitou ao chamado “terceiro setor” aatuação direta no atendimento às crianças ejovens desamparados.

A trajetória do terceiro setor no Brasil re-porta-se à década de 1970, quando ainda vigo-rava a ditadura militar, e uma parte expressivada sociedade civil mobilizava-se para reivindi-car direitos de cidadania por meio de organi-zações não-governamentais (ONGs). Nesseperíodo, é inegável a contribuição dessas enti-

Disciplinar – especialmente destinada ao re-colhimento das crianças e jovens delinqüen-tes. Até então, muitos dos meninos presos pe-la polícia eram levados para as delegacias,onde passavam uma ou duas noites encarcera-dos ao lado de adultos.

No Instituto Disciplinar, a tônica da tera-pêutica ministrada às crianças e aos jovens in-ternados era o trabalho, especialmente o agrí-cola. A regeneração de meninos e meninasviria também com o inculcamento de valoresmorais e cívicos. Entretanto, o programa dainstituição não previa o ensino religioso, ob-servando a laicidade do Estado republicano.Os meninos recebiam instrução militar, apren-dendo a manejar armas e submetendo-se aexercícios de combate. Assim, criava-se umareserva de soldados para a pátria. O instituto seincumbia da educação dos internos, emborafosse comum que de lá saíssem semi-analfabe-tos. Os jovens cumpriam uma dura jornada.No inverno, acordavam às 5h30 da manhã, to-mavam banho frio e rumavam para o trabalho.No verão, levantavam-se às 5 horas.

Ao longo do período republicano, intensifi-cou-se a presença do Estado na problemáticadas crianças abandonadas e infratoras. Leis,órgãos públicos e planos de ação foram cria-dos. Em 1927, surgiu o primeiro Código deMenores. Em São Paulo, o interventor Ademarde Barros organizou, durante o Estado Novo(1937-1945), o Serviço Social de MenoresAbandonados e Delinqüentes. Em 1954,abriu-se o Recolhimento Provisório de Meno-res, vinculado ao Juizado de Menores.

Na década seguinte, o regime militar crioua Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor

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dades na construção da democracia no país,ampliando os canais de participação popular.Na década de 1990, a participação das ONGsna vida social cresceu enormemente, por meiode parcerias com o Estado. A partir de então, aênfase de sua atuação passou da demanda pe-la ampliação de direitos civis, políticos e so-ciais para a prestação de serviços (é por contadisto que alguns especialistas vêem semelhan-ças entre as ONGs e as instituições assistencia-listas do início do século XX). Paralelamente,desenvolvia-se a crise do Estado de Bem-Estar,acompanhada de profundos cortes nos gastospúblicos com a proteção social. Foi nesse con-texto que pesquisadores norte-americanos eeuropeus utilizaram, pela primeira vez, o ter-mo terceiro setor, para distinguir o governo(primeiro setor), o mercado (segundo setor) eas organizações prestadoras de serviços (ter-ceiro setor), com características dos outrosdois setores. Essas organizações se distingui-riam do setor privado por não visarem ao lu-cro e atenderem, de alguma maneira, a inte-resses coletivos. A maioria das organizaçõesque atuam no terceiro setor o faz por meio deparcerias com o Estado, obtendo verbas ouisenções de impostos em troca do ofereci-mento de serviços assistenciais.

Dirigentes da Cidade dos Meninos, 1975

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A cidade de Jundiaí

esde a sua origem, a Fundação Anto-nio-Antonieta Cintra Gordinhocentralizou suas ações na cidade de

Jundiaí, com a qual o casal fundador manti-nha fortes laços familiares e econômicos. EloyChaves, pai de Antonieta Chaves Cintra Gor-dinho, transferiu-se para Jundiaí em 1897, afim de assumir um cargo de promotor públi-co. No ano seguinte, casou-se com AlmerindaMendes Pereira. Ela era filha de um influentemilitar da cidade, o major Antônio MendesPereira, e de Ana Rita Pereira Mendes – pri-mos entre si e descendentes de uma tradicio-nal família da cidade paulista de Itu. EloyChaves logo abandonou a promotoria para sededicar à política, tornando-se vereador e pre-sidente da Câmara Municipal de Jundiaí. Pa-ralelamente à carreira política, ele desenvolveuuma importante trajetória como empresário,

destacando-se como um dos pioneiros do se-tor elétrico paulista.

Para compreender a origem de Jundiaí épreciso lembrar que, no século XVII, a ocupa-ção do interior de São Paulo ocorreu paralela-mente à organização das bandeiras de aprisio-namento indígena e busca de metais preciosospelo sertão. Há algumas histórias a respeitodos primeiros fundadores, mas a versão maisaceita é a de que Jundiaí foi fundada, em 1639,pelo bandeirante Rafael de Oliveira e sua se-gunda esposa, Maria Cordeiro, então morado-res da Vila de São Paulo, que se deslocarampara o sertão com toda a sua família e “genteforra”, ocupando a Serra do Japi.

Com a descoberta de ouro em Minas Gerais eGoiás, na segunda metade do século XVII, hou-ve uma corrida da população de outras áreas eaté mesmo de estrangeiros para essa região,

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provocando a ocupação e a intensificação das atividades econômicas dos locais que eram ca-minhos para as minas. A abertura do “Cami-nho Novo de Goiaz”, que ligava São Paulo às re-giões mineradoras, promoveu um impulso aodesenvolvimento de Jundiaí, que se tornou Vi-la Formosa de Nossa Senhora do Desterro deJundiaí, em 1655. Nessa época, a economia deJundiaí era baseada na agricultura de subsis-tência – com o cultivo de milho, feijão, amen-doim, arroz e algodão – e na criação de gado,suínos e eqüinos para o comércio e forneci-mento de mantimentos e animais para as tro-pas que iam em direção às áreas mineradoras.Muitos habitantes de Jundiaí eram tropeiros, osprincipais responsáveis pelo transporte e abas-tecimento das regiões do interior até a chegadada ferrovia, na segunda metade do século XIX.

Com os estímulos dados pelo governo deMorgado de Mateus, no século XVIII, as vilasde Sorocaba, Piracicaba, Mogi-Guaçu e Jun-diaí, ficaram conhecidas como o “quadriláterodo açúcar”, por conta da instalação de fazen-das de cana para a produção de açúcar e ca-chaça. A mão-de-obra utilizada nessas fazen-das era a negra escrava.

No século XIX, as fazendas canavieiras pas-saram a produzir café, cujas mudas chegaram aJundiaí ainda no final do século XVIII. Na faseda economia cafeeira, Jundiaí tornou-se cidade(28 de março de 1865) e passou por grandestransformações, vendo o desaparecimento dotrabalho dos tropeiros e a chegada da ferrovia,com a construção da Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, em 1867. Nessa época, a mão-de-obrautilizada nas plantações de café ainda era pre-dominantemente escrava, mas já se começava aincentivar o trabalho livre de imigrantes euro-

peus. Em 1854, existiam em Jundiaí quatro fa-zendas de café com mão-de-obra mista – escra-va e livre –, que contavam com 235 imigrantes.Essas fazendas eram de propriedade de Anto-nio Queirós Teles, futuro Barão de Jundiaí, Joa-quim Benedito de Queirós Teles, futuro Barãode Japi, e Antonio Pereira Guimarães. Com acrise econômica provocada pela grande produ-ção de café e a baixa dos preços do produto nomercado internacional, no início do século XX,a lavoura cafeeira cedeu espaço ao cultivo deoutros gêneros agrícolas, como milho e feijão, eà criação de gado, destinado não só ao consu-mo próprio e ao transporte mas também à ven-da, sobretudo de seus derivados.

Nas primeiras décadas do século XX, Jundiaíconheceu um importante desenvolvimento in-dustrial. Para isto, contribuíram tanto a dispo-nibilidade de capitais acumulados na cafeicultu-ra quanto a existência da ferrovia. As fábricasque se instalaram na cidade eram, especialmen-te, têxteis e de cerâmica. Na industrialização deJundiaí a atuação empresarial de Eloy Chavesmostrou-se fundamental, pois ele foi um dosresponsáveis pela implantação da energia elétri-ca na cidade, a partir de 1905. Nesse ano, ao la-do de Edgard Egídio de Souza e Adalberto Quei-rós Teles, Eloy Chaves fundou a Empresa Luz eForça de Jundiaí. Com o passar dos anos, eletornou-se um dos principais empresários priva-dos do setor de energia elétrica no país. Com-prou companhias já existentes, como a EmpresaForça e Luz de Mogi Mirim, e fundou outras,como a Empresa Elétrica de Andradina. Tam-bém foi proprietário de usinas hidrelétricas –em funcionamento em cidades do interior deSão Paulo, como Limeira e Pirassununga – e ter-melétricas – uma destas localizada em Jundiaí.

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Antonio e Antonieta no dia de seu casamento, 9 de março de 1922

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Antonio e Antonieta

o fundar a entidade filantrópica, An-tonio Cintra Gordinho já era uma fi-gura de expressão tanto no mundo

empresarial quanto no meio político. Naturalde Limeira, Estado de São Paulo, ele nasceuem 1893. Era filho do coronel Antonio Gordi-nho Filho e de Leonidia Cintra Gordinho. Seupai foi um dos fundadores da Empresa Elétri-ca Bragantina. Na década de 1920, GordinhoFilho tornou-se o maior acionista dessa em-presa, concessionária de energia nas cidadesde Bragança Paulista e Atibaia. Nesse período,a família Cintra Gordinho já era proprietáriade várias indústrias no Estado de São Paulo.

Antonio Cintra Gordinho bacharelou-sepela Faculdade de Direito de São Paulo. Tam-bém se formou pela Escola de Comércio Álva-res Penteado. Cintra Gordinho fundou, emJundiaí, a S.A. Gordinho Braune Indústrias de

Papel, pioneira na indústria nacional de celu-lose. A fábrica, denominada “Ermida”, tinhacapacidade para produzir 12 toneladas por diade papel destinado ao serviço de escrituração.E a energia que movia seu maquinário vinhada Empresa Elétrica Bragantina.

Importante marco na trajetória pública deAntonio Cintra Gordinho foi a presidência daAssociação Comercial de São Paulo (ACSP),tradicional associação patronal instituída em1894 por comerciantes, industriais e fazendei-ros. Embora tenha apoiado a Revolução de1930, a ACSP logo se distanciou do governode Getúlio Vargas. A partir dessa data, o gover-no dos Estados passou a ser exercido por in-terventores indicados pelo presidente da Re-pública. A crise entre a burguesia paulista eVargas foi desencadeada pela nomeação, aindaem novembro de 1930, do “tenente” João Al-

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berto Lins de Barros para a interventoria emSão Paulo. Fazendo coro a outras entidadespatronais e aos partidos políticos, a ACSPopôs-se a João Alberto e mobilizou-se “porum governo civil e paulista”. Em maio de1931, um grande número de filiados entregouà ACSP uma representação em que classifica-va o governo Vargas de “discricionário”. Nodocumento, os signatários pediam à associa-ção,“um dos órgãos mais legítimos e autoriza-dos das classes conservadoras”, que se engajas-se na luta pela reconstitucionalização, combase numa nova lei eleitoral e na convocação“de uma Constituição em moldes liberais”.

Aderindo ao movimento constitucionalis-ta, a ACSP integrou a Frente Única Paulista,formada em fevereiro de 1932. A frente reuniupartidos políticos paulistas (os até aquele mo-mento adversários Partido Republicano Pau-lista – PRP – e Partido Democrático – PD), as-sociações de classe e entidades cívicas, como aLiga de Defesa Paulista. Sua bandeira era avolta do regime constitucional no país e a res-tauração da autonomia de São Paulo em rela-ção ao governo federal.

Quando a Revolução Constitucionalista foideflagrada, em julho de 1932, a ACSP dedi-cou-se a arrecadar donativos e a organizar ofornecimento de equipamentos militares aoscombatentes paulistas. Com a derrota do mo-vimento, em setembro de 1932, o presidenteda ACSP, Carlos de Souza Nazaré, foi preso eenviado para o Rio de Janeiro, de onde partiupara o exílio, em Lisboa.

Foi justamente no contexto da derrota domovimento constitucionalista que AntonioCintra Gordinho assumiu, em 1933, a direção

da ACSP (onde permaneceu até o ano seguin-te). Nesse período, a associação teve um papelcentral na articulação da Chapa Única por SãoPaulo Unido, que visava à disputa das eleiçõespara a Assembléia Nacional Constituinte,marcadas para maio de 1933. Esta frente polí-tica compunha-se, além da própria ACSP, doPRP, do PD, da seção paulista da Liga EleitoralCatólica (LEC) e da Federação dos Voluntá-rios Paulistas. Ao participar da Chapa Única, aACSP defendeu não apenas os interesses doscomerciantes paulistas mas também dos in-dustriais e dos fazendeiros. Ao longo dos tra-balhos da frente, ficou decidido que cada umadas cinco organizações que dela faziam parteindicaria dez nomes a uma comissão que seencarregaria de selecionar os 22 candidatosque concorreriam às eleições de maio em no-me da Chapa Única. Essa comissão de seleçãofoi presidida por Antonio Cintra Gordinho. AChapa Única alcançou indiscutível vitória,elegendo 17 deputados contra cinco parla-mentares vinculados ao interventor paulistaValdomiro Lima (e, portanto, alinhados aogoverno Vargas).

Em 1945, Antonio Cintra Gordinho tor-nou-se secretário da Fazenda de São Paulo,nomeado pelo interventor do Estado, JoséCarlos de Macedo Soares – que, na década se-guinte, faria parte do Conselho Fundador daFundação Antonio-Antonieta Cintra Gordi-nho. À derrubada de Vargas pelo Exército, emoutubro de 1945, seguiu-se a entrega do go-verno do país a José Linhares, presidente doSupremo Tribunal Federal (STF). Linharessubstituiu os interventores federais nos Esta-dos e nomeou, a pedido do general Eurico

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Gaspar Dutra, Macedo Soares para a inter-ventoria de São Paulo. Macedo Soares perma-neceu no cargo até março de 1947, quandopassou o posto ao governador eleito Ademarde Barros.

De sua parte, Antonieta Chaves CintraGordinho, em 1957, cumprira uma longa tra-jetória na filantropia. Nascida em Jundiaí, noano de 1900, era filha de Eloy de MirandaChaves e Almerinda Pereira Chaves. Casou-secom Antonio Cintra Gordinho em 1922. NaRevolução Constitucionalista de 1932, Anto-nieta trabalhou como voluntária na ajuda aossoldados paulistas que iam para o front, pre-parando comida na Casa do Soldado e fazen-do roupas para os feridos do Hospital EmílioRibas, na oficina de costura organizada porsua mãe. No mesmo período, contribuiu coma “Campanha do Ouro para o Bem de SãoPaulo”, pelo que recebeu um diploma de bene-merência. Iniciada em agosto de 1932 e admi-nistrada pela ACSP, a “Campanha do Ouro”fez parte do esforço de guerra paulista, e eradestinada a angariar fundos que sustentassemo enfrentamento às tropas federais.

No começo da década de 1930, AntonietaChaves Cintra Gordinho ingressou na Ligadas Senhoras Católicas, logo sendo designadaDiretora Voluntária do Dispensário São José.Assumiu as despesas de construção de algu-mas das novas instalações da entidade desti-nadas à filantropia e, em 1947, foi eleita, porunanimidade, primeira vice-presidente dainstituição. Nos anos seguintes, prosseguiu nocampo assistencial, auxiliando na construçãode creches e do prédio da Associação Femini-na de Estudos Sociais e Universitários (Afesu)

– ligada à organização católica Opus Dei –, ena implantação de serviço odontológico gra-tuito para o Grupo Escolar Rafael de Oliveira,localizado na fábrica de papel de sua família.

Em 1975, Ano Internacional da Mulher,Antonieta recebeu um certificado de aprecia-ção “pelos relevantes serviços prestados à fa-mília através da educação do menor”, concedi-do pelo Clube Soroptimista de São Paulo,ligado à Federação Soroptimista das Américasque, fundada em 1921, na Califórnia (EstadosUnidos), atua mundialmente e reúne mulhe-res dirigentes de empresas. Em 1985, foi ho-menageada pelo Womans’ Club de São Paulo,com o título de Mulher do Ano.

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Antonieta Chaves, por volta de 1910

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Antonio e Antonieta, década de 1940

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O Conselho Fundador

ários homens dos quais se cercaramAntonio e Antonieta, na organiza-ção da entidade filantrópica, esta-

vam ligados ao casal por laços familiares, co-mo Antonio Gordinho Filho e Eloy deMiranda Chaves, pais, respectivamente, deAntonio e de Antonieta. Havia, também, figu-ras ilustres, de projeção nacional, como JoséCarlos de Macedo Soares e Waldemar Ferrei-ra. Os conselheiros fundadores dedicavam-seaos negócios, à medicina ou às carreiras jurí-dicas (advocacia e magistratura). Dentre osmédicos, estava Jayme Rodrigues, fundadorda Faculdade de Medicina de Jundiaí. Dentreos juristas, estava Mário Guimarães, desem-bargador do Tribunal de Justiça de São Pauloe, posteriormente, ministro do Supremo Tri-bunal Federal (STF).

Uma boa parte dos conselheiros também

militava na política, tendo a experiência co-mum de ter participado da RevoluçãoConstitucionalista de 1932. Ademais, váriosdeles provinham de famílias paulistas tradi-cionais, como o médico Antônio Carlos Pa-checo e Silva, professor da Universidade deSão Paulo (USP) e descendente de JoaquimFerreira Penteado, o Barão de Itatiba, e deBento de Lacerda Guimarães, o Barão deAraras.

Além de Antonio e Antonieta, o ConselhoFundador era formado por: Antonio Gordi-nho Filho, Antônio Carlos Pacheco e Silva,Antônio Loureiro, Egberto Lacerda Teixeira,Eloy de Miranda Chaves, Francisco de PalmaTravassos, Germano Pedro Braune, Jayme Ro-drigues, João Mendonça Cortez, Jorge Quei-roz de Moraes, José Carlos de Macedo Soares,José de Aranha Pereira, Leônidas Lopes de

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Oliveira, Mário Cintra Gordinho, Mário Gui-marães, Pedro Lemos Nogueira, Vail Chaves eWaldemar Martins Ferreira.

Egberto Lacerda Teixeira nasceu emCampinas em 1919. No ano de 1942, for-mou-se pela Faculdade de Direito da USP.Em seguida, partiu para os Estados Unidos,cursando a Universidade de Michigan, emAnn Arbor. Nesta, obteve, em 1945, o títulode master in law. De volta ao Brasil, tornou-se redator da Revista do Direito Mercantil,dirigida por Waldemar Ferreira – tambémmembro do Conselho Fundador. Ao mesmotempo, foi chefe do Departamento Jurídicoda Ford Brasil S.A. Mais tarde, fundou seupróprio escritório de advocacia, que repre-sentava, no Brasil, os interesses do GrupoNelson Rockefeller. Entre 1954 e 1956, foiprofessor da Faculdade de Direito da Uni-versidade Mackenzie. Foi, ainda, auxiliar deensino na cadeira de Direito Comercial daFaculdade de Direito da USP e consultor ju-rídico da Câmara Americana de ComércioBrasil-Estados Unidos. Escreveu diversos li-vros jurídicos, como Do cheque no direitocomparado interamericano, Das sociedadespor quotas de responsabilidade limitada, Dassociedades anônimas no direito brasileiro eSociedades limitadas e anônimas no direitobrasileiro.

Natural de Pindamonhangaba (Estado deSão Paulo), onde nasceu em 1875, Eloy deMiranda Chaves passou parte de sua infânciano exterior, pois seu pai, o coronel José Gui-lherme de Miranda Chaves, serviu como di-plomata no Peru e no Equador. Em 1896, ba-charelou-se pela Faculdade de Direito de São

Paulo. Assim que se fixou em Jundiaí, fundouo Colégio Santo Antônio, do qual foi diretore professor. Eloy Chaves ingressou na políti-ca partidária pelas mãos do tio de sua espo-sa, o major Boaventura Mendes Pereira, che-fe do Partido Republicano Paulista (PRP) emJundiaí. Na década de 1900, exerceu doismandatos como deputado federal, eleito pelalegenda do PRP. Entre 1913 e 1919, foi secre-tário estadual do Interior e também de Segu-rança Pública nos governos de Rodrigues Al-ves e Altino Arantes. De volta à Câmara dosDeputados, Chaves apresentou o projeto delei mais célebre de sua carreira parlamentar.Tendo nos funcionários da Companhia Pau-lista de Estrada de Ferro de Jundiaí e Itatibaum importante eleitorado, propôs uma leiprevidenciária para os ferroviários. Aprovadapelo Congresso Nacional e sancionada pelopresidente Artur Bernardes, no início de1923, a lei criava, em cada uma das empresasferroviárias do país, uma caixa de aposenta-doria e pensões para os seus empregados. Apartir de então, os ferroviários tinham direi-to à aposentadoria por tempo de serviço ouinvalidez, auxílio-funeral, atendimento mé-dico e pensão para seus familiares, em casode morte. Com a Revolução de 1930, EloyChaves deu por encerrada sua carreira polí-tica e passou a se dedicar estritamente à ini-ciativa privada. Além de empresário do setorelétrico, Eloy Chaves foi agricultor e criadorde gado, tendo sido grande proprietário deterras.

Jayme Rodrigues nasceu em Jundiaí (SP),em 1909, mudando-se para a capital ao in-gressar na Faculdade de Medicina de São

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Da esquerda para a direita, o casal Aracy e Jorge Queiroz de Moraes, ao lado de Antonio e Antonieta, s/d

Antonieta Chaves Cintra Gordinho ao centro. À esquerda, o casal Isabel e Vail Chaves e à direita o casal Odila e dr. Jayme Rodrigues (membro do Conselho Fundador da FAACG), década de 1980

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Barbosa à Presidência da República. Comotambém era empresário, Macedo Soares tor-nou-se, em 1923, presidente da AssociaçãoComercial de São Paulo (ACSP). No final dadécada de 1920, apoiou a campanha da Alian-ça Liberal e, em seguida, participou da Revo-lução de 1930. Entre 1934 e 1937, Macedo So-ares foi o chanceler do governo de GetúlioVargas. No início de 1937, deixou o Ministé-rio das Relações Exteriores e assumiu o daJustiça, do qual se demitiu nas vésperas dogolpe do Estado Novo. Com a redemocratiza-ção do país, em 1945, foi nomeado interven-tor federal em São Paulo, cargo que exerceuaté 1947. No final de 1955, Macedo Soaresvoltou a ser nomeado chanceler pelo presi-dente interino, Nereu Ramos. Ao ser empos-sado, no ano seguinte, Juscelino Kubitschekmanteve-o no posto.

Figura que alcançou grande projeção polí-tica, Waldemar Martins Ferreira nasceu emBragança Paulista, em 1885. Em 1908, bacha-relou-se pela Faculdade de Direito de SãoPaulo. Iniciou a carreira de advogado na suacidade natal. Em 1920, tornou-se professor dedireito comercial da faculdade onde se for-mara. Foi um dos fundadores, em 1926, doPartido Democrático (PD) – organizado parafazer oposição ao PRP, agremiação que domi-nou a política paulista durante a RepúblicaVelha (1889-1930). Waldemar Ferreira apoi-ou a Revolução de 1930 e, em 1932, foi secre-tário estadual de Justiça na interventoria Pe-dro de Toledo, que havia sido nomeadointerventor federal em São Paulo, numa ten-tativa de Vargas de apaziguar a crise políticaque antagonizava os “tenentes” e a oligarquia

Paulo. Em 1933, efetivou-se como médico doHospital Beneficência Portuguesa e, no mes-mo ano, concluiu seu doutorado. Trabalhoutambém no Hospital Sorocabana e na SantaCasa de Misericórdia de São Paulo. Em 1968foi convidado pelo prefeito de Jundiaí, PedroFávaro, a fundar a Faculdade de Medicina deJundiaí, da qual foi seu primeiro diretor,cumprindo as funções voluntariamente, se-gundo sua vontade. Posteriormente, foi elei-to, por vários mandatos, vice-presidente doHospital Beneficência Portuguesa.

Médico diplomado pela Faculdade deMedicina do Rio de Janeiro, Jorge Queirozde Moraes nasceu em Jundiaí, no ano de1899. Após se formar, passou uma tempora-da na Europa (Alemanha e França) e outranos Estados Unidos, especializando-se.Exerceu a presidência da Legião Brasileirade Assistência e a vice-presidência da Previ-dência Médica. Além disso, foi membro devárias associações científicas, como a Acade-mia Nacional de Medicina, a Sociedade deMedicina e Cirurgia de São Paulo e a Socie-dade Brasileira de Pediatria. Foi diretor daCreche Baronesa, em Limeira (Estado deSão Paulo), assim como editor da revistaMaternidade e Infância. Publicou livros, co-mo Contribuição da Legião Brasileira de As-sistência na Proteção à Maternidade e à In-fância em São Paulo.

Filho de uma família de grande prestígiocultural e político, José Carlos de Macedo So-ares nasceu em São Paulo, em 1883. Formadopela Faculdade de Direito de São Paulo em1905, engajou-se, pouco depois, na Campa-nha Civilista, apoiando a candidatura de Rui

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paulista. Apesar de sua oposição à eclosão domovimento armado, Pedro de Toledo tornou-se o chefe civil do levante e, com a vitória dasforças legalistas, foi deposto do governo deSão Paulo, partindo para o exílio em Lisboa.Da mesma forma, Waldemar Ferreira, que ha-via se engajado na Revolução Constitucio-nalista, também seguiu para Lisboa, retor-nando do exílio em 1934. No mesmo ano,elegeu-se deputado federal pelo PartidoConstitucionalista de São Paulo. Durante oEstado Novo, destacou-se como membro daoposição liberal a Getúlio Vargas, tendo sidofundador da União Democrática Nacional(UDN), em 1945. Entre 1952 e 1955, voltou aocupar uma cadeira na Câmara dos Deputa-dos, pela legenda da UDN. Foi autor de diver-sos livros jurídicos, relativos, sobretudo, aodireito comercial.

Nascido em 1899, Vail Chaves, único ir-mão de Antonieta, teve importante atuaçãono setor privado. Por um longo período (en-tre 1937 e 1980), exerceu a presidência doBanco Comind (Banco de Comércio e Indús-tria do Estado de São Paulo S.A.), do qualEloy Chaves era um dos principais acionistas.Participava junto com seu pai da administra-ção de outros negócios, como a Central Elé-trica de Rio Claro, onde assumiu o cargo desuperintendente, tendo permanecido na em-presa durante 35 anos. Atuou como voluntá-rio da Santa Casa de Misericórdia de SãoPaulo a partir de 1970, auxiliando no seu ge-renciamento. Ao iniciar suas ações na entida-de, ocupava a graduação de “irmão protetor”.Em 1993, foi eleito pela irmandade “irmãomesário”, designação dada àqueles que ocu-

pam a mesa administrativa da Santa Casa, to-mando importantes decisões quanto ao seurumo administrativo.

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Irmãs cuidam das roupas e lençóis dos garotos,na Cidade dos Meninos. Elas eram as únicas pessoas

do sexo feminino dentro da instituição 1973

Primeira turma de 30 alunos da Cidade dos Meninos 1973

Garotos visitam o pomar da Cidade dos Meninos 1973Prédio dos dormitórios e refeitório 1973

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As primeiras décadas da FundaçãoAntonio-Antonieta Cintra Gordinho

primeiro estatuto da Fundação An-tonio-Antonieta Cintra Gordinho(FAACG) listava do seguinte modo

os seus objetivos:a.) prestar assistência à criança desampa-

rada desde sua vida pré-natal até a idade emque possa ingressar na sociedade preparadapara a luta pela vida; b.) instalar, manter edesenvolver creches e clínicas pré e pós-na-tal; c.) ministrar bolsas de estudos para ascrianças que terminarem seus cursos preli-minares e se mostrarem aptas para os cursostécnicos, científicos ou universitários; d.) co-laborar com as associações, institutos e de-partamentos de proteção à criança desampa-rada, a juízo de sua direção e na medida deseus recursos.

Nos seus primeiros anos de funcionamen-to, a FAACG limitou-se a apoiar iniciativas de

outras entidades que atendiam à infância de-samparada. A Fundação já contava com umsólido patrimônio, constituído de dinheiro eações – de bancos, de indústria e de empresasde transporte ferroviário e energia – doadospor Antonio e Antonieta. Pouco depois decriada a Fundação, Antonio Cintra Gordinhoadoeceu, falecendo em 1966.

A partir de então – e durante 30 anos –, An-tonieta voltou-se intensamente à Fundação,aplicando-se em ampliar sua atuação. Em1973, foi inaugurada a Cidade dos Meninos,ocupando a área de uma fazenda em Jundiaíque pertencia à fundadora. Por muito tempo,a Cidade dos Meninos funcionou como uminternato masculino. As crianças ingressavamaos 7 anos e lá permaneciam até os 18. Rece-biam educação formal e ensino religioso, pra-ticavam esportes e cultivavam hortas. Volta-

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vam para a casa de seus pais apenas nos finaisde semana.

Antonio e Antonieta eram muito religiosos.A proximidade do casal em relação à IgrejaCatólica refletiu-se na presença marcante defreiras e padres nas décadas iniciais da Fun-dação. As crianças e jovens assistidas erameducadas sob os preceitos da fé cristã. Os in-ternos da Cidade dos Meninos assistiam àmissa todos os dias. Durante a semana – noperíodo anterior à construção da capela –, amissa era celebrada antes das aulas, numa pe-quena sala próxima ao refeitório. A manuten-ção do internato era feita por algumas freiras,que limpavam as suas instalações, preparavamas refeições e lavavam as roupas dos meninos.

Por algum tempo, a Cidade dos Meninosfoi dirigida por salesianos, tendo o padre Gue-rini Sartori à sua frente. Descrito pelos antigosalunos como um homem justo e rigoroso, opadre Sartori era muito cioso de sua tarefa decatequizar os meninos. Na sua época, os inter-nos, antes de voltarem para casa, tinham dedemonstrar que haviam estudado religião. Osque não passavam na “prova” permaneciamna Cidade durante o final de semana. Por ou-tro lado, os alunos aplicados eram recompen-sados com um acampamento em que o padreSartori preparava sua famosa sopa de tomate.

Em 2001, a Cidade dos Meninos deixou deser um internato, mas manteve todas as suasatividades educacionais e adotou o modelo deescola em tempo integral. E, em 2002, passoua aceitar meninas como alunas, transforman-do-se na Cidade dos Meninos e Meninas.

Atualmente, estão instalados na Cidadedos Meninos e Meninas a Escola Antonio

Cintra Gordinho e o Centro de Educação Tec-nológica Eloy Chaves (Cetec), que foi inau-gurado solenemente em 2002, com a presen-ça de Lúcia Alckmin, esposa do governadordo Estado à época, Geraldo Alckmin. A esco-la destina-se ao ensino fundamental e o Cetecoferece ensino profissionalizante em váriasáreas (informática, edificações e restauro, ele-trotécnica, panificação e confeitaria, marce-naria e elétrica e eletrônica) para jovens eadultos.

Em 1981, a FAACG inaugurou sua segundaunidade. Tratava-se da creche (hoje Creche eEscola de Educação Infantil) Almerinda Perei-ra Chaves – uma homenagem à mãe de Anto-nieta. Ao criar a creche, a fundadora procurouuma ordem de freiras para cuidar das criançasde 6 meses a 6 anos que lá seriam atendidas.Para selecionarem as crianças, as freiras visita-vam suas famílias, para averiguar quais ti-nham mais necessidade daquela assistência.Atualmente, o critério de admissão à creche ésocioeconômico, mediante avaliação realizadapelo serviço social e conhecimento da dinâmi-ca familiar.

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Refeitório da Cidade dos Meninos, 1973

Cozinha das Cidades dos Meninos à época da inauguração.As freiras eram responsáveis pelas refeições e limpeza do internato, 1973

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Cidade dos Meninos recém inaugurada, 1973

Portão de entrada da Cidade dos Meninos visto de dentro, 1973

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A FAACG no contexto do terceiro setor

o ingressar na esfera do terceiro se-tor, a FAACG modernizou-se. Esta-beleceu uma linha pedagógica unifi-

cada para suas unidades, aboliu o regime deinternamento, profissionalizou sua gestão,tornou o ensino religioso ecumênico e aproxi-mou-se de outras entidades de assistência.

Em 1999, a FAACG obteve a sua terceiraunidade – a Talita Kum –, ao incorporar umabrigo de meninas que havia sido construídopor Antonieta Chaves Cintra Gordinho comrecursos próprios. O abrigo ficava numa áreacontígua ao convento das Irmãs Carmelitas,que o administravam. O nome Talita Kum foisugerido pela Irmã Daniela – pioneira doprojeto – e se refere a uma passagem bíblica,na qual Cristo ressuscita uma menina. Em1996, a instituição atendia a 28 meninas, de 7a 14 anos.

Segundo relatório de 2000, a Casa “terá co-mo objetivo a formação humana e cristã dasmeninas, principalmente as mais carentes, pro-curando, através de orientação, apoio e cursos,dar condições de torná-las capazes de assumirna sociedade as suas responsabilidades”.

Aos poucos, a unidade foi deixando de fun-cionar como internato – paralelamente, a ad-ministração da Casa foi profissionalizada,com a contratação de voluntários e novos fun-cionários – e, finalmente, em 2003, o interna-to foi extinto, dando lugar a oficinas pedagó-gicas, que incluem apoio escolar e aulas deinglês, música, artesanato, informática, dança,teatro, reciclagem e outros. Atualmente, a Ta-lita Kum funciona como uma casa aberta à co-munidade, oferecendo formação profissiona-lizante e cultural a meninas que tenham entre10 e 16 anos.

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A quarta unidade da Fundação – o NúcleoComunitário Jardim Novo Horizonte – foiinaugurada em 2000. O lugar escolhido parasua instalação é vizinho à Cidade dos Meninose Meninas e é nele em que a maioria dos alu-nos da instituição mora. Esse bairro da peri-feria de Jundiaí – também conhecido comoVarjão – nasceu, na década de 1980, de umaocupação irregular de terras, ao longo de umtrecho da antiga Estrada de Ferro Sorocabana.Hoje, a população do bairro é de 14 mil pes-soas. A criação do Núcleo Comunitário res-pondeu tanto ao objetivo de oferecer assistên-cia às famílias dos alunos da Cidade dosMeninos e Meninas quanto ao de estabelecervínculos com a comunidade local.

No seu início, a unidade ofereceu cursos deculinária e ginástica feminina. A partir de2002, os dois cursos foram substituídos pelasoficinas de reforço escolar (da 1ª à 4ª séries) ecapoeira. Atualmente, o Núcleo atende crian-ças, adolescentes e adultos, distribuídos nasoficinas educacionais: reforço escolar, ca-poeira, futebol (masculino e feminino), mo-da, artesanato, ginástica, violão e música. Asatividades da unidade incluem também bi-blioteca, brinquedoteca e palestras sobre as-suntos de interesse da comunidade. A FAACGpretende, futuramente, implantar o projetochamado “Parque da Vida”, que será construí-do em uma das áreas do bairro e deverá con-siderar a instalação de uma creche e amplia-ção das oficinas.

Em 2002, a FAACG passou a desenvolveratividades em outra unidade, a Fazenda Ermi-da. Em parceria com o Senai de Belo Horizon-te e a Prefeitura Municipal de Santana de Par-

naíba, a Fundação realizou o Projeto Oficinade Artes e Ofícios – Preservação e Restauraçãode Bens Históricos, destinado à formação pro-fissional de jovens e que originou o primeirocurso de Edificação e Restauro da entidade.

A Fazenda Ermida pertenceu aos pais deAntonieta Chaves Cintra Gordinho. Sua histó-ria entrelaça-se com a de Jundiaí. Ela está si-tuada na encosta da Serra do Japi, região ori-ginalmente ocupada por agrupamentosindígenas de origem guarani. Japi ou Japy, emtupi-guarani, significa abertura profunda oumorro. A região onde se encontra a FazendaErmida era a sesmaria Paragem ao Pé da Ser-ra do Japi, pertencente a Jerônimo e JoaquimAbreu de Magalhães, e desde o século XVI ha-via atividades de portugueses ali.

No século XVIII, a Fazenda Ermida iniciousuas atividades de plantação de cana-de-açú-car. Há indícios de que nessa propriedade fun-cionou também um engenho de açúcar. Coma expansão da cafeicultura pelo Oeste paulis-ta, na segunda metade do século XIX, tambéma Fazenda Ermida passou a se dedicar a estecultivo.

Eloy Chaves comprou a propriedade, em1905, das herdeiras do fazendeiro Antonio Jo-sé da Costa Wilk, falecido três anos antes. Nasmãos de Eloy, a fazenda inseriu-se no surto in-dustrial que se iniciava no Estado de São Pau-lo e incluía Jundiaí. Assim, na década de 1920,a propriedade passou a se dedicar à produçãode eucalipto e araucária para o abastecimentoda S.A. Gordinho Braune Indústrias de Papel,pertencente a Antonio Cintra Gordinho.

Em 2004, a partir do projeto de Edificaçãoe Restauro desenvolvido na Fazenda São José,

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Vail Chaves, grande incentivador da Talita Kum, s/d

a FAACG criou a sua sexta unidade. Na Fazen-da, localizada na cidade de Araçariguama(SP), a Fundação, em parceria com a Prefeitu-ra, executa projetos voltados, especialmente,para professores e alunos de Educação Infan-til da rede municipal de ensino.

Destacam-se dois projetos realizados pelaFundação na sua unidade de Araçariguama. Oprimeiro é a Ludoteca, destinado a crianças de3 a 6 anos que apresentam algum tipo de difi-culdade de interação na escola ou em casa. Osegundo é o Ateliê Agulha & Linha, que ensi-na artesanato às mães das crianças que fre-qüentam a Ludoteca, oferecendo a elas ummeio de geração de renda.

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Turma de meninos à época da inauguração da Cidade dos Meninos, 1973

Time de futebol formado pelos integrantes da Cidade dos Meninos, em jogo contra a Escola São José, de Campinas. O jogo foi realizado naquela cidade e a Fundação venceu por 1 X 0, 1973

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Antonieta junto com as crianças da Cidade dos Meninos, segunda metade da década de 1970

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Vidas que contam

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istórias de vida fazem parte da história das instituições.As pessoas que compõem

uma fundação, por exemplo, levam suas histórias e experiências pessoaispara dentro dela, formando um todo de distintas partes, muitas vezescomplementares que criam a identidadedo grupo.

A história oral aparece como umaaliada daqueles que não estão emevidência na sociedade. Permitir queessas pessoas tragam suas histórias àtona nos possibilita um contato comexperiências que não mais se perderãono tempo e alcançarão outros quepodem se beneficiar delas.

As entrevistas de história oral sãodiferentes daquelas praticadas pelojornalismo, pois o entrevistado nãoresponde simplesmente às perguntas:ele mesmo traça a sua história, organizaa sua memória e nos diz aquilo que achaimportante. O entrevistador apenas guia

os temas e pontua algumas questões.Depois de gravada, a entrevista étranscrita – passada para o texto escrito,com ajustes gramaticais e de vícios delinguagem excessivos – e textualizada.No processo de textualização asperguntas são suprimidas e a figura queaparece é exclusivamente a do narrador.Em seguida, é realizada a transcriação,quando o texto é recriado, buscandotraduzir o que muitas vezes não é ditopor meio de palavras, como hesitação,alegria, emoção. As intervençõestambém permitem tornar a narrativamais leve e fluente.

Neste livro, as transcriações forameditadas com muito critério, uma vezque seria impossível todos os textosserem publicados na íntegra. As 14entrevistas a seguir mostram um poucodos mais de 50 anos de história daFundação Antonio-Antonieta CintraGordinho, vista sob muitos e diferentesolhares.

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eu nome é EUNICE GUIMARÃES TEI-XEIRA. Nasci em 13 de janeiro de1922, no bairro do Paraíso, em São

Paulo, na casa de meu tio que era médico.Quando eu tinha 20 dias de vida, meus pais re-tornaram comigo para a cidade de Itatiba, on-de meu pai era juiz. Nessa cidade morei atémeus 6 anos de idade. Na ocasião, nos muda-mos para Rio Preto, hoje São José do Rio Pre-to, e lá ficamos mais uns dois anos. Depois,viemos para São Paulo e aqui vivi, estudei, mecasei, tive minhas filhas e netos.

Lembro-me muito de quando eu era crian-ça e morava no interior, porque a infância émuito importante, a gente não esquece. Eu te-nho um irmão e brincávamos bastante, tínha-mos muitos amiguinhos. Andávamos em cimados muros, subíamos em árvores – algo raroaqui em São Paulo – e nunca caímos! Aprendi

com meus pais, em casa, a ler, escrever e fazercontas e nem precisei cursar o 1º ano na esco-la em Rio Preto. O 4º ano fui fazer no Externa-to Elvira Brandão, em São Paulo, quando nosmudamos. Lá havia os parentes, primos e logoque entrei para a escola, fiz amizades, aliás, asminhas amigas atuais são todas da época do 5ºano do primário, continuamos muito próxi-mas. Depois do externato, passei um ano estu-dando em casa porque tinha ido à Europa commeus pais e perdido um ano.

Em seguida, estudei e me formei na Facul-dade de Estudos de Francês, Italiano, Espanhole Português. Gostava de falar outras línguas, deir a lugares que falassem outros idiomas. Euacho que qualquer estudo é útil na vida da pes-soa e, hoje, falar mais de uma língua é uma coi-sa necessária, muita gente fala inglês como se-gunda língua, no mundo inteiro.

Antonio e Antonieta pertenciam a famílias de posses. Ele trabalhou muito a vida inteira, enquanto teve saúde. Não tinham filhos nem herdeiros para deixar a fortuna, então,quando assistiram àquele filme, tiveram a idéia de fazer uma coisa semelhante para dar educação e instrução ameninos pobres.

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Meu marido, Egberto Lacerda Teixeira, foipresidente da Fundação Antonio-AntonietaCintra Gordinho. Ele é advogado e sempregostou de estudar, de escrever livros na áreadele. Foi o primeiro aluno da faculdade, ga-nhou bolsa de estudos quando se formou e es-tudou por dois anos nos Estados Unidos. De-pois que voltou, passou a ter clientesnorte-americanos, e viajava muito para aquelepaís e para outros também. Como nós já éra-mos casados, eu ia junto. Ele trabalhava e eu fi-cava passeando, visitando museus... Nós tive-mos uma vida sempre muito boa, muito feliz,muito agradável.

Minha mãe era prima distante de d. Anto-nieta e elas eram muito amigas, pois tinhampraticamente a mesma idade. Morando emSão Paulo, passamos a freqüentar a casa deAntonieta e dr. Antonio. Ele gostava de saircomigo, me deixava guiar seu carro. Eles meconsideravam como se fosse filha. Numa dasvezes que fomos ao Rio de Janeiro, chegamosao hotel e, na portaria, perguntaram: “O se-nhor pode dar seu nome?”. E o sr. Antonio:“Pois não: Antonio Cintra Gordinho, senhorae filha”. Aí, o homem do hotel disse: “A sua se-nhora e sua filha precisam preencher a ficha”.Fiquei pasma: “Dr. Antonio, como é que euvou preencher a ficha se eu tenho nome dife-rente do senhor?! Não posso pôr Eunice Cin-tra Gordinho, se eu sou Eunice Guimarães!”.Ele respondeu: “É... Bom, então não precisapreencher a ficha. Eu digo que preencho paravocê”, e ficou assim.

Eu acompanhei a construção da Fundação.Houve uma época, nos anos 1930 ou 1940, emque passou no cinema, em São Paulo, um filme

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Eunice Guimarães Teixeira

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chamado Boys Town, com Mickey Rooney,uma história verídica de uma Cidade dos Me-ninos. Um dia, dr. Antonio foi à nossa casa, naAvenida Brasil – que era uma rua de terra, semnada e na qual os bois iam pastar –, quase naesquina com a Avenida Nove de Julho, que naépoca não existia, e falou para o meu pai:“Olha, dr. Mário, o senhor sabe que eu traba-lhei muito, ganhei muito dinheiro, não tive fi-lhos e desejo deixar a minha fortuna e de mi-nha senhora para uma organização parecidacom aquela do filme Cidade dos Meninos”.

Isso foi praticamente o nascimento da Fun-dação. Antonio e Antonieta pertenciam a famí-lias de posses. Ele trabalhou muito a vida intei-ra, enquanto teve saúde. Não tinham filhosnem herdeiros para deixar a fortuna, então,quando assistiram àquele filme, tiveram a idéiade fazer uma coisa semelhante para dar educa-ção e instrução a meninos pobres. Ele foi arru-mando tudo, porém ficou doente e esteve assimpor 12 anos. Eles ficavam em São Paulo e aca-baram se mudando para a casa dos pais dela, naAvenida Paulista, para não deixá-lo sozinhoquando ela precisasse sair. Antonieta foi muitodedicada a ele e ambos eram ótimas pessoas,corretas, amáveis, boníssimas... Quando viamcriança pobre passando, pedindo esmola, elesdavam... Ajudavam... Faziam de tudo...

A Fundação havia sido instituída em 1957,mas a idéia da Cidade dos Meninos ficou pa-rada durante os anos em que dr. Antonio es-teve doente. Quando ele faleceu, em 1966,Antonieta disse, lá em casa: “Eu quero fazer oque meu marido queria”. Ou seja, a Cidadedos Meninos em Jundiaí. E todos ajudaram,meu pai, como juiz, deu seus palpites, além

dos sobrinhos que ela tinha e o irmão dela,dr. Vail. Ele foi uma pessoa ótima que tam-bém não teve filhos, deixando o que possuíapara a Fundação. D. Antonieta era uma pes-soa muito ativa, que trabalhou a vida inteirapara ajudar os menos favorecidos. Ela faziaparte da Liga das Senhoras Católicas e minhamãe a ajudava em muitas coisas, trabalhavamem prol das crianças necessitadas, costura-vam roupas. Para tomar conta do seu projeto,Antonieta cercou-se de pessoas que enten-diam de negócios, advogados, administrado-res. Ainda hoje, a instituição é sustentada comos bens que o casal Cintra Gordinho deixou,além da herança de Vail Chaves.

Na Cidade dos Meninos, as crianças entra-vam aos 7 anos e estudavam até os 18. Apren-diam a comer com garfo e faca, pois muitosnão sabiam. Houve uma vez um almoço comos pais das crianças e d. Antonieta ouviu umdos meninos dizer: “Pai, aqui não dá para co-mer com colher, aqui é para comer com garfoe faca. Aqui é chique”. Eles se serviam e co-miam o quanto queriam, mas não podiam dei-xar restos, porque não se devia jogar comidafora; comida custa dinheiro, é um sacrifíciopara quem ganha pouco – o que devia ser o ca-so de muitos dos pais dos garotos que estavamali. Eles aprendiam também a plantar legumese, nos fins de semana, quando iam para casa,levavam para as mães as verduras da horta.

D. Antonieta disse uma vez ter recebido umtelefonema de um ex-aluno, que falou: “D. An-tonieta, quando a senhora vier a Jundiaí, pode-ria passar aqui no banco para falar comigo?”.Ela ficou preocupada e foi a Jundiaí, ao talbanco. Ele veio recebê-la, levou-a a uma sala:

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“Eu queria que a senhora visse onde eu traba-lho, d. Antonieta. Eu devo isso ao que aprendina Cidade dos Meninos”. Ele quis mostrar co-mo tinha feito sucesso na vida, mostrou queaproveitou o que havia aprendido.

Em pouco tempo, a Cidade já possuía centoe tantos meninos, quando a gente chegava lá,eles vinham dar bom-dia, um por um. Anto-nieta disse para o padre, uma vez: “O senhornão acha que eu posso chegar e dizer ‘bom diapara vocês todos’? Porque a gente fica até comdor nos braços de tanto dar bom-dia”. Ele dis-se: “D. Antonieta, a senhora é quem resolve,mas eu quero dizer que aqui nós ensinamos oseguinte: quando chega uma visita na casa dagente, a gente se levanta, vai cumprimentar,convida a visita para sentar ou para almoçar,tomar um chá, um café.” A gente sentava, elesvinham conversar, mesmo os menores. Todoseles recebiam uma educação de família. A gen-te dava 50, 60, 100 “bom dia”, “boa tarde”, “atélogo” para todos que estavam ali, que vinhamfalar com a gente, estender a mão ou, então,abraçar. O padre tinha toda razão. Quando elesiam para casa, provavelmente faziam o queaprendiam lá na Cidade dos Meninos.

Antonieta nunca deixou que a Fundaçãofosse divulgada, era discreta, queria fazer obem para as crianças, mas não queria que sou-bessem que aquilo era sua vida. Depois da suamorte, acho que deviam fazer um pouco maisde propaganda, não pela Fundação em si, mascomo um exemplo para outras pessoas ricas.Tem muita criança pobre ainda, não só emJundiaí, como em outras cidades. Seria umexemplo para muita gente que talvez pudesseajudar.

Todos que trabalham lá têm um interesseespecial em fazer aquilo funcionar, porque éuma coisa boa fazer benefício a tanta gente.Nunca conheci uma pessoa que não ficasse en-tusiasmada com a instituição. Muitos pergun-tam: “Como é que vai a Fundação com a faltade Antonio e Antonieta?”. Eu digo: “Vai indomuito bem, porque a Maria Thereza e seu ma-rido, Ismar, administram a Fundação de ma-neira eficaz e correta”.

Espero que seja sempre assim, porque eu játenho 86 anos, não vou ver a Fundação daquia 20 anos. Eu desejaria que existissem umas200 iguais a ela, aqui no Estado de São Paulo,cuidando de crianças carentes desde poucosmeses até os 18, 20 anos de idade. Esse é o ti-po de coisa que, no Brasil, faz muita falta, o fa-to de não ter mais Cidades dos Meninos e Me-ninas. É necessário dar instrução para essascrianças vencerem na vida, pois aqueles quetêm oportunidade de estudo são capazes de irmais adiante.

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eu nome é MARIA THEREZA PAS-SOS GORDINHO AMARAL DE OLI-VEIRA. Nasci no dia 21 de agosto

de 1948 em São Paulo, na capital, onde fuicriada. Sou a terceira filha de Joaquim Gordi-nho do Amaral e Maria Helena Passos doAmaral. Tive cinco irmãos. Primeiro moreina Rua Bahia, em Higienópolis, onde haviaum parquinho perto que freqüentei, na Pra-ça Buenos Aires. Depois nos mudamos parauma bela casa que foi construída por Ramosde Azevedo, no bairro Campos Elíseos. Láhavia um grande jardim e um quintal queparecia um pomar, onde brincávamos muito.Lembro-me com saudade das férias que pas-sávamos na “Fazenda Canaã”, de meu bisavô,pai do tio Antonio, em Ribeirão Preto. Lá en-contrávamos os primos, levávamos amigos erevíamos outros que moravam na fazenda

por serem filhos de colonos. Sou publicitáriade formação e artista plástica. Hoje me orgu-lho de ser educadora.

Com meus 9 anos de idade eu já ouvia falarda Fundação, em casa. Lembro-me das coisasque ouvia aos 13, 14 anos, quando íamos àAvenida Paulista, na casa dos pais da tia Anto-nieta, onde ela e tio Antonio moravam. Nessasvisitas, geralmente a Fundação era o assuntodas conversas, o que agradava muito a tia An-tonieta. Ela era uma tia presente na família,mas, nesse período, ficava mais dentro de ca-sa, cuidando do marido. Depois, meu pai fi-cou doente e, então, ela se aproximou muitode nós, indo freqüentemente à nossa casa.

A Fundação só passou a trabalhar direta-mente com as crianças depois da criação daCidade dos Meninos, em 1973, e da inaugura-ção da creche, em 1981. Tia Antonieta queria

...minha rotina é assim: 24 horas de Fundação! (...) É umtrabalho que não dá para separar da vida. É o meu cotidiano.

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fazer alguma coisa pelas crianças menores –tia Isabel, esposa de tio Vail, estava com elanesse pensamento, pois também gostava mui-to dos pequenos – e homenagear d. Almerin-da, sua mãe. Até o começo dos anos 1970 elaajudava financeiramente outras instituições,com um caráter mais assistencialista. Na festade inauguração da Cidade dos Meninos esti-veram presentes algumas autoridades, entreelas o ministro da Educação Jarbas Passari-nho. Foi uma festa muito bonita.

Na primeira fase da Fundação, eu estavamuito ligada aos Conselheiros Fundadoresporque convivia com eles. Leônidas Lopes deOliveira era meu padrinho e tio, casado comtia Lila (Leonidia Amaral Lopes de Oliveira),única irmã de meu pai, que mais tarde se tor-naria conselheira também; dr. Eloy, por ser paida minha tia Antonieta; Mário Cintra Gordi-nho, meu tio-avô, irmão de tio Antonio; JorgeQueiroz de Moraes, casado com tia Aracy, ir-mã do tio Antonio, pediatra muito ligado aosmeus pais e que cuidou de mim quando crian-ça; Antonio Gordinho Filho, meu bisavô; Eg-berto Lacerda Teixeira, marido de d. Eunice;tio Vail, irmão de tia Antonieta. Todas essaspessoas eram muito queridas, faziam parte domeu universo da infância e estavam sempredentro da minha casa.

O meu primeiro momento na Fundação foiquando tia Antonieta estava querendo formarum curso profissionalizante. Eu já era moci-nha e comecei a acompanhá-la em suas pes-quisas. Nessa ocasião visitamos algumas insti-tuições que possuíam esses cursos, como aCasa do Pequeno Trabalhador, a Casa DonMacario, em São Paulo. Recordo-me com ale-

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Maria Thereza Passos Gordinho Amaral de Oliveira

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gria quando ela me pediu para fazer o primei-ro “logo” da Fundação. Eu fiz e ela o achou lin-do! Foi o primeiro que criei. Ela até contavaque o padre dirigente da Cidade dos Meninos,na época, queria levá-lo para concorrer emum concurso público. Esse “logo” era amareloe verde porque tia Antonieta queria as coresda bandeira brasileira. Depois, quando modi-ficaram as camisetas para azul, ele ficou azul-marinho. Hoje, o logotipo da Fundação é umacriação da minha filha Mariana. Tia Antonie-ta tinha a Fundação como se fosse sua casa eas crianças, seus filhos. Ela queria sempre daro melhor para elas.

Em 1999, fui convidada para ser conselhei-ra e fui também madrinha da turma do cursoprofissionalizante. D. Eunice e eu começamosa fazer várias visitas à Cidade dos Meninos.Nessas visitas, percebemos a necessidade de sefazer algumas mudanças. Entrei em contatocom a Terezinha Fran, uma brilhante educa-dora, e ela e sua equipe elaboraram um diag-nóstico e começamos a fazer as transfor-mações, profissionalizando e dando ênfase àeducação. Desde então, minha rotina é assim:24 horas de Fundação! Como hoje meu mari-do é presidente e eu sou vice-presidente, nóspraticamente só conversamos sobre a Funda-ção. É um trabalho que não dá para separar davida. É o meu cotidiano.

Mais tarde, foram criadas outras unidades.No começo, cada uma delas tinha o seu fun-cionamento independente, não havia uma li-nha pedagógica condutora comum. Foi nessemomento que procuramos a dra. Clélia La-gazzi Russo Pastorello, educadora de grandeprestígio, para ser nossa supervisora pedagó-

gica, começando, assim, um trabalho educa-cional efetivo dentro da Fundação.

Nesses quase dez anos, as principais trans-formações ocorridas foram o fim do interna-to, em 2001; a entrada das meninas na Cidadedos Meninos, em 2002; e a criação dos núcleoscomunitários em Jundiaí e Araçariguama. Ofim do internato teve seu significado, porqueinternato é uma coisa muito complicada, acriança fica em uma redoma, praticamenteperde o contato com sua família. Há ainda aconotação de reformatório e não é conside-rada uma boa solução pela pedagogia atual.Eu acredito que o importante seja que essascrianças e jovens tenham uma boa formação,possam manter o contato familiar, e com issolevar suas experiências adquiridas para dentrode seus lares.

A Talita Kum e suas meninas foram “ado-tadas” em 1999 pelo tio Vail, que era, naépoca, presidente da Fundação. Apesar de tiaAntonieta e tio Antonio terem escolhido tra-balhar com meninos, devido à história do fil-me Boys Town, eu pensava: “Por que não aten-der as meninas? Elas não têm direito? Elasserão as futuras mães!”. Acho que tio Vailcompartilhava deste pensamento. Por muitasvezes estive na Talita Kum e houve um mo-mento em que quase encerramos o projeto.Eu pensei: “Ah, não! Tem que ter algum senti-do nisso aqui”. A situação foi revertida e oprojeto da Talita Kum Oficinas Educacionaiscontinuou. As meninas migraram para a Ci-dade dos Meninos – que passou a ser denomi-nada Cidade dos Meninos e Meninas – e fo-ram as primeiras alunas da Escola AntonioCintra Gordinho.

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No Jardim Novo Horizonte, bairro de baixarenda que se formou ao longo dos trilhos detrem de uma linha desativada da Sorocabana,vizinho à Cidade dos Meninos e Meninas, te-mos um programa de reforço escolar atenden-do as crianças e oferecendo também a suasmães cursos de costura e moda, artesanato eoutros. Já temos um projeto de ampliação eprecisamos de parceiros e de colaboração. Ocoração desse novo núcleo será uma creche-es-cola de educação infantil. Continuaremos comtodas as outras atividades extracurricularesque já oferecemos, mas com uma participaçãobem mais abrangente. Acredito que daqui auns cinco anos, a Fundação terá triplicado oseu atendimento. Acredito mesmo.

O Cetec nasceu em março de 2002, quandoda comemoração dos 45 anos da Fundação,com a presença da sra. Maria Lúcia Alckmin,presidente do Fundo Social de Solidariedadedo Governo do Estado de São Paulo, e demaisautoridades, com a preocupação da inserçãodos nossos meninos no mercado de trabalho,fechando assim o ciclo de sua formação. Oscursos são montados de acordo com as possi-bilidades oferecidas pelo mercado. Hoje esta-mos formatando o curso médio profissionali-zante para ser implementado em 2010.

A fachada da casa-sede da Fazenda São Jo-sé foi restaurada através do projeto de Edifica-ção e Restauro em fevereiro de 2004, forman-do 25 alunos de Araçariguama nessa primeiraturma. O mais novo trabalho da Fundaçãoiniciou-se em 2006, de uma parceria com a Se-cretaria Municipal com capacitação para pro-fessoras do Ensino Infantil. A partir daí, foicriada uma Ludoteca, que atende as crianças

encaminhadas por essas professoras, e é ofere-cido o projeto Agulha & Linha às mães dascrianças.

Passamos a desenvolver atividades na Fa-zenda Ermida com o Projeto Oficina de Artese Ofícios – Preservação e Restauração de BensHistóricos, que deu origem ao primeiro cursode Edificação e Restauro da Fundação e for-mou 40 jovens restauradores na primeira tur-ma. Atualmente, estamos empenhados noprojeto de implantação do Memorial da Fa-zenda Ermida, um projeto já aprovado pelaLei Rouanet, que contempla pesquisa, restau-ro da Fazenda, publicação e exposição, viabili-zando à comunidade local e regional, pormeio de visita qualificada, o acesso a um bemhistórico tão significativo. Nesse local, temosnosso Centro Cultural Ermida, que foi inau-gurado em 23/10/2006.

Com o crescimento das unidades, nós co-meçamos a trabalhar a “identidade” da Fun-dação Antonio-Antonieta Cintra Gordinho:elaboramos um folder, fizemos um trabalhode conscientização. Foi um trabalho muitogrande, e hoje temos uma equipe coesa comobjetivo comum.

Quando assumimos o trabalho, com oConselho novo, a Fundação começou a deixarde ser uma entidade assistencialista fechada epassou a ter uma atuação contemporânea deterceiro setor. A presença da tia Antonietasempre foi e é muito forte! E isso é ótimo, elaé a alma da Fundação. A estrutura e o alicerce,deixados por tia Antonieta, nos permitiramcontinuar esse belo trabalho, seguindo seuspassos com amor e dedicação. Como eu disse,convivi com ela, éramos amigas e comadres –

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batizou o meu filho Thiago –, tínhamos afini-dade, saíamos juntas, trocávamos idéias. Elaera uma pessoa muito inteligente, contempo-rânea apesar da idade que tinha, era uma pes-soa extremamente boa e generosa e, por essarazão, seu projeto sobreviveu.

Eu tenho ouvido relatos de ex-alunos, vistofamílias que se transformaram. As pessoas quefreqüentaram a Fundação e que nos visitamestão bem, formaram suas famílias, e isso éuma resposta muito positiva. Eu percebo umamudança de atitude nas crianças, nas pessoas.Quando elas saem da Fundação, saem comformação não só educacional. Com todas asdificuldades, às vezes alguns não conseguemalcançar um nível de escolaridade tão grande,mas com formação, todos saem.

Essa é a Fundação, uma parte pequena desua história e das pessoas que fizeram partedela. Sempre penso na importância do dr. Eg-berto, desde o começo, por suas orientações eidéias. Ele foi presidente, e depois se afastoupor problemas de saúde, entrando o Ismar emseu lugar, uma pessoa extremamente forte queconseguiu segurar todo o patrimônio da enti-dade com uma bela administração. Meu tioVail, uma pessoa agradabilíssima que tambémse dedicou à causa até o final da vida e deixouum legado representativo para a Fundação. Senão tivéssemos essas pessoas presentes, esseConselho, hoje a instituição não existiria e eunão poderia estar contando essa história.

Nós pensamos em preparar outros conse-lheiros e passar tudo que construímos e re-construímos juntos, pois ninguém é eterno.Eu acredito que a Fundação faz sentido quan-do ajuda as famílias e elas se colocam melhor

na sociedade. Aí, sim, nosso papel está cum-prido. É importantíssimo registrar a históriada Fundação Antonio-Antonieta Cintra Gor-dinho porque essa instituição tem um traba-lho de mais de 50 anos que serve como exem-plo a ser seguido por outras pessoas quequeiram trabalhar dessa forma. Estamos mos-trando a nossa experiência e daí vem a impor-tância de se estabelecer parcerias, que vão co-laborar com o trabalho e fiscalizar. É precisoque haja essa sinergia.

Participar da Fundação é maravilhoso. Di-go para todo mundo que foi a minha melhorherança. Eu me sinto orgulhosa do trabalhoque faço: faço-o com muito amor.

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asci no dia 15 de setembro de 1939,em Pompéia, interior de São Paulo.Sou TOSHIKO IKEDA IKUHARA, filha

de imigrantes japoneses. Meu pai, Hisao Ikedae minha mãe, Tsuruyo Ikeda, chegaram aoBrasil em 1928. Eles amavam essa terra. Aquitiveram sete filhos, trabalharam, conviveram emorreram. Passei toda a minha infância e ju-ventude em Andradina. Sempre gostei muitode estudar, lia muito gibis, revistas, livros. Foio melhor tempo, os folguedos, os amigos...

Naquela época, a maioria das mulheres fa-zia o curso Normal, porque já garantia umaprofissão. Foi por esse motivo que ingressei naárea da Educação. Eu me formei em 1958 emPedagogia, em Mogi das Cruzes, e logo em se-guida fui lecionar em uma fazenda, em umaescola isolada. Escolas isoladas são aquelas delugares onde não existe estrutura para funcio-

nar uma escola completa. Eram salas criadaspara atender filhos de agricultores, pessoas ca-rentes e alfabetizar adultos. Geralmente, fun-cionava somente uma sala de aula, na qual seatendiam crianças de várias séries ao mesmotempo.

Permaneci em Andradina até 1971. Meumarido é técnico em contabilidade. Trabalha-va com meu tio e foi transferido com a indús-tria, para Jundiaí. Felizmente, fui aprovada emum concurso para direção escolar e assumi noGinásio Estadual de Louveira, uma pequenacidade próxima a Jundiaí. Foi uma maravilha!De início, eu não queria me mudar. O bairroonde moro, em Jundiaí, era mato! Hoje, estátudo completamente mudado.

A escola para a qual me removi, em Jun-diaí, foi a Escola Estadual de Primeiro GrauAna Rita Alves Ludke, vinculada à escola da

É muito gratificante saber que existem pessoas que percebemque é pela educação que se constrói um país.

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Cidade dos Meninos, classificada como umaescola isolada e com quatro salas de aula. Assalas funcionavam no prédio antigo – duas noperíodo da manhã e duas no período da tar-de. Havia da 1ª à 4ª série, uma média de 25,30 alunos.

A Cidade dos Meninos, mesmo sendo esco-la isolada, não nos dava preocupação. Era di-rigida por padres salesianos, um deles o padreChico, que são educadores por excelência.Andavam praticamente sozinhos e apenas aescrituração ficava na minha secretaria. Osprofessores tinham assistência dos nossos su-pervisores, quando necessária. Os padreseram muito dedicados, os problemas de indis-ciplina eram resolvidos por eles. Portanto, nãohavia necessidade da nossa direção estar lá.

Pela escrituração percebemos que, no iní-cio, na escola da Cidade dos Meninos haviamuita repetência, por ter poucos recursos.Além disso, as crianças eram muito carentes,com problemas familiares e aproveitamentopequeno. Com o tempo, o andamento da es-cola foi melhorando, os salesianos se preo-cupavam e os professores também procura-vam sanar essa parte, melhorar, minorar osproblemas.

Nós conhecemos dois dos padres que vi-nham à escola para saber o que teria que serfeito durante o ano e trazer a papelada. Esta-vam sempre muito interessados no andamen-to da escola, eram muito centrados, calmos eótimas pessoas para orientar aquelas criançastão vivas, traquinas e, até, problemáticas.

Naquele tempo, a escola da Cidade dos Me-ninos era muito disputada. No começo, esco-lhiam os alunos lá de perto. Com o tempo a

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Toshiko Ikeda Ikuhara

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procura aumentou muito, os pais tinhammuito interesse. Realmente havia uma preo-cupação não só pelo ensino mas pela forma-ção das crianças.

A escola da Cidade dos Meninos permane-ceu com a gente de 1976 a 1980. Interessanteque fui procurar a escrituração e não conseguiencontrar. A escola Ana Rita Ludke passou pa-ra o município, e toda a documentação foitransferida para a Escola Estadual de PrimeiroGrau Diógenes Duarte Paes.

Naquela época, a denominação administra-tiva das salas de aula da Cidade dos Meninosera: Escola Estadual de Primeiro Grau Isoladade Emergência da Cidade dos Meninos e Es-cola Estadual de Primeiro Grau Isolada da Fa-zenda Grande, que é o nome da fazenda, ondehavia 3ª e 4ª séries.

Há um tempo visitei uma das unidades daFundação. Fiquei encantada com o trabalho: aoficina, o trabalho dos alunos, a biblioteca, assalas de leitura, as salas de arte, os professorescom livros, discutindo com os alunos. Serra-lheria, marcenaria... Que coisa mais linda! Osalunos montam maquetes... As exposições, osazulejos trabalhados retratando o que a crian-ça leva na sua alma, no seu coração. Muitobom! Estão formando profissionais. Estãoproporcionando uma riqueza muito grande àcriança que está lá. Vi a oficina elétrica, tam-bém. Maravilhosa!

Outro trabalho que me chamou a atençãofoi a reciclagem de papel. Vi os alunos traba-lhando, tirando das tinas d’água. Que coisalinda! Estavam produzindo papel para umaempresa que havia encomendado. Quando osalunos saírem de lá, poderão trabalhar nesse

ramo, perfeitamente. A Fundação está for-mando técnicos, pessoas para terem um tra-balho, uma esperança de vida...

Eu gostaria muito de ter conhecido d. An-tonieta. Só a vi uma vez, não cheguei a conver-sar com ela. Sei que era uma pessoa muitodesprendida, que ajudava muito a escola, umapessoa bondosa e preocupada com a forma-ção, com a educação da criança. Falo em des-prendimento, porque ela investiu toda a suaherança em prol de pessoas – crianças – queela nem conhecia. Só uma pessoa desprendi-da, muito caridosa, faria isso. Eu me lembroque, em algumas ocasiões, ela cedeu verbaspara a Cidade dos Meninos. Quando a escolaprecisava de alguma coisa, ela enviava a verba.Então, eram atitudes só positivas.

Eu me senti orgulhosa de ver que aquela es-cola pequena se transformou nessa instituiçãomaravilhosa... É muito gratificante saber queexistem pessoas que percebem que é pela edu-cação que se constrói um país. Se houver umaeducação baseada em princípios, em forma-ção, o futuro estará garantido.

Atualmente, no geral, não há interesse emque as pessoas leiam, saibam mais, se profis-sionalizem. O aluno passa pela escola, obtémo diploma e, quando vai para o mercado detrabalho, tem que aprender tudo de novo, sen-do que já deveria ter um conhecimento, umabagagem para enfrentar o mercado. Então,quando alguém lembra de se preocupar comisto... Ôba! Vamos bater palmas.

A parceria dessas instituições com órgãospúblicos também é muito importante, en-quanto há liberdade para os professores traba-lharem e a entidade oferece subsídios. O obje-

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tivo tem que ser o mesmo: a formação dacriança. Uma fornecendo os recursos mate-riais e a outra, a parte pedagógica. Tem que serassim, parceria para melhorar o nosso ensino,para que ele não caia no que está acontecendoagora. Alunos que, muitas vezes, completam ocurso primário sem saber ler, não estão alfabe-tizados! Não lêem um livro!

Estou otimista em relação ao futuro daFundação Antonio-Antonieta Cintra Gordi-nho. Acredito nas pessoas que estão à frentedela. Conheço duas pessoas do Conselho, seique estão trabalhando para que isso permane-ça. Se o pensamento continuar, a obra conti-nua. Essa Diretoria está muito empenhada,contando, logicamente, com as pessoas ao re-dor. Eu acredito! A perspectiva é de sucessopor muito tempo.

É muito gostoso relembrar e resgatar algu-mas coisas do tempo de escola, e ver que aspessoas continuam. O projeto da Fundaçãome deixa muito feliz, por ser a continuaçãodaquela escola isolada da Cidade dos Meni-nos. E hoje, qualquer pessoa que for lá vai seorgulhar de ver aquilo tudo.

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u me chamo ANTONIO JOSÉ DA SILVAFILHO e nasci na cidade de São Pau-lo em 21 de junho de 1966. Meus

pais são Antonio José da Silva e Deolinda deOliveira Silva e tenho uma irmã chamadaMaria Filomena Aparecida da Silva. Minhamãe é do interior de São Paulo, de Gália, emeu pai é um sergipano de Carira. Estudei atéo ensino médio.

Eu estudava na Cidade dos Meninos. Alembrança mais antiga que tenho da Funda-ção é de quando cheguei. Era tudo novo paramim. O campo de futebol e a piscina me im-pressionaram. Foi dia 1° de setembro de 1976e cheguei em um dia de aula. Meus pais medisseram que seria uma visita para conhecero lugar.

Eu morava em São Paulo, na Vila Mariana,e meu pai era motorista do dr. Passarelli. To-

dos os mais antigos sabem quem era o dr. Pas-sarelli. Ele falava muito dessa Cidade dos Me-ninos. Meu pai comentou que eu ficava o diainteiro em casa, só estudava e que ele tinhamedo de eu seguir um caminho errado. Porintermédio desse senhor, meu pai conseguiume colocar lá. Aquela suposta visita foi já aminha entrada no colégio. Foi uma surpresa irestudar na Cidade dos Meninos. Meus paissempre trabalharam, minha irmã tambémtrabalhava. Eles acharam melhor me colocarlá para eu ter uma ajuda na minha educação.

No início fiquei com medo. Ficar longe demeu pai, longe de minha mãe... Eu me lem-bro que foram duas semanas de muito cho-rorô. Cheguei lá em uma quinta-feira, no fi-nal de semana seguinte meus pais nãocompareceram e eu chorava muito. Fui meacostumando com o colégio e no outro final

Aprendi muito na Cidade dos Meninos. Esses valores que forampassados para mim, como organização, respeito ao próximo eamor, eu considero como sendo tudo na minha vida.

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de semana, quando a gente estava fazendo osexercícios nas quadras externas, surgiu mi-nha irmã com minha mãe, sem o meu pai,para me levar para casa passar o final de se-mana. Isso foi algo muito marcante. Para re-tornar também foi um chororô, mas acabeivoltando no domingo.

Não tinha ninguém “passando a mão na ca-beça”. Existiam as pessoas que explicavam:“Olha, você está longe de seu pai, de sua mãe,mas tem novos amigos, você tem os assistentespara lhe darem apoio, o padre. Eu tenho certe-za que você vai gostar daqui e vai se adaptar aosistema do colégio”. E não tinha meninas. Asúnicas pessoas do sexo feminino eram as ir-mãs, pessoas muito queridas que preparavamo nosso almoço, estavam sempre fazendo alimpeza com muito gosto, cozinhando, lavan-do nossas roupas. Elas eram, depois da donaAntonieta e das nossas próprias mães, as nos-sas outras mães que cuidavam da gente comtodo carinho.

Na Cidade dos Meninos havia o padre Sar-tori mais quatro assistentes, o professor deeducação física, que era o sr. Marcos, e as frei-ras. Mais ninguém. E o Astor, que era o nossocachorro pastor alemão, grande amigo, tam-bém. Ele participava de todas as nossas brin-cadeiras, era o nosso guarda-costas ali, poisnão existia segurança, não existia nada; era eleque tomava conta da gente. Para onde íamos,o Astor ia junto.

Naquela época, a gente saía no sábado de-pois das 13 horas e tinha que retornar no do-mingo, antes das 17 horas, e o padre exigia quevocê trouxesse o folheto da missa do domin-go, porque ele ia perguntar sobre o sermão! Se

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Antonio José da Silva Filho

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você não soubesse responder, recebia um cas-tigo, mas logo tornou-se um prazer ir para aCidade dos Meninos. Tinha época que eu iapara casa passar o final de semana e não via ahora de retornar para Jundiaí. Por quê? Por-que lá nós tínhamos nossas programações,nossas atividades, nossas obrigações que nãoexistiam em casa.

O colégio de lá era da 1ª à 4ª série. Algunsgarotos mais velhos eram enviados para Cam-pinas, também num internato, e outros iampara o colégio estadual na Fazenda Ermida,para onde também fui. Duas peruas nos leva-vam de manhã e iam nos buscar ao meio-dia.As atividades daquela época eram mais oumenos assim: no horário da manhã era o estu-do; voltávamos já para o almoço; depois tí-nhamos meia hora de descanso; aí subíamospara trocar de roupa e havia duas horas de es-tudo em local de extremo silêncio, onde os as-sistentes ficavam de olho em você. Não podiadeixar cair uma caneta, um lápis, porque eramotivo de chamarem a sua atenção; depois tí-nhamos campeonato de futebol de campo,usávamos a piscina e havia época que eram asolimpíadas; após as 5 horas subíamos para odormitório para tomar banho e nos preparar-mos para a janta; depois do jantar, tínhamosum momento de lazer, jogava-se pingue-pon-gue, pebolim, futebol, via-se televisão... Apósisso, mais um tempinho de estudo e subíamospara dormir, por volta das 22 horas.

Tínhamos uma cama e um armário e todosdeviam deixá-los impecáveis. O assistente pas-sava olhando cama por cama, abria os armá-rios para ver se não estavam bagunçados. Tu-do isso valia uma nota que significava a sua

saída para casa no final de semana ou não.Mas no sábado de manhã existia, ainda, umaúltima tarefa a fazer: o assistente escolhia al-gumas crianças e fazia algumas perguntas arespeito do catecismo. Se você respondesse aessas perguntas corretamente, poderia ir paracasa. Se não respondesse, não iria e isso acon-teceu comigo: em um final de semana meu paifoi me buscar e não pude sair porque não ha-via respondido corretamente à pergunta.

Cerca de 15 dos 50 alunos ficavam na Ci-dade dos Meninos nos finais de semana porindisciplina ou pelo motivo de moraremmuito longe. Alguns deles moravam fora doEstado de São Paulo, então não tinham con-dições de ir e voltar no mesmo final de sema-na, pois todos éramos de famílias humildes.Os que ficavam tinham atividades livres. Seficasse, você jogava bola, ia para a piscina atarde inteira. A única obrigação era com oshorários das refeições e com a missa no do-mingo de manhã. As missas aconteciam todosos dias, de domingo a domingo, às 7 horas damanhã, antes do café.

Cada interno tinha um número. Eu, porexemplo, pelo início do meu nome, Antonio,era o número um. Então, todos os anos antesde eu ir para o colégio, minha mãe costurava onúmero na etiqueta na calça, na cueca, na ca-miseta... Inclusive no tênis e no chinelo erapintado o número do aluno. No sábado de ma-nhã, todos os alunos em fila levavam os sacoscom suas roupas para serem lavadas e cada umpegava o que havia deixado na semana passa-da. Só que você não pegava em saco: erammontes de roupa que as irmãs passavam, entãovocê colocava as mãos por baixo e voltava pa-

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ra o dormitório com as roupas cheirosinhas,todas dobradinhas e em excelente estado.

Além das atividades de rotina, havia umanoite, durante a semana, em que tínhamos um“acampamento”. Quando você cumpria suasobrigações e suas notas eram satisfatórias, eradestacado para fazer parte do acampamento.Em torno de 15, 20 crianças iam acampar no“casarão”, que ficava a cerca de dois ou trêsquilômetros da Cidade dos Meninos. Era umacasa antiga onde passávamos a noite com umassistente e com o padre Sartori, que faziauma sopa de tomate que todos gostavam e on-de eram feitas muitas brincadeiras.

Aprendi muito na Cidade dos Meninos. Es-ses valores que foram passados para mim, co-mo organização, respeito ao próximo e amor,eu considero como sendo tudo na minha vida.Antes de eu ir para o colégio, eu era uma cri-ança que bagunçava muito e, após meu retor-no, me tornei uma criança mais disciplinada,com amor ao próximo. Isso foi muito impor-tante. Naquela época, não se podia repetir deano; se isso acontecesse, obrigatoriamente ti-nha que sair, e esse foi o motivo da minha sa-ída. Em 1978, quando fiz a 5ª série no colégioErmida, eu repeti de ano, então fui convidadoa me retirar. Mas logo dei seqüência à minhavida, aplicando o que eu tinha aprendido ládentro.

De minha estada lá, o fato mais marcantefoi relacionado ao padre Sartori. De sexta-fei-ra à noite, quando ele dizia a nota de cada ga-roto, a gente sentava na sala, naquele tapetãogrande e ele ia falando como cada um se com-portou na semana. Ele falava sobre o colégio esentia que ali algumas crianças não davam

muita bola ao que estava sendo dito. Um dia,ele se levantou, se encostou em uma daquelascolunas e disse para nós: “Um dia vocês vãovoltar aqui, vão olhar para essas colunas e vãochorar de saudades dessa época. Alguns nãoestão sabendo aproveitar, mas vão chorar nes-sas colunas”. Dito e feito. No meu primeiro re-torno ao colégio, me lembrei daquilo que opadre falou e chorei perante aquela coluna.Sempre quando volto, choro perante aquelacoluna. Principalmente agora, que tem umafoto onde eu apareço.

Eu digo até hoje para a minha esposa: “Oque eu tenho hoje, o que eu conquistei hoje, aminha vida tanto profissional como senti-mental, eu devo à Cidade dos Meninos”. Issofoi primordial para a minha formação, para omeu conhecimento, para o meu convívio comas pessoas no dia-a-dia. Eu saí de lá em 1978 e,se eu falar que não me lembro do colégio pelomenos um dia sim, um dia não, estarei men-tindo. Eu passo tudo o que aprendi para osmeus filhos, procuro mostrar para eles o ca-minho correto, como era a nossa criação da-quela época e como eles têm que seguir hoje,mas com seus devidos limites, pois não possoser tão rígido como se era naquele tempo. Àsvezes, se você se torna uma pessoa muito rígi-da, afasta seus filhos, tanto é que tenho a mi-nha esposa que fala para mim: “Não seja comeles como era lá no colégio”. Então eu me con-trolo, mas, como tudo aquilo serviu paramim, tenho certeza que vai servir para elestambém.

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eu nome é IRMÃ TECLA. Na verda-de, de batismo é Iolanda, mas naminha consagração foi mudado o

nome para Tecla, de Santa Tereza. Eu nasci naItália, no dia 30 de setembro de 1936, no Esta-do do Lazio, na Província de Frosinone, pertode Roma.

Minha família é muito boa, modesta, comformação religiosa. Eu tinha 16 anos quandodescobri minha vocação, esse grande dom queDeus me deu; até antes, talvez, com uns 14anos. Meus pais me acompanharam a umconvento onde pude receber minha formaçãopara a vivência da vida consagrada. Somos se-te filhos, um irmão – muito carinhoso – e seisirmãs, uma delas morando na Venezuela, euaqui no Brasil e as outras na Itália. Não tive-mos uma educação rígida, mas uma educaçãocom amor, muito afeto. Meu pai trabalhava

com artesanato e minha mãe ficava em casa.Antes de vir ao Brasil, trabalhei na Sicília,

na cidade de Salaparuta. Fiquei cinco anos ali– uma experiência muito boa – e procurei aju-dar as pessoas, trabalhar com as crianças, visi-tar os doentes e dar mais atenção sempre aosmais carentes. Cheguei ao Brasil em 1979, nodia 23 de outubro. Éramos quatro irmãs reli-giosas e tínhamos um padre que nos acompa-nhava; pedimos a ele para trabalhar aqui e fo-mos bem acolhidas. Eu estava muitoentusiasmada para trabalhar com as pessoascarentes do Brasil. Vi muitas diferenças entreas crianças da Itália e as daqui porque comeceia trabalhar em uma favela, onde tinha muitapobreza...

No final de 1980, tive contato com d. Anto-nieta, um ano depois de ter chegado. Ela tinhasempre um sorriso nos lábios, sempre gentil

O que faz esse trabalho ir em frente é o sentimento deigualdade, o desejo de ver um futuro melhor, onde todos oshomens e mulheres vivam felizes.

M

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comigo, nunca a vi de mau humor. Posso falarque era amiga. Minha amiga. Quando cons-truiu a creche, que hoje se chama Escola deEducação Infantil, ela procurou as irmãs paratrabalhar. O padre que trabalhava na Cidadedos Meninos falou de nós, então entramos emcontato com ela.

Sou fundadora da creche. Lembro do meuprimeiro dia de trabalho. As crianças chegan-do, era um dia muito gostoso, depois do Car-naval... Acho que era 4 de fevereiro de 1981.Algumas crianças brincavam, outras chora-vam... No começo, elas eram um pouco enver-gonhadas, mas eram bonitas e eu gostava mui-to delas. Iniciamos a creche com 30 crianças edepois foi aumentando, aumentando até 80,depois 100 e 120 crianças, quando paramos. Ed. Antonieta vinha sempre nos visitar, semprefoi muito presente. Naquela época, elas eramselecionadas assim: nós íamos às famílias,sempre se via quem tinha trabalho, como eraa casa, se era alugada ou própria. E a idade erade 6 meses a 6 anos – atualmente continuasendo assim.

Eu fazia um pouco de tudo. O meu dia erade homologar mais harmonia. Se surgiam di-ficuldades, eu procurava ajudar. Normalmen-te, eu tinha encontro com as mães, muitas vi-nham... Se tinham problemas, elas vinhampara conversar comigo. E eu podia, assim, daruma palavrinha. E esse foi o trabalho que fize-mos... É a semente... É a semente que foi plan-tada.

Quando encontro ex-alunos, fico emocio-nada. Outro dia, encontrei um menino, de 4anos, com a mãe. Ele desceu do colo dela ecorreu... correu e veio me abraçar, chorando.

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Irmã Tecla

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Eu perguntei: “Por que chora?”. E ele: “Porquea senhora não vem mais na nossa escola!”. Fa-lei: “Eu vou voltar, vou lá para ver vocês”. Sin-to-me emocionada! Hoje eu encontro paisque freqüentaram a creche, os primeiros... Eunão os conheço mais, mas eles me chamam:“Irmã Tecla!”, “Irmã Tecla!”. Ou eu vou à igre-ja e falam assim: “A senhora me conhece?”. Eupergunto o nome porque estão mudados,crescidos.

Eu fazia visitas às famílias e ajudava, comofala Jesus no Evangelho, segundo a necessida-de! Era uma relação boa porque os pais tam-bém correspondiam. Nas datas especiais, gos-távamos de fazer festas, apresentações, sempreas crianças declamavam poesias, cantos. NoDia das Mães, elas eram convidadas, recebiampresentes feitos pelas crianças. Era muito bo-nito! No começo, nós não íamos fazer festa doDia dos Pais, porque muitos estavam presos,separados. Mas, depois, decidimos fazer. Ago-ra, estão fazendo o dia da família.

Eu trabalhava com todas as crianças, de to-das as idades. Trabalhei um período com asde 5 anos, mas depois não pude mais, por fal-ta de tempo. Muitos ficavam apegados, nãoqueriam ir embora, choravam, choravam pa-ra a professora, choravam para a mãe, chora-vam para todos. E todos estes anos lá têm umsignificado muito, muito grande para mim,porque pude ajudar aquelas crianças, pudeajudar as mais necessitadas. Lembro que ha-via um menino que, por causa do pai estarpreso, era terrível, terrível, muito agitado.Mas eu sabia cuidar dele, tinha que cuidarcom jeito. Eu dava muito amor, muito cari-nho, gostava dele.

Lembro-me de tantas histórias... Mas umahistória que ficou, mesmo, foi a de um outromenino, em especial. Eu estava dando forma-ção para as crianças, falando um pouco do Diados Pais. Falei para os meninos: “Os pais sãocomo Deus. Deus é nosso pai que está no céu”.E ele falou assim: “Mas meu pai é ruim. Meupai é ruim!” Para aquele menino, não podiaser assim, eu falar que Deus é como um pai.Eu perguntei: “Por quê?”. E ele: “Porque ele ba-te, bate na minha mãe...”.

Havia outro menino, que era especial, nãocomia... E, devagarzinho, fui cuidando e elechegou a comer. Fui à Itália e, quando voltei,me contaram que ele tinha ficado doente,com uma febre que não passava. Levaram omenino ao médico, e este disse assim: “Algu-ma coisa aconteceu com essa criança! Tem al-guma pessoa que está longe dele, de quem elesente saudades?”. Ele mesmo respondeu: “Airmã Tecla”.

Em maio de 2007, eu saí da escola. Sintofalta, mas estou aposentada. Trabalhei na cre-che, na escola, por amor, e não interessava sefalavam bem ou se falavam mal. Eu sempre re-cebi muito carinho da Fundação e acreditoque ela vai continuar toda a sua obra. O traba-lho do futuro será cultivar o que foi plantado,porque não é só a escola, os primeiros educa-dores são os pais. Quando fazia reunião comos pais, eu sempre dizia: “Os primeiros educa-dores são vocês! Nós somos apenas o apoio”.

O que faz esse trabalho ir em frente é o sen-timento de igualdade, o desejo de ver um fu-turo melhor, onde todos os homens e mulhe-res vivam felizes.

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ou THEREZINHA PAULA DOMINGUEZ,nasci em 27 de outubro de 1929 emSão Francisco de Sales, Minas Gerais,

no Triângulo Mineiro. Eu tive 18 irmãos.Quando minha mãe se casou com meu pai, elatinha 14 anos. Ele era viúvo, tinha oito filhos,então minha mãe criou os oito filhos e tevemais dez com meu pai, que morreu em 1940.Vim para o Estado de São Paulo quando mi-nha mãe faleceu, em 1948.

Em Minas Gerais, eu morava numa cidade-zinha de rua de terra, Itapagipe. Meu pai tinhafazenda com muitos empregados, nós fomoscriados com muita fartura. Sempre procureitrabalhar, ser honesta, como meu pai ensina-va... Naquele tempo, a palavra de uma pessoaera um documento assinado. E eu acho que is-so me influencia até hoje.

Quando minha mãe morreu, pedi para

meu tio, Juvenal Carneiro Leal, para ir morarem sua casa, em Santos. Ele veio me buscar e,naquele tempo, como eu não sabia fazer nada,tive que ir trabalhar de doméstica. Depois, mecasei com um espanhol, Anastácio Domin-guez Gavin e fui mudando minha vida. Meumarido tinha outra cabeça, era estrangeiro.Ele falou: “Você não pode viver desse trabalhode doméstica” – meu filho já tinha 8 anos –“Agora você vai estudar, para crescer”.

Assim, entrei para a Santa Casa. Lá, a genteestudava à noite e já pegava aquelas pessoasque vinham do cais, gente de rua, bêbados etudo mais. Então, cuidávamos, dávamos ba-nho... Naquela época, a Santa Casa estava emcrise e o estágio era de graça, não recebíamospelo trabalho enquanto nos formávamos e tí-nhamos que ficar lá três meses para arranjaremprego. Eu continuei estudando porque meu

Nos sábados e domingos em que não íamos para a FazendaErmida, ficávamos lá, no apartamento, e eu não podia sair,porque o sr. Vail dependia muito de mim. O que ele fazia?Chamava meu neto, o Bruno, para ir lá, e o menino passava ofim de semana comigo. Eles iam juntos ao cinema, o Bruno liajornal para ele, iam tomar sorvete e meu neto segurava nobraço dele... (...) Se fosse para voltar tudo de novo, eu voltava.

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marido era zelador de um prédio no Gonzaga(Santos) de gente bacana, de posses, então tí-nhamos mais facilidades na vida. Não éramosricos, mas vivíamos bem, comíamos bem, dá-vamos uma educação boa para nosso filho. Elecresceu, veio para São Paulo, estudou, fez Ad-ministração de Empresas. Ganhou três vezes oprimeiro lugar na empresa, saiu até na revistaVeja. Se estivesse vivo, hoje, estaria muito bem.Ele morreu no auge da carreira em 1985, com32 anos, num assalto... Ia tirar meu neto docarro e o assaltante, um menino de 14 anos,disparou. Sete meses antes disso, meu maridohavia morrido de leucemia.

Meu neto está com 26 anos. Formou-se ad-vogado graças a uma bolsa que o sr. Vail deu aele. Eu sempre ajudei-o, porque a mãe não ti-nha condição de ajudá-lo a estudar. Ela casou-se pela segunda vez e teve outro filho. Aconte-ce que esse menino também não tinhacondições de estudar, mas vai se formar emEngenharia, no ano que vem, pelo Mackenzie,graças à bolsa que a Fundação deu para ele. Eunão tenho como agradecer à Fundação, ao dr.Ismar e à d. Teca. Tudo que tenho hoje veio delá: consegui trabalhar, ter uma casa em MinasGerais e o apartamento. Perdi meu marido,meu filho, mas, fora isso, eu sou uma pessoafeliz: tenho meu neto, minha nora e sua famí-lia italiana, o marido dela, e todos são pessoashonestíssimas! A gente é pobre, mas não temsujeira e é uma coisa que a gente leva por todaa vida.

Aí, fui trabalhar para o sr. Vail. Eu tinhauma prima que era chefe do 3º andar do Hos-pital São Paulo – eu também cheguei a traba-lhar lá – e que tirava radiografia da esposa de-

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Therezinha Paula Dominguez

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le, d. Isabel. Elas conversaram sobre mim, d.Isabel mandou me chamar e fui para sua casa,onde fiquei trabalhando como sua enfermei-ra. Fiquei lá por sete anos, até ela falecer. Sr.Vail morava na Rua Haddock Lobo e d. Anto-nieta, na Alameda Tietê. Então, convidou-opara ir morar com ela, e eu fui junto.

Cuidei de d. Antonieta como enfermeira,também, e trabalhei nos serviços gerais da ca-sa. Ela era muito boa, tinha uma educação fi-níssima, todo mundo fala que era uma santa,e eu repito. Se você fizesse uma coisa de queela não gostava, ela te chamava e dizia: “Sabe,você fez isso, mas, se você fizer desse outro jei-to, eu gosto mais”. Era assim que chamava aatenção dos empregados, e ninguém ficava sa-bendo, só se você falasse. Quando d. Antonie-ta faleceu, o sr. Vail passou a dirigir a casa. Elefalava o que queria comer, o que devíamos fa-zer. Sabia tudo, tudo, como se fosse uma donade casa. Não se esquecia de nada, o que tinhana casa, horário, tudo.

Ele era uma ótima pessoa! Um homemmuito inteligente, sua cabeça era um compu-tador. Você falava um número para ele, ele nãoesquecia; tudo que você perguntava, ele res-pondia na hora. Eu nunca vi um raciocíniodaquele jeito, nunca! Era um bom amigo, bompatrão, conversava, ensinava, falava muitascoisas, queria saber da origem da gente, comoé que eu fui criada, como era meu pai, minhamãe. Ele gostava de saber as histórias das pes-soas e contava a dele, também. Quando meuirmão telefonava para mim – ele está muitobem de vida em Minas Gerais, tem uma fazen-da com muito gado –, o sr. Vail conversavacom ele, acompanhava as coisas...

Eu trabalhei para a família por uns 15 anos,ou mais. Quando o sr. Vail ia para o hospital,ia todo arrumado, não saía na rua sem grava-ta. Ele quem me ensinou a dar nó em gravatas,porque, depois de um tempo, suas mãos já es-tavam trêmulas... Então, eu ajudava-o a se ves-tir, cuidava dele, dormia com ele, no quarto,por recomendação médica – ele tomava remé-dios para dormir e podia levantar-se no meioda noite, meio sonolento. Nossas camas fica-vam perto uma da outra para que eu pudessever os movimentos dele enquanto dormia, jáque estava bem fraquinho. Mas sua cabeçaainda era fantástica! Morreu sabendo o quefalava... Até na hora em que foi para a UTI, sa-bia o que queria... Só dizia: “Therezinha, meleva para casa. Eu quero dormir na minha ca-ma”. Era uma pessoa formidável.

O que mais me marcou na minha convi-vência com eles foi a educação, a consideraçãoque eles tinham pela gente, tanto fazia se eracozinheira, enfermeira, arrumadeira, lavadei-ra, passadeira. Eles eram muito humanos,mesmo o sr. Vail, porque os homens já são di-ferentes no tratamento. Eles presenteavam aspessoas do prédio todinho, davam gorjeta pa-ra todo mundo. Se d. Antonieta desse paraum, dava para todo mundo igualmente, nãodiferenciava ninguém.

Ela tinha muita amizade, uma casa muitofreqüentada. Era uma pessoa muito alegre,muito informada, inteligente, estudada e fez aFundação funcionar, depois que dr. Antoniofaleceu. Não tiveram filhos, nem o sr. Vail nemd. Antonieta... Então, ela sempre falava que osmeninos da Cidade eram seus filhos, seusmuitos filhos. Ela adorava aquela criançada

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toda, tinha até vontade de pegar uma criançapara criar, mas estava com muita idade! Eladava de tudo para aqueles meninos que mora-vam lá. Havia crianças que passavam fome emcasa, não queriam ir embora no fim de sema-na – até choravam –, não queriam ir com ospais que, algumas vezes, eram drogados, bêba-dos, essas coisas todas. Na Cidade dos Meni-nos tinha de tudo, a fartura era “fora de série”.Tinha muito carinho, médico, dentista, psicó-loga, tudo que era necessário.

Depois da morte do sr. Vail, me levaram pa-ra a Cidade dos Meninos. Não senti muita di-ferença em ir trabalhar lá porque eu não fica-va no meio das crianças, só via-as na hora doalmoço. Eu ficava na cozinha, ajudando noserviço. Lá na Cidade, o pessoal era muitobom, gente muito educada. Durante toda mi-nha vida profissional, nunca tive discussões,nada nem ninguém com que ficasse zangada...São todos muito unidos para trabalhar e mui-to competentes, também. O trabalho era óti-mo! Lá tinha horário para entrar, para sair.Todo mundo tinha adoração pela Fundação,todos os funcionários. Nossa! Eles são apaixo-nados por tudo aquilo, e quem não o é? Umacoisa tão linda! Foi muito bonito o que d. An-tonieta fez e sr. Vail conservou.

Eu sinto saudades deles, não existe umapessoa que não tenha saudades da d. Antonie-ta e do sr. Vail. Ele, às vezes, era “machão”, masera muito amigo da gente, falava as coisas, en-sinava. Eu aprendi muito com ele. Muito.Quando estávamos convivendo mais juntos,nos sábados e domingos em que não íamospara a Fazenda Ermida, ficávamos lá, no apar-tamento, e eu não podia sair, porque o sr. Vail

dependia muito de mim. O que ele fazia? Cha-mava meu neto, o Bruno, para ir lá, e o meni-no passava o fim de semana comigo. Eles iamjuntos ao cinema, o Bruno lia jornal para ele,iam tomar sorvete e meu neto segurava nobraço dele... Sr. Vail era um homem “chique”,um “tipão”, eu vejo-o agora, parece que estávivinho ali. Se fosse para voltar tudo de novo,eu voltava.

A mudança na Fundação, depois da mortedo sr. Vail, foi muito boa. Ele era um senhorde idade, fez muito, mas não via e não podiafazer tanto quanto o dr. Ismar está fazendo. AFundação “deslanchou”, e para melhor. Tem-se trabalhado muito, e d. Teca trabalha! Vou tecontar! Pela Fundação ela dá a vida dela, e odr. Ismar também, são pessoas dinâmicas queestão à frente, que vêm tudo; são jovens – eufalo isso porque tenho muito mais idade doque eles – e vão longe, não vão deixar “a pete-ca cair”. Eles têm amor àquilo e d. Antonieta esr. Vail escolheram muito bem seus sucessores.

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u me chamo IRINEU SILVA JÚNIOR,atualmente sou superintendente daFundação Antonio-Antonieta Cintra

Gordinho. Cresci em São Paulo, na região dobairro de Santo Amaro que, no século XIX,chegou a ser um município. Por sempre termorado nesse bairro distante, adquiri duas ca-racterísticas interessantes: o caráter citadino,por morar em uma cidade grande, e o caráterde campo, porque Santo Amaro tinha umacoisa, ainda, de cidade interiorana.

Sempre tive muito apoio dos meus paispara estudar, principalmente da minha mãe.Fiz pré-escola com uma professora particulare todo o resto dos estudos em escola pública.Ingressei na Faculdade de Filosofia, Ciênciase Letras da Fundação Santo André no come-ço da década de 1970. O curso que eu queriafazer era Ciências Sociais na USP, mas não

consegui entrar. Muitos professores dissiden-tes daquela universidade foram afastados, de-vido à ditadura militar, então alguns deles fo-ram dar aulas nessa Fundação. Depois deentrar na faculdade, comecei a lecionar emcursinhos.

Mais tarde, já formado, fui para a Associa-ção Brasileira de Supermercados trabalharcom estatística e pesquisa; lá dentro mesmo,fui me direcionando para Recursos Humanos.Quando saí da Associação, já tinha claro que aminha área era Educação e fui para a Secreta-ria de Educação do governo Montoro. Erameados de 1980, eu já estava na PUC fazendomestrado na área, e conheci pessoas comidéias renovadoras para a Educação Pública.Na Secretaria, iniciamos um projeto para de-senvolver uma escola para meninos de rua ecriamos a Escola Oficina do Parque D. Pedro.

...você tem que estar permanentemente retornando ao passado,para se alimentar para o futuro.

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Conseguimos alguns êxitos, mas a escola nãodurou muito tempo.

O governo seguinte encerrou esse projeto esaí da Secretaria de Educação. Fui trabalhar naFundap, Fundação do Direito Administrativo,criada exatamente para promover a qualidadetécnica da administração pública, formar qua-dros, fazer pesquisas, realizar assessoria e con-sultoria ao governo do Estado de São Paulo eaté de outros países, nos assuntos relacionadosà administração pública. Dentre os vários pro-jetos de que participei, um dos que me im-pressionaram foi o trabalho realizado juntocom a professora Terezinha Fran. Ela reuniuem São Paulo as maiores cabeças da educaçãoem âmbito mundial em um seminário, em1993, no Memorial da América Latina. Cha-mava-se Conferência Internacional Educaçãopara o Futuro. Fui convidado para trabalharna organização desse evento, um evento fan-tástico, com teleconferências para o mundotodo. Era o que existia de melhor em termosde pesquisa na educação, na época. Edgar Mo-rin, Fritjof Capra, e outras pessoas desse nívelparticiparam. Saí da Fundap em 1995 para serdiretor de Recursos Humanos no Hospital dasClínicas de São Paulo, onde fiquei até 1999.

Em 2000, a Terezinha me chamou para tra-balhar, junto a mais seis pessoas, na reformula-ção interna e diagnóstico da Fundação Anto-nio-Antonieta Cintra Gordinho. Nós nosdeslocamos para Jundiaí, conversamos muitosobre como era o funcionamento das unidades.Acho que foram três ou quatro meses de traba-lho, fazendo o levantamento do que a Funda-ção possuía e suas principais linhas da filosofiado trabalho. Quando terminamos o estudo, fi-

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zemos a apresentação ao dr. Ismar, à d. MariaThereza, ao Conselho que, na época, tinha o sr.Vail como presidente. O Conselho e a Diretoriada Fundação propuseram que um dos consul-tores assumisse o papel para levar adiante aproposta do diagnóstico e fui indicado.

De início, fizemos uma pesquisa documen-tal, entrevistas, basicamente, e identificamos oseguinte: não existia o manto institucionalchamado Fundação. Ela existia no papel, masas pessoas se referiam às unidades que traba-lhavam, cada uma, do seu jeito. Outro aspectoque foi identificado é de que a Cidade dos Me-ninos, quando surgiu em 1973, foi pratica-mente concebida pelos padres salesianos. Osdocumentos mostram que eles achavam queaquela obra era uma obra deles, não uma obrade uma entidade que estava convidando-os adesenvolver um projeto, um trabalho conjun-to. Eles assumiam aquilo – que era um proje-to de d. Antonieta – como sendo uma obra re-ligiosa, deles, e davam todas as diretrizes.Talvez por inexperiência, não havia quadros,não tinha gente para tocar o projeto que nãofossem os padres. Ao fim de um período, aFundação rescindiu o contrato e eles saíram,mas já haviam marcado, profundamente, a li-nha de atuação da entidade porque a concep-ção da congregação pressupõe educação for-mal básica associada à formação profissional,isso desde Dom Bosco.

Quando os salesianos saíram da Cidade dosMeninos, deixaram, institucionalmente falan-do, um ex-padre salesiano como diretor, oMauro Scaglia. Ele tocou a unidade durantealguns anos e eu o sucedi. Quando fui contra-tado, o meu papel era assumir as unidades

educacionais em Jundiaí e procurar dar umsentido único para as atividades. Tínhamosbem claro que era preciso fortalecer a visãoeducacional de cunho profissionalizante, rea-vivar isso de uma maneira mais atual.

Uma outra questão era desativar o interna-to, e isso só conseguimos realizar em 2001. Tu-do amparado em uma diretriz do Conselho daFundação, tudo previamente conversado.Com o internato, tínhamos que manter umaequipe de funcionários à noite; tínhamos cri-anças de 7, 8 anos com muitos problemas pa-ra conseguir dormir, medos naturais da idade;era necessário haver uma disciplina rígida... Eestamos falando de 2001, onde a televisão, ainternet, os meios de comunicação eram mui-to mais divulgados, mais presentes na vidadessas crianças do que há 10, 20 anos atrás.Então, eles sentiam falta dessa liberdade e,conseqüentemente, tínhamos problemas dedisciplina interna normais, de alunos queren-do burlar regras.

Quando propusemos o fim do internato,apoiados no Estatuto da Criança e do Adoles-cente, percebemos uma melhora significativano aprendizado das crianças, além da disci-plina deixar de ser um problema, porque ascrianças sabiam que voltariam para casa. Issomudou muito o perfil do aluno, que gostoumais dessa maneira. Não importava se ele mo-rasse em situações de moradia precária, masele estava voltando para a casa dele, para a ca-ma dele ou estava voltando para as pessoascom quem ele gostava de conviver. E isso foium marco importante.

Paralelamente a isso, na creche, a concep-ção precisava ser mudada internamente, de

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creche não no sentido só de cuidar da criançafisicamente, mas de iniciar as primeiras letras,também. Daí surgiu a idéia da creche para cri-anças até 3 anos e, a partir dos 4 anos de ida-de, haveria o início das atividades estimulado-ras da aprendizagem, de tal maneira que aos 6anos a criança já tivesse uma base. Naquelaépoca, era muito difícil convencer as irmãs –que ainda cuidavam da unidade – dessas dis-tinções todas, até porque a concepção delassempre foi uma concepção própria, também.A separação de caminhos acabou acontecendonaturalmente. A Fundação começou a ter cla-ro, para ela, o que era o trabalho educacional,sem desconsiderar o trabalho de cunho filan-trópico que deve ser feito com crianças menosfavorecidas – a questão da alimentação, saúde,ou seja, sem desconsiderar a necessidade doamparo que tem que ser dado para que elaspossam se desenvolver bem na educação, inte-lectualmente.

Na Talita Kum, um internato de meninas,as irmãs relutaram muito em transformá-loem uma casa aberta. No primeiro ano após aabertura da casa à comunidade, tivemos cercade 100 meninas freqüentando as atividades nohorário invertido da escola pública, e o núme-ro só foi aumentando. As irmãs não consegui-am entender que a casa poderia atender maismeninas – elas faziam questão que fossem sómeninas.

No final de 2000, montamos o Núcleo Co-munitário Jardim Novo Horizonte, no Varjão,um bairro de ocupação com 10, 15 mil pesso-as. É uma região muito pobre de Jundiaí, comcarências de saneamento, infra-estrutura e,evidentemente, de escolas, creches. Nessa épo-

ca, começamos a oferecer reforço escolar paraas crianças. Depois, fomos abrindo outras ati-vidades aos pais dos alunos para que fizessemparte dessa estrutura. Os filhos se orgulhavamde ver os pais fazendo cursos. Em sete anosnão tivemos nenhum histórico de invasão, de-predação, roubo, nada, pois o núcleo atende àexpectativa da comunidade.

Acho que o impacto da ação da Fundaçãopoderia ser maior no ponto de vista da quan-tidade de pessoas atendidas, porém temos queanalisar pela qualidade: atendemos poucos,mas bem. Hoje, temos o ensino fundamental eagora queremos o ensino médio, mas só dare-mos esse passo se estivermos absolutamenteconscientes da qualidade; esse é o grande dife-rencial. A Fundação, seguindo essa tendênciade uma educação voltada para a profissionali-zação, tem todos os meios para desenvolver oensino técnico e tecnológico, uma Fatec – Fa-culdade de Tecnologia, com novos cursos, co-mo, por exemplo, os ligados à área de serviços.

Sou um cientista social e educador que temum compromisso muito grande com a histó-ria. Para mim, você tem que estar permanen-temente retornando ao passado, para se ali-mentar para o futuro. Então, acho importantepreservar e documentar todo o trabalho queestá sendo feito, olhar sempre os principaisatores, que são os alunos atendidos, criar amentalidade de que nós, hoje, estamos fazen-do história. A história é viva, e não algo que seperdeu no tempo.

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eu nome é WALDECI DUTRA CASTE-LHANO e nasci em São Paulo, nobairro Água Fria na zona norte, em

11 de junho de 1964. Morei ali até os 4 ou 5 anosde idade e depois fui morar na Vila Albertina,onde estou até hoje. Minha primeira escola erauma escola estadual, Maria Paula MarcondesDominguez, e ficava na vila onde morava.

Meu pai, sr. Aparecido, era filho de espa-nhóis. Minha avó veio para a região do Paranáe meu pai nasceu ali. Ele era torneiro mecâni-co, trabalhava em empresas da área industrial.Minha mãe é mineira e sempre foi do lar. Elesse conheceram numa praça, em Londrina, e fi-caram juntos, casaram. Tenho dois irmãos esomos uma família tradicional, simples, masbem formada. Sou separado e meu pai já é fa-lecido. Fui morar com minha mãe, para cui-dar dela e da minha irmã.

Eu entrei na história da Fundação para tra-balhar no escritório de d. Antonieta comooffice-boy, em 1980, e, depois, passei a ser fun-cionário da instituição. Meus empregos ante-riores foram em uma escola particular na Ave-nida Liberdade; na associação de bancos; e noprédio da sede da Fundação, em uma correto-ra de valores chamada Convenção. Neste últi-mo, eu tinha muito contato com a administra-ção do prédio, que já pertencia à d. Antonieta.Eu vinha entregar as correspondências e, umdia, o administrador me convidou para traba-lhar no escritório dela. Eu não estava estu-dando, então ele falou: “Se você quiser traba-lhar com a gente... Fica o convite, mas vocêtem que voltar a estudar”. Voltei para a escola,terminei o 1º colegial no Estado e depois o 2ºe 3º colegiais fiz no supletivo, já custeado pord. Antonieta.

Eu entrei com 16 anos e sentia que poderia ser uma dascrianças favorecidas pela Fundação, pois era de uma famíliamuito humilde, como os meninos de Jundiaí. Sinceramente, eu penso isso até hoje. Tive as oportunidades e posso dizer quesou uma pessoa privilegiada por ter conhecido d. Antonieta,que me deu todas as condições para eu ter uma vidaprofissional melhor.

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Terminado o colegial, tive contato com asrotinas do escritório. Lembro-me que me pa-garam um curso de datilografia. A gente faziaa administração dos bens e emitia os boletosde cobrança dos aluguéis dos imóveis, e era euquem datilografava. Entrei com 16 anos e sen-tia que poderia ser uma das crianças favoreci-das pela Fundação, pois era de uma famíliamuito humilde, como os meninos de Jundiaí.Sinceramente, eu penso isso até hoje. Tive asoportunidades e posso dizer que sou uma pes-soa privilegiada por ter conhecido d. Antonie-ta, que me deu todas as condições para eu teruma vida profissional melhor.

Depois dessa fase da datilografia, houveuma transição com a saída de um dos direto-res e o sr. Adão, que era o administrador e di-retor, passou a ser o diretor-geral e o sr. Lima,que era contador, passou a ser diretor. Então,outras pessoas foram contratadas para fazer acontabilidade dos bens de d. Antonieta e daFundação. Eu via que as pessoas que entravamno escritório contábil não se adaptavam, e fuiconversar com o administrador, que me ofere-ceu o curso de auxiliar contábil, no Senac. Fizo curso, depois fiz técnico em Contabilidade e,posteriormente, ingressei em uma faculdadepara fazer o curso superior na área. Formei-me contador e, logo em seguida, comecei afaculdade de Direito, na qual também me for-mei. O Renato, da administração, estudoucomigo no Senac e na Contabilidade. Nessaépoca, eu estava como contador, já fazendo ocurso de advocacia, e fui para a parte adminis-trativa, porque o sr. Adão havia saído, o sr. Li-ma tinha assumido como diretor-geral e aConceição, que era secretária-geral, ficou,

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Waldeci Dutra Castelhano

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também, como diretora. Eu fiquei como ad-ministrador e convidei o Renato para assumirmeu cargo anterior.

D. Antonieta tinha um escritório particularporque era uma senhora de posses, com váriosimóveis que precisavam ser administrados.Através dos recursos obtidos com esses imó-veis, ela fazia doações para a Fundação, man-tendo as unidades de Jundiaí. Ela fazia questãode não termos laços com o poder público, poisnão queria a interferência do Estado. Na ver-dade, ela tinha todo prazer – acredito até queera o prazer da vida dela – em cuidar dascrianças, então, até seu falecimento, havia essecunho pessoal. A Fundação recebeu como pa-trimônio uma variedade enorme de fazendas,edifícios, ações, cuja administração teve queser profissionalizada.

A partir daí, a Fundação deu um salto na suaforma de atuação, foram feitos empreendimen-tos com parceiros, com a Prefeitura de Jundiaí,houve uma melhor gestão. Os novos diretores epresidentes tiveram a preocupação de adminis-trar mais eficazmente a Fundação, e isso resul-tou em um maior número de atendimentos.Antes, havia somente a Cidade dos Meninos e aCreche; depois, foi formalizado um novo nú-cleo de atendimento, o Núcleo Novo Horizon-te no bairro do Varjão, pólo de pobreza muitogrande na região. Foi feita, também, uma par-ceria com a Congregação das Irmãs CarmelitasTeresianas, que já administravam a creche des-de sua inauguração, em 1981, para que fizes-sem o atendimento mais aberto na Talita Kum,que foi incorporada pela Fundação.

Trabalhar nos bastidores da Fundação é di-ferente, a gente não tem contato no dia-a-dia

das unidades, então, não tem esse lado pes-soal, de ligação direta com as crianças atendi-das em Jundiaí, mas a gente sabe, no nosso ín-timo, que também trabalha em benefíciodelas. Sendo o escritório da mantenedora, agente procura trabalhar bem para poder, tam-bém, gerar recursos para a manutenção dasunidades. Mesmo estando em São Paulo, agente tem conhecimento da dimensão dasações desenvolvidas. Algumas reuniões sãofeitas em Jundiaí, com os ex-alunos, onde elespassam suas experiências pós-Fundação, e vê-se que muitas pessoas tiveram uma evolução,seja pessoal ou profissional. Jundiaí foi esco-lhida porque d. Antonieta era natural de lá e, para a região, o trabalho realizado tem umimpacto social muito grande porque, hoje,são atendidas direta e indiretamente cerca de2 mil pessoas, entre crianças e adultos. Quan-to ao reconhecimento, eu tenho contato como fórum de lá e percebo que a instituição é co-nhecida, pois nossos alunos são multiplicado-res de informações.

A dedicação de d. Antonieta com as pessoasé algo que ficou muito marcado em mim, esselado materno de alguém que despende sua vi-da para cuidar dos menos favorecidos. Ela eramuito rica, de projeção pessoal enorme, masia até a rua 25 de Março para comprar cober-tores para os garotos da Cidade dos Meninos.Isso serve de lição para a gente, de não pensarsó em si mesmo, mas também naqueles queprecisam de você. Essa filosofia atinge os fun-cionários, talvez de um modo menos emocio-nal no escritório, na sede, mas a gente sente, láem Jundiaí, que essa filosofia está viva... Por-que lá eles têm o contato direto com a socie-

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dade, com as crianças, então, não tem comonão se emocionar. Você vê, às vezes, umacriança dar um beijo na cozinheira, um grupi-nho rodeando a diretora. O pessoal sabe quese dedica a uma causa nobre, que não tem sóo lado profissional. Desde que comecei, vi queaqui era um bom lugar, onde você entrava e sesentia bem.

O lado religioso que vinha de d. Antonietaé mantido até hoje. Ela sempre esteve ligadacom entidades e há documentos que mos-tram que ela chegou a construir um núcleo deassistência social para a Opus Dei, na regiãode Taboão da Serra. Antes de criar a Funda-ção, ela incrementava e auxiliava o atendi-mento de outras instituições. Depois, em1968, 1970, ela incentivou a construção da Ci-dade dos Meninos e procurou uma parceriacom a Inspetoria Salesiana do Brasil. Com asaída recente dessa inspetoria da parte admi-nistrativa da Cidade, que foi assumida direta-mente pela Fundação, diminui-se, um pou-quinho, esse lado religioso, mas manteve-se,ainda, a cultura do lado espiritual, com asmissas na capela dessa unidade.

Eu vejo o terceiro setor na visão da Funda-ção, esse atendimento, esse apego às pessoas, olado humano. Às vezes, vou a Jundiaí e vejo ascrianças em sala de aula, tendo suas ativida-des, e fico muito feliz, até emocionado, porquesei que, de alguma forma, estou ajudando umpouquinho aqueles meninos e meninas. Euvejo a Fundação como uma instituição sólida,realmente idônea, porque, se não fosse, nãoteria durado mais de 50 anos. Ela tem uma fi-nalidade nobre, veio de pessoas nobres e seucorpo profissional, diretoria, todos os conse-

lheiros são pessoas também idôneas. A Funda-ção tem uma visão de crescimento, de cons-truir novas unidades, evoluir também em ou-tros campos. Há, por exemplo, o projeto deformalizar um espaço voltado para a área cul-tural, na Fazenda Ermida, e a perspectiva denovos atendimentos no núcleo do Varjão.

A Fundação, para mim, é quase tudo, por-que me auxiliou na minha formação, na mi-nha vida, na minha carreira profissional, e seique estou em um lugar onde há uma aura dobem. É como se fosse uma família, e fico feliz,muito feliz de trabalhar em uma instituiçãoque fez 50 anos e que tem tudo para fazer maisoutros 50. Tenho certeza que, se for mantida a filosofia de d. Antonieta, essa Fundação vaiser perpétua.

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u nasci em São Paulo, em 7 de marçode 1966 e me chamo RENATO MAR-TINS. Meu pai era vidreiro, confec-

cionava lustres, e minha mãe cuidava da casa edos filhos. Cursei o ensino fundamental emuma escola da zona leste da cidade. Fiz o cole-gial, correspondente ao curso técnico em pro-cessamento de dados, no Colégio Cruzeiro doSul, também na zona leste. Parei de estudarpor alguns anos para ajudar em casa e, depois,fui para a vida universitária. Fiz duas faculda-des: Ciências Contábeis e Direito, na Universi-dade Cidade de São Paulo.

Meu primeiro emprego foi em uma empre-sa relativamente grande, de programação demáquinas processadoras, a NCR. Lá, pude apli-car o que aprendi no colegial. Depois disso, em-preguei-me no setor comercial da Mesbla Lojade Departamentos, no cargo de auxiliar contá-

bil. Na época, já estava estudando Contabilida-de e fiquei na Mesbla durante cinco ou seisanos. De lá, transferi-me para a Sony Comércioe Indústria, empresa de equipamentos eletroe-letrônicos, onde permaneci por quatro anos.Desliguei-me da Sony e entrei na Fundação.

O Waldeci Castelhano era meu colega defaculdade no curso de Contabilidade e traba-lhava na Fundação. Quando houve um rema-nejamento nos quadros da instituição, ele as-sumiu outro cargo e me disse: “A Fundaçãoestá com um projeto em andamento e estouindo para outra área. Se você quiser um novodesafio... O meu lugar no departamento deContabilidade está vago”. Aceitei. Fui entrevis-tado pelo sr. Lima, diretor na época, que gos-tou muito de mim. Conversei, também, comd. Antonieta, que não colocou objeção à mi-nha contratação.

Ingressar na Fundação foi realmente muito importante paramim. Sou de origem simples, meus pais trabalharam muitopara garantir a formação dos filhos. Sempre nos passaram ovalor do respeito ao próximo, a valorização humana. Então,quando me vi realizando uma atividade que traria retornopara os menos favorecidos... Foi uma realização pessoal.

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Eu tinha pouco contato com d. Antonieta.Isso acontecia em ocasiões de festividades ouquando ia a Jundiaí, a trabalho. Além disso,uma vez por ano ia à casa dela, levar sua decla-ração do imposto de renda para aprovação eassinatura. Uma vez comentei com ela: “D.Antonieta, é muito patrimônio, são muitosbens...”. Ela olhou as informações que conti-nham na declaração e disse: “São muitos bens,mas o bem maior que construímos não estáaqui... O que a gente faz para os menos favo-recidos, nenhum documento vai retratar”. Issome marcou muito. O patrimônio maior que d.Antonieta tinha não estava retratado em umadeclaração de bens.

Lembrar dela dá certa emoção. Foi umapessoa que respeitava o ser humano, valoriza-va muito seus funcionários. Sua dedicação acada um de nós era visível, a dedicação dela àFundação também... Acho que das pessoas,foi a mais fantástica que conheci, pela sua hu-mildade... É difícil vermos esse sentimentonas pessoas.

Ingressar na Fundação foi realmente muitoimportante para mim. Sou de origem simples,meus pais trabalharam muito para garantir aformação dos filhos. Sempre nos passaram ovalor do respeito ao próximo, a valorizaçãohumana. Então, quando me vi realizando umaatividade que traria retorno para os menos fa-vorecidos... Foi uma realização pessoal.

O trabalho da minha equipe tem um papelestratégico na Fundação. Temos uma granderesponsabilidade, pegar todo o trabalho queé desenvolvido, colocar em números e papéispara prestar contas aos órgãos governamen-tais, para que a Fundação continue gozando

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Renato Martins

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da imunidade tributária. Por mais que nosfoquemos nisso, quando trazemos os agentesdo INSS, por exemplo, para conhecerem arealidade da Fundação, o trabalho que é de-senvolvido... Essas pessoas se encantam. En-cantam-se porque é difícil ver, hoje em dia,um trabalho com tanta dedicação. As pessoasque trabalham aqui são de fácil convivência,estão felizes porque, por mais simples que se-jam suas atividades, o resultado é o bem dascrianças.

O impacto social do trabalho desenvolvidona Fundação é muito grande. Tem uma estru-tura e um preparo que muitas instituições deensino não têm, essa idéia de formar pessoas,homens com responsabilidades, ajudar famí-lias a produzir renda, a serem pessoas debem... Enfim, formar cidadãos.

É um orgulho, para mim, fazer parte des-se trabalho. A Fundação me dá mais do queeu pude imaginar, não só na parte material,mas como ser humano. Ela me faz crescercomo pessoa. Dos poucos contatos que tivecom d. Antonieta, esse é o ensinamento quevai fazer parte da minha vida até o final.Uma pessoa que tinha todas as possibilida-des de aproveitar a vida, viveu para se dedi-car a crianças carentes.

Quando entrei, o Departamento de Conta-bilidade contava com um empregado só. Ho-je, somos quatro. Tínhamos, em média, 2.000,2.500 lançamentos contábeis ao ano. Hoje, te-mos, no mínimo, de 10 a 12 mil lançamentoscontábeis por mês. Então, percebe-se umgrande crescimento de atividades, de trabalhoem equipe, de dedicação das pessoas... Pelasestratégias que são praticadas pela diretoria

atual, eu vejo a Fundação com uma longevida-de muito grande. Se continuar com o mesmopropósito e mentalidade de hoje, a gente vaipassar e essa entidade vai continuar.

Participando de alguns eventos, vejo que oEstado, além de não estar cumprindo o seupapel, está procurando arrecadar cada vezmais. Não digo especificamente da Fundação,mas do terceiro setor em geral. Isso acaba to-lhendo as atividades das instituições, pois opouco de imunidade tributária que têm, o Es-tado tenta tirar. Os auditores entendem que asatividades desenvolvidas não são de assistên-cia social, e sim de benemerência. Com esseentendimento dificultam a obtenção da certi-ficação de incentivos fiscais.

A Fundação é reconhecida como institui-ção de atividade filantrópica em todas as esfe-ras. Graças a Deus, a gente participou dessascertificações, de forma bem atuante. Cada cer-tificação, cada isenção fiscal que conseguimos,foi um ganho importante. O trabalho dos bas-tidores – a documentação gerada, os relatórioselaborados – foi valorizado.

Nosso relacionamento é mais da Fundaçãocom terceiros, mas tivemos oportunidade defazer um trabalho educativo, junto às crian-ças, sobre o patrimônio da instituição. Fize-mos o levantamento e a identificação do pa-trimônio, como equipamentos e móveis,porém, as identificações dos móveis das salasde aula foram retiradas pouco tempo depois.Criança não tem jeito... No último levanta-mento patrimonial, reunimos alguns meninose mostramos o valor do patrimônio que esta-va à disposição deles e a importância de esta-rem identificados. Certo dia, passando pelo

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pátio, sentimos o reflexo: “Olha, tio, nós nãotiramos mais nada, depois do que o senhor fa-lou, está tudo lá, identificado, pode ir ver”.Quer dizer, uma consciência de cidadania,preservar o patrimônio que é deles mesmos.Mas, esse caminho é meio de mão única, agente mais recebe dessas crianças do que for-nece informações para elas.

Nessa minha trajetória na Fundação tenhome deparado com pessoas que, por suas atitu-des, ficaram marcadas na minha lembrança.Em uma época, o Conselho estava pensandoem mudar a sede da Fundação, de São Paulopara Jundiaí. Naquele momento, a instituiçãoestava passando por um momento conturba-do. Se a sede fosse transferida, haveria muitoconflito e acredito que colocaria a subsistênciada Fundação em xeque. A postura de dr. Eg-berto, a defesa dele de manter a sede em SãoPaulo foi muito importante.

Sr. Lima foi uma pessoa importante que,além de conselheiro, era o nosso contato coma d. Antonieta. Sempre procurava nos prote-ger. Vail Chaves, irmão da d. Antonieta, pelamaneira de ser, sempre alegre. Todos os diaspassava aqui na Fundação. Sentava e contavafatos de sua vida desde garoto. Histórias devida mesmo. Carlos Alberto foi um diretorque tivemos na parte técnica. Era bem inteli-gente, sacava muito rápido as coisas para aFundação.

Hoje, o Ismar é uma referência para nós. Sea Fundação ainda existe, é devido à dedicaçãodele próprio e do dr. Egberto. Como já falei,um tempo atrás houve um momento decisivopara a instituição: ou o trabalho continuaria,ou seria perdido pelo caminho. Dr. Ismar e dr.

Egberto brigaram muito pela subsistência daFundação. D. Antonieta sempre quis que agrandeza desse trabalho ficasse no anonimato.Por ela ter tido esse pensamento, acredito quemuitas obras realizadas pela Fundação fica-ram perdidas pelo caminho.

Com este livro, muitas dessas histórias se-rão resgatadas. Vai ser um marco para a Fun-dação e um ponto de referência para conhe-cermos a sua trajetória e até mesmo a nossaprópria história. Por menor que seja a ativida-de que cada um de nós, empregados, realiza,nosso trabalho vai ficar registrado. É motivode orgulho fazer parte disso tudo. Prazeroso,como ser humano...

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eu nome é MEYRI TEDDE FREZZA.Quando iniciei meus estudos, naminha juventude, minha tendên-

cia era cursar Contabilidade. Entrei na facul-dade e era uma ótima aluna, mas quando re-cebi uma proposta de um professor paratrabalhar em um escritório dele, renomadoem Jundiaí, descobri que meu pai não aceita-va que seus filhos trabalhassem como empre-gados. Ele é de família síria muito tradicional,então, tranquei a matrícula e fui estudar paraser professora, pois, para ele, não havia pro-blemas nessa profissão.

Já antes de me formar, dava aulas comoprofessora substituta. Fui para as escolas isola-das na periferia da cidade, depois ingressei co-mo professora em Mauá e vim retornando pa-ra Jundiaí, onde trabalhei na Delegacia deEnsino, assumindo direções de diversas esco-

las. Esse tempo de direção, nas escolas do Es-tado, foi excelente.

Quando eu estava entrando no processo daaposentadoria, a Margarete, que era minhacolega e professora na Fundação, falou: “Vocêseria uma boa professora lá na Cidade dosMeninos. O padre está precisando de alguémpara dar aulas para a 4ª série”. Fui conversarcom o padre Nascimento e contei que haviatido um derrame. Lembro-me que ele falou:“Não vai dar tempo de você ter problemasaqui. Você vai ficar tão envolvida com ascrianças que não vai se lembrar do derrame eda pressão alta”. E foi dessa maneira que co-mecei a trabalhar na escola, em 1987. Eu só ti-nha a informação de que a escola recebia alu-nos com algum problema e que fossem debaixa renda.

No meu primeiro dia de trabalho, cheguei

Eu me sinto muito bem, a extensão da minha casa é a Cidadedos Meninos e Meninas e é difícil me preparar para a saída. Eu acho que, com 66 anos, é para a gente começar a acalmar,partir para o sossego. Eu não estou sentindo isso ainda, nãoparo quieta e todos têm muita afeição por mim...

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sem saber como ia ser recebida. As crianças,na época, saíam todas pelo pátio e vinham nosreceber. Era uma prática de d. Antonieta e nóséramos recepcionados com beijos, abraços,uma festa danada, uma coisa que era difícil dever fora dali. Foi muito marcante. O padreMauro Scaglia era diretor da escola e tinhauma conversa com as crianças todo início desemana, logo que os alunos chegavam, parasaber como eles estavam, como tinham passa-do o final de semana, dando as boas-vindas deuma maneira agradável. Depois de uma sema-na que eu estava trabalhando, pedi ao padrepara eu dar essas boas-vindas, porque tinhaalgumas coisas a dizer a eles e que me pesavammuito, já que, enquanto diretora, eu aconse-lhava os pais a levarem os filhos “danados” pa-ra a Cidade. Ele deixou e fui, na verdade, pedirdesculpas para as crianças, porque eu achava –assim como toda Jundiaí – que ali era comouma Febem. Foi aí que eu comecei a promo-ver a escola na cidade e mostrar para a comu-nidade e colegas de trabalho o que era feito ládentro. Foi um processo, o pessoal da Funda-ção começou a divulgar mais, a se entrosarmais com a população.

Eu era professora da 4ª série. Há dois anos,vieram me perguntar se eu gostaria de traba-lhar com a turma, na biblioteca. Aceitei e pas-sei a ser professora do grupo de apoio. As mi-nhas atividades incluíam atendê-los nabiblioteca, orientá-los a ler, interpretar e per-ceber que a leitura é muito importante paraqualquer disciplina, para tudo que fazemos navida. Passei a ser incentivadora da leitura, da1ª até a 6ª série. E foi gostoso, porque dali saiuaté teatro, você trabalha com eles de maneira

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Meyri Tedde Frezza

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totalmente diferente da sala de aula. Nesteano, fico na biblioteca com a 1ª e 2ª séries, douapoio escolar para 7ª e 8ª séries na parte damanhã. A gente fica na retaguarda, porquemuitos têm dificuldade em estudar sozinhos,respeitando a autonomia do professor, que dáa matéria e ajudando-o, junto aos alunos.

Eu adoro o que faço, adoro a Fundação, res-peitando a administração através do trabalhorealizado pela diretora Patrícia e equipe. Pro-curo cumprir com minhas obrigações, a me-todologia, claro, me entrosando principal-mente com a criançada e todos da escola. Aomesmo tempo em que sou enérgica e falo fir-me com eles, brinco também. Vê-se uma 7ª, 8ªsérie conversar com você de igual para igual.Quando os pequenos vêem que meus cabelosbrancos começam a aparecer, vão logo avisan-do que está na hora de eu pintar. A liberdadeentre nós é muito gostosa e gratificante. Umasituação engraçada que aconteceu há algunsanos: no espaço da escola, há uma rampagrande, com grama. Os alunos viviam rolandograma abaixo; quando eu estava por perto,eles queriam rolar e eu não deixava. Um dia,“me deu cinco minutos” e falei: “Está bom, vo-cês vão. Mas fiquem aí em baixo, esperando”.Sem avisá-los deitei e rolei, com todo esse cor-pão... Eu nunca havia rolado na grama e,quando levantei, vi o pessoal administrativotodo lá em baixo, inclusive o diretor.

A escola, antigamente, era mãe, pai, tudopara essas crianças. Agora, nessa nova visão daescola, o pessoal percebeu que não pode dartudo. Essas crianças têm que aprender... Paraquando saírem, levarem todo o conhecimentopara poderem “se virar” lá fora. A escola está

dando essa oportunidade para eles, que estãoaprendendo a viver fora da Fundação. Não da-va mais para ter uma escola internato. As coi-sas começaram a mudar, já não tinha aqueleperfil de aluno de antigamente, que aceitavasair só no final de semana. Dava para ver queeles queriam partir para novos horizontes,queriam mais. Às vezes, eu falo que d. Anto-nieta deve estar lá em cima de olho na turmaaqui, nos protegendo. Se tivesse parado notempo, seria uma judiação... A cada dia quepassa, eles vêm com novas solicitações, pedin-do algo mais, fazendo que mudanças sejamrealizadas, valorizando cada vez mais a escola.Eu nem percebi que já sou uma das funcioná-rias mais antigas. Eu vou me adaptando às no-vas mudanças.

Nós temos o dia dos ex-alunos, em que fa-zemos uma reunião. Eles vêm procurando-meno meio da turma e falam: “É, d. Meyri, a gen-te sabe que vai encontrar a senhora aqui”. Al-gumas vezes, deixamos de ir a festas familiarespara estar com eles, porque ficam nos espe-rando no portão para mostrar que estão con-tentes, o que fazem, contando suas vidas comose fizéssemos parte de suas famílias. A melhorcoisa que existe é encontrar esses ex-alunos narua, na praia, no supermercado. Você não selembra muito da fisionomia, porque eles mu-daram, passaram a ser homens, e de repenteouve um grito chamando seu nome. Com otempo, você perde os nomes: dos “danados”você se lembra, mas dos quietos, não. Eles che-gam perto, abraçam a gente como se fossemaqueles pequeninhos e você sente esses abra-ços como se fossem, ainda, daqueles meninosde 11 anos. Muitos deles vão à escola, me pro-

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curar, durante o ano inteiro. É gratificante,porque, por mais que você pense que não con-seguiu fazer muita coisa, é aí que você nota oque fez. Esses meninos chegam e falam: “D.Meyri, lembra quando a senhora aconselhava,cobrando atitudes nossas? Eu não ouvia e ago-ra sinto falta”.

Lá, as coisas são muito perfeitas, para falara verdade. Não há barreiras. Muitas vezes, agente precisa tomar cuidado, porque acha quetudo aquilo é nosso. Tem hora que parece quenão é da d. Antonieta, não é de ninguém, massim meu, porque eu chego para as pessoas efalo como se fosse a minha casa. Depois, pen-so: “Meu Deus, o que eu fiz?”. E sou aceita,mesmo assim, mesmo falando tudo o quepenso. Eu também estou aposentada pelaFundação, desde 2000, e estou trabalhando atéagora... Eu me sinto muito bem, a extensão daminha casa é a Cidade dos Meninos e Meninase é difícil me preparar para a saída. Eu achoque, com 66 anos, é para a gente começar aacalmar, partir para o sossego. Eu não estousentindo isso ainda, não paro quieta e todostêm muita afeição por mim...

Acho que a Fundação precisa mesmo divul-gar seu trabalho porque, querendo ou não, is-so tudo vai ficar para outros que virão. Temosque mostrar aquilo que d. Antonieta fez, por-que essa mulher foi de uma abertura fora donormal. O amor dela e do sr. Antonio era mui-to grande, era e é exemplo. D. Antonieta eracomo uma mãe, tanto para os adultos comopara as crianças. Ela chegava e ia cumprimen-tar todo mundo. Toda vez que chegava, tinhaque abraçar os funcionários, a criançada prin-cipalmente. A preocupação dela era muito

grande em relação às crianças, ao bem-estar.Não perguntava se elas sabiam, se tinham co-nhecimento escolar, mas sim se estavam comfrio, se tinham agasalhos, se precisavam de al-guma coisa, se comiam bem. Aí, no final, elaperguntava se estavam conseguindo estudar.Ela não se negava a dar um abraço, nunca dei-xou uma criança de lado. Ela era “fora de sé-rie”, mesmo. Assumia tudo que acontecia den-tro da Fundação, não havia a preocupação emtrazer alguma coisa de fora para ajudar. Eucheguei a sugerir que pedíssemos a merendapara a prefeitura, mas ela falava: “Não, filha,no momento, não. Se precisarmos, nós pedi-mos, mas, no momento, não”. Ela queria fazerassim, achava que não havia necessidade.

Valores importantes eram passados para ascrianças, como humildade, amor junto à fa-mília, ética, moral, costumes preservados, esseamor que dão para as pessoas, indistintamen-te. Para eles, não há diferença entre velho enovo, eles aceitam as pessoas como são... Essacriançada tem tudo para aprender. Quandotodos falam a mesma linguagem, qualquerprobleminha que há, todos vão atrás para ten-tar resolver...

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u nasci em 30 de novembro de 1961,em Jundiaí, e me chamo ELIANA RE-GINA PICCHI PICCOLO ZOTINI. Meus

bisavós vieram da Itália – dos dois lados, tan-to de pai como de mãe – e se estabeleceram nacidade. A família da minha mãe já veio diretopara Jundiaí, a de meu pai foi para Itatiba e,posteriormente, para Jundiaí também. Meuspais nasceram nessa cidade, meu pai tinhauma pequena empreiteira na construção civil,profissão que ele aprendeu com meu avô, eminha mãe é contadora, trabalhou semprecom o pai e até hoje cuida das coisas dele, pa-ra os irmãos. Tenho um irmão que é dentista,sete anos mais velho que eu.

Sou casada e, coincidentemente, a famíliado meu marido veio da Itália junto com a fa-mília dos meus bisavós. Eu tenho dois filhos,Daniela, estudante de engenharia de materiais

e o Frederico, que está fazendo cursinho e pre-tende, também, ser engenheiro de materiais.

Meus primeiros estudos foram no Institutode Educação Experimental Jundiaí, hoje cha-mada Escola Bispo Dom Gabriel Paulino Bu-eno, onde fiz desde a 1ª série até o Ensino Mé-dio. Em seguida, fiz cursinho. O serviço socialapareceu assim: a minha madrinha de crismaé assistente social, e as primas da minha mãetambém o são. Acho que sempre tive uma ten-dência, sem ter consciência disso. Sempre mepreocupei em entender o porquê das coisas nasociedade, a evolução... Existia uma preocupa-ção minha em entender as pessoas, o que esta-va por trás da atitude delas, da escolha de vidaque tinham feito, o que as levou a fazer suastrajetórias, e fui prestar vestibular.

Fiz, então, Serviço Social nas FaculdadesMetropolitanas Unidas, hoje Universidade

Tento me colocar na situação do outro para perceber como ele pode estar se sentindo e como ele gostaria de ser tratado. A primeira coisa que eu penso, quando vou atender umapessoa, é como eu gostaria de ser atendida também, como eugostaria que falassem do meu filho.

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FMU. Já no 3º ano da faculdade, comecei a es-tagiar diariamente trabalhando com habita-ção. Estagiei na Fundação Municipal de AçãoSocial – Fumas, de Jundiaí. Vivenciei bem aparte de urbanização das sub-moradias e omeu trabalho de conclusão de curso foi sobrea transferência dessas pessoas para um núcleohabitacional.

Graduei-me em 1994 e o meu primeiroemprego foi na Prefeitura Municipal de Caja-mar, onde fiquei até nascer minha primeira fi-lha. Formei-me em dezembro e em março co-mecei a trabalhar, comissionada na Apae local,no Fundo Social. Era, então, a única assistentesocial do município. Algumas vezes, o juiz doFórum solicitava o meu trabalho em algumainvestigação para realizar o diagnóstico de umcaso, e foi uma época muito produtiva. Apren-di muito, porque trabalhava na saúde, na pre-feitura, na comunidade e no Fórum.

Aí, dei uma parada e, nisso, já veio o segun-do filho. Voltei quando a Daniela tinha 2 anose meio e o Frederico, 11 meses. Trabalhei nohospital psiquiátrico, de lá eu fui para o SOS-Serviço de Obras Sociais, depois para um cen-tro de reabilitação que trabalha com criança eadulto, na parte de fisioterapia, fonoaudiolo-gia e psicologia. Dei uma parada, em funçãoda doença de meu pai e, quando ele faleceu,voltei a trabalhar. Foi quando vim para a Fun-dação, que foi o melhor presente.

Eu conheci a Fundação da seguinte forma:a Maria Aparecida, que é a assistente social naunidade Talita Kum e no Núcleo ComunitárioNovo Horizonte, foi levar uma pessoa atendi-da pela entidade em que ela trabalhava – antesde entrar na Fundação – ao hospital psiquiá-

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Eliana Regina Picchi Piccolo Zotini

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trico onde eu trabalhava, e nos conhecemos. Apartir daí, pegamos amizade e conversávamossempre, até que ela me falou que a Fundaçãoestava procurando uma assistente social, se eutinha interesse – isso foi depois da morte domeu pai. Eu falei: “Meu Deus, estou há cincoanos parada!”. Ela me incentivou: “Não, ima-gina, você dá conta, você nunca parou!”, por-que, de fato, eu não trabalhava, mas continueiem contato com a cooperativa que as assisten-tes sociais de Jundiaí fundaram, hoje de pro-fissionais liberais.

Fui fazer entrevista com o diretor, que erao Irineu, hoje superintendente da Fundação.A entrevista foi em dois dias e, no terceiro, jácomecei. Na época, queria ficar só meio pe-ríodo, porque tinha meus filhos pequenos. Sóque em uma instituição desse porte jamais euconseguiria desenvolver uma boa ação emmeio período: eu me apaixonei pelo trabalhoe fiquei o dia todo. Adoro o ambiente de esco-la, o meu sonho sempre foi serviço social es-colar. Foi na época do internato, em que osgarotos dormiam na Cidade dos Meninos. Euchegava a ficar até 12 horas. Quando a orga-nização funciona 24 horas, você não conseguese desligar. Muitas vezes eu saía, pegava meusfilhos e voltava para lá; muitas vezes ficava di-reto mesmo. E foi paixão à primeira vista, oambiente de escola, o adolescente, as crian-ças... O adolescente é a coisa mais apaixonan-te que pode existir. A adolescência é aqueleperíodo de busca, de identidade, e ao mesmotempo de conflito. Pena que a gente só temconsciência disso depois que passou dessa fa-se. Quando fui para a Fundação, falei: “Nossa,pensei que fosse um seminário. Não imagina-

va que fosse uma escola”. Não sabia da exis-tência da Cidade dos Meninos, da Fundação,até aquele instante.

Eu peguei toda a transição do internato pa-ra o período integral e, no primeiro dia de tra-balho, vi todos aqueles alunos, todos curiosos,olhando para mim, porque a outra assistentesocial tinha saído. Aquela curiosidade, aqueleolhar de desconfiança das crianças, dos ado-lescentes, mas aos poucos foram chegando, fo-ram vendo que eu não era uma pessoa brava,muito pelo contrário. Quando percebi, minhasala estava repleta deles. As crianças chegaramprimeiro, os adolescentes foram depois. As fa-mílias, também, tinham muita confiança naoutra assistente social, mas aos poucos foramse sentindo acolhidas e hoje posso dizer que agente tem um relacionamento com as famíliasmuito bom, elas confiam tanto em mim quan-to na Cida que fica nas outras unidades.

Acho que temos uma interface boa para tra-balhar com essas famílias. Isso é muito impor-tante, porque não se trabalha só as crianças eos adolescentes, tem que se trabalhar as famí-lias, acompanhar a dinâmica familiar, e verifi-car em que podemos ajudar. É um trabalho deacompanhamento e orientação familiar siste-mático e contínuo. Sinto que, realmente, essasmães, crianças e adolescentes se sentem bem àvontade para colocar qualquer alteração na di-nâmica familiar, algum problema que estejaocorrendo. Acreditam que estamos ali paraajudar e confiam, conversam com a gente, sa-bendo que a nossa intervenção vai tentar via-bilizar a solução para aquele problema.

Todo aluno que entra, eu vou à casa dele.Todo. Nem que seja um aluno cuja família es-

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tá bem estruturada funcionalmente. Vou paraconhecer onde esse adolescente mora, em quebairro ele está, onde dorme, se dorme nomesmo quarto que os pais, qual a situação, seaquela família está precisando de algumaorientação em relação a cuidados de vida diá-ria, higiene. Tudo isso de uma maneira quenão fira a dignidade da pessoa, respeitando aindividualidade de cada um.

Cada aluno é uma história, cada um per-manece na lembrança... Sou uma pessoa quese emociona muito fácil, muitas vezes atendocasos em que, depois, choro muito. Eu me se-guro na frente das famílias, mas depois... Ten-to me colocar na situação do outro para per-ceber como ele pode estar se sentindo e comoele gostaria de ser tratado. A primeira coisaque eu penso, quando vou atender uma pes-soa, é como eu gostaria de ser atendida tam-bém, como eu gostaria que falassem do meufilho. Quando vou falar com a mãe de algumaluno que está apresentando problemas, nun-ca chego descarregando os fatos que estãoocorrendo e culpando. Sempre procuro, notrato com a família, ter respeito àquele ser hu-mano que está ali, precisando da gente. E nósestamos precisando dele, porque é uma troca:eles aprendem conosco, nós aprendemos comeles. Acho que a vida é isso, a vida é relaciona-mento, é troca.

A relação da Fundação com os pais é exce-lente. Quando você vai propor um curso, parater grande procura você tem que fazer no finalde semana. Nossa realidade qual é? Trabalha-mos com famílias de baixa renda, a mãe tra-balha, o pai também. À noite também não dá,porque muitos ainda continuam estudando,

fazem supletivo ou ensino médio regular. Elesconfiam demais na Fundação, acreditam notrabalho, acham a escola boa, ficam tranqüilospara trabalhar enquanto os filhos estão lá,porque é dessa segurança que qualquer pai,qualquer mãe precisa hoje em dia.

Sou muito grata a Deus pela Fundação teraparecido na minha vida. Trabalho com umaequipe de profissionais muito boa, onde o re-lacionamento pessoal é bom também. Achoque é um presente trabalhar com aquelas crian-ças, com aqueles adolescentes e com aquelasfamílias. Sou apaixonada pelo que eu faço.

O valor principal da Fundação é a genero-sidade. Eu acho que o casal fundador deu omaior exemplo de generosidade. Todo diaquando chegamos para trabalhar temos quepensar que estamos cuidando do sonho deduas pessoas. Elas tornaram esse sonho reali-dade através de um ato de generosidade mes-mo. E eu tenho muita esperança, tenho certe-za que vamos conseguir ter o ensino médio,para acompanhar a criança desde os 6 meses eela sair com o ensino médio completo e cominiciação profissional já bem enraizada, parapoder ingressar no mercado de trabalho bemqualificada. O que sempre procuramos deixarpara essas crianças e jovens, e vamos conti-nuar deixando, é: “Tudo é um caminho. Aeducação e a aprendizagem são um caminho.Não parem nunca”.

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u me chamo MARIA DAS GRAÇAS DASILVA FERREIRA, tenho 43 anos enasci em Recife, Pernambuco. Meus

pais estiveram casados por 48 anos e só foramseparados porque Deus chamou minha mãe.Fomos uma família maravilhosa, de altos ebaixos, como todo mundo, mas a educação,para eles, era fundamental: tinham as regras eexigiam que fossem cumpridas. Isso, hoje, ser-ve de lição para mim e para meus filhos. A mi-nha mãe sempre dizia: “O mundo é um livroaberto, tem as coisas ruins e as coisas boas. Vo-cê segue o que quiser”.

Nós somos sete irmãos, muito unidos. Es-tudei em uma escola de freiras, parecida coma da Fundação porque meu pai conseguiuuma bolsa federal. Eu e as minhas irmãs tí-nhamos que estudar, mesmo, porque senãoperdíamos a bolsa. Terminamos o 2º grau e

não estudamos mais, porque não foi possível,mas eu não tenho do que reclamar. Meu paiera maravilhoso, não batia na gente, conver-sava, e minha mãe era a mesma coisa.

Eu vim direto de Recife, onde conheci meuesposo, mas a família dele todinha morava – emora – no Rio de Janeiro. Os avós tinhamuma chácara em Recife e para ele ir para lá, vi-sitá-los, tinha que passar pela chácara da mi-nha mãe. Como eu estudava, ele me via quan-do eu ia tomar a lotação de manhã. Quandonós nos casamos, ele pediu demissão no Rio efomos morar em Recife. Ficamos dois anos lá,mas os salários eram muito baixos e ele suge-riu que voltássemos para o Rio de Janeiro. En-tão, foi investigar os preços de aluguel lá emCopacabana, viu que era muito caro e disseque tinha medo de ir morar no subúrbio dacidade. Eu falei: “Vamos fazer o seguinte: você

A minha mãe sempre dizia: “O mundo é um livro aberto, tem ascoisas ruins e as coisas boas. Você segue o que quiser”.

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não tem uns parentes que moram lá em SãoPaulo há mais de 15 anos? Você vai até lá e vêo preço dos aluguéis”.

Estou em Jundiaí há 12 anos e cheguei aobairro do Varjão há seis. Antes, morava nocentro e pagava um aluguel absurdo! Na épo-ca, meu marido conseguiu uma herança damãe, que morava num apartamento em Co-pacabana. Depois da morte dela, venderam oapartamento e com a renda que ganhamos fi-nanciamos uma casa.

Eu não sabia como era no Varjão. Não co-nhecia ninguém, mas acabei conhecendo umamãe que participava das atividades do Núcleo,a mãe do Eric, num dia em que estava indo aomédico. Ela entrou no ônibus com uma crian-ça no colo. Olhei para ela: “Pode sentar-seaqui.” Ela falou: “Você vai me dar a cadeira?” –eu estava sem criança, ela estava com uma me-nina de uns 2, 3 anos, na época – e agradeceu.Começamos a conversar e ela falou: “Você éesposa do Francisco, né?” E eu: “De onde vocêo conhece?”. Ela respondeu: “Eu conheço o seuesposo porque minha mãe estava vindo da ci-dade com umas sacolas, ele se ofereceu paraajudá-la e foi com ela até sua casa”. Isso memarcou muito. Meu esposo sempre foi assim,ele faz essas coisas e “treina” os filhos, tam-bém. Aí, ela perguntou quantos filhos eu ti-nha, continuamos a conversa.

Passou um tempo, perguntei: “Quantos fi-lhos você tem?”. Ela disse: “Tenho um lá naCidade dos Meninos”. Eu falei: “Nossa! Co-mo você conseguiu? O pessoal fala tão bemdessa escola!”. Ela me disse como chegar atéo Núcleo. No dia seguinte, logo de manhã,levei os meninos para a escolinha e fui até lá.

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Maria das Graças da Silva Ferreira

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Pedi R$ 0,50 para minha chefe, na época, efui. Cheguei, procurei a Márcia e ela veio meatender, muito educada. Nossa! Saí com ocoração enorme de tanta felicidade, porque,quando a pessoa passa coisas positivas, vocêfica leve. Nem contei para ela que eu estavasó com R$ 0,50. Ela me orientou sobre aFundação e disse: “Maria das Graças, temuma vaga para a Natália na 2ª série e para oArthur na 1ª série”. Ela fez a inscrição e mefez prometer que voltaria com as cópias dosdocumentos, porque muitas mães vinham,eram orientadas e não voltavam. Pedi R$1,00 para uma conhecida, corri tirar xerox,não deu nem 15 minutos. O Arthur fez a 1ªsérie de reforço, no final do ano fez umaprovinha para entrar na Cidade dos Meni-nos e sei que se saiu muito bem.

Uma coisa que me chamou muito a atençãofoi que os professores da Fundação não avali-am os alunos só no provão, mas sim de umamaneira contínua. Você pode não atingir umanota, mas você pode ser alguém por outra coi-sa, então, eles avaliam a criança como um to-do, desde o comportamento até a prova. Issoeu acho o máximo!

Meu filho é muito responsável, uma crian-ça que não gosta de faltar à aula. Uma vez, eumarquei uma consulta às 8 horas da manhã.Falei para ele: “Arthur, sua aula é à tarde. Demanhã é atividade, você vai faltar por algu-mas horas. Eu mando um bilhete antes, di-zendo que você vai ao pediatra e vai chegarum pouco mais tarde.” E ele: “Não, mainha,eu vou ficar sem acompanhar os meus cole-gas. As minhas atividades vão ficar incomple-tas!” Ele até chorou! E continuou: “Mãe, pos-

so perguntar uma coisa? Porque nós não va-mos no fim de semana ao pediatra? Porquesábado e domingo não tem aula”. Ter essepensamento com a idade que ele tem! Isso foitudo na minha vida! E significa que a escola éuma aprendizagem! Ele adquire bastante co-nhecimento, chega conversando, dá lição demoral na Natália, que tem 9 anos. Onde eleaprende? Aqui em casa eu ajudo, mas a escolaé um complemento.

Participar do projeto deste livro foi, paramim, uma coisa fantástica! Eu fico feliz por te-rem me indicado, até comentei com uma vizi-nha sobre a entrevista e ela me disse que fuiescolhida porque mereço, faço por onde: levomeus filhos a pé em um lugar bom, onde temuma educação de qualidade e são respeitados.De segunda a sexta-feira eles fazem catequese,longe de casa, e eu também os levo. Para mim,é importante acreditar em Deus. Às vezes, oArthur fala que a comida está ruim e digo:“Meu filho, está ruim porque a mamãe não sa-be cozinhar. Agradeça a Deus porque nós te-mos comida”. Todo dia agradeço pelo que te-nho, porque tem gente que não tem saída e vaiao lixo procurar o que comer. Eu falo para aNatália: “Olha, eu tinha só uma bonequinha,você tem bonecas que crianças não têm. En-tão, vamos aprender a dividir aquilo que vocênão gosta mais, passar para alguém que nãotem”. É muito importante pensar no próximoe saber dividir também.

A Fundação ajuda muito a passar valoresbons para as crianças, esses valores que eumesma tive desde menina. Nossa! E comoajuda! Só não aproveita quem não quer. Eununca perdi uma reunião de pais, porque

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acho muito importante participar. A gente éuma família e precisa da participação de ca-da um. Teve dia de reunião em que eu estavasem dinheiro, mas dei um jeito e fui até lá. Eugasto R$ 9,00 daqui até a Cidade dos Meni-nos e Meninas e há dias em que não tenho R$ 1,00 para o pão. Não estou mentindo...Não é que eu esteja passando fome, não, mas,quando só uma pessoa trabalha na família,dificulta na hora de “mexer os pauzinhos”. Eutrabalhei na enfermagem por 22 anos e estousem emprego desde 2004, devido a um pro-blema de saúde.

O que me marcou muito, como mãe, foi amudança de comportamento que pude ob-servar no Arthur, depois que ele começou afreqüentar o Núcleo, a Cidade dos Meninos eMeninas. Ele possuía uma energia que tinhaque ser gasta com alguma coisa, e como mi-nhas condições são poucas... Então, eu ga-nhei um presente da Fundação: assim comosou mãe do Arthur, a Fundação foi uma mãecomigo. Deus me abriu as portas e me aju-dou muito. Meu filho melhorou 90%, porqueninguém é 100%, e todos vêem as mudanças,me dão os parabéns. Ele é outra pessoa, nãoque fosse um menino ruim, agressivo, masele não parava, queria ver tudo, brincar, cor-rer, era muito elétrico. A educação que eudou em casa é complementada na escola, quecolaborou muito comigo. Ele não gosta defaltar, de perder as atividades, e eu acreditoque está aproveitando muito bem. Eu costu-mava chorar de emoção, de felicidade pelasorte do Arthur. Não tenho vergonha de fa-lar... Eu espero que a Fundação seja cada vezmelhor no futuro! Talvez eu não esteja mais

presente, mas quem vai dar continuidade sãonossos filhos! Eu falo para o meu que eletambém vai se casar, ter filhos, e os filhos de-le vão estudar, quem sabe, na mesma escolaem que ele estudou.

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eu nome é RODRIGO DO PRADOCAETANO. Nasci em Campo LimpoPaulista, perto de Jundiaí, no hos-

pital Nossa Senhora do Rosário, no dia 11 demarço de 1984. Meus pais são do interior deMinas. Minha mãe, Benedita do Prado Caeta-no, é de Munhoz, e meu pai, Miguel ArcanjoCaetano, é de Extrema. Tenho seis irmãos porparte de pai, dois irmãos legítimos, e eu sou ocaçula. Tenho o 2º grau escolar completo.

Meus pais são separados. Nós éramos três:eu, um irmão e uma irmã. Então, minha mãetinha que trabalhar e não havia com quemdeixar os filhos. Ela ficou sabendo de uma es-cola que era semi-internato, cuidada por pa-dres... Então, inscreveu a mim e a meu irmãoe fizemos uma prova. Só eu passei. Fui estu-dar na Fundação, em 1992, com 7 para 8 anosde idade.

Sair de casa para ir para um internato foi“fogo”. Nós, meninos, não éramos acostuma-dos a dormir cedo e havia a questão da liber-dade que tínhamos na rua, de fazer o que que-ríamos, correr, soltar pipa... Lá, não: existiamregras e isso foi o mais complicado. Eu já ha-via feito a 1ª série em escola pública, mas, co-mo o nível escolar era baixo, tive que voltarpara a 1ª série. Senti muita diferença entre aescola pública e a escola da Cidade dos Meni-nos! Ela era mais rígida, devido à presença dospadres, e eu não estava acostumado comaquele esquema regrado, com aquele cotidia-no de estudos, com tudo ter uma hora. Depoisfui me acostumando, o ensino era muito bom.Na 4ª série, eu não consegui acompanhar: re-provei e saí da escola. Senti muita diferençaentre o internato e o sistema mais aberto. Foiuma mudança repentina, difícil até a gente se

Ao longo do tempo, passar de aluno a funcionário daFundação foi estranho, mas depois me acostumei, peguei ogosto. Você via (...) aquela criançada toda, a questão afetiva,(...) muitos eram carentes. Era legal ver esses meninos queentravam, eles cresciam muito rápido! Você voltava de férias e estavam todos enormes!

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acostumar. Mais tarde, eu continuei a estudarna Fundação. Fiquei oito anos, no total.

Quando entrei na Cidade dos Meninos,nós íamos embora no sábado. Chegávamosde volta na segunda-feira, tomávamos o café eíamos direto para a escola. Nos outros dias dasemana, acordávamos às 6h30, 7 horas, tínha-mos nossa rotina e íamos para a escola. A me-renda era às 10 horas e ao meio-dia tinha o al-moço. Os alunos eram divididos entremenores e maiores de 12 anos: os maioresiam fazer cursinho no Senai e os menores fa-ziam a limpeza na escola. Todos os dias, tí-nhamos uma tarefa: varrer o corredor, varreralguma coisa, rastelar... Depois da limpeza, ía-mos brincar, fazer exercícios ou educação físi-ca. Às 16h30, 17 horas, subíamos para tomarbanho e às 18 horas tínhamos mais um inter-valo, hora de brincadeira e depois a janta, se-guida do estudo. Ficávamos até as 22 horas, eàs vezes não havia nada para fazer, mas o pa-dre não deixava a gente ir dormir e dizia: “Pe-ga o livro! Dá uma lida!”. Ficávamos fazendoo dever e depois, sim, íamos dormir. Tinha fi-la para fazer oração, para o almoço, antes deentrar para o almoço, no jantar...

O Romualdo era o professor de EducaçãoFísica e todas as sextas-feiras a gente corria lápara a Serra do Japi, ia às cachoeiras, passear.Toda sexta-feira era uma corrida. Lembro-me que eu era o “menorzinho”, não agüenta-va correr muito, e vinha um correndo nafrente e outro atrás, com uma varinha. Então,quem corria menos, a varinha “tááá!”, batia.Tinha que correr, não havia jeito. Mas essaquestão de passeio era muito bacana mesmo.Nossa!

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Rodrigo do Prado Caetano

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Na época em que comecei a fazer o Senai,eu não tinha 12 anos completos ainda, entãoentrei como ouvinte, até atingir a idade. Fiz oscursos de elétrica, serralheria, marcenaria emecânica geral, que foi o último e o que maisme ajudou depois que saí da Cidade dos Me-ninos. Fiquei fora da Fundação por quase doisanos, quando surgiu uma oportunidade de fa-zer o curso de restauração na Fazenda Ermida.Fiquei uns três anos, fiz o curso e depois pas-sei a prestar serviços para a Fundação. Traba-lhei assim por uns três, quatro meses. Aí, abri-ram duas vagas, uma para trabalhar noAlmoxarifado e a outra de ajudante de marce-neiro. Viemos eu e o Evailson, que trabalhano Almoxarifado ainda. Como eu tinha ocurso de marcenaria, fui para a área e fiqueipor mais três anos. No último ano, tive achance de restaurar a máquina de beneficiarcafé da fazenda... Fiquei um ano restaurando,montando tudo. Trabalhar com restauro foibacana mesmo. O curso de restauro me aju-dou muito.

Ao longo do tempo, passar de aluno a fun-cionário da Fundação foi estranho, mas de-pois me acostumei, peguei o gosto. Você via opessoal, aquela criançada toda, a questão afe-tiva... Todos te conheciam e todo mundo ti-nha apelido: o meu era Zoinho. Eu tentei tiraresse apelido, mas não consegui, e, quando vol-tei como funcionário, passei a ser o Zóio.Mantive aquele vínculo com o pessoal, com acriançada, muitos eram carentes. Era legal veresses meninos que entravam, eles cresciammuito rápido! Você voltava de férias e estavamtodos enormes! Eles vinham e contavam co-mo tinha sido as férias, conversavam. Eu sei

que era bacana. Saí de lá em 2007, entrei emoutra firma, aí passei para a que estou agora,tudo como marceneiro.

Várias pessoas marcaram minha passagemlá dentro: a professora Neuza, a professoraEmiko, o professor Favarim do Senai, que tra-balha lá, ainda; o pessoal da limpeza, a Maria.Quando eu entrei, ela trabalhava na cozinha,depois ela veio para a lavanderia. Até hoje elasabe o número da minha roupa – as roupasdos alunos eram numeradas –, 141. Ela sepa-rava, passava, tudo. Mas há muitos funcioná-rios, grandes amigos, na realidade.

A Fundação tem um grande nome, de res-peito, pela questão de cuidar das crianças. Elame ajudou em tudo o que eu sou. Na questãode caráter, de educação... Foi super importan-te na minha vida, com aqueles pequenos deta-lhes que fazem a diferença. A questão da hu-mildade é um ensinamento que carregosempre comigo, a questão do dividir, porque,quando você convive em grupo, você sabe quetem que respeitar o colega, tem que dividir.Esses valores, além da disciplina, me fazem termuita confiança hoje. Acredito muito emoportunidades melhores, em condições me-lhores, tanto para mim como para todas aspessoas. Acredito em capacidade, acho que aspessoas têm que se esforçar. Eu fui privile-giado com a oportunidade de estudar na Fun-dação... Sou um sortudo na vida, ganhei namega-sena.

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ou ALESSANDRA SANTOS AMARAL.Nasci em Jundiaí no dia 26 de maio de1990. Minha mãe é falecida. Vivo com

meu pai e também com minha irmã, LaizaSantos Amaral. Moro aqui, no bairro de Cida-de Nova, há apenas um ano e meio. Por mui-to tempo morei na Várzea, mas sempre convi-vi bastante no centro de Jundiaí, onde estudei.

Hoje, estou no terceiro ano do Ensino Mé-dio. Eu tinha 13 anos quando entrei na Funda-ção, em março de 2003. Meus pais queriamdeixar-me ocupada, além dos estudos, e pro-curaram um lugar próximo à escola para meinscrever. Eu estudava no Sesi, estava na 6ª sé-rie. Naquele momento, eu não queria ir para aTalita Kum porque eu queria bagunçar, bagun-çar, e, se eu ficasse ocupada o tempo todo, nãoia conseguir. Mesmo assim, eu entrei e real-mente não tinha horário para mais nada: saía

da escola e ia direto para as oficinas. Era gosto-so, mas eu fui forçada no começo... Na realida-de, meu pai me colocou lá porque eu estavaquerendo namorar e ele não deixava, pois sópoderia namorar quando tivesse 15 anos – ain-da bem que eu vou fazer 18 – e minha mãeachava que ali era ainda um internato e seria asolução para as minhas indisciplinas.

No meu primeiro dia efetivo de aula, as ir-mãs ficaram muito comigo, acolheram-mebastante. Eu senti muita diferença entre a Tali-ta Kum e os outros lugares em que já havia es-tudado, porque era um pessoal de convíviopermanente. No Sesi, havia alunos com maiorpoder aquisitivo, que faziam cursos em escolasparticulares, mas eles não tinham o mesmoque eu, a formação humana, comunicação eexpressão, que me ajudaram bastante, o cari-nho, o afeto, tudo que a gente tinha na Talita

...os sapos que eu engoli haviam se transformado em joaninhasque estavam comendo tudo de ruim dentro de mim, tirandotudo que fazia sentir-me mal...

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Kum. As irmãs tratavam a gente com atenção,não simplesmente como alunas. Se você estavatriste, elas procuravam saber, conversavam...

As meninas “de fora” só iam lá para fazercursos e, normalmente, no período da tarde.No período da manhã, não havia quase nin-guém. Nos dias em que as meninas “de fora”iam para a Talita, as meninas internas da Fun-dação tinham seus cursos na Cidade dos Me-ninos; só às terças e quintas-feiras vinham pa-ra a Talita Kum. Como estava lá praticamentetodos os dias, eu era a única que tinha conta-to com elas. Fiz amizade com a maioria, atémesmo com aquelas que, no começo, erammais desconfiadas. Era normal elas sentiremciúmes, já que estavam perdendo um pouqui-nho de seu canto. Eu também senti ciúmes dasmeninas que vieram depois de mim, olha quecoisa engraçada! Foi por muito pouco tempoque eu disse: “Não quero vir para cá”. Achoque, em um mês, já falei: “Ah, eu quero ficaraqui”. As meninas realmente interessadas ti-nham muito contato com os professores, mui-to de carinho, muito de abraçar no intervalo e,como eram poucas, ficava todo mundo junto.Quando vieram mais meninas “de fora”...

Até 2006, eu ia todos os dias para a Talita,depois passei a ir dois dias por semana. Nessaépoca, meu pai achava que eu estava bagun-çando demais e queria “cortar minhas asi-nhas”. O que aconteceu foi o seguinte: eu en-trei na Fundação porque queria namorar e saíporque estava namorando. Meu pai estavamuito apegado ao meu namorado, não queriaque eu terminasse com ele, e falou que, se euestava querendo aprontar, não ia mais fazer oscursos... Porém, a Cida conversou com ele,

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Alessandra Santos Amaral

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disse que ia ter um curso importante... No fi-nal do ano, meu pai cortou de vez porque eucomecei a trabalhar num estágio onde fui in-dicada por uma professora da Talita Kum.

A lembrança mais marcante que tenho daFundação é o primeiro Festival da Alegria. Co-mo disse, eu era a única pessoa “de fora” quetinha contato permanente com as meninas e aminha apresentação foi separada das outras.Eu batalhei muito para fazer a minha parte,porque elas se fechavam, mas, quando chegouo festival, a gente comemorou, todo mundo seabraçou no final... Foi emocionante.

Apesar de ser um lugar dirigido por freiras,as irmãs nunca obrigaram a gente a rezar nacapela – a não ser em datas religiosas, Sexta-Feira Santa, quando o almoço era no conventomesmo. Nunca forçaram ninguém a gastar pe-lo menos dez minutos lá dentro, mas sempredisseram que as portas estavam abertas. Eramuito bom nos momentos em que a gente es-tava triste... Quando perdi minha mãe, eu pas-sava bastante tempo na capela. Era normal vo-cê passar e ver alguém chorando ou ajoelhada.

Eu me dava bem com todos ali... As duaspessoas com as quais eu mais me apeguei fo-ram a Cássia, que lecionou revisão de mate-mática para vestibulinho por um tempo e meencaminhou para o meu primeiro estágio, e oCláudio, professor de teatro com quem façoaula até hoje, fora da Fundação, e que me aju-dou muito... Logo depois que a minha mãemorreu, meu namorado – o “motivo” de eu terentrado para a Talita Kum – sofreu um aci-dente e ficou paraplégico. Eu vivia dizendo:“Por que tudo tem que acontecer comigo? Mi-nha mãe falecer, meu namorado ficar paraplé-

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gico. Por que tudo comigo?”. E o Cláudio meensinou a “engolir sapos”. Eu chorava muitocom ele, muito mesmo, porque ele me enten-dia. Hoje é diferente, mas, naquela época, eunão conversava muito com meu pai... Ele teveum choque por ter perdido a esposa e nós fi-camos muito separados. E eu sempre brigueicom minha mãe, tanto que ela faleceu com agente brigada. Lembro-me que, no meu ani-versário, o Cláudio me deu uma carta e umajoaninha – o símbolo da Talita Kum. Ele disse-me que, depois de certa quantidade de saposque você tinha engolido, eles saíam do corpo,através de vômitos, espinhas, catarros, tudo.Os que não saíam, ficavam na pele e se trans-formavam em joaninhas. As joaninhas comemos pulgões da plantação. No caso, os sapos queeu engoli haviam se transformado em joani-nhas que estavam comendo tudo de ruimdentro de mim, tirando tudo que fazia sentir-me mal. Isso marcou muito e, até hoje, os bi-chinhos que ele me dá são sapinhos. Foi umapessoa que me ajudou bastante.

Eu sinto muito orgulho de fazer parte dos50 anos da Fundação, muito orgulho! Porqueeu sei que fui uma boa aluna e fiz um poucoda história também. Em novembro do anopassado, eu tinha saído do meu estágio e fui àFundação me oferecer para ajudar nas aulas –eu poderia ajudar nas aulas de teatro, de arte-sanato, como auxiliar dos professores. A Cás-sia “loira” e a Cida me falaram: “Vai ter um fó-rum educacional com pessoas de São Paulo.Vai ser na prefeitura e eu preciso de algumasmeninas para ir lá, meninas que tenham pos-tura...”. Fui participar do fórum e ganhei a ca-miseta dos 50 anos da Fundação que me ensi-

nou tudo. Se entro em um emprego e a pessoapergunta onde fiz os cursos, eu explico comofiquei lá muito tempo – obviamente, não voucontar o motivo pelo qual entrei e pelo qualsaí! E espalho sobre a Fundação, que não émuito conhecida, mas tem bastante gente quediz já ter ouvido falar sobre ela.

Eu acredito que a Fundação transforma aspessoas. Se elas deixarem, transforma, sim, seumodo de pensar, de ver as coisas. Você passa aver tudo de um modo diferente, mais amplo.Você não fica só naquele seu “grupinho” ado-lescente com uma visão “besta” das coisas. NaTalita Kum, “puxavam-lhe as orelhas” e vocêficava mais atenta para o mundo. Eu entrei lábem “molecona”, com gírias, e saí falando deum jeito mais sério. A Fundação significamuito para mim, tudo o que aprendi, tudo oque tenho hoje. Tudo. Todos os cursos que fizsão de lá. Se sou muito carinhosa hoje, podeter certeza que aprendi com o pessoal de lá. Sesei ter uma postura diante de certas coisas, seme saio bem no serviço, é porque aprendi lána Fundação.

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A Fundação hoje, para o amanhã

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VALORIZAR PARA TRANSFORMAR

MÁRCIA ALEXANDRA LEARDINE,

coordenadora pedagógica da Escola

a Escola Antonio Cintra Gordinho vive-mos no exercício de olhar o cotidiano e

estudar as propostas de reformas educacionaise das novas exigências de mudança de currí-culo, sempre pensando no bem-estar das cri-anças e na sua educação de qualidade.

Recentemente um novo desafio se descorti-nou para nós com a ampliação do EnsinoFundamental para nove anos de duração e in-gresso da criança aos 6 anos de idade.

Visando atender às novas exigências, temosacompanhado as publicações do MEC, nosorganizado por meio da formação continuada

dos coordenadores, da seleção de materiaispedagógicos e da revisão do projeto pedagógi-co e do plano curricular. Nossa equipe tem sepreocupado em buscar respostas às dúvidas equestionamentos que essa mudança nos traz,refletindo nas contribuições e adequações queserão necessárias para garantirmos que o no-vo sistema seja implantado.

Na Escola Antonio Cintra Gordinho, du-rante 5 horas as crianças estudam formalmen-te os conteúdos, e os conceitos apresentadossão desenvolvidos por meio de atividadesatuais e desafiadoras, possibilitando conexõescom a vida e a realidade delas. Exploram oambiente que as rodeia – ar puro, pomar, hor-ta, curral, piscina, quadras, campos, laborató-rio de informática – e experimentam suasdescobertas, participando ativamente do pro-cesso como interlocutores da própria aprendi-

N

CIDADE DOS MENINOS E MENINAS ESCOLA ANTONIO CINTRA GORDINHO

Este espaço está inserido numa área rural de Preservação Ambiental da Mata Atlântica, naSerra do Japi. Aproveitando este contexto, nela são desenvolvidas atividades como EducaçãoAmbiental, Formação Humana e Cidadania. A Escola Antonio Cintra Gordinho proporcionaensino fundamental a 198 alunos, em salas de 25 alunos cada uma, o que possibilita um tra-balho pedagógico de qualidade. Além da grade curricular obrigatória, os alunos participamde oficinas de teatro, dança, iniciação musical, ateliê de artes e esportes, permanecendo naunidade das 7 até as 17 horas. Nesse período, as crianças têm quatro refeições balanceadase apoio médico-odontológico.

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zagem. Nas outras quatro horas do dia, pro-fessores especialistas ministram aulas em ofi-cinas de artes, música, teatro, dança, capoeira,kung fu, hora de estudos, biblioteca e reforçoescolar, numa rica vivência artística e cultural.

Os professores buscam proporcionar aosalunos a valorização daquilo que eles trazemcomo conhecimento construído e a oportuni-dade de exercitarem o pensamento e a ação.Desenvolvemos um programa avaliativo dife-renciado que tem por objetivo valorizar aqui-lo que a criança já conquistou e buscar alter-nativas para tentar oferecer aquilo que lhefalta!

Esses profissionais estão comprometidoscom seu trabalho e assessorados pela coorde-nação pedagógica, uma vez por semana, paraavaliação das atividades desenvolvidas e reso-lução de possíveis problemas. Eles também sereúnem semanalmente para estudos sobre ocurrículo, reflexões, sugestões e diálogos,pensando a própria prática no coletivo, bus-cando diminuir a trama abstrata e a distânciaacadêmica.

Da mesma forma, a equipe de coordenado-res se reúne quinzenalmente para estudar, re-fletir e pensar o currículo e seus desdobra-mentos sobre nossa prática, podendo contarcom o apoio de uma supervisora doutora emEducação, a diretora da Fundação e a vice-presidente do Conselho Administrativo.

Os pais ou responsáveis por essas criançastambém participam de todo o processo, poisincentivamos a parceria da família, seja nosoferecendo mais dados, seja acompanhandoseus filhos e cobrando deles as responsabilida-des que lhes cabem em relação à escola. Eles

recebem, também, orientações por meio depalestras oferecidas pela Fundação.

Escola e família em parceria é a receita dosucesso que estamos alcançando. Juntos, pre-paramos as crianças para conviver, fazer e co-nhecer o mundo do qual todos fazemos parte,com atitudes e valores que primem pela valo-rização da vida em todos os sentidos.

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INICIAÇÃO PROFISSIONAL COMO MAISUM CAMINHO

LEONARDO SAUIN

Instrutor de elétrica do Cetec

Cetec é uma unidade da FAACG locali-zada na Cidade dos Meninos e Meni-

nas, cujo espaço proporciona a vivência teóri-ca e prática com equipamentos e ferramentasespecíficos de cada curso.

Os cursos, que são de iniciação profissionale viabilizados com recursos provenientes deparceria com o poder público e iniciativa pri-vada, têm demonstrado, ao longo dos anos, oseu resultado por meio da colocação dos alu-nos frente a um mercado profissional cada vezmais exigente.

Temos o caso de um aluno que se formouneste ano no curso de Construção Civil e Res-tauro e foi contratado por uma grande em-presa da cidade de São Paulo para exercer afunção de auxiliar de engenharia. Isso nosproporcionou muito orgulho! Oferecemos ànoite, também, um curso avançado na área deelétrica para a comunidade. Graças a ele, tive-mos vários casos de colocação profissional eascensão na carreira dos participantes.

Essa unidade da Fundação Antonio-Anto-nieta Cintra Gordinho busca oferecer a quali-dade na educação, para que casos de sucessosejam cada vez mais freqüentes.

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CIDADE DOS MENINOS E MENINAS CENTRO DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA ELOY CHAVES (CETEC)

O Centro oferece cursos de capacitação para 135 jovens, pais de alunos ou interessados dacomunidade em geral, a fim de inseri-los no mercado de trabalho local nas áreas operacio-nal e técnica, além do incentivo ao empreendedorismo. Os cursos de nível técnico básico sãoInformática, Edificações e Restauro, Eletrotécnica, Panificação e Confeitaria, Marcenaria,Elétrica e Telefonia. O projeto possui recursos provenientes de parcerias com o poder públi-co e iniciativa privada, além da Fundação.

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UMA APOSTA NO POTENCIAL DO EDUCADOR PESQUISADOR E CRIATIVO

ANA TERESA GAVIÃO

Coordenadora pedagógica da Creche e Escola

de Educação Infantil Almerinda Pereira Chaves

formação do educador acontece em di-ferentes tempos e espaços: a formação

prévia no ensino médio (Magistério) ou noensino superior, em que circulam conheci-mentos básicos necessários para a atuaçãocom as crianças; a formação nos movimentossociais – fóruns, associações, congressos – pa-ra uma boa orientação de cunho político; aformação cultural que favorece experiênciascom a arte de forma geral; e a formação nainstituição escolar que propicia estudo, leitu-ra, discussão em grupo para a compreensão

do cotidiano da creche e/ou pré-escola. Esteúltimo ponto, a formação do educador naprática, é um tema fundamental para contri-buir com a qualidade na educação infantil.

A Creche e Escola de Educação Infantil Alme-rinda Pereira Chaves atende crianças de 0 a 6anos. A instituição se inspira nos princípios daabordagem de Reggio Emilia (Itália) na Educa-ção da Primeira Infância. Para isso, uma das pro-postas foi a criação de espaços de formação aoseducadores. Os professores, assim como as crian-ças, estão no processo de aprendizagem; estão noprocesso de compreender e aprender a elaboraruma cultura da educação infantil. A formaçãoé um momento especial e um espaço organiza-do para leituras, pesquisas, discussões e, sobre-tudo, para refletir a própria prática educativa.

Os encontros de formação ocorrem no localde trabalho, uma vez por semana, durante

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A

CRECHE E ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL ALMERINDA PEREIRA CHAVES

A creche foi inaugurada em 1981 e atende 106 crianças de 6 meses a 6 anos de idade. Comuma equipe de profissionais altamente qualificada, são desenvolvidas diversas atividades,guiadas pela proposta educacional sociointeracionista, com enfoque na pedagogia de ReggioEmilia (Itália). O prédio foi especialmente construído para abrigar todas as faixas etárias econta com amplo espaço externo, onde estão instalados um parquinho, horta, campo de es-portes gramado, caixas de areia e espaço coberto. As crianças permanecem diariamente emtempo integral, entre as 7 e as 17 horas.

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uma hora e trinta minutos. As educadoras so-cializam as leituras, trocam experiências, dúvi-das e aprendizados; reorganizam a rotina edu-cacional; discutem a obra pedagógica de LorisMalaguzzi (idealizador da abordagem italia-na); refletem o trabalho com projetos na edu-cação infantil a partir da prática em sala de au-la. Ademais, uma vez ao mês, realizamos visitasa outras instituições (escolas, museus, mos-tras) e encontros com outros profissionais pa-ra a sensibilização e o aprofundamento dos te-mas propostos na formação. Um exemplosignificativo foi a palestra organizada em agos-to de 2008, pela Fundação Antonio-AntonietaCintra Gordinho, ministrada por Bruna ElenaGiacopini, representante de Reggio Emilia.

É importante destacar que a formação do-cente é permanente, é uma atitude da escola,uma atitude do educador que se propõe a es-tudar, a trocar conhecimentos com os colegas,a investigar o processo ensino-aprendizagem,a criar contextos educativos às crianças poten-tes que recebemos.

Como nos ensina Loris Malaguzzi, em en-trevista publicada na obra As cem linguagensda criança, “pensamos em uma escola para cri-anças pequenas como um organismo vivo in-tegral, como um local de vidas e relaciona-mentos compartilhados entre muitos adultos emuitas crianças”; portanto, um local em contí-nuo ajuste, que se transforma e se ressignificaatravés dos encontros de formação, do diálogo,do confronto, da partilha de pensamentos eemoções. A formação é uma proposta, umaaposta no potencial do educador – pesquisa-dor, construtor de conhecimentos e criativo,para ver, escutar e desenvolver os direitos e po-tencialidades das crianças pequenas.

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çou a ganhar peso e passamos a colocá-lo sen-tadinho, com almofadas ao seu redor, porémsua cabecinha continuava sem sustentação.Sua expressão era triste, seu olhar era triste.Com o passar do tempo, depois de ensinar-mos os bebês a brincarem ao seu redor e desempre conversarmos com ele com muitoamor e muita música, tivemos a sua primeirareação: um sorriso. A felicidade foi imensa e apreocupação passou a ser tranqüilidade, poistivemos a primeira certeza que estávamos nocaminho certo.

Hoje, o menino está com 2 anos e já fala al-gumas palavras, imita a professora, brinca eestá feliz, demonstrando, também, o carinhoque tem pela escola, pois, no horário de ir em-bora, sempre chora.

Se cada educador fizer a sua importantemissão de incentivar uma vida saudável nacriança, certamente teremos resultados muitopositivos.

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A ATENÇÃO ÀS NECESSIDADES DASCRIANÇAS

ALEXANDRA GARCIA DOS SANTOS

Coordenadora pedagógica da Escola

de Educação Infantil

stou na unidade há três anos e há umahistória que me emociona até hoje. No

ano de 2006, recebemos a mãe de um alunoque necessitava de ajuda para cuidar de seu fi-lho ainda bebê. Quando essa criança chegou àcreche, não estava nas condições normais deseu desenvolvimento.

Sabemos que a criança se constrói na inte-ração com o meio e o movimento é uma dasformas que temos para interagir com o mes-mo, mas o menino, com 7, 8 meses não corres-pondia ao desenvolvimento da sua faixa etá-ria. Fiquei muito chocada e chamei o pediatrada unidade, que diagnosticou uma desnutri-ção muito forte: a criança não sustentava opróprio tronco, nem a cabeça, e não fazia mo-vimentos com os braços e pernas que seriamnormais para sua idade.

Nós, da equipe, nos mobilizamos e, sensibi-lizados, começamos a dar muito carinho e es-timular essa criança em todos os sentidos,principalmente na parte motora. Por falta decondições da família, a criança não supria su-as necessidades alimentares adequadamente.O primeiro aspecto cuidado foi a alimentação,e da cozinha da creche saíam refeições espe-ciais para o menino, inclusive o jantar, que eralevado para casa.

No início, ele sempre ficava no colo e nãobrincava com os outros bebês, até que come-

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UM PROJETO ESPECIAL PARA MENINAS

MARY LESSI DOS SANTOS

Coordenadora pedagógica da Talita Kum

s vezes, fico pensando o que realmente édo homem e o que é de Deus, e parece

que a resposta aparece todos os dias na TalitaKum. A história dessa casa tem origem com adoação do espaço físico por uma grande mu-lher, a sra. Antonieta, às Irmãs Carmelitas Te-resianas, para que ali fossem acolhidas meni-nas desamparadas por suas famílias. Atéentão, contávamos com uma casa sem acomo-dações, embora já com algumas moradoras.De repente, em diferentes circunstâncias, co-meçaram a chegar voluntários, clube de servi-ços à comunidade e, por obra de homensabençoados por Deus, tudo começou a fun-

cionar. Como valeu a pena! Hoje, grande par-te daquelas garotas são mães e cuidam amoro-samente de seus filhos.

A casa seguiu funcionando à base de doa-ções, crescendo e cada vez com menos possi-bilidades de se manter. Eis que aparece um ho-mem chamado Vail Chaves, enviado à TalitaKum, e oferece a ajuda necessária através daFundação Antonio-Antonieta Cintra Gordi-nho, que traz a força de um trabalho educa-cional. Como valeu a pena! Hoje, muitas me-ninas estão colocadas em escolas técnicas,conseguiram seu espaço no mercado de traba-lho, construíram um projeto de vida.

Como acontece com tudo que é vivo e quercrescer, novos desafios se colocaram. Sabía-mos que contávamos com a inspiração divina,com uma equipe iluminada, com grandes ho-mens nos bastidores, mas ainda havia mais a

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TALITA KUM - OFICINAS EDUCACIONAIS

O local era originalmente um abrigo para meninas em situação de risco social e hoje funcio-na como uma unidade aberta à comunidade e que oferece oficinas educacionais de formaçãoprofissional e humana para meninas entre 10 e 16 anos. Todas freqüentam a escola públicaregular e participam das atividades no horário oposto ao da escola. Nesta unidade há aulasde apoio escolar, teatro, dança, iniciação musical e à informática, oficina de reciclagem depapel e artesanato. Em 2008, foram atendidas 150 garotas.

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se aprender. Começa uma nova crise envol-vendo as instalações do projeto e tudo pareceterminar... Tivemos, então, a certeza de quetrabalhamos em uma comunidade tambémiluminada: através da vibração de amor pelasjovens ali assistidas e depoimentos de homenssolidários e parceiros na construção de umasociedade mais justa, vemos, mais uma vez, otrabalho permanecer. E vai valer a pena!

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O TRABALHO SOCIAL COM A COMUNIDADEDO JARDIM NOVO HORIZONTE

CRISLAINE DE JESUS AMÂNCIO MOREIRA

Coordenadora pedagógica do Núcleo Comunitário

Núcleo Comunitário Jardim Novo Ho-rizonte foi instalado no antigo Varjão –

atual Jd. Novo Horizonte –, visando desenvol-ver um trabalho social que contribuísse para odesenvolvimento humano e social das pessoasque moram na região, de acordo com a reali-dade e necessidades das famílias.

Observamos a busca dessas pessoas por ofi-cinas que lhes dessem a oportunidade de seaprimorar em determinado ofício, de forma acomplementar a renda familiar, já que a gran-de maioria trabalha informalmente, coletandomateriais recicláveis.

Entre as várias oficinas realizadas no Núcleo– visando contribuir para a melhoria da quali-dade de vida dos moradores da região –, desta-camos a de Panificação e Confeitaria, que, emrazão dos resultados alcançados e com objeti-vo de seu aprimoramento, gerou uma parceriacom o Sebrae, oferecendo aos alunos a possibi-lidade de desenvolverem o olhar empreende-dor em relação a um futuro negócio.

Atualmente, atendemos 314 pessoas, entrecrianças, adolescentes e adultos, em diversasatividades além de termos uma fila de esperacom um número considerável de interessados.

Devido à grande demanda, o nosso espaçoatual tornou-se um fator complicador, limi-tando nossas ações e dificultando o bom de-senvolvimento das oficinas. Aliado a isto,obras municipais foram realizadas compro-metendo o espaço atual do Núcleo.

NÚCLEO COMUNITÁRIO JARDIM NOVO HORIZONTE

O Núcleo foi instituído em 2000 visando estreitar o relacionamento com a comunidade vizinhaà Cidade dos Meninos e Meninas. Nele são atendidas 314 pessoas entre crianças, adolescen-tes e adultos, em diversas atividades de formação profissional e humana, como oficina edu-cacional, alfabetização de adultos, artesanato, capoeira, futebol, ginástica feminina, moda einiciação musical.

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A Prefeitura Municipal, reconhecendo otrabalho que realizamos junto à comunidade,tomou a iniciativa de nos ceder um novo lo-cal. Trata-se de um Centro Comunitário, loca-lizado no bairro, que nos possibilita não só acontinuidade das nossas ações mas também asua ampliação.

É gratificante sabermos que, por meio deum trabalho consistente e de muita dedica-ção, conseguimos desenvolver a auto-estimadessas pessoas, suas habilidades e seus valores– gerando melhorias nas relações com a famí-lia e com a comunidade –, além de contribu-ir para que possam complementar a sua ren-da familiar. Há, sempre, uma relação de trocaentre professores e alunos, ambos aprenden-do com as experiências vividas neste espaçocomunitário.

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AÇÕES COM A ESCOLA, COM A CRIANÇAE COM A FAMÍLIA

MARY RANGEL

Coordenadora pedagógica da Fazenda São José

m 2006, a FAACG iniciou um projetodenominado “Gira-Çara, Gera Saber”

em parceria com a Prefeitura de Araçarigua-ma. O projeto tinha como objetivo capacitarprofessores da Educação Infantil da rede mu-nicipal de forma que estes olhassem seus alu-nos de forma mais abrangente e detectassemproblemas relacionados a visão, audição, des-nutrição, problemas motores, de aprendiza-gem e comportamentais decorrentes de dis-funções sociais, tais como conflitos familiarese de dependência química.

No ano seguinte, houve a ampliação das

ações com a instalação de uma Ludoteca paraatender os alunos encaminhados pelas profes-soras e um ateliê, o Agulha&Linha, para aco-lher as mães destes alunos, proporcionandotécnicas de teares para que elas encontrassemuma forma com que pudessem ajudar na ren-da familiar. Uma horta e uma estufa para edu-cação ambiental foram criadas, e a implanta-ção de biblioteca e computadores conectadosà internet facilitou a possibilidade de estudose desenvolvimento de trabalhos pela equipe epelos professores.

As atividades da unidade são plurais, envol-vendo aulas, supervisões educacionais e psico-pedagógicas, orientações gerais, apoio cientí-fico a seminários e Trabalhos de Conclusão deCursos (TCCs) dos professores, além de pas-seios culturais a museus nas cidades de SãoPaulo e Jundiaí e participação em Congressos

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FAZENDA SÃO JOSÉ

A Fazenda São José foi formada entre os anos de 1580 e 1640 e está localizada em Araçari-guama (SP). A unidade desenvolve o projeto “Gira-Çara, Gera Saber”, que nasceu em janeirode 2006, atende 213 pessoas e possui três focos principais: capacitação e formação de pro-fessoras da Educação Infantil e Primeiro Ano do Ensino Fundamental da rede pública muni-cipal, em parceria com a Secretaria de Educação local; Ludoteca para atender crianças daEducação Infantil; e Ateliê Agulha & Linha para atender as famílias destas crianças.

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e Seminários. As crianças contam com umapsicóloga especializada e com duas estagiáriasde pedagogia, o que nos possibilita fazer umtrabalho em rede, realimentando as aulas etécnicas utilizadas pelos professores. Isso tudosó é possível porque existe um compromissoda equipe e dos professores em manter umarotina semanal de estudos. As famílias das cri-anças são atendidas mensalmente, em grupos,onde um assunto pertinente à educação deseus filhos é debatido e todos participam. Paisou responsáveis que trabalham e não podemcomparecer às reuniões mensais são convoca-dos individualmente em horários possíveis fo-ra de seu expediente.

No ateliê, as mães produzem bolsas, cartei-ras e cachecóis de retalhos nos teares de pape-lão criados pela estilista contratada, que opor-tunamente são vendidos em bazar beneficenterealizado pela comunidade e, mais recente-mente, por uma Feira de Artesanato Munici-pal na Praça Principal de Araçariguama. Arenda obtida é revertida para suas famílias oupara compra de mais material, tudo feito deforma transparente e democrática.

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O ANTIGO E O NOVO A FAVOR DA CULTURA E DO CONHECIMENTO

PATRICIA RAZZA

Diretora administrativa educacional

Colaboração de MARIA DANIELA BUENO DE CAMARGO,

historiadora

Fazenda Ermida, situada na encosta daSerra do Japi, tem suas terras localizadas

às margens de uma antiga rota de tropeirosque fazia a ligação da região da cidade de Ituaté a estrada de Goiás, lugar para onde se diri-giam aventureiros e bandeirantes à procura doouro das minas e de índios para serem escra-vizados.

Com essa movimentação de pessoas, inten-sificou-se a atividade comercial ao longo dasrotas, principalmente aquela denominada Ca-

minho Novo do Goiaz que permeava a regiãoda Vila de Jundiaí.

No século XVII, a fazenda inseriu-se naprodução de açúcar e, na segunda metade doXIX, dedicou-se ao cultivo do café, na esteirada expansão dessa atividade agrícola peloOeste de São Paulo. Na década de 1880, a fa-zenda pertencia a Antônio José da Costa Wilke à sua esposa, Maria Pereira da Costa Wilk.Antônio Wilk era um grande produtor de ca-fé em Jundiaí que atuou na política, exercendoo cargo de vereador durante a década de 1890.Ainda no final do século XIX, a propriedadefoi arrendada pelos italianos Armagni Attilio eAzzoni Pietro, que aumentaram a produçãode café, investindo em novos cafezais. Com amorte do fazendeiro Antônio Wilk, a fazendafoi vendida a Eloy Chaves, que a inseriu nocontexto do crescimento industrial paulista. Já

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FAZENDA ERMIDA

A Fazenda possui um patrimônio material que remonta ao século XVII e está inserida na Ser-ra do Japi, numa área de preservação ambiental da Mata Atlântica. A FAACG reconhece a im-portância da sua preservação e, em função disso, transformou o local num centro de divul-gação de movimentos culturais diversificados e desenvolveu ações ligadas à área daEducação Ambiental. Sua sede, construída por volta de 1860, abriga um museu sobre a his-tória do dr. Eloy Chaves, pai de d. Antonieta, fundadora da instituição.

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na década de 1920, a Ermida passou a produ-zir a matéria-prima para a S.A. GordinhoBraune Indústrias de Papel, pertencente a An-tonio Cintra Gordinho, genro de Eloy.

Quando voltamos os nossos olhos para aatualidade, podemos destacar importantestrabalhos realizados pela Fundação Anto-nio-Antonieta Cintra Gordinho nesse espa-ço histórico.

O primeiro Curso de Edificação e Restauropromovido pela Fundação teve seu início em2002, aliando preservação do patrimônio his-tórico à capacitação de jovens restauradores.Professores experientes em restauração mo-derna e tradicional de edifícios e mobiliárioministraram aulas a 40 jovens, que restaura-ram a sede da fazenda, em iniciativa inovado-ra baseada em projeto elaborado a partir depesquisa histórica e documental. Posterior-mente, foram restaurados o jardim de verão esua cobertura, o tanque de carpas, o salão pa-roquial, a Casa da Farinha e a pintura da Ca-pela Ermida, além da realização de obras deconservação da senzala.

Os jovens que participaram do projeto fo-ram preparados para o mercado de trabalhoe hoje se encontram empregados, sendo quedois deles integram nosso quadro de colabo-radores. O curso tornou-se referência para omercado de Jundiaí e novas turmas foramformadas.

O trabalho de restauro feito na Casa de Fari-nha nos possibilita, hoje, a organização de even-tos culturais no local, que passou a ter o nomede Centro Cultural Ermida, inaugurado em 23de outubro de 2006 com o lançamento do li-vro Contos e Rimas para Meninos e Meninas.

Outro momento marcante foi a promoçãoda palestra internacional de Reggio Emilia –região da Itália – ocorrida em 11 de agosto de2008, através da qual dezenas de educadoresda Educação Infantil tiveram a oportunidadede entrar em contato com essa experiênciaque hoje atende a 96 países. No dia 14 de ou-tubro de 2008, em homenagem à Semana daCriança, tivemos a palestra Jogadas da Vida,proferida pelo ex-jogador de futebol profis-sional Júlio César para jovens de 11 a 16 anos.

Além dessas ações, outras são realizadasjunto a todos os alunos da Fundação, privile-giando o local e seu espaço histórico e am-biental.

Em 2008, o Ministério da Cultura aprovouprojeto de implantação do Memorial da Fa-zenda Ermida, por meio da Lei Rouanet. Oprojeto prevê ações de pesquisa, restauro,publicação e exposição a respeito desse im-portante patrimônio, além de benefícios so-cioeducacionais como a ampliação do conhe-cimento sobre o passado da comunidade locale regional a fim de valorizar a fazenda, consi-derada um dos principais sítios históricos eculturais da cidade de Jundiaí e região.

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Vista da casa-sede da Fazenda Ermida, no início do processo de restauro, 2002. Acervo FAACG

Aluna trabalhando em uma das entradas da casa-sede, 2002. Acervo FAACG

Trabalhos realizados na parte interna da senzala, 2002. Acervo FAACG

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undação é a atribuição de personalida-de jurídica a um patrimônio, que a von-

tade humana destina para uma finalidade so-cial. Foi o que decidiu o casal Antonio eAntonieta Cintra Gordinho, idealizando, nosidos de 1957, a Fundação que leva seus no-mes. Deram-lhe vida, animados pelo amor edesprendimento. Para tanto, destinaram-lheseus bens, livres e desembaraçados, visandoproteger e educar integralmente a criança e oadolescente desamparados. A finalidade pre-cípua dos instituidores foi e vem sendo cum-prida. As gerações que passaram por suas vá-rias unidades nesses mais de 50 anos podemtestemunhar, assim como nós, os benefícios aelas propiciados, e que de forma concretarefletem em toda sociedade. O legado do ca-sal encontra nos dirigentes da Fundação os

mesmos sentimentos e ideais, que conduzemcrianças, adolescentes e famílias à concreta eefetiva cidadania.

ARTUR MARQUES DA SILVA FILHO

Desembargador do Tribunal de Justiça

do Estado de São Paulo

odo trabalho já é, em sua essência, umaação que exige olhares múltiplos. Agora, tra-balhar com as crianças e jovens atendidos pe-la FAACG exige, também, um sentir múltiplo,irrestrito. Momentos de escuta cuidadosa,acalanto no colo, fala firme e, às vezes, dura,olhares comprometidos pelo cuidado e pelaamizade.... Atitudes imprescindíveis ao desen-volvimento afetivo e social de cada um.

Um pouco da vida deles fica conosco,

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Mensagens

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quando daqui se vão e um pouco da nossa vi-da vai com eles, sem que precisem devolver.Estes “laços fraternos” imprimem o grande di-ferencial nas relações de formação humana eeducacional oferecidas por esta entidade.

CARMEN CARVALHO

Orientadora Educacional da FAACG

urante muito tempo tive curiosidadeem conhecer uma fazenda, que meu avô diziaexistir em Jundiaí, de uma prima sua, da famí-lia Gordinho. De outras conversas, sabia que afazenda abrigava a “Cidade dos Meninos”, queno meu mundo cercado de música, me reme-tia às instituições européias onde jovens dedi-cam horas ao estudo da música.

Através de um amigo, colaborador da FAACG, pude conhecer o trabalho da Funda-ção e levar ali um pouco de música. Vi que amúsica oferecida aos seus jovens é mais umamostra, entre tantas atividades, das oportuni-dades que estes poderão agarrar em suas vidas.Sua equipe de colaboradores, acolhedora echeia de entusiasmo, aponta a fonte da alegriaque os jovens trazem consigo. Fico feliz em terconhecido esse trabalho e, ainda que em parce-la muito pequena, ter podido participar dele.

CLAUDIA FERES

Regente

sta é uma instituição que reúne em suaequipe de direção e educadores a possi-

bilidade do aprimoramento constante de umaproposta de trabalho voltada para a Educaçãoe Cultura.

O exercício de uma prática humanista é re-significada no seu dia-a-dia, através do proje-to pedagógico educacional presente em suasunidades de ensino. O cuidado que tem comseus diversos espaços educacionais possibilitaformar/informar, tecendo a teia de compro-misso com a infância e juventude, frente aosobjetivos do seu “tempo”, festejando junto aosseus representantes.

CLÉLIA LAGAZZI RUSSO PASTORELLO

Pedagoga

uito me honra poder deixar registradonestas breves linhas a importância da

atuação social desenvolvida por instituiçõesdo Terceiro Setor, como é o caso da FundaçãoAntonio-Antonieta Cintra Gordinho.

Desde muito cedo na história da humani-dade, registram-se atitudes isoladas de ho-mens que, por amor às artes, à sabedoria oupor solidariedade ao próximo, legavam benspara uma finalidade cultural, filantrópica ouhumanitária.

Como exemplo, temos a doação da biblio-teca de Alexandria pelos Ptolomeus com ca-racterísticas, ao que parece, de patrimôniodesgarrado, pela primeira vez, da pessoa deseus proprietários. Como segundo exemplo,ainda no mundo antigo é digna de nota a es-cola que Platão fundou nos jardins de Acade-mos (daí Academia), uma instituição de ensi-no do tipo científico-religioso, consagrado àsmusas em Atenas.

Assim, nos tempos modernos e atuais per-sistem as iniciativas de doações, vez que gran-des nações e civilizações nunca foram constru-

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ídas a partir de sociedades divididas, prevale-cendo a solidariedade e a cooperação interna.

Nesse contexto, a Fundação Antonio-Anto-nieta Cintra Gordinho é reconhecida pela in-cansável disposição em aprimorar e perenizarseus objetivos fundacionais que se materiali-zam nas várias ações e serviços prestados à co-letividade. Parabéns!

LUCIA MARIA BLUDENI

Presidente da Comissão de Direito

do Terceiro Setor OAB-SP

que faz a Fundação Antonio-AntonietaCintra Gordinho passar dos 50 anos é o

rigor da administração, o zelo, a manutençãodo patrimônio, a moral e a postura dos seusdirigentes, do Conselho e dos presidentes quemantêm a instituição. As crianças e adolescen-tes recebem instrução quanto ao comporta-mento ético e moral do cidadão, a importân-cia do respeito ao próximo e eles sãoreceptivos a isso, nos compreendem e agemcorretamente. A Fundação respeita o jovem eajuda-o a descobrir em si próprio um ser hu-mano valorizado. Vejo esse trabalho como umsonho, que eu quero que dure mais 200 anos.

MARIA APARECIDA RAMOS LORENA

Advogada da FAACG

om muita honra recebi o convite paraparticipar deste livro sobre a história da

Fundação Antonio-Antonieta Cintra Gordi-nho, não só pela alegria de testemunhar que oilustre casal fundador semeou boas sementes,que frutificaram de forma extremamente sig-

nificativa para a população menos favorecidade nossa comunidade, mas, principalmente,por confirmar que o espírito empreendedor eabnegado de ambos fez com que a Fundaçãofosse, de fato, uma das primeiras instituiçõesbrasileiras a aplicar em suas ações os princí-pios da responsabilidade social, como formade viabilizar a construção de uma sociedadecada vez mais justa, solidária e, conseqüente-mente, mais livre.

GISELE FLEURY CHARMILLOT GERMANO DE LEMOS

Presidente da 33ª Subsecção da OAB-SP – Gestão

2007/2009

s sonhos motivam nossas vidas, mas aconcretização destes mostra-nos que

nossa existência valeu a pena.Foi na concretização de um sonho do casal

Antonio e Antonieta que surgiu a Fundação, aqual vem modificando a vida de centenas decrianças e adolescentes, dando-lhes oportuni-dade de desenvolver suas potencialidades e dese sentirem inclusos numa sociedade tão ex-cludente.

Que a atitude deste casal sirva-nos deexemplo, pois, quando temos um sonho indi-vidual, este afeta só a nós mesmos, mas, quan-do o sonho é coletivo, este pode transformaruma sociedade.

MARIA APARECIDA M. GIBRAIL

Psicóloga, Diretora do Projeto Criança da Secretaria

Municipal de Integração Social

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uitas foram as vezes em que tive opor-tunidade de comparecer aos eventos

realizados na Cidade dos Meninos, mantidapela Fundação Antonio-Antonieta CintraGordinho. Lembro-me da primeira vezquando fui convidado para conhecê-la. Fi-quei encantado tanto com a estrutura dosprédios quanto com a estrutura pedagógicaque alicerçam esse sonho que se materializoupela vontade de duas pessoas extraordiná-rias. A fortuna material só tem sentido quan-do transformada em espiritual. Tive a alegriade conhecer o dr. Vail três meses antes de seufalecimento. A foto tirada está revelada emmeu coração. Foi a Fundação que tornoupossível o lançamento de meu livro de poe-mas O aviador, que rompeu todas as barrei-ras do tempo. Muito teria para contar, mas fi-ca aqui minha gratidão pelos meninos emeninas.

MAURO VAZ DE LIMA

Promotor de Justiça da Infância e Juventude

estaco duas palavras importantes eque a meu ver fazem parte da história

deste lugar, Amor e Generosidade. Amorporque é uma obra que foi idealizada pen-sando no acolhimento do próximo, no seudesenvolvimento pessoal e profissional on-de o futuro, apesar de nem sempre claro,pudesse, de alguma forma, ser garantido. AGenerosidade que diz respeito ao despren-dimento porque um casal, sem filhos, deixatoda a sua fortuna, em vida, para este traba-lho social. Estas são geradas em uma únicafonte – Deus.

É um orgulho fazer parte da equipe da Fun-dação Antonio-Antonieta Cintra Gordinho.

PATRICIA RAZZA

Diretora Administrativa Educacional da FAACG

oi uma oportunidade excepcional levarnosso projeto Oficinas Kinoforum de

Realização Audiovisual aos alunos da Funda-ção Antonio-Antonieta Cintra Gordinho, pro-porcionando um primeiro contato com umaprendizado mais aprofundado da linguagemaudiovisual e a experiência de realização nestaárea.

A Associação Cultural Kinoforum, ao criaro projeto das oficinas de vídeo, em 2001, o fezpor ter sido sempre nossa crença que a arte éum sólido instrumento de transformação. Pa-ra se realizar projetos assim, é fundamentaltambém o apoio de bons parceiros como essafundação, pois partilhamos um mesmo ideal,de que tudo deve ser feito em benefício deuma vida melhor e mais digna para todos.

A experiência adquirida pelas Oficinas Ki-noforum nos indica, com muita clareza que otrabalho realizado pela Fundação Antonio-Antonieta Cintra Gordinho supera de longetudo o que até então havíamos nos deparadoem termos de trabalho educacional e transfor-mador. Os jovens participaram com entusias-mo de todo o processo de realização: criação,gravação e edição e, a partir de seus própriossonhos, criaram imagens que encantam.

Os resultados adquiridos em nosso traba-lho conjunto apontam para um futuro maisdo que promissor para nossa parceria recém-iniciada, e que esta dará à Kinoforum um

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aprendizado excepcional no lidar com a ques-tão humana, pois nada é suficiente quando sedeseja aprimorar a vida humana, e vocês sa-bem disso.

ZITA CARVALHOSA

Produtora Audiovisual e Presidente da

Associação Cultural Kinoforum

ntonio e Antonieta Cintra Gordinho, fi-lhos maravilhosos de Deus, merecem

toda nossa reverência e gratidão pela grandio-sidade de suas vidas em prol dos menos favo-recidos, crianças, adolescentes e suas famíliasda cidade de Jundiaí.

Nós, do Poder Público, mantemos um laçoestreito com a Fundação Antonio-Antonie-ta Cintra Gordinho, muito valorizamos essaparceria, cujo foco é, pela educação, forjar ocaráter do homem-cidadão, possibilitando oseu desenvolvimento integrado à sua comu-nidade.

MARIALICE FOSSEN

Assistente Social, Secretária da Secretaria

Municipal de Integração Social e Presidente do

Fundo Social de Solidariedade de Jundiaí

o casal generoso e sem filhos veio o de-sejo de cuidar de meninos, do jeito dis-

ciplinado que entendiam e com largueza,junto à natureza. A fazenda virou escola, a tiaAntonieta encheu a sua vida com boas obras,e muitos meninos puderam aprender a viver.Quando se encerrou o ciclo de sua vida, umanova geração assumiu o mando. Nela, elogioThereza, que abriu as portas aos novos tem-

pos de muitas realizações em visão contem-porânea.

MARGARIDA CINTRA GORDINHO

Cientista Social e Editora

orçoso o reconhecimento da superlativaimportância da Fundação Antonio-An-

tonieta Cintra Gordinho, instituída há mais demeio século por ato louvável de dignas pes-soas da sociedade paulistana.

Desde então, com seu significativo patri-mônio, exerce relevantes atividades em bene-fício da sociedade menos abastada monetaria-mente. Com efeito, na condição de uma dasprincipais fundações privadas do Estado deSão Paulo, desenvolve iniciativa visando à for-mação cidadã junto à Escola de Educação In-fantil Almerinda Pereira Chaves, junto ao cen-tro educacional Cidade dos Meninos eMeninas, além de ações de cunho cultural, naconservação e restauro de equipamentos deinteresse social. Imperioso ressaltar, por der-radeiro, que estas palavras, com justo coloridoelogioso, são fruto do acompanhamento dospassos da Fundação, em razão do velamentoexercido no dia-a-dia. De rigor, nesse cami-nho, para aquele que, na qualidade de curadorde fundações, é o defensor do interesse socialcoletivo, destacar a importância e a relevânciada Fundação Antonio-Antonieta Cintra Gor-dinho. A contribuição da Fundação para a al-teração e a melhoria da realidade social é fato,basta querer ver e conhecer.

AIRTON GRAZZIOLLI

Curador de Fundações da Capital

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nspirado nos ideais cristãos, o casal Anto-nio e Antonieta Cintra Gordinho, em

1957, descobriu sua vocação: semear amor pa-ra além das fronteiras de seu lar. Prepararam ocampo do altruísmo, espalharam as sementesda caridade, ofereceram as flores aos amigos eos espinhos, os ofertaram a Deus, na patena dagenerosidade, como sinal de sua fé inabalável.

Iniciaram os trabalhos da Fundação que le-va seus nomes e o bem começou a produzirseus frutos no coração das crianças a quemtratavam como filhos. Por nove anos estavamjuntos nesta obra de grande mérito, até queem 1966, Deus chamou para Si o dedicado es-poso. Antonieta prosseguiu o trabalho na Ci-dade dos Meninos (hoje, dos Meninos e dasMeninas) que já não conta mais com apenas30 crianças, mas toma formas de amplitude:uma verdadeira escola de vida, fé e autênticapromoção humana. Antonio Cintra Gordinhoafirmara: “É esse um velho sonho que realiza-mos seguindo os ensinamentos de Cristo, pro-curando voltar a nossa vida para essa Cidadedos Meninos, fazendo, assim, uma cousa du-radoura que sobreviverá à nossa vida passa-geira. Criar coisas é próprio dos homens ecriar homens é quase uma coisa divina”.

Nesses mais de 50 anos, a Igreja esteve pre-sente no começo e no desenrolar desse extra-ordinário empreendimento de amor fraterno.Nela os fundadores receberam o batismo, aeucaristia, o matrimônio e beberam da santaPalavra de Deus que lhes moveu o coração e amente, para a prática concreta e autêntica doamor fraterno: “Meu mandamento é este:amai-vos uns aos outros como eu vos amei”(Jo.15,12).

Somos impelidos a naturalmente olhar pa-ra o céu e expressar a mais eloqüente gratidão,por ter na estrada de nossas existências e nahistória de Jundiaí exemplos de vida como osde Antonio e Antonieta, que continuam vivostanto na terra, pelas suas boas obras, quantono céu, certos de que cumpriram exatamenteo que ensinou o Mestre de Nazaré: “Tudo oque fizerdes ao menor dos meus irmãos, é amim que o fizestes” (Mt, 25, 45).

DOM GIL ANTÔNIO MOREIRA

Bispo de Jundiaí – SP

eixo a Fundação com ar de alegria, nacerteza que após oito anos de convívio

nesta entidade tornei-me uma pessoa me-lhor. Sinto que hoje tenho uma base, uma es-trutura para poder chegar até onde Deus mepermitir...

Saio em busca de um sonho, ser promotorde justiça, sonho este que me proporcionarálançar mais e mais sementes, cultivando valo-res éticos e morais, muitos adquiridos comuma equipe que trabalha com o prazer de fa-zer o sonho de Antonio e Antonieta perdurare crescer a cada dia, formando cada vez maishomens de bem.

Agradeço por tudo o que já fizeram e fazempor mim e prometo que nunca me esquecereida Fundação.

ALEXANDRE ANTONIO DE LIMA

Ex-funcionário da FAACG

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Livros e teses

ABREU, Alzira Alves de et alli. (Coord.). Dicionáriohistórico-biográfico brasileiro, pós-1930. Rio deJaneiro: CPDOC/FGV, 2002.ARAÚJO, Francisco César Palma de; ARAÚJO, Pau-la Raquel Palma de. 100 anos, Empresa ElétricaBragantina. Bragança Paulista: Grupo Rede, 2003.CAJADO, Renata. Contos e rimas para meninos emeninas. São Paulo: Fundação Stickel, 2006.COELHO, Simone de Castro Tavares. Terceiro se-tor: um estudo comparado entre Brasil e EstadosUnidos. São Paulo: Senac - São Paulo, 2000.DEL PRIORE, Mary (Org.). História das criançasno Brasil. São Paulo: Contexto, 2000.FREITAS, Marcos Cezar de (Org.) História Socialda Infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 1997.GONÇALVES, Hebe Signorini (Org.). Organiza-ções Não-Governamentais. São Paulo: Estação Li-berdade, 1996.IOSCHPE, Evelyn Berg (Org.). Terceiro setor: de-senvolvimento nacional sustentado. São Paulo: Paz eTerra, 2000.

MAKINO, Miyoko. Jundiaí: povoamento e desen-volvimento, 1655-1854. São Paulo, 1981. Disserta-ção (Mestrado em História Social) – Faculdade deFilosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidadede São Paulo.

MALAGUZZI, Loris. In: EDWARDS, Carolyn,GANDIDNI, Lella, FORMAN, George. As cem lin-guagens da criança - A Abordagem de Reggio Emi-lia na Educação da Primeira Infância. Porto Alegre:Artes Médicas, 1999. p. 72.

MARCÍLIO, Maria Luiza. História social da criançaabandonada. São Paulo: Hucitec, 2006.

MELO, Luís Correia de. Dicionário de autores pau-listas. São Paulo: Comissão do IV Centenário da Ci-dade de São Paulo, 1954.

MESGRAVIS, Laima. A Santa Casa de Misericórdiade São Paulo (1599?-1884). São Paulo: Conselho Es-tadual de Cultura, 1976.

PALESTRA A ABORDAGEM DE REGGIO EMILIA– UM DIÁLOGO SOBRE A ROTINA NA ESCOLAE O TRABALHO COM PROJETOS. Jundiaí, 2008.

PAULINO, Maria Daniela Bueno de Camargo.

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Referências

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Apontamentos da história da Fazenda Ermida.[s/l] [s/d].

RUSSEL-WOOD, A. J. R. Fidalgos e filantropos. ASanta Casa de Misericórdia da Bahia, 1550-1755.Brasília: Editora da UnB, 1981.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da (Coord.). Dicionárioda história da colonização portuguesa no Brasil.Lisboa: Verbo, 1994.

TOLEDO, Karina Pardini; MARTINI, Sueli; PINTO,Donizetti Aparecido. Museu da Energia. Núcleo deJundiaí. História & Energia, São Paulo, n 8, p. 29-36, 2000.

VAINFAS, Ronaldo (Org). Dicionário do Brasil Co-lonial, 1500-1808. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000.

VIEIRA, Hermes Pio. Eloy Chaves: precursor daPrevidência Social no Brasil. Rio de Janeiro: Civili-zação Brasileira, 1978.

Sítios

www.cpdoc.fgv.br

www.gruporede.com.br

www.jundiai.sp.gov.br

www.polbr.med.br

www.portaljj.com.br

www.stf.gov.br

www2.oabsp.org.br

Entrevistas

Alessandra Santos Amaral. Entrevista realizada emJundiaí (SP), em 14/5/2008, por Marcelo Fonseca.Transcrição de Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Maiza Garcia.

Antonio José da Silva Filho. Entrevista realizada emSão Paulo (SP), em 17/4/2008, por Marcelo Fonseca.Transcrição de Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Marcelo Fonseca.

Eliana Regina Picchi Piccolo Zotini. Entrevista reali-zada em Jundiaí (SP), em 10/4/2008, por MarceloFonseca. Transcrição de Cibele Camargo de Oliveirae transcriação de Marcelo Fonseca.

Eunice Guimarães Teixeira. Entrevista realizada emSão Paulo (SP), em 15/5/2008, por Marcelo Fonseca.Transcrição de Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Maiza Garcia.

Irineu Silva Junior. Entrevista realizada em São Pau-lo (SP), em 12/6/2008, por Marcelo Fonseca. Trans-crição de Cibele Camargo de Oliveira e transcriaçãode Marcelo Fonseca.

Irmã Tecla. Entrevista realizada em Jundiaí (SP), em10/4/2008, por Marcelo Fonseca e Maiza Garcia.Transcrição de Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Marcelo Fonseca.

Maria das Graças da Silva Ferreira. Entrevista reali-zada em Jundiaí (SP), em 10/4/2008, por MarceloFonseca e Maiza Garcia. Transcrição de Cibele Ca-margo de Oliveira e transcriação de Maiza Garcia.

Maria Thereza Passos Gordinho Amaral de Oliveira.Entrevista realizada em São Paulo (SP), em28/5/2008, por Marcelo Fonseca. Transcrição de Ci-bele Camargo de Oliveira e transcriação de MarceloFonseca.

Meyri Tedde Frezza. Entrevista realizada em Jun-diaí (SP), em 14/5/2008, por Marcelo Fonseca.Transcrição por Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Maiza Garcia.

Renato Martins. Entrevista realizada em São Paulo(SP), em 24/4/2008, por Marcelo Fonseca. Transcri-ção e transcriação de Cibele Camargo de Oliveira.

Rodrigo do Prado Caetano. Entrevista realizada emJundiaí (SP), em 14/5/2008, por Marcelo Fonseca.Transcrição de Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Maiza Garcia.

Therezinha Paula Dominguez. Entrevista realizadaem São Paulo (SP), em 12/6/2008, por Marcelo Fon-seca. Transcrição de Cibele Camargo de Oliveira etranscriação de Maiza Garcia.

Toshiko Ikeda Ikuhara. Entrevista realizada em Jun-diaí (SP), em 26/5/2008, por Marcelo Fonseca. Trans-crição e transcriação de Cibele Camargo de Oliveira.

Waldeci Dutra Castelhano. Entrevista realizada emSão Paulo (SP), em 24/4/2008, por Marcelo Fonseca.Transcrição por Cibele Camargo de Oliveira e trans-criação de Maiza Garcia.

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Parte dos Conselheiros da Fundação (da esquerda para a direita):Fernando Servio Godeghesi, José Carlos Batelli Corrêa, Luiz Alberto Chaves

de Oliveira, Ismar Augusto Procópio de Oliveira, Francisco de Assis Cecheli Oliva, Nelson JoséLara Oliveira Ribeiro, Eunice Guimarães Teixeira (esposa do dr. Egberto Lacerda Teixeira),Maria Thereza Passos Gordinho Amaral de Oliveira, Laïs Helena Teixeira de Salles Freire e

Antonieta Gavião Almeida Marques da Silva. Integram também o Conselho:Gilberto Gregori, Leonidia Amaral Lopes de Oliveira e Plínio Xavier da Silveira.

Equipe – São Paulo Equipe das Unidades da FAACG

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