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Direito Romano Resumos Primeiro Período: Roma do rex e das gentes Como designar este período? Entre a fundação de Roma em 754 a.C. e o período de vigência das leges Liciniae Sextiae (367 a.C), ocorre um período monárquico e a respetiva transição para a república. Aquilo que marca este período são os elementos de organização gentílica, que perduram e os efeitos do poder real caraterístico da dinastia tarquínia. No entanto, sem o rex ou sem as gentes, a criação jurídica primitiva dos romanos seriam bem diferente e, ainda mais, estes mesmos demarcam as linhas fundamentais do conteúdo das soluções jurídicas. É importante referir que, sobre esta época, as fontes são escassas e imprecisas, portanto, de credibilidade discutível. Contudo, será indiscutível o poder supremo do rex e que a repartição da população, entre patrícios e plebeus era constituída por 10 cúrias por tribo, três tribos e, por fim, o rei. O período do rex e das gentes: generalidade Os romanos desde o início foram influenciados pelos gregos e pelos etruscos, desenvolvendo uma especificidade típica na resolução de conflitos resultantes de problemas cada vez mais complexos dada a sistemática provocação da realidade envolvente. Porém, a criação jurídica requeria uma inovação, que se distancia dos etruscos. Assim, a partir do século VI a.C. inicia-se uma crise política que resulta na criação de ius. A tirania de Tarquínio, o Soberbo, levou à conspiração palaciana promovida pelos nobres Bruto e Collatiano, em 510 a.C., apoiados pela população romana. Desta forma cai a monarquia e se inicia a transição para a República. A base religiosa, também jurídica, era fundada no culto etrusco da tríada (deuses). Roma primitiva era, desta forma, uma das cidades influenciada pela Etrúria.

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Direito Romano

ResumosPrimeiro Período: Roma do rex e das gentes

Como designar este período?

Entre a fundação de Roma em 754 a.C. e o período de vigência das leges Liciniae Sextiae (367 a.C), ocorre um período monárquico e a respetiva transição para a república. Aquilo que marca este período são os elementos de organização gentílica, que perduram e os efeitos do poder real caraterístico da dinastia tarquínia.

No entanto, sem o rex ou sem as gentes, a criação jurídica primitiva dos romanos seriam bem diferente e, ainda mais, estes mesmos demarcam as linhas fundamentais do conteúdo das soluções jurídicas. É importante referir que, sobre esta época, as fontes são escassas e imprecisas, portanto, de credibilidade discutível. Contudo, será indiscutível o poder supremo do rex e que a repartição da população, entre patrícios e plebeus era constituída por 10 cúrias por tribo, três tribos e, por fim, o rei.

O período do rex e das gentes: generalidade

Os romanos desde o início foram influenciados pelos gregos e pelos etruscos, desenvolvendo uma especificidade típica na resolução de conflitos resultantes de problemas cada vez mais complexos dada a sistemática provocação da realidade envolvente. Porém, a criação jurídica requeria uma inovação, que se distancia dos etruscos. Assim, a partir do século VI a.C. inicia-se uma crise política que resulta na criação de ius.

A tirania de Tarquínio, o Soberbo, levou à conspiração palaciana promovida pelos nobres Bruto e Collatiano, em 510 a.C., apoiados pela população romana. Desta forma cai a monarquia e se inicia a transição para a República.

A base religiosa, também jurídica, era fundada no culto etrusco da tríada (deuses). Roma primitiva era, desta forma, uma das cidades influenciada pela Etrúria.

Os grupos familiares e clientelares dispersos e fracos foram-se agrupando às gentes mais fortes, em busca de proteção, aumentando o seu poder com a junção de novas terras e a agregação de mais comunidades. A relação de pertença às gens era exclusiva e esse vínculo protetivo entre a pessoa e a comunidade constituía uma pré-cidadania.

Os primeiros romanos eram os proprietários rurais, os patrícios, que eram a base do exército e os plebeus, que eram a massa popular. Viviam em dependência dos primeiros. O casamento entre membros era proibido, uma tradição expressa na Lei das XII Tábuas. Os patrícios eram os proprietários e os plebeus uma espécie de arrendatários e, por isso, os primeiros, possuíam uma maior relevância.

As relações de clientela eram comuns nesta época. Eram um grupo subordinado às gentes, que não tinham posses suficientes para que conseguissem subsistir sozinhos. Então, eram a principal fonte de poder externo das gentes. A forma de obter a condição de cliente

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era: a deditio (submissão voluntária de um grupo familiar a uma gente) e a applicatio (submissão de um estrangeiro à proteção das gentes) e a manumismio (instituto pelo qual o escravo deixava de o ser).

A fidelidade ou fides da clientela às suas gentes ma mantinha-se próxima do seu patronus, chefe das gentes a que pertencia, envolvendo um dever de proteção ao cliente de valor superior ao que tinha para com os seus cognati. A violação destes laços podia levar à aplicação da pena de morte. Portanto, os clientes poderiam matar os seus patronus sem serem punidos.

Mais tarde, como conclui Antonio Guarino, a aproximação entre a plebe e a clientela resultou numa identificação entre os grupos, passando a ser exclusivamente considerados plebeus. Nas Leis das XII Tábuas estava explicita a tutela jurídica da proteção e assistência como deveres do patrício e o dever de obediência e de colaboração do plebeu. Os vínculos protetivos perduram até à queda da Roma na antiguidade.

Organizados em gentes unidas por cultos comuns, os patrícios tinham uma primitiva organização comunitária da terra que foram perdendo com a institucionalização da propriedade privada.

Através da crescente importância dos plebeus no exército romano, é facilitada a sua ascensão, tornando os patrícios menos importantes na vida social, política, religiosa e militar do patriciado, nos finais do século VI a.C. A organização militar permitiu a Roma iniciar a sua expansão e introduzir importantes reformas políticas internas que limitavam o seu papel na península itálica.

A luta de plebeus pela igualdade nos cargos e no acesso aos recursos chega a um impasse. O acordo constou num decenvirato para governar a cidade e a busca na Grécia de um modelo político de organização da comunidade romana que permitisse a vivência das diferenças de forma pacífica, através da intervenção de um jurídico.

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Órgãos e conceitos

Rex

O rex detinha imperium militae (administração da defesa militar), imperium domi (administração da cidade) e o poder de mediação divina.

De acordo com o primeiro, chefiava o exército e podia delegar poderes no magíster populu, para que outros pudessem também chefiar o exército, no magíster equitum, para comandar a cavalaria, nos questores parricidii (questões de repressão de crimes).

O segundo grande poder do rex permitia a resolução de aspetos da vida coletiva, enquanto comunidade, suprimindo litígios, através da aplicação das leges rexiae (regras consuetudinárias, ordenadas pelo rei). Estas faziam parte do ius papirianum, mas não concediam ao rei um poder normativo próprio como expressão do poder político, apesar de serem cumpridas como cultos na época.

O terceiro era a base do seu poder político. Era tão forte, que após a queda da monarquia, manteve-se um rex sacrorum, sem poderes de outro timo, mas que detinha um poder religioso, com grande prestígio.

O rei de Roma era eleito através de sinais, dados pelos deuses (consideração devido à importância à religião durante o período monárquico, fazendo assim mais sentido ser elegido por meio dos deuses, em vez do meio dos homens e, garantindo a legitimação face à comunidade, que era predominantemente religiosa). Recorria-se ao interrex, que daria o nome do escolhido e isso era respeitado pelos membros das comitia curiata. Depois o rei passava a deter imperium com a autorização do Senado. Quando o rei morria, o Senado elegia o seu interrex, que lendo os auspícios, indicava o nome entre os senadores, a propor aos comitia curiata. Geralmente, estes aceitavam o novo nome.

Assim, era o rex que detinha os poderes políticos supremos em relação com a comunidade, porque estava investido de poderes religiosos superiores na relação com as divindades. O facto de revelar a vontade dos deuses, mais do que condicionava, determinava todo o processo de escolha e a forma do exercício do titular do poder político. Sendo assim, o cargo era vitalício.

Embora o interregnum garantisse que na falta do rei o poder sacerdotal de interpretar os auspícios regressasse ao Senado, era o rei o chefe político por ser nele que estava concentrado o poder sacral. O interregnum apenas garantia a continuidade do imperium político que mantinha a comunidade agregada.

Os comitia curtiata

Durante a monarquia, era um órgão que reunia todo o populus de Roma. Os concilia reuniam apenas a plebe romana. A cidade estava divida em três tribos, cada uma com 10 cúrias e cada cúria estava subdividida em 10 decúrias. Constituíam o exército romano, enviando cada uma um número determinado de soldados. Os vínculos, geralmente, eram de ordem familiar e de linhagem.

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A legitimidade deste órgão assentava em elementos religiosos e, por isso, cada assembleia era presidida por um sacerdote. Era um órgão com competências legislativas, dado que aprovavam as propostas de lei do rei, que vigoravam como leges regiae. Também aprovavam o nome do novo rei, proposto pelo processo de interrex e era nesta assembleia que acontecia, portanto, a segunda votação para o reconhecimento e para investir o rei de imperium. Contudo, possivelmente, não tinham qualquer competência deliberativa própria.

As assembleias estariam como membros de pleno direito clientes e submetidos à potestes de patres (vínculo familiar). A falta de autonomia decisória dos membros faz questionar a possibilidade de deliberação autónoma das assembleias a que pertenciam.

Nesta época, segundo fontes escassas, a intervenção decisiva deste órgão limitava-se à aprovação ou rejeição, não à deliberação. O magistrado é que determina o conteúdo da solução.

O caráter de adesão às soluções construídas pelos proponentes das assembleias do populus revela a importância do rei em todos os planos da criação de soluções e na tomada de decisões. De resto, auxiliam o rei na governação.

Apenas com a lex Valeria de provocatione em 300 a.C. foi possível a intervenção desta assembleia, a pedido do condenado, para comutar a pena de morte em pena de exílio. Também eram importantes na formulação de regras dos mores maiorum (nas relações intersubjetivas e na disciplina normativa dos negócios).

Tendo em conta que a base da comunidade era a família, as alterações que a afetassem ou modificassem eram deliberadas e discutidas nas assembleias do Populus. No entanto, a estrutura gentílica tradicional que mantinha a hegemonia dos patrícios, entra em crise, devido à ascensão e pressão da plebe para que existisse maior igualdade entre classes.

Durante a república, o Populus exercia o seu poder reunido em assembleias designadas de comitia. Nelas era decidida a guerra e a paz, escolhidas as magistraturas, feitas leis. As assembleias eram reunidas de forma separada, consoante os grupos politicamente relevantes. A organização dos cidadãos em cúrias, decúrias, tribos, mantinha-se, para votarem as leis propostas pelos magistrados, em assembleias por estes convocadas, retirando-lhes poderes de iniciativa política ou de propositura autónoma.

Os comitia curiata tinham sobretudo poderes militares e integravam patrícios e plebeus, refletindo a organização do exército romano. Após a saída do último Tarquínio e com a consolidação das magistraturas, tinham a sua importância circunscrita às questões de direito sacro. A repetição de atos solenes para investiduras em cargos ou funções, a partir de uma formalidade exigida pelo ius da república no plano político, nunca deixou de ter um significado jurídico-sacral.

Com a limitação, vinculada a tratar somente de questões de índole sagrada, deixam a decisão política para os comitia centuriata (que passam a ser a base do exército).

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Com esta separação entre a política e a religião, os comitia curiata passam apenas a ter competências com efeitos sacrais. Por exemplo, cerimónias de confirmação no imperium dos magistrados maiores.

Durante o principado, os comícios são os primeiros a sofrer com o moco de exercício do poder pelo primus inter pares. Passam a poder ser facilmente manipuladas pela retórica, pelo imperador, que passava a ter um papel central de adoração nas assembleias (criando um culto ao chefe). Ao controlo dos comícios pelo prínceps acrescenta-se a falta de representação do Populus através dos comícios.

Grande parte dos cidadãos encontravam-se fora de Roma, não podendo exercer o direito de participar e votar. O prínceps controlava, assim as propostas, manipulava as votações e instrumentalizava as deliberações.

Assim, aumentou-se a falta de qualidade dos participantes, tornando os comícios num órgão de fachada. A sua manutenção apenas servia os interesses do prínceps. As suas competências legislativas (dos vários comícios) foram transferidas para o Senado, por efeito de dois expedientes: iniciativa das propostas passa para o prínceps; os mecanismos de votação comicial são meros expedientes formais de ratificação de senatusconsultos.

A competência de eleição dos magistrados, pretendida estar na posse do prínceps, através da iniciativa de apresentação de listas, apenas foi concretizada com Tibério. A partir daí, os comícios têm a competência para votar as listas apresentadas, mas não podem por sua iniciativa propor nomes para eleição, nem aprovar o proposto com alterações introduzidas pelo Populus. As propostas são de sim ou não.

Em 17 a.C. Augusto incrementou a legislação aprovada pelos comícios, fazendo crer que pretendia voltar às tradições republicanas. Contudo, apenas constituiu um argumento de retórica. Este recorre às votações populares que domina, apresentando aos concílios da plebe, no uso da sua tribuna potestas, leis de vários domínios.

Inicialmente, o seu projeto político consistiu na aprovação de leis pelos comícios, prpostas por si: a lex Iulia de collegiis; a lex sumptuaria (contra excesso de luxo); as leges criminali de ambitu, de adulteriis coercendis e de vi publica e privata; leis que regulam o processo civil e o processo penal.

Também seguiu leis com valor simbólico, aprovadas pelos comícios centuriais e propostas pelos cônsules: manumissão de escravos (regulando e limitando a forma como proprietários de escravos os libertavas); casamento.

A decadência política dos comícios demonstra que o principado era um regime monárquico mitigado, não um regime republicano de caráter aristocrático. Enquanto conseguiu, manteve no plano formal um controlo efetivo, quer das iniciativas legislativas, quer do seu conteúdo. No entanto, no fim do seu governo, deixaram de ser votadas leis nos comícios e a legislação popular desapareceu.

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Os Collegia sacerdotalia

Apesar de não poderem ser considerados um órgão de governo quiritário no período monárquico (nem em qualquer outro), eram uma instituição com forte poder de influência sobre as decisões políticas. Os mais importantes são o colégio dos pontífices e o colégio dos áugures.

O colégio dos pontífices era uma instituição que protegia os interesses das famílias patrícias no confronto com o rei, invocando os poderes político-religiosos que estas detinham. Assim, limitavam os poderes do rei na sua relação com estes. Detinham, maioritariamente, poderes religiosos (realizavam sacrifícios rituais e executavam os rituais supremos de Roma. Também desenvolviam o ius e o faz através da interpretação dos mores maiorum e no exercício da jurisdição.

Assim era garantido o controlo do governo de Roma pela religião, através do segredo que sustentava o mito-base criador da dependência daqueles que decidem face ao sagrado, que os sacerdotes pontífices eram guardiões. Estes foram adquirindo um saber técnico para criar soluções de resolução de litígios.

Neste período, não havia uma distinção entre a religião e o direito, entre o ius sacrum e o ius honorarium. A validade jurídica dos atos assentava no cumprimento de formalidades e rituais de natureza sacral, realizados pelos sacerdotes. Portanto, eram necessários em todas as atividades judiciárias. A assembleia era constituída por três pontífices e pelo Pontifex maximus. Os restantes eram designados na inauguratio.

O colégio dos áugures legitimava a vontade divina e, para isso, recorria aos auguria (acontecimentos representativos da vontade). Também era possível atender aos auspicia (presságios transmitidos pelos voos das aves), mas para isso recorria-se ao rei. A primeira cabia aos augures, enquanto a segunda cabia aos deuses. O auspicium era um instrumento fundamental para o rei, pois servia para regular a oportunidade na efetivação de uma determinada decisão.

Por outro lado, o augurium implicava a possibilidade de uma decisão ser afastada, pois previa-se um efeito negativo se entrasse em vigor. Permitia impedir que decisões fossem tomadas e cumpridas. Era mais complexo do que o primeiro, pois pretendia traduzir a vontade divina numa ação ou numa omissão.

Os comitia centuriata

Sobreviventes do período da monarquia, representam o poder crescente da plebe após a introdução de reformas no exército. Nesta altura foi realizada a passagem das suas competências estritamente militares para competências políticas, sobretudo de natureza financeira e fiscal.

Cada cidadão votava na sua centúria, determinando a maioria simples o voto que vinculava aquela centúria na votação da totalidade das centuriae. Aí também se obtinha o resultado final dos comitia centuriata através de maioria. A metodologia das votações tinha por fim garantir a supremacia dos patrícios.

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Foram as assembleias populares da república mais importantes. Eram convocadas por um magistrado detentor de imperium e reunidas de acordo com formalidades. A sua competência principal era a aprovação de declarações de guerra. Com o aumento da sua força política, ganharam competências próprias: poder de eleger cônsules, pretores, ditadores e censores (magistrados maiores); confirmar os censores; aprovar leis e propostas pelos magistrados; formalizar declarações de guerra e tratadores de paz; veredictos sobre a vida ou morte dos acusados.

Durante o principado, tal como os comitia curiata sofrem uma grande decadência.

Os comitia tributa

Os comitia tributa, aparentemente, surgem após a monarquia. Os seus poderes eram predominantemente civis.

A sua organização tinha uma base territorial, isto é, cada cidadão pertence a uma zona de Roma e, assim, pertencia a uma determinada tribus. São assembleias deliberativas de todo o Populus, organizado por tribos, convocado e presidido por um magistrado maior. O voto era expresso e individual. Votavam deliberações por maioria da tribu e não dos cidadãos com direito do voto.

As suas competências eram as seguintes: votação de leis sobre assuntos de menor relevância (as leges tributae;, eleição de magistrados menores e dos tribuni militum; fixação de penas pecuniárias para as infrações detetadas.

Durante o principado também sofrem uma grande decadência.

Os concilia plebis

Eram assembleias que, a partir de 287 a.C., devido à equiparação entre os patrícios e os plebeus, ganham importantes competências legislativas, introduzindo reformas profundas no ius civile. Seriam convocados pelos magistrados plebeus, sem necessidade de tomarem os auspicia, reuniam-se no fórum, onde exerciam competências: elegiam os magistrados plebeus; votavam os plebiscitos; exerciam uma competência sobre crimes puníveis com multa.

É importante salientar que se distinguem dos comitia tributa, tendo em conta que estes reúnem o Populus todo, enquanto o concílio da plebe apenas reúne plebeus e, ainda mais, os primeiros implicam magistrados patrícios, enquanto os segundos implicam magistrados plebeus.

Senado

O Senado representava a aristocracia romana. No período da monarquia, era o órgão consultivo do rei. Contudo, não era apenas uma assembleia constituída pelos chefes das gentes. Sendo assim, o número de senadores variou ao longo do tempo.

Ora, com o seu alargamento, surge um novo grupo social – as minores gentes, que lhe retiram autoridade e prestígio perante a comunidade. Mesmo assim, com o crescimento da importância romana, reforçou-se a sua aristocracia e, portanto, acrescenta-se o poder de

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interregnum no Senado, que corresponde ao poder de ratificar as decisões da plebe tomada nos comitia curiata, podendo cobri-las ou não com auctoritas.

Durante a monarquia, os seus poderes são: o interregnum, que garantiu a continuidade dos auspicia. Era o poder de eleger o rei, que era um dos membros do Senado, escolhido pelos restantes. Era um processo que recorria à intervenção divina, através do interrex, indivíduo elegido para coordenar o processo de escolha, e que recorria à intervenção divina; a auctoritas, consagrado através do reconhecimento pela sociedade da sua sabedoria (ratificação de decisões de outros órgãos); o ius belli et pacis (tratados externos) e o conselho e auxílio ao rex. Os seus poderes não são estritamente estes.

No período da República, o Senado manteve a sua importância. Mesmo não representando exclusivamente os patrícios, mas tornou-se numa assembleia política da aristocracia romana, incluindo agora patrícios e plebeus, elegida pelos cônsules e tribunos militares consulares e depois por via dos censores. O Senado era constituído por antigos magistrados e magistrados em funções. A sua principal função era dar a continuidade do governo e do poder republicano.

Passa a conduzir a política externa e a receber as embaixadas dos outros povos, realizando tratados e declarações de guerra, aprovando operações militares e organizações territoriais, fixar cultos públicos permitidos e auxiliar os trabalhos dos cônsules. Para realizar as suas funções, possuía quatro poderes distintos, alguns deles provenientes da monarquia.

Em primeiro lugar, o interregnum era utilizado em períodos de dificuldade constitucional, isto é, evitava o vazio de poder (dos cônsules), garantindo continuidade do imperium. O mesmo sucedia com as ausências dos magistrados titulares dos auspicia (poder ligado à religião), dado que este regressava aos senadores patrícios. Este instituto republicano garante a continuidade dos aspetos relativos à vida pública.

Em segundo lugar, a auctoritas patrum, as confirmações das deliberações de outras assembleias. O senado analisaria os casos e confirmava ou não o decidido na assembleia popular, especialmente nas propostas de lei (rogatio) dos magistrados ou a apresentação de candidatos, remetida para a assembleia popular. Este era um poder muito relevante, tendo em conta que garantia o controlo e ratificação das deliberações das assembleias populares e das propostas dos magistrados. A partir de 339 a.C. com a lex publilia Philonis, este poder torna-se ainda mais relevante, aumentando o poder do Senado e evidenciando a crise das magistraturas e dos órgãos do Populus. Em vez de se recorrer ao Senado depois da deliberação das assembleias populares, recorrer-se-ia a este após a proposta dos magistrados, evitando a entrada em vigor ainda que debilitada pela falta de auctoritas dos patres.

Em terceiro lugar, o senatusconsultum era a consulta dada pelo Senado a um magistrado, caso este a requisitasse. O processo poderia ser interrompido pelo intercessio, de um dos cônsules ou do tribuno da plebe, retirando a validade jurídica à deliberação que passava a designar-se como senatus auctoritas. Apesar da eficácia normativa crescente deste poder no período da república, nunca criaram diretamente ius civile.

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Durante o principado, o Senado foi o instrumento por excelência que, sob o pretexto de republicanismo aristocrático, concentrou os poderes totalmente no prínceps. Afirmando pretender a regeneração das instituições republicanas, o prínceps podia, inicialmente, prestar atos de culto e benefício, apenas formalmente, ao Senado, mantendo de qualquer forma a transferência de competências para si.

Augusto, através de três lectiones, que introduziram reformas decisivas sobre o prestígio do Senado, mas que apenas serviram para garantir a manipulação e controlo político do prínceps sobre o Senado.

Em primeiro lugar, reduziu o número de senadores e limitou o acesso a estes cargos. Ainda mais, passa a ter o poder de convocar o Senado a qualquer momento, e o lugar da reunião foi feito aprovar numa lex rogata pelo prínceps.

Enfim, retira poderes ao populus que concede ao Senado. Contudo, o prínceps era realmente quem os exercia. Sendo assim, perde todos os poderes que exercia com independência, passando a ser apenas um meio para a ação política do prínceps.

Os novos poderes do Senado eram: administração das províncias senatoriais; a nomeação dos magistrados encarregados do tesouro público; o poder extraordinário de autorizar derrogações pontuais às leis em vigor; o poder de legislar através do senatusconsultus; exercia um poder de jurisdição penal limitado; e exercício de parte da atividade administrativa.

Assim que começaram a aparecer os senatosconsultus, começaram a desaparecer. O reforço do prestígio do Senado foi logrado. O Senado passou apenas a ser o lugar onde o prínceps anunciava e publicava as suas decisões legislativas. Também tratava do aerarium militare, isto é, funções militares distribuídas por Augusto, que permitiam uma distribuição rápida e generosa dos praemia militaria aos veteranos, os três senadores escolhidos pelo princeps durante três anos.

O seu poder legislativo recorria a três instrumentos constitucionalmente previstos: a auctoritas patrum (ratificação ou não das propostas dos magistrados, aprovadas na assembleia populares e já formalmente com a natureza de lei), contudo o Senado pronunciava-se sobre as propostas antes de apresentadas à assembleia popular (a sua intervenção neste sentido era apenas de controlo e conselho, não deliberativa); a intervenção preventiva, requisitada pelos magistrados, sem caráter vinculativo, mas tomada, cada vez mais, devido ao prestígio crescente do Senado, pelo magistrado como a direção que devia ser seguida; a interferência nas decisões do pretor, a seu pedido, mas com forte efeito na modulação do ius praetorium e no ius honorarium.

Dado que as suas caraterísticas monárquicas impossibilitam a convocação e atuação dos comícios, tornava-se na única assembleia que se podia reunir sem ameaçar a legitimação e poder do prínceps, por isso, a sua importância aumenta.

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As magistraturas do Populus

As magistraturas da república, apesar de incidirem sobre quase todos os poderes (judiciários, políticos, militares), não incidiram nos poderes religiosos, que se mantêm na posse exclusiva dos sacerdotes. Nasceram durante o período de crise no governo quiritário. Para a sua regulação, mantiveram-se sempre dois titulares para cada magistratura, com absoluta paridade, garantindo o controlo recíproco e as magistraturas menores subordinavam-se às maiores. A separação rigorosa entre elas garantia a harmonização sistémica e responsabilização dos titulares.

A estabilização constitucional concretizou-se com o sistema de eleição pelas assembleias populares. Desta forma, fixaram-se rígidas condições para os candidatos à eleição de magistrados: ius suffragii (podem ser submetidos à votação do eleitorado ativo); ingenuidade (não ser escravo, pertencer ao grupo ao qual a magistratura estava reservada, ter mais de 28 anos, não ser acusado de infamia).

Para evitar abusos nas magistraturas ordinárias, integradas no cursus honorum, foram fixados limites: temporalidade, pluralidade de magistraturas, colegialidade e da par potestas entre magistrados e um conjunto de regras e praxes constitucionais de controlo, com uma finalidade preventiva. Assim, o magistrado tinha responsabilidades e tinha que prestar contas e não poderia acumular cargos ou repeti-los.

As magistraturas maiores tinham imperium e potestas, enquanto as menores apenas tinham potestas. As ordinárias podiam ser permanentes ou não permanentes, enquanto as extraordinárias eram sempre não poderes e tinham poder de intercessio.

Os magistrados ordinários eram elementos estabilizadores (censores; cônsules; pretores; edis; questores), tendo em conta que eram eleitos regularmente. Já os extraordinários eram eleitos em casos extremos. Tendo um limite máximo para exercer o seu mandato. As magistraturas ordinárias mais importantes eram o consulado e a pretura, eleitos nos comícios centuriais. O imperium do pretor estava subordinado ao dos cônsules, podendo ser vetadas as suas decisões, devido ao ius intecessio.

A ditadura, com um caráter extraordinário, nomeado por um cônsul, tratava de situações de emergência por seis meses. Era um momento de iustitium, com a suspensão da normalidade legal e da aplicação normal da justiça. Era uma magistratura maior extraordinária. Era deliberada pelo Senado e um dos cônsules indicava o nome da pessoa. Poderia ser um ditador com poderes plenos e indefinidos (dictator optimo iure) ou um com poderes específicos em matérias sacrais, mas com grande importância política (dictator imminuto iure). Até 300 a.C. não estava limitada pela intercessio, nem pela provocatio ad populum, e sem controlo pela parte do Senado. Devido ao risco de tirania, foram procurados outros institutos que não permitissem este tipo de situações (senatusconsultum ultimum). Os ditadores poderiam eleger uma magistratura extraordinária maior, o magíster equitum, que comandava o exército-cavalaria.

As magistraturas maiores dos tribuni militum e os tribunis viria gris dandi tinham o comando militar e o poder coercivo; direito de convocar e presidir os órgãos colegiais (senado

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e assembleias); praticar atos coercivos para que fossem obedecidos; direito de emanar e fazer publicar no fórum os seus edicta (ius edicendi); tinham também a possibilidade de assumir os auspícios maiores.

A censura é um exemplo de magistratura maior sem imperium, mas com auspicia. Já os magistrados menores que tinham apenas potetas eram o edil plebeu, o edil curul (a edilidade ficou com a gestão do tesouro e guarda dos arquivos) e os questores. A censura era uma magistratura monocrática, ordinária e inicialmente unitária. Contudo, com o aumento territorial, o número aumenta. Era não permanente e seguida pela hierarquia das magistraturas. Em 339 a.C. passam a ser patrícios, mas pelo menos, um plebeu. Os censores agiam sempre em conjunto.

No período da república surge uma magistratura patrícia-plebeia, que superintende a atividade dos mercados e controla o abastecimento de cereais, ainda organiza as festas e espetáculos e, por fim, trata da propaganda política.

Os questores promoviam a supervisão das receitas fiscais e a distribuição de fundos e receitas necessários para as despesas decididas pelos cônsules e dirigidas pelo Sneado. Estes magistrados, exceto o edil plebeu, tinham ius edicendi e auspícios menores e poderes coercivos menores.

Uma magistratura especial era o tribuno da plebe, com imunidade absoluta e direito de se opor às decisões dos outros magistrados, recorrendo ao intercessio. O seu objetivo era garantir os interesses da plebe. O tribunato da plebe constituiu a nova aristocracia política, com um poder imenso devido ao intercessio.

De forma a limitar as possibilidades de abusos, são delimitadas as ações das magistraturas e são fixadas competências próprias e formas de controlo. A dispersão do imperium é alcançada através das magistraturas e do seu exercício limitado, especialmente das dependências. O mais forte foi distribuído pelos ditadores, cônsules e pretores (o comando do exército centurial).

O imperium consular estava limitado pela divisão de poderes, à temporalidade do cargo, à colegialidade e à provocatio ad populum. O mais importante é que o cônsul exercia todas as competências que não cabiam expressamente aos outros magistrados. O pretor era nomeado pelos comícios centuriais e presidido pelo cônsul. Aplicava, essencialmente, a justiça e apresentava propostas de lei para aprovação pelos comícios.

A distinção ente magistrados maiores e menores era representada por sinais exteriores exibidos. Eram símbolos que identificavam, facilitando a obediência. Os magistrados cum imperium tinham insígnias e auspicia maiora para poderem exercer coercitio.

Para resolver o problema da sobreposição das esferas tradicionais defendidas para separar as magistraturas surge: o princípio da prevalência do imperium (aqueles cum imperium podiam vetar qualquer ato); o princípio da hierarquia (aqueles com imperium maius e a maior potestas podia anular as ordens e vetar os atos); o princípio da tutela da plebe (poder de veto sobre os outros, garantindo a participação dos plebeus e constituía uma forma de controlo).

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Durante o principado, as magistraturas foram o órgão que mais sofreu, devido à sua grande perda de importância. Durante a república, garantiam a fiscalização, um equilíbrio, contudo, com a concentração dos seus poderes no prínceps perderam o conteúdo jurídico-político. Passam a ser apenas uma ilusão, sem iniciativa política e sem capacidade de intervenção, limitando-se a tarefas administrativas e burocráticas.

Apenas tentavam agradar o prínceps pra alcançarem cargos por si indicados. O consulado, por exemplo, deixa de ter conteúdo político e passa a estar limitado pela ação do princeps. Já os pretores mantiveram-se durante um processo mais longo, devido às suas importâncias e conhecimentos técnicos, mas acabaram por ser limitados no seu campo de intervenção e desprestigiados. Conduziram ao desaparecimento da pretura.

Os censores mantiveram-se, mas sem importância politica e com o prestígio institucional, até Domiciano acabar com a censura como magistratura. Os edis curuís mantiveram-se como magistrados, mas com competências reduzidas. Augusto reduziu a edilidade à ação burocrática, hierarquizada e dependente do poder imperial.

Os questores e os magistrados menores foram reduzidos e desvalorizados ou esvaziados das suas funções. O tribunato da plebe foi a magistratura mais abalada, pois Augusto reconhecia o seu valor simbólico na intervenção na justiça em nome do povo e, para tais efeitos, aproveitou o regime do primus inter pares, assumiu a tribuna potestes, sem alterar os seus poderes. Mantiveram o poder de intercessio, menos contra o princeps. Assim, apesar de outros poderes, o princeps poderia sempre anular os seus efeitos.

O principado distribuiu de forma paulatina e eficaz a base que era fundamental na República: as magistraturas. Mantendo as aparências, as suas competências passam para o princeps que concentra o poder.

O Princeps

O princeps tinha dois poderes principais. O primeiro era o imperium proconsulare maius et infinitum que permitia o exercício do comando militar supremo, governo das províncias e a administração do império, influenciando as decisões e a possibilidade de escolher decisores. Foi criada, desta forma, uma rede clientelar, nomeada por este e dele dependente, servindo apenas os seus interesses.

O segundo é a tribunitia potestas, isto é, possibilidade de parar procedimentos do Senado ou das magistraturas que fosse contra as suas ideias. O princeps inicialmente afirma pretender preservar a república, intervindo sempre a pedido dos titulares dos seus órgãos constitucionais. Por isso, Roma confiava neste, concentrando em si os poderes, evitando um poder monocrático, absoluto e hereditário. Na formalidade constitucional, os poderes do princeps eram derivados de outros órgãos. Porém, apenas intervinha nas magistraturas para garantir o exercício de um poder seu concorrente e não complementar. Logo, o seu objetivo era a extinção das magistraturas.

Roma passou a possuir um sistema burocrático fechado. Foi criado um funcionalismo público em apoio ao poder político singular, que excluía a possibilidade de exercício de

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poderes pelos magistrados. Os magistrados perderam importância para o principado, iniciando-se um período autocrático.

Os magistrados e os funcionários diferem-se em muitos aspetos: os funcionários eram designados pelo princeps para que fossem cumpridas leis, enquanto os magistrados estavam limitados a adaptações criativas de regras e eram eleitos pelos cidadãos; os funcionários tinham uma carreira de tempo indeterminado, enquanto os magistrados tinham uma carreira limitada; os funcionários exerciam funções numa estrutura hierarquizada, enquanto os magistrados não obedeciam a hierarquias e tinham ampla liberdade.

O imperador Adriano não apenas formalizou a derrocada do ius praetorium, mas também promoveu a criação de uma carreira para os funcionários civis de Roma. Constatou a importância de organizar em carreiras burocráticas os funcionários do Estado.

Até aqui havia uma estrutura assente em elementos ad hoc, de base consuetudinária. Adriano reordenou, organizou, sistematizou e institucionalizou essa estrutura burocrática num conjunto uniforme de carreiras civis, com regras internas precisas e cerimonial próprio. O cursus honorum deu origem à carreira civil do funcionário imperial. São reforçados os poderes dos funcionários com funções na área da segurança da pessoa do titular do poder e do regime vigente. Os praefecti (estes funcionários) foram-se desdobrando em áreas de atuação e ganhando poderes e prestígios crescentes.

Os curatores juntaram competências dispersas pelas magistraturas, especialmente dos censores, e eram nomeados pelo princeps entre os senadores de maior grau e prestígio, tinham um papel fundamental na institucionalização do poder imperial. O principado criou condições propícias para o aparecimento de uma jurisdição corrente (a cognitio extra ordinem).

Os legati Augusti ajudavam o princeps no comando das legiões e na administração das pronvíncias; os procuratores Augusti geriam o património privado do princeps.

Surgem várias carreiras administrativas públicas que consolidam a primazia do princeps. De tal forma que se tenta identificar a lex do princeps com o ius de Roma. O seu poder era autocrático, exercido despoticamente. Era um regime monárquico que aparentava respeitar os órgãos da república e a tradição. O consilium principis nunca poderia interferir na decisão do princeps. Este apenas construía colégios de conselheiros para melhor exercer o seu poder absoluto.

A transição de República para Principado ocorreu de forma paulatina mas determinada, asfixiando as magistraturas e a expressão autónoma do ius na justiça e solução de casos concretos. Também é relevante o princeps detentor de uma atividade normativa própria. O seu poder era quase absoluto, não vinculado a cumprir leis de Roma, mantendo imunidade através da regra princeps legibus solutus e na qualidade de primus inter pares, exercendo um poder político expresso no plano normativo, para governar a cidade.

Assim, os atos legislativos do princeps, justificados como necessários para a comunidade, eram designados como constituições imperiais, e dividem-se em edicta, mandata, rescripta, decreta e epistolae.

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Os binómios fundamentais

Ius/Fas

Na Antiguidade clássica o Direito estava associado à religião. Os deuses transmitiriam, desta forma, as normas que deveriam ser seguidas e o cumprimento das leis assentava na fonte divina e na aceitação de que apenas um grupo determinado de pessoas conseguiria fazer a interpretação da vontade divina, comunicando com os deuses.

Neste período as normas religiosas ou fas eram confundidas com as normas jurídicas ou ius. O primeiro representa as regras, rituais, e fórmulas supostamente ditadas pelos deuses, para que as normas fossem cumpridas, representando uma regra ideal de vida, indiscutível.

O fas implica a religião, na forma de o fazer, na sanção. Pode ser entendido como a expressão da lex divina e a norma jurídica é uma interpretação humana do fas, logo expressa a lex humana. Em suma, o ius resulta do fas; corresponde a um conjunto de convenções humanas cuja legitimidade advém do fas; é de construção progressiva e busca nos mores maiorum a inspiração e o critério para a interpretativo do fas que está na sua base criadora.

Na esfera da religião foram surgindo: o ius divinum, o ius sacrum, o ius pontificum. No ius foi-se sedimentando a diferença e a separação entre s civile e ius honorarium.

Ius civile/Ius honorarium

O ius civile resulta da interpretatio pelos sacerdotes das regras divinas e dos mores maiorum. Aparece como elemento constitutivo do ius Romanum e contrapõem-se ao ius honorarium, criado pelos magistrados. As suas diferenças também estão relacionadas com os conteúdos.

O ius honorarium/edictale/magistrale é todo aquele que não é civil, isto é, criado pelos edictos de: pretores urbanos e pretores peregrinos; edos ciriís e governadores de província. É um direito criado por magistrados, enquanto o ius civile vem do Populus e é interpretado pelos jurisprudentes.

A ação do pretor permite integrar, corrigir, adaptar e preencher o ius civile em dois momentos: no exercício do ius edicendi e na aquisição com recurso à aequitas. A liberdade do magistrado com imperium na aplicação do direito ao caso permite criar, nos limites da tradição expressa no ius civile novas regras para novas situações. A excessiva formalidade do ius civile é contrabalançada pela eficácia do pretor. O ius honorarium permite a sua renovação, beneficiando de poder atuar no âmbito do primeiro.

Os jurisprudentes sempre se opuseram à criação de direito pelos pretores, tendo em conta a tradicionalidade. Sendo assim, o pretor poderia trabalhar com o ius civile, mas não poderia recriá-lo. Apenas através do tempo conseguiram aceitar a sua atividade como criadora de preceitos jurídicos. A partir da proteção judicial dos direitos conferidos pelo ius civile, que permitiu a um magistrado generaliza-lo à população e transpondo-o para as fases pós-civitas, passando a ser uma constante. O dualismo institucional na composição de uma nova estrutura das fontes é importante, dado que a fusão veloz compromete a riqueza de ambos os

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contributos. Apesar da aproximação, o ius civile mantém um corpo normativo separado e o seu prestígio.

Auctoritas/Imperium

O ius necessita de auctoritas para poder ser válido e eficaz. É necessária na aplicação e na criação, ora o imperium está mais ligado à sua aplicação. Basicamente, o ius é criado pela auctoritas dos jurisprudentes e aplicado com o imperium dos magistrados. Com a decadência da jurisprudência e do ius praetorium, a auctoritas é reduzida à sua expressão, passa a ser a consultadoria daqueles que detêm o imperium para criar lex, ou seja, o princeps.

Os jurisprudentes tinham auctoritas para as suas soluções justas, eram reconhecidos para estes fins. A auctoritas prudentium é sustentada pelo exercício da atividade jurisprudencial.

O imperium é um poder de soberania, absoluto, é detido pelos reis e pelos magistrados. Continha na sua essência: poder militar; poder de convocar as assembleias populares; poder de declarar o direito para efeitos de aplicação. Enquanto o potestas é o poder de representar todo o Populus, o imperium não é concedido a todos os magistrados, como este primeiro (é reservado aos cônsules, pretores e ditadores).

O triunfo da lex sobre o ius, ou seja, do imperium sobre a auctoritas acaba por tronar confusa a distinção entre autoridade e poder.