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360 edIçÃO 05 • JANeIRO de 2017 Geração privilegiada pela longevidade tem muito a superar para viver bem Desafios de envelhecer Luiz Roberto Ramos afirma que o país não está preparado para os idosos Foco no cuidado e na promoção da saúde reduz custos

FEHOESP - 360 · 2020. 11. 6. · Revista FEHOESP 360 em seu smartphone, tablet ou computador. Importante veículo Em nome da Organização Nacional de Acreditação (ONA), parabenizo

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  • 360edIçÃO 05 • JANeIRO de 2017

    Geração privilegiada pela longevidade tem muito a superar para viver bem

    Desafios de

    envelhecer

    Luiz Roberto Ramos afirma que o país não está preparado para os idosos

    Foco no cuidado e na promoçãoda saúde reduz custos

  • OUTUBRO de 2017

    Aguarde

  • edITORIAL

    Um ano difícil e que merecia ter acabado de forma melhor, 2016 foi único sob todos os aspectos. Crise financeira que se agravou, impeachment e troca compulsória de comando no cargo máximo da República, desemprego e desacelera-ção da economia, sem falar nas denúncias de corrupção em cada porta que se abriu em Brasília. Esses são apenas alguns exemplos de mais este ciclo que se encerrou.

    Embora não deixem muita saudade, no entanto, todos esses acontecimentos devem nos servir de alerta para o muito que ainda precisa ser feito. Neste novo ano, mais uma vez, nos vemos obrigados a recuperar o fôlego e pla-nejar novas formas de nos mobilizarmos, a fim de não en-tregarmos os pontos em meio a tantas dificuldades. E, cer-tamente, não o faremos.

    Motivos não faltam. Um Congresso Nacional que, na ca-lada da noite, resolve votar medidas contra a corrupção, desconfigurando seu texto e moldando-o de acordo com in-teresses de terceiros, como aconteceu recentemente, é um claro exemplo disso. Daí a importância de acompanharmos os nomes de quem votou contra e a favor deste absurdo. Importante também entidades, como a FEHOESP, posicio-narem-se, como de fato fizemos neste caso.

    Isso significa que continua sendo imprescindível a mo-bilização enquanto sociedade civil organizada, por meio da atuação das nossas entidades representativas.

    Os primeiros passos foram dados com a condução do impeachment e a vontade popular traduzida nas inúmeras manifestações que ocuparam as ruas. Mas de nada valerá

    Entusiasmopara lutar

    todo esse esforço se não continuarmos atentos e prontos para lutar pelos interesses públicos, que no fim beneficiam toda a sociedade brasileira. A nossa responsabilidade, por-tanto, é cada vez maior e devemos usar isso como motivo de muito entusiasmo para 2017.

    Até porque, de todas as mudanças ocorridas até aqui, ainda não tivemos nenhum resultado prático nem para as nossas empresas, nem para o setor de saúde como um todo. A crise da saúde suplementar, com a diminuição importante do número de usuários, e do próprio Sistema Único de Saú-de (SUS), que se degrada progressivamente, são situações que não nos deixam mascarar a difícil realidade.

    O setor público, inclusive, que tem sido objeto de discus-são por conta das medidas que limitam os gastos do gover-no e que tanto tem gerado acalorados debates. Acreditamos na necessidade deste remédio que, embora seja dos mais amargos, é absolutamente necessário neste momento que nos encontramos, como forma de fazer o país não gastar mais do que arrecada. Com isso, cabe-nos agir no sentido de orientar para que se melhore a qualidade dos gastos do governo, primando pela eficiência e responsabilidade aci-ma de tudo.

    Precisamos, enfim, de muito entusiasmo para obter bons resultados em todos os setores do país, inclusive na saúde. Que tenhamos um ano produtivo de vitórias.

    Yussif Ali Mere JrPresidente

  • ÍNdICeLíderes da saúde e profissionais do mercado opinam sobre a revista

    Veja os principais acontecimentos do setor na seção de notas

    FEHOESP e SINDHOSP promovem tradicional evento de fim de ano

    Foco no cuidado e na promoção da saúde reduz custos

    Entrevista exclusiva com o geriatra Luiz Roberto Ramos

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    Geração privilegiada pela longevidade tem muito a

    superar para viver bem

    CAPA 16

    Ética e transparência: soluções para a sustentabilidade do setor

    Resenha: a experiência de grandes estrategistas como lição para empreendedores

    Danilo Bernik fala sobre as preocupações do sistema de saúde suplementar

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  • PAINeL dO LeITOR ONLINe

    Confira na edição digital os conteúdos exclusivos da

    Revista FEHOESP 360 em seu smartphone,

    tablet ou computador.

    Importante veículoEm nome da Organização Nacional de Acreditação (ONA), parabenizo toda equipe da FEHOESP 360 pela produção desse importante veículo. A revista aborda assuntos de in-teresse que contribuem para a melhoria da saúde no Brasil. Temas atuais e bem desenvolvidos compõem um conteúdo rico que informa de maneira objetiva sobre o setor. Parabe-nizo também pela iniciativa de inovação ao criar um aplica-tivo da revista.

    DespojadaA nova Revista FEHOESP 360 é clean, com uma leitura de fácil compreensão e com layout mais moderno. Parabenizo toda a equipe responsável pelo conteúdo e reformulação.

    Além disso, parabenizo especialmente a edição número nº 3, que trouxe a matéria “Realidade nada doce”, que expõe de maneira muito didática o cenário do diabetes, suas com-plicações e os avanços que a tecnologia tem proporcionado para que a pessoa com esta condição viva com mais quali-dade de vida.

    ARLINdO de ALmeIdA, presidente e diretor-geral da ona

    360

    CAPA

    Veja a opinião dos especialistas do setor

    sobre o envelhecimento populacional e uma entrevista

    exclusiva com o presidente do IEPAS, José Carlos Barbério, de 85 anos.

    ENtREVIStA

    Acesse a palestra “Longevidade saudável: um

    sonho possível”, realizada no SINDHOSP, com o entrevistado

    Luiz Roberto Ramos.

    moderna e agradávelGostei muito da Revista FEHOESP 360: edições primoro-sas, apresentação moderna, visual leve e agradável. Maté-rias de interesse para os diversos profissionais do mercado da saúde. Muito abrangente, um estímulo à leitura. Com cer-teza, contribuirá para nos manter atualizados.

    Sugiro, como reportagem, manter um canal constante sobre o relacionamento comercial e operacional entre ope-radoras de planos de saúde e prestadores de serviços - um tema que tem muito a ser explorado. Parabéns a todos.

    FLávIO mARTINs, COORdeNAdOR de RegRAs de NegóCIOs dO HOsPITAL veRA CRuz, de CAmPINAs-sP

    vANessA PIROLO, jornalista e coordenadora voluntária na adj diabetes brasil

  • Abrahão, da ANS; Lottenberg, do ICOS; e Barbosa, da Anvisa, durante o debate

    NOTAs

    Clínicas debatem propostas para a saúde

    Um debate sobre os desafios da área da saúde, abordando questões que englobam desde relações do trabalho até as perspectivas dos setores hospitalar, da medicina diagnós-tica, da indústria e das seguradoras e operadoras, marcou o 1º Congresso Internacional de Gestão em Saúde, realiza-do em novembro, em São Paulo, promovido pela Associa-ção Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed) e pelo Instituto Coalizão Saúde (ICOS).

    Participaram do simpósio os presidentes da Agência Na-cional de Saúde Suplementar (ANS), José Carlos Abrahão; da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Jar-

    Congresso mostra o futuro do setor no Brasil

    O SINDHOSP reuniu as clínicas paulistanas e formou a Câ-mara Técnica (CT) Planejamento Saúde São Paulo com o objetivo de construir uma proposta de parceria da inicia-tiva privada com a prefeitura municipal de SP, a ser levada para o prefeito João Dória, em audiência.

    Impulsionado pelo desejo do novo administrador mu-nicipal da maior cidade do país de construir parcerias com o setor privado para aumentar o acesso da população aos serviços de saúde, o Sindicato convocou clínicas de diver-sas especialidades, que atuam na capital, para conhecer quais as demandas e os interesses de cada uma.

    Foram realizados dois encontros em novembro no au-ditório da entidade, com representantes de 30 clínicas. "Existem várias São Paulo dentro da cidade. Precisamos de políticas específicas para cada região", afirmou o vi-ce-presidente do SINDHOSP, Luiz Fernando Ferrari Neto, que coordenou os encontros.

    Os membros da CT participaram de uma pesquisa para o mapeamento da rede de serviços que o grupo terá dis-ponível para oferecer à prefeitura. A partir dessas informa-ções, o grupo voltará a se reunir para estudar e aprimorar a proposta a ser encaminhada ao governo municipal.

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    Representantes de clínicas preparam proposta de parceria à prefeitura de SP

    bas Barbosa; do conselho do ICOS, Claudio Lottenberg; e do Conselho da Associação Nacional de Hospitais Priva-dos (Anahp), Francisco Balestrin.

    "O objetivo foi aproveitar a presença de tantas lideran-ças para estimular a reflexão sobre os desafios do setor, como também provocar linhas de ação. As pessoas que estiveram no evento absorveram questões bastante im-portantes à saúde", explicou a presidente da Abramed, Claudia Cohn, que agradeceu o esforço de todos por esta-rem presentes, mostrando o comprometimento de toda a cadeia para mudar o panorama do setor.

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    A FEHOESP e o SINDHOSP reuniram os membros dos comi-tês e comissões da Federação e do Sindicato em um coque-tel para celebrar o encerramento das atividades de 2016. O encontro foi realizado no dia 6 de dezembro, no restaurante Madeleine The Jazz Bar, na capital paulista.

    Entre os convidados, estiveram os membros das Comis-sões de Recursos Humanos e Segurança e Saúde Ocupacio-nal, dos Comitês de Laboratório, Saúde Mental e Terapia Re-nal Substitutiva e do Grupo de Advogados na Área da Saúde. Também marcaram presença o presidente da Federação e do Sindicato, Yussif Ali Mere Jr, e o presidente do IEPAS, José Carlos Barbério.

    Os comitês e as comissões são formados por represen-tantes dos estabelecimentos de serviços de saúde asso-ciados ao SINDHOSP e aos demais sindicatos da FEHOESP para melhor assistir e orientar seus representados em cada categoria.

    Coquetel celebra comitês e comissões das entidades A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) re-

    alizou, no dia 24 de novembro, em São Paulo, o jantar co-memorativo de seus 50 anos. O evento contou com as pre-senças de executivos e autoridades da saúde, como o então secretário de saúde da cidade de São Paulo, Alexandre Padi-lha, do presidente da Agência Nacional de Saúde Suplemen-tar (ANS), José Carlos Abrahão, e demais diretores do órgão.

    Em seu discurso, o presidente da entidade, Reinaldo Scheibe, destacou o pioneirismo que marca a história da associação, bem como os desafios que permearam as cinco décadas de sua história. “É importante lembrarmos que a Abramge é anterior ao SUS e os planos de saúde tornaram-se, naturalmente, parceiros privados do setor público de saúde. Em 50 anos, enfrentamos todos os desafios com de-terminação e disposição para a busca de soluções, sempre com esperança em um futuro melhor, ofertando serviços de qualidade e apoiando o desenvolvimento da assistência à saúde no Brasil, permitindo o seu crescimento, moderniza-ção e avanço tecnológico.”

    Abramge celebra 50 anos

    A Federação Brasileira de Hospitais (FBH), com o apoio da Confederação Nacional de Saúde (CNS), lançou, em no-vembro, o livro: “Um Século de Saúde no Brasil – Avanços e Retrocessos”, do médico e gestor em saúde Olympio Távora Derze Corrêa. A obra, que reitera o objetivo da instituição de incentivar o empreendedorismo na saúde, é uma leitura crítica dos problemas que afligem o setor e apresenta uma visão de quem viveu vários papéis na execução das políticas

    FBH lança livro de saúde, atuando junto às entidades e trabalhando em prol de uma assistência justa e adequada à população.

    O lançamento da publicação ocorreu durante o evento que comemorou os 50 anos da FBH. “Comemoramos os 50 anos da Federação, sentimos saudade daqueles que não estão entre nós, temos a perseverança naqueles que estão conosco e guardamos a esperança naqueles que virão”, dis-se Luiz Aramicy Pinto, presidente da entidade.

    Encontro marcou o encerramento das atividades das comissões e comitês

    Cyro de Britto Filho, Arlindo Almeida e Ieraldo Rubo, ex-presidentes da Abramge, com Reinaldo Scheibe Ric

    ardo

    Man

    sho

  • antendo a tradição, a FEHOESP e o SIN-DHOSP ofereceram, em 30 de novembro, um co-quetel para celebrar o encerramento das ativida-des de 2016. Realizado no restaurante Santinho, localizado no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, o evento teve como pano de fundo a arte de Gaudí, em exposição no complexo, e a própria arquitetura expressiva do local.

    Neste ano, cerca de cem representantes do se-tor da saúde, empresários e autoridades compa-receram e se mostraram otimistas com o futuro. Com novas regulamentações, discussões e a in-

    certeza do cenário político, o setor espera so-luções e mudanças para 2017. “Não pode-

    mos desanimar”, afirmou o presidente da Federação e do Sindicato, Yussif

    Ali Mere Jr, durante seu discurso. “2016 foi traumático e difícil. A

    realidade nos trouxe barreiras e pensamos no que precisa ser feito para vencê-las. A sociedade civil

    organizada, que se traduz nas enti-dades aqui presentes, ganhou mais

    FEHOESP e SINDHOSP realizam tradicional coquetel de fim de ano

    M responsabilidades depois do processo de impea-chment. Isso foi só o começo. E é apenas este fato que nos enche de entusiasmo para começar 2017 e obter resultados práticos para nossas empresas e para o setor da saúde”, disse Yussif.

    Entre os convidados, estiveram o diretor da FEHOESP e vice-presidente do SINDHOSP, Luiz Fernando Ferrari Neto; Antonio Carlos de Carva-lho, diretor das entidades; o presidente e o gestor do Instituto de Ensino e Pesquisa na Área da Saú-de (IEPAS), José Carlos Barbério e Marcelo Gratão, respectivamente; a presidente da Hospitalar Feira + Fórum, Waleska Santos; a diretora da Feira e de Marketing da UBM Brazil, Mônica Araújo; o presi-dente do Conselho de Administração da Anahp, Francisco Balestrin; Franco Pallamolla, presiden-te da Abimo; o secretário do Sinaemo, Paulo Frac-caro; Gonzalo Vecina Neto, professor assistente da Faculdade de Saúde Pública da USP; Alex Ga-loro, presidente da Sociedade Brasileira de Pato-logia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML); o vereador Paulo Frange (PTB-SP), entre outros.

    Confira na edição digital da Revista FEHOESP 360 a opinião das lideranças da saúde sobre o se-tor e os desafios para 2017. (Por Rebeca Salgado)

    #EVENtOS

    Um brinde em meio à arte

    "Não podemos desanimar", afirma Yussif

  • Gaudí apresenta Barcelona Durante o coquetel, os convidados puderam con-templar a exposição que traz a obra universal do arquiteto Antoni Gaudí: Barcelona, 1900, com 46 maquetes, quatro delas em escalas monumen-tais, e 25 peças, entre objetos e mobiliário criados pelo mestre catalão.

    Com trabalhos oriundos do Museu Nacional de Arte da Catalunha, Museu do Templo Expia-tório da Sagrada Família e da Fundação Cata-lunya-La Pedrera, os curadores da exposição, Raimon Ramis e Pepe Serra Villalba, destacam os processos construtivos dos projetos de Gaudí por meio de modelos tridimensionais, que res-saltam detalhes de sua arquitetura. No design, móveis e objetos, que vão de maçanetas de me-tal a peças em cerâmica e madeira, dão conta de como a criação artesanal conseguiu fundamen-tar a indústria. O conjunto das obras testemunha a geometria calculada a partir da observação e estudo dos movimentos da natureza. Com este princípio racionalista, o artista instaura uma esté-tica moderna única que marcou definitivamente a cidade de Barcelona.

    Exposição Gaudí: Barcelona, 1900Até 5 de fevereiro de 2017 Terça a domingo, das 11h às 20h – última entrada na exposição às 19hIngressos: R$ 12,00 e R$ 6,00 (meia-entrada) Às terças-feiras a entrada é gratuita mediante re-tirada de senhas na bilheteria do Instituto Tomie Ohtake.

    Instituto tomie Ohtake: um marco culturalO Instituto Tomie Ohtake foi inaugurado em no-vembro de 2001 e destaca-se por ser um dos raros espaços da capital paulista especialmente proje-tado, arquitetônica e conceitualmente, para rea-lizar mostras nacionais e internacionais de artes plásticas, arquitetura e design.

    O local homenageia a renomada artista Tomie Ohtake e promove exposições que retratam os últimos 60 anos do cenário artístico e de movi-mentos anteriores que levam a entender melhor o período em que a arquiteta atuou, organizando mostras inéditas no Brasil, como Louise Bour-geois, Josef Albers, Yayoi Kusama, Salvador Dalí, Joan Miró, entre outras.

    Além de um programa de exposições marcante na cena cultural brasileira e que se desdobra em outras atividades como debates, pesquisa, produ-ção de conteúdo, documentação e edição de pu-blicações, o Instituto Tomie Ohtake desenvolve, desde a sua fundação, ampla pesquisa no ensino da arte contemporânea. Por isso, foi pioneiro na criação de novos processos para a formação de professores e de alunos das redes pública e priva-da, além de realizar uma série de atividades dirigi-das ao público em geral e projetos de estímulo ao desenvolvimento da produção contemporânea.

    Instituto Tomie OhtakeAv. Brigadeiro Faria Lima, 201 (entrada pela R. Coropé, 88)Pinheiros - São Paulo-SP A 800 m do metrô Faria Lima - Linha Amarela

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    gesTÃO

    Prevenir para

    economizar

    sabedoria popular diz que prevenir é melhor que re-mediar. Além de uma recomendação útil para a vida, essa máxima também tem seu valor quando aplicada à gestão. Segundo especialistas, investir em ações de prevenção de doenças e promoção da saúde é muito útil para reduzir cus-tos. “Falar em ações de promoção e cuidados com a saúde é falar em investimento, mas, neste caso, é uma aplicação de longo prazo”, ressalta Valéria Terra, professora da FGV Saú-de. “Normalmente as organizações olham somente para os gastos, mas, também, é necessário agir para que as doenças demorem mais tempo para se manifestar nas pessoas. Man-tê-las saudáveis resulta em menos gastos, complicações, sequelas, afastamentos e mais produtividade no trabalho”, acredita.

    Essas práticas, no entanto, ainda têm um nível de adesão baixo no Brasil, quando comparadas com outros países. Um estudo feito pela Aon, consultoria em gestão de riscos, benefí-

    Foco no cuidado e na promoção da saúde reduz custos

    A cios e capital humano, em 90 países, com cerca de quatro mil empresas, mostra que apenas 14% das companhias brasilei-ras realizam algum tipo de programa de promoção de saúde. No mercado americano, o percentual é de 40%. De acordo com Humberto Torloni Filho, vice-presidente de Benefícios Globais da consultoria, ainda há muito a se fazer para inse-rir esse hábito nas corporações nacionais. “Esses programas trazem resultados em médio e longo prazos e começam a ser aferidos após 18 meses”, comenta. Para ele, é comprovado que detectando, por exemplo, um câncer em uma fase inicial

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    evita-se cirurgias maiores, mais sessões de quimioterapia, radioterapia e imunoterapias. “O lucro dos hospitais continu-ará existindo, porém, se dará mais na área de prevenção do que em tratamentos para casos mais avançados.”

    As características do sistema de saúde do Brasil, no en-tanto, dificultam iniciativas com essa finalidade. “O que era considerada uma transição demográfica e epidemiológica já não é mais apenas uma fase, é uma realidade. A popula-ção idosa está mais numerosa, não morre mais de doenças infectocontagiosas, mas, sim, de enfermidades preveníveis. Aí está o grande desafio, porque a maneira como é estrutu-rado o sistema de saúde no país e como é feita a remunera-ção, focada em produção, são estímulos para que existam apenas serviços para tratar de doenças”, explica Valéria.

    Na opinião de João Paulo dos Reis Neto, vice-presidente da União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas), esse tipo de investimento, além de reduzir custos das empresas, também contribui para a redução do agrava-mento de doenças. A pesquisa Unidas 2016 - levantamento anual sobre o segmento de autogestão, que reúnem três milhões de beneficiários -, aponta que 21% das internações hospitalares são potencialmente evitáveis e as causas mais frequentes são hipertensão, gastroenterites e complicações, insuficiência cardíaca, infecção no rim e trato urinário e dia-betes. “Esse dado reforça a importância de dar atenção ao acompanhamento dessas e outras doenças, o que evitaria não só os custos com internação, mas com medicamentos, diárias médicas e equipamentos”, destaca.

    Outro aspecto positivo dessa questão é abordar o pa-ciente como parte de um processo e não apenas um pro-cedimento, acarretando, assim, uma dependência cada vez menor de tabelas de preços para remunerar os serviços. “Procuramos cuidar do paciente como um todo: corpo, mente e do entorno social, oferecendo, assim, mais quali-dade de vida. Esse processo resulta em menos problemas de saúde e menos idas desnecessárias ao hospital”, explica Fernando Parrillo, CEO da Prevent Senior. “No fim, além da satisfação do paciente, os recursos são melhor distribuídos, pois, em vez de serem direcionados para cirurgias, podem ser investidos em outros tipos de tratamento.”

    Para a professora da FGV Saúde, as operadoras de auto-gestão, de fato, são o mercado ideal para as atividades de prevenção de doenças e promoção de saúde. "Como as operadoras em geral têm uma grande rotatividade da car-teira de beneficiários, porque são trocadas pelas empresas quando surge outra com preços mais baixos, fica mais difícil desenhar programas de prevenção. Já nas autogestões há uma estabilidade maior de usuários, inclusive, com perma-nência desses clientes após a aposentadoria deles", explica.

    PossibilidadesA organização pode desenvolver, de acordo com Torloni Filho, um perfil de saúde identificando funcionários e de-pendentes com mais probabilidade de ter certas doenças a partir do uso de ferramentas disponíveis no mercado, como softwares, estudos, questionários etc. “O perfil identifica os potenciais grupos de maior risco para determinadas pato-logias, permitindo que a empresa foque maior atenção nes-sas pessoas”, explica. Outra possibilidade, segundo ele, é desenvolver um programa de check-up para mostrar pontos de atenção na saúde dos pacientes que possibilitem uma investigação mais profunda quando necessário.

    Valéria Terra alerta que é preciso estudar maneiras de al-terar a metodologia de remuneração dos prestadores para que mudanças desse tipo possam ser introduzidas em lar-ga escala. “Os prestadores não teriam mais tanto interesse em apenas produzir se recebessem um montante fixo para atender uma determinada população. Neste caso, eles esta-riam fortemente motivados a fazer com que esses indivíduos ficassem mais saudáveis para demandarem menos serviços e gastos”, exemplifica. “É preciso que as ações tenham cará-ter institucional para estimular essa mudança no mercado, como tem feito a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com discussões sobre modelos assistenciais”, acredita.

    Prevenir enfermidades e promover saúde traz, inclusive, um bônus para os gestores: a melhora na qualidade da vida da sua carteira de beneficiários. “Temos pesquisa de uma de nossas filiadas que mostra redução das internações po-tencialmente evitáveis em 28%, somente com a adoção de ações e estratégias voltadas para priorizar determinadas causas e grupos etários e com o monitoramento contínuo de algumas doenças”, ressalta Reis Neto, da Unidas. (Por Eleni Trindade)

    Valéria Terra, professora da FGV Saúde

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    Mas, para o geriatra Luiz Roberto Ramos, o país não está preparado para lidar com seus idosos

    Por REBECA SALGADO

    ma verdade absoluta a ser pen-sada: o Brasil não é mais um país de jovens. A população está envelhecen-do rapidamente e a tendência dos pró-ximos anos é ver o número de idosos quase dobrar no país.

    Inferior a 10% durante todo o século XX, a nossa proporção de mais velhos

    costumava ser equivalente à de países menos desenvolvidos. Na última déca-da, porém, este perfil começou a mu-dar rapidamente. Com a expectativa de vida, que em 2015 aumentou, segundo o Instituto Brasileiro e Geografia e Es-tatística (IBGE), para 75,5 anos, e a taxa de natalidade menor do que dois filhos

    por casal, os gestores, principalmente da área da saúde, precisam repensar o envelhecimento saudável e ativo.

    Para Luiz Roberto Ramos, geriatra e diretor do Centro de Estudos do Enve-lhecimento da Escola Paulista de Medi-cina e coordenador do Departamento de Medicina Preventiva da Universida-

    U

    Viver mais já é uma

    eNTRevIsTA

    realidade

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    de Federal de São Paulo (Unifesp), a transformação epidemiológica, a refor-ma da Previdência Social e o aumento das doenças crônicas são os principais fatores ignorados no país quando o as-sunto é a terceira idade.

    Em entrevista à Revista FEHOESP 360, o médico comenta o crescimento da população idosa, a falta de estru-tura necessária para o atendimento dessa população e as principais neces-sidades de mudança no sistema para atender esta nova realidade brasileira.

    Confira:

    Revista FEHOESP 360: De acordo com o Ministério da Saúde, o país tem a quinta maior população de idosos do mundo. São cerca de 28 milhões de pes-soas com 60 anos ou mais que precisam de atendimento, estrutura de saúde, qualidade de vida e muito mais. Como o senhor analisa o rápido crescimento da população idosa no Brasil? Luiz Roberto Ramos: O envelheci-mento vem acontecendo no país por duas quedas: de mortalidade e de fe-cundidade da população. Podemos

    dizer que o brasileiro ganhou quase 30 anos de vida nos últimos 50 anos, um processo rápido que vem por meio de um bom controle epidemiológico e também do aumento e eficácia dos métodos contraceptivos.

    360: Qual é o perfil do idoso brasileiro hoje? LR: O Brasil é um país muito heterogê-neo. São cinco regiões muito diferentes entre si, mas os nossos idosos muito se assemelham com os anciãos ao redor do mundo, que também convivem com doenças crônicas e sofrem com a incapacidade por essas doenças. Uma peculiaridade que temos aqui é a convivência familiar, ou seja, na maior parte dos casos o idoso mora com um filho, cônjuge ou parente próximo, algo não muito comum na Euro-pa, que tem a maior parte dessa população morando sozinha. Um grave problema é a condição so-cioeconômica nada favorável para o envelhecimento. Grande parte da população vai envelhecer em ambientes que possuem uma situ-ação geográfica desfavorável, com saneamento básico ruim, como é o caso do Norte e Nordeste.

    360: Quais são os estigmas relaciona-dos aos idosos? O pensamento do brasi-leiro de que o país é formado por jovens auxilia a manter algumas barreiras na atenção à terceira idade? LR: Acredito que estamos nos curan-do dessa imagem de que o Brasil é um

    país de jovens. Ser velho antigamente era algo como ser considerado fora da realidade brasileira. 'Somos um país de jovens, não temos que nos preocu-par com o envelhecimento.' Isso está caindo à medida que se percebe que o Brasil está desenvolvendo uma enor-me população de idosos e que vamos ter de nos organizarmos para dar conta disso. Uma questão que todo mundo já sentiu é a Previdência Social, ela não dará conta. Isso vai gerar um debate sobre a população economicamente ativa e seus dependentes. Antigamen-te, eles eram as crianças, que eram vis-tas como uma obrigação. Atualmente, a população de dependentes do país é constituída, na maior parte, por idosos e vemos uma necessidade de desen-volver uma consciência social, até por-que os jovens de hoje serão os idosos de amanhã e obviamente vão precisar de algum tipo de ajuda. O principal estigma é pensar que a terceira idade não faz parte da nossa realidade ou que são pessoas doentes e incapazes, quando, na realidade, a maioria dos acima de 60 anos leva uma vida nor-mal e independente.

    360: O senhor acredita que a popula-ção é devidamente esclarecida ao lon-go da vida sobre as necessidades do idoso? Faltam informações para lidar com essa questão?LR: Nunca houve uma educação so-cial para isso. Mas é possível perceber

    O principal estigma

    é pensar que a terceira

    idade não faz parte da

    nossa realidade"

  • eNTRevIsTA

    meçamos a notar mudanças no com-portamento da sociedade.

    É um processo que demora, mas a população vai se convencer que a cada ano alcançamos idades mais avança-das, e que, com isso, vão ter algumas limitações. Antigamente as pessoas morriam cedo e não tínhamos essa preocupação de como lidar com o ido-

    so. Vivia-se muito bem até o dia em que simplesmente a vida acabava. Hoje, vi-ve-se bem e mais, porém, as dificulda-des chegam e duram mais tempo.

    360: A tendência é que essa população continue crescendo nos próximos anos graças aos avanços da medicina, das pesquisas científicas e da mudança na pirâmide epidemiológica. Como os cen-tros de saúde devem se preparar para essa nova realidade? LR: Hoje em dia os hospitais não são a solução. Eles são, na verdade, parte do problema. Se não temos um sis-tema de saúde adequado para uma pessoa que está envelhecendo, ela vai imediatamente ao hospital porque não encontra um atendimento de qualida-de na Unidade Básica de Saúde (UBS). Quando o problema se agrava, o indi-víduo acaba indo direto ao pronto-so-corro, depois vem a internação, a UTI, e o sistema acaba utilizando sua parte mais sofisticada para um atendimento amplo e, muitas vezes, desnecessário. Falta um planejamento para equipes multiprofissionais no atendimento à saúde básica que desafogue a realida-de do hospital. Faltam políticas públi-cas de atenção ao idoso.

    360: A criação dessas políticas públicas cabe somente ao governo ou pode tam-bém ser feita em conjunto com a inicia-tiva privada?

    14

    que as pessoas estão começando a ter consciência. Isso pode ser percebido no metrô, por exemplo, com os assen-tos para idosos e pessoas com limita-ções, que estão sendo mais respeita-dos. As pessoas notam que existe essa parcela da população, que ela tem seus direitos e merece ser respeitada. São nessas pequenas coisas que co-

  • LR: É preciso que a política de saúde dos governos estaduais e municipais e do Ministério da Saúde identifique e promova mais claramente ações para essa população, por meio de campa-nhas de divulgação e, principalmen-te, ter nas UBS essa estrutura para o indivíduo ir até lá e perceber que vai ser bem atendido, que vai resolver seu problema. Normalmente, os idosos vão a uma unidade básica pela primei-ra vez, não encontram o que precisam e acabam nunca mais voltando.

    Já a saúde suplementar está se or-ganizando, até porque é uma ques-tão de sobrevivência e não só de fa-zer o bem para os idosos. Se não se preparar para dar conta da realidade de saúde da população acima de 60 anos como ela se apresenta, com um enfoque multiprofissional, ênfa-se em promoção de saúde, estimu-lando-as à atividade física, a comer adequadamente, evitar intoxicações dispensáveis, teremos uma popula-ção envelhecendo mal e demandan-do muito mais do sistema do que ele pode dar. É uma questão que implica tanto o SUS como a saúde suplemen-tar. Quem não se organizar vai falir. Os idosos brasileiros são a parcela de po-pulação que mais faz uso dos serviços de saúde. Dentre as pessoas com 60 anos ou mais, a proporção é de pelo menos 25%, sendo que todas as outras faixas etárias são menores. Para piorar, eles são ainda os que mais se sentem discriminados num ambiente onde de-veriam ser bem tratados.

    360: Há falta de profissionais qualifi-cados no mercado, segundo a Socie-dade Brasileira de Geriatria e Geron-tologia (SBGG). Na sua opinião, há profissionais devidamente prepara-dos e em número suficiente? LR: Há pouquíssimo tempo a ques-tão do envelhecimento ficou mais aparente para todo mundo como uma questão de saúde pública e o

    aparelho formador desses profissio-nais, que é a universidade, também começou a se equipar para dar essa resposta. Disciplinas de geriatria e ge-rontologia começaram a surgir de 20, 30 anos para cá, mas ainda de uma for-ma bem modesta. Há uma concentra-ção de pessoas que vão se especializar nessa área ainda muito aquém do que seria necessário. Temos 20 vezes mais pediatras no Brasil do que geriatras e a situação da população atual é exata-mente contrária. Temos pessoas enve-lhecendo e poucas crianças nascendo.

    360: A reestruturação do sistema traria também a solução desse problema?LR: Com certeza, é uma questão de mercado. Na medida em que você percebe que o sistema está se reestru-turando para dar conta da condição do idoso, os profissionais da saúde vão ter mais estímulo para serem es-tabilizados nessa área, mas isso não é algo que acontece do dia para a noite, são anos e anos para se formar esses profissionais. O sistema de formação universitário está se readequando e correndo atrás. Fico feliz que a Uni-versidade Federal de São Paulo, onde trabalho, percebeu isso e definiu o en-

    Faltam políticas

    públicas para

    atenção ao idoso”

    velhecimento como meta, uma preocu-pação institucional.

    360: Quanto ao mercado de trabalho, estamos preparados para os funcioná-rios da terceira idade?LR: No Brasil muito pouco, infeliz-mente. Vemos em alguns países a contratação de idosos para trabalhos que não demandam muitos esforços, mas que estimulam as funções vitais e cognitivas. É um pensamento que não só pode, mas deve chegar ao gestor o quanto antes. É um modo de auxiliar o envelhecimento saudável para essa parcela da população.

    360: Falando em envelhecimento sau-dável, se o senhor pudesse dar uma re-ceita para ele, qual seria?LR: É uma receita comum, mas que as pessoas não levam a sério. Para enve-lhecer bem, deve-se ter a noção de que, em primeiro lugar, as doenças crônicas

    sempre vão existir, então o sonho de envelhecer sem nenhuma doença é a realidade de uma minoria absoluta. A pressão vai subir ou diminuir, mas isso não é necessariamente razão para falar que o envelhecimento não está sendo saudável, porque se o indivíduo consegue se manter ativo, do ponto de vista da gerontologia,

    ele está progredindo para um envelhe-cimento bem-sucedido. Além disso, é necessário fazer sua contribuição com uma alimentação saudável, exercícios fí-sicos e estímulos cognitivos. É um modo de manter a cabeça funcionando e um corpo ativo. Na Unifesp, por meio do Projeto Epidoso, vemos muitos idosos que tocam a vida assim e de forma inde-pendente. É um novo conceito de saúde aquele idoso que vive sozinho, capaz de realizar atividades comuns, como se vestir, tomar banho, comer, fazer com-pras, cuidar das finanças, enfim, manter a sua casa e a sua família sem precisar de ajuda específica de ninguém.

    Quem não se

    organizar vai falir”

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  • 17

    Desafios da longevidade

    rabalhar, estudar, resolver os problemas da vida e ser feliz com o que tem são as atividades mais importantes para o médico neurologista José Geraldo Speciali. Todos os dias ele acorda cedo para atender pacientes em sua clínica parti-cular. Duas vezes por semana dá orientações aca-dêmicas para os residentes do ambulatório do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP). Além disso, faz parte de um grupo de estudos sobre dor da Academia Brasileira de Neurologia (ABN). Para manter-se ativo, cuida da alimentação, faz exercí-cios e organiza seu tempo para encontrar a famí-lia e os amigos, viajar e estudar os avanços atuais da sua especialidade.

    Com essa vida atribulada, o neurologista, que também já atuou como professor na Faculdade de Medicina da USP, pode não parecer, mas faz parte de um contingente de pessoas que cresceu e apareceu: aos 72 anos de idade, ele é um dos 28 milhões de cidadãos brasileiros com mais de

    População idosa cresceu e apareceu no Brasil, mas essa conquista trouxe

    obstáculos para se viver bem

    Por ELENI tRINDADE

    T

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    CAPA

    60 anos. Esses números fazem do Brasil a quinta maior nação em quantidade de idosos, de acordo com o Ministério da Saúde (MS), o que correspon-de a 13,7% de sua população total.

    Como profissional requisitado e ativo, a única coisa que incomoda Speciali nessa fase da vida são algumas “marcas da idade”, que há algum tempo teimam em aparecer em sua face. “Eu vejo rugas no meu rosto e não gosto. Mas penso que devemos aceitar como normal e natural a che-gada da maturidade”, afirma. “Não tenho mais aquela produtividade dos 30 e dos 40 anos, mas essa capacidade física menor é compensada com maior tempo de elaboração intelectual que, no meu caso, acredito ser a mesma.”

    De fato, atingir esse patamar de idade com qualidade, lucidez e independência é uma vitória sobre várias doenças e o estilo de vida de outros tempos, uma tendência que vai continuar cres-cendo. De acordo com estimativas da Organiza-ção Mundial de Saúde (OMS), em 2030 o número de brasileiros nessa faixa etária vai ultrapassar o grupo etário de crianças de 0 a 14 anos de idade. Dados recentes do Instituto Brasileiro de Geogra-fia e Estatística (IBGE) apontam para a mesma direção: a expectativa de vida ao nascer em 2015 passou a ser de 75,5 anos, um acréscimo de três meses e 14 dias em relação a 2014 (75,2 anos). Entre 1940 e 2015 a esperança de vida ao nascer aumentou 30 anos no país.

    Os dados são positivos, mas ser idoso no Brasil também significa superar diversos desafios. “Há um preconceito com o envelhecimento, pois as pessoas veem essa fase da vida como algo ruim e isso muda a relação delas com o envelhecer. É preciso mudar essa visão: envelhecer é um privi-

    légio”, acredita Carlos Uehara, médico geriatra e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geria-tria e Gerontologia (SBGG). “A opção pelo não en-velhecer é a morte precoce, por isso é preciso mu-dar esse olhar negativo e enxergar esse momento da vida como um processo normal, atuando para que essa normalidade se estabeleça por meio de mudanças de hábitos de vida”, destaca.

    A adoção de novas práticas de vida é funda-mental porque está ligada a dois desafios ineren-tes à velhice: doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e manutenção da qualidade de vida. Hoje, com o aumento da longevidade, as DCNT são as maiores causas de mortalidade e morbidade:

    José Geraldo Speciali, neurologista

    Div

    ulga

    ção

  • 19

    aproximadamente 72% das mortes no país foram causadas por esse motivo, de acordo com o Siste-ma de Informação sobre Mortalidade do Ministé-rio da Saúde.

    Com desenvolvimento estendido e efeitos de longo prazo nem sempre previsíveis, essas en-fermidades necessitam de dedicação tanto dos indivíduos quanto dos serviços de saúde. Mas nem sempre isso é possível porque a realidade se impõe de forma diferente. “As pessoas sabem, por exemplo, quais são os alimentos mais saudá-veis, mas a dona de casa, que precisa cuidar da economia doméstica com dinheiro curto para ali-mentar toda a família, não consegue seguir essa dieta, pois ela tem um custo muito maior se com-parado às tentações baratas e nada saudáveis disponíveis em abundância nos supermercados", afirma Alexandre Kalache, gerontólogo, médico especializado em saúde pública e presidente do Centro Internacional de Longevidade no Brasil (ILC Brazil).

    Segundo ele, além do momento econômico atual que tem impacto nesse processo, será ne-cessária uma mudança estrutural envolvendo a

    sociedade, o governo e a mídia – a exemplo do que ocorreu com o hábito de fumar em anos re-centes. “Cada um tem seu papel nesse processo. No caso do cigarro, as mudanças vieram com as evidências científicas dos males desse hábito, com medidas restritivas legais que dependeram do governo (como proibição de propaganda e de fumar em locais fechados) seguidas de ações fis-cais (no caso do tabagismo, aumento do preço) e um marketing social na mídia, que tirou o glamour do fumo, já que ele deixou de ser visto em filmes e novelas. Foi um grande movimento", explica.

    Speciali, que se considera um idoso de bem com a vida e atende vários pacientes da mesma faixa etária, afirma que mudanças dessa nature-za começam com alterações no comportamento. “Muitas pessoas procuram pílulas e comprimidos para resolver os problemas e, em geral, é difícil mudar a cabeça de um idoso, mas remédio não é a melhor conduta. É preciso menos medicação e mais dedicação. Por isso, sempre recomendo re-tirar comprimidos e mudar o estilo de vida, prin-cipalmente cuidando da alimentação e fazendo atividades físicas", acredita.

  • 20

    CAPA

    Um mundo hostil

    Para fazer exercícios e manter-se ativo, é preciso sair de casa e encontrar pessoas. Essas atividades extrapolam o papel de auxiliares na manutenção da saúde porque também estão ligadas à qua-lidade de vida global do idoso. Pois, ao mesmo tempo em que mantém a vitalidade por meio das atividades físicas, o idoso sai de casa, encontra pessoas e ocupa a mente e o espírito com ativida-des que o impulsionam para a vida.

    O problema é que nem sempre o seu entorno oferece condições adequadas e seguras para es-sas práticas. Sem calçadas em boas condições para uma caminhada; sem praças e espaços de convivência para fortalecer ou até mesmo criar novos laços sociais; e, muitas vezes, sem ilumina-ção pública ou policiamento, as pessoas idosas ficam confinadas em suas casas. “Na nossa so-ciedade, com suas imensas desigualdades, uma grande parte da população vive mal e vai enve-lhecer mal em decorrência disso, pois o envelhe-cimento sempre é afetado pelo curso da vida: se você se alimentou bem, tem uma rotina menos sedentária, mora numa zona segura, pode andar numa boa calçada, ótimo. Mas quem mora em más condições, mal tem calçada, vive em meio a um bangue-bangue diário, fica estressado no transporte, chega exausto em casa, isso tudo pesa na definição de quem é o idoso”, afirma Kalache.

    Daí a importância de se investir para que mais e mais localidades fiquem em boas condições para os idosos. Uma das iniciativas com esse objetivo é o projeto Cidade Amiga dos Idosos, da Organiza-ção Mundial da Saúde (OMS), que tem como meta tornar as cidades mais adequadas para a popula-ção acima de 60 anos e, por consequência, para toda a população. O país todo precisa investir, mas tudo começa pelas cidades. “O projeto se-gue uma metodologia específica com ênfase no meio ambiente físico (calçadas, rampas e sinali-zação), juntamente com o meio ambiente social, que consiste em dar acesso a trabalho, educação, serviços de qualidade e cidadania”, explica o es-pecialista. O programa, já adotado em cidades de grande porte, como Cidade do México, Moscou, Tóquio, Londres e Nova York, e em médias, como Genebra, também já está presente em cerca de duas mil outras localidades no mundo e consis-te em congregar quatro setores para deixar os municípios mais aprazíveis para o idoso: gover-no municipal local (compromisso em executar), sociedade civil (para dar voz ao idoso), comuni-dade acadêmica (para maior rigor nos estudos necessários) e setor econômico (para viabilizar as ações). “Com a crise atual, a participação das em-presas é ainda mais importante para viabilizar as mudanças e qualquer organização que tiver inte-resse pode participar, pois o modelo já está bem desenvolvido”, destaca Kalache.

    20

  • dades para 290. Nacionalmente, o home care também teve expansão no atendimento, de acor-do com um estudo encomendado pela Federação ao Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) em 2016: passando de 2.658, em 2011, para 3.353 serviços privados em 2015.

    “Em se tratando de atendimento, a iniciativa privada já vem se preparando há bastante tempo para atender esse público, mas ainda existe um desafio muito grande para continuar suprindo essa demanda porque não temos profissionais capacitados ainda em bom número", afirma Lui-za Watanabe Dal Ben, diretora da FEHOESP e do SINDHOSP. "Essa dificuldade reside no fato de que quando cuidamos do 'grande idoso', aque-le paciente acima dos 90 anos, ainda estamos

    Novo contexto

    Existe mais um contratempo que precisa ser con-tornado na vida das pessoas idosas: as famílias cada vez menores, que resultam na redução da rede de responsáveis pelo seu cuidado. De acor-do com o estudo “Síntese de Indicadores Sociais (SIS): uma análise das condições de vida da po-pulação brasileira em 2016”, elaborado pelo IBGE, a taxa de fecundidade no Brasil passou de 2,09 filhos por mulher, em 2005, para 1,72 em 2015, re-presentando uma queda de 17,7%. “Esse impor-tante índice começou a cair mais intensamente a partir 1970, com a popularização da pílula anti-concepcional, permitindo uma revolução para as mulheres, que é controlar sua reprodução. Esse fenômeno tem um efeito imenso do ponto de vis-ta do cuidado, porque, culturalmente, é a mulher a encarregada de zelar por pais, filhos, marido e outros parentes. Com famílias menores, aque-la mulher que antes ficava disponível para o trabalho dentro de casa, agora faz parte da força remunerada que está batalhando pelo seu sustento, e a economia brasileira precisa dessa mulher mais do que nunca”, ressalta Alexandre Kalache.

    Nesse contexto, um dos obstáculos que se apresenta é a necessidade de mudar a cultura do curar, ainda muito presente na área da saúde, para uma postura de cuidar. Algum esforço em termos de estruturas de atendimento já vem sen-do registrado para preencher essa lacuna: nos úl-timos anos houve um aumento significativo de es-tabelecimentos de saúde no mercado privado do Estado de São Paulo para atender aos idosos, de acordo com dados da FEHOESP. O crescimento foi verificado no número de clínicas de longa perma-nência, que passaram de 302 serviços, em 2011, para 587, em 2015, um aumento de quase 100%.

    Também tiveram aumento os serviços de diagnóstico voltados para a prevenção e o crescimento de serviços relacionados ao envelhecimento, como clínicas de oncologia, endocrinologia, orto-pedia e serviços de assistência domiciliar, sendo que este último mais que dobrou nos últimos quatro anos, passando de 138 uni-

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    O gerontólogo Alexandre Kalache

    Div

    ulga

    ção

  • Renato Veras, professor da UERJ

    aprendendo com eles, já que a longevidade é uma realidade recente para todos. E é preciso ficar atento ao atendimento voltado à saúde e às necessidades específicas nessa faixa etária, enxergando cada pessoa, e não apenas suas do-enças", afirma.

    A Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do IBGE indica também que o país está se aproximando da taxa projetada em países desenvolvidos: de acor-do com o relatório, no período entre 2005 e 2015, a proporção de pessoas com mais de 60 anos de idade aumentou em ritmo superior aos índices médios mundiais, saindo de 9,8% para 14,3%. Si-tuação que deixa o país entre dois extremos: vive-se mais, mas sem estar preparado para isso. Para-lelamente, o déficit da Previdência Social previa totalizar R$ 148,78 bilhões em 2016, de acordo com o Relatório Quadrimestral de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias, divulgado pelo Mi-nistério do Planejamento em setembro passado. "Um dos grandes problemas é que o Brasil sem-pre foi pensado como um país jovem, do futuro, da garotada. Por aqui, sempre se imaginou que a nação não iria envelhecer, mas não é assim", afir-ma Renato Veras, especialista em gerontologia e professor da Universidade Estadual do Rio de Ja-neiro (UERJ). "Existem cada vez menos crianças e mais idosos e o grupo etário central, que são as pessoas que pagam impostos e são de fato eco-nomicamente ativas, já não aguenta mais a carga fiscal e paga uma fortuna para sustentar as duas pontas dessa pirâmide", completa.

    Integração e

    produtividade

    Outro desafio presente na vida do idoso é manter-se integrado à sociedade, evitando um processo extremamente nocivo de abandono e depressão, já que a pessoa deixa de produzir como na época em que era mais nova e pode se sentir inútil. "É muito comum para o público idoso transformar as idas ao médico em lazer. Tem ancião que faz um verdadeiro tour que inclui consultas e exames

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    CAPA

    Luiza Dal Ben, diretora da FEHOESP

    e do SINDHOSP

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  • repetidos frequentemente, já que muita gente não retira os resultados porque melhora natural-mente, e o ciclo recomeça", lamenta Veras. “O ido-so precisa se integrar em atividades que possam agregar para sua vida e que lhe proporcionem prazer e satisfação, e não ficar em casa esperando o tempo passar porque ninguém aguenta isso."

    Uma das soluções sugeridas é ter uma ocu-pação produtiva. Renato Meirelles, fundador do Instituto Locomotiva - empresa de pesquisa -, de-fende a inclusão dos mais velhos no mercado de trabalho, pois eles são economicamente ativos e respondem pelo sustento de muitas famílias. “Os recentes avanços da medicina trouxeram uma melhora na qualidade e na expectativa de vida. De ultrapassados, frágeis, doentes e improduti-vos, nós idosos passamos a ser capazes, ativos, saudáveis: 64% das pessoas idosas são respon-sáveis por toda ou pela maior parte da renda da casa e metade da renda dos brasileiros com 50 anos ou mais vem do trabalho", afirma.

    Segundo ele, enquanto discute-se muito a idade para a aposentadoria, com receio de que a Previdência Social possa explodir, também deveria ser pensado algum tipo de flexibilização das legislações trabalhistas. “Além da integração desse público com a sociedade, trazendo para ele uma autovalorização, a movimentação dessa força de trabalho representa muito para a econo-mia. Um quarto dos brasileiros acima dos 50 anos movimentaram R$ 1,5 trilhão em 2016. Idosos no Brasil gastam mais do que a classe C e que as mu-lheres, ou seja, é um potencial gigantesco", enu-mera Meirelles.

    Considerada um bicho de sete cabeças até al-guns anos, a tecnologia também tem se mostra-

    do uma boa companheira para essa geração de indivíduos mais maduros dispostos a viver com qualidade de vida e interessados em aprender coisas novas. “Atrás de cada número e de cada gráfico existe um brasileiro que acompanhou as mais profundas mudanças que a revolução tec-nológica trouxe. Hoje, 24% das pessoas com 50 anos ou mais acessa a internet, o que representa um crescimento de 952% na última década. Há um forte movimento de democratização da pes-soa mais velha nas redes sociais, o que possibilita independência, um controle maior não só de in-formações úteis para a saúde, mas, também, para a renda. É o empoderamento da população pela internet", acredita Meirelles.

    Com a perspectiva de viver mais tempo, é im-portante estar aberto às dificuldades atuais e a outras que ainda virão. “O idoso de hoje precisa entender que terá algumas décadas de vida e que morrer cedo está fora de moda", destaca Renato Veras. "Certamente, as pessoas ainda vão chegar aos 90 e 100 anos com certa tranquilidade, por-tanto, esses 10, 20 ou 30 anos que serão vividos a mais serão bem aproveitados se ele se cuidar e tiver projetos. Só assim será possível usufruir da grande conquista do nosso momento atual, que é o alongamento do tempo de vida."

    Na versão digital da Revista FEHOESP 360, confira uma entrevista com o presidente do IEPAS, José Carlos Barbério. O farmacêutico, que dedi-cou boa parte de sua trajetória à pesquisa, motivo pelo qual é reconhecido como pioneiro na produ-ção de radiofármacos no Brasil, com mais de oito décadas de vida, não pensa em parar, e destaca as vantagens da longevidade. (Colaborou Rebeca Salgado)

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  • AssIsTêNCIA à sAúde

    Ética e transparência

    Brasil vive um momento especialmente par-ticular. Apesar dos mecanismos de fiscalização e combate à corrupção, o país ainda possui estru-turas que favorecem as práticas ilegais. Embora trágicos para a economia, os últimos aconteci-mentos demonstram que finalmente estamos no caminho da intolerância com as práticas que pre-judicam o desenvolvimento da nação.

    Diante deste cenário, o mundo corporativo tem adotado, com mais frequência, regras de conduta para guiar as atividades de seus profis-

    sionais, buscando elementos orientadores a fim de evitar atitudes internas e externas não adequa-das. O debate sobre ética e corrupção tem sido mais presente no meio empresarial e na socieda-de, especialmente por conta do momento políti-co vivido no Brasil.

    Na saúde, um setor fragmentado, regulamen-tado e complexo, este movimento também se intensificou no último ano, principalmente após as discussões públicas de condutas inadequadas, como a dificuldade de acesso, corrupção, indica-

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    Soluções para um sistema de saúde sustentável

    Por ALINE MOuRA e FABIANE DE Sá

  • ções desnecessárias de produtos e procedimen-tos, entre outros – que evidenciam a necessidade de uma atenção especial dos atores do setor e da sociedade para estes temas.

    “Não há dúvidas que os efeitos da corrupção são extremamente maléficos para a qualidade da gestão dos recursos destinados à saúde, para a composição dos gastos públicos e para a efi-ciência das políticas governamentais. No entan-to, para combater este câncer, é preciso rever o excesso de burocracia e fragmentação no finan-ciamento e na organização do sistema”, comen-tou Francisco Balestrin, presidente do Conselho da Associação Nacional dos Hospitais Privadas (Anahp), no 4º Congresso Nacional dos Hospitais Privados (Conahp), em novembro, em São Paulo.

    De acordo com o Relatório Mundial da Saúde “O Financiamentos da Cobertura Universal”, da Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 20% e 40% de todos os gastos em saúde são desperdi-çados por ineficiência. Apenas em países desen-volvidos a fraude e outras formas de desperdício podem representar um custo estimado de US$ 12 a US$ 23 bilhões por ano para os governos. Dados da Rede Europeia para Fraude e Corrupção na Saúde demonstram que dos US$ 5,3 trilhões das despesas globais em saúde, aproximadamente US$ 300 bilhões são perdidos para os erros e para a corrupção.

    “Máfia da OPME, pedidos de exames desneces-sários e corte de custos em detrimento da qua-lidade do atendimento são questões presentes na área da saúde e ratificam a necessidade de mudanças no setor", defendeu Balestrin, que vê a ética e transparência para a sustentabilidade da saúde e de outros setores da economia como uma demanda cada vez mais presente na socie-dade. “Sabemos que precisamos reformar e te-mos conhecimento quais são as opções e como implementá-las.”

    Há crítica também pela falta, em muitas ins-tituições, de mecanismos que sejam capazes de prevenir, descobrir, denunciar e remediar os des-vios éticos que podem ocorrer. “Pelo menos 95% dos hospitais do Brasil não têm nenhuma forma de acreditação, mesmo nos níveis mais básicos. Falta a transparência de submeter-se a uma ava-liação independente e jogar luz dentro dos hos-pitais, tanto para mostrar o que é bonito quanto

    para consertar o que não é”, enfatizou Ary Ribeiro, presidente do Comitê Científico do Conahp.

    Colocar em pauta o fomento a programas de conduta ética, bem como propor mudanças sig-nificativas, a fim de construir um novo modelo de relacionamento para o mercado, com mais trans-parência, em prol de um conjunto de ações que funcione melhor, onde todos ganharão, é um dos desafios na construção de um sistema sustentável.

    Essa discussão passa pelo financiamento da saúde. Para o ex-ministro da Saúde, Arthur Chio-ro, tem sido cada vez mais recorrente a preocu-pação dos vários elos da cadeia de saúde com o futuro do setor. E quando se discute o custo do sistema, para ele, um dos grandes nós deste con-texto é o modelo de remuneração atualmente vigente no país. “O formato usado hoje está exau-rido e insustentável. Entre as distorções está o desbalanceamento da remuneração que, muitas vezes, privilegia os materiais em detrimento dos serviços e dos profissionais da saúde.”

    A complexidade do contexto brasileiro atu-al, com grandes diferenças regionais, estrutura econômica-social heterogênea, dimensão popu-lacional, mudanças demográficas e epidemioló-gicas, é outro ponto que justifica a disparidades dentro do setor. Exemplo desse cenário são as doenças crônicas, de acordo com o ex-ministro, um dos grandes desafios do sistema nacional de saúde, por serem as responsáveis por 73% dos óbitos no Brasil, e os fenômenos da violência que impactam o sistema público. “Saímos de um cenário com altos índices de desnutrição e pas-samos a ter altos números de obesidade no país. O Brasil exige que seja pensado um sistema de

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    Francisco Balestrin, presidente do Conselho da Anahp

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    saúde visando aos problemas vigentes, que são profundos desafios relacionados à gestão do tra-balho e educação na área.”

    Na visão de Chioro, há ainda outros grandes obstáculos: a qualificação e racionalização da gestão, regulação do setor privado, análise crite-riosa da incorporação tecnológica, gerenciamen-to da informação, democratização do acesso à informação e fragilidades no controle do sistema. “Sempre é possível gastar melhor, sempre é pos-sível fazer as melhores escolhas”, frisou.

    JudicializaçãoPara o ex-ministro, também é preciso investir em planejamento e organização do sistema “com a definição da divisão de responsabilidades entre Estados e municípios, integração entre sistemas municipais e coordenação dos complexos regio-nais de saúde, planejamento e organização fun-cional do conjunto e a judicialização do setor”.

    De acordo com levantamento do Ministério da Saúde (MS), só no âmbito federal os gastos do poder público com ações na Justiça no setor saltaram de R$ 122,6 milhões, em 2010, para R$ 1,6 bilhão em 2016. Somando o desembolso de Estados e municípios, a pasta estima que o valor tenha chegado a R$ 7 bilhões no último ano.

    Esses números constatam que a saúde no Bra-sil sofre os efeitos de uma má gestão política, eco-nômica e administrativa, na opinião do presiden-te da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Antonio Britto. “É preciso mais que do que ações pontuais para que se re-solva ou, pelo menos, amenize a situação atual.”

    O membro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), integrante do Ministério Público de São Paulo e representante do Fórum Nacional da Saúde, Arnaldo Hossepian Jr., disse que a judi-cialização é a defesa da sociedade diante do fato de que o mesmo país que determina, pela Consti-tuição, que todos tenham acesso à saúde, acaba não a oferecendo. “A falta de acesso se dá em dois níveis diferentes: decorrente de erros administra-tivos, ou, ainda mais grave, quando não existem tratamentos, ou que não estão previstos pelo sis-tema público para serem disponibilizados. Dessa maneira, o setor público sem dinheiro não incor-pora medicamentos para doenças que hoje são crescentes no país. A população, mais informada do que nunca e apoiada por médicos com boa qualificação, vale-se da Carta Magna para assegu-rar aquilo que já está ao alcance de todo mundo.”

    Para o presidente executivo da Interfarma, a saída está se tornando cada vez mais comum, mas é falsa, pois só atende a quem pediu. “Assim, ela desorganiza o orçamento do governo e não é justa do ponto de vista do acesso. Quando o go-verno tranca a porta da incorporação, as pessoas forçam a janela da judicialização.”

    A complexidade do tema não nos deve impedir de tratá-lo com transparência e coragem, de acor-do com o professor da Faculdade de Medicina da USP, Giovanni Cerri. “A finalidade da rede de prote-ção social de toda nação, especialmente na área da saúde, é claramente a mesma: uma saúde me-lhor para o cidadão. Cabe a todos – governantes, gestores públicos e privados de saúde, a socieda-de civil de modo geral e também ao Judiciário -, trabalharem em harmonia para possibilitá-la.”

    AssIsTêNCIA à sAúde

  • Novas práticasA adoção de postura mais ética passa pela mu-dança dos modelos de remuneração, onde o sistema se propõe a entregar o melhor para o pa-ciente ao menor custo.

    No mundo há uma tendência de buscar novas práticas que ampliem a confiança da sociedade nos profissionais de saúde, como Sunshine Act, sistema de pagamento aberto desenvolvido pelo governo dos Estados Unidos, que permite aos norte-americanos saber o que os seus médicos receberam de empresas farmacêuticas e de ou-tros fornecedores em forma de dinheiro, refei-ções e outros benefícios.

    Mas Bernardo Weaver, ex-secretário executivo do Comitê de Sanções do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em Washington (EUA), disse que a medida não têm sido muito eficaz para transformar de fato a relação dos médicos com a indústria. “Os valores repassados aos mé-dicos não diminuíram de 2014 para 2015, por exemplo. O que mudou foi a maneira da contri-buição”, ponderou o advogado, um dos respon-sáveis por treinar o Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União para a implemen-tação da Lei Anticorrupção no Brasil.

    Segundo ele, os presentes, os repasses com entretenimento e os honorários pagos por meio de consultorias diminuíram muito nos EUA des-de a implantação do Sunshine Act, em 2013. Por outro lado, os benefícios educacionais cresce-ram 40% e as contribuições de caridade, 130%. “Particularmente, questiono se esses dados es-tão sendo úteis para induzir o acesso das pesso-as a melhores tratamentos.”

    Bernardo, que morou nos EUA, conta que não via os pacientes destacarem a relação dos seus médicos com a indústria farmacêutica como um ganho ou uma perda. E que, em geral, o norte-americano não gosta de ter a sua vida invadida. “Eles não gostam de usar Sem Parar na estrada para não deixarem sua rota registra-da em um sistema.”

    Além de obrigar a indústria a publicar o quan-to gastou com médico, o Sunshine Act ainda im-põe uma multa a quem não o fizer. Os médicos ainda podem interagir e propor correções nos da-dos publicados, caso apresentem inconsistência.

    Para Oscar Porto, presidente da Meditronic, é preciso encontrar mecanismos de controle para diminuir os custos. “Hoje, se o Sunshine Act fosse implantado no Brasil, quem mais se beneficia-ria seriam as operadoras de planos de saúde. E quem vai se beneficiar da transparência é toda a cadeia produtiva da saúde.”

    Transparência sim; excesso de controle, não. É o que defendeu o australiano Simon Longstaff, di-retor executivo do Ethics Center. Ele explicou que o excesso de regras rouba do ser humano a sua capacidade de tomar decisões responsáveis. “Nós perdemos a arte da tomada correta de decisões.”

    Longstaff lembrou que o modelo tradicional de gerenciar riscos virou gerenciamento de restri-ções. “E o sistema que estamos tentando implan-tar tem pouco a ver com cálculos matemáticos e muito a ver com valores compartilhados.”

    Na saúde, o paciente deve ser o centro disso tudo. “O paciente tem que acreditar que no mo-mento em que tiver de haver uma escolha entre o lucro e a vida, será escolhida a vida”, concluiu.

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    Bernardo Weaver, ex-secretário do BID

    Simon Longstaff, do Ethics Center

  • m dos elementos fundamentais para uma boa estraté-gia de negócios é olhar para o futuro como forma de ampa-rar as decisões no presente.

    Esta é apenas uma das muitas lições extraídas do livro Gigantes da Estratégia, que analisou durante quase três dé-cadas as decisões dos criadores e líderes das empresas In-tel, Microsoft e Apple. Nele, as trajetórias de Andy Grove, Bill Gates e Steve Jobs à frente de suas organizações são estuda-das por David B. Yoffie e Michael A. Cusumano, professores de administração de Harvard e do Instituto de Tecnologia de Massachussets, nos Estados Unidos.

    Embora os personagens já tenham sido tema de biogra-fias e diversos livros de negócios, segundo os autores, ainda existe uma grande lacuna na compreensão sobre o que for-ma um grande estrategista, e nisso a obra pode contribuir. “Os acadêmicos estudam companhias e seus líderes com frequência, mas quase nunca estudam a fundo os indivídu-os em si, junto com as decisões que definem suas carreias e as organizações que criaram”, justificam. Além disso, “geren-tes e empreendedores poderiam aprender muito com Bill Gates, Andy Grove e Steve Jobs, apesar da singularidade e da personalidade marcante de cada um deles”.

    O livro apresenta cinco regras gerais que se assemelham em relação ao modo como os três líderes abordavam desa-fios estratégicos. “As regras têm o objetivo de capturar sua abordagem estratégica e de execução e podem ajudar qual-quer líder de organização a navegar com confiança para o futuro”, confirmam.

    No entanto, estudar alguns dos maiores estrategistas contemporâneos não significa destacar apenas seus feitos positivos. Os autores lembram que mesmo eles aprenderam a liderar suas organizações somente com o tempo, e que não nasceram com a visão empresarial que os destacou.

    Como exemplo, o conhecimento de Gates sobre adminis-tração e negócios quando abandonou Harvard estava lon-ge de ser impressionante. Já o primeiro livro de Grove, que pretendia ensinar como dirigir um negócio, tornou-se nada mais que um guia utilizado por gerentes orientados para a produção. Jobs quase faliu a companhia no seu período ini-cial de atuação na Apple, mas quando se afastou dela defini-tivamente em 2011, por motivos de saúde, a empresa havia

    alcançado a maior capitalização de mercado da história.“Foi a capacidade desses homens de aprender que os

    transformou em líderes eficazes ao longo dos grandes pe-ríodos de tempo”, lembram Yoffie e Cusumano, que ainda apontam a influência dos estrategistas nos passos de novos CEOs de sucesso atualmente, como Mark Zuckerberg (Face-book), Jeff Bezos (Amazon) e Larry Page (Google).

    Embora o livro concentre-se em experiências de compa-nhias de tecnologia, as lições servem para todos os ramos de negócios. “Entendendo como Microsoft, Intel, Apple e outras companhias high-tech administram sua evolução, executivos seniores e empreendedores de outras indústrias podem aprender como melhor gerenciar as mudanças em seus próprios mercados.” (Por Ricardo Balego)

    Gigantes da EstratégiaDavid B. Yoffie e Michael A. CusumanoEditora Best Business336 págs.R$ 54,90

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    ReseNHA

    A estratégia dos

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    estabelecidos pelos conselhos profissionais cor-respondentes, em parceria com a agência, a qual está incentivando os hospitais, clínicas e labora-tórios a desenvolver o processo de acreditação de suas instituições. Nestas situações, também poderão ser utilizados indicadores selecionados, bem como a participação e o desempenho em projetos e programas de indução à qualidade.

    Para aplicação do Fator de Qualidade, foi reali-zada uma estratificação do índice de reajuste defi-nido pela ANS para os prestadores de serviços em três percentuais: nível A, 105% do IPCA; B, 100% do índice; e C, 85%.

    Infelizmente, temos que ser realistas e não po-demos concordar com a redução do percentual de reajuste para o nível C, visto que as tabelas das operadoras já são defasadas. Além disso, uma vez que o próprio índice pleno do IPCA já não cor-responde à realidade inflacionária geral, quanto mais com a inflação médico-hospitalar, cujo per-centual é sempre maior que os índices oficiais.

    E assim, ano após ano, desafiamos a nossa sobrevivência neste mercado, dentro do possível, acompanhando as mudanças propostas, ou me-lhor, impostas.

    * Danilo Bernik é gerente do departamento de As-sistência à Saúde da FEHOESP

    Obstáculosà vistaPor DANILO BERNIk

    á algum tempo, paira no mercado a pre-ocupação de que o atual sistema da saúde suple-mentar necessita ser revisto. A maior atenção está voltada para a sustentabilidade do setor, devido à crescente sinistralidade a cada ano, acendendo um sinal de alerta entre os atores do segmento. Um exemplo dessa realidade é o envelhecimento dos brasileiros e, consequentemente, o aumento do custo assistencial. A solução seria a busca por programas que possam cuidar do idoso preventi-vamente, nos seus diferentes estágios.

    Outro ponto polêmico em discussão é a pro-cura por novas formas de remuneração. Trata-se de uma possível substituição ao atual modelo uti-lizado pelos prestadores e operadoras, que é o fee for service (FFS) – conta aberta –, onde cada item utilizado pelo paciente é detalhado na fatura.

    Há outras formas de remuneração no merca-do, como o DRG (Diagnosis Related Group), que é uma metodologia de compra de serviços e ge-renciamento de custos, que vem sendo praticada experimentalmente em alguns hospitais e por al-gumas operadoras no país.

    Há ainda o Fator de Qualidade, aplicado ao reajuste dos contratos escritos firmados pelos planos de saúde com os seus prestadores de ser-viços, conforme o índice definido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), desde que cumpridas as exigências conti-das na resolução normativa (RN) nº 364.

    A preocupação é grande com a qualidade da assistência prestada ao paciente e a consequen-te redução de custos. Aos profissionais de saúde, a ANS utilizará na composição do fator, critérios

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    A Revista FeHOesP 360 é uma publicação da FEHOESP, SINDHOSP,

    SINDHOSPRU, SINDJUNDIAÍ, SINDMO-GIDASCRUZES, SINDRIBEIRÃO, SINDSUZANO e IEPAS

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