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Festival Tramontana | Programa Completo

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Programa completo do Festival Tramontana organizado pela Binaural/Nodar entre 4 e 27 de Abril de 2013, um evento dedicado à criação artística em artes sonoras e media, à pesquisa social em contexto rural e ao património imaterial das montanhas do sul da Europa.

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Festival Tramontana

4 a 27 Abril 2013, S. Pedro do Sul 1. Introdução Existem evidências de que nos encontramos numa fase que podemos considerar de recuperação de memória, especialmente aquela designada de património imaterial (saberes-fazer, técnicas e tecnologias, memória, tradição oral e musical etc.), a qual é facilitada pelos desenvolvimentos tecnológicos recentes (nomeadamente pela maior portabilidade e preço mais acessível dos equipamentos de captação sonora e videográfica e nos domínios da internet e das ferramentas de redes sociais) e por um sentimento cada vez mais evidente de que à vida hipermoderna, multiétnica e globalizada de hoje falta muitas vezes um sentido de conexão com o passado, com as raízes fundadoras de uma nação, de uma região e até de uma família, as quais dão sentido ao nosso aqui e agora. O interesse crescente por zonas rurais tem sido essencialmente motivado por dois tipos de impulsos: o contacto com a natureza e o contacto com a memória. Este segundo aspecto é muitas vezes baseado em reconstruções de um passado idealizado e até certo ponto “superficial” feito de gastronomia, artesanato, música, etc., as quais ficam frequentemente muito aquém do que efetivamente era e é a realidade mais profunda das zonas rurais. Existe pois a necessidade de pesquisar aspectos adicionais que acrescentem densidade ao conhecimento de um território e que a partir desse conhecimento seja possível gerar novas dinâmicas e factores de reconhecimento junto de públicos diversificados. Seguindo exemplos em curso noutras regiões europeias, a Binaural – Associação Cultural de Nodar (S. Pedro do Sul) tem-se posicionado desde o início das suas atividades em 2004 para gerar um sentido simultaneamente de inovação e de autenticidade na relação com os elementos patrimoniais do seu território de intervenção (Maciços da Gralheira, Arada e Montemuro e Vales do Paiva e Vouga, nos distritos de Viseu e Aveiro), procurando assim estabelecer um vasto conjunto de novas dinâmicas (residências artísticas de criação contemporânea assentes na pesquisa social e geográfica das aldeias; relação com comunidades científicas nacionais e internacionais nas áreas da antropologia, arquitetura, arqueologia, etnomusicologia, criação artística, teologia, etc.; atividades formativas dirigidas a crianças, jovens e seniores nas áreas das

técnicas de captação sonora e videográfica de aldeias rurais e a publicação regular de livros, catálogos, CDs e DVDs), de forma a que, em conjunto, contribuam para um processo contínuo na senda de novos aspectos de identidade e de riqueza patrimonial, promovendo em simultâneo o território no país e no estrangeiro. Ao longo de Abril de 2013 a Binaural/Nodar irá combinar num único evento, FESTIVAL TRAMONTANA, todo um conjunto de atividades de criação, documentação e de reflexão relacionadas com o património imaterial da região e à sua inserção numa rede europeia de inovação na área dos arquivos multimédia para a promoção dos territórios rurais de montanha. Desde Maio de 2012, a Binaural/Nodar faz precisamente parte da Rede Tramontana de arquivos da memória do Sul da Europa que é financiada pelo Programa Cultura 2007-2013 da Comissão Europeia e que inclui outras seis organizações de Itália e França. O FESTIVAL TRAMONTANA que se desenrolará de 4 a 27 de Abril de 2013 incluirá os seguintes blocos de eventos: 4 – 7 Abril 2013: Residência Artística DIVINA SONUS RURIS para alunos de mestrado em arte contemporânea da Universidade de Aveiro que trabalharão sobre o património imaterial religioso da região; 7 - 27 Abril 2013: Residência artística internacional DIVINA SONUS RURIS com sete projetos de artistas multimédia de renome mundial que trabalharão sobre o património imaterial religioso da região; 23 - 26 Abril 2013: III Fórum Internacional Tramontana, dedicado ao património imaterial de zonas de montanha do sul da Europa e que trará até à região cerca de 25 organizadores culturais, músicos e investigadores universitários de vários países do sul da Europa.

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2. DIVINA SONUS RURIS: Residência em arte sonora e media sobre o património imaterial religioso da região do maciço da Gralheira 7 – 27 Abril 2013 (Paróquias de Sul e S. Martinho das Moitas, concelho de S. Pedro do Sul) Apresentação pública de obras sonoras e media: Ponto de encontro: Largo Central de Sul Sábado, 27 Abril 2013, 15h00 – 18h00

“Nós sempre fomos amigos. Mas, como acontece entre familiares, como acontece entre amigos, a relação foi ficando

gasta. (...) Não vos explicámos as nossas coisas. (...) Não vos tivemos como alunos, amigos, conversadores. (...) E nós

também seguimos por vias travessas, onde a arte e a beleza, e – o que é pior para nós – a adoração de Deus foram mal

servidas. Refazemos a paz?”

(Paulo VI, Discurso aos Artistas, 10-12). O sacro é um elemento central das comunidades rurais do maciço da Gralheira, São Pedro do Sul. A relação entre práticas sagradas e a vida quotidiana rural é de tal forma próxima e autêntica que é impossível pensar estas comunidades de forma alheada aos temas religiosos. Não obstante as transformações aceleradas destes territórios rurais, continua a existir uma forte adesão das populações, não só as mais idosas nas também as mais jovens, à igreja, o que poderá surpreender muitas pessoas tendo em conta o secularismo crescente das sociedades contemporâneas. É pois útil analisar o que tem de particular a religião nestas comunidades rurais para continuar a merecer estes níveis elevados de adesão. A religião é um dos principais elementos de coesão social em comunidades rurais de montanha, onde permanecem vivas formas de viver e sentir muito antigas, que são passadas de pais para filhos, e que garantem um equilíbrio muito genuíno e antropologicamente interessante entre um viver num tempo de contemporaneidade e a manutenção de um conjunto de crenças e práticas ancestrais que dão um sentido de continuidade temporal (histórica, familiar, pessoal) e reforçam o sentimento de orgulho de pertença a um lugar. Em particular, a religião entrecruza de tal forma as vidas (as missas, as obras sociais, a catequese, o património religioso, as romarias que marcam os ciclos sazonais, as celebrações de vida e morte, etc.) que se torna um elemento crucial para estudar as comunidades rurais do maciço da Gralheira.

Sendo o tema religioso bastante contaminado por debates simplistas e posições irredutíveis, parece-nos que faz falta convocar visões descomplexadas e multifacetadas sobre o mesmo. Por outro lado, sendo a abertura ao “desconhecido” um dos focos primordiais da atividade da Binaural/Nodar, no sentido de criar pontes entre o mundo artístico contemporâneo globalizado e contextos que normalmente não são abordados de forma experiencial, em primeira mão, e com profundidade, julgamos muito pertinente incluir este tema nas pesquisas artísticas levadas a cabo na nossa região, de forma a que, no arco de vários anos, seja possível abordar alguns dos seguintes aspetos: 1. Hagiografia rural: Lendas de santos e milagres locais. 2. Histórias paroquiais: Memória da relação histórica local

com a religião. 3. A religião e os temas de género e geracionais. 4. Património religioso construído: Igrejas, capelas,

cruzeiros, santuários, alminhas e cemitérios. 5. Património religioso objetual: vestes, cruzes, andores,

cálices, livros, etc. 6. Património musical religioso local. 7. Ritos sagrados calendarísticos e não calendarísticos:

Festas, missas, casamentos, batizados e funerais. 8. A fonosfera religiosa na paisagem: Toques de sinos,

cânticos, procissões, foguetes. 9. O sagrado no espaço privado: Rezas e rosários;

Iconografia religiosa na casa rural. 10. A religião e os ciclos agrícolas. O programa de residências criativas em artes sonoras e media para 2013 irá precisamente tomar como tema de expressão o riquíssimo património de matriz sacra nas aldeias rurais do maciço da Gralheira, enquadrado por um sentido de promoção de um diálogo franco e aberto com as instituições religiosas locais e em consonância com a renovação teológica, litúrgica e cultural iniciada no pós II Guerra Mundial com o Concílio Vaticano II e aprofundada mais recentemente pelos Papas João Paulo II e Bento XVI através de diálogos regulares com artistas contemporâneos.

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“A relação entre práticas sagradas e a vida quotidiana rural é de tal forma próxima e autêntica que é impossível pensar estas comunidades de forma alheada aos temas religiosos.”

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3. DIVINA SONUS RURIS: projetos criativos

Antje Vowinckel (Alemanha) “Colle, Cielo, Cantieri” | “Montanhas, Céu, Construções” Uma composição/improvisação sonora de cerca de 25 minutos para uma igreja, para órgão elétrico, órgão de igreja, objetos amplificados e sons da missa em igreja (o sopro da oração, as conversas, os passos de pessoas que entram na igreja, os cânticos). A artista propõe desenvolver uma peça (composição/improvisação) para o seu velho órgão elétrico Korg em combinação com órgão de igreja, objetos amplificados e os próprios sons da igreja. A peça é baseada em experiências prévias com o seu órgão a solo e objetos, transformando a ideia de uma paisagem com colinas e sons distantes que se aproximam e afastam. A ideia desta peça sonora para o Maciço da Gralheira é a de integrar sons profanos internos à igreja e outros externos da paisagem (como sons de alfaias agrícolas mecânicas, ou fragmentos de melodias escutadas ao longe) numa composição contemplativa, onde aqueles sons deixam de ser perturbadores. Os sons mecânicos da paisagem serão recriados por objetos amplificados dentro da igreja, passando a ser mais abstractos. É importante, que todos os sons da peça sejam provenientes do interior da igreja. Desta forma, a separação entre os sons do exterior e do interior é anulada e os sons mecânicos deixam de estar ligados a certas imagens mentais de máquinas. O arranjo da peça deverá pois fazer abrir os ouvidos para uma certa beleza dos sons mecânicos. A peça pode ser encarada como um espaço espiritual. Ela convida a aceitar o mundo exterior de técnicas e máquinas, a fusão de duas zonas sonoras. Os sons serão integrados num conceito musical e numa estética homogénea e silenciosa para que a percepção e contemplação do ouvinte dentro da igreja seja possível. Antje Vowinckel (n. 1964) é uma compositora e intérprete baseada em Berlim. Ela estudou literatura e música (flauta/piano), tendo tocado numa orquestra clássica, num ensemble de câmara e em bandas de jazz. Ela escreveu a sua tese sobre peças radiofónicas e arte rádio e já concebeu peças para uma variedade de estações de rádio públicas alemãs. O seu foco é a musicalidade da palavra falada. Por exemplo, no seu projeto "Terra prosodia", produzido pelo "  WDR Studio Acoustic Art" utilizou melodias em dialetos europeus. Uma série de obras suas empregam fragmentos de discurso, de documentário ou de improvisação linguística (língua automática) que depois são transpostas para uma estrutura musical. Ela usa sons instrumentais, electrónicos, bem como sons quotidianos que são intercaladas entre música e narração.

Adam Overton (Estados Unidos) "Chance Chants” | “Cânticos Aleatórios” Adam Overton irá pesquisar os vários cânticos religiosos utilizados na região, com o objetivo de desenvolver alguns cânticos simples ao acaso, a partir da ideia de usar procedimentos aleatórios, inspirada pelo trabalho de John Cage com o I Ching. O artista desenvolverá algum tipo de sistema ou de mapeamento que poderá gerar um cântico personalizado para alguém com necessidade de um. Estes cantos aleatórios poderão ser baseados em informações do utilizador (como a idade, a data de nascimento ou até o número do cartão de crédito), ou outros factores personalizados, e, em seguida, podem ser utilizados em particular ou em grupos. O plano é gerar os cantos usando vários materiais de origem silábicos e textuais utilizadas pelos moradores: cânticos pré-existentes, outras frases religiosas, como rezas ou responsos, os quais serão então divididas em sílabas, categorizados e rearranjados através de procedimentos aleatórios. Adam Overton é um artista experimental que vive em Los Angeles e que trabalha nas áreas da performance, escrita, música experimental, massagens, oficinas, produção de eventos e diversas formas de participação, todas, com o fim de facilitar a realização de experiências íntimas e fora do comum conduzidas pelo artista. Ele liga-se regularmente com uma variedade de artistas-colegas através de várias plataformas de colaboração, incluindo Signify, Santifica, Believe (com Tanya Rubbak e Claire Cronin e envolvendo as contribuições de mais de 70 artistas semi-seculares), Ethernal Telethon e UploadDownloadPerform.net. Ele trabalha em estreita colaboração com Guru Rugu como co-diretor do Centro de Meditação Experimental de Los Angeles e como “autor fantasma” para a Hora de Meditação Experimental de Guru Rugu na Rádio KCHUNG.

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“Sendo o tema religioso bastante contaminado por debates simplistas e posições irredutíveis, parece-nos que faz falta convocar visões descomplexadas e multifacetadas sobre o mesmo.”

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3. DIVINA SONUS RURIS: projetos criativos

Liminal: Frances Crow & David Prior (Reino Unido) “Of this Parish” | “Desta Paróquia” Os sinos tiveram um papel central na formação e solidificação de comunidades. Os sinos têm um imenso poder de evocação, de conferir uma sensação de passagem do tempo, de fomentar reminiscências e de consolidar a identificação de um indivíduo com um local de escuta primordial. A ideia de uma "paróquia" - um dispositivo usado para demarcar o território, enquanto definição de uma comunidade sagrada – constituiu igualmente uma articulação do espaço acústico: pois a paróquia é também a zona em que um sino de igreja pode ser ouvido. Esta noção de paróquia enquanto “esfera sonora” é o ponto de partida para a proposta destes artistas, os quais irão conceber uma peça sonora que vai explorar a relação entre espaços acústicos diferentes: o pessoal e o compartilhado, o secular e o sagrado, o próximo e o distante, o histórico e o contemporâneo. Durante a residência os artistas irão conceber quatro passeios sonoros a serem realizadas simultaneamente por quatro participantes que gravarão os respectivos percursos. Os passeios começarão a partir de uma igreja, ao som do respectivo sino sendo tocado durante todo o tempo e divergirão na direção dos quatro pontos cardeais em que só os sons suficientemente altos - como o sino da igreja – conseguirão escutados nas quatro gravações em simultâneo. O resultado final será uma instalação sonora a oito canais dentro da própria igreja. Um mapa da paróquia com a igreja no centro, será impresso no chão do espaço de exposição, com a indicação dos dados geográficos e temporais das várias caminhadas. Liminar é uma parceria entre a arquitecta Frances Crow e artista sonoro e compositor David Prior. Começaram a trabalhar juntos em 2003. O seu trabalho concentra-se na exploração da relação entre a escuta sonora e o meio ambiente. Ela engloba intervenções “site-specific”, passeios sonoros, instalações em galerias, performances, bem como ambientes sonoros e musicais para exposições. Em 2010 Liminal ganharam o prestigioso Prémio de Novas Música da Music Foundation para a sua peça “Organ of Corti”, um instrumento acústico que medeia sonos do ambiente. Órgão de Corti, posteriormente ganhou o Prémio de Inovação John Connell de 2011 e recebeu uma Menção Honrosa no Prix Ars Electronica 2012 na categoria de Músicas Digitais e Arte Sonora.

Antony Lyons & Anne Burke (Irlanda, Reino Unido) “Sacred Ways” | “Caminhos Sagrados” “Caminhos Sagrados” toma como ponto de partida as viagens ou peregrinações rituais que são parte integrante das práticas religiosas. Desde as maiores peregrinações em massa até às viagens locais de/para locais de culto, santuários ou locais de significado pessoal/íntimo (ou mesmo "supersticioso"), os caminhos sagrados têm importância religiosa e espiritual, ligando culturas com a paisagem e ligando lugares numa malha de significado e mito. “Caminhos Sagrados” irá explorar algumas associações sonoras com a prática religiosa na região do maciço da Gralheira. O trabalho de campo irá incluir visitas a locais de culto, cemitérios, santuários, poços sagrados, árvores, rochas ou outros locais sagrados localizados na paisagem. Uma atenção especial será dedicada às ações e rituais que podem fazer parte das viagens para esses locais - por exemplo, maneiras particulares de atravessar locais ou rotas escolhidas que têm significado pessoal particular. O projeto terá como resultado um conjunto de ensaios sonoros e de instalações performativas, os quais irão emergir a partir da condução de grupos e indivíduos até determinados lugares, da gravação de vozes de habitantes locais falando do significado de certos lugares, da gravação da paisagem sonora de locais e caminhos rituais ao longo do tempo, através do posicionamento de uma série de microfones autónomos, da exploração arquivos locais e da edição e sobreposições de gravações com material visual. O trabalho do artista media e ambiental Antony Lyons concentra-se na ligação entre a investigação de arquivos e o trabalho de campo e engajamento ambientais Nos últimos anos tem aplicado os conceitos de "mapeamento profundo" e de "Geopoética" na sua prática. Lyons é um membro associado do centro de investigação PLaCE, Bristol e é membro da rede internacional Mapeamento de Traços Espectrais. Os conceitos de viagem e de relação com o sentido dos lugares tem sido fundamental para o trabalho da fotógrafa e etnógrafa Anne Burke, a qual tem explorado diferentes aspectos das relações entre língua, cultura visual e o andar como uma prática quotidiana. Como parte de um projeto de colaboração, recentemente completou uma viagem marítima de 400 milhas, seguindo a rota tomada no século VII por monges irlandeses da costa oeste da Irlanda para a ilha escocesa de Iona. Burke é professor de fotografia na Universidade de Middlesex e é fluente em português.

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“O programa de residências criativas para 2013 irá tomar como tema o riquíssimo património de matriz sagrada das aldeias rurais do maciço da Gralheira, enquadrado por um sentido de diálogo franco e aberto com as paróquias locais e com a Diocese de Viseu.”

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3. DIVINA SONUS RURIS: projetos criativos

Manuela Barile (Itália/Portugal) “Cá” “Cá” mostra uma “mater dolorosa”, a qual, com passo solene, anda lenta e silenciosa através das ruas de uma aldeia abandonada do maciço da Gralheira. De profunda inspiração cristã, a obra mostra a imagem de Maria como lamentadora no ato de padecer a morte: a morte da aldeia, símbolo do mundo antigo, representado por um feixe de milho deixado numa das casas abandonadas. A obra é construída em torno de alguns “tableaux vivants” que alternam com imagens de paredes de xisto que choram a passagem da mulher. A lamentação, o ritual do choro vinculado à colheita é um dispositivo para superar o trauma da morte, para dar forma à dor e às memórias relacionadas com o desaparecimento; sendo uma etapa fundamental para encontrar a força para continuar a viver. Nesse sentido Maria, na agonia da dor, é portadora de vida. Como testemunha, estão as suas palmas das mãos, cor de cobre, onde ainda cresce erva. O cobre na alquimia é o símbolo da força vital e da água, a água que ainda corre para a aldeia abandonada três vezes por semana para continuar a irrigar os seus campos abandonados. A água que cai das paredes tem, portanto, dois significados: o sofrimento e a morte, mas também a força e o renascimento. Manuela Barile é diretora artística da Binaural/Nodar. É uma artista italiana que vive e trabalha na região de São Pedro do Sul, Portugal desde 2006 Desenvolve projetos baseados nos lugares da região rural do maciço da Gralheira, trabalhando em estreito contato com as comunidades locais. Os seus trabalhos artísticos combinam antropologia visual, instalação, som, performance e voz usada como um instrumento. A sua abordagem artística consiste numa investigação continua sobre a realidade, sobre o estar no mundo, sobre a sua experiência pessoal. A artista leva em conta vários aspectos, como a conformação natural dos territórios, a arquitetura e história dos lugares, as simbolizações, a tradição, a memória ritual e o sagrado como sinais indeléveis depositados no solo das aldeias rurais.

Steve Peters (Estados Unidos) “Lessons from the Ancestors” | “Lições dos Antepassados”

Steve Peters realizou um trabalho sonoro multicanal combinando os seguintes elementos: gravações de campo de sons ambientais e do toque dos sinos das igrejas e capelas, ambos captados na paróquia de São Martinho das Moitas; processamentos electrónicos de alguns desses sons; textos falados por habitantes que evocam a paisagem regional, constituídos por nomes de habitantes da mesma paróquia falecidos e nomes de plantas e animais locais, alguns cantados em latim pela performer vocal Manuela Barile (registos efetuados no interior da igreja paroquial de S. Martinho das Moitas). Esses vários elementos foram tecidos em conjunto para criar um retrato sonoro sugestivo da paisagem regional e da relação humana colectiva a esses lugares através da linguagem. Steve Peters (n. 1959) faz música e som para uma grande variedade de contextos e ocasiões usando gravações de campo, objetos naturais e encontrados, electrónica, vários instrumentos musicais, e texto falado. Atento às nuances subtis da percepção e dos lugares, o seu trabalho muitas vezes é site-specific e tende a ser contemplativo. Steve Peters participa em projetos como membro da Seattle Phonographers Union, e também trabalha como produtor freelance, escritor e curador. Desde 1989 tem sido diretor de Nonsequitur, uma organização sem fins lucrativos que realiza eventos de música experimental e arte sonora, atualmente através do Ciclo de Música Wayward no Chapel Performance Space, em Seattle.

Los Yokos (Espanha) “El Eremita” | ”O Eremita” Los Yokos (Iñaki Ríos & Natividad Plasencia) são exploradores do mapa sonoro mais eclético, franco atiradores de ruído, que tanto buscam as ressonâncias dos instrumentos mais clássicos como dos objetos quotidianos, filtrando tudo pela “batedeira” da manipulação electrónica. Nesta ocasião, colocam-se ao serviço do “Eremita”, um projeto multidisciplinar que aborda o tema do pecado, do castigo e da expiação. No início de tudo há uma fuga, um não poder afrontar a realidade e uma busca de refúgio num não-espaço e num não-tempo nos quais ressoam ecos das suas vidas passadas. Los Yokos reconstroem a memória do eremita tergiversada pela fome e pela solidão, até um êxtase espiritual no qual se confundem recordações, desejos e realidade. Ali onde nada soa, ressoa o real.

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4. Residência Artística DIVINA SONUS RURIS para Alunos do Mestrado de Criação Artística Contemporânea da Universidade de Aveiro

4 – 7 Abril 2013 Macieira (freguesia de Sul, concelho de S. Pedro do Sul) Apresentação pública: Macieira (junto ao Restaurante Salva Almas) Sábado, 6 de Abril às 16h00

Entre 4 e 7 de Abril de 2013 decorrerá a terceira edição de uma residência de criação artística anual para estudantes do Mestrado de Criação Artística Contemporânea da Universidade de Aveiro, uma parceria com o Departamento de Comunicação e Artes da referida universidade. Esta terceira edição está integrada na temática do Programa de Residências da Binaural/Nodar para 2013 (por sua vez parte do projeto Tramontana), na medida em que os trabalhos de campo a desenvolver pelos alunos terão uma relação conceptual com os elementos específicos de representação e de apropriação do sacro pelas comunidades rurais de aldeias em redor do monte de São Macário (maciço da Gralheira). Em paralelo com a pesquisa artística dos alunos, a Binaural/Nodar irá levar a cabo durante os dias da residência uma série de master classes e workshops de campo sobre alguns aspetos relacionados com técnicas de captação de sons ambientais e antropológicos e com o trabalho em interligação com territórios e comunidades, num contexto de criatividade contemporânea. Por seu turno, os professores Pedro Bessa (coordenador do curso), Mário Vairinhos e Graça Magalhães apoiarão e articularão o trabalho de campo dos alunos com aspetos metodológicos, conceptuais e projetuais decorrentes do programa das várias áreas disciplinares do curso. O Mestrado de Criação Artística Contemporânea da Universidade de Aveiro está assente num paradigma da interação. As combinações resultantes de várias interações, simples ou complexas, oferecem e orientam

num surpreendente e emergente fenómeno onde se antevê, e afirma, a ideia de que todos os sistemas estão e são inter-relacionados, onde todas e quaisquer ações expõem uma consequência proporcionando toda uma abordagem consciente da gramática implícita na constituição do discurso da obra de arte contemporânea - nas suas diversas formas, que vão desde as instalações audiovisuais aos sistemas interativos. O discurso articulado no curso orienta-se no sentido do desenvolvimento de competências avançadas: no âmbito das metodologias e práticas de investigação em arte; na utilização de novas tecnologias aplicadas à arte; na compreensão / comunicação / interpretação transdisciplinar das áreas científicas envolvidas; nas capacidades de relacionamento interpessoal e de grupo necessárias ao trabalho de equipa pluridisciplinar. Alunos participantes na residência artística: Antónia Nascimento Liliana Morais Joana Marques; Rafaela Lopes Rita Romba Hugo Paquete Sérgio Marques Joacélio Batista Juliana Mendes Participação adicional: Prof. Doutor Wellington Jr.

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5. III FÓRUM TRAMONTANA de cultura e património imaterial das montanhas da Europa meridional 22 – 26 Abril 2013 (Estação de Artes e Sabores, S. Pedro do Sul e Largo Principal de Sul, S. Pedro do Sul) A existência de uma identidade cultural europeia é um conceito permanentemente posto à prova pelos movimentos migratórios, pela crescente globalização das ideias e dos costumes, pelos esforços dos decisores regionais e nacionais em promover o carácter único dos seus territórios etc. É legítimo afirmar que existe atualmente na Europa um tensão entre identidade e homogeneidade, sendo que aparentemente as identidades são hoje em grande medida influenciadas por esforços políticos e de promoção territorial enquanto as homogeneidades são o resultado óbvio de processos de comunicação de massas e de economia global. Não obstante estas macrotendências, existem na Europa espaços geográficos que mantêm naturalmente ligações ancestrais com uma cultura específica: os territórios rurais de montanha. A montanha é por definição um espaço de adaptação árdua à paisagem, de sobrevivência, de necessidade, de comunidade, de cultura. No fundo, de civilização. A configuração morfológica da montanha serviu no passado de proteção face a ameaças e hoje serve de factor de alguma estabilidade cultural face às mudanças inapeláveis do mundo contemporâneo. Nesse sentido, a memória ancestral está ainda muito presente nestes territórios, pelo que podemos considerar que a documentação dos respectivos materiais culturais é uma necessidade absoluta, seja pelo risco de desaparecimento, seja pelo valor de “diferença” que representam num mundo crescentemente globalizado. Em Agosto de 2011 foi criada a Rede Tramontana, a qual tem estado associada a um trabalho articulado entre espaços de montanha de países da Europa Meridional, particularmente de línguas românicas, a partir da qual se estudam, comparam e disseminam materiais culturais e metodologias inovativas de documentação e arquivo audiovisual dos referidos conteúdos, com o objetivo último de preservação da memória da paisagem e das comunidades e da utilização dos materiais documentados como ferramenta para a educação, autoestima e valorização destes territórios de montanha. O acrónimo da rede, TRAMONTANA, refere-se tanto ao vento frio e turbulento de Norte que assola grande parte

das montanhas presentes no projeto, como à origem latina do nome: “atrás dos montes”, constituindo assim uma perfeita metáfora para o árduo modo de vida das comunidades de montanha e para a matriz linguística comum do projeto. A Rede Tramontana obteve em Maio de 2012 um financiamento do Programa Cultura 2007-13 da Comissão Europeia e reúne num projeto integrado vários arquivos da memória das várias estruturas associativas com trabalho profundo de documentação junto de comunidades rurais de montanha nas áreas da antropologia, etnologia, etnomusicologia, etnocoreologia, linguística e paisagens sonoras, oriundas de diversas regiões de França, Itália e Portugal: Binaural/Nodar (Dão-Lafões, Portugal) Nosauts de Bigòrra (Midi- Pyrenées, França) Eth Ostau Comengés (Midi- Pyrenées, França) Numériculture Gascogne (Midi- Pyrenées, França) Bambun (Abruzzo, Itália) LEM Italia (Abruzzo, Itália) La Leggera (Toscânia, Itália) O III Fórum Tramontana decorrerá no concelho de S. Pedro do Sul (região de intervenção da Binaural/Nodar) contando com mais de duas dezenas de diretores e de membros das organizações parceiras, os quais apresentarão em formato audiovisual excertos das recolhas que estão a desenvolver em comunidades de montanha dos respetivos territórios. Por outro lado, foram convidados um conjunto de investigadores e organizadores de Portugal, Itália e País Basco, os quais contribuirão com as suas experiências profissionais para aprofundar alguns aspetos úteis para os caminhos futuros para a valorização patrimonial de territórios de montanha. Por último, o fórum culminará no dia 26 de Abril com uma festa das culturas de montanha da Europa Meridional, com a participação de grupos locais (Orquestra Regional Sons da Beira Alta e Grupo Musical Os Unidos da Encosta do São Macário) e de músicos e cantores oriundos das regiões italianas e francesas parceiras da rede Tramontana.

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5. III FÓRUM TRAMONTANA de cultura e património imaterial das montanhas da Europa meridional

Programa Público Completo: Quinta-Feira, 25 Abril 2013 10h30-11h30 – Apresentação da Rede Tramontana na Escola Secundária de São Pedro do Sul e na Misericórdia de São Pedro do Sul (Jardim de Infância e Asilo) e breves interpretações musicais dos Pirenéus Franceses, das regiões italianos do Abruzzo e da Toscânia. 15h00-19h00 – Visita dos parceiros da Rede Tramontana às aldeias de Manhouce, Candal, Covas do Monte, Covas do Rio, Nodar e Sequeiros e contacto com população e associações locais. Sexta-Feira, 26 Abril 2013 14h00-18h00 Estação de Artes e Sabores, São Pedro do Sul (antiga estação de comboios).

Seminário : Experiências de documentação e valorização de património cultural de zonas de montanha. 14h00 - Abertura da sessão por Luís Costa (Binaural/Nodar) e Fabrice Bernissan (Nosauts de Bigòrra, chefe de fila do projeto Rede Tramontana). 14h30 - Apresentações audiovisuais comentadas de recolhas antropológicas, linguísticas e etnomusicológicas dos parceiros da Rede Tramontana:

Nosauts de Bigòrra (Midi- Pyrenées, França) Eth Ostau Comengés (Midi- Pyrenées, França) Numériculture Gascogne (Midi- Pyrenées, França) Bambun (Abruzzo, Itália) LEM Italia (Abruzzo, Itália) La Leggera (Toscânia, Itália) Binaural/Nodar (Dão-Lafões, Portugal) 15h30 – Casos de estudo de documentação e valorização de património de zonas de montanha: Xabi Erkizia (Coordenador da associação audiolab.org, País Basco, Espanha): A documentação e a criação sonora nas montanhas bascas: O projeto www.soinumapa.net.

Don Filippo Lanci (Sacerdote, Diretor da Secção de Arte Sacra do Ofício Litúrgico Diocesano de Teramo, Abruzzo, Itália): “Algumas especificidades da relação entre homem cristão, imagem sagrada e espaço de culto. Notas do trabalho com algumas comunidades do Abruzzo"

Ana Saraiva (Antropóloga, Museu Municipal de Ourém): Materialização expositiva de pesquisas antropológicas na Serra de Aire e Candeeiros.

Rosário Pestana (Etnomusicóloga, Coordenadora do Departamento de Musicologia da Universidade de Aveiro): Percursos etnomusicológicos na zona de Manhouce e modelos de pesquisa universitária musicológica em articulação com territórios.

Fátima Eusébio (Historiadora da arte, Coordenadora do Departamento de Bens Culturais da Diocese de Viseu): Documentação e valorização do património da Diocese de Viseu: Objetivos e estratégias atuais.

Adriano Azevedo (Município S. Pedro do Sul e Região de Turismo Centro): O património como variável determinante para a equação de promoção territorial: o caso de São Pedro do Sul e da Região Centro.

Isabel Silvestre (lenda viva dos cantares polifónicos femininos de Manhouce, S. Pedro do Sul): Como resistir promovendo a cultura de uma aldeia. A experiência pessoal enquanto autarca, dinamizadora e cantora. 17h30 – Debate final Sexta-Feira, 26 Abril 2013 21h00-00h00 Largo Principal de Sul (S. Pedro do Sul) Festa popular das culturas europeias de montanha. Gianfranco Spiti l l i : Cantos e tocatas do vale do rio Vomano, no Abruzzo setentrional (Itália).

Fabrice Bernissan, Renaud Lassalle e Silvan Carrère : Cantos polifónicos empenhados dos Pirinéus Centrais (França).

Fil ippo Marranci e Marco Magistrali : Lenhadores e lavradores no Vale do rio Sieve: Os cantos dos pigionali e mezzadri na Toscânia oriental (Itália).

Grupo de Cantares de Sequeiros (São Pedro do Sul): Um grupo de mulheres de uma aldeia do Maciço da Gralheira retoma a tradição de cantar depois de mais de 20 anos de interregno.

Orquestra Regional Sons da Beira Alta (Castro Daire, Portugal): Um dos melhores representantes da tradição das orquestras de cordas da serra de Montemuro (com origem nas invasões francesas) que animam bailes tradicionais.

Grupo Musical Os Unidos da Encosta de São Macário (S. Pedro do Sul e Castro Daire, Portugal): Um grupo de concertinas e canções humorísticas em crescendo de sucesso local.

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