Upload
duongliem
View
213
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | ISSN 2184-0776 | Nº 40 | setembro 2016
1
DIREITO, SEGURANÇA E
DEMOCRACIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
FORÇAS ARMADAS - INTERVENÇÃO NO ÂMBITO DA SEGURANÇA INTERNA Armed Forces - Intervention in Internal Security PAULO JORGE DINIS REBISCO Mestrando em Direito e Segurança
RESUMO Serão as Forças Armadas um agente de Segurança Interna? É esta a questão que
dá o mote a este estudo. E tentar perceber, através dos variados pontos de vista e
argumentações que rodeiam as questões da segurança interna, o espaço da participação
das Forças Armadas nas acções e operações de segurança interna.
As várias latitudes de discussão permitem desde logo perceber que a interpretação
legal da participação das Forças de Segurança na Segurança Interna, será, para alguns
autores, mais extensiva, sendo que para outros, essa mesma interpretação se mostra mais
restritiva.
A presente conjuntura política, social e económica, bem como o quadro e grau de
ameaças actuais a que os Estados estão expostos faz emergir esta questão, importando
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
2
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
saber até que ponto a intervenção militar tem cabimento em questões tradicionalmente
reservadas às polícias, e de que forma esta se processa, ou processará, e ainda se será
aceitável a cooperação entre Forças e Serviços de Segurança e Forças Armadas.
PALAVRAS-CHAVE Forças Armadas, Segurança Interna, Segurança Nacional, Defesa Nacional, Polícias
ABSTRACT Are the Armed Forces an Internal Security agent? This is the subject of this study.
And trying to understand through various points of view and arguments that circumscribe
the issues of internal security the room for participation of the armed forces in actions and
operations of internal security.
The various latitudes of discussion allow us to realize that the legal interpretation of
the involvement of security forces in Homeland Security are for some authors more
extensive while for others this same interpretation is more restrictive.
This political, social and economic environment , as well as the kind and level of
current threats, to which States are exposed, brings out the question that gives meaning to
this study: understand how the military intervention in issues traditionally assigned to the
police is or will be managed, and if the cooperation between Security Forces and Services
and Armed Forces is acceptable.
KEYWORDS Armed Forces, Homeland Security, National Security, National Defence, Police
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
3
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Lista de Abreviaturas CRP - Constituição da Republica Portuguesa
FA - Forças Armadas
FSS - Forças e Serviços de Segurança
LSI - Lei de Segurança Interna
CEDN - Conceito Estratégico de Defesa Nacional
RASI - Relatório Anual de Segurança Interna
CEMGFA - Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas
EMGFA - Estado Maior General das Forças Armadas
SGSSI - Secretario Geral do Sistema de Segurança Interna
SI - Segurança Interna
LOBOFA - Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas
LDN - Lei de Defesa Nacional
Introdução Forças Armadas - um agente de Segurança Interna?
A noção de segurança interna é recente quer na terminologia político administrativa
quer no quadro das ciências sociais. A sua crescente afirmação no quadro das políticas
publicas traduz a reconceptualização da segurança associada às transformações politicas
e sociais que se tem vindo a referir e à emergência de um novo quadro de pensamentos
estratégicos decorrente das ameaças e riscos. (Lourenço, 2015)
A noção de segurança interna afirma a passagem de uma visão de segurança no
interior das fronteiras do Estado - pensada e tradicionalmente designada como de ordem
pública - para a noção mais densa e complexa de segurança interna (Lourenço, 2015)
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
4
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Foi a complexidade da sociedade global e a alteração do quadro de ameaças que
exigiu a redefinição da missão atribuída às polícias e consequentemente à assunção de um
quadro conceptual mais alargado e mais denso que os limites estritos da noção de ordem
pública. (Lourenço, 2015)
A passagem de uma noção de segurança confundível ou subsumida na noção de
defesa para um conceito autonomizado - embora sistemicamente relacionado - só é
compreensível no quadro da globalização, num processo em que o fim da Guerra Fria, o
terrorismo jihadista e o crime organizado à escala global desempenharam um papel
significativo. (Lourenço, 2015)
A emergência de ameaças transnacionais à segurança interna - embora não
assumindo uma logica de guerra - contribuem para a complexidade do conceito de
segurança interna e, simultaneamente, para perturbar a limitação tradicional entre
segurança interna e segurança externa, com consequências a nível politico e jurídico-
administrativo (Cusson,2007; Garcin, 2005; Lourenço,2006)
1) Missão e capacidades das Forças Armadas Apesar das características do "novo" Mundo, em Portugal as FA continuam a ser um
pilar essencial da Defesa Nacional, com a missão fundamental de “garantir a defesa militar
da República”.
Organizadas em três Ramos, com aproximadamente 40.000 militares e civis, as FA
cumprem as missões que legalmente lhes estão atribuídas, se bem que nem sempre com
os mais avançados sistemas de armas.
1.1) Missões militares externas
As FA encontram-se preparadas fundamentalmente para fazerem face às agressões
e ameaças externas, no sentido de garantirem a soberania, a independência nacional e a
integridade do território nacional, no quadro das organizações internacionais e da política
nacional de cooperação, como instrumento da política externa em missões de alta
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
5
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
intensidade (guerra – Afeganistão e Iraque), humanitárias e de paz e em acções de
cooperação técnico-militar.
1.2) Outras missões
Além das missões de caracter essencialmente militar, e como dispõe a Constituição
da República Portuguesa (CRP), as FA têm colaborado em missões de protecção civil,
fazendo face a situações de catástrofe ou calamidade pública e em tarefas relacionadas
com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das
populações. As FA estão ainda preparadas para serem empregues, nos termos da CRP
(art.º 19º) e da Lei (Lei Orgânica n.º 1/2012, de 11 de Maio, que constitui a segunda
alteração à Lei n.º 44/86 de 30 de Setembro relativa ao Regime do Estado de Sitio e do
Estado de Emergência), quando for declarado qualquer um dos estados de excepção
(estado de sítio ou de emergência). Estas missões, enquadráveis nas “outras missões de
interesse público” (ou, segundo Loureiro dos Santos [Vaz, 2012: 973], na missão de
“garantir o funcionamento das instituições democráticas”), são cumpridas “sem prejuízo das
missões de natureza intrinsecamente militar” (CEDN 2003; 8.1).
1.3) O Conceito Estratégico de Defesa Nacional (2013)
Com o crescendo das ameaças de cariz transnacional designadamente na
sequência dos ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001, e à luz do que se passou
noutros países europeus (nomeadamente em França), o Conceito Estratégico de Defesa
Nacional de 2013, passou a incluir a possibilidade de o Estado promover as seguintes
capacidades adicionais das FA:
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
6
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
"- Maximizar as capacidades civis e militares existentes e impulsionar uma
abordagem integrada na resposta às ameaças e riscos, operacionalizando um
efetivo sistema nacional de gestão de crises;
- Clarificar, agilizar e simplificar as estruturas de prevenção e de resposta
operacional, adaptando -as à natureza das ameaças, de modo a maximizar as
capacidades existentes e a melhorar a eficiência no emprego dos meios;
- Contribuir, nas instâncias internacionais, para o reforço das políticas de controlo
e não -proliferação dos armamentos, das tecnologias de destruição massiva, para a
prevenção e combate ao terrorismo, ao narcotráfico e a outras formas de
criminalidade organizada e para a proteção do meio ambiente, para a segurança
marítima e aérea e para o auxílio humanitário;
- Aprofundar a cooperação entre as Forças Armadas e as forças e serviços de
segurança em missões no combate a agressões e às ameaças transnacionais,
através de um Plano de Articulação Operacional que contemple não só as
medidas de coordenação, mas também a vertente de interoperabilidade dos
sistemas e equipamentos;
- Promover uma abordagem integrada da segurança interna, contemplando uma
dimensão horizontal, incluindo a necessidade de intervenção articulada e
coordenada de forças e serviços de segurança, da proteção civil, da emergência
médica e das autoridades judiciárias, bem como de entidades do sector privado, e
uma dimensão vertical, incluindo os níveis internacional, nacional e local;
- Promover a integração operativa da segurança interna, através da adoção de
medidas operacionais que reduzam redundâncias e aumentem a integração
operacional e a resiliência do sistema, incluindo as informações, a segurança
pública, a investigação criminal, os serviços de estrangeiros e fronteiras e a
proteção civil;
- Desenvolver as capacidades militares necessárias à mitigação das
consequências de ataques terroristas, cibernéticos, NBQR — Nuclear,
Bacteriológico, Químico, ou Radiológico — e de catástrofes e calamidades;"
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
7
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
São ainda linhas orientadoras do CEDN 2013;
"- Definir o esforço coordenado de aquisição e manutenção de reservas
estratégicas de determinados medicamentos que possam ser utilizados em caso
de emergência em saúde pública ou de calamidade, bem como assegurar, de um
modo sustentado, a preservação de infraestruturas essenciais quer do sector
saúde, integrando o sistema prestador de cuidados, quer no domínio do
abastecimento de água e alimentos, e energia. Para responder eficazmente à
ameaça das redes terroristas, Portugal deve desenvolver uma estratégia nacional
e integrada que articule medidas diplomáticas, de controlo financeiro, judiciais, de
informação pública e de informações, policiais e militares. Deve ainda atribuir especial
atenção à vigilância e controlo das acessibilidades marítima, aérea e terrestre ao
território nacional. Neste domínio, adquire grande acuidade a implementação de um
Programa Nacional de Proteção das Infraestruturas Críticas. Relativamente à
proliferação de armas de destruição massiva e seus vetores, é indispensável reforçar
a coordenação entre as várias instâncias do Estado com responsabilidades na
prevenção e resposta a este risco, nomeadamente no plano da fiscalização dos
mercados de acesso à produção, comercialização e tráfico, da investigação
tecnológica, da informação à população e da proteção civil, em estreita articulação com
os nossos aliados. É também necessário promover a melhoria das capacidades de
defesa NBQR. Para lutar contra o crime organizado transnacional importa não só
reforçar a cooperação internacional, como melhorar a capacidade de prevenção e
combate à criminalidade organizada, reforçando e aperfeiçoando os mecanismos de
coordenação entre as várias entidades e organismos com responsabilidades neste
domínio, atribuindo especial prioridade quer às ações de fiscalização, detecção e
rastreio do tráfico de droga nos espaços marítimo e aéreo sob jurisdição nacional, quer
às ações de combate às redes de imigração clandestina e do tráfico de seres humanos.
No domínio da cibercriminalidade, impõe -se uma avaliação das vulnerabilidades dos
sistemas de informação e das múltiplas infraestruturas e serviços vitais neles apoiados.
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
8
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Neste domínio, definem -se como linhas de ação prioritárias: garantir a proteção das
infraestruturas de informação críticas, através da criação de um Sistema de
Proteção da Infraestrutura de Informação Nacional (SPIIN); definir uma
Estratégia Nacional de Cibersegurança; montar a estrutura responsável pela
cibersegurança, através da criação dos órgãos técnicos necessários;
sensibilizar os operadores públicos e privados para a natureza crítica da
segurança informática e levantar a capacidade de ciberdefesa nacional. Para
fazer face aos atentados ao ecossistema, Portugal deverá reforçar a sua
capacidade de resposta através da promoção de uma adequada articulação
entre as políticas públicas com intervenção neste domínio e da maximização das
capacidades civis -militares. A pirataria constitui uma séria ameaça à
segurança, afetando as rotas vitais do comércio internacional. Portugal deve
continuar a participar em missões de combate à pirataria, no quadro das suas
alianças, e contribuir para a segurança dos recursos comuns do planeta, bem
como cooperar com os Estados de língua portuguesa, nomeadamente no âmbito
do Acordo de Defesa da CPLP, para desenvolver ações de segurança marítima e
de combate a esta ameaça. O impacto devastador das catástrofes naturais ou
provocadas e das calamidades dão relevo ao Sistema de Proteção Civil e às
seguintes linhas de ação estratégica: reforçar o Sistema de Proteção Civil,
intensificando o aproveitamento de sinergias operacionais entre as entidades
responsáveis pelas áreas da segurança interna, justiça e defesa nacional e a
administração local, para melhorar a eficiência e a eficácia do sistema;
desenvolver metodologias, programas e estudos técnicos e científicos sobre os
diferentes perigos, ameaças e riscos; criar uma Unidade Militar de Ajuda de
Emergência, sem aumento dos efetivos autorizados, e aprofundar a ligação e
responsáveis em situações de catástrofe e calamidade. As pandemias e outros
riscos à segurança sanitária constituem sérios riscos para a segurança do
Estado e das pessoas. Nesse quadro, é prioritário reforçar a capacidade de
resposta nacional aos riscos sanitários, através de uma melhor definição do
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
9
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
quadro estratégico de planeamento e resposta; da promoção de ações de
educação e formação para a emergência e gestão do risco; do desenvolvimento da
cooperação civil -militar e da coordenação entre os hospitais públicos, privados e
militares, no sentido de mais rápida e eficazmente se fazer face a doenças epidémicas
ou ataques com armas NBQR. A segurança sanitária passa também por garantir a
segurança alimentar, nomeadamente a qualidade dos alimentos e da água e pela
definição de uma Estratégia Nacional Sanitária - Epidemiológica. Finalmente, é
necessária uma Estratégia Nacional do Ambiente que permita prevenir e fazer face, de
forma integrada, aos principais riscos ambientais em Portugal, como os sismos, os
incêndios florestais, as cheias, a erosão no litoral e a erosão hídrica do solo, a
desertificação e os acidentes industriais."
1.4) Relatório Anual de Segurança Interna 2015 - As Ameaças
Globais à Segurança
Tendo por base o Relatório Anual de Segurança Interna de 2015 (RASI), é possível
apontar como as seguintes “ameaças globais à segurança”:
- A ameaça terrorista,
- A espionagem
- Proliferação de armas de destruição em massa
- Crise de refugiados
- Criminalidade organizada transnacional
- Branqueamento de capitais
- Espionagem
- Hacktivismo
- Cibercrime organizado
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
10
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
1.5) Enquadramento legal
A Lei de Segurança Interna (LSI - Lei n.º 53/2008, de 29 de Agosto) esclareceu a
participação das FSS fora do território nacional no quadro de compromissos internacionais,
e explicitou no seu art.º 35º (Forças Armadas, no âmbito do Capítulo VI relativo às
disposições finais) que “as Forças Armadas colaboram em matéria de segurança interna
nos termos da Constituição e da lei, competindo ao Secretário-Geral do Sistema de
Segurança Interna [SGSSI] e ao Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas
[CEMGFA] assegurarem entre si a articulação operacional. (Borges, 2013)
Alinhado com a LSI, o disposto na alínea e. do nº 1 do art.º 4º da Lei Orgânica de
Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA - Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7 de
Julho), vem permitir que as FA possam “cooperar com as forças e serviços de segurança,
tendo em vista o cumprimento conjugado das respectivas missões no combate a agressões
ou ameaças transnacionais.”. (Borges, 2013)
Esta disposição legal (para além das missões de protecção civil, de satisfação das
necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações e dos estados de
excepção) no quadro específico da SI, circunscrevendo a cooperação com as FSS às
missões no combate a agressões ou ameaças transnacionais, foi ao encontro da
factualidade operacional, com a necessária e adequada articulação entre o SGSSI e o
CEMGFA (art.º 26º). (Borges, 2013)
Por outro lado, a Lei de Defesa Nacional (Lei n.º 31-A/2009 art.º 24º, 1, e.) acentua
que “as FA colaboram em matéria de segurança interna nos termos da Constituição e da
Lei, competindo ao SGSSI e ao CEMGFA assegurarem entre si a articulação
operacional”.(Borges, 2013)
Entretanto, as Leis orgânicas do EMGFA, da Marinha, do Exército e da Força Aérea
referiram de modo explícito esta colaboração das FA com as FSS.
Como refere o Major-General Luís Borges (2013) "A missão das FA de colaborar em
matéria de SI, é considerada por muitos legalistas como inconstitucional, em face da
omissão dessa mesma intervenção das FA na SI nos artigos 272 (Polícia) e 275 (Forças
Armadas) da CRP.
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
11
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Para os mais cépticos, ao nível da segurança, nomeadamente da ordem pública, da
prevenção criminal e da investigação criminal, a CRP, com excepção das situações de
guerra e dos estados de sítio ou emergência, não prevê a participação dos militares em
missões de segurança interna. A possível intervenção das FA é ainda interpretada em
alguns sectores mais civilistas como o reforço da militarização no controlo urbano (uma das
missões) ou nas funções de polícia em geral. Neste sentido, a intervenção das FA na SI
pode ser considerada como um “Mito”, fundamentalmente em função da leitura política
(remeter os militares aos quartéis depois do período pós revolucionário e acabar com o
conselho da revolução) feita em 1982, aquando da revisão da CRP e da aprovação da Lei
de Defesa Nacional e das Forças Armadas. Desde então, as mudanças em Portugal e no
Mundo da S&D foram significativas, apesar de continuar a haver pontualmente alguns
traumas associados aos mitos. Infelizmente, as questões políticas e ideológicas, a par de
um continuado corporativismo, continuam a ter um peso considerável na consolidação do
sistema político em Portugal, limitando inclusivamente a revisão de uma CRP já
desactualizada (pelo menos) no que concerne à S&D." (Borges, 2013)
1.6) Enquadramento sistémico
Para Guedes Valente (2013) "a Constituição de 1976, separou as funções de
segurança interna das de segurança externa. As Forças Armadas detêm a missão originária
de segurança externa, cabendo-lhes defender e garantir a integridade e a independência
(soberania político-territorial) do Estado português. este preceito constitucional deve ser
interpretado de acordo com o art. 19.º da Constituição: os estados de excepção impõem
uma interpretação da ordem jurídica de acordo com os princípios que regem os regimes de
estado de sítio e de estado de emergência. "
Ainda para Guedes Valente (2013) a etimologia estado de excepção implica a
observância de dois princípios; o princípio da excepcionalidade e do princípio da
indispensabilidade, correndo-se o risco da excepção se tornar regra. As Forças Armadas
intervêm na segurança interna só e apenas em situações de excepção e de
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
12
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
indispensabilidade para que a ordem e a tranquilidade públicas – paz pública – seja
assegurada ou seja reposta. Como o próprio regime jurídico do estado de sítio e de
emergência determina, as Forças Armadas assumem o comando das forças de segurança
no estado de sítio e submetem-se ao comando das forças de segurança e das autoridades
administrativas no estado de emergência.
A LSI amplia a intervenção das Forças Armadas como actores promotores de
segurança submetidos às forças de segurança, estando obrigadas a comunicar àquelas
todos os actos que lesionem ou coloquem em perigo a segurança interna, conforme n.º 2 e
n.º 3 do art. 5.º da LSI. Se ao cidadão se impõe este dever de contribuir para a segurança
interna [n.º 1 do art. 5.º da LSI], muito mais se impõe aos membros das Forças Armadas,
que, para efeitos de responsabilidade penal, são considerados funcionários e, como tal,
detêm um dever de agir acrescido. (Valente, 2013)
A intervenção das Forças Armadas pode ganhar uma dimensão mais ativa no campo
da cooperação e sob o comando ou direção das forças de segurança: v. g., a marinha pode
ser chamada a cooperar numa operação policial de prevenção e repressão do tráfico de
droga, tráfico de armas ou tráfico de seres humanos em alto mar, ou para intercetar um
navio que transporte de produtos radioativos com o intuito de promover um atentado
terrorista; a força área pode ser chamada a cooperar com a polícia na perseguição e na
deteção e apreensão de uma aeronave que transporta estupefacientes do norte de África
ou de outro território estrangeiro para o território nacional. (Valente, 2013)
2) Colaboração com as Forças e Serviços de Segurança -
Uma perspectiva "extensiva" Ainda de acordo com o Major-General Luís Borges (2013) "as percepções do
cidadão comum são hoje muito diferentes, sobretudo em função do que observam através
dos Órgãos de Comunicação Social em França ou nos EUA, em especial no combate às
ameaças transnacionais, com a participação das FA em apoio das FSS na segurança
urbana ou na protecção de pontos sensíveis. É nesta perspectiva, reforçada pela actuação
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
13
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
conjunta das FA e das FSS face a agressões e ameaças de cariz transnacional, que
entendemos que a carga simbólica associada à intervenção das FA na SI tem hoje um cariz
substancialmente diferente, entendível no sentido da participação das FA na SI em regime
de excepcionalidade e com carácter de complementaridade e nunca da substituição das
FSS.
O disposto na LSI, na LOBOFA e na LDN constitui uma extensão (para fazer face às
novas ameaças) do disposto na alínea 6. do art.º 275º da CRP, quando se refere que as
FA podem ser incumbidas, nos termos da lei, de colaborar em missões de protecção civil,
em tarefas relacionadas com a satisfação de necessidades básicas e a melhoria da
qualidade de vida das populações. A principal questão tem relação directa com a
identificação das referidas “agressões ou ameaças transnacionais”, que no nosso entender
têm carácter de ameaça externa (actores externos transfronteiriços) e nesse sentido o seu
combate em território nacional poder ser complementado pelas FA em apoio das FSS e
sem prejuízo da sua missão primária de defesa militar da República".
Para o Coronel Gil Prata (2010:1) “no âmbito de actuação das Forças Armadas devem ser
compreendidas também as ameaças cujas acções são desenvolvidas no interior do Estado,
mas cuja origem está no exterior. Trata-se da vertente interna da defesa nacional que se
distingue de segurança interna pela natureza externa da ameaça. Pelo que, assim o
entendemos, para fazer face a uma ameaça transnacional, pode ser usado o instrumento
militar complementarmente ao instrumento policial.”
De acordo com o General Pinto Ramalho (2011: 110) “face aos novos riscos à
segurança global e, em particular, numa perspectiva de combate ao terrorismo e ameaças
não tradicionais [mas de carácter transnacional], deixaram de existir fronteiras definidas
entre a segurança interna e externa, o seu carácter é difuso e reconhece-se a
indispensabilidade da actuação supletiva das Forças Armadas em muitas situações de
carácter interno, onde as Forças de Segurança não dispõem de capacidades adequadas
ou se revelaram insuficientes.”
2.1) Meios de colaboração com as Forças e Serviços de Segurança
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
14
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Relativamente à colaboração entre FSS e as FA argumenta o Major-General Luis
Borges (2013) "Entre as capacidades das FA disponíveis para a colaboração em regime de
complemento com as FSS no combate a ameaças de cariz transnacional (como o
terrorismo, a proliferação de armas de destruição maciça, a criminalidade transnacional
organizada, a cibercriminalidade e a pirataria) destaca-se:
- defesa antiaérea; capacidade prioritária da Força Aérea, com apoio do Exército
(artilharia antiaérea) e da Marinha (sistemas antiaéreos das unidades navais);
- NBQR; capacidades materializadas no Elemento de Defesa Biológica e Química
que integra valências disponíveis nos Laboratórios de “Bromatologia e Defesa
Biológica” e de “Toxicologia e Defesa Química” do Exército (a Marinha, a Força Aérea e
as FSS também dispõem de capacidades limitadas)
- inactivação de engenhos explosivos; capacidade (EOD) centrada na
Engenharia no caso do Exército (a Marinha, a Força Aérea e as FSS também
dispõem de capacidades limitadas);
- ciberdefesa; capacidade materializada no Centro de Cibersegurança da Defesa (a co-
localizar na divisão de comunicações e sistemas de informações do EMGFA);
- engenharia: capacidades (pontes, construção, etc.) das unidades de
Engenharia Militar do Exército;
- vigilância e fiscalização; do mar por parte da Marinha (com navios e Polícia
Marítima) e do espaço aéreo por parte da Força Aérea (com aeronaves e sistemas
C4I) com acções de apoio à Polícia Judiciária (PJ), no combate ao tráfico de
estupefacientes, de apoio ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no combate à
imigração clandestina e de apoio ao Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos
(IPTM) na inspecção de navios estrangeiros;
- Operações Especiais; quando a ameaça interna for muito elevada e
organizada (grupos terroristas), que apoiadas pelos meios aéreos e de
informações exclusivos das FA (existe inclusivamente um Quartel General de
Operações Especiais no Comando Operacional Conjunto do EMGFA que exerce o
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
15
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
comando de nível operacional destas forças) estão preparados para missões de alta
intensidade;
- saúde, apoio psicológico, transporte, tratamento de águas, informação
cartográfica, etc. […]."
Ainda na argumentação do Major-General Luís Borges (2013) "Relativamente ao
empenhamento de pequenos escalões das FA (pelotão ou companhia) em apoio/reforço
das FSS (relação de comando ou apoio a definir caso a caso, no princípio de, sempre que
possível, permitirem que as FSS fiquem libertas para actuarem na ordem pública e mais
genericamente nas funções de natureza policial) destacamos a possível utilização de
subunidades (esquadrões e pelotões) de Polícia do Exército (PE), ou mesmo de sub-
unidades do Exército (preferencialmente infantaria) preparadas e treinadas para o efeito.
Esta situação, que é frequente em França (caso do plano VIGIPIRATE atrás referido) ou
em Espanha (em que as FA patrulham a linha do TGV ou as centrais nucleares), poderia
contemplar o apoio/reforço às FSS no caso da protecção de infra-estruturas críticas
(também designados de pontos sensíveis - casos da Ponte Vasco da Gama, da Ponte 25
de Abril, do Mosteiro dos Jerónimos, etc.) de modo a que estas fiquem libertas para
actuarem na ordem pública e mais genericamente em funções de natureza policial, sem ser
necessário declarar um estado de excepção."
3) Colaboração com as Forças e Serviços de Segurança -
Uma perspectiva "restritiva" Os estados de excepção são quadros jurídico-operativos de segurança interna os quais se
inserem no regime jurídico da segurança interna e do Direito penal material e processual,
onde as Força Armadas são agentes cooperantes sob comando e direção da polícia e a
sua intervenção obedece ao vector da racionalização e ao vector da não duplicação das
atribuições, das competências e dos meios, que se desenvolvem segundo os princípios da
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
16
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
cooperação, da proporcionalidade, da indispensabilidade e da subsidiariedade. (Valente,
2013)
A racionalização dos meios assume-se ou dever-se-ia ter assumido como um vector
primacial de afirmação democrática dirigida a construir uma sociedade mais justa, mais livre
e mais solidária.
Esta racionalização implica uma justa e adequada distribuição e assunção das
atribuições e competências constitucionais por parte de toda a administração do estado. A
consciência da escassez dos meios materiais – em especial económico-financeiros –
impunha uma Constituição que entregasse, de acordo com a sua natureza, a cada órgão e
serviço de soberania as atribuições, as competências e os meios necessários para as
prosseguir e as cumprir (Valente, 2013).
Os princípios da intervenção das Forças Armadas na segurança interna são o da
cooperação, o da indispensabilidade da intervenção das Forças Armadas, o da
proporcionalidade da intervenção e da cooperação das Forças Armadas e o da
subsidiariedade da intervenção das Forças Armadas. Todos têm em comum que o que
coopera são as Forças Armadas e aquele a que é prestada cooperação são as forças de
segurança, estas entendidas como a Policia. (Valente, 2013)
Contudo deve-se estabelecer a necessária diferença entre as formas de cooperação,
pela forma como ocorrem no quadro da SI. Como refere Guedes Valente (2013) "O princípio
da cooperação implica dois pontos cruciais: um prende-se com a ideia de que a atribuição
da segurança interna é originária da polícia e esta assume a responsabilidade civil, jurídica
e política de toda a ação; e outro diz respeito ao comando ou direção da ação, que é do
cooperado e não do cooperador, ou seja, as Forças Armadas cooperam sob o comando ou
direção do dominus originário da atribuição e da competência – PSP, GNR, PJ, SEF, (etc.).
O princípio da cooperação significa que o órgão ou serviço cooperador se subordina às
ordens do órgão ou serviço cooperado que é o titular pleno e originário da atribuição e da
competência.
O princípio da cooperação que apresentamos neste ponto não se confunde com o
princípio da cooperação vertical tutelar ou de superintendência e com o princípio da
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
17
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
cooperação horizontal desenvolvido por nós em outros momentos e textos45. A cooperação
que explanamos neste contexto é de subordinação à entidade originariamente competente,
próxima da cooperação vertical existente entre a AJ e os órgãos de polícia criminal, em que
estes levam a cabo diligências processuais sob a direção daquelas. Mas os órgãos de
polícia criminal têm competências próprias cautelares processuais penais para assegurar
a preservação das provas reais e pessoais, conquanto as Forças Armadas não têm
competências próprias «cautelares» de segurança interna."
Ao responsável policial que comanda ou dirige a operação ou a atividade policial
cabe a decisão de que meios e de que forma os utiliza, porque lhe pertence a legitimidade
pela atribuição e competências originárias e porque é sobre ele que recai toda a
responsabilidade da operação ou da actividade policial. A decisão pertence, desta feita, à
autoridade de polícia ou autoridade de polícia criminal material e territorialmente
competente que comunicará com o Secretário-geral do Sistema de Segurança Interna a
quem cabe coordenar a cooperação das forças armadas com as polícias (Valente, 2013).
A intervenção das forças armadas na segurança interna, tendo em conta a sua
natureza e a sua preparação militar, cuja preparação não é igual nem pode e deve ser igual
à preparação das polícias, só é admissível em tempo de paz pública no quadro da
subsidiariedade e apenas no plano dos meios materiais e dos meios humanos
manobradores dos mesmos. Esta intervenção das forças armadas na segurança interna
em tempo de paz pública – excluímos os cenários de estado de sítio e de estado de
emergência – só pode ser admitida segundo o prisma da subsidiariedade e a solicitação da
polícia necessitada do apoio que deve ser solidário. (Valente, 2013)
4) Defesa nacional e Segurança Interna: Convergências e
incompatibilidades Segundo Rui Pereira (2010) "a solução para estes casos é absolutamente
compatível, no entanto, com a letra e com o espírito da Constituição. É certo que a
Constituição apenas prevê expressamente a intervenção das Forças Armadas em missões
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
18
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
de protecção civil ou estados de excepção. Todavia, isso não implica a recusa de que
determinadas ameaças transnacionais, associadas ao terrorismo e à criminalidade
organizada, sejam passíveis de uma resposta articulada, que envolva meios das Forças e
dos Serviços de Segurança e das Forças Armadas. Não estará em causa, nessas
situações, uma ingerência inconstitucional das Forças Armadas na segurança interna.
Tratar-se-á antes do cumprimento das suas missões próprias, que podem coincidir, nos
casos de terrorismo e criminalidade organizada, com as missões das Forças e dos Serviços
de Segurança. Foi esse o caminho trilhado, em 2008 e 2009, nas Leis de Segurança Interna
e da Defesa Nacional. É essa a solução que nos permite responder, hoje, com todos os
meios necessários e adequados de que dispomos a ameaças conjuntas à segurança
interna e externa do Estado Português."
Contudo, as diferenças doutrinais, de formação, a génese operacional, bem como
os objetivos inerentes a cada tipo de missão, acentuam as incompatibilidades, na
complementaridade entre as FSS e as FA, como tão bem refere Nuno Lourenço (2006), "A
ideia de se perspectivar uma subsidiariedade e complementaridade forte entre "forças de
segurança - forças armadas" que permita potenciar os recursos disponíveis tem vindo a
ganhar adeptos e, como exemplo, constitui um dos vectores da politica de Segurança
Nacional definida em França, em 2008. Defende-se, assim, o desenvolvimento de uma
cooperação civil-militar em áreas estratégicas que vão da vigilância e protecção de locais
de interesse estratégico, da utilização de equipamentos, transportes, transmissões e
engenharia militar, e da utilização das capacidades logísticas das forças armadas, em
situações particulares, em áreas como o alojamento, alimentação e infra-estruturas de
campanha, sendo estes os aspectos de maior destaque na convergência positiva entre FSS
e FA, no quadro de uma politica de Segurança Nacional
Acompanhando ainda Nuno Lourenço (2006) "a utilização de forças militares em
acções de intervenção junto da população civil tem merecido serias dúvidas dos mais
variados quadrantes académicos, políticos e de oficiais das forças armadas e das forças
policiais e de instituições internacionais.
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
19
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Os meios necessários para a prevenção e combate a ameaças transnacionais à
segurança interna, mesmo quando possam ter consequências duras para a sociedade e
exigirem um acrescido esforço de coordenação não fazem apelo a uma logica de guerra,
como é o caso do crime organizado e das organizações de tipo mafias, dos actos que
cabem na figura de desordem social, do cibercrime ou do terrorismo"
Na tradição europeia, esta uma área de acção reserva às forças e serviços de
segurança, sejam eles de natureza civil ou militar, aceitando-se excepcionalmente se uma
intervenção das forças armadas (Cusson, 2007; Garcin 2005, Lourenço 2006). Em Portugal
estão previstas nas Figuras do Estado de Sitio e Estado de Emergência.
Vários são os factores que convergem para essa incompatibilidade. De ordem
organizacional, de filosofia e de doutrina, nomeadamente de formação. A acção policial é
diferente da militar. Os primeiros actuam junto de cidadãos do seu pais, qualidade que não
perdem mesmo no caso de um comportamento delinquente. Os segundos enfrentam o
inimigo. O campo de acção da polícia é, em essência e por natureza, interna, o campo de
acção das forças armadas é por definição externo.
Das polícias espera-se uma ação pela prevenção e persuasão, assentes na
legitimidade de garantes da ordem pública, não sendo o uso da força o meio de acção
privilegiado, para serem eficazes na sua actuação face aos cidadãos em situação de
incumprimento da lei.
Por outro lado, o equipamento e armamento militar é concebido com vista à máxima
eficácia em termos de alcance, poder de destruição e precisão. Em suma, as forças
militares estão preparadas e dotadas de armamento, equipamento e treino, direcionados
prioritariamente para a eliminação física do inimigo." (Lourenço 2006)
Conclusão
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
20
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
A resposta à pergunta que motivou o presente estudo mostra-se diversa, sem que
seja possível encontrar consensos, pelo menos nos aspectos que o normativo nacional não
refere concretamente, exceptuando os estados de excepção e as acções de protecção civil.
É evidente uma corrente de pensamento mais abrangente e extensiva, na qual a
intenção de os militares participarem, ou como frequentemente é referido, "colaborarem"
em acções e operações de Segurança Interna, num quadro da função exclusivamente
policial, é mais intenso. Importa desde logo perceber o que levou os militares a terem as
pretensões, plasmadas nos mais recentes Conceitos Estratégicos de Defesa Nacional, nos
quais se defende a densificação e alargamento do conceito de Segurança, de forma a
permitir a articulação das Forças Armadas e das Forças e Serviços de Segurança ao nível
da intervenção interna e externa.
É recorrente, no agendamento político, o tema a segurança interna, caracterizado
de forma negativa face ao aumento da criminalidade, bem como das suas novas formas,
estas responsáveis pelo agudizar o sentimento de insegurança dos cidadãos.
É seguro afirmar-se que os cidadãos, na maior parte dos casos, não percebem bem
a distinção entre a função policial e a função militar, estando, preocupados com a garantia
da segurança, independentemente da corporação que possa proporcionar esse bem.
Contudo esta finalidade não dilui a separação entre a função militar e a função policial.
Bibliografia Borges, JV, 2009. As Forças Armadas na Segurança Interna: Mitos e Realidades.
Revista Militar, janeiro, 2532, pp. 25-41.
Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), 2003. Resolução do Conselho de
Ministros n.º 6/2003 (D.R. N.º 16, 1.ª Série-B de 20 de janeiro). Lisboa: Diário da
República.
Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), 2013. Resolução do Conselho de
Ministros n.º 26/2013 (D.R. N.º 77, 1.ª Série-B de 19 de abril). Lisboa: Diário da
República.
CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | Nº 40 | setembro 2016
21
DIREITO, SEGURANÇA E DEMOCRACRIA
SETEMBRO
2016
Nº 40
Constituição da República Portuguesa (CRP), 2005. Lei n.º 1/2005 – Sétima revisão
constitucional (D.R. N.º 155, 1.ª Série-A de 12 de agosto). Lisboa: Diário da
República
Guedelha, MJM, 2013. Sistema de Segurança Interna Português: A reforma de 2008 –
Forças e Fraquezas. Jornal de Defesa e Relações Internacionais
Lourenço, N, 2006. Estudo para a reforma do modelo de organização do sistema de
segurança interna: Relatório Final - Modelo e Cenários. Instituto Português de
Relações Internacionais
Lourenço, N, 2015. As novas fronteiras da Segurança - Segurança Nacional.
Globalização e Modernidade. Revista Segurança e Defesa, fevereiro - junho, 31,
pp. 26-36
Ministério da Defesa Nacional, 2009a. Lei Orgânica n.º 1-A/2009 - Lei Orgânica de
Bases da Organização das Forças Armadas (D.R. N.º 129, 1.ª Série de 7 de
julho). Lisboa: Diário da República.
Ministério da Defesa Nacional, 2009b. Lei Orgânica n.º 31-A/2009 - Lei de Defesa
Nacional (D.R. N.º 129, 1.ª Série de 7 de julho). Lisboa: Diário da República
Palma, JN, 2011. O Papel das Forças Armadas nas Operações Inter-Agências de
Combate às Ameaças Emergentes em Portugal. Cadernos Navais, julho-
setembro, 38.
Pereira, R, 2010. Segurança Interna e Defesa Nacional - Autonomia e convergência das
funções de soberania
Prata, GVM, 2010. As FFAA e a Segurança Interna
Valente, MMG, 2013, A Segurança (Interna) na Constituição da Republica Portuguesa de
1976