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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Luciana Maria da Silva
2014
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens
Filosófica e Antropológica
Presidenta da República Dilma Vana Rousseff Vice-presidente da República Michel Temer Ministro da Educação José Henrique Paim Fernandes Secretário de Educação Profissional e Tecnológica Aléssio Trindade de Barros Diretor de Integração das Redes Marcelo Machado Feres Coordenação Geral de Fortalecimento Carlos Artur de Carvalho Arêas Coordenador Rede e-Tec Brasil Cleanto César Gonçalves
Governador do Estado de Pernambuco João Soares Lyra Neto
Secretário de Educação e Esportes de
Pernambuco José Ricardo Wanderley Dantas de Oliveira
Secretário Executivo de Educação Profissional
Paulo Fernando de Vasconcelos Dutra
Gerente Geral de Educação Profissional Luciane Alves Santos Pulça
Coordenador de Educação a Distância
George Bento Catunda
Coordenação do Curso Teresinha Beltrão e Sheila Ramalho
Coordenação de Design Instrucional
Diogo Galvão
Revisão de Língua Portuguesa Eliane Azevêdo
Diagramação
Roberta Cursino
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 3
1.COMPETÊNCIA 01 | CARACTERIZAR O DEVIR HUMANO ...................................................... 5
1.1 Terra - Mundo: A Constituição do Humano ......................................................... 10
1.2 Terra - Mundo: A Constituição da Sociedade ....................................................... 12
1.3 Etnocentrismo e Diversidade Cultural ................................................................. 14
1.4 A Construção do Humano pelo Humano: a Construção da Cidadania Educação
Cultural ....................................................................................................................... 17
2.COMPETÊNCIA 02 | JUSTIFICAR A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM NA EDUCAÇÃO .......... 20
2.1 A Linguagem e sua Origem ................................................................................... 20
2.2 A Linguagem e a Língua ........................................................................................ 25
2.3 A Comunicação como um Processo da Linguagem na Educação ......................... 28
3.COMPETÊNCIA 03 | RELACIONAR ASPECTOS RELEVANTES DO TRABALHO, DOS VALORES,
DAS PRÁTICAS CULTURAIS E DA EDUCAÇÃO .......................................................................... 33
3.1 Trabalho e Devir: um Conceito Histórico ............................................................. 34
3.2 A Transformação do Trabalho .............................................................................. 38
3.3 Tudo tem Valor ..................................................................................................... 41
4. COMPETÊNCIA 04 | COMPREENDER OS PONTOS DE COMPRAS E REPOSIÇÃO DE
ESTOQUES ............................................................................................................................... 46
4.1 Quais Saberes são Construídos na Escola? .......................................................... 50
4.2 Os Espaços Escolares ............................................................................................ 52
4.3 Os Sujeitos dos Espaços Escolares e a Constituição de Saberes .......................... 53
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 56
MINICURRÍCULO DO PROFESSOR ........................................................................................... 58
Sumário
3
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
INTRODUÇÃO
Olá! Caro cursista. Esta nossa disciplina Homem, Pensamento e Cultura:
Abordagens filosófica e antropológica, terá quatro competências que nos
ajudarão a entender melhor o que vamos estudar.
Bom, para começar gostaria de falar um pouco sobre o título da disciplina,
pois é bem extenso (grande mesmo) e pode assustar (o que, por favor, não é
o que desejo). Vamos falar sobre o Homem, Pensamento e Cultura sob a
perspectiva filosófica e antropológica. Mas gostaria de trabalhar com vocês a
partir das ideias e práticas desses conceitos utilizados. Para tanto, trarei uma
breve definição do que é filosofia e antropologia.
Filosofia é "a decisão de não aceitar como óbvias e evidentes as coisas, as
ideias, os fatos as situações, os valores, os comportamentos de nossa
existência cotidiana, jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e
compreendido" 1.
Antropologia "é a ciência que estuda o homem e as implicações e
características de sua evolução física (Antropologia biológica), social
(Antropologia Social), ou cultural (Antropologia Cultural)" 2.
A intenção aqui é fazermos reflexões, bem como trabalharmos conceitos, ou
seja, é preciso entender que a realidade não cabe em uma fórmula, você não
acha? Podemos utilizar o mesmo conceito em várias situações, é importante
que tenhamos a mente aberta para compreendermos e aceitarmos outras
opiniões.
As competências a serem estudadas como já falei anteriormente é sob a
perspectiva antropológica e sociológica, e serão:
1CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2000.
2Texto de Caroline Faria. Fonte: http://www.infoescola.com/ciencias/antropologia/
4
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
1. Caracterizar o devir humano.
2. Justificar a importância da linguagem na educação.
3. Relacionar aspectos relevantes do trabalho, dos valores, das práticas
culturais e da educação.
4. Estabelecer relação entre práticas culturais na escola e a educação para a
cidadania.
Como você já deve ter percebido, esses assuntos tem a ver com a
Humanidade e sua importância no mundo, ou antes a construção do mundo
em que vivemos.
Então vamos lá, convido você a mergulhar no mundo do conhecimento
comigo e que, mais do que aprender, essas quatro semanas possam deixar
saudade em mim e em você.
5
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Competência 01
1.COMPETÊNCIA 01 | CARACTERIZAR O DEVIR HUMANO
A palavra devir causa alguma sensação em você? No meu caso, esta palavra
remete à minha memória algo sobre o que virá ou que está por vir. Calma,
caro cursista, essa é uma ideia simples para que possamos começar a nossa
conversa. E você o que acha que é o Devir? Guarde a ideia para compararmos
ao final da competência.
Antes de falarmos conceitualmente sobre o que é o Devir, vamos saber quem
começou a falar sobre o Devir e um pouco do contexto histórico.
Nascido por volta do ano de 515 a.C., na cidade de Éleia, ao sul da Magna
Grécia (Itália), Parmênides é considerado pelos historiadores da Filosofia
como o pensador do imobilismo universal3.
Para Heráclito de Éfeso, nascido por volta de 540 a.C., tudo o que existe está
em permanente mudança ou transformação. A essa incessante alteração deu
o nome de DEVIR4.
E você o que acha? Tudo está em movimento, se transforma ou é estático,
sem alteração?
Vamos ler um texto sobre o Devir para começarmos a nossa construção sobre
esse conceito tão importante para entendermos sobre a constituição do ser
humano e como produzimos cultura.
3Colaborador do site João Francisco P. Cabral. Fonte: www.brasilescola.com/filosofia/
parmenedes.htm 4Colaborador do site João Francisco P. Cabral. Fonte: www.brasilescola.com/filosofia/heraclito.
htm
6
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Competência 01
Vamos ao texto:
O Devenir5
- Meu pai, devenir é fruta ou verdura?
- Por que perguntas filho?
- Meu pai, quero, se possível, veja minhas razões. O senhor já me ensinou que
quando se recebe uma pergunta, só se deve entrar com outra, depois de ter
respondido. E eu, seu filho, firmado na sua ortodoxia quero para mim as
vantagens da sua observação.
- Bem, vejo que você tem razão. Desejo, no entanto, dizer-lhe que se você me
houvesse feito, ontem, essa inquirição, confesso que não estaria em
condições de respondê-la. Porém, hoje, depois de certo progresso que fiz,
posso afirmar que DEVENIR não é fruta nem verdura. É, sim, uma concepção
filosófica.
- Agora sim, “con- cep- ção – fi- lo- só- fi -ca!” Mas…
- Nem mais nem menos, agora a vez é minha, Sócrates.
- O senhor sabe que não gosto de ser chamado de Sócrates, pois acho aquele
velho muito feio, e sua mulher me desculpe, mas acho o nome dela
horroroso! Xantipa! (Só sendo grega.)
- Está certo, mas, por que você me perguntou se devenir é fruta ou verdura?
- Perguntei porque a mamãe falou que alguém comeu a folha do devenir. - O
velho se arrumou na cadeira de balanço, tirou os óculos, e depois duma
mordaz e gostosa gargalhada, falou: Paulinho, você é um anjo. Você, sua mãe
e seus irmãos azucrinam meus ouvidos, mas, também fazem cócegas no meu
coração. Presta atenção, filhote, Devenir é o mesmo que devir é uma série de
transformações. A transformação ou mudança de estado considerado em si
mesmo. O devenir é a nossa característica fundamental, e a tudo quanto no
mundo nos rodeia. A Filosofia tem se empenhado em compreender o devenir,
cuja questão decisiva é a relação deste com o ser. Heráclito e Parmênides
5 Texto de José Rodrigues de Oliveira. Fonte: www.cordel.01br.com/o-devenir/. Acesso em 01
de janeiro de 2014.
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
quatro séculos antes de Cristo, já se ocupavam com o assunto, que veio
receber mais luz, agora no século XX com o nosso querido Einstein. Já
expliquei muito, pelo seu aspecto, vejo que você entendeu pouco, não foi?
- Para ser sincero, papai, não entendi nada, e se eu quisesse ser chato iria
fazer mais perguntas.
- Pode perguntar, entretanto, Piaget aconselha que devemos aprender as
coisas aos poucos, as doses do saber devem ser homeopáticas. E você ainda é
criança. Segundo o mesmo educador existe a idade para a abstração.
Contudo, faça a pergunta, sua curiosidade muito me agrada.
- Devenir é o mesmo que futuro?
- Não. Entretanto, podemos relacioná-lo não só com o futuro como também
com progresso e o regresso à vida e à morte.
- Com a vida e com a morte!?
- Sim, com a vida e com a morte. Até conosco, com você, meu filho, veja só,
você vai completar 13 anos no próximo mês, já notou sua voz como está
ficando diferente? Os pêlos do seu bigode estão engrossando. (Ao ouvir isso o
rapazinho não se conteve e escandalosamente botou para sorrir.) Você,
devenirmente, caminha para puberdade, depois tornar-se-á adulto, daqui a
cem anos quando você morrer irá modificar o ph da terra onde colocarem seu
corpo. Antes disso você vai mudar de tal forma que quem lhe vê hoje, e só
possa ver daqui a alguns anos, talvez não lhe reconheça. Salvo melhor juízo,
isso é devenir. Gostou?
- O devenir se limita de acordo com a ideia que se tem do progresso, sendo a
ideia um progresso, é preciso que o devenir seja compreendido, sendo
compreendido, encontrar-se- á nele um movimento que é o que existe de
mais concreto. Heráclito, o filósofo do “vir a ser”-Devenir- disse que o “vir a
ser” está em tudo, porque nada é. Para nós, modernamente, tudo já era. Eu e
você não somos mais aqueles de quando iniciamos essa conversa, eu, afora o
sutil da natureza, já bebi um copo d’água, emiti essas palavras, e dei aquelas
risadas. Você, além de outras coisas que aconteceu, já pode ouvir falar em
devenir sem aquela estranheza do início deste bate-papo. Verdade?
-Ah!…Então quer dizer que aquela caneta que lhe dei a pouco, não é essa que
está aí, porque a que lhe dei sofreu o calor das suas mãos, a tampinha estava
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
do lado oposto, já escreveu, e, consequentemente, está com menos tinta.
- Muito bem! Demorou, mas chegou. Observo com muita satisfação que já
ampliou a dialética. Quero, aproveitando a ocasião, que você saiba que o
movimento dialético é o que mais existe de concreto no progresso.
-Obrigado, meu pai. Amanhã vou pedir a minha mãe para comprar um
dicionário novo para o senhor, pois o seu está bastante “”devenirzado.”"
Também já sei quem comeu a folha do devenir.
E aí o que você achou? Gostou do texto? Foi útil para sua compreensão do
que é Devir? Podemos continuar?
Bom, vamos conhecer uma definição de Devir para amadurecermos o
conhecimento.
Devir é um conjunto de características fundamentais
concebidas pelo ser, assim como pelo mundo (suas
realidades, diferenças, e desejos) em seu transcurso por
meio de um continuum movimento de transformação
(SILVA e GOMES, 2013)
Veja só de acordo com esta concepção de Devir, ele está em tudo, tanto na
natureza como nas pessoas. Guarde essa informação, pois abriremos a
discussão daqui a pouco sobre como o humano se constitui pela natureza.
Outro conceito de Devir apresentado por Deleuze e Parnet é "Devir é jamais
imitar, nem fazer como, nem ajustar-se a um modelo, seja ele de justiça ou de
verdade" (Deleuze e Parnet, apud SILVA e GOMES, 2013).
Esse outro conceito mostra a singularidade do ser humano, somos diferentes
dos demais seres que habitam o nosso planeta e criamos um mundo de
acordo com nossas necessidades.
Em outras palavras podemos dizer que de acordo com as duas visões
apresentadas, podemos pontuar no primeiro conceito que o Devir não ocorre
Competência 01
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
apenas com os seres humanos, mas, também com o mundo, isso nos faz
pensar como a natureza interfere em nós e como nós interferimos na
natureza. No segundo conceito posto por Deleuze e Parnet podemos observar
que o Devir é algo muito mais particular, de cada um. O que você acha? O
Devir é subjetivo ou é coletivo?
Agora vamos ler a letra da música Como uma onda6 de Lulu Santos e Nélson
Motta que pode nos trazer uma reflexão sobre o Devir.
Como uma onda
Nada do que foi será
De novo do jeito que já foi
um dia
Tudo passa, tudo sempre
passará
A vida vem em ondas,
como um mar
Num indo e vindo
infinito
Tudo que se vê não é
Igual ao que a gente viu há
um segundo
tudo muda o tempo todo no
mundo
Não adianta fugir
Nem mentir pra si mesmo
agora
6Fonte: www.vagalume.com.br/lulu-santos/como-uma-onda-no-mar.html#ixzz2q6u5d15v
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Há tanta vida lá fora
Aqui dentro sempre
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar
Como uma onda é considerada por muitos como sendo um clássico da década
de 80, ela foi gravada por inúmeros artistas da nossa MPB (Música Popular
Brasileira). Você já a conhecia? Ela me faz pensar sobre o Devir. Foi possível
identificar elementos do Devir nela? Quais foram? Você identificou esses
elementos do Devir em pessoas ou na natureza?
Partindo do que está posto, vamos analisar a transformação do ser humano a
partir da construção/constituição do mundo humano.
1.1 Terra - Mundo: A Constituição do Humano
A ideia central de Devir é mudança e só podemos compreender o humano
quando analisamos as mudanças ao longo da nossa história.
A Terra, conceitualmente falando é diferente de Mundo. A Terra é nossa casa,
a natureza, já o Mundo é o artifício criado pelo ser humano. Este mesmo
Mundo separa a existência humana e sua artificialidade do que é animal7.
Então, sem este mundo que habitamos sem esforço algum, o esforço que me
refiro são as condições básicas para existirmos, como por exemplo, não
criamos uma artificialidade para respirar (ainda) temos essa condição de
forma muito natural.
Sendo que o Devir acontece tanto no Mundo como na Terra (independente da
vontade do homem) e é através deste Devir que o ser humano se liga também
a essa Terra, criando assim uma identidade diferenciada das demais espécies, 7 ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 09-14.
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
por conta dessa interferência no Mundo e ao mesmo tempo gerando uma
semelhança com os demais seres.
Figura 1 - Terra-Mundo Fonte: ensinandomissoesparacriancas.blogspot.com.br/2012/07/o-que-ha-em-nosso-laneta.html
Você consegue observar essas transformações na figura 1? Já vivenciou
alguma delas?
Sobre as diferenças e semelhanças, vamos entender juntos: a semelhança que
aponto está relacionada com que o Devir está em tudo, sendo assim, o que há
de comum aos seres humanos e os demais seres é a transformação que
ocorre em todas as partes e o a diferença é como nós fazemos essa mudança.
Para definir melhor essas diferenças podemos pontuar questões que vamos
trabalhar mais à frente, como por exemplo: A linguagem articulada através de
regras não apenas gramatical, mas também social (nós somos capazes de
"segurar" um sentimento ou uma emoção, diferentemente de outros
animais). Você já deve ter dito: Tive que me segurar para não fazer besteira.
Não é mesmo?
Outra questão é o trabalho, através dessa ação podemos transformar o
mundo de forma consciente.
Vamos tentar entender como é essa nossa ação no mundo e onde o Devir
Temos apenas que
tomar cuidado, pois há uma diversidade de definições sobre o que é humano. Outra palavra com
vários significados é civilização, por
muitos historiadores
compreendida de forma etnocêntrica e europeizada (ver
etnocentrismo subtítulo 1.3).
Agora é com você! Pesquise sobre os
múltiplos significados para a palavra humano.
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
entra nisso tudo.
1.2 Terra - Mundo: A Constituição da Sociedade
A constituição da sociedade e do ser humano como nós o conhecemos se deu,
se dá e se dará através da transformação e a esta mudança pontuaremos a
cultura e suas práticas através de necessidades e escolhas que fazemos para
suprir essas necessidades. Você Já assistiu ao filme: A guerra do fogo? Vale a
pena conferir. Ainda que você discorde sobre a questão do surgimento da
espécie humana na terra, uma coisa é inegável: a sua evolução através do
acúmulo de conhecimento e como mudamos ao longo de nossa história.
Você deve estar pensando: Mas o que a cultura tem a ver com o Devir? A
cultura é o meio pelo qual esse Devir aparece. Por exemplo, de acordo com o
Devir as outras espécies também mudam, mas não conseguimos observar a
mudança, pois apenas nós seres humanos podemos produzir os meios
(artificialidade) que apareceram. Por exemplo, temos a necessidade de nos
alimentar, mas a grande maioria da humanidade não é mais coletora, vamos a
um supermercado e compramos o que precisamos ou ainda desenvolvemos
técnica para plantarmos e colhermos cada vez mais. Desenvolvemos espécies
vegetais mais resistentes às pragas, criamos rações para os nossos animais
para que eles se desenvolvam mais rápido. Tudo isso faz parte da nossa
cultura ou do que somos. Outra coisa que mudou ao longo do tempo é o
papel da mulher na sociedade e junto com essa mudança há também a
mudança de valores. A tudo isso, denominamos de cultura, mas vamos ver o
que os pesquisadores da área têm a dizer sobre isso.
Bom, é consenso entre os filósofos que o Devir se dá principalmente pela
cultura. Então vamos ver uma definição de cultura para nos ajudar a entender
melhor esse questionamento: "Cultura é este conjunto complexo que inclui
conhecimento, crença, arte, lei, costumes e várias outras aptidões e hábitos
adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade" (MELO apud
Para entender mais.
Livro A condição humana. ARENDT,
HANNAH Editora: FORENSE
UNIVERSITARI
Competência 01
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
BATISTA, 2010, p. 1-8). Esse conjunto complexo de práticas muda no decorrer
do tempo. Você poderia dar um exemplo sobre mudança cultural que
observou ao longo de sua existência?
Outro conceito que gosto de trabalhar para entender como o Devir acontece
em nós e na natureza é o da filósofa Hannah Arendt.
Figura 2 - Práticas Humanas Fonte: http://ocontornodasombra.blogspot.com.br/2011/03/eichmann-em-
jerusalem-por-hannah-arendt.html
Para Hannah Arendt, o Mundo e Terra são diferentes, como já falamos, no
entanto vale a pena esclarecermos um pouco mais sobre o assunto.
Para Arendt, a Terra é a natureza em si e o Mundo é esta Terra transformada
(cultura) pelo ser humano. No entanto, a filósofa ainda apresenta uma
transformação do ser humano através da Terra, uma adequação da vida na
Terra através da necessidade humana que ela chamara de artificialidade.
Para esta prática cultural, destacamo-nos dos outros animais por meio da
linguagem, do trabalho e dos valores.
Sendo assim, fica claro que este ser humano se transforma à medida que
constrói esse Mundo.
HANNAH ARENDT
(1906-1975) Hannah Arendt (Linden, 14 de
Outubro de 1906 — Nova Iorque, 4 de
Dezembro de 1975) foi uma teórica política alemã, muitas vezes
descrita como filósofa, apesar de ter recusado essa
designação. Emigrou para os Estados Unidos
durante a ascensão do nazismo na
Alemanha e tem como sua magnum
opus o livro "Origens do
Totalitarismo". http://os-
filosofos.blogspot.com.br/2008/03/hannah-arendt-1906-
1975.html
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Figura 3 - Práticas Humanas Fonte: www.canstockphoto.com.br/pessoas-isolado-vetorial-%C3%ADcones-7409161.html
A interferência que fazemos na Terra se procede de diversas maneiras, dessa
forma, temos diferentes culturas em nosso planeta, e o que somos está ligado
diretamente à cultura que adquirimos.
1.3 Etnocentrismo e Diversidade Cultural
Na construção da sociedade vemos surgir diversos grupos sociais e diferentes
práticas culturais, podendo assim reforçar a supervalorização de uma cultura
em detrimento da outra.
Vamos observar juntos, o conceito de etnocentrismo transcrito abaixo:
Etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso
próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os
outros são pensados e sentidos através dos nossos
valores, nossos modelos, nossas definições do que é a
existência. No plano intelectual, pode ser visto como a
dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo,
como sentimentos de estranheza, medo, hostilidade,
etc. Perguntar sobre o que é etnocentrismo é, pois,
indagar sobre um fenômeno onde se misturam, tanto
elementos intelectuais e racionais, quanto elementos
emocionais e afetivos. No etnocentrismo, estes dois
planos do espírito humano – sentimento e pensamento
– vão juntos compondo um fenômeno não apenas
Competência 01
15
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
fortemente arraigado na história das sociedades como
também facilmente encontrável no dia a dia das nossas
vidas (ROCHA, 1988, p. 5.)
E aí caro cursista? O que você achou?
Já a diversidade cultural como o próprio conceito sugere, são diferentes
elementos, dentro de várias culturas diferentes entre si como, por exemplo:
vestimenta, manifestações religiosas, culinárias e tradições.
Podemos dizer que existem diversas culturas?
Se você acha que sim, o que você pensa sobre as culturas diferentes da nossa?
São boas? São estranhas? Você parou para pensar?
Bom, veja bem, se acreditarmos que existem várias culturas, também temos
que pensar que existem também vários promotores ou construtores dessa
cultura ou várias pessoas humanas.
No geral, quando vamos emitir uma opinião sobre algum ponto ou sobre
alguém tendemos a julgá-los (fato ou pessoa) de acordo com os nossos
valores e conceitos éticos e morais, não é mesmo? Veja o desenho abaixo:
Figura 4 - Visão Etnocêntrica Fonte:http://sociologiaprofandre.blogspot.com.br/2013/05/3-ano-1-trimestre-etnocentrismo.html
Para saber mais leia
o Livro : O que é etnocentrismo. autor: ROCHA, EVERARDO P. GUIMARÃES.
Editora: BRASILIENSE
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Para vocês quem está sendo etnocêntrico? Por quê? Agimos assim às vezes?
Podemos evitar sermos etnocêntricos? Como?
Temos muitas questões para refletir, não podemos esquecer que ao
constituirmos dentro dos nossos grupos sociais temos características
específicas que valorizamos e que formam a nossa identidade. É comum ao
valorizarmos essas características negarmos o outro, temos, portanto que
tomar cuidado e buscarmos entender que o outro é um ser único que precisa
ser respeitado em sua individualidade.
O etnocentrismo é responsável pelos mais diversos conflitos sociais
existentes. E além desses conflitos que podem ser religiosos, étnicos e até
mesmo de gênero temos também os preconceitos de forma em geral contra
as minorias.
Apenas para pontuarmos historicamente a gravidade do etnocentrismo
podemos lembrar do holocausto judeu durante a Segunda Guerra Mundial, é
claro que não podemos pontuar o holocausto apenas como uma questão
etnocêntrica. Outro fato histórico que podemos utilizar para ilustrar o assunto
é a formação do Brasil através do nativo, do europeu e do africano.
Dentro de tudo isso que estamos discutindo gostaria de inserir a escola como
esse espaço de diversidade, uma vez que se encontra neste local: gerações
diferentes, com costumes diferentes, estilos de vida diferentes, valores
comportamentais diferentes. É no ambiente escolar que podemos perceber a
dimensão do etnocentrismo ao observarmos a constituição dos grupos e a
forma como nos posicionamos. A sala de aula é um bom exemplo disso, pois é
comum pensar que os alunos do "fundão" não são tão aplicados quanto os
alunos que sentam na frente, ou ainda que os alunos mais comportados são
aqueles que usam determinado tipo de roupa, ou ainda têm um tipo de
comportamento que identificamos como correto. Como conviver com tantas
diferenças? Como perceber quando se está sendo etnocêntrico? O que se
pode fazer para amenizar esses conflitos desse espaço escolar? São perguntas
Competência 01
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
que precisamos fazer para entendermos a situação e buscarmos soluções.
Falamos que alguém é cidadão quando ele é um sujeito de direitos, isto é,
alguém que diante do Estado e da sociedade pode se posicionar e interferir na
construção dessa sociedade, uma das formas de construção da cidadania é
através da cultura, onde o indivíduo a partir da sua singularidade e aceitação
das normas e valores contribui para a identidade coletiva.
1.4 A Construção do Humano pelo Humano: a Construção da Cidadania
Educação Cultural
É bem verdade e todas as pessoas já sabem que a cultura se transforma, mas
você já parou para pensar como acontece essa mudança? Você já falou ou
ouviu aquela famosa frase: "No meu tempo não era assim"...falamos ou
ouvimos isso geralmente quando alguém mais velho está avaliando o
comportamento de alguém que é mais novo e mostrando a diferença de
comportamento para a mesma situação. Mas porque estou falando sobre isso
e sobre mudança de cultura? E através dessa diferença entre as gerações que
ocorrem as mudanças dentro da sociedade.
Vamos para exemplos mais práticos, quando pensamos em escola e
comparamos a escola de hoje e a escola de cinquenta anos atrás podemos
fazer várias observações, que vão desde a estrutura da escola, passando por
formas de ensino aprendizagem e por fim nas relações e sobre tudo na
relação professor-aluno. O que mudou não foi a estrutura escolar mais sim os
sujeitos que compõem esse ambiente através das práticas sociais de
desconstrução e reconstrução.
A escola como espaço público é o ambiente que prepara a humanidade
ocidental para vida através da construção de saber, possibilitando a todos a
participação na vida pública através da assimilação de comportamento social
como regras, linguagem e relações de poder além do conhecimento científico.
Agora reflita.
Dentro do ambiente escolar contribuímos de
alguma forma para a construção dessas normas e valores?
Todos deveriam participar dessa
construção?
Assista ao vídeo
sobre o perigo de uma história única. www.youtube.com/results?search_query=o%20perigo%20de%20uma%20historia%20unica&sm=
1
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Nessa perspectiva, o que ensina não é o ambiente em si, mas as pessoas ou as
trocas culturais que ocorrem nesse espaço que é voltado e planejado para
troca desses conhecimentos, a essa ação chamamos de endoculturação,
sendo assim podemos aprender e ensinar em vários ambientes como, por
exemplo, na família, igreja, associações entre outros.
Claro está que essa absorção de conhecimento se dá de forma muito pessoal,
ninguém, ou antes, as pessoas, não aprendem todos da mesma forma e ao
mesmo tempo, isso porque cada um de nós tem uma experiência diferente
que acaba interferindo em quem somos e como somos. A essa assimilação do
conhecimento através das práticas sociais está ligada também a cultura, logo
a cultura também é apreendida através da educação.
Arendt afirma que a escola é a instituição que protege as crianças do mundo e
o mundo das crianças. Como assim? O mundo precisa ser protegido das
crianças e as crianças serem protegidas do mundo? O que você pensa sobre
isso?
Quando as pessoas nascem elas vão encontrar um mundo em
desenvolvimento, se transformando. Para que haja a continuidade desse
mundo é necessário que as tradições sejam passadas a fim de proteger essa
continuidade.
A escola é este espaço público que, nem sempre, intermedia o espaço privado
(família) dos demais espaços públicos só que a escola tem uma característica
diferenciada por ser um espaço de ensino-aprendizagem, de saberes
específicos e necessários à inserção dos seres humanos no Mundo, sendo
assim a escola tem essa responsabilidade de educar para a obediência
protegendo o mundo das crianças - respeito às tradições, e educar para o
saber crítico protegendo as crianças do mundo.
Competência 01
19
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Figura 5 - Cidadão e Cidadania Fonte: maoseobras.wordpress.com/2012/07/10/cidadao-e-cidadania/
Agora responda: A escola é um ambiente para estimular a cidadania através
das práticas culturais? Podemos estimular a aceitação das diferenças por meio
da cidadania?
Competência 01
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
2.COMPETÊNCIA 02 | JUSTIFICAR A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM
NA EDUCAÇÃO
Olá caro cursista, aprendemos na competência anterior sobre o Devir e vamos
continuar aprendendo um pouco mais sobre ele. Combinado?
Aprendemos que o Devir é uma característica de mudança e transformação
que está em tudo e em todos, que essa característica também se configura
através da cultura que por sua vez é absorvida através de um processo
educacional, pois todos ensinam em alguma medida e aprendem também.
Mas, na constituição do humano não podemos deixar de falar sobre a
linguagem como uma das práticas sociais, bem como educacional mais
importante que existe. E você o que acha? Mas o que é linguagem? A
linguagem é inata ao ser humano? Outros animais não humanos também têm
linguagem? O quanto a linguagem é importante para nós? Já parou para
pensar que existem várias linguagens? Já se viu em dificuldades por causa da
linguagem que utilizou para se comunicar? A linguagem é importante dentro
da escola? Você acha que existe um padrão de linguagem para ser usado
dentro do espaço escolar?
Ufa! Muitas perguntas para refletirmos e quem sabe poder nos transformar
através das reflexões e melhorar os nossos relacionamentos. Então vamos
começar logo essa competência para tentarmos responder esses
questionamentos.
2.1 A Linguagem e sua Origem
Você já imaginou se tivéssemos que trocar nossa linguagem sempre. Se cada
vez que fossemos contar a mesma história tivéssemos que mudar todas as
palavras por elas terem obrigatoriamente que se renovar? Se uma palavra que
utilizaremos agora deixasse de existir logo após ser utilizada? Seria muito
complicado nos comunicar não é mesmo?
Competência 02
21
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
É válido lembrar o título da nossa disciplina - Homem, pensamento e cultura:
Abordagens antropológica e filosófica, mas por que reforçar isso? Porque
estamos estudando o ser HUMANO a partir da visão de alguns filósofos e
antropólogos, além disso, a nossa reflexão abarca as características dos seres
humanos. Por isso, já falamos sobre o Devir e, neste momento, nossa
discussão se foca na linguagem. Isso nos leva a buscar resposta para a
seguinte pergunta: Você conseguiria imaginar a humanidade sem a
linguagem? Consegue se lembrar de algum dia sequer que tenha passado sem
você fazer uso da linguagem? Sendo assim, podemos observar que a
linguagem também constitui o humano.
Bom, mas o que é mesmo a linguagem?
Eni Puccinelli Orlandi em seu livro: O que é linguística diz o seguinte: "O
homem tenta dominar e explicar tudo o que existe e a linguagem é uma
dessas coisas"8. Ao procurar explicar a linguagem o homem está procurando
explicar algo que é próprio e que é parte necessária de seu mundo e da sua
convivência com os outros seres humanos.
Podemos perceber que de Orlandi diz que sem a linguagem não existe vida
social.
Mas a linguagem contém alguns elementos são eles: Língua, Signo,
Significante e Significado.
A língua é um sistema de signo.
O signo são as imagens que produzimos quando falamos ou escrevemos
também pode ser a combinação que fazemos entre um objeto (imagem) e o
conceito desse objeto.
Exemplo:
8 ORLANDI, Eni Puccinelli. O que é linguística. 2ª ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 2009.
Competência 02
22
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Figura 6 - Linguagem Fonte:coisaspraver.blogspot.com.br/2012/12/desenhos-de-casas-para-imprimir-e.html#.UueZ S9K5fIU
Significante é a imagem acústica, é a imagem de um objeto ou coisa que
se forma em nossa mente ao ouvir a palavra.
Significado é o conceito do objeto ou imagem.
É importante lembrar que damos, ou antes, criamos significado
(conceituamos) para várias coisas ou pessoas, dos significados podem nascer
ou se estabelecer os PRÉ- CONCEITOS. Exemplo disso é quando falamos que
os políticos são todos corruptos, criamos um novo significado para os
políticos, e estes, normalmente, são preconceituosos. Outra situação
recorrente em nossa sociedade - quando falamos que aquela pessoa não é
uma pessoa decente por morar em tal bairro, ou usar determinada roupa e
etc.
Observação: O preconceito é sempre raso em argumentos, geralmente vem
com um discurso extremado e panfletário.
Já ia esquecendo... a linguagem pode ser verbal e não-verbal, e apesar da
linguística não se ocupar da linguagem não-verbal esse tipo de linguagem
também constitui o humano, pois faz parte de nossa vida, como por exemplo
a LIBRAS (língua brasileira de sinais) ou o nosso código de trânsito. A
linguagem também tem a ver com as línguas (idiomas).
Competência 02
23
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Figura 7 - Semáforo Fonte: ministerioinfantil5re.blogspot.com.br/2011_09_01_archive .html
Figura 8 - Libras Fonte: www.essaseoutras.xpg.com.br/atividades-escolar-com-libras-alfabeto-libras-ligar-pontos-numeros/atividades-alfabeto-libras-1/
Veja a imagem abaixo:
Figura 9 – Linguagem não - verbal Fonte: edinanarede.webnode.com.br/products/linguagem-n%C3%A3o-verbal-ditados-populares/
Competência 02
24
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
E aí o que você pode dizer sobre esta imagem?
Mas vamos lá. Conversamos até agora sobre os elementos da linguagem,
vamos falar um pouco do estudo da linguagem.
Temos os primeiros estudos da linguagem na Grécia Antiga como vemos no
livro Origem da Linguagem de Bruna Franchetto e Yonne Leite9 no trecho a
seguir:
Antes de Sócrates (470/469-399 a.C.) falar e agir estavam
intimamente associados. A palavra é ação, faz agir, conduz, mas
também engana...A linguagem servia a arte da persuasão e ao
homem político. É na primeira metade do século VIII a.C., como o
poeta Hesíodo, que a palavra passa a ter a função de revelar a
ordem do mundo (FRANCHETTO, Bruna e LEITE, Yonne, 2004, p.7-
17).
Com o passar dos séculos o estudo da linguagem se constituiria em dois
momento importantes:
No século XVIII quando os intelectuais da época procuram ver a linguagem
como representação do pensamento, temos o que se chama de formalismo,
ou seja, uma vertente psíquica da linguagem, onde a linguagem é apresentada
como única e universal.
Já no século XIX onde começou a existir o método de comparação
histórica através das gramáticas, temos a linguagem sob a perspectiva do
sociologismo, quando os pesquisadores buscam a característica múltipla da
linguagem.
Mas a linguística tal qual a conhecemos hoje passa por Ferdinand de Saussure
(1857-1913) considerado o pai da linguística moderna.
A partir de 1950, Noam Chomsky vai apresentar a gramática gerativa onde a
9 FRANCHETTO, Bruna. LEITE, Yonne. Origens da Linguagem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor
Ltda, 2004.
Competência 02
25
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
linguagem deixa de ser descritiva para ser explicativa e científica.
O fato é que nós, seres humanos, tentamos explicar a linguagem ao longo da
nossa existência. A linguagem seria apresentada como esse sistema simbólico
e como tal é criado culturalmente, mas o que é mais interessante é que a tudo
o que vemos ou ouvimos damos um significado próprio (é a capacidade de
subjetividade humana), dentro da cultura em que foi criado.
2.2 A Linguagem e a Língua
A linguagem e seu desenvolvimento
O que é língua?
A constituição da língua como comportamento cultural
A língua como construção cultural
Dialogamos sobre a Linguagem e sua origem de forma poética. O que achou?
Agora vamos falar sobre a linguagem e a língua.
Será que língua e fala são a mesma coisa? O que você acha?
Para os estudiosos a língua é um idioma (Português, Inglês, etc.), ou seja, um
sistema formado por palavras e regras (formal) ou informal, já a fala é quando
falamos, ou seja, a concretização da língua.
O homem tenta explicar a linguagem bem como a língua desde a época
antiga, como já vimos. Já tentamos encontrar uma língua-mãe, de onde todas
as outras línguas se originaram, buscamos compreender se a língua constituiu
a sociedade ou se a sociedade constituiu a língua.
Para Rosseau (1712-1778) a palavra vai caracterizar e separar os homens dos
outros animais.
O livro "Origens da Linguagem" de Bruna Franchetto e Yonne Leite mostrará
Leia Livro : Origens
da Linguagem. Bruna Franchetto e
Yonne Leite Jorge Zahar Editor Coleção Passo-a-
passo
Competência 02
26
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
que para Jean Jacques Rosseau, a linguagem é música e paixão...". A
motivação para a linguagem humana vem da necessidade de comunicação,
uma vez que os homens constituem uma sociedade. E o homem pode
comunicar-se pelo movimento corporal (o gesto) ou pela vocalização (a
palavra). É a linguagem como convenção que distingue os homens dos demais
animais. O gesto nasce das necessidades físicas naturais; a palavra nasce da
paixão, do sentimento. Se as necessidades afastam os homens, a paixão os
aproxima. Segundo Rousseau, o homem não começou raciocinando, mas
sentindo.
É interessante pensar na língua como essa constituição do humano e como
uma prática sociocultural. Você já havia pensado dessa forma antes?
A língua como elemento que caracteriza o humano é uma constituição
cultural? Sim. A língua, não esqueça, é um sistema formado por signos
(palavras), cada povo tem uma língua (idioma) diferente, que constitui
palavras diferentes e frases diferentes, até mesmo a tradução de palavras ou
textos para o nosso idioma perde algum sentido cultural. A palavra saudade,
por exemplo, que é tão comum em nossa língua e quer dizer que sentimos
falta de alguém ou alguma coisa, não existe em todas as línguas, isso nos leva
a pensar... se existe uma variação da língua de acordo com o lugar vai existir
uma variação da língua ao longo do tempo? Essa resposta é bem mais fácil,
pois podemos observar a transformação da nossa própria língua, não falamos
como há cem anos, nem mesmo como há cinquenta ou sessenta anos atrás.
Palavras surgiram e desapareceram ao longo das décadas, ou sofreram
adaptação. Como é o caso de algumas gírias, que não se usa mais como, por
exemplo: É uma brasa, mora? Ninguém utiliza mais essa gíria para dizer que
algo é bom. Quando queremos dizer que algo é bom, hoje, utilizamos (dentre
tantos vocábulos) outra gíria que é "legal". Palavras dentro da nossa língua
como Vossa Mercê sofreu alteração e ficou "vosmicer" até chegar no "você"
que tanto utilizamos. Outra situação que podemos observar em língua é a
utilização de palavras de vários dialetos ou idiomas como é o caso de hot-dog
(cachorro quente) que é uma palavra inglesa ou, ainda, palavras de origem
Competência 02
27
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
africana. Quem nunca fez uma bagunça? Ou não quis um dengo?
Para tentarmos entender, ou antes, refletir sobre se somos uma constituição
da língua ou a língua é constituída por nós.
Na Índia, onde os casos de meninos-lobo foram relativamente numerosos,
descobriu-se em 1920, duas crianças, Amala e Kamala, vivendo no meio de
uma família (?) de lobos. A primeira tinha um ano e meio e veio a morrer um
ano mais tarde. Kamala, de oito anos de idade, viveu até 1929. Não tinham
nada de humano e seu comportamento era exatamente semelhante àquele
de seus ‘irmãos’ lobos.
Elas caminhavam de quatro, apoiando-se sobre os joelhos e cotovelos para os
pequenos trajetos e sobre as mãos e os pés para os trajetos longos e rápidos.
Eram incapazes de permanecer em pé. Só se alimentavam de carne crua ou
podre. Comiam e bebiam como os animais, lançando a cabeça para frente e
lambendo os líquidos. Na instituição onde foram recolhidas, passavam o dia
acabrunhadas e prostradas numa sombra. Eram ativas e ruidosas durante a
noite, procurando fugir e uivando como lobos. Nunca choravam ou riam.
Kamala viveu oito anos na instituição que a acolheu, humanizando-se (?)
lentamente. Necessitou de seis anos para aprender a andar e, pouco antes de
morrer, tinha um vocabulário de apenas cinqüenta palavras. Atitudes afetivas
foram aparecendo aos poucos. Chorou pela primeira vez por ocasião da morte
de Amala e se apegou lentamente às pessoas que cuidaram dela bem como às
outra com as quais conviveu. Sua inteligência permitiu-lhe comunicar-se por
gestos, inicialmente, e depois por palavras de um vocabulário rudimentar,
aprendendo a executar ordens simples10.
O relato acima descreve um fato verídico e permite entender em
que medida as características humanas dependem do convívio
10
Fonte: www.qi300.com/amala-e-kamala-conheca-essa-historia-t13092.html
www.youtube.com/watch?v=0SRxD8kX
1MI Assista ao vídeo sobre a menina
cachorro.
Leia o texto sobre Amala e Kamala.
AMALA E KAMALA: as meninas-lobo
Competência 02
28
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
social. Amala e Kamala, as meninas-loba da Índia, por terem sido
privadas do contato com outras pessoas, não conseguiram se
humanizar: não aprenderam a se comunicar através da fala, não
foram ensinadas a usar determinados utensílios, não
desenvolveram processos de pensamento lógico... (DAVIS e
OLIVEIRA, 1990, p. 16-17)11
.
Figura 10 - Amala e Kamala Fonte: www.qi300.com/amala-e-kamala-conheca-essa-historia-t13092 .html
O relato é interessante para fazermos a reflexão não é mesmo? Essas garotas
não tinham uma língua própria? Ou seria linguagem? O que você acha? Será
que existia comunicação entre elas e a matilha? Por falar nisso, a
comunicação é nosso próximo tema.
2.3 A Comunicação como um Processo da Linguagem na Educação
Bom, você sabe que é necessário saber falar a língua para poder utilizá-la que
apesar de biologicamente todo ser humano nascer com essa característica
(poder se comunicar) é necessário aprendê-la para que haja interação e
comunicação, não é mesmo?
Como Rousseau disse, o homem "sentiu antes de pensar", a linguagem nos
ajuda a expressar o que sentimos. Já aconteceu isso com você de ser mal
interpretado (a)? Isso ocorre também porque cada um de nós internaliza a
11
DAVIS, Cláudia; OLIVEIRA, Zilma de. Psicologia na educação.São Paulo: Cortez: 1990. p 16-17
Competência 02
29
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
informação nem sempre da mesma forma ou com o mesmo significado que
nos é passado.
Se antes não internalizamos, ou antes, entendemos a mensagem com a
intenção do emissor, temos então que dialogar, fazer perguntas e
observações a fim que haja um entendimento da mensagem, no entanto há
de si dizer que entendimento não significa o mesmo que aceitar ou concordar
com o que foi dito.
Mas para que haja a comunicação é necessário que haja o que vamos chamar
de boa vontade ou disposição entre o emissor e o receptor.
Observe a imagem e procure compreender o que foi dito.
Figura 11 - Estrutura da linguagem Fonte: www.eps.ufsc.br/disserta99/berger/cap2.html
Mas quando falamos em comunicação não podemos deixar de falar sobre os
meios de comunicação, entre eles destacamos: os jornais televisivos, o rádio,
os jornais impressos e a internet. Mas será que a comunicação com os meios
de comunicação acontece da mesma forma que com interlocutores (emissor e
receptor)?
É bem diferente a comunicação que é feita através dos meios de
comunicação, ainda que com a utilização da internet, que acaba possibilitando
uma forma de dialogo, entre emissor e receptor, esta forma de diálogo acaba
Competência 02
30
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
sendo ainda limitada de alguma forma, pois para que traga a interferência do
receptor, ele tem necessariamente que ter acesso a internet, o emissor acaba
escolhendo o que vai aparecer, como é o caso de alguns programas de
televisão. O fato é que dentro dessa relação o emissor (meios de
comunicação) acabou expondo as informações e o receptor (nós) não
interagimos.
Outra coisa que temos que observar é que as informações que são vinculadas
podem ter sido escolhidas por critérios diferentes do nosso. Mas já que
estamos falando em comunicação vamos inserir a escola nessa conversa.
Pensar no ambiente escolar sem a comunicação, ou antes, sem o diálogo, é
inviável.
Você já deve ter ouvido aquele velho ditado “É conversando que a gente se
entende”. Pensando a escola como um espaço especializado e voltado para a
educação, compreendemos que o diálogo tem que ser incentivado nesse
ambiente, pois nos posicionamos politicamente através da fala, que nos é algo
natural como já discutimos. Para que a escola cumpra com este papel de
também ensinar temos que absorver o dialogo como um meio para isto.
É através da fala que aparecemos para o mundo tanto, no âmbito privado,
mas principalmente no espaço público. É nos espaços públicos que há
disputas, negociações, por exemplo, no âmbito escolar é comum aparecerem
as diferenças que são comuns a todos nós alunos, professores, funcionários
de uma forma geral e a comunidade.
Temos que vivenciar essas experiências através do dialogo, buscando uma
postura crítica em relação a si mesmo e ao outro.
Você já ouviu aquele outro ditado que diz “O meu direito começa quando o
seu termina”. Os direitos meus ou seus não precisam necessariamente
terminar para que o de outras pessoas possa começar, quando utilizamos o
bom senso e o diálogo.
Competência 02
31
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Não é na exclusão de direitos que vamos construir significados coletivos
saudáveis.
No entanto quando colocamos que não se devem excluir direitos dentro de
espaços públicos, temos sempre que utilizar o bom senso.
Quando pensamos em educação, temos que pontuar que mesmo que o
professor(a) detenha o conhecimento cientifico, não significa que este
profissional não possa aprender. Levando em consideração o que já foi
aprendido sobre o devir, temos que lembrar que todos estão sempre
mudando.
Mas é claro que convivências com o outro e por que não dizer conosco nem
sempre são pacíficas surgindo assim conflitos.
Acredita que se estivéssemos frente a frente e eu perguntasse a você se já
sofreu alguma injustiça ou situação constrangedora por falta de diálogo, você
me responderia que sim.
Mas existem duas formas de observamos as relações com os outros: uma é
empatia e a outra forma é através do preconceito.
Quando somos empáticos temos a capacidade de nos colocar no lugar do
outro mesmo quando o outro aparentemente está errado. É claro que esta
situação não é fácil, pois é necessária uma reflexão profunda.
Enquanto que a relação de preconceito ela se estabelece na exclusão do outro
sem lhe dar a oportunidade de ser ou aparecer politicamente. No entanto
temos que pontuar que dentro de um grupo social onde se estabelece esta
forma de relacionamento, os conflitos deixam de ser positivos para se
tornarem negativos.
Não somos uma ilha, nem mesmo donos da verdade. Se estivessem juntos
Competência 02
32
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
tenho certeza que você invocaria um milhão de argumentos que somariam
aos meus argumentos. Mas mesmo não estando tão próximos somos capazes
de crescer juntos tenho certeza disso.
Competência 02
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
3.COMPETÊNCIA 03 | RELACIONAR ASPECTOS RELEVANTES DO
TRABALHO, DOS VALORES, DAS PRÁTICAS CULTURAIS E DA
EDUCAÇÃO
Na competência anterior discutimos sobre a linguagem. Observamos também
que é através da linguagem que se constitui e se transforma o humano e
também o humano transforma a linguagem – trata-se de um movimento em
mão-dupla. (isso é apenas uma sugestão)
Nesta terceira competência, vamos conversar sobre o trabalho e a ética como
constituição de valores.
O que você pensa sobre o que é o trabalho? Para alguns, o trabalho é muito
importante, é a forma como vivemos, pode ser que você pense que o trabalho
diz quem você é, ou ainda para outros o trabalho é desnecessário, caso não se
goste muito de trabalhar.
Mas será que podemos existir sem o trabalho? Você conseguiria viver sem
trabalhar? Não falo apenas do ponto de vista financeiro, mas como uma
realização pessoal mesmo.
Qual a importância do trabalho para o mundo como o conhecemos? Será que
podemos dividir o trabalho em intelectual e braçal ou existe apenas uma
forma de trabalho? Você acha que existem algumas profissões mais
importantes do que outras?
Outro assunto a tratarmos é a construção dos valores para nós e para os
outros. O que seria valor? Todos possuem valores? Os valores são diferentes?
Tudo tem valor?
Esses serão alguns questionamentos que trataremos nesta competência.
Competência 03
34
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
3.1 Trabalho e Devir: um Conceito Histórico
Antes de apresentar o conceito histórico da palavra trabalho, gostaria de
apresentar esta ação humana como uma prática cultural e transformadora da
natureza.
Bom, entendendo o trabalho como uma prática cultural, vamos chegar à
conclusão que existem diversos tipos ou formas de trabalhos? Mas será que
existe uma escala de valor sobre os diversos tipos de trabalho? Quando
pensamos em trabalho logo pensamos em esforço físico não é mesmo?
Se pararmos para observar tudo o que existe a nossa volta, vamos ver que
tudo foi transformado ou adequado às nossas necessidades, de maneira que
facilite a nossa vida, e é claro isso requer um esforço físico, afinal de contas a
cadeira que estamos sentados demandou esse esforço. Por exemplo: a árvore
foi cortada, levada para uma indústria que a cortou em partes, para ser
vendida ao marceneiro ou outra indústria para cortá-la novamente e fazer por
fim a cadeira, isso é apenas um pequeno exemplo, e se pararmos para pensar
nas roupas que vestimos ou no alimento que esta disponível para nós nos
supermercados e ainda no sapato que utilizamos, na cama onde dormirmos.
Bom você já percebeu que tudo ao nosso redor foi transformado através do
trabalho, não é mesmo? Mas será que o trabalho esta relacionado ao esforço
físico apenas?
Como resultado do trabalho temos tudo que podemos observar ao nosso
redor e isso (essa transformação) requer sim um esforço físico, mas também
requer um esforço intelectual (o pensar sobre a necessidade para achar uma
solução prática. Vamos a um exemplo simples: Para que o ser humano criasse
um escorredor de arroz (parte prática) foi necessário pensar sobre essa
necessidade ou seja utilizar também a força simbólica.
Competência 03
35
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Já sabemos que o ser humano cria símbolos para interpretar e conceituar o
mundo. O trabalho se constitui também por forças simbólicas e normativas,
como tal, é uma ação exclusivamente humana, o mundo humano se constitui
de regras e normas de convivência tendo como um dos principais mecanismos
normativos, justamente, o trabalho.
Bom, vamos aos conceitos que esta palavra (trabalho) tem. Para iniciar essa
discussão vamos fazer uma retrospectiva histórica. A princípio vamos estudar
o conceito de trabalho na antiguidade clássica, vamos até a Grécia.
Para os gregos a palavra trabalho esta relacionada à desvalorização por que
era feito por escravos, enquanto que as pessoas livres se dedicavam ao “ócio
digno” que era a oportunidade que as pessoas livres tinham de cultivar o
corpo e o espírito. Para Platão as pessoas livres viviam para contemplar as
ideias, por esta atividade (contemplação das ideias) representar a
característica fundamental de todo ser racional.
Na Roma Antiga temos a ideia para o trabalho, também negativa, era a
ausência do lazer, era um castigo, que não cabia às pessoas livres.
Agora vamos ver qual é a ideia de trabalho na Idade Média. Você já assistiu a
algum filme sobre a Idade Média? Se você já assistiu deve ter percebido que a
sociedade medieval está dividida basicamente em três classes sociais, são
elas: o clero, a nobreza e o camponês.
Porque estou falando de classes sociais? Para explicar qual era a ideia que se
tinha do trabalho naquela época?
É que era estabelecida a função que cada um desempenha na sociedade de
acordo com a classe social a qual pertencia. Por exemplo: o clero tinha a
obrigação de rezar, os nobres de guerrear e proteger a todos, de modo que o
trabalho manual era relegado aos camponeses.
Competência 03
36
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Não é difícil perceber que o trabalho era visto de forma depreciativa, apesar
do Santo Tomás de Aquino tentar equiparar todos os trabalhos. Na prática,
não era esse sentimento que existia.
As ideias em relação ao trabalho só começaram a mudar com a Idade
Moderna. Mas por que será que isso aconteceu?
A burguesia, que era uma nova classe dentro da Europa acostumada a fazer
trabalhos manuais, dedicara-se ao comércio e conseguira ter ascensão dentro
da sociedade europeia.
Também serão os burgueses que irão patrocinar as grandes navegações. O
trabalho passa a ser associado a dinheiro e acúmulo de riquezas e bens.
Também é nesse momento histórico que o trabalho passa a ser associado ao
conhecimento científico.
Durante a Idade Antiga e Idade Média vamos ter uma valorização do saber
contemplativo, sendo que o trabalho manual (prático) é considerado inferior,
uma atividade de não-humanos.
Quando chegamos ao Renascimento e Idade Moderna, temos a valorização da
técnica e do conhecimento que se obtém por meio da prática.
Mas de onde vem a ideia negativa sobre o trabalho?
Bom, existia um instrumento utilizado pelos agricultores chamado de
tripalium, que era feito de três paus com pontas de ferro, era usado para
bater o trigo, o milho e etc. A palavra tripalium também está associada a um
instrumento de tortura, daí vem a ideia negativa que está associada ao
trabalho.
Competência 03
37
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Observe a imagem do objeto de tortura:
Figura 12- Tripalium Fonte: http://diaslucas.blogspot.com.br/2014_01_01_archive.html
Até a Idade Média, como você deve ter percebido, o trabalho estava ligado à
exclusão social.
E hoje? Acha que mudou a ideia que relaciona trabalho e exclusão?
É com Hegel (1770-1831) que a visão do trabalho mudou ainda mais, pois ele
trouxe uma ideia de humanização do trabalho. É através do trabalho que o ser
humano tem consciência de si mesmo e de sua interferência dentro da
sociedade como um ato de reconhecimento.
Com o advento da técnica e da tecnologia esse trabalho se transformou,
perdendo um pouco da consciência dos seres humanos em relação a esse
trabalho, que quando efetivado, eles não sabem exatamente a sua finalidade,
o que não acontecia anteriormente. A essa falta de consciência chamamos de
alienação do trabalho.
Competência 03
38
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Figura 13 - Trabalho e alienação Fonte: www.historiadigital.org/questoes/questao-enem-2001-divisao-do-trabalho-e-alienacao/
Como você já deve ter percebido existe uma ideia de divisão do trabalho que
é histórica. Uma ideia de trabalho manual (Idades Antiga e Média) e a ideia de
trabalho intelectual (Renascimento e Idade Moderna).
No entanto, o que vale mais: o trabalho manual ou o trabalho intelectual?
O trabalho, como já vimos, é uma ação humana e é através dessa relação com
a natureza que transformamos o mundo a fim dele tornar-se habitável para
nós. Também já vimos que o trabalho intelectual precede o trabalho manual.
Mas será que houve uma transformação do trabalho ao longo dos séculos?
3.2 A Transformação do Trabalho
Como podemos explicar as transformações que o trabalho sofreu?
O trabalho tem haver com as necessidades e bem-estar dos grupos sociais. O
ser humano é condicional, o que estou querendo dizer com isso? É que
condicionamos as nossas relações e existência aos objetos que produzimos
para melhorar e facilitar a nossa vida. Como assim? Eu explico. Que
necessidade há de nos comunicar o tempo todo? Há trinta anos, se nós
quiséssemos falar alguma coisa importante com alguém, teríamos que
esperar encontrarmos essa pessoa, não é mesmo? Hoje isso é impensável,
Para entender
melhor assista ao filme tempos modernos de
Charles Chaplin.
Competência 03
39
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
podemos nos comunicar, mandar mensagens de texto, vídeo, voz; podemos
até mesmo falar com alguém que está do outro lado do planeta. Para nós,
hoje, é impossível termos algo para falar com alguém e esperarmos até ver
esta pessoa. As formas de comunicação condicionaram a forma como nos
relacionamos.
Dei apenas um exemplo sobre a comunicação do nosso dia a dia, mas existem
muitos outros exemplos, a indústria farmacêutica alterou a nossa relação com
a saúde, as indústrias de lazer alteraram a forma como preenchermos o nosso
tempo livre e etc.
A forma como vivemos se alterou, bem como o trabalho proporcionou essas
mudanças. Observe a imagem abaixo:
Figura 14 - Evolução do homem na alimentação Fonte: arterocha.blogspot.com.br/2011/11/evolucao-do-homem-e-alimentacao.html
Você concorda com essa imagem? Que elementos da transformação do
trabalho podemos observar na imagem?
Você pode observar que o trabalho em relação à alimentação mudou,
passando de uma forma mais simples de apenas colher para uma retirada dos
produtos da natureza e a preparação desses produtos para a transformação
em um alimento específico. Para a mudança que tem acontecido com o
trabalho ao longo dos séculos chamamos de técnica.
Competência 03
40
Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
A técnica é o aproveitamento dos recursos naturais através de um processo
racional e prático para satisfazer as necessidades humanas. Ou seja, foi
através do acúmulo de conhecimento e da utilização racional dele, que houve
uma mudança do trabalho, como podemos ver na figura sobre a evolução
alimentar.
Mas isso é bom ou ruim para nós?
A tecnologia nos ajuda? O que você acha?
Bom, existe uma discussão interessante sobre essa questão. Vamos descobrir
qual é?
Já falamos anteriormente, mas vamos nos aprofundar.
O trabalho está ligado à humanização do ser (já discutimos essa questão no
Devir, lembra?), também é uma força normativa, dentro das sociedades, pois
estabelece relações e cria normas de comportamento e hierarquias.
Existem alguns pensadores que dizem que o trabalho é importante a partir do
momento que os seres humanos se reconhecem nele e sabem por que estão
fazendo, mas a partir do momento que o homem perde essa consciência
sobre para que serve o seu trabalho, perde também a sua referência e aí o ser
humano passa a fazer o trabalho por fazer, apenas uma forma de ganhar
dinheiro e não mais como uma forma de interação consciente do mundo, na
intenção de melhorá-lo.
E se perdemos um referencial tão positivo (que pode colocar o porquê
estamos aqui) começamos a retirar as características humanas do trabalho.
Mas o que você acha?
Competência 03
41
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
É importante saber como e por que fazemos algo?
Você acha que a maioria das pessoas que você conhece tem essa consciência
sobre si e sobre o trabalho que elas desempenham?
Quando refletimos sobre a nossa importância dentro da nossa sociedade e a
importância do nosso trabalho, tendemos a fazer o nosso trabalho da melhor
forma possível e humanizar o processo pelo qual fazemos, reconhecendo
valor em cada um de nós e nos outros para quem fazemos o trabalho, você
não acha?
Mas que valor é esse? É justamente esse assunto que vamos conversar agora.
3.3 Tudo tem Valor
Quando falamos sobre valor, pensamos automaticamente em dinheiro não é
mesmo? E o dinheiro é uma forma simbólica de valorar as coisas.
Digo forma simbólica, porque o mundo é constituído de símbolos pelos
humanos, até mesmo o humano é um símbolo para nos conceituar e
diferenciar das demais espécies.
O dinheiro, por exemplo, não tem valor em si mesmo, esse valor que o
dinheiro adquiriu é dado por nós, pois se pararmos para pensar sobre o que é
dinheiro, chegaremos à conclusão que o dinheiro é apenas papel colorido. E
você o que acha? Que valor tem o dinheiro para você?
Entretanto existem outras formas de valorar coisas e pessoas, na realidade
estamos fazendo isso o tempo todo. Como? Vamos descobrir.
Competência 03
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Figura 15 - Valores Fonte: www.laparola.com.br/dinheiro
Estamos o tempo todo valorando tudo o que vemos. Você sabia? Mas como
isso acontece?
A valoração de tudo está na não-indiferença que creditamos, o valor não
precisa ser positivo, ele pode ser negativo também.
Quando falamos: "Não gosto de você" ou "prefiro ir à praia ao invés do
campo" ou ainda, "você viu como aquele personagem da novela é mau
caráter?" Estamos acrescentando juízos de valor e estamos determinando se
algo nos agrada ou não.
Ao nos relacionarmos tendemos a expor os nossos valores e ao serem
expostos esses valores, tendem a sofrer alguma alteração em contato com o
outro, que emitirá uma sentença, concordando ou não com o que foi posto.
É interessante observarmos que nem sempre quando alguém discorda de nós,
é porque quer nos excluir ou nos dizer que o que ela pensa é mais importante
do que o que nós pensamos.
O exercício sadio de valores, passa pela empatia, ou seja, ato de nos
colocarmos no lugar do outro.
Contudo, para discutir sobre valor trabalharemos com valores estéticos, éticos
Competência 03
43
Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
e políticos. Vamos conhecer e refletir sobre cada um deles.
A palavra estética vem do grego e quer dizer sensibilidade, experiência, está
relacionada à apreciação da arte através da inteligência humana.
A valoração estética está relacionada à afetividade e sensibilidade, ou seja, a
arte, que é a prática cultural que utilizamos para adjetivar algo ou alguém. Por
exemplo, quando falamos que algo é bom ou ruim, feio ou belo, estamos
utilizando o valor estético.
É claro que a constituição desse valor está ligada também a uma
subjetividade, ou seja, podemos emitir os nossos valores, mas o que não
podemos é impedir que os outros se posicionem, também, em relação à
mesma coisa que nos posicionamos, mesmo que as suas ideias sejam
diferentes das nossas.
Não podemos esquecer que quando chegamos neste mundo (nascemos) já
existiam valores estéticos estabelecidos que nós aprendemos então,
tendemos a julgar estranho algo que não é da nossa cultura ou da nossa
prática.
Existem vários valores estéticos e eles estão ligados às nossas escolhas
religiosas ou culturais, por exemplo.
O outro valor que vamos falar é o ético. Sempre que falamos sobre a moral,
apesar dos vocábulos serem diferentes têm o sentido parecido, por exemplo,
a palavra moral vem do latim mos, moris e é relativo a “costume”, “maneira
de se comportar regulada pelo uso”, já ética vem do grego ethos que quer
dizer “costume”.
“Ética ou filosofia moral é a parte da filosofia que se ocupa com a reflexão a
respeito das noções e princípios que fundamentam a vida moral.”
Competência 03
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Na moral, temos valores entre eles a heteronomia, ou seja, valores que nós
necessariamente não temos que concordar, são valores pensados por outras
pessoas. E os valores autônomos que são criados por nós ou ajudamos a
construí-los e concordamos com eles.
O próximo valor a estudarmos é o político, quando estudamos este valor,
identificamos as pessoas como cidadãs e como o poder público, através do
Estado (poder legislativo, poder executivo e poder judiciário).
Figura 16 - Os três poderes no Brasil Fonte: http://quizdapolitica.wordpress.com/2012/09/27/os-tres-poderes-da-politica/
Com o surgimento do Estado e o aparecimento das pessoas concidadãs,
aparece a primeira característica da valoração política que é a
institucionalização de direitos para todos, ou seja, a igualdade de direitos.
Mas há algo que precisamos pontuar.
Você acredita que apenas o Estado é responsável pelo estabelecimento de
direitos e deveres na sociedade?
Ou você acha que o Estado é o maior responsável por garantir o bom
funcionamento da máquina pública?
Competência 03
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
O Estado se ocupará de tudo o que é público e se é público é de todos nós
cidadãos e isso quer dizer que somos co-responsáveis com o Estado, pelo
desenvolvimento das políticas públicas.
Por exemplo, se trabalhamos em uma escola pública, somos tão responsáveis
quanto o governo pelo desenvolvimento educacional daquelas pessoas que
estão lá.
Algumas vezes o Estado promove políticas de exclusão, cabe a nós
analisarmos criticamente a situação e não utilizarmos os argumentos
apresentados pelo Estado para criamos uma política educacional que exclui.
Falo isso, por que tendemos a nos eximir da responsabilidade quando se trata
da coisa pública, mas é através da tomada de consciência e do
reconhecimento do nosso valor e dos outros que podemos transformar o
mundo em que vivemos através dos processos políticos, culturais e históricos.
É na escola também que esses processos se estabeleceram e é através da
nossa tomada de decisão que podemos agir de forma a incluir e não excluir
educandos no mundo.
Todos têm que participar desse processo a fim de que possamos nos
responsabilizar e atuar.
Mas o que é educação? Para que nos educamos? Veremos a educação como
um processo de transformação de si e do mundo.
Competência 03
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
4.COMPETÊNCIA 04 | COMPREENDER OS PONTOS DE COMPRAS E
REPOSIÇÃO DE ESTOQUES
Esta é a nossa última competência, e como o título diz, vamos investigar qual
o papel da escola dentro de tudo o que já vimos.
Aprendemos alguns elementos que nos dão uma visão da constituição
antropológica e filosófica do ser humano. Trabalhamos conceitos
importantíssimos para a nossa compreensão de como nos constituímos
pessoa, sujeito de direito. Vale a pena lembrarmos o que vimos até agora.
Estudamos na primeira competência sobre o Devir e por que o estudamos,
para compreendermos a dinâmica não apenas das coisas, mas principalmente
das pessoas. Como podemos mudar e mudar os outros através das relações;
podemos mudar o ambiente em que convivemos.
É por meio da compreensão do que é o Devir que entendemos como as
mudanças acontecem e podemos ousar sair da nossa zona de conforto nas
relações tanto pessoais como profissionais e construirmos algo diferente,
melhor, através de uma avaliação crítica de nossas ações e das ações dos
outros.
Nessa dinâmica das relações humanas, vimos também que a linguagem
constitui o humano e é constituída por ele através de adaptações e
ressignificações. O ser humano se transforma ao longo da sua história bem
como sua linguagem. Descobrimos também a multiplicidade da linguagem.
Nem sempre compreendemos o que foi dito, mas não significa dizer que o
que entendemos foi o que a outra pessoa quis dizer, nós ressignificamos. Esta
situação aparece quando lemos, não apenas quando nos relacionamos por
meio da fala.
Aprendemos também que trabalhamos tanto para existirmos, como essa ação
que é apenas humana é importante para a manutenção e transformação
Competência 04
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
deste mundo. É necessário que saibamos “por que trabalhamos” e qual a
importância desse trabalho para nós e para os outros.
Também discutimos sobre valor, que valoramos tudo, ações, objetos, pessoas,
sentimentos e até mesmo nós. Quando nos posicionamos a respeito de tudo
ou qualquer coisa, estamos expondo os nossos valores. Aprendemos que
esses valores já existem na sociedade quando nascemos; que a aceitação e
compreensão desses valores serão de acordo com o nosso grupo social.
Vimos tudo isso até agora, mas vamos questionar um pouco sobre a escola
como um espaço em que tudo isso está inserido, a questão do devir da
linguagem, do trabalho e dos valores. Como esse espaço educativo lida com
esta variedade de elementos culturais? Como construímos significados
através das relações que acabam alterando as nossas formas de viver?
Vamos investigar também sobre a construção da identidade humana nos
espaços escolares.
A escola é realmente esse espaço fascinante onde podemos estabelecer
relações e experiências que vamos levar para a vida toda; é um espaço
pensado pela sociedade para a transmissão de conhecimento cientifico, sendo
por meio dela que podemos interferir na construção do outro e do mundo.
Claro que a escola tinha essa configuração social que vemos hoje. Estamos,
acredito, em um momento de transição e talvez por isso a dificuldade em
repensar esse espaço e as adaptações que precisam ser feitas.
A escola sempre foi também um espaço normatizador, assim como tanto
outros espaços da sociedade. Só que antes me parece que os papéis eram
definidores de posturas. Como assim? Era como se fosse um teatro e todos os
atores e atrizes não pudessem sair do “personagem”, tanto em fala como em
postura e ações.
Competência 04
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Tem uma charge que acredito alguns já devem ter visto, onde são colocadas
duas cenas de um garoto recebendo as notas. A primeira cena é datada do
final da década de 1969 e os pais estão na sala de aula com a professora,
questionando o resultado ao garoto. Já a outra cena mais recente, agora os
pais estão cobrando o resultado do garoto à professora.
Achei a cena um tanto quanto emblemática, porque ela nos mostra a
mudança que ocorreu na escola e na sociedade, pena que a charge não
represente a mudança que desejamos. Mas, podemos construir essa mudança
a partir de uma educação baseada no diálogo e comunicação para a
cidadania.
O ser cidadão também é uma construção baseada nas relações interpessoais e
a escola pode ter essa ideia de protagonismos das pessoas que a constitui.
Apesar da multiplicidade de valores e práticas culturais, tem que ser
exercitado na escola o refletir para nos tornarmos humanos, que é não
apenas aparecermos nesse espaço público mais fazer com que os outros
também apareçam, é ouvir e também ser ouvido, falar, mas escutar é
interferir, mas deixar que os outros interfiram no ambiente.
Assim essa educação pensada para a cidadania pode ajudar na construção de
uma sociedade melhor, onde todos participam dessa construção a partir da
valorização de si e dos outros.
Da mesma forma que quando não refletimos sobre o que fazemos acabamos
não dando o verdadeiro valor ao que fazemos.
Você já ouviu ou falou aquela expressão: “hoje eu estou no automático?”
Quando estamos muito tempo no automático não refletimos sobre o que
estamos fazendo.
É comum aceitarmos um conceito como verdade quando estamos
insatisfeitos ou não analisarmos a situação criticamente. O “estar no
Competência 04
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
automático” quer dizer que estamos fazendo o nosso trabalho sem pensar
sobre ele, não é mesmo? E já vimos a insustentabilidade do trabalho alienante
para a sociedade e para nós mesmos.
Será que temos essa prática de trabalho alienante na escola? Podemos
imaginar as perdas para a sociedade de uma educação escolar com baixo
rendimento. O Relatório de Monitoramento Global de Educação Para Todos –
EPT 2013/2014, com o título: “Ensinar e aprender: alcançar a qualidade para
todos”, mostra a necessidade de os governos no mundo todo investirem em
uma educação de qualidade. O relatório também mostra que essa crise que a
educação enfrenta custa mais de 120 bilhões por ano, e os mais afetados
agora e posteriormente serão as populações pobres.
Mas é importante que comecemos a trazer essa questão para toda a
sociedade e quando falo da crise da educação, lembro de outro assunto que
vimos, lembra qual é? Isso mesmo, o valor.
Falamos que o valor é subjetivo, e que também ele é construído através dos
grupos sociais que pertencemos. Falamos também que ao valorar damos
significado ao que valoramos. Mas que valor damos à educação?
A compreensão de mundo passa antes pela compreensão de nós mesmos, do
que fazemos, como fazemos e a compreensão do outro. De modo que a
escola pode ajudar na compreensão de quem nós somos e como vamos
interferir no mundo.
Uma educação que busca uma interação entre saberes científicos e práticas
sociais com certeza pode acrescentar à nossa sociedade.
Carl Roger em seu livro: Tornar-se pessoa mostra como essas ações
pedagógicas que buscam não apenas o repasse de informações científicas,
mas a descoberta e valorização do outro podem ser positivas para todos.
Quando educamos com a ideia de crescimento mútuo, o trabalho ganha outro
significado.
Competência 04
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Figura 17 – Carl Roger Fonte:www.buscadorerrante.com/wp/2009/biografia-de-carl-rogers/
Partindo do que falamos, podemos dizer que a escola é responsável por uma
educação mais humanizada. Cabe a nós decidirmos qual o conceito de
humano que queremos construir.
Eu sei que as relações no ambiente escolar nem sempre são fáceis, uma vez
que temos tantos grupos diferentes, com práticas diferentes e uma fronteira
imaginária ao redor da escola, que tenta separar as vivências escolares das
vivências não – escolares.
Mas podemos somar ao trabalharmos a diversidade cultural que existe na
escola, ao invés de tentarmos engessar as relações. É possível vivermos o
currículo através da prática e vivência escolares.
4.1 Quais Saberes são Construídos na Escola?
Pensamos inicialmente na escola como um local de produção, a escola é este
espaço onde os saberes científicos são construídos, mas não apenas
construídos, são também discutidos, visando o compartilhamento das
informações, da melhor forma possível para a inserção do indivíduo no
mundo como um ser crítico e produtivo. O outro saber que construímos na
escola são as relações humanas.
Para a constituição desses saberes temos que falar do trabalho dos vários
profissionais que estão nos espaços escolares. São eles: gestores, zeladores,
Carl Rogers (1902-
1987) foi um psicólogo norte-
americano. Desenvolveu a
Psicologia Humanista,
também chamada de Terceira Força
da Psicologia. Segundo o
psicólogo Abraham Maslow, Carl
Rogers foi um dos principais
responsáveis pelo acesso e
reconhecimento dos psicólogos ao universo clínico, antes dominado pela psiquiatria médica e pela
psicanálise. Sua postura enquanto terapeuta sempre esteve apoiada em sólidas pesquisas e
observações clínicas. www.e-
biografias.net/carl_rogers/
Competência 04
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
cozinheiros, professores e porteiros.
É também a partir do compromisso assumido por todos esses profissionais
que a educação será efetivada de forma mais humanizada. Gostaria, neste
momento, de relembrar que só aprendemos algo quando aquele algo ganha
significado para nós. Logo podemos ensinar com significado em todos os
ambientes escolares, pois as relações estabelecidas têm a ver com práticas
que aconteceram fora do ambiente escolar.
No entanto, o comprometimento só poderá acontecer quando nos sentimos
aptos a agir e refletir, percebendo a nossa existência condicional e sendo
críticos em relação a ela. É preciso não apenas estarmos na escola, mas,
sabermos que estamos na escola. A diferença é que quando estamos apenas
na escola, nós fazemos um trabalho alienante e quando sabemos que estamos
na escola, fazemos um trabalho mais comprometido.
Gosto do conceito de “bem” de Hannah Arendt, ela diz que o bem só é bem
porque é capaz de fazer uma análise profunda de si e do outro, ao mesmo
tempo é radical, porque o que faz tem raízes, pode se sustentar.
O bem que me refiro em Hannah Arendt é o comprometimento através da
ação-reflexão dentro da realidade humana que Paulo Freire coloca tão bem
em seu livro “Educação e Mudança”.
Figura 18 - Paulo Freire Fonte: www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php ?titulo= Paulo+Freire<r=p&id_perso=265
Paulo Freire (1921-1997) foi educador
brasileiro. O método de
alfabetização Paulo Freire foi aplicado
em diversos países. Foi membro do
Conselho Estadual de Educação de
Pernambuco www.e-
biografias.net/paulo_freire/
Competência 04
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
Temos que ter a consciência desses saberes e de nosso comprometimento
com o que fazemos, para que possamos construir o mundo através dos
valores humanos.
Todos os espaços escolares podem ser utilizados para uma ação planejada
(pedagógica), e essa é a nossa próxima discussão.
4.2 Os Espaços Escolares
Ao falarmos de espaços escolares, logo nos vem à mente a sala de aula, mas
podemos lembrar outros espaços como: biblioteca, secretaria, cozinha,
direção, banheiros, sala de informática e o pátio.
Todos convivemos nos espaços escolares juntos, mesmo que cada espaço
tenha um significado diferente. Por exemplo, a sala de aula não tem o mesmo
significado para os alunos e para os professores; se tivesse o mesmo
significado não existiria a divergência entre os dois grupos citados.
É importante observarmos que o valor que os sujeitos do ambiente escolar
dão aos espaços são diferentes.
Os estudantes valorizam mais o pátio do que a sala de aula por exemplo, por
se sentirem mais livres no pátio; é importante chamar a atenção dos
estudante para a sala de aula, como espaço de libertação da ignorância e
construção de saberes científicos necessários e importantes podendo, esses
saberes serem vivenciados em outros ambientes.
Como é posto, às vezes, parece que o saber científico está encarcerado na
sala de aula e que esses conhecimentos não fazem o menor sentido para os
estudantes. É importante, por este motivo, que todos os profissionais do
ambiente escolar como também os estudantes façam reflexões sobre o
comprometimento. Acredito que todos podem ser agentes provocadores
dessa questão.
Competência 04
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Quando trazemos o assunto para ser discutido, podemos também contribuir
para a mudança, é o que chamamos de devir social. Mas para tal é importante
que nós, todos os profissionais, possamos fazer uma reflexão -ação.
Talvez você pense que não pode fazer essa interferência, por sua escola como
espaço público não ser bem estruturada, mas para refletirmos e agirmos, não
é necessário muita coisa, mas apenas o comprometimento orientado pelo
conhecimento de si e o reconhecimento do outro.
4.3 Os Sujeitos dos Espaços Escolares e a Constituição de Saberes
A escola é esse espaço planejado para o ensinar de forma consciente, quem
faz parte desse espaço sabe ou deveria saber a importância do seu trabalho.
Os saberes discutidos nesse espaço são os saberes científicos como já foi dito.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) orientam trabalhar meio-
ambiente, trabalho, diversidade cultural, cidadania, ética e sexualidade para o
ensino fundamental, já no ensino médio ele nos orienta a discutirmos
Trabalho e Cidadania.
É interessante perceber que os Parâmetros Curriculares Nacionais trazem na
transversalidade, práticas culturais que já falamos, ou seja, sugere que não se
trabalhe apenas as disciplinas, mas também as relações humanas através de
ações planejadas, ou em outras palavras, o devir.
Temos que ter essa certeza ao nos posicionarmos todos os dias nesse espaço.
Todos são importantes nessa construção. Não podemos dimensionar que o
trabalho de um é mais importante que o trabalho de outro, trazendo uma
responsabilidade maior para um dos segmentos dentro desse espaço.
É importante sabermos quais são os sujeitos envolvidos e buscarmos
trabalhar juntos para que todos ganhem. Por exemplo, temos dentro do
espaço educacional estudantes, a comunidade e demais funcionários; em se
Assistam ao vídeo
educação e mudança social.
www.youtube.com/watch?v=K4eLeXXR
ttw
Competência 04
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
tratando do espaço público não podemos esquecer que o Estado, não o
governo, mas o Estado é responsável e possibilita, oportuniza, ou seja, a sua
política é responsável por esse trabalho. Estou fazendo esta diferenciação
para que possamos entender que o governo é passageiro, tem um tempo
limitado, mas o Estado é uma instância mais longa.
Vamos refletir sobre as responsabilidades de cada um nesse espaço.
Primeiramente o Estado que tem a responsabilidade de criar políticas públicas
que viabilize o pleno desenvolvimento dos estudantes através de capacitação
dos professores e trazendo também igualdade de oportunidade, o Estado
também educa quando gera um bem-estar dentro da nossa sociedade.
Os demais funcionários, ao buscarem essa relação dialogada com os demais
sujeitos do ambiente escolar, tendo um comprometimento através de uma
reflexão-ação e valorização de si, do seu trabalho e do outro, mostram ao
Estado, junto com a comunidade quais são as interferências que precisam ser
feitas para o desenvolvimento de todos e da sociedade.
Os estudantes também são responsáveis nesse processo agindo de forma
também reflexiva. Paulo Freire diz que ninguém educa ninguém por sermos
sujeitos da nossa própria educação. Ou seja, não apenas os estudantes mas
também, este sujeito tem que buscar ‘sair’ do seu trabalho alienante. Para
isso, eles têm que compreender a sua importância dentro da sociedade.
O espaço escolar faz parte da construção da identidade dentro da nossa
sociedade. Mas precisamos entender e decidir qual identidade queremos
construir.
Outro segmento importante é a comunidade em que a escola está inserida,
ela também tem um trabalho a ser considerado dentro desse processo. O que
nos faz pensar sobre as demais crises instaladas dentro da nossa sociedade e
buscarmos formas eficazes de fazermos nossa interferência.
Competência 04
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Homem, Pensamento e Cultura: Abordagens Filosóficas e Antropológicas
Na escola todos se educam, então temos que planejar a forma como vamos
educar e refletir sobre a educação que recebemos a ponto de fazer uma
interferência crítica e dialogada que seja boa para todos.
Chegamos ao fim do nosso curso. Espero que tenha sido bom para você, caro
aluno, como foi para mim, uma experiência única e gratificante poder
compartilhar com você sobre aquilo que penso, acreditando que não detenho
a verdade absoluta, mas que podemos somar com um pouco de boa vontade
e pensamento crítico. Um abraço e até mais.
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
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Introdução a Filosofia. 4 ed. São Paulo. Moderna, 2009.
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_____________, Entre o passado e o futuro. 6. Ed. São Paulo: Perspectiva,
2007.
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uma educação melhor. Brasília. Liber Livros, 2008.
BUFFA, Ester. ARROYO, Miguel. NOSELLA, Paolo. Educação e Cidadania: Quem
Educa o Cidadão? 7ª edição. São Paulo, Cortez, 1999.
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ROCHA. Everardo P. Guimarães. O que é etnocentrismo. 5 ed. São Paulo.
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ROUSSEAU, Jean-Jacques. Ensaio sobre a origem das línguas. 3 ed. São Paulo.
Unicamp, 2008.
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Técnico em Multimeios Didáticos e Secretaria Escolar
MINICURRÍCULO DO PROFESSOR
Sou Luciana Silva, professora de História do Estado de Pernambuco desde
2009. Formada pela FUNESO em 2007 e pós-graduada pela UFRPE em 2008,
mas o título que mais gosto de exibir é o de ser humano.
Também sou colaboradora do Instituto Maria da Penha, cuja experiência tem
sido salutar para as minhas reflexões sobre a vida e o trabalho, o que
certamente ecoa em minha prática pedagógica.
Gosto de lembrar como o ambiente escolar influenciou no que me tornei hoje
e como cresci neste espaço, mais que como uma profissional, aprendi a
enxergar pessoas e suas limitações à medida que me percebia também.
Muitas lembranças boas, muito mais do que lembranças não tão boas...
aprendi a viver uma vida de solidariedade e por que não dizer de amor, amor
tanto que voltei para fazer o que fizeram em minha vida: a diferença.