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IGREJA LUTERANA Revista Semestral de Teologia

IGREJA LUTERANA · Teologia do Seminário Concórdia, da Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB), ... LIANçA DO SANGUE1 Paul G. Bretscher Para muitos, a Bíblia parece conter

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IGREJA LUTERANARevista Semestral de Teologia

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Igreja Luterana

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DiretorGerson Luis Linden

ProfessoresAcir Raymann, Anselmo Ernesto Graff, Clóvis Jair Prunzel, Gerson Luis Linden, Leo-poldo Heimann, Paulo Proske Weirich, Paulo Wille Buss, Raul Blum, Vilson Scholz

Professores EméritosDonaldo Schüler, Paulo F. Flor Norberto Heine

SEMINÁRIO CONCÓRDIA

IGREJA LUTERANAISSN 0103-779XRevista semestral de Teologia publicada em junho e novembro pela Faculdade de Teologia do Seminário Concórdia, da Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB), São Leopoldo, Rio Grande do Sul, Brasil.

Conselho EditorialPaulo P. Weirich (Editor), Gerson L. Linden e Acir Raymann.

Assistência AdministrativaIvete Terezinha Schwantes e Josemar da Silva Alves

A Revista Igreja Luterana está indexada em Bibliografia Bíblica Latino-Americana e Old Testament Abstracts.

Os originais dos artigos serão devolvidos quando acompanhados de envelope com endereço e selado.

Solicita-se permutaWe request exchangeWir erbitten Austausch

CORRESPONDêNCIARevista Igreja LuteranaSeminário Concórdia

Caixa Postal 20293001-970 – São Leopoldo/RSTelefone: (0xx)51 3037 8000

e-mail: [email protected]

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Índice

IGREJA LUTERANA

Volume 70 – Junho 2011 – Número 1

ARTIGO

ALIANçA DO SANGUE 5Paul G. Bretscher

AUXÍLIOS HOMILÉTICOS 29

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ALIANçA DO SANGUE1

Paul G. Bretscher

Para muitos, a Bíblia parece conter duas religiões diferentes. Uma é a religião do Judaísmo, no Antigo Testamento (AT); a outra, a religião Cristã, no Novo Testamento. As diferenças parecem tão grandes ao ponto de as duas “religiões” parecerem mundos divididos. O Antigo Testamento é a religião da lei; o Novo Testamento, a do evangelho. A do Antigo Testamen-to se caracteriza por um complexo esquema de sacrifícios, circuncisão e regulamentações detalhadas a respeito do sábado; no Novo Testamento tudo isso é rejeitado. A religião do Antigo Testamento é a religião de um único povo; a do NT deve ser divulgada no mundo inteiro.

Desde os primórdios da Igreja Cristã estas diferenças têm sido um verdadeiro problema. Paulo e os outros apóstolos da Igreja Primitiva achavam muito difícil convencer os cristãos judeus de que, ao abrirem mão da circuncisão, dos sacrifícios e de outras práticas cuidadosas da lei cerimonial, não estavam perdendo uma só parte da verdadeira essência da sua religião do AT. Ainda hoje muitos mantêm a idéia de que o Judaísmo, por aceitar o AT, é religião verdadeira em toda sua extensão. Hoje muitos cristãos afirmam: “Eu acredito no NT”, dando com isso a entender, indi-retamente, que há uma diferença fundamental entre o Antigo e o Novo. A relação do AT para com o NT é um problema com o qual muitos estudantes de Teologia e muitos pastores cristãos têm lutado seriamente.

Nós sabemos que o NT dá o seu claro sinal de aprovação ao todo do AT como sendo a verdadeira palavra de Deus. Sabemos que o mesmo Espírito Santo é o divino Autor de ambas as alianças; que, portanto, devem conter uma unidade que reflita a unidade do Deus eterno e imutável. Aceitamos o princípio teológico de que o NT está oculto no Antigo, e que o Antigo é revelado ao Novo, como o expressa o apóstolo Paulo: “O véu [que cobre o AT] é removido em Cristo” (2 Co 3.14). Tudo isso sugere que existe uma unidade essencial que une os dois testamentos numa só religião. Mas qual é este laço de unidade?

Este ensaio pretende mostrar que um fio desta unidade é o conceito de sangue, com todas as suas implicações, no Antigo e no Novo Testamento. Para o Autor, este é o conceito que revela a glória e a beleza da religião do Israel do AT, e que uniu esta glória e beleza à religião de Jesus Cristo.

1 BRETSCHER, Paul G. The Covenant of Blood. Concordia Theological Monthly. Vol. XXV, 1954, n. 1, 2, 3; January, February, March: pp. 1-27; 109-125; 199-209. Traduzido pelo Rev. Ivo Dreyer, pastor na Comunidade Evangélica Luterana Cristo, Schroeder/SC.

Artigo

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1. O SANGUE DA ALIANÇA

O Deus da Bíblia é Deus de Aliança – um Deus que não se afasta para longe dos seres humanos, desinteressado e indiferente; mas, por Sua própria iniciativa, cobre-os torrencialmente com as promessas da sua graça; que se aproxima e lhes fala, perdoa seus pecados e os torna propriedade Sua. 275 vezes é mencionada, na Bíblia, a aliança de Deus com o homem. Deus fez aliança com Noé, Abraão, Moisés. Prometeu nova aliança a Jeremias (Jr 31.31-34; cf. Hb 9.6-9). Ele nos deu a Sua nova aliança em Cristo. Uma característica deveria ser notada, especialmente, ao esboçarmos a história das alianças que Deus fez com o homem. É que com a aliança há sempre um selo, um sinal externo e garantia, no qual a aliança é dada. Mais comumente, com apenas poucas exceções (e.g., o sábado como selo da aliança de Deus, Êx 31.12-17), o selo da aliança é o sangue. Isso é enfatizado no AT, em passagens como essas:

E Moisés enviou alguns jovens dos filhos de Israel, os quais ofe-receram ao Senhor holocaustos e sacrifícios pacíficos de novilhos. E Moisés tomou do sangue e o pôs em bacias; e outra metade espargiu sobre o altar. (...) E Moisés tomou o sangue e o aspergiu sobre o povo, e disse: Eis aqui o sangue da aliança que o Senhor fez convosco a respeito de todas estas palavras. (Êx 24.5-8).

Congregai os meus santos, os que comigo fizeram aliança por meio de sacrifícios (i.e., por meio de sangue) (Sl 50.5).

Por causa do sangue da tua aliança, tirei os teus cativos da cova (Zc 9.11).

No Novo Testamento, o selo da aliança é novamente o sangue, o san-gue de Cristo. Vemos isto mais claramente nas palavras de Jesus, quando Ele instituiu a Ceia do Senhor: “Este é o meu sangue, o sangue da [nova] aliança” (Mt 26.28). Também na Epístola aos Hebreus é poderosamente enfatizado que o sangue de Cristo é o selo da nova aliança:

De quanto mais severo castigo julgam vocês será considerado digno aquele que calcou aos pés o Filho de Deus e profanou o sangue da aliança com o qual foi santificado, e ultrajou o Espírito da graça? (Hb 10.29).

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E [vocês chegaram] a Jesus, o Mediador da Nova Aliança, e ao sangue da aspersão que fala coisas superiores ao que fala o próprio Abel. (Hb 12.34).

Ora, o Deus da paz, que tornou a trazer dentre os mortos a Jesus nosso Senhor, o grande Pastor das ovelhas, pelo sangue da eterna aliança, aperfeiçoe vocês (Hb 13.20,21a).

Em quase todos os momentos o selo da Aliança de Deus é, ou pelo menos envolve, sangue. Uma exceção, da qual podemos tomar nota, é o selo do arco-íris, dado a Noé (Gn 9.8-17). Esta é, como podemos logo perceber, uma circunstância excepcional. Envolvia uma aliança muito especial de graça, contendo a garantia e a afirmação do próprio Deus de que as nuvens, nas quais estava agora posto o arco, nunca mais derra-mariam suas apavorantes águas para destruir a terra. Porém, a aliança do arco-íris não exclui uma aliança com sangue, mesmo no caso de Noé. Três referências específicas nos dão toda a indicação de que também Noé conhecia a aliança de Deus com o pecador como aliança do sangue, sim, que a aliança com sangue já era parte integrante da sua religião, antes do Dilúvio.

A primeira destas indicações é o fato de que Noé ofereceu sacrifícios de sangue logo ao sair da arca. É-nos dito que “Noé levantou um altar ao SENHOR, e, tomando de animais limpos e de aves limpas, ofereceu holocaustos sobre o altar” (Gn 8.20). Na Bíblia, esta é a primeira vez que se menciona a edificação de um altar. Ainda assim, não temos razão nenhuma para duvidar que a oferta de sacrifícios sobre altares remonta ao próprio início da história dos patriarcas. Na história do Dilúvio temos também, pela primeira vez, a distinção entre animais puros e impuros. Também esta distinção pode muito bem remontar ao começo da vida após a Queda. Na verdade, torna-se inevitável uma distinção por causa da maldição pronunciada sobre a serpente. Observem, especialmente, que o próprio Deus providenciou os animais para o sacrifício da parte de Noé. De todos os animais limpos foram colocados sete na arca – três pares, mais um para o sacrifício. Veremos, mais adiante, que a verdadeira essência de todo sacrifício se insere na aliança com sangue. Assim, os sacrifícios de Noé são a nossa primeira indicação de que ele já vivia com Deus nos termos da aliança com sangue.

A segunda indicação é a observação de Gênesis 8.21, referente à rea-ção do Senhor às oferendas de Noé: “E o Senhor aspirou o suave aroma”. Essa referência ao “suave aroma” do sacrifício ocorre cerca de 40 vezes no AT, mormente em Levítico e Números. Certamente isso possui signifi-cado maior do que o conceito antropomórfico de que o SENHOR aprecia o cheiro de gordura queimada. O fato é que este mesmo SENHOR, que

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aqui aprova o sacrifício de Noé, pode tornar-se completamente aborrecido com cheiro idêntico. Testemunha-o Sua palavra (Is 1.11,13a): “Estou farto dos holocaustos de carneiros, e da gordura de animais cevados, e não me agrado do sangue de novilhos, nem de cordeiros, nem de bodes (...) Não continuem a trazer ofertas inúteis” (cf. também Sl 40.6; 51.16,17).

Evidentemente, se o SENHOR pode aprovar um sacrifício e rejeitar outro, embora sejam exteriormente iguais, então deve haver um certo significado e propósito por trás do sacrifício. O sacrifício traz o seu “aroma suave” às narinas do Senhor somente quando o significado e o propósito se encontram expressos no coração do ofertante. Se, portanto, o sacri-fício de Noé obteve a aprovação divina, segue-se, necessariamente, que nos sacrifícios de Noé cumpriu-se o significado e o sentido verdadeiro, intencionado por Deus. Isto significa que Noé ofereceu seu sacrifício com a plena compreensão e humilde apreciação da aliança do sangue.

A terceira indicação de que a aliança do sangue já estava em vigor, e com seu pleno significado, para Noé, surge com a ordem de Deus em Gn 9.3-6:

Tudo o que se move, e vive, servirá de alimento; como lhes dei a erva verde, tudo lhes dou agora. Carne, porém, com sua vida, isto é, com seu sangue, vocês não comerão. Certamente reque-rerei o sangue de vocês, o sangue da sua vida; de todo animal o requererei, como também da mão do homem, sim, da mão do próximo de cada um requererei a vida do homem. Se alguém derramar o sangue do homem, pelo homem se derramará o seu; porque Deus fez o homem segundo a Sua imagem.

Estas palavras, embora proferidas muito antes da entrega da Lei de Deus no monte Sinai, contêm cada elemento necessário para uma avaliação plena da importância do sangue como selo da aliança da graça de Deus.

1. Sangue é vida. O derramamento de sangue significa o derrama-mento da vida. “Derramar o sangue do homem” quer dizer homicídio, e, mesmo que não tenha acontecido, literalmente, a perda do sangue, significa homicídio.

2. Inculca-se aqui um profundo respeito pelo sangue, respeito este que, temos toda razão para crer, antecedeu também ao Dilúvio, embora, talvez, obscurecido pela perversidade do mundo antediluviano. Ao homem claramente é permitido comer carne de animais. Porém o sangue é ex-cluído. O sangue é considerado sagrado. Não deve ser comido, com base na idéia de que ele é vida.

3. A vida do homem é considerada infinitamente mais preciosa do que a vida de qualquer animal. A razão é que o homem é a coroa da Criação,

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feito à imagem de Deus. Assim, é dado ao homem o poder de matar ani-mais e usá-los para se alimentar; é-lhe dado poder e domínio sobre eles. Mas o homem não tem poder algum sobre a sua própria vida ou a do seu irmão. Tomar esse poder é usurpar a autoridade que Deus reserva para Si mesmo; e a punição é a morte.

4. A terrível sombra de Gn 3 lança-se sobre a seguinte passagem, com implicações profundas: “No dia em que dela comeres, certamente morrerás.” “Visto que isto fizeste (...) pó és, e ao pó tornarás.” O sangue significa vida apenas quando permanece oculto. Porém quando jorra, quando corre à vista dos olhos humanos, ele traz uma mensagem, a mensagem do horror da morte. Noé, ou qualquer outro fiel filho de Deus, nunca poderia ver sangue, de animal ou de homem, sem estar lembrado de que a morte está no mundo por causa do pecado; que a sua própria vida está perdida; que ele é pecador e, portanto, não tem direito à vida. Realmente, aqueles que viam este significado no sangue iriam ter aversão a ele, e nem lhes passaria pela cabeça a idéia de comê-lo!

5. Há também esperança nesta passagem. Embora a vida do homem esteja realmente perdida, o próprio Deus valoriza essa vida. Embora o homem tenha se voltado contra Deus, este ainda lhe concede domínio. Pois Deus não poderia esquecer que fizera o homem à Sua própria ima-gem. A mensagem da redenção está dentro destas palavras. Por que Deus cuidaria tanto de Noé? Por que iria amá-lo e o abençoaria? Estaria Deus apenas brincando com o homem durante esta vida, esperando o momento sadicamente mais oportuno a fim de jogá-lo na morte por causa do seu pecado? Impossível! A existência continuada de Noé, sua libertação da morte sofrida pelo mundo inteiro no Dilúvio, as bênçãos de domínio, a inviolabilidade de sua vida perante Deus, a ordem de frutificar, multiplicar e repovoar a terra – tudo mostra que Deus, de algum modo maravilhoso havia vencido a maldição do pecado, abolido o horror da morte e obtido eterna vitória em favor do homem. A cabeça da serpente está esmagada. A vitória do Diabo foi-lhe arrebatada. O homem está salvo!

A importância da aliança do sangue já, portanto, conhecida de Noé, e, diria eu, dos patriarcas anteriores a ele, é poderosamente confirmada na aliança do Sinai. A passagem singular mais rica sobre o assunto é Lv 17.10-14:

Qualquer homem da casa de Israel, ou dos estrangeiros que peregrinam entre eles, que comer algum sangue, contra ele me voltarei e o eliminarei do seu povo. Porque a vida da carne está no sangue. Eu vo-lo tenho dado sobre o altar, para fazer expiação pelas vossas almas: porquanto é o sangue que fará expiação em virtude da vida. Portanto tenho dito aos filhos de Israel:

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Nenhuma alma de entre vós comerá sangue, nem o estrangeiro que peregrina entre vós, o comerá. Qualquer homem dos filhos de Israel, ou dos estrangeiros que peregrinam entre eles, que caçar animal ou ave que se come, derramará o seu sangue, e o cobrirá com pó. Portanto a vida de toda carne é o seu sangue; por isso tenho dito aos filhos de Israel: Não comereis o sangue de nenhuma carne, porque a vida de toda carne é o seu sangue; qualquer que o comer será eliminado.

Aqui temos uma afirmação clara, quatro vezes repetida, a respeito do principal significado do sangue. “A vida está no sangue”. “Ele [sangue] é a vida”. “O sangue é para a vida”. “A vida é o sangue”. É fundamental este conceito, já definido, como vimos, em Gn 9. Na Bíblia não se pode com-preender nenhuma referência ao sangue sem este conceito. Ele é, desde o princípio, a base dos conceitos religiosos do povo de Deus. Na verdade, o medo supersticioso de sangue, existente em muitas religiões pagãs – talvez até a reação diante do sangue, que é quase inerente à “natureza humana”, – pode estar ligado a este fato: o sangue é vida. Imaginem Adão e Eva diante do cadáver de seu filho Abel. Pela primeira vez viram a morte no homem; pela primeira vez experimentaram o horror máximo do pecado. Duas impressões inevitáveis lhes surgem naquela hora. Uma, a terrível quietude, a inamovível rigidez de um corpo sem vida; a outra, o sangue daquele homicídio, derramado na terra. Ali, no sangue, está a diferença entre vida e morte. A vida está no sangue. Quando o sangue é derramado, a vida se vai. E, involuntariamente, o terror da morte é transferido para o sangue.

Este pensamento é tão dominante que o sangue (significando “vida” ou, na maioria das vezes, “morte”, dependendo do ponto de vista) torna-se parte do vocabulário do povo de Deus, sim, também de outros povos. A Bíblia está cheia dessas referências. É a “voz do sangue de Abel” que clama desde a terra a Deus. Judas trai “sangue inocente”. Pilatos declara-se “inocente do sangue” de Jesus. Os judeus não podem usar no Templo as trinta moedas de prata porque “são preço de sangue”. Realmente, poucas vezes a palavra sangue é usada, na Bíblia, sem carregar o significado religioso de morte.

Não há sequer um pouquinho de pagã superstição no respeito bíblico pelo sangue. Ao contrário, ele nos lança profundamente no coração da religião bíblica do Antigo e do Novo Testamento. O interesse primordial de toda a Escritura volta-se aos primeiros capítulos de Gênesis e ao seu relato da Queda do homem no pecado. Não há nada mais grave para o homem, nada a ser mais temido, do que a morte. Ela é o resumo e a soma de todo o mal do pecado. Todo propósito da religião da Bíblia é anular a

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desgraça da morte. Se o sangue é vida, então seu derramamento, ou a morte, irá inevitavelmente ocupar, não uma pequena, mas a maior parte nessa religião.

Lei e Evangelho, ambos estão contidos no conceito do sangue. Lei, porque a própria contemplação do sangue deve sempre lembrar ao ho-mem que a morte, mesmo também a sua própria, é a realidade mais cruel dele e do mundo. Enquanto a maldição do pecado pender sobre ele, está eliminado da presença de Deus, condenado sob o justo salário do seu pecado. Por isso, o profundo respeito pelo sangue, como é inculcado na Lei. O sangue nunca deve ser comido. O caçador deve sangrar o animal abatido, derramar o sangue na terra e cobri-lo com pó. Toda cena de sangue instila temor religioso, pois para Israel o sangue, se derramado proposital ou acidentalmente, justa ou injustamente, sobre o altar, no campo ou em casa, sempre traz a mensagem do pecado e a da morte do homem.

Mas o sangue contém também o mais precioso Evangelho, como vemos nestas palavras de Lv 17: “A vida da carne está no sangue. Eu vo-lo tenho dado sobre o altar para fazer expiação pelas vossas almas: porquanto é o sangue que fará expiação em virtude da vida”. “Eu vo-lo tenho dado sobre o altar”, diz o Senhor. Este sangue é a garantia da aliança da graça de Deus com Seu povo, uma aliança que se origina inteiramente no amor de Deus, aliança que Deus “deu” e que o homem pode receber unicamente como dom gracioso. Porém, se é recebida como dom gracioso, então é recebida pela fé. Assim, nas palavras “Eu vo-lo tenho dado”, subjazem os dois grandes conceitos neo-testamentários da justificação: o sola gratia e o sola fide. “Eu vo-lo tenho dado sobre o altar para fazer expiação pelas vossas almas, porque é o sangue que faz expiação em virtude da vida”.

A palavra “expiação” significa uma cobertura, uma proteção contra a ira e, por isso, salvação. Discutiremos isso mais adiante, no próximo capítulo. Aqui, porém, observem especialmente a palavra “alma”. Nós, algumas vezes, esquecemos que o sentido primário de “alma” é, simplesmente, “vida”. Deus diz que Ele dá o sangue de animais sobre o altar como uma cobertura para a vida dos homens. Isto é, o animal derrama seu sangue e morre a fim de os homens não terem de morrer, mas para que possam encontrar vitória sobre o pecado e a morte. Aqui está o terceiro grande princípio neotestamentário da justificação e da expiação vicária, vida pela vida, sangue pelo sangue, morte pela morte.

Mas tudo gira em torno do sangue. A aliança do sangue é o gracioso meio de Deus para redimir o homem da morte e da maldição dela. Ao mesmo tempo, o sangue dessa aliança é o gracioso meio de Deus para proclamar essa redenção, por palavra e sinal, para que o homem possa encontrar o conforto da aliança e crê-lo para a salvação.

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2. O SANGUE DA EXPIAÇÃO

No hebraico, a palavra que traduzimos como “expiar” ou “fazer expia-ção” é kaphar. É usada 101 vezes no AT. E ocorre apenas uma vez no seu sentido natural de “cobrir”. É Gn 6.14, onde Noé deve “cobrir com piche” ou “cobrir” a arca por dentro e por fora com piche. Em todas as outras passagens, kaphar leva o sentido moral e religioso de cobertura sobre o pecado. A definição mais clara é dada pela própria Escritura, em Lv 16.30: “Porque naquele dia se fará expiação por vós [kaphar], para purificar-vos: e sereis purificados de todos os vossos pecados perante o Senhor”.

Na Versão Autorizada (inglesa) ocorre um bom número de outras traduções da palavra além de “fazer expiação”, e que ajudam a escla-recer seu sentido. Em Gn 32.30, Jacó diz: “Eu o aplacarei [Esaú] com o presente”. Em Dt 21.8, Moisés recorre a Deus: “Sê propício ao teu povo Israel”. Pv 16.14 usa kaphar no sentido de apaziguar: “um homem sábio o apazigua (i.e., a ira de um rei)”. Outras traduções são “perdoar”, “fazer reconciliação”, “perdão”, “purgar”, “ser purificado”. Na maior parte dos exemplos, porém, o hebraico “kaphar” é traduzido pelas palavras “fazer expiação”. Cerca de 75 passagens, na sua maioria de Lv e Nm, expres-sam a idéia de que é o sangue do sacrifício que faz a expiação pela alma (i.e., pela vida) do homem, poupando-o da morte, que é o salário da sua rebelião contra Deus. Assim, por exemplo, Lv 17.11: “É o sangue que faz a expiação pelas vossas almas.”

Três substantivos derivados das formas de kaphar podem ser aqui mencionados. Um é kapporeth, usado em apenas um sentido, para indicar aquilo que Lutero chama de Gnadenstuhl, e o que a Versão Autorizada traduz como o “lugar da misericórdia” da arca da aliança. Dentro da arca estavam as condenatórias tábuas da Lei de Deus. Cobrindo-as está o kap-poreth, literalmente, a “cobertura” da arca, mas tipificadamente cobrindo a transgressão humana da Lei, pois o kapporeth representa a expiação de Deus e a misericórdia perdoadora, que anula a desobediência, a culpa e a morte do homem.

Sobre o “lugar da misericórdia”, como veremos, o sacerdote aspergia o sangue da expiação, a garantia de que a morte, a qual o homem trouxe sobre si mesmo, foi vicariamente expiada pela morte do animal sacrifica-do. Querubins estão esculpidos sobre as pontas do kapporeth, com suas asas estendidas sobre ele. Relembramos que havia querubins com espada refulgente lá na entrada do Éden para guardar o caminho da árvore da vida, para que o homem não comesse dela e vivesse para sempre. Assim, a arca representa novamente o duplo aspecto da aliança de Deus. Por um lado, Lei que, intransigentemente, condena o pecado e o pune com

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a morte. Por outro, evangelho, pelo qual o Deus de toda a misericórdia encontra no sangue o preço da expiação em favor do homem.

O segundo substantivo derivado de kaphar é kippurim, que pode ser literalmente traduzido como “expiações”. É usado apenas oito vezes, sendo a forma nominal normal para kaphar. Seu uso mais comum está na expressão yom kippurim, o Dia da Expiação.

O terceiro substantivo é kopher, normalmente traduzido como “res-gate”. No próximo capítulo teremos oportunidade de referir-nos a ele ao falarmos da redenção.

Toda discussão sobre o sangue da expiação nos coloca, imediatamente, dentro de todo o sistema sacrificial ordenado por Deus ao seu povo Isra-el. Não precisamos discutir detalhadamente os vários tipos de sacrifício. É, porém, necessário um pequeno esboço da maneira geral de proceder. Podemos observar sete etapas:

1. O animal a ser sacrificado é cuidadosamente escolhido. 39 passagens indicam o quanto é importante que ele seja perfeito, sem mácula. A lista mais detalhada de exigências é a que está em Lv 22.18-25.

2. O homem que traz o sacrifício coloca a sua mão sobre a cabeça do animal, significando que o animal morre vicariamente, em favor do homem (Lv 1.4; 3.2, 8, 13; 4.4, 15, 24, 29).

3. O animal é morto, cortando-se a sua garganta. O sangue é recolhido numa bacia (Êx 12.22; 24.6).

4. O sangue é usado cerimonialmente. Aqui existe grande variação, dependendo do tipo de sacrifício. O sangue é aspergido sobre o altar (Êx 24.6; Lv 1.5), colocado sobre as pontas do altar (Lv 16.18), aspergido sobre as vasilhas do altar e do Tabernáculo (Lv 16.16), ou derramado na base do altar (Lv 4.7). Na congregação dos sacerdotes ele é colocado na ponta da orelha direita, sobre o polegar da mão direita, no dedão do pé direito (Lv 8.23, 24), e é aspergido sobre as suas vestes (Lv 8.30). Aplicação similar de sangue é exigida na cerimônia de purificação de um leproso (Lv 14.14). Sangue é aspergido sobre o povo (Êx 24.8). No Dia da Expiação ele é aspergido sobre e diante do lugar da misericórdia da arca da aliança, no Santo dos Santos (Lv 16.14). Na Páscoa ele é posto, juntamente com hissopo, nos batentes dos lados e de cima das portas das casas (Êx 12.7).

5. Tira-se o couro do animal; a gordura e certas partes internas são removidas, e a carcaça é cortada em pedaços, de acordo com um padrão determinado (Lv 1.6-17; 3.9-11).

6. Então, outra vez, a maneira de proceder varia muito, de acordo com o tipo de sacrifício. Há três tipos principais, cada um com variações. Na oferta queimada (Lv 1), o animal inteiro era queimado sobre o altar. No

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caso de ofertas por transgressão e pecado (Lv 4-7), eram queimadas sobre o altar apenas a gordura e as partes internas. O restante era queimado no local das cinzas, fora do acampamento. Em alguns casos a carne da oferta pelo pecado, ou parte dela, era comida pelos sacerdotes. Em outros casos (por exemplo, quando a oferta era feita pelos pecados do sacerdote ou quando o sangue era usado dentro do tabernáculo) o sacrifício era total-mente queimado. No caso de ofertas pacíficas (Lv 3.7, 11-38) que eram, na verdade, sacrifícios espontâneos de ação de graças e louvor, o peito e a coxa direita eram comidos pelos sacerdotes. O restante da carne, pelo ofertante e sua família, com a restrição de que poderia comer somente aquele que era moral e cerimonialmente limpo. A gordura e as partes internas eram queimadas sobre o altar.

7. As cinzas do que foi queimado sobre o altar eram levadas para fora do acampamento, ao lugar das cinzas, onde eram queimadas as ofertas pelo pecado (Lv 4.12; 6.11).

Todas as normas para o sacrifício, com seu significado, podem ser re-sumidas a partir dos cerimoniais relacionados com o Dia da Expiação, con-forme apresentado em Lv 16. Todos os sacrifícios prescritos neste capítulo são, evidentemente, acrescentados às ofertas matutinas e vespertinas de ovelhas queimadas oferecidas diariamente durante o ano (Êx 29.38-44), pelo que o fogo sobre o altar nunca deveria apagar (Lv 6.12,13). Cinco animais estão envolvidos nos sacrifícios do Dia da Expiação:

1. O primeiro é um novilho, que Arão, o sumo sacerdote (ou os su-mos sacerdotes, seus filhos, depois dele, Lv 16.32), oferece como “oferta pelo pecado, que é por ele mesmo”, fazendo assim “expiação por si e por sua casa” (v 6). Arão leva um punhado de incenso e um incensário com brasas vivas para dentro do Santo Lugar, no interior do véu, e lá coloca o incenso sobre o fogo, de tal modo que a nuvem de fumaça cobre a Arca da Aliança e o lugar da misericórdia. Então Arão traz o sangue do novi-lho recém imolado por ele e o asperge diante do lugar da misericórdia e sobre o mesmo por sete vezes (vv. 11-14). A gordura do novilho é poste-riormente queimada sobre o altar (v. 25), e a carne é queimada fora do acampamento (v. 27).

2. A segunda oferta é um dos bodes, uma oferta pelo pecado do povo (v. 15). Dois bodes são, a princípio, escolhidos, e por sorte se determina qual deles será sacrificado e qual será o bode emissário (v. 8). O sangue do bode morto, como o do novilho, é trazido para dentro do véu e espar-gido sobre o lugar da misericórdia, bem como diante dele. Esta aspersão do sangue faz expiação pelo santo lugar, que é profanado por causa dos pecados do povo de Israel (v. 16). O sangue da aspersão também faz expiação pelo Tabernáculo e pelo altar (vv.16,19), que também precisam ser “purificados e santificados por causa da impureza dos filhos de Israel”.

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Sangue do novilho e do bode são colocados nas pontas do altar (v. 18). A gordura do bode é posteriormente queimada sobre o altar, junto com a do novilho. A carne do bode é queimada fora do acampamento.

3. O terceiro animal envolvido nos cerimoniais do Dia da Expiação é o bode emissário. Arão coloca ambas as mãos sobre a cabeça do bode vivo, e confessa sobre ele “todas as iniquidades dos filhos de Israel, todas as suas transgressões e todos os seus pecados, colocando-os sobre a cabeça do bode” e então o envia ao deserto, carregando todas as iniquidades deles (Lv 16.21,22).

4. Os dois últimos são carneiros, oferecidos agora como ofertas quei-madas. O primeiro, para fazer expiação pelo próprio Arão; e o segundo, pelo povo (vv. 3,5,24). O pleno significado e aplicação dos cerimoniais do yom kippurim são sumarizados nos dois últimos versículos de Lv 16:

E ele [o sumo sacerdote] fará expiação pelo santuário: pela tenda da congregação e pelo altar, também a fará pelos sacerdotes e por todo o povo da congregação. Isto vos será por estatuto perpétuo, para fazer expiação uma vez por ano pelos filhos de Israel por causa dos seus pecados.

Pode-se perceber imediatamente, a partir deste breve resumo, que não

há qualquer lugar para o conceito de sacrifício como algo que o homem dá a Deus. Para todas as religiões pagãs o sacrifício significa que o homem priva a si mesmo de algo ou suporta o sofrimento a fim de conquistar a compaixão e o favor de Deus. Desta forma, o sacrifício pagão vem a ser, consequentemente, uma tentativa humana de subornar a Deus ou de colo-car Deus em débito Consigo mesmo. Que toda idéia assim é coisa nojenta para Deus é-nos dito num texto como Rm 11.35: “Ou quem primeiro deu a Ele para que lhe venha a ser restituído?”

Ou vejam a passagem ricamente poética do Salmo 50.5-13, onde Deus reprova Seu povo por imaginarem que com seus sacrifícios eles estavam dando algo a Deus quando, na realidade, tudo o que porventura pudessem dar, já pertence a Deus:

Congregai os meus santos, os que comigo fizeram aliança por meio de sacrifícios (...) Escuta, povo meu, e eu falarei; ó Israel, e eu testemunharei contra ti; Eu sou Deus, o teu Deus. Não te repreendo pelos teus sacrifícios, nem pelos teus holocaustos continuamente perante mim. De tua casa não aceitarei novilhos, nem bodes dos teus apriscos. Pois são meus todos os animais do bosque, e as alimárias aos milhares sobre as montanhas. Conheço todas as aves dos montes, e são meus todos os animais que pu-

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lulam no campo. Se eu tivesse fome não to diria, pois o mundo é meu, e quanto nele se contém. Acaso como eu carne de touros? Ou bebo sangue de cabritos? (Veja também Dt 10.14, 16, 17).

Até mesmo Israel, sempre que perdia de vista o verdadeiro significado do sangue, era levado, inevitavelmente, a uma falsa noção de sacrifício. E mais: uma vez que sua concepção de sacrifício se degenerou em pio suborno de Deus, perdeu-se toda a verdadeira distinção entre Javé e os deuses das nações, como veremos logo a seguir. Não importa por qual nome Deus é chamado; sim, é perfeitamente razoável sacrificar tanto a Baal nos lugares altos, como a Javé no Templo.

O profeta Miquéias traz uma poderosa mensagem (6.6,7), mostrando a loucura de qualquer tentativa humana para comprar o favor de Deus com sacrifícios:

Com que me apresentarei ao Senhor e me inclinarei ante o Deus excelso? Virei perante ele com holocaustos? Com bezerros de um ano? Agradar-se-á o Senhor de milhares de carneiros? de dez mil ribeiros de azeite? Darei o meu primogênito pela minha transgres-são? o fruto do meu corpo pelo pecado da minha alma?

Esta é uma interessante lista de estágios através dos quais pode passar um homem, querendo silenciar a voz da consciência e conquistar o favor de Deus. Primeiro virá com ofertas queimadas. Se isto não lhe assegura a paz com Deus, ele pode oferecer grandes presentes – milhares de carnei-ros, dez mil ribeiros de azeite. Se estes não satisfazem, pode ser levado a oferecer a Deus aquilo que lhe é mais precioso, o sacrifício supremo que alguém poderia imaginar – e tenham piedade dos pobres pagãos que, na sua desesperadora luta para comprar o favor de Deus, estavam dispostos a fazê-lo – o primogênito, o fruto do seu corpo, pelo pecado da sua alma. Todas estas tentativas pagãs de apaziguar a consciência e encontrar a paz com Deus são realmente patéticas, tanto mais porque repousam sobre a premissa blasfemadoramente falsa de que a misericórdia de Deus está à venda, e que o homem tem o poder de merecer e comprar o favor de Deus.

O espírito do sacrifício, na Lei do AT, não tem nada a ver com essas concepções pagãs. Em nenhum lugar tem-se a mínima impressão de que o homem, ao oferecer sacrifícios a Deus, estivesse oferecendo a Deus um presente. Ao contrário, através do sacrifício Deus concede Seus dons ao homem. No sangue do sacrifício Deus está derramando sobre o homem as riquezas da graça perdoadora. Este é o significado da palavra “expiação”. Em Levítico, sempre de novo encontramos uma expressão como a seguinte, que resume a essência do sacrifício: “O sacerdote fará expiação por ele

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com respeito ao seu pecado; e lhe será perdoado” (Lv 4.20, 26, 31, 35, etc.). No sacrifício, o homem não sobe a Deus. Pelo contrário, Deus desce até o homem. Esta grande realidade é enfatizada em Lv 1.4: “E ele [o homem que traz o holocausto voluntário] porá sua mão sobre a cabeça da oferta queimada; e será aceito a favor dele para fazer expiação por ele”.

Observem as palavras: “será aceito em favor dele”. Deus não é obriga-do, em nenhum sentido. A aceitação do sacrifício é um ato de pura graça, e o homem permanece para sempre devedor a Deus. Ou lembrem novamente da passagem principal, Lv 17.11: “Pois a vida da carne está no sangue; e eu vo-lo dei sobre o altar para fazer expiação por vossas almas”.

O sacrifício não é expediente humano para conquistar o favor de Deus. É o meio de Deus para trazer Sua graça e perdão ao homem, pois Ele diz: “Eu vo-lo dei para fazer expiação em favor de vossas almas”, i.e., pela vida que perdestes por causa do vosso pecado. Assim é perfeitamente compatível que Deus exija humildade da parte do Seu povo. Em momento algum ousariam eles pensar que seriam melhores do que os outros povos; que haviam merecido a graça. Em suas últimas palavras a Israel, Moisés extravasa a fim de gravar a importância da humildade total, autoesvazia-dora, perante Deus, humildade que dá toda a glória a Javé. Ele diz, por exemplo, em Dt 7.6-8:

Porquanto tu és povo santo ao Senhor teu Deus: o Senhor teu Deus te escolheu, para que lhe fosses o seu povo próprio, de todos os povos que há sobre a terra. Não vos teve o Senhor afeição, nem vos escolheu, porque fôsseis mais numerosos do que qualquer povo, pois éreis o menor de todos os povos, mas porque o Senhor vos amava [pura graça], e para guardar o juramento que fizera a vossos pais [pura fidelidade], o Senhor vos tirou.

Ou, novamente, Dt 9.4-7, 24:

Não digas no teu coração: Por causa da minha justiça é que o Se-nhor me trouxe a esta terra para a possuir (...) Não é por causa da tua justiça, nem pela retitude do teu coração que entras a possuir a sua terra, mas pela maldade destas nações o Senhor teu Deus as lança fora, de diante de ti; e para confirmar a palavra que o Senhor teu Deus jurou a teus pais, Abraão, Isaque e Jacó. Sabe, pois, que não é por causa da tua justiça que o Senhor teu Deus te dá esta boa terra para possuí-la, pois tu és um povo teimoso. Lembrai-vos e não vos esqueçais de que muito provocastes à ira o Senhor vosso Deus no deserto (...) Rebeldes fostes contra o Senhor desde o dia em que vos conheci.

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De fato, toda exortação para temer ao Senhor, para amá-lo de todo o coração, alma e entendimento, confiar nEle, tomar cuidado para não esquecê-lo – tudo isso é exortação para dar toda a glória ao Senhor e, portanto, para o completo autoesvaziamento e humildade pessoal. Ou-trossim, Deus exige arrependimento e confissão dos pecados junto com os sacrifícios que Seu povo oferece. Vimos como Arão confessa os pecados do povo sobre o bode emissário no Dia da Expiação. Do homem que peca e que traz uma oferta pelo pecado para sua expiação, exige-se dele “confessar que pecou nisso” (Lv 5.5). Se, quando o povo tiver entrado na terra que Deus lhes daria, eles se tornassem arrogantes e O esquecessem, então Deus os afligiria amargamente. Mas Deus promete em Lv 26.40-42:

Mas se confessarem a sua iniquidade, e a iniquidade de seus pais, na infidelidade que cometeram contra mim; como também que andaram contrariamente para comigo, pelo que também fui contrário a eles, e os fiz entrar na terra dos seus inimigos; se o seu coração incircunciso se humilhar, e tomarem eles por bem o castigo de sua iniquidade, então me lembrarei da minha aliança.

Com este plano de fundo podemos prontamente resumir a disposição mental com a qual o israelita devia oferecer seu sacrifício para que este atingisse seu objetivo e trouxesse um aroma agradável a Deus. Ele se apresenta em humildade, como pecador condenado, sabendo que por sua transgressão e pela rebelião do seu coração contra Deus ele merece apenas punição e morte. Nesta humildade ele sabe que não há bondade alguma nele mesmo que pudesse oferecer a Deus como expiação por sua culpa. Ele oferece seu sacrifício cruento: oferece-o em paz e alegria, porque crê na promessa de Deus, de que Deus aceitará este sacrifício como sinal da expiação completa e final pelo seu pecado. E assim ele vai justificado para sua casa, vitorioso sobre a maldição do pecado e da morte; justificado pela graça de Deus, pela fé. Na verdade, a fé não é diretamente mencionada em conexão com as leis do sacrifício. Os filhos de Israel junto ao Sinai não conheciam qualquer formulação dogmática da doutrina da fé. Ainda assim, a fé está poderosamente presente neste esquema global da propiciação. As pessoas são salvas pela fé exatamente como nós. Porque a fé, afinal, é produzida no coração do homem não por ele saber que necessita dela, nem mediante intensos esforços para obtê-la, mas através da simples consideração da Palavra e das graciosas promessas de Deus.

A importância da fé é destacada pelas muitas passagens nos Salmos e nos Profetas que descrevem a justa indignação de Deus contra o Seu povo quando os sacrifícios são realizados, não em arrependimento e fé,

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mas por questão de rotina religiosa – como os sacrifícios pagãos – pelos quais o homem procura subornar a Deus, querendo submetê-lo ao próprio homem. Por isso:

Pois não te comprazes em sacrifícios, do contrário eu tos daria: e não te agradas de holocaustos. Sacrifícios agradáveis a Deus são o espírito quebrantado; coração compungido e contrito não o desprezarás, ó Deus (...) Então te agradarás dos sacrifícios de justiça, dos holocaustos e das ofertas queimadas; e sobre o teu altar se oferecerão novilhos (Sl 51.16-19).

Aqui está claro que o sacrifício é agradável a Deus somente quando é oferecido em humildade e arrependimento, ou nessa fé que, por meio do sacrifício recebe, para sua salvação, a promessa divina de perdão e expiação. Pensamento idêntico é expresso nos Profetas. Desta forma, Is 66.2,3:

(...) O homem para quem olharei é este: o aflito e abatido de espírito, e que treme da minha palavra. O que imola um boi é como o que comete homicídio; o que sacrifica um cordeiro, como o que quebra o pescoço a um cão; o que oferece uma oblação, como o que oferece sangue de porco; o que queima incenso, como o que bendiz a um ídolo (...).

Os sacrifícios ordenados por Deus são tão horrivelmente pervertidos quando oferecidos com qualquer outra coisa que não seja com espírito contrito, humildade e fé na Palavra e nas promessas de Deus. Ou, nova-mente, Os 6.6: “Pois misericórdia quero, e não sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que os holocaustos” (veja também Is 1.11ss; Jr 6.20; 7.21-23; Os 8.13).

Seria bom observar agora, porém, que por causa de toda a sua indignação contra a frieza irregenerada, na qual Israel trazia os seus sacrifícios, os Profetas não têm a intenção de rejeitar a própria aliança sacrificial em si. Que o significado essencial do sacrifício não tenha sido modificado desde os dias de Moisés e Arão, está expresso em passagens como as seguintes:

Porque no meu santo monte (...) requererei as vossas ofertas e as primícias das vossas dádivas, com todas as vossas coisas santas. Agradar-me-ei de vós e do vosso aroma suave (...). Ez 20.40,41.

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Prepararão os sacerdotes sobre o altar os vossos holocaustos e as vossas ofertas pacíficas; e eu vos serei propício, diz o Se-nhor Deus. (Ez 43.27. Veja também Jr 33.11,18; Zc 14.24; Ml 3.3,4).

Ainda outro pensamento em relação ao sangue da expiação, como o encontramos nos sacrifícios veterotestamentários: o sangue de animais não possui valor intrínseco para fazer expiação pelo pecado e morte do homem. Em última análise, o sangue do animal está muito aquém de servir como verdadeiro substituto para o sangue do homem. Desta forma, Hb 10.4: “É impossível que sangue de touros e de bodes remova pecados”. Este fato é reconhecido, indiretamente, também no AT. O bode emissário, do Dia da Expiação, não derrama seu sangue na morte; e ainda assim é claramente afirmado (Lv 16.10, 21, 22) que o sacerdote faz expiação também com o bode emissário por todos os pecados do povo. Outrossim, é interessante examinar a proporção de ofertas pela culpa aceitáveis a Deus, conforme esboçado em Lv 5.6-13. Primeiramente exige-se uma cordeira ou um dos cabritos. Porém, se o homem não pudesse trazer uma ovelha, então podia trazer duas rolas, ou pombinhas. Mas, se não pudesse trazer nem mesmo isso, então traria a décima parte dum efa de flor de farinha como oferta pelo pecado. Isso será, então, queimado pelo fogo sobre o altar; e assim o sacerdote fará expiação pelo seu pecado, e lhe será perdoado. É evidente, portanto, que Deus não está preso ao sangue de animais na aliança que Ele fez com o homem. Ele pode dispensar isso. Pode expiar em favor do pecado do homem sem o sangue, como no caso do bode emissário, ou na oferta de flor de farinha. Evidentemente, o sangue não salva por seu próprio mérito. Ele, na verdade, não é o preço a ser pago pelo pecado do homem. Pelo contrário, o sangue é o símbolo ou sinal da aliança de Deus, como é diretamente expresso na instituição da Páscoa (Êx 12.13. cf cap. V) e, indiretamente, em conexão com a circuncisão (Gn 17.11. cf. cap. IV). Os sacrifícios do AT são, desta forma, semelhantes aos sacramentos do NT. Exatamente como pergunta Lutero: “Como pode a água fazer coisas tão grandes?”, assim podemos também perguntar aqui: “Como pode o sangue de animais fazer coisas tão grandes?”. E a resposta seria semelhante à de Lutero: “Realmente não é o sangue que as faz, mas a Palavra de Deus, Sua ordem e promessa, que está em e com o sangue, e a fé que crê nessa Palavra de Deus no sangue”. Também isso precisa ser acrescentado. Exatamente como as promessas que Deus une ao Batismo e à Ceia do Senhor repousam diretamente sobre o preço que Ele pagou pelo pecado do homem em Jesus, seu Filho, assim também as promessas que Deus uniu aos sacrifícios do Seu povo no AT repousavam diretamente sobre a maravilhosa verdade de que o próprio Deus, na ple-nitude do tempo, irá oferecer, em favor do homem, o único sacrifício de

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todos os tempos que, literal e intrinsecamente, é mais precioso do que o homem e que, literal e intrinsecamente, pode ser o substituto do homem na morte e todas as suas consequências. Este sacrifício é o próprio Deus, na pessoa de seu Filho Unigênito.

Esta abençoada verdade nos leva ao sangue da expiação, como o encontramos no NT. É digno de nota que a palavra “expiação”, embora muito comum no AT, como tradução da Versão Autorizada para kaphar, é usada apenas uma vez no NT como tradução do grego katallagee, em Rm 5.11: “(...) por intermédio de quem [Cristo] acabamos de receber agora a expiação.” Em todos os outros exemplos em que katalasso e suas formas nominais são usadas no NT, são traduzidos como “reconciliar” ou “recon-ciliação”. Certamente não há perda nesta diferença, pois “reconciliação” e “expiação” são sinônimos. A diferença encontra-se também no AT, na Versão Autorizada, onde “reconciliar” ocorre sete vezes como tradução de kaphar (normalmente traduzido como “fazer expiação”).

Para o nosso intento é mais importante ver como o hebraico kaphar é traduzido na Septuaginta (LXX), pois normalmente é ela que estabelece o precedente pelo qual os conceitos do AT são vertidos para o grego do NT. Consistentemente a LXX traduz “kaphar” com o verbo exilaskomai, “aplacar, conciliar, ser misericordioso”. Porém, esta forma exata não ocorre em todo o NT. Ali encontramos apenas hilaskomai, sem o prefixo ex. E mesmo esta ocorre apenas duas vezes. Uma delas é a súplica do cobrador de impostos no Templo: “Ó Deus, sê misericordioso (hilastheeti) para comigo!” (Lc 18.13). A outra é Hb 2.17: “Convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos seus irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote (...) para fazer propiciação (eis to hilaskesthai) pelos pecados do povo.”

A forma nominal hilasmos ocorre duas vezes em 1 João: “Ele é a pro-piciação pelos nossos pecados” (2.2); e: “Deus enviou o seu Filho como propiciação pelos nossos pecados” (4.10). Outro substantivo derivado é hilasteerion. Esta é a palavra consistentemente usada na LXX para traduzir kapporeth ou “lugar da misericórdia”. Ocorre no mesmo sentido em Hb 9.5. O outro lugar no qual ocorre no NT é Rm 3.25, onde a Versão Autorizada a traduz como hilasmos, “propiciação”: “O qual Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé”. Visto que a palavra é tão pouco usada no NT, provavelmente nunca será categoricamente decidido se hilasteerion, nesta passagem, é melhor traduzido como “propiciação” ou se deveria ser “lugar da misericórdia”. A última é apropriada quando conhecemos o significado de kapporeth no AT. Precisamente como o lugar da misericórdia cobre a Lei e a ira de Deus, assim Cristo o faz. Exatamente como aquele tem este poder porque é aspergido pelo sangue do sacrifício, assim Cristo nos protege da ira de Deus, sendo ela (a ira) aspergida, como foi, com

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o sangue do Seu próprio sacrifício de Si mesmo. Assim como os judeus deviam crer que a ira de Deus estava aplacada mediante esta aspersão de sangue, assim também nós devemos ter fé no sangue de Cristo. Final-mente, assim como o lugar da misericórdia simbolizava a própria presença real, local, de Deus entre seu povo (Êx 25.22; Lv 16.2), da mesma forma, na pessoa de Cristo Deus está verdadeira e realmente presente entre os homens. Por isso, talvez, a verdadeira intenção do apóstolo Paulo seja que traduzamos assim as suas palavras: “Deus propôs a Cristo para ser o lugar de misericórdia, mediante a fé no Seu sangue.”

Em todo caso, qualquer que seja a palavra mediante a qual a idéia da expiação é levada do Antigo Testamento para o Novo, é muito claro é inconfundível que a expiação, no NT, está sempre ligada a Cristo; mais especificamente, ao sangue de Cristo, que oferece a Si mesmo pelo pe-cado. Em Cristo chega ao seu pleno auge e cumprimento todo o conceito veterotestamentário do sangue que faz expiação em favor da alma (vida) do homem. Este pensamento é o cerne do evangelho do NT, ocorrendo literalmente dezenas de vezes. Observem nestes exemplos a contínua referência ao sangue, i.e., à morte de Cristo, Seu auto-sacrifício:

Rm 3.25: O qual Deus propôs como propiciação mediante a fé no Seu sangue.Rm 5.9: Sendo agora justificados pelo Seu sangue, seremos por Ele salvos da ira.Rm 5.10: Fomos reconciliados com Deus mediante a morte do Seu Filho.Rm 5.11: Por Ele (Cristo) acabamos agora de receber a expia-ção.2Co 5.19: Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mun-do.2Co 5.21: Ele o fez pecado por nós. (Observem: hamartia é a tradução comum da LXX para o hebraico chattath, ora significando “pecado”, ora “oferta pelo pecado”.)Gl 1.4: O qual a Si mesmo se entregou pelos nossos pecados.Ef 2.13: Vós, que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo.Ef 5.2: Cristo (...) se entregou a Si mesmo por nós, como oferta e sacrifício a Deus em aroma suave.Cl 1.19,20: Aprouve ao Pai (...) tendo feito a paz por meio do sangue da Sua cruz, por meio Dele reconciliar Consigo todas as coisas.1Pe 1.2: (...) a aspersão do sangue de Jesus Cristo.1Jo 1.7: O sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo

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pecado. (Lembre-se novamente Lv 16:30: Porque naquele dia se fará expiação por vós, para purificar-vos: e sereis purificados de todos os vossos pecados perante o Senhor.)1Jo 5.6: Este é o que veio por meio de água e sangue (...).Ap 1.5: Aquele que nos ama, e pelo Seu sangue nos libertou dos nossos pecados.Ap 7.14: São estes (...) que lavaram suas vestiduras e as alve-jaram no sangue do Cordeiro.Jo 1.29: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.

Nenhum judeu experiente nos sacrifícios e na terminologia do AT teria qualquer dúvida a respeito do sentido e do significado destas alusões. Todas elas apontam para Cristo como o cumprimento de todas as promessas de Deus, dadas no sangue do AT. Cristo Jesus é o Sacrifício Final, o fim de todos os sacrifícios. A expiação vicária e a morte substitutiva em favor da morte do homem se encontram apenas nEle. Seu sangue não é mais o símbolo ou sinal da aliança da graça. Sua morte é a aliança. O homem é a coroa da Criação. Por isso, em toda a Criação não se pode achar subs-tituto de valor suficiente para sofrer a morte do homem e para suportar o inferno do homem em seu lugar. De fora da Criação, Deus, o próprio Criador, entra em cena e, em seu Filho, torna-se sacrifício tão digno e glorioso que pode expiar plena e apropriadamente por todo o pecado, de todo o mundo, de todos os tempos.

O desenvolvimento mais poderoso deste pensamento central encontra-se na Epístola aos Hebreus. Não podemos aqui fazer um estudo exegético desta maravilhosa Epístola. Há, porém, cinco pensamentos principais re-lacionados à aliança do sangue e, especialmente, ao sangue da expiação, que eu gostaria de assinalar resumidamente.

1. O Autor de Hebreus reconhece, como o faz a Bíblia toda, que o grande e universal problema do homem é o do pecado e da morte. De-pois de glorificar a divindade de Cristo no primeiro capítulo, ele se volta, no segundo, à Sua humanidade. Nos versículos 14 e 15 o Autor explica a principal necessidade desta humanidade nestas palavras: “Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que por sua morte destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo, e livrasse a todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a vida”.

A maldição de Deus sobre o pecado não pode ser ab-rogada. A maldição da morte deve ser executada plenamente. Para carregar essa maldição em favor do homem é que Cristo, o Filho de Deus, assume carne humana. Acima de tudo, porém, observe-se a ênfase sobre a morte como o proble-ma mais crucial para a existência humana. Tudo na vida torna-se inútil e infrutífero se o homem tem de morrer. A morte é o terrível verdugo que

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transforma a vida em jugo e escravidão. Liberdade em relação à morte, vitória sobre ela – esta é a grande e universal necessidade do homem.

2. O Autor desta Epístola reconhece que não se pode obter a vitória sobre a morte, a não ser pela morte. A aliança da graça de Deus, por sua própria natureza e objetivo, exige a morte, i.e., o derramamento de sangue. Este pensamento, já expresso na passagem acima referida, é desenvolvido em Hb 9.16-17: “Porque onde há testamento é necessário que intervenha a morte do testador; pois um testamento só é confirma-do no caso de mortos; visto que de nenhuma maneira tem força de lei enquanto vive o testador”.

A partir da própria palavra “testamento” o Autor deduz que a morte é necessária. O próprio fato de Deus, o Testador, estabelecer uma “intenção” ou “testamento” com o homem, é uma indicação clara da necessidade da morte; sim, mesmo esse Deus, o Testador, espera morrer para trazer o testamento à viva realidade em favor dos homens. Dever-se-ia observar que esta aplicação da palavra “testamento”, embora inerente ao grego diathekee, não está diretamente ligada ao hebraico berith. Apesar disso, serve extraordinariamente para ilustrar a necessidade da morte – fato esse que o autor agora se põe a provar diretamente, a partir das Escrituras do AT (especialmente Êx 24):

Pelo que nem a primeira aliança foi sancionada sem sangue; por-que, havendo Moisés proclamado todos os mandamentos segundo a lei, a todo povo, tomou o sangue dos bezerros e dos bodes, com água, e lã tinta de escarlate, e hissopo, e aspergiu não só o próprio livro, como também todo o povo, dizendo: Este é o sangue da aliança, a qual Deus prescreveu para vós outros. Igualmente também aspergiu com sangue o Tabernáculo e todos os utensílios do serviço sagrado. Com efeito, quase todos as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e sem derramamento de sangue não há remissão. (Hb 9.18-22).

A referência, no último versículo, à “purificação” e “remissão” pelo sangue, reconhece, mais uma vez, que o pecado do homem é que pro-duz a sua morte; e que a vitória sobre a morte vem com a remissão dos pecados. Todavia, essa remissão, como se demonstra por toda a lei ceri-monial do AT, somente é possível através do derramamento de sangue, isto é, pela morte.

3. O autor deixa claro que o sangue de animais no AT não possui valor intrínseco para libertar o homem do pecado e da morte. É apenas um sinal que aponta para o sacrifício de Cristo. Sim, mesmo os pecados cometidos sob a antiga aliança são efetiva e realmente purgados, não

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pelo sangue dos sacrifícios de animais, mas pelo sangue de Cristo. Desta forma, Hb 9.13-15:

Portanto, se o sangue de bodes e de touros, e a cinza de uma novilha, aspergida sobre os contaminados os santifica, quanto à purificação da carne (i.e., vestimentas terrenas, vasos, etc.), muito mais o sangue de Cristo que, pelo Espírito eterno, a si mesmo se ofereceu a Deus, purificará a nossa consciência de obras mortas para servirmos ao Deus vivo! Por isso mesmo, ele é o Mediador da nova aliança a fim de que, intervindo a morte para a remissão das transgressões que havia sob a primeira aliança, recebam a promessa da eterna aliança aqueles que têm sido chamados.

Assim, quando os santos do AT escapavam da ira de Deus sobre os pecados deles, não era porque Deus debilmente fechava os olhos e dava as costas à Sua própria Lei divina. Pelo contrário, eles podiam ser perdoa-dos por um Deus justo devido à propiciação de Cristo, o perfeito sacrifício porvir. Esta é a maravilha do Deus que permanece justo, e mesmo assim é o justificador daquele que crê em Jesus (Rm 3.26).

A inadequação dos sacrifícios veterotestamentários é sublinhada tam-bém em Hb 10.1-4:

Ora, visto que a Lei tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas, nunca jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano, per-petuamente, eles oferecem. Doutra sorte, não teriam cessado de ser oferecidos, porquanto os que prestam culto, tendo sido purificados uma vez por todas, não mais teriam consciência de pecados? Entretanto, nesses sacrifícios faz-se recordação de pe-cados todos os anos, porque é impossível que sangue de touros e de bodes remova pecados.

4. Jesus Cristo, sacrificando-se a Si mesmo, é o Fim de todos os sa-crifícios de animais. Ele mesmo é santo, separado dos pecadores, sem defeito nem mácula. Por isso Ele não necessita, como o sumo sacerdote do AT, fazer primeiro uma oferta por Si mesmo. Não tendo pecado, Ele não está sujeito à morte e, portanto, não tem necessidade de que alguém morra por Ele. Todavia, Ele, o santo Filho de Deus, se oferece a Si mesmo, voluntariamente, uma vez, por todos os homens de todos os tempos. De-pois disso não é mais necessário nenhum outro sacrifício, nenhum outro sangue. Pois o preço do pecado do mundo foi real e completamente pago até ao fim do mundo. Assim, Hb 7.26, 27:

aLIanÇa Do sangue

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Com efeito nos convinha um sumo sacerdote, assim como este, inculpável, sem mácula, separado dos pecadores, e feito mais alto do que os céus, que não tem necessidade, como os sumos sacerdotes, de oferecer sacrifícios todos os dias, primeiro por seus próprios pecados, depois, pelos do povo; porque fez isso uma vez por todas, quando a Si mesmo se ofereceu.

O mesmo pensamento em Hb 9.25-28:

Nem ainda para se oferecer a si mesmo muitas vezes, como o sumo sacerdote cada ano entra no Santo dos Santos com sangue alheio. Ora, neste caso, seria necessário que ele tivesse sofrido muitas vezes desde a fundação do mundo; agora, porém, ao se cumprirem os tempos, se manifestou uma vez por todas, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de Si mesmo. E, assim como aos homens está ordenado morrer uma só vez e, depois disso o juízo, assim também Cristo, tendo-se oferecido uma vez para sempre para tirar os pecados do mundo.

Veja-se também o capítulo 10.10,12,14:

Somos santificados mediante a oferta do corpo de Jesus Cristo, uma vez por todas (...) Jesus, porém, tendo oferecido, para sempre, um único sacrifício pelos pecados, assentou-se à destra de Deus (...). Porque com uma única oferta aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados.

5. O Autor de Hebreus assinala que a verdadeira natureza dessa expiação vicária do sangue de Cristo pelos nossos pecados exige que a creiamos, para que a recebamos pela fé. Desta forma, observem as se-guintes referências colhidas do décimo capítulo:

Irmãos, tendo, pois, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus (...) aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé, tendo os corações purificados de má consciência, e lavado o corpo com água pura. Guardemos firme a confissão da esperança sem vacilar, (pois quem fez a promessa é fiel) (vv. 19, 22, 23).

Todavia o meu justo viverá pela fé (...), porém nós (...) somos da fé, para a conservação da alma. (vv. 38, 39).

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Visto que a expiação do homem custou preço tão elevado, está também ali a seriíssima advertência de que ela não deve ser desprezada:

Sem misericórdia morre pelo depoimento de duas ou três tes-temunhas quem tiver rejeitado a lei de Moisés. De quanto mais severo castigo julgais vós será considerado digno aquele que calcou aos pés o Filho de Deus, e profanou o sangue da aliança com o qual foi santificado, e ultrajou o Espírito da graça? (vv. 28, 29).

Horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo (v.31).

Tanto mais por causa da Expiação. O sangue da expiação é o sangue da aliança de um Deus gracioso. No AT, é o sangue dado por Deus ao homem sobre o altar para fazer expiação em favor de sua alma (Lv 7.11). No NT, é o sangue de Cristo, seu Filho, que nos purifica de todo pecado (1Jo 1.7). Ainda assim existe essencialmente apenas uma única aliança, um só testamento, um só caminho de salvação. Sua origem é a pura e imerecida graça de Deus para com o pecador. Seu preço é sangue. Sob a antiga aliança o preço é o sangue-símbolo, o sangue de animais. É se-melhante ao papel-moeda. O papel moeda não possui qualquer valor em si mesmo. Contudo, ele tem real poder de compra porque existe ouro por trás dele na Caixa Forte e porque a palavra do Governo o confirma. Por trás do sacrifício de animais e daquilo que lhes dá o poder de expiação está a Palavra de Deus, oferecendo ao homem o sangue de Cristo, por Si mesmo eternamente precioso; está também a Sua morte eternamente suficiente para livrar todos os homens do poder da morte, porque Ele é o Filho de Deus. Finalmente, o único caminho de salvação, na Bíblia, não exige nada mais que a fé simples, confiante e penitente.

Salvação por graça, por causa do sangue, mediante a fé. Esta é a salvação de Noé e dos patriarcas antediluvianos que o precederam. É a salvação de Abraão, Moisés, Davi e Paulo. De cada um de nós. Esta é a única religião verdadeira de todos os tempos.

(Continua na próxima edição)

aLIanÇa Do sangue

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AUXÍLIOS HOMILÉTICOS

DOMINGO DA SANTÍSSIMA TRINDADE

19 de junho de 2011

Salmo 8; Gênesis 1.1-2.4a; Atos 2.14a, 22-36; Mateus 28.16-20

CONTEXTO LITÚRGICO

Este é o domingo em que a Santíssima Trindade se torna o tema do culto. Embora o Deus Triúno esteja presente em todos os cultos e men-sagens, e a obra de cada uma das pessoas da Trindade seja necessária para a existência da Igreja, nessa data o pastor tem a oportunidade de explicitar o envolvimento total de Deus em favor de seu povo. Para tanto, as seguintes leituras nos ensinam sobre esse Deus:

Salmo 8: Esse salmo é um hino de louvor a Deus. Davi reconhece a majestade e o domínio do Senhor que estão estampados na criação do universo. O esplendor dessas obras causa espanto e declara o poder e bondade de quem as fez.

Gênesis 1.1-2.4a: O relato da criação também nos ensina acerca da natureza trinitária de Deus e de seu relacionamento conosco. O Espírito aparece logo no v.2, e no v.26 há um plural que revela a Trindade. A fre-quente repetição de que as obras criadas eram boas mostras que o Deus Triúno fez algo perfeito, onde haveria paz e felicidade em sua companhia constante. O plano de Deus era viver em harmonia com a criação. Na história da humanidade e também no relato bíblico, isso tudo aconteceu antes da queda em pecado.

Atos 2.14a, 22-36: Aqui a Santíssima Trindade é crida e ensinada por Pedro da perspectiva da economia de Deus. O Pai confirmou a obra realizada pelo Filho quando o ressuscitou. Depois de ter sido exaltado, o Filho recebeu o Espírito Santo e o derramou. Nessa pregação, o apóstolo mostra o envolvimento de cada uma das pessoas na obra da salvação. Deus está pessoalmente empenhado no resgate de sua criação perdida.

TEXTO

Os onzeAo contrário de outros discursos de Jesus onde os ouvintes são mul-

tidões, aqui Ele fala àqueles que foram testemunhas desde o início e que foram instruídos por Ele com respeito à pregação do evangelho. Hoje em dia ninguém se enquadra nesta descrição. No entanto, aqueles que são chamados pela igreja a fim de se dedicarem ao estudo e ensino da

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Palavra, exercem funções que eram comuns aos apóstolos. Dessa forma podemos dizer que a comissão de Cristo é dada também aos pastores da atualidade, embora aprendamos de outras passagens que a Igreja toda dá testemunho de Cristo.

Façam discípulos batizando e ensinandoEsta é a grande comissão dada por Jesus. Quando Deus criou todas as

coisas, não havia necessidade de se fazer discípulos. Todos pertenciam a Ele e eram semelhantes a Ele em justiça e santidade. A harmonia reinava e assim se concretizava a boa vontade de Deus de viver com suas criatu-ras. Agora, muitos anos haviam se passado desde que as pessoas haviam se rebelado contra Deus, escolhendo se desligar dele. Por causa disso Jesus viera, vivera uma vida perfeita e morrera para tirar do ser humano a sentença de morte. Depois de Sua ressurreição, então, Ele lembra os discípulos de que o que Ele fez foi para recuperar os perdidos. A queda e seus efeitos, que ocorreram contra a vontade de Deus, podem ser rever-tidos pelo ato do discipulado. A separação e a morte causadas pelo ser humano e nas quais ele se encontra podem ser remediadas quando este é tornado um discípulo.

De que forma isso ocorre? Através do Batismo e do ensino! Apesar de nossa dificuldade em compreender como isso é possível, Jesus diz que nada mais é necessário. A jornada do ser humano perdido de volta à harmonia com Deus não é através de seus esforços, mas através do Batismo e o posterior (no caso de Batismo infantil) ensino.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito SantoEm Gênesis lemos que o Deus Triúno estava ativo na obra da Criação

perfeita. A Trindade criou o ser humano à sua imagem para com ele viver em comunhão. O ser humano se perdeu, e Jesus diz que há um jeito de Ele voltar: sendo “batizado em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”. Não é um simples Batismo, mas um Batismo em e para o Deus Triúno. A Santíssima Trindade está presente e através do Batismo resgata o homem, fazendo dele nova criatura. Assim como o Deus Triúno atuou na criação de todas as coisas boas, no Batismo Ele atua recriando, reconciliando os perdidos consigo mesmo para com eles viver em harmonia e comunhão.

De todas as naçõesVocê, pastor, e os ouvintes no banco à sua frente estão incluídos aqui.

Sua mensagem, a congregação e os visitantes em sua igreja só existem porque ao longo da história pessoas de todas as nações foram sendo trans-formadas em discípulos por meio do Batismo no Deus Triúno e do ensino das Escrituras. A comissão não acabou. Portanto, ainda hoje Jesus quer que pessoas de todas as nações (não somente luteranos, ou católicos, ou

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pobres, ou ricos, ou brancos, ou negros, etc.) sejam batizadas e ensinadas, a fim de que todos possam participar da nova criação perfeita de Deus.

Jesus está no controleJesus começa Sua conversa com os discípulos dizendo: “Toda a autori-

dade me foi dada no céu e na terra.” Esta frase não está ali por acidente. Há uma conexão evidente entre Sua autoridade e a comissão. O uso da conjunção ou=n no v.19 mostra que a comissão só é possível, ou está ba-seada, na autoridade de Jesus. Em outras palavras, Jesus está dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Portanto [não tenham medo, é por minha conta] vão (ou: quando forem) e façam discípulos. Os discípulos sabiam que nessa missão eles não estariam desamparados, pois quem os enviou foi Jesus, que tem autoridade sobre tudo. O resultado não está nas mãos deles ou nas nossas, mas Jesus é quem está no controle.

Jesus conforta os pregadores do evangelho com a certeza de que eles não estão sozinhos. Depois da comissão Ele diz: “Eu estou com vocês até a consumação do século.” O Todo-Poderoso Jesus não somente comissio-na ou envia, Ele mesmo está presente e realiza a obra, através de Seus instrumentos.

SUGESTÃO DE ESBOÇO

Tema: “O Deus Triúno trabalha para a nossa salvação!” Parte I – Deus nos criou para termos comunhão com Ele (Gênesis será

lido no culto)À Sua imagem (pode-se falar da justiça e bondade de Deus)Escolha errada do ser humano (afastamento e situação atual)Parte II – Deus nos recria para termos comunhão com EleNos perdoa, aceita e transforma quando somos religados a Ele no

BatismoNos ensinaParte III – Deus está conosco para sempreCom amor e sempre pronto a perdoar nesta vidaNa nova e definitiva criação, onde tudo será perfeito

Se preferir enfatizar a obra de cada uma das pessoas, é possível falar do Pai na parte I (criação), do Espírito na parte II (regeneração, Batismo, ensino) e do Filho na parte III (“estou com vocês todos os dias...”).

Alexandre T. VieiraConcordia Seminary, St. Louis, USA

[email protected]

domIngo Da santíssIma trInDaDe

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SEGUNDO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

26 de junho de 2011

Salmo 119.153-160; Jeremias 28.5-9; Romanos 7.1-13; Mateus 10.34-42

CONTEXTO LITÚRGICO/HISTÓRICO

O momento litúrgico em que entramos tem muito a dizer sobre a grande missão da igreja, pois estamos no período de Pentecostes e, como tal, a igreja relembra a sua grande tarefa e, firmada na palavra de Deus, renova suas forças para este grande desafio: anunciar Cristo para todos. Foi uma missão de que foram incumbidos os apóstolos, mas que nos é estendida pelo amor fraterno que Deus coloca em nossos corações para com as almas que vivem sem salvação. Também é um momento em que a igreja pode despertar para a realidade de que não estamos sós, mas a todo instante temos ao nosso lado o paracleto divino que por nós intercede e nos capacita para a missão que deus colocou em nossas mãos: “...mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra” (Atos 1.8).

E para este domingo, os textos selecionados nos dizem algo de impor-tante e significativo para este período:

Salmo 119.153-160: Neste trecho do Salmo, há um apelo apaixonado por livramento e o poder de persistir em sua devoção à palavra de Deus, pois conforme o próprio salmista defende, “A tua palavra é a verdade” (v.160, ARC). E para o período em pauta há algo muito significativo, pois é desta palavra que testemunhamos.

Jeremias 28.5-9: Jeremias nos dá um exemplo que serve de ânimo a agir diante da injustiça e do pecado sempre em prol da palavra de Deus. O profeta chega a ser irônico em relação a se acreditar que pode haver paz no pecado. Ao contrário de Hananias, Jeremias sabia que só o arre-pendimento evitaria a catástrofe. E esta também faz parte do anúncio amoroso que a igreja leva ao mundo revelando as mazelas que o pecado traz ao mundo.

Romanos 7.1-13: Neste trecho, Paulo faz uso de umas das figuras mais estranhas de suas analogias, pois o apóstolo fala da união marital para alegorizar a relação do ser humano para com a lei. No entanto, quando ele fala que ao morrer o marido a mulher fica desobrigada de qualquer sujeição a este, e fica livre para casar com outro, esperaríamos que ele

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comparasse a situação do cristão ao da mulher que está livre para sua relação com Deus, mas ele inverte sua analogia e afirma que nós mor-remos para a lei para poder pertencer a outro. Ainda fala do desejo que a lei desperta em cada um e o perigo que isto pode representar, e isto não porque a lei seja má, mas pelo contrário, pelo fato de o pecado ainda exercer uma terrível força sobre nós.

Mateus 10.34-42: Neste texto Jesus fala dos grandes desafios que representa ser um seguidor seu. Fala que apegar-se a Ele e sua mensa-gem sempre exigirá da pessoa negação de interesses que podem, muitas vezes, representar até mesmo divisão e desentendimento com aqueles que amamos. No entanto, Ele afirma que estes seguidores, apesar de abraçarem a autonegação e tomarem cada um a sua cruz, sempre serão alvo dos cuidados divinos.

O TEXTO PARA A MENSAGEM: MATEUS 10.34-42

Vv. 32-33: Nestes versículos Jesus evoca a fidelidade dos cristãos para com Ele, afirmando que aquele que o negar diante dos homens será negado por Ele diante do Pai, no entanto, aquele que o confessar diante dos homens será confessado por Ele diante de Deus Pai. E estas palavras foram tão fortes na igreja primitiva que Plínio, o governador da Bitínia, certa vez escreveu uma carta ao imperador Trajano falando sobre como tratava os cristãos em sua jurisdição. Ele dava aos tais a oportunidade de invocar os deuses romanos, oferecer um pingo de incenso como sacrifício ante uma imagem do imperador e, à maneira de prova limite, amaldiçoar o nome de Cristo. No entanto, como o próprio Plínio falava, os verdadeiros cristãos preferiam a morte a negar o nome de seu Salvador.

Mas negar a Cristo pode ocorrer de mais de uma forma. Podemos negá-lo ao nos calar quando somos indagados sobre nossa fé, quando mantemos comunhão com o pecado de maneira a justificar o erro. Quan-do preferimos não nos declarar cristãos para que isto não seja motivo de desentendimento com nossos círculos de amizades e etc. Mas se por um lado é difícil mantermos nosso testemunho num mundo tão hostil, por outro temos de Jesus a promessa de que se não o negarmos, também não seremos negados por ele diante do Pai.

Vv. 34-39: Jesus não enrola nem ilude seus discípulos quanto à tarefa de anunciar a sua mensagem, mas deixa claro o que isto acarretará. E esclarece também que será uma aventura cheia de desafios, mas que no final será uma jornada vitoriosa. Willian Barclay diz que nesta passagem Jesus oferece quatro coisas:

Uma luta: luta na qual até os próprios parentes e amigos do cristão serão seus inimigos.

segunDo DomIngo aPÓs PenteCostes

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Uma escolha: nela às vezes será necessário escolher entre nossos laços mais ternos e a fidelidade a Cristo.

Uma cruz: os homens com quem Jesus estava falando tinham visto várias vezes seus compatriotas vergando sob o peso de suas cruzes, e morrendo na mais terrível agonia. Portanto, sabiam que seguir a Cristo implicaria uma tarefa dolorosa.

Uma aventura: o homem que “achar a sua vida estará na verdade perdendo-a” é uma das frases de um significado profundo neste texto, pois negar o Cristo para salvar sua vida pode representar a perda da vida. E ao olharmos para os mártires da antiguidade podemos fazer a seguinte pergunta: Para que nos lembrar destes homens se os mesmos tivessem negado a fé que pregavam?

Epicteto fala algo na mesma direção a respeito de Sócrates: “Ao morrer salvou sua vida, porque não fugiu.”

Ao que parece, não existe espaço para uma política de total segurança na vida cristã. Um cristão pode até mesmo encontrar completo sossego e repouso neste mundo e gozar da vida sem empecilhos, mas isto pode representar a perda do real objetivo da vida neste mundo, que é servir a Deus e ao próximo.

Vv. 40-42: No primeiro século da era cristã, entre os judeus era muito apreciado o fato de se receber um mensageiro de Deus. Para rabinos, “quem oferece sua hospitalidade ao sábio é como se levasse a Deus a oferenda de seus primeiros frutos”.

Receber um embaixador era o mesmo que estar recebendo o rei. Por-tanto, todas as honras deveriam ser dadas aos embaixadores de Deus, pois é o próprio Deus que está com eles. Talvez seja esta a parte mais consoladora da tarefa cristã de anunciar as boas novas neste tempo de Pentecostes. É saber que deus sempre está ao nosso lado e que quem nos recebe, recebe o próprio Deus.

Barclay, ao analisar os versículos 40 a 42 do capítulo 10 do evangelho de São Mateus, citando H. L. Gee, conta a seguinte história:

Havia um moço de um povo de campanha que depois de muitas lutas conseguiu chegar a ser pastor da igreja. Um amigo dele, que era sapateiro em seu próprio povo, tinha-o ajudado para que pudesse seguir seus es-tudos. No dia que o jovem pregador foi ordenado, o sapateiro, que como muitos dos membros de seu ofício era um homem capaz de profundas reflexões, disse-lhe:

“Sempre foi meu desejo ser um ministro do evangelho, mas as circuns-tâncias de minha vida o fizeram impossível. Mas você obteve o que para mim foi um caminho fechado. E quero que me prometa uma coisa: Quero que sempre me permita remendar de graça os seus sapatos. Quando você subir ao púlpito levará postos os sapatos que eu remendei, e então eu

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sentirei que você está pregando o evangelho que eu sempre quis pregar... em meus sapatos” (BARCLAY, 1975, p.429).

Com certeza Deus dará o mesmo galardão aos dois pelo que fizeram, pois ambos estavam servindo a Deus em seu Reino. E o mesmo não é diferente a outras situações similares, pois o próprio Cristo afirma o se-guinte: “E quem der a beber, ainda que seja um copo de água fria, a um destes pequeninos, por ser este meu discípulo, em verdade vos digo que de modo algum perderá o seu galardão.”

SUGESTÃO HOMILÉTICA DE TEMA E PARTES

Título: A cruz e o galardão1ª parte — A fidelidade a Cristo no confessar a fé2ª parte — Os desafios da vida cristã3ª parte — O galardão que nos aguarda e àqueles que nos recebem.

REFERêNCIAS

BARCLAY, Willian. Comentário do Novo Testamento. Formato digital em pdf. Disponível no seguinte endereço: http://www.megaupload.com/?d=QM5OJTOS. Visitado em 15 de julho de 2011.BÍBLIA DE ESTUDO ALMEIDA - Revista e Corrigida. Barueri (SP): Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.CHAMPLIM, Russel Norman. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São Paulo: Voz Bíblica, V. 1 e 2, 1971.DAVIDSON, Francis. O novo comentário da Bíblia. São Paulo: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1997.

Alexsandro Martins MachadoSão Leopoldo/RS

[email protected]

segunDo DomIngo aPÓs PenteCostes

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TERCEIRO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

03 de julho de 2011

Salmo 145.1-14; Zacarias 9.9-12; Romanos 7.14-25a; Mateus 11.25-30

Salmo 145.1-14: Salmo de Davi. Salmo Alfabético. São assim chama-dos, pois as suas estrofes ou seus versículos estão em ordem de acordo com o alfabeto hebraico.

Neste salmo o salmista reconhece a grandeza de Deus. Grandeza esta que ele quer anunciar e por ela dar graças. O júbilo do salmista não está baseado em uma esperança vaga, mas se firma em coisas bem concre-tas, naquilo que o senhor já fez (v.4). E é firmado nesta palavra de Deus que as gerações futuras falarão dos atos poderosos, da grandeza e da bondade de Deus. Quase no final da nossa perícope aparece três vezes a expressão “O TEU REINO”. Esse reino não se caracteriza por ser um reino de domínio e opressão, mas é um reino que acolhe com amor os que passam por necessidade.

Zacarias 9.9-12: A felicidade do povo de Deus depende da vinda do Rei justo e Salvador que estabelecerá um reino de paz destruindo as forças e os poderes deste mundo que oprimem as pessoas. O texto dá bastante ênfase ao fato de o Rei estar vindo ao encontro do seu povo para anunciar a paz aos “cativos e presos de esperança”.

Romanos 7.15-25a: O apóstolo Paulo, em linguagem simples, falando de si mesmo, descreve que o cristão continua sendo um “pobre e miserável pecador” que por força própria não consegue se livrar do pecado, entretanto a sua salvação depende única e exclusivamente de Jesus Cristo.

TEXTO DE MATEUS (11.25-30)

Se observarmos o contexto, perceberemos que entre o texto atual e o anterior temos um verdadeiro contraste. Lá, uma grave acusação; aqui, um amável convite. Lá, uma maldição; aqui, a bênção. “Naquele tempo”. Não sabemos ao certo em que tempo tais palavras de consolo foram proferidas por Jesus. Mateus não nos diz quando isso ocorreu, entretanto Lucas nos diz que elas foram ditas após o retorno dos 70. Contudo não sabemos com precisão quando esse comissionamento aconteceu.

Vv. 25,26: Jesus não usa a expressão “Pai nosso” como na oração que ele ensinou aos seus discípulos, mas ele diz “O Pai”. Às vezes Jesus

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diz “Meu Pai” (Mt 26.39). Os judeus que eram os inimigos de Jesus não gostavam dessa expressão, pois eles interpretavam isso como se Jesus estivesse reivindicando igualdade com Deus (cf. João 5-18). Neste con-texto essa expressão se torna muito apropriada, pois além de Deus ser o Pai de Jesus, Ele também é o Pai de todos aqueles que Jesus chama carinhosamente de pequenino.

Aqui cabe uma importante pergunta: Porque Jesus louva a Deus por ocultar dos sábios e revelar aos pequeninos? A intenção não é salvar a todos? Jesus não está negando a Salvação, mas está afirmando que ela não é compreendida e alcançada pela compreensão humana. Talvez facilite a compreensão se nós relacionarmos aos personagens, neste casso os pequeninos. O termo pequeninos – 11.25 (nhpi,oij) fisicamente falando, refere-se a crianças (crianças que ainda necessitam do peito). Crianças que não têm condições de se defender e são completamente dependentes de alguém. Nesse caso, pequeninos são todos aqueles que sabem que são totalmente dependentes de outro. Pequeninos são todos aqueles que estão convictos da sua absoluta dependência do carinho e da misericórdia do Pai. Esses vão esperar tudo do Pai e vão receber dEle tudo o de que precisam para desfrutar da salvação. Devemos ainda tomar cuidado para não confundirmos os termos “sábios e entendidos” com “pequeninos”. Cristo aqui não está se referindo a pessoas instruídas e pessoas analfabe-tas. O contraste aqui exposto é entre aqueles que imaginam que pela sua sabedoria superior ou por suas obras possam ser salvas, e entre aqueles que reconhecem e compreendem que só pela graça podem ser salvas. Se isso ficar claro para cada um de nós, então podemos dizer com toda certeza que uma pessoa bem qualificada com um intelecto elevado pode ser tida como um “pequenino”, e uma pessoa com pouca instrução pode ser considerada uma pessoa sábia e instruída.

Como entender que Jesus louve por ser assim? Jesus não estava agradecendo pelo fato de os sábios serem ignorantes por confiarem em si mesmo e na sua capacidade, mas ele estava agradecendo porque até mesmos os iletrados sabiam como serem salvos. As palavras “porque as-sim foi do teu agrado” parecem ressaltar que ocultar diante dos sábios e entendidos não foi um acaso nem sequer um acontecimento secundário, mas corresponde ao agrado de Deus. É sua determinação que está por trás do acontecimento, pois é da vontade de Deus que todos sejam salvos. E para que esta salvação aconteça, basta viver e deixar Deus agir em nós e deixar que Ele conduza o curso de nossas vidas.

Jesus louva porque o caminho não é aberto por força ou capacidade, pois se assim fosse nem todos poderiam entrar no reino de Deus. Jesus louva porque o caminho só é aberto através da eterna graça de Deus e desta forma ele está aberto a cultos e incultos, letrados e iletrados, in-

tErCeIro DomIngo aPÓs PenteCostes

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divíduos extraordinariamente talentosos e intelectualmente retardados, ricos e pobres, jovens e idosos, homens e mulheres, escravos e livres, ou seja, todos os seres humanos estão incluídos nos planos de Deus, e por isso Jesus louva. Na verdade o nosso Deus providenciou uma maravilhosa solução para nos livrar da condenação do pecado: a solução é “não faça nada, deixe Deus fazer, apenas confie”.

V. 27: “Tudo me foi entregue por meu pai”. O que Jesus esta querendo dizer com “tudo”? Nos capítulos anteriores Jesus já havia recebido autori-dade do Pai sobre: Satanás (4.1-11), ondas e ventos (8.23-27), demônios (8.28-32), corpo e alma (9.1-8), doenças e males físicos (9.1-8; 9.20-22), vida e morte (9.23-26). Além disso, Jesus já havia recebido do Pai autoridade para: salvar (9.13) e para julgar (7.22-23). Em Mateus 28.18 ainda aprendemos que Jesus recebeu toda autoridade tanto no céu como na terra. A autoridade de Jesus não se limita a esse mundo, mas perpassa todas as dimensões.

“Ninguém conhece o Pai senão o Filho”. Conhecer alguém significa ser capaz de vê-lo assim como o Pai o vê. Portanto aquele que conhece o Pai também deve conhecer e ver o pecador assim como o Pai o vê. E assisti-lo assim como o Pai o assiste em suas necessidades. Somente o Filho conhece o Pai, e somente o Filho conhece o pecador e suas necessi-dades. As palavras “aquele a quem o Filho o quiser revelar” não podem ser interpretadas como se o Filho estivesse relutando em revelar o Pai. Pois anteriormente Jesus louva o Pai por ter revelado a salvação aos pequeni-nos. Essas palavras indicam que a salvação não depende do homem, mas somente da revelação que procede, única e exclusivamente, da vontade do Pai e do Filho que são um só em essência e em propósito.

V. 28: “Vinde a mim”. O que significa ir a Jesus? Nesse nosso texto fica claro que ir a Jesus significa crer nEle, confiar nEle. Essa fé e confiança só podem ser produzidas através do Espírito Santo, pois essa é a sua função, criar e manter a fé para que não tenhamos medo de Deus e dessa forma viver uma vida tranquila, alegre, cheia de paz e amor em relação a si mesmo e também ao seu semelhante.

O belo convite que Jesus faz aos cansados e sobrecarregados é tão importante hoje quanto foi importante para o povo que estava com Ele enquanto ainda andava sobre a terra. Os cansados e sobrecarregados eram todos aqueles que andavam tristes e oprimidos pelos pesados fardos e as difíceis regras e regulamentos postos sobre os seus ombros pelos fariseus e escribas, como se a pessoa só pudesse ser salva através de uma vida de obediência. Quando postas essas regras, o que brota no coração das pessoas é uma enorme incerteza da salvação, e com ela o medo, as dú-vidas, as angústias e um desespero com pouca esperança. Junto com o belo convite vêm as palavras “e eu lhes darei descanso” (NTLH). Jesus não

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está dizendo que teremos uma vida livre de dificuldades, mas o descanso é que mesmo na dificuldade poderemos ter certeza da salvação.

Quando Jesus diz “tomai sobre vós o meu jugo” é como se Ele esti-vesse dizendo “tornem-se meus discípulos”, ou seja, aceitem aquilo que ensinei. Uma pessoa não é salva por obras que faz, mas somente pela obra que eu faço por ela, por isso confiem em mim, pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve, pois ele é desprovido de exigências, mas é farto em doações.

Se o convite de Jesus for levado a sério, perceberemos que ele não somente oferece benefício à alma, mas também beneficia enormemente o corpo. O descanso e a paz ao coração e à mente é exatamente o oposto das opressões que levam muitas pessoas aos médicos, hospitais e até mesmo à morte. A simples ausência de paz no ser humano pode produzir inúmeras doenças. O ensino de Cristo, além de tranquilizar a nossa alma em relação à vida eterna, é também um ensino terapêutico para todo nosso corpo. Jesus é, sem dúvida nenhuma, um Salvador completo.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Tema: Jesus, o Salvador Completo

Jesus, o Salvador que revela o PaiO mundo procura conhecer a Deus, mas pela ciência não conhecerá

o Seu amor.Somente Cristo pode revelar o amor de Deus. A revelação não é restrita a pessoas, mas ela é para todos. Jesus, o Salvador que traz descanso Pois nos livra do peso e do medo das obras da leiE nos convida a confiar nEle e na Sua revelação.Em meio às dificuldades, em Cristo temos paz.

BIBLIOGRAFIA

HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento. Mateus, v.1. Cambuci (SP): Editora Cultura Cristã, 2001.RIENECKER, Fritz. Evangelho de Mateus. Comentário Esperança. Curi-tiba: Editora Evangélica Esperança, 1998.TASKER R. V. G. Mateus: Introdução e Comentário. São Paulo: Editora Vida Nova, 1988.

Celso Valmir GramsSão Leopoldo/RS

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tErCeIro DomIngo aPÓs PenteCostes

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QUARTO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

10 de julho de 2011

Salmo 65. 9-13; Isaías 55.10-13; Romanos 8.12-17; Mateus 13.1-9,18-23

LEITURAS BÍBLICAS DO DIA

Salmo 65: Este Salmo é um hino de ação de graças pela bondade de Deus e pelo seu cuidado em favor de Israel. Fala do perdão dos pecados e da providência de Deus através da natureza que louva o Criador.

Isaías 55.10-13: Esses versículos celebram a alegre saída do povo da Babilônia e comprovam que a palavra de Deus não volta vazia, pois ela é fértil e realiza tudo o que Deus quer.

Romanos 8.12-17: A criação suporta angústias e espera com paci-ência a revelação dos filhos de Deus, pois ficará livre do poder destruidor que a escraviza.

Mateus 13.1-9, 18-23: A parábola do semeador ensina que o Reino do Céu vem através da mensagem do Reino, que pode ser rejeitada, po-rém quando ela é aceita e entendida, produz uma grande colheita. Ouvir a mensagem do Reino é um grande privilégio que vem acompanhado de uma grande responsabilidade. Por isso, Jesus adverte: “Se vocês têm ouvidos para ouvir, então ouçam” (v.9).

CONTEXTO

A inauguração do reino por Jesus, o Messias, já se deu. Ele está aqui, porém muitos não acreditam. Os homens podem rejeitá-lo, e de fato o rejeitam. Na verdade, só o podem aceitar aqueles cujos corações foram preparados para recebê-lo, exatamente como as sementes podem resultar em boa colheita somente quando semeadas em terreno preparado para a sua fertilização. Este é o ponto essencial da parábola do semeador.

As parábolas do capítulo 13 não são histórias com um fundo moral (ético). São ensinos a respeito do Reino de Deus. Ou seja, são ensinos a respeito do que acontece quando o reino de Deus vem ao mundo na pessoa de Jesus. É exatamente a postura da pessoa frente a Jesus que define se haverá entendimento ou não do seu ensino. As parábolas refletem de maneira bela, quase poética, a bênção que é ter o Reino de Deus se ma-nifestado (e estar se manifestando) entre a humanidade. A parábola do semeador, sendo lida neste contexto, trará uma mensagem de conforto,

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força e consolo para todos os que estão com Jesus. Ao mesmo tempo trará um alerta aos que os desprezam e pensam poder lidar com a própria vida com uma independência irreal.

TEXTO DE MATEUS (13.1-9, 18-23)

Da colheita até o próximo plantio, normalmente se passam vários meses. Aquele que planta deseja uma semente de boa qualidade para sua plantação. Mas como saber se a semente é boa? Como obter a garantia de germinação? Os agricultores geralmente fazem o teste de germinação para ver se a semente é boa, separando cem sementes e semeando-as no quintal ou horta. Após aproximadamente uma semana, vão conferir quan-tas sementes germinaram e imediatamente tiram sua dúvida. Já sabem se a semente foi bem guardada, armazenada e se vale a pena plantá-la.

Com relação à palavra de Deus, não precisamos fazer teste porque temos a garantia da germinação e eficiência na produção. Aproveitemos a explicação do Salvador para entender melhor a lição.

Vv. 4 e 19: E, ao semear, uma parte caiu à beira do caminho, e, vindo as aves, a comeram. A todos os que ouvem a Palavra do Reino e não a compreendem, vem o maligno e arrebata o que lhes foi semeado no co-ração. Este é o que foi semeado à beira do caminho.

Vv. 5 e 20: Outra parte caiu em solo rochoso, onde a terra era pouca, e logo morreu, visto não ser profunda a terra. O que foi semeado em solo rochoso, esse é o que ouve a palavra e a recebe logo, com alegria; mas não tem raiz em si mesmo, sendo, antes, de pouca duração; em lhe chegando a angústia ou a perseguição por causa da Palavra, logo se escandaliza.

Vv. 7 e 22: Outra caiu entre os espinhos, e os espinhos e a sufocaram. O que foi semeado entre os espinhos é o que ouve a palavra, porém os cuidados do mundo e a fascinação das riquezas sufocam a Palavra, e fica infrutífera.

Vv. 8 e 23: Outra, enfim, caiu em boa terra e deu fruto: a cem, a sessenta e a trinta por um. Mas o que foi semeado em boa terra é o que ouve a Palavra e a compreende; este frutifica e produz a cem, a sessenta e a trinta por um.

APLICAÇÃO HOMILÉTICA

Semear naquele tempo era andar pela lavoura, de ponta a ponta, jogando sementes sempre no mesmo ritmo e jeito. Algumas sementes seriam levadas pelo vento, e como as sementes eram levadas nas mãos, algumas simplesmente cairiam em lugares que não eram a boa terra recém preparada pelo agricultor.

qUarto DomIngo aPÓs PenteCostes

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Nesse sistema, era possível a perda de semente. Usando esse exemplo, Jesus ilustra sua mensagem sobre o Reino de Deus falando dos tipos de solo onde caíam as sementes lançadas pelo agricultor.

No entanto, a parábola do semeador nos convida a considerar a palavra de Deus, tanto a sua proclamação como a palavra escrita, especialmente como a dinâmica ação de Deus em vir até as pessoas. Por esta palavra, Deus mesmo confronta o leitor/ouvinte com suas fragilidades, necessi-dades e pecado, e lhe traz vida e salvação, pelo perdão e comunhão com Ele mesmo, por meio de seu Filho (a Palavra encarnada).

Nesta perspectiva, não são diferentes tipos de solo (diferentes “tipos” de pessoas), mas diferentes reações ao ouvir da palavra. Ela é sempre poderosa e capaz de produzir o melhor resultado, ou seja, a dádiva do Espírito Santo e a fé. Infelizmente cada um de nós tem a triste capacidade de rejeitar a mensagem.

A Palavra de Cristo é pregada e ouvida. Mas há tantas outras vozes chamando a atenção que logo ela é sufocada, quem sabe pelos espinhos da ansiedade e dos cuidados deste mundo: O que comeremos? O que beberemos? O que vamos vestir? O espinheiro da cobiça, o desejo de ter mais, mais e mais, ser o melhor, o mais rápido, o mais brilhante muitas vezes sufoca a Palavra.

A semente é a Palavra – a mesma que criou e sustenta o Universo. O semeador nos vê sempre como uma boa terra. Em nosso Batismo, no anúncio do perdão de nossos pecados, ou na Santa Ceia, Cristo está sendo semeado em nós.

Tema: Vamos semear a semente do Reino: por quê?O solo está pronto. “O universo todo geme...” conforme Rm 8;A semente é boa e a germinação é conhecida – Mt 13.5-8. A produção é certa – v.23 e Is 55.11.

Eduardo VizaSão Leopoldo/RS

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QUINTO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

17 de julho de 2011

Salmo 119.57-64; Isaías 44.6-8; Romanos 8.18-27; Mateus 13.24-30, 36-43

Salmo 119.57-64: Nesta perícope o salmista expressa a sua comple-ta dependência de Deus. Demonstra toda sua dependência comparando Deus com seu quinhão, terreno, porção. Visto de modo espiritual, Deus e Sua palavra são a única coisa que resta para alguém e tudo o de que o salmista precisa. Da mesma forma que a Lei de Deus é a única guia para os caminhos, envolvendo constante retorno: “Considero os meus caminhos e volto os meus passos para os teus testemunhos” (Sl 119.59). Quando nossos erros e nossas transgressões devem ser confessados. E desta forma o salmista reconhece a graça e o perdão de Deus, não em virtude de méritos, mas pela misericórdia de Deus.

Isaías 44.6-8: Aqui Deus vem lembrar através do profeta de que Ele é o único e verdadeiro Deus. “Eu sou o primeiro e eu sou último, e além de mim não há ninguém” (Is 44.6). E remete ao livro de Apocalipse: “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim” (Ap 1.17; 21.6; 22.13). Vemos um único Deus em todos os tempos, Senhor da História. Ele se anuncia como rocha, como única defesa e abrigo, em contraponto aos falsos deuses adotados pelos israelitas no exílio.

Romanos 8.18-27: Paulo aponta para uma nova criação. Isto é, o fim de todo o sofrimento do ser humano e de toda a criação, que “sofrem dores de parto” (Rm 8.22), indo em direção à “libertação do cativeiro da corrupção” (Rm 8.21). O cristão, que permanece ainda neste mundo, sofre assim como tudo e todos por causa do pecado que continua nele e à sua volta. Mas, estes que aguardam a glória futura, ao mesmo tempo em que sofrem, são acompanhados pelo Consolador, que intercede por eles junto a Deus.

CONTEXTO

Este texto de Mateus é dividido em dois momentos. Um com as multi-dões e outro a sós com os discípulos. O primeiro momento é o da parábola do joio. Ela teve um impacto sobre a multidão que, provavelmente, não entendia do que se tratava o reino de Deus. Nem mesmo os discípulos a tinham realmente compreendido, e prova disto é o pedido: “Explica-nos a parábola do joio do campo”.

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No primeiro momento Jesus estava à beira mar, sentado em um bar-co, enquanto falava por parábolas: “Todas estas coisas disse Jesus às multidões por parábolas e sem parábolas nada lhes dizia” (Mt 13.34a), falando “enigmas dos tempos antigos” (Sl 78.2). Assim, de uma maneira simples, usando exemplos do cotidiano, mostrava verdades ocultas que percorrem todos os tempos. O joio e o trigo estavam plantados juntos, e eram plantas muito parecidas, no entanto uma era erva tóxica, a outra produzia o grão que resultava no pão. Uns compreendiam, outros não. “Ao que respondeu: Porque a vós outros é dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas àqueles não lhes é isso concedido” (Mt 13.11).

No segundo momento, Jesus está a sós com os discípulos, quando eles o interrogam sobre o significado da parábola. Então Jesus pacientemen-te explica ponto por ponto. Com este gesto, demonstra sua vontade de que seus seguidores aprendam e entendam suas palavras. Assim como esteve acessível aos discípulos, está acessível a nós pelo estudo de sua palavra.

TEXTO

Vv. 24, 37, 38: Jesus costumava começar suas parábolas com esta expressão: “O Reino dos céus é semelhante a...” Este é o mesmo reino dos céus que João Batista já anunciava: “Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus” (Mt 3:2). E tal afirmação se repete nos ensinamentos de Jesus. Tal reino será plenamente instaurado na última vinda de Cristo.

Filho do Homem é o título preferido de Jesus ao se referir a si mesmo, tanto no estado de humilhação (Mt 8.20) quanto no de exaltação (Mc 2.10). Também é interessante notar que o campo abrange todo o mundo. Campo, na cultura hebraica, referia-se a um território sem cercas, campo aberto, onde qualquer um podia entrar, contrastando com a vinha, que se referia normalmente a uma área fechada. Tal fato mostra a universalidade da mensagem do Evangelho, que é semeado mundo afora, a toda cultura e nação, e também o desejo divino de um campo bom e produtivo. Campo que, no primeiro plano, só teria trigo. Somente boa semente, os filhos do reino. Vale a pena ressaltar que na parábola Jesus fala de sementes e de servos, mas existe apenas um semeador, que espalha as sementes. Somente através da ação de Deus que alguém vem a crer e assim ser adotado como filho de Deus.

Vv. 25-28a; 38b-39a: Aqui temos um falso semeador e uma semente ruim. Jesus afirma a existência de um inimigo, velho e astuto, que desde o princípio já trazia a morte e a desgraça. Um inimigo que não pode ser subestimado, pois suas sementes são venenosas, como é o próprio joio, que se parece em muito com o trigo, mas produz o mal. Em contraponto,

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o inimigo também não pode ser superestimado ou chamado de semeador, pois vem à noite, escondido, e não vem para produzir, ele apenas consegue prejudicar. O diabo tenta imitar a Deus, mas de forma alguma consegue se igualar a Ele. Devemos ter em mente que o diabo é perigoso, trouxe e continua trazendo o mal para o mundo, mas em tudo é inferior e vencido pelo verdadeiro semeador, pelo verdadeiro Deus.

Vv. 28b-29: Os servos do semeador estão espantados com a erva que crescia e que aparentemente estragava o que o semeador havia criado. E a vontade dos servos era cortar fora o mal, assim como o cristão tem von-tade de tirar do mundo toda seita, todo falso profeta e todos que zombam da palavra de Deus, como demonstram os discípulos em Lucas: “Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para os consumir?” (Lc 9:54). E a resposta do semeador é espantosa: não corte, pois há trigo no meio do joio, trigo que não pode ser cortado, pois Cristo promete: “o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora” (Jo 6.37).

Vv. 30; 40-43: O semeador não quer perder, por erro de julgamento dos seus servos, nenhum dos que lhe pertencem, pois todo julgamento pertence a Deus, todo o castigo e vingança estão em suas mãos. “A mim me pertence a vingança; eu é que retribuirei, diz o Senhor” (Rm 12.19). Então Ele mandará aquele que for mau para o inferno e levantará os que forem seus filhos. Deste modo, Cristo em sua parábola deixa claro que o dia do juízo realmente acontecerá e será criado o novo céu e a nova terra. Estes novo céu e nova terra não são de forma alguma resultado da sociedade ou de qualquer interferência humana. Compete apenas ao cristão viver na fé que recebeu e aguardar a glória futura.

LEI E EVANGELHO

Lei – O Diabo está presente neste mundo, assim como seus servos, frutos de sua semeadura. A igreja está neste mundo e sofre com ele, diante de injustiças sem fim. E assim vai ser até o juízo.

Evangelho – Deus promete glória àqueles que são seus, no final dos tempos. O inimigo já foi vencido por Cristo na cruz, e Ele promete não condenar nenhum dos que lhe foram entregues, mas salvar a todos os que confiam na sua misericórdia.

CONTEXTO LITÚRGICO

Em época de Pentecostes, lembramos da igreja, sua missão e sua finalidade. Enquanto se espera pela vinda de Cristo no juízo, a igreja mi-litante é chamada para permanecer neste mundo destemidamente, para que a palavra de Deus seja pregada a todas as nações. Da mesma forma é

quInto DomIngo aPÓs PenteCostes

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impulsionada por Cristo para jamais desistir, seja diante das adversidades, seja diante dos frutos do diabo e dos seus servos neste mundo.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Jesus é o semeador. E sua palavra nos traz a salvação.O diabo age no mundo tentando destruir a obra de Cristo, atacando a

sua igreja e se utilizando de todo tipo de pessoas e artimanhas.Jesus Cristo morreu para que possamos ter a certeza da vida eter-

na.O Espírito Santo continua conosco, intercedendo junto ao Pai, nos

consolando e animando para o anúncio do evangelho.O Pai vai levar a todos quantos confiarem nas suas promessas para a

morada celestial. A igreja militante se tornará então a igreja triunfante.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

A BÍBLIA SAGRADA. Trad. João Ferreira de Almeida. 2ª ed. rev. e at. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. CONCORDÂNCIA BÍBLICA. Baseada na edição revista e atualizada no Brasil da tradução João Ferreira de Almeida. 2ª ed. rev. e at. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.GIBBS, Jeffrey A. Concordia Commentary: a theological exposition of Sacred Scripture. General Editor Dean O. Wenthe: Matthew 11:2 – 20:34. Saint Louis : Concordia, 1996-2010. GOERL, Otto A. Púlpito: Epifania. v.2. Porto Alegre: Concórdia, 1980. LUTHER, Martin. Luther’s Works: First Lectures on The Psalms II. v.11. Saint Louis: Concordia, 1955-2009. LUTHER, Martin. Luther’s Works: Lectures on Romans. v.25. Saint Louis: Concordia, 1955-2009. LUTHER, Martin. Luther’s Works: Lectures on Isaiah. v.25. Saint Louis: Concordia, 1955-2009.

Émerson Ricardo MelloJoinville/SC

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SEXTO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

24 de julho de 2011

Salmo 125; Deuteronômio 7.6-9; Romanos 8.28-39; Mateus 13.44-52

LEITURAS

Salmo 125: Este é um dos chamados “Hinos de Confiança”. Estes hinos mostram o louvor a Deus em gratidão pelas bênçãos recebidas, porque o SENHOR é o único e verdadeiro Deus, aquele que nos criou, nos redimiu e nos conduz para a vida eterna. Alguns Salmos deste gênero são: 11, 16, 62. O Salmo 125 mostra o povo de Israel louvando a Deus e mostrando que o SENHOR deve ser o nosso único objeto de confiança.

Deuteronômio 7.6-9: O contexto desta perícope mostra Moisés falando ao povo de Israel sobre a entrada da terra prometida. Deus, por meio de Moisés, diz ao povo que eles devem destruir o povo pagão, pois se não os destruírem, eles levarão o povo de Israel a adorar outros deuses. Os versículos sugeridos mostram o grande amor de Deus para com Israel, pois o SENHOR libertou o povo, cumpriu a sua promessa e mantém a sua aliança por mil gerações. Tudo isso somente pelo seu amor e misericórdia.

Romanos 8.28-39: Por meio de Cristo nós podemos dizer que ama-mos o Pai, mas muito e inexplicavelmente maior é o seu amor por nós. Por esse motivo podemos dizer que todas as coisas cooperam em nosso favor. Ele nos chamou e nos aceitou, por isso somos mais que vencedores e nada pode nos separar do seu amor. Nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem outras autoridades celestiais, nem o presente, nem o futuro, nem altura, nem profundidade. Nada, realmente NADA pode nos separar do amor de Deus que é nosso por meio de Cristo.

Mateus 13.44-52: Através de três parábolas, Jesus traça compara-ções com o Reino de Deus. Primeiramente compara o Reino a um tesouro escondido, depois a uma pérola e por fim a uma rede lançada ao mar. O ponto principal destas parábolas é que o Reino dos Céus excede todo e qualquer valor.

TEXTO: MATEUS 13.44-52

O texto em estudo está dentro do contexto do terceiro discurso de Jesus em Mateus. Jesus está sentado à beira do Lago da Galileia, mas

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por causa da grande multidão que se aglomerou em volta dele, Jesus entra em um barco, senta-se. O povo fica de pé na praia ouvindo Ele falar. Neste momento Jesus usa diversas parábolas (comparações) para ensinar ao povo.

V. 44: Aqui vemos a primeira parábola da série. Esta fala sobre um homem que acha um grande tesouro. Este fica tão alegre que o enterra de novo, depois vai, vende tudo o que tem, volta e compra aquele pedacinho de chão onde está enterrado o tesouro. Quão infindável é o valor deste tesouro! J. Jeremias destaca que esconder tesouros era um costume da época (Mt 25.18)1. Kretzmann fala que “Jesus, no caso presente, não está preocupado com os aspectos morais do fato, caso isto seja considerado [...] No caso presente, o tesouro sido oculto ou enterrado deliberadamente. Por acaso ou intencionalmente, um homem achou este tesouro”.2 Prova-velmente era alguém simples que estava lavrando a terra. Não esperava achar tal tesouro, mas mesmo sem esperar, ele o encontra. Podemos ligar esta passagem ao relato da mulher samaritana (Jo 4.5-26). Ela cumpria a sua tarefa diária de tirar água do poço, então se encontra com o próprio Cristo. O seu objetivo não era ir até o poço para encontrar com Cristo.

Deus deu a todos este Grande Tesouro, um tesouro de valor inesti-mável. Um tesouro que é nosso por meio de Cristo. Mas a pergunta que nos fica é: Por que alguns são salvos e outros não? Não cabe a nós tentar achar alguma resposta para essa pergunta, mas sim crer que Deus enviou Jesus Cristo para salvar a todos. E também que é necessário anunciar o evangelho.

Vv. 45-46: Uma parábola muito semelhante à primeira, com a diferença que o objeto agora é uma pérola. Pérolas também eram objetos de valor muito alto, algo de interesse de todos. Mas a característica principal está em ser uma pérola. Assim também O Caminho para O Reino é único (Jo 14.6), Jesus Cristo é O Caminho para o Reino dos Céus.

Vv. 47-50: Esta parábola nos remete para a “parousia”. Podemos comparar esta parábola com a parábola do “joio e do trigo”. O que está enfatizado aqui é separação. Separação entre peixes comestíveis e peixes não comestíveis. Não devemos entender isso com olhos humanos, mas sim com os olhos da fé. Pois somente Deus pode olhar para dentro do coração do homem e ver se ali há fé ou não. O que devemos entender é sobre o amor de Deus que se estende a todos.

Vv. 51-52: A parábola termina com uma pergunta de Jesus aos seus discípulos: se eles realmente entenderam aquilo que lhes dissera. Os dis-cípulos disseram: “Sim, Senhor, entendemos!” E Jesus termina dizendo: “Por isso, todo escriba instruído acerca do Reino dos céus é semelhante

1 JEREMIAS, J. As Parábolas de Jesus.

2 KRETZMANN, P. E. O Evangelho Segundo São Mateus.

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a um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas”. Uma declaração de difícil compreensão, mas Tasker destaca desta afirmação que “Parece que a referência é ao discípulo de Jesus que aprendeu as verdades do reino dos céus [...] a respeito das quais Jesus tem dado ins-truções. Tal ‘escriba’, na qualidade de mestre da ‘lei de Cristo’, tem rico depósito de conhecimento do qual pode retirar verdades que podem ser descritas como novas e... velhas. São novas no sentido de que somente com a vinda do Messias foram reveladas claramente; são velhas porque se referem aos mistérios que estão presentes na mente de Deus, mas ocultos desde a criação/do mundo”.3

SUGESTÃO PARA USO HOMILÉTICO

Primeiramente falar sobre o Reino de Deus realmente como um grande tesouro. Não como um tesouro que devemos nós buscar, mas como algo que já é nosso, um presente.

Pode-se destacar também a importância da missão, que este tesouro foi dado a todos. Destacar o nosso objetivo como Igreja, lançar a Palavra, assim como Jesus mandou que os seus discípulos lançassem as redes ao mar. O objetivo de Jesus é este: que nós lancemos as redes, que pregue-mos a Palavra. Depois que os discípulos jogaram as redes do outro lado do barco e as recolheram carregadas de peixes, Jesus diz: Venham comigo que eu farei de vocês pescadores de homens. Jesus está mostrando que não depende de nós pescarmos, mas apenas lançar a rede.

Também pode-se enfatizar o tema da Igreja “Acolhendo e Integrando” como parte da mensagem. Falar da importância do acolhimento dentro da Igreja. No verdadeiro sentido de diaconia, que não deve ser somente (como muitas vezes é entendido) da porta da Igreja para fora. Isso é muito importante, mas também devemos acolher aqueles que já estão à nossa volta e muitas vezes não os percebemos.

E, por último, falar do grande tesouro que é o Reino, que este vem até nós por meio da Palavra e dos Sacramentos. Onde realmente podemos ter a certeza que isso nos foi concedido sem nenhum mérito de nossa parte, mas apenas por graça.

Everaldo TeixeiraArabutã/SC

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3 TASKER, R. V. G. Evangelho Segundo Mateus.

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SÉTIMO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

31 de julho de 2011

Salmo 136.1-9 (23-26); Isaías 55.1-5; Romanos 9.1-5 (6-13); Mateus 14.13-21

CONTEXTO LITÚRGICO

1. A congregação como parte e ponte na história da igreja (chronós e kairós)

No período após Pentecostes, a igreja celebra o ministério e os ensinos de Cristo. Nossos textos apontam para a misericórdia de Deus que despen-ca do céu, caindo sobre o ser humano. Qual é o alcance da misericórdia de Deus? Quem o SENHOR quer que seja salvo? Deus chama todos os povos para comer e beber daquilo que Ele oferece: Cristo! A misericórdia de Deus dura para sempre. Por isso, a Igreja continua viva, chamando e oferecendo o alimento da Vida: Cristo, até que Deus venha nos chamar para a vida plena no céu.

2. As perícopes e sua função no lecionário anualNão há consolo maior do que saber que a misericórdia do Senhor dura

para sempre. Deus age para acolher os que têm fome e sede do consolo, do alívio, do perdão. Os textos apontam para o acolhimento do ser hu-mano pecador nos braços paternos de Deus. A bondade, a misericórdia e o compadecimento de Deus são destacados. A misericórdia de Deus dura para sempre. Isso demonstra o amor de Deus pelo ser humano, que, por sua vez, não pode oferecer nada a Deus, a não ser os pecados. Nesse sentido nós, seres humanos, diante da misericórdia de Deus, damos graças a Ele e nos entregamos aos seus cuidados, pois nEle achamos a verdadeira paz.

3. Os textos3.1 Ideia centralSalmo 136.1-9 (23-26) – Nós rendemos graças ao Senhor, Deus dos

céus e da terra, por sua bondade e por sua misericórdia que dura para sempre.

Isaías 55.1-5 – É um chamamento aos que têm sede e fome. Não precisa ter dinheiro. Pode-se comprar e comer sem dinheiro. O requisito aqui é a sede e a fome.

Mateus 14.13-21 – “Jesus se compadece”. Cristo se compadece do ser

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humano. Cristo alimenta a multidão que não tinha fome “física” apenas. Cristo alimenta a multidão por completo, corpo e alma, dando descanso aos corações aflitos. Bondade, misericórdia e compadecimento aos que têm sede e fome.

Romanos 9.1-5 (6-13) – Paulo fala da incredulidade do povo de Israel. Mesmo na condição de povo de Deus, muitos não creram na mensagem de Cristo. Isso ressalta o fato de que Deus escolhe e chama todos os povos para serem seus filhos. É a vontade de Deus o fator determinante, e não o pertencer a um determinado povo ou etnia.

3.2 Idéias comunsO ser humano tem sede e fome de paz. Na misericórdia de Deus en-

contramos o banquete celestial do perdão: Cristo.3.3 Objetivo geralDeus nos alimenta com a Sua paz.3.4 Ênfase teológicaO ser humano se encontra em estado de pecado. Sem força, sedento

e faminto, encontra a paz na misericórdia de Deus que alimenta os peca-dores com o banquete da paz.

O TEXTO DE MATEUS 14.13-21

1. CONTEXTO BÍBLICO DO TEXTO

1.1 Narrativa; personagens; momento históricoEsta narrativa conta a história do milagre da multiplicação dos peixes.

Este é o único milagre que aparece em cada um dos quatro evangelhos. O contexto é importante para entendermos porque Jesus estava naquele local. Herodes, tempos antes, havia prendido João Batista porque este o repreendia em virtude da vida de adultério que o rei vivia (Lc 3.19,20). Porém Herodes sabia que João era querido pelo povo, pois o tinham como profeta (Mt 14.5). Assim, Herodes estava receoso em mandar matar João. Até que na festa de seu aniversário, já pelo final, a filha de Herodias, chamada Salomé, entrou no salão e começou a dançar de forma lasciva, apresentando-se aos convidados e a Herodes. Encantado pelos apelos sensuais, Herodes, talvez sem pensar, prometeu a Salomé o que ela qui-sesse. Tudo saiu conforme o planejado por sua mãe, que não gostava de João. Assim, Salomé, influenciada por sua mãe, pediu a cabeça de João Batista num prato. Apesar do abatimento do rei, tudo foi feito conforme ela havia pedido. Após o acontecimento, os discípulos de João recolheram seu corpo, o sepultaram e depois anunciaram a Jesus o ocorrido. Quando Jesus ouviu sobre a morte de João Batista ele se retirou de Nazaré (Mt 13.54) e foi para um lugar deserto (provavelmente uma localidade cha-mada Gaulanites, perto de Betsaida).

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Por quê? Primeiro: Jesus percebeu a necessidade de se retirar do domínio de Herodes. Talvez por algum peso na consciência (por causa da morte de João Batista), Herodes acreditava ser Jesus o João Batista ressuscitado (Mt 14.2). Não podemos afirmar se Jesus estava preocupado com sua própria segurança. Mas, sem dúvida, a morte de João Batista poderia gerar uma crise e atrapalhar seus planos em relação ao seu mi-nistério. Segundo: Jesus se comoveu com a notícia de morte de João. Seu primo, o profeta que o batizou abrindo o caminho para a entrada de Jesus em seu ministério, havia sido morto de forma desonrosa. Jesus estava de luto e sentiu necessidade de se recolher. Terceiro: os discípulos esta-vam cansados da sua viagem e precisavam de descanso (Mc 6.7,30,31). Portanto, Jesus sentiu necessidade de se afastar das multidões. Porém, o contrário não aconteceu. A multidão logo ficou sabendo e pela praia alcançaram Jesus do lado nordeste do lago. Olhando aquela gente, Jesus se compadeceu delas e continuou a curar os doentes, ensinar e estar na companhia delas.

Na continuação do texto, percebemos que Jesus conseguiu despedir a multidão, depois de alimentá-la, e se retirou subindo um monte onde esteve só (Mt 14.23). Quando era a quarta vigília da noite (entre 3 e 6 horas da manhã), Jesus foi se encontrar com seus discípulos que já estavam voltando, de barco, para o outro lado do rio. Nesse episódio Jesus anda sobre as águas. O vento era forte; os discípulos ficaram com medo; Pedro anda sobre as águas; Pedro afunda na água; Jesus ensina seus discípulos; os dois sobem no barco; o vento acalma; e os discípulos afirmam: “verdadeiramente és Filho de Deus!”

2. EXEGESE

2.1 Verbos – voz, tempoEncontramos nesse texto um verbo importante: splagcni,zomai. Este

verbo significa compaixão. Ser movido pelas entranhas. Ser movido pela compaixão. Interessante que esse verbo normalmente vem acompanhado de uma ação de Jesus. Por exemplo: Lc 7.13, onde Jesus se compadece da viúva de Naim e ressuscita seu filho; Lucas 10.33, que é a parábola do bom samaritano. O bom samaritano se compadece e age em favor daquele ferido; Lucas 15.20, que é a parábola do filho pródigo. Compadecido, o pai corre ao encontro do filho. Além dessas passagens, esse verbo aparece também em Mt 9.36 quando Jesus se compadece das multidões porque pareciam ovelhas sem pastor. Todos os trechos bíblicos acima citados de-monstram o que esse verbo quer dizer: Jesus olha para cada um de nós

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com compaixão, amor, misericórdia. Cristo quer ser nosso pastor e por isso ele nos toma como suas ovelhas para estar em nossa companhia.

3.ENCAMINHAMENTO HOMILÉTICO

3.1 Lei e EvangelhoLei: Por que Jesus se compadeceu? Podemos perceber no texto a mi-

séria material e espiritual do povo. Ali eles também se encontravam como ovelhas sem pastor. A ansiedade do povo em ir até Jesus é demonstrada pelo fato de o povo até ter se adiantado, e quando Jesus desembarcou viu aquelas pessoas já à sua espera, famintas e sedentas pela sua compaixão e misericórdia. Jesus viu naquelas pessoas não somente suas fraquezas físicas, mas também grande necessidade espiritual, embora muitos não tivessem consciência disso. Portanto, a Lei aqui já está implícita na própria vida das pessoas. A Lei que mostra a miséria humana e a necessidade de um Salvador. Jesus sabe disso. Assim, aproveita para ensinar.

Evangelho: O compadecimento de Jesus. Em contraste com a pressa e impaciência dos discípulos, Jesus mostra o seu amor, sua paciência, sua bondade e misericórdia por aquelas pessoas que vieram até ele. O mila-gre evidencia a nossa dependência do Senhor Jesus. Nós recebemos as bênçãos de Deus todos os dias. Naquela ocasião Jesus abastece o corpo e a alma. Deus providencia para todos nós o necessário para o corpo e a alma. Jesus faz o milagre e ensina quem realmente providencia vida. A fome representa a necessidade que temos de algo. Naquele momento já era passada a hora de comer e escurecia. Nossa fome espiritual (ovelhas sem pastor) representa nossa necessidade de comunhão com Deus. A paz que Cristo dava às pessoas era o alimento esperado. Essa paz era transmitida pela sua Palavra e pelo seu jeito de agir: se compadecendo. As bênçãos nos são dadas porque Deus se compadece de nós, pois ele sabe que precisamos dele. Sem esse alimento nossa vida escurece e perde o sentido. Essa é a hora. Jesus convida para o banquete, onde ele mesmo é o principal alimento. Esse é o grande milagre. O corpo e o sangue de Cristo se tornaram o principal alimento. Nele recebemos perdão, nova vida, salvação. As bênçãos de Deus podem ser partilhadas sem medo de que elas acabem. Quanto mais se partilha, mais haverá. Cristo pode ser partlihado. É dessa maneira que o corpo de Cristo alimenta o mundo. O banquete está pronto e Deus chama.

3.2 Objetivo do textoMostrar que Deus se compadece de nós e nos dá o alimento para a

vida eterna.

sÉtImo DomIngo aPÓs PenteCostes

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3.3 Objetivo deste sermãoColocar Cristo no centro da mesa do banquete de Deus para que os

ouvintes possam ter certeza que o acesso é livre, pois o convite de Deus está aberto para todos os pecadores.

3.4 TemaJesus se compadece e nos alimenta.

Filipe Luxinger TimmCuritiba/PR

[email protected]

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OITAVO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

07 de agosto de 2011

Salmo 18. 1-6 (7-16); Jó 34. 4-18; Romanos 10. 5-17; Mateus 14. 22-33

LEITURAS DO DIA

Salmo 18. 1-6 (7-16): As palavras que encontramos no título deste Salmo são bem esclarecedoras e nos dão uma boa ideia do conteúdo do mesmo. Interessante ainda é notar que existe outra forma para este Sal-mo, com variações significativas (2Sm 22), e que sugere a idéia de que foi cantado por Davi em ocasiões diversas quando ele reviu sua própria história extraordinária e observou a mão graciosa de Deus em toda ela. Esse Salmo é um hino que brota de um coração agradecido e comovido pelas muitas e maravilhosas misericórdias de Deus. É considerado um Salmo real, originário de alguma ocasião especial na vida do rei, assim como os Salmos 2, 20 e 45. Os três primeiros versículos são prefácio no qual a decisão de bendizer a Deus é declarada. Os sete títulos atribuídos a Deus no v. 2 são muito expressivos e refletem o domínio que este pen-samento exerceu sobre Davi durante os anos em que ele foi objeto de caça por parte de Saul. Os seus sentimentos nesta ocasião assemelham-se aos de um homem que está a afogar-se, absorvido por fortes águas em redemoinho, ou aos de um animal selvagem preso numa rede. Não havia alguém que pudesse ajudá-lo, exceto o Senhor, de modo que Davi clamou alto a Ele na sua desgraça. O verbo encontra-se no presente como se o acontecimento ainda estivesse vívido perante ele. Deus veio em seu auxílio.

Jó 34. 4-18: O jovem Eliú condensa os discursos de Jó em duas quei-xas: na primeira Jó acusa Deus de ter sido injusto para com um homem inocente desferindo-lhe, por puro capricho, um golpe mortal. Tal queixa, diz Eliú, apenas denuncia a incomparável e insaciável sede de zombaria de Jó. Em segundo lugar, Jó lamenta-se de que de nada aproveita ao homem o comprazer-se em Deus ou, segundo outra versão, “ser amigo de Deus”.

Jó queixa-se de que Deus procedeu injustamente para com ele. Com toda a convicção de que é capaz a sua piedosa natureza, Eliú afirma que Deus é justo. Conforme Eliú, o homem colhe o que semeia, seja a se-menteira boa ou má. Este tipo de pensamento é perigoso, pois passamos a julgar as coisas pelo princípio de causa e consequência. O sofrimento

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de Jó é um exemplo de que não podemos pensar como Eliú. Isso está claro no início do livro: “Havia um homem na terra de Uz, cujo nome era Jó, homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desviava do mal” (Jó 1.1). Jó não estava sofrendo porque Deus o estava castigando por um pecado cometido.

Romanos 10. 5-17: O Apóstolo Paulo, desde o início do capítulo 9, vem tratando a respeito da incredulidade dos judeus. Muitos judeus não creram que Jesus era de fato o Messias que eles tanto esperavam. E com certa razão alguns comentaristas atribuem ao bloco de Romanos 9.30-10.21 o seguinte título: “A Justiça de Deus ao Rejeitar o Antigo Israel”. Os próprios termos da revelação divina tornam explícito que a justiça de Deus é “sem lei”, que a revelação em Cristo transcende e substitui a lei. O homem não precisa subir aos céus para do alto trazer a Cristo; Cristo desceu e o fez, também, na semelhança de nossa carne pecaminosa, e como sacrifício pelo pecado. O homem não precisa descer ao negro abismo da morte para levantar a Cristo dentre os mortos; ele foi ressus-citado dos mortos pela glória do Pai, ressuscitado para nossa justificação. A ação justificadora de Deus está aí, ao alcance do homem, na Palavra que chega até ele (“que pregamos”); o homem não precisa descobri-la ou inventá-la. Só precisa crer nela; é “palavra da fé”. Desse modo esta “palavra da fé”, este evangelho, é poder para a salvação. Nenhum homem que tem o Senhor Jesus por seu Senhor permanece servo silencioso de seu Senhor, envergonhado de reconhecê-lo perante os homens (Mc 8.38), mas o confessa diante dos homens. E seu Senhor o confessará no juízo perante seu Pai. O Antigo Testamento já apontara a Israel esta estrada da fé e dera a Israel a promessa de que aquele que tivesse fé no Senhor não seria confundido. A fé congrega todos os homens, judeus e gregos, sob a soberania de um só Senhor, um Senhor que possui riquezas suficientes para todos, riquezas de misericórdia para todos. Israel ignorou a justiça de Deus revelada em Cristo e procurou uma justiça baseada na lei, que o homem pode denominar de sua própria, Israel é culpado. O apóstolo lamenta amargamente o fato que, enquanto os gentios aceitaram a justiça da fé, Israel se recusou a obedecer ao evangelho e rejeitou a salvação que é oferecida a todas as pessoas. Nenhum homem pode, de si mesmo, trazer notícias de Deus; o evangelho é o evangelho de Deus, e apenas “pregadores”, autorizados a falar em nome de Deus, podem anunciá-lo. Mas muitos não creram; nem todos deram atenção ao evangelho. Cristo foi pregado, em palavra e ação; seus mensageiros levaram seu nome até aos confins do mundo, e, dessa vez, homens chegaram à fé e invocaram seu nome para serem salvos.

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TEXTO PARA O SERMÃO: MATEUS: 14. 22-33

V. 22: O verbo hvna,gkasen que aqui é traduzido por “compeliu”, também pode ser traduzido por: “insistiu, obrigou ou ordenou”. E isso nos dá uma ideia de que os discípulos não queriam partir sem Jesus. Mas ele tinha suas razões que o levaram a querer permanecer sozinho mesmo que os discípulos temessem voltar sem sua proteção para a Galileia. Sua ordem, porém, prevaleceu. Os discípulos embarcaram com o propósito de cruzar o lago, enquanto Ele permaneceu para despedir o povo.

Vv. 23-24: Um fato importante: Jesus sempre encontra tempo para orar e para apresentar a seu Pai celeste a grande obra que assumira, e para, em súplica sincera, pedir força para a suportar. Ele de fato era um verdadeiro homem que sentia a necessidade de buscar em Deus o conforto e a força. Enquanto Cristo ficara para trás na praia para orar, o barco, aos poucos, vencia parte de seu caminho para Cafarnaum. Mas o vento lhes era diretamente oposto e com sua força agitava as águas com violência, tornando difícil uma navegação bem sucedida.

V. 25: Jesus passou quase a noite inteira em oração. E os discípulos ha-viam lutado por tempo igual para alcançar a margem oposta. Foi na quarta e última vigília da noite, ou seja, entre três e seis horas da manhã, quando a escuridão já se dissolvia num cinzento amanhecer, que Jesus foi atrás deles, caminhando sobre as águas do mar. Quem pode caminhar sobre as águas? Um ser humano pecador assim como nós pode? Não. Só Jesus, o Filho do Deus Vivo, o Messias. Aquele que tem poder sobre a criação.

Vv. 26, 27: Os discípulos encheram-se do medo mais descontrolado, sendo que o medo de fantasmas, de aparições e espíritos entre o povo da época era muito forte. Eles gritaram de medo. Assim como aconteceu com os discípulos que ficaram apavorados em meio às suas tribulações, também acontece conosco. Muitas vezes não cremos que Deus é Deus, mas somos levados a acreditar que Ele seja uma aparição que vem para nos apavorar e destruir, por estarmos envoltos em aflições. Mas a voz calma de Jesus lhes dá firmeza. –[ ...] Tende bom ânimo! Sou eu. Não temais! Esta é a voz do que é verdadeiramente Filho de Deus. E é a voz dEle que ouvimos quando estamos passando por dificuldades. É a voz do Senhor gracioso e misericordioso, que está cuidando do barco de nossa vida.

Vv. 28-31: Pedro sempre foi afoito, muitas vezes mais rápido para agir do que para pensar. A voz do Senhor encheu-o de tal coragem, que se tornou quase imprudente. Foi a voz da felicidade da fé que o fez clamar ao Senhor. Queria ser o primeiro que com a mão tocasse o Senhor.

E, seguindo o convite confiante de Cristo, ele, realmente, saiu do barco e caminhou sobre a água em direção a Jesus. Enquanto os olhos de sua fé, como também seus olhos físicos, estavam dirigidos para seu Senhor e

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Mestre, tudo ia bem. Mas uma golfada forte e incomum de vento e uma onda excepcionalmente alta levaram-no a gaguejar de medo. Sua fé va-cilou. Ele começou a afundar. Não mais confiava na palavra que lhe fora dirigida. Em sua situação crítica, porém, clamou ao Mestre, que Ele ainda conhece como o Senhor do universo.

Assim como Pedro começou a afundar, qualquer um de nós também pode sucumbir. Pois muitas vezes queremos ir ao encontro de Jesus, mas não conseguimos. As coisas em nossa volta desviam nosso olhar. A nossa natureza desvia nosso olhar, tornando assim impossível irmos até Jesus. Mas Ele vem ao nosso encontro, assim como veio ao encontro de Pedro.

A bondade paciente do Senhor o salva. Jesus rapidamente o pegou e o ergueu sobre a água. O Senhor tem paciência com a fraqueza dos que estão com Ele. Ele ouve seus gritos. Ele os sustém, com Sua mão poderosa, até mesmo, na hora da morte. Até porque a morte já não tem poder sobre nós. Porque Jesus a venceu por nós.

Vv. 32,33: Cristo é o Senhor supremo e absoluto dos elementos da natureza. A natureza também é natureza de Deus, criada e preservada por Ele. Por isso o vento cessou logo, não de modo gradual, mas de re-pente, quando Jesus e Pedro subiram ao barco, porque Jesus tem controle sobre a natureza. Não é de admirar que todos os que estavam no barco, não só os discípulos, mas todos os passageiros, o adoraram, dando-lhe espontaneamente a glória e a honra como sendo o Filho de Deus. Eles o adoraram como se devia adorar o Deus de Israel. Eles o adoraram porque reconheceram que Jesus era Deus assim como o Pai. Nós também cremos, confessamos e ensinamos que Jesus Cristo é verdadeiramente o Filho de Deus. O Filho de Deus que sempre está presente. O Filho de Deus que não nos deixa sós. A Ele seja a glória hoje e para sempre.

SUGESTÃO DE ESBOÇO

Tema: Jesus Cristo é Verdadeiramente o Filho de Deus!- Porque fez muitos sinais- Porque tem poder sobre os elementos da natureza- Porque com sua voz calma e suave acalma os discípulos- Porque sua mão é poderosa para livrar os seus- Porque somente Ele é digno de ser adorado, juntamente com o Pai

e o Espírito Santo, um só Deus, eternamente.

Geomar MartinsBela Vista/MS

[email protected]

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NONO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

14 de agosto de 2011

Salmo 67; Isaías 56.1,6-8; Romanos 11.1-2a, 13-15, 28-32; Mateus 15.21-28

LEITURAS DO DIA

O Salmo 67 a princípio pode nos parecer unicamente um canto de louvor em meio a uma festa da colheita (v.6). Entretanto, o salmista vai além das bênçãos colhidas, seu canto expressa uma profunda esperança e gratidão pela maior de todas as bênçãos de Deus, sua presença na história de seu povo, uma presença e bênção que se expande a todos os povos. Aquilo que Deus prometera a Abraão se cumprirá, ele se tornará uma bênção para que se conheça na terra o caminho do Senhor e em todas as nações a sua salvação. E a bênção que Deus deu ao seu povo (v.1; Nm 6.24-26) se estenderá por todos os confins da terra.

No texto de Isaías ouvimos a promessa do Senhor aos estrangeiros, ou seja, aqueles que não pertenciam ao povo de Israel. Aqui, ecoam palavras tais como as de Ezequiel 14.6: “Convertei-vos, e apartai-vos dos vossos ídolos, e dai as costas a todas as vossas abominações”. Também as pa-lavras de Jesus em Jo 14.21: “Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; e aquele que me ama será amado por meu Pai, e eu também o amarei e me manifestarei a ele”. Os fariseus da época de Jesus, e também os de hoje, descreveriam este chamado aos estrangeiros como um chamado às obras e ações próprias de sua religião. Entretanto, por causa de Cristo, reconhecemos aqui um chamado à fé, a depositar sua esperança no “Senhor Deus que congrega os dispersos de Israel, e que ainda congregará muitos outros aos que já se acham reunidos” (v.8).

No trecho da carta aos Romanos para este domingo, Paulo nos auxilia a falar a respeito da fé. Já no primeiro versículo o apóstolo deixa claro que não há contradição em Deus por estar rejeitando a religião judaica, pois ela não representa o verdadeiro Israel. O Israel espiritual sempre creu e esperou pela salvação que viria de Deus e agora reconhece esta salvação em Cristo. Por isso Deus jamais rejeitou o seu povo, o seu verdadeiro povo, aquele que crê. Paulo também deixa claro que Deus ama os judeus e quer que estes voltem para ele.

Com a rejeição dos judeus, por sua própria culpa, a reconciliação foi anunciada aos que estavam de fora. O evangelho da reconciliação de Deus

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com o homem em Cristo foi levado ao mundo gentio como um efeito da rejeição dos judeus. Mas, se este castigo dos judeus teve um resultado tão bendito, que bênçãos, que vida fluirá de sua aceitação, da conversão daqueles que ainda possam ser ganhos por meio do método usado por Paulo?! O apóstolo expressa sua esperança no tempo em que o restante de Israel tiver sido convertido ao Messias, e então o objetivo de Deus terá sido realizado, então virá a vida gloriosa em e com Cristo por toda a eternidade, e ambos, judeus e gentios, herdarão pela fé o reino que lhes foi preparado antes da fundação do mundo.

CONTEXTO: MATEUS 15.21-28

Se olharmos para os fatos descritos no capítulo 14 e no princípio do 15, veremos que não sem justificativa, Jesus estava cansado. Mesmo que a mensagem do evangelho que ele pregava não fosse aceita pela grande maioria do povo, muitos estavam atrás dele em busca de seus milagres. Os fariseus estavam cada vez mais hostis, atiçando o povo ao ódio, e colocando em seu caminho todos os obstáculos possíveis. Esta oposição daqueles que questionavam as práticas dos seus discípulos era tão forte que o obrigou a responder: “Deixai-os; são cegos, guias de cegos” (15.14).

Então Jesus e seus discípulos se retiraram para as regiões de Tiro e Sidom, que fazem parte da Fenícia, que pertencia à Síria, na faixa costeira do Mar Mediterrâneo, uma região que ficava entre a Galileia e o mar. Tiro se situava a uns 65 km a noroeste de Cafarnaum, junto ao mar, enquanto Sidom, a uns 40 km de Tiro, na direção do nordeste e a 100 km de Ca-farnaum. Eram cidades-estado independentes e rivais, e cada uma tinha o seu próprio soberano, seus deuses e sua moeda. Não temos qualquer indicação quanto à duração e à extensão desta viagem de Jesus e seus discípulos, sendo que só um episódio é narrado nos evangelhos.

O TEXTO

V. 21: O texto nos diz que em determinada ocasião Jesus encontrou uma mulher cananeia. Isto significa que era uma mulher de origem não-judaica, como Raabe (Js 6.17; 22s) ou o centurião romano de Cafarnaum (Mt 8.5-13). Tanto este como aquela são mencionados segundo sua origem étnica e não pelo nome e ambos pedem pela cura de seus dependentes. A mulher roga por sua filha. O centurião por um de seus servos, na verdade um jovem rapaz. Ambos demonstram um grande apreço pelo mestre da Galileia e uma esperança sem igual no seu poder de curar doentes.

V. 22: Nas palavras da mulher: “Senhor, Filho de Davi, tem compaixão de mim!”, que são as mesmas utilizadas pelos dois homens cegos em Mt

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9.27, vemos que de alguma forma ela conhecia a esperança dos israelitas com relação ao Messias. Vemos que sua fé e reconhecimento de Cristo como o Messias vieram pelo ouvir destas coisas. Vemos aqui uma confis-são de fé. Ao chamá-lo de Senhor, Filho de Davi, ela confessa reconhecer em Jesus o Messias. Da mesma forma vemos o reconhecimento de que em sua aflição e insignificância esta mulher abandona todo orgulho e vergonha e se coloca aos gritos e de joelhos na esperança de que Jesus, por misericórdia, a ajude. Vemos uma mãe, talvez na maior aflição que possa sentir, voltando e esperando tão somente no Senhor.

Vv. 23-27: Ao longo do tempo, quanto à reação de Jesus, tem sido dada grande ênfase à ideia de que o Senhor estaria testando a fé da mu-lher cananeia. Porém, não podemos ignorar que este fato se dá durante os anos de aprendizado “teológico” dos discípulos.

Não é verdade que a reação inesperada, enigmática, desconcertante, e até ofensiva de Jesus, reflete muito bem o pensamento judeu, e por que não dizer, pelo menos até aquele momento, também dos discípulos? Não pensavam eles que Jesus não deveria se envolver com tais pessoas?

Muitos comentários bíblicos a respeito deste episódio falam de Jesus sendo “convencido” pela fé da mulher. Mas se refletirmos neste sentido, veremos que muito mais do que convencer a Jesus, a fé daquela gentia, provada em seu dialogo com Jesus, mostra aos discípulos o que realmente torna alguém parte do povo de Deus – a fé no Salvador, o crer e esperar nEle acima de todas as coisas.

V. 28: Esta mulher já era membro do povo de Deus, não por causa do seu nascimento e sua nacionalidade (Rm.9.7,8; Gl.4.28), mas pela fé em seu Salvador, o Filho de Davi, era verdadeiramente uma filha de Deus.

“Grande é a tua fé”, afirma Jesus. Essa fé contrasta com a timidez e pequena fé tanto dos discípulos (8.26; 16.8) quanto de Pedro (14.31). A fé demonstrada por essa mulher é a fé que agrada a Jesus. Por isso, ele pode dizer, em seguida: “Faça-se contigo como queres”. Outro fato impor-tante é que sua fé não está preocupada única e exclusivamente consigo mesma, o que é uma característica da verdadeira fé cristã.

SUGESTÕES HOMILÉTICAS

Um dos aspectos principais do texto de Mateus, e que está em conexão com as outras leituras para este domingo, é o acolhimento de Deus, pela fé, daqueles que não eram seu povo por nacionalidade. Neste sentido pode-se abordar homileticamente a questão de que todos nós hoje fomos alcançados pela misericórdia de Deus que alcançou todos os confins da terra. Não é por sermos israelitas (ou luteranos) de nascimento que somos salvos, mas pela fé que Cristo nos Deus e que se apega somente nEle.

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Outra sugestão, talvez a mais comum, é enfatizar a fé em conexão com a oração. Foi o crer e esperar em Cristo que fez com que a mãe cananeia não desistisse de sua súplica em favor de sua filha.

Ainda outra abordagem possível do texto é a de que o episódio da mulher cananeia aconteceu diante dos olhos dos discípulos e está hoje diante dos olhos de todos para que possam reconhecer que a fé é o único fator que define e distingue o verdadeiro povo de Deus. E quem pode julgar a fé?

Também do ponto de vista do aconselhamento pastoral este episó-dio é rico em significância. Quantas são as mães que hoje vivem aflitas por causa de seus filhos doentes, viciados, descrentes? Quantas destas mães hoje procuram o pastor por ser ele um representante do Filho de Davi, chamado e ordenado, e encontram pastores que tomam as palavras duras de Jesus como o único método de agir com estas mães. Pastores que esquecem de mostrar afinal o profundo amor, preocupação e cuidado que Cristo dispensa a elas e seus amados filhos. Como dito acima, Jesus não ensinou e deu algo somente à mulher cananeia neste episódio, mas também aos seus discípulos.

Jonas Feil PauseDourados/MS

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DÉCIMO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

21 de agosto de 2011

Salmo 138; Isaías 51.1-6; Romanos 11.33-12.8; Mateus 16.13-20

Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo

LEITURAS DO DIA

Salmo 138: Este é um Salmo de ação de graças, um cântico de agra-decimento que parte de uma pessoa que experimentou o poder e o amor de Deus (Davi). É a manifestação de louvor ao SENHOR por sua misericórdia e fidelidade à aliança com o povo de Israel. Esse Salmo, assim como outros, ressalta a presença constante do Deus eterno. O versículo seis afirma: “Tu estás lá nas alturas, mas assim mesmo te interessas pelos humildes, e os orgulhosos não podem se esquecer de ti” (NTLH). O SENHOR é fiel em cumprir as suas promessas, o seu amor dura para sempre. E Ele não abandona o trabalho que começou.

Isaías 51.1-6: “O Senhor Deus diz: Escutem, os que procuram a salvação...” (NTLH). Deus faz o povo olhar para o passado e ver tudo o que ele já fez por eles. E assim, fazendo-os olhar para trás, ele mostra o que pode fazer pelo seu povo. Assim cita o exemplo de Abraão e Sara, um casal impossibilitado de ter descendência; de uma mulher estéril, Deus faz uma grande nação.

O Deus que mostrou o seu poder no passado é o mesmo nessa nova situação, por isso ele afirma que fará o seu deserto como o Éden. Deus está preocupado com o futuro do seu povo. Os vv.5,6 afirmam que perto está a salvação do SENHOR, e esta salvação durará para sempre e a justiça de Deus não será anulada. As nações podem esperar em Deus, pois ele as libertará. Deus é fiel em cumprir as suas promessas.

“Escutem.” Essa é a palavra de chamamento. Deus vem ao encontro do seu povo. E Deus vem ao encontro desse povo para lhe dar uma justiça. Não uma justiça própria, mas uma justiça que brota de Deus, ou seja, uma salvação que vem de Deus. A salvação de Deus para o seu povo se traduz na encarnação de Cristo.

Romanos 11.33-12.8: Nos últimos quatro versículos do capítulo 11, o apóstolo Paulo expressa palavras de louvor a Deus (uma doxologia conclusiva). O apóstolo trouxe a parte histórica de sua exposição a uma conclusão. E Paulo, tendo em mente todos os milagres da graça e da mi-sericórdia de Deus tal como eles aparecem em Seu trato tanto com judeus

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como com gentios, sente-se forçado a irromper com um hino de louvor e de agradecimento. Pois são inúmeros e grandes os feitos do SENHOR, e profundo o seu conhecimento e sabedoria. Nem sempre o homem consegue compreender os planos de Deus, mas sempre pode confiar na sua miseri-córdia. O próprio fato que a providência de Deus sustém o mundo. Mundo no qual ele executou seus desígnios da misericórdia em favor do povo mostra uma sabedoria e misericórdia tão inescrutável e incompreensível que só podemos permanecer em devota admiração; não somos capazes de compreender e desvendar a maravilha destes mistérios de Deus.

Por causa da misericórdia divina, diz Paulo, apresentem os vossos corpos como sacrifício vivo e agradável a Deus. Apresentem a vossa vida como sacrifício agradável a Deus. Muitas vezes se pensa que o cristão agrada a Deus somente quando faz alguma coisa na igreja. Mas o que o apóstolo Paulo aponta aqui é para uma vida cristã diária, para a vida do cristão na igreja, mas também e principalmente para uma vida fora das quatro paredes da igreja, ou seja, a semana do cristão. O sacrifício agradável ao Senhor é ser família, pai, mãe, filho, empregado, namorado, professor, médico e etc. Esta é a boa, agradável e perfeita vontade de Deus. E assim, sendo nova criatura em Cristo, o cristão vive uma nova vida. Os dons da graça de Deus, que Ele distribuiu segundo lhe apraz, devem sempre servir para o bem comum.

O TEXTO DE MATEUS 16.13-20

Pode-se notar que o ministério de Jesus é agitado, está sempre rode-ado de pessoas. No contexto da perícope vemos que por duas vezes ele alimenta uma multidão que o seguia (14.13-21; 15.32-39). Jesus fazia também alguns milagres e ensinava o povo. Ao que tudo indica, Jesus no presente texto se retira um pouco da agitação para ter um momento com os seus discípulos. Jesus então vai com os seus discípulos para as regiões de Cesareia de Filipe. Os discípulos precisavam ser preparados para os momentos difíceis que ainda estavam por vir, ou seja, quando Jesus seria entregue para morrer. Assim, Jesus via a necessidade de for-talecer a fé deles.

Jesus faz uma pergunta a eles: “Quem diz o povo ser o Filho de Ho-mem?” (v.13) Dessa pergunta Jesus obtém algumas respostas. Apesar das muitas injúrias e difamações que os fariseus colocavam sobre Jesus, o povo ainda tinha uma grande estima por ele. Deram três amostras de respostas típicas, sem dúvida das opiniões mais imaginosas e menos superficiais então correntes: João Batista ressuscitado dos mortos, um segundo Elias, outro Jeremias. As três sugestões tinham ao menos duas coisas em comum: identificavam Jesus com um vulto do passado em

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vez de reconhecê-lo como personalidade única. E continham perigosas e enganosas meias-verdades, pois, embora Jesus possuísse algumas das características de cada um desses três grandes homens, transcendeu-os a todos. Assim mesmo, tendo Jesus em alta estima, o povo não tinha noção da verdadeira identidade de Jesus.

Ouvindo estas respostas, Jesus aprofunda a questão: “E vocês? Quem vocês dizem que eu sou? (v.15). É chegada à hora da decisão, da declaração pessoal de fé. Este foi o momento decisivo em que foi feita a separação da igreja do Novo Testamento da teocracia do Antigo Testamento. Simão Pedro deu, de modo impetuoso, emocional, forte e sincero, uma resposta em nome dos apóstolos. Como seu representante, proferiu numa decla-ração breve: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (v.16).

Este não era o sentido que a ideia judaica tradicional ligava à palavra Messias, tendo-o como um mero libertador da servidão terrena, porém era uma confissão concisa, mas compreensiva da condição de ele ser o Cristo, da divindade de Jesus. Ela expressava sua fé nele como o Redentor prometido. Era uma resposta e uma analogia da expressão de Cristo “Filho do homem”, no versículo 13. Nestas palavras, por isso, está incluso todo o Credo Apostólico: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. A saber, que ele é o Filho de Deus, Pai Todo-poderoso, o Criador do céu e da terra, e que nosso Senhor Jesus Cristo foi concebido do Espírito Santo.

Depois de ter ouvido a confissão de Pedro, Jesus deu-se por muito satisfeito. Jesus chama a Pedro de “bem-aventurado” (feliz, abençoado) no sentido de possuir a felicidade como um presente de Deus. Dirige-se a ele de modo solene: “Simão, filho de João”. Mas explica a bênção, colocando a glória a quem ela pertence. Pois, o que Pedro confessa, como sendo sua fé, não era qualquer vã filosofia humana, ou seja, de sua própria natureza e razão. Era uma revelação do próprio Deus. O conhecimento verdadeiro de Jesus Cristo, ou seja, a verdadeira fé é obra e dom de Deus.

No versículo 18 Jesus ainda adiciona uma promessa que diz respei-to à igreja como um todo até o fim dos tempos. Dirigindo-se, de modo solene, a Pedro, que é o porta-voz dos discípulos, afirma-lhe que sobre sua confissão ele edificará sua igreja. Ele não diz: Sobre ti, mas: “Sobre esta rocha”. Como Lutero o expressa: “Sobre esta pedra”, entende, não o que você é. Pois sua pessoa seria fraca demais para tal fundamento. Mas sobre a confissão de fé que o torna uma pedra, Jesus edificará a sua igreja. Este fundamento aguenta e é suficientemente firme. O diabo não será capaz de destruí-la ou abalá-la. Contra esta igreja, tal como está edificada, e porque está edificada sobre esta pedra, “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”, as portas do inferno não podem prevalecer. Todas as forças do inferno juntas não a conquistarão. Ela é forte e duradoura, enquanto reina nela a fé no Pai e em Jesus Cristo, seu Filho, nosso Redentor, e no

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Igreja Luterana

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Espírito, que concede esta convicção bendita.Em vista da afirmação de Pedro, Jesus Cristo, em reconhecimento de

sua fé, confere a Pedro e a todos quantos crêem as chaves do reino dos céus. Neste sentido, Jesus toma a parte (Pedro e seu ofício apostólico) pelo todo (a Igreja e seu ofício apostólico). A promessa foi feita originalmente a Pedro, cristão, mas, por extensão, a todos quantos têm a mesma fé de Pedro e fazem a mesma confissão fé.

As chaves são um símbolo do poder que dá admissão em uma casa, ou que impede a qualquer pessoa não autorizada a entrar nela. Jesus Cristo, o Filho do Deus vivo, tem a chave, ou o poder de fechar e abrir a casa ou o reino de Deus (Ap.3.7). Ele conseguiu misericórdia e salvação para todos os pecadores. Ele dá esse poder e autoridade a seus fiéis discípulos. Todo aquele que crê tem parte em Cristo e em tudo que Cristo possui. Todo aquele que crê, esse está no reino dos céus, tem perdão dos peca-dos, vida e salvação. Como traz a Confissão de Augsburgo: “O poder das chaves, ou poder dos bispos, é, segundo o evangelho, o poder ou ordem de Deus de pregar o evangelho, remitir e reter pecados e administrar os sacramentos” (Art. XXIII, 5).

O presente texto termina com o pedido de Jesus para que a ninguém contassem que ele era o Messias. À primeira vista este pedido de Jesus parece estranho, mas se formos olhar o contexto da época, iremos ver que os judeus estavam com uma falsa concepção procurando um Messias que desse ao povo a libertação política. Assim, se isso fosse espalhado, poderia levar a uma revolução precipitada.

APLICAÇÃO HOMILÉTICA

Em dias atuais ouvimos muitas pessoas falando de Cristo. Alguns o têm como um grande homem, um profeta, um grande exemplo. Contudo, as Escrituras nos mostram que Jesus é muito mais do que isso. Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo, o ungido, o escolhido de Deus, que havia sido prometido ao longo de todo o Antigo Testamento. E este precisa ser o testemunho da Igreja Cristã, precisa sempre apontar que Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo.

Deus entrou na vida de Pedro, como Jesus mesmo afirmou, “não foi carne e sangue que te revelaram isso, mas o próprio Deus”. Jesus constrói a sua Igreja. A Igreja é, de fato, construída. E quem a constrói é Jesus. Cristo é o fundamento da Igreja. Sem Cristo não há Igreja. Se a igreja tem como fundamento a Jesus Cristo, ninguém vai conseguir destruí-la. Nem eu, nem vocês, nem a morte, nem as portas do inferno, nem ateísmo, nem consumismo, nem liberalismo conseguirão destruí-la.

Jesus fez uma promessa a Pedro. E se olharmos para o passado, para

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aquilo que as Escrituras afirmam, pode-se ver que Deus é fiel em cumprir aquilo que promete. As leituras que compõem esse domingo apontam para um Deus fiel e poderoso.

Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo, o cumprimento da promessa de Deus. Aquele que por meio do Espírito Santo cria a fé em nosso coração e nos torna bem-aventurados (felizes). Jesus é o Cristo, o fundamento verdadeiro e único, sobre o qual a igreja se mantém de pé.

PROPOSTA HOMILÉTICA

JESUS É O CRISTO, O FILHO DO DEUS VIVOQue se revela a nósQue constrói a IgrejaQue sustenta a Igreja

Jonas Roberto SchultzSão Leopoldo/RS

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DÉCIMO PRIMEIRO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

28 de agosto de 2011

Salmo 26; Jeremias 15.15-21; Romanos 12.9-21; Mateus 16.21-28

Dentro do contexto litúrgico, este texto faz parte do 11º Domingo após Pentecostes da Série A. Os domingos após Pentecostes enfatizam os ensinamentos e o ministério de Jesus.

CONTEXTO DO TEXTO

Pedro, em nome dos discípulos, havia feito uma confissão esplêndida de fé, dando, finalmente, provas de que tinham conhecimento a respeito de quem Jesus era, o Messias. Cristo, por isso, julgou que chegara o tempo próprio para prepará-los para o grande clímax ou auge de sua obra. Já deviam estar prontos para suportar as notícias.

TEXTO

Os discípulos precisavam ser preparados para os dias difíceis que iriam acontecer mais tarde, quando Jesus seria entregue para morrer. Precisavam crescer na fé em Jesus para não vacilarem nos momentos de sua paixão e morte.

Jesus passa a revelar-lhes ou a dar-lhes informação clara e detalhada a respeito de sua missão aqui na terra. Ele precisa ir a Jerusalém. Pesava sobre ele a missão divina de resgatar a humanidade perdida. Ele precisava morrer. Os anciãos, os principais sacerdotes e os escribas conseguiriam matá-lo, mas ele ressuscitaria no terceiro dia. Este foi o conteúdo da conversa que Jesus teve com os discípulos.

O impulsivo Pedro, provavelmente movido pelo sentimento de satis-fação pelo grande louvor que o Senhor lhe dera, chama Jesus de lado e começa a repreendê-lo dizendo: “Tem compaixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá”. Foi uma interferência bem intencionada, mas carregada de implicações para a obra da salvação. Pedro não concorda. Jesus, isso não faz sentido! Morte? Pedro não consegue entender o Cristo crucificado. Pedro quer o Cristo sem a cruz! Quer ir ao monte da glória sem passar pelo vale da humilhação. “Tem compaixão de ti, Senhor; Senhor; isso de modo algum te acontecerá”. Jesus responde: “Arreda! Satanás; tu

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és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e, sim, das dos homens.” Cristo sem a cruz é uma ideia humana, diabólica. Aí está Satanás falando pela boca de um discípulo destacado de Jesus, renovando sua investida no deserto (Mt 4.1-11).

Então Jesus continua seu “bate-papo” interrompido por Pedro falando do que representa ser um discípulo dEle: negar-se, tomar a sua cruz e segui-lo. Contudo, virá o dia em que Jesus voltará não mais em pobreza e humildade, mas na plena glória de sua divindade, que ele exercerá também segundo a sua natureza humana. Acompanhado dos anjos, ele virá para o juízo, e retribuirá a cada um de acordo com o que fez, segundo cada pessoa atestou sua fé pelas obras de suas mãos.

USO HOMILÉTICO

Este texto me chama atenção pelo menos em dois aspectos. O primei-ro é que ele me ajuda naquelas horas cheias de angústia, quando estou assolado por dúvidas e perguntas.

Lembro-me, então, de Pedro, aquele homem que foi firmado sobre a rocha de sua confissão: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo!” e que, no entanto, logo após, fazendo-se de conselheiro especial e procurador de seu Senhor, tentou tirar-lhe a ideia da morte dizendo: “Tenha paciência, Senhor! isso de modo algum te acontecerá!” (Mt 16.21 ss.) E que choque não deve ter sido para o coração deste tão fiel seguidor de seu Senhor quando lhe foram dirigidas as palavras: “Arreda! Satanás; tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das causas de Deus, e, sim, das dos homens”!

Como é consolador lembrar que este meu irmão Pedro também teve, como eu, suas profundas dúvidas quanto ao modo de agir de Deus, tão estranho para o raciocínio humano. E quando chego a este ponto, quando se torna claro que não sou em nada um homem excepcional com estas minhas dúvidas, quando reconheço que o grande tentador, desde o início de sua existência como Maligno, efetivamente ataca os filhos de Deus com a insinuante pergunta: “Será mesmo assim que Deus disse?”, então as minhas mãos se unem e meus joelhos se dobram diante de Deus e me submeto à Sua vontade.

O segundo ponto é o que significa cruz e tomar a cruz?A palavra cruz só é compreendida quando vista dentro do contexto do

nosso texto, ou seja, à luz da dificuldade de Pedro em harmonizar seus ideais messiânicos distorcidos e a realidade do Messias sofredor.

Nos dias de Cristo, a cruz não era um belo símbolo como hoje. Era símbolo de vergonha e criminalidade. Era a pena de morte destinada aos escravos. Ela representava vergonha, humilhação, morte.

dÉCImo PrImeIro DomIngo aPÓs PenteCostes

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Em nossa vida, o que é a cruz? Seria uma doença grave? Sofrimento? Dores? Não. Doença e sofrimento são problemas que se abatem sobre todos os homens. Resultam de nossa condição pecaminosa e podem ter uma intenção pedagógica de Deus, nos atraindo para junto de si.

O tomar a cruz é algo que se limita ao discípulo de Jesus. Ser discípulo é ter uma cruz. Tomar a cruz é enfrentar o problema, ser corajoso na vida cristã, assumir o discipulado. Pedro não conseguia “digerir” a ideia do Cristo na cruz. Isto o incomodava. Ele não podia concordar. Contudo Jesus diz: Nega-te a ti mesmo, ou seja, nega a tua vontade, teu palpite e toma a tua cruz. Se meu sofrimento te faz sofrer, saiba que não pode ser diferente. Toma a tua cruz. O meu sofrimento é necessário. Só posso ser teu Mestre e Senhor, e tu meu discípulo, passando pelo vale do sofrimento.

Hoje Jesus é muito comentado e se fala muito a respeito dEle. Jesus é o maior psicólogo que já existiu, mas sem a cruz; Jesus é um exemplo a ser seguido, mas sem a cruz. Jesus traz felicidade e prosperidade, mas nada de cruz.

Qual é a tua cruz? Qual é a minha cruz? Nossa vida como discípulos, com tudo o que a envolve, é a nossa cruz.

Os apóstolos de Cristo, na qualidade de embaixadores do Reino, tiveram dificuldades. Jesus não rejeitou Pedro depois de sua resposta. Esse fato ajuda todos os cristãos nas suas dificuldades, nos aproxima e consola, pois Jesus acolhe todas as nossas dificuldades e não nos descarta como seus discípulos.

PROPOSTA HOMILÉTICA

O que significa tomar a cruz e seguir a Jesus?

Miquéias EllerAriquemes/RO

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DÉCIMO SEGUNDO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

4 de setembro de 2011

Salmo 32.1-7; Ezequiel 33.7-9; Romanos 13.1-10; Mateus 18. 1-20

LEITURAS DO DIA

Salmo 32.1-7: Esse Salmo mostra um homem influente, Davi, sen-tindo a alegria do perdão do próprio Deus após confessar o seu pecado. O perdão distende, relaxa, põe um bálsamo curativo na ferida aberta pelo pecado cometido. Ferida que atormentava dia e noite a Davi. Uma vez sentindo o perdão, o salmista canta bem alto a salvação que recebeu do Senhor que o protege.

Ezequiel 33.7-9: Para que o perdão aconteça, é necessário que al-guém aponte o erro. Deus coloca pessoas encarregadas de orientar o seu povo para que andem de acordo com a vontade de Deus. Essas pessoas encarregadas tem o dever de apontar o pecado cometido visando a um fim proveitoso: o arrependimento e perdão.

Romanos 13.1-10: Ezequiel e tantos outros profetas foram usados por Deus para orientar o seu povo a andar de acordo com os seus preceitos. O apostolo Paulo ensina que as autoridades estão nos seus cargos porque Deus os colocou lá e importa que sejam obedecidos. Lutero, na explicação do quarto mandamento, diz: “Devemos temer e amar a Deus e, portanto, não desprezar, nem irritar nossos pais e superiores; mas devemos honrá-los, servi-los, obedecer-lhes, amá-los e querer-lhes bem”. Tudo isso para que impere o perdão e o amor mútuo.

O TEXTO DE MATEUS 18.1-20

É um texto em que Jesus mostra a realidade do pecado inerente ao ser humano e como lidar com ele, priorizando trazer o pecador ao arre-pendimento para que possa gozar dos benefícios do perdão que Deus quer dar a todo ser humano.

Antes de tudo, Jesus condena o orgulho e nos convida a aprender com a humildade que Ele demonstra e que é o oposto da atitude competitiva. Ele nos ensina a importância de um coração verdadeiramente humilde. Para ilustrar essa verdade, Jesus usa uma criança. Ele deixa claro que a fé que nos permite entrar no Reino de Deus é uma de criança. A humildade que nos traz a felicidade e o favor de Deus também é uma qualidade das

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crianças. Ao olharmos mais para as crianças, olhemos também para a nossa “criança interior” que sabe o caminho para o colo do Pai.

Poucas coisas são menos compatíveis com o espírito cristão do que o desprezo pelos “pequeninos”, sejam eles crianças, pessoas marginali-zados pela sociedade, minorias raciais, pessoas excluídas de uma forma ou de outra numa sociedade altamente competitiva e mesmo dentro de organizações eclesiais.

Através da parábola da ovelha perdida, Jesus mostra mais uma vez o quanto esses pequeninos são valorizados pelo Pai. Deus ama o ser humano, cada um deles, sem exceção, e se alegra quando estes se arrependem de seus pecados e retornam aos braços abertos do Pai.

“Se teu irmão pecar contra você...” (v. 15). Em vez da atitude julga-dora e vingativa que tantos e tão prontamente adotam quando se sen-tem lesados por um irmão, Jesus recomenda aqui que demos prioridade à recuperação do irmão que eventualmente nos prejudicou. A primeira medida a ser tentada é sempre “ganhar o irmão”, prevalecer o perdão, o amor mútuo.

Queremos ser perdoados, mas quando saímos da presença de Deus esquecemos essa realidade no nosso cotidiano. Usufruímos da graça e só pensamos em receber dádivas. Esquecemo-nos de passar as dádivas de Deus adiante ao nosso próximo.

Revestidos da identidade perdoadora do Pai, em Jesus Cristo, é preciso reconhecer que os outros não são responsáveis por nossa infelicidade. Per-doar significa aceitar. Aceitar que vivemos dependendo da graça de Deus. Aceitar que nós mesmos somos pessoas pecadoras e perdoadas. Mostrar essa realidade ao irmão que pecou tendo em vista o arrependimento, volta ao colo do Pai, para poder sentir-se extremamente feliz, como diz o salmista, sentindo a alegria de ser um ser humano perdoado por Deus.

SUGESTÕES HOMILÉTICAS

Estamos no Décimo Segundo Domingo após Pentecostes, momento em que visamos o crescimento da igreja, orientados pelo próprio Senhor da igreja – Cristo. Nada mais apropriado do que dar ênfase ao perdão mútuo, cultivar o amor entre os seres humanos. Como diz o apóstolo Paulo, se quiserem ficar devendo alguma coisa, que seja o amor uns aos outros.

Combater a hipocrisia, o orgulho de ver o argueiro no olho do nosso irmão e não ver a trave no nosso próprio olho (Mt 7.3). Fazer prevalecer a ordem e decência de acordo com as orientações do próprio Deus. Infeliz-mente todo ser humano, em determinado tempo, cai em alguma falta. Se acontecer, o erro deve ser apontado, mantendo o processo o mais restrito possível, evidenciando com isso o incentivo ao perdão.

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LeiMostrar que ninguém escapa de errar. Nesses momentos, é preciso que

haja alguém que mostre o erro ao que errou. Essas pessoas são colocadas por Deus. Os profetas, os apóstolos, as autoridades civis e eclesiásticas. Condenar o erro, condenar a atitude contrária à vontade de Deus.

EvangelhoDeus quer ter o ser humano junto de si, quer dar-lhe o perdão, o con-

forto de que tanto precisa. Para isso envia seus mensageiros a fim de que os que erraram possam se arrepender e voltar a Deus, possam receber o perdão, a graça maravilhosa de Deus e, assim, possam exclamar como o salmista: “Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada, cujo pe-cado é coberto. Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não atribui iniquidade e em cujo espírito não há dolo” (Sl 32.1,2).

ObjetivoCondenar o erro do ser humano com o propósito de que haja arrepen-

dimento e que a graça de Deus possa ser dada em abundância. Cultivar o perdão e amor mútuos. Perdão é leveza conquistada junto à cruz de Jesus Cristo. Leveza que é fermento do Reino, que faz nosso ambiente refletir que somos feitos à imagem de Deus. Que o Senhor tenha misericórdia de nós, e nos ajude a transmitir graça em nossas ações e perdões.

Tema: Vivendo o perdão de DeusVendo a realidade do pecado;Sentindo o perdão de Deus em nossas vidas;Levando o perdão de Deus ao que tem errado;Mostrando a universalidade da graça de Deus.

Olmar NornbergBrasil Novo/PA

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dÉCImo segunDo DomIngo aPÓs PenteCostes

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DÉCIMO TERCEIRO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

11 de setembro de 2011

Salmo 103.1-12; Gênesis 50.15-21; Romanos 14.1-12; Mateus 18.21-35

CONTEXTO LITÚRGICO Pentecostes nos faz lembrar da continuidade da presença e do gover-

no de Deus. O mesmo Deus que criou e exerceu o seu governo de forma direta em vários momentos descritos no AT1 encarnou-se, atuando de forma direta na pessoa de Jesus Cristo. Esse Deus continua, a partir do Pentecostes, na pessoa do Espírito Santo, a atuar e a governar toda a criação. Em outras palavras, se Emanuel é Deus conosco, Pentecostes é Deus presente e atuante.

CONTEXTO CIVIL

Estamos ainda próximos ao “Dia da Pátria”2. Podemos fazer pontes entre o jeito como Deus conduz o governo em seu reino e o jeito como a sociedade o realiza no governo do reino secular. Podemos também ques-tionar: Como igreja, estamos sendo ponto de referência para que tipo de governo? Em outras palavras, como povo do Reino de Deus, como local por onde esse Reino de Deus é anunciado, aqueles que nos ouvem e nos rodeiam conseguem perceber em nós a forma do governar de Deus?

TEXTOS

Salmo 103.1-12: A misericórdia e o amor de Deus. “O que ele fez por um, ele faz por todos” 3. Há no paralelo “iniquidades x enfermidade” a profunda relação de sofrimento sentida por qualquer pecador. O pecado é uma doença e, como tal, causa dores. O perdão por outro lado não eli-mina a doença, mas é substancial para eliminar as dores. Os pecados são redimidos, as dores são saradas (Sl 103.3). O texto expressa a forma de governo de Deus, que é um reinado que concede benefícios (vv.2,5); que é doador de saúde para a alma e para o corpo (vv.3,4); que é transparente,

1 Torre de Babel; chamado de Abraão; sarça ardente; coluna de fogo; etc.

2 07 de setembro, Dia da Independência do Brasil

3 MANUAL BÍBLICO SBB. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2008. p. 383

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que se faz conhecido (vv.6,7); atua com misericórdia, sem retribuição com mal ao mal praticado, que afasta e esconde o mal cometido (vv.8-12).

Gênesis 50.15-214: Três coisas são destacadas aqui: deixar que Deus seja o juiz para os erros alheios (v.19); ver que mesmo sob a ação pecadora, a providência divina e o seu governo ainda são reais e ativos e assim Ele pode usar toda espécie de mal para a construção do bem, segundo a sua vontade (v.20); em seu Reino, ou no governo do Reino de Deus, alinhando com o Salmo, pelo mal que foi praticado se recebe total perdão, mas não apenas o perdão. No Reino do governo de Deus também se recebe amor, afeto e cuidado (v.21).

Romanos 14.1-12: A igreja é chamada a acolher os fracos na fé. Mas quem é fraco? O exemplo inicia-se com o tipo de alimento. Passa pela questão dos dias e termina como se Paulo dissesse: “pouco importa”, pois tudo existe em e para o Senhor. Vale ressaltar que a fraqueza também está na vida piedosa quando se despreza quem não a tem. Por outro lado igualmente fraco é o que não tem vida piedosa e julga aquele que a busca ter (Rm 14.10). O centro da questão é o olhar para “quem é o outro?” Mas antes disso é preciso saber que “o outro”, é “o outro” que Deus sustém (Rm 14.4). Quem seria capaz de julgar a Deus? Pois o outro é expressão da vontade, do cuidado e do governo de Deus. O Senhor morreu para que o outro seja inteiramente dEle (Rm 12.9). Nesse governo contínuo de Deus que tanto chama como mantém, Deus faz cada um em sua pluralidade lhe servir. Em outras palavras, Deus é quem é o Senhor e esse Senhor não me incumbiu da “ronda”. Ele me incumbiu do descanso no amor e na certeza de que é Ele quem produz tanto o querer quanto o realizar. Mas também me é uma advertência: cada um dará contas de si mesmo a Deus. Já isto é muito para qualquer ser humano: cuidar de si próprio.

Mateus 18.21-35: Reino de Deus. O assunto começou no fim do capítulo 17 com a questão do pagar ou não impostos. Jesus pergunta e Pedro responde: Os estrangeiros devem pagar, não os filhos (Lc 17.25,26). Mas ainda que os filhos fossem isentos, Jesus começa a mostrar como as coisas são em seu Reino: mesmo que não precisássemos pagar, vamos pagar (Lc 17.27). O capítulo 18 então segue com exposições da forma de governo de Deus: os valores de maior ou menor não seguem os padrões humanos (18.1-5); o prêmio da salvação não vem para os ‘merecedores’, mas justamente para os imerecedores e perdidos (18.11); o pecado é, no máximo, diminuído, encoberto, silenciado (18.15); o perdão é ilimitado, os súditos devem refletir o jeito de governar do Rei (18.21-35).

4 KIDNER, Derek. Gênesis – introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova, 1979. p. 207.

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Igreja Luterana

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CONTEXTUALIZANDO

Todas as questões giram em torno da má compreensão do funciona-mento do governo de Deus em seu Reino, aflorada pela questão do maior ou do menor. Pois assim o é no governo secular. Existimos em classes sociais. Somos separados em etnias. Em gênero. Em competências. Ou seja, no reino do governo secular somos todos classificados para que possamos ser encaixados em um ou em outro caso. Para uma classificação é necessário uma avaliação, logo, julgamento. Uns maiores, outros menores.

Esse paradigma é importado pelos discípulos de Jesus para o governo do Reino dos céus. Então, a motivação da pergunta “quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe?” deve ser entendida à luz da tríade apresentada por Jesus no 18.15-18. Ali os discípulos entenderam uma fórmula para definir os pertencentes ao Reino dos céus.

Poderíamos expressar assim: 1) Alguém pecou; 2) eu (que não pequei) atuo primeiramente; 3)

chamo uma testemunha; 4) chamo a igreja; 5) daí defino se pertence ou não ao Reino dos céus; 6) se houve arrependimento, o pecador é um irmão, co-filho do Reino; 7) se não houve arrependimento, não é irmão, mas gentio e publicano, estrangeiro ao Reino.

Pedro então pergunta: quantas vezes? Com a parábola do credor incompassivo, Jesus alinha com a epístola de Romanos e tira o foco do outro, do que pecou, do que está no banco dos réus, e inverte: olhemos para nós. Nós somos referência. Ou, o nosso pecado é referência quando o pecado do outro aparece. Talvez por isso, entendo bem isso, Lutero começa o Catecismo com os Dez Mandamentos. Ou seja, denúncia do pecado. Também a Confissão de Augsburgo trata logo de início em seu segundo artigo: Do pecado original. Se tivermos a compreensão do ta-manho do nosso próprio pecado, o pecado dos outros contra nós passa a ser pecado insignificante.

Uma correta compreensão do pecado nos faz desligar o “radar”, pois o pecador de sinal mais intenso e mais próximo a ser localizado seria eu mesmo. Jesus aponta isso aos discípulos e a todos nós que recebemos como benefício, como anti-pecado, a vida eterna. E aqui aparece o tamanho do meu pecado, do tamanho de uma vida eterna. Ou seja, o meu pecado me causa a morte eterna. Por isso Deus me devolve o que o pecado me tirou: vida eterna. Nesse sentido, até o assassinato, a retirada da vida terrena é menor do que o meu pecado.

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PONTOS DE CONTATO

O Salmo nos lembra como Deus age conosco: perdão sem merecimento. Gênesis atesta um exemplo desse perdão que ultrapassa o perdoar, mas que, como também disse o Salmo, reverte em afeto e amor. A Epístola alinha com Gênesis e o Salmo na questão da providência divina, do seu governo, do seu cuidado e, assim, nosso julgamento fica limitado ou nulo quando temos à nossa frente e à nossa volta a vontade e o governo de Deus sendo realizados.

O Evangelho nos aplica: a. ao Salmo: perdão sem merecimento. b. a Gênesis: chamando-nos a proceder da mesma forma, ou seja,

como José, deveríamos nós também perdoar generosamente. c. à Epístola quando esse perdão deve pulsar em aceitação, acolhi-

mento.

Ondiekson F. LenkeRealengo/RJ

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DÉCIMO QUARTO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

18 de setembro de 2011

Salmo 27.1-9; Isaías 55.6-9; Filipenses 1.12-14, 19-30; Mateus 20. 1-16

CONTEXTO

No Pentecostes são reconciliados os povos e as línguas separados em Babel. Em Babel, houve desencontro e dispersão. No Pentecostes, houve reconciliação e reunião, o evangelho de Cristo foi pregado nas línguas das nações. É a festa do acolhimento e da integração dos que antes eram estranhos, mas agora, pela pregação do evangelho de Cristo, foram rece-bidos como filhos de Deus. Como escreveu o apóstolo Paulo: “É por meio de Cristo que todos nós, judeus e não-judeus, podemos ir, pelo poder de um só Espírito, até a presença do Pai” (Ef 2.18 NTLH).

TEXTO

Essa parábola é registrada apenas por Mateus. Essencialmente é uma parábola do reino de Deus, onde a graça de Deus é o fator predominante. Jesus não está querendo mostrar como os patrões devem pagar os seus empregados, ou sobre outros problemas econômicos com os quais as pessoas se preocupam tanto nos dias atuais.

O ponto central da parábola é mostrar a bondade e a generosidade de Deus nos atos do imaginário dono de casa que foi contratar trabalhadores para trabalhar na vinha. E pagou o salário de um dia completo mesmo para aqueles que não trabalharam o dia todo.

Jesus contou essa parábola depois do encontro com o jovem rico que por conta própria queria ser justo diante de Deus. Por não ter aceito o pedido de Jesus de vender suas propriedades e dar aos pobres e depois segui-lO, Ele alerta seus discípulos sobre o perigo das riquezas. Em se-guida Pedro questiona: “Eis que nós tudo deixamos e te seguimos; que será, pois, de nós?” (19.27) Jesus promete recompensa: “Receberá muitas vezes mais e herdará a vida eterna” (19.29).

Mas na parábola Jesus os adverte do perigo de julgar o assunto por um padrão terreno, pois a lógica da retribuição não funciona no Reino de Deus: não há “menos céu” ou “menos galardão” para quem chega a Cristo

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mais tarde. Os primeiros trabalhadores quiseram negociar e combinar o preço da diária, e isso foi feito. Já para todos os que chegaram depois o dono simplesmente disse: “Eu pagarei o que for justo”. Em vez de combi-nar o pagamento, foram logo ao trabalho e confiaram no senhor quanto ao que ganhariam com isso. Além disso, Deus não dará menos que o combinado aos primeiros, apenas reserva-se o direito de dar igualmente aos últimos.

A parábola descreve dois episódios: 1. A contratação dos trabalhadores e a ordem generosa relativa ao pagamento do salário. 2. A indignação dos que se julgam prejudicados.

Vv. 1,2: Logo pela manhã o dono de casa conseguiu achar alguns trabalhadores, e os contratou, e ordenou que fossem logo ao trabalho. O dia de trabalho dos judeus tinha uma carga horária de 12 horas, come-çando às seis da manhã até às seis da tarde. Foram contratados por um denário cada um. Ele ofereceu esse salário e eles concordaram, ou seja, havia um contrato.

Vv. 3,4: Três horas depois, às nove horas da manhã, saiu novamente. Na praça do povoado, onde ficavam as pessoas desempregadas esperando que alguém as contratasse, achou outros desempregados. Com esses não combinou salário, apenas disse: “Vos darei o que for justo.” Eles concor-daram com as condições e foram trabalhar na vinha.

Vv. 5-7: Ao meio dia e às três da tarde repetiu o mesmo processo, sendo ajustado o mesmo contrato e da mesma forma. Mas a última saída do dia foi marcante. Já eram cinco da tarde e o dia de trabalho terminava às seis, quando o dono de casa saiu à procura de mais trabalhadores. Novamente foi até a praça, e lá encontrou desempregados, pessoas que queriam ter trabalhado, mas que não tinham sido contratadas. Então disse: “Ide também vós para a vinha.” Não lhes especifica qualquer recompensa ou salário. Apenas pediu que fossem.

V. 8: Ao final do dia o senhor da vinha deu ao seu administrador a or-dem de pagar os trabalhadores. Chama a atenção a ordem de pagamento: devia iniciar com os que vieram trabalhar apenas uma hora. Começando pelo último que veio, devia ir até o primeiro. Cada um devia receber a soma total do contrato, soma que o dono de casa havia indicado ao ad-ministrador.

V. 9: Algo fora da normalidade acontece. De acordo com o costume da época, o tempo trabalhado decidia o valor do salário. Caso trabalhasse poucas horas receberia menos do que aquele que trabalhou o dia inteiro. Mas quando chegaram para receber o salário aqueles que foram contra-tados na última hora do dia, cada um deles recebeu um denário, como se tivesse trabalhado o dia inteiro.

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V. 10: Quando vieram os trabalhadores que haviam sido contratados na primeira hora da manhã, por meio de um contrato regular, esperavam receber um salário maior que os demais. Mas cada um deles recebeu um denário.

Vv. 11,12: Aceitaram o dinheiro, mas logo começaram a reclamar do patrão. Ficaram revoltados porque aqueles que trabalharam apenas uma hora receberam o mesmo salário.

Vv. 13,14: O patrão escolhe um do grupo que estava questionando e chama-o de amigo, desta forma combina respeito com repreensão. Ele havia recebido o que haviam combinado, o que deveria fazer é pegar o dinheiro e ir embora sem fazer protesto.

Vv. 15,16: Ele contesta o direito de qualquer um para interferir no seu modo de gastar seu dinheiro. É pura maldade, ciúme, inveja que alguém esteja insatisfeito com a bondade do patrão e com generosidade que faz mais do que lhe é exigido. Por isso Jesus repete a lição do relato, capítulo 19.30: “Porém muitos primeiros serão últimos; e os últimos, primeiros.

A parábola é endereçada a pessoas semelhantes a esses murmurado-res, que criticam o evangelho, a graça e a bondade de Deus. A estes Jesus quer mostrar o quanto sua crítica é injusta, odiosa, egoísta e impiedosa. E Deus é assim tão bom, cheio de compaixão para com seus filhos.

Outras parábolas contadas por Jesus mostram a bondade, o amor de Deus que vai completamente contra a nossa lógica humana. Da Ovelha Perdida (Mt 18.10-14), o pastor deixa as noventa e nove e vai à procura de uma que se perdeu. Da Moeda Perdida (Lc 15. 8-10); do Filho Perdido (Lc 15. 11-31). São textos que vão contra a nossa racionalidade.

Neste contexto se encaixa o que o apóstolo Paulo escreveu aos Ro-manos: “Portanto, tudo isso depende não do que as pessoas querem ou fazem, mas somente da misericórdia de Deus” (Rm 9.16 NTLH).

Um fato marcante que vem ao encontro dessa parábola que Jesus contou é o do malfeitor que foi crucificado ao seu lado na cruz. À beira da morte, ele diz: “Jesus, lembra-te de mim quando vieres no teu reino. Jesus lhe respondeu: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 24. 42-43). Vemos como a maneira de Deus nos amar vai contra a nossa lógica. Esse trabalhador (malfeitor) poderíamos dizer que foi contratado na última hora do dia.

APLICAÇÃO HOMILÉTICA

O assunto: Jesus sempre se preocupou com as pessoas simples, com os desprezados, com aqueles aos quais a sociedade não dava a mínima importância, com aqueles que eram considerados lixo. E no texto de hoje Jesus mais uma vez vem ao encontro e conta essa parábola para mostrar

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que a recompensa de Deus, “galardão”, não depende do que a pessoa faz, mas do fato de que Deus é bom e misericordioso.

Objetivo: Anunciar ao ouvinte o Deus misericordioso que não age segundo a nossa lógica humana. Com a mensagem, pode-se atingir dois grupos: aqueles que se colocam diante de Deus com suas obras, tentando justificar a si próprios (eu mereço e conquistei o tesouro no céu); aqueles outros que reconhecem que não têm nada a oferecer, mas que também não confiam na misericórdia e graça de Deus (os meus pecados Deus jamais perdoará).

Tema: Somos trabalhadores na vinha de Jesus

- Todos os trabalhadores têm o salário da parte de Deus (vida eter-na).

- O salário de Deus sempre nos causará espanto, pois vai contra a nossa lógica.

- Não cabe a nós trabalhadores dizer quanto Ele deve pagar aos tra-balhadores (não cabe a nós julgar).

- Cada trabalhador tem sua função aqui na vinha, alguns com um posto de mais destaque e já outro com menos.

- Mas o Cristo é o mesmo para todos. - Todos dependem dEle na mesma proporção.

CONCLUSÃO

Todos nós estávamos na praça, desempregados, perdidos, sem ne-nhuma esperança. E o nosso Senhor nos chamou para trabalhar em sua vinha. De tempo em tempo volta com mais trabalhadores que também estavam desocupados, assim como nós. E o salário é igual para todos, tanto para aqueles que chegaram no início do dia como para aqueles que chegaram quando estava quase encerrando o expediente. Pois o nosso Senhor (patrão) é misericordioso, bondoso, não faz injustiça com nenhum de seus empregados. Continuemos o nosso trabalho na vinha, acolhendo e integrando os novos trabalhadores que o nosso Senhor (patrão) traz a todo o momento para nosso meio para nos ajudar no trabalho.

Reginaldo Gabrecht KummCanarana/MT

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DÉCIMO QUINTO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

25 de setembro de 2011

Salmo 25.1-10; Ezequiel 18.1-4, 25-32; Filipenses 2.1-4 (5-13) 14-18; Mateus 21.28-32

LEITURAS DO DIA

Salmo 25.1-10: O salmista Davi se coloca diante de Deus e confessa que, na sua juventude, havia pecado muito. Deus o conservou em miseri-córdia mesmo nesta situação, porém é preciso se arrepender e se apegar a essa misericórdia. Por isso clama: “Ó Senhor Deus, a ti dirijo a minha oração” (v.1) e “Ó Senhor, lembra da tua bondade e do teu amor”. Ele clama e confessa na certeza da misericórdia que não tem fim. Davi não eleva apenas mãos e olhos, eleva a alma e do íntimo do seu ser confia que será salvo, quando diz: “...Lembra-te de mim, segundo a tua misericórdia, por causa da tua bondade, ó SENHOR” (v. 7).

Ezequiel 18.1-4, 25-32: Deus chama o povo de Israel à realidade e mostra como eles deveriam agir, ou seja, “... convertei-vos e desviai-vos de todas as vossas transgressões...” (v.28) e em seguida, no mesmo ver-sículo, ele mostra a misericórdia de um Deus que ama e quer salvar seu povo: “e a iniquidade não vos servirá de tropeço”. Com a misericórdia de Deus é possível ao povo se arrepender e através de sua providência eles teriam um coração e um espírito novos, vivendo de maneira agradável a Deus.

Filipenses 2.1-4: Nesta perícope o apóstolo Paulo exorta aos cristãos filipenses que, por estarem unidos com Cristo, eles participam do Espírito de Deus. Sendo assim, eles podem viver harmoniosamente em amor fra-terno entre eles, mas para isso todos vivam em humildade e não procurem se exaltar, pois Cristo se humilhou, se esvaziou, demonstrando a graça e a misericórdia de Deus para a salvação de cada um deles.

TEXTO DE MATEUS 21.28-32

Obs.: Seguiremos o Novo Testamento Interlinear (grego) e a NTLH, visto que a ARA altera a ordem dos filhos e consequentemente suas res-postas. Para tanto o livro “Variantes Textuais do Novo Testamento”, lançado em 2010 pela SBB, confirma a ordem proposta para este estudo.

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CONTEXTO

O capítulo 21 do evangelho de Mateus começa relatando a entra-da triunfal de Jesus em Jerusalém. O ministério público de Jesus está chegando ao fim. Está próximo o seu sofrimento final. Após a entrada triunfal, Jesus purifica o templo, realiza milagres e ensina no templo. Parece que o povo começa a reconhecê-lo e ouvi-lo. Diz-nos o versículo 15: “Mas, vendo os principais sacerdotes e os escribas as maravilhas que Jesus fazia...”.

Em razão do que presenciaram, eles interpelam a Jesus: “Com que autoridade fazes estas cousas? E, quem te deu essa autoridade” (v.23). Jesus, por sua vez, em resposta, faz outra pergunta: “De onde era o batismo de João? Do céu ou dos homens?...” (v.25). Como não quiseram responder, com medo de se complicar, Jesus contou a parábola do texto em questão (28-32).

TEXTO

Vv. 28-30a: A parábola dos dois filhos está interligada com o relato da perícope anterior (vv. 24-27), onde o ponto de contato é a atitude que as autoridades religiosas tiveram com João Batista e sua pregação, conforme Lc 3.3: “Ele (João Batista) percorreu toda a circunvizinhança do Jordão, pregando batismo de arrependimento para remissão dos pecados”. A mensagem fazia parte da profecia da proximidade do reino de Deus que seria manifesta em Cristo e na qual os líderes judaicos também não creram e não aceitaram. A pergunta de Jesus na parábola é clara, simples e objetiva: “Quem fez a vontade do pai?”

O pai tem dois filhos. Ele pede ao primeiro que vá trabalhar na vinha e este diz que não vai, se arrepende e acaba indo. E o segundo diz que vai, mas não vai.

Depois de expor a parábola, Jesus pergunta para os ouvintes e, pos-sivelmente para aqueles que estavam questionando sua autoridade (vv. 23-27), o que eles achavam: “Quem dos dois fez a vontade do pai?” – Claro que a resposta é direcionada para o primeiro filho.

Interessante observar que o homem (pai) não reagiu diante da ne-gativa do filho, mas sim, usa de misericórdia tanto para ele como para com o segundo que disse que iria e não foi porque estava se escondendo atrás de palavras.

Vv. 31b,32: A mesma postura que o pai assume, Jesus também deixa a questão em aberto. Ele não fala que os publicanos e meretrizes entrariam no lugar deles, mas sim, entrariam antes deles, pois eles se arrepende-ram e fizeram a vontade de Deus. Jesus não renegou lugar no céu para

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eles. Por mais relutantes que eles fossem contra sua mensagem, Jesus estava com eles.

Os fariseus, porém, sempre reforçavam seu posicionamento e queriam provar que tinham razão. Eles não aceitaram que estavam errados e aí começa o endurecimento do coração. Eles são aqueles que não aceitaram e rejeitaram a pregação de João Batista ao passo que os que ouviram a pregação e se arrependeram são os publicanos (Lc 3.12: “Foram também publicanos para serem batizados...”).

Os fariseus ouviram a vontade do Pai na pregação de João. Deus fala algo e aponta para algo que eles não querem. Deus está apontando Cristo através da mensagem de João e aí eles não querem, ouvem e não querem, E aqueles que aparentemente não queriam são os que fazem a vontade do Pai, se arrependem e creem na mensagem de Deus.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Algumas pessoas estavam questionando a autoridade de Cristo. Num primeiro momento parece que a parábola não tem nada a ver. Jesus, porém, inicia falando que um homem tinha dois filhos. No papel de um pai essa ideia no hebraísmo do patriarcado dá a noção de autoridade. De alguém que possui domínio sobre alguém ou alguma coisa.

O ponto de comparação é o termo “arrependido” que acontece na parábola e depois na comparação do momento.

Jesus quis mostrar mais uma vez aos líderes religiosos da época que estas pessoas que eram por eles desprezadas estavam sob a misericórdia de Deus, e por essa razão Jesus estava ali cumprindo a promessa de Deus em reconciliar o mundo.

Impressiona a misericórdia de Deus. Os fariseus estavam recebendo mais uma oportunidade de arrependimento. O próprio Jesus continuava a pregação de Batista: “Arrependei-vos, pois está próximo o reino dos céus”...

Olhando para a parábola, poderíamos nos colocar no lugar de qual deles? Dos “certinhos” que dizem “eu vou” e acabam não indo? Ou dos que sequer são mencionados nem imaginados como sendo filhos de Deus, que dizem “não” e depois se arrependem e mudam de mentalidade?

A vinha sempre é a igreja, o campo de trabalho do evangelho. Essa é a questão, cuidar da vinha, cultivar o meu povo.

Jesus diz que a atitude deles (fariseus) é a de quem disse sim e não fez, pelo contrário destruiu a vinha; o outro que disse não, entretanto, crê.

Ilustração: Certa vez aconteceu algo numa congregação tradicional que mostra a dificuldade de algumas pessoas em acolher os que estão em busca da misericórdia de Deus e querem se arrepender.

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– Momentos antes do culto, um senhor que há muito não frequentava os cultos estava se dirigindo à porta da igreja. Foi quando se aproximou dele uma senhora. Senhora esta que vinha a todos os cultos, participava em todas as programações, aparentemente tudo certo. Ah! Ela ainda conhecia o homem, pois o mesmo fazia pequenas reformas em sua casa havia tempo.

Ela se dirigiu ao homem e disse: “Qual é mesmo o seu nome?” – A pessoa que presenciou o fato não recorda de ter visto aquele senhor outra vez vir a um culto.

Com este exemplo fica uma preocupação no ar: esta senhora fez a vontade de Deus? Que tipo de pregação ela recebe e/ou como ela interpreta a questão de acolher e integrar os afastados, os irmãos pecadores? Aqui se pode mencionar a exortação de Paulo aos filipenses na epístola do dia.

Jesus recebia os pecadores, os considerados impuros, que não faziam parte do modelo ideal de religiosos da época. Jesus os acolhia, os perdoava e dizia: “Vai em paz, a tua fé te salvou”.

Não esqueçamos: Mateus era cobrador de impostos e foi escolhido para ser discípulo de Jesus. Jesus foi à casa de Zaqueu, o publicano, “jantou com pecadores” e, com a presença de Jesus, a misericórdia de Deus estava ali. Zaqueu se arrependeu e fez a vontade do Pai.

Jesus levou consigo na cruz toda a desobediência e miséria humanas. Todo o pecado estava sobre Ele e quem busca ao menos uma gota de alívio em sua misericórdia encontra a salvação plena. Auxiliando com amor e compreensão os afastados e os que ainda não conhecem a Jesus, estaremos fazendo a vontade do Pai e trabalhando para o crescimento do reino de Deus.

Tema sugerido:

– Acolher e integrar pecadores arrependidos é fazer a vontade de Deus.

René GehmSapucaia do Sul/RS

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DÉCIMO SEXTO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

02 de outubro de 2011

Salmo 80.7-19; Isaías 5.1-7; Filipenses 3.4b-14; Mateus 21.33-46

LEITURAS

Salmo 80.7-19: Este Salmo é uma súplica coletiva do povo, que pro-vavelmente está no cativeiro assírio. A figura da videira usada nos vv.7-19 narra a história do povo de Israel desde o Egito até a entrada na terra prometida, Canaã. A situação presente do povo contrasta com a história que Deus já realizou com seu povo: libertação do Egito, ocupação da terra, expansão no tempo do rei Davi. O pedido que o povo faz a Yahewh é por socorro, para que Yahewh possa vir novamente e trazer a liberdade para o povo. O motivo para o pedido é apresentado nos vv.14-15: “...visite esta vinha; protege o que a tua mão direita plantou...”

Isaías 5.1-7: O texto de Isaías 5.1-7 é uma parábola em forma de canção. Essa “canção” canta o amor e o cuidado que um plantador de uvas teve com a sua vinha. Ele fez tudo o que era necessário para que a sua vinha desse as uvas mais doces: escavou em volta, limpou as pedras, plantou as vides escolhidas, edificou até mesmo uma torre de vigia e um tanque para pisar as uvas. Há por parte do dono da vinha uma grande expectativa pela colheita dos frutos. No entanto, no lugar das uvas doces, o que a vinha produziu foi frutos azedos. O dono da vinha é Deus, a vinha é o povo de Israel e de Judá. Deus esperava que o seu povo vivesse diante do seu temor e justiça (v.7b), mas o que se vê é justamente o contrário. O profeta chama o próprio povo para julgar o seu caso. A canção, mesmo de juízo, é uma declaração de amor de Deus. Deus ama a sua vinha (v. 7a).

Filipenses 3.4b-14: Nesse trecho de sua carta aos Filipenses o apóstolo Paulo faz uma série de comparações entre a Lei (obras) e a vida em Cristo (fé). Seu ponto de comparação é a sua própria história antes de sua conversão. O apóstolo está advertindo os cristãos filipenses contra os judaizantes, um grupo convertido ao cristianismo, mas que exigia ainda a circuncisão e o cumprimento da Lei como formas de agradar a Deus e chegar à salvação. Paulo mostra que todas essas coisas nada podem ajudar no relacionamento entre o ser humano e Deus, e que somente em Cristo, em sua morte e ressurreição, o ser humano é unido novamente com o Pai celeste.

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CONTEXTO

Jesus acabara de entrar em Jerusalém montado em um jumentinho. A sua entrada “triunfal” feita às vésperas da grande festa da Páscoa está carregada de significado para o povo. Tomando a profecia de Zc 9.9, Jesus entra em Jerusalém como o Rei da paz. O rei que o povo tanto aguardava, aquele que havia sido escolhido e ungido pelo próprio Deus. Um rei que causava divisões e que suscitava perguntas tais como: “Quem é este?” (Mt 21.11).

É diante do templo e das pessoas que ali estão que Jesus mostra a sua “autoridade” e a finalidade da mesma. Ao atacar os cambistas e o comércio que ali havia, Jesus ataca toda uma base sobre a qual aquela sociedade e também a sua religião se apoiavam. Era, de fato, com esse comércio que grande parte da economia do país se sustentava. A ação de Jesus abala não somente o sistema de vida religiosa, mas toda uma estrutura que usava da religião (templo) para estabelecer privilégios de uma classe e assegurar uma visão errada e pobre da salvação, uma visão que excluía do reino de Deus as pessoas pobres, enfermas, necessitadas e pecadoras.

A “purificação” feita por Jesus não foi apenas expulsar os cambistas do templo, mas também trazer de volta ao mesmo o verdadeiro significado que ele tinha: um local onde Deus visitava o povo para acolhê-lo em sua fragilidade e a ele estender o seu perdão e a sua salvação.

Por meio de sua ação, acolher e curar os cegos, coxos, etc., e de suas parábolas (a figueira estéril; a parábola dos dois filhos), Jesus aponta para duas realidades: 1. A sua autoridade, que vinha do alto e tinha como propósito acolher, curar, perdoar e salvar; 2. A ação dos líderes do povo, que transformaram o templo, símbolo da presença de Deus, em um lugar “estéril”, que separava e excluía as pessoas mais fracas.

É diante dessa realidade elitista que Jesus conta a parábola dos lavra-dores maus, a terceira de uma série que aponta para a negligência dos líderes para com o povo de Deus. Jesus aponta para a ação de Deus que tomará a sua vinha (povo) e a dará a outros administradores, os quais cuidarão da mesma de forma que frutifique a seu tempo (cheguem ao conhecimento da salvação).

ANÁLISE DO TEXTO DE MATEUS 21.33-46

V. 33: “Atentai noutra parábola”. Jesus já havia contado outras duas parábolas (a figueira sem fruto [21.18-22] e a dos dois filhos [21.28-32]). Ambas apontavam para a negligência e o uso abusivo da autoridade por parte dos líderes religiosos em relação ao culto e ao templo. Essa nova

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parábola, agora, tem um propósito diferente: apontar para a ação de Deus em relação a essa negligência e abuso. Jesus, como comumente faz, usa o Antigo Testamento (Isaías 5.1-7) e conta a parábola da vinha para representar o povo de Israel. O início da parábola aponta para todo o cuidado que o dono da vinha tem com ela (colocou uma cerca, construiu um depósito; uma torre para vigiar a vinha, contratou lavradores para cuidar dela, etc.). Todo esse cuidado do dono da vinha revela algo muito importante: a vinha é muito preciosa para o seu dono, de maneira que ele não mede esforços para tê-la sempre em bom estado e produzindo frutos doces. As figuras são conhecidas pelo povo: o dono da vinha é Deus; a vinha é o povo; os lavradores são os sacerdotes e líderes que tinham a tarefa de “cultivar” a vinha de Deus.

Vv. 32-39: “Ao tempo da colheita, enviou os seus servos aos lavrado-res”. Agora a parábola toma um tom dramático. É chegada a hora que o dono da vinha tanto aguardava, a hora da colheita. E ele então envia os seus servos para recolher os frutos de sua vinha. Qual a surpresa do dono da vinha? Os lavradores, os quais o dono havia colocado para cuidar da sua vinha, mataram os servos enviados pelo dono. Por duas vezes a parábola retrata a crueldade e a ação dos lavradores. São cenas que, por si só, já chocariam os ouvintes. Mas há no coração do dono da vinha ainda uma última esperança: seu Filho. Ele, que juntamente com o Pai (dono da vinha), era o proprietário legal da vinha, tinha a autoridade necessária para reivindicar para si os frutos da vinha de seu pai. Essa é a esperança que está no coração do Pai: “A ele respeitarão” (Mt 21.37). Qual a surpresa dos ouvintes da parábola? A cena é des-crita por Jesus: “Mas os lavradores, vendo o filho, disseram entre si: Este é o herdeiro; ora vamos, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança. E, agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e o mataram” (Mt 21.38-39). Os lavradores, aos quais o dono da vinha havia confiado a sua vinha preciosa, haviam abusado e matado os seus servos. Agora matam também o seu filho, apropriando-se da vinha que não lhes pertencia. Essa era a realidade do povo de Israel. Deus havia confiado aos líderes religiosos o cuidado e a liderança espiritual do povo. Mas eles abusaram e mataram os profetas e estavam prestes a matar o Filho de Deus. Estavam se apropriando da “vinha” de Deus para terem para si benefícios próprios.

Vv. 40,41: “Quando, pois, vier o dono da vinha, que fará àqueles la-vradores?” Assim como no texto de Isaías, Jesus agora transfere a “causa” para que o próprio povo e seus líderes julguem e deem o veredito. Eles mesmos deveriam julgar as suas próprias más ações. E é da boca deles, do seu próprio julgamento, que vem a sua condenação. Assim, a ação de Deus em “arrancar a vinha dos lavradores e dar a outros” não pode ser

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tida como injusta da parte de Deus. Deus não age com injustiça; pelo contrário, a ação de Deus é uma ação de amor em favor da sua vinha.

Vv. 42-44: A partir desse ponto Jesus faz a aplicação da parábola. Jesus novamente faz uso de uma passagem do AT para apontar para algo muito importante: a rejeição do povo e de seus líderes com relação ao Messias. Toda obra de Deus em “resgatar” a sua “vinha” passava pelo Messias e pela sua rejeição. A aplicação da parábola tem um tom de discurso muito forte, de juízo. Mas o juízo aqui não é para o povo, mas sim, para aqueles que abusaram da autoridade sobre a vinha de Deus e que rejeitaram os profetas e o Filho de Deus. Esses que “rejeitariam a pedra angular” (Mt 21.42) trariam sobre si o juízo de Deus. Um juízo que eles próprios no versículo anterior já haviam anunciado. Agora, para o povo, a “vinha de Deus”, essa pedra se tornaria em principal pedra de “Salvação”.

Vv. 45,46: “Os principais sacerdotes e fariseus... entenderam que era a respeito deles que Jesus falava”. A parábola havia atingido o seu objetivo e os líderes entenderam que era a respeito deles que Jesus falava. Mas, ao que parece, com relação ao arrependimento, pouco mudou no coração desses homens que, ao contrário, se enfureceram mais e buscavam agora oportunidade para prender Jesus. Seu temor, no entanto, era com a reação do povo – povo que pode sentir nas palavras de Jesus novamente aquilo que lhes havia sido tirado pelos líderes: o amor de Deus, seus cuidados e acolhimento.

AUXÍLIO HOMILÉTICO

Ao contar essa parábola, Jesus tem em mente o sofrimento do povo de Israel. O povo havia sido abandonado pelos seus líderes religiosos, por aquelas pessoas a quem Deus havia dado a sua vinha, seu povo, para ser cuidado. No entanto, a realidade encontrada é outra. Uma realidade de abandono, enfermidade, exclusão, condenação. Esse é o quadro clínico do povo encontrado por Jesus.

Jesus oferece a esse povo aquilo de que eles mais necessitavam para serem regatados do seu abandono, da sua enfermidade: o perdão e o amor de Deus. Amor e perdão que haviam sido tirados do povo pelos seus líderes. Sem o perdão e o amor de Deus, restavam a esse povo o desespero e o “clamor” por alguém que os pudesse libertar da escravidão na qual haviam sido colocados por seus guias espirituais. Ao acolher o povo e lhes oferecer o perdão e o amor de Deus, Jesus está dizendo a eles: “Deus não desistiu de vocês”, antes quer salvá-los, curar as suas dores e oferecer o seu reino para que habitem seguros.

Essas são as palavras de Jesus para cada um de nós: “Deus não de-

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sistiu de nós”, ele quer nos salvar, quer curar as nossas dores e oferecer a cada um de nós o seu reino para que possamos habitar seguros.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Tema: Deus não desiste da sua vinha!1. Deus ama sua vinha (povo), por isso manda mensageiros!2. Deus ama a sua vinha e envia o seu Filho amado!

Elton AmericoCoxim/MS

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DÉCIMO SÉTIMO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

09 de outubro de 2011

Salmo 23; Isaías 25.6-9; Filipenses 4.4-13; Mateus 22.1-14

LEITURAS DO DIA

Salmo 23: É um texto muito lido e conhecido. Davi fala do Bom Pas-tor que ama o seu rebanho. Ele nos faz repousar (v.2), nos guia (v.3). O que deve ser destacado desse Salmo em relação ao evangelho do dia é o versículo 5: “preparas-me uma mesa”. A ênfase é a obra de Deus: Ele providencia tudo; Ele faz tudo por e para nós; Ele nos convida para estarmos junto à Sua mesa.

Isaías 25.6-9: O texto do Antigo Testamento também tem relação com o evangelho do dia. ‘O Senhor dos Exércitos dará neste monte a todos os povos um banquete...enxugará o Senhor Deus as lágrimas de todos os rostos (vv.6,8). A obra é de Deus.

Filipenses 4.4-13: No texto da epístola, o apóstolo Paulo destaca o tema alegria. O Bom Pastor que nos prepara uma mesa, o Senhor dos Exércitos que dá um banquete, que enxugará as lágrimas, quer nos dar ou presentear uma alegria sem fim. Por isso Paulo enfatiza: “alegrai-vos sempre no Senhor, outra vez digo: alegrai-vos” (v.4).

CONTEXTO LITÚRGICO

No Ano Eclesiástico, estamos nos denominados Domingos após Pen-tecostes, onde toda a ênfase é o poder de Deus e o efeito desse poder em nossas vidas. Para os que se apegam à palavra do Senhor, o poder de Deus é alegria, festa; para os que ignoram a palavra do Senhor, o poder de Deus é para destruição, tristeza.

CONTEXTO BÍBLICO

Se olharmos o capítulo 21 de Mateus, vamos perceber que Jesus entra triunfalmente na cidade de Jerusalém (21.1-11). E “tendo Jesus chega-do ao templo” (21.23), conta as últimas parábolas para ensinar o povo: a parábola dos dois filhos (21.28-32); a parábola dos lavradores maus (21.33-46) e a parábola das bodas (o nosso texto em destaque). Já em Mt 22.15-33 lemos sobre como os fariseus e os saduceus agiram, pessoas

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que não ouviam a Jesus (ou seja, não se apegavam à Palavra), mas são pessoas soberbas, são hipócritas, se “acham mais amigas” de Deus.

O TEXTO DE MATEUS 22.1-14

Vv. 1-4: “novamente...” (v.1) nos mostra que existe uma sequência. Na verdade, Jesus já vinha contando parábolas e agora temos mais uma, onde Ele ensina sobre o Reino de Deus ou ‘reino dos céus’ (v.2). ‘Um rei que celebrou ou também que fez...’(v.2). Esse Rei é o Senhor Deus – dEle é a obra, dEle é toda a iniciativa, ao Rei pertencem todos os preparati-vos. É Ele quem envia os seus servos para convidar (v.3), o convite é do Rei, de Deus. “Eis o meu banquete tenho preparado” ou como Almeida traduz: “tudo está pronto” (v.4). Ele fez tudo, nós não precisamos e nem podemos fazer algo.

Vv. 5-7: Vimos até aqui que o Rei fez e preparou tudo. Agora, nesses versículos, se vê que os convidados (ser humano – pecador) rejeitam o convite, “não dando atenção partiram, um para o próprio campo, outro para o comércio dele”; “não se importaram” (Almeida) (v.5). Todo ser humano é soberbo, quer ser auto-suficiente e assim ignora o convite para a festa que o Rei preparou. “O Rei ficou irado” (v.7). Anteriormente, no contexto litúrgico, já destacamos que os que ignoram a Palavra, o convite de Deus, para estes há destruição, tristeza – essa é a ira do Rei. Os que são auto-suficientes ou querem ser melhores que os outros, “os que se acham o biscoito mais gostoso do pacote” terão a ira de Deus sobre si, ou seja, destruição, condenação.

Vv. 8-10: Mesmo havendo aqueles que ignoram o convite, o Rei não se abala; o Rei continua e pede para convidar mais e mais pessoas: “Ide para as encruzilhadas dos caminhos e a todos que encontrardes convidai para as bodas” (v.10). O convite é para todos, o Rei não ignora ninguém, não se importa se é pobre, rico, criança, jovem, idoso, etc. O convite é universal “e a sala do banquete ficou repleta, cheia de convidados” (v.10).

Vv. 11-14: Mesmo o convite sendo para todos, há aqueles que conti-nuam sendo soberbos e não querem o que o Rei oferece, ou seja, ignoram o manto de Cristo – único manto que cobre nossas impurezas e pecado. O Rei conhece muito bem os que Ele vestiu com o manto da justiça e san-tidade e conhece também os que continuam a andar em trapos próprios. A consequência para aquele que rejeita o manto do Rei e quer andar em seus próprios trapos imundos é o que está descrito no v.13: ‘Amarrai-o de pés e mãos e lançai-o para fora, nas trevas; ali haverá choro e ranger de dentes”.

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Palavras de Lutero sobre esse textoO bom Senhor quer nos ensinar e nos fazer reconhecer quão grande

graça acontece em nós, quando somos convidados para tão maravilhosa refeição, somos salvos do pecado, diabo, morte e o eterno choro e ranger de dentes. Mas onde nós rejeitamos tal refeição, então só nos resta a morte eterna. Das duas, uma tem de ser: ou nos apegar ao Evangelho, crer e ser abençoado ou não crer e ser eternamente condenado. Esse é o resumo da pregação de hoje, que levemos a sério a Palavra do Senhor, crer, e quando Ele novamente voltar no último dia, nos salvará de toda angústia. Isso nos conceda o misericordioso Deus, através de Cristo, seu Filho e o Espírito Santo. Amém.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Tema: O convite do Rei é para todos!O Rei convida todos para festa, sem fazer distinção.Os que ignoram o convite e a veste da justiça têm sobre si a ira do

Rei.Entramos para a festa que o Rei nos preparou por graça e nessa festa

não são os convidados que trazem o presente, mas somos nós que rece-bemos o presente do Rei: perdão, vida, salvação – Seu Reino.

Leandro BornSão Leopoldo/RS

[email protected]

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DÉCIMO OITAVO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

16 de outubro de 2011

Salmo 96.1-9 (10-13); Isaías 45.1-7; 1 Tessalonicenses 1.1-10; Mateus 22.15-22

CONTEXTO LITÚRGICO

1. A congregação como parte e ponte na história da igreja (chronós e kairós)

Neste período após Pentecostes a igreja olha para os ensinamentos de Jesus e o seu ministério. E para este domingo uma importante mensagem é reenfatizada. Deus é a razão do nosso culto. Não existe outro Deus e nem existirá até Cristo vir novamente em glória para nos dar a paz pro-metida. Como igreja já vivemos na esperança da salvação em Cristo, na esperança de um mundo sem pecado, sem sofrimento, sem choro e nem morte. No entanto, ainda vivemos neste mundo. Qualquer mensagem que fuja desta verdade é falsa doutrina e idolatria.

2. Os textosSalmo 96.1-9 (10-13): Este Salmo é um convite para todos os povos

do mundo a louvar Yahweh como Rei. Começa com um chamado universal (vv. 1-3), seguido pelo motivo deste louvor: Yahweh é o Deus Criador (vv. 4-6). O Salmo fecha novamente com este chamado dizendo que Ele virá para julgar com justiça e fidelidade toda a humanidade (vv.10-13).

Isaías 45.1-7: Deus fez Ciro um grande vencedor entre os reis e povos pelo amor que tinha por seu servo Jacó. Deus é a origem de tudo o que existe neste mundo e o que acontece ao nosso redor. E isso Ele fez e continua a fazer para mostrar a todos que somente Ele é Deus.

Timóteo 1.1-10: Paulo repreende aqueles que estavam ensinando doutrinas falsas. Em vez de revelarem a obra de Deus, que transparece pela fé, estavam causando distúrbios e agitações, levando o povo a dar atenção a mitos e ensinamentos errôneos.

Mateus 22.15-22: Os discípulos enviados pelos fariseus para enredar Jesus com suas próprias palavras acabaram caindo na própria armadilha. Esta perícope é normalmente usada para ensinar a respeito da separação entre a igreja e o estado, e das obrigações dos cristãos pagarem impos-tos, dentre outros deveres civis. No entanto, para sermos coerentes com o contexto presente, outra ênfase pode ser dada. O evangelista Mateus

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parece nos dizer que algo a mais está em questão: Jesus está reenfatizan-do que Ele é o Rei, que Ele é Deus, que Ele é a origem e o fim. Desde o início do Evangelho (Mt 5.11,12), essa parece ser a discussão: os judeus não aceitavam a ideia de Jesus ser o Filho enviado por Deus, e por não acreditarem, tentam de todas as formas condená-lo.

2.1. Ideias comunsJesus é o Rei que virá julgar com justiça e fidelidade toda a humani-

dade. Qualquer doutrina que de alguma forma “desafirme” essa verdade é falsa e precisa ser combatida. Os judeus esperavam um rei político, e em resposta Jesus afirma: “Vocês têm a Cesar, dai a Cesar o que é de Cesar”. Jesus se apresenta como o Rei que veio para libertar a todos da escravidão do pecado.

2.2. Objetivo geralResponder a pergunta: Quem realmente é Jesus?

2.3. Ênfase teológicaO nome de Jesus nos dias de hoje está tão difundido que dificilmente,

na cultura em que vivemos e conhecemos, alguém irá dizer que não o conhece. Os judeus também sabiam quem era Jesus, presenciaram mi-lagres e curas, mas a questão foi que eles não confiaram e acreditaram que Jesus era o Filho de Deus. A pergunta para os dias de hoje passa a ser: “Quem realmente é Jesus?” O episódio narrado para este domingo fala sobre a relação entre os dois reinos de Deus, mas essa não era a intenção dos líderes judeus ao enviarem seus discípulos para falarem com Jesus; o objetivo foi tentar fazer Jesus cair em contradição, para mostrar ao povo que tudo isso não passava de uma grande farsa e encenação e que Jesus não era o Filho de Deus. Será que ainda existem pessoas que não acreditam em Jesus como seu Salvador e ainda tentam com aqueles que têm fé?

O TEXTO DE MATEUS 22.15-22

1. Contexto bíblico do textoNo cap. 21, com a entrada triunfal em Jerusalém, Jesus está cumprindo

o que fora dito pelo profeta Zacarias 9.9: “Eis que o seu rei vem a vocês, humilde e montado num jumentinho”. Muitos perguntavam: “Quem é este?” e a multidão respondia: “Esse é Jesus, o profeta de Nazaré da Galiléia”. Jesus se revela como filho de Davi, o Filho prometido. Uma das primeiras coisas que Jesus faz em Jerusalém é purificar o templo que estava sendo usado com fins comerciais. Jesus afirma: “a minha casa será chamada de

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casa de oração”. Os fariseus que observavam as coisas que Jesus fazia ficaram indignados, pois eles não suportavam a ideia de Jesus ser o Filho de Deus. O desejo dos fariseus de tentarem encurralar Jesus não é um assunto desconhecido dos leitores (ver: 12.14, 16.1, 19.3, 22.35). In-dignados com a audácia de Jesus, os judeus e fariseus tiveram de ouvir a parábola dos dois filhos e no fim ouvir Jesus dizer: “Digo-lhes a verdade: Os publicanos e as prostitutas estão entrando antes de vocês no Reino de Deus... Porque eles creram e vocês não” (Mt 21.28-32). Na parábola dos lavradores, Jesus afirma que eles (os judeus) eram os lavradores maus, pois rejeitaram a pedra fundamental. Esses acontecimentos nos ajudam a entender o que está para acontecer no cap. 22.

Logo no início do capítulo 22 Jesus conta mais uma parábola. O auditório continua sendo o mesmo, os líderes judeus. Nesta parábola da festa de casamento, Jesus faz alusão à rejeição dos judeus a Cristo e, consequen-temente, à chamada dos gentios para o Reino dos céus (Mt 22.1-10) e a rejeição do convidado que não veio devidamente preparado para a festa de casamento. Compara, assim, o perigo da hipocrisia de alguns que se dizem cristãos, mas o são só da boca para fora (Mt 22.11-14).

O contexto se torna essencial para compreendermos o texto indicado para este domingo. Primeiro, os acontecimentos ocorreram na semana santa, mais especificamente na terça-feira. Percebe-se nitidamente o des-contentamento que os líderes judeus demonstravam a Jesus e, por isso, planejavam uma cilada para prendê-lo e matá-lo. Tendo em mente o que se passava, vamos olhar os versículos com mais atenção.

2. ExegeseV. 15: Notam-se as constantes tentativas da parte dos fariseus em

confrontarem Jesus a respeito de sua autoridade – sem sucesso. Neste episódio, porém, destaca-se a atitude pensada e planejada dos fariseus em condená-lo por suas próprias palavras. Lenski afirma: “foi um ato pensado e manipuloso” (LENSKI, p.861). A expressão pagideu,w, que significa “surpreender, fazer cair em armadilha”, aparece somente nesta ocasião no NT1.

V. 16: O plano foi elaborado e colocado em ação. Nota-se que além de os fariseus terem enviado seus discípulos, herodianos aparecem em cena. Os herodianos eram politicamente ligados a supremacia romana. Eles eram, portanto, contra os fariseus. Os fariseus eram publicamente contra o pagamento dos impostos. Ao se unirem, acreditavam que po-deriam colocar Jesus em um dilema do qual ele não conseguiria escapar. Podemos sugerir que os herodianos estavam presentes como espiões para servirem de testemunhas caso houvesse necessidade (Lc 20.20). Os fari-

1 No AT pagideu,w aparece duas vezes: 1 Samuel 28.9; Eclesiastes 9.12.

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seus ensinaram bem seus discípulos: com palavras doces e convincentes, eles procuraram tirar Jesus de uma posição de defesa. Eles disseram: “Mestre, sabemos que és íntegro e que ensinas o caminho de Deus con-forme a verdade. Tu não te deixas influenciar por ninguém, porque não te prendes a aparência de homens”. O que os discípulos da boca pra fora disseram a Jesus, todos os judeus e fariseus naquela época deveriam ter sinceramente feito. A questão aqui era: Jesus não se deixa levar por homens, também não se deixará levar por César. Jesus, ao olhá-los, viu hipocrisia (Mc) e astúcia (Lc).

Vv.17-20: A expressão: e;xestin está no sentido de lei. Em outras palavras: “Existe alguma coisa escrita na lei de Moisés que aprove os impostos ou conhecemos pela tradição?” Este imposto, em especial, despertava certa animosidade entre os judeus porque a eles não era permitido ter imagens de deuses pagãos. O uso da moeda nos lembra o episódio em que Jesus apresenta a seus seguidores, no sermão do Monte, o chamado de escolha entre Deus e o dinheiro (Mt.6.24). A imagem da moeda pode sugerir também a cumplicidade que os judeus já tinham com o império romano, representado pela pessoa de Pôncio Pilatos, governador da Judéia, para trazer a morte de Jesus. Embora os judeus se identificassem como resistentes ao império romano (SCARER, 2004), Jesus os chama de u`pokritai, “hipócritas”. Esta palavra reproduz a ideia de que eles estavam atuando, literalmente “estavam usando máscaras”, como os antigos atores faziam. Com a pergunta de Jesus: “Porque vocês estão me colocando à prova?” Ele revela o plano deles e os deixa sem reação. Jesus sem medo de ser condenado revela a verdade que estava em seus corações.

Vv. 21,22: O impacto da resposta de Jesus nos discípulos e nos he-rodianos foi um grande choque, deixando-os sem reação. Jesus disse a eles que, por terem se submetido ao império romano e receberem os be-nefícios de estarem sobre sua guarda, não só os impostos, mas também honra e temor são esperados. No entanto, essa verdade não é a única: Jesus adiciona “e o que pertence a Deus, para Deus”. Em resposta ao que recebemos de Deus estão a “contrição, fé, amor, culto, obediência, submissão.” E obediência a Deus não exclui ter obediência às autoridades. A conjunção “e” exclui o “ou” que estava na mente dos judeus. Jesus somente conecta a obrigação com a imagem: “Dai a César o que é de César”. E Jesus adiciona “e dai a Deus o que é de Deus”. Quem é Deus? Deus é o criador dos céus e da terra, nos criou e após o pecado enviou seu Filho unigênito para nos restaurar. A relação que temos entre governo e a relação que temos com Deus não pode ser igual. A obrigação que temos com Deus está na questão que ele nos deu a vida, ou seja, tudo o que temos e somos vem e pertence a Deus. A igreja como instituição dada e

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governada por Deus tem consciência de sua relação com o estado (Rm 13). (LENSKI, p.861-868).

3. Encaminhamento homilético

3.1. Objetivo deste sermãoAfirmar que Jesus é o nosso Rei que veio para nos libertar das garras

do pecado para nos dar a salvação eterna. Essa verdade, que infelizmente os judeus e fariseus não enxergaram, precisa ser reenfatizada nos dias de hoje. Jesus é o nosso Salvador e qualquer doutrina que não afirme essa verdade é falsa e precisa ser firmemente combatida.

3.2. TemaQuem é Jesus para você?

Matheus SchmidtSão Leopoldo/RS

[email protected]

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DÉCIMO NONO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

23 de outubro de 2011

Salmo 1; Levíticos 19.1,2, 15-18; 1 Tessalonicenses 2.1-13; Mateus 22.34-46

INTRODUÇÃO

Os textos para este domingo se concentram na importância da Lei de Deus e na santificação. O Salmo 1 mostra que o caminho da felicidade não é agradar homens, mas a Deus: “Antes o seu prazer está na lei do Senhor” (Sl 1.2). Na leitura de Levítico, Moisés fala que todos devem ser santos, pois Deus é santo (Lv 19.2), e depois demonstra regulamentos sobre o 8º mandamento. Em 1 Tessalonicences 2.1-13, Paulo se defende de acusações que ele estava sofrendo contra o seu ministério, mas também faz questão de alertar, conforme o Salmo, que não deseja agradar a homens, mas a Deus (1 Ts 2.4). Por fim, o Evangelho de Mateus 22.34-46 apresenta o diálogo entre Jesus e os fariseus. Na primeira parte (vv.34-40), Jesus é questionado pelos fariseus sobre qual seria o grande mandamento. Na segunda (vv.41-46), Jesus passa a ser o inquiridor e pergunta para os fariseus a respeito do Messias e de sua ligação com Davi.

CONTEXTO

No Evangelho de hoje há o último diálogo entre Jesus e os fariseus no templo. Jesus enfrentou muita oposição entre as camadas religiosas da Judeia. Aqui não é diferente: Jesus já havia entrado em Jerusalém para a última semana de seu ministério (Mt 21) e, posteriormente, contado aos fariseus a parábola dos lavradores maus (Mt 21.33-46) e a parábola das bodas (Mt 22.1-14), além de ter enfrentado o questionamento dos saduceus a respeito da ressurreição (Mt 22.23-33). Todos queriam pegar Jesus em contradição, mas suas tentativas eram frustradas pelas res-postas dadas por Jesus, o que causava grande irritação entre os fariseus e os saduceus, mas que também os convidava a refletir sobre a correta interpretação da Lei e a falsa esperança da autojustificação.

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TEXTO

V. 34: Os fariseus travavam um contínuo embate teológico contra os saduceus. Como Jesus tinha acabado de refutar a descrença dos saduceus quanto à ressurreição, fato em que os fariseus concordavam, eles resolvem reunir-se em conselho sunh,cqhsan evpi. to. auvto, a fim de propor uma questão para Jesus. Desse modo, eles esperavam mais uma vez que Jesus concordasse com suas ideias, e assim, pudessem sair como vencedores sobre os saduceus.

Vv. 35,36: Então, um homem versado na lei nomiko.j, a quem Marcos 12.28 chama de escriba, resolve propor uma questão um pouco diferente. Essa questão tem como objetivo principal testar o conhecimento de Jesus sobre a lei de Deus, mas também tinha um interesse por parte dos fariseus, no tocante a prováveis debates sobre a lei mais importante dentre os 613 mandamentos que eles tinham de conhecer. Uma das grandes diferenças entre os fariseus e saduceus se dava especialmente neste campo, porque os saduceus rejeitavam todos os mandamentos farisaicos que não esta-vam escritos plenamente na lei e eram apenas uma tradição passada de geração em geração. Em vista de tantas leis, o intérprete da lei questiona Jesus: qual o grande mandamento na lei?

V. 37: Jesus vai direto ao ponto e cita com pequenas variações Dt 6.5. O texto paralelo de Marcos diz claramente que o fariseu concordou e parabenizou Jesus pela resposta com um “Muito bem, Mestre!”. A palavra “todo”, em grego o[lh , tem importância especial e não à toa é repetida três vezes, "de todo coração, de toda a alma, de todo entendimento", denotando um amor integral, que envolve toda a pessoa, coração, alma e mente.

Vv. 38-39: Diante de tal mandamento em que toca a aliança de Deus com Israel, não há como alguém refutar a resposta de Jesus. Evidente-mente, há uma posição de hierarquia entre as leis que deve ser respeita-da. Pensando em termos quantitativos, o mandamento de amor a Deus é mais importante do que de amor ao próximo. Aliás, somente a partir do amor a Deus que podemos amar ao próximo, e é dele que recebemos força para tal. Algo que estava muito distante da realidade legalista dos fariseus, até porque eles se concentravam apenas em suas próprias ações e, desse modo, não tinham tempo para olhar o próximo e amar a Deus. O que interessava era transparecer santidade e superioridade. Pensando sobre o ponto de vista qualitativo, o caráter de ambos é o mesmo, bem como a fonte para o cumprimento destes, o amor de Deus.

V. 40: Mais uma vez a palavra todo, do grego o[loj é enfatizada. Diante desses dois grandes mandamentos depende toda a Torah (os livros de Moisés) e todos os livros dos profetas – esta era a forma que

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os israelitas usavam para se referir às Escrituras. De fato, todos os 613 mandamentos dos fariseus devem se submeter a estes dois. Se qualquer um deles estivesse contrário aos dois principais mandamentos, ou fosse necessário descumprir um dos dois para que um mandamento huma-no fosse cumprido, haveria um descumprimento da Lei de Deus. Basta observarmos o exemplo da parábola do Bom Samaritano, em que para não descumprir leis cerimoniais de purificação, sacerdotes deixaram uma pessoa prestes a morrer sem socorro. Vale destacar aqui o texto paralelo de Marcos12.33-34, onde uma confissão e uma resposta de Jesus são marcantes. O fariseu concordou tanto com a resposta de Jesus que, além de elogiar a sua resposta, confessou que “amar a Deus de todo o coração, de todo o entendimento e de toda a força, e amar ao próximo como a si mesmo excede a todos os holocaustos e sacrifícios”. Diante de tamanha sabedoria, Jesus replicou: “Não estás longe do reino de Deus”.

Vv. 41-42: Após a questão sobre os mandamentos, é a vez de Jesus testar os fariseus questionando: “o que pensais de Cristo? De quem ele é filho?” Vale lembrar que aqui já havia ocorrido a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Antes disso, Jesus havia evitado o nome Messias, mas agora ele vai diretamente ao cerne de sua missão. Em Mateus 16.13-16 podemos observar que ele já havia feito semelhante questionamento aos seus discípulos, tendo obtido como resposta a grande confissão de Pedro. Lutero encontra uma conexão entre a pergunta dos fariseus e a pergunta de Jesus. Como Deus poderia pedir ao seu povo para ter amor por ele e pelo próximo se o pecado está na natureza destes e é contrário ao amor? A resposta é dada em Jeremias 31.33: “Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor: Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo”. A resposta não está nos homens e no cumprimento da lei, mas em Deus, no Messias, em Jesus, filho de Davi. Esta é a intenção da questão de Jesus: que os fariseus despertassem da sua religiosidade exterior e legalista para aquele que poderia salvá-los.

Vv. 43-44: Evidente que esta resposta abria espaço para o diálogo, mas ainda não apontava diretamente para Cristo, afinal Davi tinha muitos descendentes, e ainda poderia haver aqueles mais literais que pensassem que Salomão pudesse ser o Messias. Então Jesus lança outro questiona-mento mais profundo, citando o Salmo 110 de Davi, afinal: “como Davi, pelo espírito, chama-lhe Senhor?”. Desse modo, Jesus desafia os fariseus a enxergarem o texto com outros olhos. Nesta citação do Salmo é visível a referência à Trindade. Davi, inspirado pelo Espírito Santo, escreveu o Salmo; além disso, no versículo citado há um diálogo entre Deus Pai e Deus Filho. De fato, Jesus demonstra que Davi reconheceu humildemente que o Messias era o seu Senhor, algo que a cega descrença e principalmente

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a autojustificação (eles haviam acabado de fazer uma pergunta a respeito da Lei) impedia que os fariseus enxergassem em Jesus. A citação também é expressiva, pois Jesus, que estava prestes a chegar ao ápice de seu estado de humilhação, relata a respeito de seu estado de exaltação.

Vv. 45-46: Por fim Jesus não deixa dúvidas acerca da descendência davídica do Messias. Contudo, não como filho, mas como Senhor, algo que ninguém pode negar levando-se em conta as próprias palavras do Rei Davi, nem mesmo os intérpretes da lei. Fato interessante é que Jesus propositalmente dirigiu o questionamento para o título Filho. De fato, o Filho do Homem e não outro é o Senhor. Jesus, desse modo, expõe a má exegese feita pelos fariseus, que consideravam que o Messias seria um mero filho de Davi, apenas humano, que viria para resolver seus problemas humanos, tendo assim uma visão limitada sobre o Messias. Na realidade, o Messias era muito mais do que eles esperavam, era humano sim, mas era também Deus, algo que sempre foi negado pelos fariseus, e que os moveu a acusar Jesus de blasfêmia no Sinédrio. Com tal exposição de Jesus, não resta outra alternativa aos fariseus do que se calarem.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Assunto: A nossa santidade está em CristoObjetivo: Demonstrar os perigos de se viver uma santidade mera-

mente exterior e hipócrita, objetivando agradar ao próximo e não a Deus. Seguramente, os cristãos passam por tal tentação todos os dias, afinal, é muito bom ser considerado uma pessoa íntegra, honesta e cumpridora da lei. Contudo, isso pode ser muito nocivo, pois corremos o risco de atribuirmos a nossa santificação às nossas ações e não a Deus. De fato, diante dos homens, os fariseus tinham uma enorme reputação, mas estavam muito distantes da salvação, pois eram cegos para tudo que estivesse fora deles. Só conseguiam enxergar seu bom comportamento, mas estavam distantes de amar a Deus sobre todas as coisas, afinal, não confiavam nele para serem salvos. Além disso, estavam muito distantes de amar o próximo, pois os outros eram apenas pecadores que mereciam ser condenados, e dos quais eles deveriam manter distância. Contudo, Jesus desmascara qualquer exterioridade que possa existir em nós. Se olharmos a lei sem a hipocrisia farisaica, só podemos perceber que não conseguimos cumpri-la, por isso, somos convidados, como Lutero foi por Staupitz, a olhar para Jesus, e assim perceber que toda a nossa dignidade vem de Cristo, e graças unicamente a ele que somos salvos.

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1. Como os fariseus, temos a tendência de olhar apenas para as nos-sas ações

2. Olhando somente para o que fazemos, podemos achar que somos capazes de nos salvar pelo cumprimento da lei.

3. Olhando honestamente para nossas ações, podemos cair em de-sespero, pois somos incapazes de cumprir toda a lei.

4. Somos convidados por Deus por Palavra e Sacramento a olhar para Cristo.

5. Com Cristo e sua obra o véu cai e somos considerados culpados pela lei, mas ao mesmo tempo santos em Cristo (simul iustus et peccator).

6. Tendo a certeza da salvação e confiando inteiramente em Cristo, podemos amar o próximo e assim deixar de enxergar apenas nós mesmos, e enxergar os outros e suas necessidades.

Rômulo Santos SouzaSão Leopoldo/RS

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VIGÉSIMO DOMINGO APÓS PENTECOSTES

30 de outubro de 2011

Salmo 43; Miqueias 3.5-12; 1 Tessalonicenses 4.1-12; Mateus 23.1-12

CONTEXTO

Jesus está continuamente sendo questionado pelos líderes judeus, que rejeitam a sua autoridade e não o reconhecem como o Messias, apesar de todos os sinais realizados por ele. Um dos questionamentos feitos pelos líderes judeus diz respeito aos mandamentos: “Mestre, qual é o mais im-portante de todos os mandamentos?” (Mt 22.36). Jesus responde a eles que os mandamentos se resumem a dois: amar a Deus e ao próximo. Os líderes religiosos, na sua ânsia em querer agradar a Deus com as suas próprias obras e rituais religiosos, estavam perdendo o foco daquilo que era de fato o objetivo da lei de Deus e caindo num legalismo hipócrita.

Vemos isso de forma contínua nos evangelhos: o rigor e os fardos pesados que os líderes religiosos colocam sobre o povo e a crítica insis-tente de Jesus pelo fato de serem tão zelosos em coisas mínimas e, por outro lado, serem negligentes com os preceitos mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia e a fé (Mt 23.23).

O texto de Mq 3.5-12 também denuncia atitudes incoerentes dos pro-fetas e sacerdotes. Vemos o discurso muito longe das atitudes. O profeta Miquéias denuncia os profetas que enganam o povo, torcendo a justiça e pregando aquilo que o povo quer ouvir. E isso é feito em prol dos seus próprios interesses. O texto de 1 Ts 4.1-12 enfatiza que não há uma vida verdadeiramente dedicada a Deus se não houver integridade, honestidade e amor ao próximo

Meditando nos textos indicados, vemos que mudam as épocas e o contexto, mas sempre de novo as situações se repetem, ainda que com uma “nova maquiagem”. É inerente no ser humano a vontade de querer ser visto, exaltado e elogiado. Também hoje presenciamos em líderes religiosos incompatibilidade entre discurso e atitude, impondo sobre os fieis fardos pesados para o benefício próprio, e não em benefício do Reino de Deus.

Outra realidade apontada é o fato de que o simples conhecimento bíblico é inútil se a obra de Cristo não estiver evidenciada. Em Rm 10.2,

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o apóstolo Paulo menciona que de nada adianta o zelo por Deus se não houver o entendimento. A lei mostra o quão distante de Deus estamos e quão pecadores nós somos. Se não fosse a graça e a misericórdia de Deus, que enviou o Seu Filho Jesus Cristo ao mundo para cumprir a lei em nosso lugar e levar os nossos fardos, todos nós estaríamos perdidos e condenados para sempre.

TEXTO DE MATEUS 23.1-12

V. 2: “Na cadeira de Moisés”: os escribas e fariseus eram a autoridade oficial na interpretação da Lei de Moisés, considerados como os suces-sores dos profetas. Os escribas não eram meros copistas, mas também ensinadores, intérpretes e doutores da lei. Os fariseus, que significa “os separados”, era um grupo religioso de grande influência no judaísmo e os estudiosos dos fariseus eram os líderes daquilo que veio a ser o judaísmo rabínico. Eles se viam como um grupo de homens piedosos fieis à lei de Moisés, separados de um povo sem lei e, portanto, ímpio. Uma grande soberba predominava em muitos fariseus, que exaltavam a si próprios e desprezavam os outros (Lc 18.9).

V. 3: Os escribas e fariseus tinham um grande conhecimento da lei e das tradições orais. O trabalho deles era importante e necessário, até porque o hebraico bíblico já não era mais tão bem compreendido pelo povo. O problema apontado por Jesus é a hipocrisia deles, pois suas atitudes são incompatíveis com os seus discursos.

V. 4: “Fardos pesados”: os escribas e fariseus impunham obrigações muito difíceis de serem cumpridas pelo povo. Os líderes religiosos, por sua vez, nada podiam fazer para ajudar o povo a pôr em prática os man-damentos da lei.

V. 5: Os filactérios eram caixinhas de couro que continham trechos da Lei de Moisés. Essas caixinhas eram amarradas no braço esquerdo e na testa pelos líderes religiosos. Esta prática surgiu a partir da interpre-tação de Dt 6.8, onde Deus orienta o seu povo a amarrar as suas leis nos braços e na testa para não as esquecerem. Além dos filactérios, eles usavam franjas ou pingentes costurados nas suas roupas (Nm 15.38). No seu zelo excessivo, os escribas e fariseus levaram esta prática ao pé da letra. Porém a motivação para as atitudes dos escribas e fariseus é que está equivocada. Eles utilizam os filactérios e as franjas para serem vistos pelos outros. Jesus ensina que os seus seguidores não devem praticar os rituais religiosos com o objetivo de serem vistos e elogiados, e sim, de servirem a Deus e ao próximo (Mt 6.1).

Vv. 6,7: A atitude dos líderes religiosos de quererem assentar-se nos primeiros lugares nos banquetes reforça a ideia da motivação equivocada

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dos seus rituais religiosos, que é “aparecer”, estar em evidência diante das outras pessoas, ao invés de glorificar a Deus.

Vv. 8-11: Os escribas e fariseus gostavam de elogios, de serem chama-dos de mestres, pais ou guias. Jesus orienta os seus seguidores a serem servos dos outros, ao invés de quererem receber bajulações. Para Jesus, o mais importante é aquele que serve. Jesus não ficou apenas no discurso, mas assumiu a forma de servo e agiu como servo (Mt 20.26-28).

V. 12: Vemos esta situação de humilhação e exaltação claramente evidenciada na parábola do fariseu e do publicano (Lc 18.9-14). Deus conhece o coração. Aquele que se humilha será exaltado por Deus, que não vê apenas o exterior, mas conhece o coração.

SUGESTÃO DE USO HOMILÉTICO

Sugestão de tema: Somos exaltados por Cristo1. Há um ditado popular que diz: “Faça o que eu digo, mas não faça o

que eu faço”. Assim agiam os escribas e fariseus. Eles observavam detalhes minuciosos da lei e os impunham ao povo; porém Jesus adverte a multidão e os seus discípulos que eles não fazem o que ensinam (v.4);

2. A lei de Deus se resume no amor a Deus e ao próximo. Com este fim ela nos foi dada;

3. A lei mostra também o quanto nós somos falhos, o quanto somos pecadores e merecedores do castigo de Deus;

4. Se quisermos ser salvos pela lei e sem Cristo, corremos o sério risco de:

4.1 Cairmos no mesmo legalismo farisaico, na religião de aparên-cia;

4.2 Cairmos em desespero ao percebermos a nossa incapacidade de vivermos de acordo com os preceitos da lei, e, por conse-quência disso, ela torna-se um fardo pesado para nós, pobres e miseráveis pecadores.

5. Felizmente, Jesus veio ao mundo, tornando-se servo de todos nós, cumprindo a lei em nosso lugar;

6. Felizmente, Cristo carregou os nossos fardos. Ele nos amou e nos serviu! Viu a situação de humilhação em que nós nos encontrávamos e nos exaltou, nos reconciliando com Deus!

Timóteo Ramson FuhrmannMorro Redondo/RS

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DIA DA REFORMA

31 de outubro de 2011

Salmo 46; Apocalipse 14.6-7; Romanos 3.19-28; João 8.31-36

LEITURAS DO DIA

Salmo 46: Este salmo nos aponta para o único lugar onde encontra-remos refúgio certo, forças e socorro: junto de Deus, o Senhor. O salmista fala de guerras e pinta grandes catástrofes no âmbito da natureza, mas, ao final, conclui que nada poderá abalar aqueles que têm Deus por seu protetor.

Apocalipse 14.6,7: A mensagem da qual o anjo está encarregado de anunciar ao mundo todo é esta: “Já chegou a hora de Deus julgar a humanidade (v.7)”. Se o julgamento for baseado no que a lei exige, o veredito será implacável: todos os povos da terra, todas as raças, tribos, línguas e nações serão condenadas. Entretanto, a esperança cristã é esta: o Cordeiro, o Filho de Deus nos libertou da maldição do pecado. Somos agora filhos de Deus, os quais receberão das mãos do Pai a vida eterna.

Romanos 3.19-28: Neste texto, Paulo busca inicialmente acabar com toda e qualquer possibilidade de autojustificação por parte do ser humano. “Todos pecaram e estão afastados da presença gloriosa de Deus” (v.23). O homem é escravo do pecado e jamais poderá se libertar do mesmo, a não ser que alguém outro o liberte. Deus é justo e não poderia aceitar o homem pecador antes que seus pecados fossem pagos. Por isso, “Deus ofereceu Cristo como sacrifício para que, pela sua morte na cruz, Cristo se tornasse o meio de as pessoas receberem o perdão dos seus pecados, pela fé nele” (v.26). Somos agora livres do pecado, não porque cumprimos a lei e não pecamos, mas porque alguém outro o fez em nosso lugar – Cristo – conquistando por nós a liberdade que antes nos era impossível de ser alcançada.

CONTEXTO

O capítulo 8 de João nos mostra que, enquanto Jesus ensinava ao povo no pátio do templo, alguns fariseus e mestres da Lei trouxeram diante dele uma mulher pega no ato de adultério. A Lei de Moisés, neste caso, era muito clara: a mulher adúltera deveria ser morta a pedradas. Os fa-riseus e mestres da Lei, querendo testar e consequentemente incriminar

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a Jesus, lhe perguntam qual a sua posição diante da sentença dessa lei. As palavras de Jesus são: “Quem de vocês estiver sem pecados, que seja o primeiro a atirar uma pedra nesta mulher (v. 7)”. De forma simples e precisa, Jesus mostra que a Lei condena a todos. À dureza da lei, Jesus acrescenta o ingrediente do perdão, oferecendo agora a liberdade com-pleta – perdão dos pecados – para aquela mulher que há pouco quase fora apedrejada.

No desenrolar deste capítulo, observam-se diversas discussões e debates de Jesus com os judeus. No texto bíblico que compreende os versículos 12-20, Jesus se apresenta como a luz do mundo, a única luz capaz de conduzir à vida, e vida eterna.

No versículo 24 Jesus se revela como o “EU SOU QUEM SOU”, dando-se a conhecer com o mesmo nome que Deus usou ao falar com Moisés, em Êx 3.14,15. Ele, o verdadeiro Filho de Deus, novamente revela o porquê de ter vindo ao mundo: para ser “levantado” (alusão à crucificação) e assim conquistar definitivamente a liberdade para o ser humano, que vive escravo do pecado.

Levando em consideração o fato de que estamos diante da comemo-ração do dia da Reforma, podemos destacar de especial maneira nestes textos bíblicos a mensagem central de toda a Bíblia, a qual foi propulsora da reforma. Mensagem esta que seria: o ser humano não pode pagar ou compensar os seus pecados através de suas boas ações ou observância da lei; o único que pode nos libertar do pecado e oferecer a verdadeira liberdade é Cristo, o Filho de Deus.

O TEXTO DE JOÃO 8.31-36

No texto bíblico proposto para nossa reflexão, observa-se que Jesus se dirige agora aos judeus que nele creram. Há muito tempo os judeus já estavam sendo dominados e oprimidos pelo império romano, sendo que seu maior desejo era de um dia se tornarem independentes, conquistando sua liberdade dos tiranos opressores. A esperança de que isso um dia se tornaria realidade estava baseada na promessa de Deus feita a Abraão em Gn 22.17,18. O Messias deveria vir da descendência de Abraão e, segundo as errôneas esperanças daqueles judeus, quando este grande rei viesse, todas as nações seriam subjugadas, sendo que eles seriam a nação que dominaria todos os demais povos da terra.

Sabendo desse seu anseio por liberdade, Jesus lhes faz a seguinte proposta: “Se vocês continuarem a obedecer aos meus ensinamentos, serão, de fato, meus discípulos e conhecerão a verdade, e a verdade os libertará” (vv. 31,32).

Entretanto, cabe destacar que a liberdade oferecida por Jesus, o Mes-

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sias, não é simplesmente uma liberdade dos reinos deste mundo. A liber-dade oferecida por Jesus vai muito além, é liberdade do poder do pecado, da morte, da ira de Deus, do diabo, do inferno e da maldição eterna. Esta liberdade não depende da condição terrena do homem, se empregado ou patrão, servo ou senhor. Tal liberdade também não pode ser conquistada mediante uma revol ução de independência, mas depende unicamente do crer e confiar em Cristo, aquele que conquistou a liberdade em nosso lugar ao pagar na cruz os pecados que nos escravizavam.

Surpreendente e inesperada é a resposta dos judeus ante a proposta de Jesus. Estes afirmam nunca terem sido escravos de alguém. A verdade é que eles não conseguiam admitir para si mesmos o fato de serem servos, escravos dos romanos, visto que isso lhes feria o ego. Como poderiam escravos ter a pretensão de dominar as outras nações? Eles, os descen-dentes da Abraão, viviam na ilusão de que um dia governariam todas as nações, e agora Jesus vem lhes dizer que ele os libertaria dos pecados?! Isso os ofendia, pois, segundo a sua compreensão, eles já eram livres do pecado ao observarem a lei e oferecerem seus sacrifícios.

Aqueles judeus creram enquanto pensavam que, sendo discípulos de Jesus, governariam o mundo. Mas percebendo que não era isso o que Jesus lhes propunha, eles novamente se afastaram dEle. Eles receberam o Evangelho com alegria, mas ao perceberem que isso não lhes traria glória e poder, novamente se afastaram da verdade.

O escravo não tem direito sequer sobre seu corpo, mas é dirigido pelo seu senhor. Todos pecamos e somos escravos do pecado, sendo escravos e sujeitos também a todas as consequências do pecado: doenças, fome, guerras, dores, governos corruptos. Poderemos ser de fato livres apenas quando nos virmos livres do pecado. Aqui está o grande drama da huma-nidade: como conquistar esta liberdade? Os judeus se julgavam livres por causa dos seus jejuns, seus sacrifícios, dos dízimos que ofertavam, das leis que observavam. Entretanto, nada que façamos é capaz de arrancar de nossa natureza o pecado que carregamos em nós. Existe apenas uma maneira de alcançar a liberdade: “Se o Filho os libertar, vocês serão, de fato, livres” (v. 36).

A liberdade não será alcançada em cumprir os ensinamentos ou man-damentos, mas em neles e através deles passar a conhecer a verdade, que é Jesus, e este, então, nos libertará.

Lutero destaca que aqueles que estão firmados na “verdade” nem sempre vão viver tão tranquilamente, pois muitas vezes terão de enfrentar grande sofrimento. Entretanto, mesmo quando humanamente falando não houver mais saídas, mesmo quando aparentemente todas as possibilida-des tiverem se acabado, poderemos confiar que, como o Salmo 46 muito bem nos mostra, o Senhor é nosso refúgio. Quem confiar na “verdade”,

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o Verbo encarnado, poderá sentir a mão de Deus agindo em sua vida, mesmo quando o mundo já houver perdido as esperanças.

Com grande propriedade Lutero ainda diz que, caso autoridades ou aqueles que exercem domínio sobre nós quisessem nos escravizar, maltra-tar ou mesmo tirar nossa vida, isso não afetaria em nada nossa liberdade. A única coisa que conseguiriam fazer seria nos elevar diretamente aos céus, nos empurrando para aos braços amorosos de Deus. Essa é também a ideia que o reformador nos transmite nas palavras do hino “Castelo Forte é nosso Deus”. Em outras palavras, nada pode nos trazer grande prejuízo quando possuímos a liberdade em Cristo.

PROPOSTA HOMILÉTICA

Tema: Jesus nos oferece a única liberdade verdadeira1. Apesar de nos considerarmos pessoas livres na forma como o mundo

compreende a liberdade, somos escravos do pecado.2. Por natureza, estamos condicionados a agir de acordo com nosso

ser pecador, sendo que somos escravos do pecado em tudo o que faze-mos, sofrendo naturalmente as consequências. É impossível a qualquer ser humano desvencilhar-se das garras do pecado.

3. Apenas Jesus pode quebrar esse ciclo em nossa vida, nos libertando do pecado e nos religando ao Pai. Apenas junto de Jesus encontramos a real liberdade.

Ederson André VorpagelNova Petrópolis/RS

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ANTEPENÚLTIMO DOMINGO DO ANO DA IGREJA

06 de novembro de 2011

Salmo 70; Amós 5.18-24; 1 Tessalonicenses 4. 13-18; Mateus 25.1-13

TEXTOS

Salmo 70: Trata-se de uma súplica de alguém que está sendo perse-guido e que pede a ajuda de Deus (v.1) no combate aos seus adversários (vv.2,3). O salmista sabe o quão pobre e necessitado ele é, por isso invoca o auxílio de Deus com a máxima urgência em sua vida. Ele sabe que o seu socorro vem do SENHOR Deus.

Amós 5. 18-24: Amós é o primeiro profeta a falar sobre o dia do SE-NHOR. O povo pensava que esse dia seria um dia de luz (v.20), o dia em que Deus castigaria os inimigos de Israel. Mas Amós diz que será um dia de escuridão (v.18), um dia em que Deus castigará também pessoas do seu próprio povo. Deus não se agrada da falsa religiosidade das pessoas. “Em vez disso ele quer que haja justiça” (v.24).

1 Tessalonicenses 4.13-18: O dia do SENHOR também é assunto para o apóstolo Paulo. Nesse texto de Paulo aos Tessalonicenses fica claro que o dia do SENHOR tem uma ligação direta com a segunda vinda de Cristo ao mundo. Agora para o juízo final. Paulo fala especialmente da situação daqueles que já terão morrido antes da vinda de Jesus: “Aqueles que morreram crendo em Cristo ressuscitarão primeiro” (v.16). Mas Paulo também fala para o consolo daqueles que estiverem vivos: “seremos le-vados nas nuvens, junto com eles, para nos encontrarmos com o Senhor no ar. E assim ficaremos para sempre com o Senhor. Portanto, animem uns aos outros com essas palavras” (vv.17,18).

CONTEXTO

O texto da mensagem (Mt 25. 1-13) está localizado dentro da última sessão de discursos em Mateus, onde Jesus fala sobre a vinda do Filho do Homem, sobre os sofrimentos e perseguições dos últimos tempos e também sobre a importância de vigiar (25. 1-13) e ser fiel (24. 45-51; 25.14-30), enquanto se espera a chegada do noivo (Jesus) no dia do juízo final (25.31-46).

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O TEXTO DE MATEUS 25.1-13

Para compreendermos bem a mensagem do texto, precisamos entender um pouco a cultura e a tradição do povo judeu da época de Jesus. O ca-samento tinha três estágios bem diferentes que precisavam ser seguidos. Primeiro vinha o compromisso: era feito um contrato formal entre os pais da noiva e do noivo. Depois vinha o noivado: cerimônia feita na casa dos pais da noiva. Apesar de ainda não serem de fato marido e mulher, ficavam unidos um ao outro pela cerimônia de noivado. Tanto que se o homem morresse durante esse período, a mulher era considerada viúva. E, finalmente, o terceiro estágio, o casamento: o noivo, acompanhado dos seus amigos, ia buscar a noiva na casa do seu pai e a levava em cor-tejo de volta para sua casa, onde se fazia a festa de casamento. É bem provável que seja este o cortejo das dez moças desta parábola contada por Jesus.

Vv. 1,2: Jesus está falando do dia de sua vinda, do dia do juízo final. Jesus está fazendo uma advertência geral de que os discípulos autênticos, os cristãos, têm a característica da vigilância, ao passo que os descren-tes e falsos cristãos não têm essa característica. Esses são chamados de ajuizados e aqueles de pessoas sem juízo.

V. 3: O cristão não só vive uma noite de espera pelo noivo, mas vive toda sua vida na espera do momento em que vai se encontrar com Je-sus, o seu Salvador. O descuido de algumas das moças representou um desastroso fim de festa. Para o cristão, o descuido, o não estar preparado pode significar um triste, sofrido e eterno afastamento da grande festa preparada para os convidados de Deus, ou seja, a vida eterna no céu.

V. 4: As ajuizadas pensaram que o noivo poderia não demorar, por isso se prepararam. Estar preparado é, em primeiro lugar, estar ciente de que todos são pecadores e que os erros e falhas impedem a todos de entrar na vida eterna. Estar preparado é reconhecer que por esses pecados o ser humano merece nada mais do que desprezo e a condenação de Deus. Estar preparado é alimentar o coração e a mente com a palavra de Deus através de leituras bíblicas, reflexões e a participação de cultos e estudos bíblicos. Estar preparado é ser capaz de, pela fé e pelo poder do Espírito Santo, confessar para as pessoas a sua confiança em Jesus. Estar prepa-rado, acima de qualquer coisa, é um estado de confiança em Deus.

Vv. 5,6: Há mais de dois mil anos os cristãos esperam pelo noivo da igreja, Jesus Cristo. Para muitos isso pode ser considerado um atraso; outros talvez cochilem na fé por essa falsa impressão. Na verdade o que a palavra de Deus nos diz é outra coisa: “O Senhor não demora a fazer o que prometeu, como alguns pensam. Pelo contrário, ele tem paciência com vocês porque não quer que ninguém seja destruído, mas deseja que

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todos se arrependam dos seus pecados” (2 Pe 3.9). Como se não bastasse a nossa própria impaciência e pecado, Jesus pede para sermos vigilantes porque “nos últimos dias vão aparecer homens dominados pelas suas próprias paixões. Eles vão zombar de vocês, dizendo: “Ele prometeu vir, não foi? Onde está ele?” (2 Pe 3.3,4). Precisamos estar em alerta contra o relaxamento e esfriamento da fé e da vida cristã: “Fiquem alerta! Não deixem que as festas, ou as bebedeiras, ou os problemas desta vida façam vocês ficarem tão ocupados, que aquele dia pegue vocês de surpresa” (Lc 21.34). Muitos pensam que isto nunca vai acontecer e não se preocupam. “A vinda do Filho do homem será como aquilo que aconteceu no tempo de Noé. Antes do dilúvio, o povo comia e bebia, e os homens e as mulheres casavam, até o dia em que Noé entrou na arca. Porém não sabiam o que estava acontecendo, até que veio o dilúvio e levou todos. Assim também será a vinda do Filho do Homem” (Mt 24.37-39). O v. 6 mostra isso, que a vinda do noivo é imprevisível.

Vv. 7-9: Outra coisa muito importante que essa parábola nos revela é que a salvação é individual: eu com a minha fé não posso salvar outra pessoa. Isso nós percebemos na reposta dada pelas moças ajuizadas ao pedido feito pelas moças sem juízo: “Dêem um pouco de óleo para nós, pois as nossas lamparinas estão se apagando”. A resposta: “De jeito nenhum... O óleo que nós temos não dá para nós e para vocês”. Isso nos lembra que ninguém vai entrar na vida eterna com a fé de outra pessoa.

Vv. 10-12: Nós vivemos no tempo da misericórdia de Deus. E em sua palavra Deus nos estimula para confiarmos no Salvador Jesus em todos os momentos. Ele pode vir a qualquer momento e só entrará na grande festa do céu quem for achado crendo nEle até o fim. Quem deixar para se preocupar com isso depois de sua vinda, além de encontrar a porta fechada, vai ouvir Jesus dizer: “...eu não sei quem são vocês”.

V. 13: Ao mesmo tempo que essas palavras soam como advertência, elas nos lembram que o Salvador virá novamente, agora para fazer a se-paração (entre joio e trigo; peixes bons e ruins: parábola da rede). Isso é sinal de que aquilo que a Bíblia nos diz é verdade e que as promessas de Deus vão se cumprir.

SUGESTÃO DE USO HOMILÉTICO

Tema: Estejam preparadosNos dias de hoje, uma das regras mais importantes é estar preparado.

Estar preparado profissionalmente, psicologicamente, fisicamente, finan-ceiramente, etc. Estar preparado é determinante entre o ter e o perder; entre a vitória e a derrota, entre a vida e a morte. Estar preparado, por exemplo, para um comerciante, pode significar estar atento às tendên-

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cias do mercado. Para um vendedor pode significar estar atualizado com técnicas de vendas e as necessidades dos clientes. Estar preparado para um motorista pode significar estar com a documentação e o veículo em dia. E, para o cristão, o que significa estar preparado?

Estar preparado é, em primeiro lugar, estar ciente de que todos são pecadores e que os erros e falhas impedem a todos de entrar na vida eterna. Estar preparado é reconhecer que por esses pecados o ser humano merece nada mais do que desprezo e a condenação de Deus. Estar pre-parado é alimentar o coração e a mente com a palavra de Deus através de leituras bíblicas, reflexões e a participação de cultos e estudos bíblicos. Estar preparado é ser capaz de, pela fé e pelo poder do Espírito Santo, confessar para as pessoas a sua confiança em Jesus. Estar preparado, acima de qualquer coisa, é um estado de confiança em Deus.

Fernando Santos BooneItapema/SC

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PENÚLTIMO DOMINGO DO ANO DA IGREJA

13 de novembro de 2011

Salmo 90.1-12; Sofonias 1.7-16; 1 Tessalonicenses 5.1-11; Mateus 25.14-30

LEITURAS DO DIA

Salmo 90: o texto reflete sobre a transitoriedade da vida e a ira do Senhor. Suas palavras finais concedem um magnífico desfecho a este salmo: “confirma a obra das nossas mãos”.

Sofonias 1.7-16: trata-se de um texto duro de ouvir, pois fala da ira do Senhor. Chamo a atenção para os vv.7 e 12. O primeiro diz que o SENHOR preparou o seu dia. Ele é quem preparou o sacrifício e santificou os seus convidados. Mesmo com essas afirmações, o v.12 revela que há pessoas que dizem que Deus não faz nada, nem o bem nem o mal.

1Tessalonicenses 5.1-11: Paulo fala aqui do dia do Senhor e do perigo de dormir, isto é, de não aguardar esse dia. Paulo poderia usar aqui a imagem de Jesus na parábola a seguir dizendo para não guardarmos a nossa armadura, mas para a vestirmos.

TEXTO DE MATEUS 25.14-30

O texto apresenta a parábola dos três empregados (NTLH). Uma pa-rábola nunca é fácil de ser compreendida. No entanto, a parábola não se propõe a ser fácil, e sim a pronunciar a palavra de Deus. Ao pronunciar a palavra de Deus, Jesus escolhe anunciar um aspecto dessa palavra. Trata-se de grande engano pensar que cada elemento de uma parábola represente um assunto. Se assim fosse, deveríamos seguir a interpreta-ção alegórica e perguntar: “O que significam os talentos?” “Quem são os três servos?” “Quem é o senhor?” Dessa forma, facilmente cairíamos na tentação de dizer que os talentos são dons (cf. TASKER, 1961, p.186), ou dizer que existe uma hierarquia de recompensa entre os servos (do tipo: “Quem tem mais ganha mais”), ou ainda de dizer que o senhor da parábola é Deus.

Essas identificações, porém, logo começam a criar problemas sérios. Se esses talentos são dons, logo, não usar bem os seus dons pode condená-lo à morte eterna, como demonstra o desfecho da parábola: “ali haverá

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choro e ranger de dentes” (cf. Mt 8.12). Se o senhor é Deus, logo alguém perguntaria: “Deus defende o uso de juros?”

A primeira pergunta a ser feita, portanto, é: “Por que Jesus contou esta parábola?”

O contexto – como sempre – é importante. O texto de Mt 25.14-30 está dentro de um discurso que principia em Mt 24.4. Trata-se de um discurso de Jesus em resposta a uma pergunta feita por seus discípulos. Enquanto saíam do templo de Jerusalém, os discípulos de Jesus comentam com o mestre sobre a grandeza daquele templo. Ao invés de ouvirem de Jesus que aquele templo era muito importante para o povo, que o templo teve a sua origem registrada no Antigo Testamento ou que o templo estava presente durante a peregrinação no deserto, os discípulos ouvem: “Não ficará pedra sobre pedra” (Mt 24.2). Querendo compreender melhor a afirmação de Jesus, os discípulos perguntam: “Dize-nos quando sucederão estas coisas e que sinal haverá da tua vinda e da consumação do século” (Mt .24.3).

Portanto, esta parábola faz parte da resposta de Jesus a respeito de sua vinda e da consumação do século. Ou, como Jesus diz um pouco antes de contá-la, “O reino do céu é semelhante a...” Os discípulos novamente não ganham a resposta que gostariam, pois eles queriam saber a data. Jesus lhes dá parábolas.

Na parábola dos talentos, há um homem e os seus servos. Não se trata de um senhor mau, carrasco, que gosta de ver os seus servos sofrendo com obras impossíveis de praticar, pois Mateus faz questão de registrar: “A um deu cinco talentos, a outro, dois e a outro, um, a cada um segundo a sua capacidade” (Mt 25.15). Com isso percebemos que não estamos falando de obras impossíveis; o patrão considerou as condições de cada um. Portanto, o último servo não falhou devido à pouca quantidade de talentos recebida. Ele tinha as mesmas condições dos demais. Essa lógica também nos fará pensar por que o que tem mais ganhou ainda mais ao final da parábola.

Portanto, a parábola segue com o pensamento de que o natural é que os servos cumpram a sua missão. No entanto, a estrutura lógica da parábola é interrompida no final:

v.16: “ganhou outros cinco”v.17: “ganhou outros dois”v.18: “escondeu o dinheiro do seu senhor”.

Não podemos colocar esse servo infiel no livro do profeta Sofonias, mas, à semelhança daqueles que pensaram que Deus não faria o bem nem o mal (Sf 1.12), este servo infiel pensou que o seu senhor não lhe faria nem bem nem mal.

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Como podemos ler em Mateus, o servo infiel estava enganado. O seu senhor queria fazer-lhe o bem, pois deu todas as condições de que ele precisava. Deu-lhe o talento, não cobrou mais do que as suas capacidades e deu-lhe muito tempo, como bem destaca o v.19.

Precisamos agora saber quais são os pontos de contato da parábola com a realidade. Pois, como vimos antes, nem todos os pontos podem ser aplicados a Deus e, especificamente, à vinda de Jesus (assunto da pergunta dos discípulos).

Tratando-se do tempo da vinda, esta parábola fala de muito tempo. As duas parábolas anteriores falam que virá em um momento em que não se espera (Mt 24.50; 25.5). Todas as três, porém, fazem questão de mostrar que havia tempo suficiente. Havia tempo para não espancar. Havia tempo para ir buscar azeite. Havia tempo para investir nos talentos. Portanto, o reino de Deus vem de surpresa, mas há tempo para esperá-lo.

No entanto, deve-se reconhecer que o clímax da parábola está no úl-timo servo, o infiel. Como já comentamos, o senhor queria dar em dobro também a este último, mas o próprio servo não acreditou que poderia ter dois talentos. Sua justificativa era que o seu senhor era um senhor severo. No entanto, não é com severidade que Jesus apresenta esse senhor. Se Jesus é bondoso ao apresentar um senhor terreno, como é o caso do homem da parábola, quão mais bondoso será ele em apresentar o Senhor do Céu?

Jesus coloca uma inquietação nessa parábola. Há sentidos que trans-cendem à imagem da parábola. Jesus não considera que os investimentos bancários possam ter prejuízos. Bem sabemos que investir em coisas terrenas tem sempre um risco. Se as pessoas considerassem a transito-riedade dos bens terrenos, como muito bem o Sl 90 considera, logo, elas poderiam perceber que o tema de Jesus era outro. Só há um investimento que nunca dá prejuízo, o reino do céu, pois a garantia é a promessa da vinda de Cristo.

No entanto, questionar essa garantia é igual a esconder o reino do Céu debaixo da terra. Como se a garantia pudesse continuar enterrada. A garantia sai da terra para acompanhar cada cristão e para ser o sinal de que o reino de Deus virá e ele será nosso.

Os discípulos estavam encantados com outras garantias; o templo de Jerusalém, por exemplo. Jesus derruba essas garantias e desenterra aquela que é a garantia de Deus, e que se revelará um pouco depois neste evangelho: a morte e ressurreição de Cristo.

Portanto, podemos dizer que o objetivo homilético da pregação deste texto é levar as pessoas a fazerem a seguinte oração: “Venha a nós o teu reino” (Mt 6). Os discípulos querem saber o momento em que o reino de Deus vem. A pergunta deles está errada e, por isso, Jesus não a responde.

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A pergunta certa a fazer é: “Como vem o reino de Deus?” Com certeza não é com o templo de Jerusalém. Com certeza é com a vinda de Cristo.

Nós estamos um pouco mais acostumados com a imagem do apóstolo Paulo presente no texto de 1 Tessalonicenses. Paulo fala de uma armadura. Naquela época, nenhum soldado teria uma armadura para deixá-la guar-dada. É da natureza da armadura que ela seja vestida e, assim, ela pode proteger. Em Mateus, a imagem é o dinheiro. Sabemos que o natural do dinheiro é ser utilizado. O local do dinheiro é o comércio. Portanto, quando o servo enterra o dinheiro ele está indo contra a natureza do dinheiro. Isso seria diferente se estivéssemos falando de sementes (cf. Mt 13).

Portanto, se pensamos que Jesus quer responder à pergunta de seus discípulos a respeito da sua vinda, podemos dizer que o natural é que aconteça a vinda de Cristo. Nas palavras de Lutero: “O reino de Deus vem por si mesmo”. O problema é ir contra essa natureza. É por isso que aquele último servo é condenado. As pessoas são condenadas em nosso mundo quando atacam a natureza do reino deste mundo. As pessoas são condenadas no reino de Deus quando atacam a natureza do reino de Deus, a saber, a manifestação deste reino divino por meio de Jesus Cristo.

ESTRUTURA DE UM POSSÍVEL SERMÃO

Inicialmente, levar à reflexão de que a natureza de todo ser humano é a de resistir à palavra de Deus, escondendo-a. A consequência dessa resistência é a condenação eterna.

Jesus muda a condição do ser humano quando lhe dá uma nova na-tureza. Essa nova natureza é capaz de receber a palavra de Deus. Essa nova natureza entende que há um Deus querido, pois recebe a apresen-tação que Cristo faz de Deus. Jesus nos faz compreender, assim, que o seu reino vem.

Por causa disso que Cristo faz nós podermos orar “Venha a nós o teu reino” pensando em nós mesmos e pensando em nosso próximo. Pensa-mos em nós para que o reino de Deus venha a nós (como veio aos demais cristãos). Pensamos em nosso próximo para que o reino de Deus chegue também a ele (como veio a nós mesmos).

Consultar também os estudos feitos pelo prof. Vilson Scholz no Men-sageiro Luterano de julho de 1990 e o estudo apresentado na Igreja Luterana n° 68 de 2009.

Francis Dietrich HoffmannCanguçu/RS

[email protected]

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ÚLTIMO DOMINGO DO ANO DA IGREJA

20 de novembro de 2011

Salmo 95.1-7a; Isaías 65.17-25; 2 Pedro 3.3-13; Mateus 25.31-46

TEXTOS

Salmo 95.1-7a: este Salmo é uma canção de louvor, onde o povo de Deus é convidado a adorar e louvar o SENHOR com alegria (v.1) e de joe-lhos (v.6) por tamanhas obras criadas e mantidas pelo Criador, entre elas, o próprio ser humano. É entoado pela igreja cristã desde os tempos mais antigos, fazendo-se presente em nossa liturgia, na Ordem das Matinas: VENITE (vinde). Nesse salmo, o salmista nos convida a cantarmos alegre-mente porque o SENHOR é a rocha que nos salva (v.1), é todo-poderoso e Rei acima de quaisquer outros deuses que o homem incrédulo venha a venerar (v.3). O seu governo não é limitado; Ele reina sobre o mundo inteiro (v.4), criado unicamente por Ele (v.5). Somos o seu rebanho, e Ele, o nosso Pastor, que guia o seu povo nesse mundo (v.7).

Isaías 65.17-25: nessa perícope de Isaías, parece haver um paralelo entre a nova vida que o povo terá após o cativeiro e a vida eterna. E isso, de tal forma, que o leitor mal consegue distinguir quando se refere à nova vida pós-exílio (especificamente para o povo hebreu) e em que momento o texto se refere à escatologia propriamente dita. Talvez a intenção seja mesmo entrelaçar esses dois momentos como um só, visto que o mesmo Deus que resgata o povo do cativeiro babilônico é o mesmo que nos liberta da escravidão do pecado, dando, em troca, a liberdade para a nova vida. Importante destacar que essa nova vida é algo tão maravilhoso que o povo de Deus não mais lembrará das desgraças que sofreram. E não só isso: Deus também se esquecerá de todo o passado ruim (vv.16 e 17). Não haverá mais choro nem gritos de aflição (v.19), pois o próprio Deus estará criando um novo céu e uma nova terra para que ali o seu povo habite em alegria e felicidade (v.19).

2 Pedro 3.3-13: nesse trecho de sua carta, o apóstolo Pedro reafirma a necessidade dos irmãos aguardarem pela vinda do Senhor. Nota-se uma grande preocupação do apóstolo para que os irmãos se mantenham firmes nessa espera, pois haverá muitos que irão zombar dos cristãos (vv.3-6) por esperarem alguém que não dá sinais que virá. E o apóstolo é enfático em afirmar que se Jesus não veio até agora, não é porque ele esqueceu, mas sim, porque é imensamente paciente; não quer que ninguém se

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perca, mas que todos cheguem ao arrependimento e sejam salvos (v.9). Porém, estejamos vigiando porque o Dia do Senhor será como um ladrão (v.10); virá de repente, sem aviso prévio. Mantenhamo-nos firmes nessa fé na certeza que Ele virá nos buscar para a vida eterna, pois assim Ele o prometeu (v.13).

CONTEXTO

O capítulo 25 do evangelho de Mateus está cheio de profecias, dentre as quais muitas ainda não cumpridas. Para a boa compreensão deste ca-pítulo, é de fundamental importância não perder de vista a pergunta dos discípulos que deu origem a todo esse discurso. E essa pergunta aparece bem no início do capítulo 24.

Jesus acabara de sair do pátio do templo (Mt. 24.1) quando os seus discípulos chamaram a atenção dele para os edifícios do templo de Jeru-salém. Jesus, então, lhes afirma que toda aquela obra monumental será destruída. Estas palavras certamente chocaram os discípulos, os quais perguntam: “Conte para nós quando é que isso vai acontecer. Que sinal haverá para mostrar que chegou o tempo de o senhor voltar e de tudo acabar?” (Mt 24.3 NTLH). Essa é a pergunta chave que desencadeia uma série de profecias por parte de Jesus.

Essas profecias estão distintas em dois acontecimentos: a destruição de Jerusalém e a segunda vinda de Cristo. Todavia, esses dois aconteci-mentos se entrelaçam de tal forma no decorrer do discurso que, em muitos momentos, torna-se impossível separá-los. Sobre esses acontecimentos, Jesus falou, dando inúmeros detalhes e sinais. A profecia da destruição de Jerusalém já se cumpriu no ano 70 d.C. Todavia, importante salientar que “a respeito daquele dia e daquela hora” (juízo final) só a Deus cabe saber. Sendo assim, é necessário estar preparado.

No capítulo 25, porém, Jesus afunila o seu discurso para a segunda e última profecia: o juízo final, onde as ovelhas serão separadas dos cabritos.

ANÁLISE DO TEXTO DE MATEUS 25.31-46

V. 31: “Quando vier o Filho do Homem.” A expressão “Filho do Homem” é muito utilizada por Jesus. Ela aparece nos quatro evangelhos e, não raro, no Antigo Testamento. Sua origem está no hebraico, e significa: humildade ou ausência de privilégios especiais (cf. Mt 8.20; 20.28). Aparece em Eze-quiel referindo-se ao próprio profeta (Ez 2.1,3,6...). Em Daniel, com dois sentidos diferentes: referindo-se a ele (Dn 8.17) e a Cristo (7.13): “[...] E eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem [...]”

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(Dn 7.13). Ao utilizar a expressão “Filho do Homem”, Jesus se identifica com o personagem profético descrito em Daniel 7. Ao mesmo tempo, Jesus prova que as Escrituras Sagradas testificam a respeito dEle (Jo 5.39). E não só isso: com esse termo, Jesus enfatiza a sua própria humanidade (Jo 1.14). Essa descrição, porém, jamais sugere que Jesus era apenas homem, visto que ela está conectada com a profecia de Daniel. Portanto, o Filho do Homem não é alguém que surge da terra, a exemplo da erva em Is. 51.12. Não era um homem glorificado, como sugerem várias doutrinas, mas é Deus humilhado (Jo 6.62; Fp 2.5-8). Ele vem, isso sim, dentre as nuvens do céu (cf. Mc 13.26; 14.62), para onde, outrora, ele ascendeu, e está à direita do Pai (Lc 16.19). E dessa visão gloriosa, Estevão foi pri-vilegiado instantes antes de morrer (At 7.56).

V. 32: “Todas as nações serão reunidas em sua presença”. – Não serão apenas algumas, nem várias, mas sim, todas as nações. O mundo inteiro será reunido na presença do Senhor. E ali se fará a separação entre ovelhas e cabritos. Essa divisão não será por motivos sociais, econômicos, sem preferências por classes, riquezas, votos de pobreza ou coisas do tipo. A separação será tão-somente entre cabritos e ovelhas. É a mesma que separa o joio do trigo (Mt 13.24-30) e as noivas prudentes das néscias (Mt 25.1-12).

V. 33: “E porá as ovelhas à sua direita, mas os cabritos, à esquerda”. – Note que haverá somente duas divisões. Ou as pessoas estarão de um lado, ou do outro, sem meio termo. Um sinal para diferenciar a ovelha do cabrito é a fé. A ovelha crê, ao passo que o cabrito resiste à palavra de Deus (cf. Jo 10.26). Todavia, importante saber que quem fará essa separação entre justos e incrédulos não somos nós, mas tão-somente o Senhor, o Bom Pastor, que reunirá todo o rebanho a fim de separar as ovelhas dos cabritos.

Vv. 34-40: “Dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde”. – Os da direita são identificados como os justos. A palavra “justo” traduz melhor esse termo do que a palavra “bom”, visto que a última traz uma idéia de algo que parte do próprio homem: “Eu pratico coisas boas, sou bom, e é isto que me salva!” Já a palavra “justo” traz consigo a mensagem de que alguém conquistou essa justiça em favor do homem. Esse é o seu sentido original. É, portanto, o homem justificado não por obras próprias, mas por fé, e é nessa justiça (na Divina) que o filho de Deus vive. Notemos que há uma relação aqui com Jo 10. O Bom Pastor conhece as suas ovelhas, elas conhecem a sua voz e o seguem. Até as pequenas obras que fizerem serão consideradas grandiosas, justamente por serem frutos do Espírito (motivadas pela fé em Cristo).

Vv. 40-45: “Dirá o Rei aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim”. – Os da esquerda são os incrédulos. Aqueles que não quiseram

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ouvir a palavra de Deus. Que a rejeitaram. A estes Jesus não conhece, e todas as suas justiças são como trapos da imundície (Is 64.6).

V. 46: “A sentença final”. – Não há purgatório nem qualquer tipo de segunda chance. O tempo da graça é agora. Diante do juízo final, a sen-tença é esta: os incrédulos para o castigo eterno (castigo sem fim) e os justos para a vida eterna.

PROPOSTA HOMILÉTICA

A figura do juiz é muito conhecida entre nós. Necessitamos de um juiz em meio a uma partida de futebol, ou mesmo num tribunal. A sua sentença é baseada no seu ponto de vista. Nós até podemos dizer que ele foi justo ou injusto em sua sentença, mas, com toda certeza, ele teve os seus motivos para aplicá-la daquela forma.

Juízes humanos levam em conta os feitos, as obras visíveis. “Você fez isso!” “Deixou de fazer aquilo!” etc. para, assim, darem o seu pronuncia-mento. Ora, Deus também leva em conta as obras do ser humano, mas Ele olha através delas, enxergando fé ou ausência desta nas mesmas.

Fé e obras são uma coisa só nessa perícope, como também o são em toda a Escritura Sagrada. Não há como separá-las, mas, tão-somente distingui-las, tal como Lei e Evangelho.

O texto, inicialmente, dá uma idéia de Lei, tão-somente. Porém, há muito evangelho contido nele. Antes de ser uma advertência, ele revela a promessa e a garantia de um novo e feliz reencontro com Deus.

No juízo final haverá uma separação entre as ovelhas (os remidos do Senhor) e os cabritos (os que rejeitaram a Jesus neste mundo), tendo como base desse julgamento a vida frutífera em boas obras que são o sinal exterior da fé, ou seja: da presença de Cristo no coração de quem nele crê.

Convém, porém, sempre lembrar que o mesmo juiz que condena o incrédulo é o mesmo que oferece o seu Filho Jesus como advogado de todo e qualquer réu a fim de salvá-lo da condenação.

Como ovelhas do Bom Pastor, aguardamos com muita alegria a sua segunda vinda. Será algo, sem sombra de dúvidas, maravilhoso para o povo de Deus, que desde agora festeja alegremente o perdão e a salvação oferecidos imerecidamente por nosso Senhor Jesus Cristo.

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Tema: Jesus virá em majestade e glória!

1º parte: Para separar os cabritos das ovelhas;2º parte: Para condenar os incrédulos;3° parte: Para conceder a vida eterna aos justos.

Mateus Leonardo LangeSão Leopoldo/RS

[email protected]

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