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G R A N T O R I N O Jornal Universitário de Coimbra O ú l t i m o t r a b a l h o d o r e a l i z a d o r v e t e r a n o , C l i n t E a s t w o o d , é u m a r e f l e x ã o s o b r e a s o l i d ã o e a v e l h i c e P 1 8 17 de Março de 2009 Ano XVIII N.º 194 Quinzenal gratuito Director: João Miranda Editor-executivo: Pedro Crisóstomo C É R E B R O A v i d a d o s e s t u d a n t e s p o d e t e r u m a m á i n f l u ê n c i a ? P 2 e 3 D E S E M P R E G O P o r t u g u e s e s n a r u a e p r e o c u p a d o s c o m o f u t u r o P 1 5 Estudantes da CPLP acusam direcção-geral de distanciamento Um grupo de estudantes da Facul- dade de Letras vai mobilizar-se, amanhã, em frente à faculdade para expressar o descontentamento com a implementação do regime jurídico do superior e do Processo de Bolo- nha. A direcção-geral promove no dia seguinte, 19, um protesto silen- cioso no Largo D. Dinis. P 5 Os dirigentes das associações que re- presentam os estudantes não portu- gueses da CPLP denunciam a “ausência” das direcções-gerais da AAC nas actividades que desenvolvem. Um dos estudantes afirma que “a DG/AAC não tem sabido criar mecanismos que permitam a integração dos estudantes da CPLP”. O presidente da direcção- geral, Jorge Serrote, no entanto, diz que “é a direcção-geral que está empenhada em estreitar laços”. Já o presidente da Organização dos Estudantes Guineen- ses em Coimbra acusa directamente a actual direcção de “manipulação”, ao ter apresentado, na última Assembleia Magna, uma moção em alternativa à proposta que previa a ida à manifesta- ção a Lisboa pela defesa dos direitos dos imigrantes. P 5 Mais informação em acabra. net @ PUBLICIDADE Um homem de causas, de lutas e de jornalismo P 7 João Mesquita Pela madrugada agitada de Coimbra As profissões que conhecem a cor da noite P 1 4 a cabra ANDRÉ FERREIRA Associações de estudantes dizem ser contactadas apenas para as eleições Dois dias de luta Estudantes mobilizam-se Norberto Alves “Vamos tentar jogar e ganhar jogos” No fim-de-semana em que a Acadé- mica saiu derrotada na visita ao Benfica e acabou com um ciclo de seis vitórias consecutivas, o treina- dor da equipa sénior de basquetebol da Académica fala da participação do clube na liga portuguesa, do novo modelo da prova, na carreira e no futuro. Norberto Alves elogia a coe- são de grupo, apesar das limitações financeiras e desportivas P 9

Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

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Edição 194 do Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA

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Page 1: Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

GRAN TORINO

Jornal Universitário de Coimbra

O último trabalho do realizador veterano,Clint Eastwood, é uma reflexão sobre asolidão e a velhiceP 18

17 de Março de 2009Ano XVIIIN.º 194Quinzenal gratuito

Director: João MirandaEditor-executivo: Pedro Crisóstomo

CÉREBROA vida dos estudantespode ter uma máinfluência?P 2 e 3

DESEMPREGOPortugueses na rua e

preocupados como futuro

P 15

Estudantes da CPLP acusamdirecção-geral de distanciamento

Um grupo de estudantes da Facul-dade de Letras vai mobilizar-se,amanhã, em frente à faculdade paraexpressar o descontentamento coma implementação do regime jurídicodo superior e do Processo de Bolo-nha. A direcção-geral promove nodia seguinte, 19, um protesto silen-cioso no Largo D. Dinis.P 5

Os dirigentes das associações que re-presentam os estudantes não portu-gueses da CPLP denunciam a“ausência” das direcções-gerais da AACnas actividades que desenvolvem. Umdos estudantes afirma que “a DG/AACnão tem sabido criar mecanismos que

permitam a integração dos estudantesda CPLP”. O presidente da direcção-geral, Jorge Serrote, no entanto, diz que“é a direcção-geral que está empenhadaem estreitar laços”. Já o presidente daOrganização dos Estudantes Guineen-ses em Coimbra acusa directamente a

actual direcção de “manipulação”, aoter apresentado, na última AssembleiaMagna, uma moção em alternativa àproposta que previa a ida à manifesta-ção a Lisboa pela defesa dos direitos dosimigrantes.P 5

Mais informação em

acabra.net@PUBLICIDADE

Um homemde causas,de lutas e dejornalismoP 7

JoãoMesquita

Pela madrugada agitada de CoimbraAs profissões que conhecem a cor da noite P 14

a cabra

ANDRÉ FERREIRA

Associações deestudantes dizem sercontactadas apenaspara as eleições

Dois dias de luta

Estudantesmobilizam-se

Norberto Alves

“Vamos tentar jogare ganhar jogos”

No fim-de-semana em que a Acadé-mica saiu derrotada na visita aoBenfica e acabou com um ciclo deseis vitórias consecutivas, o treina-dor da equipa sénior de basquetebolda Académica fala da participaçãodo clube na liga portuguesa, do novomodelo da prova, na carreira e nofuturo. Norberto Alves elogia a coe-são de grupo, apesar das limitaçõesfinanceiras e desportivasP 9

Page 2: Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

DESTAQUE2 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

Os hábitos diários de qualquerpessoa influenciam o seu cérebro.Disto já ninguém tem dúvidas, por-que há vários estudos que o pro-vam. A alimentação, as horas detrabalho, o tempo de descanso e atéos 'hobbies' são factores decisivospara as respostas que o cérebro dá.

O poeta António Gedeão, que era

também um homem das ciências,dizia que “o sonho comanda avida”, mas o que de facto se passa éque o cérebro comanda o sonho.Embora continue a ser um segredopara muitos investigadores, é unâ-nime qual o papel do cérebro emtodas as actividades do corpo hu-mano. Desde as funções vitais até

aos movimentos de pernas e bra-ços, passando pelos sonhos e o ra-ciocínio, o cérebro é que dirige asoperações. Com tudo isto, prevê-seque os efeitos sobre o cérebro se re-flictam em vários campos da vidaprática.

A vida do estudante universitá-rio, como qualquer outra, tem roti-

nas muito próprias. Horas de aulase de estudo, leitura, noitadas, ex-cessos de álcool e drogas, pressãodos exames e o recurso a comple-mentos cerebrais são alguns doshábitos que caracterizam a vidauniversitária e que deixam marcasincontornáveis no cérebro humano.Muitas das doenças e desconfortos

que experimentam têm origem nes-tas rotinas. É de esperar que o cé-rebro reaja de maneiras diferentesconsoante a maior ou menor expo-sição a elas.

Coloca-se então a questão: o cé-rebro dos estudantes universitáriosanda cansado desta (má) vida? Osespecialistas pronunciam-se.

Até ao próximo domingo, 22, comemora-se a Semana Internacional do Cérebro e ACABRA aproveitou para fazer um “retrato” ao cérebro do estudante universitário. PorDiana Craveiro e João Ribeiro

Bem-vindo ao cérebro de um estudanteSEMANA INTERNACIONAL DO CÉREBRO

A leitura é uma actividade quepreenche grande parte da rotinade qualquer estudante univer-sitário, basta reparar nas filas nosserviços de reprografia para ocomprovar. Mesmo quem nãomorre de amores por livros senteque é impossível fugir-lhes. Todaesta exigência traduz-se numatendência dominante: os estu-dantes universitários muitas vezescingem-se àquilo que são obriga-dos a ler.

De que forma pode estar istorelacionado com o cérebro? Aleitura tem uma grande influênciano desenvolvimento cerebral, namedida em que “altera até aprópria estrutura física do cérebroe do sistema nervoso”, segundo acoordenadora do Plano Nacionalde Leitura, Isabel Alçada. “Há maisconexões sinápticas nas pessoasque desde cedo lêem, do quenaquelas que não lêem”, explica.A concentração e a memória sãodois dos campos em que os efeitosda leitura mais se manifestam. Deacordo com Isabel Alçada, “ohábito de ler exige que as pessoasestejam quietas, com os olhos fix-ados num determinado ponto”, oque traz benefícios para a concen-tração. Já em relação à memória, aescritora mostra-se mais incerta,visto “não haver certezas em como

ela se desenvolve”. No entanto,sabe-se que “o exercício de mem-orizar textos é importante”, mas Is-abel Alçada adverte: “a leitura temde estar associada à vontade defixar”.

A autora compara a leitura a“uma escalada que exige esforço edá prazer” e, continuando a metá-fora, afirma que “o estudante uni-versitário tem muito mais hipótesesde chegar ao Everest da leitura”,do que quem não percorre todo osistema educativo.

Actualmente, assiste-se a umaprogressiva substituição da leituratradicional pelos meios tecnológi-cos, para o qual os estudantestambém contribuem. Isabel Alçadanão considera esta situaçãoameaçadora para a leitura empapel: “a comunicação através daleitura de livros é uma invençãoextraordinária, que marca a Hu-manidade de uma forma tão pro-funda que se pode dizer que éinabalável”. A autora admite que“as pessoas recorrem muito maisdepressa à informação na Internetdo que, por exemplo, às enci-clopédias”. No entanto, adverteque é preciso “distinguir o trigo dojoio” e que “as pessoas vão sendocada vez mais alertadas paraaquilo que é credível ou não”.

J.R.

O álcool acompanha a vida uni-versitária, mas quando ingerido emexcesso pode ter efeitos negativos.Ana Rita Álvaro, do Centro deNeurociências e Biologia Celularde Coimbra e da Sociedade Por-tuguesa de Neurociências (SPN),explica que, "dependendo daquantidade de álcool ingerido,diferentes áreas cerebrais são afec-tadas". Inicialmente, é o equilíbrioque sofre alterações, mas o álcoolpode também vir a alcançar "áreasresponsáveis por funções vitais quelevam à perda de consciência, aocoma e mesmo à morte", acres-centa.

Quanto mais jovens forem osconsumidores de álcool, mais prej-udicial é a sua ingestão. Em idadeprecoce, o cérebro ainda está emdesenvolvimento, pelo que o con-sumo de álcool o pode afectar.Ana Rita Álvaro diz que "o álcooltambém perturba os níveis de con-

centração, portanto um jovem es-tudante vai apresentar redução nodesempenho escolar". Embora "oconsumo crónico de qualquer sub-stância nociva seja prejudicial àsaúde", como defende Ana Rita Ál-varo, "tudo depende da quanti-dade". Tomando como exemplo aingestão de quatro cervejas diaria-mente, o membro da SPN não con-sidera que este seja um númerograve. Contudo, "esse actorepetido diariamente por longosperíodos não é desejável, sobre-tudo em idades precoces".

”O consumo crónico de todas asdrogas, tal como o álcool, causa amorte dos neurónios”, esclareceAna Rita Álvaro. A sua regeneração,embora já se saiba que ocorre, nãoé feita à mesma velocidade a quemorrem os neurónios. Em situaçõesmais graves, "um consumidorcrónico de drogas tem alteraçõesde comportamento e de capaci-

dade física e intelectual", especí-fica.

Segundo um estudo orientadopor um membro do Instituto Supe-rior de Psicologia Aplicada, o hax-ixe, junto das camadas mais jovens,é a substância ilícita mais consum-ida. Considerada por muitos comosendo uma droga leve, Ana Rita Ál-varo lembra que “há estudos quemostram uma relação no consumode haxixe e o desenvolvimento deesquizofrenia".

Outro dos problemas do con-sumo de drogas é o desenvolvi-mento de comportamentosdepressivos. "O consumo crónicode ecstasy pode provocar situ-ações depressivas, porque estadroga afecta o sistema serotoninér-gico, isto é, a libertação de sero-tonina, um neurotransmissorresponsável pela boa disposição",esclarece Ana Rita Álvaro.

D.C.

Page 3: Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

DESTAQUE17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 3

A utilização de computadorese a navegação na Internet sãoautênticos rituais sagrados para amaioria dos estudantes. Msn,Google, Hi5, Facebook eWikipedia, são termos familiarespara o estudante comum, quequase já não passa sem acederdiariamente à web. Além dashoras em frente ao computador,há um sem número de outros es-tímulos tecnológicos a que océrebro humano não é indifer-ente, desde o telemóvel à tele-visão, passando mesmo pelasimples máquina de calcular.

Para o presidente do Institutoda Inteligência, Nélson Silva,fugir a todo este fluxo de infor-mação “é como tentarmos fugirda nossa própria sombra”. “O

cérebro está semprede antenas

voltadas para onde haja infor-mação. Uma simples mosca quepasse ao seu alcance é automati-camente detectada, registada etransformada numa imagem men-tal”, explica.

As consequências deste autên-tico bombardeamento de sons eimagens estão relacionadas coma maior ou menor exposição a in-formação. No limite, o ser hu-mano desenvolve uma“dependência de ecrãs” e passapor aquilo que o presidente doInstituto da Inteligência apelidade “transe hipnótico-tec-nológico”.

Este estado é provocado “poruma elevada concentração nosconteúdos de ecrãs, nomeada-mente nos computadores” e cul-mina numa “’atenção fascinada’,próxima da que se obtém emtranse hipnótico”, conta o inves-tigador.

A um nível mais prático tudoisto se traduz de várias formas:

“andar sempre a bocejar;adormecer nas aulas; es-

quecer-se do que se anda a fazerna vida; perder a cabeça por dácá aquela palha ou entrar emebulição à mínima frustração ouà mínima contrariedade”, enu-mera Nélson Silva.

Um estudo recente realizadopor uma investigadora britânicarevela que as redes sociais online(Hi5, Facebook e Twitter, são al-guns exemplos) provocam, alongo prazo, nos seus uti-lizadores uma “infantilização” docérebro.

As principais consequênciassão egoísmo, défices de concen-tração e dificuldades em rela-cionamentos. Nélson Silva nãoacredita que “o cérebro faça umaviagem de regresso ao passado”.Contudo, o presidente do insti-tuto admite que, “a nível mentale, por conseguinte, a nível psi-cológico, possa haver umaaquisição de atitudes e lingua-gens mais infantis”.

J.R.

Semanaassinaladano Museuda Ciência

Patrícia Neves

“Cérebro e arte” é o tema desteano da Semana Internacional doCérebro. Por isso, o Museu daCiência da Universidade de Coim-bra agendou um conjunto de acti-vidades para esta semana.

No espaço vão estar expostasmontagens que visam dar a co-nhecer alguns aspectos da neuro-ciência. A exposição é dirigida emparticular ao público mais jovem.

Hoje, 17, quinta-feira e sexta-feira vão decorrer palestras ondese vai relacionar o cérebro com aarte. Foram convidados cientistasdo cérebro e mesmo pessoas quese dedicam à poesia, como LuísQuintais, para expor a sua pers-pectiva quanto à investigação docérebro e a importância que temno trabalho. Neurocientistas, in-vestigadores em neurociência,neurobiologia geral e biologiageral, tais como Paulo Pereira eMarta Menezes, também vãoexpôr as suas ideias. Estas pales-tras acontecem sempre às 16horas.O Centro de Neurociênciasvai também visitar escolas.

Em homenagem aos 60 anos doNobel de Egas Moniz, amanhã de-

corre um colóquio para o qualforam convidados neurocientis-tas, neurocirurgiões e historiado-res para debaterem qual aimportância que hoje se dá às in-vestigações que Egas Moniz reali-zou. “Achámos que esta era umahomenagem que fazia sentido, jáque seria interessante fazer umareflexão sobre a importância e asimplicações daquele que a dadaaltura foi considerado um Nobelcontroverso devido às consequên-cias da utilização da técnica da lo-botomia”, explica o director doMuseu da Ciência, Paulo GamaMota. Catarina Resende de Oli-veira, Alexandre Castro Caldas,Miguel Castelo Branco, FernandoGomes e Manuel Correia são osespecialistas convidados.

A maioria dos estudantes univer-sitários recorre à automedicaçãopara ter um bom rendimento faceao esforço intelectual. A con-clusão parte de um estudo feitopela Escola Superior de Saúde deViseu que foi divulgado em No-vembro do ano passado. Apesquisa foi feita em 1004 estu-dantes universitários, com idademédia de 19 anos, e engloboualunos da área das ciências dasaúde, gestão, administração e lín-guas.

Ana Rita Álvaro, do Centro deNeurociência e Biologia Celular,explica que "existem suplementosvitamínicos que não são prejudici-ais para o cérebro, uma vez quenormalmente servem para aumen-tar a concentração e combater afadiga e quando utilizados deforma regrada são benéficos e pro-duzem geralmente o efeito pre-tendido".

No entanto, além de comple-mentos para o cérebro, há estu-dantes que recorrem aanti-depressivos na época de ex-ames, algo que Ana Rita Álvarodesaconselha, porque "para alémde deverem ser tomados apenascom indicação médica, não devemser tomados em situações pontu-ais, como em situações de stressagudo como se verifica em épocasde exame". Se o objectivo for con-trolar a ansiedade e o nervosismodestas alturas, "há outros fármacosmais indicados", defende.

Os anti-depressivos, quando

tomados sem vigilância médica ede forma não controlada, podemter efeitos negativos. Segundo AnaRita Álvaro, estes medicamentos"provocam alterações na liber-tação de neurotransmissores nocérebro e, por isso, não podem serdeixados de tomar de qualquermaneira, caso contrário o cérebroressente-se podendo ocorrer al-terações de comportamento con-trários ao efeito inicialmentedesejado".

Outra situação que os estu-dantes costumam repetir em fasede exames são as directas. A do-cente da Faculdade de Psicologiae Ciências da Educação da Univer-sidade de Coimbra (FPCEUC),Maria Salomé Pinho, explica que"quando as pessoas estão numasituação de maior stress ou an-siedade, torna-se mais difícil recor-dar informação que aprenderam,mas o sono deve ser feito de formadistribuída". "Há dados quechamam a atenção para o facto deo sono ajudar à consolidação dainformação na memória", afirma. Adocente da FPCEUC adverte aindaque "as pessoas que fazem direc-tas na altura em que a memória vaiser processada podem vir a preju-dicar o seu desempenho".

Maria Salomé Pinho defendeque o estudo é a melhor formapara exercitar a memória e diz queas directas são "um esforço muitoconcentrado e intenso que provo-cam desgaste no organismo".

D.C.

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ENSINO SUPERIOR4 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

Rumo político da AAC dividea Academia novamente

Moções que previamuma manifestaçãonacional em Lisboa eum abaixo-assinadocontra o RJIES foramaprovados em ambiente de discórdia

Na Assembleia Magna (AM) dapassada quarta-feira, 11, foi discu-tida a linha de acção política da As-sociação Académica de Coimbra(AAC), num plenário que gerou

discordância entre os estudantesque se encontravam reunidos. A es-tudante da Faculdade de Ciências eTecnologia da Universidade deCoimbra (FCTUC) Sílvia Marquesapresentou uma moção que, noprimeiro ponto, previa o repúdiodo modelo de gestão das faculda-des, imposto pelo Regime Jurídicodas Instituições de Ensino Superior(RJIES) e no segundo um abaixo-assinado. A moção foi votada pontopor ponto e o primeiro ponto foi re-provado, ao passo que o segundofoi aprovado.

De acordo com a proponente, “amoção em nada compromete a po-sição da Direcção-Geral da AAC

(DG/AAC). Era uma medida con-sensual, que correspondia a umadeliberação de magna”. Sílvia Mar-ques afirma que foi uma “incoe-rência política brutal” e que houve“desonestidade para com os estu-dantes que estavam na magna epara com todos os estudantes quea associação académica repre-senta”. A estudante acrescenta que“foi uma tentativa de tomada deposição que revela alguma inexpe-riência por parte desta DG/AAC”.O presidente da DG/AAC, JorgeSerrote, explica que “não se trataaqui de incoerência, é uma questãode não voltar a fazer algo que já foifeito depois de já estar traçado o

rumo e a forma de lutar contra oRJIES”.

Para a estudante da FCTUC, ofacto de a DG/AAC ter votado con-tra o primeiro ponto e ter-se abs-tido no segundo “parece ter sidopor terem sido chamados à atençãoaquando a reprovação da tomadapública de posição contra oRJIES”. Jorge Serrote, asseguraque “não foi certamente por aquiloque a proponente disse que se alte-rou o voto”. “Pedimos para ser vo-tado ponto por ponto precisamenteporque as votações iam ter sentidosde voto diferentes”, justifica.

Sílvia Marques refere quequando apresentou a moção, “pen-sava que a DG/AAC iria votar afavor do primeiro ponto e chumbaro segundo, porque o abaixo-assi-nado é uma proposta concreta deacção e não me parece que esta di-recção-geral tenha vontade deapresentar propostas concretas deacção e de as concretizar”. Serroteafirma que “o abaixo-assinado éalgo que verdadeiramente não es-tava vocacionado como algo quefosse, naquele momento, o melhorcaminho, mas consideramos tam-bém que não seria algo mau fazer.Daí a abstenção”.

Também a moção apresentadapela estudante da Faculdade de Le-tras da UC (FLUC) Ana Beatriz Ro-drigues gerou discussão entre osestudantes presentes na Assem-bleia Magna, tendo os votos sidocontados três vezes. A moção pre-via uma manifestação nacional emLisboa a efectuar depois do Encon-tro Nacional de Direcções Associa-tivas (ENDA) que se vai realizar emMaio. A proposta vai ser apresen-

tada, pela DG/AAC, às associaçõesde estudantes presentes no ENDAe a proponente da moção esperaque “a direcção-geral faça tudopara que a proposta seja apro-vada”. Jorge Serrote explica que“caso a moção não seja aprovadaem ENDA, tem que se equacionar,porque se aquilo é para ser umamanifestação nacional torna-secomplicado não termos o apoio dasoutras académicas”. O dirigente as-sociativo afirma que “antes doENDA vai-se discutir essa questãocom a proponente e talvez, até,levar a discussão a magna”. No quediz respeito às questões discutidasem AM, Ana Beatriz Rodrigues as-segura que “não temos uma acade-mia unida e acho que há umatentativa da DG/AAC em não agru-par tudo”. A estudante da FLUCressalva que “a direcção-geral es-teve bem em relação a certas pro-postas como é o caso da iniciativa‘UC a pente fino’ e do caderno rei-vindicativo”.

Além das moções referidas, naúltima AM foi aprovada a elabora-ção de um caderno reivindicativo ea apresentação de uma queixa aoProvedor de Justiça a requerer afiscalização sucessiva do RJIES eda Lei de Financiamento do EnsinoSuperior, tendo em vista a declara-ção de inconstitucionalidade dosdiplomas. Um “Jogo das Cadeiras”,um minuto de silêncio pelos direi-tos dos imigrantes, uma concen-tração silenciosa e umlevantamento dos actuais proble-mas das faculdades, obtiveramtambém o voto a favor dos estu-dantes reunidos em AssembleiaMagna.

A ASSEMBLEIA MAGNA votou a favor de todas as moções apresentadas pela DG/AAC

Alteração doregulamento deatribuição das bolsasa meio do ano levouserviços a reverprocessos que jáestavam concluídos

Os Serviços de Acção Social daUniversidade de Coimbra (SASUC)esperam que a atribuição de bolsasde estudo “à maior parte” dos pro-cessos que estão pendentes nestemomento esteja concluída no finalde Março, adianta a coordenadorados serviços de bolsas, Elisa DecqMotta.

Até à sexta-feira passada, havia6161 concorrentes a bolsas, mais329 do que em 2007-2008. Mas,desses processos, ainda estavampendentes 622 atribuições a estu-

dantes com documentos por entre-gar. A coordenadora dos serviçosexplica que “de uma maneira recor-rente, os documentos não vêmcompletos” e que isso se vai “reflec-tindo nalgum atraso”.

Ainda assim, justifica a coorde-nadora, este “não é o único motivo”para haver bolsas por atribuir. “Amudança de regras na atribuição debolsas de estudo no decorrer desteano lectivo afectou não só os pri-meiros anos como também os ou-tros, quando já estávamos comprocessos [concluídos]”, explica.

A partir de Junho passado, onovo regime deixou de consideraros rendimentos familiares dos 12meses do ano para passar a incluirmais dois (o de Natal e o de férias).“A partir do momento em que foialterado o procedimento, os servi-ços também tiveram de alterar. Issoimplicou que revíssemos váriasvezes muitos processos”, justificaElisa Decq Motta. Para a coordena-

dora da Acção Social da Direcção-Geral da Associação Académica deCoimbra, Carmo Páscoa, “o novoregulamento conseguiu tornar aatribuição de bolsas incomparavel-mente mais injusta”. Na prática, fazcom que “bolseiros baixem de esca-lão” e que, “no extremo”, sejam ex-cluídos “mesmo bolseiros do últimoescalão”, critica.

Tiago Silva, estudante do terceiroano em Arqueologia e História,alega que, embora tenha recebido“quatro meses de bolsa em finais deFevereiro”, ainda tem “dois mesesem atraso”. Como entregou um do-cumento apenas em Janeiro, diz,não chegou a pedir o adiantamentoda bolsa. “No meu caso, recebobolsa mínima, por isso o agravanteé o facto de apenas receber a bolsaapós já ter pago duas prestações depropinas”, conta. Ainda assim, “nãopenso que a administração dosSASUC seja o problema fulcralaqui”, ressalva o estudante, que en-

tende que o “problema da acção so-cial é um problema estrutural desub-financiamento, por parte dogoverno”.

O exemplo do estudante não éúnico. “Já tivemos vários casos” deestudantes que se dirigiram ao pe-louro da Acção Social por dificulda-des financeiras, pelo facto de aindaestarem a aguardar a atribuição dabolsa. “E acredito que continuarãoa surgir”, revela Carmo Páscoa.

Nesse caso, “o primeiro passo é

ligar para os SASUC para obtermosde imediato a informação sumária”,concretiza. “Caso a bolsa não tenhasido ainda atribuída, por algummotivo, aconselhamos que os estu-dantes requeiram um adianta-mento”, explica.

Até ao momento, da parte dosSASUC, foram dados “mais de 850adiantamentos de contas de bolsa”,o correspondente a cerca de 250mil euros, adianta Elisa DecqMotta.

SASUC esperam concluir atribuição de bolsas até final de Março

LEANDRO ROLIM

SÓNIA FERNANDES

Pedro Crisóstomo

Cláudia Teixeira

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ENSINO SUPERIOR17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 5

Estudantes da CPLP denunciamdistanciamento da direcção-geral

Estudantesorganizaminiciativade luta

Os estudantes da Faculdade deLetras da Universidade de Coim-bra (FLUC) vão realizar amanhã,18, uma concentração de alunosem frente ao edifício. O objectivo,segundo o estudante de História eorganizador da iniciativa, CarlosMachado, é “enterrar simbolica-mente o ensino superior devido àsactuais políticas”.

A acção de luta está ao encargode “um grupo de estudantes da fa-culdade de letras que está descon-tente com o actual estado doensino superior”. Os alunos pre-tendem “sensibilizar a comunidadeestudantil para os problemas queexistem e passar a mensagem deque é preciso fazer alguma coisa”.Carlos Machado defende que os es-tudantes sabem o que se passa noensino superior: “todos nós paga-mos propinas e todos nós temosproblemas com a implementaçãode Bolonha”. No entanto, lamenta:“há vontade de fazer mas não háuma direcção para canalizar essavontade”.

O estudante de História refereque a iniciativa vem no seguimentodos “cortes orçamentais e do Re-gime Jurídico das Instituições deEnsino Superior (RJIES)”. CarlosMachado acha que “há alunos quenão sabem o que é e isso é grave”.“Este é um papel que cabe à Direc-ção-Geral da Associação Acadé-mica de Coimbra (DG/AAC), masse há pessoas que acham que essepapel não está a ser cumprido,vamos fazê-lo nós”, esclarece.

Também a DG/AAC vai levar acabo uma actividade com o objec-tivo de denunciar o sub-financia-mento do ensino superior. Oprotesto foi aprovado na últimaAssembleia Magna e vai-se realizarquinta-feira, 19, no Largo D. Dinis,às 12h30. A moção aprovada emmagna refere que os estudantesvão estar unidos num protesto si-lencioso onde “envergarão másca-ras que lhes cobrirão totalmente acara, representando assim a vergo-nha de todos os estudantes que sevêem obrigados a abandonar o en-sino superior por não disporem derecursos económicos”. A acção deluta tem também como intuito de-nunciar o orçamento dos serviçosde acção social.

Filipa Faria

Os estudantes da Comunidade dosPaíses de Língua Portuguesa (CPLP)não portugueses acusam as sucessi-vas direcções-gerais da AssociaçãoAcadémica de Coimbra (AAC) de“distanciamento” em relação às asso-ciações de estudantes que represen-tam. O presidente da Associação deEstudantes Cabo-Verdianos, SamirSilva, esclarece que “as críticas nãotêm a ver com a actual Direcção-Geral da AAC (DG/AAC), mas simcom as sucessivas” e que se dirigiu àúltima Assembleia Magna (AM), dia11, para “manifestar a ausência daAAC e para falar especificamente naFesta dos Sons, Saberes e Sabores emque a DG/AAC recebeu um convite enão compareceu”.

Por seu lado, o presidente daDG/AAC, Jorge Serrote, afirma que“é mentira”. “Tivemos convite paravisitar e foi o que fizemos”, justifica.O dirigente associativo acrescenta:“desde que sou presidente daDG/AAC nunca tive um convite delespara nada”.

Samir Silva explica ainda que “acrítica vai no sentido de que qualquertipo de relação que possa existir temde passar sempre pela boa vontadede quem estiver na direcção-geral”.“Não queremos depender da boavontade da direcção-geral”, assegura.No entanto, o dirigente cabo-ver-diano ressalva: “tenho consciência deque por parte dos estudantes quevêm dos países que representamosnão há um grande esforço de inte-gração. Faço aqui a ‘mea culpa’”.Jorge Serrote diz não perceber asacusações, “até porque se passa ocontrário” e, continua, “somos nósque estamos empenhados em estrei-tar laços”.

Samir Silva denuncia que “aDG/AAC não tem sabido criar meca-nismos que permitam a integraçãodos estudantes da CPLP não portu-gueses”. Também o presidente da Or-ganização dos EstudantesGuineenses em Coimbra, YannickBaptista d’Alva, refere que “a atitudede indisponibilidade da DG/AAC temsido constante”.

Ambos os dirigentes afirmam sercontactados apenas em altura de elei-ções para os corpos gerentes da AAC:“queremos dizer um basta a estaforma de nos verem simplesmentecomo votantes na altura das elei-ções”, explica Samir Silva. O presi-dente da DG/AAC diz não saber “oque eles querem dizer com isso” e as-segura representar todos os estudan-tes, “quer tenham votado em mim ounão e o tratamento é igual paratodos”. E acrescenta,“obviamenteque a magna é um local para discutirestas questões, mas nunca vieramfalar comigo sobre isto”.

Já em 2005, no mandato de Fer-nando Gonçalves, as associações deestudantes dos Países Africanos deLíngua Oficial Portuguesa (PALOP)afirmaram a A CABRA sentir-se “ne-gligenciadas” pela DG/AAC.

Dirigentessentem-se “chocados”Yannick d’Alva explica que o princi-pal motivo que o levou à AM foi “criarum ponto de partida para estabeleceruma relação de proximidade e de re-presentatividade”. Contudo, o estu-dante de Medicina Dentária explicaque, além da distância entre associa-ções, o que o levou a falar foi o votocontra da DG/AAC à moção apresen-tada por Jennifer Jesus, relativa à di-vulgação e disponibilização, peladirecção-geral, de autocarros para amanifestação pelos direitos dos imi-grantes que se realizou no passadodomingo, 15. “Chocou-me que a di-recção-geral tenha votado contra essamoção”, afirma.

O dirigente guineense conta queapós a AM conversou com elementosda DG/AAC e foi-lhe dito que “não ti-nham informação acerca da iniciativae que, neste momento de crise, nãoseria adequado patrocinar uma ma-nifestação a Lisboa”. Yannick d’Alvadenuncia a situação justificando que“é irónico a DG/AAC não querer pa-trocinar uma manifestação quando

apresenta os lucros que tem apresen-tado”.

Yannick d’Alva acredita que houve“manipulação” por parte da DG/AACao apresentar uma moção em alter-nativa à moção apresentada por Jen-nifer Jesus. A moção da DG/AAC foiaprovada e previa um minuto de si-lêncio, a realizar-se em Coimbra, nodia da manifestação. O representantedos estudantes guineenses em Coim-bra considera que “houve uma tenta-tiva de não assumir aresponsabilidade de chumbar amoção”. Samir Silva diz que “tendo

em conta a vertente social da AAC, écompletamente contraditório teremvotado contra esta moção e a formacomo tentaram contornar a questãoé grave”.

No que diz respeito a esta questão,Jorge Serrote afirma não entenderquando falam em “manipulação” ejustifica: “apesar de ter sido umamagna pouco participada, não são só

os elementos da direcção-geral quevotam, portanto não percebo porqueé que dizem que foi a DG/AAC quemanipulou, quando houve estudan-tes que estavam presentes na magnae votaram neste sentido”. “Achámosque era mais oportuno fazer o minutode silêncio e, portanto, apresentámosa moção”, acrescenta.

Yannick d’Alva espera que “o pre-sidente da DG/AAC diga algumacoisa aos estudantes” que representa,“porque a maior parte deles há-desentir-se indignado com o que acon-teceu. Quero que ele diga porque éque a direcção-geral tem essa posiçãoexplícita face à luta pela igualdade dedireitos”. Jorge Serrote afirma que “aDG/AAC solidariza-se completa-mente com os imigrantes” mas que“foram os votos dos estudantes queestavam na magna que ditaram queassim fosse”. “Não percebo esse tipode críticas”, remata Jorge Serrote.

O estudante guineense denuncia,ainda, que “a magna é plural mas nãodemocrática, visto que só passarammoções que a DG/AAC queria quepassassem”. Mais uma vez, JorgeSerrote, afirma não perceber as críti-cas que são dirigidas à DG/AAC:“acho que mais democrático do queas pessoas estarem ali e votarem nãopode ser, portanto não percebo por-que é que não é democrático. Sim-plesmente não percebo”.

Representantes dos estudantes da CPLP não portugueses em Coimbra fazem críticas às sucessivasdirecções-gerais da AAC. Todavia, Jorge Serrote afirma “não perceber” as acusações

DIRIGENTES das associações de estudantes da CPLP pretendem “não depender da boa vontade da direcção-geral”

Cláudia Teixeira

Estudantes da CPLPnão portugueseslamentam ser con-tactados apenas emaltura de eleições

LEANDRO ROLIM

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ENSINO SUPERIOR6 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

ara se compreender o sig-nificado do Dia do Estu-dante, 24 de Março,temos que recuar até aos

primeiros movimentos de contes-tação estudantil do início do sé-culo XX.

O professor de História da Fa-culdade de Letras da Universidadede Coimbra (FLUC), Rui Bebiano,afirma que "até 1961 a comuni-dade estudantil comemorou outradata, o 25 de Novembro". Nestedia, em 1921, os estudantes ocu-param o Clube dos Lentes, "mar-cando o seu protesto pelaafirmação dos direitos associati-vos", sublinha. Esse episódio ficouconhecido como a "Tomada daBastilha".

Em 1961, a Direcção-Geral daAssociação Académica de Coim-bra (DG/AAC), "conotada comooposição ao regime e incentiva-dora de uma vida associativa di-nâmica e independente",mobilizou as academias de Lisboae do Porto para virem a Coimbra.Depois de várias reuniões, foi pro-posta a criação de uma União Na-cional de Estudantes "livre,autónoma e isenta", bem como aabolição da praxe pelo Dux Vete-ranorum, Joaquim Garcia. Destaacção resultou a prisão de váriosalunos pela PIDE, instaurando-se um clima de tensão no meio

académico. Mais tarde, em 1962,"ignorando a proibição que o Go-verno tinha decretado", realizou-se, em Coimbra, o primeiroEncontro Nacional de Estudantes,que valeu aos membros da AACprocessos disciplinares e suspen-sões. "Os estudantes de Coimbraresponderam então com o lutoacadémico e a greve às aulas", ex-plica Rui Bebiano.

Entretanto, em Lisboa, as asso-ciações de estudantes, "mesmosem a autorização do Ministérioda Educação Nacional, comemo-raram o Dia do Estudante a 24 deMarço de 1962", destaca o do-cente. O regime respondeu com asua "violência habitual, invadindoa Cidade Universitária e muitosestudantes foram espancados epresos". A reacção de repúdio nãose fez esperar e os estudantes de-cretaram o luto académico se-guindo a mesma linharevolucionária que ocorrera emCoimbra. Estávamos perante acrise académica de 1962.

Toda esta atitude autoritária dogoverno fomentou a união dos es-tudantes na luta pela "preservaçãodas suas associações como espa-ços democráticos" e pelo "repúdioda política educativa do EstadoNovo". Todo este processo ficouna memória como a "primeiragrande mobilização dos estudan-

tes universitários" que, só em1987, viram a sua batalha recom-pensada, com a ratificação, em As-sembleia da República, do Dia doEstudante para 24 de Março.

Até ao final do Estado Novo, adata foi aproveitada "para subli-nhar a importância da luta pelosdireitos associativos estudantis epela democratização das institui-ções universitárias e do ensino",relembra o professor da FLUC.Contudo, depois do 25 de Abril de1974, apesar do devido reconheci-mento da data, "as comemoraçõesdeixaram de ter o impacto pú-blico, ou mesmo na comunidadeestudantil, que durante a décadade 60 tinha permanecido".

Confrontado com a forma comoé, actualmente, comemorado oDia do Estudante em Coimbra,Rui Bebiano confessa que "co-nhece pouco do que tem sido feitonos últimos anos", mas, aindaassim, admite que tenta "estaratento ao que se vai passando". Ofacto de não sentir que, nesta al-tura, "algo de especial esteja aacontecer" pode significar que ascomemorações "não têm tidogrande impacto". "A maioria dosalunos universitários não está mo-tivada para comemorações dedatas e seria uma boa altura paradiscutir os problemas estudantis",alerta.

No próximo 24 de Março assinala-se mais um Dia do Estudante. O que foi na história e o queestá planeado para assinalar a data em Coimbra. Por Vasco Batista e Pedro Pinto

Para o próximo dia 24 de Março,estão agendadas duas iniciativas paraassinalar o Dia do Estudante. O Pro-jecto U, candidato às últimaseleições para a Direcção-Geral daAssociação Académica de Coimbra(DG/AAC), vai realizar uma concen-tração de estudantes em frente aoGoverno Civil de Coimbra.

Também a DG/AAC e o ConselhoInter-Núcleos (CIN) vão levar a caboum “Jogo das Cadeiras”. A iniciativavem no seguimento da aprovação deuma moção apresentada pela di-recção-geral e pelo CIN.

O presidente do Núcleo de En-genharia Electrotécnica da AAC,José Martins, explica que o objectivoda actividade é “alertar a comu-nidade estudantil para os estudantesque ficam de fora do ensino superiorpor condições económicas e dosórgãos de gestão por imposição doRegime Jurídico das Instituições deEnsino Superior”. O jogo vai ter lugarna Praça da República, às 12h30 e éaberto a todos os estudantes.

A concentração organizada peloProjecto U inclui a distribuição defolhetos informativos acerca do pas-sado histórico do 24 de Março e dosprincipais objectivos do movimento

actual. “Para credibilizar a contes-tação será ainda entregue umabaixo-assinado ao Governo Civil”afirma o elemento do projecto,Paulo Costa.

O estudante de Direito destaca o“simbolismo e a história” que a dataacarreta para o meio estudantil,aproveitando-a para expor os prob-lemas mais gerais da Universidadede Coimbra (UC), como “a falta decondições humanas, materiais epedagógicas, o valor elevado daspropinas, a insuficiência de respostados serviços de acção social e osproblemas pedagógicos resultantesdo Processo de Bolonha”. Com aacção de luta, o projecto pretende“lutar contra o fim da gestãodemocrática e paritária”, manifes-tando-se contra o novo Regime Ju-rídico das Instituições do EnsinoSuperior, que “pode levar à privati-zação das instituições de ensino”,afirma Paulo Costa.

O abaixo-assinado já circula emtodas em faculdades da UC e pre-tende chegar não só aos estudantesda Alta universitária, como tambémaos dos institutos politécnicos.

Com Tiago Carvalho eAna Rita Santos

AS INICIATIVAS DO DIAP

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Dia do Estudante tem menosimpacto na comunidade

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CULTURA17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 7

Cartaz culturalda Queimacelebra 110anos de festa

Na próxima segunda-feira, 23,vai realizar-se o espectáculo “Fado,Sonho e Tradição” nos jardins daAssociação Académica de Coimbra(AAC). O espectáculo integra o car-taz das actividades preparadaspara a Queima das Fitas.

Segundo o vice-presidente daSecção de Fado da AAC, FranciscoRequicha, o concerto tem comoobjectivo aproximar a comunidadeestudantil da cultura da cidade: “aCanção de Coimbra é indissociávelda festa da Queima das Fitas.Assim, o espectáculo percorrerá asvárias etapas do fado académico -da sua génese até à actualidade -em paralelo com o evoluir daQueima das Fitas”. A música quevai compreender temas de ArturParedes, José Afonso, Luís Gomese baladas mais recentes vai seracompanhada pela projecção defotografias das festas de queimasanteriores.

O espectáculo manifesta o carác-ter comemorativo desta queima,

que celebra 110 anos e que temcomo lema “110 anos de tradição”.Nesse sentido, a Comissão Centralda Queima das Fitas apresenta umcartaz com 110 dias de actividadesculturais, desportivas, solidárias etradicionais. O comissário respon-sável pelas actividades culturais,André Malho, afirma que estão“calculadas duas a três actividadespor semana, que se iniciaram nopassado dia 10 de Março e que vãoterminar a 27 de Junho”.

A destacar também a exposiçãoitinerante que começou no pas-sado dia 10 e que vai estar dois diasem cada faculdade da Universi-dade de Coimbra encerrando-se nodia 17 de Abril no edifício da AAC.A exposição é composta por dezpainéis ilustrativos de cartazes,programas e fotos de queimas dasfitas. Há ainda outras novidadesno cartaz deste ano como a mostrade “fado alternativo”, dia 2 deJunho, que apresenta bandas cujocenário musical é a canção deCoimbra.

Outra das novidades no cartazdeste ano é as olimpíadas univer-sitárias, o “Jantar do Bigode” eainda a iniciativa “110 anos, 110 ár-vores”.

Patricia GonçalvesFilipa Magalhães

ra um homem de causas.De princípios. De afectos.E de muitos amigos. Deum pensamento crítico e

incapaz de se vergar. Não admitia fre-tes. A única coisa que tinha de faná-tico era a devoção à Académica, dequem era adepto incondicional. Que-ria saber sempre mais e ligar os fac-tos, acompanhar as tendências.Convivia com gente de todas as gera-ções e sensibilidades sociais, políticase culturais. Um homem da cidade.

Em Coimbra nasceu quase por aci-dente e em Coimbra teve o seu últimotrabalho como jornalista.João Mesquita,o “homemcerto naprofis-s ã o

certa”, actualmente editor da revistaRua Larga, morreu aos 51 anos namadrugada da quinta-feira passada,12.

Os amigos recordam-no como umhomem alegre, conversador, sempredisponível para se dar aos outros.Cedo despertou para a política e dapolítica para o jornalismo foi umsalto. Embora fosse uma paixão de-clarada desde criança, conheciamuito pouco do meio jornalístico e daprofissão. Corria o rumor de que es-crevia com “desembaraço” e isso,aliado à experiência que trazia doMovimento Associativo do EnsinoSecundário de Lisboa, de que foi fun-dador, fê-lo entrar n’“A Voz do Povo”(órgão oficioso da União DemocráticaPopular) aos 22 anos.

Aí, começou a compreender os me-canismos e as práticas inerentes àprofissão, experiência que durou até1981, quando o jornal acabou. En-frentou então a realidade do desem-

prego, que viria a conhecer maistarde mais do que uma vez. Até quevários meses depois integrou a dele-gação de Lisboa do “Notícias daTarde” como repórter parlamentar.De resto, foi o início do que definiuuma vez numa entrevista como uma“hiperespecialização”. Extinto o pe-riódico, passou depois pelo “Jornalde Notícias”, pelo “Semanário”e cercade um ano depois, encetou uma novamudança quando integrou a editoriade um novo diário, o “Público”.

Os anos do sindicato“Gostei muito da pinta dele,

pá!”, lembra José PedroCastanheira do

encontro queteve com João

M e s q u i t aaquando do

c o n v i t epara in-

tegrara

lista concorrente ao Sindicato dosJornalistas (SJ), como secretário.“Achei-o muito firme, muito deter-minado, muito combativo e percebique poderia ser um bom elementopara a minha equipa”, acrescentaCastanheira.

João Mesquita veio a recandidatar-se à direcção do sindicato, desta vezcomo presidente, nos biénios de1989/90 e de 1991/92.

Durante os seus mandatos bateu-se com algumas das mais profundasalterações no jornalismo. Foi nestaaltura que começou o processo de re-privatização dos órgãos que haviamsido nacionalizados durante o Pro-cesso Revolucionário em Curso(PREC) e que surgiram as primeirasrádios privadas, então com o estatutode pirata. Foi também neste períodoque um grupo de jornalistas levantoua possibilidade da criação de umaOrdem profissional. “O João soubecolocar a questão da forma mais de-

mocrática possível, através de um re-ferendo em que os jornalistas foramchamados a pronunciar-se sobre amelhor forma de organização”, re-corda Castanheira. Contudo, o amigoe camarada destaca como a grandeluta de Mesquita o combate que levoua cabo contra politização da Alta Au-toridade para a Comunicação Social.

A ligação a CoimbraDesiludido com todas as alteraçõesno sector jornalístico, abandonouLisboa para entrar para a redacção do“Jornal As Beiras”. Estreitou então oslaços que o uniam a Coimbra. Noplano da intervenção cívica, foi umdos grandes motores da criação doConselho da Cidade, empenhou-se naaprovação da Carta Constitucional dacidade e colocou uma das pedras ba-silares da ‘Pró-Urbe’. Era “um cida-dão dos movimentos dos cidadãos”,como recorda José Manuel Pureza.Contudo, nunca deixou que esta suavertente cívica e interventiva cho-casse de alguma forma com a sua

vida profissional. “O João sem-pre evidenciou a sua

orientação política equando lhe foi pedido

que desempenhassetrabalhos jornalísti-cos, por exemplo, decobertura de campa-nhas eleitorais, soube

sempre traçar de umamaneira muito ri-

gorosa asua mili-tância eaquilo queé o traba-

lho dej o r n a -l i s t a ” ,defendePureza.

D’ “As Beiras” nunca esqueceu ofacto de ter visto um texto seu censu-rado, motivo que o levou a abando-nar o jornal e a voltar ao desempregodurante quatro meses, até integrar adelegação de Coimbra do “Indepen-dente”, da qual foi despedido com oencerramento das delegações do jor-nal. Passou então dois anos sem em-prego, realizando alguns trabalhos defreelance. “A cidade nunca soube re-conhecer a dedicação do João Mes-quita. A tal ponto que teve que ir paraLisboa porque em Coimbra lhe recu-saram trabalho e o afastaram”, lem-bra José Manuel Pureza.

Contudo, o elo a Coimbra não es-moreceu e João Mesquita acabou porvoltar a trabalhar para a cidade, aconvite da reitoria da Universidadede Coimbra, para editar a revista RuaLarga, mesmo continuando a viverem Lisboa.

De pé, manteve-se sempre a paixãoda qual nunca se desligou, a Acadé-

mica. Dono de uma devoção extremaao futebol, é lembrado por todos osamigos por quase nunca ter perdidoum jogo da Briosa. Paixão que lhevaleu uma homenagem singular,quando o cortejo fúnebre atravessouo Estádio Cidade de Coimbra a cami-nho da Lousã, onde foi sepultado.Aliás, em Janeiro de 2008 lançou emparceria com João Santana o livro“Académica – História do Futebol”,uma obra sobre o percurso da acadé-mica, que bateu o recorde de vendasno lançamento da editora Almedina,com mais de 400 exemplares vendi-dos. “Ele a escrever tinha um talentoinigualável. Foi o grande responsávelpela redacção, conseguia explanar asideias muito bem e eu não podia terarranjado um parceiro melhor”, re-corda João Santana.

Porém, “não cedia a tendências deencostar o futebol a realidades menosdignas de articulação com alguns po-deres da nossa sociedade. E issovaleu-lhe como académico algunsdissabores na relação com algumasdas figuras da direcção”, aponta JoséManuel Pureza.

Quando vivia em Coimbra, “porqueo João era um conimbricense degema”, lembra a amiga NatérciaCoimbra, repetia os mesmos rituais.Pela manhã lia a imprensa sempreacompanhado de um café e de umaágua das pedras. O almoço prolon-gava-se por largas horas, sempreacompanhado e geralmente no Can-tinho dos Reis, como lembra a amigaNatércia Coimbra, que com ele parti-lhava longas horas de conversa. E de-pois trabalhava pela noite dentro, atéde madrugada. Às vezes fazia umapausa para ir ao bar do Botânico, por-que o Noites Longas já não era omesmo do seu tempo.

João Mesquita foi até ao fim umdefensor acérrimo de um ideal do jor-nalismo que não se vende ao sensa-cionalismo e às lógicas de mercado. Eachava também que existia a necessi-dade de transmitir esses mesmos va-lores. E essa postura assume-setambém um pouco no que é hoje ACABRA. Quando, no final de 2002, ojornal passou a quinzenal, foi JoãoMesquita que tomou as rédeas detodo o processo.

Eduardo Brito, antigo presidenteda Secção de Jornalismo, recorda acircunstância: “ele chegou-nos comaquela voz à Mesquita e disse-nosque o jornal tinha que fazer isto e isto.Duas semanas depois apareceu-noscom o jornal todo rasurado e parti-mos de um novo modelo”. “Um tra-balho que ele prezava tanto, porqueachava que era nessa fase que se de-viam passar as mensagens do que erao jornalismo”, reconhece NatérciaCoimbra. “O João marcou-nos maisdo que ele pensaria ou desejaria”, de-fende Eduardo Brito.

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Jornalista, lutador de causas, adepto fervoroso da Académica, JoãoMesquita é, incontestavelmente, um homem de carácter e de princípios.Por João Miranda

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O homem certo na profissão certaJOÃO MESQUITA

Page 8: Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

CULTURA8 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

cápor

17MAR

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cultura

19MAR

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21MAR

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BURAKA SOM SISTEMA

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19MAR

5MAR

THE RUBY SONGS

“Coimbra é a cidade dos livros”

o coração da Universi-dade de Coimbra (UC),está a Biblioteca Geral.Com cerca de 50 anos, o

edifício alberga oito pisos, milhõesde publicações, tem linhas que re-montam ao Estado Novo e hoje aco-lhe o passado de quem explorou oconhecimento, e concretiza o futurode quem entra com perguntas e saicom respostas.

Com um espólio vasto em termoshistóricos e culturais, na BGUCpode-se encontrar um pouco detudo. Em Portugal, em média, demeia em meia hora, é editado umlivro. Ora, isto perfaz um total de 48livros por dia, num universo de 17520 livros por ano. Coimbra tem oprivilégio de possuir uma das duasbibliotecas portuguesas com depó-sito legal, onde soma todos os livrospublicados em Portugal assim comotodos os periódicos. Para além disso,livros estrangeiros e portugueses,velhos e novos coabitam nummesmo lugar. O depósito legal daBGUC está disposto, ao longo de oitopisos, em torno da sala principalonde se exercita o conhecimento: asala de leitura. Quem a escolhe paraestudar, dia após dia, não tem a realnoção do que está para além das pa-redes que envolvem a sala. Apesarda amplitude do depósito da BGUC“os livros estão a gritar desesperadospor ajuda”, personifica o director daBiblioteca Geral, Carlos Fiolhais. Por

falta de espaço, algumas publicaçõestêm mesmo de ficar amontoadas nochão, principalmente jornais e revis-tas. Também as prateleiras se en-contram sobrecarregadas, formandolabirintos apertados. Mas o espaçonão é o único problema. A sala deleitura tem infiltrações que, segundoCarlos Fiolhais, são de difícil resolu-ção porque “quando se tapa numlado, aparece noutro”, nota, e oaquecimento também é uma carên-cia. Segundo funcionário da BGUC,António Parreiral, “o ideal seria criaruma oficina para a restauração de al-guns livros que se encontram muitodegradados”.

A Biblioteca Geral possui exem-plares únicos no mundo. A primeiraedição dos Lusíadas, de Luís de Ca-mões; uma das primeiras edições daBíblia; mapas com mais de 500 anose manuscritos musicais com mais deum metro de altura e vários quilos,são raridades que não são deixadasao acaso. A Casa Forte da BGUC éuma sala climatizada, uma espéciede cofre gigante, com alta segurançaque garante a protecção destesexemplares. São raras as pessoasque a ela têm acesso.

Do espólio da BGUC não foramesquecidas as bibliotecas pessoais dealguns ilustres ligados à cidade deCoimbra, como Oliveira Martins eVisconde da Trindade. Quem entrana sala Visconde da Trindade logo seapercebe do seu valor, pelas enca-

dernações de luxo protegidas porgrades. Estas salas estão repletas delivros mas também servem de es-paço de reuniões.

O desinvestimento por parte dareitoria da UC é uma realidade. “Auniversidade não tem, neste mo-mento, meios suficientes para acu-dir a necessidades que sãourgentes”, refere o director daBGUC.

Para além das insuficiências doedifício, a falta de recursos humanosé também uma condicionante.“Existem muitos livros por catalo-gar”, refere Fiolhais, e esta é emparte, uma consequência da falta depessoal para as diferentes tarefas.

Apesar da BGUC não admitir tra-balhadores-estudantes, Carlos Fio-lhais entende que essa é uma dasprioridades para colmatar algunsproblemas, e o processo já está emcurso. “É uma maneira de os estu-dantes se envolverem mais numacoisa que é deles, sendo pagos porisso e ficando a conhecer os bastido-res”, defende o director.

Carlos Fiolhais ambiciona umnovo espaço. E vê como possível arequalificação e reutilização do es-paço da penitenciária de Coimbra.“Se houver ambição, a universidadee a câmara [municipal] têm de sejuntar, para conseguir um espaçomoderno que poderá ser privile-giado no país, equiparando-nos àsgrandes bibliotecas mundiais”,

avança Fiolhais.

Para além do papelUm milhão é o número aproximadode livros que estão nas prateleiras dabiblioteca da universidade. Este nú-mero continua a crescer, e a tecno-logia é uma prioridade. A BGUC épioneira no projecto Google Booksque actualmente disponibiliza cercade 600 obras digitalizadas integral-mente, mas que tem a particulari-dade de serem edições da própriaUC.

Segundo Carlos Fiolhais, “o digi-tal é a salvação dos livros e da im-prensa”. A Biblioteca Geral Digital,o Estudo Geral – Repositório de pro-dução científica da UC e os diversoscatálogos estão todos informatiza-dos. Para Carlos Fiolhais a disponi-bilização destes conteúdos onlinepermite aos leitores uma maior co-modidade e poupança de tempo.

Apesar da Biblioteca Geral estar apassar por algumas dificuldades,Carlos Fiolhais coloca os estudantesnuma posição fulcral. O director en-tende que “Coimbra é a cidade doslivros, os estudantes devem contri-buir para encontrar uma solução’’.Entretanto, a entrada e a saída de li-vros e pessoas vai continuar. O co-nhecimento vai persistir naqueleespaço. O estudante de Direito, VítorFigueiredo, garante mesmo que “aBiblioteca Geral é a melhor que osestudantes têm no país”.

N

BIBLIOTECA GERAL DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

SARA GALAMBA

Já foi colégio, teatro académico e faculdade de Letras. Hoje é a BibliotecaGeral da Universidade de Coimbra (BGUC), o maior espaço de leiturauniversitário do país. Actualmente depara-se com algumas dificuldadesPor Maria João Fernandes, Sara Oliveira e Ana Rita Santos

A BGUC comporta oito pisos de depósito e possui a maior colecção de mapas desenhados à mão que existe em Portugal

ARRAIAL SOCIAL

a12ABR

UM POR CEM – OLHAR AS

REPÚBLICAS DE COIMBRA

23MAR

Page 9: Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

DESPORTO17 de Março de 2009| Terça-feira | a cabra | 9

Que balanço faz da participa-ção da Académica na liga?Muito positivo. Ninguém esperavaisto, porque teoricamente éramosum dos candidatos a descer de di-visão. Jogo a jogo fomos traba-lhando, mantendo-nos coesos.Nesta altura, estamos numa posi-ção que nos permite ambicionar iraos play-off. É, em primeiro lugar,um esforço colectivo. Nestes últi-mos anos, a secção de basquetebolmudou para muito melhor e pensoque a equipa dentro de campo é oreflexo disso.

Como analisa a evolução daequipa ao longo da tempo-rada?Temos as nossas limitações: oplantel mais curto, o orçamentomais pequeno, somos a equipamais baixa, mas, em termos de coe-são de grupo e de trabalho diário,somos do melhor que existe nestaliga. Quando assim é, melhoramose é isso que tem acontecido.

Qual o segredo para ter umaequipa coesa e tranquila quedepois consegue surpreenderna liga?O segredo tem a ver com liderança.As pessoas responsáveis, técnicos edirectivos, têm essa capacidade…De dominar aquilo que são os co-nhecimentos, o “estado de arte” domomento, o treino em basquete-bol, os processos de comunicaçãocom os jogadores e o controle emo-cional. Ganhámos dois jogosmesmo nos últimos segundos. Osjogos têm sido muito equilibrados eé preciso emocionalmente, nos mo-mentos mais críticos do jogo, con-tra adversários teoricamente maisfortes, estarmos constantementeconcentrados.

A escolha dos estrangeirostambém foi um ponto de sus-tentação ao longo deste ano?Sem dúvida. Evidentemente, sabe-mos as posições que queremos queeles venham colmatar, mas o pri-meiro critério é o carácter deles, éperceber se são jogadores que vêmajudar os outros a ser melhores eque não sejam jogadores indivi-dualistas, com egos que não permi-tam ser treinados e modificadospara melhor. Não são aqueles joga-dores de estatísticas como melho-res marcadores, mas ajudam a

equipa a ser melhor.

E como avalia o trabalho dosseus jogadores nacionais?A AAC é o único clube que veiopara esta liga sem uma referêncianacional. Apostámos nos jogadoresque conhecem os valores inerentesao clube e à secção de basquetebol.Eles evoluíram muito, tiveram umimpacto muito forte, porque nuncatinham jogado a este nível.

Como é a relação de Coimbracom a equipa de basquetebol?Coimbra é uma cidade que sempregostou de basquetebol, mas andoumuitos anos arredada da primeiradivisão. Quem vem ver os jogostem de admitir que a equipa dátudo o que tem. Neste momento,há uma grande identificação daspessoas que vêem, e todos os joga-dores portugueses e estrangeirostêm contribuído. É importantís-simo perceber que é uma tarefa quenunca está completa e é funda-mental continuarmos a captar pes-soas e jovens para vir jogar. Este éum jogo do século XXI, emotivo,que se resolve no último segundo.

“Tempo, talento e dinheiro”para ter sucesso é talvez a suafrase mais repetida. A Acadé-mica tem isso?A Académica não tem dinheiro.Temos de entender a nossa reali-dade: possuímos o pior orçamentoda liga, mas é um orçamento cum-pridor. Temos o talento que pode-mos ter, mas há uma coisa quetemos que é muito importante eque os outros clubes não têm:tempo para as coisas se trabalha-rem.

Que primeiras conclusões tirado novo modelo da liga?Fui uma pessoa crítica em relação aeste modelo de competição, de jor-nadas cruzadas, de competiçãocom muitos jogos. Foi o modeloque alguns dos responsáveis da fe-deração e alguns clubes entende-ram por bem adoptar. Agora, háuma coisa que eu sei – a maior

parte dos clubes que o quiseramadoptar estão arrependidos. Seantes do modelo ser aprovadoemiti posições públicas, agora façouma coisa simples: ponham-me omodelo que quiserem que vamostentar jogar e ganhar jogos. Eramelhor ter um campeonato comdoze ou catorze equipas.

Que análise faz da prestaçãodos outros clubes da liga?Há clubes que estão claramenteaquém do que se estava à esperaface aquilo que foi o seu investi-mento. O FC Porto e o Vitória deGuimarães são, se calhar, os casosmais visíveis. Já estive num grandeclube e isto depende muito das cir-cunstâncias. O treinador é ele e assuas circunstâncias. Eu não sei ascircunstâncias dos outros, o dia-a--dia, a oportunidade que estes trei-nadores têm ou não de liderança.

E em relação a jogadores?Houve um regresso de grandes jo-

gadores ao basquetebol português.O regresso do Élvis Évora, do Sér-gio Ramos, do João Santos, que jo-garam na liga espanhola, a melhordo mundo a seguir à NBA. É im-portante, porque são referênciaspara os jovens.

O que é que recorda como jo-gador de basquetebol?Se há alguma coisa que me vem àmemória do tempo em que jogavaé que me divertia imenso.

Que balanço faz da carreira,tendo por base os clubes poronde passou?Estive um ano no Benfica. Chegueia meio de uma época em que esta-vam em último. Fiz um ano comuma opção que se calhar não foi amelhor, que foi participar nas eu-ropeias no lugar do Real Madrid,que nos desgastou. Chegámos aoplay-off e falhámos. No ano a se-guir, comecei a época e vim-meembora. Foi o único ano que senti

que a época não foi positiva e eusou treinador há 20 anos.

Como é a sua relação com aAcadémica?É uma relação curiosa. Quandovim para a Académica, vim do Oli-vais, o grande rival. Neste mo-mento não é o grande rival, é umgrande projecto. Podemos ser deforma sustentada um grande clubeportuguês. O primeiro passo a daré ter um pavilhão para o basquete-bol treinar. As pessoas devem pediro que merecem e nós temos feitotudo por merecer.

Como técnico, tem recebidoalguma proposta para ir paraoutro clube?Ser convidado faz parte da vidanormal de treinador. E recusartambém. Seria um péssimo exem-plo da minha parte, para os meusjogadores, que dentro do campotranspiram para ganhar, estar apensar noutras coisas.

O TREINADOR orienta a equipa sénior de basquetebol da Académica há três épocas .

Mesmo com a derrota frente ao Benfica, a Académica não penhorou a ida aos play-offda liga de basquetebol. O técnico faz o balanço da participação da equipa na prova

BASQUETEBOLMaia Basquet vs. Académica16H30 • MUNICIPAL FORMIGUEIRO

A G E N D A D E S P O R T I V A

VOLEIBOLAcadémica vs Sporting das Caldas17H • ESTÁDIO UNIVERSITÁRIO 3

HÓQUEI EM PATINS Académica vs APDG Penafiel18H • ESTÁDIO UNIVERSITÁRIO 1

DESPORTOS NÁUTICOSCampeonato Nacional de Junvenis e VeteranosMONTEMOR-O-VELHO

21MAR

21MAR

21MAR

22MAR

NORBERTO ALVES • TREINADOR DA EQUIPA SÉNIOR DE BASQUETEBOL DA ACADÉMICA

“Podemos ser um grande clube português”

SÓNIA FERNANDES

Catarina Domingos Sónia Fernandes

“Apostamos nos jogadores que conhecem os valores inerentesà Académica”

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DESPORTO10 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

Projecto desecção avançaem Setembro

Num futuro próximo, uma sec-ção de triatlo pode juntar-se às 26modalidades que já existem naAssociação Académica de Coim-bra (AAC). Rafael Gomes, ex-aluno da Universidade deCoimbra e impulsionador do pro-jecto para uma futura secção detriatlo, defende que “Coimbra éuma cidade que tem todas as con-dições para fazer grandes eventosdesportivos a nível do triatlo”.

O antigo estudante, lembrandoque antigamente existia um clubede triatlo na cidade, refere que oprincipal objectivo é “fazer renas-cer a modalidade na região”. Paraisso, contactou a secção de nata-ção, “porque é uma das secçõesmais importantes para poderabrir um projecto”, já que esta é avertente mais treinada no triatlo.

Quanto ao recrutamento deatletas, “já existe um grandegrupo de nadadores que fazemparte da secção de natação e queestão interessados no triatlo”. Ou-tros não fazem parte da Acadé-mica, mas “praticam em clubes anível nacional ou na região deCoimbra e vão-se juntar ao pro-jecto”.

O local e horário de treinosainda não estão estipulados. Sóem Setembro, quando os atletasse filiarem no clube, é que vaihaver “um horário bem definido”.Neste momento só estão a treinaros elementos da secção de nata-ção e “até Setembro os treinos vãoser feitos na piscina do complexoolímpico”.

Como o projecto nasceu há pou-cas semanas, os apoios ainda sãopoucos e provêem sobretudo dasecção de natação. Rafael Gomesexplica que “como a nataçãoainda está em desenvolvimentoem Coimbra, os alunos demons-tram grandes interesses em expe-rimentar a modalidade do triatlo”.As expectativas são positivas:“como é uma modalidade que estána moda, temos boas perspectivaspara a angariação de atletas”.Num futuro próximo, é esperadaa “realização de provas nacionaise a nível do circuito jovem”. Adata das provas ainda não estámarcada, mas vai ser entre osmeses de Setembro e Outubropara aproveitar a entrada dos es-tudantes na universidade. A provavai ter a duração de um fim-de-semana e vai estar aberta a atletasfederados e não federados.

A criação da nova secção vai serapresentada no próximo plenáriodo Conselho Desportivo da AAC.O membro da direcção do orga-nismo, Jaime Carvalho, apenasadianta que “o projecto só podeser avaliado depois de apresen-tado”.

Filipa Faria

Divisão de Honra à vistaCom o primeiro lugarna fase regular, a Académica sonhacom a subida. Eliminados da taça, aequipa concentra-seno campeonato

A Secção de Futebol da Associa-ção Académica de Coimbra (AAC)terminou a primeira fase do Cam-peonato Distrital Série A da Asso-ciação de Futebol de Coimbra(AFC) em primeiro lugar e pre-para-se para disputar a fase finalque permite a subida à Divisão deHonra.

A segunda fase começa no pró-ximo domingo, dia 22, frente aoGóis. A disputa pela Divisão deHonra é feita entre os seis primei-ros classificados da série e só oprimeiro lugar sobe directamentede escalão. O presidente que étambém um dos capitães deequipa, Rui Pita, considera que“os jogos vão ser difíceis”, uma vezque são retirados metade dos pon-tos aos participantes, o que vai di-minuir a vantagem da formação.

Na época transacta, os estudan-tes finalizaram o campeonato emoitavo lugar, devido a “falhas deorganização e a uma menor quali-dade do plantel”, esclarece RuiPita. No entanto, após “três anosde grandes remodelações nogrupo”, chegaram os bons resulta-dos no campeonato e na Taça da

AFC, como realça o presidente.Em relação ao campeonato, a

equipa acumulou cinco empates eduas derrotas em 20 jogos. O trei-nador Bruno Fonseca admite queo grupo “nunca assumiu nada noinício da época, pelas dificuldadesa nível de apoio logístico e pelofacto dos jogadores nem semprepoderem estar presentes nos trei-nos”. A secção de futebol dispõede apoios financeiros limitados, oque influencia a qualidade daequipa. “Não pagamos a ninguém,mas mostramos outras mais-va-lias como seja representar a nossaacademia”, sublinha Rui Pita.

Além das dificuldades financei-ras, a falta de condições do está-

dio universitário e a utilização tar-dia do Campo de Santa Cruz paraos treinos foram também factoresque condicionaram o percurso dogrupo. Bruno Fonseca critica a po-sição da Direcção-Geral da AACpela sua falta de apoio. “Penso quepodia ter sido dado mais apoiopela posição que a equipa ocupano campeonato e por ser uma mo-dalidade popular”.

Quanto ao apoio dos adeptos, otreinador revela não haver afluên-cia aos jogos pelo facto das “pes-soas estarem desligadas”.

A subida de divisão é uma am-bição dos estudantes e dos técni-cos, que anseiam por umcampeonato mais competitivo e

interessante. “Esta equipa, commais dois ou três jogadores, estápreparada para dignificar a cami-sola”, afirma o técnico que estáconfiante na qualidade do plantelpara esta competição. Contudo,consideram “ser cedo para se falarem Divisão de Honra”.

Relativamente à taça, a equipafalhou no passado domingo o apu-ramento para as meias-finais,frente ao Febres, perdendo nospenáltis após o empate a um golo.

Bruno Fonseca relata que ogrupo “veio para essa competiçãosem qualquer tipo de objectivo” eencarou cada jogo “sem pressão”,mas que a presença nos quartosde final já os deixa orgulhosos.

Num jogo que seprevia complicado,os estudantesresponderam damelhor maneira,com um empate auma bola frentea SC Braga

A Briosa deslocou-se este fim-de-semana a Braga para defrontar aequipa local. Os arsenalistas que vi-nham para este jogo moralizados,depois de terem empatado a zero aprimeira mão dos oitavos de finalda Taça UEFA frente ao Paris Saint-Germain.

Jorge Jesus apresentou algumassurpresas na equipa titular. O trei-nador do Braga deixou no banco jo-gadores como Renteria e LuísAguiar. Também Domingos Paciên-cia apresentou surpresas. A Briosaentrou em campo a jogar em 4x3x3,com um trio atacante muito rápido,

com Lito, Sougou e Carlos Saleiro.Os estudantes levaram para

Braga a lição bem estudada, defen-dendo bem, com o meio campo e adefesa muito compactos, lançandodepois rápidos contra ataques.

O Braga começou melhor, encos-tando a equipa da Académica à ba-liza. Logo aos dois minutos,Mossoró fugiu a Pedrinho e já den-tro da área tentou desmarcar umcompanheiro, mas a defesa daBriosa conseguiu afastar a bola paralonge da grande área. A equipa deJorge Jesus continuava a pressionara defesa dos estudantes. PauloCésar teve a primeira grande opor-tunidade da partida aos onze minu-tos. O avançado arsenalista entra naárea e frente a Peskovic, propor-ciona uma excelente defesa aoguarda-redes dos estudantes. AAcadémica respondia em contra-ataque e Tiero tem uma excelenteoportunidade dois minutos depois.O médio da Briosa aparece comple-tamente sozinho no lado direito doataque, rematando para uma defesaapertada de Eduardo.

O jogo animava com perigo para

ambas as balizas, até que aos 33 mi-nutos Carlos Saleiro inaugura omarcador. Na sequência de uma jo-gada de envolvimento do ataquedos estudantes, Sougou descobreCarlos Saleiro no coração da área eo avançado de primeira faz o seuprimeiro golo com a camisola daAcadémica. O Braga dominava ojogo, mas a Briosa não deixava aequipa da casa criar lances de pe-rigo.

Na segunda parte, os minhotosapareceram novamente mais fortes,criando logo inúmeras oportunida-des de golo. Os estudantes tenta-vam segurar o ímpeto atacante doadversário, mas com a entrada deLuís Aguiar e de Renteria, tudo setornou mais complicado. Dois mi-nutos depois de entrar, Renteria,com um passe a rasgar a defesa dosestudantes, desmarca Paulo Césarque, isolado, não falhou, estabele-cendo, assim, o resultado final.

Com este empate, a Académicasoma 25 pontos, mantendo o dé-cimo lugar. Na próxima jornada, dia5 de Abril, a Briosa recebe o Bele-nenses.

Empate com sabor a vitória ANA COELHO

SARA SÃO MIGUEL

Sara São Miguel

A ACADÉMICA SF terminou a primeira fase com 44 pontos.

André Ferreira

TRIATLO

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DESPORTO17 de Março de 2009| Terça-feira | a cabra | 11

P•R•O•LONGA•M•E•N•T•O

BASQUETEBOLA equipa

de basquete-bol da Aca-d é m i c ap e r d e ufrente ao

Benfica por 89-60 e pôs termo aum ciclo de seis vitórias conse-cutivas na Liga Portuguesa deBasquetebol. A turma de Nor-berto Alves está no quinto lugar,com 42 pontos. Na próxima jor-nada, a AAC joga com o MaiaBasket, em mais uma jornadacruzada.

VOLEIBOLNa pri-

meira jor-nada doplay-off daSérie dosPrimeiros da

Divisão A2, a Académica perdeucom o Sporting Clube das Caldaspor 0-3. Nesta fase, as equipasdefrontam-se no sistema à me-lhor de três jogos. O próximo en-contro está marcado parasábado, dia 21, no Pavilhão 3 doEstádio Universitário.

HÓQUEI EM PATINSCom a ma-

nutenção jáassegurada,a Académicacomeçou damelhor ma-

neira a luta para o título de cam-peão da 3ªDivisão. A equipa deMiguel Vieira venceu o Clube dePatinagem de Beja por 1-4, naprimeira jornada de apura-mento do campeão do terceiroescalão. Na próxima ronda, aAAC joga com o APDG Penafiel.

XADREZA segunda equipa de xadrez

da Acadé-mica perdeupor 1-3frente ao S.João da Ma-deira, em

jogo da terceira jornada da SérieB do Campeonato Nacional de2ª Divisão. Na próxima jornada,a AAC II encontra o Mari-nhense. No Campeonato Nacio-nal de 3ª Divisão, a AcadémicaIII perdeu frente ao Vale deCambra por 0-4. No próximofim-de-semana, a AAC joga como S. João da Madeira II.

Catarina Domingos

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Lenine Cunha e Vítor Pleno destacam-se em França Paraatletas da AAC regressam a Portugalcom dez medalhas efalam da suaprestação, dosobjectivos futurose do dia-a-dia

Depois da participação no Cam-peonato da Europa em Pista Co-berta INAS-FID, os atletas daSecção de Atletismo da Associa-ção Académica de Coimbra(AAC), Lenine Cunha e VítorPleno, regressam de França commedalhas e novos recordes.

A representar a selecção nacio-nal de atletismo de deficiência in-telectual, Lenine Cunhaconquistou seis medalhas de ouro(no pentatlo, triplo salto, 60 me-tros, salto em comprimento, saltoem altura e corrida de estafeta4x400 metros) e duas de prata(60 metros e corrida de estafeta4x200). A boa prestação emReims valeu-lhe o prémio “Me-lhor Performance”.

“Faço um balanço muito posi-tivo, pois foi a minha melhorcompetição de sempre”, avalia oatleta. Para além das medalhas, odesportista de 26 anos conseguiuestabelecer um novo recordemundial no pentatlo, com 3157pontos.

Na partida para França, LenineCunha lembra que “não estavamuito confiante”. A nova marcamundial trouxe-lhe “ânimo paraos dias seguintes”. “Houve provasem que me superei e fiquei sur-preendido com marcas que nuncaimaginava fazer”, destaca.

O academista Vítor Pleno, maiscontido nas respostas, tambémavalia a sua prestação como posi-tiva. Depois de partir para terrasgaulesas como vice-campeão daEuropa de Corta-Mato INAS-FID,o atleta arrecadou uma medalhade ouro na corrida de estafeta4x400 metros e uma medalha debronze nos 3000 metros. “Estavaà espera de fazer melhor, mas fizo que foi possível”, afirma.

Com estes resultados, quederam a Portugal o segundo lugardo quadro de medalhas (no total28), Lenine Cunha sente que estáa causar impacto. No entanto, la-menta que “na chegada ao aero-

porto não estivesse ninguém”.O atleta de Vila Nova de Gaia

pratica atletismo há vinte anos eelege como o momento mais im-portante da carreira a participa-ção nos Jogos Paraolímpicos deSidney em 2000, que o fizeram “oatleta que é hoje” e o ajudaram adar “um grande salto”. A sua vidaé exclusivamente dedicada aoatletismo: à parte das duas horase meia de treino por dia, ocupa-secom música, televisão e internet.

Lenine Cunha representa a Aca-démica desde o início desta tem-porada. “Não gostei da propostaque o meu anterior clube [FCPorto] me fez, e depois porque omeu amigo António Oliveira meconvidou”, conta.

Já Vítor Pleno conta com dezanos de carreira e veste a cami-

sola da Académica há duas épo-cas. O desportista da Figueira daFoz divide-se diariamente entre otrabalho numa padaria e os trei-nos ao final da tarde. O Campeo-nato do Mundo de Pista ao ArLivre no Brasil em 2007 é o mo-mento que escolhe como maismarcante do seu percurso des-portivo.

Global Games no pensamento O técnico da secção de atletismo,António Oliveira, faz parte daAcadémica desde 1989 e ajuda apreparar os dois desportistas paraas competições de clubes, apelida-os de “belíssimos atletas”. A par-ticipação nos Global Games naRepública Checa, entre 5 e 15 deJulho, é o próximo objectivo a al-

cançar. Lenine Cunha e VítorPleno não falam em medalhas,mas prometem “honrar o país edar o melhor”. “Vai ser uma com-petição muito superior e de altonível”, adverte o atleta de Gaia.

Após os resultados da partici-pação no europeu de pista co-berta, Lenine Cunha acredita quetem as “portas abertas para o quevai acontecer em Londres 2012”.A presença nas Paraolímpiadas équase obrigatória. “Quero lá estarporque já ganhei tudo o que haviapara ganhar, mas ainda não ga-nhei uma medalha paraolímpicae vai ter de ser nessa competiçãoporque a idade depois pesa”, am-biciona.

À parte das representações na-cionais, ambos querem “ajudar aAcadémica a subir de divisão”.

DEPOIS DAS MEDALHAS, os atletas da Académica já só pensam nos Global Games.

SARA SÃO MIGUEL

Catarina DomingosSara São Miguel

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10 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

TEMA

Quando se assinalam seis anos do início da invasão do Iraque, A CABRA elenca os confrontosmilitares da actualidade mais mediatizados. Textos por Vasco Batista e João Miranda e ilus-tração por Tatiana Simões

CONFLITOS MUNDIAIS

pós vários incidentes etrocas de ameaças entreos diferentes executivosnorte-americanos e o go-

verno iraquiano, no dia 20 deMarço de 2003, uma força de co-ligação composta pelos EstadosUnidos da América (EUA) e peloReino Unido, entre outros, iniciaa operação “Iraqi Freedom” com ajustificação de pôr fim a um ale-gado projecto iraquiano de produ-ção e armazenamento de armas dedestruição maciça.

Cerca de um mês depois, as tro-pas de coligação tomam a capitaliraquiana e no final de 2003 cap-turam o então presidente do país,Saddam Hussein. Entretanto, emvárias zonas do país, diversos gru-pos, como guerrilhas xiitas e suni-tas, iniciam uma ofensiva contraas forças ocupantes. As eleiçõeslegislativas, no início de 2005,ficam marcadas por vários episó-dios de violência e pelo boicote da

po-pulaçãosunita. Con-tudo, o governopermanente só as-sume o poder em meadosdo ano seguinte, ano em que osconfrontos entre as tribos xiitas esunitas assumem proporções ca-tastróficas. 2006 é também indis-sociável da execução de SaddamHussein e da denúncia do trata-mento dos prisioneiros iraquianosna prisão de Abu Ghraib.

A instabilidade política man-tém-se e, no ano seguinte, o se-nado norte-americano aprova oenvio de novos contingentes desoldados para o Iraque.

Consequências de todo o con-flito no Iraque são, como aponta omembro da direcção do ConselhoPortuguês para a Paz e Coopera-ção (CPPC), Vítor Silva, os “4,5

m i -lhões de des-

locados, a taxade desemprego

superior a 50 por cento, para cimade um milhão de viúvas e os cincomilhões de órfãos”. “As redes sa-nitárias e fornecedoras de água eelectricidade que cobriam cercade 70 por cento do país há 12 anosatrás estão destruídas, com a con-comitante explosão de doenças, aque a rede de hospitais e centrosde saúde não dão resposta, porqueforam destruídas pelos ocupan-tes”, acrescenta.

Após a recente vitória eleitoral,o novo presidente dos EUA, Ba-rack Obama, anunciou a retiradanorte-americana do país, a que oprimeiro-ministro iraquiano

Nouri al-Maliki, respondeu

respondeu demonstrandoconfiança nas forças militares lo-cais para assegurar a paz no país.

Porém, a estabilidade no paísnão é algo que analistas apontempara um futuro próximo. SegundoVítor Silva “este [cenário] só serápossível quando os invasores seretirarem (de facto e totalmente)e quando houver condições dopovo iraquiano escolher livre-mente o seu destino”. O membrodo CPPC lembra também as in-tenções proclamadas pelas forçasinvasoras e o trajecto que o con-flito levou para explicar as tensõesque se vivem actualmente no Ira-que: “ao contrário da propalada li-berdade, segurança e democraciaque queriam exportar, além deoutros falsos pretextos, com queos EUA e a Inglaterra tentaramjustificar o bombardeamento e

ocupação do Iraque, este país está

num caos e a sua população vivenum inferno”.

Também a docente do Departa-mento de Relações Internacionaisda Faculdade de Economia daUniversidade de Coimbra(FEUC), Daniela Nascimento, fazum “balanço francamente nega-tivo do ponto de vista daquilo quesão os objectivos de longo prazoda coligação que liderou a inter-venção. O cenário que nós temosno Iraque é um cenário ainda depós-guerra bastante belicizado”.

A solução poderá passar, se-gundo Daniela Nascimento, por“procurar um entendimento entreas partes relativamente àquilo queserá o futuro político, económicoe social do Iraque”. “Não creio,contudo, que isso seja uma tarefafácil e alcançável no curto prazo”,acrescenta.

IRAQUE

A

D.R.

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17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 11

TEMA

A i n d aantes da in-

tervenção soviética em 1979, o Afega-nistão já era dos países mais pobresdo mundo. Hoje, o país da Ásia Cen-tral tenta encontrar o seu rumo, numcenário de reconstrução após o con-flito com os EUA , iniciado em Outu-bro de 2001. Com a iminente retiradadas tropas americanas em solo afe-gão, “o Afeganistão está longe de serum caso resolvido”. “O país não al-cançou a paz que se pretende numquadro amplo e não pela simples[ideia de] ausência de conflito ar-mado”, entende Daniela Nascimento.

Os atentados de 11 de Setembro de2001 submeteram o país a um dosconflitos mais violentos e polémicosque a comunidade internacional já

conhecera. O conflito afe-gão “tem a vantagem de

ter tido o apoio internacio-nal aquando da intervenção, que o

Iraque não teve”, relembra a do-cente da FEUC. Justificando a ne-

cessidade de responsabilizar osterroristas, os EUA controlaram ospontos estratégicos do Afeganistão,mantendo aberta a possibilidade deavançar noutros sentidos.

Pelas enormes reservas de gás e pe-tróleo, o Afeganistão suscita interes-ses geoestratégicos, tornando-se numterritório bastante cobiçado. Na pos-sibilidade de se assegurar a estabili-dade no Afeganistão, será possíveltorná-lo na principal forma de en-trada na Ásia Central, não sendo es-tranho que surjam meios financeiroscom a finalidade de melhorar as co-municações e explorar os recursosexistentes. Uma retirada do país semgarantir a estabilidade pretendidapara transformar opaís num acessoprivilegiado àÁsia Central po-deria rever a suapolítica nestamatéria.

O conflito remontaaos movimentos decolonização do século XX,quando o sul do país se tornounuma colónia italiana. No pós-guerra, o deserto de Ogaden, quefazia parte da Somália, foi entregueà Etiópia, indignando os somalis.A independência do país ocor-reu em 1960, tornando-senuma república.

Em 1969, um golpe deestado colocou no poder ogeneral Barre, que ataca aEtiópia com o intuito deanexar Ogaden, cujos ha-bitantes falam somali,mas sem sucesso.

Em 1991, Mohammad Ali Mahdisubstitui Barre quando já se viviauma guerra entre clãs que dividia opaís. Em virtude do golpe de estadode Mahdi, a capital da Somália, Mo-gadishu, fica sob o comando de Mo-hammad Farah Aidid.

Foi então criado um governo detransição no país, o qual é, para o

povo somali, um fantoche da Etió-pia. A guerra pelo controlo das ri-quezas do país tem degradado asituação humanitária do país.

E m2006, aUnião deT r i b u -

nais Islâ-m i c o s

(UTI) tomao controlo da

capital e iniciauma campanha

contra as facções es-palhadas pelo país.

As forças etíopes, com oapoio dos EUA, entram em

território somali para protegero governo de transição da UTI,

acusada de querer impor um Es-tado islâmico na Somália. Os EUA,convencidos que a UTI dava gua-rida a terroristas, enviam para a So-mália agentes da CIA e FBI, masnão se provou qualquer ligação. Acapital foi conquistada em Dezem-bro de 2006 pelas forças do go-verno de transição. Contudo, a UTIparece não ter desistido da sua pre-tensão.

O conflitono Darfur arrasta-

se desde 2003 e constitui-se comouma das piores crises humanitáriasda história que já vitimou mais de300 mil pessoas, segundo dados dasNações Unidas. A situação interna domaior país africano é catastrófica e osconfrontos entre grupos rebeldes,forças de segurança e as milícias jan-

jaweed parecem não ter fim. A vio-lência e a instabilidade constantesforçam milhões de pessoas a refugia-rem-se no interior do país, na tenta-

tiva de encontrar segurança econdições mínimas de sobrevivência.

A 4 de Março, o Tribunal Penal In-ternacional (TPI) emitiu um man-dado de captura ao presidentesudanês, Omar al-Bashir, por crimesde guerra no Darfur. O governo su-

danês expulsou 13 organizações in-ternacionais do país por alegadacolaboração com o TPI, “fazendocom que a sua população, que já

está a sofrer na pele o conflito,ainda sofra mais”. “A tentativa delevar o presidente sudanês a tri-

bunal pode e deve ser uma soluçãopara o conflito” declara o director-executivo da Amnistia Internacional,Pedro Krupenski. Para Daniela Nasciessa tentativa, ainda que seja “umpasso importante na responsabiliza-ção de crimes e um avanço da lutacontra a impunidade não é, só por si,suficiente”.

O antigoCeilão, inde-pendente da Grã-Bretanha desde 1948,enfrenta uma guerra civilque já perdura há 16 anos.O conflito no Sri Lanka, queopõe os Tigres de LibertaçãoEelam Tâmil (LTTE) às for-ças governamentais, iniciou-se em 1983 e já provocou maisde 70 mil mortos. Os analistas carac-terizam esta guerra como conflito debaixa intensidade, onde predominamatentados e acções de guerrilha, a quese sucedem picos de acção militar.

A situação na “Pérola do Oriente”constitui um legado do imperialismo.Depois de confirmada a independên-cia da ilha, o então primeiro-minis-tro Stephn Senanayake, criou umalegislação que negava a cidadania aostamil, oriundos da Índia, com o in-tuito de preservar a hegemonia cin-galesa. Vivia-se uma situação de

tensões étnicas.Em 1972, foi ratificada

uma nova constituição,mas os tamil ainda eram

alvos de discrimina-ções pelo domíniocingalês. A etnia per-cebeu que a não-violência não seriaa melhor opção edecidiram criar oEstado Tamil inde-

pendente. Foi nestecontexto que surgiu a

LTTE.Se é ou não um dos principais con-

flitos mundiais da contemporanei-dade, Daniela Nascimento acreditaque “é perigoso e contra-producentecatalogar alguns conflitos como maisimportantes do que outros, porqueisso ajuda e legitima a desresponsa-bilização internacional re-lativamente aosoutros”.

AFEGANISTÃO

SUDÃO SRI LANKA

SOMÁLIA

Após o fim da Segunda GuerraMundial, o Reino Unido abandona ascolónias que detém na região doMédio Oriente. Assim a ONU propõe,em 1947, uma divisão do territóriopalestiniano entre árabes e judeus,numa proporção de 45 para 55 porcento, que não é aceite pelos estadosárabes.Com a saída dos britânicos apopulação judaica proclama o Estado

de Israel, originando um conflitoentre o novo estado e os países ára-bes vizinhos, como a Síria, o Egipto(que anexa a Faixa de Gaza) ou a Jor-dânia (que anexa a Cisjordânia). Con-tudo, os árabes palestinianos acabamsem um Estado próprio.

A partir daí desenrolam-se umasérie de confrontos entre Israel e ospaíses vizinhos, em que o Estado he-

braico vai ocupando territórios des-ses mesmos países. No meio desta si-tuação, os árabes palestinianoscolocam-se do lado dos Estados daLiga Árabe, lutando pela sua inde-pendência.No ano de 1982, tem iní-cio a Primeira Intifada, em que apopulação palestiniana se rebela con-tra a ocupação israelita, arremes-sando pedras aos militares hebraicos.

Nove anos depois, o governo israelitainicia a construção de um muro como intuito de separar os países. Muroque o Tribunal Internacional de Jus-tiça declara como ilegal devido aofacto de atravessar territórios de ad-ministração palestiniana.

Têm início novos confrontos, cujomais recente conflito se dá quando oHamas lança vários rockets sobre Is-

rael e ester e s p o n d ecom uma in-vestida mili-tar, quecausou, segundofontes médicas,mais de mil mortosentre a populaçãopalestiniana.

ISRAEL-PALESTINA

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CIDADE14 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

Começar o dia quando outros acabam

São trabalhadores da noite. Come-çam o dia quando a maior parte oacaba e enquanto muitos dormemsão eles que agitam a cidade. A segu-rança, a limpeza, o transporte e a ali-mentação da noite dependem deles.

A noite está amena. Na Alta é diade festa e a Praça da República temuma fila de táxis pronta a levar os es-tudantes de volta a casa. Alternativapara os autocarros que já não circu-lam, os taxistas passam horas a fio àespera que a porta se abra. Taxistahá 15 anos, Rui (nome fictício) vê oque faz como a única alternativadada pela idade. “O negócio está li-mitado, é o mais fraco que podehaver, mas tenho que continuar por-que já não sou novo”, afirma. Traba-lhar de noite não é para ele umaopção. Fá-lo porque a entidade pa-tronal assim o exige, e apesar de nãoser “compensatório”, Rui prefere tra-balhar de noite “porque é maiscalmo”, explica.

Na outra margem do rio, os carrosvão parando em frente à rulote “OEstudante”. O movimento vai au-mentando enquanto as horas pas-sam. O frio faz-se sentir, mas ocheiro dos cachorros parece vencê-lo. “Trabalho à noite por opção e étudo muito mais calmo é isso dá-megosto” diz a proprietária, Paula Ro-drigues. Entre um cliente e outro,que “passa, compra e vai embora”, amaioria são clientes habituais. “Nãohá muita clientela, só é chato nashoras mortas”, acrescenta. O traba-lho só acaba ao amanhecer e noúnico dia em que não trabalha acabapor não descansar para estar com afamília.

Numa das muitas ruas estreitas daBaixa conimbricense, à medida quea noite passa, vai-se retirando o pãodo forno. A padaria “Mimosa” é co-nhecida pela maior parte dos estu-dantes, mas cada vez são menos osque a procuram depois do sol se pôr.Sem rádio, nem televisão, só os clien-tes que vão chegando e as conversasdo dia-a-dia quebram a monotoniado trabalho dos quatro padeiros alipresentes. “Esta foi a profissão queescolhi, já experimentei outras masgosto disto. Faço da noite o meu dia”,é assim que o proprietário, AdéritoJordão, retrata o seu gosto pela pro-fissão. Trabalhar à noite já se tornouum hábito, tanto que já só sabe dor-mir de dia, “quando faço os turnos aocontrário é complicado”, remata.

Quanto à rua em que se situa a“Mimosa”, o proprietário do estabe-lecimento não a considera a sua lo-calização perigosa. “Conhecemos amalta quase toda”, esclarece. As si-

tuações de perigo nocturno forampoucas sendo apenas de salientar oepisódio em que “um indivíduo em-briagado entrou e mandou-me comuma garrafa de vidro, exigindo bolosgratuitos”. O perigo torna-se menorcom a passagem frequente da Políciade Segurança Pública (PSP).

Os funcionáriospúblicos da noiteVários são os sítios de Coimbra pa-trulhados todas as noites pelos agen-tes da PSP. Sair da esquadra,percorrer o Pátio da Inquisição, azona da Conchada, Celas, Santo An-tónio dos Olivais, Hospitais da Uni-versidade de Coimbra e Ingote é umdos percursos habituais de um doscarros de patrulha.

A observação é a palavra-chavepara os três agentes que fazem aronda num ritmo lento, vão comen-tando os que passam e revelandopormenores invisíveis às pessoas co-muns. “Coimbra não tem muita cri-minalidade violenta”, relatam osagentes, que preferiram não se iden-tificar. Porém, o trabalho aumenta àsterças e quintas-feiras em que o ba-rulho dos bares da Praça da Repú-blica incomoda os moradores. “APadre António Vieira é uma das maisruidosas da cidade, e os assaltos e adroga estão mais presentes no BairroNorton de Matos”, esclarecem.

Os turnos de trabalho são rotati-vos. Três dias de dia e outros três denoite. “Não compensa trabalhar denoite. A vida social degrada-se e asremunerações não são as melhores”,expõem. Apesar de vigiarem e tenta-rem tornar mais seguras as zonasmais problemáticas da cidade, “nosturnos nocturnos, agentes e meiosescasseiam”, lamentam.

Esta carência é também apontadapelos trabalhadores que recolhem olixo da cidade. Divididos por grupos,percorrem rotas definidas de 70 a 80quilómetros. “Gostamos daquilo quefazemos, e ser o homem do lixo nãonos incomoda, apesar das pessoasnão valorizarem o nosso trabalho”,refere António Pereira, um dos fun-cionários. Pendurados nos camiõesde recolha, vão aperfeiçoando a téc-nica de inserir o contentor no ca-mião. Assim andam até às cinco damanhã, e só “de Inverno é mais com-plicado por causa do frio”, diz LuísFonseca um dos mais antigos fun-cionários. Os estudantes que vãopassando entram nas suas brinca-deiras, todavia são eles que lhes dãomais trabalho. “A rua Padre AntónioVieira é uma vergonha, as pessoastêm os caixotes do lixo e metem ossacos no chão”, conclui António.Menos experiente na noite, RamiroMeco diz que após cinco dias já sehabituou e, ao contrário dos outros,tem medo do que a noite lhe possatirar.

Daniel AlmeidaTiago Carvalho

Sara CoimbraMarta Pedro

Pela madrugada de uma cidade agitada, são muitos os que garantem o bom funcionamentoda noite e a normalidade do dia seguinte. Com tarefas diferentes, são indispensáveis à cidade

TRABALHADORES NOCTURNOS DE COIMBRA

ANDRÉ FERREIRA

O SOSSEGO é uma das vantagens em trabalhar à noite, apontam os trabalhadores

TIAGO CARVALHO

VIRGINIE BASTOS

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PAÍS & MUNDO17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 15

O desemprego... outra vez

s jovens licenciados nãopodem construir umavida, não podem arrendarcasa, não podem pensar

em ter filhos, nem sair de casa! E oGoverno não está a fazer nada”, la-menta, Flor Neves, licenciada emHistória e desempregada. A aversãoao poder não podia ser mais óbviaquando milhares de pessoas, nummovimento colectivo sincronizado,saltaram ao ritmo dos gritos “Equem não salta, é do governo!” A au-xiliar da acção educativa e delegadasindical em Coimbra, ConceiçãoCarvalho, afirma marcar semprepresença nas manifestações, “estouaqui para denunciar este governoresponsável por prejudicar os traba-lhadores. Precisávamos de outro 25de Abril”, afirma, ao som da Grân-dola de Zeca Afonso. António Mar-ques, trabalhador nas minas doconcelho de Nelas, reitera a posição:“a crise e o desemprego são só paraos trabalhadores e os pobres, que osricos ficam cada vez mais ricos e nóspagamos-lhes a factura”.

O desempregonão vai pararO ano de 2009 não se avizinha fácilpara os portugueses. O Instituto Na-cional de Estatística (INE) apresen-tou recentemente uma taxa dedesemprego, de 7,8 por cento, refe-rente ao último trimestre de 2008.Apesar deste valor animador, dado

que em 2007 a taxa de desempregose situava nos 8 pontos percentuais,a tendência tem sido para o seu au-mento gradual. Esta tendência veri-ficou-se a partir do segundotrimestre de 2008, altura em que ataxa ainda se fixava em 7,3 porcento. Segundo os últimos dados doInstituto do Emprego e FormaçãoProfissional (IEFP), o número deinscritos em Centros de Emprego si-tuou-se, em Janeiro de 2009, nos447 966 desempregados. Mais 44,7por cento de inscritos em relação aomês de Dezembro.

Estes números não são apenaspreocupantes para Portugal, a taxade desemprego na zona Euro, queengloba os países que aderiram àmoeda única, subiu 0,1 por centodesde Dezembro do ano passado si-tuando-se assim nos 8,2 por cento,o valor mais alto desde 2006. A pró-pria Espanha que conheceu um forteperíodo de prosperidade, com cres-cimento médio anual de 3,7 porcento, tem actualmente a maior taxade desemprego da União Europeia(UE). Relativamente à taxa de de-semprego juvenil, no contexto euro-peu, Portugal conta com a 12ª maisbaixa, sendo que a média europeia éde 16,6 e a portuguesa 16,1 porcento.

Quem tem maisoportunidades Os jovens "são por norma os primei-

ros a sofrer consequências", afirmao membro da Comissão Executivada Confederação Geral dos Traba-lhadores Portugueses (CGTP), Ar-ménio Carlos. São os jovensrecém-licenciados, faixa etária entreos 15-24 anos, quem mais sofre como desemprego, representando cercade 32 por cento dos desempregadosportugueses, segundo dados do INE.Contudo a formação superior, ainda,garante uma maior taxa de empre-gabilidade nas faixas etárias poste-riores (baixando para 8,3 por centoentre os 25-34 anos).

Uma das apostas levada a cabopelo governo socialista foi o pro-grama Novas Oportunidades. Esteprograma formou mais de 100 miladultos desde Janeiro de 2007 atéDezembro de 2008. Apesar disso,mais do que números interessam,segundo a oposição social-demo-crata, "os resultados concretos des-sas políticas e dessas acçõesinseridas no programa das NovasOportunidades", isto é, se corres-ponde "à propaganda que o Governotem feito desses programas". O diri-gente da CGTP acusa este programade ser ineficaz no "combate aos pro-blemas estruturais que o país en-frenta". O secretário-geral da UniãoGeral dos Trabalhadores, JoãoProença, é mais brando e explica: o"programa Novas Oportunidades sócomeçará a produzir agora im-pacto", afinal, ainda "está numa fase

embrionária e, portanto, o reflexo noemprego será, sobretudo, sentido nofuturo".

As várias facesdo desemprego As medidas encetadas pelo Governopara o combate à crise laboral, di-rectamente relacionada com a criseeconómica mundial, centram-se noreforço do investimento público, in-cluindo a recuperação de escolas, eà actividade económica, incluindo asPequenas e Médias Empresas(PMEs). O deputado social-demo-crata, Arménio Santos, acusa o Go-verno de se ter preocupadotardiamente com as PMEs, acres-centando o facto de este ser um anode eleições: "até aí ignorou, despre-zou sistematicamente as micro, pe-quenas e médias empresas". Em vezdisso, explica o deputado social de-mocrata, "o Governo esteve maispreocupado com a apresentação degrandes projectos e de grandes ope-rações mediáticas". O deputado doPartido Popular, Pedro Mota Soares,acredita que o problema é que o tipode emprego que as grandes obrasgeram é um emprego pouco qualifi-cado, que traz pouca mais-valia". Odeputado sublinha ainda que esteemprego nem sempre é atribuído aportugueses.

O deputado do Partido ComunistaPortuguês, Jorge Machado, cienteda importância do apoio às PMEs

destaca, contudo, que "a medidafundamental nesta altura é a pro-moção do aumento dos salários edas pensões". Numa análise recenteo economista Eugénio Rosa compa-rou a percentagem desempregadoscom e sem subsídio, mostrando quedos 437 mil desempregados apenas59,9 por cento beneficiava de subsí-dio.

Esta complicada realidade é a jus-tificação da grande adesão à mani-festação convocada pela CGTP, naúltima sexta-feira. Jorge Machadoacredita que a resolução destes pro-blemas passa pela "mobilização e naluta dos trabalhadores" e explica:"temos a profunda convicção que opaís não esta condenado à miséria,ao desemprego, à precariedade e aosbaixos salários". Da mesma forma, odeputado do Partido Social Demo-crata evidência que "as pessoas estãona rua porque estão insatisfeitascom os resultados das políticas doGoverno". Uma possível solução pa-rece reservada para depois das elei-ções, como acrescenta, ArménioSantos, "apesar da maioria absoluta"e da "postura aberta" das confedera-ções sindicais o governo socialistanão conseguiu, até agora, solucionaros problemas. Até ao fim do fecho daedição e após solicitarmos as suasdeclarações não obtivemos respostados deputados do Partido Socialista,Osvaldo de Castro e Odete João.

Com Frederico Fernandes

ILUSTRAÇÃO POR TATIANA SIMÕES

O

A manifestação da última sexta-feira é o espelho mais evidente do descontentamento dosportugueses. A situação do desemprego em Portugal assume contornos preocupantes. PorFilipa Magalhães, Rui Miguel Pereira e Joana Tadeu

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PAÍS & MUNDO16 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

O recente assassinatodo presidente daGuiné-Bissau encheuos jornais e despoletoua questão - golpes deEstado ou assassinatosde líderes políticos sãoou não pontos finais nahistória?

Abraham Lincoln, Ghandi, JohnF. Kennedy, Martin Luther King ouBenazir Bhutto são alguns dosexemplos mais conhecidos de per-sonalidades assassinadas ao longoda época contemporânea.

De todos os assassinatos de líde-res políticos conhecidos, qual o maisimportante? O professor de históriacontemporânea na Faculdade de Le-tras da Universidade de Coimbra(FLUC), Vítor Neto, não tem dúvi-das em eleger “o atentado de Sara-jevo cometido contra FranciscoFernando, arquiduque da Áustria-Hungria” como “um dos mais signi-ficativos” e de “consequênciastremendas na zona balcânica e emtodo o mundo. Foi o ponto princi-pal, que está na raiz e na origem daPrimeira Guerra Mundial”.

O também professor de históriacontemporânea da mesma facul-dade, João Paulo Avelãs Nunes, ex-plica que as “mudanças de curtoprazo de natureza factual podem al-terar ligeiramente o modo como ascoisas vão decorrer, mas no essen-cial elas decorrerão da mesma ma-neira”, partilhando, ainda assim, daopinião dos que consideram o aten-tado de Sarajevo “um pretexto ra-zoável para resolver uma série detensões que estavam a ocorrer na

Europa”, levando à Primeira GrandeGuerra.

Mas outros assassinatos são, noentender dos docentes, importantes,no desenvolvimento do curso da his-tória. Avelãs Nunes refere o assassi-nato de Robert Kennedy, irmão dotambém assassinado ex-presidentedos Estados Unidos, John F. Ken-nedy, que “provavelmente teria tidouma presidência ainda mais liberal”do que o seu irmão.

Vítor Neto destaca o assassínio do“campeão da luta pela paz” JeanJaurès, um líder socialista assassi-nado em 1914 cuja morte como quesimbolizou o fim da oposição àguerra de 1914-18.

Nino Vieira eo continente africanoRecentemente, Nino Vieira tornou-se no 17.º chefe de estado africano(47 em todo o planeta) assassinadonos últimos 60 anos. Porque são osafricanos as maiores vítimas deatentados políticos? Sobre NinoVieira e a Guiné-Bissau, Vítor Netoafirma: “a Guiné-Bissau é um paíspobre, com grandes dificuldades dedesenvolvimento, com um atrasoeconómico enorme”. A ausência de“desenvolvimento económico”, de“uma democracia consolidada”, da“corrupção bem patente” e o factode “os guineenses não terem aindaconseguido constituir uma demo-

cracia política” levou à “governaçãoda Guiné-Bissau em termos autori-tários”. Esse autoritarismo de NinoVieira “criou as condições para a re-volta dos militares” contra o próprioque, na altura do atentado, “era jáum homem só e isolado”.

Contudo, estes não são problemasespecíficos do povo guineense, masde todo um continente. AvelãsNunes sublinha a decisiva influên-cia que a colonização teve nos conti-nente ao afirmar que esta “foibastante limitadora para a evolução[africana]”, pois “durante muitotempo [os colonizadores] apostaramna escravatura, trabalho forçado ouna ausência de acesso à escolaridade

como forma de manterem controla-das as populações”. Com isto, acre-dita o docente, “não contribuíramem nada para a sua evolução políticae social, para que se criasse umanação em vez de um somatório detribos”. Também pelo facto de setratarem de “países mais frágeis”,estes são “mais facilmente alvo daintervenção de outras potências”, noplano político-económico. VítorNeto deixa uma advertência: “aquestão dos atentados em África éuma questão de desenvolvimento: oMundo tem de ser mais solidáriocom África”.

Com Sara Coimbra eRui Miguel Pereira

MILITARES GUINEENSES assassinaram o presidente Nino Vieira, em sua casa

A história mundialestá marcada pordiversos assassinatospolíticos. Figuras quecontinuamos a recordarpelo que ainda hojerepresentam

O recurso aos atentados comoforma de fazer política é uma ten-dência que acompanha a históriamundial desde sempre. Em Portugal,o regicídio ocorrido em 1908, no qualo rei D. Carlos I e o príncipe herdeiroforam assassinados, daí resultandodois anos depois a implantação da

República, é um dos exemplo em quese pôde verificar um verdadeiro virarde página na história do país.

Seis anos depois, em 1914, omundo assistiu ao assassinato quedespoletou a Primeira Guerra Mun-dial: a morte do arquiduque Fran-cisco Fernando da Áustria, por partedo extremista Gavrilo Princip.

Em 1948, um ano sobre a inde-pendência da Índia, MahatmaGandhi, célebre líder espiritual e pa-cifista indiano, foi baleado em NovaDeli, por um extremista hindu. Emsua defesa argumentou que Gandhifora o responsável pelo enfraqueci-mento do governo indiano ao insis-tir no pagamento de certas dívidas aoPaquistão.

John Kennedy, presidente dos Es-tados Unidos da América, fora assas-

sinado em Dallas, a 22 de Novembrode 1963.

Retomando ao panorama portu-guês, somos confrontados com amorte do General “Sem Medo”,Humberto Delgado, em 1965, porparte da polícia política portuguesa,PIDE, na fronteira luso-espanhola.

Quem não se lembra do ilustrepastor protestante e um dos mais im-portantes dirigentes do activismopelos direitos humanos? Martin Lut-her King foi assassinado em Memp-his, em 1968. O seu discurso “I havea dream”, proferido em 1963, queainda hoje marca o pensamento pa-cifísta, foi o ponto de partida para setornar a mais jovem personalidade aganhar o Prémio Nobel da Paz, em1964.

Amílcar Cabral e Jonas Savimbi,

chefes dos movimentos revolucioná-rios do PAIGC (Partido Africano paraa Independência da Guiné e CaboVerde) e UNITA (União Nacionalpara a Independência Total de An-gola), respectivamente, inserem-setambém neste contexto dos célebresassassinatos políticos. Amílcar Ca-bral foi assassinado em 1973, em Co-nacri por dois membros guineensesdo seu próprio partido. Por sua vez,Jonas Savimbi foi morto a 22 de Fe-vereiro de 2002 pelas forças arma-das angolanas (FAA). Muitos dosassassinatos ocorrem envoltos emmistério surgem teorias sobre “quemajudou quem”, quais as motivaçõesou se teria sido possível o assassinatosem traição.

Mais recentemente, em 27 de De-zembro de 2007, aconteceu o assas-

sínio da primeira mulher a ocuparum cargo de chefia de governo de umestado islâmico. Referimos-nos, pois,à ex-primeira-ministra do Paquistão,Benazir Bhutto.

João Bernardo Vieira, mais conhe-cido por Nino Vieira foi derrubadodo poder, dia 2 de Março deste ano,após um golpe de Estado. Baleadopor militares, torna-se assim a se-gunda vítima depois de, no dia ante-rior, militares guineenses teremmorto o seu chefe de Estado Maiordas Forças Armadas, Batista TagmeNa Wai.

Mudando ou não o curso da histó-ria, a morte de líderes políticos quepelo carisma ou estatuto deixaram asua marca na história, inspiramainda hoje, muitos deles, movimen-tos em prol das suas causas e ideias.

Uma história construída de assassinatos

Por Sara Coimbrae Rui Miguel Pereira

Bruno Monterroso

África é o continente com maislíderes políticos assassinados

D.R.

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CIÊNCIA & TECNOLOGIA17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 17

O exploratório vaimudar para o ParqueVerde, mas só as escolas o podem visitar

O novo Exploratório do Centro deCiência Viva reabre hoje, 17, para vi-sitas escolares numa fase experimen-tal. Espera-se que cerca de umacentena de alunos visite este espaçopor dia. Apesar de não estar aindacompleta, “a exposição já tem mate-rial suficiente e com bastante coerên-cia para justificar as visitas dasescolas”, refere o director do Explo-ratório, Vítor Gil.

As novas instalações do Explorató-rio, situadas na margem esquerda doParque Verde, vão estar abertas nestaprimeira fase apenas para as escolas,uma vez que já havia marcações paraeste mês desde Outubro de 2008. Ainauguração oficial e a abertura ao

público estão previstas para Abril,mas ainda não há uma data certa,porque, até que isso aconteça, faltamalguns detalhes finais.

Entre as actividades presentes noexploratório destaca-se o novo pla-netário e a exposição dos cinco senti-dos que esteve em digressão porvárias cidades do centro do país e emPorto Moniz (Madeira), e que agorase fixa na margem esquerda do Mon-dego.

Há três roteiros alternativos nonovo espaço. Um que consiste na vi-sita do planetário e dos módulos in-teractivos dentro do edifício, e outrosdois que se centram na exploração doespaço exterior, um de exploraçãolivre e outro orientado por um moni-tor. Há ainda novos conteúdos rela-cionados com o tema “Materiais,Nanopartículas e Saúde” que inte-gram módulos novos e outros que jáexistiam no antigo exploratório.

Está projectada uma segunda fasedo projecto do Exploratório que vaiconsistir no alargamento do espaço

de exposição existente no ParqueVerde. No entanto, é um projecto quevai ser candidato ao Quadro de Refe-rência Estratégico Nacional (QREN)este ano, e, dando-se a sua aprova-ção, será lançado a concurso públicoe iniciada a obra em 2010.

As antigas instalações do Explora-tório na Casa da Cultura puderam servisitadas até Dezembro. Neste mo-mento, o edifício do antigo Explora-tório está a ser desactivado. A parteexterior vai continuar em funciona-mento este ano com as actividadesdas hortas pedagógicas para as esco-las do primeiro ciclo, uma vez que aárea destinada a esta actividade nasnovas instalações ainda não estáapta. Vítor Gil esclarece ainda que oExploratório tem “um acordo com aCâmara Municipal de Coimbra paracontinuar a dar alguma colaboraçãona manutenção do espaço exterior”do antigo exploratório e também para“continuar a exercer a experiênciaque adquirimos naquele espaçodesde o início do projecto”.

Com quase 20 anos deexistência, a secção deastronomia pretendeganhar nova dinâmicacom iniciativas quecomeçam hoje

A Secção de Astronomia, As-trofísica e Astronáutica da Associ-ação Académica de Coimbra(SAC/AAC) vai representar hoje, 17,a Universidade de Coimbra (UC) naI Feira de Ciência e Tecnologia deAlcobaça. Num ano em que a secçãoestá com falta de colaboradores, aastronomia vai sair da cidade dosestudantes para dar mini-sessões deplanetário.

A actual presidente da SAC/AAC,Filipa Ventura, explica que nestemomento a secção “está mais viradasó para a parte de astronomia,porque há falta de elementos”. Asecção costuma promover obser-vações nocturnas, algumas obser-vações do Sol e ainda pequenosateliês com crianças. Nos últimostempos, a actividade mais solicitadatem sido sessões de planetário,“onde se mostra às crianças como sedeve ver o céu se não houvesse luzna cidade”, conta Filipa Ventura,acrescentando que “principalmenteas crianças da cidade vêm poucasestrelas e ensina-se a começar aidentificar o norte, através da es-trela polar e da ursa maior e menore algumas constelações que se vêmmelhor”. “No final, fazemos uma pe-quena sessão a mostrar as conste-lações dos signos, que é o quenormalmente todos preferem”, ref-ere a presidente.

Em Alcobaça, a secção vai dar aconhecer “a importância da as-tronomia”, adianta Filipa Ventura,“explicar o que é que se faz com elano dia-a-dia e para que é que serve”.“Não é só estar a olhar para as es-trelas, porque há muita actividadepor detrás da astronomia que nosdá a conhecer o nosso passado e,quem sabe, o nosso futuro”, de-fende. A iniciativa partiu da câmaralocal e da UC, e destina-se não só aalunos dos vários níveis de ensino,mas também a qualquer pessoa quetenha gosto por astronomia.

A SAC/AAC foi fundada a 9 deMaio de 1989 com o objectivo de di-vulgar a astronomia. Duas décadasdepois, o balanço que Filipa Ven-tura faz é positivo. “A secção já teveanos muito bons e já teve anos emque esteve para fechar. Agora estánuma fase de recuperação outravez”, conta a presidente. Filipa Ven-tura lembra os anos em que aSAC/AAC “foi a Paris ver um eclipsesolar e outras viagens desse género”.Embora actualmente a secção estejanum momento menos bom, “o saldoacaba sempre por ser positivoporque as poucas pessoas que par-ticipam gostam sempre do quefazem e pedem sempre mais activi-dades a nível da astronomia”, ex-plica Filipa Ventura.

Outra pessoa que também passoupela SAC foi Joana Marques, queactualmente está a trabalhar noMuseu da Ciência da UC. Presidenteda SAC no ano lectivo de2002/2003, Joana Marques fala dotempo em que esteve na secção e dizque “foram anos em que aprendimuito em relação à astronomia, foióptimo para a minha formação emtermos de contactos que estabeleci”,realçando a aprendizagem do tra-balho em grupo.

Também Ana Rocha presidiu asecção, mas em 2006/2007. “Foium veículo ao qual aderi parachegar ao público em geral, demodo a conseguir fazer com queeste tomasse gosto pela astronomia,pela ciência e pelo conhecimento”,conta. Na sua altura “havia muitaadesão, tanto da parte dos estu-dantes como das pessoas em geral,às várias actividades”. No entanto,Ana Rocha explica que esta situaçãose foi alterando, porque “as pessoas,a nível social, mudaram um pouco asua mentalidade e perdemos muitada participação”. “Comparo estasituação quase que a uma crise cul-tural que se instalou em Portugal, apar desta crise económica que en-tretanto apareceu também”, adi-anta.

A opinião é partilhada por FilipaVentura que defende que além de“os estudantes normalmente nãoestarem interessados por secçõesculturais”, “a cultura sempre foi umpouco desprezada e o Processo deBolonha veio dar mais uma ajud-inha à desmotivação”.

Já Joana Marques pensa que a as-tronomia é um tema que interessaàs pessoas. “Da experiência que tiveenquanto estive na SAC/AAC, e dotrabalho que faço agora [no Museuda Ciência], que está também de al-guma maneira relacionado com as-tronomia, sei que há um núcleoduro de pessoas que gostam”. “De-pois há pessoas curiosas que apare-cem de vez em quando. Em geral,acho que as pessoas têm curiosi-dade”, acrescenta. Na sua altura,Joana Marques diz que a adesão daspessoas era maior, porque “o grupode trabalho era muito bom e nóséramos muito dinâmicos e fazíamosvárias coisas”. “Acho que isso tam-bém foi importante, porque, de vez

em quando, as pessoas ouviam falarde nós e se as coisas forem muito es-paçadas as pessoas dispersam umbocado”.

Mesmo com falta de elementos, asecção de astronomia vai estar pre-sente no recinto da Queima dasFitas 2009. Filipa Ventura revelaque a secção vai levar telescópios

para o queimódromo, “até cerca dauma da manhã, porque até maistarde é impossível, depois começa achegar muita gente”. Os telescópiosvão estar acessíveis a qualquer pes-soa, mas quem não quiser olhar asestrelas pode sempre participar nosorteio que a SAC/AAC vai fazer eganhar um brinde.

Exploratório reabre no Parque Verde para os mais pequenos

Patricia Gonçalves

Diana Craveiro

D.R.

D.R.

Com os olhos nas estrelas

“HÁ MUITA actividade por detrás da astronomia”, diz Filipa Ventura

O NOVO EXPLORATÓRIO tem um espaço de experimentário para ateliês

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ARTES FEITAS18 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

ara se ter uma pequenanoção do que estamos afalar, convém dizer queWatchmen, o livro da au-

toria de Alan Moore e Dave Gib-bons, data de 1986, e foiconsiderado pela TIME como umdos 100 melhores romances desempre em língua inglesa, sendo oúnico livro “aos quadradinhos” afigurar em tal lista. Posto isto, con-vém acrescentar ainda que a ideiade trazer este ‘graphic novel´ parao para o cinema é quase tão antigaquanto o próprio livro, mas foisendo sucessivamente adiada.Depois de uma lei aprovada porRichard Nixon que proíbe a activi-dade de vigilante nos EUA, aque-les que outrora se encarregaramde combater o crime estão agorareformados, velhos, à procura doseu lugar numa sociedade mo-derna, numa vida solitária apenasacompanhada pelos seus proble-mas e fantasmas antigos. Poroutro lado, estamos no pico da

guerra fria, que só não rebentapelo facto dos EUA terem um úl-timo trunfo: Dr. Manhattan, umabomba nuclear viva – ‘The super-man exists and he’s american’. Dr.Manhattan tem poderes pratica-mente ilimitados, e foi o granderesponsável pela vitória dos EUAno Vietname. Manhattan é o se-guro de vida da América. Masquando o Comediante (outro vigi-lante) é assassinado, os vigilantesreúnem-se para descobrir o queestá a acontecer.Transpor uma obra desta dimen-são para um filme exige alguma gi-nástica, e isso é logo evidente nogenérico onde levamos com um“banho” de história de “guardiões”para nos dar algum backgroundrelativamente às personagens. Deresto, tal como em 300, Zack Sny-der procurou ser fiel o máximopossível ao livro. E, de facto, aúnica coisa que foi alterada subs-tancialmente foi o final, que foi umpouco actualizado, mas que nem

por isso estraga o filme ou destro-çará os fãs. Pelo contrário, criaalgum suspense para quem já co-nhece a obra. Tal como o recente“The Dark Knight” (TDK), Watch-men está a ser vendido como umblockbuster, quando é algo mais.E quem espera acção aos ponta-pés, explosões e afins, vai sair umpouco desiludido. Depois de TDKos filmes de super-heróis são olha-dos com outros olhos, e isso talvezseja uma vantagem para Watch-men, pois trata-se de uma históriacomplexa e com personagens pro-fundas: heróis velhos e decaden-tes, com passados mais ou menosobscuros, com dilemas morais ediscussões quase filosóficas, numfilme que se estende durante2h40, e que no fim ainda nos deixaa pensar. Talvez seja esse o maiordefeito do filme, a informação émuita e com qualidade, mas passaa uma velocidade que nos exige al-guma concentração para conse-guir digerir o que está a acontecer.

Watchmen– Os guardiões

CIN

EM

A

Who Watches theWatchmen?

CRÍTICA DE RAFAEL FERNANDES

DE

ZACK SNYDER

COM

MALIN AKERMAN

BILLY CRUDUP

JACKIE EARLE HALEY

2009

DE

CLINT EASTWOOD

COM

CLINT EASTWOOD

BEE VANG

AHNEY HER

2008

inguém duvida queClint Eastwood éuma figura incon-tornável no pano-

rama cinematográficonorte-americano. O actor de“Dirty Harry” parece actuarcomo o único elo de ligação aocinema de outros tempos. Umahomenagem activa ao que demelhor se fez no outro lado dooceano durante os anos doura-dos de Hollywood. O seu estilo é inconfundível:enquadramentos simples, con-templativos. Uma figura per-feccionista que não descuranenhum pormenor.Não obstante, há algo de inva-riavelmente datado nas suasúltimas obras. “A Troca” já

tinha deixado antever que algose estava a passar. Infeliz-mente a confirmação chegacom “Gran Torino”.“Gran Torino” não é um maufilme. O problema é que tam-bém não passa disso. Apesarde ser uma obra perfeitamenteaceitável não há ali nada deverdadeiramente transcen-dente. A realização mantém aclasse a que Eastwood já noshabituou mas começa a não sersuficiente. Depois de “MillionDollar Baby”, “A Troca” ou“Mystic River”, a fórmula pa-rece estar a ganhar umas irri-tantes teias de aranha.Em linhas gerais temos umareflexão sobre a velhice – esco-lha a que a própria realidade

do realizador não é alheia –onde os valores da sociedade eda família são questionados deuma forma que tem tanto deengenhoso como de caricato.No entanto, as constantes mu-danças de tom – entre o in-trospectivo e a auto-paródia –levam a uma certa inquietação.Como se não conseguíssemosperceber aquilo que devíamosestar a sentir.No final ficamos com a sensa-ção de que o ciclo se fechou. AEastwood dificilmente o volta-remos a ver à frente das câma-ras. Resta-nos esperar quecanalize todas as suas forçaspara a cadeira do realizador.

Entre o modeloclássico e osimplesmentevelho

Gran Torino”

FRANÇOIS FERNANDES

“ P

N

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ARTES FEITAS17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 19

ão se pode dizer do se-gundo álbum oficial dosDeerhunter que tenhasido uma surpresa parti-

cularmente bem guardada. O nomedo disco era conhecido já desde ofinal de 2007, e a primeira data deedição avançada foi o mês de Ja-neiro do ano transacto. Mas as coi-sas não aconteceram exactamentedessa forma...

Depois da estreia oficial em Cryp-tograms, a banda viu-se sob os po-tentes focos do mediatismo. A estaascensão juntaram-se logo acusa-ções de sobrevalorização, como setivessem sido eles mais uns felizescontemplados na eterna lotaria doshypes da imprensa. Em abono daverdade, importa dizer que sim,sem dúvida que o foram. Mas maisimportante do que isso é dizer quemereceram por inteiro o destaque.

A sobre-exposição tem muitas des-vantagens. Convém lembrar que osDeerhunter não tinham à alturamuita rodagem ao vivo. A ascensãofoi demasiado meteórica, e a banda

passou da garagem para os palcos dos mais importantes festivais domundo, com performances que muitas vezes ficavam aquém das ex-pectativas, e com as naturais tensões internas que levaram à saídado guitarrista Colin Mee (com a progressiva radicalização do discursohomossexual de Bradford Cox a ajudar à festa). A notícia da pausa in-definida anunciada no final de 2007 fez temer o pior, mas felizmentenão teve muito mais consequências negativas do que o atraso de 10meses na edição do disco. E a experiência adquirida na estrada aju-dou em tudo ao processo criativo.

Os Deerhunter aparecem aqui quase transfigurados. Aprenderama trabalhar a inocência natural da sua música, que evoluiu clara-mente em termos técnicos, o que permitiu abordar a construção dostemas de forma mais polida e natural. Por isso, temos aqui cançõescom estrutura mais convencional - algumas absolutamente geniais,como Nothing Ever Happened ou Agoraphobia, esta última na voz doguitarrista Lockett Pundt - sem que isso seja um limitação sonora. Ecom tal transfiguração operada, é interessante verificar como a iden-tidade da banda não se perde, apenas se transforma.

O segredo estava mal guardado, convém explicar, porque o disco“pingou” para a Internet no dia 1 de Junho de 2008. Talvez conse-quência da loucura vivida nessa noite no backstage do palco All To-morrow’s Parties, no festival Primavera Sound em Barcelona. Outalvez não, isto sou só eu a atirar para o ar...

Mundo é Tudo o que Acon-tece", de Pedro Paixão, à se-melhança das obrasanteriores, embora não pa-

reça é um romance: como Herberto Hel-der lho confirma num sonho, à porta deuma livraria de verdade.O livro, composto por 95 narrativas fic-cionais curtas, permite a emergência doreal, como uma presença que toma de as-salto a acção. Por isso, o romance, géneroatribuído à obra, é-o enquanto “técnicade simplificação, de engano”, e não palcode histórias simplesmente inventadas.As personagens são quase sempre o “eu”entre outros. São alvos, sem acaso, doencadeamento sucessivo da narrativa fic-cional com a realidade, que se mistura –sob disfarce – na encenação. E nisto, “aojulgar ler a vida imaginada dos outros es-tamos a tentar escapar à nossa”.A arrebatar os textos curtos: a paixão(significante de sofrimento); o prazer(sem regras); as cidades (lugares de pai-xão) intemporais; a relação do homemcom deus e o universo; a filosofia e ospoetas - (referências culturais e erudi-tas). Há sentimentos escondidos do clãHumano, aqui apresentados a nu.Nas histórias, o passado irrecuperável,denso de memórias por salvar. As pala-vras são a forma, feita matéria, para re-cuperar o que se viveu – a ilusão – parase procurar um lugar no mundo onde

“nos sabemos estrangeiros, nem daqui,nem dali”.Neste ponto, podemos recordar a per-gunta inicial do "Fedro" de Platão: “Paraonde vais e donde vens?”. Todos comuma origem, a partir – na verdade,somos muito diferentes e muito pareci-dos. O denominador comum da naturezahumana torna-nos mais próximos da lei-tura, enquanto os “temperos” que nosdistinguem sujeitam-nos à reflexão, pro-vando que – “as palavras unem-nos defi-nitivamente para nos separar”.É através das palavras, construídas emfracções quase imagéticas, que o ro-mance abre espaço, encerrando em si amagia da descoberta, que confere à prosaficcional uma força poética. Isto porquecria outras possibilidades de sentido – onosso.Cada história assenta numa melodia cor-tada ao cabo de frases curtas – uma es-crita simples – perto do tom oralizante, acontar a história.Pedro Paixão, é como os seus heróis “naliteratura não escreveram literatura, masa vida vivida até ao limite – quando per-guntaram a Flaubert [escritor francês]quem era Madame Bovary respondeusou eu”. Assim, na narrativa, enredo denarrativas, encerram-se ciclos infinitos(“alma, abismo, segredo de tudo”) depersonagem que somos nós, que são ele– acto vivido em cena.

stamos no século XIV. An-tonius Block (Max VonSydow), um cavaleiro dascruzadas, e Jöns (Gunnar

Björnstrand), o seu escudeiro, voltamà terra natal, na Suécia, depois de dezanos de luta contra os infiéis. A desola-ção da paisagem é óbvia e não se en-contra ninguém à vista, apenas umafigura, um velho, vestido de preto dospés à cabeça, que se apresenta como aMorte. Recusando o seu destino, Blockpropõe um acordo: um jogo de xadrez.Se ele ganhar pode continuar a viver,mas se a morte conseguir o xeque-mate, é com ela que deve seguir.

É desta maneira que começa “O Sé-timo Selo”, um dos filmes mais reco-nhecidos de Ingmar Bergman. É difícilcontornar a estética minimalista, masao mesmo tempo tão memorável, queo filme nos apresenta, como se Berg-man quisesse contrastar a simplicidadedo mundo físico com a complexidadeque é a alma, ou, se preferirem, a mentehumana.

O jogo com a morte não se faz du-rante uma única sessão, faz-se sim aolongo do percurso que o cavaleiro vaipercorrendo por uma terra que é a dele,mas que agora lhe parece irreconhecí-vel. As questões levantadas por Berg-

man prendem-se, nesta obra, com a féreligiosa. O porquê de Deus ser tão si-lencioso e apático enquanto que amorte é uma certeza e faz questão deser brutalmente visível.

Quanto à edição em DVD, a editoraCastello Lopes traz-nos uma nova ver-são remasterizada, com o bom velhopreto e branco a aparecer aqui em todaa sua glória. Não nos podemos esque-cer que se trata de um flme de 1957 e,pelo que me parece, dificilmente seconsegue uma transferência tão fiel domaster original. Até mesmo a faixaáudio, que é em mono, não dá ares deter perdido nada com o tempo. Em ma-téria de extras temos apenas a habitualbiografia e filmografia do realizador, eo documentário “De Filmstaden a Faro– Três cenas com Ingmar Bergman”,que não é mais do que uma conversa de30 minutos com o realizador acerca doseu percurso profissional. Seria inte-ressante saber mais acerca do filme emsi ou até mesmo da importância queteve na cultura popular. As referênciasà obra aparecem em sítios tão dísparescomo o filme “O Último Grande Herói”,com Arnold Schwarzenegger, ou o vi-deoclip do tema “Re-Tratamento” dabanda de hip-hop, Da Weasel.

OUVIR

DE

PEDRO PAIXÃO

EDITORA

QUETZAL

2008

DE

DEERHUNTER

EDITORA

KRANKY/4AD

2008

Microcastle”

N

EMANUEL BOTELHO

Artigos disponíveis na:

O

O Mundo é Tudo o que Acontece ”

JOSÉ SANTIAGO

FATIMA ALMEIDA

O Sétimo Selo”

VER

Hoje encontrei amorte. Estamos a jogar Xadrez

GUERRA DAS CABRAS

A evitar

Fraco

Podia ser pior

Vale a pena

A Cabra aconselha

A Cabra d’Ouro

LER

O Segredo maismal guardadodo mundo

E

Acto vivido em cena

FILME

DE

INGMAR BERGMAN

EDITORA

CASTELO LOPES

2002

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SOLTAS20 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

m Março de 2002, ACABRA deu destaque àseleições legislativas de17 de Março, apresen-

tando as políticas dos diferentes par-tidos, em matérias direccionadas aosjovens, nomeadamente educação,emprego, sexualidade e toxicode-pêndencia. Segundo A CABRA, estesassuntos estavam a ser relegados eos "principais temas da confrontaçãopolítica têm sido as questões rela-cionadas com a implementação das

farmácias sociais, a reforma fiscal e arealização (ou não) do Euro 2004".

O Partido Socialista pretendia umincentivo às novas tecnologias quedeveriam ser aplicadas na Educação.Este aspecto seria vital para a me-lhoria do sistema educativo comoficou provado aquando da imple-mentação de internet nas escolas dopaís, o que se revelou ser "umavanço fundamental para a educa-ção dos jovens" relembrou o candi-dato a deputado pelo círculoeleitoral conimbricense Pedro Coim-bra.

Por sua vez, o Partido Social De-mocrata pretendia uma reestrutura-ção do Ministério da Educação. Deacordo com Miguel Coleta, este mi-nistério "tem a missão de gerir umnegócio bastante complexo que en-globa todo o ensino, desde a pré-pri-mária até à pós-graduação".Relativamente à sexualidade, tema

considerado como uma "necessidadeabsoluta", defendia-se a criação deuma disciplina específica que seriaum passo em frente para "quebrartabus na sociedade portuguesa".

Já a vontade de "fazer melhor" daCDU prendia-se, em matéria educa-tiva, em abolir os aspectos redutoresdo acesso à educação, como sejam aspropinas e o elevado preço dos ma-nuais escolares. Na questão do em-prego, o então candidato àAssembleia da República pelo PCP,João Oliveira, entendia que "o Es-tado permite que os alunos se for-mem, mas não lhes garante depois,como principal empregador, um tra-balho".

Os candidatos pelo CDS/PP apre-sentavam como proposta para o en-sino superior um modelo de gestãodas universidades. João Almeida,Presidente da Direcção Nacional daJuventude Popular afirmava: "as

propinas não são usa-das para melhorar ascondições, mas parapagar despesas corren-tes". Focando a questãodo aborto, o então can-didato afirmava que opartido era contra adespenalização. "Estaquestão deve ser tra-tada segundo a persec-tiva deresponsabilização doshomens" justificou.

Para o Bloco de Es-querda, a "legalizaçãodas drogas e a distribui-ção de heroína, sobcontrolo médico", se-riam formas de comba-ter atoxicodependência. Na educação,Miguel Reis, dirigente do partido,apelava à "redução de alunos por

turma" e mostrava-se contra a revi-são curricular do ensino secundário.

Vasco Batista

A CABRA sai do arquivo...

18ºANIVERSÁRIO

A MÃO QUEEMBALA OBERÇO”

MARÇO 2002 • EDIÇÃO N.º 76 • QUINZENAL GRATUITO

E

JOÃO LUÍS • TREINADOR DOS SUB-20 DA AAC/RUGBY

Maçã

OS SUB-20

Foi um ano em que as escolas ounão trabalharam bem ou houvemenos captação de atletas e houvedificuldades em manter e fazercrescer o número de atletas paracontinuarmos a crescer comoequipa. A realidade é que a forma-ção não esteve bem , os treinadoresfalharam e não conseguiram trans-mitir uma ideia de continuidade aosjogadores. Chegou a um ponto ondejá não estávamos a formar, antespelo contrário estávamos a defor-mar os atletas, e a tentar habituá-los a uma ideia com a qual nãopactuo que era habituá-los a perder.Não posso pactuar com esse lemade vida nem com essa filosofia. Demaneira que cheguei à direcção edisse: se vocês querem continuartem de haver jogadores ou se conti-nuamos com os doze que estão nãovale a pena, vamos acabar isto por-que assim não dá. Estamos numprocesso de formação: há uns anosatrás a Académica não ganhou nadae como tal não entravam atletaspara o rugby, por sua vez, tivemosdificuldade em ter treinadores dequalidade nos escalões de forma-ção. Enquanto não conseguirmosisso não conseguimos ter atletas.Vamos ver se agora com treinado-res, já com alguma qualidade,vamos conseguir meter mais atle-tas. Pelos menos para já parece quehá muita gente nos sub-14, nos sub-16, no sub-18. Este não é um pro-blema da Académica é umproblema a nível nacional.

Rui Miguel Pereira

ALMOÇO SOCIAL

Frango Assado

A SECÇÃO

DE RUGBY

Neste momento não temos jogado-res que possam fazer parte da selec-ção. Estamos a formar um jogadorpara a selecção nacional, o João Ma-teus, e vamos ver se conseguimos napróxima época levar o Eduardo Sal-gado. Se nós estivéssemos em Lisboaeles facilmente iam à selecção. Nãoestando, implica muito sacrifício. Oshorários de treino em Lisboa sãocompletamente marados, já de pro-pósito para não ir ninguém fora deLisboa à selecção. Só quem é de Lis-boa consegue encaixar no horário.Isto só pode ser contrariado quando aAcadémica voltar à Divisão de Honrae começar a ganhar o campeonato daDivisão de Honra, obrigando a que oleque de escolha de horário seja maisaberto. Neste momento a Académicatem condições para estar na Divisãode Honra, estamos a ficar com umnúmero bom de jogadores no plantel,alguns com muita experiência e ou-tros mais novos, como os sub-20 quesubiram este ano e os que vão subirpara o ano, que vão dar algum ritmo,velocidade e ambição à equipa.Temos um plantel que vai conseguirmanter a Académica na Divisão deHonra. O maior problema que nóstemos é a falta de ambição. Mas nãohá ninguém para os repreender, nãohá castigos, se ganharem está tudobem se perderem está tudo bem namesma. Os atletas de Lisboa temmais ambição de ganhar, trabalhammais. Nós aqui se tentarmos prolon-gar os treinos para lá das nove danoite temos uma série de problemas,isto quando um atleta em Lisboachega a casa à uma da noite.

Canja

RUGBY

EM PORTUGAL

Foi um desenvolvimento pla-neado, conseguido com algum mé-rito mas foi única e exclusivamenteem Lisboa, fora da região de Lisboaé um bocado mais complicado o de-senvolvimento do rugby. Lisboa, aocontrário do resto do país, já conse-guiu desenvolver uma academia derugby a nível sénior e tem outra quevai ser iniciada para as camadas jo-vens. Os objectivos são grandes e asambições são muitas, vamos ver seconseguimos fazer com que o de-senvolvimento alargue ao resto dopaís, mas vai ser um bocado compli-cado. Este desenvolvimento decor-reu dessa forma mais como umaobrigação. O rugby ainda é um des-porto de elite em Portugal e a maiorparte do elitismo que temos está emLisboa, onde está a maior concen-tração populacional. As academiassurgem devido à era da profissiona-lização do rugby, mas também maiscomo uma obrigação da IRB (Inter-nacional Rugby Board). A diferençaé tão grande entre o rugby profissio-nal e amador que a IRB se assustouquando Portugal se conseguiu quali-ficar para o Mundial. Foram Envia-dos para Portugal trêsrepresentantes para coordenaremum projecto de desenvolvimento deacademias obrigando assim o rugbyportuguês a desenvolver-se. Facil-mente Portugal pode ultrapassar aGeórgia e a Rússia, dentro de dois,três anos o objectivo será esse.Penso que Portugal neste momentotem hipóteses de chegar o 10º lugara nível mundial, já o conseguimosem sevens.

RUI MIGUEL PEREIRA

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SOLTAS17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 21

ITÁLIA Durante amissa de domingo, umcasal italiano foi apa-nhado a fazer sexo noconfessionário de umaigreja. De acordo com oadvogado de defesa, ocasal exagerou na bebidae reconheceu que passoudos limites. Os apaixo-nados fizeram as pazescom o bispo da igreja,que rezou uma “missa dereparação” para “purifi-car” a igreja onde foi co-metido o “pecadooriginal”.

ÍNDIA Os moradoressolteiros de uma aldeiano Oeste da Índia estão a

trabalhar sem parar para cons-truir uma estrada de seis quiló-metros que acreditam que vaiaumentar as probabilidades de secasarem. A aldeia de Barwaan éconhecida na região como a “al-deia das pessoas solteiras”. Arazão da construção deve-se aofacto de o local ser muito remotoe de difícil acesso.

EUA Uma mulher de 27 anos te-lefonou três vezes para o númerode emergência, o 911, a queixar-se que a McDonald's não lhe en-tregou os McNuggets que pediu.A polícia chegou ao local e confir-mou que os McNuggets estavamesgotados. Como resultado, a mu-lher teve de comparecer em tri-bunal para lhe ser aplicada umacoima, dado que o uso abusivo do911 é considerado crime.

Daniel Almeida

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COM PERSONALIDADE

Ser músico da voz. Essa fusão seria necessária para uma tradição a que chamamos Fado. Eu não sei o que é isto que canto. É fado-canção. O delinear de vários temas queiriam compor esse álbum. Isso ficou decidido entre quatro pessoas: eu, José Cid, Francisco Ribeiro, dos Madredeus, e a Ana Sofia Cid. Fomos nós que elegemos os 11 temas queestão neste primeiro álbum chamado “ Os Fados do Rock”. Gostámos imenso de o fazer. Este álbum é gravado em analógico. Podem-se ouvir todos os barulhinhos. É gravado ainda em fita. Os mais importantes do mundo começam a procurar novamente esta formade gravação. Há um laço de amizade que nos une. E por isso, um espectáculo ao vivo tem outra força que um álbum não passa. Eu não sou músico de estúdio. Entrego-me quando estou ao vivo. Em estúdiosou uma merda. Espero estar na vida com a música. Não cheguei aqui caído do céu. Comecei no campo lírico, passei pelo étnico, pelo pop, rock, e foi aqui, neste projecto,que me encontrei, entre o lírico e o étnico, numa roupagem acústica. Transmitimos todas essas emoções para o público de uma forma simples e agradável. Espero mais da música portuguesa. Temos grandes poetas, grandes homens e mulheres que escrevem muito bem, dos melhores que o mundo tem. Temos grandes mú-sicos que conseguem fazer grandes arranjos para esses mesmos poemas. A música para mim é o ar que eu respiro. É tudo. José Cid foi um homem que eu encontrei, um grande produtor, um grande músico e intérprete. Não podemos des-corar que José Cid não é o macaco que gosta de bananas. Estamos a falar de um homem que todo ele é musical. Esta capacidade de transpor para o panorama musi-cal todos estes temas que estão imortalizados em todo o Portugal. São temas que vão cantar-se sempre. Este meu primeiro álbum, vou escutá-lo e não vou arrepender-me. A música é uma adrenalina que todos sentem. É a minha droga, o palco. Confesso que me sinto muito melhor na intimidade do que em grandes palcos, porque sintoo afecto muito mais próximo. É assim que eu gosto de estar, sem artefactos, sem nada que amplifique o som. Assim sinto-me bem. Se os portugueses assim o en-tenderem, sim. Eu tenho a música como a minha vida. Não quero ser politicamente nada. Estou na música pela música. Quero ser simplesmente o Zé Perdigão.

O FADO NOUTRA PELE

Entrevista por Sara Oliveira

ZÉ PERDIGÃO • 28 ANOS • MÚSICO

LEANDRO ROLIM

e certeza que os meus carís-simos leitores já se deramconta do calor que por aí

anda (ou pelos menos andava na al-tura em que escrevi estas linhas). E oproblema nem é tanto o calor. O querealmente me chateia é a forma comoa natureza se aliou ao corpo humanopara nos fazer a vida negra. É uma

conspiração ao mais alto nível.Quanto mais próximos estamos do

Verão, mais quentes ficam os dias. Eo que tem a Natureza a dizer sobreisso? Dias maiores que te lixas. Sepelo menos houvesse uma reacção sa-tisfatória do corpo humano. Mas oque é que ele para resolver a situa-ção? Suar. Ora muito obrigado sr.

Corpo. Era mesmo isso que me fal-tava.

Mas o pior nem é isso. O pior é quequando o calor e o sol chegam deforma tão repentina, as pessoas sãoobrigadas a atacar o guarda-roupaem busca de peças de roupa commenor quantidade de tecido possível.Apesar de ainda não estarmos prepa-rados, somos obrigados a mostrar aspartes do corpo que não vêem a luzdo sol há meses. Como os pés, porexemplo. Estão tão brancos quequando calças umas sandálias pelaprimeira vez parece que te enxerta-ram as patas de um urso polar. De-pois de seis meses, a melanina deveestar de ressaca. A sacana para se vin-gar de a teres acordado põe-te ver-melho.

No entanto admito que até sou umafortunado. Para as mulheres a coisaé bem mais complexa. Algumas nãose depilam durante todo o inverno equando sentem os dias mais quentesvão logo correr para a esteticista:

“Então, como vai ser? Com cera?”“Não, com moto-serra”.

Brincadeiras à parte, o Aqueci-mento Global é uma coisa grave. Osestudiosos dizem que durante o sé-culo XXI o nível médio das águas domar vai subir muito. Não tanto comoa taxa de desemprego, mas quase. Seisto continuar assim, no século XXXBadajoz vai ter uma praia do caraças,e nós andaremos a disputar a Ligados Campeões de futebol aquáticocom os Atlantes. (Bem… Desde que

não sejam alemães).Neste momento vocês devem estar

a pensar: “Bah… 2100 está tãolonge… eu nunca vou lá chegar”.Bem… talvez só o Sr. Pintos. Já oestou a imaginar a montar um negó-cio de traçadinho na Atlântida. Sócom gasosa porque as uvas tinhamsecado todas. Ou seja, no fundo nãomudaria muito.

É por estas e por outras que nin-guém quer saber da natureza nem doAquecimento Global nem do quequer que seja. A culpa é dos cientis-tas. Eles não sabem falar ao coraçãoda população. Para mim a soluçãopassaria por revelar as verdadeirasameaças. Aquelas que vão realmenteinfluenciar a vida dos cidadãos. Porexemplo, “em 2100 vai fazer tantocalor que a relva vai desaparecer todae não se vão poder fazer jogos de fu-tebol”. Ou então, “o calor vai ser tantoque a cevada vai deixar de existir e acerveja vai acabar”. Assim sim, jáestou a imaginar a AAC a aderir empeso, com o presidente lavado em lá-grimas.

Resumindo e concluindo: daqui auns anos as temperaturas vão ser tãoaltas que metade da população vaimorrer sufocada, os pólos vão derre-ter e toda a humanidade sucumbirádebaixo de um oceano de morte edestruição. Que tenham uma boa se-mana.

TEM DIAS...

QUANDO O CALOR APERTA

Por Licenciado Arsénio Coelho

D

Todas as crónicas em

arseniocoelho.blogs.sapo.pt

CARICATURA POR GISELA FRANCISCO E ILUSTRAÇÃO POR TATIANA SIMÕES

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OPINIÃO22 | a cabra | 17 de Março de 2009 | Terça-feira

1. As mudanças sociais noensino superior: os mecanismosde acção social são o mais impor-tante garante da equidade na fre-quência no ensino superior. Oapoio do Estado via bolsas, resi-dências, cantinas ou serviços médi-cos tem alvos e objectivosdiferentes mas sempre com a igual-dade de oportunidades como pri-meira aposta. Os números eestatísticas sobre a condição so-cioeconómica dos estudantes doensino superior são esmagadores: étrês vezes mais provável um filho delicenciados estar no ensino superiordo que alguém sem pais licencia-dos. Esta reprodução social é ina-ceitável e está mitigada com apresença do sistema de bolsas a es-tudantes (mais de 20 por cento dosestudantes recebem bolsa). A criseeconómica mundial com reflexosclaros em Portugal vem potenciar oaumento das desigualdades. Parasituações extremas exigem-se me-didas à altura. Assim, tem vindo aser proposta pelas associações aca-démicas e de estudantes medidasque podem ajudar em momentosde crise: a extensão do Passe Esco-lar 4_18 ao ensino superior; a cria-ção de um período suplementar decandidatura a bolsas de estudo,com efeitos retroactivos, para todosaqueles que tenham visto a sua con-dição económica alterada, nomea-damente pelo desemprego dentrodo agregado familiar; a manuten-ção do preço das cantinas oumesmo a sua redução para os valo-res de 2008; o aumento das contri-buições com a educação nadeclaração anual de IRS. As asso-ciações tem sido activas nas pro-postas, exige-se do Estado acçõesclaras e coerentes com a afirmaçãosempre repetida de mais e melhorformação e qualificação nacionalcomo motor de desenvolvimento.

2. A crise como oportuni-dade de mudança: as épocas decrise servem como oportunidadespara mudanças estruturais que sir-vam para melhorar as condições departida. No caso do apoio social háa necessidade de alterar o regimede atribuição de bolsas, abolindo osescalões e passando a ter uma fór-mula de atribuição mais justa e efi-caz. No mesmo sentido, éfundamental que seja implemen-tada a contratualização de bolsas,ou seja, o aluno entregaria os docu-

mentos apenas uma vez sendo abolsa renovada automaticamentecaso nada tivesse sido alterado noagregado familiar. Conseguir-se-iaum aumento de eficácia dos servi-ços de acção social e um início dopagamento das bolsas mais rápido.

3. Qualificação como desafiode futuro: o apoio social e as suasmudanças são importantes pilaresna valorização do ensino superior ena equidade no seu acesso e fre-quência. Contudo, é preciso maispara que o desenvolvimento nacio-nal seja de facto assente no au-mento da qualificação profissional.Diversificação das formações noensino superior que vão ao encon-tro das ambições e necessidadesdos estudantes em idade escolar epara os regressos ao ensino; maisflexibilidade curricular e a verda-deira reforma funcional do Pro-cesso de Bolonha; mais ensinonocturno e pós-laboral que vá aoencontro dos trabalhadores-estu-dantes em especial no segundo ciclode estudos; aposta determinante noensino com recurso às novas tecno-logias. Mais e melhor qualificação éo futuro de Portugal e a aposta certano debelar de longo prazo do nossoatraso estrutural. Isso só se conse-gue fornecendo aos estudantes e àsinstituições os meios financeiros efuncionais que lhes permitam am-bicionar a excelência. À sociedadeexige-se que avalie de forma séria,autónoma e independente o sis-tema de ensino superior como ga-rante que a formação ministrada éde qualidade e que todos os que seinscrevem num curso estão a efec-tuar uma escolha acreditada a nívelnacional.

Em resumo a crise que atravessa-mos exige de todos medidas fortes edestemidas: dos governos acçõesconcretas que avaliem o sofrimentodas famílias; aos estudantes o inte-riorizar de que a sociedade precisadeles como motores do desenvolvi-mento económico e social de Por-tugal. Estes momentos de crisepodem ainda potenciar reformasduradouras que permitam ir maislonge no que era feito até então.Também no Ensino Superior talpode e deve acontecer, haja opçõespolíticas condizentes com a eternapaixão pela educação.

*Estudante da UC e membro do Conselho Nacional da Educação

Cartas ao directorpodem ser

enviadas para

[email protected]

A CRISE, O ENSINO SUPERIOR

E OS ESTUDANTES

João Pita *

O apoio social e assuas mudanças sãoimportantes pilaresna valorização doensino superior e naequidade no seuacesso e frequência

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PEDRO CRISOSTOMO

Page 23: Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 194

OPINIÃO17 de Março de 2009 | Terça-feira | a cabra | 23

Secção de Jornalismo,Associação Académica de Coimbra,Rua Padre António Vieira,3000 - CoimbraTel. 239821554 Fax. 239821554e-mail: [email protected]

EDITORIAL

A MINHA QUEIMA É MELHOR

QUE A TUA

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Rui Lopes *

Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Depósito Legal nº183245/02 Registo ICS nº116759Director João Miranda Editor-Executivo Pedro Crisóstomo Editor-Executivo Multimédia: João Ribeiro Editores: André Ferreira (Fo-tografia), Cláudia Teixeira (Ensino Superior), Sara Oliveira (Cultura), Catarina Domingos (Desporto), Marta Pedro (Cidade), Rui Miguel Pereira(País & Mundo), Diana Craveiro (Ciência & Tecnologia) Secretária de Redacção Sónia Fernandes Paginação Pedro Crisóstomo, Sónia Fer-nandes, Tatiana Simões Redacção Adelaide Batista, Ana Coelho, Andreia Silva, Carolina de Sá, Eunice Oliveira, Filipa Faria, Hugo Anes, JoãoPicanço, Patrícia Gonçalves, Patrícia Neves, Pedro Nunes, Tiago Carvalho, Vanessa Quitério, Vanessa Soares Fotografia Ana Coelho, LeandroRolim, Sara Galamba, Sara São Miguel, Sónia Fernandes, Tiago Carvalho, Virginie Bastos Ilustração Rafael Antunes, Tatiana Simões Colab-oraram nesta edição Bruno Monterroso, Daniel Almeida, Frederico Fernandes, Filipa Magalhães, Joana Tadeu, Maria João Fernandes,Pedro Pinto, Rita Santos, Sara Coimbra, Sara São Miguel, Vasco Batista Colaboradores permanentes Ana Val-do-Rio, Carla Santos, CarloPatrão, Cláudia Morais, Dário Ribeiro, Emanuel Botelho, Fátima Almeida, Fernando Oliveira, François Fernandes, Inês Rodrigues, José AfonsoBiscaia, José Santiago, Milene Santos, Pedro Nunes, Sofia Piçarra, Rafael Fernandes, Rui Craveirinha Publicidade Sónia Fernandes - 239821554;914926850 Impressão FIG - Fotocomposição e Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: [email protected] Tiragem4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de CoimbraAgradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra

Referia o estudante Filipe Pedronuma carta ao director da ediçãopassada do jornal A CABRA que alinha editorial do órgão deveria “re-flectir sobre se a Queima das Fitas éou não um evento que se digne aestar presente na sua versão im-pressa”. Acrescentava o estudanteque não se lembrava “de ver ninguémda Comissão Organizadora daQueima das Fitas entrevistado comotal, excepto no suplemento sobre aQueima das Fitas, pago pela mesma”.E mencionava ainda que contava“pelos dedos das mãos as vezes queA CABRA publicou artigos relativosà Queima das Fitas”.

E a questão que se coloca aqui nãopassa, como o estudante bem referiu,por aludir a uma obrigação editorialdo jornal de publicar matérias alusi-vas à Queima das Fitas unicamentedevido ao contributo financeiro queo lucro da queima representa para assecções.

A questão passa pela desvirtuação

de alguns factos, que uma rápida (efrequente) leitura do jornal poderiasolucionar.

Apesar de todas estas críticasnunca o Jornal Universitário deCoimbra, A CABRA, irá contra alinha editorial que pauta o seu traba-lho e nunca se subjugará a atitudesprepotentes por parte de qualquercomissão organizadora de uma qual-quer festa académica ou de qualqueroutra estrutura da casa. Nunca o Jor-nal Universitário de Coimbra, A

CABRA, aceitará trabalhos por enco-menda. E mais: o Jornal Universitá-rio de Coimbra, A CABRA, não temde se justificar pelo conteúdo dassuas edições. A única fidelidade épara com o leitor, e estamos certos deque o serviço público de informaçãoa que nos propusemos é cumprido.

Mais há a dizer sobre a referidaimportância atribuída pelo jornal àQueima das Fitas. Afinal de contas,acabra.net é o único órgão a possuirum site exclusivo dedicado às Noitesdo Parque, com uma cobertura diá-ria de todo o evento e com pelomenos oito pessoas por noite a tra-balhar para este mesmo projecto.

O trabalho de cobertura daQueima das Fitas não se fica pelo tra-balho realizado nas Noites do Parquee no site informativo acabra.net.Toda a iniciativa é acompanhada aolongo do ano com informações ac-tualizadas.

Não deverão, portanto, as críticasser feitas de forma tão redutora

quando é o trabalho de dezenas desócios e colaboradores da Secção deJornalismo da Associação Académicade Coimbra que é posto em causa.Poderíamos então questionar muitasdas decisões tomadas pela ComissãoOrganizadora da Queima das Fitas,como o tratamento diferenciadodado a um qualquer diário regional ea um órgão de comunicação da casa.Não o faremos, porém.

João Miranda eCláudia Teixeira

A questão passa pela desvirtuaçãode alguns factos, que uma rápida(e frequente) leitura do jornalpoderia solucionar

Na última edição d'A CABRA, no artigo “A remar pela defesa do título”podia ler-se nas palavras do técnico Júlio Amândio que o Futebol Clube doPorto era um dos candidatos para esta época, quando o treinador se refe-ria ao Sport Clube do Porto.

Na mesma edição, encontram-se algumas caixas em branco que, na im-pressão, e por motivos alheios à direcção do jornal, omitiram parte dos tex-tos dos artigos em causa.

A direcção

A CABRA ERROU

Em 1969, os estudantes da Acade-mia de Coimbra reivindicaram “exa-mes para todos…ou exames paraninguém”… ao tempo, a igualdadeera apenas um sonho só possível coma democracia…essa por quem tantoslutaram e por quem tantos sofre-ram…

Estes, esperavam no mínimo, que40 anos depois, esse conceito de de-mocracia, melhor, de Estado de di-reito democrático, consagrasse umasociedade tendencialmente igualita-ria, “tratando como igual o que éigual e como diferente o que é dife-rente” corolário do princípio da igual-dade que tanto e repetidas vezesestudamos ao longo do curso de Di-reito na Faculdade de Direito de U.C.

O regime da avaliação contínua,que entre outros, o Processo de Bolo-nha trouxe para a Universidade deCoimbra e particularmente para a Fa-culdade de Direito, vinha carregadocom a esperança de que a carga edensidade curricular que o curso deDireito exigia possibilitasse mais su-cesso aos alunos da FDUC. Um re-gime onde se avaliasse a assiduidade,a participação, a capacidade de de-senvolver trabalhos de investigação,mini-avaliações, repartição da densi-dade doutrinal etc., etc. Tudo merasexpectativas.

A realidade mostrou-nos que emnada o regime de avaliação contínuanos veio beneficiar…A sua essênciaestá correcta, é certo… é com avalia-ção contínua que devemos ser postosà prova… mas cada estudante e nãoapenas alguns que por mera sorteforam sorteados ou que tiveram maisuma décima ou duas de média nacandidatura ao ensino superior. Oque se passa actualmente na FDUC édiscriminatório, pois é inconcebívelque não se trate de modo diferente oque é manifestamente igual…Comose concebe que na melhor Faculdadede Direito do país se pratique publi-cidade enganosa? Sabia algum dos úl-timos candidatos ao ingresso nanossa faculdade que para além deuma média de entrada esta aindaseria comparada com a dos restantescolocados para efeitos de ingresso noregime de avaliação contínua? E osque já cá estão? Faz sentido entraremnum concurso para obterem a possi-

bilidade de ingressar no referido re-gime?

Se não há condições logísticas, físi-cas e intelectuais, para que na Facul-dade de Direito se possa implementarum verdadeiro regime de avaliaçãocontínua, que chegue a todos, que nostrate de igual forma a todos, entãoque não haja avaliação contínua paraninguém. O argumento de que “umpouco mais de bem é sempre melhor”é, neste específico caso, uma violaçãodo princípio da igualdade, pois paraiguais condições há um tratamentodiferente e não há uma razão coe-rente para que seja assim…Porque éque o Sr. A, que para além de pagar omesmo valor de propinas, que temum aproveitamento académico seme-lhante ao do Sr. B, não consegue teracesso ao regime de avaliação contí-nua? Porque é que o Sr. B, em virtudede um simples sorteio, pode optarentre o regime de avaliação contínuae o regime de avaliação final e o Sr. Asó pode aceder a um dos regimes?

Está na altura dos alunos da Facul-dade de Direito também começarema resolver estes casos práticos…

E os critérios de Avaliação? Têmexistência? São simulados? Dissimu-lados? Objectivos? Subjectivos?

Porque é que dois alunos damesma Faculdade, ao fazerem omesmo exame, tem surpreendente-mente resultados tão distintos? Eporque é que em cada 25 alunos sótrês conseguem ter aproveitamento?E não falemos apenas dos factoressubjectivos que a cada um diz res-peito… isso não é uma responsabili-dade da Faculdade de Direito… masuma mesma resposta pode ser paraum avaliador, totalmente correctamas para outro parcialmente correctaou até mesmo incorrecta… Será sóculpa dos alunos?

O que se passa na Faculdade de Di-reito da Universidade de Coimbra?Porque é que ninguém quer saber?Porque é que já ninguém canta “…hásempre alguém que resiste, …há sem-pre alguém que diz não”?

São muitas as perguntas…mas háuma só resposta… É HORA DEMUDAR!

* Estudante da Faculdadede Direito da UC

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Mais informação disponível em

“Injustiças sociais/Arre porra queé demais!” foi a frase que mais seouviu entre os mais de 200 mil tra-balhadores em Lisboa, segundo aCGTP. O desemprego, a precariedadee as politicas económicas e sociais dogoverno assumiram-se como as basesdo protesto que paralisou a capital.Em época de crise e no ano de todasas eleições é bom que os portuguesesse façam ouvir, e em uníssono soasempre melhor.

M.P.

Hugo ChávezManifestaçãoda CGTP

Minutode Silêncio

O presidente venezuelano ordenouque as Forças Armadas usem a forçacontra os governadores locais que seopõem à lei de transferência do poderde administração dos portos e aero-portos para o governo central. Estasemana proibiu ainda a permanênciada exposição “Bodies Revealed”, querevela o interior do corpo humano.Mais exemplos de intolerância pe-rante os adversários políticos e ideiasque não sejam do seu agrado.

J.R.

O minuto de silêncio em defesa dosdireitos dos imigrantes teve uma par-ticipação bastante fraca, contando-se pelos dedos os presentes. ADG/AAC falhou na sua missão desensibilizar a sociedade civil para osproblemas que afectam as comunida-des imigrantes. Questiona-se se eramesmo necessária esta alternativaaprovada na Assembleia Magna ou sea participação na manifestação deLisboa não seria mais eficaz.

J.R.

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Neste quadro, Hans GeorgSchüssler mostra-nos uma paisa-gem banal; árvores e casas comofundo, um, dois cavalos encosta-dos à berma da estrada. Para estealemão, estudioso das artes grá-ficas e decorativas e actualmentea residir em Portugal, uma boamaneira de observar uma ima-gem pode ser estilhaçá-la e pos-teriormente recolocá-la noutrolocal. A ordem dos estilhaçospassa aí a depender da vontadedo autor, sendo claro que concei-tos como correcto, suposto ou or-deiro podem não fazer parte doimaginário do mesmo.

Afinal, o que é cada um destestrês palavrões? Qanduo aguélmiamgnia, aglo é sputoso? Umacirãçao dvee ter odrem? Umcrrao itenrio é mias pcretpvielque um fgmarantedo, aissmcmoo uma farse dvee etasrgmatclraianetme crroteca praase cmpedorenedr?

Naquele monocromático dia de

sol, nessa rua a subir que é pre-cedida de uma subida aindamaior, nesse amontoado apenasaparentemente ordeiro de pe-dras, cimento e monóxido de car-bono onde se move o sujeitofotográfico, o autor apercebe-sede que, ao avistar o carro, nin-guém daria conta que o mesmoseria composto por fragmentos.A nossa vista passaria por ele derelance, o nosso cérebro esterio-tipá-lo-ia como mais uma das in-finitas coisas normais quecompõem a nossa normalidade,a nossa memória, passado unsinstantes eliminá-lo-ia, muitoprovavelmente para sempre. Ecom isto, tinhamo-nos acabadode cruzar com um carro que, ima-gine-se, não obedece às leis da Fí-sica.

As pinturas de Hans GeorgeSchüssler estão patentes na Gale-ria Minerva, em Coimbra, até 3de Abril.

Por Bruno Monterroso

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