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leitura interpretativa da obra “Umas Férias” Machado de Assis
Dependendo dos olhos que o leem, Machado de Assis - Contista é um pouco de documentarista de época, crítico de costumes, investigador de mistérios do espírito e da existência, e sabe-se lá o que mais ainda irá se inventar - de pleno direito - sobre ele. Toda leitura criativa lhe acrescenta perspectivas; já qualquer leitura que pretenda conferir exclusividade a uma visão específica sobre sua obra reduz perigosamente, e mesmo deturpa, as possibilidades que os contos de Machado oferecem ao leitor.
(http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada)
SUMÁRIO
Introdução ......................................................................................................... 2
Biografia ............................................................................................................ 3
A interioridade psicológica................................................................................. 4
O contato com a morte ...................................................................................... 5
O efeito surpresa ............................................................................................... 7
Machado X Realismo ........................................................................................ 7
Machado X Impressionismo ...............................................................................8
Simbologia......................................................................................................... 9
Personagens .................................................................................................... 10
Tipos de Narrador ............................................................................................ 13
Tipos de espaços e ambientes ......................................................................... 14
Tempo .............................................................................................................. 15
Considerações finais ........................................................................................ 16
Referências ...................................................................................................... 17
Anexo A – Resumo da Obra............................................................................ 18
Anexo B – Imagens ilustrativas ....................................................................... 19
Anexo C – Imagens ilustrativas ....................................................................... 20
INTRODUÇÃO
Este trabalho é uma leitura interpretativa do conto “Umas Férias”, o qual
faz parte do último livro de contos de Machado de Assis, “Relíquias da Casa
Velha” (1906).
A intenção primária deste trabalho é acrescentar novas luzes à leitura da
obra de Machado de Assis, procurando observar a construção literária do
escritor na transição do século XIX para o século XX.
Há ainda nesta análise, uma tentativa de identificar no texto algumas
relações entre os costumes cotidianos da sociedade pertinentes neste período
e no conto em questão, assim como uma análise textual da narrativa.
Para uma melhor compreensão do leitor, encontra-se em anexo neste
trabalho um breve resumo do conto ora analisado.
"Relíquias da Casa Velha" é o segundo livro de contos de Machado de
Assis, publicado em 1906. Foi o primeiro livro que o autor publicou após a
morte da mulher, Carolina.
2
BIOGRAFIA
Joaquim Maria Machado de Assis nasceu a 21junho de 1839, no Morro
do livramento, Rio de Janeiro. Seu pai era brasileiro, mulato e pintor de
paredes; sua mãe era portuguesa da ilha de Açores e lavadeira. Frequentou
por pouco tempo uma escola pública, onde aprendeu as primeiras letras; aos
16 anos já frequentava a tipografia de Paula Brito, onde se publicava a revista
Marmota Fluminense, em cujo número de 21 de janeiro de 1855 sai o poema
“Ela”: era a estreia de Machado de Assis nas letras.
No ano seguinte, começa a trabalhar como aprendiz de tipógrafo, depois
revisor, ao mesmo tempo em que colabora com artigos em vários jornais da
época. Em 12 de novembro de 1869, casa-se com Carolina Xavier de Novais,
portuguesa de boa cultura, irmã do poeta Faustino Xavier de Novais, amigo de
Machado.
Em 1873, é nomeado primeiro oficial da Secretaria de Estado do
Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Como servidor público,
teve uma carreira meteórica que lhe deu tranquilidade financeira; já em 1892
era Diretor-Geral do Ministério da Viação. Em 1897, Machado é eleito
presidente da recém-fundada Academia Brasileira de Letras (também chamada
“Casa de Machado de Assis”), concretizando o velho sonho de reunir a elite
dos escritores da época em um fechado clube literário.
Após a morte de sua esposa, o romancista raramente saía; sua saúde,
extremamente abalada pela epilepsia, por problemas nervosos e por uma
gaguez progressiva, contribuía para o seu isolamento. Morre em 1908, a 29 de
setembro, em sua confortável casa do Cosme Velho.
3
A INTERIORIDADE PSICOLÓGICA
Neste conto, Machado de Assis propõe um olhar sobre a realidade
psicológica de suas personagens de modo inédito nas narrativas nacionais.
Podemos dizer que no texto em questão, existem três partes que
permeiam a história do conto de Machado.
Inicialmente, na primeira parte, e talvez a parte mais explicativa e
importante do conto, Machado transmite a ideia da fantasia de José Martins e
sua irmã Felícia de que eles estariam saindo mais cedo da escola para alguma
festa.
“A minha sensação de prazer foi tal que venceu a de espanto. Tinha dez anos apenas, gostava de folgar, não gostava de aprender. Um chamado de casa, o próprio tio, irmão de meu pai, que chegara na véspera de Guaratiba, era naturalmente alguma festa, passeio, qualquer cousa.(...). Ele não me dizia nada, eu não me atrevia a nenhuma pergunta. (...) A minha alegria agora era maior. Certamente havia festa em casa, pois que íamos os dois, ela e eu; íamos na frente, trocando as nossas perguntas e conjeturas. Talvez anos de tio Zeca. Voltei a cara para ele; vinha com os olhos no chão, provavelmente para não cair.(Assis, 1839-1908)
Neste trecho, Machado inicia surpreendendo o leitor, pois deixa claro
que o conto será narrado a partir do olhar do menino, algo incomum para a
literatura do século XIX. Ele, de certa forma, mostra no decorrer do conto, a
entrada das crianças no mundo dos adultos, e isso para a época era
considerado uma ousadia.
A narrativa de Machado mostra uma espécie de diferença entre o mundo
da infância e o mundo adulto, em relação ao comportamento do tio em direção
a casa e os pensamentos dos irmãos. Neste momento do trajeto entre a escola
e a casa dos irmãos, Machado permite, através da narrativa, que o mesmo
trajeto seja vivido de ângulos totalmente diferentes, mostrando a subjetividade
do mundo adulto e infantil, ou seja, a realidade e a fantasia.
Essa interioridade psicológica antecipa certos procedimentos narrativos
que serão retomados apenas por autores do século XX, o que torna Machado
de Assis um percussor de estratégias de exploração da psicologia humana que
definem a literatura modernista.
4
O CONTATO COM A MORTE
A segunda parte, e não menos importante do que a primeira, situa o leitor na história, causando uma contradição referente às expectativas do menino.
‘’Não se tratava de um dia santo, com a sua folga e recreio, não era festa, não eram as horas breves ou longas, para a gente desfiar em casa, arredada dos castigos da escola. Que essa queda de um sonho tão bonito fizesse crescer a minha dor de filho não é cousa que possa afirmar ou negar; melhor é calar. O pai ali estava defunto, sem pulos, nem danças, nem risadas, nem bandas de música, cousas todas também defuntas. Se me houvessem dito à saída da escola por que é que me iam lá buscar, é claro que a alegria não houvera penetrado o coração, donde era agora expelida a punhadas.’’ (Assis, 1839-1908)
O trecho mostra a hora em que José Martins se depara com a triste
situação de seu pai morto, então ele começa a perceber que preferiria não ter
saído da escola, e nem ficaria alegre se soubesse o verdadeiro motivo de sua
saída.
"A intriga completa consiste na passagem de um equilíbrio a outro. A narrativa ideal, a meu ver, começa por uma situação estável que será perturbada por alguma força, resultando num desequilíbrio. Aí entra em ação outra força, inversa, restabelecendo o equilíbrio; sendo este equilíbrio parecido com o primeiro, mas nunca idêntico." (Gom Jabbar, http://www.recantodasletras.com.br).
Este primeiro contato do menino com a morte evidencia a realidade que
todos vão se deparar algum dia, O texto, embora escrito há mais de cem anos,
levanta uma questão ainda de grande relevância nos dias de hoje, como se
observa neste trecho de matéria assinada por Rosely Sayão:
“ [...] Temos feito de tudo para retirar a morte de cena, principalmente para as crianças; fazemos de conta que morrer não é nosso destino.” (Folha de S. Paulo, 15 de março de 2007)
Ao abordar a dificuldade de diálogo entre adultos e crianças, Machado
ainda tece críticas e alusões ao ambiente escolar, relações familiares, teatro e
à própria sociedade, mantendo o conto relevante e contemporâneo.
5
No terceiro e ultimo trecho em questão, revela José Martins voltando à
escola e recuperando a sua alegria.
“A missa do sétimo dia restituiu-me à rua; no sábado não fui a
escola, fui à casa de meu padrinho, onde pude falar um pouco
mais, e no domingo estive à porta da loja. Não era alegria
completa. A total alegria foi segunda-feira, na escola. Entrei
vestido de preto, fui mirado com curiosidade, mas tão outro ao pé
dos meus condiscípulos, que me esqueceram as férias sem
gosto, e achei uma grande alegria sem férias.’’ (Assis, 1839-1908)
A partir deste momento ele tenta esquecer as suas “tristes férias”. Neste
trecho, Machado explica praticamente toda a situação do conto e até mesmo o
título deste.
Em outras palavras: no geral o conto "se apresenta" com "uma ordem". O conflito traz uma "desordem" e a solução desse conflito (favorável ou não) faz retornar à "ordem" – agora com ganhos e perdas, portanto essa ordem difere da primeira. "O conto é um problema e uma solução", diz Enrique Anderson Imbert.( http://pt.wikipedia.org/wiki/Conto)
6
O EFEITO SURPRESA
Machado constrói no conto as partes enigmáticas, fazendo com que o
leitor se espante ao final para produzir o giro das ideias, ou seja, ninguém
espera o que vai acontecer, nada é previsível.
O final enigmático prevaleceu até Maupassant (fim do século XIX) e era muito importante, pois trazia o desenlace surpreendente (o fechamento com "chave de ouro", como se dizia). (...) não há como negar que o final no conto é sempre mais carregado de tensão do que no romance ou na novela e que um bom final é fundamental no gênero. "Eu diria que o que opera no conto desde o começo é a noção de fim. Tudo chama, tudo convoca a um "final" (http://pt.wikipedia.org/wiki/Conto)
Desta maneira, Machado de Assis interage com o leitor provocando um
efeito surpresa surpreendente.
Mas a ironia maior de Machado é nos incluir neste seu mundo de profundas convulsões interiores que aparecem timidamente na calma superfície que, convencionalmente, nos parece ser a vida. Os silêncios são terríveis: as histórias escondem um segredo qualquer, uma palavra ou gesto que é impossível precisar qual seja, mas que sabemos, quebraria o encanto, espatifaria o espelho das convenções e poria os personagens. (Assis, 1839-1908)
MACHADO X REALISMO
Machado é um autor realista, ele pertence a essa escola surgida no
século XIX – uma reação ao Romantismo, que privilegiava a Razão, a
Realidade (social ou psicológica).
Nesta perspectiva, o texto de Machado relata os acontecimentos de
forma simples e direta seguindo as características do Realismo, não expondo
os fatos. Ele usa a forma de falar simples e direta sem explicar o porquê ou
expor os fatos, como podemos observar nestes três trechos seguintes (Assis,
1839-1908):
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“_O seu pai morreu”
“_Foi à semana mais triste da minha vida”
“_Ele havia saído mais cedo da escola para ir pra casa”
Machado de Assis X Impressionismo
Muito se falou sobre a prosa impressionista de Machado de Assis, talvez
seja um exagero considerá-lo a partir das características do movimento que
aconteceu na pintura metade do século XIX, mas encontramos
posicionamentos semelhantes na escrita de Machado Assis.
Segundo o pintor brasileiro Angelo Guido, o impressionismo, embora
visto sempre como um movimento revolucionário na pintura moderna, “não é
uma nova escola, mas a expressão de um novo modo de ver”, dentro do qual
cada artista encontra a sua própria modalidade expressiva (GUIDO, 1968,
p110-125). É a partir desta visão que encontramos afinidades entre a pintura
impressionista e a escrita machadiana.
Machado de Assis era um escritor do período do Realismo, mas era
contra a objetividade fria e fixa do mesmo, ele defendia a subjetividade
baseado na sensação, também era contra aos excessos do Romantismo.
Machado escrevia de uma maneira especial, pois se recusava a “pinturar” os
pormenores objetivos das coisas, como queriam os realistas. Principalmente
em seus contos, mantinha-se fiel ao seu motivo, renunciando aos pormenores.
No conto percebemos que o autor não entra em detalhes sobre a causa
da morte do pai de José Martins, ele apenas nos revela que o pai morreu e
ponto, não há nenhuma descrição de como era a convivência do protagonista
com o pai, nem o motivo que o levou a falecer.
Outra característica que reconhecemos na obra de Machado de Assis e
o Impressionismo, são os contos fragmentados que são próprios do
impressionismo, já que o artista, o pintor e o escritor não conseguem
representar um todo e sim em partes.
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“Pois afinal, que artista, pintor ou escritor, pode representar toda a natureza? Um artista não a pode representar senão em fragmentos”. (VENTURINI, 1972, p.141-164).
O que mais aproxima Machado de Assis do ideal impressionista,
segundo Guido, é que ele se tenha igualmente permitido fazer escolha do
processo da sua escrita, ele não quis, aplicar nenhuma regra pré- estabelecida,
nem pregar nenhum ideal, moral ou qualquer outro. Machado preferiu
conservar-se fiel, não à uma escola, mas à sua escolha, escudado no seu
motivo para realizar o seu projeto de criação artística.
SIMBOLOGIA
No conto de Machado, através da simbologia, podemos encontrar o
relato de alguns costumes do século XIX.
Quando José se encontra com Zeca, ele beija a mão do tio, como um
gesto de respeito:
“Corri a buscar o chapéu, meti o livro de leitura no bolso e desci as escadas da escola, um sobradinho da Rua do Senado. No corredor beijei a mão a tioZeca.” (Assis, 1839-1908)
Quando chegam na casa, os irmãos encontram o pai morto e a mãe de
José os obriga, à ele e Felícia, a beijarem a mão do pai:
“(...) naquele momento não perguntei nada a mim nem a ninguém. Ouvi as palavras de minha mãe, se repetiam em mim, e os seus soluços que eram grandes. Ela pegou em nós e arrastou-nos para a cama, onde jazia o cadáver do marido; e fez-nos beijar-lhe a mão. (Assis, 1839-1908)
Podemos entender que esses gestos de respeito, relatado no conto de
Machado, devem-se a estrutura da família patriarcal do século XIX, família
essa que imperou no Brasil desde a chegada dos primeiros portugueses no
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século XVI até os meados do século XIX onde o pai era representado como
autoridade na família e esse beijo era demonstração de amor, de respeito, uma
espécie de “terror/amor”, que, ao mesmo tempo, lembrava ao filho a distância a
ser mantida entre ele e o patriarca.
Ainda tratando da simbologia, encontra-se no texto em questão, um
trecho em que tio Zeca encontra-se com um homem desconhecido e combina
algo com este em um horário determinado:
“_ Nove hora? Lá estarei, disse ele. -- Vamos, disse-nos tio Zeca.” (Assis, 1839-1908)
Machado de Assis pode ter utilizado o horário das “nove horas” para
representar a expressão que surgiu nessa época para designar alguém que
ditava regras de conduta e restringia as alegrias dos outros, complicando as
coisas mais simples, pois “nove horas” era a hora clássica do século XIX, que
regulava o final das visitas e ditava o momento das despedidas.
A combinação das nove horas era a do enterro, no dia seguinte, o que
no momento não foi revelado aos irmãos.
Personagens
Protagonista:
José Martins é o protagonista nesta narrativa, além de ser também o
narrador. No decorrer da narrativa, classificaremos como um personagem
redondo, já que muda o seu comportamento, evolui ao longo da mesma.
No inicio do conto, o menino José Martins ficou muito feliz ao ter que
deixar a escola com seu tio Zeca. Não gostava de estudar, o que mais queria
era folgar, para poder brincar, mas quando teve que tirar umas férias forçadas,
pela morte de seu pai e foi obrigado pela sua mãe a ficar recluso dentro de
casa por oito dias, sentiu saudade do colégio. Mas esta saudade não era
relacionada aos estudos, mas sim com as brincadeiras, depois de passar todos
esses dias em casa, o que mais almejava era voltar à escola.
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Percebemos a evolução do personagem no desfecho do conto, quando
há uma mudança de atitudes do menino em relação a seus pensamentos. José
Martins achava a escola uma prisão e que sua casa representava a sua
liberdade, mas diante da dureza e da crueldade da vida, o menino passou a ver
com outros olhos os dois ambientes. A escola agora significava a liberdade e a
casa sua prisão, por isso estava tão feliz em não estar de férias.
“(...) no domingo estive à porta da loja. Não era alegria completa. A total alegria foi segunda-feira, na escola. Entrei vestido de preto, fui mirado com curiosidade, mas tão outro ao pé dos meus condiscípulos, que me esqueceram as férias sem gosto, e achei uma grande alegria sem férias”. (Assis, 1839-1908)
Antagonista:
O grande vilão, o antagonista nessa narrativa, é a morte do pai de José
Martins, o menino ficou muito feliz ao ser retirado da escola, mas quando
descobriu o real motivo, mudou o seu modo de ver as coisas. No trajeto da
escola para casa imaginou mil coisas boas, como festas, teatros, aniversário do
tio para a sua saída antecipada da escola, mas a sentiu-se mal ao chegar a
casa e descobriu que enquanto estava feliz, seu pai estava morto.
“Naquele momento não perguntei nada a mim nem a ninguém”. Ouvi os soluços que eram grandes. Ela pegou em nós e arrastou-nos para a cama, onde jazia o cadáver do marido; fez-nos beijar a mão. Tão longe estava eu daquilo que, apesar de tudo, não entendera nada a princípio; (Assis, 1839-1908) (...) Não se tratava de um dia santo, com a sua folga e recreio, não era festa, não eram as horas breves ou longas, para a desfiar em casa, arredadas dos castigos da escola”. (Assis, 1839-1908)
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Secundários:
No conto temos alguns personagens secundários, mas que exerceram
papéis fundamentais na história como:
Tio Zeca, irmão do pai de José Martins, roceiro, morador de Guaratiba, o
responsável por retirar José Martins e sua irmã da escola e os levar para casa.
“(...) Ele não dizia nada, eu não me atrevia a nenhuma pergunta. Pouco depois chegávamos ao colégio de minha irmã Felícia; disse-me que esperasse, entrou , subiu, desceram, e fomos os três caminho de casa”. (Assis, 1839-1908)
Felícia, irmã de José Martins, é no dialogo dos irmãos à caminho de
casa, que se desenrola a narrativa, na tentativa de descobrir a saída repentina
da escola.
“(...) Felícia a quem comuniquei a possibilidade do espetáculo, não me pareceu gostar muito, mas também não recusou nada. Iria ao teatro. E quem sabe se não seria em casa, teatrinho de bonecos? Íamos nessas conjeturas, quando tio Zeca nos disse que esperássemos; tinha parado a conversar com um sujeito”. (Assis, 1839-1908)
A mãe de José e Felícia, no conto não é mencionada pelo seu nome,
mas é ela quem dá a notícia aos filhos da morte do pai. A mesma que deixa
José e Felícia reclusos em casa por oito dias.
“- Meus filhos, vosso pai morreu!” (Assis,
1839-1908)
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Tipo de narrador
Narrador Autodiegético: o narrador participa da ação como
personagem principal, discurso na primeira pessoa.
“A minha sensação de prazer foi tal que venceu a de espanto. Tinha dez anos apenas, gostava de folgar, não gostava de aprender”. (Assis, 1839-1908)
Narrador Personagem: conta a história através de uma perspectiva de
dentro da história, participa do enredo sendo um dos personagens, usando a
primeira pessoa para contar a história.
... “Todos ficaram esperando o que vinha
dizer o homem, eu mais que ninguém,
porque ele era meu tio, roceiro, morador em
Guaratiba. Chamava-se tio Zeca”. (Assis,
1839-1908)
Dentro do narrador personagem podemos classificá-lo em:
Narrador Personagem Protagonista: este narrador é a personagem
principal da história, narrando-a de um ponto de vista fixo: o seu. O narrador
protagonista não tem acesso ao estado mental das demais personagens, não
sabe o que pensam os outros personagens, apenas narra os acontecimentos
como os lembra.
“(...) Certamente havia festa em casa, pois
que íamos os dois, ela e eu; íamos à frente, trocando as nossas perguntas e conjeturas. Talvez anos de tio Zeca”. (Assis, 1839-1908)
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Tipos de espaços ou ambientes
Espaço físico: trata-se do espaço onde as personagens se
movimentam e onde ocorrem os acontecimentos, podem ser geográfico,
exterior e interior.
Geográfico: a única referência geográfica que temos no conto é a
cidade de Guaratiba, cidade interiorana fluminense.
“Um chamado de casa, o próprio tio, irmão
de meu pai, que chegara na véspera de Guaratiba, era naturalmente alguma festa, passeio, qualquer coisa”. (Assis, 1839-1908)
Exterior: Trajeto da escola a casa.
“ Na rua fui andando ao pé dele, amiudando os passos, e levantando a cara. Ele não dizia nada, eu não me atrevia a nenhuma pergunta”. (Assis, 1839-1908)
Interior: A sala de aula de José Martins, onde seu tio aparece para
buscá-lo.
“Houve um movimento geral de cabeças na direção da porta do corredor, por onde devia entrar a pessoa desconhecida. Éramos não sei quanto quantos meninos na escola” (Assis, 1839-1908)
Interior da casa de José Martins, onde encontra sua mãe aos prantos.
“ Dentro, ao pé da cama, estava minha mãe com a cabeça entre as mãos. Sabendo da nossa chegada, ergueu-se de salto, veio abraçar-nos entre lágrimas [...]”(Assis, 1839-1908)
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Podemos notar no conto que havia dois espaços principais no conto:
Espaço público: o trajeto serviu pra as conjeturas e dúvidas das
personagens, foi o espaço onde eles cogitavam as possíveis razões da
saída mais cedo da escola.
Espaço privado: o local das descobertas e realizações. É em casa que
José descobre o real motivo de sua saída repentina da escola.
Espaço psicológico: corresponde às vivências íntimas, pensamentos,
sonhos, memórias, reflexões... das personagens. Enquanto José Martins e sua
irmã Felícia tentam descobrir qual o motivo que os levou a saírem mais cedo
da escola, surge a ideia que eles iriam ao teatro, e José relembra que uma vez
fora e voltara dormindo, adorando o espetáculo, apesar de não ter entendido
nada.
“(...)Tinha ido uma vez ao teatro, e voltei dormindo, mas no dia seguinte estava tão contente que morria por lá tornar, posto não houvesse entendido nada do que ouvira”. (Assis, 1839-1908)
Tempo
O intervalo de tempo em que o(s) fato(s) ocorre(m). Pode ser um tempo
cronológico ou psicológico.
Tempo cronológico: é o tempo fictício que transcorre na ordem natural
dos fatos do enredo, isto é, do começo para o final. Está, portanto, ligado ao
enredo linear (que não altera a ordem em que os fatos ocorreram). Quando no
enterro um amigo perguntou que dia voltaria à escola, minha mãe respondeu:
“Sábado, meu filho, disse a minha mãe, quando lhe repeti a pergunta imaginada; a missa é sexta-feira. Talvez seja melhor voltar na segunda”. (Assis, 1839-1908)
Tempo psicológico: onde você sabe que existe um intervalo em que as
ações ocorreram, mas não se consegue distingui-lo. Não sabemos ao certo
quando essa história foi contada, já que é um adulto nos relatando uma
passagem da sua vida, quando ainda era criança.
“Se me houvessem dito à saída da escola
por que é que me iam lá buscar, é claro que
a alegria não houvera penetrado o coração,
donde era agora expelida a punhadas”.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A primeira conclusão a que chegamos é que a obra de Machado de
Assis suscita diferentes leituras. No conto em questão, Machado traz a
sinceridade dos sentimentos vividos pelos dois irmãos, em especial o primeiro
contato de um menino com a morte.
A visão objetiva e pessimista da vida, do mundo e das pessoas,
característica machadiana, mistura-se neste conto com a subjetividade infantil,
através de uma análise psicológica profunda das contradições humanas na
criação de personagens imprevisíveis, jogando com insinuações em que se
misturam a ingenuidade e a malícia, a sinceridade e a hipocrisia.
Machado faz ainda uma crítica irônica das relações entre as pessoas e
dos padrões de comportamento utilizando uma linguagem com estilo conciso,
sentenças curtas e o equilibrada com o conteúdo.
O conto envolve o leitor pela oralidade da linguagem, pelas surpresas
apresentadas e pelas “conversas” que o narrador estabelece frequentemente
com o leitor, transformando em cúmplice e participante do enredo
(metalinguagem).
O uso da ironia revela a solidão e a infelicidade dos personagens de
forma implícita no conto, através da composição que Machado faz com cuidado
e delicadeza. Ele utiliza desses recursos para nos propor um contato com a
infelicidade real e crua da vida social humana, sendo tal felicidade, nas linhas
de Machado, geral, social e organizada.
16
REFERÊNCIAS
AGUIAR, F. Murmúrios no espelho. In: ASSIS, Machado de. Contos. São
Paulo: Ática, 1976.
Assis, Relíquias de Casa Velha Machado de, 1839-1908.
ASSIS, Machado de. Obras Completas. Volume 2. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 1962.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u448178.shtml
http://3ddomaga.blogspot.com/.../resumo-e-trechos-realistas-no-conto.html
http://bibliotecamagalhaes.blogspot.com/.../machado-de-assis-reliquias-da-c...
http://www.editoradcl.com.br/Produto/195/umas-ferias
http://literatura.moderna.com.br/catalogo/encartes/85-16-03969-2.pdf
http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/.../000666841.pdf?...1
[PDF] O MODO DE NARRAR DO CONTO MACHADIANO - SEER
UFRGSseer.ufrgs.br/organon/article/download/28692/17375
http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/2855412
http://pt.wikipedia.org/wiki/Conto
17
ANEXO A
RESUMO DA OBRA
UMAS FÉRIAS
O conto inicia-se em uma escola aonde um homem chamado Zeca, tio
dos irmãos José Martins e felícia, chega e pede para falar com o professor da
sala de aula.
Após a conversa com o professor, o mesmo chama por seu aluno José e
o manda sair na companhia de seu tio Zeca. Os dois caminham até a escola de
Felícia para também buscá-la. Os três caminham curiosos em direção a casa
dos irmãos, e tanto José quanto Felícia, estavam pensativos sobre o que
estava acontecendo e o que havia de acontecer, tentando compreender o
motivo que os tinham retirado da escola mais cedo.
José estava muito feliz por ter saído da escola, pois não gostava de
estudar, ele imaginava que ao chegar em casa poderiam ser surpreendidos
com uma grande festa, ou algo do tipo, para festejarem. Os irmãos percebem o
comportamento estranho de Zeca, que parece estar triste e apreensivo,
principalmente ao falar com as pessoas que encontram pelo caminho.
Ao chegar em casa, os irmãos se deparam com uma triste surpresa, o
velório do próprio pai, que acaba de morrer.
A semana que se sucede passa a ser a semana mais triste da vida
deles, tanto que José não via a hora de voltar à escola. Os dois tentam passar
o tempo de qualquer maneira e ficam ansiosos para voltarem à escola.
Na segunda-feira, eles retornam à escola e esquecem todos os
problemas. Foi também a volta da alegria, eles esqueceram as férias sem
gosto, e ficaram com grande alegria sem férias. E voltam a sorrir.
18
ANEXO B
IMAGENS
Machado e sua esposa Carolina
Relíquias de Casa velha – 1906
19
Casa do Cosme Velho, 18
Nesta residência, Machado de Assis e Carolina
viveram grande parte da vida.
Machado de Assis e a Academia Brasileira de Letras
20