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1 LÍNGUA ESPANHOLA E A IMPORTÂNCIA DE SEU ENSINO: UMA REFLEXÃO CALCADA NOS PCNs E NA LEI 11.161 Salete Marli Carvalho da Cruz 1 Resumo Este trabalho tem como objetivo refletir acerca da necessidade e relevância do ensino do idioma espanhol no sistema educativo brasileiro, e refletir ainda em que medida os documentos que regem a educação brasileira, mais especificamente, os que tangem o ensino de línguas estrangeiras (LE) como os PCNs e a lei 11.161, que torna obrigatória a oferta da Língua Espanhola no ensino regular, contribuem para a aquisição desse conhecimento que não se restringe às regras gramaticais e ortográficas, mas que contribuem para a formação individual, cultural e profissional dos sujeitos. Para isso, será apresentado breve recorte histórico do idioma espanhol como maneira de auxiliar na compreensão de como se tornou um dos idiomas mais influentes mundialmente, perpassando pelas leis que inicialmente determinavam o ensino de línguas estrangeiras no ensino nacional para, por fim, apresentar as conclusões e as reflexões acerca da análise dos PCNs e da lei 11.161. Palavras chaves: Língua Espanhola; Ensino; Língua estrangeira; 1-INTRODUÇÃO Este trabalho tem como objetivo refletir acerca da necessidade e relevância do ensino do idioma espanhol no sistema educativo brasileiro, e refletir ainda em que medida os documentos que regem a educação brasileira, mais especificamente, os que tangem o ensino de línguas estrangeiras (LE) como os PCN e a Lei 11.161, que torna obrigatória a oferta da Língua Espanhola no ensino regular, contribuem para a aquisição desse conhecimento que não se restringe às regras gramaticais e ortográficas, mas que contribuem para a formação individual, cultural e profissional dos sujeitos. Para isso, será realizada análise dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN 1996, 2001) enquanto determinantes para o ensino de uma ou mais línguas estrangeiras (LE) nas instituições regulares de ensino bem como da lei 11.161. Ao considerar que vivemos a era das inovações tecnológicas que exige que as pessoas estejam atualizadas para acompanharem as transformações econômicas, sociais e comportamentais decorrentes de se viver em um mundo globalizado, conhecer outros idiomas e outras culturas possibilita o entendimento, o diálogo e a comunicação entre diferentes nações, além de contribuir 1 Graduada em Letras Português Espanhol Licenciatura pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) Campus Cerro Largo RS. Pós-Graduanda em Metodologias da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica pela Universidade do Norte do Paraná (UNOPAR). Polo São Luiz Gonzaga RS.

LÍNGUA ESPANHOLA E A IMPORTÂNCIA DE SEU ENSINO: …omicult.org/emicult/anais/wp-content/uploads/2016/11/LÍNGUA... · Para isso, será realizada análise dos Parâmetros Curriculares

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LÍNGUA ESPANHOLA E A IMPORTÂNCIA DE SEU ENSINO: UMA REFLEXÃO

CALCADA NOS PCNs E NA LEI 11.161

Salete Marli Carvalho da Cruz1

Resumo

Este trabalho tem como objetivo refletir acerca da necessidade e relevância do ensino do idioma

espanhol no sistema educativo brasileiro, e refletir ainda em que medida os documentos que regem

a educação brasileira, mais especificamente, os que tangem o ensino de línguas estrangeiras (LE)

como os PCNs e a lei 11.161, que torna obrigatória a oferta da Língua Espanhola no ensino regular,

contribuem para a aquisição desse conhecimento que não se restringe às regras gramaticais e

ortográficas, mas que contribuem para a formação individual, cultural e profissional dos sujeitos.

Para isso, será apresentado breve recorte histórico do idioma espanhol como maneira de auxiliar na

compreensão de como se tornou um dos idiomas mais influentes mundialmente, perpassando pelas

leis que inicialmente determinavam o ensino de línguas estrangeiras no ensino nacional para, por

fim, apresentar as conclusões e as reflexões acerca da análise dos PCNs e da lei 11.161.

Palavras chaves: Língua Espanhola; Ensino; Língua estrangeira;

1-INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo refletir acerca da necessidade e relevância do ensino do

idioma espanhol no sistema educativo brasileiro, e refletir ainda em que medida os documentos que

regem a educação brasileira, mais especificamente, os que tangem o ensino de línguas estrangeiras

(LE) como os PCN e a Lei 11.161, que torna obrigatória a oferta da Língua Espanhola no ensino

regular, contribuem para a aquisição desse conhecimento que não se restringe às regras gramaticais

e ortográficas, mas que contribuem para a formação individual, cultural e profissional dos sujeitos.

Para isso, será realizada análise dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN 1996, 2001) enquanto

determinantes para o ensino de uma ou mais línguas estrangeiras (LE) nas instituições regulares de

ensino bem como da lei 11.161.

Ao considerar que vivemos a era das inovações tecnológicas que exige que as pessoas

estejam atualizadas para acompanharem as transformações econômicas, sociais e comportamentais

decorrentes de se viver em um mundo globalizado, conhecer outros idiomas e outras culturas

possibilita o entendimento, o diálogo e a comunicação entre diferentes nações, além de contribuir

1 Graduada em Letras Português Espanhol – Licenciatura pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) Campus

Cerro Largo RS. Pós-Graduanda em Metodologias da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica pela

Universidade do Norte do Paraná (UNOPAR). Polo São Luiz Gonzaga RS.

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para o desenvolvimento pessoal, intelectual e profissional. Sendo assim, conhecer outros idiomas

deixou de ser opção para se tornar uma necessidade atualmente. Em virtude disso, os Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN, 2001) determinam que as instituições de ensino ofereçam pelo menos

uma língua estrangeira moderna aos alunos matriculados.

“Pelo seu caráter de sistema simbólico, como qualquer linguagem, elas funcionam como

meios para se ter acesso ao conhecimento e, portanto, às diferentes formas de pensar, de

criar, de sentir, de agir e de se conceber a realidade, o que propicia ao indivíduo uma

formação mais abrangente e ao mesmo tempo mais sólida” (BRASIL, 2001. p. 25).

Nesse sentido, o conhecimento de outro idioma contribui para o desenvolvimento do

cidadão e para a inserção social, ficando a critério das instituições de ensino a escolha pelo idioma

que melhor convém oferecer. E, com o objetivo de favorecer e contribuir para o fortalecimento dos

laços comerciais entre os países membros do Bloco MERCOSUL (Mercado Comum do Sul), e

estreitar ainda mais as relações interpessoais decorrentes de se viver em um país que faz fronteira

geográfica com sete países hispanofalantes, foi homologado a lei 11.161em 05 de agosto de 2005

pelo então presidente Luis Inácio Lula da Silva, instituindo a obrigatoriedade da oferta e ensino da

Língua Espanhola em todas as instituições regulares de ensino.

A referida lei busca facilitar o entendimento e a comunicação entre brasileiros e falantes da

língua espanhola, considerando que é o idioma oficial da Espanha e de outros 20 países, sendo o

terceiro idioma mais falado no mundo, ficando atrás apenas do Mandarim e do Inglês. Daquele

devido a população chinesa ser a mais numerosa do mundo e deste por ser reconhecidamente o

idioma universal. De acordo com dados do IBGE há aproximadamente 500 milhões de falantes da

língua espanhola, com cerca de 390 milhões de falantes nativos e de 110 milhões de falantes que

têm o idioma como segunda língua, estando presentes na América do Sul, América Central,

América do Norte e África.

Como o objetivo deste trabalho é fazer uma reflexão acerca da necessidade e importância do

ensino da Língua Espanhola, é interessante fazer um breve resgate histórico do surgimento do

idioma assim como breve recorte da história do ensino de línguas estrangeiras no Brasil,

perpassando pelos PCNs e pela lei 11.161. Fatores importantes para a compreensão de como o

idioma espanhol tornou-se um dos idiomas mais difundidos e falados no mundo atualmente, e,

consequentemente, se pensar na relevância de seu ensino e aprendizagem.

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2 - LÍNGUA ESPANHOLA E SUA ORIGEM

O Latim, língua que provém das línguas indo-europeias, era falada pelo povo romano que

vivia no centro da Península Itálica, chamada Lácio. Os romanos dão início a um vasto histórico

desbravador com a ampliação das fronteiras do antigo Lácio a partir da penetração na parte

meridional da Península Itálica, concluída em 272 a.C, com a anexação de Toronto e com a guerra

contra os semnitas, iniciada em 326 a.C, com término depois da batalha de Sentino em 295 a.C.

Com esses episódios inicia-se um longo período de conquistas que vão desde a anexação de

territórios da Sicília (241 a.C.), da Sardenha e da Córsega (238 a.C), da Ilíria (229 a.C), da costa

leste e sul da Península Ibérica (218-219 a.C e da Récia (15 a.C.), entre outros, (CUNHA, 1976).

Como é possível perceber, essa língua, com o decorrer do tempo, foi se transformando no

idioma da conquista porque a partir do momento em que os soldados romanos partiam para novas

descobertas, para ampliação das regiões conquistadas foi sendo difundida entre esses povos. Mas

foi só no século III a.C. que surge o latim escrito chamado latim literário com a finalidade artística

atingindo sua diferenciação do latim vulgar no século I a. C. O latim literário é mais ‘apurado’

utilizado pelos literatos e pela elite, já o latim vulgar é falado pelas camadas mais humildes da

população e pelos soldados. Conforme Ismael de Lima Coutinho (2011):

A princípio, o que existia era simplesmente o latim. Depois, o idioma dos romanos se estiliza,

transformando-se num instrumento literário. Passa então a apresentar dois aspectos que, com o correr

do tempo, se tornam cada vez mais distintos: o clássico e o vulgar. Não eram duas línguas diferentes,

mas dois aspectos da mesma língua. Um surgiu do outro, como a árvore da semente. Essas duas

modalidades do latim, a literária e a popular, receberam dos romanos a denominação respectivamente

de sermo urbanus e sermo vulgaris (COUTINHO, 2011, p.).

Desse modo, o latim vulgar esteve em contato com diversas nações, seja por meio das

anexações ou pelas invasões sofridas. Mesmo aquelas nações que têm um histórico desbravador e

de conquistas, podem, muitas vezes, serem conquistadas ou pelo menos sofrerem uma tentativa de

conquista como ocorreu com o território romano, que foi alvo da invasão árabe no Séc. VIII, assim

como fizeram os visigodos no mesmo século. À medida que há o contato entre conquistadores e

povos conquistados, há trocas e a incorporação tanto da cultura como do idioma e o modo de vida

dos povos oponentes, como ocorreu a partir do avanço da Reconquista do território romano nos Séc.

X ao XV. Já que houve o enriquecimento do vocabulário espanhol com a incorporação de palavras

árabes como: tambor, aljibe, jará, arrabal, almohada, alfombra, entre outros benefícios como a

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implantação dos meios de produção, das técnicas de irrigação, do cultivo de plantas e cereais e das

técnicas artesanais herdadas desse povo. Fatores importantes para ampliação do comércio e,

consequentemente, desenvolvimento da península. Também houve a incorporação de palavras

como: guerra, ropa, bando, rico, etc, herdadas a partir da invasão dos visigodos.

Ocorre também a exteriorização de costumes, da cultura e da língua latina a partir do advento da

Reconquista, que faz com que o latim se torne mais conhecido e falado não só em domínios romanos, mas

também nas terras dos invasores e, isso propicia também o surgimento de novos dialetos que podem

tornar-se línguas independentes e autônomas como ocorreu com o castelhano (CUNHA, 1976). O dialeto

castelhano provém de Castilla (que se constituiu ao sul de Cantabria e do país Basco e entre Rioja e norte

de Burgos) que se consolida já no século XI, quando membros da Escola de Tradutores de Toledo passam

a traduzir textos para o castelhano produzidos em árabe sobre astronomia, filosofia e medicina. Dialeto

que no Séc. XV devido ao início do processo de unificação da Espanha manteve a hegemonia sobre as

demais regiões adquirindo proporções de língua independente.

De acordo com Zamora (2009) ficou a denominação castelhano para o dialeto que enriquecido por

inúmeros elementos dos outros dialetos hispânicos transformou-se na língua oficial da Espanha em 1492

com a criação da primeira gramática em língua espanhola por Elio Antonio de Nebrija, culminando com a

criação em 1495 do primeiro dicionário dessa língua. A história do idioma espanhol pode ser dividida em

três momentos: em castelhano antigo, entre os séculos X e XV; espanhol moderno do século XVII ao

XVIII e o espanhol contemporâneo a partir da fundação da Real Academia Espanhola até a atualidade.

Com o imperador Carlos I, em 1536, o dialeto de Castela, passa a ser a Língua Oficial da Espanha e a

denominar-se Espanhol, denominação que provém do latim medieval, Hispaniolus. Denominação que se

junta à denominação ‘castelhano’, já que de acordo com o dicionário da Real Academia Espanhola ambos

são sinônimos.

Os primeiros textos em castelhano datam do Séc. X, que foram chamadas de Glosas Emilianenses

e Silenses, uma relação com os monastérios onde foram achados, mas o desenvolvimento cultural e

literário desta língua começa no Séc. XII, com a aparição dos cantares de gesta cujo único legado

completo é o poema “El cantar de mio Cid”, de autor desconhecido. Surgem também as primeiras peças

de teatro no Séc. XII, como o “Auto de los reyes magos”. Em relação a isso Antonio Alatorre (1979)

afirma: “Os primeiros documentos que mostram palavras escritas em nossa língua não tem data, mas os

estudiosos dizem que foram escritos na segunda metade do século X, ou seja, entre o ano 950 e o ano

1000”. Desse modo, podemos considerar que os primeiros registros em língua espanhola possuem mil e

poucos anos.

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É importante salientar que o latim deu origem a outros idiomas além do espanhol. Conforme

Rodolfo Ilari (p.219) “hoje no mundo românico, cabe reconhecer o status de línguas nacionais a

seis idiomas: o espanhol, o português, o francês, o italiano, o catalão e o romeno”. Idiomas

importantes para a comunicação em nível mundial, tendo representações em todos os continentes,

como ocorreu com a língua espanhola que foi levado e difundido em todos os continentes por meio

das expedições exploratórias lideradas por Cristóvão Colombo e também pelos processos de

colonização.

Como mencionado, a Língua Espanhola está presente em todos os continentes, prevalecendo

como idioma oficial de países da América Central e do Sul, e segundo Martín (1997, p. 201) mesmo

que dentro da própria Espanha hajam outros idiomas falados fluentemente, ou seja, haja regiões bi

Língues reconhecidas pela constituição como o país Vasco, que tem como idioma próprio o

(Euskera), Catalunha que também tem idioma próprio o (Catalán), Galía onde se fala (Gallego) e

Valencia, onde se fala (Valenciano), ainda assim a língua oficial continua sendo o Espanhol, por

determinação da Constituição Espanhola de 1978. Conforme aponta Martín (1997, p.207) a

expansão do espanhol para a América do Sul ocorreu a partir do Séc. XVI com o descobrimento e

colonização que se deu a seguir.

E, para favorecer o processo de colonização espanhola, os colonizadores contaram com a

ajuda dos “missioneiros” para que o espanhol fosse ensinado para os povos autóctones que

habitavam a região. Mas os missionários encontraram dificuldades para a realização dessa tarefa,

resolvendo então a aprender as línguas autóctones para facilitar a compreensão entre eles e facilitar

o ensino do espanhol para os indígenas. Contudo, no Séc. XVIII os espanhóis proibiram que os

indígenas fizessem uso de sua língua de origem para que houvesse uma melhor assimilação da

língua espanhola. A qual foi beneficiada com empréstimos linguísticos autóctones, já que inúmeras

palavras que fazem parte do vocabulário espanhol tiveram origens nessas línguas, como por

exemplo: jícara, tomate, maíz, batata, cacique, etc, não permanecendo apenas em território sul

americano, mas também sendo levadas para outras regiões.

Como exposto, a Língua Espanhola sofreu um longo processo de evolução, chegando a ser o

segundo idioma mais falado mundialmente ao considerarmos a quantidade de falantes do idioma

pelo mundo e se desprezarmos o número de falantes nativos do idioma Mandarim, o qual destina ao

espanhol o terceiro lugar enquanto idioma mais falado atualmente.

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3 – A HISTÓRIA DO ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS NAS ESCOLAS

BRASILERAS

Convém fazer um breve resgate histórico do ensino de línguas estrangeiras no sistema

educativo brasileiro, perpassando pelos PCNs e enfocando as determinações da lei 11.161 para

refletir em que medida a obrigatoriedade do ensino da língua espanhola pode estimular e despertar o

interesse dos educandos, contribuindo assim para que a aprendizagem do idioma seja de fato

consolidada, e que ultrapasse as paredes das salas de aulas enquanto disciplina da grade curricular e

faça parte da vida do aprendiz.

O Brasil se constituiu a partir da união de várias etnias, portanto, não há como atribuir à

constituição do país uma única etnia, já que desde o início do processo de colonização parte do

território nacional foi alvo de disputas entre a coroa portuguesa e a espanhola. Mencionando ainda

entre outras tentativas de invasão, a francesa e a holandesa, e também as levas de migrantes da

Espanha, Itália, Alemanha, Japão entre outras nações que ajudaram na constituição do país. Sendo

assim, o país que chamamos Brasil constituiu-se a partir da união de inúmeras etnias, idiomas e

culturas. Com isso, podemos afirmar que as línguas estrangeiras sempre estiveram presentes em

nosso território e que de certa forma o país é ‘plurilingual’, já que ainda hoje muitas regiões do país

conservam e utilizam dialetos autóctones e de migração, atribuindo-lhes, portanto, características de

regiões bilíngues.

A preocupação em ensinar uma ou mais língua(s) estrangeira(s) no sistema educacional

brasileiro surgiu a partir do interesse em comunicar-se nos idiomas influentes da época, ocorrendo

assim a oficialização do ensino de língua estrangeira no Brasil em 22 de junho de 1809:

E sendo, outrossim, tão geral e notoriamente conhecida a necessidade de utilizar-se das

línguas francesa e inglesa, como aquelas que entre as vivas têm mais distinto lugar, e é de

muita utilidade ao Estado, para aumento e prosperidade de instrução publica, que se crie na

Corte uma cadeira de língua francesa e outra inglesa (MOACYR, 1936, p. 61)

Como exposto acima, a língua francesa e a inglesa passaram a integrar o ensino na Corte,

introduzindo assim o ensino de outras línguas modernas na educação nacional, como ocorreu a

partir das mudanças implantadas no ensino secundário em1855 pelo então Ministro Couto, tornando

obrigatório o ensino do francês, do inglês e do alemão e facultativo o ensino do italiano. Em relação

às línguas clássicas, há a obrigatoriedade do ensino do latim e do grego. Em relação a isso Chagas

(1979, p.105) traz: “as línguas modernas ocuparam então, e pela primeira vez, uma posição análoga

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a dos idiomas clássicos, se bem que ainda fosse muito clara a preferência que se destina ao Latim”.

E com o passar do tempo o ensino das línguas modernas suplantou o ensino das línguas clássicas

que foram retiradas da grade curricular escolar. Com a Reforma de Capanema em 1942 o ensino

secundário passa a ser estruturado em curso ginasial de quatro anos e curso colegial de três anos,

sendo dividido entre científico e clássico. Chagas (1979) aponta que o ministro Gustavo Capanema

afirmava que a inclusão do ensino da língua espanhola no currículo escolar contribui com a

aquisição do conhecimento e para a aproximação entre as nações coirmãs:

[ ] ensino secundário das nações cultas dá em regra o conhecimento de uma ou duas’ delas,

elevando-se tal número para três nos ‘países cuja língua nacional não constitui um

instrumento de grandes recursos culturais. A reforma adotou esta última solução’,

escolhendo o francês e o inglês, ‘dada a importância desses dois idiomas na cultura

universal e pelos vínculos de toda a sorte que a eles nos prendem’; e o espanhol por ‘ser

uma língua de antiga e vigorosa cultura e de riqueza bibliográfica’, cuja adoção, por outro

lado, ‘é um passo a mais que damos para nossa maior e mais íntima vinculação espiritual

com as nações irmãs do Continente’ (CHAGAS, 1979, p.116).

O ensino da Língua Espanhola foi introduzido tanto no ensino clássico como no científico,

como consta no Capítulo II, Art. 12 do Decreto-Lei n° 4.244 de 09 de abril de 1942. Contudo,

continuava sendo obrigatório o ensino da língua materna. Desse modo, é a partir da Reforma

Capanema que se inicia o Ensino de Língua Espanhola no Brasil, para em 20 de dezembro de 1961

ser promulgada pelo presidente João Goulart a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) n°.

4024, que estabelecia os parâmetros para todos os níveis de ensino, subdividindo o currículo em três

partes, são elas: a nacional com as disciplinas obrigatórias determinadas pelo Conselho; a Federal

de Educação; e a regional também obrigatórias, porém estabelecidas pelo Conselho de Educação

Estadual; e a parte diversificada, disciplinas estabelecidas pela própria instituição escolar, a partir

de lista prévia estabelecida pelo Conselho de Educação.

A nova versão da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - Lei 5692/71 de 1971,

determina o ensino de língua estrangeira no 1° e n o 2° graus (atual Ensino Fundamental e Médio),

sendo obrigatório no Ensino Médio devido à exigência nas seletivas para o Ensino Superior. Com

a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 20 de dezembro de 1996 (Lei 9.394), a língua

estrangeira passa a ser incluída no Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Neste em caráter

obrigatório:

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Art. 26 – Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional

comum, a ser completada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma

parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura,

da economia e da clientela.

§ 5° - Na parte diversificada do currículo será incluído, obrigatoriamente, a partir da quinta

série, o ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna, cuja escolha ficará a cargo

da comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituição.

Art. 36 – O currículo do ensino médio observará o disposto na Seção

I deste capítulo e as seguintes diretrizes: (...)

III – Será incluída uma língua estrangeira moderna, como disciplina obrigatória, escolhida

pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo, dentro das disponibilidades

da instituição.

Como maneira de complementar a LDB, foram criados os PCN (1998) que trazem que “a

aprendizagem de uma língua estrangeira juntamente com a língua materna, é direito de todo

cidadão” (p.19). Segundo o documento, foram criados critérios para a inserção da língua estrangeira

na comunidade escolar, que devem estar calcados nos fatores históricos; nos fatores relativos às

comunidades locais e nos fatores relativos à tradição. Objetivando a representatividade que uma

língua tenha no desenvolvimento específico da história da humanidade, já que o fator histórico

torna-se imprescindível na aprendizagem de um idioma. A relevância é frequentemente determinada

pelo papel hegemônico dessa língua nas trocas internacionais, gerando implicações para as trocas

internacionais nos campos da cultura, da educação, da ciência, do trabalho, etc. (PCN, 1998, p.23).

O referido documento traz como exemplos de línguas relevantes o Inglês, pela crescente e

notória influência econômica norte-americana pós II Guerra Mundial e a língua espanhola pelas

trocas comerciais e econômicas com os países integrantes do MERCOSUL. Em relação aos fatores

relativos às comunidades locais, sugere a inclusão tanto de línguas indígenas como de línguas de

imigrantes, devido a laços culturais, afetivos e ou de parentesco. Quanto às comunidades onde o

português não é língua materna, justifica-se seu ensino como segunda língua. E em relação aos

fatores relativos à tradição, considera-se a relação cultural desenvolvida entre dois países, citando o

caso do francês pelas trocas culturais entre Brasil e França.

O documento aborda a importância de se conhecer a língua espanhola devido às trocas

comerciais e também à proximidade geográfica entre o Brasil e os países hispanofalantes:

Deve-se considerar também o papel do espanhol, cuja importância cresce em função do

aumento das trocas econômicas entre as nações que integram o Mercado das Nações do

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Cone Sul (Mercosul). Esse é um fenômeno típico da história recente do Brasil, que, apesar

da proximidade geográfica com países de fala espanhola, se mantinha impermeável à

penetração do espanhol (BRASIL, 1998, p. 23).

Os documentos que determinam o ensino de uma língua estrangeira e sugerem, neste caso, o

ensino da língua espanhola, sustentam seus argumentos nos laços mercantis que envolvem os países

membros do MERCOSUL e sua proximidade geográfica com países de língua espanhola. Mas, é

indispensável dar atenção à questão de que não há apenas a proximidade geográfica entre Brasil e

alguns países de língua espanhola, indo, além disso, já que o nosso país faz fronteira geográfica

com sete desses países. Desse modo, as trocas perpassam as simples trocas comerciais, havendo

trocas artísticas - culturais, de costumes, de hábitos e modos de vida. Lembrando ainda que há a

exigência do conhecimento de uma língua estrangeira como critério de seleção em cursos de pós-

graduação e que muitos candidatos optam pelos conhecimentos em língua espanhola e também há

exigência do conhecimento básico do espanhol para ingresso em vários cursos de especialização no

exterior, além de ser opção de língua estrangeira nas provas do ENEM e de vestibulares em todo o

território nacional. Isso contribui para o interesse em aprender o idioma.

E, para contribuir e facilitar a imersão dos brasileiros no idioma e cultura hispânica foi

promulgado a lei 11.161 em 05 de agosto de 2005, que determina a inserção da Língua Espanhola

no currículo das Instituições regulares de ensino brasileiras para o Ensino Médio e sendo facultativa

no currículo do Ensino Fundamental - ciclo II. Lei que de alguma maneira vem para complementar

e fechar uma lacuna deixada pelos PCN quando apontam a relevância de se conhecer a Língua

Espanhola, mas sem que sua oferta fosse obrigatória. Conforme a Lei 11.161(2005):

Art. 1o O ensino da língua espanhola, de oferta obrigatória pela escola e de matrícula

facultativa para o aluno, será implantado, gradativamente, nos currículos plenos do ensino

médio. § 1o O processo de implantação deverá estar concluído no prazo de cinco anos, a

partir da implantação desta Lei.§ 2o É facultada a inclusão da língua espanhola nos

currículos plenos do ensino fundamental de 5a a 8a séries.

Art. 2o A oferta da língua espanhola pelas redes públicas de ensino deverá ser feita no

horário regular de aula dos alunos.

Art. 3o Os sistemas públicos de ensino implantarão Centros de Ensino de Língua

Estrangeira, cuja programação incluirá, necessariamente, a oferta de língua espanhola.

Art. 4o A rede privada poderá tornar disponível esta oferta por meio de diferentes

estratégias que incluam desde aulas convencionais no horário normal dos alunos até a

matrícula em cursos e Centros de Estudos de Língua Moderna.

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Art. 5o Os Conselhos Estaduais de Educação e do Distrito Federal emitirão as normas

necessárias à execução desta Lei, de acordo com as condições e peculiaridades de cada

unidade federada.

Art. 6o A União, no âmbito da política nacional de educação, estimulará e apoiará os

sistemas estaduais e do Distrito Federal na execução desta Lei.

Art. 7o Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

O que se vislumbrou com as determinações dos PCN sobre o ensino de língua estrangeira e

da lei 11.161, é que os brasileiros estejam aptos a comunicar-se nessa língua, considerando que há o

contato real por meio de diferentes manifestações de uso da língua seja pela música, pelo cinema,

pela política e/ou por fatores econômicos. E, para que as determinações desses documentos

realmente saiam do papel, sabemos que é necessário ter instituições de ensino empenhadas e

profissionais capacitados a desempenhar a função de intermediador de um conhecimento que não se

restringe unicamente a questões linguísticas, às regras gramaticais e ortográficas, mas que é amplo

ao se considerar as questões históricas e culturais que estão imbricadas em qualquer idioma. Em

relação a isso os PCN (2001) mencionam: “O domínio de uma Língua Estrangeira se constitui em

mais uma possibilidade de ampliação do universo cultural do aluno, possibilitando-lhe o acesso e a

apropriação de conhecimentos de outras culturas”. O que certamente contribui para a formação

intelectual e pessoal dos sujeitos.

4- CONCLUSÕES E REFLEXÕES

Como vimos, a LDB define que será incluído, obrigatoriamente, a partir da quinta série, o

ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna, já para o Ensino Médio será incluída uma

língua estrangeira moderna, como disciplina obrigatória e uma segunda em caráter optativo, dentro

das disponibilidades da instituição. Já a lei 11.161 torna obrigatória a oferta da língua espanhola no

Ensino Médio e de matrícula facultativa para o aluno, e facultada à inclusão nos currículos plenos

do Ensino Fundamental. As referidas leis objetivam que os estudantes brasileiros tenham a

possibilidade de conhecerem outros idiomas e outras culturas.

É importante mencionar que o Brasil, único país da América do Sul que tem o a língua

Portuguesa como idioma oficial, faz fronteira geográfica com: Uruguai, Argentina, Paraguai,

Venezuela, Bolívia, Peru e Colômbia. Isso já é argumento suficiente para o ensino do espanhol nas

escolas brasileiras. Em contrapartida, a oferta e ensino da Língua Portuguesa na Argentina vem

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sendo implantado ao se cumprir as determinações da lei 26.468 que determina a oferta da Língua

Portuguesa em território argentino. A promulgação da referida Lei em 16/01/2009 torna obrigatória

a oferta da Língua Portuguesa em todas as escolas de Ensino Médio do país e, no caso das escolas

de fronteira, também no Ensino Fundamental. Esforço para que haja a interação e comunicação

entre os argentinos e os brasileiros.

Quanto ao ensino da Língua Espanhola no Brasil, podemos afirmar que se tornou uma

necessidade ao pensarmos que esse idioma faz parte da vida de muitos brasileiros, mesmo que

intencionalmente, já que não é necessário sair exatamente do país e ir até um país vizinho para estar

em contato com falantes do idioma, pois o território brasileiro é destino certo para muitos

hispanofalantes que visitam as praias brasileiras em temporadas de férias e/ou pelo interesse em

conhecerem os Sete Povos das Missões, considerando que vivemos na região missioneira. Temos

conhecimento também do crescente interesse de estudantes brasileiros por cursos de Ensino

Superior em países como Uruguai, Argentina, entre outros. Sendo assim, não tem como desprezar o

fato de que o processo – ensino e aprendizagem da Língua Espanhola é uma necessidade e que deve

ser conduzida pelos profissionais do ensino de maneira a despertar verdadeiramente o interesse dos

estudantes brasileiros pelo idioma. Interesse que ultrapasse as paredes das salas de aulas para que

não se restrinja unicamente à aprendizagem de uma ‘disciplina escolar’, mas que tenha sua real

importância reconhecida.

Com isso, os PCN e a lei 11.161 desempenham função importante no sentido de outorgar às

instituições de ensino a responsabilidade de instigar à tomada de consciência de que conhecer

outro(s) idioma(s) contribuirá para o crescimento individual, intelectual e profissional do aprendiz.

Por isso, cabe à escola trabalhar de modo que o aluno perceba a relevância de aprender outro

idioma, e que isso fará toda a diferença em sua vida.

.

5-.REFERÊNCIAS

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