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 M I C H E L L A M Y O O S S  T T  E  E  M  M  P  P  L  L  Á  Á  R  R  I  I O O S S   E SS E S G R A N D E S S EN H O R E S D E  M A N T O SBR A N C O S O s seus costum es, os seus ritos, os seus segredos h ht t t t  p  p:/ / / / g gr r o o u u  p  p s s. g go oo g gl le e. c co o m m/ / g gr r o o u u  p  p / /d d i i g gi it t a al lso o u u r r c c e e 

LIVRO Os Templarios

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    MICHEL LAMY

    OOSSTTEEMMPPLLRRIIOOSSESSES GRANDES SENHORES DE

    MANTOS BRANCOS

    Os seus costumes, os seus ritos, os seus segredos

    hhttttpp::////ggrroouuppss..ggooooggllee..ccoomm//ggrroouupp//ddiiggiittaallssoouurrccee

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    4 edioNotcias Editorial

    NOTA DO EDITOR PORTUGUS

    No se sabe ao certo se, entre os primeiros nove templrios que foram aJerusalm, um deles seria do Condado Portucalense: Gondomar (ou Gondemar?).Mas supe-se que a presena da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo (maistarde denominada por Ordem do Templo) em Portugal data de 1126, e sabe-se queos Templrios estavam solidamente implantados no pas em 1157, quando foinomeado Gro-Mestre Gualdim Pais, figura emblemtica que comandou areconquista de Santarm e Lisboa, ao lado de Martim Moniz. Em 1128, D. Teresaconcedeu-lhes o castelo de Soure, e como recompensa dos seus feitos guerreiros,D. Afonso Henriques outorgar-lhes- a cidade de Tomar, bem como as terrascompreendidas entre Tomar e Santarm. Foi assim que o castelo de Almourol,contemplando todo o Tejo, entrou na posse da Ordem.

    tambm certo que a deciso papal de extinguir a Ordem no seria bemacolhida e, em 1311, D. Dinis ordenou o levantamento de um processo, quedecorreu em Salamanca, para averiguar a culpabilidade dos templrios da PennsulaIbrica. Os templrios portugueses seriam ilibados. Logo depois, D. Dinis enviouao papa Joo XXII dois emissrios para negociarem o renascimento da Ordem doTemplo. Surgiu a Ordem de Cristo, de que foi investido Gro-Mestre Gil Martins

    (em 15 de Maro de 1319), e cujos cavaleiros usavam um hbito idntico ao dostemplrios: apenas uma cruz branca inscrita dentro da cruz vermelha (para assinalara pureza da instituio ressurgida) os distinguia. Os dignatrios do Temploconservaram os seus lugares na nova Ordem, que alojou tambm muitos templriosrefugiados, de Frana e outras naes europeias.

    em Tomar que encontramos uma maior concentrao de basties daOrdem, contributos inestimveis para o nosso patrimnio arquitetnico. E o casodo castelo de Tomar (tambm chamado dos Templrios), que estaria unido porpassagens subterrneas Igreja de So Joo Baptista (santo venerado pela Ordem,que nos seus templos e capelas conta com inmeras representaes de baphomets-

    cabeas degoladas) e Igreja de Santa Maria do Olival, onde Gualdim Pais foisepultado. O seu tmulo, ao que se sabe, est vazio - mais um enigma para aconstelao dos mistrios do Templo.

    A arte gtica, segundo Michel Lamy, ter sido introduzida pelos Templrios,que se associaram a mesteirais cagots, possuidores de segredos de construo e dostrabalhos em pedra (possveis antecessores dos pedreiros-livres ou franco-maons). O estilo manuelino ser, em Portugal, o herdeiro direto do gtico e o seugrande expoente o Convento de Cristo, cripta da Ordem de Cristo, aps se ter

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    instalado por alguns anos em Castro Marim e ter regressado original sede doTemplo. Na charola do Convento de Cristo encontramos a disposio octogonal,fiel cosmologia da poca e representando o hemisfrio celeste. Os Templrios, eos seus herdeiros Cavaleiros de Cristo, teriam desenvolvido os conhecimentos deastrologia e astronomia (as duas cincias, como se sabe, eram indissociveis) que

    lhes serviram para iniciar a aventura dos Descobrimentos. A esfera armilar, nafamosa Janela do Captulo, l est para nos lembrar o papel dos Cavaleiros nasDescobertas, assim como o ngulo de 34 que encontramos nos vrtices dasfachadas das capelas gticas, que ser o ngulo que a constelao de Co Maior fazcom a Taa (Graal) e com Leo, conforme representado no baixo-relevo da Igrejade So Joo Baptista. Esta estar ainda ligada por subterrneos a um outromonumento de Tomar, o Convento de Santa Iria, onde se observa um boiesculpido na pedra (Constelao do Boieiro), herana visigtica de que a Ordem doTemplo se ter apropriado. No plano arquitetnico, h tambm que realar o olhode boi sobre a Janela do Captulo, de que se diz indicar a direo do ovoalqumico, que serviria para a transmutao do metal em ouro e que, juntamentecom a carga trazida das viagens martimas Terra Nova, seria a explicao dotesouro templrio, misteriosamente desaparecido e talvez depositado em... Tomar.

    Podemos no dar crdito a todas estas suposies (ao ponto de nos parecer,lendo as obras dos que investigaram os segredos dos Templrios, que a Ordemseria uma espcie de smula das mais variadas e dspares esotricas de todo oMundo, sendo quase impossvel encontrar um fio de coerncia). Mas pareceinegvel que os Templrios e a Ordem de Cristo desempenharam um papelfundamental nos Descobrimentos Portugueses. Diz-se de D. Dinis, o grandedefensor da continuao da Ordem, que estaria iniciado nos segredostemplrios... E no foi ele o plantador de naus a haver, segundo a Mensagem de

    Fernando Pessoa, ltimo Cavaleiro de Rosa-Cruz, essa Ordem da cruz mstica quemuitos julgam herdeira dos Templrios?

    O grande impulsionador das Descobertas foi D. Joo, mestre de Aviz, esabemos que a Ordem de Avis estava intimamente ligada a Calatrava e, portanto, aoTemplo. Assim, tambm, as primeiras caravelas ostentavam o pavilho da Cruz deCristo, e o Infante D. Henrique, se no era Mestre, era pelo menos governador daOrdem de Cristo. Finalmente, e sem esgotar os grandes nomes da histria nacionalque estariam ligados a uma pretensa misso templria, o ltimo rei de Avis foi D.Sebastio, o Desejado, dominado pelo sonho megalmano do Imprio ondenunca o Sol se pe (era, indiscutivelmente, objetivo dos Templrios ligar ao

    Ocidente o Oriente). E foi D. Sebastio que ordenou ao D. Pedro lvares queescrevesse a histria da Ordem de Cristo, Compilao das Escrituras da OrdemdeCristo,ordenada por Alvar d El Rei D. Sebastio, de 16 de Dezembro de 1560. Nestaobra, em vrios volumes, conta-se que a Igreja de Santa Maria do Olival era anica paroquial Igreja de toda a terra de Thomar e Ceras e que o vigairo dela erarepresentado pelo Mestre e Convento sem instituio nem autoridade doutrem,que a Ordem de Cristo se pode chamar a Ordem do Verdadeiro Templo, e queparece que o dito Infante D. Henrique soube do tempo da sua morte e como se

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    preparou para ela, entre outras vrias histrias que valer a pena esmiuar-se sese quiser traar o percurso dos Templrios em Portugal, que parece serindissocivel da consolidao e afirmao da nossa nacionalidade.

    Vemos, pois, que Portugal esteve decisivamente envolvido na implantao epreservao da Ordem do Templo, o que Michel Lamy deixa entrever na sua obra.

    Esta nota e a documentao iconogrfica selecionada para ilustrar a obra,pretendem fornecer algumas pistas para quem deseje prosseguir um estudo sobre aao dos Templrios em Portugal.

    ADVERTNCIA

    A histria da Ordem do Templo um terreno escorregadio que provocadesconfianas aos universitrios atuais. Demasiado enigmtico, demasiado ligadoao esoterismo para no desagradar aos apoiantes da escola quantitativista, suscitamuito poucas vocaes em comparao com o que aconteceu outrora. No entanto,deu origem, ao longo dos tempos, a inmeras obras de qualidade. Investigadores detodos os horizontes tentaram compreend-la, contribuindo com a luz que eraprpria da sua formao ou do seu empenhamento poltico.

    Por que razo acrescentar mais um livro aos milhares j publicados em todoo mundo e que estudam pormenorizadamente a vida dos cavaleiros do Templo nassuas Comendas, as operaes militares que realizaram, a sucesso dos seus Gro-Mestres, a sua alimentao, as suas armas, etc.?

    Se se tratasse apenas disso, bastaria efetivamente remetermo-nos para asmuito boas obras de John Charpentier, Albert Ollivier, Georges Bordonove,Marion Melville, Raymond Oursel, Alain Demurger e muitos outros. Mas essasobras, por mais srias que sejam, no resolvem todos os enigmas que a Ordem do

    Templo levanta.Muitos investigadores se dedicaram s zonas de sombra desta histria, com

    maior ou menor felicidade, maior ou menor loucura, preciso diz-lo. Nem todasas suas hipteses so fiveis, mas muitos deles trouxeram o seu quinho de luz aum tema que tinha muitos espaos de trevas. So necessrios nomes como os deLouis Charpentier, Daniel Rju, Grard de Sde, Gilette Ziegler, Guinguand,Weysen, para desbravar as veredas da Histria Secreta, por mais perigosas eassustadoras para o caminhante que sejam.

    Porque, finalmente, digam o que disserem determinados historiadoresencartados, a criao da Ordem do Templo continua envolta em mistrios; e o

    mesmo acontece com a realidade profunda da sua misso. Inmeros locaisocupados pelos Templrios apresentam particularidades estranhas. Atriburam-seaos monges-soldados crenas herticas, cultos curiosos e s suas construessignificados e at poderes fantsticos. A seu respeito, fala-se de gigantescostesouros escondidos, de segredos ciosamente preservados e de muitas outras coisas.

    As diversas hipteses formuladas contm, sem dvida, muito mais partes desonho do que fatos provados, mas, mesmo por detrs das mais loucas, h muitas

    vezes parcelas de verdade que h que pr a claro, por muito que desagrade aos

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    racionalistas inveterados.No que a isto respeita, convm determo-nos, por breves instantes, num caso

    curioso: o de Umberto Eco. Depois do seu xito mundial, O Nomeda Rosa, esteuniversitrio italiano vendeu vrios milhares de exemplares de uma outra obra: O

    Pndulo deFoucault.Nela, amalgama a seu bel-prazer tudo o que se relaciona com o

    esoterismo e os Templrios, acumulando citaes desinseridas do seu contexto,truncando-as de forma a adulterar as teses apresentadas; em resumo, utilizandoprocessos bem conhecidos da desinformao. O objetivo de Umberto Eco pareceter sido ironizar, troar de todos quantos procuram a verdade fora dos caminhosmuito trilhados, o que, no entanto, , em certa medida, tambm o seu caso.Encarniou-se especialmente contra aqueles que se interessam pelos mistrios dosTemplrios: uns loucos! Por trs vezes, a frase que pe na boca de uma das suaspersonagens: Desde o tempo em que eles [os Templrios] haviam sido enviadospara a fogueira, uma multido de caadores de mistrios procurara encontr-los emtodo o lado, e sem nunca apresentar a menor prova - Quando algum repe em

    jogo os Templrios, quase sempre um louco - Mais tarde ou mais cedo, o loucope os Templrios em jogo - Tambm h loucos sem Templrios, mas os loucosdos Templrios so os mais insidiosos - Os Templrios continuam a serindecifrveis devido sua confuso mental. por isso que tantas pessoas os

    veneram.Pois bem, assim seja. Convido todos quantos se interessam pelos Templrios

    a partilharem um pouco de loucura comigo, na investigao dos mistrios daOrdem do Templo. Deixemos Umberto Eco entregue ao seu psicanalista, para queeste lhe explique o que o levou a ler centenas de obras a que no atribui qualquercrdito e que procura ridicularizar.

    Corramos antes o risco de, em conjunto, nos aventurarmos por caminhos

    no balizados, mesmo que possamos perder-nos neles. Tentemos esclarecer, depassagem, os mistrios das origens da Ordem e a influncia de So Bernardo.Interessemo-nos pela colossal potncia econmica e poltica que a Ordem doTemplo representou e pelos meios que empregou, pelas fontes da sua riqueza.Investiguemos se foi hertica e que cultos estranhos foram eventualmentepraticados no seu seio. E, para tal, dediquemo-nos a examinar os vestgios que osTemplrios nos deixaram, nomeadamente gravados na pedra. Interroguemo-nossobre a origem do impulso que deram arquitetura da sua poca e sobre as fontesdos seus conhecimentos nesta matria. Procuremos na sua priso e no seu processoas chaves mais misteriosas. Estudemos o que pode sobreviver desta Ordem e, por

    fim, visitemos alguns locais onde podemos respirar o odor estranho da suapresena e procurar os sinais tangveis daquilo a que se convencionou chamar aHistria Secreta dos Templrios.

    Mas, antes, refresquemos por um instante os nossos conhecimentos,passando em revista os dois sculos da histria da Ordem, de modo a adquirirmosassim os pontos de referncia necessrios para a anlise da sua evoluo no tempo.

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    PRIMEIRA PARTE

    O NASCIMENTO DA ORDEM DO TEMPLO

    I

    BREVE HISTRIA DA ORDEM DO TEMPLO

    Esta obra no tem a ambio de retomar toda a histria da Ordem doTemplo sob o ngulo dos acontecimentos fatuais, mas sim de esclarecer as suaszonas mais obscuras. No entanto, para compreender o que se passou, h que terpresente no esprito que esta Ordem viveu dois sculos e evoluiu necessariamente.

    data da sua morte, no podia ser idntica ao que era nascena. Mudou porque oseu ideal se viu confrontado com duras realidades. Teve de se adaptar, uma e outra

    vez, tomar em mo as questes temporais, perdendo sem dvida, ao longo dosanos e das necessidades, uma parte da sua pureza original, tal como um adulto quepor vezes tem dificuldade em encontrar em si a criana maravilhada, o minsculoser de olhos puros que, no entanto, foi.

    A Ordem do Templo foi influenciada pelo seu tempo, mas este modificou-a,

    orientou-a, contribuindo para a Histria com as suas prprias correes.Para nos orientarmos nesta evoluo, pareceu-nos til apresentar, de forma

    muito breve, neste primeiro captulo, uma histria breve dos Templrios e,sobretudo, da sua poca.

    Nos caminhos de peregrinao

    Recuemos no tempo at ao final do sculo X. Na nossa poca, temosdificuldade em imaginar o que foram os terrores do ano 1000. A interpretao dasescrituras convencera toda a cristandade de que o Apocalipse se produziria nesse

    ano fatdico. Revelao, no sentido etimolgico do termo, mas tambm destruio,dor: regresso de Cristo terra e julgamento dos homens, separao entre eles paramandar alguns para o paraso, para junto dos santos, e os outros para os infernos, afim de a serem submetidos a tormentos eternos.

    Os cristos viveram com angstia esse ano 1000 e a sua aproximao. Enada se passou, pelo menos nada pior do que nos anos precedentes. A Igrejaenganara-se na sua interpretao das Escrituras? Deus teria esquecido os seus filhosna terra? No, claro que no. Era algo diferente. A catstrofe fora evitada. Deus

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    fora tocado pelas preces dos homens. Perdoara. Sim, mas por quanto tempo? E seapenas se tratasse de um adiamento? Era preciso rezar, cada vez mais, rezar sempre.

    No sculo anterior, os cristos tinham-se feito estrada para irem emperegrinao a locais onde estavam enterrados santos. Estes ltimos haviam, semdvida, intercedido em favor dos homens e Deus deveria ter-se deixado convencer.

    Um dos mais eficazes deveria ter sido Santiago que, de Compostela, atraa milharesde homens e mulheres que deixavam a sua famlia, o seu trabalho, abandonandotudo para irem rezar quele local da Galiza onde a terra acaba.

    Tinha-se passado perto da catstrofe final, as fomes de 990 e 997 eram provadisso. Tinha-se evitado o pior, o mtodo j era conhecido: era preciso cada vezmais que os homens se fizessem estrada, que os monges rezassem, que todosfizessem penitncia. No seria conveniente ir mais longe, realizar a supremaperegrinao, a nica que merecia verdadeiramente a viagem de uma vida: ir aoslugares onde o filho de Deus sofrera para resgatar os pecados dos homens,

    Jerusalm?Michelet escreveu: Os prprios ps conheciam o caminho, e John

    Charpentier faz notar: Feliz aquele que regressava! Mais feliz aquele que morriaperto do tmulo de Cristo e que podia dizer-lhe, segundo a audaciosa expresso deum contemporneo [Pierre d'Auvergne]: Senhor, morrestes por mim e eu morri por

    vs.Multides cada vez mais numerosas puseram-se a caminho de Jerusalm. A

    cidade pertencia aos califas de Bagdade e do Cairo que permitiam o livre acesso aosperegrinos. Mas tudo mudou quando os Turcos se apoderaram de Jerusalm, em1090. De incio, contentaram-se com vexar os cristos e, por vezes, espoli-los,infligindo-lhes humilhao atrs de humilhao, obrigando-os a executarem gestoscontrrios sua religio. De escalada em escalada, a situao agravou-se: houve

    execues, torturas. Falou-se de peregrinos mutilados, abandonados nus nodeserto. De Constantinopla, o imperador Alexis Comnne lanara o sinal dealarme.

    Libertar Jerusalm

    O Ocidente emocionou-se. No podia tolerar-se que os peregrinos fossemmortos. No podiam deixar-se os lugares santos nas mos de infiis. O ano 1000passara, mas...

    Pedro, o Eremita, que assistira, em Jerusalm, a verdadeiros atos de barbrie,

    regressara muito decidido a erguer a Europa e pr os cristos no caminho dacruzada. Viram-no percorrer distncias considerveis, montado na sua mula, a quea multido arrancava as crinas aos punhados, para com elas fazerem relquias.Quando Pedro, o Eremita, passara por algum lugar, os espritos encontravam-seinflamados; homens, mulheres, crianas, mostravam a impacincia de tudodeixarem para se dirigirem a um nico destino: Jerusalm. E, uma vez l, se veria oque se fazia...

    Do lado dos senhores notava-se um pouco mais de prudncia na atitude.

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    Mais razo, sem dvida, mas tambm mais a perder: as terras que j no seriamprotegidas, os bens que poderiam atrair cobias, etc.

    A 27 de Novembro de 1095, o papa Urbano II pregou num conclioprovincial reunido em Clermont. Proclamou: Cada um deve renunciar a si mesmoe carregar a cruz. O sumo pontfice via a tambm uma ocasio de meter na ordem

    esses leigos que se espojavam na luxria e brincavam aos arruaceiros. Ir libertarJerusalm seria o caminho da salvao.Aos milhares, os peregrinos haviam cosido sobre as suas vestes cruzes de

    tecido vermelho, que viriam a valer-lhes o nome de cruzados. Inicialmente, foramos pobres, os mendigos, os famintos, que quiseram libertar Jerusalm, metendo-seao caminho em bandos andrajosos que gritavam Deus assim o quer! E aquelesque no partiam faziam ddivas para que os outros tivessem com que sobreviver,durante a viagem. Alguns tomavam a deciso obedecendo a um impulso, a umsinal: uma mulher seguira um ganso que deveria lev-la Cidade Santa.* Foramtambm referidos pssaros, borboletas e rs que se pensava mostrarem o caminho.

    [* H que ver a uma similitude com o jogo da glria ou do ganso e o jogo dasemana, que conduziam ambos ao Paraso ou Jerusalm celeste (cf Michel Lamy,

    Histoiresecrtedu Pays Basque,Albin Michel).]Pedro, o Eremita, e o seu lugar-tenente, Gauthier-Sans-Avoir, arrastavam

    atrs de si uma turbamulta heterclita que comeou a sua cruzada matando osjudeus do vale do Reno e pilhando os bens dos camponeses hngaros. Chegaram aConstantinopla no sbado de Aleluia de 1096. Foi o incio do fim. Na sia Menor,depois de Civitot, uma parte desses cruzados mal armados que no sabiamcombater foi massacrada. Os sobreviventes pereceram quase todos de fome ou depeste, em frente a Antioquia.

    Estes ltimos viram chegar ento - melhor seria dizermos, por fim - o

    exrcito dos cruzados, o dos homens de armas que tinham acabado por seguir oexemplo dos mendigos. Fortemente armados, determinados, esses guerreirosapoderaram-se de Antioquia. O objetivo final estava prximo: Jerusalm, terraprometida. Os cantos elevaram-se mal avistaram as muralhas da cidade. Deixou dehaver mendigos e nobres, restando apenas cristos em xtase, maravilhados com asua faanha.

    A 14 de Julho de 1099, a tropa ps-se em movimento e atacou a cidade.Jerusalm foi conquistada, num fogoso mpeto, logo na manh do dia 15.

    No entanto, os cruzados no eram santos. De passagem, tinham pilhado eviolado, a ponto de os cristos orientais se terem visto forados a refugiar-se junto

    dos Turcos: inconcebvel. Em Jerusalm, tambm se no comportaram com umacaridade digna de nota. Inmeros muulmanos tinham-se refugiado na mesquitaAl-Aqsa; os cristos desalojaram-nos e fizeram uma hecatombe. Um cronistaanotava: L dentro, o sangue chegava-nos aos tornozelos, e Guilherme de Tiroprecisava: A cidade apresentava um espetculo tal de carnificina de inimigos, umatal efuso de sangue, que os prprios vencedores se sentiram chocados pelo horrore a repugnncia.

    Durante uma semana, sucederam-se os massacres e combates de rua, at o

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    odor do sangue provocar nuseas.

    O reino latino de Jerusalm

    No entanto, os cruzados tinham fincado p na Terra Santa e tencionavam

    ficar por l. Foi fundado o reino latino de Jerusalm. Godofredo de Bouillon foinomeado rei, mas recusou-se a cingir a coroa naquele lugar onde Cristo apenasusara uma coroa de espinhos. Godofredo, o rei cavaleiro do cisne, morreria poucodepois, em 1100.

    Para alm do reino de Jerusalm, que se estendia do Lbano ao Sinai,formaram-se progressivamente trs outros Estados: o condado de Edessa, a norte,meio franco meio armnio, fundado por Balduno de Bolonha, irmo deGodofredo de Bouillon; o principado de Antioquia, que ocupava, grosso modo, aSria do Norte, e, finalmente, o condado de Antioquia.

    Godofredo foi substitudo por Balduno I. A conquista fora realizada masagora tratava-se de conservar e administrar os territrios obtidos. Era convenienteconservar as cidades e as praas fortes e velar pela segurana das estradas. Oinimigo fora vencido, mas no eliminado. Fundaram-se ordens, a que foramatribudas misses diversas. Houve, entre outras, a Ordem Hospitaleira de

    Jerusalm, em 1110, a Ordem dos Irmos Hospitalrios Teutnicos, em 1112, e aOrdem dos Pobres Cavaleiros de Cristo (futuros Templrios), em 1118, quandoBalduno II era rei de Jerusalm.

    O nome de Ordem do Templo s aparece em 1128, por ocasio do Concliode Troyes, que codificou a sua organizao. Em 1130, So Bernardo escrevia o seu

    De laude novae militiae ad Milites Templi, para assegurar a divulgao da Ordem.Dentro em pouco, as doaes tinham-se tornado importantes, o recrutamento

    progredia e, quando o primeiro Gro-Mestre, Hugues de Payns, morreu, em 1136,sucedendo-lhe Robert de Craon, a Ordem do Templo j era coesa. Trs anos maistarde, Inocncio III reviu alguns aspectos da regra e concedeu ao Temploprivilgios exorbitantes.

    Em 1144, Edessa foi retomada pelos muulmanos, o que levou organizao da segunda cruzada, pregada por So Bernardo em 1147, enquanto aOrdem do Templo continuava a adaptar-se e desenvolver-se. A operao viria asaldar-se num malogro, mas, no terreno, os cruzados resistiam, ainda assim,bastante bem aos assaltos muulmanos. Todavia, Saladino conseguia, pouco apouco, unificar o mundo do Isl. Em 1174, apoderava-se de Damasco e, em 1183,

    de Alepo. Em seguida, aps o desastre de Hattin, onde morreram inmeroscristos, Saladino conseguiu retomar Jerusalm, em 1187, reduzindo assim o reinolatino regio de Tiro.

    Uma terceira cruzada foi organizada em 1190, quando Robert de Sabl eraGro-Mestre da Ordem do Templo. Viria a permitir reconquistar Chipre e Acra,em 1191. Reunia Filipe Augusto, Frederico Barba Ruiva e Ricardo Corao deLeo. Este ltimo bateu Saladino em Jafa e, depois, tendo sido vencido, tentouregressar a Inglaterra disfarado de templrio. Reconhecido, foi feito prisioneiro,

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    uma histria que bem conhecida de todos quantos, na infncia, vibraram com asaventuras de Robin dos Bosques. Infelizmente, ao contrrio do que reza a lenda,Ricardo Corao de Leo no foi o rei nobre que descrito com bonomia e estevelonge de se comportar sempre de forma cavaleiresca. Morreu em 1196, trs anosdepois de Saladino e de Robert de Sabl.

    Em 1199, foi decidida a quarta cruzada que teve muitas dificuldades para sepr a caminho. Quando os cruzados avistaram Constantinopla, em 1912,esqueceram o seu objetivo, conquistaram a cidade, pilharam aquele reino cristo eorganizaram os Estados Latinos da Grcia.

    No dealbar desse sculo XIII, Wolfram von Eschenbach escrevia o seuParzifal,onde os Templrios apareciam como os guardies do Graal.

    Depois de se ter desviado do seu objetivo, a Palestina, para pilhar o reinobizantino, a cavalaria ocidental - nomeadamente a francesa - deve ter dito a siprpria que no era necessrio ir to longe para enriquecer. Em 1208, foi pregadanova cruzada, mas esta consistia em ir sangrar o Sul de Frana, onde os Ctarosopunham a sua heresia a um clero local pouco convincente, porque demasiadocorrompido. Os bares do Norte preferiram ir matar os Albigenses a esbarraremnas cimitarras dos muulmanos.

    Mesmo assim, foi organizada uma quinta cruzada, entre 1217 e 1221.Terminou com a tomada de Damieta, no Egito, e sem mais xitos. Foi esta a pocaescolhida pelos Mongis para lanarem uma operao de invaso, criando umanova frente, muito difcil de manter. Sem muita dificuldade, apoderaram-se do Ir.Todavia, Frederico II de Hohenstaufen, imperador germnico excomungado pelopapa, devolvera Jerusalm aos cristos. O que as armas no haviam conseguido,obtivera Frederico II mediante negociaes diplomticas. Infelizmente, em 1244, aCidade Santa viria a cair nas mos dos Turcos.

    O fim de um reino e de uma ordem

    Durante todo este tempo, os Templrios estiveram praticamente em todas asfrentes, alimentando, graas gesto genial de um patrimnio ocidental colossal, oesforo de guerra no Oriente. Mas o povo, os nobres, comeavamindubitavelmente a cansar-se. As vitrias e as derrotas sucediam-se, tornavam-sebanais. J no existia o entusiasmo inicial. Em contrapartida, o Oriente influenciarao Ocidente. O contacto com outra civilizao deixara marcas. Tinham aparecidoprodutos novos nos mercados da Europa; haviam-se desenvolvido tcnicas e

    cincias graas a frutuosas relaes estabelecidas entre sbios e letrados das duascivilizaes.O Ocidente abria-se ao fascnio do Levante.Um homem pensava ainda ter o dever de levar o ferro, em nome de Cristo,

    ao seio dos infiis: So Lus. Em 1248, iniciou a catastrfica stima cruzada. Emnome de um ideal, desdenhava das realidades, recusando-se a ouvir aqueles que,como os Templrios, conheciam bem os problemas locais. Acumulou erros esofreu uma grave derrota em Mansur, enquanto os Mamelucos turcos

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    consolidavam o seu poder no Egito. Em 1254, So Lus regressou a Frana. Quatroanos mais tarde, os Mongis apoderaram-se de Bagdade, pondo fim ao califadoabssida. Em 1260, foram repelidos para a Sria pelos Turcos e, no ano seguinte, osGregos retomavam Constantinopla.

    Em 1270, So Lus, que nunca percebera nada e nem sempre retirara as

    lies da sua primeira campanha, participava na oitava cruzada. Encontrou a morteem frente a Tnis, nesse mesmo ano.Em 1282, foi concluda uma trgua de dez anos com o Egito, enquanto os

    Cavaleiros Teutnicos haviam decidido levar as suas espadas mais para norte e criarum reino na Prssia. Em 1285, Filipe III, cognominado o Audaz, que sucedera aSo Lus no trono de Frana, extinguia-se, deixando o lugar a Filipe IV, o Belo.

    Seis anos mais tarde, com a derrota de So Joo de Acre, no decurso da qualfoi morto o Gro-Mestre da Ordem do Templo, Guillaume de Beaujeu, a TerraSanta foi perdida e evacuada. Os Templrios retiraram para Chipre.

    Em 1298, Jacques de Molay tornou-se Gro-Mestre da Ordem: o ltimoGro-Mestre. Um ano mais tarde, organizou uma expedio ao Egito, mas o reinolatino de Jerusalm acabara de vez.

    Filipe, o Belo, teve violentos confrontos com o papa Bonifcio VIII, que oexcomungou, em 1303. O sumo pontfice morreu nesse mesmo ano. Em 1305, oseu sucessor, tambm ele em litgio com Filipe, o Belo, morreu envenenado e o reide Frana tornou papa um homem com quem fizera acordos: Bertrand de Got, quereinou sob o nome de Clemente V.

    Nesse mesmo ano, foram lanadas acusaes de extrema gravidade contra aOrdem do Templo, que assumiram a forma de denncias feitas perante o rei deFrana. Acusaes duvidosas mas que surgiam num bom momento: a Ordeminquietava, agora que o seu poder j no tinha onde se exercer no Oriente.

    Em 1306, Filipe, o Belo, sempre sem dinheiro, baniu os judeus do reino deFrana, no sem antes os ter espoliado dos seus bens e de ter mandado torturaralguns deles. Em 1307, mandou prender todos os templrios do reino e escolheupara tal fim a data de 13 de Outubro. A 17 de Novembro, o papa acedeu a pedir asua priso em toda a Europa.

    Foram realizadas acusaes estereotipadas e a instruo do processo fez-secom a ajuda da tortura. Mesmo assim, o papa tentou organizar a regularidade dosprocedimentos mas no ousou atacar diretamente o rei de Frana. Pouco a pouco,os Templrios tentaram formalizar a sua defesa mas, a partir de 1310, alguns delesforam condenados e conduzidos fogueira. Em 1312, quando do segundo conclio

    de Viena, a Ordem do Templo foi extinta sem ser condenada. Os bens dosTemplrios foram, teoricamente, devolvidos aos Hospitalrios de So Joo deJerusalm.

    A 19 de Maro de 1314, o Gro-Mestre, Jacques de Molay, e vrios outrosdignatrios foram queimados vivos. Um ms mais tarde, a 20 de Abril, morreu, porsua vez, o papa Clemente V. No dia 29 de Novembro ocorreu a morte de Filipe, oBelo.

    A Ordem do Templo extinguira-se mas a sua histria no terminara. Deixou

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    vestgios que, tal como as catedrais que ajudara a construir, transpuseram o tempo.Vivera dois sculos, perodo durante o qual a evoluo da civilizao ocidental foramuito importante, muito mais do que deixa entender a concepo esttica quegeralmente se tem em relao Idade Mdia. Dois sculos de evoluo econmica,de desenvolvimento do comrcio e do artesanato, de progresso nas artes. Dois

    sculos que marcaram para sempre o mundo.A Ordem do Templo esteve intimamente ligada a essa evoluo e esse no o menor dos mistrios que agora teremos de abordar.

    II

    O MISTRIO DAS ORIGENS

    Jerusalm, cenrio do nascimento da Ordem

    Antes das cruzadas, o Mediterrneo era um lago muulmano onde osBarbarescos quase faziam reinar a sua lei. De incio, tinham tolerado os peregrinosantes de os destrurem, tanto em terra como no mar. A cruzada deveria pr tudoem boa ordem, mas manter Jerusalm e mais algumas cidades ou praas fortes noera cobrir todo o territrio e a insegurana mantinha-se. Quanto capital, pareciapacificada.

    Godofredo de Bouillon mandara limpar rapidamente a cidade - enomeadamente os lugares santos - dos cadveres que o furor dos cruzadosacumulara. No Santo Sepulcro, instalara um captulo de vinte cnegos regulares,reunidos sob a denominao de Ordem do Santo Sepulcro. Envergavam um mantobranco ornado com uma cruz vermelha.

    Mandara tambm reparar as muralhas guarnecidas com torres que protegiama Cidade Santa e fora dispensado um cuidado muito especial s igrejas: Santa MariaLatina, Santa Madalena, So Joo Baptista e, claro, Santo Sepulcro, com a suarotunda ou anastasis, que albergava o tmulo de Cristo. Tambm fora ampliado umhospital que devia ser entregue aos Hospitalrios de So Joo de Jerusalm ereparara-se a mesquita de Omar, isto , a cpula do rochedo que exibia a pedrasobre a qual Jacob vira, em sonhos, a escada que conduzia ao cu. Quanto mesquita de Al-Aqsa, viria a tornar-se, em 1104, residncia do rei de Jerusalm,Balduno I, antes de ser devolvida aos Templrios, a partir de 1110.

    Quem era Hugues de Payns?

    Tudo mistrio nos primrdios da Ordem. Primeiro enigma, que no omais importante: a personalidade do seu fundador. Geralmente, d-se-lhe o nomede Hugues de Payns. Segundo os registos e as crnicas dessa poca, encontramo-lotambm sob os nomes de Paganensis, Paenz, Paenciis, Paon, etc. Guilherme deTiro designa-o como Hues de Paiens delez Troies, dando assim a sua origemgeogrfica. Com efeito, pensa-se geralmente que tenha nascido em Payns, a um

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    quilmetro de Troyes, por volta de 1080, no seio de uma famlia nobre aparentadacom os condes de Champagne. Era senhor de Montigny e teria mesmo sido oficialda Casa de Champagne, uma vez que a sua assinatura figura em dois registosimportantes do condado de Troyes. Pela famlia de sua me, era primo de SoBernardo, que lhe chamava amigavelmente carissimus meus Hugo. O irmo de

    Hugues de Payns teria sido abade de Sainte-Colombe de Sens. Casado, Huguesteria tido um filho que alguns autores transformam no abade de Sainte-Colombe,em lugar de seu irmo. Esse filho, que encontramos nos textos sob o nome deThibaut de Pahans, teve um dia alguns dissabores por haver empenhado uma cruze uma coroa de ouro ornada de pedrarias que pertenciam sua abadia. verdadeque foi por uma boa causa, dado que se tratava de conseguir cobrir as despesas dasua participao na segunda cruzada. Mas, mesmo assim...

    Em resumo, sabemos muito pouco sobre o cavaleiro de Champagnechamado Hugues de Payns. De Champagne... nem disso h a certeza. Foramavanadas outras hipteses quanto s origens da sua famlia. Entre outros,encontraram-se-lhe antepassados italianos ligados a Mondovi e a Npoles. Paraalguns, o seu nome verdadeiro teria sido Hugo de Pinos e seria necessrio procurara sua origem em Espanha, em Baga, na provncia de Barcelona, o que seria atestadopor um manuscrito do sculo XVIII, conservado na Biblioteca Nacional deMadrid.

    Sobretudo, afirma-se tambm que seria de Ardche, sado de uma famliaque inicialmente vivera na Alta Provena e que, depois, se teria fixado em Forez.Segundo Grard de Sde, os seus antepassados teriam sido companheiros deTancredo, o Normando. Hugues teria nascido a 9 de Fevereiro de 1070, no castelode Mahun, na comuna de Saint-Symphorien-de-Mahun, em Ardche. Alis, em1897, foi encontrado o registo de nascimento, mas pode tratar-se de uma

    homonmia. As suas armas teriam sido de ouro com trs cabeas de mouros,lembrando o apodo de seu pai. Este, natural de Langogne, em Lozre, eraconhecido, efetivamente, como o Mouro da Gardille. Laurent Dailoliez precisaque: A biblioteca municipal de Carpentras conserva um manuscrito que regista umadoao, de 29 de Janeiro de 1130, de Laugier, bispo de Avinho. Nessa ocasio,Hugues de Payns referido como originrio de Viviers, em Ardche.

    Tudo isso pareceria dar alguma credibilidade s origens de Hugues de Paynsem Ardche. Ficaria, portanto, por averiguar que circunstncias o teriam levado atornar-se oficial do conde de Champagne. Por isso, e porque existe um Payns pertode Troyes e tambm em razo do parentesco com So Bernardo, optaremos antes

    por uma origem champanhesa do primeiro Gro-Mestre da Ordem do Templo.

    A criao da Ordem do Templo e o policiamento das estradas

    Tambm a fundao da Ordem comporta muitas zonas obscuras.Analisemos, em primeiro lugar, a verso oficial tal como nos foi transmitida peloscronistas da poca. Guilherme de Tiro, nascido na Palestina em 1130, bispo de Tiroem 1175, no pde assistir ao incio da Ordem e, portanto, falava dele em funo

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    do que lhe fora contado.Jacques de Vitry era mais preciso, embora tenha escrito um sculo mais

    tarde. Devia estar de posse de alguns pormenores oficiais sobre os primrdios daOrdem, porque estava muito ligado aos Templrios. Poderemos, pois, pensar que oque se segue lhe foi contado diretamente por dignitrios do Templo: Alguns

    cavaleiros, amados por Deus e ordenados para o seu servio, renunciaram aomundo e consagraram-se a Cristo. Mediante votos solenes pronunciados perante opatriarca de Jerusalm, dedicaram-se a defender os peregrinos dos arruaceiros eladres, a proteger os caminhos e a servir de cavaleiros ao soberano rei.Observaram a pobreza, a castidade e a obedincia, segundo a Regra dos CnegosRegulares. Os seus chefes eram dois homens venerveis, Hugues de Payns eGeoffroy de Saint-Omer. Inicialmente, s houve nove que tomaram uma decisoto santa e, durante nove anos, serviram com vestes seculares e cobriram-se comaquilo que os fiis lhes deram como esmola. O rei, os seus cavaleiros e o senhorpatriarca encheram-se de compaixo por esses nobres homens que tudo haviamabandonado por Cristo e deram-lhes algumas propriedades e benefcios paraproverem s suas necessidades e pelas almas dos doadores. E porque no tinhamigreja ou casa que lhes pertencesse, o rei instalou-os no seu palcio, perto doTemplo do Senhor. O abade e os cnegos regulares do Templo deram-lhes, para asnecessidades do seu servio, um terreno que no ficava distante do palcio e, poressa razo, foram mais tarde chamados Templrios.

    No ano da graa de 1128, depois de terem ficado nove anos no palcio,vivendo todos juntos em santa pobreza, de acordo com a sua profisso, receberamuma Regra por interveno do papa Honrio e de Estvo, patriarca de Jerusalm,e foi-lhes atribudo um hbito branco. Isso foi feito no conclio realizado emTroyes, sob a presidncia do senhor bispo de Albano, legado apostlico, e na

    presena dos arcebispos de Reims e de Sens, dos abades de Cister e de muitosoutros prelados. Mais tarde, no tempo do papa Eugnio (1145-1153), puseram acruz vermelha nos seus hbitos , usando o branco como emblema de inocncia e o

    vermelho pelo martrio. [...] O seu nmero aumentou to rapidamente que embreve havia mais de trezentos cavaleiros nas suas assembleias, todos envergandomantos brancos, sem contar os inmeros servidores. Adquiriram tambm bensimensos deste e do outro lado do mar. Possuam [...] cidades e palcios, de cujosrendimentos entregavam, todos os anos, uma determinada soma para a defesa daTerra Santa, nas mos do seu soberano mestre, cuja residncia principal em

    Jerusalm.

    Jacques de Vitry dava tambm algumas indicaes sobre a disciplina quereinava no interior da Ordem. Poderamos recorrer tambm a Guilherme deNangis ou pedir alguma ajuda verso latina da sua Regra, que afirma noprembulo: pelas oraes de mestre Hugues de Payns, sob cuja direo a referidacavalaria teve incio pela graa do Esprito Santo.

    Que deveremos concluir? Que alguns cavaleiros renunciaram ao mundo sobo comando de Hugues de Payns para se colocarem ao servio dos peregrinos e queassim nasceu a Ordem do Templo.

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    Podemos dizer tambm que os Templrios foram apenas nove, durante noveanos, e esse nmero j foi muito glosado. Mas, quem eram esses nove paladinos.Para alm de Hugues de Payns, encontramos Geoffroy de Saint-Omer, umflamengo; Andr de Montbard, nascido em 1095 e tio de So Bernardo pela suameia-irm, Aleth. Havia tambm Archambaud de Saint-Aignan e Payen de

    Montdidier (por vezes designado pelo nome de Nivard de Montdidier), ambosflamengos. E, depois, Geoffroy Bissol, sem dvida originrio do Languedoque eGondomar, que talvez fosse portugus. Por fim, um tal Roral, ou Rossal, ouRoland, ou ainda Rossel, de quem nada mais sabemos, e um hipottico HuguesRigaud, que teria sido originrio do Languedoque.

    Uma vez mais, as informaes fiveis so muito tnues. Por que razo sejuntaram estes homens? Jacques de Vitry j no-lo disse: para defenderem osperegrinos dos arruaceiros, protegerem os caminhos e servirem de cavalaria ao seusoberano-rei.

    Na verdade, os exrcitos de cruzados que haviam permanecido no local notinham meios para dominarem todo o territrio, tanto mais que muitos homenshaviam regressado ao Ocidente. As cidades estavam bem controladas mas a maiorparte do pas continuava sob domnio muulmano. Algumas pequenas cidades nemsequer tinham guarnio crist. Os Francos contentavam-se com vagos patos deno agresso e obrigavam-nas a pagar um tributo. Alguns senhores rabesaproveitavam-se desta situao para efetuarem golpes de mo e assaltarem ascaravanas de peregrinos. Os camponeses muulmanos, para resistirem ao invasor,no hesitavam em organizar o bloqueio econmico das cidades a fim de asreduzirem fome ou capturavam cristos isolados e vendiam-nos como escravos.Nas prprias cidades ocorriam atentados. Em resumo, a segurana era uma palavra

    v.

    Havia uma estrada que era especialmente considerada exposta e poucosegura. Ligava Jafa a Jerusalm, e os egpcios de Ascalon faziam amide incursescontra ela. Os peregrinos s podiam circular por ela agrupados em pequenashostes, o melhor armados que fosse possvel. Hugues de Payns teria decididoremediar essa situao constituindo uma equipe para que guardassem os caminhos,l por onde os peregrinos passavam, dos ladres e salteadores que grandes males asoam fazer, como dizia Guilherme de Tiro.

    Hugues de Champagne e o nascimento da Ordem

    A Ordem do Templo foi fundada a 25 de Dezembro de 1118. Hugues dePayns e Geoffroy de Saint-Omer tinham prestado juramento de obedincia entre asmos do patriarca de Jerusalm no preciso dia em que Balduno era coroado rei.

    Mas nove cavaleiros no seriam bem poucos para guardar as estradas daTerra Santa? certo que poderemos supor que cada um deles deveria ter consigoalguns homens, sargentos de armas ou escudeiros. Isto era muito corrente, mesmoque tal no fosse referido.

    Mesmo assim, os primrdios foram bastante modestos e no devem ter

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    permitido que os primeiros Templrios desempenhassem a misso que,aparentemente, se haviam atribudo. Diz-se que guardavam o desfiladeiro de

    Anthlit, entre Cesareia e Caifa, no preciso local onde, mais tarde, edificaram ofamoso Castelo-Peregrino. Tal tarefa no deveria ser muito fcil, estando sediadosem Jerusalm.

    Quase desprovidos de meios, no podiam fazer muito. A lgica exigia queprocurassem recrutar pessoas para desempenharem melhor a sua misso. Eraindispensvel. E, no entanto, nada fizeram. Evitaram, inclusive, com muitocuidado, durante os primeiros anos, qualquer aumento da sua pequena hoste.Guilherme de Tiro e Mathieu de Paris so formais: recusaram toda e qualquercompanhia, excepto, em 1125 ou 1126, a do conde Hugues de Champagne, filho deThibaut de Blois, um senhor cujo condado era mais vasto do que o domnio real.Porqu esta recusa? Como possvel que aqueles nove cavaleiros no tenhamparticipado em qualquer operao militar, embora o rei no tenha parado decombater, de Antioquia a Tiberades, passando por Alepo?

    Tudo isto no convence e o papel de polcias das estradas parece, nestascondies, uma simples capa que disfara uma outra misso que deveriapermanecer secreta.

    talvez graas chegada de Hugues de Champagne que vamos perceber umpouco melhor o que se passou.

    Em 1104, depois de ter reunido alguns grandes senhores, dos quais um seencontrava em relao muito estreita com o futuro templrio Andr de Montbard,Hugues de Champagne partira para a Terra Santa. Tendo regressado rapidamente(em 1108), deveria voltar l em 1114 para regressar Europa em 1115, a tempo dedoar a So Bernardo uma terra onde este construiu a Abadia de Clairvaux.

    Em todo o caso, a partir de 1108, Hugues de Champagne tinha entabulado

    contatos importantes com o abade de Cister: Estvo Harding. Ora, a partir dessapoca, embora os cistercienses no fossem considerados habitualmente homens deestudos - ao contrrio dos beneditinos -, eis que comearam a estudarminuciosamente textos sagrados hebraicos. Estvo Harding pediu mesmo ajuda asbios rabinos da Alta Borgonha. Que razo poderia ter originado um entusiasmoto repentino por textos hebraicos? Que revelao se pensava que esses textospoderiam trazer para que Estvo Harding tenha posto, assim, os seus monges atrabalhar com o auxlio de sbios judeus?

    Neste quadro, a estada de Hugues de Champagne na Palestina pode parecercomo uma viagem de verificao. Podemos imaginar que documentos descobertos

    em Jerusalm ou nos seus arredores tenham sido trazidos para Frana. Foramtraduzidos e interpretados, e Hugues de Champagne teria ido ento procurarinformaes complementares ou ento verificar, no local, a correo dasinterpretaes e a validao dos textos.

    Sabemos, por outras fontes, o papel importante que So Bernardo, protegidode Hugues de Champagne, devia desempenhar na poltica do ocidente e noprogresso da Ordem do Templo. Escreveu a Hugues de Champagne, a propsitoda sua vontade de ficar na Palestina:

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    Se, pela graa de Deus, te fizeste conde, cavaleiro, e de rico, pobre,felicitamo-nos pelo teu progresso, dado que justo, e glorificamos a Deus em ti,sabendo que isto uma mutao mo direita do Senhor. Quanto ao resto,confesso que no suportamos com pacincia sermos privados da tua alegrepresena por no sei qual justia de Deus a menos que, de tempos a tempos,

    mereamos ver-te, se tal for possvel, o que desejamos mais do que todas ascoisas.Esta carta do santo cisterciense mostra-nos at que ponto os protagonistas

    desta histria esto ligados entre si e so capazes, portanto, de guardar o segredoem que trabalham. Alis, o prprio So Bernardo interessou-se muito de perto porantigos textos sagrados judeus. Em todo o caso, parece que Hugues de Champagneconsiderou as revelaes suficientemente importantes para legitimarem uma fixaona Palestina. Era casado e, para entrar na Ordem do Templo que acabara de secriar, era necessrio que a sua mulher aceitasse entrar para um convento. A caraesposa no entendia assim as coisas. Hugues de Champagne hesitou durante algumtempo mas, como a sua mulher lhe era notoriamente infiel, repudiou-a. Aproveitouesse fato para deserdar o filho, em relao ao qual tinha fortes desconfianas de noser seu, e abdicou de todos os seus direitos em favor de seu sobrinho, Thibaut.Entrou para a Ordem do Templo e nunca mais deixou a Terra Santa, onde faleceuem 1130.

    Quem seria capaz de nos fazer crer que repudiou a mulher e abandonoutudo para guardar estradas com pessoas que no queriam a ajuda de ningum, e issosob as ordens de um dos seus prprios oficiais?*

    [* provvel que Hugues de Payns tenha vindo para a Palestina ao mesmotempo que Hugues de Champagne, isto , em 1104. Com efeito, a primeira cruzadarealizou-se em 1099 e, nessa poca, Hugues de Payns ainda devia encontrar-se na

    Champagne, dado que a encontramos a sua assinatura num documento de 21 deOutubro de 1100.]

    Era preciso ser muito ingnuo, mesmo que tomemos em considerao que af capaz de dar origem a muitos abandonos. No se trataria antes de ajudar osTemplrios na verdadeira tarefa que lhes fora confiada e que Hugues deChampagne tinha boas razes para conhecer?

    Tudo iria acelerar-se. A Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo s foracriada oficialmente em 1118, isto , vinte e trs anos depois da primeira cruzada,mas foi apenas em 1128, a 17 de Janeiro, que recebeu o nome de Ordem doTemplo e a sua aprovao definitiva e cannica, mediante a confirmao da regra.

    At mesmo essas datas so contestadas por vezes e fala-se, respectivamente, de1119 e de 13 de Janeiro de 1128. Podemos pensar que os documentos que tudoindica terem sido trazidos da Palestina por Hugues de Champagne (que sem dvidaos descobrira juntamente com Hugues de Payns) no deixariam de estarrelacionados com o local que, em seguida, foi afetado ao alojamento dosTemplrios.

    O Templo de Salomo

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    O rei de Jerusalm, Balduno, atribuiu-lhes como alojamento uns edifcios

    situados no local do Templo de Salomo. Chamaram ao local caserna de So Joo.Fora necessrio mandar sair de l os cnegos do Santo Sepulcro que Godofredo deBouillon l instalara primitivamente. Por que razo no se procurara antes outra

    habitao para os Templrios? Que necessidade imperiosa havia de lhes oferecerpara toca aquele local em particular? De qualquer modo, a razo no tem nada quever com o policiamento das estradas.

    As caves eram formadas por aquilo a que se chamavam as estrebarias deSalomo. O cruzado alemo Joo de Wurtzburg dizia que eram to grandes e tomaravilhosas que podiam alojar-se l mais de mil camelos e quinze centenas decavalos. No entanto, foram afetadas na sua totalidade aos nove cavaleiros doTemplo que, antes de mais, se recusavam a fazer recrutamento. Desentulharam-nase utilizaram-nas a partir de 1124, quatro anos antes de receberem a sua regra eestimularem o seu desenvolvimento. Mas utilizaram-nas apenas como estrebariasou realizaram nelas buscas discretas? E que procuraram?

    Um dos manuscritos do mar Morto, encontrado em Qumran e decifrado emManchester em 1955-1956, referia quantidades de ouro e de vasos sagrados queconstituam vinte e quatro conjuntos enterrados sob o Templo de Salomo. Mas,nessa poca, esses manuscritos dormiam no fundo de uma gruta e, mesmo quepossamos imaginar a existncia de uma tradio oral a esse respeito, poderemospensar que as pesquisas foram orientadas antes para textos sagrados ou objetosrituais e no para vulgares tesouros materiais.

    Que podero ter encontrado no local e, antes de mais, que sabemos sobreesse Templo de Salomo de que tanto se fala? Para alm das lendas, muito pouco:nenhum vestgio identificvel por arquelogos; essencialmente, tradies veiculadas

    ao longo do tempo e algumas passagens na Bblia (no Livro dos Reis e nasCrnicas).

    Sem dvida que foi construdo cerca de 960 a. C. - pelo menos na sua formaprimitiva. Salomo, que desejaria construir um templo glria de Deus, fizeraacordos com o rei fencio Hiram que se comprometera a fornecer-lhe madeira (decedro e de cipreste). Enviar-lhe-ia tambm operrios especializados: canteiros ecarpinteiros recrutados em Guebal, onde os prprios egpcios costumavamcontratar a sua mo-de-obra qualificada.

    As obras duraram sete anos, abrangendo tambm um palciosuficientemente grande para albergar as setecentas princesas e trezentas concubinas

    do rei Salomo.O Templo era retangular. Entrava-se no vestbulo transpondo uma portadupla de bronze e, ento, encontravam-se duas colunas: Jachin e Boaz, tambm debronze. Seguia-se uma porta dupla, em madeira de cipreste, que permitia o acessoao hkal, ou local santo, uma sala com lambris de madeira de cedro e cheia deobjetos preciosos e sagrados: o altar dos perfumes, em ouro macio, a tbua dospes de orao, em madeira de cedro forrada a ouro, dez candelabros e lmpadasde prata, copos para libaes finamente cinzelados, bacias sagradas e braseiros que

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    serviam para a celebrao de sacrifcios. Em seguida, entrava-se no debir, uma salacbica onde se encontrava a Arca da Aliana. O conjunto era feito de pedrastalhadas, madeira e metais. Em frente ao Templo, o mar de bronze, grandereservatrio que podia conter cinquenta mil litros de gua, suportado por dozeesttuas de touros, dominava a esplanada. Os elementos de decorao eram

    cobertos de folhas de ouro. Todo o empedrado tinha placas de ouro. A prata e ocobre tambm se encontravam em profuso. Os metais preciosos estavamverdadeiramente em todo o lado, incluindo o telhado, onde agulhas de ouroimpediam que os pssaros pousassem. O Templo existiu sob esta forma at 586 a.C. Nessa data, Nabucodonosor cercou Jerusalm e apoderou-se dela. A cidade foiincendiada e o Templo de Salomo destrudo.

    Cerca de 572 a. C., Ezequiel teve a viso do Templo reconstrudo das suasrunas. No entanto, teve que esperar at 538 a. C. para se ver Zorobadel iniciar asua reconstruo. O novo santurio, muito mais modesto do que o precedente, foiarrasado pelo Selucida Antoco Epifnio. Herodes decidiu reconstru-lo. Durantedez anos, mil operrios trabalharam no estaleiro. O resultado foi grandioso, masdurou pouco, dado que o edifcio foi destrudo no tempo de Nero, menos de seteanos depois de ter sido terminado. Em 70 d. C., uma vez mais, Jerusalm foitomada e o Templo pilhado, por Tito. Os objetos sagrados, como o candelabro dossete braos e muitas outras riquezas, foram levados para Roma e apresentados aopovo, quando do triunfo de Tito. Quando os Templrios se instalaram no localonde se erguera, apenas restava do Templo um pedao do muro das lamentaes eum magnfico empedrado quase intacto. Em sua substituio, erguiam-se duasmesquitas: Al-Aqsa e Omar. Na primeira, a grande sala de orao foi dividida emquartos para servir de alojamento aos Templrios. Juntaram-lhe novas construes:refeitrios, adegas, silos.

    Os Templrios e a Arca da Aliana

    Parece que os Templrios fizeram descobertas interessantes no local. Mas,de que se tratava?

    Se a maior parte dos objetos sagrados desaparecera por ocasio das diversasdestruies, e nomeadamente quando do saque de Jerusalm por Tito, havia umque se volatilizando pura e simplesmente, no parecia ter sido retirado de l. Ora,fora para alojar esse objeto que Salomo construra o Templo: a Arca da Aliana,que continha as Tbuas da Lei. Uma tradio rabnica referida pelo Rabi Mannaseh

    ben Israel (1604-1657) explica que Salomo teria mandado fazer um esconderijosob o prprio Templo, para se colocar l a Arca, em caso de perigo. Essa Arcatinha a forma de uma caixa de madeira de acaju com dois cvados e meio (1,10 m)por um cvado e meio (66 cm), tendo tanto de altura como de largura. Tanto nointerior como no exterior, as paredes estavam cobertas com folhas de ouro. Ocofre abria-se para cima, por meio de uma tampa de ouro macio por cima da qualse viam dois querubins de ouro martelado, frente a frente, com as asas dobradas e

    viradas uma para a outra. Havia argolas fixadas, que permitiam a insero de barras

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    - tambm elas cobertas de ouro - para transportar a Arca que, assim, teria umaspecto igual ao de certos mveis litrgicos egpcios. Por fim, uma placa de ouroestava colocada sobre a tampa, entre os querubins. Este kapporet era consideradopelos Hebreus como o trono de Iav. Assim o afirma o xodo, onde Iav diz aMoiss:

    a que me encontrarei contigo, de cima do propiciatrio, do espaocompreendido entre os dois querubins colocados sobre a Arca do Testemunho,que te comunicarei as ordens destinadas aos filhos de Israel.

    Que quer dizer isso?Para os amantes de OVNIS, a Arca poderia ser uma espcie de receptor de

    rdio intergalctico que permitia receber mensagens vindas do espao ou de outrolugar. Para os outros, resta classificar isto na misteriosa rubrica dos objetos ditos deculto cujo destino no conhecido. Os querubins alados parecem sugerir homens

    voadores, anjos intermedirios entre os homens e os deuses. Pelo nosso lado,vamos abster-nos de dar qualquer opinio quanto a esta questo, mas nopoderamos afastar a priori nenhuma hiptese enquanto no for fornecida umaexplicao totalmente convincente, e sem dvida que no ser fcil explicar por querazo a Arca fora construda como um condensador eltrico.

    Em todo o caso, a Arca encontrava-se bem protegida. Paul Posson* lembraque era proibido tocar-lhe sem uma autorizao expressa para tal (e, muitopossivelmente, equipado com protees especiais), sob pena de se ser fulminado deimediato. Um dia, quando a transportavam, e porque ia mal segura, a Arca deu aimpresso de ir cair ao cho. Um homem precipitou-se para a segurar. Foi umainfelicidade, porque morreu imediatamente fulminado. Pode considerar-se que a

    Arca se protegia a si prpria, querendo dizer com isso que seria difcil admitir que aclera divina tenha fulminado algum apenas porque pretendera impedir que a Arca

    casse.*[Paul Posson,LeTestament deNo]

    A Arca foi, pois, colocada no Templo de Salomo, no ano 960 a. C. NoLivro dos Reis, Salomo dirige-se a Deus, atravs dela:

    O Eterno declarou que habitaria na escurido. Acabei de edificar uma casaque ser a Tua residncia, oh Deus, uma casa onde Tu habitars eternamente.

    Robert Laffont escreve:Curioso, tratando-se de um ser da Luz. De notar que Salomo parece fazer

    uma distino entre o deus a que se dirige e o Eterno.Tal como j dissemos, no parece que a Arca tenha sido roubada quando das

    diferentes pilhagens ou pelo menos, quando tal aconteceu, foi recuperada, deacordo com os textos. O seu desaparecimento por roubo teria deixado inmerosvestgios, tanto nos escritos como nas tradies orais. Apenas uma lenda sugere queela teria sido roubada pelo prprio filho de Salomo. Esse filho, que teria tido darainha do Sab, t-la-ia roubado para a levar para o reino de sua me. Mas estalenda pouco credvel e no encontramos nada que a possa apoiar, na Bblia.

    Louis Charpentier lembra:Quando Nabucodonosor tomou Jerusalm, no h qualquer referncia

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    Arca, no saque. Manda incendiar o Templo, em 587 a. C. E a Arca arde com ele.Diz Wegener:Ora, certo que a Arca foi enterrada. E Salomo no disse que ela ficaria

    na escurido? O que no podia ser o caso do Santo dos Santos.Charpentier v a prova disso num texto que refere:

    Quando a Arca da Aliana foi enterrada, levou-se para a ghenizah orecipiente que continha o man, porque estivera em contacto com as Tbuas daLei.

    Para Charpentier, isso no tem a menor dvida: a Arca ficou no local,escondida sob o Templo, e os Templrios descobriram-na. Esta afirmao deverser aceite com muita circunspeco, mas no deixa de ter interesse. Se admitirmos,por um instante, a sua validade como hiptese de investigao, torna-se lgicopensar que, entre 1104 e 1108, Hugues de Champagne e Hugues de Payns, umaespcie de aventureiros da Arca perdida, tenham conseguido descobrir documentosque permitiam localiz-la. O trabalho dos monges de Cister e dos sbios judeus queos ajudaram, teria consistido ento na traduo e interpretao dos textos,eventualmente, fragmentrios trazidos por Hugues de Champagne. Depois,munidos de informaes adequadas, e depois de terem obtido como alojamento olocal do Templo de Salomo, os primeiros cavaleiros do Templo teriam podidorealizar escavaes que conduziriam descoberta da Arca. Quanto a isto,Charpentier cita em primeiro lugar, como memria, uma tradio oral que faria dosTemplrios os detentores das Tbuas da Lei. Lembra o regresso ao Ocidente dosprimeiros templrios, em 1128. Assim, abandonavam a sua misso. claro que setratava de obter a fundao de uma ordem militar dotada de uma regra especial,mas seria necessrio, para tal, abandonar tudo no Oriente, durante um longoperodo? No bastaria enviar um embaixador, tanto mais que os cavaleiros no

    tiveram a menor dificuldade em obter o que desejavam graas fora dos apoios deque beneficiavam? Ora, o preliminar da regra que ento lhes foi dada por SoBernardo comeava assim:

    Bem agiu Damedieu conosco e com o Nosso Salvador Jesus Cristo, o qualenviou os seus amigos da Santa Cidade de Jerusalm Marca de Frana e daBorgonha [...].

    Charpentier comenta e sublinha:A obra realizada com a ajuda deNous. E os cavaleiros foram mesmo

    mandados Marca de Frana e da Borgonha, isto , Champagne, sob a proteodo conde de Champagne, onde podem ser tomadas todas as precaues contra

    qualquer ingerncia dos poderes pblicos ou eclesisticos: naquele lugar onde,nessa poca, se pode garantir melhor um segredo, uma vigilncia, um esconderijo.E Charpentier pensa que os Cavaleiros do Templo, ao regressarem ao

    Ocidente, traziam, se assim o podemos dizer, nas suas bagagens, a Arca da Aliana.E precisa:

    No portal norte de Chartres, o portal chamado dos Iniciados, existemduas colunatas esculpidas em relevo e ostentando, uma, a imagem do transporte da

    Arca por uma junta de bois, com a legenda:Archa cederis; a outra, a Arca que um

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    homem cobre com um vu, ou agarra com um vu, perto de um monte decadveres entre os quais se distingue um cavaleiro de cota de malha; a legenda :Hicamititur Archa cederis (amititurpossivelmente em vez deamittitur).

    Ter de ver-se a um indcio suficiente para apoiar a tese de Charpentier?Podemos, temos inclusive o dever de sermos extremamente cpticos. No entanto,

    mesmo a Arca da Aliana que parece estar representada, em cima de um carro dequatro rodas, em Chartres. Com efeito, uma escultura idntica, representando otransporte da Arca, encontra-se nas runas da sinagoga de Cafarnaum. Essarepresentao mostra que, em Chartres, se atribua um interesse muito especial aotransporte da Arca e poderia significar que os escultores no ignoravam que elafora deslocada. Isso no quer dizer, de modo algum, que tenha sido trazida para oOcidente pelos Templrios, nem sequer que estes tenham uma relao especial comessa deslocao. Precisamente, poderemos observar que a decorao da catedral deChartres evoca mais de uma vez os cavaleiros do Templo.

    O outro segredo de Salomo

    O segredo descoberto no local do Templo pelos Templrios pode no terqualquer relao com a Arca da Aliana, embora continue ligado a Salomo. Dequalquer modo, foroso reconhecer que h muitos pontos comuns entre osTemplrios e este rei. Em primeiro lugar, temos de lembrar que, logo no incio,Hugues de Payns e os seus amigos tinham tomado o nome de Pobres Cavaleirosde Cristo e isso at terem ocupado o local do Templo de Salomo - pelo menos o que geralmente se diz. Ora, a partir do momento em que obtiveram a sua regra(logo, aps as suas possveis descobertas), l-se no prlogo da verso francesa:Aqui comea a regra da pobre cavalaria do Templo.

    Muito em breve encontramos nas doaes que lhes foram feitas os ttulos decavaleiros do Templo de Salomo. A expresso no veio, pois, por hbito e foidecidida muito rapidamente. Notemos, por outro lado, que o minnesngeralemo,Wolfram von Eschenbach, que se afirmava Templrio, escrevia no seuParzivalqueo Graal fora transmitido por Flgtanis, da linhagem de Salomo, e que osTemplrios eram os seus guardies. Voltaremos a este ponto. Pensemos tambmna construo do Templo que Salomo confiara a mestre Hiram. O arquiteto,segundo a lenda, foi morto por companheiros invejosos aos quais recusara adivulgao de determinados segredos. A seguir ao desaparecimento de Hiram,Salomo enviara nove mestres sua procura, nove mestres como os nove primeiros

    Templrios procura do arquiteto dos segredos. E depois, Salomo, tal como osTemplrios, apostou muito no comrcio, sobretudo dos cavalos. Quis ter uma frotacomercial para facilitar o seu negcio e os Templrios, por sua vez, possuram umafrota poderosa. Que pensava disso So Bernardo que fez a propaganda dosTemplrios e escreveu sobre o Cntico dos Cnticos, atribudo ao rei Salomo?

    A prpria personalidade de Salomo interessante de estudar, neste quadro. smbolo de justia: o seu julgamento clebre; smbolo de sabedoria, tambm.Rei dos poetas, autor do Cntico dos Cnticos que alguns pensam ser um

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    documento cifrado, uma espcie de testamento de adepto.No podemos falar de Salomo sem lembrarmos a rainha do Sab. Esta

    chegou a Jerusalm acompanhada por uma magnfica caravana de cameloscarregados de presentes fabulosos. Balkis, a magnfica, vinha pr prova Salomo,cuja reputao chegara at ela e tinha a inteno de lhe apresentar enigmas muito

    difceis de resolver. O Coro contm, a propsito da visita de Balkis, reflexesbastante interessantes. Assim:Salomo herdou de David e disse: Homens! Ensinaram-nos a linguagem

    dos pssaros, e, de todas as coisas, fomos contemplados copiosamente. Naverdade, esse por certo um favor evidente!

    A aluso linguagem dos pssaros deixa entender que Salomo tinhaconhecimento dos segredos ocultos da natureza. Esse tipo de denominao erabem conhecido dos trovadores e leva-nos de volta escrita do Cntico dosCnticos de Salomo, estudado de perto por So Bernardo. Mas, regressemos aoCoro:

    As tropas de Salomo, formadas por Djinns, Mortais e Pssaros foramreunidas sua frente, divididas por grupos. Assim, Salomo tinha ao seu serviohomens mas tambm gnios - isto , conhecia os elementares * - e pssaros, isto, seres voadores.

    *[O Esprito dos elementos, segundo o ocultismo. (N. do E.)]Ento, Arca da Aliana, segredos de arquitetura, linguagem dos pssaros? Ou

    outra coisa encontrada na Palestina? Mas o qu? Segredos ligados a Jesus? suavida? A Maria Madalena? Ao Graal, talvez...

    Sat prisioneiro

    Consideremos mais uma possibilidade, por mais louca que seja. Segundo oApocalipse de So Joo, depois de ter sido vencido e expulso do cu com os anjosque foram afastados da graa divina, Sat acorrentado no abismo. Ora, a tradioafirma que esse abismo tem sadas e que estas se encontram obturadas. Uma delasencontrava-se, precisamente, selada pelo Templo de Jerusalm. O quartel dosTemplrios ficaria, pois, situado num local de comunicao entre diferentes reinos,caracterstica comum da Arca da Aliana. Ponto de contacto tanto com o Cucomo com os Infernos, um dos locais sagrados sempre ambivalentes, dedicadostanto ao bem como ao mal. Um local de comunicao ideal de que os Templriosse teriam tornado guardies.

    Uma lenda referida pelo Senhor de Vog conta que, na poca de Omar, umhomem, ao debruar-se, avistou uma porta no fundo do poo donde tirava gua.Desceu ao poo e transps a porta. Apareceu-lhe um jardim magnfico. Arrancouuma folha de uma rvore e trouxe-a como prova da sua descoberta. Mal saiu,apressou-se a ir prevenir Omar. Correram para l, mas a porta desaparecera eningum voltou a encontr-la. Ao homem restou apenas a folha que nuncamurchou. Isto passava-se no local do Templo de Salomo. Uma tradio mais paratransformar o local numa passagem entre diversos nveis e reinos.

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    Relata-se tambm que o Templo de Salomo fora precedido, no local, porum templo pago dedicado a Poseidon. Ora, ignora-se demasiadas vezes quePoseidon s muito tardiamente se tornou deus do mar. Antes, tinha a posio deDeus supremo e foi apenas com a chegada Grcia dos Indo-Europeus que Zeusassumiu a liderana das divindades. Poseidon fora, no tempo dos povos pelasgos, o

    Deus criador, demiurgo que tinha um lugar privilegiado nas guas-mes salgadas.Era o grande agitador das terras, senhor das foras telricas e, em alguns aspectos,aproximava-se de Sat.

    Eugne Delacroix, iniciado da Sociedade Anglica, sabia-o bem quandodecorou o teto da capela dos Santos Anjos, na igreja de Saint-Sulpice, de Paris.Pintou nela So Miguel a deitar ao cho o demnio. Ora, esse demnio das origens,representou-o sob a forma de Poseidon, perfeitamente reconhecvel devido aosseus atributos.

    Muito bem! Os Templrios encarregados de guardarem os locais por ondeSat poderia evadir-se da priso que lhe fora atribuda na noite dos tempos, algoque parecer, sem dvida, grotesco a muitos leitores modernos mas que seriaconveniente reinserir nas crenas da poca. E, depois, nunca se sabe... Tanto maisque Salomo tambm mandou construir santurios para divindades estrangeiras.Mandou dedicar, nomeadamente, templos Astart, a abominao dosSidonenses e Milkom, o horror dos Amonitas. O deus ciumento de Israeldeve ter ficado furioso. Nesse campo, Salomo no se limitaria a ceder s pressesdas inmeras concubinas estrangeiras? Se agiu desse modo, que no teria feito emrecordao da rainha do Sab, cujo reino podemos localizar, sem a menor dvida,no lmen? Na sua maioria, os deuses do pas de Baffis cheiravam muito a enxofre.

    Os Templrios e os segredos de Salomo

    Em resumo, podemos considerar como uma quase certeza o fato de Huguesde Payns e Hugues de Champagne terem descoberto documentos importantes, naPalestina, entre 1104 e 1108. Esses achados estiveram, sem dvida, na base daconstituio dos nove primeiros Templrios e devemos lig-los deciso de lhesatribuir, como residncia, o local do Templo de Salomo. A, levaram a caboescavaes. Nessa fase, estava fora de questo aumentarem os seus efetivos, porcausa do segredo. As suas pesquisas devem t-los levado a encontrar algo realmenteimportante, pelo menos a seus olhos. A partir desse momento, a poltica da Ordemmudou.

    Que tinham encontrado? A Arca da Aliana? Um modo de comunicaremcom poderes exteriores: deuses, elementares, gnios, extraterrestres ou outros? Umsegredo relativo utilizao sagrada e, por assim dizer, mgica da arquitetura? Achave de um mistrio ligado vida de Cristo ou sua mensagem? O Graal? Aforma de reconhecer os locais onde a comunicao, tanto com o Cu como com osInfernos, facilitada, com o risco de libertar Sat ou Lcifer?

    Poderamos pensar que nos encontramos numa novela de H. P. Lovecraft, certo, mas estas perguntas, embora no sejam racionais, surgem imperativamente

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    no contexto da poca.Iremos procurar, ao longo dos prximos captulos e dos indcios que nos

    iro ser fornecidos pela histria da Ordem, separar o trigo do joio e restringir osnossos pressupostos, explicar por que razo, a partir de ento, a poltica dosTemplrios mudou brusca e radicalmente.

    III

    SO BERNARDO E OS MONGES-GUERREIROS

    Obter uma regra

    Em 1127, quando Hugues de Payns regressou ao Ocidente em missoespecial, encontrava-se acompanhado por mais cinco Templrios. Ora, ainda eramapenas nove, ou talvez dez. Logo, tinham ficado apenas trs ou quatro no Orientepara assegurarem a falada proteo dos peregrinos. Mesmo que tivessem juntodeles alguns sargentos de armas, a hoste deveria ser bem magra no caso de umrecontro com o inimigo. Decididamente, essa misso era muito mal desempenhada.Isso prova insofismavelmente que apenas se tratava de um disfarce. Alis, houveque esperar at 1129 para se ver os Templrios enfrentar pela primeira vez osinfiis em combate. Isso no impediu os modestos guardies do desfiladeiro de

    Athlit de se verem chamados ilustres pelas suas faanhas guerreiras inspiradasdiretamente por Deus, e isso ainda antes de se terem batido verdadeiramente. Apropaganda no , por certo, uma inveno moderna, mas, este exemplo especialmente interessante. Mostra que a publicidade que lhes foi feita no sebaseava numa realidade e se integrava, deliberadamente, naquilo que podemos

    considerar uma segunda fase da Ordem: o seu desenvolvimento e a suatransformao numa ordem militar. Do pequeno nmero discretamente ocupadocom a descoberta de segredos importantes, passava-se procura do poder, o queindica que as pesquisas tinham, sem dvida, dado os seus frutos e estavamterminadas. Convinha, desde logo, pr em execuo a poltica que elas tivessemsugerido e podemos perguntar-nos se, a partir desse momento, no existiu uma

    vontade de criar uma espcie de poder sinrquico que se sobreporia aos reinos.Hugues de Payns parou em Roma, antes de seguir para a Champagne. Ali,

    encontrou-se com o papa Honrio II (1124-1130) que se interessava muito poraquela Ordem nascente. Em Janeiro de 1128, Hugues de Payns encontrava-se em

    Troyes para participar no conclio onde foi proposto adotar uma regra especial paraa Ordem do Templo. O texto, nas suas linhas gerais, fora elaborado em Jerusalm.Tratava-se tambm de dar a conhecer a Ordem, de comear a recrutar, recolherddivas, estimular a fundao do poder futuro do Templo. Hugues de Payns tinhano bolso a carta de recomendao do rei de Jerusalm, Balduno II; que sem dvidafinanciara a viagem. Dirigia-se a So Bernardo e pedia-lhe que desse o maior apoioaos projetos de Hugues de Payns e dos seus companheiros. Pelo seu lado, opatriarca de Jerusalm pedia ao papa a concesso de uma regra especial a esses

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    monges.A carta de Balduno II a So Bernardo referia:Os irmos Templrios, que Deus inspirou para a defesa desta provncia e

    protegeu de uma forma notvel, desejam obter a confirmao apostlica bem comouma regra de conduta. Devido a isso, enviamos Andr e Gondemarc, ilustres

    devido s suas proezas guerreiras e pela nobreza do seu sangue, para que solicitemao Soberano Pontfice a aprovao da sua ordem e se esforcem por obter delesubsdios e ajudas contra os inimigos da f, coligados para nos suplantarem ederrubarem o nosso reino. Sabendo bem quanto peso poder ter a vossaintercesso, tanto junto de Deus como do seu vigrio e dos outros prncipesortodoxos da Europa, confiamos vossa prudncia esta dupla misso cujo xitonos ser muito agradvel. Fundamentai as constituies dos Templrios de talforma que eles se no afastem dos rudos e dos tumultos da guerra e continuem aser os auxiliares teis dos prncipes cristos... Fazei de maneira que possamos, seDeus o permitir, ver em breve uma concluso feliz desta questo.

    Dirigi por ns oraes a Deus. Que Ele vos tenha na Sua Santa Guarda.

    So Bernardo

    So Bernardo deveria, efetivamente, desempenhar um papel importante noprogresso da Ordem. Convm determo-nos um pouco nesta personagem sobre aqual Marie-Madeleine David escreve:

    Bernardo o homem mais representativo do renascimento do sculo XII.Nascido no final do sculo XI, em 1090, e falecido em 1153, insere-se em

    plena poca de fecundidade intelectual e de transformaes econmicas e sociais.Nascido no castelo de Fontaine, a noroeste de Dijon, era o terceiro filho da

    Dwna Aleth. Antes do seu nascimento, a sua me tivera sonhos curiosos. Via o seufuturo filho sob a forma de um cozinho que ladrava furiosamente. Inquieta,abrira-se com um religioso que a acalmara afirmando-lhe que, mais tarde, o seufilho apenas ladraria para defender a Igreja.

    O pai de Bernardo, Tescelin, era senhor do castelo de Fontaine e os seuscompatriotas tinham-no apodado de o baio, porque era loiro-arruivado. Tinha afama de ser um homem de honra, corajoso e fiel ao seu suserano, o duque daBorgonha.

    Aleth, que era filha do duque de Montbard, velara por que o seu filhorecebesse uma boa educao. Confiara-o, pois, aos cnegos de Saint-Vorles, em

    Chtillon-sur-Seine. Eles haviam-lhe ensinado o trivium (gramtica, retrica,dialctica) e o quadrivium(aritmtica, msica, geometria, astronomia) e tinham-noobrigado a ler Ccero, Virglio, Ovdio, Horcio. Tambm o tinham ajudado a

    vencer uma timidez quase doentia.Foi na igreja de Saint-Vorles que caiu em xtase perante Maria, vendo aquela

    imagem da Me de Deus, feita de uma madeira que a idade escureceu mais do queo sol. Fora essa virgem negra de madeira que, miraculosamente, teria apertado oseu seio, de modo que teriam cado trs gotas de leite nos lbios de Bernardo.

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    Os seus contemporneos descreviam o jovem Bernardo como belo, esbelto,com uma cabeleira revolta, um olhar que se impunha. Mas essa beleza no era paraas mulheres, porque pretendia preservar a sua castidade. Um dia, pensando queolhara uma mulher com demasiada complacncia, fora mergulhar num lago geladopara apagar o desejo que sentia crescer dentro de si. Do mesmo modo, tratara com

    desprezo uma outra mulher que viera meter-se, nua, na sua cama. Pelo menos, oque conta a sua lenda dourada. De qualquer modo, escolheu o claustro quecomparava escola de Deus. Robert Thomas lembra-nos como So Bernardo viaos monges:

    Tal como os anjos, vivem puros e castos; tal como os profetas, elevam osseus pensamentos acima das coisas da terra; tal como os apstolos, deixam tudo e

    vo ouvir a palavra do Mestre, record-la nos seus coraes, esforar-se por aguardar, por a pr em prtica. Cada mosteiro ser uma escola onde Jesus ensina.

    So Bernardo escolheu Cister onde entrou, no tempo do abade EstvoHarding, com cerca de trinta companheiros que mais ou menos arrastara consigo.

    Definia-se como algum que procurava Deus e pensava que, neste caso,quem procura, encontra. Era exigente com os outros mas, antes de mais, consigomesmo. Recusava-se a respeitar apenas o voto de obedincia que lhe no pareciaum compromisso suficiente. Era necessrio ir alm disso. No podia compreenderque um monge se ficasse pelo mnimo obrigatrio. Escrevia:

    A obedincia perfeita ignora o que apenas uma lei, no est encerrada emlimites; a vontade vida estende-se at aos limites da caridade, entrega-se por simesma a tudo o que lhe proposto e, com o fervor de uma alma ardente egenerosa, vai sempre em frente, sem ter em conta limites ou medidas. Para ele amedida de amar a Deus amar sem medida.

    Bernardo no se contentava com meditar, adorar. Estudava tambm. Lia as

    escrituras, comentava-as, dissecava-as, at, procurando ir at fonte em vez de selimitar aos comentadores precedentes. O que estava em jogo em tudo isto:conhecer-se a si mesmo e conhecer Deus. Mas conhecer-se consiste tambm emdescobrir quo insignificante se . No entanto, a sua atitude na vida desmentiu,amide, essa aparente humildade.

    So Bernardo, o admirado e o temido

    Bernardo em breve se tornou notado e foi a ele que se confiou a fundaoda abadia de Clairvaux, em 1115, num local que tinha o belo nome de Vale de

    Absinto. Afirmou-se l e continuou a pregar a humildade, e nem por isso deixou deser cada vez mais seguro de si, a tal ponto que necessrio ser um hagigrafo paranegar o orgulho de So Bernardo. Afirmava:

    Os assuntos de Deus so meus e nada do que lhe diz respeito estranhopara mim.

    O que mais extraordinrio que, em seu redor, todos achavam isso normalde tal modo a sua personalidade era, ao mesmo tempo, forte e sedutora. Estavadotado de uma energia e de uma vontade sem falhas, daquelas que fazem vergar as

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    pessoas em seu redor. Para alm da autoridade e da violncia verbal, sabia manejartambm a delicadeza e a persuaso. Bernardo foi um ser dplice, dividido entre ameditao e a ao. To depressa arrastava os irmos, repreendia os grandes,influenciava a poltica de todo o Ocidente, como se retirava para uma choupana ese entregava a mortificaes at esgotar o seu corpo e o tornar doente, semelhante

    a um arco que, depois de ter sido distendido, retesado de novo, recupera toda a suafora: como uma torrente retida por uma barragem que, liberta, retoma aimpetuosidade do seu curso, regressa s suas prticas, como se tivesse pretendidocastigar-se por esse repouso, e reparar as perdas da ascese interrompida.

    Robert Thomas escreve:Uma sade arruinada, um corpo extenuado, uma alma que, at ao fim, ser

    senhora daquele corpo e lhe far a vida dura, assim Bernardo.Dedicou-se Ordem de Cluny para a qual defendeu uma reforma monstica.

    Acusava os monges clunicenses de terem costumes dissolutos. Compreenderemosfacilmente, com base nisso, que So Bernardo no defendesse para os Templriosuma regra especialmente suave e que se esforasse por os tornar aguerridos atravsda prpria dureza da vida que deveriam levar.

    Bernardo foi tambm quem lutou contra Abelardo, at o ter derrubado,aniquilado social e psicologicamente. Abelardo era um mestre com uma inteligncianotvel que ensinava uma juventude estudantil que o adulava. Dialctico brilhante,gostava das lides oratrias mais por elas mesmas do que pelo seu contedo. Tinhauma tendncia ntida para o racionalismo e no admitia que, para um problemareligioso, a nica resposta avanada fosse: um mistrio. Crer e no discutir erainconcebvel para ele. Bernardo considerava perigoso o seu ensino, tanto maispernicioso quanto as suas teses eram, amide, sedutoras. Ops-se-lhe

    violentamente e redigiu um tratado dos erros de Abelardo que dirigiu ao papa

    Inocncio III. No parou enquanto o no conseguiu condenar. A esse respeito,Dom Jean Leclerq escreveu:

    Esse excesso de injrias, de acusaes baseadas em denncias sumrias,traa, em So Bernardo, uma paixo mal dominada.

    Este episdio no , certamente, o mais glorioso da vida de So Bernardo.

    O culto da Dama Celeste

    Bernardo teve tambm um amor louco por Maria, embora tenha escritomuito menos sobre esse tema do que acerca de outros. As poucas pginas que

    deixou sobre a Virgem ressumam literalmente fervor e amor. Inventou uma oraoa Maria, na qual ela aparece como a Rainha da Salve Regina, que intercede emprol dos homens, junto de Cristo, a Virgem coroada que aceitou a provaodesejada por Deus, triunfou sobre ela, capaz de mostrar o caminho aos homens.

    A devoo de Bernardo Virgem parece profunda, o que no to habitual na suapoca. Da, poderemos imaginar que no tenha sido alheio venerao que osTemplrios sempre tiveram por Nossa Senhora.

    Todavia, tenhamos cautela porque talvez se tenha tendncia para atribuir

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    uma importncia desmesurada a So Bernardo, a partir do momento em que setrata dos Templrios. Baseando-nos nos depoimentos prestados por estes ltimosno seu processo - dois sculos mais tarde - poderamos pensar que fora o prprioBernardo quem redigira a sua regra. Na verdade, mesmo que seja quase certo quemeteu a sua mo na tarefa, deve ter trabalhado a partir de um texto prvio redigido

    pelo patriarca de Jerusalm, Estvo de La Fert. O que certo que tornou maisfcil a sua aprovao e, nesse sentido pelo menos, os Templrios deveram-lhe a suaregra. Assim, Bernardo enviou uma carta a Thibaut de Champagne, dizendo-lhe:

    Dignai mostrar-vos cheio de solicitude e de submisso pelo legado, emreconhecimento por ter escolhido a vossa cidade de Troyes para a realizao de umgrande conclio, e dignai-vos dar o vosso apoio e a vossa assistncia s medidas eresolues que este julgar convenientes no interesse do bem.

    O pedido no est isento de uma certa firmeza. No entanto, por detrs deum So Bernardo aparentemente na primeira linha, esconde-se talvez uma outrapersonagem cuja importncia, nos bastidores do Templo, nos parece considervel.

    Estvo Harding e a tradio hebraica

    Podemos interrogar-nos quanto ao fato de saber quem foi, quanto ao fundo,a personagem mais importante para a constituio da Ordem do Templo: SoBernardo ou Estvo Harding, abade de Cister, que congeminara tudo, desde oincio, com Hugues de Champagne?

    Ingls de origem, Estvo Harding fora, inicialmente, monge no mosteiro deSherbone. Depois, prosseguira estudos na Esccia e, em seguida, em Paris e emRoma. Marion Melville lembra o que dele dizia Guillaume de Malmes:

    Sabia casar o conhecimento das letras com a devoo; era corts nas suas

    palavras, risonho no rosto: o seu esprito rejubilava sempre no Senhor.Depois de uma passagem por Molesmes, fundara Cister. Alguns anos mais

    tarde, tornara-se o seu terceiro abade.Estvo Harding acumulara quase todos os conhecimentos intelectuais que

    podiam adquirir-se nessa poca. Reformou a liturgia e fez da sua abadia um centrocultural nico. Empreendeu um trabalho gigantesco: a redao da Bblia de Cister,com um esprito de correo crtica notvel. Para o ajudarem, recorrera a sbios

    judeus. De acordo com as suas observaes, mandou efetuar duzentas e noventacorrees e cinco versculos completos de Samuel foram completamente reescritos.Findo isso, Estvo Harding proibiu que se tocasse numa s palavra daquela Bblia.

    Daniel Rju refere que uma personagem curiosa vivia ento em Troyes: orabino Salomon Rachi (1040-1105). Foi considerado o maior exegeta dos textoshebraicos e o principal comentador e intrprete do Talmude. Analisava sempre ostextos a trs nveis: literal, moral e alegrico.

    difcil saber se Estvo Harding conheceu pessoalmente Rachi, dado queeste morreu em Praga, em 1105. Em todo o caso, bastante provvel que os seusgenros tenham vindo trabalhar para Cister, ao lado dos monges, para facilitar atraduo de documentos sagrados especialmente difceis de interpretar. Por este

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    meio indireto, os Templrios beneficiaram de um apoio extremamente importantepara a pesquisa que pareciam estar a levar a cabo no Ocidente.

    So Bernardo partilhou, sem dvida, o interesse de Estvo Harding pelostextos hebraicos, embora as provas sejam escassas. Em todo o caso, ergueu-semuitas vezes contra as perseguies que os judeus tiveram de sofrer um pouco por

    toda a Europa. Fustigou os autores dos pogroms e manifestou bastante maisindulgncia religiosa pelos judeus do que pelos ctaros.

    O conclio de Troyes: para uma regra feita medida

    Claro que Estvo Harding participou no conclio de Troyes, mas teria sidopor qualquer coisa relacionada com a redao da regra? Isso mais difcil de dizer.

    Alguns quiseram ver nesse texto uma espcie de cpia das regras de vidaobservadas pelos essnios, no tempo de Cristo. Mas que se sabia, no sculo XII,sobre esses essnios que nos foram sobretudo revelados graas descoberta dosmanuscritos do mar Morto, em Qumran? Seriam veiculadas tradies a elesrespeitantes nos meios judaizantes? Teriam os prprios Templrios descoberto, poracaso, documentos essnios? Por certo temos de relegar isto para o campo dassimples conjecturas.

    Em todo o caso, o conclio de Troyes reuniu-se no dia da festa do SenhorSanto Hilrio, no ano da Encarnao de Jesus Cristo de 1128, ao nono ano doincio da supramencionada cavalaria. A assembleia consular foi presidida pelolegado do papa: Mathieu d'Albano. Assistiram a ela os bispos de Sens, Reims,Chartres, Soissons, Paris, Troyes, Orlans, Auxerre, Meaux, Chlons-sur-Marne,Laon, Beauvais. Encontravam-se tambm presentes vrios abades, entre os quaisEstvo Harding, claro, e leigos como Thibaud de Champagne e o conde de

    Nevers. Entre todas estas personagens, algumas eram amigas de So Bernardo.Logo no prlogo da regra, apercebemo-nos de que a publicidade da Ordem

    estava pronta para favorecer o seu progresso e que o conjunto se inseria num planodeliberado, a longo prazo. Pode ler-se:

    Falamos, em primeiro lugar, a todos quantos desprezam ir atrs das suasprprias vontades e desejam, com pura coragem, servir como cavalaria aosoberano-rei, e com um desvelo aplicado desejam vestir e vestem perpetuamente amuito nobre armadura da obedincia. E, portanto, admoestamo-vos - a vs quehaveis seguido, at agora, secular cavalaria na qual Jesus Cristo no tomou parte,mas que seguistes apenas por favor humano - a seguir aqueles que Deus escolheu

    da massa da perdio e ordenou, pela sua agradvel piedade, para a defesa da SantaIgreja, e a que vos apresseis a juntar-vos a eles perpetuamente [...].Hugues de Payns exps, perante a douta assembleia, as necessidades da

    Ordem, tal como as concebia. Depois, o texto foi estudado e discutido, artigo apsartigo. A regra latina que da resultou compreendia setenta e dois artigos. Tudo, ouquase tudo, estava previsto nela: os deveres religiosos dos irmos, os regulamentosque fixavam os atos quotidianos (refeies, distribuio de esmolas, vestes,armamento, etc.), as obrigaes dos irmos uns em relao aos outros, as relaes

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    hierrquicas...A preocupao com o pormenor foi levada muito longe, dado que se decidia

    nela como seriam feitos os sapatos, como se cortariam os bigodes, o nmero deoraes a recitar nesta ou naquela ocasio, etc.

    Tratava-se de adaptar uma regra monstica aos imperativos com que os

    guerreiros deparavam. Aos Templrios, por exemplo, no podiam ser impostosjejuns to severos como nas outras ordens, seno como teriam foras para se bater?Pela mesma razo, um monge fatigado era dispensado de satisfazer todas as suasobrigaes de orao: precisavam de descansar para reconstiturem as suas forasde guerreiros. Mesmo assim, a obedincia ao Mestre devia ser absoluta, militar.

    A regra foi rapidamente complementada por vrias bulas pontificais, bemcomo pelos Retrais que desenvolveram, nomeadamente, tudo o que serelacionava com a disciplina e as sanes eventuais e que enumeraram o conjuntodos deveres aos quais cada um estava submetido.

    A regra foi traduzida para francs, em 1140, e recebeu, nessa altura, algumasmodificaes. Nomeadamente, o novo texto recomendava que se atrassem osexcomungados para a Ordem, para sua redeno. Com efeito, o artigo diz:

    L onde souberdes que se renem cavaleiros EXCOMUNGADOS, lque vos ordenemos que vades, e se houver entre eles quem queira ir juntar-se cavalaria de Alm-Mar, no devereis esperar o lucro temporal tanto quanto asalvao eterna da sua alma, quando o texto da regra latina afirmava: L ondesouberdes que se renem cavaleiros NO EXCOMUNGADOS..., isto ,precisamente o inverso...

    Erro de copista? o que pensa a maior parte dos comentadores, mas impossvel porque outras passagens da regra latina que proibiam o convvio comhomens excomungados foram modificadas. Tratava-se, pois, de uma alterao

    voluntria - e importante - a que teremos ocasio de voltar.Alis, outras alteraes tinham sido introduzidas sem sequer esperar pela

    redao da regra em francs. Quando Hugues de Payns regressou ao Ocidente, opatriarca de Jerusalm revira doze artigos e acrescentara vinte e quatro, entre osquais o fato de reservar o manto branco da Ordem apenas aos cavaleiros.

    Na realidade, a verso latina e a verso francesa parecem corresponder aduas lgicas diferentes, em vrios pontos. O conclio de Troyes dissera que deixavaao papa e ao patriarca de Jerusalm o cuidado de aperfeioarem a regra de acordocom as necessidades da Ordem no Oriente. Foi, alis, essencialmente a partir de1163, aps a publicao da bula Omne Datum Optimum, que todos esses

    regulamentos foram fixados definitivamente. Esse texto reforava ainda mais ospoderes da Ordem e do seu Gro-Mestre. Autorizava os Templrios a conservarempara si mesmos o saque tomado dos Sarracenos, colocava a Ordem sob a tutelaexclusiva do papa, permitindo-lhe assim escapar a qualquer outra forma de poderda Igreja, incluindo o do patriarca de Jerusalm. Quando sabemos, por exemplo,que a nomeao dos bispos dependia em grande medida do rei e do poder polticoem geral, compreendemos a importncia de uma tal medida, dado que protegia osTemplrios de qualquer ingerncia a esse nvel e dava-lhes, at certo ponto, um

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    estatuto internacional. A bula confirmava, ademais, que os bens da Ordem estavamisentos de dzimo; em contrapartida, com a anuncia do bispo local, os Templriostinham o direito de lanar o dzimo em proveito prprio. Por outro lado, o textoproibia que os Templrios fossem submetidos a juramento e estipulava que apenasos irmos da Ordem podiam participar na eleio do Gro-Mestre. A bula fixava e

    condensava os estatutos da Ordem e proibia a quem quer que