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CENTRO UNIVERSITÁRIO CLARETIANO PÓS-GRADUAÇÃO: ENSINO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA ORIENTADOR: PROFESSORA REGINA TORTORELLA REANI-MST A TOPOGRAFIA DO SAGRADO: AS ALMAS SANTAS DA PEDRA DOS OSSOS EM ITAPAJÉ-CE. ANTÔNIO PINTO DE SOUSA BRASÍLIA, NOVEMBRO DE 2012.

Manografia Revista e Corrigida

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CLARETIANO

PÓS-GRADUAÇÃO: ENSINO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA

ORIENTADOR: PROFESSORA REGINA TORTORELLA REANI-MST

A TOPOGRAFIA DO SAGRADO: AS ALMAS SANTAS DA PEDRA DOS

OSSOS EM ITAPAJÉ-CE.

ANTÔNIO PINTO DE SOUSA

BRASÍLIA, NOVEMBRO DE 2012.

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INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo mostrar a relação entre geografia de religião e seu impacto na paisagem. Abordar a problemática da crença e seu relacionamento com meio, não é a tarefa fácil, impõe um olhar interdisciplinar e cientifico. Em primeira instância parece que não há nenhuma ligação entre a ciência geográfica e a religiosidade humana. Na realidade essas culturais estão mais próximas do que se tem imaginado. O acontecimento trágico na vida de uma família de retirantes sagrou a pedra ao ponto dos romeiros a chamarem de Pedra Sagrada.

1. A topografia do sagrado: as almas santas de pedras dos ossos em Itapagé-Ce.

Os fatores religiosos não interessam à geografia apenas pelas modificações que elas originam na face da terra; interessam também pelos movimentos que determinam, abrindo novos rumos à circulação de pessoas e ideias (Girão, 1958). Portanto, partindo desta ideia pretendemos salientar a importância crescente de um termo que tem despertado em geógrafos, antropólogos, sociólogos e historiadores da religião, num grande esforço para entender, a fé humana.

Deste modo, uma vertente da ciência geográfica cada vez mais tenha saído do anonimato, trata-se de geografia da religião que durante muito tempo foi ignorada pela maioria dos Acadêmicos, embora nos últimos tempos tenha despertado uma curiosidade cientifica, afinal era um conhecimento, um saber específico de padres. Geógrafos de origem alemã e anglo-saxônicos e mais recentemente alguns brasileiros tenham descoberto neste novo conhecimento um enorme potencial para tentar desvendar o porquê da relação entre ser humano e divindades produzem alegria, paz, harmonia e contentamento. Ela é uma parte das humanas que procura aplicar o tema da religião como ciência geográfica, buscando uma melhor compreensão do dinamismo da fé e das estruturas do sacerdotal, efeitos na vida de milhões de pessoas e o impacto que produz no ambiente. Seu estado procura quantificar o lugar das diferentes denominações, abordando teoricamente o papel do abençoado e do conspurco na organização espacial do terreno, como modifica a topografia e a cenário. A metodologia utilizada para a análise do problema em torno da gruta da Pedra dos Ossos baseou se principalmente em leitura biográfica interdisciplinar para fundamentar o traçado teórico da investigação, o procedimento adotado consistiu em pesquisa realizada na internet e na publicação do jornal “O Povo” de Fortaleza em reportagem publicado no dia 04/04/2012, com o titulo “Santificados II”. Este pretende analisar três aspectos relacionados à Pedra Sagrada: Inicialmente almejar trabalhar o tema, em seguida analisar-se-á características geográficas e históricas da sacralização de Pedra e por fim a situação atual do local. O pioneiro na matéria sobre a nova ciência foi Pierre Deffontaines com sua obra “Geoghafie et Religions”, de 1948, tratando da relação entre a costumes e a culto aplicada a uma dinâmica espacial particular, e Maximilien Surre que na década de 1948, com seus artigos analisou as atividades religiosas e seus efeitos no espaços sócio rural. Paul Claval, autor renomado enfatiza a combinação fé e meio ambiente. No Brasil,

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temos o primeiro estudo relevante na área por volta de 1972, por Maria Cecilia França, tese de doutorado pela USP.

Sagrado e Profano: Choque na natureza

Itapajé significa: “Pedra do Feiticeiro” ou “Pedra aprumada”. Os primeiros requisitos sobre aquela terra falam da passagem dos frades franciscanos José Filgueiras e Francisco Pinto em 1605. Dentro da gruta, os ossos e a carne humana foram destruídos não só pelo fogo, mas pela crueldade de um coronel, senhor daquele mato bruto de Itapajé. Ficaram almas santas e a história para ganharem devoção. O lugar santo na Baixa Grande, no alto da Serra do Juá, é uma Pedra Oca ”Pedra dos Ossos”. Dentro, o silêncio por uma história tão constrangedora, nascida da crueldade.

Episódios do primeiro século passado. Uma família “supostamente de retirantes” queimada viva. Pai, mãe e filhos, nove ao todo, condenados a fogueira por suspeitar deles terem furtado uma rês Mas o tal crime nem se confirmou. O bicho desgarrado só havia ido beber água noutra cacimba, a vida não teve sequência, só a devoção. Quem foi punido pelas mortes? Se eram terra só do coronel e seus capangas? Ninguém.

A oralidade do povo conta de tudo ter se passado entre 1915 e 1925. As almas que ali morreram pediam somente comida e lugar no rancho, dormindo ao relento ou nas veredas mesmo. Foi quando sugeriram a gruta, cravada nas cercas do macabro coronel Barroso Cunduru. O pretume da fuligem daquele fogo maldito está encoberto pela cal branca enfeitada para romarias, que costumam lotar a serra do meio do ano em diante. Sem dá caminho as paredes agora têm recortes de imagens da Sagrada Família, de Nossa Senhora ou do Menino Jesus. No chão daquele pequeno salão, que já fedeu com ossos carbonizados havendo uma cruz encoberta com fitas de pedidos.

O lugar de matança agora é para joelhos fiéis, amontoam-se ex-votos de pés, cabeças, corpos inteiros e as orações de gratidão. Como a estória se espalhou se morreram todos ali, queimados ou vivos? Com o fogo, a pedra rachou. E uma menina escapou. Correu e pôde contar, o resto morreu. Esse lugar ficou milagroso, tornou a Pedra Sagrada. A garota teria saído pelo matagal e chegado até a vizinhança, já fora das terras do coronel.

Sobreviveu só uma noite, de tão queimada. Mas resistiu o suficiente para fazer história e tal evento virar reza daquele povo, de gente de fora e crentes nos martirizados. No lado de fora da pedra, construíram uma capelinha. O altar fica diante da brecha por onde a menina fugiu. Fazem se orações e se dizem atendidos. A treze quilômetros da sede de Itapajé, subindo serra e passando em terra difícil, a Pedra dos Ossos é distante até para quem mora na cidade. Quando se crê, então acontece (Jornal O Povo, 2012). Nessa linha de pensamento Durkheim (1996:51) afirma: “O sagrado e o profano foram pensados pelo espirito humano como gêneros distintos, como dois mundos que não tem nada em comum”. Considera ainda que o primeiro como sendo tudo que está ligado à religião, magia, crença. Em qualquer tipo de crença, a concepção do que é sagro, manifesta-se sempre como uma realidade diferente dos naturais, remetendo-se ao extraordinário, ao anormal, ao transcendente e metafisico.

Eliade (2004) baseia-se num conceito de santificado como hierofania, a manifestação de uma entidade sagrada: natureza, Deus, etc... Em suas pesquisas sobre a origem da religião, o renomado autor observa que as sociedades ágrafas tinha tendência

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de viver o mais próximo possível na esfera do sagrado ou muito perto dos objetos pertinentes. O mundo esta impregnado de valores religiosos.

A história e a geografia das religiões estão apresentam um número considerável de hierofanias, manifestações das realidades bentas.Desde logo, se principia pelo esboço da relação entre território e bendito, isto é, o elo que liga ciência e dogma. É deste modo que mostramos que o sagrado como elemento de caracterização e diferenciação dos lugares, atribui um significado que os vincula de esfera do

econômico (Rosendahl, p.12). “O sagrado tem um papel muito importante para o entendimento do que se passa na organização do espaço, embora na nossa época, a sua percepção deixou de ser um dado comum da cultura universalmente aceita. Na sociedade teocrática medieval, pelo contrario, fazia parte dos elementos fundamentais de toda cultura” (Matoso 1998). Esta moção recai e ao mesmo tempo reflete-se nas relações que o ser humano fim com o divino, diferindo assim, de pessoa e entre as diferentes culturas.

Podemos afirmar que a extensão e o impacto que o santo comporta (por oposição ao profano), cada vez mais presente na vida cotidiana estão, sobretudo, confinados a locais específicos, como igrejas, mosteiros e santuários. A antítese do tema, que ao irromperem em dicotomia parecem levar ao surgimento de dois espaços que não se confundem que por vezes se podem aproximar, mas nunca se intrometem. A religião é um aspecto da vida humana cuja imagem, percepção, identidade, vivência e mito ideia acerca da realidade (fundamentos mentais) emergem como representações da fé. Deste modo, este se realiza através de um precisa apropriação do espaço onde se combinam os fenômenos espaciais e numa intrincada colcha de retalho da experiência humana, sobre diferentes lugares sagrados originando diversos reflexos e impactos sobre a paisagem. O espaço torna se sagro porque é resultante da inevitabilidade que o homem devoto tem de possuir um lugar com uma atmosfera mística onde estejam presentes patentes todos os elementos mentais que vão construindo-se, sendo igualmente resultado da necessidade de segurança que estes lugares propiciam, dando ao ser humano, conforto, equilíbrio, e sentido ao espaço. Componentes impossíveis de ignorar.

Como define Rosendahl (1996, p.30) o “espaço sagrado é um campo de força e de valores que eleva o homem religioso acima de si mesmo, que o transporta para um meio distinto daquele que transcorre a sua existência”. No passado, a relação entre homem e a natureza foi ditada por uma visão de mundo muito diferente do que estamos acostumados hoje. Especialmente nas grandes cidades é fácil perder o significado de conexão com a terra, por nossa sensibilidade reduzida, sendo à base da vida, do progresso da civilização e do individuo. Desde os tempos antigos, o homem tem sempre o cuidado de manter um sistema harmonioso da utilização dos recursos naturais que o planeta tem a oferecer. Por isso o homem se apresentou ao longo dos séculos nos sinais sagrados (naturais) de sua presença, de suas atividades, de sentimentos religiosos. Edifícios, artefatos tem desempenhado um papel essencial, morfogênico, fito genético e modificadores do panorama. Na geografia o conceito de paisagem traz a tona o livro de Emílio Sereni, publicado em 1976. No título a palavra paisagem é seguida pela agraria o autor retrata a mesma não apenas como “imagem”, mas como um resultado de uma series de situações históricas, ou como uma convergência de eventos que fazem a

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historia e a geografia. Poderia até afirmar que no caminho peregrinatório sempre há um espaço geográfico que o homem vai modificando. Para entendermos essa harmonia paisagem-homem-religião, precisamos voltar no tempo mais especificamente nas chamadas sociedades agrárias. Nestas primeiras formas socioculturais o ambiente sempre foi considerado sagrado, sede das manifestações da vida e cheio de folego que, com uma complexa interação de forças, é capaz de possuir recursos úteis para a manutenção e desenvolvimento das coisas vivas. Historicamente, a ciência antropológica afirma que, nas culturas antigas e ainda hoje, existe uma visão segundo a qual há uma crença na sacralidade da terra e veio a desenvolver uma ciência natural, isto é, a geologia. O primeiro uso do termo “geologia” surge no ano de

1473, foi introduzido no mundo acadêmico pelo bispo de Durham, Richard di Bury, para indicar a jurisprudência como doutrina “terrestre” distinta da teologia (Piccardi, 2001).

Ele queria expressar que existem forças na natureza que causam medo, temor, fascínio, forças que regem o homem e o universo. A terra mesma, com a sua energia vital, sempre foi considerada uma divindade. Montanhas grutas, rochas, arvores, aguas e outros lugares particulares e formas naturais, sempre formas naturais, sempre exerceram fascínio sobre as pessoas, umas das características comuns das sociedades agrarias primitivas, é a distinção entre o individuo, espaço sagrado (eliade,1973). Esses elementos naturais com sua energia vital, com sua força desproporcional sempre tiveram na historia das mentalidades antigas, uma conotação sobrenatural e forte ligação com o mundo subterrâneo, misterioso e inacessível aos vivos considerados o reino dos mortos. Eram em geral aqueles lugares que mostravam características impressionantes por isso, eram consideradas sagradas. A arqueologia e a antropologia nos têm dados grandes informações destes fenômenos modificadores do espaço geográfico. Esses fenômenos eram o vulcanismo, terremotos, deslizamentos, inundações, trouxeram para os estudiosos muitos pormenores sobre a mentalidade dos povos primitivos, e como esses elementos incontroláveis foram sacralizados.

O tema é complexo, porém, muito interessante para a História e a Geografia. Não obstante a origem geológica de alguns mitos famosos do passado, eles servem para ilustrar alguns dos principais aspectos da religiosidade do homem primitivo e sua crença nos elemento da natureza. A religião teria nascido do medo diante do desconhecido, do incontrolável? É possível. Também nos serve como referencia teórica para uma explicação em todas as culturas sobre a estratificação mito-religioso e como a religião passou por uma gradual evolução a fé chegar à sua forma atual. Essa religiosidade pré-histórica era dominada da figura de Grande-Deusa-Mãe, a ideia dos muitos nomes simbolizava o culto a Gaia, ou seja, a Mãe Terra (Tellus). Como podemos perceber, por meio dessa importante informações, esses cultos no inicio não se orientavam para o alto´, ás divindades celestes mas para baixo, na direção da terra, àqueles infernos fecundos do qual emergiam incessantemente a vida com as suas colheitas abundantes ou a morte. Não surpreende, portanto, que tanta atenção seja dada a mitologia primitiva propriamente aos fenômenos geológicos que encantavam e causavam temor, era uma religiosidade que tinha como influxo o fascínosum e tremendum. Assim, os sinais da religião permeavam e estão extremamente ligados à paisagem e por isso, nos últimos tempos tem despertado o interesse da Historia e da Geografia. O que aconteceu no passado permanece vivo na memoria das pessoas ainda hoje, permanece vivo na tradução oral e escrita.

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Volto a repetir a uma ligação muito intensa entre a Geografia-História-Religião, isso é visível na paisagem e no impacto que ela sofre desse relacionamento. Essa vinculação resulta dos traços impressos dos cultos seja na organização do território, seja nas expressões e nos modelos dos comportamentos sociais (Simoneta,2001).

Quero destacar no presente artigo a importância que a religiosidade humana confere à paisagem através da pesquisa dos aspectos históricos e geográficos da “liturgia espacial” e do relacionamento-peregrinação-religião-turismo à Pedra Sagrada. Em seu livro, O sagrado e o profano (Eliade, 1986) explica que o sagrado sempre se manifesta como uma realidade diferente das realidades normais. Tomamos consciência do sagrado, quando ele se mostra como algo diferente do profano.

O sagrado se manifesta apenas para quem tem fé. Eliade escolhe o termo hierofania (algo sagrado que se manifesta para nós). O grande pesquisador enfatiza que a tendência entre os seres humanos perceber acreditar, que o sagrado esta presente em qualquer coisa. No caso especifico de pedras a literatura antropológica e geográfica nos alerta para o fato que elas foram investidas de sacralidade desde tempos imemoriais. A adoração a pedras podem ser encontradas em quase todas as culturas ao redor da terra. De acordo com Pausanias(VII,244), nos tempos antigos os gregos adoravam pedras brutas em vez de imagens, o deus Zeus por exemplo, nasceu em uma gruta, a caverna Corycian em Delphi era sagrada para as ninfas e corycia. As religiões de mistérios também realizavam seus festivais em cavernas.

Aspectos históricos e geográficos da sacralização da pedra

“O nome itapajé significa “Pedra do Feiticeiro” ou Pedra Aprumada”. Os primeiros registros históricos sobre aquela terra falam da passagem dos padres franciscanos José Filgueiras e Francisco Pinto, em 1605. Na serra de Uruburetama nos dilatados anos de 1721, dois irmãos Francisco Pinheiro Bastos e Domingos Teixeira Bastos, guiados por um velho índio da etnia dos guaranis, lhes indicou haver um solo fértil Vale de águas abundantes em cima da serra. Estabeleceram-se nas cabeceiras do rio Caxitoré onde fundaram o povoado de Santa Cruz de Uruburetama. Ambos portugueses de nascimento da região do Minho, de Conselho dos Bastos, no norte de Portugal. Fundaram o primeiro comercio de víveres e algodão, e, deste modo, o pequeno povoado em gestação consolidou-se passando depois à categoria de vila. Francisco Pinheiro Bastos contraiu núpcias com uma índia convertida ao catolicismo romano, dando assim origem a linha dos Bastos em terra brasileiras, posteriormente seu irmão contraiu matrimonio com uma de suas sobrinha, para manter a pura linhagem. Mais tarde daria origem a uma das famílias mais tradicionais de Itapajé. Durante mais de dois séculos o clã dos Bastos casavam somente entre si mantendo intacto o sangue congênere. Por meio do comercio, ampliava suas terras, enriquecendo num momento histórico em que não existia quase nada naquela região inóspita. Numa terra de cegos quem tem um olho é rei, diz o ditado popular: deste modo, o clã dos Bastos angariou riqueza e poder politico. O jornal “O Povo” de Fortaleza, publicou uma serie de reportagem sobre a questão de religiosidade popular no Estado do Ceará, dentre os quais figurava a “Pedra Sagrada”.

Jornal “O Povo (04 de Abril de 2012)”: Dentro daquela época Pedra dos Ossos e a carne humana foram destruídos não só pelo fogo, mas pela crueldade de um coronel, senhor daquelas terras de mato bruto de Itapajé. Ficaram as almas e a história, para ganharem devoção. O lugar na Baixa Grande, no alto de Serra de Juá, em itapajé é uma pedra oca. Pedra dos Ossos.

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Dentro, o silêncio por uma historia tão cruel e constrangedora parida da crueldade. Episódios dos primeiros anos do século passado. Uma família-supostamente retirantes-queimada viva. Pai, mãe e filhos, seriam nove ao todo acesos em fogo de madeira e alguns litro de mamona, porque alguém suspeitou deles e de sua fome. Um coronel que mandava em tudo naquele mato longe de pedra e capim bruto, lhe acusou de terem roubado uma rês. Mas tal crime nem se confirmou. O bicho desgarrado só havia ido beber água noutra cacimba. E a vida não teve sequência, só devoção.

Quem foi punido pelas mortes, se eram terras de um só coronel e seus capangas? Ninguém. Só a decência. A oralidade do povo de tudo ter se passado entre 1915 e 1925. Datam até para antes. Muitos afirmam com convicção, as almas que ali morreram eram santas. Pobres almas que pediam comida e lugar para rancho. Ou dormiriam ao relento mesmo nas veredas. Foi quando sugeriram a gruta, cravadas nas cercas do macabro coronel Barroso Cunduru.

O pretume da fuligem daquele fogo maldito hoje está encoberto pela cal branca. Enfeitada para romarias, que costumam lotar a serra, do meio do ano em diante. Sem dá caminho.

As paredes agora têm recortes de imagens da Sagrada Família ou Nossa Senhora ou Menino Jesus. E no chão daquele pequeno salão, que já fedeu com ossos carbonizados, há uma cruz encoberta de fitas e pedidos.

O lugar da matança agora é para joelhos fiéis. Amontoam-se ex-votos de pés, cabeças, corpos inteiros e as orações de gratidão por graças alcançadas. E como história se espalhou, se morreram todos ali, queimados vivos? Algumas pessoas que visitam a Pedra Santa, afirmam que com aquele fogo, a pedra rachou. E uma menina escapou. Correu e pôde contar, o resto morreu.

Até mesmo alguns evangélicos visitam a gruta. Esse lugar ficou milagroso pelo sofrimento que tiveram aquelas almas, afirmam. A garota teria saído pelo matagal e chegado até a vizinhança, já fora das terras do coronel. Sobreviveu só uma noite, de tão queimada. Mas resistiu nesta vida o suficiente para fazer a historia de a chacina virar reza daquele povo e de gente de fora, crentes nos martirizados. Do lado de fora da pedra, construíram uma capelinha. O altar fica diante da brecha por onde a menina fugiu. Fazem orações e afirmam com convicção que as almas santas da Pedra dos Ossos os atende. A treze quilômetros da sede de Itapajé, subindo serra e passando em terreno difícil, a Pedra dos Ossos é longe até para quem mora na cidade. Quando se crê, então acontece. Segundo Bastos (1993), em seu livro Histórias de minha terra, a Pedra dos ossos é uma gruta encravada num lugarejo ermo.

A pedra é cravada, verdadeiro fenômeno da natureza. Sua topografia marca intensamente a geografia do local, ao mesmo tempo se constitui um abrigo seguro para quem dela necessita. A atmosfera sacra da pedra toca quem a visita, sente algo sobrenatural faz parte da paisagem. Realidade é que esses sítios arqueológicos e megalíticos se transformam em lugar sagrado na paisagem, trazendo a certeza de que existe algo maior cujo esse nosso mundo material, é apenas reflexo. A Pedra dos Ossos não é diferente como história de fé e resistência de uma religiosidade popular, que foge do controle da hierarquia católica. Ela é uma gruta com teto alto divinamente projetada para embelezar aquele local. Constitui-se como um abrigo natural aos desamparados, contra o mal tempo e ataques de animais selvagens.

Sacralização da Pedra

Inicialmente pode ser partir de uma pergunta: Como uma pedra pode se torna objeto sacro? Para se tentar responder a essa indagação pensa que se faz necessário

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colocar em evidência o método de investigação usado pela geografia da religião e outras ciências afins sem deixar de mencionar a geografia cultural. a abordagem tem que ser fenomenológica, pois no caso especifico da Pedras dos Ossos, analisar-se-á conceitos chaves como lugar e espaço vivido, sem deixar sem deixar de mencionar outros conceitos como a paisagem o território e o de região, visto que há uma integralidade entre os diversos aspectos de abordagem. Da grande crise pela qual a ciência geográfica passou ate sua completa sistematização como ciência empírica sobressaiu-se no Brasil, mais especificamente a geografia da religião como um novo referencial epistemológico, mais precisamente nos anos 1980-1990. Jean Paul Sartes afirma: “O homem não é mais do que o que ele faz” (Apud Duarte;Matias,2005, p.192), o homem só pode compreendido a partir do que ele fabrica, que constrói, portanto, o seu espaço o ambiente em que vive, faz com que ele se reconheça como ser-nos Mundo, ou seja, o espaço é vital para sua realização com o homem. O espaço é o lugar onde o ser humano manifesta suas tendências puramente humanas, ou seja, seu modo de vida, a religião, lazer, cultura e a liberdade (Duarte; Matias, pg. 194). Para uma melhor compreensão do espaço sagrado de Pedra dos Ossos, percebe-se claramente a enorme importância da geografia com ciência, ela é muito mais humanizada que possamos imaginar, tem muitas vertentes com as quais podemos trabalhar. Pois bem, a atmosfera sacra na qual a Pedra dos Ossos esta imersa, desemboca uma irrupção do sagrado onde um território, uma paisagem, uma topografia foi profundamente modificada inicialmente por um acontecimento, depois pela ação do homem sobre a paisagem modificando-a pelo pensamento e pelo trabalho. Neste lugar geográfico de Itapajé onde está localizado a Pedra Sagrada, foi construído um templum (templo) que servirá de morada e proteção ás almas santas que sacralizam o espaço. Historicamente o templum era o setor delimitado pela ágora romana no qual se observava fenômenos naturais como a passagem dos pássaros, e passando com o tempo a designar o edifício sagrado, o espaço sagrado onde era praticada a observação do céu. A palavra grega femenos provinda do mesmo radical tem o significado de (cortar, delimitar, dividir), indicava o local reservado aos deuses, o recinto sagrado que cercava um santuário (Chevalier, 2002). O templo é um centro organizador, um microcosmo, no qual todo o macrocosmo é refletido. A porta do templo quando é aberta para o seu interior separa os dois espaços, isto é, o sagrado e o profano. O templo simultaneamente reflete uma abertura que torna possível a comunicação com as divindades, há um encontro e um diálogo de amor, aonde eles veem e falam ao homem e este vai até eles com a fé. O transcendente se revela e começa com humanidade um dialogo cósmico. O reflexo dessa comunicação entre céu e terra se reflete na paisagem e no espaço, são construídas moradias humanas, pois os devotos querem ficam pertinho de quem responde aos seus anseios e preces.

Os romeiros que vão visitar a Pedra Sagrada para pedir ou agradecer ás almas santas, se transportam como num passe de mágica para outra dimensão além de sua realidade física.

O significado do espaço sagrado da pedra dos Ossos está presente na vida normal da cidade e das pessoas. Reflete-se na economia, na sociedade, cultura, na politica e principalmente no turismo-religioso que permeia o lugar. O que acontece na gruta da Pedra dos Ossos chama-se catolicismo popular, onde há toda uma simbologia em jogo, terço, missa, procissão, promessa, graça, etc...

As praticas e as crenças deste tipo de catolicismo se expressam por meio de uma relação direta entre a divindade(santo) e os romeiros, sem necessidade de mediação de um padre (paz,2004,pag. 14).

Na Pedra Sagrada visualiza-se um conjunto bem harmônico, ou seja, homem, religião, natureza. Não podemos esquecer que a religião deixa marcas profundas na vida

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do povo e na paisagem. As pessoas que visitam o local acreditam piamente que existe outra dimensão espiritual chamada de céu, paraíso, um mundo metafísico. Essas marcas não estão presentes apenas nos espíritos humanos , pelo contrario, integram-se também na paisagem, assim, emerge toda uma convivência que se mostra na paisagem e no espaço em si, harmonizando-se amplamente e apoiando-se em uma imagem sacralizada na paisagem. Nesse sentido, há um “casamento” perfeito entre geografia e religião se encaixando perfeitamente, logo a “paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizados entre o homem e a natureza” (Santos,2008,pág.103). situação de Pedra hoje é bastante inusitada, ela saiu do anonimato quando o jornal “O Povo” de Fortaleza(2002)publicou uma série de artigos com o título Santificados II”.

A partir do exposto, percebe-se claramente na Pedra dos Ossos toda uma simbologia centrada na religião cultuada pelos fiéis. A pedra hoje está na mídia ela se libertou da tutela da tradição e da hierarquia católica e se decolou para a mídia. Este artigo, portanto vinculado à geografia e a história, é uma contribuição na tentativa de analisar e discutir o espaço sagrado de Pedra dos Ossos em itapajé – CE, centro de muitas peregrinações durante todo ano. Foram abordados temas concernentes a religião e seu relacionamento com a ciência geográfica. Espaço Sagrado, o profano, tem mostrar que a religião podem serem interpretadas e entendidas a partir de várias vertentes.

REFERÊNCIAS

1 BARROS, L. O. C. Santuários, peregrinações e novas Modalidades de concentrações humanas nas práticas religiosas. Diálogos latino-americanos, Aarhus-Dinamarca, v.3/2001. p.147-154,2001.

2 BASTOS, M. Z. História da minha terra. - 1990. p.118-123.

3 CLAVAL, P.O tema religião nos estudos geográficas: espaço e cultura. Rio de Janeiro, n. 7, p. 37-59, 1999.

4 CHAUI, M. Convite à filosofia. 4. ed. São Paulo: Ática, 2003

5 DURKHEIM, E. As formas dementes da vida religiosa, Martins Fontes, São Paulo,1996.

6 DUARTE, M. B.; MATIAS,V.R.S. Reflexões sobre o espaço geográfico a partir da fenomenologia: Caminhos da Geografia, v.17,n.16,p.190.

Bibliografia

7 ELIADE, M. O sagrado e o profano: A essência das religiões, São Paulo, Martins fontes,2001.

8 OTTO.R. O sagrado. Lisboa, Edições 70,2005.

9 O POVO, Jornal de Fortaleza, 2012. 10 PICCARDI, L. Geologia e mito: Instuto di Geoscienze e Georisrse, Sezione di

Firenze, 2000.

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11 ROSENDAHL, Z. Espaço e religião: uma abordagem geográfica, Rio de Janeiro, ed. Verj. 1996.

12 REVIÈRE, C. Os ritos profanos, ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.

13 SIMONETTA,C.Il peasaggio e i segmi dela religione, problemi di método e casi de studio. [?].