Manual Gestion de Inundaciones Urbanas

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GESTO DAS INUNDAES URBANAS Carlos E. M. Tucci

C U R S O DE

Gesto das Inundaes urbanas

Carlos E. M. Tucci90690-370 Rua Lavradio, 150 c1 Porto Alegre-RS Brazil Tel.: (051) 33347604 [email protected]

Junho de 2005

Apresentaoste texto foi preparado como base para um curso de mesmo ttulo voltado para tomadores de deciso, profissionais de diferentes reas de conhecimento que de alguma forma atuam dentro do meio ambiente urbano como administradores, legisladores, engenheiros, arquitetos, gelogos, bilogos, entre outros. Os objetivos do curso so de apresentar uma viso integrada da gesto das guas pluviais urbanas, onde se inserem a drenagem urbana e as inundaes ribeirinhas das cidades. O curso no aborda os aspectos especficos de projeto, mas trata de abordar os aspectos estratgicos da gesto e as interfaces com os diferentes aspectos das guas urbanas e os outros elementos de planejamento e gesto das cidades. Este curso foi ministrado inicialmente no Brasil e depois em vrias cidades da Amrica do Sul em cooperao com vrias entidades nacionais e internacionais, procurando mudar a forma insustentvel do desenvolvimento urbano e seus impactos no mbito das guas pluviais. O primeiro captulo do curso apresenta os diferentes aspectos da gesto integrada no ambiente urbano, as suas inter-relaes e interfaces e a viso integrada. Como no primeiro captulo so destacados os dois tipos principais de inundaes: devido urbanizao, drenagem urbana e inundaes ribeirinhas, o segundo captulo trata das Inundaes Ribeirinhas, avaliao, medidas de controle para mitigao dos impactos e gesto dentro das cidades. No terceiro captulo apresentada a gesto na drenagem urbana como: estratgias de controle e princpios, medidas de controle sustentveis em diferentes estgios. No quarto captulo so apresentados os elementos do Plano de guas Pluviais Ubano e sua relao com os outros elementos com a infra-estrutura urbana e o Plano da Bacia Hidrogrfica. No quinto captulo so apresentados alguns estudos de caso de conflitos e gesto de guas urbanas. Seguramente o contedo deste texto no esgota um tema to amplo que para realidade econmica, social, ambiental e climtica exige solues inovadoras que se baseiam em princpios fundamentais do desenvolvimento sustentvel. Porto Alegre, Junho de 2005. Carlos E. M. Tucci

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2.7.3 Equao do prejuzo agregado:

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3. GESTO DAS INUNDAES NA DRENAGEM URBANA 67 3.1 Impacto do desenvolvimento urbano no ciclo hidrolgico 3.2 Impacto Ambiental sobre o ecossistema aqutico 67 69 77 77

ndice1.GUAS URBANAS 1.1 Desenvolvimento urbano 1.1.1 Processo de urbanizao 1.1.2 Impactos na infra-estrutura urbana 1.1.3 Impactos na infra-estrutura urbana 1.2 Sistemas Hdricos Urbanos 1.3 Disponibilidade Hdrica 1.4 Avaliao dos componentes hdricos urbanos 1.4.1 Contaminao dos mananciais 1.4.2 Abastecimento de gua e saneamento 1.4.3 Resduos slidos 1.4.4 Escoamento pluvial: 1.4.5 Sntese do cenrio atual 1.5 Doenas de veiculao hdrica 3 3 4 7 8 9 11 11 13 16 17 21 22 3

3.3 Gesto na macrodrenagem que geram impactos 3.3.1 Gesto na drenagem urbana 3.3.2 Gesto inadequada das reas ribeirinhas em combinao com a drenagem urbana 3.4 Princpios da gesto sustentvel 3.5 Tipos de Medidas de Controle 3.5.1 Medidas de controle distribudo 4. GESTO INTEGRADA DAS GUAS URBANAS 4.1 Fases da gesto 4.2 A viso do desenvolvimento urbano integrado e sustentvel 4.2.1 Viso integrada no ambiente urbano 4.2.2 Aspectos Institucionais: 5. PLANO DE GUAS PLUVIAIS 5.1 Interfaces entre os Planos 5.5.1 Gesto 5.2 Estrutura 5.2.3 Estratgias

79 80 83 83 109 110

111 111 115 123 123 123 125 128 129 130 130 131 143 144 144 147 153 153

2.GESTO DAS INUNDAES RIBEIRINHAS 2.1 Caractersticas das inundaes ribeirinhas 2.2 Ocupao do espao urbano e impacto 2.3 Avaliao das enchentes 2.3.1 Previso de Cheia em Tempo Atual 2.3.2 Probabilidade ou risco da inundao: 2.4 Medidas de controle das inundaes ribeirinhas 2.5 Medidas Estruturais 2.5.1 Medidas Extensivas: 2.5.2 Medidas Intensivas 2.6 Medidas no-estruturais 2.6.1 Sistema de previso e alerta 2.6.2 Zoneamento de reas inundveis: 2.6.3 Construo prova de enchente 2.6.4 Seguro de inundao 2.7 Avaliao dos prejuzos das enchentes 2.7.1 Curva nvel-prejuzo: 2.7.2 Mtodo da curva de prejuzo histrico

28 28 29 34 35 36 38 40 40 42 48 49 51 59 60 60 60 62

5.2.4 Cenrios 5.3 Medidas 5.3.1 Medidas no-estruturais : 5.3.2 Medidas estruturais 5.4 Produtos 5.5 Programas 5.5.1 Programa de Monitoramento 5.5.2 Estudos complementares 6.ESTUDOS DE CASO 6.1 Inundaes ribeirinhas em Estrela (RS) 6.2 Inundaes ribeirinhas e energia em Unio da Vitria/Porto Unio. 6.2.1 Inundaes 6.2.1 Conflito 6.3 Gesto das Inundaes na Regio Metropolitana de Curitiba 6.3.1 Alternativas de controle

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6.3.2 Concepo das medidas de controle 6.4 Gesto de Inundaes em Porto Alegre 6.4.1 Descrio 6.4.2 Bacia do Areia 6.4.3 Cenrio de drenagem na cidade 6.5 Plano de guas Pluviais do Brasil

161 163 163 165 167 168

6.5.1 Objetivos e princpios 6.5.2 Estrutura 6.5.3 Institucional 6.5.4 Investimentos

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1guas UrbanasViso integrada dos aspectos da infra-estrutura urbana que possuem relao com as inundaes urbanas.

Captulo

desenvolvimento urbano se acelerou na segunda metade do sculo vinte com grande concentrao de populao em pequeno espao, impactando o ecossistema terrestre e aqutico e a prpria populao atravs das inundaes doenas e perda de qualidade de vida. Este processo ocorre devido a falta de controle do espao urbano que produz efeito direto sobre a infra-estrutura de gua : abastecimento, esgotamento sanitrio, drenagem urbana e inundaes ribeirinhas e resduos slidos. Neste captulo so destacados os principais processos que integram o conjunto da sustentabilidade hdrica urbana e as inter-relaes da gesto deste conjunto de infra-estrutura. No item seguinte so apresentados os aspectos principais da urbanizao e ocupao do uso do solo e a seguir so caracterizados os principais elementos da infra-estrutura das guas urbanas: abastecimento de gua, esgotamento sanitrio, resduos slidos e guas pluviais e os aspectos de sade.

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1.1 Desenvolvimento urbano1.1.1 Processo de urbanizao

O crescimento urbano nos pases em desenvolvimento tem sido realizado de forma insustentvel com deteriorao da qualidade de vida e do meio ambiente. Este processo ainda mais significativo na Amrica Latina onde 77% da populao urbana (47,2% a nvel mundial). Existem 44 cidades na Amrica Latina com populao superior a 1 milho de habitantes (de um total de 388 cidades do mundo, UN,2003). Cerca de 16 Mega-cidades (acima de 10 milhes de habitantes) se formaram no final do sculo vinte, representando 4% da populao mundial, sendo que pelo menos quatro destas cidades esto na Amrica Latina (tabela 1.1), representando mais de 10% da populao da regio. O crescimento urbano ocorrido em pases em desenvolvimento tem sido significativo desde a dcada de 70. Nos pases desenvolvidos o crescimento da populao estacionou e tende a diminuir j que a taxa de natalidade inferior a 2,1 filhos por casal que mantm a populao estvel. A recuperao ou a

manuteno da populao atualmente ocorre apenas atravs de migrao controlada. Nos pases em desenvolvimento o crescimento ainda muito grande e a projeo das Naes Unidas de que a estabilizao da populao ocorrer apenas em 2150. A urbanizao um processo que ocorre a nvel mundial com diferenas entre continentes. Na Amrica Latina a urbanizao tem sido alta com a transferncia da populao rural para as cidades. Este processo, tende a mdio prazo a estabilizar o crescimento demogrfico. A previso de que cerca de 2010 existiro 60 cidades acima de 5 milhes, sendo a maioria em pases em desenvolvimento. Na tabela 1.1 podem-se observar as cidades mais populosas do mundo e da Amrica Latina. A taxa de crescimento da populao da Amrica Latina e Caribe variaram de 2,1% nos primeiros cinco anos da dcada de 80 para 1,5% nos primeiros cinco anos do novo milnio e tende a 1,2 para 2015. Isto reflexo do processo de urbanizao que tende a reduzir a taxa de crescimento habitacional. Na figura 1.1 so apresentadas a proporo do crescimento da urbanizao observado nos pases da Amrica Latina e sua projeo. Pode-se observar que a Amrica do Sul e Mxico encontram-se acima de 70% de urbanizao, enquanto que a Amrica Central est ainda em cerca de 50%. Portanto, de se esperar que os problemas enfrentados pelos pases da Amrica do Sul e Mxico possam se reproduzir na Amrica Central na medida que a tendncia de urbanizao ocorra. Toda a regio tender a 2015 a uma proporo de populao urbana total de 80,7 %, principalmente devido aos pases mais populosos que esto com taxas maiores de urbanizao. Na tabela 1.3 so apresentados alguns dos pases da Amrica Latina em ordem de populao e sua urbanizao em 2000. Na figura 1.2 pode-se observar a relao entre a urbanizao e a populao dos pases. Observam-se duas tendncias para os pases de menor populao, uma para os pases de maior renda per capita, que possuem altas taxas de populao urbana e os pases de renda menor possuem menor populao urbana.1.1.2 Impactos na infra-estrutura urbana

Os principais problemas relacionados com a infra-estrutura e a urbanizao nos pases em desenvolvimento, com destaque para a Amrica Latina so: Tabela 1.1 Maiores cidades a nvel mundial e da Amrica Latina (UN,2003)Maiores a nvel mundial Cidade Populao Milhes Toquio 26,44 Cidade do Mxico 18,07 So Paulo 17,96 Bombai 16,09 Los Angeles 13,21 Calcuta 13,06 Xangai 12,89 Daka 12,52 Deli 12,44 Maiores cidades da Amrica Latina Cidade Populao Milhes Cidade do Mxico 17,8 So Paulo 16,3 Buenos Aires 12,02 Rio de Janeiro 10,65 Lima 7,44 Bogota 6,77 Santiago 5,47 Belo Horizonte 4,22 Porto Alegre 3,76

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90 80 70 % populao urbana 60 50 40 30 20 10 0 1985 1990 1995 2000 anos Amrica do Sul America Central Mxico 2005 2010 2015

Figura 1.1 Urbanizao em pases da Amrica Latina Tabela 1.3 Populao e urbanizao em alguns pases da Amrica Latina (Cepal, 2002)Pas Brasil Mxico Colmbia Argentina Peru Venezuela Chile Equador Guatemala Bolvia Honduras El Salvador Paraguai Nicargua Costa Rica Uruguai Panam Total/mdia Populao 1000 habitantes 172.891 98.881 43.070 37.032 25.939 24.170 15.402 12.879 11.385 8.516 6.485 6.397 5.496 5.071 4.112 3.337 2.856 483.919 Populao urbana % 79,9 75,4 74,5 89,6 72,3 87,4 85,7 62,7 39,4 64,6 48,2 55,2 56,1 53,9 50,4 92,6 55,7 76,14

Grande concentrao populacional em pequena rea, com deficincia no sistema de transporte, falta de abastecimento e saneamento, ar e gua poludo, alm das inundaes. Estas condies ambientais inadequadas reduzem as condies de sade, qualidade de vida da populao, impactos ambientais e so as principais limitaes ao seu desenvolvimento; Aumento da periferia das cidades de forma descontrolada pela migrao rural em busca de emprego. Estes bairros geralmente esto desprovidos de segurana, da infra-estrutura tradicional de gua, esgoto, drenagem, transporte e coleta de resduos slidos e so dominados por grupos de delinqentes geralmente ligados ao trfego de drogas.

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100 90 % da populao urbana 80 70 60 50 40 30 20 10 0 1000 10000 100000 1000000 habitantes, 1000 Amrica do Sul e Mxico Amrica Central

Figura 1.2 Relao entre populao e populao urbana A urbanizao espontnea e o planejamento urbano realizado para a cidade ocupada pela populao de renda mdia e alta. Sem um planejamento do espao a ocupao ocorre sobre reas de risco como de inundaes e de escorregamento, com freqentes mortes durante o perodo chuvoso. Somente no ms de janeiro de 2004, 84 pessoas morreram no Brasil devido a eventos relacionados com as inundaes. Parte importante da populao vive em algum tipo de favela. Portanto, existe a cidade formal e a informal. A gesto urbana geralmente atinge somente a primeira Os problemas da urbanizao ocorrem por um ou mais fatores ao longo do tempo e principalmente nas ltimas dcadas: a populao que migra para as cidades geralmente de baixa renda e no possui capacidade de investimento e tende a invadir reas pblicas ou comprar reas precrias sem infra-estrutura da urbanizao informal. Nestas esto as reas de risco de inundao ou de deslizamento; dficit de emprego, renda e de moradia alto; legislaes equivocadas de controle do espao urbano; incapacidade do municpio de planejar e antecipar a urbanizao e investir no planejamento do espao seguro e adequado como base do desenvolvimento urbano; crise econmica nos pases. O municpio consegue apenas controlar as reas de mdio e alto valor econmico com regulamentao do uso do solo, onde estabelece a cidade formal.

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1.1.3 Impactos na infra-estrutura urbana

O planejamento urbano realizado para a cidade formal e para a cidade informal so analisadas tendncias desta ocupao. Os principais problemas relacionados com a infra-estrutura de gua no ambiente urbano so os seguintes: a falta de tratamento de esgoto: grande parte das cidades da regio, no possuem tratamento de esgoto e lanam os efluentes na rede de esgotamento pluvial, que escoa pelos rios urbanos (maioria das cidades brasileiras); outras cidades optaram por fazer as redes de esgotamento sanitrio (muitas vezes sem tratamento), mas no implementam a rede de drenagem urbana, sofrendo freqentes inundaes com o aumento da impermeabilizao; ocupao do leito de inundao ribeirinha, sofrendo freqentes inundaes; impermeabilizao e canalizao dos rios urbanos com aumento da vazo de cheia (at sete vezes) e sua freqncia; aumento da carga de resduos slidos e da qualidade da gua pluvial sobre os rios prximos das reas urbanas; deteriorizao da qualidade da gua devido a falta de tratamento dos efluentes tem criado potenciais risco ao abastecimento da populao em vrios cenrios, onde o mais crtico tem sido a ocupao da reas de contribuio de reservatrios de abastecimento urbano, que eutrofizados podem produzir riscos a sade da populao.

Existe uma viso limitada do que a gesto integrada do solo urbano e da sua infra-estrutura e grande parte dos problemas destacados acima foram gerados por um ou mais dos aspectos destacados a seguir: falta de conhecimento: da populao e dos profissionais de diferentes reas que no possuem informaes adequadas sobre os problemas e suas causas. As decises resultam em custos altos, onde algumas empresas se apiam para aumentar seus lucros. Por exemplo, o uso de canalizao para drenagem uma prtica generalizada, mesmo representando custos muito altos e geralmente tendem a aumentar o problema que pretendiam resolver. A prpria populao, quando possui algum problema de inundao, solicita a execuo de um canal para o controle da inundao. Com o canal a inundao transferida para jusante afetando outra parte da populao. As empresas de engenharia lucram de forma significativa pois estas obras que podem chegar a ordem de magnitude de 10 vezes superior a medidas mais sustentveis; concepo inadequada dos profissionais de engenharia para o planejamento e controle dos sistemas: Uma parcela importante dos engenheiros que atuam no meio urbano, esto desatualizados quanto a viso7

ambiental e geralmente buscam solues estruturais, que alteram o ambiente, com excesso de reas impermeveis e conseqente aumento de temperatura, inundaes, poluio, entre outros; viso setorizada do planejamento urbano: O planejamento e o desenvolvimento das reas urbanas realizado sem incorporar os aspectos relacionados com os diferentes componentes da infraestrutura de gua. Uma parte importante dos profissionais que atuam nesta rea possui uma viso setorial limitada. falta de capacidade gerencial: os municpios no possuem estrutura para o planejamento e gerenciamento adequado dos diferentes aspectos da gua no meio urbano.

1.2 Sistemas Hdricos UrbanosOs principais sistemas relacionados com a gua no meio ambientem urbano so: Mananciais de guas; Abastecimento de gua; Saneamento de efluentes cloacais; Controle da drenagem urbana; Controle da inundaes ribeirinhas.

Os mananciais de gua urbana so as fontes de gua para abastecimento humano, animal e industrial. Estas fontes podem ser superficiais e subterrneas. Os mananciais superficiais so os rios prximos s comunidades. A disponibilidade de gua neste sistema varia sazonalmente ao longo dos anos, e algumas vezes a quantidade de gua disponvel no suficiente para atender a demanda, sendo, muitas vezes, necessrio construir um reservatrio para garantir a disponibilidade hdrica para a comunidade ao longo do tempo. Os mananciais subterrneos so os aqferos que armazenam gua no subsolo e permitem o atendimento da demanda atravs do bombeamento desta gua. Geralmente o atendimento realizado atravs da disponibilizao de gua subterrnea depende da capacidade do aqfero e da demanda. Assim, a gua subterrnea utilizada geralmente para cidades de pequeno e mdio porte, pois depende da vazo de bombeamento que o aqfero permite retirar sem comprometer seu balano de entrada e sada de gua. O abastecimento de gua envolve a utilizao da gua disponvel no manancial, que transportada at a estao de tratamento de gua (ETA) e depois distribuda populao por uma rede. Este sistema envolve importantes investimentos, geralmente pblicos, para garantir a gua em quantidade e qualidade adequada. O saneamento de efluentes de esgoto sanitrio o sistema de coleta dos efluentes (residenciais, comerciais e industriais), o transporte deste volume, seu tratamento numa ETE (Estao de Tratamento de Esgoto) e despejo da gua tratada de volta ao corpo hdrico.

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A drenagem urbana envolve a rede de coleta da gua (e resduos slidos), que se origina devido precipitao sobre as superfcies urbanas, o seu tratamento e o retorno aos rios. O controle da inundaes ribeirinhas refere-se a evitar que a populao seja atingida pelas inundaes naturais. Os rios nos perodos chuvosos saem do seu leito menor e ocupam o leito maior, dentro de um processo natural. Como isto ocorre de forma irregular ao longo do tempo, a populao tende a ocupar o leito maior, ficando sujeita ao impacto das inundaes.

1.3 Disponibilidade HdricaTodos os componentes dos sistemas hdricos esto fortemente interrelacionados devido forma como so gerenciados dentro do ambiente urbano. Nos ltimos anos, estamos passando por um cenrio em que valores essenciais nossa vida, que somente damos a devida importncia quando nos faltam, como a gua e a luz, podem estar em risco de suprimento por um tempo maior do que estamos acostumados a suportar. Ser que estamos voltando poca de nossos avs em que a infra-estrutura era ainda precria? So dvidas que passam pela cabea de muitas pessoas, com a avalanche de informaes, muitas vezes desencontradas, que aparece na mdia. Em nosso planeta, o total de gua globalmente retirado de rios, aqferos e outras fontes aumentou cerca de nove vezes, enquanto o uso por pessoa dobrou e a populao est trs vezes maior. Em 1950, as reservas mundiais representavam 16,8 mil m3/pessoa; atualmente esta reserva reduziuse para 7,3 mil m3/pessoa, e espera-se que venha a se reduzir para 4,8 mil m3/pessoa nos prximos 25 anos, como resultado do aumento da populao, industrializao, agricultura e a contaminao. Quando comparados os usos, a quantidade de gua disponvel e a necessidade humana, pode-se, erroneamente, concluir que existe gua suficiente. No entanto, a gua encontra-se distribuda no planeta com grande variao temporal e espacial; existem vrias regies vulnerveis, onde cerca de 460 milhes de pessoas (aproximadamente 8% da populao mundial) esto vulnerveis falta freqente de gua e cerca de 25% esto indo para o mesmo caminho. A tabela 1.4 apresenta um resumo de atendimento de gua utilizado por organizaes ligadas as Naes Unidas.Tabela 1.4 Proporo de aceitvel (improved1) Abastecimento e saneamento de reas urbanas(WHO e UNICEF JMP, 2002) Saneamento3 Regio Abastecimento de gua2 frica 86 80 sia 93 74 Amrica Latina e 94 86 Caribe Oceania 98 86 Europa 100 99 Amrica do Norte 100 100 Global 95 83

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1 uma definio qualitativa genrica para a gua fornecida e disposta sem contaminar a populao. No a mesma definio que safe , gua segura, que deveria se basear em medida quantitativa de indicadores; 2 Abastecimento de gua entendido pelos autores como o atendimento de gua a populao; 3 - Saneamento entendido pelos autores como a disposio do esgoto em redes ou solo s, no envolve necessariamente coleta e tratamento.

O ciclo hidrolgico natural constitudo por diferentes processos fsicos, qumicos e biolgicos. Quando o homem atua sobre este sistema e se concentra no espao produz grandes alteraes, que alteram dramaticamente este ciclo, e trazem consigo impactos significativos (muitas vezes de forma irreversvel) no prprio homem e na natureza. Um dos primeiros impactos o risco da escassez quantitativa de gua. A natureza tem mostrado que a gua, que escoa nos rios e depende das chuvas, aleatria e varia muito entre as pocas de chuvas e estiagens. O homem, na sua histria, procurou controlar essa gua para seu benefcio por meio de obras hidrulicas. Essas obras procuram reduzir a escassez pela regularizao das vazes, aumentando a disponibilidade ao longo do tempo. No passado, quando as cidades eram menores, a populao retirava gua a montante do rio e despejava sem tratamento a jusante, deixando para a natureza o impacto ambiental e funo de recuperao da sua qualidade. Os impactos eram menores devido ao baixo volume de esgoto despejado. Com o aumento da urbanizao e com o uso de produtos qumicos na agricultura e no ambiente em geral, a gua utilizada nas cidades, indstrias e na agricultura retorna aos rios totalmente contaminada e, em grande quantidade. Alm disso, com o aumento da populao sempre haver uma cidade a montante e outra a jusante, contaminando o manancial superficial, o rio ou seu despejo contamina as diferentes camadas do sub-solo de onde retirar a gua. A conseqncia da expanso sem uma viso ambiental a deteriorao dos mananciais e a reduo da cobertura de gua segura para a populao, ou seja a escassez qualitativa (ver na figura 1.3 o ciclo de contaminao das cidades).Este processo necessita de diferentes aes preventivas de planejamento urbano e ambiental, visando minimizar os impactos e buscar o desenvolvimento sustentvel. Os riscos de inundao e a deteriorizao da qualidade da gua nos rios, prximos s cidades de pases em desenvolvimento e, mesmo em pases desenvolvidos, um processo dominante no final do sculo vinte e incio do sculo vinte e um. Isto se deve a: contaminao dos mananciais superficiais e subterrneos com os efluentes urbanos como o esgoto cloacal, pluvial e os resduos slidos; disposio inadequada dos esgotos cloacais, pluviais e resduos slidos nas cidades; inundaes nas reas urbanas devido urbanizao; eroso e sedimentao gerando reas degradadas; ocupao de reas ribeirinhas, com risco de inundaes e de reas de grandes inclinaes, como morros urbanos, sujeitos a deslizamento aps perodo chuvoso.

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A maioria destes problemas conseqncia de uma viso distorcida do controle da guas pluviais por parte da comunidade e profissionais, que ainda priorizam projetos localizados, sem uma viso da bacia e dos aspectos sociais e institucionais das cidades. O paradoxo que pases em desenvolvimento e mais pobres, priorizam aes economicamente insustentveis, como as medidas estruturais; enquanto os pases desenvolvidos buscam prevenir os problemas com medidas no-estruturais, mais econmicas e com desenvolvimento sustentvel.

1.4 Avaliao dos componentes hdricos urbanos1.4.1 Contaminao dos mananciais

O desenvolvimento urbano tem produzido um ciclo de contaminao, gerado pelos efluentes da populao urbana, que so o esgoto domstico/industrial e o esgotos pluviais (figura 1.3 ). Este processo ocorre devido ao: Despejo sem tratamento dos esgotos cloacais nos rios, contaminando os mesmos que possuem capacidade limitada de diluio. Isto ocorre devido falta de investimentos nos sistemas de esgotamento sanitrio e estaes de tratamento e, mesmo quando existem, apresentam baixa eficincia; O despejo dos esgotos pluviais, que transportam grande quantidade de poluio orgnica e de metais que atingem os rios nos perodos chuvosos. Esta uma das mais importantes fontes de poluies difusa; Contaminao das guas subterrneas por despejos industriais e domsticos, atravs das fossas spticas, vazamento dos sistemas de esgoto sanitrio e pluvial; Depsitos de resduos slidos urbanos, que contaminam as guas superficiais e subterrneas, funcionando como fonte permanente de contaminao; Ocupao do solo urbano sem controle do seu impacto sobre o sistema hdrico. Com o tempo, locais que possuem abastecimento tendem a reduzir a qualidade da sua gua ou exigir maior tratamento qumico da gua de fornecida populao. Portanto, mesmo existindo hoje uma boa cobertura do abastecimento de gua, a mesma pode ficar comprometida se medidas de controle do ciclo de contaminao no ocorrerem. Muitas cidades utilizam reservatrios urbanos para regularizar a demanda de gua de uma comunidade. Como os reservatrios se encontram prximos das cidades, existe grande presso de ocupao urbana na bacia hidrogrfica a montante do reservatrio. Infelizmente os municpios possuem pouca capacidade de fiscalizao, e acabam se desenvolvendo nas reas mananciais com loteamentos irregulares ou clandestinos. No Brasil, a legislao de proteo de reas de manancial foi criada para procurar proteger estas reas, mas incentivou exatamente o contrrio do desejado (ver tabela 1.5).

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Em conseqncia desta ocupao e da falta de tratamento dos esgotos, a carga poluidora chega diretamente ao reservatrio, aumentando a probabilidade de eutrofizao (riqueza em nutrientes). Com o reservatrio eutrfico existe a tendncia de produo de algas que consomem os nutrientes. Estas algas podem produzir toxinas que absorvidas pelo homem, atuam de forma cumulativa sobre o fgado, gerando doenas que podem levar a morte, principalmente no caso de dilise (caso Caruaru no qual morreram vrias pessoas de uma clnica de dilise). As toxinas tambm se acumulam no fundo dos lagos, dos quais alguns peixes tambm se alimentam. Os tratamentos de gua tradicionais no removem estas toxinas.

Figura 1.3 Ciclo de contaminao

Tabela 1.5 Legislao de Proteo de reas de Mananciais no BrasilA legislao de proteo de mananciais aprovada na maioria dos Estados brasileiros protege a bacia hidrogrfica utilizada para abastecimento das cidades.

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Nestas reas proibido o uso urbano e outros usos, que possam comprometer a qualidade da gua de abastecimento. Devido ao crescimento das cidades, estas reas foram pressionadas ocupao pelo valor imobilirio da vizinhana e pela falta de interesse do proprietrio em proteger a rea, j que a mesma perdeu o valor em funo da legislao. Estas reas so invadidas pela populao de baixa renda e a conseqncia imediata o aumento da poluio. Muitos proprietrios incentivaram a invaso at para poder vender a propriedade para o poder pblico. A principal lio que se pode tirar deste cenrio que, ao se declarar de utilidade pblica a bacia hidrogrfica do manancial, a mesma deveria ser adquirida pelo poder pblico ou criar valor econmico para propriedade, atravs da gerao de mercado indireto para a rea, ou ainda outros benefcios para os proprietrios, para compensar a proibio pelo uso da mesma.

As principais fontes de contaminao dos aqferos urbanos so: Aterros sanitrios contaminam as guas subterrneas pelo processo natural de precipitao e infiltrao. Deve-se evitar que sejam construdos aterros sanitrios em reas de recarga e deve-se procurar escolher as reas com baixa permeabilidade. Os efeitos da contaminao nas guas subterrneas devem ser examinados quando da escolha do local do aterro; Grande parte das cidades brasileiras utiliza fossas spticas como destino final do esgoto. Esse sistema tende a contaminar a parte superior do aqfero. Esta contaminao pode comprometer o abastecimento de gua urbana quando existe comunicao entre diferentes camadas dos aqferos atravs de percolao e de perfurao inadequada dos poos artesianos; A rede de drenagem pluvial pode contaminar o solo atravs de perdas de volume no seu transporte e at por entupimento de trechos da rede que pressionam a gua contaminada para fora do sistema de condutos.1.4.2 Abastecimento de gua e saneamento

O acesso gua e ao saneamento reduz, em mdia, 55% da mortalidade infantil (WRI, 1992). A implementao adequada da infra-estrutura de abastecimento e saneamento essencial para um adequado desenvolvimento urbano. Em 1990, os pases em desenvolvimento possuam um abastecimento de gua que cobria cerca de 80% da populao e apenas 10% dessa populao era atendida pelo sistema de saneamento. Mesmo com a cobertura de 80% da populao, existia um bilho de pessoas que no tinham acesso gua limpa. Neste perodo, 453 milhes de pessoas no tinham acesso ao saneamento (entendido aqui como apenas coleta e no coleta e tratamento) representando cerca de 33% da populao. Em quatro anos 70 milhes receberam saneamento, mas a populao cresceu em velocidade maior, aumentando a proporo de pessoas sem acesso para 37% (Wright, 1997). Em muitas cidades da Amrica do Sul os servios de gua possuem problemas crnicos, com perda de gua na distribuio e falta de racionalizao de uso da gua a nvel domstico e industrial. As cidades perdem de 30 a 65% da gua colocada no sistema de distribuio. Na tabela13

1.6 pode-se observar a diferena de perdas na rede das cidades dos pases desenvolvidos e das cidades da Amrica do Sul, apesar do consumo per capita maior. Quando falta de gua, a tendncia de buscar novos mananciais sem que seja reduzida, as perdas e desenvolvida racionalizao. Na tabela 1.7 descrito o exemplo de Nova York de exemplo de racionalizao do uso de gua. A cidade de Las Vegas est dando subsdios para a troca de grama para vegetao de baixo uso de gua. A cidade de Denver no conseguiu aprovao para a construo de novas barragens para atendimento do aumento da demanda de gua, e est sendo obrigada a racionalizar seu uso e comprar direitos de uso de agricultores. O desenvolvimento de vrias cidades da Amrica do Sul tem sido realizado com moderada cobertura de redes de coleta de esgoto, alm da quase total falta de tratamento de esgoto (tabela 1.8). Inicialmente, quando a cidade tem pequena densidade, utilizada a fossa sptica para disposio do esgoto. medida que a cidade cresce e o poder pblico no investe no sistema, o esgoto sanitrio das so ligados rede de esgotamento pluvial sem nenhum tratamento. Este escoamento converge para os rios urbanos e o sistema fluvial de jusante gerando os conhecidos impactos na qualidade da gua. Veja os dados da tabela 1.9 de cobertura no Brasil.Tabela 1.6 Valores de consumo e perdas na rede (World Bank, 1996). Local Ano Consumo Perdas na rede litros/pessoa/dia % Brasil (mdia) 1989 151 39 Braslia 1989 211 19 So Paulo 1988/1992 237 40 S. Catarina 1990 143 25 Minas Gerais 1990 154 25 Santiago 1994 204 28 Bogot 1992/1991 167 40 Costa Rica 1994 197 25 Canada (mdia) 1984 431 15 USA (mdia) 1990 666 12 Tquio 1990 355 15 Tabela 1.7 Racionalizao do Uso da gua (Scientifical American, 2001) A cidade de Nova York no incio dos anos 90 teve uma grande crise de abastecimento de gua e estava indo para um cenrio catico, com o crescimento da populao. A cidade necessitava de mais 90 milhes de gales de gua a cada dia (340 milhes de m3), cerca de 7% do uso total da cidade. A alternativa era gastar mais US $ 1 bilho para bombear gua do rio Hudson, mas a cidade optou pela reduo da demanda. Em 1994, foi iniciados um programa de racionalizao, com investimento de US $ 295 milhes, para substituir 1/3 de todas as instalaes dos banheiros da cidade. Cada banheiro utilizava dispositivo que consumia cerca de 5 gales para descarga, tendo sido substitudo por um dispositivo de 1,6 galo. Em 1997, quando o programa terminou 1,33 milho de dispositivos foram substitudos em 110.000 edifcios com 29% de reduo de consumo de gua por edifcio, reduzindo o consumo de 70 a 90 milhes de gales por dia.

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Tabela 1.8 Acesso ao Saneamento* em % (Word Bank,1999) 1982 1995 Pas (%) (%) Argentina 76 80 Bolvia 51 77 Brasil 33 74 Chile 79 95 Colombia 96 70 Equador 79 70 Paraguai 66 20 Peru 67 78 Uruguai 59 56 Venezuela 57 74* acesso a saneamento indica a parcela da populao que tinha coleta de esgoto seja por rede pblica como por disposio local

Tabela 1.9 Situao Brasileira com Relao ao Abastecimento de gua e Esgotamento Sanitrio(IBGE, 1997)

Tipo de Servio Brasil Abastecimento de gua: Rede Geral Outro Esgotamento Sanitrio: Rede Coletora Fossa Sptica Outro No Tinham 75,93 24,07 37,83 23,03 27,70 11,43

Populao Atendida (%) Urbana Rural 90,56 9,44 46,79 25,45 23,59 4,17 19,91 80,09 3,50 13,75 43,48 39,26

Mesmo nos pases onde existe coleta e tratamento de esgoto, pouco se conhece da eficincia do mesmo e o grau de contaminao para jusante. Este processo pode se agravar com a privatizao, na medida que a poder concedente no tenha capacidade de fiscalizao adequada. No Brasil, as empresas de saneamento nos ltimos anos tm investido em redes de coleta de esgoto e estaes de tratamento, mas a parcela do volume gerado pelas cidades que efetivamente tratado antes de chegar ao rio ainda muito pequena. Algumas das questes so as seguintes: Quando as redes de esgoto so implementadas ou projetadas, muitas vezes no tem sido prevista a ligao da sada das habitaes ou condomnios s mesmas. Desta forma as redes no coletam o esgoto projetado e as estaes no recebem o esgoto para o qual tm a capacidade. Neste caso, ou o projeto foi elaborado de forma inadequada ou no foi executado como deveria. Como o esgoto continua escoando pelo pluvial para o sistema fluvial, o impacto ambiental continua alto. A concluso que os investimentos pblicos so realizados de forma inadequada, atendendo apenas as empresas

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que executam as obras e no sociedade, que aporta os recursos e o meio ambiente que necessita ser conservado; Como uma parte importante das empresas cobra pelo servio de coleta e tratamento, mesmo sem que o tratamento seja realizado, qual ser o interesse das mesmas em completar a cobertura de coleta e tratamento do esgoto?. Outro cenrio freqente o de aumentar a coleta sem tratamento, agravando o problema na medida que concentra a poluio nos rios; Quando for implementado o sistema de cobrana pela poluio quem ir pagar as penas previstas para a poluio gerada? Existe atualmente um impasse sobre a concesso dos servios de gua e esgoto no Brasil que tem imobilizado o financiamento e a privatizao do setor. A Constituio Federal previu que a concesso dos servios de gua e esgoto pertencesse aos municpios, enquanto que as empresas de gua e saneamento geralmente ficariam a cargo de rgos estaduais. Como as mesmas no detm a concesso, o seu valor econmico fica reduzido no mercado de privatizao. Recentemente o governo federal enviou projeto de lei ao Congresso Nacional sobre a matria, reacendendo a polmica que decorre de enormes conflitos de interesse.1.4.3 Resduos slidos

A produo de resduos a soma do total coletado nas residncias, industria e comrcio, mais o total coletado das ruas e o que chega na drenagem. TR = Tc + Tl + Tdr (1.1) onde o TR o total produzido pela sociedade e pelo ambiente; Tc o total coletado, Tl total da limpeza urbana; e Tdr o total que chega na drenagem. Os dois primeiros volumes podem ser reciclados, diminuindo o volume para ser disposto no ambiente. Na medida que os sistemas de coleta e limpeza urbana so ineficientes o volume de Tdr aumento, aumentando o custo de retirada, obstruo ao escoamento e o subsdio ambiental recebido pela sociedade que polui. No desenvolvimento urbano so observados alguns estgios distintos da produo de material slido na drenagem urbana (Tdr), que so os seguintes: No estgio inicial: quando ocorre modificao da cobertura da bacia, pela retirada da sua proteo natural, o solo fica desprotegido e a eroso aumenta no perodo chuvoso, aumentando tambm a produo de sedimentos. Exemplos desta situao so: enquanto um loteamento implementado o solo fica desprotegido; na construo de grandes reas ou em lotes ocorre grande movimentao de terra, que transportada pelo escoamento superficial. Nesta fase, existe predominncia dos sedimentos e pequena produo de lixo; No estgio intermedirio: parte da populao est estabelecida, ainda existe importante movimentao de terra devido a novas construes. A16

produo de lixo da populao se soma ao processo de produo de sedimentos. No estgio final: nesta fase praticamente todas as superfcies urbanas esto consolidadas e apenas resulta produo de lixo urbano, com menor parcela de sedimentos de algumas reas de construo ou sem cobertura consolidada. O volume total de lixo que chega na drenagem depende da eficincia dos servios urbanos e de fatores como os seguintes: freqncia e cobertura da coleta de lixo, freqncia da limpeza das ruas, reciclagem, forma de disposio do lixo pela populao e a freqncia da precipitao. A produo de lixo coletada no Brasil da ordem de 0,5 a 0,8 kg/pessoa/dia, mas no existem informaes sobre a quantidade de lixo que fica retida na drenagem. Mesmo a nvel internacional as informaes so reduzidas. Em San Jos, Califrnia o lixo que chega na drenagem foi estimado em 1,8 kg/pessoa/ano. Aps a limpeza das ruas resultam 0,8 kg/pessoa/ano na rede (Larger et al, 1977). Para o Brasil este volume deve ser maior, considerando que muitas vezes a drenagem utilizada como destino final de resduos slidos. Na ltima dcada houve um visvel incremento de lixo urbano devido s embalagens plsticas que possuem baixa reciclagem. Os rios e todo o sistema de drenagem ficam cheios de garrafas tipo pet, alm das embalagens de plsticos de todo o tipo. As principais conseqncias ambientais da produo de sedimentos so as seguintes: assoreamento das sees de canalizaes da drenagem, com reduo da capacidade de escoamento de condutos, rios e lagos urbanos. Por exemplo, a lagoa da Pampulha (em Belo Horizonte) um exemplo de um lago urbano que tem sido assoreado. O arroio Dilvio em Porto Alegre, devido a sua largura e pequena profundidade, durante as estiagens, tem depositado no canal a produo de sedimentos da bacia e criado vegetao, reduzindo a capacidade de escoamento durante as enchentes; transporte de poluente agregado ao sedimento, que contaminam as guas pluviais.

1.4.4 Escoamento pluvial:

O escoamento pluvial pode produzir inundaes e impactos nas reas urbanas devido a dois processos, que ocorrem isoladamente ou combinados: Inundaes de reas ribeirinhas: so inundaes naturais que ocorrem no leito maior dos rios devido a variabilidade temporal e espacial da precipitaoe do escoamento na bacia hidrogrfica; Inundaes devido urbanizao: so as inundaes que ocorrem na drenagem urbana devido ao efeito da impermeabilizao do solo, canalizao do escoamento ou obstrues ao escoamento.Inundaes de reas ribeirinhas

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Os rios geralmente possuem dois leitos: o leito menor, onde a gua escoa na maioria do tempo. O leito menor limitado pelo risco de 1,5 a 2 anos. Tucci e Genz (1994) obtiveram um valor mdio de 1,87 anos para os rios do Alto Paraguai. As inundaes ocorrem quando o escoamento atinge nveis superiores ao leito menor, atingindo o leito maior. As cotas do leito maior identificam a magnitude da inundao e seu risco. Os impactos devido inundao ocorrem quando esta rea de risco ocupada pela populao (figura 1.4). Este tipo de inundao geralmente ocorre em bacias mdias e grandes (> 100 km2).

Leito maior de inundao Leito menor

Figura 1.4 Caractersticas dos leitos do rio A inundao do leito maior dos rios um processo natural, como decorrncia do ciclo hidrolgico das guas. Quando a populao ocupa o leito maior, que so reas de risco, os impactos so freqentes. Essas condies ocorrem devido s seguintes aes: no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, das cidades geralmente no existe nenhuma restrio quanto ocupao das reas de risco de inundao, a seqncia de anos sem enchentes razo suficiente para que empresrios desmembrem estas reas para ocupao urbana; invaso de reas ribeirinhas, que pertencem ao poder pblico, pela populao de baixa renda; ocupao de reas de mdio risco, que so atingidas com freqncia menor, mas que quando o so, sofrem prejuzos significativos. Os principais impactos sobre a populao so: prejuzos de perdas materiais e humanos; interrupo da atividade econmica das reas inundadas; contaminao por doenas de veiculao hdrica como leptospirose, clera, entre outras; contaminao da gua pela inundao de depsitos de material txico, estaes de tratamentos entre outros. O gerenciamento atual no incentiva a preveno destes problemas, j que medida que ocorre a inundao o municpio declara calamidade pblica e recebe recursos a fundo perdido e no necessita realizar concorrncia pblica para gastar. Como a maioria das solues sustentveis passam por medidas noestruturais, que envolvem restries populao, dificilmente um prefeito buscar este tipo de soluo, porque geralmente a populao espera por uma18

obra. Enquanto que, para implementar as medidas no-estruturais, ele teria que interferir em interesses de proprietrios de reas de risco, que politicamente complexo a nvel local. Para buscar modificar este cenrio necessrio um programa a nvel estadual, voltado educao da populao, alm de atuao junto aos bancos que financiam obras em reas de risco.Inundaes devido urbanizao

As enchentes aumentam a sua freqncia e magnitude devido impermeabilizao do solo e construo da rede de condutos pluviais. O desenvolvimento urbano pode tambm produzir obstrues ao escoamento, como aterros, pontes, drenagens inadequadas, obstrues ao escoamento junto a condutos e assoreamento. Geralmente estas inundaes so vistas como locais porque envolvem bacias pequenas ( < 100 km2, mas freqentemente bacias < 10 km2). medida que a cidade se urbaniza, em geral, ocorrem os seguintes impactos: aumento das vazes mximas (em at 7 vezes, figura 1.5) e da sua freqncia devido ao aumento da capacidade de escoamento atravs de condutos e canais e impermeabilizao das superfcies;

Figura 2.3

As curvas fornecem o valor de R, aumento da vazo mdia de inundao funo da rea impermevel e da canalizao do sistema de drenagem. (Leopold, 1968)

aumento da produo de sedimentos devido falta de proteo das superfcies e produo de resduos slidos (lixo); e a deteriorao da qualidade da gua superficial e subterrnea, devido lavagem das ruas, transporte de material slido e s ligaes clandestinas de esgoto cloacal e pluvial; devido forma desorganizada como a infra-estrutura urbana implantada, tais como: (a) pontes e taludes de estradas que19

obstruem o escoamento; (b) reduo de seo do escoamento por aterros de pontes e para construes em geral; (c) deposio e obstruo de rios, canais e condutos por lixos e sedimentos; (d) projetos e obras de drenagem inadequadas, com dimetros que diminuem para jusante, drenagem sem esgotamento, entre outros.Qualidade da gua do Pluvial

A quantidade de material suspenso na drenagem pluvial apresenta uma carga muito alta devido as vazes envolvidas. Esse volume mais significativo no incio das enchentes. Os primeiros 25 mm de escoamento superficial geralmente transportam grande parte da carga poluente de origem pluvial (Schueller, 1987). Uma das formas de avaliar a qualidade da gua urbana atravs de parmetros que caracterizam a poluio orgnica e a quantidade de metais. Na tabela 1.10 so apresentados alguns valores de concentrao da literatura. Schueller (1987) cita que a concentrao mdia dos eventos no se altera em funo do volume do evento, sendo caracterstico de cada rea drenada. Os esgotos podem ser combinados (cloacal e pluvial num mesmo conduto) ou separados (rede pluvial e sanitria separada). A legislao estabelece o sistema separador, mas na prtica isto no ocorre devido s ligaes clandestinas e falta de rede cloacal. Devido falta de capacidade financeira para implantao da rede de cloacal, algumas prefeituras tm permitido o uso da rede pluvial para transporte do cloacal, o que pode ser uma soluo inadequada medida que esse esgoto no tratado. Quando o sistema cloacal implementado, a grande dificuldade envolve a retirada das ligaes existentes da rede pluvial, o que na prtica resultam em dois sistemas misturados com diferentes nveis de carga.Tabela 1.10 Valores mdios de parmetros de qualidade da gua de pluviais (mg/l) algumas cidades

Parmetro DBO Slidos totais PH Coliformes (NMP/100ml) Ferro Chumbo Amnia

Durham1

Cincinatti 2 19

Tulsa 3 11,8 545 7,4 18.000

P. Alegre 4 31,8 1523 7,2 30,3 0,19 1,0

1440 7,5 23.000 12 0,46 0,4

APWA 5 Min Max 1 700 450 14.600 5511 2 x107 ,

1, 5x107

1 - Colson (1974); 2 - Weibel et al. (1964); 3 - AVCO (1970); 4 - Ide (1984); 5 - APWA (1969)

As vantagens e desvantagens dos dois sistemas tm gerado longas discusses sobre o assunto em todo o mundo. Considerando a inter-relao com a drenagem, o sistema unitrio geralmente amplia o custo do controle quantitativo do escoamento da drenagem pluvial medida que exige que as detenes sejam enterradas. Este tipo de construo tem um custo unitrio 7 vezes superior deteno aberta (IPH, 2000). As outras desvantagens so: na

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estiagem, nas reas urbanas o odor pode ser significativo; durante as inundaes, quando ocorre extravasamento, existe maior potencial de proliferao de doenas. Este cenrio mais grave quando os extravasamentos forem freqentes. Por outro lado, as cidades que priorizaram a rede de esgotamento sanitrio e no consideraram os pluviais sofrem freqentes inundaes com o aumento da urbanizao, como tem acontecido em Barranquilla na Colmbia e algumas reas de Santiago. No existem solues nicas e milagrosas, mas solues adequadas e racionais para cada realidade. O ideal buscar conciliar a coleta e tratamento do esgotamento sanitrio somado reteno e tratamento do escoamento pluvial, dentro de uma viso integrada, de tal forma que tanto os aspectos higinicos como ambientais sejam atendidos. A qualidade da gua da rede pluvial depende de vrios fatores: da limpeza urbana e sua freqncia; da intensidade da precipitao e sua distribuio temporal e espacial; da poca do ano e do tipo de uso da rea urbana.1.4.5 Sntese do cenrio atual

Atualmente um dos principais, se no o principal problema de recursos hdricos no pas o impacto resultante do desenvolvimento urbano, tanto a nvel interno dos municpios como a nvel externo, exportando poluio e inundaes para jusante. As regies metropolitanas deixaram de crescer no seu ncleo, mas se expandem na periferia, justamente onde se concentram os mananciais, agravando este problema. A tendncia de que as cidades continuem buscando novos mananciais, sempre mais distantes e com alto custo. A ineficincia pblica observada no seguinte: A grande perda de gua tratada nas redes de distribuio urbana. No racional o uso de novos mananciais quando as perdas continuam em nveis to altos. As perdas podem ser de faturamento e fsicas, as primeiras esto relacionadas com a medio e cobrana e a segunda devido a vazamento na rede; Quando existem, as redes de tratamento no coletam esgoto suficiente, da mesma forma, as estaes de tratamento continuam funcionando abaixo da sua capacidade instalada. O investimento na ampliao da cobertura no leva ao atendimento das Metas do Milnio aprovado nos Fruns internacionais; A rede de drenagem pluvial apresenta dois problemas: (a) alm de transportar o esgoto que no coletado pela rede de esgoto sanitrio, tambm transporta a contaminao do escoamento pluvial (carga orgnica, e metais); (b) a construo excessiva de canais e condutos, apenas transferem as inundaes de um local para outro dentro da cidade, a custos insustentveis para os municpios.

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1.5 Doenas de veiculao hdricaExistem muitas doenas com veiculao hdrica. Com relao gua, as doenas podem ser classificadas de acordo com o conceito de White et al (1972) e apresentado por Prost (1993): Doenas com fonte na gua (water borne diseases): dependem da gua para sua transmisso como clera, salmonela, diarria, leptospirose (desenvolvida durante as inundaes pela mistura da urina do rato), etc. A gua age como veculo passivo para o agente de infeco. Doenas devido falta de higine (water-washed diseases): dependem da educao da populao e da disponibilidade de gua segura. Estas doenas esto relacionadas com a infeco do ouvido, pele e os olhos. Relacionado com a gua (water-related): o agente utiliza a gua para se desenvolver, como malria e esquistossomose.Tabela 1.11 Mortalidade devido a doenas de veiculao hdrica no Brasil (Mota eRezende, 1999)

Idade < 1 ano 1 e 14 anos > 14 anos

Infeco Intestinal 1981 1989 28.606 13.508 3.908 3.963 2.439 3.330

Outras* 1981 87 44 793 1989 19 21 608

*clera, febre tifide, poliomielite, dissentiria, esquistossomose, etc

Muitas destas doenas esto relacionadas com baixa cobertura de gua tratada e saneamento, como a diarria e a clera; outras esto relacionadas com a inundao, como a leptospirose, malria e dengue. Na tabela 1.11 so apresentadas a mortalidade infantil e as doenas de veiculao hdrica no Brasil. Na tabela 1.12 apresentada a proporo de cobertura de servios de gua e saneamento no Brasil de acordo com o grupo de renda. Mostrando claramente a pequena proporo de atendimento para a populao de menor renda. Na tabela 1.13 so apresentados valores do Brasil.Tabela 1.12 Proporo da cobertura de servios, por grupos de renda do Brasil em %(Mota e Rezende, 1999)

Domiclios (SM) 0 -2 25 >5 Todos

gua Tratada 1981 1989 59,3 76,0 76,3 87,8 90,7 78,4 95,2 89,4

Coleta de esgoto 1981 1989 15 24,2 29,7 39,7 54,8 36,7 61,2 47,8

Tratamento de Esgoto 1981 1989 0,6 4,7 1,3 8,2 2,5 1,6 13,1 10,1

SM = salrio mnimo

Tipo Clera Malria

Tabela 1.13 Nmero de ocorrncia totais no Brasil em 1996 (MS, 1999) Quantidade 1017 444.049

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Dengue Taxa de mortalidade por doenas infecciosas e parasitrias por 100.000 habitantes (1995)

180.392 24,81

As doenas transmitidas atravs do consumo da gua preocupam, devido principalmente ao seguinte: Cargas domsticas: o excesso de nutrientes tem produzido eutrofizao dos lagos, aumentam as algas, que geram toxicidade. Esta toxicidade pode ficar solvel na gua ou se depositar no fundo dos rios e lagos. A ao da toxidade de atacar o fgado das pessoas gerando doenas degenerativas como cncer e cirrose. Cargas industriais: os efluentes industriais apresentam os mais diferentes compostos e, com a evoluo da indstria, novos componentes so produzidos diariamente. Dificilmente as equipes de fiscalizao possuem condies de acompanhar este processo; Cargas difusas: as cargas difusas provenientes de reas agrcolas trazem compostos de pesticidas, que apresentam novos compostos anualmente. A carga difusa de rea urbana foi mencionada nos itens anteriores e podem atuar de forma cumulativa sobre o organismo das pessoas.1.6 Comparao entre pases desenvolvidos e em desenvolvimento:

A tabela 1.14 apresenta uma comparao dos cenrios de infra-estrutura urbana relacionada com a gua em pases desenvolvidos e em pases em desenvolvimento

Infra-estrutura urbana Abastecimento de gua

Tabela 1.14 Comparao dos aspectos da gua no meio urbano Pases desenvolvidos Pases em desenvolvimento Grande cobertura; tendncia de reduo da disponibilidade devido contaminao das fontes; grande quantidade de perdas na rede Falta de rede e estaes de tratamento; as Grande Cobertura na coleta que existem no conseguem coletar esgoto e tratamento dos efluentes como projetado; Os aspectos quantitativos Impactos quantitativos sem soluo; esto controlados; Impactos devido qualidade da gua no Gesto da qualidade da foram identificados. gua Medidas de controle noGrandes prejuzos por falta de poltica de estruturais como seguro e controle zoneamento de inundao Resolvido, cobertura total

SaneamentoDrenagem Urbana Inundaes Ribeirinhas

Pode-se observar que nos pases desenvolvidos grande parte dos problemas foi resolvida quanto ao abastecimento de gua, tratamento de esgoto e controle quantitativo do escoamento na drenagem urbana. Neste ltimo caso, foi priorizado o controle atravs de medidas no-estruturais que obrigam a populao a controlar na fonte os impactos devido urbanizao. O principal23

problema nos pases desenvolvidos o controle da poluio difusa devido s guas pluviais. J nos pases em desenvolvimento o problema ainda est no estgio do tratamento de esgoto. Em alguns pases, como o Brasil, o abastecimento de gua, que poderia estar resolvido, devido grande cobertura de abastecimento, volta a ser um problema devido forte contaminao dos mananciais. Este problema decorrncia da baixa cobertura de coleta de esgoto tratado. Na realidade existem muitas redes e estaes de tratamento, mas a parcela de esgoto sem tratamento ainda muito grande. Devido ao ciclo de contaminao, produzido pelo aumento do volume de esgoto no tratado para a mesma capacidade de diluio, os objetivos tambm so de sade pblica, pois a populao passa ser contaminada pelo conjunto do esgoto produzido pela cidade no que chamamos aqui de ciclo de contaminao urbana (figura 1.3). Um exemplo deste cenrio a cidade de So Paulo que se encontra na bacia hidrogrfica do rio Tiet e tem demanda total de abastecimento de gua da ordem de 64 m3/s, sendo que mais da metade da gua importada (33 m3/s) de outra bacia a do Piracicaba (cabeceiras na serra da Cantareira). Isto ocorre porque parte dos mananciais na vizinhana da cidade esto contaminados pelos esgotos sem tratamento. Os mananciais como a Billings e a Guarapiranga tem sua qualidade comprometida. O controle quantitativo da gua da drenagem urbana ainda limitado nos pases em desenvolvimento. O estgio do controle da qualidade da gua resultante da drenagem est ainda mais distante nestes pases. Na Amrica do Sul, como grande parte dos pases em desenvolvimento, busca-se o controle dos impactos quantitativos da drenagem pluvial, que ainda no esto controlados. Por exemplos, os sistemas de deteno construdos nas cidades brasileiras possuem como foco apenas o controle do impacto das inundaes, sem o componente de controle da qualidade da gua. Problemas 1. Quais os principais mananciais de guas urbano? Quando so utilizados e em que condies? 2. 3. 4. 5. Quais as principais causas de contaminao dos mananciais? Quais so os principais problemas da coleta e tratamento dos esgotos cloacais? Descreva o ciclo de contaminao Qual a diferena entre as inundaes ribeirinhas e as inundaes devido a urbanizao?

6. Quais so as fontes dos problemas destes tipos de inundao? 7. O que diferenciam as cargas poluentes da drenagem urbana e do esgoto cloacal? 8. Os so os tipos de resduos slidos urbanos? Quando ocorrem?

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9. Por que a vazo aumenta numa bacia urbana com relao s condies rurais? 10. Este aumento uniforme ou varia com a magnitude da cheia? Por que? 11. Analise a cadeia causal na deteriorizao da qualidade da gua dos rios a jusante das cidades. 12. Quais so os perodos crticos em que ocorrem os cenrios mais desfavorveis? 13. Qual a origem da contaminao da qualidade da gua pluvial? 14. Por que os slidos totais aumentam com a urbanizao? Como variam ao longo da urbanizao? 15. Qual a importncia do monitoramento da quantidade de gua, sedimentos e qualidade da gua no planejamento da bacia urbana? Se no possvel monitorar todas as bacias, por que ento investir nisto? Quais as dificuldades deste tipo de ao? 16. Considerando que as causas dos impactos devido s inundaes e da qualidade da gua so decorrncia da urbanizao como realizada hoje, como ento poderiam ser as estratgias para evitar isto? 17. A coleta de lixo coleta cerca de 0,7 kg/dia, considerando que uma parcela deste total no seja coletado e chega na drenagem. Considere uma sub-bacia urbana, com 50 km2 de rea, populao densa da ordem de 120 hab/hectar. Estime o total anual de lixo que transportado para a drenagem. Admita 1, 5 e 10 % do total de lixo coletado chega na drenagem. Admita um custo de 5 centavos de dlar o kg para coletar e dispor este volume. Calcule o valor por pessoa anual. Este o subsdio que a populao esta recebendo do meio ambiente.Referncias APWA,1969. Water pollution aspects of urban runof. Water Quality Administration.(Water Pollution Control Research Series. Report N. WP-20-15). ASCE, 1992. Design and Construction of Urban Stormwater Management Systems. American Society of Civil Engeneer. 753p AVCO, 1970. Stormwater pollution from urban activity. Water Quality Administration. (Water Pollution Control Research Series. Report n. 11034 FKL). COLLISCHONN, W. TUCCI, C. E.M. 1998. Drenagem urbana e Controle de Eroso. VI Simpsio nacional de controle da eroso. 29/3 a 1998, Presidente Prudente, So Paulo. COLSON, N.V., 1974. Characterization ant treatment of urban land runoff. EPA. 670/2-74096. GUARULHOS, 2000. Cdigo de Obras do Municpio de Guarulhos Lei 5617 de 9 de novembro de 2000, Mujnicpiuo de Guarulhos. IBGE, 1998 Anurio Estatstico do Brasil 1997, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica, Rio de Janeiro, 1998 (CD-ROM)25

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2Gesto das Inundaes RibeirinhasControle das reas de risco do leito maior dos rios fundamental para a gesto das reas ribeirinhas

Captulo

2.1 Caractersticas das inundaes ribeirinhasinundao ocorre quando as guas dos rios, riachos, galerias pluviais saem do leito de escoamento devido a falta de capacidade de transporte de um destes sistemas e ocupa reas onde a populao utiliza para moradia, transporte (ruas, rodovias e passeios), recreao, comrcio, industria, entre outros. Quando a precipitao intensa e o solo no tem capacidade de infiltrar, grande parte do volume escoa para o sistema de drenagem, superando sua capacidade natural de escoamento. O excesso do volume que no consegue ser drenado ocupa a vrzea inundando de acordo com a topografia das reas prximas aos rios. Estes eventos ocorrem de forma aleatria em funo dos processos climticos locais e regionais. Este tipo de inundao denominado neste livro de inundao ribeirinha. As condies meteorolgica e hidrolgica propiciam a ocorrncia de inundao. O conhecimento do comportamento meteorolgico de longo prazo muito pequeno devido ao grande nmero de fatores envolvidos nos fenmenos meteorolgicos e interdependncia dos processos fsicos a que a atmosfera terrestre est sujeita. As condies hidrolgicas que produzem a inundao podem ser naturais ou artificiais. As condies naturais so aquelas cuja ocorrncia propiciada pela bacia em seu estado natural. Algumas dessas condies so: relevo, tipo de precipitao, cobertura vegetal, capacidade de drenagem (captulo 11). Os rios normalmente drenam nas suas cabeceiras, reas com grande declividade produzindo escoamento de alta velocidade. A variao de nvel durante a enchente pode ser de vrios metros em poucas horas. Quando o relevo acidentado as reas mais propcias ocupao so as planas e mais28

A

baixas, justamente aquelas que apresentam alto risco de inundao. A vrzea de inundao de um rio cresce significativamente nos seus cursos mdio e baixo, onde a declividade se reduz e aumenta a incidncia de reas planas. As precipitaes mais intensas atingem reas localizadas e so em geral dos tipos convectivo e orogrfico. Essas formas de precipitao atuam, em geral, sobre pequenas reas. A precipitao ocorrida em Porto Alegre, em 13 de fevereiro de 1981, com cerca de 100 mm em 1 hora um exemplo. As precipitaes frontais atuam sobre grandes reas provocando as maiores inundaes dos grandes rios. A cobertura vegetal tem como efeito a interceptao de parte da precipitao que pode gerar escoamento e a proteo do solo contra a eroso. A perda desta cobertura para uso agrcola tem produzido como conseqncia o aumento da freqncia de inundaes devido falta de interceptao da precipitao e ao assoreamento dos rios. As condies artificiais da bacia so aquelas provocadas pela ao do homem. Alguns exemplos so: obras hidrulicas, urbanizao, desmatamento, reflorestamento e uso agrcola. A bacia rural possui maior interceptao vegetal, maiores reas permeveis (infiltrao do solo), menor escoamento na superfcie do solo e drenagem mais lenta. A bacia urbana possui superfcies impermeveis, tais como telhados, ruas e pisos, e produz acelerao no escoamento, atravs da canalizao e da drenagem superficial. Os resultados da urbanizao sobre o escoamento so: aumento da vazo mxima e do escoamento superficial, reduo do tempo de pico e diminuio do tempo de base. A urbanizao e o desmatamento produzem um aumento da freqncia da inundao nas cheias pequenas e mdias. Nas grandes cheias o seu efeito menor, pois a capacidade de saturao do solo e o armazenamento so atingidos e o efeito final pouco difere.

2.2 Ocupao do espao urbano e impacto das inundaesAs inundaes so mais antigas que a existncia do homem na terra. O homem sempre procurou se localizar perto dos rios para us-lo como transporte, obter gua para seu consumo e mesmo dispor seus dejetos. As reas prximas aos rios geralmente so planas, propcias para o assentamento humano, que motivou a sua ocupao. O desenvolvimento histrico da utilizao de reas livres explica os condicionamentos urbanos hoje existentes. Devido grande dificuldade de meios de transporte no passado, utilizava-se o rio como a via principal. As cidades se desenvolveram s margens dos rios ou no litoral. Pela prpria experincia dos antigos moradores, a populao procurou habitar as zonas mais altas aonde o rio dificilmente chegaria. Com o crescimento desordenado e acelerado das cidades, principalmente na segunda metade deste sculo, as reas de risco considervel, como as vrzeas inundveis, foram ocupadas, trazendo como conseqncia prejuzos humanos e materiais de grande monta.

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Os prejuzos ocorrem devido falta de planejamento do espao e o conhecimento do risco das reas de inundaes. A experincia de gesto de inundaes j ocorria a milhares de anos. No histrico da tabela 2.1 observase que a mais de 3000 no passado as pessoas j planejavam a ocupao do espao de inundao, mas que ainda hoje ainda no uma prtica corrente. Tabela 2.1 Histrico de ocupao de reas de inundaoA cidade de Amarna no Egito, que Aquenaton (1340 aC) escolheu para ser uma nova capital foi planejada considerando as reas inundaes, veja o relato: Correndo de leste para oeste, dois leitos secos de rio, nos quais nada se construiu por medo das enchentes repentinas, dividiam a cidade em trs partes: o centro e os bairros residenciais de norte e do sul. Brier (1998).

A histria mostra em diferentes partes do globo que o homem tem procurado conviver com as inundaes, desde as mais freqentes as mais raras. Uma experincia histrica a da igreja catlica, pois sempre que ocorre uma inundao numa cidade o prdio da igreja, apesar de ser uma das obras mais antigas, localiza-se em nvel seguro. A gesto de inundao envolve a minimizao dos impactos e dificilmente elimin-los, devido s limitaes econmicas e do conhecimento da natureza. Na tabela 2.2 apresentado o prefcio apresentado por Hoyt e Langbein (1959) que caracteriza o carter limitado que tem o homem de controlar as inundaes. As inundaes representam 50% dos desastres naturais relacionados com a gua, dos quais 20% ocorrem nas Amricas. Na figura 2.1 apresentada a curva dos prejuzos anuais dos Estados Unidos devido as inundaes ribeirinhas. Pode-se observar que os valores variam de 0,02 a 0,48 do PIB, com valor mdio de 0,081% (cerca de US$ 8,1 bilhes de dlares). Tabela 2.2 Histrico e suposies que demonstram a limitao da gesto das inundaes(prefcio do livrofloods de Hoyt e Langbein, 1959) Terra de Canaan, 2957 a C, numa grande inundao, provavelmente centrada cerca do UR no Eufrates, No e sua famlia se salvaram. Um dilvio resultante de 40 dias e 40 noites de continua precipitao ocorreu na regio. Terras ficaram inundadas por 150 dias. Todas as criaturas vivas afogaram com exceo de No, sua famlia e animais, dois a dois, foram salvos numa arca e finalmente descansaram no Monte Ararat (passagem da bblia sobre o Dilvio, citada no referido prefcio). Este texto caracteriza um evento de risco muito baixo de ocorrncia. Egito XXIII, Dinastia, 747 a C. Enchentes sucedem secas. Fara anunciou que todo o vale do rio Nilo foi inundado, templos esto cheios de gua e o homem parece planta dgua. Aparentemente os polders no so suficientemente altos ou fortes para confinar as cheias na seo normal. A presente catstrofe descreve bem os caprichos da natureza, outro fara reclamou que por sete anos o Nilo no subiu. Este texto que tambm pode ser encontrado relatos na Bblia tambm enfatiza a incapacidade de prever o clima e seus impactos quando ocorrem. Em algum lugar nos Estados Unidos no futuro (o autor mencionava ano 2000, muito distante na poca). A natureza toma seu inexorvel preo. Cheia de 1000 anos causou indestrutvel dano e perdas de vida. Engenheiros e Meteorologistas acreditam que a presente tormenta resultou da combinao de condies meteorolgicas e hidrolgicas que ocorreriam uma vez em mil anos. Reservatrios, diques e outras obras de controle que provaram efetivas por um sculo e so efetivas para sua capacidade de projeto so30

incapazes de controlar os grandes volumes de gua envolvidos. Esta catstrofe traz uma lio que a proteo contra inundaes relativa e eventualmente a natureza cobra um preo daqueles que ocupam a vrzea de inundao. "

As inundaes ribeirinhas ocorrem principalmente devido ocupao do solo das reas ribeirinhas do leito maior. Nos perodos de pequena inundao existe a tendncia de ocupar as reas de risco e quando ocorrem as maiores inundaes os prejuzos so significativos. A seguir so apresentados alguns casos sobre impactos devidos a este tipo de cenrio: (a) No rio Itaja em Santa Catarina no Brasil existe uma srie de nveis mximos de inundaes desde 1852. Deste histrico pode-se observar que as trs maiores inundaes em Blumenau ocorreram entre 1852 e 1911, sendo a maior em 1880 com 17,10 m (figura 2.2). Entre 1911 e 1982 no ocorreu nenhuma inundao com cota superior a 12,90 m, o que fez com que a populao perdesse a memria dos eventos crticos e ocupasse o vale de inundao. Em 1983, quando a cidade se encontrava bem desenvolvida com populao de cerca de 500 mil habitantes ocorreu uma inundao (a quinta em magnitude dos ltimos 150 anos) com cota mxima de 15,34 m. Os prejuzos resultantes em todo o Vale do Itaja representaram cerca de 8% do PIB de Santa Catarina. A lio tirada deste exemplo que a memria sobre as inundaes se dissipa com passar do tempo e a populao deixa de considerar o risco, como no h planejamento do espao de risco a ocupao ocorre e os prejuzos so significativos. No entanto, a Cia Hering em Blumenau (fundada em 1880, ano da maior inundao) manteve na memria o valor de 17,10m e desenvolveu suas instalaes em cota superior a esta. Sem planejamento os relatos histricos so as nicas informaes disponveis para orientar as pessoas.0,60 0,50 0,40 % do PIB 0,30 0,20 0,10 0,00

Figura 2.1 Srie histrica do prejuzo anual devido inundaes nos Estados Unidos como % doPIB ( Priscoli ,2001)

19 03 19 08 19 13 19 18 19 23 19 28 19 33 19 38 19 43 19 48 19 53 19 58 19 63 19 68 19 73 19 78 19 83 19 88 19 93 19 98anos31

(b) Na figura 2.3 pode-se observar os nveis de enchentes no rio Iguau em Unio da Vitria. Entre 1959 e 1982 ocorreu apenas um inundaes com risco superior a 5 anos. Este perodo foi justamente o de maior crescimento econmico e expanso das cidades brasileiras As enchentes aps 1982 produziram prejuzos significativos na comunidade (tabela 2.3).18 16 flood level, mZ m

14 12 10 8 6 4 2 0 1850flood levels Mximos Limite level lower flood do leito menor

1900Ano year

1950

2000

Figura 2.2 Nveis de inundaes em Blumenau, S. Catarina, Brasil

Figura 2.3 Nveis mximos de enchentes no rio Iguau em Unio da Vitria (bacia de cerca de 25.000 km2),(Tucci and Villanueva, 1997)

(c) No alto rio Paraguai existe uma das maiores banhados do mundo, denominado Pantanal. Nesta regio sempre houve uma convivncia pacfica entre o meio ambiente e a populao. Na figura 2.4 pode-se observar os nveis mximos de enchentes em Ladrio desde o incio do32

sculo. Na tabela 2.4 so apresentados valores do nvel mximo mdio de inundao e das reas inundadas do Pantanal em trs perodos distintos. Pode-se observar a grande diferena da dcada de 60 com relao as demais. Neste perodo houve ocupao dos vales de inundao por perodos longos e no apenas sazonalmente. A populao foi desalojada nas dcadas seguintes em funo do aumento da freqncia dos nveis de inundao. A perda econmica do valor das propriedades e falta de sustentao econmica foi a conseqncia imediata. Esta populao passou a viver na periferia das cidades da regio em estado de pobreza. Uma propriedade que inundava 20% do tempo na dcada de 60, atualmente fica 97% inundada. Tabela 2.3 Perdas por inundaes em Unio da Vitria e Porto UnioAno 1982 1983 1992 1993 Prejuzos US$ milhes 10.365 78.121 54.582 25.933(JICA, 1995)

(d) Em Porto Alegre, RS existem nveis de inundao desde 1899, quando se observaram vrios eventos at 1967 (figura 2.5). Em 1970 foi construdo um dique de proteo para a cidade e desde 1967 no ocorre nenhuma inundao com tempo de retorno superior a 10 anos (~2,94 m). Nos ltimos anos houve um movimento na cidade para a retirada do dique de inundao, considerando que no tinham ocorrido eventos nos ltimos 38 anos. Esta percepo errada do risco de inundao levou a Cmara de Vereadores a aprovar a derrubada do dique, que felizmente no foi executada pelo municpio.7 6 Annuall Flood levels, m 5 4 3 2 1 0 1900

1920

1940 Years

1960

1980

2000

Figure 2.4 Nveis mximos anuais em Ladario no Rio Paraguai e a mdia dos perodos: (a) 19001961; (b)1961-1973; (c)1973-1991

O ambiente institucional de controle de inundaes nos pases em desenvolvimento geralmente no leva a uma soluo sustentvel. Existem,33

apenas, poucas aes isoladas de alguns poucos profissionais. Em geral, o atendimento a enchente somente realizado depois de sua ocorrncia. A tendncia que o problema fique no esquecimento aps cada enchente, retornando na seguinte. Isso se deve a vrios fatores, entre os quais esto os seguintes:

Tabela 2.4 Valores estimados de nveis e reas inundadas no Pantanal (valores aproximados)Perodo 1900-1959 1960 1972 1973-1992 Nvel Mximo Mdio rea Inundada Mdia no Pantanal m * 1000. Km2 4,16 35 2,21 15 5,49 50

* valores aproximados obtidos de Hamilton ( 1995) falta de conhecimento sobre controle de enchentes por parte dos

planejadores urbanos; desorganizao, a nveis federal e estadual, sobre gerenciamento de

enchentes; pouca informao tcnica sobre o assunto em nvel de graduao na Engenharia; o desgaste poltico para os administradores pblicos no controle no-estrutural (zoneamento), j que a populao est sempre esperando uma obra hidrulica; falta de conhecimento da populao sobre controle de enchentes; Em alguns locais no existe interesse na preveno das inundaes, pois quando ocorrem, os recursos so fornecidos gratuitamente.5 4,5 4 3,5 anos 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 1890 1910 1930 1950 nveis, m 1970 1990

Figura 2.5 Nveis de inundao em Porto Alegre 1899-1994

2.3 Avaliao das enchentes

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A variao do nvel ou de vazo de um rio depende das caractersticas climatolgicas e fsicas da bacia hidrogrfica. As distribuies temporal e espacial da precipitao so as principais condies climatolgicas. As mesmas somente podem ser previstas com antecedncia de poucos dias ou horas, o que no permite a previso dos nveis de enchente com antecipao muito grande. O tempo mximo possvel de previso da cheia, a partir da ocorrncia da precipitao, limitado pelo tempo mdio de deslocamento da gua na bacia at a seo de interesse. A previso dos nveis num rio pode ser realizada a curto ou em longo prazos. A previso de cheia em curto prazo ou em tempo atual, tambm chamada de tempo-real, permite estabelecer o nvel e seu tempo de ocorrncia para a seo de um rio com antecedncia que depende da previso da precipitao e dos deslocamentos da cheia na bacia. Este tipo de previso utilizado para alertar a populao ribeirinha e operadores de obras hidrulicas. A previso de cheia em longo prazo quantifica as chances de ocorrncia da inundao em termos estatsticos, sem precisar quando ocorrer a cheia. A previso em longo prazo se baseia na estatstica de ocorrncia de nveis no passado e permite estabelecer os nveis de enchente para alguns riscos escolhidos.2.3.1 Previso de Cheia em Tempo Atual

Para efetuar a previso de cheia em curto prazo so necessrios: sistemas de coleta e transmisso de dados e metodologia de estimativa. Os sistemas so utilizados para transmitir os dados de precipitao, nvel e vazo, durante a ocorrncia do evento. O processo de estimativa realizado atravs do uso de modelos matemticos que representam o comportamento das diferentes fases do ciclo hidrolgico. Complementarmente necessrio um Plano de Defesa Civil, quando a enchente atinge uma rea habitada, ou no caso de operao de reservatrio um sistema de emergncia e operao. A previso de nveis de enchentes pode ser realizada com base em (figura 2.6): (a) previso da precipitao; (b) conhecida a precipitao; (c) vazo de montante; (d) combinao dos dois ltimos. No primeiro caso necessrio estimar a precipitao que cair sobre a bacia atravs do uso de equipamento como radar ou de sensoriamento remoto. A seguir, conhecida a precipitao sobre a bacia, possvel estimar a vazo e o nvel por modelo matemtico que simule a transformao de precipitao em vazo. A previso, quando conhecida a precipitao na bacia, utiliza uma rede telemtrica de coleta e transmisso de dados (no caso anterior esta rede no dispensvel) e o referido modelo matemtico de transformao de precipitao em vazo. A antecedncia de previso menor neste caso e est limitada ao tempo mdio de deslocamento da enchente (figura 2.6a). A previso em curto prazo, com base em posto montante da seo de interesse, depende das caractersticas do rio, ou seja da rea controlada da bacia. Neste caso, o tempo de antecedncia menor que os anteriores (figura 2.6b). Quando a bacia intermediria, da situao anterior, apresentar uma contribuio significativa, a combinao dos dois processos anteriores

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utilizada na previso em tempo atual (figura 2.6c). A apresentao dos modelos de previso em tempo atual foge ao escopo deste livro e pode ser encontrado na literatura especializada.2.3.2 Probabilidade ou risco da inundao:

O risco de uma vazo ou precipitao entendido neste texto como a probabilidade (p) de ocorrncia de um valor igual ou superior num ano qualquer. O tempo de retorno (T) o inverso da probabilidade p e representa o tempo, em mdia, que este evento tem chance de se repetir.T= 1 p

(2.1)

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Figura 2.6. Previso em tempo atual

Para exemplificar, considere um dado, que tem seis faces (nmeros 1 a 6). Numa jogada qualquer a probabilidade de sair o nmero 4 p=1/6 (1 chance em seis possibilidades). O tempo de retorno , em mdia, o nmero de jogadas que o nmero desejado se repete. Nesse caso, usando a equao 2.1 acima fica T = 1/(1/6)=6. Portanto, em mdia, o nmero 4 se repete a cada seis jogadas. Sabe-se que esse nmero no ocorre exatamente a cada seis jogadas, mas se jogarmos milhares de vezes e tirarmos a mdia, certamente isso ocorrer. Sendo assim, o nmero 4 pode ocorrer duas vezes seguidas e

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passar muitas sem ocorrer, mas na mdia se repetir em seis jogadas. Fazendo uma analogia, cada jogada do dado um ano para as enchentes. O tempo de retorno de 10 anos significa que, em mdia, a cheia pode se repetir a cada 10 anos ou em cada ano esta enchente tem 10% de chance de ocorrer. As estimativas de inundao de um determinado local pode ser realizada com base em : (a) srie observada de vazes; (b) regionalizao de vazes; (c) com base na precipitao e uso de modelo precipitao vazo. Estas metodologias estimam o risco de inundao no local com base nos histricos ocorridos e consideram que as sries histricas de vazes so: Homogneas ou estacionrias, ou seja as suas estatsticas no se alteram com o tempo. Isto significa que a mdia das vazes ou seu desvio padro no deveriam se alterar ao no longo do tempo. Por exemplo, ao ser construda uma barragem a montante de uma seo de um rio com volume importante para amortecimento de inundao, o risco da inundao deve mudar porque a srie no mais homognea; As sries registradas de nveis de inundao so representativas da ocorrncia no local: Poucos anos de dados podem no ser representativos do real risco de um local. No exemplo de Blumenau, caso fossem utilizadas sries somente partir de 1935, em 1982 o risco de uma inundao como a que ocorreu em 1983 teria um risco superior a 100 anos, quando considerando os nveis obtidos no sculo 19 e mesmo a cheia de 83 e 984, observa-se que seu risco da ordem de 30 anos; Os valores so independentes entre si. Geralmente uma cheia mxima de um ano no guarda dependncia com o ano seguinte se forem escolhidas dentro do chamado ano hidrolgico, que o perodo do incio do ms chuvoso ao final do ms seco.

Os dois primeiros itens apresentam a maior quantidade de incertezas e a utilizao de marcas de inundaes essencial para um ajuste confivel da curva de probabilidade de vazes nos locais de interesse. As metodologias para determinao da curva de probabilidade so descritas nos livros de hidrologia (Tucci, 1993).

2.4 Medidas de controle das inundaes ribeirinhasAs medidas para o controle da inundao podem ser do tipo estrutural e no-estrutural. As medidas estruturais so aquelas que modificam o sistema fluvial atravs de obras na bacia (medidas extensivas) ou no rio (medidas intensivas) para evitar o extravasamento do escoamento para o leito maior decorrentes das enchentes. As medidas no-estruturais so aquelas em que os prejuzos so reduzidos pela melhor convivncia da populao com as enchentes, atravs de medidas preventivas como o alerta de inundao, zoneamento das reas de risco,

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seguro contra inundaes, e medidas de proteo individual (flood proofing). ingenuidade do homem imaginar que poder controlar totalmente as inundaes, as medidas sempre visam minimizar as suas conseqncias, mesmo as estruturais. Por exemplo, Na dcada de 30, o projeto de controle de cheias e uso da terra para a agricultura do rio P, na Itlia era um exemplo de projeto de recursos hdricos bem-sucedido. Em 1951, uma combinao de precipitaes intensas e altos nveis da mar, destruram os polders, causaram 100 mortes e a perda de 30.000 cabeas de gado, alm das perdas agrcolas (Hoyt e Langbein,1955). Este exemplo, refora a viso limitada da gesto de controle das inundaes ribeirinhas expressa na tabela 2.2. O controle da inundao obtido por uma combinao de medidas estruturais e no-estruturais que permita populao ribeirinha minimizar suas perdas e manter uma convivncia harmnica com o rio. As aes incluem medidas de engenharia e de cunho social, econmico e administrativo. A pesquisa para a combinao tima dessas aes constitui o planejamento da proteo contra a inundao ou seus efeitos. Um exemplo de poltica de gesto de inundaes ocorreu nos Estados Unidos. Em 1936 foi aprovada uma lei em nvel federal, sobre controle de enchentes, que identificava a natureza pblica dos programas de reduo de enchentes e caracterizava a implantao de medidas fsicas ou estruturais como um meio de reduzir estes danos. Desta forma, no era necessrio verificar as relaes de custo/benefcio para justificar a proteo das reas sujeitas a inundaes. Com isso, acelerou-se o desenvolvimento e ocupao das vrzeas, o que resultou em aumento dos danos ocasionados pelas enchentes. As perdas mdias anuais, devido s enchentes, aumentaram e a disponibilidade dos fundos pblicos foi insuficiente para atender a esta tendncia. Em 1966, o governo reconheceu que as medidas anteriores no eram adequadas e deu nfase a medidas no-estruturais, que permitiriam populao conviver com a cheia. O comit criado pela American Society of Civil Engineers sobre controle de enchentes, relatou, em 1962, o seguinte (Task, 1962): "As limitaes da presente (em 1962) Poltica Nacional de Controle de Enchentes, a qual baseada principalmente na construo de obras de controle de inundao, so reconhecidas neste relatrio, o qual enfatiza a necessidade para a regulamentao das vrzeas de inundao como uma parte essencial de um plano racional de reduo das perdas das cheias". Em 1973, foi aprovada uma lei sobre proteo contra desastres de enchentes, dando nfase a medidas no-estruturais, encorajando e exigindo o seguro para enchentes e regulamentao do uso da terra e proteo das novas construes para enchentes de 100 anos tempo de retorno. Em 1974 foram aprovados, dentro da Legislao de Desenvolvimento de Recursos Hdricos, artigos especficos sobre enchentes que previam medidas no-estruturais e a distribuio de custos, como no artigo 73 da Lei de 1974: "Em pesquisa, planejamento ou projeto de qualquer Agncia Federal, ou de qualquer projeto envolvendo a proteo contra inundaes, deve ser dada prioridade s alternativas no-estruturais para reduo de prejuzos de inundao, incluindo, mas no limitando s construes prova de enchentes,

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regulamentao das reas de inundao; utilizao das reas de inundao para usos recreacionais, pesca, vida animal e outras finalidades pblicas e relocao com vistas a formulao da soluo economicamente, socialmente e de meio ambiente mais aceitvel para reduo dos danos de enchentes". Na figura 2.7 apresentada a evoluo dos benefcios anuais, benefcios acumulados e os investimentos em gesto de inundao at 1999 (com valores ajustados ao dlar de 1999). Pode-se observar desta figura que os benefcios acumulados superaram em muito os investimentos na gesto das inundaes.800 700 600 US $ bilhes 500 400 300 200 100 0 1920 1930 1940 1950 1960 anos 1970 1980 1990 2000 gastos acumulados benefcios anuais benefcios acumulados

Figura 2.7 Evoluo dos benefcios anuais e acumulados e dos gastos na gesto de inundao nosEstados Unidos ( Priscoli,2001).

2.5 Medidas EstruturaisAs medidas estruturais so obras de engenharia implementadas para reduzir o risco de enchentes. Essas medidas podem ser extensivas ou intensivas. As medidas extensivas so aquelas que agem na bacia, procurando modificar as relaes entre precipitao e vazo, como a alterao da cobertura vegetal do solo, que reduz e retarda os picos de enchente e controla a eroso da bacia. As medidas intensivas so aquelas que agem no rio e podem ser de trs tipos (Simons et al., 1977): (a) aceleram o escoamento: construo de diques e polders, aumento da capacidade de descarga dos rios e corte de meandros; b) retardam o escoamento: Reservatrios e as bacias de amortecimento; c) desvio do escoamento, so obras como canais de desvios. Na tabela 2.5 so resumidas as principais caractersticas das medidas estruturais.2.5.1 Medidas Extensivas:

As medidas extensivas so: Cobertura vegetal: a cobertura vegetal tem capacidade de armazenar parte do volume de gua precipitado pela interceptao vegetal, aumentar a evapotranspirao e de reduzir a velocidade do escoamento superficial pela40

bacia hidrogrfica. Quando retirada a cobertura vegetal a tendncia de aumentar o volume escoado, as cheias e reduo das estiagens, aumentando a variabilidade das vazes. O aumento da cobertura uma medida extensiva para reduo das inundaes, mas aplicvel a pequenas bacias, onde tem mais efeito ( < 10 km2). O efeito maior deste tipo de medida sobre os eventos mais freqentes de alto risco de ocorrncia. Para eventos raros de baixo risco o efeito da cobertura vegetal tende a ser pequeno.Tabela 2.5 Medidas estruturais (Simons et al. 1977) Medida Principal vantagem Principal desvantagem Medidas extensivas Alterao da Reduo do pico de Impraticvel para Cobertura vegetal cheia grandes reas Controle de perda do Reduz assoreamento Idem ao anterior solo Medidas intensivas Diques e polders Alto grau de proteo Danos significativos de uma rea caso falhe Melhoria do canal: Reduo da Aumento da vazo com Efeito localizado rugosidade por pouco investimento desobstruo Corte de meandro Amplia a rea Impacto negativo em protegida e acelera o rio com fundo escoamento aluvionar Reservatrio: Todos os Controle a jusante Localizao difcil reservatrios devido a desapropriao Reservatrios com Mais eficiente com o Vulnervel a erros comportas mesmo volume humanos Reservatrios para Operao com mnimo Custo no partilhado cheias de pedras Mudana de canal: Caminho da cheia Amortecimento de Depende da volume topografia Desvios Reduz vazo do canal Idem ao anterior principal

Aplicao Pequenas bacias Pequenas bacias Grandes rios e na plancie. Pequenos rios rea de inundao estreita Bacias intermedirias Projetos de usos mltiplos Restrito ao controle de enchentes Grandes Bacias Bacias mdias e grandes

Controle da eroso do solo: o aumento da eroso tem implicaes ambientais pelo transporte de sedimentos e seus agregados, podendo contaminar os rios a jusante e diminuir a sua seo e alterando o balano de carga e transporte dos rios. Um dos fatores a reduo da seo dos rios e o aumento da freqncia das inundaes em locais de maior sedimentao. O controle da eroso do solo pode ser realizado pelo reflorestamento, pequenos reservatrios, estabilizao das margens e prticas agrcolas corretas. Esta medida contribui para a reduo dos impactos das inundaes.

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2.5.2 Medidas Intensivas

As medidas intensivas so: Reservatrio: O reservatrio de controle de enchentes funciona retendo o volume do hidrograma durante as enchentes, reduzindo o pico e o impacto a jusante do barramento. Na figura 2.8 observa-se o hidrograma natural de um rio. Considerando um volume V do hidrograma capaz de ser retido por um reservatrio, pode-se observar a reduo da vazo mxima e o hidrograma resultante. Os reservatrios para controle de inundaes podem se uso exclusivo para esta finalidade ou pem ser usos mltiplos. O primeiro tem como objetivo somente minimizar as inundaes, enquanto que o segundo tem mais de um objetivo, que so muitas vezes conflitantes. Um reservatrio sem controle de operao aquele que no dispe de comportas de vertedor ou de fundo e a cheia regulada pelas condies do vertedor livre. Quando existem comportas possvel utili