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CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE – CCS Departamento de Microbiologia e Parasitologia Disciplina de Microbiologia Geral 1 Prof. Daniel Roulim Stainki UFSM MÉTODOS DE CONTROLE DOS MICROORGANISMOS. (1.4) 1. INTRODUÇÃO. A ciência para o controle do crescimento microbiano teve início a cerca de 100 anos, quando Pasteur levou os pesquisadores a acreditarem que os micróbios seriam uma possível causa das doenças. Na metade do século XIX, o médico húngaro Ignaz Semmelweis e o médico inglês Joseph Lister utilizaram algumas das primeiras práticas de controle microbiano para procedimentos médicos. Essas práticas incluíam a lavagem das mãos com hipoclorito de cálcio e a utilização de técnicas cirúrgicas assépticas. Até aquele momento as infecções nosocomiais matavam pelo menos 10% dos pacientes cirúrgicos e 25% das parturientes. A ignorância a respeito dos microorganismos era tanta que, durante a Guerra Civil Americana, não era incomum um cirurgião limpar seu bisturi, entre as incisões, na sola de sua bota. A prevenção e o controle de enfermidades infecciosas podem ser eficientemente realizados mediante aplicação de agentes químicos ou físicos sobre os microorganismos antes que estes entrem em contato com os hospedeiros, ou antes que atravessem a barreira cutânea. Tais procedimentos podem ser utilizados sobre os alimentos, água, objetos em geral ou sobre a pele/mucosa. A natureza do agente a ser utilizado (físico ou químico), seu tipo específico (grupo a que pertence) e sua intensidade de aplicação têm de ser apropriados para a natureza do material que se vai submeter ao tratamento, bem como devem ser condizentes com o grau de eliminação dos microorganismos que se almeja alcançar. Assim sendo, pode-se planejar desde uma inativação seletiva, até uma destruição completa de todos os micróbios presentes no local. Sendo assim faz-se necessário conceituar alguns vocábulos essenciais e fazer considerações básicas sobre os mesmos. 2. TERMINOLOGIAS DO CONTROLE BACTERIANO. a) Esterilização: é a destruição ou remoção dos microorganismos patogênicos e não patogênicos (todas as formas de vida) de um objeto ou material. Este processo pode ser executado mediante emprego de métodos químicos ou físicos. O aquecimento é o método mais comumente utilizado para matar os microorganismos, incluindo as formas mais resistentes, como os endosporos. É um processo absoluto, não havendo graus de esterilização. Ex: instrumental cirúrgico para a realização do procedimento operatório. b) Desinfecção: é o emprego de métodos químicos ou físicos com vistas a destruir ou inibir microorganismos patogênicos em objetos inanimados (superfícies) ou em ambiente. Ex: salas cirúrgicas e baias. c) Antissepsia: é a manobra que promove a destruição ou inativação dos

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MÉTODOS DE CONTROLE DOS MICROORGANISMOS. (1.4)

1. INTRODUÇÃO.

A ciência para o controle do crescimento microbiano teve início a cerca de 100 anos, quando Pasteur levou os pesquisadores a acreditarem que os micróbios seriam uma possível causa das doenças.

Na metade do século XIX, o médico húngaro Ignaz Semmelweis e o médico inglês Joseph Lister utilizaram algumas das primeiras práticas de controle microbiano para procedimentos médicos. Essas práticas incluíam a lavagem das mãos com hipoclorito de cálcio e a utilização de técnicas cirúrgicas assépticas. Até aquele momento as infecções nosocomiais matavam pelo menos 10% dos pacientes cirúrgicos e 25% das parturientes. A ignorância a respeito dos microorganismos era tanta que, durante a Guerra Civil Americana, não era incomum um cirurgião limpar seu bisturi, entre as incisões, na sola de sua bota.

A prevenção e o controle de enfermidades infecciosas podem ser eficientemente realizados mediante aplicação de agentes químicos ou físicos sobre os microorganismos antes que estes entrem em contato com os hospedeiros, ou antes que atravessem a barreira cutânea. Tais procedimentos podem ser utilizados sobre os alimentos, água, objetos em geral ou sobre a pele/mucosa. A natureza do agente a ser utilizado (físico ou químico), seu tipo específico (grupo a que pertence) e sua intensidade de aplicação têm de ser apropriados para a natureza do material que se vai submeter ao tratamento, bem como devem ser condizentes com o grau de eliminação dos microorganismos que se almeja alcançar. Assim sendo, pode-se planejar desde uma inativação seletiva, até uma destruição completa de todos os micróbios presentes no local. Sendo assim faz-se necessário conceituar alguns vocábulos essenciais e fazer considerações básicas sobre os mesmos.

2. TERMINOLOGIAS DO CONTROLE BACTERIANO.

a) Esterilização: é a destruição ou remoção dos microorganismos patogênicos e não patogênicos (todas as formas de vida) de um objeto ou material. Este processo pode ser executado mediante emprego de métodos químicos ou físicos. O aquecimento é o método mais comumente utilizado para matar os microorganismos, incluindo as formas mais resistentes, como os endosporos. É um processo absoluto, não havendo graus de esterilização. Ex: instrumental cirúrgico para a realização do procedimento operatório.

b) Desinfecção: é o emprego de métodos químicos ou físicos com vistas a destruir ou inibir microorganismos patogênicos em objetos inanimados (superfícies) ou em ambiente. Ex: salas cirúrgicas e baias.

c) Antissepsia: é a manobra que promove a destruição ou inativação dos

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microorganismos (desinfecção química) da pele, mucosas e outros tecidos vivos animais ou humanos. Ex: antissepsia das mãos do cirurgião. O produto químico utilizado para a antissepsia é denominado antisséptico.

OBS: a desinfecção difere da antissepsia pelo fato de esta segunda se referir

apenas aos tecidos vivos, por isso deve se evitar o uso de expressões tais como “desinfecção da pele ou ferida”, ou mesmo, “antissepsia de um instrumental cirúrgico”; o correto é dizer “antissepsia da pele ou da ferida” e “desinfecção do instrumental cirúrgico” .

d) Assepsia: é o conjunto de procedimentos que se empregam para evitar a infecção dos tecidos durante as intervenções cirúrgicas. Engloba as manobras de esterilização, desinfecção e anti-sepsia.

e) Degermação: retirada dos microorganismos da pele por meio da remoção

mecânica ou pelo uso de antissépticos. Ex: o ato de passar o algodão embebido em álcool-iodado na pele antes da aplicação de uma injeção.

f) Germicida ou Biocida: agentes químicos (ou físicos) que são capazes de matar

os microorganismos. Ex: bactericida é o que mata a bactéria, virucida é o que mata os vírus, fungicida é o que mata os fungos e esporocida é o que mata os esporos.

Os termos bacteriostático e fungiostático designam os compostos químicos que apresentam a propriedade de inibir o crescimento e a multiplicação das bactérias e fungos, respectivamente. O termo virustático deve ser utilizado para os medicamentos que são empregados parenteralmente, tendo em vista que, não ocorre a multiplicação viral fora das células.

g) Sanitização: designa o tratamento, em nível industrial, que leva à diminuição

da população microbiana nos alimentos não processados, em utensílios para a manipulação dos alimentos, até atingir um padrão seguro para a saúde pública. EX: lavagens em altas temperaturas, imersão em desinfetantes químicos (sanitizantes).

h) Sepse ou septicemia: indica contaminação bacteriana grave do organismo por

micróbios patogênicos.

3. MÉTODOS DE CONTROLE E ELIMINAÇÃO MICROBIANA. Os métodos de controle e eliminação de microorganismos em objetos (incluindo

alimentos), ambientes e superfície corporal diferem conforme a natureza do micróbio, bem como do item a ser higienizado. Existe uma variação muito grande entre os microorganismos quanto à sensibilidade aos métodos empregados para o controle e

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eliminação dos mesmos. Deve-se observar o fato de que, a princípio, o termo “controle” se refere aos métodos que visam reduzir a população microbiana a quantidades toleráveis ou, então, estratégias que impedem a referida população de crescer além dos limites aceitáveis. Já a palavra “eliminação” significa extermínio total dos microorganismos em determinado local.

Em uma visão global, os principais métodos físicos e químicos, não quimioterápicos, para o controle e eliminação microbiana são:

3.1 – MÉTODOS FÍSICOS. a) Temperatura: o calor constitui um dos mais importantes métodos empregados

para o controle do crescimento e para a eliminação de microorganismos. É um dos métodos preferenciais por ser eficiente contra os micróbios, relativamente seguro para quem o executa, ter custo baixo e por não formar produtos tóxicos. Da mesma forma o método que se baseia nas baixas temperaturas se apresenta seguro para quem o usa e não forma produtos nocivos.

O calor aparentemente mata os microorganismos pela desnaturação de suas enzimas, que resulta na mudança tridimensional dessas proteínas, inativando-as. A resistência ao calor varia entre os diferentes microorganismos, e essas diferenças podem ser expressas pelo conceito de ponto de morte térmica (PMT ). O PMT é a menor temperatura em que todos os microorganismos em uma suspensão líquida específica serão mortos em 10 minutos. Outro fator a ser considerado no processo de esterilização é o tempo requerido para o material se tornar estéril. Esse período é expresso como tempo de morte térmica (TMT ), que designa o tempo mínimo em que todas as bactérias em uma determinada cultura líquida específica serão mortas, em uma determinada temperatura.

Esterilização pelo calor: distinguem-se o calor úmido e o calor seco. O calor úmido é a água ou o vapor de água a alta temperatura, possui maior poder de penetração comparativamente ao calor seco. O quadro 07, abaixo, especifica as diferentes formas de controle microbiano pelo uso de calor úmido.

Quadro 07 – Métodos físicos de calor úmido empregados para o controle

microbiano. MÉTODO MECANISMO DE

AÇÃO COMENTÁRIOS USO

PREFERENCIAL Fervura Desnaturação de

proteínas. Destrói bactérias, fungos e muitos vírus ao redor de 15 minutos. Não é eficaz para todos os endósporos.

Processo de desinfecção de larga utilização caseira.

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Autoclavação Desnaturação de proteínas.

Método eficaz de esterilização. Deve-se observar o trinômio: tempo X temp. X pressão

Meios de cultura, soluções, utensílios e instrumentais.

Pasteurização Desnaturação de proteínas.

Mata bactérias patogênicas eventualmente transmissíveis pelo leite e reduz o número de todos os microorganismos presentes.

Leite, creme de leite, cerveja, vinho, etc.

A autoclavação requer um equipamento chamado autoclave, e a esterilização é alcançada após 45 minutos a 115ºC, ou 15 minutos a 121ºC. A pasteurização é um procedimento usado principalmente na indústria, para o tratamento em alimentos e controle da população microbiana, mas preservando boa parte de importantes substâncias nutrientes. O alimento é submetido ao calor, seguido de resfriamento brusco. São basicamente três tipos de pasteurização: temperatura ultra-alta (ultra-high temperature – UHT), 141ºC por 2 segundos; alta temperatura por curto tempo (high temperature short time – HTST), 72ºC por 15 segundos; baixa temperatura (low temperature – LT), 63ºC por 30 minutos. Entre os métodos de calor seco empregados para o controle dos microorganismos temos os seguintes (Quadro 08).

Quadro 08 – Métodos físicos de calor seco empregados para o controle microbiano.

MÉTODO MECANISMO DE AÇÃO

COMENTÁRIOS USO PREFERENCIAL

Flambagem Oxidação de todo material.

Método eficaz de esterilização.

Alça e fio de platina.

Incineração Oxidação do material até tornar cinzas.

Método eficaz de esterilização.

Papéis, carcaças de animais, restos de curativos e outros materiais hospitalares descartáveis.

Estufas/fornos Oxidação. Métodos de esterilização (tempo X Temperatura).

Vidrarias e outros materiais resistentes ao calor.

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O calor seco mata os microorganismos por efeitos de oxidação. Uma analogia simples é a lenta carbonização do papel em um forno aquecido, mesmo quando a temperatura permanece abaixo do ponto de ignição do papel. Um dos métodos mais simples de esterilização com calor seco é a chama direta ou flambagem, o qual será utilizado muitas vezes no laboratório de microbiologia para a esterilização das alças de inoculação. E para que o processo de esterilização seja efetivo neste processo, a alça de inoculação deverá ser aquecida até a obtenção de um brilho vermelho (incandescente). Baixas temperaturas: atuam principalmente mediante redução da atividade enzimática microbiana, o que diminui sua taxa metabólica e velocidade de crescimento. No geral as baixas temperaturas são utilizadas apenas como método de preservação dos microorganismos, embora, dependendo da intensidade de aplicação, poderá acarretar na morte de alguns microorganismos. Os métodos mais empregados são:

• Refrigeração – usado principalmente nas residências e nos estabelecimentos de comercialização de alimentos. Possui efeito bacteriostático e fungiostático, mas na presença de microorganismos psicrófilos e psicotróficos (microorganismos que se multiplicam bem em ambientes refrigerados, sendo os principais agentes de deterioração de carnes e pescados, ovos entre outros) promovem alteração do sabor dos alimentos, após algum tempo. Ex.: Pseudomonas, Yersinia, Enterobacter. • Congelamento – utilizam-se temperaturas abaixo de 0ºC. O congelamento rápido tende a inibir as bactérias sem matá-las (nitrogênio líquido, - 179ºC). No congelamento lento, cristais de gelo se formam e crescem, rompendo as estruturas celulares de bactérias e fungos. O congelamento (em torno de -16 a -20ºC) constitui um eficiente recurso para a conservação de alimentos por longos períodos, sobretudo carnes e derivados.

b) Radiações: determinadas radiações eletromagnéticas, ionizantes e não ionizantes são capazes de inativar (matar) de forma eficaz os microorganismos. Possuem dependência de seus afeitos quanto ao comprimento de onda, da intensidade, duração e distância da fonte.

Existem dois tipos de radiação que possuem efeito de esterilização: • A radiação ionizante – são utilizados isótopos radioativos que emitem radiação, como por exemplo, as radiações gama. Esse tipo de radiação possui comprimento de onda mais curto e carrega mais energia do que a radiação não-ionizante. O principal efeito da radiação ionizante é a morte ou inativação do microrganismo, através da destruição do DNA celular. Produtos hospitalares descartáveis como seringas plásticas, luvas, cateteres, fios e suturas são esterilizados por este método. A industria de alimentos renovou recentemente seu interesse no uso da radiação para a conservação de alimentos. Como forma de proteção contra o bioterrorismo, em alguns países os correios usam com frequência essa radiação para esterilizar certos tipos de correspondências. • A radiação não ionizante – utilizam-se radiações com comprimento de onda mais longo (acima de 1 nm), como a luz ultra-violeta (UV), que provoca alteração no

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DNA. As lâmpadas germicidas são empregadas para o controle dos microrganismos no ar e são encontradas em centros cirúrgicos, enfermarias, berçários, capelas de fluxo laminar, etc. As desvantagens do uso da UV são: baixo poder de penetração, obrigando a exposição direta dos microorganismos aos raios para que sejam mortos (atua somente na superfície dos materiais) e os efeitos nocivos sobre a pele e os olhos.

As microondas, também denominadas super high frequency – SHF, não possuem efeito direto sobre os microorganismos, e as bactérias podem ser facilmente isoladas do interior de fornos de microondas recém utilizados. As frequências dos fornos de microondas são ajustados para combinar com os níveis de energia nas moléculas de água, que absorvem a energia e as transferem na forma de calor para o alimento, que irá matar a maioria dos patógenos na forma vegetativa. Os alimentos sólidos se aquecem de modo desigual, devido uma distribuição não homogênea da umidade nos tecidos. Por essa razão, uma carne de porco cozida no forno de microondas pode ocasionar a transmissão de triquinose no homem.

c) Filtração: método empregado para remover microorganismos de líquidos, ar e

gases. Os filtros de partículas de ar de alta eficiência (high-efficiency particulate air - HEPA) removem quase todos os microorganismos maiores que cerca de 0,3 µm de diâmetro. Atualmente, a descontaminação do ar mediante filtração, realizada em laboratórios de manipulação asséptica, fluxos laminares, salas de cirurgia e outros ambientes hospitalares onde o rigoroso controle microbiológico se faz necessário.

d) Dessecação: condição conhecida pela remoção da umidade de determinada

matéria, e pelo impedimento da mesma em absorver a umidade do ar. Os microorganismos não podem crescer e se reproduzir nesse ambiente seco, mas podem permanecer viáveis por longos períodos. No momento que a água é reintroduzida, podem ser reativados, retomando seu crescimento e divisão. Esse é o princípio da liofilização (congelamento-dessecação), um processo utilizado em laboratórios para a preservação de microorganismos, onde uma suspensão é rapidamente congelada em uma faixa de temperatura de -54ºC a -72ºC, tendo a água removida por alto vácuo (sublimação).

e) Remoção do oxigênio: na ausência de oxigênio as bactérias aeróbicas perecem,

ou então, formam esporos, caso sejam dotadas dessa capacidade. Essa técnica possui importância prática na indústria alimentícia, a qual utiliza-se de embalagens (ou envasamento) a vácuo como meio de melhorar a conservação de alimentos (carne, legumes, etc).

f) Pressão osmótica: técnica que utiliza altas concentrações de sais e açucares

para conservar próteses biológicas e alimentos, baseada nos efeitos da pressão osmótica. Altas concentrações de determinadas substâncias criam um ambiente hipertônico que ocasiona a saída de água da célula microbiana. Esse processo lembra o método de

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conservação por dessecação, pois ambos os métodos retiram da célula a umidade que ela necessita para o crescimento. Lembre-se de que, como regra geral, os fungos e os bolores são muito mais capazes que as bactérias de crescer em materiais com baixa umidade ou com alta pressão osmótica.

3.2 – MÉTODOS QUÍMICOS:

Os métodos químicos são baseados em substâncias naturais ou sintéticas para eliminar ou inibir o crescimento dos microorganismos em tecidos vivos ou em objetos inanimados. Infelizmente, poucos agentes químicos proporcionam a esterilidade, a maioria apenas reduz as populações microbianas em níveis seguros ou removem as formas vegetativas de patógenos nos objetos. Nenhum desinfetante isolado é apropriado para todas as circunstâncias. Fatores como pH, temperatura, tempo de contato, presença de matéria orgânica (inativa algumas substâncias), fase do ciclo vital do microorganismo, concentração do composto químico e presença de outras substâncias químicas podem influenciar na ação dos agentes antimicrobianos, além da variação na resistência dos microorganismos aos produtos químicos. Outra consideração importante é se o agente químico entrará facilmente em contato com os microorganismos. Uma área pode precisar ser esfregada e lavada antes da aplicação do produto, e em muitos casos haverá a necessidade de deixar o desinfetante em contato com a superfície por várias horas.

Existem duas categorias principais de efeitos dos métodos químicos: • Efeito estático (bacteriostático ou fungiostático) – ocasiona a inibição no crescimento microbiano. • Efeito microbicida/germicida (bactericida, fungicida, viruscida, protozoocida ou esporocida) – promove a destruição dos microorganismos.

A capacidade de eliminar microorganismos, a rapidez assim como o espectro de ação, define o nível de desinfecção que pode ser alcançado por determinado produto. Tendo em vista isso, podemos classificá-los da seguinte forma:

• Nível baixo – eliminação da maioria das bactérias, de alguns vírus e alguns fungos, sem inativação de microorganismos mais resistentes como micobactérias e formas esporuladas. • Nível intermediário – inativação das formas vegetativas de bactérias, da maioria dos vírus e maioria dos fungos. • Nível alto – destruição de todos os microorganismos, com exceção de formas esporuladas.

3.2.1 – TIPOS DE AGENTES QUÍMICOS UTILIZADOS NO CONTROLE

MICROBIANO: 3.2.1.1 – Agentes alquilantes: São compostos cancerígenos e, por isso, não devem ser utilizados em tecidos vivos. Por definição, um alquila ou alcoila é um radical monovalente (CnH2n+1) formado

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pela remoção de um átomo de hidrogênio de um hidrocarboneto saturado. Os principais alquilantes utilizados para o controle dos microorganismos são: Glutaraldeído: seu mecanismo de ação ocorre através da alteração do DNA e de

enzimas. Serve para a desinfecção (de alto nível) e para a esterilização, dependendo da concentração e do tempo de exposição. Possui grande poder de desinfecção em diversos equipamentos cirúrgicos, odontológicos, além de não ser corrosivo. Muito utilizado para materiais termossensíveis. Tem como desvantagens o vapor irritante, odor desagradável, ser carcinogênico e ter a sua eficácia diminuída na presença de matéria orgânica. Um possível substituto do glutaraldeído é o orto-fitalaldeído (OFA) que além de mais efetivo contra a maioria dos miroorganismos, mostra-se pouco irritante.

Formaldeído: atua como desinfetante ou esterilizante, possuindo ótimo efeito sobre bactérias gram-positivas e gram-negativas, além de vírus, fungos, micobactérias e endósporos. Obtem-se a esterilização através da solução alcoólica de formaldeído a 8% ou aquosa a 10%, com exposição mínima de 18 horas. Pode ser usado em instrumental cirúrgico e em acrílicos, mas não deve ser utilizado em alumínio e em borrachas. Apresenta alto poder carcinogênico, e deve ser manuseado usando-se equipamentos de proteção individual (EPIs).

Oxido de etileno (ETO): é um esterilizador gasoso incolor muito eficiente, utilizado principalmente para materiais termossensíveis como as sondas para laparoscopia e artroscopia. Possuí alto poder de penetração, é carcinogênico, exigindo treinamento de pessoal, uso de EPIs e exames bioquímicos de saúde periódicos. 3.2.1.2 – Fenóis: O fenol (ácido carbólico) e seus derivados atuam na desnaturação de proteínas, servindo como antimicrobianos. Atualmente, os compostos fenólicos são pouco utilizados, pois irritam a pele e apresentam odor desagradável. Possuem efeitos carcinogênicos, com acentuada toxicidade em felinos e crianças. Um dos compostos fenólicos mais utilizados deriva do alcatrão e são denominadas cresóis. Os cresóis são ótimos desinfetantes de superfície. 3.2.1.3 – Bifenóis: São derivados do fenol que possuem dois grupos fenólicos ligados por uma ponte. Um bifenol, o hexaclorofeno é muito utilizado em procedimentos de controle microbiano cirúrgico e hospitalar. Estafilococos e estreptococos gram-positivos, que costumam causar infecções de pele em recém-nascidos, são especialmente susceptíveis ao hexaclorofeno, que é usado com frequência para controlar essas infecções em berçários. Outro bifenol amplamente utilizado é o triclosano, um dos componentes presentes em sabonetes antibacterianos e pastas de dentes. O uso do triclosano foi incorporado em tábuas de cozinha, em cabos de facas e outros utensílios plásticos de cozinha. Seu uso está tão difundido que bactérias resistentes a este agente já foram relatadas. É especialmente efetivo contra bactérias gram-positivas, mas também funciona bem contra fungos e bactérias gram-negativas. Existem algumas exceções, como a Pseudomonas

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aeruginosa, uma bactéria gram-negativa que é muito resistente ao triclosano, bem como a muitos outros antibióticos e desinfetantes. 3.2.1.4 – Biguanida: Apresentam um amplo espectro de atividade, especialmente contra bactérias gram-positivas. As biguanidas são também efetivas contra bactérias gram-negativas, com exceção das pseudomonas. A biguanida mais conhecida é a clorexidina, muito usada na preparação cirúrgica, antissepsia de mãos e para o combate de microorganismos indesejáveis da pele e mucosas. Por possuir ótimo efeito bactericida e ser efetiva contra fungos e vírus, é tida como excelente antisséptico, embora não tenha efeito esporocida. Atua como bom desinfetante de superfícies e materiais diversos e se demonstra eficaz mesmo na presença de matéria orgânica. A alexidina é uma biguanida similar à clorexidina, apresentando, porém, ação mais rápida. 3.2.1.5 – Halogênios: Os halogênios (ou halógenos), particularmente o iodo e o cloro, são agentes anti-microbianos eficazes, tanto isoladamente, como constituintes de compostos inorgânicos ou orgânicos. Cloro ou compostos clorados – são amplamente empregados na desinfecção doméstica, pecuária, industrial, alimentícia e de água, bem como na desinfecção de nível médio na área hospitalar. São efetivos contra os vírus, bactérias gram-positivas e gram-negativas, fungos, e efetividade média como tuberculocidas e esporocidas. Uma grande vantagem é a permanência de atividade residual, e como desvantagens destacam-se a inativação pela matéria orgânica, atividade corrosiva em metais e o efeito descolorante. Os principais compostos clorados com ação desinfetante são: hipoclorito de sódio (água sanitária, líquido de Dakin), hipoclorito de cálcio (alvejantes em pó) e as cloraminas (amônia com cloro). Iodo – considerado um dos antissépticos mais antigos e eficazes, empregados em feridas e tecidos, agindo contra todos os tipos de bactérias, muitos endósporos, vários fungos e alguns vírus. O iodo pode ser empregado para a desinfecção de equipamentos e superfícies, não sendo seu uso recomendado em metais facilmente oxidáveis ou que mancham facilmente. As soluções à base de iodo são geralmente alcoólicas (álcool etílico 70 com 0,5 a 1% de iodo livre), solução a 2% em água ou emulsões em detergentes (iodo-povidona), conhecidas como degermantes. Estas emulsões não são recomendadas para curativos, uma vez que a presença constante do detergente prejudica a cicatrização, entretanto, são indicadas para a antissepsia das mãos, campo operatório e desinfecção de superfícies. 3.2.1.6 – Peroxigênios – peróxido de hidrogênio, ácido peracético e ozônio: São agentes químicos oxidantes que exercem ação na membrana citoplasmática, no DNA e em outros componentes celulares. Peróxido de hidrogênio (H2O2) – conhecido como água oxigenada, a substância

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é utilizada como desinfetante de filtros e tubulações na indústria de alimentos. Possui ampla aplicação na limpeza e desinfecção hospitalar e como antisséptico de feridas. Ácido paracético – possui odor de vinagre, sendo eficiente para a desinfecção de materiais e instrumentos, sendo pouco afetado pela presença de matéria orgânica. Atua bem em temperaturas de 10 a 40ºC. Ozônio (O3) – trata-se de um composto derivado do oxigênio, usado geralmente para a desinfecção de água. Possui efeito germicida e não apresenta toxicidade ao homem e animais. 3.2.1.7 – Alcoóis: O mecanismo de ação do álcool é a desnaturação de proteínas, mas também pode romper membranas e dissolver lipídeos, inclusive o componente lipídico dos vírus envelopados. Agem efetivamente contra as bactérias, fungos, mas não contra endósporos e vírus não envelopados. Os dois alcoóis mais comumente utilizados são o etanol e o isopropanol. A concentração ótima para o etanol (etílico) é de 70%, enquanto que para o isopropanol ((isopropílico) é de 90%. Os alcoóis têm a vantagem de agir e então evaporar rapidamente, sem deixar resíduos. Quando a pele é degerminada antes de uma injeção, a atividade de controle microbiano provém do fato de simplesmente remover a poeira e os microorganismos junto com os óleos cutâneos (limpa). Contudo, os alcoóis não são antissépticos satisfatórios quando aplicados em feridas, pois causam a coagulação de uma camada de proteínas, sob a qual as bactérias continuam a proliferar. Como antisséptico das mãos, o álcool em gel apresenta determinadas vantagens sobre o líquido, as quais destacam-se:

• o gel retém certo grau de moléculas de álcool, com a volatilidade reduzida, possibilita maior tempo de ação. • adesão do gel nas mãos, prolongando a ação do álcool; • o gel protege a pele do ressecamento promovido pelo álcool líquido; • o gel é menos inflamável, evitando acidentes com queimaduras; • mais fácil no acondicionamento, na medida que o gel não vaza facilmente.

3.2.1.8 – Corantes: O azul de metileno e o cristal violeta (violeta genciana) constituem-se nos principais corantes antimicrobianos, atuando por inibição da síntese da parede celular. 3.2.1.9 – Agentes de superfície (tensoativos ou surfactante): Os agentes de superfície podem reduzir a tensão superficial entre moléculas de um líquido. Esses agentes incluem os sabões e os detergentes. Sabões e detergentes – possuem pouco valor como antisséptico, mas tem uma importante função na remoção mecânica dos microorganismos. A pele geralmente possui células mortas, pó, suor seco, microorganismos e óleos, provindos das gl\ãndulas sebáceas. Os sabões rompem o filme oleoso em pequenas gotículas, denominadas emulsificação, que juntamente com a água, removem os resíduos à medida que a pele é

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lavada. Nesse sentido, os sabões funcionam como bons agentes degerminantes. Compostos quaternários de amônia (QUATs) – possuem excelente ação bactericida contra as gram-positivas e, bom poder bactericida contra as gram-negativas, sendo efetivos contra vírus envelopados (lipofílicos), as amebas e alguns fungos. São ineficazes contra vírus não envelopados (hidrifílicos), micobactérias e esporos. A presença de matéria orgânica limita a ação dos compostos deste grupo. Dois QUATs populares são o cloreto de benzalcônio e o cloreto de cetilpiridínico.

3.2.2 – PRINCIPAIS FATORES QUE PODEM INFLUENCIAR NA AÇÃO DOS DESINFETANTES QUÍMICOS:

• Diluição do produto – desinfetantes muito diluídos podem se tornar pouco eficazes.

• Tempo de exposição – para que tenha uma ação mais efetiva, é necessário um tempo mínimo de contato entre o desinfetante e o microorganismo.

• Mistura do desinfetante com outros produtos – a mistura de substâncias pode ocasionar a perda da eficácia dos produtos.

• Natureza do material a ser desinfetado. • Validade do produto – desinfetantes com prazo de validade já vencido pode

exercer pouca ou nenhuma ação sobre os microorganismos. • Lavagem prévia do local ou material antes da aplicação do desinfetante – na

maioria dos casos, a prévia lavagem das instalações facilita a ação dos desinfetantes.

• Aplicação em ambientes úmidos – após a lavagem prévia, a desinfecção deve ser realizada com as instalações ainda úmidas, a fim de permitir boa distribuição e penetração do desinfetante nas regiões a serem desinfetadas.

3.2.3 – CARACTERÁSTICAS DESEJÁVEIS A SEREM OBSERVADAS NA

ESCOLHA DE UM DESINFETANTE QUÍMICO: • Possuir amplo espectro de ação. • Alto poder germicida. • Ser atóxico para o homem e animais. • Ser estável ao armazenamento na temperatura ambiente, por longos períodos. • Ser eficiente na presença de matéria orgânica ou matéria mineral. • Não ser corrosivo. • Manter boa atividade antimicrobiana sob temperatura entre 10 a 40ºC. • Ser isento de atividade tintorial. • Ser solúvel em água. • Ser compatível com sabões e detergentes. • Possuir bom poder de penetração. • Ser inodoro, ou exalar odor brando, ou mesmo agradável. • Não ser poluente.

Page 12: Metodos de Controle Dos Microorganismos

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE – CCS Departamento de Microbiologia e Parasitologia

Disciplina de Microbiologia Geral

12 Prof. Daniel Roulim Stainki

UFSM

• Agir de forma eficaz com tempo de exposição relativamente curto (10 a 25 minutos).

• Ter custo acessível e estar disponível no mercado. Atualmente não existe um desinfetante que contemple todos os requisitos desejáveis

acima descritos. No contexto da atividade veterinária, a escolha dá-se baseada, principalmente, em atributos como: espectro de ação, intensidade de ação, susceptibilidade de inativação na presença de matéria orgânica e custo.

Os microorganismos diferem quanto à susceptibilidade aos desinfetantes químicos. As bactérias vegetativas (não esporuladas) e os vírus envelopados sofrem rapidamente a ação dos desinfetantes. Os esporos fúngicos e os vírus desprovidos de envelope são menos susceptíveis. As micobactérias (bactérias do gênero da tuberculose) são resistentes aos desinfetantes comumente empregados, já os oocistos de protozoários e endósporos bacterianos são altamente resistentes aos desinfetantes.

4. INATIVAÇÃO DOS PRÍONS.

Os príons, agentes etiológicos das encefalopatias espongiformes transmissíveis (EETs) são extremamente resistentes as substâncias químicas. Altas concentrações de hipoclorito de sódio, assim como soluções concentradas de hipoclorito de sódio aquecidas são indicadas para inativar estes agentes infecciosos não convencionais.

Os príons são igualmente resistentes à inativação térmica, sendo necessária a autoclavação a 132ºC por quatro horas e meia para inativá-los. SUGESTÃO DE LEITURA: KAMWA, E.B. Biosseguridade, higiene e profilaxia: abordagem teórico-didática e aplicada. Belo Horizonte:Nandyala, 2010. 104p. TORTORA, G.J., FUNKE, B.R., CASE, C.L. Microbiologia . 10ed. Porto Alegre: Artmed, 2012, 934P.