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O DINHEIRO E O TERRITÓRIO * MILTON SANTOS Universidade de São Paulo A Geografia alcança neste fim de século a sua era de ouro, porque a geograficidade se impõe como condição histórica, na medida em que nada considerado essencial hoje se faz no mundo que não seja a partir do conhecimento do que é o Território. O Território é o lugar em que desembocam todas as ações, todas as paixões, todos os pode- res, todas as forças, todas as fraquezas, isto é, onde a história do homem plenamente se realiza a partir das manifestações da sua existência. A Geografia passa a ser aquela disci- plina tornada mais capaz de mostrar os dramas do mundo, da nação, do lugar. O que eu trago aqui é um ensaio. É muito mais um ensaio de método que algo terminado. Aliás, para que um professor dirigir-se a quem quer que seja com coi- sas já prontas? Uma aula é sempre um conjunto de questões, e não propriamente de respostas. A aula que quer ser uma resposta é algo quase desnecessário. A aula tem que ser um conjunto de perguntas as quais incompletamente o professor for- mula, e as quais os ouvintes tomam como um guia tanto para aceitar, como para, depois de aceitar, discutir e, mesmo, recusar. A indagação que estou fazendo aqui é a respeito desses dois pólos da vida con- temporânea: o dinheiro, que tudo busca desmanchar, e o território, que mostra que há coisas que não se podem desmanchar. Território e dinheiro: definições A primeira coisa a fazer é definir o que a gente pretende conversar. Se não o faço, também não permito que as pessoas discutam comigo. A primeira condição para 7 * Este texto resulta da transcrição da Conferência de inauguração do Mestrado em Geografia da Universidade Federal Fluminense e abertura do ano letivo de 1999, proferida em 15/3, e foi revisto pelo Autor, guardando, todavia, um estilo verbal.

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  • O DINHEIRO E O TERRITRIO*

    MILTON SANTOSUniversidade de So Paulo

    A Geografia alcana neste fim de sculo a sua era de ouro, porque a geograficidadese impe como condio histrica, na medida em que nada considerado essencial hojese faz no mundo que no seja a partir do conhecimento do que o Territrio. OTerritrio o lugar em que desembocam todas as aes, todas as paixes, todos os pode-res, todas as foras, todas as fraquezas, isto , onde a histria do homem plenamente serealiza a partir das manifestaes da sua existncia. A Geografia passa a ser aquela disci-plina tornada mais capaz de mostrar os dramas do mundo, da nao, do lugar.

    O que eu trago aqui um ensaio. muito mais um ensaio de mtodo que algoterminado. Alis, para que um professor dirigir-se a quem quer que seja com coi-sas j prontas? Uma aula sempre um conjunto de questes, e no propriamentede respostas. A aula que quer ser uma resposta algo quase desnecessrio. A aulatem que ser um conjunto de perguntas as quais incompletamente o professor for-mula, e as quais os ouvintes tomam como um guia tanto para aceitar, como para,depois de aceitar, discutir e, mesmo, recusar.

    A indagao que estou fazendo aqui a respeito desses dois plos da vida con-tempornea: o dinheiro, que tudo busca desmanchar, e o territrio, que mostra queh coisas que no se podem desmanchar.

    Territrio e dinheiro: definies

    A primeira coisa a fazer definir o que a gente pretende conversar. Se no o fao,tambm no permito que as pessoas discutam comigo. A primeira condio para

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    * Este texto resulta da transcrio da Conferncia de inaugurao do Mestrado em Geografia daUniversidade Federal Fluminense e abertura do ano letivo de 1999, proferida em 15/3, e foi revistopelo Autor, guardando, todavia, um estilo verbal.

    ElizangelaNBMquina de escreverSANTOS, Milton. O dinheiro e o territrio. Revista GEOgraphia, n1, vol1, pp 7-13. Rio de Janeiro: 1999.

    ElizangelaNBMquina de escreverSANTOS, Milton. O dinheiro e o territrio. In: SANTOS, Milton; BECKER, Bertha; SILVA, Carlos Alberto Franco da; et alii. Territrio, territrios: ensaios sobre o ordenamento territorial. Niteri: Programa de Ps-Graduao em Geografia da Universidade Federal Fluminense; Associao dos Gegrafos Brasileiros, 2002.

  • aqueles que partem de uma ideologia que o meu caso , oferecer claramenteos termos do debate que desejam. Se no o proclamo, fujo discusso, evito-a,impeo que debatam comigo. H que definir por conseguinte essas duas palavras:o territrio e o dinheiro.

    O territrio no apenas o conjunto dos sistemas naturais e de sistemas de coi-sas superpostas. O territrio tem que ser entendido como o territrio usado, no oterritrio em si. O territrio usado o cho mais a identidade. A identidade osentimento de pertencer quilo que nos pertence. O territrio o fundamento dotrabalho, o lugar da residncia, das trocas materiais e espirituais e do exerccio davida. O territrio em si no uma categoria de anlise em disciplinas histricas,como a Geografia. o territrio usado que uma categoria de anlise. Alis, aprpria idia de nao, e depois a idia de Estado Nacional, decorrem dessa rela-o tornada profunda, porque um faz o outro, maneira daquela clebre frase deWinston Churchill: primeiro fazemos nossas casas, depois nossas casas nosfazem. Assim o territrio que ajuda a fabricar a nao, para que a nao depoiso afeioe.

    O dinheiro aparece em decorrncia de uma vida econmica tornada complexa,quando o simples escambo j no basta, e ao longo do tempo acaba se impondocomo um equivalente geral de todas as coisas que existem e so, ou sero, oupodero ser, objeto de comrcio. Desse modo, o dinheiro pretende ser a medida dovalor que , desse modo, atribudo ao trabalho e aos seus resultados.

    Metamorfoses do dinheiro e do territrio

    Faamos um passeio rpido a partir do que chamaramos, para facilidade daexposio, de comeo da histria dos dois, isto , do dinheiro e do territrio.

    Num primeiro momento h um dinheiro local, expressivo de contextos geogrfi-cos limitados e de um horizonte comercial limitado. Era o tempo de um mundocuja compartimentao produzia alvolos que seriam quase auto-contidos. Ummundo sem movimento, um mundo lento, estvel, aquelas mnadas de Leibniz,mnadas numerosas, mas ao contrrio das de Leibniz, sem princpio geral. Era umdinheiro com circulao apenas local, ou quase. Nesse primeiro momento, o fun-cionamento do territrio deve muito s suas feies naturais, s quais os homens esuas obras se adaptam com pequena mediao tcnica, porque ento as tcnicaseram de alguma forma herdeiras da natureza circundante, ou um prolongamento docorpo. Elas eram ao mesmo tempo o resultado desse afeioamento do corpo natureza, e desse comando da natureza sobre a histria possvel, de tal maneira quea tecnicidade a partir dos objetos fabricados alm do corpo era limitada.

    As relaes sociais presentes eram pouco numerosas, e eram tambm relaessimples e pouco densas. Se o entorno mostrava mistrios na sua existncia, noeram eles devidos, como hoje, produo da histria, mas s foras naturais, e for-

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  • as naturais desconhecidas, ao contrrio de hoje quando de alguma forma conhece-mos o funcionamento da natureza. Ento, nesse tempo a vida material de algummodo se impunha sobre o resto da vida social, e o valor de cada pedao de cholhe era atribudo pelo prprio uso desse pedao de cho. A existncia podia serinterpretada a partir de relaes que eram ressentidas diretamente, ou como se fos-sem diretas.

    Nesse perodo da histria, o territrio assim delineado rege o dinheiro; o territ-rio era usado por uma sociedade localizada, assim como o dinheiro.

    Da razo do uso razo da troca

    Essas categorias se metamorfoseiam ao longo do tempo. Com a ampliao dastrocas, a amplificao do comrcio, com a interdependncia crescente entre socie-dades, com a produo de um nmero maior de objetos e de um nmero maior devalores a trocar, vem a complexificao do dinheiro, com o alargamento do seuuso e da sua eficcia. Para garantia de estabilidade das trocas e da produo decada grupo, aparece a necessidade da regulao e o dinheiro comea sua trajetriacomo informao e como regulador.

    Cresce, expande-se e se identifica, no apenas o comrcio internacional mastambm o comrcio interno. Tudo tende a se tornar objeto de troca, valorizadocada vez mais pela troca do que mesmo pelo uso. O papel que a troca comea aganhar uma enorme mudana na histria dos lugares e do mundo, deslocando daprimazia o papel do uso, e at mesmo comandando o uso, ao revs do comandoanterior da troca pelo uso. Isso fundamental tanto para entender as mudanas queo mundo conhece, como para produzir toda a possibilidade de interpretao do queexiste como se fosse um resultado de relaes mecnicas imediatas entre o grupo eo seu entorno, entre o homem e o que ainda se chamaria a natureza.

    O dinheiro aparece como uma arena de movimentos cada vez mais numerosos,fundados sob uma lei do valor que tanto deve ao carter da produo escolhidacomo s possibilidades da circulao. A circulao ganha sobre a produo ocomando da explicao, porque ganha sobre a produo o comando da vida. E essalei se estende aos lugares, quanto maior a complexidade das relaes externas einternas, mais necessidades de regulao, e se levanta a necessidade de Estado: oEstado e os limites, o Estado e a produo, o Estado e a distribuio, o Estado e agarantia do trabalho, o Estado e a garantia da solidariedade e o Estado e a busca daexcelncia na existncia.

    Cria-se o Estado territorial, o territrio nacional, o Estado nacional, que passama reger o dinheiro. O que h nesta fase so dinheiros nacionais internacionalizados. evidente que o dinheiro nacional sofre modulaes internacionais. Ele parcial-mente um respondente interno das modulaes internacionais. Mais profundamen-te a partir da presena forte do Estado, esse dinheiro representativo das relaes

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    O Dinheiro e o Territrio

  • ento profundas entre Estado territorial, territrio nacional, Estado nacional, nao.Era um dinheiro relativamente domesticado, o que era feito dentro dos territrios.

    O dinheiro e o territrio da globalizao

    Chega o dinheiro da globalizao. Este fim de sculo permitiu a instalao dastcnicas da informao, que so tcnicas que ligam todas as outras tcnicas, quepermitem que as mais diversas tcnicas se comuniquem. Essas tcnicas da infor-mao que, afinal, a partir do planeta, produzem um mundo (e por isso que sefala de globalizao), e que nos levam iluso da velocidade, como matriz detudo, como necessidade indispensvel e que certamente criam uma fluidez poten-cial transformada nessa fluidez efetiva a servio de capitais globalizados, de talmodo que o dinheiro aparece como fluido dos fluidos, o elemento que imprimevelocidade aos outros elementos da histria. No entanto, se o dinheiro que coman-da dinheiro global, o territrio ainda resiste. Basta refazermos mentalmente omapa do dinheiro no Brasil e nele encontraremos um lugar onde h todas as moda-lidades possveis de dinheiro (So Paulo), e outro onde a nica modalidade dedinheiro possvel o dinheiro-moeda (um ponto isolado no estado mais pobre).Em outras palavras, o territrio tambm pode ser definido nas suas desigualdades apartir da idia de que a existncia do dinheiro no territrio no se d da mesmaforma. H zonas de condensao e zonas de rarefao do dinheiro. Todavia, ocomando da atividade financeira est ali onde os dinheiros todos podem estar pre-sentes: So Paulo. Mas, sobretudo, o comando se d a partir do dinheiro global.Esse dinheiro fluido, que tambm invisvel, um dinheiro tornado praticamenteabstrato, um dinheiro global e um dinheiro desptico.

    Nunca na histria do homem houve um tirano to duro, to implacvel quanto essedinheiro global. esse dinheiro global fluido, invisvel, abstrato, mas tambm desp-tico, que tem um papel na produo atual da histria, impondo caminhos s naes. Oequivalente geral torna-se afinal o equivalente realmente universal. Mas esse dinheirono sustentado por operaes da ordem da infra-estrutura. um dinheiro sustentadopor um sistema ideolgico. Esse dinheiro global o equivalente geral dele prprio. Epor isso ele funciona de forma autnoma e a partir de normas. Produzindo uma falsifi-cao do critrio, esse dinheiro autonomizado e em estado puro no existiria assim, seas condies tcnicas utilizadas pelas condies polticas que dominam o perodo his-trico no contassem com a possibilidade de enviesar a informao.

    O papel do sistema ideolgico

    Nossa era se caracteriza sobretudo por essas ditaduras: a ditadura da informaoe a ditadura do dinheiro, e a ditadura do dinheiro no seria possvel sem a ditadura

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  • da informao. O dinheiro em estado puro nutre-se da informao impura, tornadapossvel quando imaginvamos que ela seria cristalina. Curiosamente, este formi-dvel sistema ideolgico acaba por ter um papel na produo da materialidade e naconformao da existncia das pessoas.

    A ideologia, como nunca aconteceu, passa a mostrar-se como aquela metafsicasuscetvel de aparecer como uma empiria. H 25 anos atrs, empolgava-nos a assi-milao da diferena entre o veraz e o no verdadeiro, entre a aparncia e a exis-tncia, entre o ideolgico e o real. Hoje a ideologia se tornou realidade, o que com-plica nossa tarefa de anlise, porque se impe produo da histria concreta doshomens a partir de um discurso nico perfeitamente elaborado, e que se torna acre-ditvel a partir do bombardeio das mdias, mas tambm a partir da chancela daUniversidade. desse modo que as lgicas do dinheiro se impem ao resto da vidasocial. Assim, o dinheiro cria sua lei e a impe aos outros, forando mimetismos,adaptaes, rendies, a partir de duas outras lgicas complementares: a dasempresas e a dos governos mundiais.

    A lgica do dinheiro das empresas a lgica da competitividade, que faz comque cada empresa tornada global busque aumentar a sua esfera de influncia e deao, para poder crescer. Os ltimos anos so emblemticos porque so o teatrodas grandes fuses tanto no domnio da produo material como no da produode informao. Essas fuses reduzem o nmero de atores globais e, ao mesmotempo a partir da noo de competitividade, conduzem as empresas a disputarem omenor espao, a menor fatia do mercado.

    Ento quando, cavaleiros andantes, saem os ministros para esmolar no Norte oque eles chamam de compreenso das empresas, como se no soubessem queessas empresas globais necessitam dos mercados, por mais mnimos que sejam,porque a perda do menor grama de atividade inflete o poder de uma em benefcioda outra. Todos os mercados, por menores que sejam, so fundamentais isso tam-bm globalizao. Desse modo, por menor que seja um lugar, por mais insignifi-cante que parea, no mundo da competitividade este lugar fundamental porque asempresas globais dependem de pequenas contribuies para que possam manter oseu poder. Esse poder que cego, porque no olha ao redor. Esse poder que sepreocupa com objetivos precisos, individualistas, egosticos, pragmticos umpoder cego, j que no olha ao redor. Mas escolhe lugares aqui e ali, hoje e ama-nh, em funo das respostas que imaginam poder ter, e desertam esses lugaresquando descobrem que j no podem oferecer tais respostas.

    Ora, essas lgicas individuais necessitam de uma inteligncia geral, e essa inte-ligncia geral no pode ser confiada aos Estados porque estes podem decidir aten-der aos reclames das populaes. Ento so esses governos globais, representadospelo Fundo Monetrio Internacional, pelo Banco Mundial, pelos bancos interna-cionais regionais, como o BID, pelo consenso de Washington, pelas Universidadescentrais produtoras de idias de globalizao e pelas Universidades subalternasque aceitam reproduzi-las.

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    O Dinheiro e o Territrio

  • Nesse mundo de enganos, a chamada contabilidade dos pases aparece como umdado central. Mas essa contabilidade nacional , no fundo, um nome fantasia paraa contabilidade global que escolhe, entre as categorias utilizadas, aquelas que pri-vilegiam os interesses de um certo tipo de agente, e excluem todas as categorias deoutra ndole. E essa contabilidade global se funda em parmetros inspirados nasprprias finanas globais, num mundo no qual no mais o capital como um todoque rege os territrios, mas uma parte dele, isto , o dinheiro em estado puro.

    Antes o territrio continha o dinheiro, que era em parte regulado pelo dinheiro,pelo territrio usado. Hoje, sob a influncia do dinheiro, o contedo do territrioescapa a toda regulao interna, trazendo aos agentes um sentimento de instabili-dade, essa produo sistemtica de medo, que um dos produtos da globalizaoperversa dentro da qual vivemos, esse medo que paralisa, esse medo que convoca aapoiar aquilo em que no cremos apenas pelo receio de perder ainda mais.

    Permitam-me aqui fazer um parntesis. A associao que este fim de sculo per-mitiu entre a cincia e a tcnica, a tcnica e o mercado, esse tecno-mercado noqual vivemos e essa tecno-cincia que nos arrasta e desgraadamente tambm estarrastando as cincias humanas, que reduz o escopo do trabalho acadmico eafasta-nos, vezes, da busca da verdade. Devemos preocupar-nos com os destinosque possa tomar a Universidade, sobretudo quando condena a crtica de fora mastambm no faz a sua prpria crtica.

    Voltando ao tema central, dizamos que antes o territrio continha o dinheiro,regulado pelo territrio usado, enquanto hoje o contedo do territrio escapa a todaregulao interna. o problema do Brasil atual. Essa briga entre governadores,essa zanga de alguns prefeitos mais audveis, interpela o trabalho dos gegrafos edos cientistas polticos, conjuntamente. Porque uma cincia poltica que no sefunde no funcionamento e na dinmica do territrio pode, dificilmente, ofereceruma contribuio emprica soluo dos problemas nacionais. O contedo do ter-ritrio mudou, fundamentalmente, com a globalizao, seja o contedo demogrfi-co, o econmico, o fiscal, o financeiro, o poltico. O contedo de cada frao doterritrio muda rapidamente. Essa instabilidade e nervosismo atuais do territrioso a representao emprica do nervosismo, da nervosidade, da impacincia e dovulcanismo da nao.

    Ditadura do dinheiro e desregulao do territrio nacional

    Nesta fase da vida nacional, esse papel extraordinrio da ditadura do dinheiroem estado puro acaba de mostrar-nos, definitivamente, a dificuldade de regulaointerna e tambm de regulao externa, j que cada empresa tem interesses quesomente se exercem a partir da desregulao dos outros, ajuda a organizar aempresa em questo e desorganiza tudo o mais. Em outras palavras, a presena dasempresas globais no territrio um fator de desorganizao, de desagregao, j

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  • que elas impem cegamente uma multido de nexos que so do interesse prprio,enquanto ao resto do ambiente nexos que refletem as suas necessidades individua-listas, particularistas. Por isso, o territrio brasileiro se tornou ingovernvel. Ecomo o territrio o lugar de todos os homens, de todas as empresas e de todas asinstituies, o pas tambm se tornou ingovernvel, como nao, como estado ecomo municpio.

    Em ltima anlise esse o resultado da influncia do dinheiro em estado purosobre o territrio. A finana tornada internacional como norma contraria as estru-turas vigentes e impe outras. E quando tem uma existncia autnoma, isto , nonecessita consultar a ningum para se instalar, ela funciona a despeito dos outrosatores, e acarreta para o lugar uma existncia sem autonomia. H, certamente,anteparos a essa ao do dinheiro em estado puro, maneiras de reorganizar o terri-trio, como a Europa da Comunidade Europia. E um outro dado que resiste a essaao cega do dinheiro a cidadania. No caso do Brasil isso grave, porque o fatode que jamais tivemos cidados, faz com que a fluidez dessas foras de desorgani-zao se estabelea com a rapidez com que se instala.

    Essa srie de idias extremamente elementares, descosidas, pretensiosamentedespretensiosas, um convite a um trabalho maior de pesquisa, que nos permitaproduzir um discurso. A Universidade est a para isso, pois ela o lugar da produ-o desse discurso que resulta da anlise.

    O DINHEIRO E O TERRITRIOResumo: Territrio e dinheiro se correlacionam. Primeiro, o territrio rege o dinheiro. Aps, e

    progressivamente, a relao se inverte, o dinheiro rege o territrio. A troca a mediao histrica darelao e da inverso. Por intermdio da troca, o dinheiro, e ento o territrio, se faz informao eregulao. Com a criao do Estado territorial (o Estado nacional), o dinheiro vira dinheiro nacionale se internacionaliza. At que vira dinheiro global, o fluido dos fluidos, o tirano desptico e cruel sus-tentado na velocidade da circulao e na tcnica informacional dos dias de hoje.

    Palavras-chave: Dinheiro, Territrio, Perodo Tcnico-Cientfico Informacional

    MONEY AND TERRITORYSummary: Territory and money are correlated. First, territory rules money. Afterwards and pro-

    gressively, this relation is reversed, money rules territory. Exchange constitutes the historical media-tion of the relation and the reversion. By means of exchange, money and then territory become infor-mation and regulation. Money becomes national money and it is internationalized when the territorial(national) State is created. Finally, it becomes global money, the flux of the fluxes, the despotic andcruel tyrain sustained in the velocity of circulation and in the todays informational technique.

    Keywords: Money, Territory, Technical-Scientifical and Informational Period.

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    O Dinheiro e o Territrio