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DOI: https://doi.org/10.26512/rfmc.v7i3.27033 Modernidade, Transmodernidade e Eurocentrismo: Mutações Conceituais [Modernity, Transmodernity and Eurocentrism: Conceptual Changes] Sulivan Ferreira de Souza * ; Ivanilde Apoluceno de Oliveira ** Resumo: O objetivo deste artigo é refletir sobre os conceitos de Moder- nidade Eurocêntrica, Modernidade Planetária e Transmodernidade, apresentando duas visões históricas sobre a modernidade. A pri- meira, a intraeuropeia, cuja base é a consolidação da cultura, da ci- ência no Ocidente e na racionalidade europeia, sendo Hegel, uma das principais referências e a segunda, planetária e transmoderna, cu- jos fundamentos são Enrique Dussel e intelectuais da rede Moderni- dade/Colonialidade. Metodologicamente, é um estudo bibliográfico, por meio do qual se dialoga com autores que tratam o fenômeno da modernidade. Entre os resultados destacamos que a visão moderna eurocêntrica mantém a lógica do pensamento colonial, enquanto a concepção moderna planetária busca desconstruí-la, de forma crítica, deslocando o olhar para o outro negado e excluído, trazendo para de- bate o discurso ético da diferença e da alteridade. Palavras-chave: modernidade; eurocentrismo; transmodernidade; planetário. Abstract: The aim of this article is to reflect on the concepts of Eurocentric Modernity, Planetary Modernity and Transmodernity, presenting two historical views on modernity. The first, intra- European, whose basis is the consolidation of culture, science in the West and European rationality, being Hegel, one ofthe main referen- ces and the second, planetary and transmodern, whose foundations are Enrique Dussel and intellectuals of the Modernity/Coloniality network. Methodologically it is a bibliographic study, through which one dialogues with authors who treat the phenomenon of modernity. Among the results we highlight that the modern Eurocentric vision maintains the logic of colonial thought, while the modern planetary conception seeks to deconstruct it, critically, shifting the gaze to the other denied and excluded, bringing to debate the ethical discourse of dierence and otherness. Keywords: modernity; eurocentrism; transmodernity; planetary. * Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Pará (UEPA). Atualmente realiza doutorado em Edu- cação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Membro do Núcleo de Educação Popular Paulo Freire. Bolsista CNPq e mebro do GESTRADO/UFMG. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000- 0003-3391-0265. ** Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Realizou estágio de pós- doutorado em Educação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO). Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação e Coordenadora do Núcleo de Educação Popular Paulo Freire da Universidade do Estado do Pará (UEPA). E-mail:[email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0002- 3458-584X. Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.7, n.3, dez. 2019, p. 267-289 ISSN: 2317-9570 267

Modernidade, Transmodernidade e Eurocentrismo: Mutações

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Page 1: Modernidade, Transmodernidade e Eurocentrismo: Mutações

DOI: https://doi.org/10.26512/rfmc.v7i3.27033

Modernidade, Transmodernidade e Eurocentrismo:Mutações Conceituais

[Modernity, Transmodernity and Eurocentrism: Conceptual Changes]

Sulivan Ferreira de Souza*; Ivanilde Apoluceno de Oliveira**

Resumo: O objetivo deste artigo é refletir sobre os conceitos de Moder-nidade Eurocêntrica, Modernidade Planetária e Transmodernidade,apresentando duas visões históricas sobre a modernidade. A pri-meira, a intraeuropeia, cuja base é a consolidação da cultura, da ci-ência no Ocidente e na racionalidade europeia, sendo Hegel, umadas principais referências e a segunda, planetária e transmoderna, cu-jos fundamentos são Enrique Dussel e intelectuais da rede Moderni-dade/Colonialidade. Metodologicamente, é um estudo bibliográfico,por meio do qual se dialoga com autores que tratam o fenômeno damodernidade. Entre os resultados destacamos que a visão modernaeurocêntrica mantém a lógica do pensamento colonial, enquanto aconcepção moderna planetária busca desconstruí-la, de forma crítica,deslocando o olhar para o outro negado e excluído, trazendo para de-bate o discurso ético da diferença e da alteridade.Palavras-chave: modernidade; eurocentrismo; transmodernidade;planetário.

Abstract: The aim of this article is to reflect on the concepts ofEurocentric Modernity, Planetary Modernity and Transmodernity,presenting two historical views on modernity. The first, intra-European, whose basis is the consolidation of culture, science in theWest and European rationality, being Hegel, one of the main referen-ces and the second, planetary and transmodern, whose foundationsare Enrique Dussel and intellectuals of the Modernity/Colonialitynetwork. Methodologically it is a bibliographic study, through whichone dialogues with authors who treat the phenomenon of modernity.Among the results we highlight that the modern Eurocentric visionmaintains the logic of colonial thought, while the modern planetaryconception seeks to deconstruct it, critically, shifting the gaze to theother denied and excluded, bringing to debate the ethical discourseof difference and otherness.Keywords: modernity; eurocentrism; transmodernity; planetary.

*Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Pará (UEPA). Atualmente realiza doutorado em Edu-cação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Membro do Núcleo de Educação Popular Paulo Freire.Bolsista CNPq e mebro do GESTRADO/UFMG. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3391-0265.**Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Realizou estágio de pós-

doutorado em Educação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO). Professora do Programade Pós-Graduação em Educação e Coordenadora do Núcleo de Educação Popular Paulo Freire da Universidade doEstado do Pará (UEPA). E-mail:[email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3458-584X.

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1 - Introdução

Este artigo faz parte de uma pes-quisa maior intitulada “Educação,Modernidade e Transmoderni-dade: mutações conceituais(UFMG\ UEPA)”. Metodologica-mente, ele é um estudo biblio-gráfico, por meio do qual se di-aloga com autores que tratam ofenômeno da modernidade. Com-preendemos a Modernidade comoum fenômeno cultural, econô-mico, e filosófico, constituída pelaColonialidade, que se apresentamcomo duas faces da mesma mo-eda.

A rede Modernidade/Coloniali-dade é constituída por intelectu-ais de diferentes campos do saber,organizados em uma comunidadede argumentação, que trabalhamde forma coletiva em conceitose estratégias (ESCOBAR, 2003),estabelecendo crítica ao pensa-mento moderno eurocêntrico, àsconsequências do colonialismo as-sociado à modernidade e cons-truindo os pressupostos do pen-samento decolonial e do pensa-mento planetário moderno.

Assim, neste estudo, inicial-mente serão analisadas as duasconcepções de modernidade: a in-traeuropeia e a planetária, apre-sentando os seus pressupostosepistemológicos e refletindo so-bre os principais conceitos que en-volvem o tema. Em seguida será

explicitado o projeto ético, po-lítico e epistêmico, denominadode transmodernidade, perspectivaessa adotada pela rede Moderni-dade/Colonialidade.

2 - Modernidade: conceitos econcepções

Para compreender a palavra mo-dernidade e suas variações semân-ticas utilizamos uma conceituaçãomais usual explanada pelo filósofoMarcondes (2007, p.142):

A etimologia de “moderno”parece ser o advérbio la-tino “modo”, que significa“agora mesmo”, “nesteinstante”, “no momento”,portanto designando oque nos é contemporâ-neo, e é este o sentidoque “moderno” capta,opondo-se ao que é ante-rior, é traçado, por assimdizer, uma linha, ou divi-são entre os dois períodos.

Nesta perspectiva, a Moderni-dade está sempre atrelada à mu-dança de um estágio antigo parao novo, associada ao contemporâ-neo e uma visão atrelada ao con-ceito de progresso, cujo indicadoré o desenvolvimento econômico,vinculado a uma determinada ele-

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vação intelectual, moral e social.Porém, há um ponto cego, pois

a Modernidade enquanto movi-mento histórico, fenômeno cul-tural e produtor de narrativas eepistemologias em determinadasleituras é concebida como um pro-cesso unívoco, na medida em queexistem elementos históricos, filo-sóficos e pedagógicos que são da-dos como “a priori”, cristalizandoos pressupostos da modernidadeou modernidade tardia ou pós-modernidade.

Essa visão unívoca de moderni-dade é problematizada pela redeModernidade/Colonialidade, quedestaca a existência de concepçõesde modernidade diferenciadas doponto de vista histórico e polí-tico. Esta rede critica a concepçãointra-europeia, por ser eurocên-trica, e aponta a perspectiva pla-netária em uma dimensão trans-moderna.

2.1 - A Modernidade Intraeuro-peia (Eurocêntrica)

A Modernidade, na perspectivaintraeuropeia, possui uma estru-tura narrativa histórica que com-partilha de determinados eventoscomo: o renascentismo, a reformaprotestante, a revolução francesa,a revolução industrial e o surgi-mento da ciência moderna. Acompreensão é de que a filoso-

fia moderna e as suas diversastendências gnosiológicas (raciona-lismo, empirismo, dogmatismo,criticismos entre outros) engen-draram os pilares para o enten-dimento da produção do conheci-mento; e a filosofia europeia sub-sidia os fundamentos da raciona-lidade moderna.

Em termos gerais os teóricosda modernidade partilham des-ses alicerces comuns, isso não sig-nifica que, as suas concepçõessão homogêneas, pelo contrário,há muitas divergências sobre opeso de cada um dos eventos his-tóricos em relação aos alcancesda modernidade, e, principal-mente, em suas consequências enos desdobramentos dessas impli-cações. Por isso, destacamos qua-tro autores, que representam a vi-são eurocêntrica de modernidade:Max Weber (1864-1920); GeorgWilíelm Friedrich Hegel (1770-1831); Auguste Comte (1798-1857) e Jürgen Habermas (1929).Evidente que o presente texto nãoobjetiva esgotar os debates reali-zados nas obras dos referidos au-tores, muito menos reduzir suasideias às criticas aqui apresenta-das com base em uma epistemolo-gia decolonial.

Começamos com o trabalho deJürgen Habermas, que transitapor célebres obras de pensadores,como Max Weber, Hegel, Schiller,Nietzsche, Horkheimer, Adorno,

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Heidegger, Derrida, Foucault, en-tre outros, ou seja, a sua excursãocentra-se nos grandes nomes dopensamento filosófico e social dacultura europeia ocidental (HA-BERMAS, 2000).

Uma das grandes produções deHabermas é O Discurso Filosóficoda Modernidade (1985), na qualdelineia o passo a passo da edi-ficação do discurso filosófico damodernidade. “Nesse discurso, amodernidade foi elevada, desde osfins do século XVIII, a tema filosó-fico” (HABERMAS, 2000, p.01).

Habermas centra as suas inves-tigações apenas nos cânones euro-cêntricos, o seu debate sobre a mo-dernidade eclode tomando comobase histórica exclusivamente apercepção linear que entende ahistória moderna tem origem norenascentismo, isto é, ele tomacomo marco referencial apenas asnarrativas eurocêntricas da histó-ria e da filosofia.

Weber (1992), em seu livro AÉtica Protestante e o Espírito doCapitalismo, afirma que, no oci-dente, e mais especificamente nacivilização europeia, surgem fenô-menos culturais de extremo va-lor, pois, pelo significativo desen-volvimento da civilização ociden-tal, lograram-se valores univer-sais. Isto significa que “Weber as-socia a modernidade ao contextohistórico da civilização e do raci-onalismo ocidental, pois no Oci-

dente, diferentemente das civi-lizações orientais, os fenômenosculturais são dotados de valorese significados universais” (OLI-VEIRA, 2016, p.51).

Para Weber (1992), ao estu-darmos qualquer problema dahistória universal, o produto damoderna civilização europeia es-tará sujeito à indagação de quaiscombinações de circunstâncias sepode atribuir ao fato de que, nacivilização ocidental, e só nela,terem aparecido fenômenos cul-turais que, como queremos crer,apresentam uma linha de desen-volvimento de significado e valoruniversais. Elenca os pontos avan-çados da civilização ocidental, rei-vindicando as culturas grega e ro-mana como pilares iniciais queajudaram a formatação da socie-dade moderna.

Para Weber (1992, p.02), apenasno Ocidente:

existe uma ciência numestágio de desenvolvi-mento que reconhecemos,hoje, como válido. O co-nhecimento empírico, asreflexões sobre o universoe a vida, a sabedoria filo-sófica e teológica das maisprofundas não estão aquiconfinadas [...] Em poucaspalavras, conhecimentoe observação de grandefinura sempre existiram

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em toda parte, principal-mente na Índia, na China,na Babilônia e no Egito.Mas à astronomia da Ba-bilônia e às demais fal-tavam – o que torna seudesenvolvimento mais as-sombroso – as bases mate-máticas recebidas primei-ramente dos gregos. A ge-ometria hindu não tinhaprovas racionais, que fo-ram outro produto do in-telecto grego, criador tam-bém da mecânica e da fí-sica. As ciências naturaisda Índia, embora de tododesenvolvidas sobre a ob-servação, careciam de mé-todo de experimentação oque foi, longe de seus al-vores na Antiguidade, umproduto essencialmentedo Renascimento, assimcomo o moderno labora-tório. A medicina, especi-almente na Índia, emboraaltamente desenvolvidaquanto às técnicas empíri-cas, carecia de fundamen-tos biológicos e particular-mente bioquímicos. Umaquímica racional tem es-tado ausente de todas asáreas da cultura que não aocidental.

Conforme Habermas (2000), We-ber demonstra como ocorreu na

Europa o processo de racionali-zação e fomento das esferas cul-turais de uma organização social,como as ciências empíricas, teo-rias morais, teorias jurídicas, ar-tes, isto é, esferas culturais dodesenvolvimento das sociedadesmodernas.

O que Max Weber des-creveu do ponto de vistada racionalização não foiapenas a profanação dacultura ocidental, mas,sobretudo, o desenvolvi-mento das sociedades mo-dernas. As novas estrutu-ras sociais são caracteriza-das pela diferenciação da-queles dois sistemas, fun-cionalmente interligados,que se cristalizaram emtorno dos núcleos organi-zadores da empresa capi-talista e do aparelho bu-rocrático do Estado. We-ber entende esse processocomo a institucionaliza-ção de uma ação econô-mica e administrativa ra-cional com respeito a fins.(HABERMAS, 2000, p.004).

A modernidade na obra de We-ber está relacionada à constituiçãoda cultura ocidental, europeia, aqual está dotada de ciência, mo-

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ralidade e conhecimentos emba-sados em métodos sistemáticos,racionais e associados à ética ca-pitalista.

Habermas (2000) e Marcondes(2007) assinalam que Hegel foium dos primeiros filósofos a con-ceituar a modernidade, definindo-a em termos históricos, ou seja,refere-se a ela como sinônimo denovos tempos ou tempos moder-nos, significando ser a moderni-dade, em Hegel, um conceito deépoca.

Hegel é responsável por sis-tematizar a história da filosofia,sendo conhecido como o primeirohistoriador da filosofia. Ele or-ganiza e classifica em períodosnomeados: Antiguidade, IdadeMédia e Idade Moderna, divi-são ainda muito usual na con-temporaneidade em várias áreasdo conhecimento (MARCONDES,2007; CHAUÍ, 1990).

O filósofo alemão organiza a fi-losofia em três períodos:

Primeiro período. Começanos tempos de Tales, cercado ano 600 a. C. e estende-se até ao apogeu da filoso-fia neoplatônica com Plo-tino, no século III d. C. esua ulterior continuação eevolução por meio de Pro-clo, no século V, até a ex-tinção de toda a filosofia.A filosofia neoplatônica

penetrou mais tarde nocristianismo, e muitas fi-losofias dentro do cristia-nismo não têm outra basealém desta. Temos aquium período de pouco maisou menos mil anos, cujofim coincide com as emi-grações de povos e coma queda do Império Ro-mano.

Segundo período. É o daIdade Média, o dos au-tores escolásticos. Histo-ricamente merecem tam-bém ser mencionados osárabes e os judeus. Masesta filosofia desenvolve-se principalmente dentroda Igreja cristã: períodoque abarca pouco mais deum milênio.

Terceiro período. A filo-sofia dos tempos moder-nos consolidou-se apenasao tempo da Guerra dosTrinta Anos, com Bacon,com Jacob Boehme e comDescartes, o qual começacom a distinção contidano Cogito, ergo sum. Esteperíodo cronologicamentecompreende ainda poucosséculos e, por isso, esta fi-losofia é, todavia algo denovo. (HEGEL, 2005, p.393).

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A divisão histórica do filósofo ale-mão compreende que a Idade Mo-derna é precedida por períodospreparatórios, logo a história uni-versal se inicia na Idade Antiga,passando pela Idade Média e che-gando aos novos tempos, isto é,aos tempos modernos.

A trajetória da filosofia que co-nhecemos, utilizamos e estamoslendo, nesse exato momento, rea-firma uma série de complexos nar-rativos eurocêntricos. Esta dimen-são histórica filosófica expandepara outras áreas do pensamentocomo a educação, a sociologia, ageografia, a política entre outras.

No pensamento social vamosdestacar Auguste Comte, pensa-dor francês do século XIX, quecontribui para a formação de umanova ciência, as Ciências Sociaisou Sociologia. Em seus trabalhosestavam presentes as suas concep-ções de ciência e a formação doespírito científico, ou espírito po-sitivo. O ideário do espírito po-sitivo, isto é, científico, está ex-presso em suas obras Curso de Fi-losofia Positiva (1830) e Discursosobre o espírito positivo (1844). Naspalavras de Comte:

De um lado, a grandecrise inicial da positivi-dade moderna só dei-xou essencialmente forado movimento científicopropriamente dito teo-

rias morais e sociais, lar-gadas então a um isola-mento irracional, sob a es-téril dominação do espí-rito teológico-metafísico.Consiste, pois, em levá-las também, em nossosdias, ao estado positivo,a última prova do verda-deiro espírito filosófico,cuja extensão sucessiva atodos os outros fenôme-nos fundamentais já se en-contrava suficientementeesboçada. Mas, de ou-tro lado, essa última ex-pansão da filosofia naturaltendia espontaneamente asistematizá-la logo, cons-tituindo o único ponto devista, científico ou lógico,que pode dominar o con-junto de nossas especu-lações reais, sempre ne-cessariamente redutíveisao aspecto humano, istoé, social, o único suscetí-vel duma ativa universali-dade. (COMTE, 1978, p.65).

Para Comte, os aspectos humanospoderiam ser tratados como ob-jetos importantes para a ciênciamoderna, poderiam ser mensurá-veis, observáveis, além de ser pos-sível a criação de leis gerais paraa compreensão dos fatos sociais.Caberia apenas desenvolver uma

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ciência rigorosa para essas com-plexidades de investigar a socie-dade.

Do século XVIII ao XIX, então,travam-se debates sobre o cará-ter científico ao se estudar os se-res humanos e os mais variadosaspectos da humanidade. Entre-tanto, pretendemos destacar aquicomo Comte compreendia a mo-dernidade, já que viveu no mo-mento de consolidação da ciên-cia moderna. Ele busca adaptaros métodos, as experimentações eos usos da racionalidade instru-mental, elencados como quesitosnecessários para se conhecer a re-alidade.

Comte (1978) acreditava que aevolução de estágios míticos, pré-científicos e especulativos para oestágio científico ou positivo, ca-racterizado por ele como estágiodefinitivo da positividade racio-nal da humanidade, é um movi-mento exclusivamente da Europaocidental. Esclarece Comte que o:

[...] conjunto de nossaevolução mental, e, so-bretudo o grande movi-mento realizado na Eu-ropa ocidental desde Des-cartes e Bacon, não deixa,pois, a partir de agora, ou-tra saída possível a nãoser constituir enfim, de-pois de tantos preâmbulosnecessários, o estado ver-

dadeiramente normal darazão humana. (COMTE,1978, p. 6).

Observamos que há uma con-vergência histórica entre Hegel,Comte, Weber e Habermas, umavez que os trabalhos apresentampilares históricos comuns, isto é,consideram que a consolidaçãoda cultura e ciência da civiliza-ção moderna fora antecedida poreventos históricos cruciais e exclu-sivamente europeus para a cons-trução desse designado “estadoverdadeiramente normal da razãohumana”.

norte do globo terrestre (semdesconsiderar a própria históriaeurocentrada da cartografia), compretensões monolíticas de repre-sentação do mundo e das socieda-des. É notório que as etapas his-tóricas, os fenômenos culturais, odesenvolvimento do modo de pro-dução capitalista, a evolução tec-nológica e a constituição do Es-tado Moderno dentre outros fenô-menos constituem o que somoshoje.

A pensadora Chauí (1990) des-taca que o Renascimento é umperíodo de transição, de confli-tos intelectuais, confusões políti-cas, tensões entre Igreja e Estado,entre protestantes e católicos, hu-manistas ateus e humanistas cris-tãos, entre organizações feudaise cidades burguesas emergentes.

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O movimento humanista ergue-seno Renascimento. Para Marcon-des (2007, p.144), o humanismo:

rompe assim com a visãoteocêntrica e com a con-cepção filosófico-teológicomedieval, valorizando ointeresse pelo homemconsiderado em si mesmo;por outro lado, significatambém uma ruptura coma importância dada às ci-ências naturais após a re-descoberta de Aristótelesao final do séc. XII.

A visão teocêntrica é corroída pelohumanismo, pondo os seres hu-manos no centro, ou seja, os in-teresses do ser humano são pri-oridades que passam arquitetar asua autonomia, logo derrubando omonopólio do conhecimento que aigreja católica possuía.

O humanismo contou com au-xílio de outro movimento religi-oso que surge de conflitos internosda Igreja, isto é, a reforma pro-testante, que adquiriu relevantepapel nesse processo de rebeldiacontra autoridade quase inques-tionável da instituição católica,pois:

a reforma aparece nestemomento como represen-tante da defesa da liber-

dade individual e da cons-ciência como lugar da cer-teza, sendo o indivíduocapaz pela sua luz naturalde chegar à verdade (emquestões religiosas) e con-testar a autoridade insti-tucional e o saber tradicio-nal, posições que se gene-ralizarão além do camporeligioso e serão funda-mentais no desenvolvi-mento do pensamentomoderno, encontrando-seexpressa um século depoisem seu mais importanterepresentante, René Des-cartes. (MARCONDES,2007, p.153).

Segundo Marcondes (2007), ape-sar de ser um movimento reli-gioso, a reforma forneceu as ba-ses para a liberdade individualcomo ferramenta para se che-gar à “verdade”. Veracidade essaque não precisa mais da legitimi-dade ou autorização do Vaticano,uma vez que a reforma fomentouo questionamento das estruturasinstitucionais imperiosas da IgrejaCatólica, autoridade essa que du-rou muitos séculos.

Outro movimento intelectualimportante foi o Iluminismo, quecontribuiu na produção do ali-cerce filosófico da modernidade,formando a filosofia moderna.

De acordo com Chauí (1990,

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p.60), a filosofia moderna é:

aquele saber que se desen-volve na Europa durante oséculo XVII tendo comoreferencias principais ocartesianismo – isto é, afilosofia de René Descar-tes –, a ciência da naturezagalilaica – isto é, a mecâ-nica de Galileu Galilei – ,a nova ideia do conheci-mento como síntese entreobservação, experimenta-ção e razão teórica baconi-ana – isto é, a filosofia deFrancis Bacon – e as ela-borações acerca da origeme das formas da soberaniapolítica a partir das ideiasde direito natural e direitocivil hobbesianas – isto é,do filósofo Thomas Hob-bes.

A filosofia moderna, então, con-solida as concepções epistêmicas,antropológicas, políticas consti-tuindo assim uma racionalidadecondizente como os fenômenosdos “tempos modernos”.

O papel da ciência moderna éimprescindível, pois irá ultrapas-sar as acepções teológicas e es-peculativas da realidade, o mé-todo científico e os princípios re-guladores, generalizantes e sistê-micos da ciência moderna levam

a humanidade ao “conhecimentoverdadeiro” do real. Para Marcon-des (2007), isso ocorreu, porque aciência moderna:

surge quando se tornamais importante salvaros fenômenos e quando aobservação, a experimen-tação e a verificação dehipóteses tornam-se cri-térios decisivos, suplan-tando o argumento me-tafisico. (MARCONDES,2007, p.156).

Todos esses argumentos, ressalta-dos pelos filósofos e pelos cien-tistas dos tempos modernos, evi-denciam que a modernidade é umfenômeno histórico e intelectualque surgiu na Europa ocidental,isto quer dizer, os fenômenos damodernidade são acontecimentosexclusivamente europeus, comoilustra Hegel (1997, p.309):

346 - Porque a história éa encarnação do espíritona forma do evento, darealidade natural imedi-ata, os graus de evoluçãosão dados como princípiosnaturais imediatos e estesprincípios, enquanto na-turais, existem como umapluralidade de termos ex-teriores de modo a cada

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povo receber um. É a exis-tência geográfica e antro-pológica do espírito.

347 - O povo que recebetal princípio como seuprincípio natural fica coma missão de aplicá-lo nodecorrer do progresso e naconsciência de si do espí-rito universal que se de-senvolve. Tal povo é opovo que, na época corres-pondente, domina a histó-ria universal. Mas só umavez pode ser o povo do-minante (§ 346a), e emface do direito absolutoque lhe cabe como repre-sentante do grau atual dodesenvolvimento do espí-rito do mundo, nenhumdireito têm os outros po-vos que, tais como aquelesque já representaram umaépoca passada, nada sãona história universal.

Segundo Hegel (1997), a histó-ria universal chega ao ápice coma Europa ocidental. A moder-nidade, na perspectiva de Hegelrefere-se aos “tempos modernos”,como passagem para um novo pe-ríodo, cujo inicio histórico é o ilu-minismo.

Inferimos, então, que as ca-racterizações sobre a moderni-

dade, modernidade tardia ou pós-modernidade estão atreladas a fa-tores históricos exclusivamente dacultura europeia. Isto significa:o que aconteceu antes é conside-rado período preparatório para os“novos tempos” e o que ocorrerdepois é resultado da expansãodessa cultura moderna europeiaocidental.

2.2 - A Modernidade Planetária

Oliveira (2016, p.52) explica queDussel contrapõe-se a visão his-tórica hegeliana da modernidadede que a modernidade emerge doiluminismo. “A sua tese é de que1492 é a data de nascimento damodernidade como um conceito”,porque “com o descobrimento daAmérica, a Europa se confron-tou com o outro e pode se definircomo ‘um ego descobridor, con-quistador, colonizador’”.

A conquista da América, em 12de outubro de 1492, é para Dus-sel (1994) um fator constituinte damodernidade

Para Habermas, comopara Hegel, el descubri-miento de América no esun determinante consti-tutivo de la Modernidad.Deseamos demostrar locontrario. La experien-cia no sólo del "Descu-

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brimiento", sino especial-mente de la "Conquista"será esencial en la consti-tución del “ego” moderno,pero no sólo como subjeti-vidad, sino como subjeti-vidad "centro" y "fin" de lahistoria. (DUSSEL, 1994,p. 21).

Dussel (1994) critica a visão demodernidade intraeuropeia porser eurocêntrica, isto é, centra nosgrandes eventos históricos da Eu-ropa. Isto implica dizer que, o

desenvolvimento científico, a re-volução industrial, a expansão ca-pitalista, a implantação e a am-pliação das colônias na Américasão consequências da moderni-dade europeia ocidental.

O Paradigma eurocêntrico, en-tão, se configura por períodos his-tóricos, entre os quais o Renasci-mento, o Iluminismo, a ReformaProtestante, que consolidaram opensamento moderno tendo comocentro geográfico e cultural a Eu-ropa, conforme figura 1, a seguir.

Figura 01- Paradigma Eurocêntrico

Fonte: Dussel (1994)

Dussel (1994, p. 20) explica queos europeus se autodenominaramcomo possuidores de um direitoabsoluto, o direito de poder, ser eter.

Es la mejor definición nosólo de “eurocentrismo”

sino de la sacralizaciónmisma del poder imperialdel Norte o el Centro, so-bre el Sur, la Periferia, elantiguo mundo colonial ydependiente. Creo queno son necesarios comen-tarios.

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Entretanto, por mais brilhanteque seja a exposição dos teóricoseurocêntricos, considera que hánesses estudos uma lacuna epis-têmica. É como se a Europa nadativesse a aprender com os outrospovos, pois, já dizia Hegel (1997,p. 309): “nenhum direito têmos outros povos que, tais comoaqueles que já representaram umaépoca passada, nada são na histó-ria universal”.

Assim, Dussel destaca, em con-cordância com a rede Moderni-dade/Decolonialidade, que a con-cepção de modernidade está mer-gulhada na colonialidade, isto é, ahistória, a ciência, a filosofia, a lin-guagem, as normas e as religiõesestão enraizadas nas culturas eu-ropeias como “centro do mundo”.Por isso, o processo de coloniza-ção necessita ser lido como fenô-meno importante nas análises so-bre a modernidade.

Conforme Quijano (2007, p.93):

La colonialidad es uno delos elementos constituti-vos y específicos del pa-trón mundial de poder ca-pitalista. Se funda en laimposición de una clasi-ficación racial/étnica dela población del mundocomo piedra angular dedicho patrón de poder, yopera en cada uno de los

planos, ámbitos y dimen-siones, materiales y subje-tivas, de la existencia co-tidiana y a escala social.Se origina y mundializa apartir de América.

A colonialidade é essa matriz depoder / saber que invade as rela-ções de caráter tanto macrossoci-ais quanto microssociais e atua nocotidiano, bem como constrói aolongo dos séculos um imagináriosocial.

Nesta perspectiva, desde o“descobrimento” da América, aEuropa vem se relacionado comoutras culturas, mundos e pessoascomo o “Outro que é o Mesmo”,pois esse outro é um objeto quepode ser controlado, é uma coisamanipulável, ou seja, o outronão é compreendido como ou-tro, é concebido apenas como o“Mesmo” . O Eu (Eurocentrismo)interpela os povos ameríndioscomo uma “versão selvagem”,como um estágio “mítico dasociedade” ou como “uma pré-história” que necessita ser desen-volvida.

Nessa relação, entre Eu (Eu-ropa) e o Outro (América), é queocorre a constituição das subje-tividades, do colonizador comoser superior e do colonizado comoser inferior. A América é a “des-cubierta” para ser civilizada por“el ser europeo de la Cultura Oc-

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cidental", pero "en-cubierta" en suAlteridad” (DUSSEL, 1994, p. 37).

O encobrimento da alteridadedos sujeitos que habitavam aAmérica antes da conquista, istoé, os ameríndios (povos múltiplose diversos), produz, para Dussel(1994), a constituição de imagens,representações negativas dessespovos, o europeu caracterizava-os como bárbaros incultos e comobestas.

Explica Dussel que os espa-nhóis, lusitanos, franceses, holan-deses, entre outros europeus, ti-nham a árdua missão civilizadorade retirar da “selvageria” as popu-lações ameríndias. Da colônia aomundo contemporâneo, os euro-peus e Estados Unidos (que entracena séculos depois) são as gran-des potências econômicas que nos“salvarão” da barbárie e do subde-senvolvimento. Destaca ainda quea Modernidade é justificativa deuma práxis colonizadora, irracio-nal e violenta sobre os Outros, os“não modernos” (DUSSEL, 2005).

Dussel (1994), então, adverteque a acepção eurocêntrica damodernidade é um grande mito,cujo discurso é falaz e excludente,pois essa narrativa ideológica, his-tórica e filosófica tanto produzquanto legitima o encobrimentodo “Outro”.

O mito da Modernidade elucidaque:

1. A civilização mo-derna autodescreve-secomo mais desenvolvidae superior (o que signi-fica sustentar inconscien-temente uma posição eu-rocêntrica).

2. A superioridade obrigaa desenvolver os mais pri-mitivos, bárbaros, rudes,como exigência moral.

3. O caminho de talprocesso educativo de de-senvolvimento deve seraquele seguido pela Eu-ropa (é, de fato, um desen-volvimento unilinear e àeuropeia o que determina,novamente de modo in-consciente, a falácia de-senvolvimentista).

4. Como o bárbaro se opõeao processo civilizador, apráxis moderna deve exer-cer em último caso a vi-olência, se necessário for,para destruir os obstácu-los dessa modernização (aguerra justa colonial).

5. Esta dominação produzvítimas (de muitas e vari-adas maneiras), violênciaque é interpretada comoum ato inevitável, e com osentido quase ritual de sa-crifício; o herói civilizadorreveste a suas próprias ví-timas da condição de se-

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rem holocaustos de um sa-crifício salvador (o índiocolonizado, o escravo afri-cano, a mulher, a destrui-ção ecológica, etecetera).

6. Para o moderno, obárbaro tem uma culpa(por opor-se ao processocivilizador) que permite àModernidade apresentar-se não apenas como ino-cente, mas como eman-cipadora dessa culpa desuas próprias vítimas.

7. Por último, e pelo ca-ráter civilizatório da Mo-dernidade, interpretam-secomo inevitáveis os sofri-mentos ou sacrifícios (oscustos) da modernizaçãodos outros povos atrasa-dos. (imaturos), das ou-tras raças escravizáveis,do outro sexo por ser frá-gil, etecetera (DUSSEL,2005, p.29).

Desta forma, a práxis dominadorada Modernidade forjou na con-quista, a subalternização política,epistêmica e ontológica dos po-vos ameríndios. A Colonialidadeé a face oculta da modernidade.A chegada do homem europeu,branco, heterossexual, patriarcal,estabeleceu hierarquias no mundodo trabalho, na organização po-lítica, militar, étnica, sexual, es-

piritual, linguística e epistêmica(GROSFOGUEL, 2010).

A Modernidade eurocêntricaelaborou uma narrativa de“história universal”, uma cro-nologia geopolítica, diria Dus-sel (2005), que engendra umasequência histórica ideológica,que parte da história da Ásia comopré-história europeia, passandopelo mundo Grego, Mundo Ro-mano Pagão e Cristão, MundoCristão Medieval, chegando até aoMundo Europeu Moderno. A par-tir do mundo moderno, são cons-tituídas as periferias, sendo a pri-meira delas a América Latina.

Dussel (2007), então, descons-truiu essa história universal, afir-mando que a história não parte daEuropa, mas se inicia com siste-mas Inter-regionais. Destaca quehá quatro estágios destes sistemas:(a) Egípcio-mesopotâmico (desdeo IV milênio a.C.); (b) Indo-europeu (desde o século XX a.C.);(c) Asiático-afro-mediterrâneo(desde o século IV a.C.); (d)Sistema-mundo. Ele explica,ainda, que, antes da conquista,antes da espoliação material e hu-mana da Europa sobre a América,a Europa era apenas uma periferiado sistema inter-regional Asiático-Afro-Mediterrâneo, mais especi-ficamente, o mundo Otomano-Mulçumano.

Assim, o sistema-mundo atualnasce com a conquista do con-

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tinente americano, o “novomundo”. A exploração dos cor-pos, das mentes, principalmentedos recursos materiais, proporci-ona um salto quantitativo e quali-tativo para a Europa, que passa arivalizar com as potências do sis-tema inter-regional Asiático-afro-mediterrâneo, o mundo otomano-mulçumano, Índia e China (DUS-SEL, 1994, 2005, 2007).

Como explicita Dussel (2005,2007), no sistema-mundo, a Eu-ropa ganha centralidade, o quenão acontece pela “superioridadenatural” interna da cultura euro-peia em relação às outras cultu-ras, (também não se nega a impor-tância dessa cultura para humani-dade, mas o que se problematiza éesse discurso que naturaliza umasuposta superioridade), por doismotivos: o primeiro porque nãohá um purismo cultural, houve in-fluências de outras culturas asiá-ticas, mediterrâneas entre outras,por mais que não assumam isso,e, segundo, o acúmulo de recur-sos extraídos das colônias ofere-ceu vantagens econômicas e mili-tares aos europeus.

Por isso o paradigma planetárioda modernidade, na visão de Dus-sel (2007, p.52), é estruturado:

a partir do horizontemundial, concebe a mo-dernidade como a culturado centro do "sistema-

mundo’“, do primeiro"sistema-mundo" pela in-corporação da Ameríndia-, e como resultado daquestão da dita "cen-tralidade". Quer di-zer, a modernidade eu-ropeia não é um sistemaindependente autopoié-tico, auto-referente, mas éuma "parte" do "sistema-mundo": seu centro. Amodernidade, então, é umfenômeno que vai se mun-dializando; começa pelaconstituição simultâneada Espanha com referên-cia a sua "periferia" (a pri-meira de todas. propria-mente falando, a Amerín-dia: o Caribe, o México e oPeru). Simultaneamente,a Europa (com uma dia-cronia que tem um ante-cedente pré-moderno: ascidades italianas renas-centistas e Portugal) iráse transformando no "cen-tro" (com um poder super-hegemônico que, da Espa-nha, passa para Holanda,Inglaterra e França...) so-bre uma "periferia" cres-cente (Ameríndia, Brasile as costas africanas deescravos, Polônia, no sé-culo XVIII; afiançamentode América Latina, Amé-rica do Norte, o Caribe,

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as costas da África e daÁsia e a Europa oriental,no século XVII". o Impé-rio Otomano, Rússia, al-guns reinos da Índia, Su-deste Asiático e primeirapenetração na África con-tinental, até à primeirametade do século XIX).Então a modernidade se-ria, para este paradigmamundial, um fenômenopróprio do "sistema" com"centro e periferia", Es-tasimples hipótese mudaabsolutamente o conceitode modernidade, sua ori-gem, desenvolvimento esua atual crise; e, porisso, também o conteúdoda modernidade tardia oupós-modernidade.

Para Restrepo e Rojas (2010), o“sistema-mundo moderno” im-plica em dizer que as sociedadesestão organizadas e estruturadaspor processos de escala mundial.Essas estruturas moldam as rela-ções entre as sociedades e essasrelações acontecem entre centrose periferias. Neste sentido, a Mo-dernidade é a cultura que está nocentro do sistema-mundo, ou seja,a cultura que está conduzindo asrelações entre centro e periferia.

Como demonstra a figuraabaixo, às outras regiões são ge-ridas pelas concepções modernaseurocentradas. Sem desconside-rar a complexidade e as tensõesestabelecidas nessa centralidade(é uma hegemonia, contudo nãosignifica que há passividade unâ-nime, a imposição é constituídapor conflitos e hierarquizações).

Figura 02 - Paradigma Planetário

Fonte: Dussel (1994)

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Dussel (2007) alerta que a con-quista e integração da Américaproduz a centralidade e a auto-ridade europeia, ou seja, a moder-nidade é produto desse aconteci-mento histórico e não origem.

A “gestão” da centrali-dade do “sistema-mundo”permitirá que a Europa setransforme em algo comoa “consciência reflexiva”(a filosofia moderna) dahistória mundial; e muitosvalores, invenções, desco-bertas, tecnologias, insti-tuições políticas, etc., queatribui a si mesma comosua produção exclusiva.(DUSSEL, 2007, p. 52).

É importante enfatizar que, deacordo com Dussel (2007), exis-tem dois processos na constitui-ção da modernidade. A primeiramodernidade é hispânica, huma-nista, renascentista, e incluímostambém, como complementar, amodernidade lusitana; a segundacorresponde a do centro da Eu-ropa, que inicia com Holanda, de-pois se expande para França, In-glaterra e Alemanha. É relevantesublinhar que a segunda é frutoda primeira. Dussel (2005, p.28)expressa que:

o ego cogito moderno foi

antecedido em mais deum século pelo ego con-quiro (eu conquisto) prá-tico do luso-hispano queimpôs sua vontade (a pri-meira, Vontade-de-podermoderna) sobre o índioamericano. A conquistado México foi o primeiroâmbito do ego moderno.A Europa (Espanha) ti-nha evidente superiori-dade sobre as culturas as-teca, maia, inca, etc., emespecial por suas armas deferro presentes em todoo horizonte euro-afro-asiático. A Europa mo-derna, desde 1492, usaráa conquista da AméricaLatina (já que a Amé-rica do Norte só entrano jogo no século XVII)como trampolim para tiraruma vantagem compara-tiva determinante com re-lação a suas antigas cul-turas antagônicas (turco-muçulmana, etc.). Suasuperioridade será, emgrande medida, fruto daacumulação de riqueza,conhecimentos, experi-ência, etc., que acumu-lará desde a conquista daAmérica Latina.

É proeminente ressaltar o ladoobscuro da modernidade, que é

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o nascimento da Colonialidadejunto com a modernidade, cujoprojeto moderno, com retóricasalvacionista, esconde a sua facesubalternizadora, injusta e vio-lenta (DUSSEL, 1994; RESTREPOE ROJAS, 2010).

A crítica à modernidade, sejaà primeira ou à segunda, é umacrítica à práxis da racionalidadeviolenta. É preciso ficar claro, quenão se pode reduzir a moderni-dade apenas aos males, aos in-fortúnios. Existem positividades,porém nosso objetivo aqui é pro-blematizar a violência ontológica,epistêmica e política da moderni-dade eurocêntrica.

É importante destacar que tantoo coletivo decolonial quanto Dus-sel (1994, 2007) não negam os as-pectos criativos do pensamentomoderno, mas com base na irra-cionalidade da violência do mitoé que afirmam a razão do outrocomo pressuposto da mundiali-dade transmoderna.

No negamos entonces larazón, sino la irraciona-lidad de la violencia delmito moderno; no nega-mos la razón, sino la irra-cionalidad postmoderna;afirmamos la "razón delOtro" hacia una mun-dialidad Transmoderna.(DUSSEL, 1994, p.22).

Ainda de acordo com Dus-sel (2005) e a coletividadede argumentação Moderni-dade/Colonialidade, para supe-rar os processos desumanizan-tes modernos, é necessário ne-gar o mito da modernidade ea violência sacrificadora, afir-mando a Alteridade do Ou-tro, as Alteridades dos oprimi-dos, das vítimas do Sistema-Mundo/Moderno/Colonial/Capi-talista.

3 - O projeto de transmoderni-dade

O movimento Decolonial nos fazrepensar os processos de produ-ção de conhecimentos, as relaçõesde saberes, os modelos educacio-nais, os processos educativos, asindagações filosóficas dentre ou-tros campos da vida humana, nocontexto latino-americano, apon-tando para a necessidade de supe-rar a Modernidade/Colonialidadee decolonizar nossa história enosso presente. Encoraja-nos a as-sumir um projeto Transmoderno.

Dussel (2001, 2007) esclareceo conceito de transmodernidade,distinguindo-o das concepçõeseurocêntricas de modernidade epós-modernidade.

Hablar de "Post"-moderni-dad es indicar que hay un

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proceso que surge "desde-dentro" de la Moderni-dad, y significa un estadode crisis actual en el ho-rizonte de la globaliza-ción. Hablar en cambio de"Trans"-modernidad exi-girá una nueva interpre-tación de todo el fenó-meno de la Modernidad,para poder contar con mo-mentos que nunca estu-vieron incorporados a laModernidad europea, yque subsumiendo lo me-jor de la Modernidad eu-ropea y norteamericanaque se globaliza, afirmará"desde-fuera" de ella com-ponentes esenciales de suspropias culturas exclui-das, para desarrollar unanueva civilización futura,la del siglo XXI. Acep-tar esa masiva exteriori-dad a la Modernidad eu-ropea permitirá compren-der que hay momentosculturales situados "fu-era " de dicha Moderni-dad. Para ello habrá quesuperar una interpreta-ción que supone todavíaun "segundo" y muy sutileurocéntrismo, pasandoa una interpretación no-eurocéntrica de la historiadel sistema mundial, sólohegemonizado por Europa

por algo más de 200 años– y no 500 –, por lo queel hecho de que otras cul-turas hasta ahora despre-ciadas, no valorizadas, es-tén emergiendo desde un"más-allá" del horizontede la Modernidad euro-pea no es un mero mi-lagro de su surgimientodesde la nada, sino el re-torno a ser los actores queya lo han sido en esa his-toria en otras épocas re-cientes. Aunque la cul-tura occidental se globa-liza – en un cierto niveltécnico, económico, po-lítico, militar – no agotapor ello otros momentosde enorme creatividad enesos mismos niveles queafirman desde su "Exteri-oridad" otras culturas vi-vientes, resistentes, cre-cientes. (DUSSEL, 2001,p.390-391).

Nesta perspectiva, o projeto datransmodernidade não se consti-tui apenas uma guinada termino-lógica, constitui um giro episte-mológico que emerge desde as ví-timas da modernidade, desde ossubalternos.

Para Grosfoguel (2010, p.482),o filósofo Enrique Dussel propõe:

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que se enfrente a moder-nidade eurocentrada atra-vés de uma multiplici-dade de respostas críti-cas descoloniais que par-tem das culturas e luga-res epistêmicos subalter-nos de povos coloniza-dos de todo mundo [...]a transmodernidade se-ria equivalente à ‘diver-salidade enquanto projetouniversal’, que é resultadodo “pensamento crítico defronteira” enquanto inter-venção epistêmica dos di-versos subalternos.

A Transmodernidade é um projetode sociedade ético-político, utó-pico, que eclode da fronteira, istoé, dos espaços-tempo que não fo-ram totalmente violentados, des-truídos ou desfigurados pela Mo-dernidade Eurocêntrica. Consisteem um projeto planetário que sefundamenta no diálogo e na soli-dariedade das populações oprimi-das, da América latina, da Ásia, daÁfrica, da Oceania e da Europa.

Por meio do esquema (Figura 3)a seguir, Dussel explica a afirma-ção da exterioridade, que possibi-lita a construção da transmoder-nidade.

Figura 03 - Esquema de Afirmação da Exterioridade de acordo com Enrique Dussel

Fonte: Dussel (2001)

O Esquema da Figura 03 repre-senta: a) “Pós-Modernidade” (é olimite da Modernidade e da Tota-lidade); b) Inclusão do Outro nomesmo (no sistema antigo); c) In-terpelação inovadora frente à Mo-dernidade; d) Subsunção do po-

sitivo da modernidade; e) Afir-mação do Outro em sua Exterio-ridade; f) Construção da “Trans”-modernidade inovadora (comosíntese de c+d+e).

Assim, a construção de epis-temologias, saberes e práticas

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educativas, de subjetividades eindagações filosóficas, em umaperspectiva transmoderna, signi-fica pensar e fazer a partir daexterioridade, ou seja, cultivarpráxis que vão além da totali-dade opressora eurocêntrica e“estadunidocêntrica” de produzirconhecimento, de promover ciên-cia, de fazer filosofia, de elaborarpedagogias, criar e recriar saberese possibilitar a emergência de ou-tras subjetividades.

Considerações Finais

Neste artigo o debate centra-se notema da modernidade, que en-volve duas concepções que se con-trapõem em termos de períodoshistóricos e de argumentações emtermos filosóficos e políticos.

A visão intraeuropeia é criti-cada por Dussel e intelectuais darede Modernidade/Colonialidadepelo eurocentrismo, que coloca aEuropa como centro da culturamundial em função de seu carátercivilizatório, e pelo discurso ex-cludente e irracional de violênciaconstruído pelo mito da moderni-dade, que nega as demais cultu-ras, criando uma linha abissal en-

tre as populações do Norte e as doSul. Estas na situação de periféri-cas.

O filósofo Enrique Dussel é umadas principais referências no de-bate sobre a modernidade, por-que desconstrói o discurso histó-rico hegeliano do nascimento damodernidade no período do ilu-minismo e defende a tese de quea modernidade surge, no períododo descobrimento da América, noprocesso de colonização europeia,no qual o outro é negado emseus saberes e cultura, sendo cons-truído um discurso de superiori-dade de uns (homem branco, cris-tão e com posses financeiras) e in-ferioridade de outros, pessoas vin-culadas a outras culturas, costu-mes, gênero, raça e religiões.

A visão moderna eurocêntrica,então, mantem a lógica do pen-samento colonial enquanto a con-cepção moderna planetária buscadesconstruir criticamente a men-talidade colonial, deslocando oolhar para o outro negado e ex-cluído, trazendo para debate odiscurso ético da diferença e daalteridade, sendo, portanto, enga-jado ética e politicamente com asclasses e culturas historicamentenegadas.

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