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O Brasil e o contencioso na OMC

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O Brasil na OMC

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  • ISBN 978-85-02-15076-8Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Soluo de controvrsias: O Brasil e o contenciosona OMC : tomo I / Maria Lcia LabateMantovanini Padua Lima,Barbara Rosenberg,coordenadoras. SoPaulo : Saraiva, 2009. (Srie GVlaw)Vrios autores.1. Comrcio internacional2. Contenciosos 3.Organizao Mundial doComrcio 4. Soluo

  • Comrcio 4. Soluopacfica de controvrsiasinternacionais 5.Subsdios I. Lima, MariaLcia Labate MantovaniniPadua. II. Rosenberg,Barbara. III. Srie.08-03747 CDD-382.92

    ndice para catlogo sistemtico:Soluo de controvrsias : Brasil e soluo de controvrsias na OMC :

    Comrcio internacional 382.92

    Diretor editorial Antonio Luiz de Toledo PintoDiretor editorial Luiz Roberto Curia

    Gerente de produo editorial Lgia AlvesEditora Manuella Santos de Castro

    Assistente editorial Aline Darcy Flr de SouzaAssistente de produo editorial Clarissa Boraschi Maria

    Preparao de originais Ana Cristina Garcia / Bernadete R. S. MaurcioArte e diagramao Cristina Aparecida Agudo de Freitas / Snia de Paiva

    LimaReviso de provas Rita de Cssia Queiroz Gorgati / Rita de Cassia S.

    PereiraServios editoriaisAna Paula Mazzoco / Carla Cristina Marques

  • Data de fechamento daedio: 25-8-2008

    Dvidas?Acesse www.saraivajur.com.br

    Nenhuma parte desta publicao poder ser reproduzida por qualquermeio ou forma sem a prvia autorizao da Editora Saraiva.

    A violao dos direitos autorais crime estabelecido na Lei n. 9.610/98e punido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

  • Aos alunos do GVlaw.

  • APRESENTAO

    A FGV formada por diferentes centros de ensino e pesquisa comum nico objetivo: ampliar as fronteiras do conhecimento, produzir etransmitir idias, dados e informaes, de modo a contribuir para odesenvolvimento socioeconmico do pas e sua insero no cenriointernacional.

    Fundada em 2002, a Escola de Direito de So Paulo privilegiou umprojeto diferenciado dos currculos tradicionais das faculdades de direito,com o intuito de ampliar as habilidades dos alunos para alm da tcnicajurdica. Trata-se de uma necessidade contempornea para atuar em ummundo globalizado, que exige novos servios e a interface de diversasdisciplinas na resoluo de problemas complexos.

    Para tanto, a Escola de Direito de So Paulo optou pela dedicao doprofessor e do aluno em tempo integral, pela grade curricularinterdisciplinar, pelas novas metodologias de ensino e pela nfase empesquisa e publicao. Essas so as propostas bsicas indispensveis formao de um profissional e de uma cincia jurdica altura dasdemandas contemporneas.

    No mbito do programa de ps-graduao lato sensu, o GVlaw,programa de especializao em Direito da Escola de Direito de So Paulo,tem por finalidade estender a metodologia e a proposta inovadora dagraduao para os profissionais j atuantes no mercado. Com pouco tempode existncia, a unidade j se impe no cenrio jurdico nacional atravs deduas dezenas de cursos de especializao, corporativos e de educaocontinuada. Com a presente Srie GVlaw, o programa espera difundir seumagistrio, conhecimento e suas conquistas.

    Todos os livros da srie so escritos por professores do GV law,profissionais de reconhecida competncia acadmica e prtica, o que tornapossvel atender s demandas do mercado, tendo como suporte slidafundamentao terica.

    O GVlaw espera, com essa iniciativa, oferecer a estudantes,advogados e demais profissionais interessados insumos que, agregados ssuas prticas, possam contribuir para sua especializao, atualizao ereflexo crtica.

    Leandro Silveira PereiraCoordenador do GVlaw

  • PREFCIO

    A Escola de Direito de So Paulo da Fundao Getulio Vargas(Direito GV) foi criada em 2002 com o objetivo de renovar o ensino doDireito no Brasil, formando profissionais que tenham tanto um slidoconhecimento do sistema jurdico brasileiro quanto uma viso abrangente dereas correlatas. A preocupao de inovar da Direito GV no se limita aocontedo; estende-se forma de transmisso desse conhecimento. Assim,tm sido desenvolvidas metodologias no usuais no ensino do Direito noBrasil, por exemplo o mtodo do caso, as simulaes e o role-playing. preciso salientar que a renovao do ensino do Direito no Brasil, perseguidapela Direito GV, tem um propsito maior que o de contribuir com odesenvolvimento brasileiro, seguindo, dessa forma, a tradio de mais demeio sculo da Fundao Getulio Vargas.

    Como parte dessa proposta da Direito GV pareceu-nos pertinenteque nossos alunos e o pblico em geral pudessem ter acesso anlise dosprincipais contenciosos do Brasil no rgo de Soluo de Controvrsias(OSC) da Organizao Mundial do Comrcio (OMC). Portanto, o sentido dapresente coletnea colaborar com esse projeto mais amplo da Direito GV,alm de promover um registro do esforo brasileiro de uma inserointernacional mais bem qualificada.

    Faz-se necessrio ressaltar que o Brasil, nos treze anos deexistncia do OSC, acumulou considervel experincia nesse importanteforo internacional. Basta mencionar que o pas participou como demandante,demandado e terceira parte em mais de 86 casos. Apesar de o Brasil aindater uma participao no muito expressiva no fluxo de comrciointernacional, do ponto de vista do uso do mecanismo de soluo decontrovrsias da OMC, ocupa a quarta posio dentre os pases membrosdessa organizao.

    Para se ter uma idia de como tem sido intensa essa utilizao,basta mencionar que os EUA, pilares do sistema multilateral de comrcio eprincipais participantes do OSC, tiveram no mesmo perodo 260 casos. Donosso ponto de vista, relatar e discutir os principais casos do contenciosobrasileiro nesses ltimos treze anos tem tambm o papel de resgatar parteda memria desse esforo coletivo de aprimorar a insero e oposicionamento do Brasil no sistema multilateral de comrcio.

    Na presente coletnea, consideramos imprescindvel fazer umregistro das observaes de alguns dos principais atores que conduziram aparticipao do Brasil no OSC no perodo em foco. Para tanto, pudemoscontar com a disponibilidade e generosidade de algumas das figuras

  • centrais desse processo, a saber, o Ministro Celso Amorim, o MinistroCelso Lafer, o Prof. Dr. Luiz Olavo Baptista, o Ministro Roberto Rodrigues eo Ministro Srgio Amaral.

    Na elaborao deste livro tivemos, desde o incio, a colaboraocrucial do Ministrio das Relaes Exteriores, especialmente doSubsecretrio-Geral para Assuntos Econmicos e Tecnolgicos RobertoCarvalho de Azevedo, figura central da participao do Brasil no contenciosodo OSC, e do Conselheiro Haroldo de Macedo Ribeiro, que dedicaram tempovalioso na escolha dos casos a serem analisados. Cabe tambm mencionaro estmulo de Vera Thorstensen, assessora econmica da missopermanente do Brasil em Genebra, para que esse projeto fosse levadoadiante. Posteriormente, com a contribuio fundamental do Prof. Dr.Umberto Celli Junior, pudemos avanar na estruturao deste trabalho.

    Contudo, sem a participao entusiasmada dos autores dos artigosdesta coletnea, essas idias iniciais jamais teriam tomado o formato finaldeste livro. Esses excelentes especialistas participaram ativamente emtodas as fases deste projeto, como: distribuio dos casos previamenteselecionados; consolidao de uma estrutura mnima de anlise; elaboraopropriamente dita dos artigos; e sucessivas revises dos textos.

    No menos importante foi a presena incansvel da mestranda IedaMiyuki Koshi Dias de Lima, que com sua organizao e pacincia tornoueste trabalho possvel. Os estagirios Flvia Donadelli, Joo Pedro Caleiro eMarilia Jimenez Zanona cumpriram seu papel dando a assistncia necessriapara que pudssemos levar adiante este projeto.

    O tamanho do desafio de realizar este livro foi compatvel comtodo o apoio institucional da Direito GV que tivemos desde o incio.Agradecemos o voto de confiana da Diretoria da Direito GV, em especialdo Prof. Dr. Ary Oswaldo de Mattos Filho, que com seu esprito pioneiro foio grande incentivador deste projeto. A coordenao do GVlaw acolheu comentusiasmo a proposta de execuo desta coletnea, como parte da srieGVlaw da Editora Saraiva, o que muito facilitou este trabalho.

    Optamos por organizar os casos de acordo com os principais temasde negociao na OMC, a saber: Agricultura, NAMA e Regras. Alm domais, tratou-se tambm da parte procedimental e de implementao dasdecises do OSC. Por sugesto dos editores e com o objetivo de facilitar aconsulta, dividimos esta publicao em dois tomos.

    No tomo I esto includos os depoimentos dos principais atoresdesse processo; as anlises sobre as questes procedimentais e os casosrelativos agricultura, bens no agrcolas, e meio ambiente. Por sua vez, otomo II traz os casos relacionados a regras; a discusso sobre a relaoentre a OMC e outras instituies multilaterais; a anlise sobre a

  • implementao das decises do OSC e uma sntese de todos os casos doBrasil no OSC at dezembro de 2007.

    Acreditamos que o esforo de todos os envolvidos neste livro possacontribuir, de alguma maneira, para o conhecimento e maior compreensoda participao do Brasil no OSC.

    Estamos seguras de que os resultados positivos obtidos pelo Brasilnesse foro internacional to relevante so decorrncia do trabalho coletivode brasileiros talentosos e dedicados ao desenvolvimento do pas.

    Maria Lcia L. M. Padua LimaBarbara Rosenberg

    Coordenadoras

  • SUMRIO

    ApresentaoPrefcioParte I

    1 O Brasil e o mecanismo de Soluo de Controvrsiasda OMC

    Roberto Carvalho de Azevedo e Haroldo de MacedoRibeiro

    1.1 Introduo1.2 Participao do Brasil

    2 Depoimentos dos principais atoresMaria Lcia L. M. Padua Lima (organizadora)

    2.1 Depoimento do Ministro Celso Amorim2.2 Depoimento do Ministro Celso Lafer2.3 Depoimento do Prof. Dr. Luiz Olavo

    Baptista2.4 Depoimento do Ministro Roberto

    Rodrigues2.5 Depoimento do Ministro Srgio Amaral

    3 O Programa de Formao da Misso do Brasil emGenebra

    Vera Thorstensen3.1 Histrico3.2 O programa de formao de jovens

    especialistas em OMC3.3 Os nmeros do programa3.4 Balano da experincia adquirida

    Parte II1 Revisitando o escopo e a funo do mecanismo de

    soluo de controvrsias da OMC: segurana e previsibilidade nosistema multilateral de comrcio Barbara Rosenberg

    1.1 Introduo1.2 Garras e dentes para o Sistema

    Multilateral de Comrcio: o sistema de soluo decontrovrsias da OMC

    1.2.1 A criao do mecanismo desoluo de controvrsias da OMC

  • 1.2.2 O adensamento jurdico doOSC: os procedimentos

    1.2.3 Algumas consideraessobre a jurisdio e competncia do OSC:revisitando o escopo e a funo do OSCno sistema multilateral de comrcio

    1.3 Consideraes finaisReferncias

    2 A Organizao Mundial do Comrcio e as regras dedireito intertemporal

    Carolina Saldanha2.1 Introduo e histrico do caso2.2 Marco regulatrio da controvrsia

    2.2.1 Do pleito relativo aos ArtigosI e II do GATT 1994

    2.2.2 Do pleito relativo ao ArtigoVI do GATT 1994

    2.2.3 Do pleito relativo ao Artigo32 do Acordo sobre Subsdios e MedidasCompensatrias

    2.2.4 Da aplicabilidade controvrsia do GATT 1994

    2.2.5 Do pleito relativo ao Acordosobre Agricultura da Rodada Uruguai

    2.2.6 Das decises transitrias doGATT 1947, do Cdigo de Subsdios eMedidas Compensatrias da RodadaTquio e do Acordo de Subsdios eMedidas Compensatrias da OMC

    2.2.7 Do princpio da no-retroatividade dos tratados

    2.2.8 Da interpretao literalversus objeto e propsito da OMC

    2.2.9 Da integrao eindivisibilidade do sistema da OMC

    2.2.10 Relacionamento entre oGATT 1994 e o ASMC

    2.2.11 Recomendao do OSC2.3 Principais contribuies para o sistema

  • brasileiro2.4 Concluses2.5 Principais precedentes mencionados nos

    relatrios do OSCReferncias

    3 A figura do amicus curiae na OMCRoberta Danelon Leonhardt e Maria Pia Bastos-Tigre

    3.1 Introduo3.2 Os amicus briefs e a jurisprudncia da

    OMC3.2.1 O caso European

    Communities Asbestos3.2.2 A posio brasileira

    3.3 O desafio do amicus curiae3.4 ConclusoReferncias

    4 Informaes confidenciais privadasMichelle Ratton Sanchez

    4.1 Introduo: confidencialidade e proteodas informaes do setor privado

    4.2 Os casos Embraer-Bombardier: oscontenciosos e os procedimentos especiais

    4.2.1 O contraditrio sobreprocedimentos especiais

    4.2.2 Procedimentos especiais4.3 A repercusso dos procedimentos

    adotados nos casos Embraer e Bombardier:controvrsias posteriores

    4.4 Propostas para reforma do ESC4.5 Consideraes finaisAnexo I Extratos dos artigos que dispem

    sobre confidencialidade e possibilidades de suaregulamentao

    Apndice I Linha do tempo dos casosEmbraer-Bom-bardier

    Apndice II Estrutura bsica deprocedimentos especiais para informaesconfidenciais do setor privado e da proposta dereforma do ESC

  • Referncias5 Solues mutuamente acordadas: identificao e

    seleo de controvrsias passveis de negociaoRoberto Kanitz

    5.1 Introduo5.2 Controvrsias brasileiras e solues

    mutuamente acordadas5.2.1 Comunidade Europia

    Medidas Relativas ao TratamentoDiferenciado e Favorvel do Caf Solvel(DS154) e Medidas Relativas ao CafSolvel (DS209)

    5.2.2 Estados Unidos Imposto deequalizao do Estado da Flrida sobre oSuco de Laranja (DS250)

    5.2.3 Brasil - Medidas referentes proteo patentria (DS199)

    5.2.4 Argentina Salvaguardastransitrias contra txteis (DS190)

    5.3 Solues mutuamente acordadas: regrase limitaes

    5.3.1 Processo de consultasobrigatrias

    5.3.2 Composio de interesses:critrios para a seleo de controvrsias

    5.3.2.1 Objeto dacontrovrsia

    5.3.2.2 Critrio legal5.3.2.3 Critrio poltico5.3.2.4 Critrio

    econmico5.3.2.5 Critrio cultural

    5.4 Solues negociadas: principais vantagens5.5 ConclusoAnexo I Demais casos com solues

    negociadasReferncias

    Parte III1 Agricultura e subsdios: o caso do algodo

  • (WT/DS267)Leandro Rocha de Arajo, Geraldo Valentim Neto,

    Leonardo Peres da Rocha e Silva e Ren Guilherme da SilvaMedrado

    1.1 Introduo1.2 Aspectos gerais do contencioso: mercado,

    posio do Brasil, peculiaridades da demanda1.3 Os programas de apoio agrcola dos EUA

    para o algodo1.3.1 Marketing Loan Programme

    (MLP)1.3.2 User Marketing (Step 2)

    Payments1.3.3 Production Flexibility

    Contract (PFC) Payments1.3.4 Market Loss Assistance

    (MLA) Payments1.3.5 Direct Payments (DP)1.3.6 Counter-cyclical Payments

    (CCP)1.3.7 Crop Insurance Payments

    (CIP)1.3.8 Cottonseed Payments1.3.9 General Sales Manager 102

    (GSM 102)1.3.10 General Sales Manager 103

    (GSM 103)1.3.11 Supplier Credit Guarantee

    Programme (SCGP)1.3.12 O reflexo dos programas de

    subsdios norte-americanos para o algodo1.4 Os principais argumentos e os mais

    importantes aspectos da deciso do OSC1.4.1 Aspectos processuais1.4.2 A Clusula de Paz1.4.3 Srios prejuzos aos

    interesses brasileiros: significativaconteno do aumento de preos

    1.4.4 A alegao de ameaa de

  • grave prejuzo1.4.5 A legalidade do programa

    Step 21.4.6 A legalidade dos programas

    de crdito exportao1.4.7 Os principais pontos da

    deciso, desenvolvimentos recentes eimpactos para a Rodada Doha

    1.5 Consideraes finaisReferncias

    2 O contencioso entre Brasil e Comunidades Europiassobre subsdios Ao acar (DS266)

    Christiane Aquino, Adriana Dantas e Cynthia Kramer2.1 Introduo2.2 O regime aucareiro europeu e seus

    efeitos2.2.1 Principais instrumentos2.2.2 Efeitos dos subsdios

    europeus2.2.2.1 Efeitos sobre os

    preos no mercadointernacional

    2.2.2.2 Efeitos sobre asexportaes de acar doBrasil

    2.2.2.3 Efeitos sobre aseconomias dos pases ACP

    2.3 O contencioso2.3.1 Sensibilidade poltica2.3.2 Principais demandas

    apresentadas pelo Brasil2.3.3 Alegaes das Comunidades

    Europias2.3.4 Relatrio do painel2.3.5 Recomendao final pelo

    rgo de Apelao2.4 A implementao da recomendao

    2.4.1 Prazo para implementao arbitragem

  • 2.4.1.1 Projeto dereforma do regime aucareiroeuropeu

    2.4.1.2Desdobramentos no mbito doOSC Acordo de sequencing

    2.4.2 A reforma do regimeaucareiro europeu vis--visrecomendaes do OSC

    2.4.3 O novo regime europeu doacar

    2.4.3.1 Controle deexportaes

    2.4.3.2 Controle doantigo acar Cremanescente

    2.4.3.3 Controle dasquantidades de acarextraquota reportadas (carried-forward)

    2.4.3.4 Retirada deacar do mercado

    2.4.3.5 Programa dereestruturao

    2.4.3.6 Estocagem doacar

    2.4.3.7 Compras deinterveno

    2.4.3.8 Apoio direto aoprodutor

    2.4.3.9 Controle depreos

    2.4.3.10 Taxa aoacar excedente

    2.4.4 Perspectivas quanto implementao da recomendao

    2.5 ConclusoReferncias

    3 O contencioso entre as Comunidades Europias e o

  • Brasil: Classificao aduaneira do frango desossado congelado(DS269)

    Antnio Garbelini Jnior3.1 Introduo3.2 O Caso WT/DS269: classificao

    aduaneira do frango desossado congelado3.3 ConclusoReferncias

    Parte IV

    1 Subsdios a bens industriaisRabih A. Nasser e Robson de Moura Fernandes

    1.1 Introduo1.2 Brasil Programa de financiamento s

    exportaes de aeronaves (WT/DS46)1.2.1 PROEX1.2.2 Questes principais

    1.3 Canad Medidas relativas sexportaes de aeronaves civis (WT/DS70)

    1.4 Canad Crditos de exportao egarantias de emprstimos para aeronaves regionais(WT/DS222)

    1.5 Proposta de reviso do ASMC1.6 ConclusesReferncias

    Parte V

    1 EUA padres para gasolina Reformulada econvencional

    Vera Sterman Kanas1.1 Introduo e importncia do caso1.2 Questes procedimentais1.3 Os fatos e as medidas questionadas

    1.3.1 O Clean Air Act de 1990 e oimpacto na criao de novas normas

    1.3.2 A medida questionada: aGasoline Rule

    1.3.3 A proposta de maio de 19941.4 Questes jurdicas

  • 1.4.1 Disposies da OMCalegadas pelas Partes

    1.4.2 Questes relacionadas violao de regras da OMC

    1.4.2.1 Artigo III doGATT

    1.4.2.1.1Artigo III:4 doGATT

    1.4.2.1.2Artigo III:1 doGATT

    1.4.2.2 Artigo I:1 doGATT

    1.4.2.3 ArtigoXXIII:1(b) do GATT

    1.4.2.4 Acordo TBT1.4.3 Questes relacionadas

    defesa: Artigo XX do GATT1.4.3.1 Natureza e

    metodologia de anlise doArtigo XX do GATT

    1.4.3.2 Artigo XX(b)1.4.3.2.1

    Adequao dapoltica

    1.4.3.2.2Necessidade

    1.4.3.3 Artigo XX(d)1.4.3.4 Artigo XX(g):

    painel e rgo de Apelao1.4.3.4.1

    Adequao dapoltica

    1.4.3.4.2Requisito de amedida serrelativa proteo do recursonatural

  • 1.4.3.4.3Requisito datomada de medidaem conjunto comrestries produo ouconsumo domstico

    1.4.3.5 O caput doArtigo XX

    1.4.3.5.1Objeto e funo docaput do Artigo XX

    1.4.3.5.2Mtodo de anlisedo caput do ArtigoXX do GATT

    1.4.3.6 Afirmao deque a OMC no est emisolamento clnico emrelao ao Direito InternacionalPblico

    1.5 Implementao da deciso do DSBReferncias

    2 Comunidade Europia medidas relativas ao amianto eprodutos que contm amianto (DS135)

    Vera Sterman Kanas2.1 Introduo e importncia do caso2.2 Questes procedimentais2.3 Os fatos e a medida questionada2.4 Questes jurdicas de ordem

    procedimental2.4.1 O recurso a experts2.4.2 Amicus curiae briefs

    2.4.2.1 Fase de painel2.4.2.2 Fase de

    apelao2.4.3 A participao ativa ou

    passiva de terceira parte2.4.4 Ordem de exame das

    reclamaes

  • 2.5 Questes jurdicas substantivas:disposies da OMC alegadas pelas Partes

    2.5.1 Aplicabilidade doAcordo TBT

    2.5.1.1 Fasede painel

    2.5.1.2 Fasede apelao

    2.5.2 Violao doArtigo III:4 do GATT: relaoentre os Artigos XI e III doGATT

    2.5.2.1Similaridade entreprodutos

    2.5.3 A defesa baseadano Artigo XX do GATT

    2.5.3.1Artigo XX(b) doGATT

    2.5.3.1.1Adequaodapoltica

    2.5.3.1.2Necessidadedamedida

    2.5.3.2 Ocaput do Artigo XXdo GATT

    2.5.3.2.1Discriminaoarbitrria ouinjustificada

    2.5.3.2.2Restriodisfaradaaocomrcio

  • 2.6 Consideraes finaisReferncias

    3 Comrcio Internacional e biotecnologia: ocaso EC Biotech

    Elaini Cristina Gonzaga da Silva, Rodrigo C. A.Lima e William Filgueiras

    3.1 Introduo3.2 Desenvolvimento da disputa3.3 Demanda europia por

    interpretao mais ampla das medidasquestionadas

    3.4 A deciso do painel sobre asmedidas questionadas

    3.5 Consideraes finais acerca docaso e da participao do Brasil

    Referncias

  • PARTE I

    1 O BRASIL E O MECANISMO DE SOLUO DE CONTROVRSIAS DA OMC

    Ministro Roberto Carvalho de Azevedo

    Subsecretrio-Geral para Assuntos Econmicos e Tecnolgicos.

    Conselheiro Haroldo de Macedo Ribeiro

    Assessor do Subsecretrio para Assuntos Econmicos e Tecnolgicos.

    1.1 Introduo

    Transcorridos quase treze anos da entrada em vigncia doEntendimento Relativo s Normas e Procedimentos sobre Soluo deControvrsias1 (ESC), em janeiro de 1995, j possvel reunir elementossuficientes para avaliar com preciso a relevncia desse instrumentojurdico para o sistema multilateral de comrcio. Ainda que se admita anecessidade de aperfeioar o mecanismo de soluo de controvrsias daOrganizao Mundial do Comrcio (OMC) em muitos aspectos, j amplo oreconhecimento de que o ESC constitui avano institucional de singularimportncia no campo das relaes internacionais.

    No parece haver espao para dvidas quanto s vantagens do

  • mecanismo de soluo de controvrsias da OMC em relao a seuantecessor da era GATT 2 (General Agreement on Tariffs and Trade ). Aadoo do chamado consenso reverso, segundo o qual decisesimportantes como o estabelecimento de painis ou a adoo de relatriosso automaticamente tomadas caso no se verifique a oposio do conjuntodos membros da OMC, trouxe maior previsibilidade ao sistema. A criaode uma instncia recursal, o rgo de Apelao, por sua vez, atribuiu maiorjuridicidade complexa tarefa de dirimir litgios comerciais entre Estadossoberanos. Por fim, a admisso do direito de suspender concesses eobrigaes na hiptese de descumprimento de suas decises ou seja, deretaliar conferiu ao sistema grau de atratividade e confiana que noencontra paralelo em outras cortes internacionais.

    O Brasil considera o mecanismo de soluo de controvrsias daOMC uma das principais realizaes da Rodada Uruguai do GATT. Alm dedar cumprimento a sua funo precpua de resolver conflitos comerciaisentre membros da OMC, o mecanismo de soluo de controvrsias revelou-se instrumento fundamental (i) na interpretao dos compromissosassumidos no mbito dos acordos que conformam o sistema multilateral decomrcio e (ii) na gerao de jurisprudncia que, na prtica, preenchelacunas e equaciona ambigidades que muitas vezes esto presentes nasdisciplinas multilaterais de comrcio.

    A possibilidade de obter esclarecimentos sobre o verdadeiro sentidode regras estabelecidas nos acordos da OMC pela via de deliberaes depainis e do rgo de Apelao configura certamente um dos principaisbenefcios oferecidos pelo mecanismo de soluo de controvrsias daorganizao. A jurisprudncia que se forma a partir das decises sobre osmais diversos assuntos confere previsibilidade e segurana jurdica saes que os membros venham a adotar com base nos referidos acordos.

    A jurisprudncia gerada pelo mecanismo de soluo decontrovrsias tem adicionalmente a capacidade de influenciar de maneiradecisiva as negociaes destinadas a alterar ou complementar o acervo dasdisciplinas multilaterais de comrcio j acordadas. Ao esclarecer o alcancedos acordos da OMC adotados ao final da Rodada Uruguai do GATT, porexemplo, o mecanismo de soluo de controvrsias oferece umacompreenso melhor a respeito dos direitos e deveres j contrados pelosmembros no passado e, assim, contribui para definir o que devem ser ospontos de partida para a negociao de novas disciplinas. Com base emdeliberaes do sistema de soluo de controvrsia da OMC, possvelevitar que os membros sejam chamados a negociar e a fazer concessesadicionais para obter direitos que na realidade j tenham sido obtidos nopassado.

    Outro aspecto relevante do papel exercido pelo mecanismo desoluo de controvrsias da OMC diz respeito s decises sobre temas queno esto disciplinados com clareza nos diversos acordos. A exemplo do

  • que ocorre no direito interno, as disciplinas multilaterais de comrcio nocobrem todo o universo de situaes que podem afetar o relacionamentocomercial entre os membros do sistema. Em caso de dvida sobre acobertura ou no de uma situao pela disciplina multilateral, compete aospainis e ao rgo de Apelao lanar mo dos instrumentos dehermenutica de que dispem para exercer suas funes e deliberar sobreos casos que lhes so submetidos. A medida da dificuldade de semelhantetarefa pode ser avaliada luz do teor do Artigo 3.2 do ESC, segundo o qualAs recomendaes e decises do rgo de Soluo de Controvrsias nopodero promover o aumento ou a diminuio de direitos e obrigaesdefinidos nos acordos abrangidos.

    Pode-se afirmar que, em certo sentido e a despeito do teor doArtigo 3.2 do ESC, as disciplinas multilaterais tm progredido muito maisrapidamente pela via da jurisprudncia do mecanismo de soluo decontrovrsias da Organizao do que por meio das negociaes entre osmembros. Nesse contexto, o papel desempenhado pelo rgo de Apelaotem sido especialmente relevante. O mecanismo de soluo decontrovrsias da OMC conta hoje com uma instituio em grau recursalconsolidada e eficiente, capaz de beneficiar o conjunto dos membros daorganizao, inclusive aqueles que nunca fizeram uso do mecanismo desoluo de controvrsias, por meio do aumento da previsibilidade e dasegurana jurdica que resulta de suas decises.

    1.2 Participao do Brasil

    Ao longo dos anos, o Brasil firmou-se como um dos principaisatores do sistema de soluo de controvrsias da OMC. Trata-se do pasem desenvolvimento que mais vezes participou de procedimentos desoluo de controvrsias ao amparo do ESC. Se considerados todos osmembros da OMC, o Brasil ocupa o quarto lugar dentre aqueles que maisvezes atuaram no mbito do sistema, aps os Estados Unidos, a UnioEuropia e o Canad.

    Apesar de responder por pouco mais de 1% do comrciointernacional de bens, o Brasil registra hoje participao comodemandante, demandado ou terceira parte interessada em cerca de 23%do total das controvrsias conduzidas ao amparo das regras do ESC. Essedado ilustra a relevncia da atuao brasileira no mecanismo de soluo decontrovrsias e a importncia que o pas atribui a esse sistema.

    A participao do Brasil no mecanismo de soluo de controvrsiasda OMC pauta-se, via de regra, pelo objetivo de suprimir barreiras entradade produtos brasileiros nos mercados de outros membros. No mais dasvezes, as barreiras comerciais surgem em setores em que as exportaes

  • brasileiras desfrutam de grande competitividade. Um dos alvospreferenciais tem sido o setor agrcola. Um primeiro grupo de entraves aocomrcio enfrentado por esse setor compreende medidas restritivas deacesso a mercados tais como a imposio de barreiras no-tarifrias(sanitrias, fitossanitrias ou barreiras tcnicas ao comrcio), aes dedefesa comercial (salvaguardas e direitos antidumping) ou, ainda, medidasque ocasionam desvio de comrcio em virtude de esquemas preferenciaiscontidos em acordos regionais de comrcio ou, por exemplo, em SistemasGerais de Preferncias (SGPs).

    A jurisprudncia do GATT e da OMC com relao a esse tipo demedidas cada vez mais rica e serve de precedente para vrias questesque envolvem interesses brasileiros. Alguns exemplos da participao doBrasil nesse tipo de disputa so os contenciosos a propsito de medidasantidumping sobre frangos com a Argentina, sobre graduao e regimedrogas no mbito do SGP europeu, sobre a taxa de equalizao aplicadapelos Estados Unidos ao suco de laranja e, mais recentemente, ocontencioso relativo reclassificao aduaneira de cortes de frango salgadopela Unio Europia e a arbitragem sobre o novo regime europeu parabananas.

    Um segundo conjunto de medidas que afetam interesses brasileirospoderia ser qualificado como de concorrncia desleal e incluiria, porexemplo, a concesso por pases desenvolvidos de subsdios exportaoou produo domstica, os quais conferem competitividade artificial aseus produtos nos mercados domsticos ou globais. A atuao do Brasil emcontenciosos como o do algodo, iniciado contra os Estados Unidos, ou doacar, iniciado conjuntamente com Austrlia e Tailndia contra a UnioEuropia, levou formao de importante jurisprudncia sobre a matria,limitadora de condutas violatrias regra multilateral por parte de certosmembros desenvolvidos da OMC.

    O resultado da participao do Brasil no mecanismo de soluo decontrovrsias da OMC tem sido bastante positivo. A anlise dos diversoscasos em que o Brasil atuou e que compe o cerne desta publicaoconstitui testemunho do desempenho exitoso do pas no sistema.Independentemente dos resultados alcanados, porm, a mera capacidadedemonstrada pelo Brasil de participar ativamente do referido mecanismo jconfigura, por si s, um grande benefcio. A imagem do pas melhora namedida em que o Brasil demonstra capacidade de reao quando seusdireitos so afetados. O compromisso do Brasil com o multilateralismo econtra o unilateralismo fica mais evidente quando o pas submete suasdisputas s regras do sistema multilateral.

    Acionar o mecanismo de soluo de controvrsias no apenas umexerccio de obter ou perder vantagens econmicas. Trata-seigualmente de mecanismo de presso poltica e de legitimao de direitos.As disputas levadas OMC colocam a descoberto comportamentosprotecionistas, violaes a compromissos assumidos no plano multilateral e

  • aplicao incorreta de acordos negociados livremente por pases soberanos.Em muitos casos, as controvrsias inspiram a reviso desses mesmosacordos ou ainda a discusso acerca da necessidade de preencher lacunasexistentes nas disciplinas multilaterais.

    O mecanismo de soluo de controvrsias deve ser acionado demaneira extremamente cuidadosa e responsvel, aps avaliao detidasobre aspectos tcnicos e polticos envolvidos na questo, bem como sobreos ganhos reais que podero ser alcanados pelo pas ao final docontencioso. Nem toda causa legtima uma boa causa. Se por um lado aparticipao do Brasil no mecanismo confere maior visibilidade ao sistemae amplia a confiana do setor privado e do prprio governo no seu usocomo instrumento efetivo de soluo de disputas comerciais e defortalecimento do sistema multilateral, por outro lado essa participaoenvolve riscos. O maior deles, naturalmente, o da derrota, que podesignificar no apenas deixar de atender aos interesses do setor privadoenvolvido, mas tambm estabelecer precedente muitas vezes danoso aoconjunto dos interesses do pas.

    Participar ativamente do mecanismo de soluo de controvrsias daOMC, porm, no constitui uma opo para o Brasil, mas uma necessidade,um imperativo. Por seus efeitos sistmicos, os resultados de algunscontenciosos podem ser extremamente prejudiciais ao pas. Assim, revela-se fundamental que o Brasil participe deles, sempre que possvel, com oobjetivo de opinar sobre aspectos de seu especial interesse sistmico,mesmo que a disputa concreta no envolva interesses comercias diretos dopas. Nessa mesma linha atuam membros como os Estados Unidos e aUnio Europia, que participam como terceiras partes interessadas nagrande maioria dos contenciosos, cientes da importncia e da necessidadede influenciar a formao da jurisprudncia multilateral.

    A participao ativa do Brasil no mecanismo de soluo decontrovrsias da OMC tem tambm o objetivo de assegurar que os painise o rgo de Apelao, ao interpretarem dispositivos dos acordosmultilaterais, levem em considerao a viso e as peculiaridades do mundoem desenvolvimento, o que no acontecer na hiptese em que oscontenciosos se mantenham circunscritos a partes oriundas do mundodesenvolvido.

    Para fazer frente aos desafios de atuar de forma ativa no mbitodo sistema de soluo de controvrsias da OMC, o Ministrio das RelaesExteriores criou, em outubro de 2001, a Coordenao-Geral de Contenciosos(CGC). A CGC foi criada com o objetivo de ser o ponto de convergncia dasaes do governo brasileiro, em geral, e do Itamaraty, em particular, nosassuntos relativos a contenciosos comerciais no mbito da OMC. O papelda CGC tem-se revelado desde ento de grande relevncia nos esforosempreendidos com vistas eliminao de entraves s exportaesbrasileiras e busca de definies e esclarecimentos sobre as regrasvigentes do sistema multilateral de comrcio.

  • No curso dos ltimos treze anos, e em especial desde a criao daCGC, o governo brasileiro tem tido xito no aprimoramento de seus canaisde dilogo com o setor privado nacional, com vistas a ampliar a utilizaodo mecanismo de soluo de controvrsias da OMC em defesa dosinteresses exportadores do pas. As controvrsias na OMC desenvolvem-se,de modo geral, em longa e complexa sucesso de etapas, as quaisenvolvem consultas, painis, apelao, adoo de relatrios, procedimentosde implementao, negociaes de compensao e retaliao3. O passoinicial do processo, ou seja, a identificao do potencial contencioso,depende em larga medida de participao eficiente do empresariadonacional, a quem incumbe, em primeiro lugar, a tarefa de chamar a atenodo governo para as dificuldades impostas por outros membros da OMC asua atuao empresarial.

    Para ser capaz de atuar com propriedade na defesa de seusinteresses comerciais, o empresariado nacional necessita familiarizar-secom as regras da OMC, o que pode ser feito por meio da contratao deassessoria jurdica e tcnica competente na matria. O estudo daparticipao do Brasil como parte demandante, parte demandada ou terceiraparte interessada em contenciosos da OMC constitui contribuioimportante para a formao de quadros no pas capazes de apoiar oempresariado nacional e o governo em suas disputas concernentes sdisciplinas multilaterais de comrcio. O conhecimento reunido na presenteobra, que seleciona e analisa alguns dos mais importantes contenciosos deque o Brasil tomou parte na OMC, certamente representa um passoimportante na formao desses quadros.

    1 Da sigla em ingls Dispute Settelment Understanding (DSU).2 Acordo Geral de Tarifas e Comrcio.3 Para informaes mais aprofundadas, ver Parte VIII, tomo II, deste livro.

  • 2 DEPOIMENTOS DOS PRINCIPAIS ATORES

    O objetivo de apresentar os depoimentos desses importantes atores foio de colher as impresses e observaes de quem tem participado

    ativamente no processo de utilizao do sistema de soluo decontrovrsias da OMC. Optou-se por trazer um depoimento informal

    com o intuito de poder captar as nuances e dvidas que sempreacompanham situaes desse tipo. Alm do mais, acredita-se que esse

    registro tem um carter histrico por ilustrar a evoluo institucionaldo sistema multilateral de comrcio bem como da crescente atuao

    do Brasil nessa organizao. Os depoimentos a seguir foram baseadosem entrevistas concedidas, e organizadas, a Maria Lcia Labate

    Mantovanini Padua Lima1 entre os meses de junho e agosto de 2007.

    2.1 Depoimento do Ministro Celso Amorim2

    Durante a Rodada Uruguai, havia certa ambigidade em relao criao de um sistema de soluo de controvrsias mais estruturado. Deum lado, estavam os pases ricos, que queriam colocar dentes nasnormas do que era ento o GATT e, tambm, incluir vrios novos temas nanegociao. De outro lado, os pases em desenvolvimento, que viam comdesconfiana a posio dos pases ricos e, particularmente, a alterao dosistema de soluo de controvrsias. Do meu ponto de vista, esse era umaspecto realmente importante por ser uma maneira de tornar as retaliaescrveis. Na realidade, o sistema de soluo de controvrsias existente napoca possibilitava que mesmo um pas apenas pudesse vetar umprocedimento, ainda que fosse o pas demandado. At o Brasil j tinha sidoprejudicado em funo dessa possibilidade. Dou um exemplo que me ocorre:uma demanda do setor caladista brasileiro contra um direitocompensatrio norte-americano, que no teve prosseguimento emdecorrncia dessa prerrogativa de suspenso do procedimento com o vetode apenas um pas.

    Assim, nunca conseguamos fazer aprovar no Conselho do GATTnossas demandas, pois bastava um pas vetar. E, naturalmente, o pasdemandado sempre vetava. De qualquer forma, a reformulao do sistemade soluo de controvrsias fazia parte do conjunto de propostas dos pasesdesenvolvidos na Rodada Uruguai, o que suscitava um receio natural dospases em desenvolvimento.

    Em relao posio do Brasil sobre a reformulao do sistema desoluo de controvrsias na Rodada Uruguai, gostaria de ressaltar doisaspectos. Por um lado, foi percebida uma oportunidade derivada da criao

  • do rgo de Soluo de Controvrsias, qual seja, a possibilidade de barrarou, pelo menos, limitar o unilateralismo, principalmente dos pasesdesenvolvidos. Hoje est muito claro que as regras do rgo de Soluo deControvrsias inibem o comportamento unilateral. Mas quero ressaltar que,na ocasio, j havamos percebido essa vantagem, ainda que ela estivessecolocada de maneira indireta.

    Na dcada de 80, vimos como o Brasil foi ameaado, chegandomesmo a sofrer retaliaes, como nos casos da informtica e das patentesfarmacuticas, o que nos obrigava a agir praticamente sob coao.

    Por outro lado, havia um preo a pagar, que era a proposta deserem criados dentes em relao a alguns pontos que podiam nointeressar ao Brasil. A grande vantagem, porm, era que esse processoocorreria em um sistema multilateral, que tem mais transparncia e mais equilibrado. Na prtica, as questes relativas defesa comercialacabavam ficando sujeitas ao arbtrio dos pases, ou seja, eram resolvidasunilateralmente. Por essa razo, houve muito empenho do Brasil nadiscusso do novo mecanismo de soluo de controvrsias, proposto naRodada Uruguai.

    No perodo entre o surgimento do Documento Dunkel3 em 1991 e aconcluso da Rodada, lutamos com muito empenho para que fosse criado orgo de Soluo de Controvrsias. Eu estava em Genebra4 quando surgiu oDocumento Dunkel e, quando da concluso da Rodada5, era Ministro6 doItamar Franco7. Portanto, durante todo esse perodo, estive bastanteenvolvido com a questo. Alcides Prates8, nosso atual Embaixador noVietn, cuidava especificamente desse tema e colaborou muito com oesforo do Brasil de criar o rgo de Soluo de Controvrsias. Tnhamos apercepo de que era uma oportunidade, uma possibilidade de criar umaorganizao multilateral mais slida. Gostaria tambm de citar, entreoutras pessoas, o Embaixador Paulo Nogueira Batista9 e o EmbaixadorRubens Ricupero10, que partilhavam dessa convico de que se tratava deuma oportunidade importante para o Brasil.

    Portanto, a idia da criao do rgo de Soluo de Controvrsias,se nasceu com objetivo mais limitado e que atendia mais aos interessesdos pases ricos, acabou tendo o papel relevante de permitir odesenvolvimento do aspecto multilateral na soluo de disputas e, portanto,de reforar a nova Organizao Mundial do Comrcio. Os EUA resistirammuito a uma instituio multilateral de comrcio. importante lembrar queo prprio GATT era parte de um acordo mais amplo11 Organizao doComrcio e Emprego, cuja essncia refletia as preocupaes de Keynes12 que no foi aprovado pelo Congresso norte-americano. Quero ressaltar quea criao do OSC era um aspecto importante na constituio da OMC, ens trabalhamos muito nesse sentido. Juntamos, inclusive, nossos esforos

  • aos dos europeus e, por essa razo, trabalhamos muito com a Delegaodas Comunidades Europias, cujo chefe na poca era um Embaixador deorigem vietnamita13. Acredito que o fato de o Tran Van Thinh ser originriode um pas menos desenvolvido facilitou bastante nossos entendimentos.

    Um aspecto que nos preocupava muito os dentes jmencionados era a chamada retaliao cruzada. Era uma possibilidade queveio efetivamente a ser utilizada. Diria at que, em parte, em favor dospases em desenvolvimento ou, pelo menos, de maneira mais equilibrada doque se imaginava.

    Havia um grande temor em razo de como os dentes haviamsido pensados de que um rgo de soluo de controvrsias, queabarcasse os trs principais acordos (o novo GATT, o Acordo de Servios 14

    e o Acordo de Propriedade Intelectual15), com as caractersticas quetivesse, significava um alto risco para os pases em desenvolvimento. preciso dizer que o desenho do que viria a ser a OMC, em geral, e o OSC,em particular, s se consolidou na fase final da Rodada. Em 1991, quandocheguei a Genebra, falava-se de uma concepo geral sobre a criao doOSC, ou seja, de maneira ainda pouco especfica. Portanto, a criao de umrgo de Soluo de Controvrsias, que abarcasse aquelas trs vertentes,era muito temida pelos pases em desenvolvimento. Deve-se acrescentarque a idia da retaliao cruzada foi introduzida pelos pases ricos,sobretudo pelos EUA. Penso que o objetivo no era tanto estabelecerpunies para o comrcio de bens, mas, sobretudo, para violaes empropriedade intelectual e servios. Os pases ricos, e volto a insistir,principalmente os EUA, consideravam que, dado o fato de os pases emdesenvolvimento no serem produtores importantes de patentes, casohouvesse uma violao na rea de patentes, a retaliao mais adequadaseria em bens.

    Havia, assim, essa preocupao por parte de muitos pases emdesenvolvimento, inclusive o Brasil, em relao possibilidade deretaliaes cruzadas. Em 1991, pouco antes da apresentao do DocumentoDunkel, ocorreu uma reunio na misso dos EUA, da qual participaram osEUA, obviamente, as Comunidades Europias (CE), a ndia e o Brasil, paradiscutir a questo da retaliao cruzada, sem ainda haver certeza se aOMC viria a ser concretizada. Estava claro que o objetivo era criar dentes,mas duas impresses digitais viriam a ser incorporadas: uma da ndia eoutra do Brasil.

    A colaborao da ndia foi, principalmente, a adio de umasalvaguarda para que a retaliao cruzada no fosse usada imediatamente,quer dizer, sem antes serem esgotados todos os outros meios para ver adeciso implementada dentro do prprio acordo. Assim, se o problemafosse em bens, seriam primeiro tentados os meios existentes no acordopara bens, de modo a obrigar a implementao da deciso. Caso no fossepossvel fazer cumprir a deciso, seria utilizada a retaliao prevista no

  • mesmo acordo. Apenas se nem com o uso dessa retaliao resultasse aimplementao da deciso que se passaria para outro campo. Aimpresso digital da ndia foi essa: assegurar que as etapas seriamseguidas, para evitar que se passasse muito rapidamente para umaretaliao cruzada. A retaliao cruzada seria uma espcie de recursoextremo. Dessa maneira, como a prpria retaliao j era pensada comosendo um derradeiro recurso, a retaliao cruzada seria deixada como umrecurso in extremis.

    A impresso digital do Brasil acabou sendo outra: quando nsverificamos ser inevitvel que houvesse a retaliao cruzada, fizemos umaproposta que surpreendeu a muitos, inclusive ao prprio indiano. A posiopor mim defendida foi a seguinte: se a retaliao cruzada iria funcionar deservios ou propriedade intelectual para bens, deveria tambm funcionar debens para servios ou propriedade intelectual. Ou seja, deveria haver umareciprocidade no processo de retaliao cruzada. Criou-se uma situaocuriosa: EUA e CE no tinham como rejeitar. E foi essa a posio que ficouno Documento e fez parte do acordo final.

    O mais curioso o seguinte: a primeira vez que uma retaliaocruzada foi autorizada na OMC foi justamente no caso das bananas doEquador contra as Comunidades Europias16. O Equador pediu para retaliarem propriedade intelectual. Argumentava que, se retaliasse em bens,estaria causando prejuzo a seu prprio pas. Ou seja, estaria dificultando ouimpedindo a compra, por exemplo, de bens de capital e outros produtos deque o pas necessitava.

    Considero importante tecer esses comentrios porque o Brasil teveuma atuao relevante na Rodada Uruguai na constituio tanto da novainstituio multilateral, em geral, quanto do rgo de Soluo deControvrsias, em particular, com o objetivo principalmente de substituir asretaliaes unilaterais. Se for feita uma leitura atenta do acordo sobre orgo de Soluo de Controvrsias17, h um pargrafo que garante a no-utilizao de retaliaes unilaterais por parte dos pases signatrios. verdade que o texto foi redigido em uma linguagem no muito clara, ouseja, o princpio foi colocado de forma meio indireta para que os EUApudessem aceitar. O fato que o compromisso tem sido seguido. Desdeento, ao que me consta, no houve nenhum caso ou, pelo menos, nenhumcaso importante de retaliao unilateral.

    O Brasil teve esse papel respeitvel de reforar o multilateralismocontra o unilateralismo como garantia de um maior equilbrio, mesmo coma introduo da novidade das retaliaes cruzadas. A interpretaobrasileira da retaliao cruzada passou a fazer parte do Documento Dunkel,e no saiu mais. Uma idia simples mas crucial, para a manuteno doequilbrio entre os pases-membros desenvolvidos e os menosdesenvolvidos.

  • Desde o incio do OSC, o Brasil tem sido muito ativo na utilizaodesse novo mecanismo para soluo de disputas, o que vem tendo impactomuito grande nas atuais negociaes da Rodada Doha. Digo isso baseadono apenas na minha prpria avaliao, mas tambm tomando como base aposio de altos funcionrios norte-americanos, at mesmo o Secretrio deAgricultura18, que defende a necessidade de concluir a Rodada e, inclusive,fazer algumas concesses na parte de subsdios. Os representantes doGoverno norte-americano referem-se sempre necessidade de diminuir oscontenciosos e entendem que o final da Rodada Doha poderia atender aesse objetivo.

    Obviamente o caso mais notvel que os EUA perderam foi o doalgodo19. O caso do algodo importante no apenas economicamente ecomo precedente dentro da OMC, mas tambm pela imensa repercusso naopinio pblica norte-americana. Os subsdios beneficiam uma camadanfima da populao norte-americana, a qual tem lobbies poderosos masprejudicam muitos consumidores, que so tambm contribuintes. Ou seja,os subsdios derivam de uma parte da arrecadao tributria, que utilizada para o favorecimento de poucos. Assim, quando saiu o primeiroresultado do painel do algodo, jornais importantes, como The New YorkTimes20 e Los Angeles Times21, notaram o alto significado da deciso daOMC. O primeiro deles chegou a afirmar, em editorial, que se sabia, atento, que os subsdios eram imorais; com a deciso, passava-se a saberque eram tambm ilegais.

    O custo poltico para o Governo norte-americano de manter essessubsdios ficou muito grande. Embora isso no nos d uma seguranaabsoluta em relao mudana de posio dos EUA, no tenho a menordvida de que o caso do algodo contribuiu para a atitude norte-americanatornar-se mais aberta idia da reduo dos subsdios. No incio da RodadaDoha, parecia ser impossvel que houvesse essa mudana. O forte impactonegativo na opinio pblica tem sido um argumento sempre usado peloUSTR22 em relao ao prprio Congresso norte-americano.

    Em relao ao caso do acar, considero que foi tambm muitoimportante para a questo dos subsdios exportao. Conseguimosdemonstrar que, mesmo com as regras atuais da OMC, os subsdiosconcedidos no se sustentavam do ponto de vista jurdico, o que abriu umatrilha para outros casos. H vrios produtos em situao semelhante, comoa soja, o arroz e o algodo.

    De modo geral, diria que o caso do algodo foi til para colocar ofoco nos subsdios internos, que causam distoro ao comrcio. Por outrolado, o caso do acar tratou dos subsdios exportao, demonstrando serpossvel, mesmo dentro das regras atuais, defender-se das prticasdesleais de comrcio nessa rea. Os dois casos mostraram que pode ser

  • prefervel aos pases desenvolvidos assumir compromissos mais claros deeliminao dos subsdios do que continuar a sofrer esses processosdesgastantes.

    Considero, assim, que os contenciosos tiveram um papel importanteno andamento da atual Rodada de negociaes. Lembro-me de que, emCancun23, a questo da eliminao dos subsdios exportao no estavacolocada de maneira clara. Muitos achavam, inclusive, que o acar seriaum dos produtos que a Unio Europia procuraria incluir em uma lista deexcees. O desdobramento do caso entre o Brasil e a UE tornou invivelessa possvel pretenso europia.

    Em relao a resultados concretos para os setores especficos,devo lembrar que a justia tem seu tempo, tanto no plano nacional quantono internacional. essa a sua natureza. Mesmo assim, voltando ao caso daUnio Europia em relao ao acar, j houve uma mudana bastante clarados programas europeus, que apontam para uma direo que parecesatisfatria para o Brasil. Nesse caso, consideramos que, pelo menos nomomento, no h necessidade de pedir novo painel para implementao. Jno caso do algodo, o resultado menos positivo: o Governo norte-americano eliminou os subsdios exportao ligados ao algodo, mas noeliminou os subsdios internos, que foram considerados causadores dedistoro. Por essa razo, o Brasil solicitou a abertura de um Painel deImplementao24.

    Mesmo com dificuldades na implementao dos resultados doscontenciosos, ocorreu um efeito positivo, como j comentei, na prpriaatitude dos pases demandados, o que trar benefcios indiscutveis para oBrasil. No tenho a menor dvida de que vamos concluir a Rodada Doha,talvez no alcanando os objetivos ideais, mas com data certa para aeliminao dos subsdios exportao certa e prxima. Vamos, tambm,terminar essa Rodada com os subsdios internos em um nvel muito inferiorao que tem sido praticado e permitido.

    Reitero que os contenciosos tm trazido benefcios concretos. Havanos. s vezes, no exatamente como se tinha imaginado, masmelhoras ocorrem. Cito mais um exemplo: o caso dos produtossiderrgicos e a Emenda Byrd da lei antidumping norte-americana25. Adeciso da OMC26, autorizando oito parceiros comerciais a impor sanesaos EUA, levou a uma alterao na legislao norte-americana. Estamosacompanhando o assunto para ver se, de fato, ocorrer o ajuste necessrio.

    Mesmo no rumoroso e to moroso caso Embraer-Bombardier, seno nos tivssemos aparelhado, estaramos hoje em uma situao muitodifcil. Quando cheguei a Genebra27, esse jogo j vinha se desenvolvendo:diria que o primeiro tempo terminou, j aps a minha chegada, com umresultado de 4 a 1 para a Bombardier. Mas, no segundo tempo, fizemos 3gols e empatamos a partida. Resumidamente, houve um gentlemens

  • agreement, dando aos dois pases autorizao para retaliar. Sabe-se queningum retaliou. Mas, como resultado positivo desse longo processo, oBrasil est sendo convidado para conversar sobre um novo acordo emrelao a aeronaves no mbito da OCDE28.

    O que gostaria de enfatizar que no h nada de retrico ouespalhafatoso na posio brasileira em relao utilizao do mecanismode soluo de controvrsias da OMC. Temos entrado nos casos queconsideramos adequado ingressar com demandas, mantendo sempre umaatitude consistente ao longo do tempo. A propsito, reconheo o mrito doGoverno anterior. Por exemplo, nos dois casos mais importantes, o doacar e o do algodo, o incio, ou seja, a fase de consultas, deu-se noGoverno anterior. Mas a deciso de abrir o Panel nesses dois casos foitomada no Governo atual. Devo salientar que havia certa hesitao quanto deciso de se abrir esses painis: alguns temiam que, se abrssemosprocessos contra os EUA e a Unio Europia simultaneamente, teramosuma repercusso negativa nas negociaes da Rodada. Na realidade,tomadas as decises de abertura dos painis do acar e do algodo,ocorreu exatamente o oposto, como j mencionei.

    Cabe fazer um comentrio a respeito da dinmicaintragovernamental, que, do meu ponto de vista, tem em geral funcionadobem. No senti nenhum problema ao longo desse perodo, em relao aoscontenciosos na OMC. Diria que a tendncia natural seria o Itamaraty sermais cauteloso, uma vez que no est defendendo nenhum setor especfico,mas, sim, vendo o conjunto das relaes com o exterior. Quando daabertura dos painis nos casos do acar e do algodo o Itamaraty tevetodo o apoio de que precisava tanto da CAMEX29 quanto do Ministrio daAgricultura. No houve nenhuma dificuldade. Ocorreram discussestcnicas, com posies nem sempre convergentes, mas prevaleceu oobjetivo de defesa dos interesses brasileiros.

    Penso que o contencioso um recurso disponvel, que todos sabempode ser usado. Evidentemente, o ideal que as pendncias se resolvamsem a necessidade de sua utilizao. Considero que nosso maior esforo,na atual Rodada, conseguir um resultado que permita a reduo dasdemandas, at porque o contencioso lento e caro. Muitas vezes se iniciaum processo com o setor interessado apoiando financeiramente, mas,depois de algum tempo, o Governo acaba tendo de levar o caso sozinho. Emsuma, o contencioso uma arma para poder negociar, mas tem seu custo.Por outro lado, temos tambm que seguir as regras internacionais, sob penade sofrermos processos. O Brasil j foi demandado em vrios casos. Aposio deve ser de muita cautela. o que sempre tenho conversado com

  • meus colegas de outros Ministrios. Penso que s se deve entrar com umademanda no OSC se houver uma razovel chance de ganhar.

    No incio do caso do algodo, quando eu era ainda Embaixador emGenebra, um grande economista me procurou30, para dizer que se tratavade uma causa justa. Na ocasio, disse a ele que, alm de ter uma causajusta, era necessrio que tivesse uma causa no sentido jurdico do termo,que se pudesse ganhar na OMC. Para tanto, era preciso consultar advogadosespecializados no assunto. Caso esses advogados considerassem possvelganhar, deveria ir em frente. Do contrrio, mesmo sendo justo, no seriaprudente acionar os mecanismos da OMC.

    Cabe mencionar que o Brasil fez um extraordinrio trabalho tcnicono caso Embraer-Bombardier, que muito contribuiu para os sucessosposteriores que o pas obteve junto ao OSC. preciso ter em conta que aOMC est muito baseada no Direito anglo-saxo, a chamada Commom Law.Por essa razo, dada grande importncia aos precedentes relacionadoscom as vrias questes. H um espao bastante expressivo para ainterpretao das normas. Nesse caso da Embraer, conseguimos mostrarcomo as regras, ou uma certa interpretao que se dava s regras porqueas regras sempre permitem mais do que uma interpretao , beneficiavamos pases mais ricos. E foi uma batalha que se travou tanto no foroestritamente judicial, ou seja, no OSC, como tambm em outros forosdentro da prpria OMC.

    Deliberadamente, fizemos questo de mostrar que, no casoEmbraer-Bombardier, tratava-se de uma empresa de um pas emdesenvolvimento, que tinha podido competir e desafiar uma empresa de umpas rico em uma rea de alta tecnologia. As regras estabelecidas eram detal ordem que o apoio que um pas como o Brasil podia dar empresabrasileira era proibido, mas todo o apoio que um pas rico como o Canadoferecia a sua empresa era permitido ou, pelo menos, assim erainterpretado. Acredito, mas nunca poderei ter certeza, que a relativapolitizao que se estabeleceu nesse caso contribuiu para o resultado obtidopelo Brasil.

    Finalmente, gostaria de comentar as perspectivas que se abrempara o Brasil com a bioenergia e eventuais acordos de cooperao tantocom os EUA quanto com a UE. Considero que a principal tarefa a curtoprazo transformar o etanol o biodiesel tambm, mas o etanol j estmais maduro em uma commodity energtica. fazer com que o etanolseja mais visto como um ingrediente do processo produtivo do que oresultado de uma produo agrcola. Da mesma forma que a maior partedos pases no impe uma tarifa de importao para o petrleo, nodiscriminando o petrleo estrangeiro porque isso afetaria todo o processo

  • produtivo, no deveria ser cobrada tarifa para importao de etanol ouqualquer outro biocombustvel.

    Acredito que o grande avano, que de certa maneira j estcolocado, seria a criao de um frum mundial do biocombustveis com aparticipao dos EUA e da Unio Europia. essa a concepo maisadequada: o etanol e outros biocombustveis so fontes de energia e,portanto, devem ter um comrcio livre. Esse seria o grande ganho. Temosde trabalhar no sentido da normatizao dos biocombustveis com umadefinio comum e clara desses produtos.

    Nessa rea, cabe ao Brasil continuar avanando. No podemosdormir nos louros porque novas tecnologias viro, sobretudo quando ospases ricos comearem a investir pesadamente. Alis, essa mais umarazo para estarmos aliados a esses pases, garantindo mais recursos parainvestir no etanol e em outros biocombustveis.

    Diria que h possibilidade concreta de desenvolver uma cooperaotriangular entre o Brasil, pases ricos e outros pases menos desenvolvidos.Veja, por exemplo, o caso dos investimentos brasileiros na Jamaica emusinas de desidratao de lcool para venda no mercado norte-americano. importante o Brasil passar a produzir em outros lugares para poder atender demanda mundial de biocombustveis, que dever crescer muito nosprximos anos. Isso tambm ajudar a consolidar nossa estratgia decooperao Sul-Sul.

    Esse processo ainda est muito no incio, mas temos realizadoseminrios sobre a questo do biocombustvel com a Unio Africana, comos pases da Amrica Central e do Caribe, e outros. H tambm grandeinteresse de pases como a Itlia, que quer colaborar conosco em Angola; aInglaterra, que deseja cooperar na frica do Sul e em Moambique, e assimpor diante. Isso no deixa de ser curioso: h quinze anos, quandocomeamos a levantar a idia de cooperao tcnica triangular no sSul-Sul, mas envolvendo o Brasil, um pas rico e pases pobres , haviacerta desconfiana. No entanto, somos hoje procurados para desenvolveriniciativas dessa natureza. Nos ltimos tempos, nenhuma das altasautoridades de pases desenvolvidos que recebi deixou de levantar apossibilidade de implementarmos projetos de cooperao triangular.

    Acredito que esse interesse no seja devido apenas nossa longaexperincia com a utilizao do etanol, ainda que isso seja, certamente, umelemento importante. Deve-se, tambm, maior presena brasileira empases menos desenvolvidos, na frica e em outras regies do mundo, queganhou grande impulso no Governo atual.

    2.2 Depoimento do Ministro Celso Lafer31

  • Vou abordar o tema proposto, qual seja, da relevncia do rgo deSoluo de Controvrsias (OSC) da Organizao Mundial do Comrcio(OMC) a partir da perspectiva de minha experincia pessoal. Como se sabe,fui o primeiro embaixador do Brasil32, em Genebra, indicado pelo PresidenteFernando Henrique Cardoso33, a ter contato direto com uma novaorganizao, ou seja, quando cheguei em Genebra, j no existia o GATT,mas sim a OMC. Portanto, presenciei o incio da OMC, os quatro primeirosanos dessa organizao e, conseqentemente, o incio do funcionamento doSistema de Soluo de Controvrsias.

    Penso que cabe, antes de tudo, fazer uma observao sobre aminha prpria experincia pessoal: no sou, como se sabe, um diplomata decarreira. Venho da vida acadmica e da vida empresarial. Na minhaexperincia acadmica, um dos temas a que sempre me dediquei foi o doDireito Internacional Econmico; por essa razo, quando de minhanomeao j tinha vrios trabalhos sobre essa rea do Direito. Assim, haviaescrito sobre o GATT e a Clusula de Nao mais Favorecida; sobre oGATT luz do que foi a Rodada Tquio; minha tese de livre-docncia tratoudo convnio internacional do caf e discutiu a reciprocidade na criao e naaplicao das normas de Direito Internacional Econmico.

    Dessa forma, minha experincia acadmica, felizmente, foi muitoimportante quando assumi as funes na Misso do Brasil em Genebranaquele momento: ou seja, do ponto de vista terico, e do ponto de vista dainformao e da reflexo, fui para Genebra com um conhecimento prviosignificativo do que era o GATT, do que eram os modelos internacionais dedisciplina do comrcio internacional. Por outro lado, havia tido antes de irpara Genebra uma experincia empresarial bastante relevante. Fiz parte docorpo diretivo da Metal Leve34 durante muitos anos, e, portanto, tinhatambm a experincia de quem lidou com a prtica do comrcio exterior:como que se exporta, quais so as dificuldades, o que so as barreirastcnicas exportao, o que significa tarifa, o que significam barreiras no-tarifrias.

    Nunca havia imaginado ser o embaixador do Brasil em Genebra.Quem sugeriu, e teve essa iniciativa, foi o Presidente Fernando Henrique, demaneira que, no sendo um projeto, acabou sendo uma coincidncia muitointeressante, para a qual estava, vamos dizer assim, aparelhado.

    Por conta desse meu interesse prvio minha ida a Genebra,acompanhei, como todos aqueles que se interessavam pelo assunto, asdiversas fases da Rodada Uruguai: os problemas, as dificuldades, desde seuincio em Punta Del Leste35. A introduo de assuntos antes nopreviamente disciplinados pelo GATT, com medidas consideradas maisintrusivas, chamou minha ateno de forma particular. Na Rodada Uruguai,o GATT saiu de sua atuao tradicional processos de reduo de tarifas

  • para lidar ratione materiae com uma srie de assuntos que antes no eramdisciplinados, ou eram disciplinados la carte, como foram na RodadaTquio. Os assuntos disciplinados ad hoc compuseram os acordosplurilaterais, o que levou um autor a dizer que o GATT da Rodada Tquioera um GATT la carte. Assim, os acordos plurilaterais valiam apenas paraos pases signatrios, o que dava uma dimenso distinta dentro do GATTentre os pases-membros, isto , entre os pases signatrios e os que nohaviam assinado os acordos plurilaterais.

    Na Rodada Uruguai, sem dvida nenhuma, dentro da perspectivabrasileira, um dos assuntos mais importantes era o tema da agricultura.Um tema clssico, porque o que se tinha obtido em matria dedesagravao tarifria na rea industrial at ento carecia de algumacompensao na rea da agricultura.

    Um dos fatos novos que viabilizaram a Rodada Uruguai foi o Grupod e Cairns36, ou seja, aquele conjunto de pases desenvolvidos e emdesenvolvimento, que tinha interesse na liberalizao agrcola e queintroduziu um componente novo no processo negociador. Alm disso, haviado lado brasileiro, luz da experincia brasileira com o unilateralismo doTrade Act 37 norte-americano, uma grande preocupao com a forma deatuao dos EUA que nos afetou em diversos momentos e que, enfim,penalizou setores por conta de uma determinao unilateral dos EUA. Porexemplo, o papel, em determinado momento.

    Portanto, a idia de um Sistema de Soluo de Controvrsias laworiented, como acabou sendo contemplada na Rodada Uruguai, era tambmum interesse nosso. Estava ligado tradicional viso brasileira de que,enfim, melhor um sistema multilateral regido por normas do que umsistema em que essas normas fossem frgeis.

    Na negociao da Rodada Uruguai, o Brasil tinha uma grandeexperincia em matria de GATT. Como se sabe, o Brasil partecontratante originria do GATT e, portanto, tinha uma grande experincianessa matria. Alm do mais, o pas sempre teve, vamos dizer assim,embaixadores de qualidade que souberam, enfim, conduzir bem osinteresses do Brasil na rea.

    Um dos mais notveis embaixadores brasileiros que passaram peloGATT foi o Embaixador George Maciel 38, que ficou por mais de dez anos,era um grande conhecedor do GATT, muito respeitado, e teve uma atuaobastante importante. Outros embaixadores que participaram da negociaoda Rodada Uruguai, com distintas vises, foram muito relevantes tambm.Entre eles, destaco: o Embaixador Paulo Nogueira Batista39, que tinha umaviso mais defensiva nessa matria; o Embaixador Ricupero40, que foi umembaixador muito atuante na Rodada Uruguai e escreveu a respeito de

  • maneira muito interessante; e o Embaixador Lampreia41, que foi quem, dolado brasileiro, fechou as negociaes na primeira gesto do EmbaixadorCelso Amorim42 como Ministro das Relaes Exteriores, que, por sua vez,tinha sido embaixador em Genebra.

    O conjunto de acordos da Rodada Uruguai muito expressivo. Odomnio tcnico das suas diversas caractersticas no uma coisa simples,justamente porque, ao contrrio do GATT, ele agregou muitos temas, porexemplo: o GATS, o Acordo de TRIMs 43 e o Acordo de TRIPs. De maneiraque se tratava de um mundo novo.

    Considero que o Brasil, entre os pases mdios em desenvolvimentoque celebraram e aprovaram a Rodada Uruguai, era um dos que estavambastante informados sobre o que significava aquilo tudo. Mas, naturalmente,ns, como muitos outros, no podamos antecipar todos os desdobramentosque viriam a ocorrer aps a concluso da Rodada Uruguai e a criao daOMC.

    Uma das caractersticas da OMC a noo do single undertaking. Osingle undertaking d ao conjunto de normas que hoje regem a OMC opredicado de ser um ordenamento jurdico, e essa propriedade um dadoimportante na vida da OMC. Essa tambm a regra no processo denegociao desde a Rodada Uruguai, ou seja, nothing is agreed untileverything is agreed44.

    Na dinmica que levou ao sucesso a Rodada Uruguai, cabe lembraro papel que tiveram duas importantes figuras que foram diretores-gerais doGATT. O primeiro foi o Arthur Dunkel 45, um suo diretor-geral do GATTdurante muito tempo e que era um profundo conhecedor das tecnicalidadesde todo o processo. Foi ele que fez o assim chamado Dunkel Draft, queteve, enfim, um papel muito importante naquilo que depois acabou sendo aRodada Uruguai.

    No entanto, havia alguns assuntos pendentes que no foramequacionados no Dunkel Draft. O fecho da Rodada Uruguai muito se deve aPeter Sutherland46, diretor-geral que sucedeu Arthur Dunkel. PeterSutherland tinha uma forte personalidade, no possua o mesmo domniotcnico de Dunkel, mas, vamos dizer assim, tinha tato, liderana poltica eimaginao. Como irlands, uma coisa que ele dizia sempre, sabia o queera ser um pas subdesenvolvido dentro do sistema europeu; por essarazo, possua tambm uma sensibilidade prpria em relao aos pases emdesenvolvimento. E nesse sentido, essa sensibilidade o ajudou a trabalhar procura desse consenso, que penso ser um dado interessante de lembrar.Do lado brasileiro, alm dos embaixadores, quem teve um papel importanteno incio da Rodada Uruguai foi Olavo Setbal47. Na poca, Setbal era

  • Ministro das Relaes Exteriores e teve um papel importante em aceitar aidia de uma viso mais abrangente do GATT. Nesse mesmo perodo, oSecretrio-Geral do Itamaraty, Paulo Tarso 48, alm de ter sido umSecretrio-Geral forte, tinha muita experincia e domnio desta parte decomrcio internacional. Subseqentemente, j no Governo Collor49, MarcosAzambuja50, Secretrio-Geral do Itamaraty, tambm teve uma atuaorelevante. Contudo, houve vrios momentos de crises, que no cabe agorarelembrar, no processo de negociao da Rodada Uruguai, tanto que levouquase dez anos para ser concludo.

    Com o final da Rodada Uruguai e a criao da OMC em 1995, oBrasil teve certa atuao na escolha do primeiro diretor-geral dessainstituio, que foi Ruggiero51. bom lembrar que na ocasio ocorreu certadisputa eleitoral para a posio de diretor-geral da OMC. O ex-presidente doMxico, Salinas52, foi um dos candidatos. Contudo, como a situao polticade Salinas complicou-se no Mxico, sua candidatura ficou fragilizada. Houvetambm a candidatura do Embaixador Ricupero, que era uma candidaturaforte, mas foi atropelada pelas circunstncias polticas internas, quedificultaram a viabilizao do seu nome. Foi nesse contexto que surgiu onome de Ruggiero aprovado pelo Brasil, pois tnhamos uma relao muitoboa com ele.

    Dito isso, quando cheguei em Genebra, comecei a examinar, comtoda a profundidade, os textos da Rodada Uruguai. Tenho ainda o meuexemplar, que pertenceu antes ao Lampreia e, como se v, est bastanteanotado. Ficaram umas anotaes que o prprio Lampreia fez em relaoao captulo de Sistema de Soluo de Controvrsias.

    Naquela ocasio, em Genebra havia uma atividade chamada GilbertoAmado Memorial Lectures53, que era uma lecture dada no mbito daComisso de Direito Internacional das Naes Unidas. Assim que chegueiem Genebra, fui convidado para fazer uma conferncia nessa srie deseminrios. E, justamente, por ser algo novo no campo do DireitoInternacional, decidi apresentar no Memorial Lecture Series uma reflexosobre o Sistema de Soluo de Controvrsias da OMC54. um textobastante conhecido que foi publicado em 1996. Esse texto foi tambmpublicado em portugus e est em meu livro sobre a OMC e aregulamentao do comrcio internacional55. Ainda foi publicado em umlivro do Casella56; enfim, um texto de grande circulao. Naqueleprimeiro momento, em que parei para pensar no Sistema de Soluo deControvrsias, procurei identificar qual era a diferena existente entre osistema do GATT e o da OMC. E, naturalmente, realcei alguns aspectosmuito significativos que naquela poca ainda no eram to claros.

  • O sistema do GATT era uma jurisprudncia mais diplomtica doque jurdica, requeria o consenso para a aprovao das decises do panel.Apesar disso, j havia um trabalho grande, dentro do GATT, de codificaodo que viria a ser o Sistema de Soluo de Controvrsias. Tanto que afirmoque o sistema , em linguagem jurdica, fruto de codificao edesenvolvimento progressivo daquilo que havia anteriormente. O quecaracteriza o novo sistema da OMC um inequvoco adensamento dajuridicidade. Esse adensamento da juridicidade muito significativo, porquedenotava antes de tudo a automaticidade da jurisdio tendo como critrioo consenso invertido. Alm do mais, porque alm dos panels h a segundainstncia, que o rgo de Apelao, com um duplo grau de jurisdiopraticamente inexistente no sistema internacional. E indo mais alm do quese chama um processo de conhecimento, com duplo grau de jurisdio, htambm um mecanismo de execuo.

    Mesmo com todas as dificuldades de um mecanismo de execuono plano internacional, existe a avaliao se as decises do panel estosendo implementadas e a possibilidade da retaliao que no caso da OMC,como em geral no caso do Direito Internacional Econmico, a sano asano da no-participao nos resultados. O objetivo do sistema, como dizo Dispute Settlement Understanding, bring into conformity, que procurarmanter a coerncia e a consistncia. Claro que o contencioso da OMC mais um contencioso de interesses do que um contencioso de legalidade.Ou seja, um contencioso de interesses procurando manter o rumo de umcontencioso de legalidade.

    Ainda do ponto de vista de experincia, e no s reflexiva, mas umaexperincia institucional, fui o presidente do OSC. Fui o segundo presidentedo OSC, e coube-me na poca tratar da instaurao do rgo de Apelao edo seu regimento interno. Naquela ocasio, mantive um estreito contatocom os que tinham sido indicados para integrar o Appellate Body (rgo deApelao). O Appellate Body era formado por pessoas muito qualificadas,como o Julio Lacarte57, do Uruguai. Lacarte tinha vasta experincia prvia,tendo sido um dos poucos que participaram de Havana58 e, portanto, doincio do GATT. Alm disso, conhecia tambm muito bem os detalhes danegociao da Rodada Uruguai. Lacarte representou para o rgo deApelao a memria do que era a instituio, com as suas caractersticas ecom as suas especificidades. Menciono isso para ressaltar a idia daimportncia dos que haviam trabalhado no GATT, do ponto de vista jurdicoe diplomtico, e para enfatizar que aquele era um sistema self-contained. ODispute Settlement Understanding o primeiro passo de abertura para oDireito Internacional Pblico quando trata das regras de interpretao do

  • Direito Internacional, que so as da Conveno de Viena59, e assimsucessivamente.

    Em interao consultiva com o rgo de Apelao empenhei-me notrabalho que levou ao estabelecimento das regras de procedimento dessergo, inclusive naquilo que foi uma inovao dessas regras em relao aoDispute Settlement Understanding. Porque o Dispute SettlementUnderstanding menciona uma cmara de trs e o regimento do rgo deApelao instaurou, com o meu apoio, algo novo: a idia da colegialidade.Essa idia significa que a responsabilidade pela deciso do rgo deApelao cabe aos trs membros da cmara, mas implementou ummecanismo de discusso e consulta formalizado e com todos os membros.Essa foi uma sugesto vinda dos membros do rgo de Apelao queconsiderei muito boa porque permitia, la longue, trabalhar a uniformidadeda jurisprudncia. Ainda que a responsabilidade de decidir um casocontinuasse a ser da cmara haveria a oportunidade de o colegiado trocaridias, ou seja, de ir construindo um processo comum de reflexo sobre asnormas.

    Penso que essas so minhas observaes e reflexes sobre adimenso institucional. Passo, a seguir, a relatar um pouco da experinciacom os casos concretos no mbito de minha prpria experincia emGenebra.

    O primeiro caso que surgiu foi o da gasolina reformulada60. Umcaso muito interessante, mas menos complicado juridicamente do queoutros que vieram depois, por exemplo, o da Embraer-Bombardier61. Osamericanos tinham estabelecido, por meio da sua legislao interna,critrios de exigncia para quem exportava a gasolina reformulada, que erao caso do Brasil e da Venezuela, mas as exigncias para as refinariasamericanas eram inferiores aos standards requeridos dos exportadores.Naturalmente, os americanos apresentaram aquilo como sendo uma questode natureza ambiental. H na legislao americana um captulo importantesobre proteo ambiental. Quero fazer uma ressalva importante: nstambm estamos a favor do meio ambiente. A nossa linha de raciocnio foique no se tratava de um problema de natureza ambiental, e, sim,significava um tratamento discriminatrio entre o produtor nacional e oexportador, o que no compatvel com as regras da OMC.

    Como usual nesses casos, para uma demanda chegar OMC, preciso que o governo considere o assunto importante e estenda aointeresse particular o que em Direito se chama proteo diplomtica. Comose sabe, no h acesso dos particulares ao sistema da OMC. O locus standipara a atuao da OMC do Estado. Quem conduz, primeiro, a deciso de

  • levar o caso OMC e, segundo, a maneira pela qual o caso serapresentado, o Estado. claro que existem os interesses dos particularese as razes pelas quais tal ou qual assunto deva ser levado OMC. Nocaso da gasolina reformulada, era a Petrobras que tinha interesse noassunto, e o governo brasileiro assumiu o patrocnio da demanda daPetrobras, que era comum causa da Venezuela.

    Ns, naturalmente, chamamos, como usual nessa histria, umescritrio de advocacia americano, que foi contratado pela Petrobras. Eraum escritrio muito renomado, mas tambm estavam lidando pela primeiravez com o Sistema de Soluo de Controvrsias. O advogado encarregado esua equipe reuniram-se muitas e muitas vezes comigo e, evidentemente,pelo fato de tambm ter um domnio tcnico dessa matria, a deciso deargumentar de tal e qual maneira coube a mim, apoiado pela equipe queestava na Misso em Genebra. Portanto, no foi uma delegao feita dogoverno ou do embaixador a um escritrio de advocacia americano, e simum trabalho realizado em parceria. Penso que nesse caso advoguei,efetivamente, em prol do Brasil, valendo-me dos meus conhecimentosprvios. Em certo sentido, minha experincia pessoal acrescentava aoconhecimento que todos os embaixadores da OMC tm das regras acapacidade de trabalhar juridicamente o assunto. Por essa razo, envolvi-memuito diretamente neste caso e depois no caso subseqente, do DesiccatedCoconut62.

    Ganhamos o caso da gasolina reformulada e o do DesiccatedCoconut. Ganhamos este segundo caso porque nos valemos de um bomrecurso jurdico do direito internacional privado, que era a discusso danorma aplicvel. No caso, a norma aplicvel no deveria ter sido a da OMC,como alegaram as Filipinas, mas a norma da Rodada Tquio, e por essarazo vencemos, dando um argumento juridicamente muito slido, que foiaceito.

    Claro que medida que os fatos ocorriam fui-me dando conta deque era necessrio aparelhar a Misso do Brasil em Genebra para lidar comcompetncia com os assuntos relacionados ao OSC. Um dos meusprimeiros colaboradores, um excelente colaborador, alis, foi Victor doPrado63. Victor havia sido meu aluno na Faculdade de Direito do Largo SoFrancisco64. Tambm contei com o apoio de Fernando de Melo Barreto65,hoje embaixador do Brasil na Austrlia, que tinha sido professor de DireitoInternacional na So Francisco durante certo tempo e advogado militante.Eram os dois que dentro da Misso me ajudavam a pensar juridicamenteposies brasileiras. Alm do que, levei Vera Thorstensen66 para trabalharem Genebra porque tinha a convico de que, e o tempo mostrou ser muitomais significativa do que imaginava na poca, no trato dessas questes e

  • desses contenciosos, o domnio da economia, inclusive para efeito de prova,era muito significativo e, portanto, era preciso ter algum com essedomnio aliado ao interesse pelos assuntos da OMC. Com essa equipe inicialfomos trabalhando o tema dos contenciosos na OMC.

    Ainda acompanhei o incio do caso da Embraer-Bombardier. Comose sabe, esse caso foi muito mais complicado do que os dois anteriores,porque envolvia a questo de subsdios e um domnio de informao muitogrande, alm de termos uma situao juridicamente mais difcil, queresultava daquela nota que existe no Acordo sobre Subsdios sobre oconceito de juros subsidiados. A diferenciao do que taxa de jurossubsidiada ou no foi feita pela OCDE, organismo do qual o Brasil noparticipa, e que beneficiava, evidentemente, o Canad e dificultava a nossavida.

    O caso da Embraer um caso tambm emblemtico, porqueenvolvia um problema que era especfico do Brasil, mas est relacionado aoutros pases em desenvolvimento. Quero dizer, o acesso ao crditointernacional depende, naturalmente, do investment grade da sua economia.A Embraer uma empresa extremamente bem-estruturada, no entanto, porser uma empresa brasileira, vive a realidade da economia do pas. Por essarazo, o tema da equalizao de juros era para ns um tema crtico. No sevende avio como se vende commodities; trata-se de uma operao deprazo longo, em que o tema do financiamento muito importante. Nessesentido, a oportunidade de gerar uma equalizao entre aquilo que oacesso ao crdito de uma empresa brasileira e aquilo que o acesso aocrdito de uma empresa situada no Canad um item de fundamentalimportncia. A mim me pareceu sempre, e essa a minha convico, que oproduto da Embraer era um produto de qualidade, tecnicamente de qualidadee, por isso, competitivo com o da Bombardier. Portanto, no que nsestvamos subsidiando um produto de qualidade inferior; ns estvamosfazendo o nivelamento necessrio entre o acesso ao crdito de umaempresa situada no Brasil e o acesso ao crdito de uma empresa situadano Canad.

    Claro que esse era um tema poltico importante. O governobrasileiro, com toda a razo, patrocinou essa causa da Embraer e muitagente trabalhou nesse caso. Enquanto estive em Genebra, trabalhei muitoneste caso, seja com os advogados, seja com a Embraer, seja com osintegrantes do governo brasileiro que participavam, por exemplo, doBNDES67 no processo de equalizao de juros.

    Quando voltei de Genebra fui nomeado Ministro doDesenvolvimento68, durante um curto perodo em 1999. Naturalmente,mantive meu interesse e ateno em relao aos temas da OMC, alm domais, o ministro do MDIC integra a Cmara de Comrcio Exterior, onde

  • esses assuntos tambm eram discutidos e tratados.Em 2001, quando voltei ao Ministrio das Relaes Exteriores, tinha

    a convico de que era preciso avanar no aparelhamento do governobrasileiro e da sociedade brasileira no trato desses assuntos. Criei, nombito do Itamaraty, a Coordenao dos Contenciosos, confiada a RobertoAzevedo69, que tinha trabalhado comigo em Genebra e havia se tornado umaprofundado conhecedor dessas matrias. Procurei ainda reformular oDepartamento Econmico do Itamaraty, instituindo uma estrutura matricial.Fiz essas alteraes em decorrncia de meu entendimento de que certosassuntos, ainda que se tratassem de negociaes distintas, tinham umaconvergncia temtica muito grande: tarifas, medidas no-tarifrias,medidas fitossanitrias, e assim sucessivamente.

    Nessa minha atuao como Ministro das Relaes Exteriorestambm dei a devida importncia uma convico que sempre tivera para a interao com o setor privado. Como ministro, estava convencido deque ningum melhor do que o empresrio para conhecer as dificuldadespara exportar, onde est o dgito da tarifa aduaneira que o prejudica, ondeest a complicao que acarreta nus, e assim sucessivamente. Inclusive ocaso da ABEF70, que era um problema de administrao de quotarelacionado Quota Hilton71 e estava baseado na discricionariedade daaplicao da quota que prejudicava o exportador brasileiro. S quem est noramo e conhece os detalhes operacionais que pode tratar dessesassuntos.

    Dessa maneira, avanamos no preparo do Itamaraty para tratar dequestes relativas ao contencioso e, ao mesmo tempo, dei um enormeapoio Vera na implantao do programa de estgio para advogadosbrasileiros na Misso do Brasil em Genebra. um pouco o bvio. Umprofessor que conhece os escritrios de advocacia deseja ter para o seupas uma autonomia de conhecimento e de competncia. Essa autonomia s possvel se as pessoas esto capacitadas no assunto. Um grupo deescritrios de advocacia72 com interesse em defesa comercial apoiou esseprograma, o que possibilitou sua implantao, a qual, inclusive, tem tidocontinuidade. Considero que um dado importante para nosso preparo.

    Nessa minha segunda gesto no Itamaraty, uma das coisasimportantes que funcionaram do ponto de vista de coordenaointragovernamental foi a Cmara de Comrcio Exterior. E, justamente, naCmara de Comrcio Exterior que ns discutamos se tal ou qual casodeveria receber a proteo diplomtica brasileira e ser levado OMC. Emdois desses casos participei ativamente da deciso: o caso do algodo e odo acar. Nesse jogo da defesa de interesses, cada Ministrio tem a suaprpria lgica. Na poca, o Ministrio da Agricultura era conduzido pelo

  • Pratini de Moraes73, um ministro muito atuante e profundo conhecedor dosassuntos relacionados pasta. Um dos seus colaboradores, Pedro Camargo,tinha a idia de que valeria a pena acionar o Sistema de Soluo deControvrsias em todas as direes para lidar com o problema doprotecionismo agrcola.

    Na poca, minha avaliao, compartilhada pela Cmara de ComrcioExterior, era a de que iramos entrar em um terreno novo e difcil e, poressa razo, teramos de selecionar dois casos emblemticos. Como setratava de protecionismo agrcola, deveramos ter um caso importante comos EUA e um com a Unio Europia. So casos diferentes, como se sabe,com especificidades diferentes, mas com o denominador comum de seremcasos muito representativos do protecionismo agrcola dos pasesdesenvolvidos.

    O Ministrio da Agricultura tambm queria colocar a soja, masponderei: a soja no, porque no caso da soja teremos de provar lucroscessantes, o que muito mais difcil que comprovar prejuzo. No caso doalgodo, em princpio, achava eu que ns seramos capazes de provarprejuzo. E que, portanto, era um caso em que tnhamos melhores chancesde vencer. Em relao ao acar, era um assunto politicamente maisdelicado, porque envolvia, de uma forma ou de outra, a rede de prefernciada Unio Europia (UE) com pases menos desenvolvidos. Em decorrncia,havia a preocupao poltica de como seria a reao tanto da UE como dospases menos desenvolvidos.

    Mas entendi, e os meus companheiros da Cmara de Comrciotambm, que cabia defender os interesses econmicos do Brasil nocomrcio de acar e, conseqentemente, de lcool e demais produtosrelacionados ao setor sucroalcooleiro. O assunto era de tal formaimportante que no era adequado restringir nossa atuao porconsideraes polticas muito pouco precisas. No tnhamos nenhumaaspirao nas Naes Unidas (ONU)74 que nos obrigasse a buscar umamaioria; no estvamos nessa batalha do atual governo para conseguir umassento permanente no Conselho de Segurana da ONU. Dado oentendimento de qual era nosso interesse no caso do acar e de nossaspossibilidades de argumentao, cabia defender o pas.

    Portanto, a deciso de levar os casos do algodo e do acar foiuma deciso que tomei, juntamente com os membros da Cmara deComrcio Exterior, e instrumentei do ponto de vista do processo decisriopara encaminhamento no mbito no Ministrio das Relaes Exteriores. Osresultados dessa estratgia so de conhecimento de todos, o que refora aconvico de que estvamos certos.

  • 2.3 Depoimento do Prof. Dr. Luiz Olavo Baptista75

    A avaliao da participao do Brasil na Rodada do Uruguai podepartir de uma anlise do que acontece com os pases grandes. Eles tendema uma certa auto-suficincia. Os EUA, por exemplo, at o advento dapresidncia Wilson76, tinham muito pouca atuao internacional. Quandoocorria, a atuao era baseada no recurso violncia, para obter umaexpanso territorial. Posso citar como exemplos marcantes a ocupao deterritrios mexicanos e a abertura dos portos japoneses feita na boca dacanhoneira. Ou seja, quase no havia uma atuao internacional dos EUApara expanso territorial que no fosse a do recurso violncia. Ento, amudana dessa atitude advm num momento em que a economiaamericana se internacionaliza mais. Antes era, vamos dizer, um movimentopara obrigar a abertura de mercados, isto , forar o acesso aos mercadospara os produtos americanos. Somente com a expanso dos investimentosno exterior e, conseqentemente, com o aumento da presena do investidoramericano em vrios pases houve mudana de posio, porque os EUApassaram a ter menos medo do mundo.

    Uma reao de fora no lugar de uma negociao um sinal deimaturidade poltica e de incapacidade de negociar ou de medo de negociar.

    O Brasil seguiu uma trajetria similar dos EUA. O Brasil ainda um pas tmido. Ele como aquele grando, o bobo da escola, que todomundo espanca e atormenta, e que demora muito para reagir. Se elereagisse e desse um tapa no agressor, ele derrubaria o outro menino. Noentanto, o Brasil aceita, por exemplo, situaes que so at de humilhao,como foi o caso da refinaria da Petrobras na Bolvia. As instalaes daPetrobras foram cercadas e ocupadas militarmente, sem uma reaobrasileira muito definida.

    Ao mesmo tempo, o empresrio brasileiro tambm tem medo deinvestir no exterior, isto , de fazer coisas no exterior. Apenas maisrecentemente que comearam a aparecer algumas empresas que tmessa ousadia e, em poucos anos, independentemente da aogovernamental, ou apesar das dificuldades colocadas pela burocracia, asempresas conseguiram acesso ao exterior. Hoje, o Brasil j tem trs ouquatro multinacionais de peso atuando no exterior.

    Esse medo de fazer coisas no exterior est relacionado a umsentimento de inferioridade brasileiro. Posso dar um exemplo dessesentimento de inferioridade. Apesar da participao importante do Brasil naSegunda Grande Guerra com uma tropa aguerrida, que sem equipamentose com inmeras dificuldades conseguiu realizar aes importantes e venceruma batalha crucial como foi