20
Cascavel PR 21 a 23 de junho de 2010 O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO DA COOPERATIVA C. VALE PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL DO MUNICÍPIO DE PALOTINA (PR) Área: Ciências Econômicas Resumo Este artigo objetiva apresentar os princípios cooperativistas e a contribuição da Cooperativa Agroindustrial C.Vale para o desenvolvimento econômico do município de Palotina (PR). A pesquisa pautou-se na revisão de literatura e na análise de dados secundários sobre o assunto, e no estudo de caso da Cooperativa C. Vale. Tenta-se associar a sua função social em relação à valorização do produtor e da propriedade, explicitando o seu papel no desenvolvimento socioeconômico local e regional. Constatou-se que, no passado distante, o surgimento do cooperativismo legalmente constituído se deu com a fundação da cooperativa de Rochdale. Já o cooperativismo paranaense tem suas origens junto às comunidades de imigrantes europeus, mas a sua efetiva estruturação tem influência de três fortes ondas colonizadoras regionais. As cooperativas são entidades de livre adesão de pessoas que estejam aptas para participar do objeto para a qual foi constituída. Dessa forma, as cooperativas agropecuárias exercem grande influência no meio rural e no desenvolvimento local. Os resultados apontaram que a C.Vale é uma importante agente geradora de renda aos associados e estes, por sua vez, fazem a utilização dessa renda na própria região. Isso se reflete no aumento do número de empregados formais em Palotina a partir da instalação do Complexo Avícola em 1997. Palavras Chave: Cooperativismo; C. Vale; Desenvolvimento. 1. INTRODUÇÃO A trajetória histórica de um povo, bem como seu desenvolvimento, tem como ponto de referência a agricultura. Vista como uma arte para as antigas civilizações (mesopotâmicos, egípcios, incas, maias, astecas, etc.), o início da atividade agrícola é um marco histórico importante. A partir de seu desenvolvimento, o homem deixou de ser nômade e passou a estabelecer novas relações com o meio em que vivia, tornando-se sedentário. Tratada apenas da forma extrativa durante séculos, a agricultura era uma atividade que se resumia apenas aos atos de semear e colher. Somente depois dos avanços do sistema capitalista é que ela passou por grandes transformações. De acordo com Silva (1998, p. 4), a atividade agropecuária deixa de ser uma esperança ao sabor das forças da Natureza e torna-se uma certeza subordinada pelo Capital. É neste contexto que se inseriu a atividade agropecuária do Estado do Paraná. Uma atividade que objetivava inicialmente a ocupação e a colonização do Estado, e, como afirma Trintin (2006), a colonização agrícola do Estado ocorreu por distribuição das propriedades de forma desconcentrada, favorecendo o surgimento de pequenas propriedades. Com o desenvolvimento do capitalismo, essas pequenas propriedades, para serem competitivas, necessitavam se reunir para aumentar seu poder no mercado. Foi nesse contexto que as atividades cooperativas se inseriram no Paraná. Conforme Singer (2002), um grupo

O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

  • Upload
    dotu

  • View
    216

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO DA

COOPERATIVA C. VALE PARA O DESENVOLVIMENTO

ECONÔMICO E SOCIAL DO MUNICÍPIO DE PALOTINA (PR)

Área: Ciências Econômicas

Resumo

Este artigo objetiva apresentar os princípios cooperativistas e a contribuição da Cooperativa

Agroindustrial C.Vale para o desenvolvimento econômico do município de Palotina (PR). A pesquisa

pautou-se na revisão de literatura e na análise de dados secundários sobre o assunto, e no estudo de

caso da Cooperativa C. Vale. Tenta-se associar a sua função social em relação à valorização do

produtor e da propriedade, explicitando o seu papel no desenvolvimento socioeconômico local e

regional. Constatou-se que, no passado distante, o surgimento do cooperativismo legalmente

constituído se deu com a fundação da cooperativa de Rochdale. Já o cooperativismo paranaense tem

suas origens junto às comunidades de imigrantes europeus, mas a sua efetiva estruturação tem

influência de três fortes ondas colonizadoras regionais. As cooperativas são entidades de livre adesão

de pessoas que estejam aptas para participar do objeto para a qual foi constituída. Dessa forma, as

cooperativas agropecuárias exercem grande influência no meio rural e no desenvolvimento local. Os

resultados apontaram que a C.Vale é uma importante agente geradora de renda aos associados e estes,

por sua vez, fazem a utilização dessa renda na própria região. Isso se reflete no aumento do número de

empregados formais em Palotina a partir da instalação do Complexo Avícola em 1997.

Palavras Chave: Cooperativismo; C. Vale; Desenvolvimento.

1. INTRODUÇÃO

A trajetória histórica de um povo, bem como seu desenvolvimento, tem como ponto

de referência a agricultura. Vista como uma arte para as antigas civilizações (mesopotâmicos,

egípcios, incas, maias, astecas, etc.), o início da atividade agrícola é um marco histórico

importante. A partir de seu desenvolvimento, o homem deixou de ser nômade e passou a

estabelecer novas relações com o meio em que vivia, tornando-se sedentário. Tratada apenas

da forma extrativa durante séculos, a agricultura era uma atividade que se resumia apenas aos

atos de semear e colher. Somente depois dos avanços do sistema capitalista é que ela passou

por grandes transformações. De acordo com Silva (1998, p. 4), a atividade agropecuária deixa

de ser uma esperança ao sabor das forças da Natureza e torna-se uma certeza subordinada pelo

Capital.

É neste contexto que se inseriu a atividade agropecuária do Estado do Paraná. Uma

atividade que objetivava inicialmente a ocupação e a colonização do Estado, e, como afirma

Trintin (2006), a colonização agrícola do Estado ocorreu por distribuição das propriedades de

forma desconcentrada, favorecendo o surgimento de pequenas propriedades. Com o

desenvolvimento do capitalismo, essas pequenas propriedades, para serem competitivas,

necessitavam se reunir para aumentar seu poder no mercado. Foi nesse contexto que as

atividades cooperativas se inseriram no Paraná. Conforme Singer (2002), um grupo

Page 2: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

cooperativo deve ser capaz de, simultaneamente, preservar o tamanho dos pequenos

empreendimentos e eliminar as diferenças de rentabilidade, equalizando os resultados para o

grupo de cooperados.

Este trabalho tem por objetivo apresentar os princípios cooperativistas e a contribuição

da Cooperativa Agroindustrial C.Vale para o desenvolvimento econômico do município de

Palotina (PR), analisando os encadeamentos produtivos da variável emprego nesse município,

induzidos com a instalação do parque agroindustrial da referida cooperativa.

2. ELEMENTOS METODOLÓGICOS

A metodologia da pesquisa pode ser classificada de acordo com o objetivo que o

pesquisador deseja, enquadrando-se, de acordo com Richardson (1999), como: estudos

exploratórios, quando não se tem informação sobre determinado tema e se deseja conhecer o

fenômeno; estudos descritivos, quando se deseja descrever as características de um fenômeno;

e estudos explicativos, quando se deseja analisar as consequências de um fenômeno.

A metodologia empregada neste estudo tem caráter documental, exploratório e o

estudo de caso. Conforme Yin (2002), o estudo de caso é a verificação de um fenômeno atual

dentro da realidade pessoal. Uma dissertação associada ao estudo de caso torna-se um

importante método de pesquisa principalmente para investigar eventos fora dos limites do

laboratório e dos objetivos do conhecimento da ciência laboratorial.

Quanto ao objetivo e ao grau em que o problema de pesquisa está cristalizado, o

presente estudo foi caracterizado como descritivo, pois descreve a realidade como ela é sem a

intenção de querer modificá-la (RICHARDSON, 1999). Segundo Gil (1995), uma das

características mais significativas das pesquisas descritivas está na utilização de técnicas

padronizadas na coleta de dados.

Quanto ao procedimento documental, foi realizada a revisão de literatura sobre o

assunto e, no estudo de caso da Cooperativa C.Vale, na tentativa de associar a sua função

social em relação à valorização do produtor e da propriedade, explicitando o seu papel para o

desenvolvimento econômico.

Além disso, fez-se uma análise de dados secundários sobre o município de Palotina,

dados coletados principalmente dos seguintes bancos de dados: Instituto de Pesquisa

Econômica e Aplicada (IPEA), Relação Anual de Informações Sociais (RAIS)

disponibilizado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), e do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE).

3. HISTÓRICO SOBRE O COOPERATIVISMO

Nessa seção será apresentado um pouco da história e das origens do cooperativismo.

Primeiramente, é importante ressaltar que a palavra cooperativa deriva do latim cooperativus

– de cooperari, que significa cooperar, colaborar, trabalho com outros (DE PLÁCIDO &

SILVA, 2000, p. 222).

A cooperação sempre existiu nas sociedades humanas, desde as eras mais remotas,

estando associada às lutas pela sobrevivência, às crises econômicas, políticas e sociais, bem

como às mudanças. Os melhores exemplos de cooperação aparecem quando se estuda a

Page 3: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

organização social dos antigos povos, como babilônios, gregos, chineses, astecas, maias e

incas (SCHNEIDER, 1998).

O cooperativismo moderno surgiu junto com a Revolução Industrial, como forma de

amenizar os traumas econômicos e sociais que a Revolução Industrial trouxe com suas

mudanças e transformações nos sistemas de produção. O crescimento industrial, na sua

primeira etapa, fez com que os artesãos e os trabalhadores rurais migrassem para as grandes

cidades, atraídos pelas fábricas em busca de melhores condições de vida. Essa migração

resultou em excesso de mão de obra urbana, na exploração do trabalhador de forma abusiva e

desumana, com jornadas de trabalho de até 16 horas/dia, com baixos salários e baixa

qualidade de vida, obrigando mulheres e crianças a ingressar no mercado de trabalho, em

condições mais desumanas que a dos homens. Com o aumento da industrialização, o trabalho

manual passou a ser substituído gradativamente pela maquinaria, aumentando a exclusão

social e o excedente de mão de obra.

Nesse contexto, começaram a surgir reações contra a doutrina liberal e individualista,

como exemplo, as reações socialistas, o socialismo espiritualista, chamado utópico, e o

socialismo materialista ou científico, a partir de 1848 com o Manifesto Comunista de Karl

Marx. As correntes de pensamento que surgiram nessa época defendiam uma forma mais

igualitária na distribuição de bens, pois havia um grande anseio por que todos os

trabalhadores fossem beneficiados, de forma a contribuir para a diminuição da debilidade nas

condições de vida e de trabalho. Ganharam importância espaços que pudessem ser utilizados

para esse fim, e a ideia de formar cooperativas tomou força. A cooperativa, nessa concepção,

seria uma organização que pudesse facilitar o combate e a diminuição das desigualdades

sociais a partir da ideia de que a produção não poderia ser apenas de propriedade privada,

onde a eliminação de intermediários entre o produtor e o consumidor pudesse diminuir os

preços dos produtos (PINHO, 1966).

Dessa maneira, a exploração coletiva das terras poderia facilitar esse processo e,

consequentemente, contribuir para a emancipação dos trabalhadores, que deixariam de servir

a terceiros e passariam a produzir para si, tornando-se, assim, donos do resultado final de seu

trabalho. Era preciso encontrar novas alternativas, e o que parecia mais coerente naquele

momento era criar novos postos de trabalho que absorvessem a grande massa de trabalhadores

ociosos, e melhorar as condições de trabalho.

Foi então nesse contexto de extremas desigualdades sociais que surgiu a que se

considera a primeira cooperativa, a dos Pioneiros de Rochdale (Distrito de Lancashire, na

Inglaterra). Essa experiência bem sucedida deu-se graças às iniciativas próprias de 28

tecelões, que buscavam um meio de melhorar suas condições sociais e econômicas. A história

do cooperativismo registra que, em Rochdale, no dia 24 de dezembro de 1844, os Pioneiros

inauguraram um armazém, organizado e regido por normas estatutárias que, segundo Pinho

(1982), objetivavam: a formação de capital para emancipação dos trabalhadores, mediante

economias realizadas com a compra em comum de gêneros alimentícios, construção de casas

para fornecer habitação a preço de custo, criação de estabelecimentos industriais e agrícolas

com duplo objetivo (produzir direta e economicamente tudo o que fosse indispensável às

necessidades dos trabalhadores e assegurar trabalho aos operários desempregados), educação

e luta contra o alcoolismo (que era muito comum entre os trabalhadores), comercialização

(compra e venda) somente a dinheiro, para que os cooperados só assumissem compromissos

Page 4: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

dentro de suas possibilidades orçamentárias, e evitando o crédito, que consideravam um "mal

social", e, por fim, cooperação integral.

Embora a experiência dos Pioneiros de Rochdale tenha tido sucesso, é importante

deixar claro que nem todas as cooperativas que vieram após a de Rochdale tiveram a mesmo

êxito. Muitas dessas experiências não obtiveram sucesso principalmente devido às condições

políticas desfavoráveis, pois muitas delas eram fragmentárias e tinham pouca expressividade.

Elas se concentrarem em países de estrutura capitalista e conseguiram se multiplicar mais para

o final do século XIX e início e a partir do século XX, tornando-se mais importantes depois

do período da Primeira Grande Guerra (1914-1919). Ao mesmo tempo em que o meio

capitalista estava passando por varias transformações, muitas das cooperativas também

passaram por isso, portanto, frente à necessidade se adaptarem às transformações, muitas se

desviaram, em parte, dos fins doutrinários.

Cercada de forças, em sua grande maioria agressivas e desfavoráveis aos seus

interesses, as cooperativas precisaram harmonizar-se com o ambiente em que estavam postas.

Essa foi a condição primordial para continuarem a existir. Cabe deixar claro, também, que o

cooperativismo, desde o seu surgimento, sempre foi considerado uma alternativa aos modelos

socioeconômicos tradicionalistas, pois nasceu como um movimento popular autônomo e

acabou por preservar essa característica. E, sendo a experiência histórica testemunha dos

fatos, fica evidente que o sistema econômico dominante dificulta o desenvolvimento de

empresas que lhe são contrárias, levando-as a se corromper. O ambiente, além de pressionar

contrariamente o desenvolvimento do cooperativismo, implica, também, de maneira profunda,

interferências no funcionamento interno. Além de existirem os entraves de ordem externa,

resultantes do sistema vigente, organizado e fortalecido durante quase dois séculos de

experiências, nas cooperativas existem também os entraves internos, como a mentalidade

capitalista dos associados e dos próprios dirigentes, a falta de capitais, entre outros.

O cooperativismo está organizado em um sistema mundial, que busca garantir a

unidade da doutrina e da filosofia cooperativista. Além de defender os interesses do

cooperativismo pelo mundo, sua organização máxima mundial é a Aliança Cooperativa

Internacional (ACI), uma organização não governamental, independente, que reúne,

representa e presta assistência às organizações cooperativas do mundo inteiro. A ACI foi

fundada em 1895, por iniciativa de líderes cooperativistas ingleses, franceses e alemães, com

o objetivo de criar um órgão representativo mundial, que intensificasse o intercâmbio entre as

cooperativas dos diversos países, no campo doutrinário, no educativo e no técnico. A ACI

congrega mais de 800.000 cooperativas e 810.000.000 de cooperados. Sua sede fica em

Genebra, na Suíça.

A fundação da ACI foi precedida por intensos debates entre duas correntes. A

primeira era a da Hegemonia do Produtor, que pregava a transformação social por intermédio

das cooperativas de produção, que seria o instrumento de libertação dos trabalhadores

assalariados, com a participação dos funcionários nos lucros das empresas. A segunda era a da

Hegemonia do Consumidor, que pregava a transformação social pela organização das

cooperativas de consumo, pois entendiam que todas as pessoas são consumidoras e nem todas

são trabalhadoras, por isso as cooperativas de consumo são mais universais nos objetivos que

defendem e, portanto, atenderiam aos interesses de todas as pessoas.

De acordo com Schneider (1991), a influência de Charles Gide foi decisiva para que

a ACI acatasse a "Hegemonia do Consumidor" (que é a vitória da produção cooperativada de

Page 5: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

consumidores, com retorno proporcional às operações) em detrimento da "Emancipação do

produtor" ou produção de trabalhadores cooperativados, em retorno ao trabalho. Segundo ele,

as cooperativas de produção, apoiadas pelas cooperativas de crédito, pleiteavam apenas a

reconciliação entre o capital e o trabalho, gerando a paz social, defendendo somente os

interesses dos pequenos produtores da ameaça de se tornarem assalariados.

A representação do sistema cooperativista nacional cabe à Organização das

Cooperativas Brasileiras (OCB), sociedade civil, com sede em Brasília, que nasceu durante a

realização do IV Congresso Brasileiro de Cooperativismo em Belo Horizonte, no qual se

decidiu pela fusão da ABCOOP e da UNASCO e pela existência de apenas uma entidade de

representação do cooperativismo no Brasil. Estruturada nos termos da Lei Federal nº

5764/1971, foi definitivamente criada em 1971 para atuar como representante legal do

sistema cooperativista nacional e como órgão técnico consultivo ao governo, congregando as

organizações estaduais constituídas com a mesma natureza. Representa todos os ramos do

cooperativismo brasileiro, composto por mais de 7.518 cooperativas e mais de 6.791.054

cooperados (OCEPAR, 2008).

4. PRINCÍPIOS DO COOPERATIVISMO

Iniciada no ano de 1988, a revisão mais recente dos princípios cooperativistas só foi

concluída em setembro de 1995, no Congresso Centenário de ACI em Manchester, Inglaterra.

Essa revisão foi completamente diferente das primeiras e foi convocada para examinar as

mais profundas questões de identidade cooperativa, pois o crescimento quantitativo e

empresarial das cooperativas fez com que os valores básicos do cooperativismo fossem

substituídos pela eficiência econômico-administrativa e pela necessidade de encontrar

respostas eficazes aos crescentes desafios de um mercado extremamente competitivo e

monopolista devido à formação de grandes empresas multinacionais.

Oficialmente, a definição do termo cooperativa é aquela proveniente do Congresso

Mundial da Aliança Cooperativa Internacional (ACI), ocorrido em Manchester, na Inglaterra,

em setembro de 1995, e pode ser assim formulada: Cooperativa é uma associação autônoma

de pessoas, unidas voluntariamente, para atender suas necessidades e aspirações

econômicas, sociais e culturais comuns, através de uma empresa coletiva e

democraticamente controlada.

A atualização dos "Princípios Cooperativistas dos Pioneiros de Rochdale" também

aconteceu no Congresso do Centenário da Aliança Cooperativa Internacional – ACI em 1995,

e é assim entendida:

1º) Adesão Voluntária e Livre: As cooperativas são organizações voluntárias, abertas a

todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades como

membros, sem discriminações de sexo, sociais, raciais, políticas e religiosas; democráticas,

controladas pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das suas políticas

e na tomada de decisões.

2º) Gestão Democrática pelos Membros: As cooperativas são organizações

democráticas, controladas pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das

suas políticas e na tomada de decisões.

3º) Participação Econômica dos Sócios: Os cooperados devem contribuir igualmente

para o capital de sua cooperativa, o qual é controlado democraticamente. Parte deste capital é

Page 6: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

propriedade comum dos cooperados. O restante poderá ser destinado para investimentos na

própria cooperativa ou para outras aplicações, sempre de acordo com a decisão tomada na

assembleia.

4º) Autonomia e Independência: As cooperativas são organizações autônomas de

ajuda mútua, controladas pelos seus membros. Se estas firmarem acordos com outras

organizações, incluindo instituições públicas, ou recorrem ao capital externo, devem fazê-lo

em condições que assegurem o controle democrático pelos membros e mantenham a

autonomia das cooperativas;

5º) Educação, Formação e Informação: As cooperativas promovem a educação e a

formação dos seus membros, dos representantes eleitos e dos trabalhadores de forma que estes

possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento das suas cooperativas;

6º) Intercooperação: As cooperativas devem trabalhar em conjunto, por meio do

intercâmbio de informações, produtos e serviços, para atender melhor os seus associados e

fortalecer o Cooperativismo.

7º) Interesse pela Comunidade: As cooperativas trabalham para o desenvolvimento

sustentado das suas comunidades através de políticas aprovadas pelos membros.

Tendo apresentado brevemente o histórico do cooperativismo e seus princípios em um

contexto geral, apresenta-se, na próxima seção, o contexto cooperativista brasileiro.

5. O COOPERATIVISMO NO BRASIL

Verificando a historiografia, é possível encontrar dados a respeito do cooperativismo

brasileiro já no século XVII, mais precisamente a partir de 1610, com a formação das

primeiras reduções jesuíticas no Brasil, na região compreendida pela bacia dos Rios Paraguai,

Paraná e Uruguai; ocupando áreas de Guaíra, no Paraná; das Missões, no Rio Grande do Sul e

terras no Oeste de Santa Catarina, formaram-se Estados cooperativos integrais, onde tudo era

de todos e as necessidades eram atendidas de forma grupal, formando uma sociedade

solidária, fundamentada no trabalho coletivo, baseado na catequese divina e no auxílio mútuo

(PINHO, 1982, p. 30).

Podem-se encontrar também referências a fatos ocorridos entre os séculos XVII a

XIX, em Quilombos (que se formaram principalmente no Nordeste brasileiro), onde os

escravos fugidos também já praticavam alguma forma de cooperativismo.

No Estado do Paraná, as cooperativas agropecuárias, bem como as de outros ramos de

atividades, surgiram a partir da década de 1940, principalmente nas comunidades de origem

alemã e italiana, onde seus habitantes já eram conhecedores do Sistema Cooperativista

Europeu (OCB, 1993).

O movimento cooperativista demorou a ser aceito pelo povo brasileiro, isso devido à

desconfiança provocada por gestões ineficientes. Foi somente após 1960 que se iniciou um

movimento que redundou na fundação de várias cooperativas agrícolas, conservando, desde

essa época, os princípios que nortearam os operários de Rochdale.

O cooperativismo agrícola se desenvolveu com os crescentes desafios impostos pelo

governo no sentido de aumentar a produção de alimentos para consumo e para exportação,

cujos benefícios resultariam em melhores condições para o desenvolvimento dos centros

urbanos industriais, com isso tornando o país mais competitivo. Estas cooperativas prestam

serviços de vários tipos aos seus associados: recebem a produção para armazenamento,

Page 7: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

padronização, industrialização e venda; fornecem implementos para uso profissional, gêneros

de consumo e obtêm crédito junto aos bancos, para os associados.

Devido às particularidades do desenvolvimento político, econômico, social e cultural,

o cooperativismo brasileiro desenvolveu-se à sombra dos subsídios e do paternalismo do

governo, onde os interesses do poder econômico dominante prevaleceram sempre em

detrimento dos interesses dos pequenos e médios agricultores. Mesmo assim, com todas as

adversidades conjunturais, o cooperativismo brasileiro tornou-se um sistema organizado que

participa da maioria das atividades da vida humana (CORADINI & FREDERICO, 1982).

O movimento cooperativista agrícola brasileiro cresceu consideravelmente no início

do século XX em virtude da necessidade de comercialização da produção e do abastecimento

dos centros urbanos industriais, que cresciam rapidamente devido à industrialização. Até

então o cooperativismo era um instrumento dos pequenos produtores para enfrentar a ação

dos intermediários durante o período de comercialização dos excedentes da safra. O objetivo

inicial era a defesa da remuneração do trabalho familiar, uma vez que a agricultura

camponesa, nessa fase, não possuía nenhum instrumento de proteção (CORADINI &

FREDERICO, 1982).

A partir da década de 1930, com a crise econômica mundial, que provocou, entre

outras ações, o fechamento do comércio mundial, fazendo com que o café brasileiro ficasse

sem mercado, houve a necessidade de redirecionar o modelo de desenvolvimento econômico

brasileiro, no sentido de substituir a importação de bens duráveis pela industrialização. Isso

resultou, em 1932, na promulgação do Decreto Federal 22.239, que disciplinava a

constituição e o funcionamento das cooperativas, facilitando e simplificando a sua fundação e

isentando-as de uma série de impostos. A partir de então, o governo não só passou a regular a

constituição de cooperativas, como procurou a incentivar a sua criação e expansão

(VALADARES, 1990).

Assim, o cooperativismo agrícola deixou de ser um movimento legítimo dos

produtores, passando a ser um instrumento governamental, que procurava a organização dos

produtores agrícolas de acordo com os padrões do modelo de desenvolvimento econômico

adotado pelo governo.

Segundo a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) em 2008, o país já

contava com cerca de 4.000 cooperativas congregando o sistema, em 11 diferentes segmentos,

com mais de 3.700.000 associados. O segmento mais importante do cooperativismo brasileiro

ainda é o do cooperativismo agropecuário de produção, que contribui muito para o

crescimento econômico das localidades onde as unidades cooperativas estão inseridas.

A Tabela 1 mostra a participação das cooperativas de produção agropecuária

brasileiras na produção de diversos produtos. A participação das cooperativas agrícolas na

produção de alimentos é bastante significativa, principalmente na produção de trigo, cevada,

aveia, algodão e soja. Este fato evidencia a importância das cooperativas na produção

agropecuária brasileira.

As cooperativas de produção, cooperativas operárias de produção ou cooperativas de

trabalhadores, segundo Pinho (1966), baseiam-se em uma espécie de síntese do modelo

rochdaleanismo e dos sistemas societários de Buchez, de Fourier (livre associação do

trabalho, talento e capital), de Louis Blanc e outros. Aos poucos foram se estruturando, com o

objetivo de eliminar o patrão, suprimir o assalariado e dar aos operários a posse dos

instrumentos de produção e o direito de disposição do produto de seu trabalho. Nesse ramo do

Page 8: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

cooperativismo, estão concentradas as cooperativas dedicadas à produção de um ou mais tipos

de bens e produtos, os meios de produção, explorados pelo quadro social, pertencem à

cooperativa e aos cooperados que formam o seu quadro diretivo, técnico e funcional.

TABELA 1 - Participação das cooperativas brasileiras na produção agrícola Produtos Agrícolas %

Trigo 62,2 %

Cevada 44,2 %

Aveia 39,2 %

Algodão 38,9 %

Soja 38,4 %

Batata 36,1 %

Suínos 31,1 %

Café 28,0 %

Alho 22,5 %

Uva 19,2 %

Milho 16,7 %

Arroz 11,4 %

Feijão 11,2 %

Fonte: OCB, in Folha de Londrina, Caderno Economia, 23/12/96

Nesse contexto, na próxima seção são feitas algumas considerações acerca do

cooperativismo paranaense.

6. O COOPERATIVISMO PARANAENSE

O Paraná é um Estado privilegiado, não só em aspectos naturais, como também em

produtivos. Seus campos férteis produzem um quarto da produção de alimentos (grãos) do

país. Os agricultores, através de uma ação consciente e preservacionista em lavouras de soja,

milho, trigo, café, algodão, feijão e arroz, entremeadas com criações de bovinos, de suínos, de

aves, com reservas florestais e com rios, garantem produtos puros de origem. O Estado é

exportador de matérias-primas como soja, farelo, óleo, café, milho, fios de algodão e de seda,

carnes de aves, de bovinos e de suínos, onde os produtos industrializados já representam

metade do valor exportado (COAMO, 2009).

Segundo a COAMO (2009), o cooperativismo paranaense deitou suas raízes nos

pioneiros esforços cooperativistas nas comunidades de imigrantes europeus, que procuraram

organizar suas estruturas de compra e venda em comum, além de suprir suas necessidades de

educação e lazer, através de sociedades cooperativistas. Foram os imigrantes que deram

significativo impulso ao cooperativismo estadual com as experiências bem sucedidas das

cooperativas de colonização, como Witmarsum, de Palmeira; Agrária, de Entre Rios; Batavo

e Castrolanda, de Castro, e Capal, de Arapoti, hoje verdadeiros exemplos de comunidades

rurais perfeitamente urbanizadas, economicamente prósperas e socialmente integradas às

condições de vida urbano-industrial no país.

Apoiado na doutrina e na filosofia cooperativista universal, o cooperativismo

paranaense contava, em 2008, com 500.129 mil cooperados, organizados em 238 cooperativas

registradas na Organização das Cooperativas do Estado do Paraná – OCEPAR (criada em

1971). Essas cooperativas agrupavam mais de 1,5 milhão de postos de ocupação, 55 mil

empregos diretos e envolvia 2,2 milhões de pessoas, o que equivalia a 20% da população

paranaense ligada ao cooperativismo em 2008. As cooperativas também participaram dos

diversos ciclos econômicos pelos quais o Paraná passou, expandiram fronteiras agrícolas e

Page 9: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

passaram a desenvolver-se também nas cidades. Atualmente, no Estado, existem cooperativas

nas mais diferentes áreas (saúde, trabalho, serviços, crédito, consumo, educação, habitação), e

até no ramo dos transportes, o mais jovem do cooperativismo brasileiro, que se articula para

tentar ser a vanguarda de um mercado que demanda cada vez mais soluções profissionais e

especializadas (OCEPAR, 2009).

Para compreender a capacidade empreendedora das cooperativas paranaenses, é

preciso voltar à década de 1970, quando praticamente toda a economia estava voltada para a

produção agropecuária. Naquela década as cooperativas se reorganizaram e passaram a ter

participação crescente na economia paranaense, baseada fortemente na produção

agropecuária. Também passaram a atuar no setor agroindustrial e absorveram diversas

empresas agropecuárias em liquidação, mostrando sua aptidão empreendedora e seu

compromisso com o setor, garantindo o recebimento e o processamento da produção dos

cooperados. Responsabilidade social e ambiental, geração de emprego e renda, promoção de

melhoria da qualidade de vida das pessoas, dinamização da economia e a expansão desta nas

comunidades onde está inserida, essa é a missão do cooperativismo paranaense. Inúmeras

ações objetivam a integração, a educação e a formação de milhares de cooperados e

colaboradores das cooperativas. Os investimentos sociais do sistema cooperativista

paranaense somam mais de 2 bilhões de reais/ano, segundo a OCEPAR. A responsabilidade

social das cooperativas é exercida através de projetos voltados ao aprimoramento cultural

artístico de lazer, saúde e às questões assistenciais, bem como em novos projetos e

tecnologias para melhorar os processos produtivos e agregar valor aos produtos e serviços dos

cooperados (OCEPAR, 2009).

Tabela 2 – Cooperativas do Paraná Registradas na OCEPAR – Dezembro 2008 Ramo Cooperativas Cooperados

Agropecuário 81 123.311

Crédito 66 346.695

Saúde 33 10.847

Transporte 19 2.373

Educacional 15 2.881

Trabalho 09 4.657

Infraestrutura/Eletrificação rural 08 7.985

Turismo e lazer 03 292

Consumo 01 950

Habitacional 01 96

Mineral 01 22

Produção 01 20

Total 238 500.129

Fonte: OCEPAR, SEAB

Como se pode observar na Tabela 2, as cooperativas agropecuárias (como é o caso da

C.Vale, objeto de estudo deste artigo) são as de maior número no Estado do Paraná e,

segundo a OCEPAR (2008), cerca de um terço dos produtores rurais paranaenses são

cooperados. A expressiva participação dos pequenos e médios produtores com área de até 50

hectares – nas cooperativas agropecuárias, representando 70% de seu total de 123.311

cooperados -- evidencia a importância das cooperativas para essa faixa de produtores. A

integração das cooperativas e a agregação dos interesses dos produtores rurais permitiram a

montagem de estruturas de armazenagem, apresentando mais de 54% de toda a capacidade de

estocagem instalada no Paraná (OCEPAR, 2008).

Page 10: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

São importantes instrumentos de difusão de tecnologias e implementadoras de

políticas desenvolvimentistas, como a difusão de crédito rural, armazenagem, manejo

integrado de pragas, manejo e conservação de solos, industrialização, entre outros. Além

disso, em vários municípios paranaenses -- como a C. Vale em Palotina, a Copacol em

Cafelândia, a Copagril em Marechal Cândido Rondon e a Lar em Medianeira --, essas

cooperativas assumem o papel de empresas mais importantes, as maiores empregadoras e

também as principais geradoras de receitas (OCEPAR, 2008).

Tabela 3 - Participação das Cooperativas na Produção Agropecuária do Paraná – Safra

2006/2007 Produtos Produção do Paraná (em toneladas) Participação das cooperativas – (%)

Cevada 120.520 100,0

Trigo 1.948.869 87,4

Soja 11.750.579 72,5

Algodão (em caroço) 25.903 55,8

Leite comercializado (1000 litros) 2.500.000 48,0

Milho (*) 14.258.086 46,3

Suínos 448.140 36,3

Triticale 93.340 35,8

Canola 4.236 33,9

Aves 2.130.000 23,6

Café em coco 97.389 19,0

Cana-de-açúcar 45.887.548 18,5

Aveia 288.793 13,3

Maçã 43.425 12,5

Arroz 174.258 8,8

Feijão 766.792 8,2

Mandioca 3.365.003 3,4

Fonte: OCEPAR, SEAB e IBGE, 2008.

(*) Participação das cooperativas na produção e comercialização

Conforme mostra a Tabela 3, as cooperativas participam ativamente na produção das

principais commodities do Estado, como no caso da soja com 72,5% e do milho com 46,3%,

mas também em vários outras atividades agropecuárias, como na produção de cevada,

representando 100% e no leite com 48%.

As cooperativas agropecuárias são muito importantes no sentido de que estão sempre

procurando implantar novos projetos, com o objetivo de agregar valor aos produtos primários,

aumentando assim, consideravelmente, o valor desses no mercado. O aumento da renda do

cooperado, que, por sua vez, pode reinvestir na atividade produtiva, garante, dessa forma, a

oferta de matérias-primas em níveis permanentes. É nesse contexto que ocorre o

desenvolvimento da comunidade na qual a cooperativa está inserida (OCEPAR, 2008).

O cooperativismo agrícola (agropecuário) é o que mais se tem destacado na geração

de renda e nas exportações brasileiras de produtos básicos agropecuários e

agroindustrializados (OCEPAR, 1996-a). Essas cooperativas, as agropecuárias, são as

responsáveis por exportar produtos elaborados para aproximadamente 70 países, o que gerou

ao Estado do Paraná, em 2008, uma receita superior a 1,5 bilhão de dólares (REVISTA

OCEPAR, 2009).

Na próxima seção serão abordadas informações a respeito da cooperativa de produção

agropecuária C.Vale, que, assim como algumas outras cooperativas paranaenses do mesmo

ramo, deixou de direcionar seus objetivos apenas à produção de alimentos e se inseriu na

Page 11: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

industrialização da produção, agregando mais esta atividade ao leque de serviços prestados a

seus cooperados (MENEGÁRIO, 2000).

7. O HISTÓRICO DA COOPERATIVA C.VALE

Como já foi enfocado acima, a origem do cooperativismo paranaense está ligada aos

grupos de imigrantes europeus no Sul do Brasil. O processo de colonização do extremo-oeste

paranaense, mais especificamente falando da colonização de Palotina (onde está a sede da

Cooperativa C.Vale), envolveu vários tipos de interesses, de cunho político-ideológico,

econômico-empresarial e também religioso, presentes durante o governo de Getúlio Vargas de

1930 a 1945 (FREITAG, 2001).

Para Freitag (2001), uma das características essenciais do extremo-oeste paranaense

foi o processo racional de ocupação e de uso do solo agrícola a partir da década de 1930. As

atitudes nacionalistas do governo Vargas, atreladas à sua política de segurança nacional,

encontraram terreno fértil junto aos grupos de intelectuais na época, que foram os

responsáveis, então, por construir aquilo que ficou conhecido como o sentimento de

brasilidade para a nação em seus limites territoriais, especialmente aqueles contíguos às

fronteiras internacionais.

Cooptados pela política varguista, esses intelectuais trabalharam em conjunto, com o

único objetivo – construir uma nacionalidade forte e coesa. Deram, assim, ao Estado Nacional

uma fisionomia econômica e sociopolítica no sentido de nação homogênea. Suas teorias

transformaram os territórios, considerados vazios demográficos, em espaços a serem

ocupados através de uma cruzada nacional.

A política de Marcha para Oeste foi um preciso exemplo desse processo. Foi política

elaborada crucialmente depois do golpe que instituiu o Estado Novo em 1937, visava firmar a

imagem de uma nação que tinha sua própria autonomia. A região do extremo-oeste

paranaense participou efetivamente desse processo chamado de Marcha para Oeste, com

políticos, pensadores e empresários (especialmente do Sul do país), já em meados da década

de 1930, considerando esta região como vazia, demograficamente falando, sendo assim uma

fronteira de importância vital a ser ocupada e colonizada para assegurar a segurança nacional.

Mesmo muito antes, ao final do século XIX, houve a fundação da Colônia Militar de

Foz do Iguaçu, com o objetivo na época de ocupar e de nacionalizar essa fronteira. Foi nesse

momento então que ocorreu o primeiro contato oficial brasileiro com as obrages -- grandes

unidades produtivas estrangeiras de extração de madeira e de erva-mate, produtos explorados

e remetidos aos Mercados do Prata por grupos econômicos argentinos. Esses grupos se

introduziram na região e possuíam o capital necessário para o desenvolvimento das atividades

de exploração em suas propriedades, enquanto que os paraguaios faziam parte da mão de obra

dessas grandes unidades produtivas. Argentinos e paraguaios, naquele momento,

representavam um grande perigo às instituições nacionais e à política nacionalista. Aliados

então, os governos federal e paranaense tinham como objetivo principal nacionalizar essa

região de fronteira internacional. A ocupação dos vazios demográficos no extremo-oeste

paranaense ocorreu, no entanto, décadas depois e feita principalmente por descendentes de

ítalos e teuto-brasileiros sulistas, que tinham por tradição o trabalho em pequenas

propriedades policultoras. Foram eles a base fundamental para a realização das políticas

nacional e estadual de Marcha para Oeste. A ocupação da fronteira extremo-oeste paranaense

Page 12: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

ocorreu como expansão interna. A política getulista forneceu o substrato ideológico pela via

do nacionalismo, provocada pela expressiva presença de estrangeiros nessa área. E, mesmo

que a efetiva construção e ocupação do território hoje constituído pelo município de Palotina

tenha se concretizado, somente na década de 1950, ele foi resultado das preocupações que

foram apontadas e que tiveram início na década de 1930 (FREITAG, 2001).

Nesse processo (a partir da década de 1930) estavam inseridas empresas colonizadoras

de capital privado. A Companhia Pinho e Terras Ltda. foi a empresa que colonizou a região

de Palotina. A empresa procurou criar elementos atrativos à migração, tendo em vista a

estrutura de povoamento revestida de um teor sociocultural, e um grande instrumento

utilizado foi a propaganda. Era preciso despertar nas pessoas o interesse em adquirir terras

nessa região, criaram-se expressões do tipo “nova terra”, “novo mundo”, reportagens em

jornais e correspondências também foram usadas como tática de propaganda, mas é

importante frisar que o interesse dos colonos se deu também por meio de um canal condutor

alimentado pela religiosidade. O catolicismo era uma das exigências básicas da Companhia,

que se comprometia com os colonos a fim de fornecer, aos núcleos colonizatórios, assistência

religiosa e educacional (FREITAG, 2001).

A colonização de Palotina iniciou-se no ano de 1953, quando ainda pertencia ao

município de Guaíra. Os seus pioneiros eram descendentes de alemães e de italianos e vieram

principalmente dos Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. O nome Palotina é

uma homenagem aos Padres Palotinos (religiosos e corretores uniram fé à atividade

econômica e construíram uma sociedade singular, em consonância com os interesses

econômicos da empresa colonizadora Pinho e Terras) (BIPP, 2009).

O crescimento acelerado da população permitiu a sua oficialização enquanto

município sob a Lei Estadual nº 240, de junho de 1960. O primeiro censo de Palotina,

realizado em 1970, mostrou um número de 43.005 pessoas no município, das quais 5.252

residiam na zona urbana e 37.753 na zona rural (BIPP, 2009).

A falta de locais para armazenar a produção, as dificuldades para o escoamento da

safra e a ausência de assistência técnica levaram um grupo de 24 agricultores a fundar, em 7

de novembro de 1963, a Cooperativa Agrícola Mista de Palotina Ltda. (primeiramente

denominada Campal). Mas obstáculos no acesso ao crédito impediram que a Campal iniciasse

sua estruturação. O início efetivo das atividades da cooperativa ocorreu em 1969, com o

recebimento de trigo em armazém de um moinho de Palotina. Em 1970 foi finalizada a

construção do primeiro armazém da Campal. O rápido crescimento da produção levou a

Campal a iniciar a fase de estruturação física, com a construção de unidades para recebimento

de cereais no município de Palotina.

Com a divisão territorial da região Oeste entre as cooperativas, a Campal passou a

atuar além das fronteiras do município, o que levou os associados a modificar a razão social

da empresa, em 1974, para Cooperativa Agrícola Mista Vale do Piquiri Ltda. (Coopervale).

Com uma grande produção de trigo, a Coopervale implantou, em conjunto com outras

cooperativas, o Moinho Cotriguaçu, em 1992 (C. VALE, 2009).

8. C.VALE E A SUA AGROINDUSTRIALIZAÇÃO

A C.Vale é uma cooperativa de produção agropecuária com atuação no Paraná, Santa

Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraguai. As atividades da cooperativa

Page 13: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

concentram-se no segmento agroindustrial, e destacam-se na produção de soja, milho, trigo,

mandioca, leite e suínos. Atua na prestação de serviços, com mais de 150 profissionais que

dão assistência agronômica e veterinária aos associados. Para manter os cooperados

atualizados tecnologicamente, desenvolve cursos, palestras, treinamentos e dias de campo.

Também financia a produção, garantindo crédito aos cooperados, especialmente aos

pequenos produtores. A empresa também comercializa insumos, peças, acessórios e revende

máquinas agrícolas, assegurando preços mais competitivos aos associados. Produz semente de

soja em Santa Catarina, que é comercializada em todo o Brasil. Além disso, a cooperativa

mantém uma rede de supermercados, com seis lojas no Paraná e no Mato Grosso.

A cooperativa incentiva a produção de leite como alternativa de renda para seus

associados. Desde 1983, a cooperativa mantém um Departamento Veterinário para orientar os

pecuaristas sobre manejo e tecnologias que melhorem o desempenho da atividade. A

produção de leite é entregue à Frimesa, em Medianeira (PR), empresa da qual a C.Vale é

sócia, que o industrializa e comercializa.

Foi a partir de 1995 que a cooperativa colocou em prática um plano de modernização

destinado a tornar a empresa mais competitiva no mercado agroindustrial e a iniciar o

processo de agregação de valores aos produtos primários.

A agroindustrialização começou em outubro de 1997, quando foi inaugurado o

complexo avícola, com alta tecnologia para a produção de frangos. Foi o primeiro sistema de

integração avícola brasileiro, em escala comercial, a utilizar processos automatizados para o

controle de ambiência. Outro aspecto importante da atividade está na rastreabilidade da cadeia

produtiva. A cooperativa mantém um sistema informatizado que permite o acesso aos

procedimentos utilizados para a produção da matéria-prima (soja e milho), passando pela

fabricação da ração, manejo e industrialização das aves. O objetivo é garantir a segurança

alimentar aos consumidores da carne de frango.

A agroindustrialização ampliou-se em 2002 com o início das operações de uma

amidonaria em Assis Chateaubriand. Em 21 de novembro de 2003, uma alteração estatutária

mudou a razão social de Cooperativa Agrícola Mista Vale do Piquiri Ltda. (Coopervale) para

C.Vale -- Cooperativa Agroindustrial. Também nesse ano a cooperativa colocou em operação,

uma Unidade Produtora de Leitões (UPL) no Distrito Floresta, em Palotina. A unidade abriga

3.470 matrizes, que produzem 1.600 leitões por semana, num total de 84.000 animais/ano. Os

animais são entregues aos associados, que fazem a engorda e os enviam para a

industrialização. Na fase final, a UPL terá 14.200 matrizes e produzirá 1.420 leitões por dia.

Assim, a C.Vale dispõe de um processo de crescimento e expansão contínua, procurando

sempre diversificar suas atividades tendo em vista conquistar espaços no mercado e ampliar

as margens de lucros.

Em 2004 começaram as obras de ampliação do abatedouro de aves (inaugurado em

outubro de 1998), e também a construção da indústria de termoprocessados de aves, obras que

foram inauguradas no dia 8 de abril de 2005. A capacidade de produção passou de 150 mil

para 500 mil aves/dia. Essa expansão beneficiou o município de Palotina, principalmente

quando se fala em ocupação de mão de obra, como será apresentado na próxima seção.

Conforme foi apresentado, a C.Vale financia a produção, garantindo crédito aos

cooperados, comercializa insumos, peças, acessórios, revende máquinas agrícolas, produz

sementes de soja e mantém uma rede de supermercados, ou seja, trata-se de uma empresa com

diversificação horizontal.

Page 14: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

O desempenho da C.Vale, nos cinco primeiros meses de 2009, está sendo superior ao

do mesmo período do ano anterior. Os indicadores econômicos e sociais mostram que, apesar

da crise econômica internacional e dos problemas climáticos sobre a safra de verão em 2009,

a cooperativa segue crescendo, embora a um ritmo menor que em 2008. Esse conjunto de

fatores permitiu que a C.Vale fechasse os cinco primeiros meses de 2009 com faturamento

bruto (soma da vendas) de R$ 961 milhões, cerca de 8% a mais que no mesmo período de

2008.

A melhoria do desempenho econômico está sendo acompanhada por benefícios

sociais. Em 2009, 220 novos postos de trabalho já foram abertos, o que elevou para 4.930 o

número total de funcionários da cooperativa. O número de associados subiu para 8.296 e a

arrecadação de tributos alcançou R$ 35,5 milhões (REVISTA C.VALE, 2009).

Esses números apresentam o cenário positivo analisando a cooperativa como um todo,

com sua atuação em todos os municípios de abrangência. Cabe perguntar: -- Especificamente

em Palotina, quais foram os impactos sociais (na geração de empregos) e econômico, gerados

pela C.Vale? A próxima seção objetiva responder a esses questionamentos.

9. CARACTERIZAÇÃO SOCIOECONÔMICA DE PALOTINA

Conforme mencionado em seção anterior, o município de Palotina foi emancipado na

década de 1960. A partir dos dados disponibilizados pelos censos demográficos do Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o município perdeu parte significativa de sua

população a partir de 1970.

Gráfico 1 – População total, urbana e rural do município de Palotina – 1970/2007

43.005

28.253

30.705

24.78325.771

27.545

5.214

12.854

19.70018.537

20.740

23.086

37.791

15.399

11.005

6.2465.031 4.459

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

45.000

50.000

1970 1980 1991 1996 2000 2007

Total Urbana Rural

Fonte: IBGE, 2009.

Conforme mostra o Gráfico 1, no ano de 1970, a maior parte dos 43.005 habitantes

estavam situados na zona rural do município, representando cerca de 87,87% do total. Esse

cenário começa a se alterar rapidamente a partir dessa década. Em 1980, duas características

Page 15: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

são visualizadas: a primeira é a redução da população total em 34,30% em relação a de 1970 e

a segunda é o aumento da participação da população urbana no total, passando de 12,12% em

1970 para 45,50% em 1980.

A partir de 1980, a população urbana ganha cada vez maior destaque, sendo superior à

população rural já em 1991. Apesar do aumento da população total de 1980 a 1991, e da

diminuição posterior em 1996, de 1996 até 2007 a população total vem crescendo de forma

contínua. Nesse período, o crescimento da população total foi de 11,14%, sendo o

crescimento da população urbana a maior responsável por esse desempenho. No mesmo

período, a população urbana apresentou crescimento de 24,54%, enquanto a população rural

diminuiu em -28,61%.

Quando se analisa o comportamento do número de empregados formais do município

de Palotina, verifica-se uma estabilidade do crescimento do total de empregados até o ano de

1997. Comparando o desempenho setorial e total de 1985 até 1997, verifica-se que o total de

empregados diminuiu -19,16%, e os desempenhos setoriais foram, na sua maioria, modestos.

Em 1996, os setores que mais empregavam eram: o comércio com 782 empregados, a

administração pública com 640 e a agropecuária com 506.

Tabela 4 - Número de empregados formais no município de Palotina, por setores – 1985-2008

Ano

Ind. de

prod.

minerais

não met.

Ind.

metal. e

mec.

Ind. de

prod.

aliment.

Const.

civil

Outras

ativ. ind. Comércio

Transp.

e

comum.

Serv. de

aloj. e

aliment.

Adm.

Pública Agrop.

Outras

ativ.

terciárias

Total

1985 45 58 27 52 152 1.518 126 245 625 444 444 3.736

1986 73 86 41 83 160 1.509 146 248 626 458 398 3.828

1987 58 95 37 127 143 1.448 185 255 646 445 596 4.035

1988 68 93 123 76 153 1.349 184 274 652 433 804 4.209

1989 65 83 55 65 157 1.403 205 249 739 451 762 4.234

1990 61 73 66 64 168 1.185 193 392 719 390 740 4.051

1991 45 36 67 29 148 1.064 190 403 764 367 701 3.814

1992 49 37 118 21 140 963 144 272 565 374 745 3.428

1993 60 46 142 39 164 951 150 250 582 363 1.044 3.791

1994 59 46 99 94 158 1.045 160 229 594 566 1.005 4.055

1995 55 47 68 104 92 934 145 612 464 608 309 3.438

1996 47 58 175 74 98 782 147 154 640 506 339 3.020

1997 68 72 530 114 127 901 135 276 438 544 346 3.551

1998 68 69 184 92 135 1.688 124 250 418 332 393 3.753

1999 58 73 174 91 127 1.793 135 259 424 331 359 3.824

2000 44 97 879 77 131 1.275 163 306 428 415 377 4.192

2001 41 129 1.392 53 175 1.389 165 303 446 539 423 5.055

2002 50 193 1.586 83 212 1.520 182 382 504 557 463 5.732

2003 67 160 1.692 122 215 1.581 210 384 504 555 496 5.986

2004 65 160 1.901 207 229 1.857 235 408 544 547 616 6.769

2005 78 107 2.872 182 215 1.861 253 430 596 578 603 7.775

2006 98 68 2.679 179 309 1.873 278 411 581 550 539 7.565

2007 109 101 3.160 188 340 1.988 310 410 637 613 503 8.359

2008 91 125 3.302 134 312 2.144 333 447 641 638 540 8.707

Fonte: RAIS, 2009.

A partir do ano em que a Cooperativa C.Vale inaugura seu complexo avícola, a

situação do emprego setorial começa a se alterar. Inicialmente é possível verificar um

aumento contínuo no número total de empregados. Somente entre 1996 até 1997 esse total

cresceu 17,58%, estimulado principalmente pelo setor das indústrias de produtos alimentícios,

que apresentaram 202,86% de aumento nesse mesmo período.

Page 16: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

O interessante é que o aumento no setor das indústrias de produtos alimentares foi

acompanhado pelo desempenho positivo de outros setores, como, por exemplo, os setores do

comércio, de transporte e de comunicação, de serviços de alojamento e alimentação, e da

agropecuária.

O resultado desse processo foi que em 2008 a hierarquia dos setores que mais

empregavam em Palotina se alterou completamente. Nesse ano, a ordem dos principais

setores era: as indústrias de produtos alimentares com 3.302 empregados (ou 37,92% em

relação ao total), o comércio com 2.144 (ou 24,62%), o setor da administração pública com

641 (ou 7,36%), e o setor da agropecuária com 638 empregados (e representação de 7,33% do

total).

De 1997 a 2008 todos os setores apresentaram crescimento no número total de

empregados. Os principais destaques foram para o setor das indústrias de produtos

alimentares com 523,02%, das outras atividades industriais com 145,67%, do setor de

transportes e comunicação com 146,67% e do comércio com 137,96%.

A justificativa para o crescimento associado dos setores supracitados é encontrada na

afirmação de Hirschmann (1985), que identifica os conceitos de encadeamentos para frente e

para trás. Esse autor afirma que esses encadeamentos se evidenciam principalmente através do

crescimento interdependente e respectivo de certas indústrias fornecedoras e compradoras de

insumos de uma determinada indústria (central), bem como dela própria. Hirschmann reforça

que a importância desses efeitos deveria ser analisada por meio de dois enfoques principais: o

primeiro diz respeito aos produtos potencialmente induzidos em outros setores pelo

investimento inicial, enquanto que, no segundo, deveriam ser analisadas as probabilidades de

que esses novos investimentos, corporificados em ampliações da capacidade das empresas ou

na criação de outras, realmente aconteçam.

Sendo assim, ao buscar caminhos que possam apontar os encadeamentos, o autor

propõe que os encadeamentos para frente de um determinado setor sejam medidos pela

proporção de seu produto total destinado às outras indústrias, e não à demanda final, enquanto

que, para o efeito de encadeamento para trás, através da medida da porcentagem de seu

produto, que representa compras de outros produtos do mesmo setor e/ou de outros setores

(HIRSCHMAN, 1961, p. 150-161).

O autor menciona ainda que o caminho mais eficiente de crescimento deve ser aquele

onde possam ser combinados os efeitos de encadeamento para trás e para frente

(HIRSCHMAN, 1961). A partir disso, entende-se que encadeamento para trás é o resultado de

um crescimento autônomo de um determinado setor, motivado basicamente por causa de um

novo investimento ou pelo aproveitamento da capacidade produtiva previamente existente.

Nesse tipo de encadeamento existe a indução do crescimento de outros setores a ele

relacionados, graças, principalmente, às pressões de demanda. Nos encadeamentos para

frente, o motivo de sua ocorrência é a existência de um aumento da produção de um

determinado fator que provoca a elevação da produção de outros setores em virtude do

excesso de oferta do produto do setor inicial (RIPPEL, 1995).

No caso analisado neste artigo, pode-se fazer uma analogia com a teoria apresentada

de Hirschmann. A partir do momento em que a C.Vale realiza os investimentos necessários

para a construção do seu complexo avícola e começa a utilizá-lo, ela necessita continuamente

da matéria-prima, de transportar e de comercializar os produtos finais e, com isso, dinamiza o

setor rural, que produz os frangos e os suínos, e o setor de comércio e serviços para

Page 17: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

transportar os produtos. Além disso, os próprios setores rural e terciário vão aumentar sua

demanda de produtos diversos, e, com isso, dão continuidade nesse efeito multiplicador.

Os gráficos ajudam a comprovar essa afirmação, mostrando que, na prática, em

Palotina ocorreram efeitos de encadeamentos para trás e para frente após a implantação do

Complexo Avícola da C.Vale no município.

Gráfico 2 – Produto Interno Bruto (PIB) setorial do município de Palotina – 1970/2006

0,00

50.000,00

100.000,00

150.000,00

200.000,00

250.000,00

300.000,00

350.000,00

400.000,00

1970 1975 1980 1985 1996 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

R$

de 2

00

0 (

mil

)

PIB Total PIB Indústria PIB Serviços PIB agrop.

Fonte: IPADATA, 2009.

O Gráfico 2 mostra o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) do município de

Palotina entre 1970 a 2006, e notam-se algumas características interessantes do município. A

primeira delas era a expressiva participação do PIB agropecuária em 1970 e a pequena

participação do setor industrial nesse mesmo ano.

A segunda é a inversão da hierarquia dos principais setores responsáveis pela

produção setorial municipal no ano de 1996. A partir desse ano, ganha destaque, e sempre

crescente, o setor dos serviços, seguido pelos setores agropecuário e industrial, característica

que continua até o ano de 2003.

De 2003 em diante, o setor da agropecuária perde cada vez mais sua participação no

PIB total, sendo compensado pelo crescimento contínuo do PIB industrial e de serviços, mas

que, mesmo assim, não conseguem evitar a diminuição do PIB total a partir desse ano. Essas

informações mostram que, se não fosse o comportamento do PIB industrial, e de serviços, o

desempenho do PIB total de Palotina poderia ter sido muito mais negativo. Partindo do

pressuposto de que a C.Vale é uma das indústrias que mais emprega e que mais gera

produção, pode-se afirmar que ela tem ajudado o município a manter o dinamismo dos setores

industrial e de serviços.

Page 18: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

10. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A história do cooperativismo faz parte da evolução da humanidade. Ela se revela

diante das dificuldades e lutas que os homens encontraram e travaram no dia a dia para sua

sobrevivência e defesa de sua dignidade. É uma história ligada à economia daqueles que

cooperam, que, apoiados em sua doutrina, buscam a produção e a distribuição daquilo de que

necessitam ou que desejam para viver. O cooperativismo surge como uma atividade humana

concreta, que leva a marca histórica de cada época em que ela ocorre. Por isso, pode-se falar

de diferentes práticas cooperativas ao longo da história da Humanidade.

A formação do pensamento cooperativista representa a busca de construir um

cooperativismo autêntico, fiel aos seus princípios e adaptável sempre às mudanças e às

transformações que ocorrem no meio político, social e econômico das nações. Tal atualização

é coordenada pela ACI, que procura acompanhar os princípios cooperativistas estabelecidos

em Rochdale, mesmo dentro de uma economia de mercado.

Embora não constituindo um “remédio milagroso para todos os males”, o

cooperativismo produtivo objetiva reunir homens (e não capitais) e, por isso, permanece

aberto a qualquer um, sem discriminação de religião, de raça ou de patrimônio. A

preocupação com o bem-estar do associado, essencial na doutrina cooperativista, visa

melhorar as condições de vida do homem e não simplesmente criar uma organização

econômica.

Essa seria a diferença básica entre as cooperativas e as empresas capitalistas, que se

preocupam primeiramente com o lucro. As cooperativas, ao contrário, se preocupam com o

homem, sem se importar com o capital de que ele dispõe, o seja, o capital do associado não

influi no exercício dos seus direitos. O cooperado pode utilizar os serviços da sociedade; pode

votar e ser votado e isso significa que, mesmo tendo o menor número de cotas-partes, pode vir

a ser administrador da cooperativa.

A distribuição dos lucros na sociedade capitalista é proporcional ao capital de cada

um; na cooperativa, as sobras são distribuídas em proporção às operações praticadas pelos

associados com a cooperativa, isto é, de acordo com a utilização dos serviços. Disso decorre

uma posição moral bem definida por parte da cooperativa em suas operações, mesmo com

terceiros. Os associados procuram fazer uma rigorosa fiscalização, seja através do constante

contato com a cooperativa, seja nas assembleias gerais ou ainda através do conselho fiscal,

que não é, como nas sociedades anônimas (mero apêndice da diretoria), com seus membros

escolhidos entre não acionistas, amigos e empregados. O conselho fiscal das cooperativas é

formado por associados que têm suas responsabilidades perfeitamente definidas perante a

sociedade e os demais associados.

Todos esses elementos fazem da cooperativa uma sociedade única, que alia os

objetivos econômicos aos sociais e que atua inspirada em princípios morais, ou seja, os

princípios de Rochdale, não porque tenham sido apenas os Pioneiros de Rochdale que os

criaram, mas porque foram eles que os formularam como verdadeiro programa doutrinário,

posteriormente aperfeiçoado pela prática e pelos estudos da doutrina.

Além de descrever os aspectos gerais do cooperativismo, este artigo procurou

também fazer uma análise a respeito das relações que existem entre cooperativismo e

desenvolvimento econômico por meio do estudo de caso da cooperativa C.Vale. Essa

instituição é vista como uma das principais agentes geradoras de desenvolvimento econômico

Page 19: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

em Palotina-PR, pois promove renda aos associados e estes, por sua vez, fazem a utilização

dessa renda na própria região. Isso pode ser observado com maior intensidade a partir de

1997, no número de empregados formais, quando houve a instalação do Complexo Avícola. A

cooperativa também é a empresa que mais gera postos de trabalho e arrecadação de impostos

no município de Palotina. No contorno da verticalização da produção, a cooperativa em

questão ainda propicia, de forma direta ou indireta, o desenvolvimento social e econômico da

localidade onde está inserida. Sendo assim, ao analisar o histórico da C.Vale, foi possível

perceber que, além do aspecto econômico e comercial (principal motivo pelo qual o produtor

se torna associado), o vínculo torna-se viável também por laços que não são apenas de âmbito

econômico, mas que perpassam esse espaço, expandindo-se para o social. Assim, para

garantir a manutenção do cooperado como associado dessa cooperativa, foi necessária a

criação tanto da confiança como da credibilidade, que se complementam e garantem os

vínculos entre cooperativa e cooperado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BATALHA, M. O. (Coord.). Gestão agroindustrial. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

BIPP: Boletim Informativo da Prefeitura Municipal de Palotina. História de Palotina. Circulação

Interna, 2009.

CORADINI, O. L.; FREDERICO, A. A agricultura, cooperativas e multinacionais. Rio de Janeiro:

Zahar, 1982. p. 184.

C. Vale – Cooperativa Agroindustrial. Disponível em: <http://www.cvale.com.br>. Acesso em:

várias datas de 2009.

COAMO – Agroindustrial Cooperativa. Disponível em: <http://www.coamo.com.br/historia_do_

cooperativismo.html>. Acesso em: 2009.

COOPERATIVAS DE TRANSPORTES – Na direção Certa. Revista Paraná Cooperativo. Ano 5, n.

50, jul. 2009.

DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário jurídico. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

FREITAG, L. da C. Fronteiras perigosas: migração e brasilidade no extremo-oeste paranaense (1937

– 1954). Cascavel, PR: Edunioeste, 2001.

GASTALDI, J. P. Elementos de economia política. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1987.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

HIRSCHMAN, A. A economia como ciência moral política. São Paulo: Brasiliense,

1986.

_________. Desenvolvimento por efeitos cadeia: uma abordagem generalizada. ln: SORJ, Bernard et

alii. Economia e movimentos sociais na América Latina. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 31-79.

Page 20: O COOPERATIVISMO DE PRODUÇÃO E A CONTRIBUIÇÃO … cooperativismo... · Com o aumento da industrialização, o trabalho ... a exploração coletiva das terras poderia facilitar

Cascavel – PR – 21 a 23 de junho de 2010

_________. Estratégia do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura

Econômica, 1961.

INTERCOOPERAÇÃO – Parcerias estratégicas rumo ao futuro. Revista Paraná Cooperativo. Ano

4, n. 49, maio/jun. 2009.

MAILLAT, D. Globalização, meio inovador e sistemas territoriais de produção. Revista

Internacional de Desenvolvimento Local. Campo Grande, v. 3, n. 4, p. 9-16, 2002 .

MAZZALI, L. O processo recente de reorganização agroindustrial: do complexo à organização

“em rede”. São Paulo: UNESP, 2000.

MENEGÁRIO, A. H. Emprego de Indicadores sócio-econômicos na avaliação financeira de

cooperativas agropecuárias. Piracicaba, Universidade de São Paulo. Dissertação de mestrado em

Economia Aplicada, 2000.

OCB - Organização das Cooperativas Brasileiras. História do cooperativismo. Disponível em: <http:

//www.ocb.org.br>. Acesso em: 10 jun. 2009.

OCEPAR - Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná. Notas sobre

cooperativismo. Disponível em: <http://www.ocepar.org.br/ocepar/>. Acesso em: 22 jul. 2009.

PAULANI, L. M.; BRAGA, M. B. A nova contabilidade social. São Paulo: Saraiva, 2000.

PINHO, D. B. A doutrina cooperativa nos regimes capitalista e socialista. 2. ed. São Paulo:

Pioneira, 1966.

PINHO, D. B. O pensamento cooperativo e o cooperativismo brasileiro -- manual do

cooperativismo. São Paulo: Editora, 1982. p. 30.

RICHARDSON, R. J. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1999.

RIPPEL, R. Migração e desenvolvimento no Oeste do Paraná: uma análise de 1950 a 2000. 2005.

Tese (Doutorado em Demografia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), Universidade

Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas – SP, novembro de 2005

SCHNEIDER, J. O. As origens do cooperativismo moderno. In: UNIMED. Compêndio de

cooperativismo. Porto Alegre, RS: WS Editor, 1998.

SINGER, Paul. Introdução à economia solidária. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002.

TRINTIN, J. G. A nova economia paranaense: 1970-2000. Maringá, PR: Eduem, 2006.

YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. Porto Alegre, RS: Bookman, 2002.

VALADARES, J. H. Cooperativismo e capitalismo. In: Curso de formação de dirigentes de

cooperativas – Módulo 1. Curitiba, PR: FORMACCOP, 1990.