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1 O (NÃO) CABIMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA PARA FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO PADRONIZADOS 1. Introdução Como Procurador do Estado com designação para o contencioso judicial atuo em inúmeras ações propostas contra o Poder Público com o intuito de obter medicamento de forma gratuita. Nunca fiz a conta, mais creio que quase metade dos processos em que atuei até hoje nos anos de Procuradoria são relativos ao fornecimento de medicação. Essa realidade não é só minha, mas de todo o setor no qual estou lotado, que responde, dentre outras atribuições, pela representação judicial do Estado em ações dessa natureza. A crescente judicialização da tutela de interesses que envolve a prestação por parte do Estado de alguma medida ligada à saúde é fenômeno sentido não só nos limites do justiça capixaba, alcançando todos os entes que integram nossa federação, Estados, Municípios e União. A intensificação do número de processos desta natureza tem conduzido, equivocadamente, aos juízes buscarem solucioná-los como se as causas se revestissem de contornos de demandas de massa e que envolvessem matéria repetitiva de cunho eminentemente jurídico. Ao menos é essa constatação que pude fazer ao analisar o modo preponderante como a Justiça deste Estado em particular tem julgado estes processos. Dentre todos os processos em que atuei como principal designado ou em substituição, na esmagadora maioria dos casos foi proferido julgamento antecipado da lide quase a totalidade contrária à Fazenda Pública-, ao fundamento de a demanda não demandar dilação probatória e a questão de direito já ter sido sedimentada nos tribunais. Vários, senão quase a totalidade, dos recursos foram julgados monocraticamente pelo tribunal de justiça local, com base no dispositivo contido no art. 557 do CPC, invocando-se precedentes judiciais em ações supostamente semelhantes. Há, de uma maneira geral, certo desprezo pelas questões de fato suscitadas nos autos. Decide- se invocando regras e princípios legais ou constitucionais no sentido de ser do Estado o dever de prover os meios para assegurar a saúde do cidadão.

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O (NÃO) CABIMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA PARA

FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO PADRONIZADOS

1. Introdução

Como Procurador do Estado com designação para o contencioso judicial atuo em inúmeras

ações propostas contra o Poder Público com o intuito de obter medicamento de forma gratuita.

Nunca fiz a conta, mais creio que quase metade dos processos em que atuei até hoje nos anos

de Procuradoria são relativos ao fornecimento de medicação. Essa realidade não é só minha,

mas de todo o setor no qual estou lotado, que responde, dentre outras atribuições, pela

representação judicial do Estado em ações dessa natureza.

A crescente judicialização da tutela de interesses que envolve a prestação por parte do Estado

de alguma medida ligada à saúde é fenômeno sentido não só nos limites do justiça capixaba,

alcançando todos os entes que integram nossa federação, Estados, Municípios e União.

A intensificação do número de processos desta natureza tem conduzido, equivocadamente,

aos juízes buscarem solucioná-los como se as causas se revestissem de contornos de

demandas de massa e que envolvessem matéria repetitiva de cunho eminentemente jurídico.

Ao menos é essa constatação que pude fazer ao analisar o modo preponderante como a Justiça

deste Estado em particular tem julgado estes processos.

Dentre todos os processos em que atuei como principal designado ou em substituição, na

esmagadora maioria dos casos foi proferido julgamento antecipado da lide – quase a

totalidade contrária à Fazenda Pública-, ao fundamento de a demanda não demandar dilação

probatória e a questão de direito já ter sido sedimentada nos tribunais. Vários, senão quase a

totalidade, dos recursos foram julgados monocraticamente pelo tribunal de justiça local, com

base no dispositivo contido no art. 557 do CPC, invocando-se precedentes judiciais em ações

supostamente semelhantes.

Há, de uma maneira geral, certo desprezo pelas questões de fato suscitadas nos autos. Decide-

se invocando regras e princípios legais ou constitucionais no sentido de ser do Estado o dever

de prover os meios para assegurar a saúde do cidadão.

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Embora as ações em que se exige o fornecimento de medicamento pelo Poder Público

representem um contingente considerável de processos em todo o país, não podem ser

classificadas e, mais ainda, decididas como se fossem simples processos repetitivos. Apesar

de haver entre elas identidade quanto à modalidade de pretensão requerida frente ao Estado,

cada ação é fundada em situação de fato específica, a exigir um tratamento particularizado por

parte do magistrado.

Em sua grande maioria, ditas demandas envolvem fundamentalmente discussão sobre as

questões de fato. Isso porque, a despeito da existência de controvérsia a respeito do

significado do enunciado contido no art. 196 da CF, o principal dissenso verificado entre a

pretensão autoral e a postura da Fazenda Pública nestas causas é concernente à comprovação

ou não da efetiva necessidade do uso do medicamento pleiteado pelo particular.

A esse respeito, o Ministro Gilmar Mendes, ao julgar no STF o pedido de suspensão de

antecipação de tutela que deferira fornecimento de medicamento de auto custo (nº 175),

alertou que

[...] independentemente da hipótese levada à consideração do Poder Judiciário, as

premissas analisadas deixam clara a necessidade de instrução das demandas de

saúde para que não ocorra a produção padronizada de iniciais, contestações e

sentenças, peças processuais que, muitas vezes, não contemplam as especificidades

do caso concreto examinado, impedindo que o julgador concilie a dimensão

subjetiva (individual e coletiva) com a dimensão objetiva do direito à saúde.

Dado os contornos fáticos das demandas de saúde1 surge a necessidade de verificar se

pretensão dessa natureza se mostra compatível com o rito do mandado de segurança, cujo

procedimento não permite dilação probatória. Em especial, será analisado o cabimento do writ

no caso de requerimento de medicamento distinto daquele fornecido pelo SUS.

2. Definição de direito líquido e certo

O mandado de segurança está previsto no rol de garantias constitucionais contidas no art. 5º

da CF. Reza o inciso LXIX do art. 5º da CF o seguinte:

1 Fala-se aqui em demanda de saúde para retratar ação coletiva ou individual proposta em face da Fazenda

Pública em que se requeira o fornecimento de medicamento de forma gratuita.

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“art. 5º [...]

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo,

não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela

ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no

exercício de atribuições do Poder Público;”2

Segundo Hely Lopes Meirelles, o mandado de segurança

[...] é o meio constitucional posta à disposição de toda pessoa física ou jurídica,

órgão com capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para a

proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas

data ou habeas corpus, lesado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, seja de

que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça(MEIRELLES, 2003,

p.21 e 22).

Portanto, o mandado de segurança tem como ponto fundamental a tutela de direito líquido e

certo. Direito líquido e certo, na definição de Alexandre de Moraes, “é o que resulta de fato

certo, ou seja, é aquele capaz de ser comprovado, de plano, por documentação inequívoca.”

(MORAES, 2004, p. 167). Em igual medida, Cássio Scarpinella Bueno afirma que se trata de

“direito cuja existência e delimitação são claras e passíveis de demonstração documental.”

(BUENO, 2006, p. 14). Nas palavras desse processualista, isso ocorre “quando a ilegalidade

ou a abusividade forem passíveis de demonstração documental, independentemente de sua

complexidade ou densidade” (BUENO, 2006, P. 14). “É que só se considera líquido e certo o

direito amparado em fatos comprovados documentalmente.” (LOPES, 2007, p 82)

Hely Lopes Meirelles afirma que a adoção do mandado de segurança pressupõe a precisão e

comprovação dos fatos que ensejam o exercício do direito. E, como consequência disso, não

se admite instrução probatória na via mandamental. Há apenas uma dilação para informações

da parte impetrada e do MP, cabendo à parte autora trazer aos autos já com a inicial provas

capazes de demonstrar a liquidez e a certeza do direito (na verdade a veracidade dos fatos que

2 BRASIL, Constituição Federal. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 28.08.2012. O

significado dessa ação de índole constitucional também é extraído no art. 1º da Lei nº 12.016/2009,cuja redação

foi influenciada pela definição criada por Hely Lopes Meirelles, , in verbis: “Art. 1o Conceder-se-á mandado de

segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que,

ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de

sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.” BRASIL, Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12016.htm> . Acesso em

29.08.2012.

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fundam o direito), salvo se o documento estiver em poder do impetrado ou for superveniente

às informações (MEIRELLES, 2003, p. 37).

Alexandre de Moraes esclarece que “está englobado na conceituação de direito líquido e certo

o fato que para tornar-se incontroverso necessite somente de adequada interpretação do

direito, não havendo possibilidades de o juiz denegá-lo, sob o pretexto de tratar-se de questão

de grande complexidade jurídica.” (MORAES, 2004, p. 167). Aliás, tal qual a dificuldade de

interpretação do direito, a simples complexidade dos fatos também não constitui óbice ao

cabimento do writ (MEIRELLES, 2003, p. 38).

Está superado o entendimento de que eventual complexidade das questões (fáticas

ou jurídicas) redunda no descabimento do mandado de segurança. O que é

fundamental para o cabimento do mandado de segurança é a possibilidade de

apresentação de prova documental do que alegado pelo impetrante e a

desnecessidade de produção de outras provas ao longo do procedimento. (BUENO,

2006, p. 14)

A exigência de direito líquido e certo configura requisito de admissibilidade específico do

mandado de segurança. “Direito líquido e certo é apenas uma condição da ação do mandado

de segurança, assimilável ao interesse de agir e que, uma vez presente, autoriza o

questionamento do ato coator por essa via especial e de rito sumaríssimo” (BUENO, 2006, p.

15).

Por isso, a ausência de direito líquido e certo não se confunde com a inexistência do direito

em si, mas somente representa a inviabilidade de comprovação elas provas trazidas aos autos

com a inicial e com a resposta da autoridade e da Fazenda Pública e a imprescindibilidade de

dilação probatória. Julgamento que declare inexistir direito líquido e certo apenas importa no

reconhecimento da inadmissibilidade da via mandamental, “sendo possível que, por outras

vias judiciais, o impetrante tutele a afirmação de seu direito” (BUENO, 2006, p. 16),ex vi do

art. 19 da Lei nº 12.016.3 A análise da presença de direito líquido e certo é prévia ao juízo de

mérito, com ele não se confundido. Uma vez não configurada a liquidez e certeza, considera-

se não haver julgamento de mérito, e, com isso, a decisão não faz coisa julgada material, o

que abre ensejo à nova impetração, acaso superados os óbices do writ anterior, ou a

veiculação da pretensão por outra via processual (BUENO, 2006, p. 16).

3 Art. 19. A sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais.

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Como se pode ver pelos conceitos acima apresentados, a doutrina, ao caracterizar a liquidez e

certeza necessária ao mandado de segurança, vale-se de elementos nem sempre

correspondentes, são eles: a) líquido e certo é o direito baseado em fato passível de

demonstração documental; b) direito líquido e certo é aquele cujo fato é comprovado de plano

(prova pré-constituída), sendo desnecessária dilação probatória; c) certo e líquido é o direito

amparado em prova documental.

A possibilidade de o direito ser comprovado por prova documental não significa que, naquele

processo, haja, efetivamente, provas documentais que atestem a existência do fato indicado na

inicial. Uma coisa é a aptidão para o fato ser provado por meio de documento, outra é sua real

comprovação. Aliás, o juízo de cognição realizado pelo juiz a respeito da capacidade de as

provas documentais juntadas aos autos comprovarem ou não o fato que embasa o pedido

contido na exordial é muito próximo à própria análise do mérito do processo. Também não

aparece haver estrita correlação entre a impossibilidade de dilação probatória e a exigência de

que o fato seja amparado em prova meramente documental. Nada impede, por exemplo, que a

inicial venha instruída com prova testemunhal produzida em cautelar antecipatória de provas,

ou mesmo que o fato discutido no writ prescinda de comprovação, tal como se dá nos fatos

notórios. Muitas outras críticas e considerações poderiam ser feitas a respeito do conceito de

direito líquido e certo, todavia, isso fugiria ao objeto do tema a ser desenvolvido.

De maneira geral, pode se dizer que a parte impetrante deve trazer com a inicial prova dos

fatos que fundamentam seu pedido, uma vez que o mandado de segurança não prevê outra

etapa para instrução probatória. Já que após despachar a inicial, o juiz irá notificar a

autoridade para apresentar informações, para, em seguida, abrir vista ao Ministério Público e,

retornados os autos, proferir decisão definitiva (art. 7º, I c/c art. 12 da Lei nº 12.016/2012)4.

Ressalva-se a hipótese de o documento estar na posse de autoridade ou repartição pública (art.

6º, §1º5), quando o juiz marcará prazo para que seja apresentado.

4 Art. 7o Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via apresentada com as

cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações;

Art. 12. Findo o prazo a que se refere o inciso I do caput do art. 7o desta Lei, o juiz ouvirá o representante do

Ministério Público, que opinará, dentro do prazo improrrogável de 10 (dez) dias.

Parágrafo único. Com ou sem o parecer do Ministério Público, os autos serão conclusos ao juiz, para a decisão, a

qual deverá ser necessariamente proferida em 30 (trinta) dias. 5 Art. 6o A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da

autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições.

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Ao apreciar a inicial, o juiz verificando que os documentos não são suficientes para

comprovar os fatos que embasam o direito alegado na inicial e que seria necessária a

realização de dilação probatória, irá indeferir a inicial (art. 10 da lei 12.106).6 O juízo positivo

de admissibilidade a respeito da liquidez e certeza do direito é meramente provisório, pois

apresentadas as informações ou resposta da Fazenda Pública (ou mesmo parecer do Parquet),

podem ser suscitados fatos que demandem dilação probatória, tal como a alegação de

falsidade de algum documento apresentado pelo impetrante, o que, inevitavelmente, acarretará

a necessária extinção do processo, por inadequação da via eleita.

Deve-se destacar que a (in)existência de liquidez e certeza do direito, enquanto condição da

ação, não está atrelada simplesmente à comprovação ou não dos fatos narrados na inicial, mas

também a necessidade ou não de novas provas para que o juiz forme a sua convicção (dilação

probatória). Assim, v.g., em demanda cujos fatos discutidos suscitem apenas prova

documental e, apresentados documentos por ambas as partes, o juiz se veja convencido de que

os fatos se deram de maneira diferente da descrita na inicial, caberá julgar improcedente o

pedido (juízo de mérito) e não, simplesmente, denegar a segurança por ausência e direito

líquido e certo (juízo negativo de admissibilidade).

Além disso, o uso do mandado de segurança, como técnica de sumarização do processo, deve

se conciliar com os demais direitos e garantias assegurados na CF. Neste aspecto, a restrição à

dilação probatória, embora tenha como fim dinamizar o tempo do processo, somente é cabível

quando seja realmente desnecessária a realização de outros meios de prova para que seja

proferida decisão segura a respeito dos fatos. Isso porque, a garantia do acesso à justiça

pressupõe uma decisão não apenas célere, mas também justa, que represente com a maior

exatidão possível os fatos como ocorridos.

É preciso buscar, pelo processo, a aplicação correta e racionalmente justificada do

direito. Para atingir esse objetivo, fundamental é a preocupação com a verdade dos

fatos. Somente a solução baseada em fatos verdadeiros pode ser considerada justa

(BEDAQUE, 2011, p. 114 e 115).

§ 1o No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento

público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará,

preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o

cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. O escrivão extrairá cópias do documento para juntá-las à

segunda via da petição.

6 Art. 10. A inicial será desde logo indeferida, por decisão motivada, quando não for o caso de mandado de

segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou quando decorrido o prazo legal para a impetração.

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A adoção da via mandamental não se mostrará adequada também quando isso implicar em

restrição ou direito das partes pleitearem prova não admissível na via estreita do writ. A CF

assegura às partes o direito de ampla defesa e do contraditório. Nos moldes hoje plenamente

aceitos em doutrina e jurisprudência, o direito ao contraditório corresponde à efetiva

possibilidade de influenciar na decisão do magistrado, o que pressupõe a prerrogativa de

requerer - e ver deferida – a produção de prova capaz de sustentar suas afirmações e de

infirmar a versão apresentada pela parte adversa (PINHEIRO, 2006, p. 90). Mesmo o poder

de iniciativa probatória do juiz e o livre convencimento motivado não podem ser utilizados

como justificativa para amesquinhar o direito de a parte requerer prova em seu favor

(BEDAQUE, 2011, p. 82 e 83). Assim, não basta ao juiz afirmar que os documentos contidos

no mandado de segurança são suficientes para formar seu juízo de convicção, quando alguma

das partes alega que prova diversa não contida nos autos poderia modificar este

convencimento. Nessa hipótese, o writ somente será admissível se a prova pleiteada for

considerada inidônea para os fins pretendidos de quem as requereu.

Em síntese, a liquidez e certeza necessária para a impetração do writ irá depender da

avaliação (1) dos fundamentos de fato e de direito alegados pelas partes e pelo Ministério

Público e (2) das provas existentes nos autos, trazidas com a inicial, com as informações,

resposta da Fazenda Pública e, eventualmente, com o Parquet.

3. Do (não) cabimento de mandado de segurança para fornecimento de medicamento

distinto do padronizado

O direito à saúde é garantido no art. 196 da CF, que estabelece aos entes federados o dever de

prover políticas sociais e econômicas que visem o acesso universal e igualitário às ações e

serviços para a sua promoção, in verbis:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas

sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e

ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e

recuperação.

Portanto, toda a demanda que envolve fornecimento gratuito de medicamento suscita a

interpretação desse dispositivo constitucional. Não se pretende aqui discutir com

profundidade o sentido da norma referida, pois esse não é objetivo deste trabalho. O preceito

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constitucional só nos interessa naquilo em que repercute na valoração e delimitação dos fatos

relevantes e das provas necessária para a solução da lide.

De um modo geral pode se dizer que o Estado tem a prerrogativa e a competência para traçar

políticas públicas de atendimento à saúde da população, no que se insere a definição dos

medicamentos a serem fornecidos gratuitamente. Por outro lado, o cidadão tem o direito a

receber o tratamento necessário e adequado à sua moléstia. Esse direito não é absoluto, sob

pena de colocar em risco ou inviabilizar o acesso universal e igualitário da população ao

serviço público de saúde.

Nesse aspecto, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo possui precedente

firmado pelo Tribunal Pleno no sentido de que o fornecimento de medicamento pressupõe: a

demonstração de sua eficácia; a inexistência de outro tratamento com igual eficácia fornecido

pelo SUS; a prevalência do bem jurídico que se pretende proteger, sopesando de um lado o

benefício ao direito individual do cidadão e do outro o impacto da medida à coletividade

(proporcionalidade em sentido estrito) (proc. n° 100.06.001804-9) .7

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o direito à

saúde, reconhecido no art. 196 da CF, não alcança a possibilidade de o paciente escolher o

7 EMENTA: CONSTITUCIONAL. MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS. DIREITO À SAÚDE.

IMPETRANTE PORTADOR DE DIABETES "TIPO 1." PRETENSÃO AO RECEBIMENTO DE BOMBA DE

INSULINA. USO PROLONGADO DO TRATAMENTO TRADICIONAL. POSTULADO DA

PROPORCIONALIDADE. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

INADEQUAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA. [...] 2. A aplicação de todo princípio constitucional

exige a verificação dos postulados da adequação (Grundsatz der Geeignetheit), da necessidade (Grundsatz der

Erforderlichkeit) e da proporcionalidade em sentido estrito (Grundsatz der Verhaltnismäßigkeit im engeren

Sinne). Nesse contexto, o fornecimento de medicamentos especiais pressupõe (i) a eficácia no tratamento

pretendido (adequação), (ii) a inexistência de outro tratamento com igual eficácia e menor custo (necessidade) e

(iii) a prevalência do bem jurídico que se pretende proteger sobre todos os demais (proporcionalidade em sentido

estrito). A eficácia do tratamento (adequação) geralmente é verificada por intermédio de informações técnicas

(laudo médico etc.); a inexistência de outro tratamento com igual resultado e menor custo também exige o conhecimento de especialistas; a prevalência do bem jurídico (direito à saúde) sobre os demais direitos sempre se

apresenta, pois a vida é o bem jurídico supremo, devendo ser protegido mesmo que ao custo de violação de

regras orçamentárias ou administrativas. 3. A exigência de "inexistência de outro tratamento com igual eficácia e

menor custo", não significa que se deve condicionar o direito à vida à existência de "baixo custo" na aquisição de

remédios. Muito ao contrário. A vida humana não tem preço. Porém, o dispêndio de recursos públicos em

tratamentos desnecessários pode acarretar o esgotamento da verba pública para outras despesas igualmente

importantes, como aquisição de aparelhos para hemodiálise, fornecimento de remédios para tratamento de

câncer, AIDS etc. Assim, o fornecimento de medicamentos excepcionais deve ser amplamente protegido, desde

que não exista outro tratamento com a mesma eficácia (Geeignetheit) e com menor custo (Erforderlichkeit) ou

não implique o sacrifício da própria vida do requerente (Verhaltnismäßigkeit im engeren Sinne). [...] (TJES; MS

n° 100.06.001804-9; Tribunal Pleno; Relator: SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR; Data de Julgamento:

18.12.2006; Data de Publicação: 24.01.2007) (grifo nosso).

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medicamento que mais se adeque ao seu tratamento. Segundo a Corte Superior, o cidadão

deve utilizar o medicamento fornecido pela Rede Pública, não podendo exigir fármaco

diverso por mera conveniência clínica, ressalvada a hipótese onde a medicação seja a única

capaz de preservar sua saúde. Compete ao paciente o ônus de comprovar a

imprescindibilidade do tratamento pretendido.

EMENTA: ADMINISTRATIVO - MOLÉSTIA GRAVE – FORNECIMENTO

GRATUITO DE MEDICAMENTO - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - DEVER

DO ESTADO - MATÉRIA FÁTICA DEPENDENTE DE PROVA. [...] 4. O direito

assim reconhecido não alcança a possibilidade de escolher o paciente o

medicamento que mais se adeqüe ao seu tratamento. 5. In casu, oferecido pelo SUS

uma segunda opção de medicamento substitutivo, pleiteia o impetrante fornecimento

de medicamento de que não dispõe o SUS, sem descartar em prova circunstanciada a

imprestabilidade da opção ofertada.6. Recurso ordinário improvido. (STJ;

RMS 28338 /MG, Ministra ELIANA CALMON; SEGUNDA TURMA; Data do

julgamento: 02/06/2009; Data de publicação: 17/06/2009) (grifo nosso).

Portanto, para que o jurisdicionado demonstre que possui direito subjetivo público a prestação

positiva do Estado em matéria de saúde precisa comprovar (1) a existência da doença; (2) a

necessidade e adequação do tratamento pretendido. Nos casos em que o medicamento

requerido for padronizado e fornecido pelo Poder Público para o tratamento da moléstia

indicada na inicial, fica dispensada a prova da necessidade e adequação da utilização do

fármaco, cabendo apenas comprovar a existência da doença. Se, todavia, for requerida

medicação não padronizada, caberá ao postulante provar o grau de eficácia do tratamento

(adequação) e a impossibilidade de utilizar os medicamentos já disponibilizados pelo SUS

(necessidade). Em todo o caso, a ponderação de interesses (proporcionalidade em sentido

estrito) é questão de direito, embora dependa dos dados extraídos das provas produzidas nos

autos.

Some-se a isso a existência de precedentes no sentido de que cabe ao jurisdicionado

comprovar a impossibilidade de arcar com os custos do tratamento. E, ainda, decisões que

exigem prova de negativa de fornecimento por parte da Administração Pública.8

8“ PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RMS. FORNECIMENTO DE REMÉDIO. INEXISTÊNCIA

DE ATO COATOR. 1. É inviável o mandado de segurança sem a existência do ato coator. 2. A alegada

deficiência do serviço público de saúde não é suficiente para justificar a atuação pelo Poder Judiciário para determinar o fornecimento de determinado medicamento, sem que a pretensão tenha sido levada previamente à

esfera administrativa. 3. Recurso ordinário não provido. (RMS 23839/ES, Rel. Ministro CASTRO MEIRA,

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Portanto, dados os contornos dos fatos que fundamentam as demandas de saúde para

fornecimento de medicamento, poderão surgir as seguintes questões de fato a serem

enfrentadas pelo órgão jurisdicional: a) se o requerente possuiu a doença afirmada; b) se a

medicação solicitada na inicial é indicada para o tratamento da enfermidade alegada e o grau

de eficácia; c) se há alguma contra-indicação ao seu uso; d) se a medicação solicitada pela

parte autora é disponibilizada pelo SUS; e) se o SUS disponibiliza medicação diversa da

solicitada pela parte autora com a mesma indicação para o tratamento e o grau de eficácia; f)

se há algum benefício ou vantagem no uso da medicação requerida em relação ao que é

fornecido pelo SUS e quais seriam estes benefícios; g) se a parte autora fez requerimento

administrativo para receber o medicamento; i) se a parte possui condições de arcar com o

custo do tratamento.

Feitas estas considerações, chega o momento de analisar o cabimento ou não de mandado de

segurança que veicule pretensão de fornecimento de medicamento gratuito.

Desde já fica pontuado que o cabimento do writ em ações dessa natureza deve ser aferido com

base nas circunstâncias do caso. Para tanto é preciso verificar quais questões de fato devem

ser dirimidas para se solucionar a lide, tendo em vista os fundamentos apresentados pelo

impetrante (ou por ambas as partes, a depender do momento da decisão) e, ainda, as provas

existentes nos autos. Se, na maioria das vezes, o mandado de segurança se revela inadequado,

isso não implica vedar sua utilização para todas as hipóteses. Assim, v.g., não parece haver

óbice na impetração de writ para discutir o fornecimento de medicamento padronizado, cuja

SEGUNDA TURMA, julgado em 21/08/2007, DJ 31/08/2007, p. 217)”. Observa-se da leitura do inteiro teor do

acórdão que o recurso ordinário foi improvido, ao argumento de que não restou configurado ato coator, por

ausência de comprovação de recusa administrativa no fornecimento do medicamento e, ainda, porque não ficou

demonstrada a impossibilidade de o impetrante adquirir o medicamento, já que não demonstrou insuficiência de

recursos. Em sentido contrário, foi proferida decisão pela prescindibilidade de prova da negativa administrativa:

“ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ATO COATOR OMISSIVO.AUSÊNCIA

DE COMPROVAÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO INCONTROVERSO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. 1. É incontroverso que o impetrante é paciente oncológico (portador de trombocitemia) e

necessita do medicamento pleiteado (Agrilyn). O remédio é custeado pelo SUS e fornecido pelas clínicas

oncológicas credenciadas. 2. Discute-se apenas a comprovação do ato omissivo, pois a autoridade impetrada

afirma que "não houve qualquer pedido administrativo de entrega do medicamento, por parte do impetrante ou

do seu médico, nem tampouco qualquer negativa para o seu fornecimento por parte do impetrado".3. Não há

dúvida de que compete ao impetrante apresentar, com a inicial, prova pré-constituída de seu direito. No entanto,

a exigência deve ser observada com cautela nos casos omissivos, sobretudo quando se tratar de direitos

indisponíveis, como a saúde e a educação, bem como os referentes à tutela da infância e adolescência, dos

idosos, de pessoas com deficiência, do meio ambiente. 4. O direito ao medicamento é reconhecido. Por outro

lado, não há prejuízo para a Fazenda em caso de concessão da segurança, pois o remédio é custeado pelo SUS e

regularmente fornecido pelo Estado.5. À luz do direito maior à saúde e à vida, deve ser prestigiada a finalidade do mandamus e concedida a segurança. 6. Recurso Ordinário provido. (RMS 20110/PR, Rel. Ministro

HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/05/2009, DJe 21/08/2009)”

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11

única controvérsia seja a respeito do atraso na disponibilização do fármaco, por alguma falha

administrativa.

Será tratada especificamente a compatibilidade do rito do mandado de segurança para a tutela

de pretensão voltada ao fornecimento de medicamento não disponibilizado pelo SUS ou em

desrespeito aos protocolos fixados pelos órgãos de regulação do serviço de saúde pública, o

que corresponde ao maior número de processos desta natureza. Essa modalidade de pretensão

abarca três hipóteses (1) pedido de fornecimento de medicamento não padronizado; (2)

pedido de medicamento padronizado para tratamento distinto do pretendido; (3) pedido de

medicamento sem observância dos protocolos de avaliação fixados pelo Poder Público. Será

também ponderada a existência ou não de medicamento substituto e de discussão quanto à

eficácia do tratamento pretendido.

Primeiramente, seja qual for o caso, o impetrante deverá trazer prova com a inicial que

indique a existência da doença e a impossibilidade de arcar com os custos da medicação, o

que a depender do caso pode ser presumida em razão do valor do medicamento. Qualquer

dúvida técnica levantada sobre a existência da doença, v.g., erro de diagnóstico, a via estreita

do mandado de segurança se mostrará inadequada. Me recordo de situação ocorrida em

procedimento ordinário em que feita prova pericial, a perícia foi contrária ao diagnóstico

realizado pelo médico da parte autora. Portanto, não pode o juiz aceitar, acriticamente, a

posição firmada nos laudos trazidos junto com a inicial. É fundamental que seja oportunizada

a impugnação das conclusões técnicas contidas nos documentos juntados com o autor e

também que seja feita prova para dirimir a controvérsia.9

Em matéria de mandado de segurança para fornecimento de medicamento diverso do

padronizado, o Superior Tribunal de Justiça possui precedente dominante no sentido de que a

controvérsia demanda dilação probatória, o que não é permitido na via estreita da ação

mandamental. A maioria dos julgados da Corte Superior considera não haver liquidez e

certeza do direito.

9 O STJ entendeu não ser adequado o MS já que havia controvérsia quanto ao diagnóstico da doença, onde

informação técnica do poder público colocava em dúvida a conclusão do médico particular. Vide Ementa:

“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA VISANDO AO

FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO EXCEPCIONAL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E

CERTO, ASSIM ENTENDIDO AQUELE DECORRENTE DE FATOS DEMONSTRADOS POR MEIO DE

PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. INEXISTÊNCIA DE ATO ILEGAL DE AUTORIDADE. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. (RMS 17873/MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA

TURMA, julgado em 09/11/2004, DJ 22/11/2004, p. 264)

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12

A título ilustrativo relaciona-se o julgamento do Agravo Regimental no RMS nº 34.545, de

relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 14/02/2012, onde a Corte Superior teve

a oportunidade de indicar, de maneira clara e precisa, as razões da inadequação da via

mandamental.10

Nesse mandado de segurança discutia-se o fornecimento de medicamentos e equipamentos

para tratamento de diabetes mellitus tipo 1. As provas existentes nos autos eram as seguintes:

laudo particular juntado pelo impetrante e nota técnica apresentada pelo poder público a

indicar que os equipamentos e fármacos requeridos não eram padronizados e que existiam

substitutos.

O STJ considerou que a parte impetrante carecia de direito líquido e certo. Na fundamentação

do voto condutor foi dito que, como regra, deve ser privilegiado o tratamento fornecido pelo

SUS, salvo comprovada ineficácia da política de saúde existente para o caso específico. O

laudo médico particular, todavia, não é idôneo a refutar a viabilidade da utilização do

10 “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO

EM MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO/TRATAMENTO MÉDICO A

CIDADÃO PORTADOR DE DIABETES MELLITUS TIPO I. PRETENSÃO MANDAMENTAL APOIADA

EM LAUDO MÉDICO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. NECESSIDADE DA PROVA SER

SUBMETIDA AO CONTRADITÓRIO PARA FINS DE COMPROVAÇÃO DA INEFICÁCIA OU

IMPROPRIEDADE DO TRATAMENTO FORNECIDO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE.

INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. O recurso ordinário em questão foi interposto contra acórdão proferido

pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que denegou o mandado de segurança em que se objetiva o

acesso a medicamentos e equipamentos necessários ao tratamento e controle de diabetes mellitus tipo 1. O Tribunal de origem entendeu que "as declarações [...] constantes de documentos particulares têm a veracidade

oponível apenas a seu signatário, competindo ao favorecido pela declaração provar o fato declarado em face de

terceiro, razão por que a instrução do 'mandamus' somente com relatório e prescrição subscritos por médico

particular não configura a prova pré-constituída da liquidez e certeza do direito da impetrante de obter do Poder

Público determinado medicamento, sobretudo se se mostra controvertida a maior eficácia do material e remédio

solicitados em relação às opções terapêuticas que são padronizados pela Secretaria de Estado da Saúde para

tratamento das moléstias". 2. O Supremo Tribunal Federal, após realização de audiência pública sobre a matéria,

no julgamento da SL N. 47/PE, ponderou que o reconhecimento do direito a determinados medicamentos dá-se

caso a caso, conforme as peculiaridades fático-probatórias. Porém, ressaltou que, "em geral, deverá ser

privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre

que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente". 3. O laudo emitido por

médico particular, embora possa se caracterizar como elemento de prova (v.g.: AgRg no Ag 1107526/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29/11/2010; AgRg no Ag 1194807/MG, Rel. Ministro

Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 01/07/2010), não pode ser imposto ao magistrado como se a matéria fosse,

exclusivamente, de direito. O laudo médico, vale dizer, não é espécie de prova suprema ou irrefutável, ainda

mais quando a solução da controvérsia, de natureza complexa, depende de conhecimento técnico-científico,

necessário para se saber a respeito da possibilidade de substituição do medicamento ou sobre sua

imprescindibilidade. 4. Como elemento de prova, o laudo médico apresentado pelo impetrante deve ser,

regularmente, submetido ao contraditório, à luz do que dispõe o art. 333, II, do CPC, principalmente quando,

para o tratamento da enfermidade, o Sistema Único de Saúde oferecer tratamento adequado, regular e contínuo.

5. Nesse contexto, forçoso reconhecer que a impetrante deve procurar as vias ordinárias para o reconhecimento

de seu alegado direito, porquanto o alegado direito ao tratamento que postula não se mostra líquido nem certo

para o fim de impetração do mandado de segurança. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no RMS 34545/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe

23/02/2012)

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medicamento padronizado. Embora se trate de elemento de prova, não pode ser imposto ao

magistrado como se fosse questão puramente de direito, pois não representa prova suprema ou

irrefutável. A controvérsia surgida é complexa e demanda conhecimento técnico-científico

para ser solucionada a questão de fato. Além disso, o laudo médico, como elemento de prova,

deve ser submetido ao contraditório, por força do art. 333, II do CPC, principalmente, quando,

para o tratamento da enfermidade, o Sistema Único de Saúde oferecer tratamento adequado,

regular e contínuo. Concluiu o julgado que cabia à parte impetrante procurar as vias

ordinárias.

Outro bom exemplo pode ser extraído do julgamento do Recurso Ordinário em mandado de

segurança nº 22.115, ministro relator João Otávio da Noronha. 11

Nesse writ fora requerido o

medicamento interferon peguilato e ribavirina 250 mg, para paciente portador de hepatite “c” ,

ao custo mensal de R$ 6.340,00. O STJ considerou não haver prova pré-constituída de que a

utilização do medicamento requerido pelo impetrante mostrava-se mais eficaz do que o já

fornecido pelo Estado. Valeu-se, para tanto, das informações prestadas pela autoridade sobre

de estudos científicos que fundamentaram as portarias ministeriais do Ministério da Saúde a

respeito da similitude da resposta apresentada pelos pacientes com o tratamento do fármaco

requerido e aquele fornecido pelo SUS ao custo de R$ 32,00. Considerou-se que para definir o

conflito entre a posição externada pela receita médica particular, onde afirmava a necessidade

do uso da medicação, e as orientações apresentadas em documento público da lavra do

Ministério da Saúde, onde se atribuía a mesma eficácia a remédio mais barato, seria

necessária dilação probatória vedada na via do writ.

Em outro precedente emblemático (RMS 28962, ministro relator Benedito Gonçalves)12

, o

STJ deixou assentado que a prescrição do médico, mesmo conveniado do SUS, não é

11 “ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO.

PACIENTE COM HEPATITE "C". PRODUÇÃO DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. 1. O mandado de segurança não é via adequada para a análise de controvérsia relacionada à obrigatoriedade de a autoridade

pública fornecer medicamento específico se, para tanto, faz-se necessário promover dilação probatória. 2.

Recurso ordinário improvido. (RMS 22115/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA

TURMA, julgado em 12/06/2007, DJ 22/06/2007, p. 394)” 12 “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDANDO DE

SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-

CONSTITUÍDA E CONSEQUENTEMENTE DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRINCÍPIO DA RESERVA

DO POSSÍVEL. 1. "A concessão da ordem, em sede de Mandado de Segurança, reclama a demonstração

inequívoca, mediante prova pré-constituída, do direito líquido e certo invocado" (RMS 24.988/PI, Relator

Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 18 de fevereiro de 2009). 2. No caso em foco, o compulsar dos autos

denota que não há prova pré-constituída a embasar o pleito deduzido neste writ of madamus. Deveras, a prescrição medicamentosa do remédio Enbrel por médico conveniado ao Sistema Único de Saúde (fl. 15) não é

suficiente para comprovar que a resposta do paciente ao tratamento será melhor do que aquela obtida com os

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14

suficiente para comprovar que a resposta do paciente ao tratamento será melhor do que aquela

obtida com os medicamentos fornecidos pelo Poder Público. A alegação de que o

medicamento requerido surte mais efeito é de grande complexidade e demanda realização de

perícia técnica, dilação probatória incompatível com o rito do mandado de segurança.

Tratava-se de mandado de segurança impetrado com o fim de fornecer o medicamento Enbrel

para tratamento de psoríase ao custo de R$ 4.000,00. No tribunal local foi denegada a

segurança sob o fundamento de ausência de liquidez e certeza por falta de comprovação de

plano de que o medicamento seria indicado para a doença apontada, diante da existência de

nota técnica apresentada pelo poder público no sentido de que o medicamento era indicado

para outra doença, no caso, artrite reumatóide e também diante da existência de substituto

ainda não utilizado pelo paciente. Em recurso ordinário foi dito que o uso dos outros

medicamentos causava efeitos colaterais indesejados. O recurso foi improvido pelo STJ ao

fundamento de inexistência de prova pré-constituída. Ficou dito que a receita médica

particular que indica o uso do enbrel foi produzida unilateralmente sem o crivo do

medicamentos oferecidos pelo SUS (acitretina e ciclosporina) (fl. 18). 3. A produção da prova subjacente à

assertiva de que o tratamento do paciente com a droga Enbrel surtirá mais efeito é de grande complexidade e, à

toda evidência, demanda a realização de perícia técnica, cuja dilação probatória é incompatível com rito célere

do mandado de segurança. 4. Ainda sob esse ângulo, o documento indicativo de que o tratamento deve ser

realizado com o fármaco Enbrel (receita à fl. 15) foi produzido unilateralmente, sem o crivo do contraditório.

Ademais, a contraprova produzida pelo impetrado, consistente na Nota Técnica NAT/AF n. 0321/2007 (fls. 74-

76), milita em sentido oposto à pretensão do impetrante, pois consignou que: (a) o etanercepte, substancia ativa

do Enbrel, é de alto custo, relativamente nova e ainda não testada satisfatoriamente em pessoas portadores de psoríase; (b) o relatório médico de fl. 28 informa que o paciente foi tratado com acitretina, corticoterapia

sistêmica e tópica e hidratantes, mas não se refere aos medicamentos oferecidos pelo Ministério da Saúde para o

tratamento de psoríase (ciclosporina e acitretina); e (c) a droga em comento foi recentemente incluída, pelo

Ministério da Saúde, no rol de medicamentos com dispensação em caráter excepcional, através da Portaria

MS/GM n. 2577/2006, e a sua utilização foi tão somente autorizada por aquele órgão para o tratamento de artrite

reumatóide. Logo, a questão gravitante em torno da eficácia superior do Enbrel para o tratamento de psoríase e

da menor manifestação de efeitos colaterais advindos da sua utilização deve ser analisada à luz do processo

cognitivo (Precedentes: RMS 22.115/SC, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 22

de junho de 2007 e RMS 17.873/MG, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ de 22 de

novembro de 2004). 5. Apenas a título de argumento obter dictum, as ações ajuizadas contra os entes públicos

com escopo de obrigar-lhes indiscriminadamente ao fornecimento de medicamento de alto custo devem ser

analisadas com muita prudência. 6. O entendimento de que o Poder Público ostenta a condição de satisfazer todas as necessidades da coletividade ilimitadamente, seja na saúde ou em qualquer outro segmento, é utópico;

pois o aparelhamento do Estado, ainda que satisfatório aos anseios da coletividade, não será capaz de suprir as

infindáveis necessidades de todos os cidadãos. 7. Esse cenário, como já era de se esperar, gera inúmeros

conflitos de interesse que vão parar no Poder Judiciário, a fim de que decida se, nesse ou naquele caso, o ente

público deve ser compelido a satisfazer a pretensão do cidadão. E o Poder Judiciário, certo de que atua no

cumprimento da lei, ao imiscuir-se na esfera de alçada da Administração Pública, cria problemas de toda ordem,

como desequilíbrio de contas públicas, o comprometimento de serviços públicos, dentre outros. 8. O art. 6º da

Constituição Federal, que preconiza a saúde como direito social, deve ser analisado à luz do princípio da reserva

do possível, ou seja, os pleitos deduzidos em face do Estado devem ser logicamente razoáveis e, acima de tudo, é

necessário que existam condições financeiras para o cumprimento de obrigação. De nada adianta uma ordem

judicial que não pode ser cumprida pela Administração por falta de recursos. 9. Recurso ordinário não provido. (RMS 28962/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/08/2009,

DJe 03/09/2009 LEXSTJ vol. 242, p. 55)

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15

contraditório. Por seu turno, havia prova produzida pelo impetrado, nota técnica, que militava

em sentido oposto. Esta nota técnica, indicava que o uso do medicamento Enbrel para

tratamento de psoríase ainda não fora testado satisfatoriamente. Por isso, o Enbrel fora

padronizado para tratamento apenas de outra doença. Também ficou registrado que o

impetrante não provara que já fizera uso da medicação padronizada.

No julgamento do RMS nº 31775, relator Ministro Benedito Gonçalves, o STJ deixou claro

não caber mandado de segurança para discutir fornecimento de medicamento não

padronizado, quando o SUS fornece outro com mesmo princípio ativo.13

Por ocasião do

julgamento do RMS nº 33.463, também não se admitiu mandado de segurança, quando por

nota técnica o Poder Público indica a existência de substitutos, não servindo o laudo particular

como prova pré-constituída de que o impetrante não possa utilizá-los.14

Em outra decisão, a

Corte Superior declarou não caber mandado de segurança, por ausência de liquidez e certeza,

13 ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE

SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ESQUIZOFRENIA PARANÓIDE. PRETENSÃO

DE NÃO TER SUBSTITUÍDO UM MEDICAMENTO ESPECÍFICO (LEPONEX) POR OUTRO SIMILAR

(LIFALCLOZAPINA), CUJOS PRINCÍPIOS ATIVOS SÃO OS MESMOS. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-

CONSTITUÍDA QUE INDIQUE A IMPROPRIEDADE DA SUBSTITUIÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO

NÃO DEMONSTRADO. 1. A discussão se limita em saber se o impetrante, vitimado pela esquizofrenia

paranóide, tem direito líquido e certo de receber o medicamento Leponex, ao invés do medicamento similar

Lifalclozapina, embora o princípio ativo de ambos seja o mesmo, a clozapina. 2. A concessão do mandado de

segurança exige que o impetrante, por meio de prova pré-constituída, demonstre ter direito líquido e certo à

pretensão que persegue, não sendo apropriado ao seu rito a solução de controvérsias que exigem dilação

probatória. 3. No caso dos autos, conquanto seja incontroverso o direito de o impetrante ter acesso ao medicamento indicado

à sua enfermidade (clozapina), o fato é que o pretendido direito de não ter substituído o medicamento Leponex

pelo Lifalclozapina é controverso e necessita ser demonstrado por meio de dilação probatória.

4. A pretensão do impetrante deve ser perseguida por meio das vias ordinárias próprias, e não por meio do

mandado de segurança, uma vez que não há prova pré-constituída que demonstre o direito ao recebimento de um

medicamento específico, ao invés de seu similar.5. Recurso ordinário não provido. (RMS 31775/RS, Rel.

Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/08/2010, DJe 13/08/2010) 14 ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDANDO DE

SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO (ARIPIPRAZOL - ANTI-

PSICÓTICO; NOME COMERCIAL: ABILIFY). NÃO COMPROVAÇÃO DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA A RESPEITO DA IMPRESCINDIBILIDADE DO

MEDICAMENTO. 1. Recurso ordinário em mandado de segurança no qual se discute o fornecimento de medicamento de alto custo ao impetrante, embora não haja comprovação de que outros medicamentos fornecidos

pelo Sistema Único de Saúde - SUS não lhe sirvam. 2. Embora o laudo emitido por médico particular possa ser

qualificado como elemento de prova (v.g.: AgRg no Ag 1107526/MG, Rel. Ministro Mauro Ccampbell Marques,

Segunda Turma, DJe 29/11/2010; AgRg no Ag 1194807/MG, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe

01/07/2010), no caso do presente mandado de segurança, não houve a comprovação, por meio de prova pré-

constituída, de que outros medicamentos fornecidos pelo Sistema Único de Saúde - SUS não serviriam ao

impetrante. Dessa forma, não há como reconhecer o alegado direito líquido e certo, porquanto o laudo médico

juntado aos autos não é suficiente para sua configuração. Precedentes: RMS 26.600/SE, Rel. Ministro Arnaldo

Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 23/02/2011; RMS 31.775/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira

Turma, DJe 13/08/2010; RMS 28.962/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 03/09/2009;

RMS 28.338/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 17/06/2009). 3. Recurso ordinário não provido. (RMS 33463/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em

20/10/2011, DJe 26/10/2011)

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16

em razão de Parecer fornecido pelo Poder Público desaconselhar o tratamento pretendido (MS

8895/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON ).

15 Também foi considerado ausente direito

líquido e certo em mandado de segurança que pleiteava o fornecimento de medicamento não

registrado na ANVISA (RMS 35434/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES).16

Todavia, o mesmo Superior Tribunal de Justiça, em algumas situações, admite mandado de

segurança voltado ao fornecimento de medicamento, ao argumento de que o laudo particular

juntado à inicial configura prova pré-constituída apta a conferir liquidez e certeza ao direito

debatido. A título ilustrativo colhe-se decisão proferida no Agravo Regimental de nº

1.107.526, da lavra do Ministrado Mauro Campbell Marques.17

Todavia, é bom notar que o

julgado não se aprofundou sobre a prova em si e nele não foi discutida a existência de

medicamentos substitutos ou a ineficácia do fármaco. O recurso fora movido contra decisão

monocrática que negara provimento a agravo de instrumento interposto para destrancar

recurso especial. No provimento singular, o ministro relator refutara o recurso ao fundamento

15 ADMINISTRATIVO – SERVIÇO DE SAÚDE – TRATAMENTO NO EXTERIOR – RETINOSE

PIGMENTAR. 1. Parecer técnico do Conselho Brasileiro de Oftalmologia desaconselha o tratamento da

"retinose pigmentar" no Centro Internacional de Retinoses Pigmentária em Cuba, o que levou o Ministro da

Saúde a baixar a Portaria 763, proibindo o financiamento do tratamento no exterior pelo SUS. 2. Legalidade da

proibição, pautada em critérios técnicos e científicos.3. A Medicina social não pode desperdiçar recursos com

tratamentos alternativos, sem constatação quanto ao sucesso nos resultados. 4. Mandado de segurança denegado.

(MS 8895/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/10/2003, DJ 07/06/2004,

p. 151) 16 ADMINISTRATIVO, CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM

MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO IMPORTADO SEM REGISTRO NA ANVISA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. Trata-se de recurso ordinário em mandado de

segurança no qual se objetiva o fornecimento à impetrante de medicamento importado sem registro na Anvisa

(substância química: Tetrabenazina; nomes comerciais: Nitoman, Xenazine ou Revocon). 2. O Tribunal de

Justiça do Paraná, ao denegar a segurança, por maioria, externou o entendimento de que, "não sendo o

medicamento postulado registrado na Anvisa, não é possível ao Estado do Paraná fornecer o referido

medicamento a senhora impetrante. Nestas condições, voto para ser extinto o mandado de segurança sem

julgamento do mérito porque ausente direito líquido e certo a ser tutelado" (fl. 139). 3. Não se observam a

liquidez e a certeza do direito invocado pela impetrante nem a prática de ato ilegal ou de abuso de poder. 4. O

fato de o medicamento pretendido não ter registro na Anvisa e, portanto, não poder ser comercializado no

território nacional, denota que o alegado direito não é líquido nem certo para fins de impetração de mandado de

segurança, porquanto o seu exercício depende de eventual autorização da Anvisa para que o medicamento seja

importado e distribuído pelo Estado. 5. A entrada de medicamentos no território nacional, sem o devido registro na Anvisa, configura o crime previsto no artigo 273, § 1º-B, I, do Código Penal; fato que não pode ser

desprezado pelo administrador público responsável pelo fornecimento do medicamento em questão, razão pela

qual não há falar que o seu não fornecimento caracteriza ato ilegal ou de abuso de poder. 6. Recurso ordinário

não provido. (RMS 35434/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em

02/02/2012, DJe 09/02/2012) 17 ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO

GRATUITO DE MEDICAMENTOS. LAUDO MÉDICO EMITIDO POR MÉDICO PARTICULAR. PROVA.

ADMISSIBILIDADE. 1. É admissível, em sede de mandado de segurança, prova constituída por laudo médico

elaborado por médico particular atestando a necessidade do uso de determinado medicamento, para fins de

comprovação do direito líquido e certo capaz de impor ao Estado o seu fornecimento gratuito. 2. Precedente:

AgRg no Ag 1.194.807/MG, DJe 01/07/2010. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 1107526/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/11/2010, DJe

29/11/2010)

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17

de que a apreciação da questão envolvia reexame de fato, o que encontraria óbice na súmula 7

do STJ. Ao julgar o agravo regimental, a Corte apenas acresceu ao fundamento anterior a

menção da viabilidade do laudo particular servir de prova pré-constituída. Não se discutiu a

existência de provas contrárias ao laudo, muito menos se, em havendo controvérsia, se o

mandado de segurança seria cabível.

Decisão idêntica foi proferida pelo STJ no julgamento do Agravo regimental nº 119480718

, da

lavra do Ministro Luiz Fux. Dita decisão possui os mesmos limites de cognição e premissas

fixadas no julgamento anteriormente comentado. Também aqui o agravo regimental fora

movido contra decisão singular que negara provimento a agravo de instrumento interposto

para liberar recurso especial inadmitido na origem. O recurso especial fora interposto sob o

argumento de inadequação do mandado de segurança por ausência de prova pré-constituída. O

Tribunal Superior, ao julgar o agravo interno, manteve o fundamento externado na decisão

singular, no sentido de que a avaliação de liquidez e certeza pressuporia reexame de prova,

obstado pela súmula 7 da mesma corte. E também que o laudo particular é válido como

elemento de prova, prescindido de laudo oficial. Aqui fica claro que a ratio decidendi limitou-

se apenas a conferir eficácia probatória a laudo particular como prova pré-constituída e a

desnecessidade de laudo oficial. Não houve apreciação da prova em si, muito menos se

discutiu a se esta mesma prova seria idônea em caso de haver prova em sentido contrário

fornecida pelo Estado.

No julgamento do RMS 17903/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA 19

,o STJ considerou que

os laudos médicos ofertados pelo impetrante eram suficientes para atestar a necessidade de

18 PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR.

FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CONCESSÃO. LAUDO DE MÉDICO PARTICULAR. PROVA

PRÉ-CONSTITUÍDA. SUFICIÊNCIA. 1. Os laudos médicos expedidos por serviço médico particular são

válidos e suficientes para fins de isenção do imposto de renda e concessão de aposentadoria. Precedentes: (REsp

1088379/DF, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJe 29/10/2008; REsp nº 749.100/PE, Rel.Min.

FRANCISCO FALCÃO, DJ de 28.11.2005.; REsp 302.742/PR, 5ª T., Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ de 02/08/2004). 2. Consectário lógico é que se laudos de médicos particulares são, por força da juriprudência,

válidos para concessão de aposentaria e isenção de imposto de renda, quando há dispositivo legal que determine

a expedição de laudo oficial para a concessão do benefício, tanto mais valerá como elemento de prova.

Precedentes: REsp nº 673.741/PB, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA DJ de 09/05/2005; REsp

749.100/PE, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/09/2005, DJ

28/11/2005 p. 230 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no Ag 1194807/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX,

PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/06/2010, DJe 01/07/2010) 19 “CONSTITUCIONAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO

FUNDAMENTAL À VIDA E À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO. HEPATITE C.

RESTRIÇÃO. PORTARIA/MS N.º 863/02. 1. A ordem constitucional vigente, em seu art. 196, consagra o

direito à saúde como dever do Estado, que deverá, por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados não "qualquer tratamento", mas o tratamento mais adequado e eficaz, capaz de ofertar ao enfermo

maior dignidade e menor sofrimento. 2. O medicamento reclamado pela impetrante nesta sede recursal não

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18

uso de medicamento que fora negado pelo Poder Público, em razão de o impetrante não

atender ao protocolo firmado por Portaria da Secretaria de Assistência à Saúde. No caso dos

autos, o impetrante juntara laudo médico, onde afirmava a imprescindibilidade do

medicamento e que aquele fornecido pelo SUS não se mostrara eficiente. Já o Poder Público

trouxe aos autos Portaria da Secretaria da Saúde, onde indicava que o uso do medicamento

pretendido, embora padronizado, não era indicado dada a situação particular do paciente. O

Tribunal entendeu que não havia prova se a restrição contida na Portaria era ou não

tecnicamente justificada e que incumbia ao impetrado este ônus. Concluiu que o laudo

particular seria prova concreta da eficácia da medicação, a sobrepor-se à restrição contida em

norma abstrata, cuja pertinência técnica não fora provada pelo impetrado. Disse, também, que

na dúvida deveria ser concedida a tutela.20

objetiva permitir-lhe, apenas, uma maior comodidade em seu tratamento. O laudo médico, colacionado aos

autos, sinaliza para uma resposta curativa e terapêutica "comprovadamente mais eficaz", além de propiciar ao paciente uma redução dos efeitos colaterais. A substituição do medicamento anteriormente utilizado não

representa mero capricho da impetrante, mas se apresenta como condição de sobrevivência diante da ineficácia

da terapêutica tradicional. 3. Assim sendo, uma simples restrição contida em norma de inferior hierarquia

(Portaria/MS n.º 863/02) não pode fazer tábula rasa do direito constitucional à saúde e à vida, especialmente,

diante da prova concreta trazida aos autos pela impetrante e à mingua de qualquer comprovação por parte do

recorrido que venha a ilidir os fundamentos lançados no único laudo médico anexado aos autos. 4. As normas

burocráticas não podem ser erguidas como óbice à obtenção de tratamento adequado e digno por parte do

cidadão carente, em especial, quando comprovado que a medicação anteriormente aplicada não surte o efeito

desejado, apresentando o paciente agravamento em seu quadro clínico. 5. Recurso provido. (RMS 17903/MG,

Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/08/2004, DJ 20/09/2004, p. 215) 20 Trecho do voto: “O Tribunal de origem, ao analisar a impetração, entendeu inexistir, por parte do Estado de Minas Gerais, recusa

no fornecimento de medicação, mas tão-somente recusa no fornecimento do remédio que a impetrante, com base

em atestado médico particular, acredita ser mais adequado para o tratamento da moléstia que lhe acomete. Na

hipótese, o recorrido fornece o medicamento denominado "Interferon Alfa" associado a "Ribavirina", enquanto o

recorrente requerer o remédio "Interferon Peguilado". Alega o Ministério Público, em suas razões recursais,

que a droga requerida é mais eficaz no tratamento da Hepatite "C", sendo plenamente indicada no caso,

segundo laudo médico particular que faz juntar aos autos, principalmente quando o tratamento anterior com

"Interferon Alfa" não obteve resultados satisfatórios. Sustenta que a negativa de fornecimento do remédio

importaria malferimento à garantia estatuída no art. 196 da Constituição da República, que preconiza ser

a saúde direito de todos e dever do Estado. Às fls. 92/99, o recorrido apresenta resposta, aduzindo,

preliminarmente, que as razões do presente recurso encontram-se dissociadas do fundamento da decisão

recorrida, já que, em momento algum, dirigem-se à causa de pedir adotada pelo Colegiado de origem. No mérito, sustenta que o remédio "Interferon Peguilado", embora tenha sido incluído na lista de medicamentos

padronizados do Ministério da Saúde após a impetração, passando a ser fornecido gratuitamente àqueles que

dele necessitam, não seria indicado no caso da impetrante, porquanto o item 4, letra "a", da Portaria n°

863/02 da Secretaria de Assistência à Saúde/MS, estabelece que o mesmo não seria ministrável à quem já se

submetera anteriormente a tratamento com "Interferon Alfa" associado à "Ribavirina". [...]

Pelo que consta dos autos, após a impetração, o Ministério da Saúde incluiu, em sua lista de medicamentos

padronizados, o remédio reclamado pela impetrante. No momento, a única resistência manifestada pelo

recorrido em fornecer a droga consiste na alegação de que a impetrante, por já ter sido submetida a tratamento

com "Interferon Alfa" associado à "Ribavirina", não estaria indicada ao tratamento com "Interferon Peguilado",

por força do que dispõe o item 04, letra"a", da Portaria n.º 863/02 da Secretaria de Assistência à

Saúde/MS. Não se sabe, entretanto, se a restrição ao uso do medicamento, como prevista na Portaria n.º 863/02, é ou não tecnicamente justificada. O recorrido não trouxe, em momento algum, qualquer argumento que

demonstre ser razoável aplicar-se a restrição ao caso da impetrante. O fato é que a norma, de conteúdo abstrato e

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A decisão do STJ peca ao considerar a Portaria da Secretaria de Saúde mera peça burocrática

e ao atribuir ao Poder Público o ônus de provar que a restrição nela imposta seria

tecnicamente justificável. Isso porque, os protocolos clínicos são estabelecidos pelo SUS com

base em evidências científicas a respeito da eficácia do tratamento. Esse dado implica também

na desnecessidade de o impetrado comprovar o caráter técnico das instruções contidas nos

protocolos do SUS. Vale traçar à baila as palavras do Ministro Gilmar Mendes, por ocasião

do julgamento do Pedido de Suspensão nº 175 no STF.

[...] o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da “Medicina com base em

evidências”. Com isso, adotaram-se os “Protocolos Clínicos e Diretrizes

Terapêuticas”, que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o

diagnóstico de doenças e o tratamento correspondente com os medicamentos

disponíveis e as respectivas doses. Assim, um medicamento ou tratamento em

desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar

um consenso científico vigente.

Acrescente-se, ainda, que se existiam dúvidas – como suscitado ao final do voto condutor do

acórdão em questão- cabia encaminhar as partes para as vias ordinárias e não, simplesmente,

conceder a ordem. A dúvida é a antítese da liquidez e certeza. Logo, a medida mais segura e

aparentemente desprovida de razoabilidade, conflita com a declaração médica trazida aos autos à fl. 24, que

dispõe:

"Declaro que a Sra. Kátia Mendes Campos é portadora de Hepatite C crônica, genótipo 1b, com fibrose hepática acentuada (Metavir F4). Submeteu-se a tratamento convencional com Interferon-Alfa e Ribavirina

durante 48 semanas, sem êxito terapêutico. Como é sabido, a Hepatite C crônica com tais características

apresenta baixa probabilidade de resposta terapêutica ao esquema de tratamento supra-citado. Em vista da

gravidade de seu comprometimento hepático, a paciente necessita submeter-se a novo tratamento, com

maior probabilidade de eficácia. Deverá, pois, usar Interferon Peguilado ('Pegasys', 180mcg subcutâneos de 7

em 7 dias) associado a Ribavirina (1000mg via oral por dia), durante 48 semanas. Tal esquema é

comprovadamente mais eficaz que o anterior no tratamento da hepatite C com genótipo 1b e fibrose avançada

(Fried MW et al, N Engl J Med 2002;

347:975-82 )".”

Assim, como há prova concreta e indicação explícita, segundo atestado médico, de que a utilização do

medicamento requerido mostra-se mais eficaz ao tratamento da impetrante, parece razoável autorizar-lhe o

fornecimento, apesar da proibição genérica contida na norma. Ora, uma simples restrição contida em norma de inferior hierarquia não pode fazer tábula rasa do direito constitucional à saúde e à vida,

especialmente, diante de prova concreta trazida aos autos pela impetrante e à mingua de qualquer

comprovação por parte do recorrido que venha a ilidir os fundamentos lançados no único laudo médico anexado

aos autos. Na dúvida, afigura-se mais consentâneo com os valores albergados pelo ordenamento jurídico optar-

se pelo direito à saúde em detrimento da legalidade estrita. As normas burocráticas não podem ser erguidas

como óbice à obtenção de tratamento adequado e digno por parte do cidadão carente, em especial,

quando comprovado que a medicação anteriormente aplicada não surte o efeito desejado, apresentando o

paciente agravamento em seu quadro clínico.” [...]O laudo médico, colacionado aos autos à fl. 24, sinaliza

para uma resposta curativa "comprovadamente mais eficaz", além de propiciar ao paciente uma redução

dos efeitos colaterais. A substituição do medicamento anteriormente utilizado não representa mero

capricho da impetrante, mas se apresenta como condição de sobrevivência diante da ineficácia da terapêutica tradicional.”

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consentânea com as garantias constitucionais do processo era determinar que as partes

adotassem rito onde fosse possível dilação probatória, até mesmo para oportunizar ao Estado

provar a validade técnica das restrições impostas ao tratamento pretendido.21

21 Decisão similar do STJ foi proferida no RMS 24197, com a seguinte ementa : PROCESSUAL CIVIL.

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E

CERTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. HEPATITE C. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À

SAÚDE, À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. LAUDO EMITIDO POR MÉDICO NÃO

CREDENCIADO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). EXAMES REALIZADOS EM HOSPITAL ESTADUAL. PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE.

1. A ordem constitucional vigente, em seu art. 196, consagra o direito à saúde como dever do Estado, que deverá,

por meio de políticas sociais e econômicas, propiciar aos necessitados não "qualquer tratamento", mas o

tratamento mais adequado e eficaz, capaz de ofertar ao enfermo maior dignidade e menor sofrimento. 2.

Sobreleva notar, ainda, que hoje é patente a idéia de que a Constituição não é ornamental, não se resume a um

museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas. Destarte, na

aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios

setoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da República que destina especial proteção a

dignidade da pessoa humana. 3. Sobre o tema não dissente o Egrégio Supremo Tribunal Federal, consoante se

colhe da recente decisão, proferida em sede de Agravo Regimental na Suspensão de Segurança 175/CE, Relator

Ministro Gilmar Mendes, julgado em 17.3.2010, cujos fundamentos se revelam perfeitamente aplicáveis ao caso sub examine, conforme noticiado no Informativo 579 do STF, 15 a 19 de março de 2010, in verbis:

"Fornecimento de Medicamentos e Responsabilidade Solidária dos Entes em Matéria de Saúde - 1 O Tribunal

negou provimento a agravo regimental interposto pela União contra a decisão da Presidência do STF que, por

não vislumbrar grave lesão à ordem, à economia e à saúde públicas, indeferira pedido de suspensão de tutela

antecipada formulado pela agravante contra acórdão proferido pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª

Região. Na espécie, o TRF da 5ª Região determinara à União, ao Estado do Ceará e ao Município de Fortaleza

que fornecessem a jovem portadora da patologia denominada Niemann-Pick tipo C certo medicamento que

possibilitaria aumento de sobrevida e melhora da qualidade de vida, mas o qual a família da jovem não possuiria

condições para custear. Alegava a agravante que a decisão objeto do pedido de suspensão violaria o princípio da

separação de poderes e as normas e os regulamentos do Sistema Único de Saúde - SUS, bem como

desconsideraria a função exclusiva da Administração em definir políticas públicas, caracterizando-se, nestes casos, a indevida interferência do Poder Judiciário nas diretrizes de políticas públicas. Sustentava, ainda, sua

ilegitimidade passiva e ofensa ao sistema de repartição de competências, como a inexistência de

responsabilidade solidária entre os integrantes do SUS, ante a ausência de previsão normativa. Argumentava que

só deveria figurar no pólo passivo da ação o ente responsável pela dispensação do medicamento pleiteado e que

a determinação de desembolso de considerável quantia para aquisição de medicamento de alto custo pela União

implicaria grave lesão às finanças e à saúde públicas. Fornecimento de Medicamentos e Responsabilidade

Solidária dos Entes em Matéria de Saúde - 2 Entendeu-se que a agravante não teria trazido novos elementos

capazes de determinar a reforma da decisão agravada. Asseverou-se que a agravante teria repisado a alegação

genérica de violação ao princípio da separação dos poderes, o que já afastado pela decisão impugnada ao

fundamento de ser possível, em casos como o presente, o Poder Judiciário vir a garantir o direito à saúde, por

meio do fornecimento de medicamento ou de tratamento imprescindível para o aumento de sobrevida e a

melhoria da qualidade de vida da paciente. No ponto, registrou-se que a decisão impugnada teria informado a existência de provas suficientes quanto ao estado de saúde da paciente e a necessidade do medicamento indicado.

Relativamente à possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, reportou-se à decisão proferida na ADPF 45

MC/DF (DJU de 29.4.2004), acerca da legitimidade constitucional do controle e da intervenção do Poder

Judiciário em tema de implementação de políticas públicas, quando configurada hipótese de injustificável inércia

estatal ou de abusividade governamental. No que se refere à assertiva de que a decisão objeto desta suspensão

invadiria competência administrativa da União e provocaria desordem em sua esfera, ao impor-lhe deveres que

seriam do Estado e do Município, considerou-se que a decisão agravada teria deixado claro existirem casos na

jurisprudência da Corte que afirmariam a responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de saúde

(RE 195192/RS, DJU de 31.3.2000 e RE 255627/RS, DJU de 23.2.2000). Salientou-se, ainda, que, quanto ao

desenvolvimento prático desse tipo de responsabilidade solidária, deveria ser construído um modelo de

cooperação e de coordenação de ações conjuntas por parte dos entes federativos. No ponto, observou-se que também será possível apreciar o tema da responsabilidade solidária no RE 566471/RN (DJE de 7.12.2007), que

teve reconhecida a repercussão geral e no qual se discute a obrigatoriedade de o Poder Público fornecer

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21

Após pesquisadas as decisões do STJ sobre a matéria é possível afirmar que, em que pese

haver decisões em sentido contrário, a orientação dominante nesse Tribunal é no sentido de

não caber mandado de segurança para discutir o fornecimento de medicamento não

padronizado para a moléstia do paciente. Notadamente, quando o Poder Público possui

fármaco substituto ou quando impugna a eficácia do medicamento requerido. (vide também

medicamento de alto custo. Ademais, registrou-se estar em trâmite na Corte a Proposta de Súmula Vinculante 4, que propõe tornar vinculante o entendimento jurisprudencial a respeito da responsabilidade solidária dos entes da

Federação no atendimento das ações de saúde. Ressaltou-se que, apesar da responsabilidade dos entes da

Federação em matéria de direito à saúde suscitar questões delicadas, a decisão impugnada pelo pedido de

suspensão, ao determinar a responsabilidade da União no fornecimento do tratamento pretendido, estaria

seguindo as normas constitucionais que fixaram a competência comum (CF, art. 23, II), a Lei federal 8.080/90

(art. 7º, XI) e a jurisprudência do Supremo. Concluiu-se, assim, que a determinação para que a União pagasse as

despesas do tratamento não configuraria grave lesão à ordem pública. Asseverou-se que a correção, ou não,

desse posicionamento, não seria passível de ampla cognição nos estritos limites do juízo de contracautela.

Fornecimento de Medicamentos e Responsabilidade Solidária dos Entes em Matéria de Saúde - 3 De igual modo,

reputou-se que as alegações concernentes à ilegitimidade passiva da União, à violação de repartição de

competências, à necessidade de figurar como réu na ação principal somente o ente responsável pela dispensação do medicamento pleiteado e à desconsideração da lei do SUS não seriam passíveis de ampla delibação no juízo

do pedido de suspensão, por constituírem o mérito da ação, a ser debatido de forma exaustiva no exame do

recurso cabível contra o provimento jurisdicional que ensejara a tutela antecipada. Aduziu, ademais, que, ante a

natureza excepcional do pedido de contracautela, a sua eventual concessão no presente momento teria caráter

nitidamente satisfativo, com efeitos deletérios à subsistência e ao regular desenvolvimento da saúde da paciente,

a ensejar a ocorrência de possível dano inverso, tendo o pedido formulado, neste ponto, nítida natureza de

recurso, o que contrário ao entendimento fixado pela Corte no sentido de ser inviável o pedido de suspensão

como sucedâneo recursal. Afastaram-se, da mesma forma, os argumentos de grave lesão à economia e à saúde

públicas, haja vista que a decisão agravada teria consignado, de forma expressa, que o alto custo de um

tratamento ou de um medicamento que tem registro na ANVISA não seria suficiente para impedir o seu

fornecimento pelo poder público. Por fim, julgou-se improcedente a alegação de temor de que esta decisão constituiria precedente negativo ao poder público, com a possibilidade de resultar no denominado efeito

multiplicador, em razão de a análise de decisões dessa natureza dever ser feita caso a caso, tendo em conta todos

os elementos normativos e fáticos da questão jurídica debatida."(STA 175 AgR/CE, rel. Min. Gilmar Mendes,

17.3.2010. 4. Last but not least, a alegação de que o impetrante não demonstrou a negativa de fornecimento do

medicamento por parte da autoridade, reputada coatora, bem como o desrespeito ao prévio procedimento

administrativo, de observância geral, não obsta o deferimento do pedido de fornecimento dos medicamentos

pretendidos, por isso que o sopesamento dos valores em jogo impede que normas burocráticas sejam erigidas

como óbice à obtenção de tratamento adequado e digno por parte de cidadão hipossuficiente. 5. Sob esse enfoque

manifestou-se o Ministério Público Federal:"(...)Não se mostra razoável que a ausência de pedido administrativo,

supostamente necessário à dispensação do medicamento em tela, impeça o fornecimento da droga prescrita. A

morosidade do trâmite burocrático não pode sobrepor-se ao direito à vida do impetrante, cujo risco de

perecimento levou à concessão da medida liminar às fls.79 (...)" fl. 312 6. In casu, a recusa de fornecimento do medicamento pleiteado pelo impetrante, ora Recorrente, em razão de o mesmo ser portador de vírus com

genótipo 3a, quando a Portaria nº 863/2002 do Ministério da Saúde, a qual institui Protocolo Clínico e Diretrizes

Terapêuticas, exigir que o medicamento seja fornecido apenas para portadores de vírus hepatite C do genótipo 1,

revela-se desarrazoada, mercê de contrariar relatório médico acostado às fl. 27. 7. Ademais, o fato de o relatório

e a receita médica terem emanado de médico não credenciado pelo SUS não os invalida para fins de obtenção do

medicamento prescrito na rede pública, máxime porque a enfermidade do impetrante foi identificada em outros

laudos e exames médicos acostados aos autos (fls.26/33), dentre eles, o exame "pesquisa qualitativa para vírus da

Hepatite C (HCV)" realizado pelo Laboratório Central do Estado, vinculado à Secretaria Estadual de Saúde do

Estado do Paraná, o qual obteve o resultado "positivo para detecção do RNA do Vírus do HCV" (fl. 26). 8.

Recurso Ordinário provido, para conceder a segurança pleiteada na inicial, prejudicado o pedido de efeito

suspensivo ao presente recurso (fls. 261/262), em razão do julgamento do mérito recursal e respectivo provimento. (RMS 24197/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe

24/08/2010)

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RMS nº 28684/MG, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 26/05/2009 e RMS nº

26600/SE, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 15/02/2011).

Com razão a orientação predominante do STJ, pois nestas hipóteses os laudos, exames e

receitas particulares apresentadas pelo impetrante não são capazes de conferir liquidez e

certeza ao direito invocado, quando confrontadas pelas informações técnicas contrárias

prestadas pelo Poder Público. Não se pode esquecer que ditas provas são todas dotadas de

caráter técnico científico. Além disso, recai sobre os protocolos e diretrizes clínicas

formuladas pelo Poder Pública a presunção de validade e adequação dos tratamentos neles

definidos. O que implica em ônus especial ao impetrante rechaçá-los por prova idônea.

Neste aspecto, os laudos particulares não são capazes de aclarar a controvérsia. Primeiro,

porque produzidos unilateralmente pela parte autora, em momento anterior ao processo, sem a

participação do Poder Público no momento da formação da prova. E também porque o

profissional médico que o subscreve está passível de falhas e, em casos outros, pode agir de

forma mal intencionada, influenciado pelo laboratório que produz o medicamento, etc.

Não se pode afirmar que a orientação técnica do médico particular é melhor do que aquela

encampada nos protocolos clínicos do SUS (também definida com base em evidências

científicas). O simples fato de o profissional acompanhar o tratamento da parte impetrante não

o torna o único capaz de definir o tratamento adequado a ser seguido. Aliás, admitir a

prevalência do laudo particular sobre toda e qualquer orientação do SUS representaria um

raciocínio perverso, pois conduziria sempre ao deferimento do pleito autoral, subjulgando o

Poder Público à opinião do médico, independentemente, de ficar comprovado ou não o acerto

técnico dessa orientação e transformando o Judiciário em mero homologador de receitas

médicas. Isso tolheria toda e qualquer possibilidade de o Poder Público impugnar a prova,

especialmente, em mandado de segurança, onde não se permite a dilação probatória, o que

representaria esvaziar por completo o contraditório.

A receita médica não é prova absoluta. Até mesmo as conclusões realizadas por perito oficial

nomeado pelo juízo e presumidamente imparcial são levadas ao crivo da cognição do juiz, que

pode, mediante sua livre convicção, tecer juízo de valor em sentido contrário ao do experto,

em vistas das demais provas existentes nos autos.

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23

A Fazenda Pública tem o direito de requerer a produção de prova pericial ou de exigir que o

paciente seja submetido à avaliação por parte de médicos do SUS para obter uma segunda

opinião a respeito do tratamento necessário, mediante uma avaliação das condições

específicas da saúde do autor da ação. Ora, o particular que vai ao médico e não concorda

com o tratamento indicado tem a possibilidade de ir a outro profissional obter uma segunda

opinião. Por que ao Poder Público não seria dado discordar da receita apresentada pelo

médico particular do cidadão e discutir, mediante produção de provas, qual o medicamento

que deve efetivamente ser utilizado no caso?

Assim, não se pode permitir a utilização da via mandamental neste caso, sob pena de ofensa à

garantia da ampla defesa, pois, nessa hipótese o Estado não poderá requerer a produção de

provas em seu favor, restringindo-se, de forma desarrazoada o direito ao contraditório.

Portanto, sempre que houver divergência a respeito do uso de medicamento não padronizado

para o tratamento do impetrante (havendo ou não substituto), o mandado de segurança deverá

ser extinto por falta de liquidez e certeza do direito. Com isso, o jurisdicionado poderá

ingressar na via ordinária, onde será possível realizar extensa dilação probatória, suficiente

para assegurar o direito de defesa e contraditório das partes e também conferir maior

segurança e acerto à decisão judicial.

4. Conclusão

1- As demandas que envolvem o fornecimento de saúde têm se multiplicado ao longo dos

anos, fruto da judicialização da saúde;

2 – O aumento no número de processos cria o risco de que as demandas passem a ser

decididas de forma acriteriosa, sem que sejam observadas as condições fáticas de cada caso;

3- Por sua natureza, as ações de saúde não podem ser tratadas como simples processos de

massa, pois, apesar de envolverem matéria de direito similar, se diferenciam uma da outra

pelas circunstâncias fáticas que as envolvem;

4- Por isso mesmo, a maioria das controvérsias surgidas nestes processos são relativas às

questões de fato, tais como, se o medicamento requerido é eficaz, se a parte pode ou não

utilizar medicamento padronizado, etc.

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5- Como meio de garantir que o Poder Público não se veja obrigado a arcar com tratamento

desnecessário e, assim, comprometer indevidamente as finanças públicas, é fundamental

realizar adequada instrução probatária nestas ações.

6- Muitas vezes adota-se a via do mandado de segurança para pleitear o fornecimento gratuito

de medicamento. Todavia, diante das características do procedimento mandamental, que não

admite dilação probatória, surge a questão de saber se a pretensão aduzida nos autos configura

ou não direito líquido e certo.

7- Por direito líquido e certo entende-se aquele que é fundado em fatos comprovados de plano

por meio das provas apresentadas com a inicial, com a resposta ou pelo Ministério Público e

cuja solução prescinda de instrução probatória. Não se admite o writ também quando isso

possa representar restrição do direito de defesa e contraditório das partes.

8- No caso das demandas de saúde, é ônus da parte autora comprovar a existência da doença e

a imprescindibilidade do medicamento requerido.

9- Quando o medicamento requerido não é fornecido pelo SUS para o tratamento da moléstia

do paciente, compete ao jurisdicionado provar (1) que não pode utilizar o medicamento

padronizado e (2) que o fármaco requerido é eficaz.

10- A controvérsia sobre a utilização de medicamento não padronizado (ou padronizado para

tratamento distinto) é questão de alta complexidade, que envolve dilação probatória não

permitida na via estreita do mandado de segurança.

11- O laudo particular não se sobrepõe às provas técnicas apresentadas pelo Poder Público,

por se tratar de prova produzida unilateralmente, sem que fosse assegurado o contraditório.

12- Portanto, havendo conflito entre o laudo do médico particular apresentado pelo impetrante

e as informações técnicas prestadas pela autoridade, pessoa jurídica de direito público ou pelo

Parquet, deve ser extinto o mandado de segurança por inadequação da via eleita, diante da

ausência de liquidez e certeza do direito.

Page 25: O (NÃO) CABIMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA PARA FORNECIMENTO DE ...anape.org.br/site/wp-content/uploads/2014/07/Arquivo_tese-61.pdf · 5 Como se pode ver pelos conceitos acima apresentados,

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