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O Novo Manual do Trabalho Doméstico

O Novo Manual do Trabalho Doméstico - ltr.com.br · Doutor em Filosofia do Direito pela UFMG. Mestre em Ciência ... Os dois principais juristas em matéria de Direito do Trabalho

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O Novo Manual do Trabalho Doméstico

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Mauricio Godinho DelgadoMinistro do Tribunal Superior do Trabalho.

Professor Titular do Centro Universitário UDF. Doutor em Filosofia do Direito pela UFMG.

Mestre em Ciência Política pela UFMG.

Gabriela Neves Delgado Advogada. Professora Associada dos Programas de Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de Direito da UnB. Líder do Grupo

de Pesquisa “Trabalho, Constituição e Cidadania” (UnB-CNPq). Doutora em Filosofia do Direito pela UFMG.

Mestre em Direito do Trabalho pela PUC Minas.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Delgado, Mauricio Godinho

O novo manual do trabalho doméstico / Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. — São Paulo : LTr, 2016. Bibliografia.

1. Empregados domésticos — Brasil 2. Empregados domésticos — Leis e legislação — Brasil I. Delgado, Gabriela Neves. II. Título.

15-10754 CDU-34:331:647.2(81)

Índice para catálogo sistemático:

1. Brasil : Empregados domésticos : Direito do trabalho 34:331:647.2(81)

R

EDITORA LTDA.© Todos os direitos reservados

Rua Jaguaribe, 571

CEP 01224-003

São Paulo, SP – Brasil

Fone: (11) 2167-1101

www.ltr.com.br

Janeiro, 2016.

Versão impressa: LTr 5416.4 – ISBN 978-85-361-8710-5

Versão digital: LTr 8867.6 – ISBN 978-85-361-8722-8

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O Novo Manual do Trabalho Doméstico 5O Novo Manual do Trabalho Doméstico 5

Sumário

Prefácio — Ministra Delaíde Miranda Arantes ............................................................ 11

Introdução ....................................................................................................................... 15

Capítulo I — O Contrato de Trabalho Doméstico: Evolução Jurídica no Brasil .... 17 I. Introdução .................................................................................................................. 17 II. Fase de exclusão jurídica .......................................................................................... 17 III. Fase de inclusão jurídica .......................................................................................... 19

1. Período anterior à Constituição de 1988: modesta normatização inclusiva . 192. Período deflagrado pela Constituição de 1988: ciclo de institucionalização

da cidadania trabalhista doméstica .................................................................... 20A) Cidadania deflagrada (CF/88) ....................................................................... 20B) Cidadania ampliada (Lei n. 11.324/06) ........................................................ 21C) Cidadania consolidada (EC n. 72/13 e LC n. 150/15) ............................... 23

IV. A natureza especial da normatização do trabalho doméstico ............................. 25

Capítulo II — Estrutura Jurídica da Relação de Emprego Doméstico .................. 27 I. Introdução .................................................................................................................. 27 II. Empregado e empregador domésticos: definição ................................................. 27 III. Estrutura da relação de emprego doméstico: elementos fático-jurídicos .......... 29

1. Elementos fático-jurídicos gerais ....................................................................... 29A) Pessoa natural como prestadora de serviços ............................................... 30B) Pessoalidade ..................................................................................................... 31C) Onerosidade ..................................................................................................... 32D) Subordinação ................................................................................................... 35

2. Elemento fático-jurídico geral, com peculiaridades — a continuidade ........ 403. Elementos fático-jurídicos especiais .................................................................. 44

A) Finalidade não lucrativa dos serviços ........................................................... 45B) Prestação dos serviços à pessoa ou à família ............................................... 47C) Âmbito residencial da prestação dos serviços ............................................. 48

IV. Paralelismo de relações jurídicas: enquadramento ............................................... 49

Capítulo III — O Novo Contrato de Trabalho Doméstico: Síntese das Regras Atuais Aplicáveis (LC n. 150/2015) ....................................................................... 51

I. Introdução .................................................................................................................. 51

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6 Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado

II. Contrato de trabalho doméstico: caracterização. Novos documentos e cláusulas formalizados .............................................................................................................. 51

III. Regras aplicáveis ao contrato de trabalho doméstico ........................................... 531. Contratos a prazo e contrato por tempo indeterminado ................................ 532. Duração do trabalho: diária e semanal. Regime clássico de compensação de

horas e banco de horas. Jornada de plantão (12 x 36). Horas extras. Trabalho noturno. Trabalho do empregado que presta serviços em viagem em acom-panhamento do empregador: peculiaridades. Trabalho em regime de tempo parcial. Registro do horário de trabalho ........................................................... 54

3. Intervalos trabalhistas dentro da jornada diária: regra geral; redução do intervalo para 30 minutos; regra especial do empregado que mora no local de trabalho — desmembramento do intervalo. Intervalos interjornadas .... 55

4. Dias de descanso: repouso semanal remunerado e repouso em feriados ..... 565. Férias anuais remuneradas. Prazo padrão e prazos especiais do regime de

tempo parcial. Período aquisitivo e período concessivo. Concessão unitária (30 dias) ou concessão parcelada das férias. Gozo das férias: pagamentos pertinentes. Procedimentos formais relativos às férias. Férias vencidas, simples e proporcionais ....................................................................................... 57

6. Salário. O complexo salarial mensal: salário básico e acréscimos salariais. Descontos salariais autorizados e descontos proibidos. Pagamento salarial. Lançamento mensal de dados no Simples Doméstico. Guia única de arre-cadação .................................................................................................................. 58

7. Vale-transporte ou concessão dos valores para aquisição de passagens ....... 608. Garantias vinculadas à empregada gestante e parturiente e à proteção da

criança recém-nascida: licença-maternidade de 120 dias e garantia de em-prego desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Garantia correlata: a licença-paternidade de cinco dias...................................................... 60

9. Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ......................................................... 6110. Interrupções e suspensões contratuais ............................................................... 6211. Terminação do contrato de trabalho. Dispensa do empregado sem justa

causa nos contratos por tempo indeterminado: verbas e procedimentos rescisórios. Peculiaridade rescisória nos contratos a prazo. O aviso-prévio e suas dimensões. O seguro-desemprego .......................................................... 63

12. Terminação do contrato de trabalho. Dispensa por justa causa do empregado: caracterização; verbas e procedimentos rescisórios. Hipóteses de justa causa obreira .................................................................................................................... 70

13. Terminação do contrato de trabalho. Ruptura por infração grave do empre-gador: rescisão indireta — caracterização. Verbas rescisórias. O aviso-prévio. Procedimentos rescisórios peculiares. O seguro-desemprego. Hipóteses de rescisão indireta .................................................................................................... 72

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14. Terminação do contrato de trabalho. Pedido de demissão pelo empregado: regra geral; peculiaridade nos contratos a prazo; verbas e procedimentos rescisórios. Outros fatores extintivos do contrato de trabalho: morte do empregado e morte do empregador — verbas e procedimentos rescisórios 75

15. A comprovação do cumprimento contratual, previdenciário e fiscal: guarda de documentos pelo empregador; prescrição aplicável às parcelas trabalhistas, fiscais e previdenciárias; fiscalização indireta e direta — a peculiaridade da fiscalização direta no ambiente de trabalho doméstico ................................... 80

IV. O Simples Doméstico ............................................................................................... 821. O sistema oficial virtual de cadastramento e inserção de dados relativos

à existência e ao desenvolvimento do contrato de trabalho doméstico. O Simples Doméstico hospedado no e-Social Doméstico ................................... 82

2. O documento único de arrecadação mensal do Simples Doméstico ............ 83 V. A nova amplitude da inserção previdenciária e de seguridade social do empregado

doméstico ................................................................................................................... 851. A adaptação das leis previdenciárias às mudanças deflagradas pela EC n.

72/2013 e LC n. 150/2015 .................................................................................... 862. O sentido da extensão do art. 7o, XXVIII, da Constituição da República à

relação de emprego doméstico ............................................................................ 89

Capítulo IV— Comentários às Normas da Lei Complementar n. 150/2015........ 91 I. Introdução .................................................................................................................. 91 II. Do contrato de trabalho doméstico ........................................................................ 91 III. Do Simples Doméstico ............................................................................................... 156 IV. Da legislação previdenciária e tributária ................................................................ 163 V. Do Programa de Recuperação Previdenciária dos Empregadores Domésticos

(REDOM) .................................................................................................................. 169 VI. Das disposições gerais da Lei Complementar n. 150/2015 .................................. 172

Capítulo V — Trabalho Doméstico: Textos Normativos Referenciais .................. 179 I. Constituição da República Federativa do Brasil ................................................... 179

1. Art. 7o, caput, incisos e parágrafo único, Constituição da República (texto original de 1988) ................................................................................................... 179

2. Art. 7o, caput, incisos e parágrafo único, Constituição da República (texto reformado pelas Emendas Constitucionais n. 20/1998, n. 28/2000, n. 53/2006 e EC n. 72/2013) .................................................................................................... 180

II. Convenções Internacionais da OIT ........................................................................ 1811. Convenção n. 182 da OIT – ratificada pelo Brasil pelo Decreto Legislativo

n. 178, de 14 de dezembro de 1999, com promulgação pelo Decreto do Presidente da República n. 3.597, de 12 de setembro de 2000 ........................ 181

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8 Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado

A. Convenção n. 182 — Sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação Imediata para a sua Eliminação....................................... 181

B. Decreto Legislativo n. 178, de 14 de dezembro de 1999 ........................... 184C. Decreto do Presidente da República n. 3.597, de 12 de setembro de 2000 .... 184D. Decreto do Presidente da República n. 6.481, de 12 de junho de 2008 ... 184

2. Convenção n. 189 da OIT — ainda não ratificada pelo Brasil ....................... 200 III. Recomendações Internacionais da OIT ................................................................. 205

1. Recomendação da OIT n. 190 — ratificada pelo Decreto Legislativo n. 178, de 14 de dezembro de 1999, com promulgação pelo Decreto n. 3.597, do Presidente da República, de 12 de setembro de 2000 ...................................... 205

2. Recomendação da OIT n. 201 – ainda não ratificada pelo Brasil .................. 208 IV. Lei Complementar n. 150, de 1o de junho de 2015............................................... 213 V. Leis ordinárias ........................................................................................................... 221

1. Lei n. 5.859, de 11 de dezembro de 1972 ........................................................... 221A. Lei n. 5.859/72 (texto original de 1972) ....................................................... 221B. Lei n. 5.859/72 (texto alterado pela Lei n. 10.208/2001, pela Lei n.

11.324/2006 e pela Lei n. 12.964/2014, até sua revogação pela Lei Com-plementar n. 150/2015) .................................................................................. 222

2. Lei n. 7.418, de 16 de dezembro de 1985 (texto já com alterações promovidas pela Lei n. 7.619, de 30.9.1987 e diplomas legais subsequentes) .................... 224

3. Lei n. 10.208, de 23.3.2001 (texto original de 2001; este texto já está incorpo-rado na nova redação da Lei n. 5.859/72, indicado no item IV.1.B, retro) .... 225

4. Lei n. 11.324, de 19 de julho de 2006 (texto original de 2006; este texto já está incorporado na nova redação da Lei n. 5.859/72, indicado no item IV.1.B, retro) ....................................................................................................................... 225

5. Lei n. 12.506, de 11 de outubro de 2011 (texto original de 2011) .................. 226 VI. Decretos ...................................................................................................................... 227

1. Decreto n. 71.885, de 9 de março de 1973 (regulamenta o texto original da Lei n. 5.859, de 11 de dezembro de 1972) ......................................................... 227

2. Decreto n. 3.361, de 10 de fevereiro de 2000 (regulamenta a Lei n. 5.859/1972, alterada pela Lei n. 10.208/2001, pela Lei n. 11.324/2006 e pela Lei n. 12.964/2014, até a sua revogação pela Lei Complementar n. 150/2015) ....... 228

3. Decreto n. 95.247, de 17 de novembro de 1987 ................................................ 2294. Decreto n. 4.552, de 27 de dezembro de 2002 .................................................. 2335. Decreto n. 4.870, de 30 de outubro de 2003 ...................................................... 2396. Decreto n. 8.373, de 11 de dezembro de 2014 .................................................. 240

VII. Instruções Normativas do Ministério do Trabalho e Emprego ......................... 2421. Instrução Normativa n. 110, de 6 de agosto de 2014 ....................................... 242

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VIII. Resoluções ............................................................................................................... 2431. Resolução n. 1, de 20 de fevereiro de 2015, do Comitê Gestor do e-Social ... 2432. Resolução n. 4, de 20 de agosto de 2015, do Comitê Gestor do e-Social ....... 2463. Resolução CODEFAT n. 754, de 26 de agosto de 2015.................................... 2474. Resolução n. 780, de 24 de setembro de 2015, do Presidente do Conselho

Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (referendada pela Resolução n. 782, de 7 de outubro de 2015) ...................................................... 250

Referências Bibliográficas ............................................................................................. 251

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Prefácio

Profundamente honrada e com imensa satisfação, recebi da Professora Gabriela Neves Delgado e do Ministro do TST, Mauricio Godinho Delgado, um dos mais importantes convites de toda a minha vida: prefaciar esta inédita e fascinante obra.

O Novo Manual do Trabalho Doméstico consiste em aprofundada pesquisa sobre a Emenda Constitucional n. 72/13 e a Lei Complementar n. 150/15 — as duas maiores e mais recentes conquistas da evolução histórica dos direitos dos trabalhadores domésticos, no Brasil.

Os dois principais juristas em matéria de Direito do Trabalho de nosso país presenteiam os leitores com obra marcada pela legitimidade advinda de sua demons-trada vocação e competência às letras jurídicas, cultivadas por ambos nos estudos de Doutorado de Filosofia do Direito pela UFMG.

Entre as diversas obras publicadas pelos autores, é imperativo registrar a correlação entre esse estudo e a abordagem apresentada nas obras “Constituição da República e Direitos Fundamentais” (obra dual dos referidos autores); “Curso de Direito do Trabalho” (obra individual de Mauricio Godinho Delgado) e “Direito Fundamental ao Trabalho Digno” (obra individual de Gabriela Neves Delgado).

O magistral estudo deste Novo Manual do Trabalho Doméstico tem como paradigmas constitucionais estruturantes o primado da dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho (como fundamento da República) e o princípio da igualdade.

Originalmente, a igualdade na valorização social do trabalho doméstico ficou limitada, na Carta Magna, à redação restritiva do parágrafo único do art. 7o e daí o enorme significado para os domésticos da EC n. 72/13. A mudança do texto consti-tucional, fundamental para a concretização do princípio da igualdade, é amplamente tratada em pesquisas traduzidas nesta obra pelo Ministro Mauricio Godinho Delgado e pela Professora da UnB e Coordenadora do Grupo de Pesquisa “Trabalho, Cidadania e Constituição” (UnB/CNPq), Professora Gabriela Neves Delgado.

Os autores demonstram com maestria que a igualdade de direitos entre os traba-lhadores urbanos, rurais e domésticos é a maneira de consolidar o direito fundamental ao trabalho digno, na perspectiva de um Direito do Trabalho constitucionalizado. A partir dessa perspectiva, discorrem sobre a possibilidade de assegurar tratamento igualitário entre os trabalhadores e estender aos domésticos a plenitude da garantia constitucional da dignidade da pessoa humana na relação empregatícia.

A promulgação da Emenda Constitucional n. 72/2013 ocorreu em um contexto permeado de polêmicas na sociedade e na mídia sobre as mudanças que a alteração do texto maior acarretaria. As grandes discussões versavam sobre as repercussões e

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12 Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado

previsões de consequências nefastas que poderiam advir das novas conquistas dos trabalhadores domésticos, como o desemprego em massa e o caos para a categoria.

Nessa conjuntura, foi possível perceber também o evidente preconceito e a discri-minação contra o trabalhador doméstico, considerando, principalmente, os recortes de raça e gênero, tendo em vista que a maioria dos trabalhadores é constituída de mulheres, mais de noventa por cento, e de mulheres negras, mais de sessenta por cento.

O cenário de reação à jornada de trabalho dos empregados domésticos é de difícil compreensão quando se constata que desde o remoto ano de 1919, há quase 100 anos, a Organização Internacional do Trabalho já havia aprovado a Convenção, limitando a jornada semanal de todos os trabalhadores em 48 horas semanais.

Dados da Pesquisa Nacional para Amostra de Domicílios (PNAD), realizada em 2007 demonstram que 35,5% dos ocupados trabalharam em jornada superior a 44 horas semanais e 20,3% trabalharam de 48 horas semanais, significando que grande parte dos domésticos no Brasil executa jornadas semanais longas, e, muitas vezes, superiores ao limite legal.

De acordo com pesquisa realizada em 117 países do mundo pela Organização Internacional do Trabalho em janeiro de 2013, o Brasil é o país com maior número de trabalhadores domésticos, somando mais de seis milhões de pessoas nessa categoria. Segundo o Organismo Internacional, o setor é caracterizado pelo elevado grau de infor-malidade, sendo que o número global de domésticos no mundo pode chegar à casa de cem milhões de trabalhadores.

Como situação agravante, no Brasil, apenas 30% dos trabalhadores domésticos têm seus contratos de trabalho formalizados através do registro em carteira de trabalho, o que acarreta severos prejuízos quanto aos benefícios previdenciários, inclusive aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição.

A realidade, no Brasil e no Mundo, ainda é de desrespeito aos direitos dos traba-lhadores domésticos, prática que deverá ser transformada pela luta dos povos em favor da igualdade e da não discriminação. Esperamos por mudança de paradigma em relação a trabalhadores e serviços da maior relevância em nossas vidas. Para a igualdade plena ainda há um longo caminho a ser percorrido, um aprendizado para patrões e empregados, mas com a Emenda Constitucional n. 72/13, o trabalhador doméstico se transforma em um cidadão de direitos.

Por tais razões, a Emenda Constitucional n. 72/13 e a Lei Complementar n. 150/15 significam, além do avanço de importantes conquistas, o resgate de uma dívida do Brasil com os trabalhadores domésticos.

O Tribunal Superior do Trabalho contribuiu com as Comissões do Senado e da Câmara ao projeto de regulamentação. O Presidente do TST, à época Ministro Carlos Alberto Reis de Paula e o Ministro Mauricio Godinho Delgado, um dos autores desta obra, bem como outros ministros tiveram a oportunidade de apresentar contribuições

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escritas ao Legislativo para compor o Projeto da Emenda Constitucional promulgada em abril de 2013.

Nesse cenário, a presente obra, que tenho a honra de prefaciar, resulta de importante pesquisa e estudo, reunindo aspectos históricos, teóricos e práticos relacionados ao tema da maior relevância para a efetivação dos direitos fundamentais sociais trabalhistas de uma categoria de trabalhadores que, do ponto de vista histórico, conquistou muito lentamente sua real cidadania.

Com a didática de professores renomados, os autores apresentaram resultado de aprofundados estudos e pesquisas nesta obra, dividida em cinco capítulos. Iniciando pela evolução jurídica que o contrato de trabalho doméstico percorreu no Brasil (Capí-tulo 1 — Contrato de Trabalho Doméstico: Evolução Jurídica no Brasil), discorrem com propriedade sobre a Estrutura Jurídica da Relação de Emprego Doméstica (Capítulo 2) e sobre a síntese das atuais regras (Capítulo 3 — Novo Contrato de Trabalho Doméstico: Síntese das Regras Atuais Aplicáveis (LC n. 150/2015).

Em sequência, apresentam fundamentados e importantes Comentários às Normas da Lei Complementar n. 150/15 (Capítulo 4) e, por fim, compilam os textos normativos da atual regulamentação, no Capítulo 5 — Trabalho Doméstico: Textos Normativos Referenciais.

Os autores fornecem conteúdo imprescindível para a compreensão dos contornos jurídicos da relação de emprego doméstico, no momento em que os envolvidos, principalmente trabalhadores e empregadores domésticos, buscam entender os novos direitos e preceitos aplicáveis.

A obra, portanto, apresenta-se como importante marco doutrinário para o domínio das mudanças constitucionais e legislativas, que buscam superar a tradição de desi-gualdade por muito tempo perpetuada nas relações de emprego doméstico. Os autores articulam de maneira sofisticada a nova estrutura jurídica do contrato de trabalho doméstico, de forma a cumprir os comandos constitucionais de igualdade para que todo trabalho seja digno. Brindam, assim, os leitores com segurança e conteúdo.

Ministra Delaíde Miranda ArantesTribunal Superior do Trabalho

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Introdução

O Novo Manual do Trabalho Doméstico estuda o conteúdo normativo sobre a relação empregatícia e o contrato de trabalho domésticos, com suporte na Emenda Constitucional n. 72/2013 e na Lei Complementar n. 150/2015.

A proposta nuclear da obra é a de apreender, analiticamente, a teoria do trabalho doméstico, assegurando ao leitor instrumental suficiente para contextualizá-la na prática jurídica trabalhista brasileira. Trata-se, portanto, de contribuição doutrinária que busca reunir, em equilibrada simbiose, consistente suporte teórico, harmonizado a prudente e criterioso sentido prático.

Os cinco capítulos, organicamente vinculados, procuram apresentar ao leitor exame metódico e cuidadoso do trabalho doméstico no Direito pátrio, seja na pers-pectiva anterior às modificações constitucionais e legais mais recentes, seja no que diz respeito ao impacto e à compreensão dessas modificações que hoje regem o trabalho doméstico.

O Capítulo I apresenta retrospectiva da evolução jurídica do trabalho doméstico no Brasil. A análise tem início na fase de exclusão jurídica, sendo posteriormente complementada pelo estudo da fase de inclusão jurídica, com o trajeto de institucio-nalização da cidadania trabalhista doméstica no País. Aqui, são examinadas as fases da cidadania deflagrada pela Constituição de 1988; da cidadania ampliada pela Lei n. 11.324/06; e da cidadania consolidada pela Emenda Constitucional n. 72/13 e pela Lei Complementar n. 150/15.

O Capítulo II apresenta visão característica da estrutura da relação empregatícia doméstica, mediante estudo específico de seus elementos fático-jurídicos gerais (pessoa natural como prestadora de serviços, com pessoalidade, onerosidade e subordinação), de seu elemento fático-jurídico geral, mas com peculiaridades (a continuidade) e de seus elementos fático-jurídicos especiais (finalidade não lucrativa dos serviços, prestação de serviços à pessoa ou à família, realizados no âmbito residencial da prestação dos serviços).

Neste capítulo são também analisadas situações de paralelismo de relações jurídicas, em que há fusão contratual intensa, e muitas vezes em nítida simultaneidade temporal (a denominada “promiscuidade” de contratos), entre prestações de trabalhos distintas (o trabalho doméstico e o celetista, por exemplo), com a proposta de enquadramento jurídico possível.

O Capítulo III sintetiza as regras trabalhistas atuais aplicáveis aos contratos de trabalho domésticos, em observância à Lei Complementar n. 150/2015. Neste capítulo se aborda a novidade do Simples Doméstico, concretizado por meio do programa virtual oficial denominado e-social Doméstico. Também foi analisada a nova amplitude da

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inserção previdenciária e de seguridade social assegurada aos empregados domésticos pela Lei Complementar n. 150/2015.

O Capítulo IV segue em complementação ao capítulo anterior, com o objetivo de sistematizar os comentários específicos às normas da Lei Complementar n. 150/2015, no formato de anotações de referência.

O Capítulo V apresenta um repositório dos textos normativos referenciais sobre o trabalho doméstico no Brasil, com vistas a situar e a facilitar o trânsito do leitor por esse complexo arcabouço jurídico. Foram destacados, ilustrativamente, os seguintes diplomas normativos: a Constituição de 1988, particularmente em seu art. 7o, incisos e parágrafo único, que têm correspondência com a regulação do trabalho doméstico; as Convenções e Recomendações internacionais da OIT vinculadas ao tema; a Lei Complementar n. 150/2015; distintas leis ordinárias específicas correlatas ao assunto (Lei n. 5.859/72; Lei n. 11.324/2006, entre outras); decretos vinculados ao mesmo tema; instruções normativas do Ministério do Trabalho e Emprego (desde outubro de 2015, Ministério do Trabalho e Previdência Social).

Em conjunto, esses cinco capítulos asseguram ao leitor uma visualização ampla, técnica, reflexiva e, ao mesmo tempo, prática da relação empregatícia doméstica e do novo contrato de trabalho doméstico em seus contornos normativos mais atualizados.

Brasília, novembro de 2015.

Mauricio Godinho Delgado

Gabriela Neves Delgado

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O Novo Manual do Trabalho Doméstico 17O Novo Manual do Trabalho Doméstico 17

Capítulo I O Contrato de Trabalho Doméstico:

Evolução Jurídica no Brasil

I. Introdução

A evolução jurídica do contrato de trabalho doméstico no Brasil evidencia a presença de um dos mais dramáticos exemplos de exclusão civilizatória percebida na sociedade brasileira no século XX.

Todo o desenvolvimento do Direito do Trabalho no País, a contar das décadas de 1930 e 1940, não teve a aptidão de alcançar esse numeroso segmento de trabalhadores componentes da realidade laborativa brasileira, que se manteve em impressionante limbo jurídico até as décadas finais do século passado.

A extensão do Direito do Trabalho, por sua vez, a esse segmento trabalhista peculiar fez-se em ritmo marcadamente lento, somente acentuando seus passos com a promulgação da Constituição de 1988.

Nesse contexto, o cenário aberto pela Constituição da República é que permitiu deflagrar-se um processo crescente de resgate dessa profunda dívida civilizatória, de maneira a integrar a categoria dos empregados domésticos no universo de direitos e garantias característico do Direito do Trabalho.

Esse processo de inclusão jurídica trabalhista encontrou seu ápice com a Emenda Constitucional n. 72, de 2013, e seu diploma normativo regulamentador, a Lei Comple-mentar n. 150, de 2015.

II. Fase de exclusão jurídica

O contrato de trabalho doméstico caracteriza-se por ser a última das figuras de contratação empregatícia de trabalhadores no Brasil que foi incorporada pelo Direito do Trabalho do País.

Desde a década de 1930, como se sabe, o Direito do Trabalho passou a se gene-ralizar na economia e na sociedade brasileiras, deflagrando um processo de inserção econômica e social de importantes segmentos da população nacional. Nesse processo de generalização e de inclusão, a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), aprovada pelo Decreto-lei n. 5.452, de 1o de maio de 1943, teve papel de destaque, ao lado de inúmeros diplomas legais esparsos complementares que foram instituídos nos anos e décadas subsequentes a 1943.

Essencialmente apenas dois tipos de efetivos empregados mantiveram-se excluí-dos desse processo de integração jurídico-trabalhista generalizado nos anos 1930: os

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trabalhadores rurais e os trabalhadores domésticos, mesmo que fossem, já àquela época, contratados com os elementos componentes da relação de emprego.

No início da década de 1960, por meio da Lei n. 4.214, de 1963, denominada de Estatuto do Trabalhador Rural (ETR, que teve vigência em 2.6.63), estendeu-se a legis-lação trabalhista ao campo brasileiro, ainda que respeitadas certas especificidades. Essa inclusão jurídica e institucional dos rurícolas, a propósito, produziu impressionante impacto no imaginário político daquela época, sendo considerada, até mesmo, um dos fatores que impulsionou a derrubada do governo constitucional de João Goulart, por meio do golpe civil e militar ocorrido em março e abril de 1964.(1)

Com respeito às relações de trabalho domésticas, entretanto, o processo de sua inserção no Direito do Trabalho foi ainda postergado, tendo se realizado, ademais, em ritmo substancialmente mais lento.

No tocante a essa fase de exclusão jurídica, assim se manifesta Mauricio Godinho Delgado:

“A categoria doméstica não recebeu qualquer proteção jurídica do Direito do Trabalho em sua fase clássica de institucionalização (1930, em diante). Por décadas permaneceu excluída de qualquer cidadania trabalhista, previdenciária e institucional.

De fato, a CLT exclui, expressamente, os empregados domésticos do âmbito de suas normas protetivas (art. 7o, “a”). A categoria permaneceu, assim, por extenso período, em constrangedor limbo jurídico, sem direito sequer a salário mínimo e reconhecimento previdenciário do tempo de serviço.

Um antigo diploma fez referência a esses trabalhadores (Decreto-lei n. 3.078, de 1941), com o fito de lhes atribuir determinados direitos. Porem impôs, expressamente, para sua efetiva vigência a necessidade de regulamentação inferior — a qual jamais foi procedida”.(2)

Nesse contexto, a fase de exclusão jurídica iria perdurar por mais um longo tempo. Tão grave quanto isso: o processo de suplantação dessa exclusão jurídica realizou-se em ritmo evolutivo incrivelmente lento, despendendo de mais de quatro décadas para alcançar seu ponto final de maturação (realmente, se tomados os marcos da tímida Lei n. 5.859, de 1972, e a recente Lei Complementar n. 150, de 2015, passaram-se cerca de 43 anos!).

(1) Note-se que, nos anos de 1960, a maioria da população brasileira ainda se encontrava no campo, uma vez que a taxa de urbanização detectada pelo censo do IBGE de 1960 indicava ainda o modesto índice de 44,67%, evidenciando a prevalência da população rural no País (a respeito, consultar o Capítulo IV, “Direito do Trabalho e Inclusão Social: o desafio brasileiro”, do livro de Mauricio Godinho Delgado, Capitalismo, Trabalho e Emprego: entre o paradigma da destruição e os caminhos de reconstrução. São Paulo: LTr, 2006; 2. ed., 2015). O Estatuto do Trabalhador Rural — Lei n. 4.214/63 — foi revogado pela Lei n. 5.889, de 1973, diploma normativo ainda hoje vigente. O novo diploma, conhecido como Lei do Trabalho Rural, embora aprovado no período do regime militar, manteve a extensão da legislação trabalhista, inclusive a CLT, às relações laborativas rurais. Tal processo de extensão foi aperfeiçoado, tempos depois, com o advento da Constituição da República de 5.10.1988.

(2) DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015. p. 404.

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III. Fase de inclusão jurídica

A fase de inclusão jurídica da categoria doméstica no Direito do Trabalho brasileiro ostenta dois momentos sumamente diversos: o período pré-Constituição de 1988 e o período inaugurado com a Constituição de 1988.

1. Período anterior à Constituição de 1988: modesta normatização inclusiva

O período antecedente à nova Constituição da República foi inaugurado pela singela e esquálida Lei n. 5.859, de 1972, que estendeu exclusivamente dois únicos direitos trabalhistas aos empregados domésticos (direito à assinatura de sua CTPS e direito às férias anuais remuneradas de 20 dias úteis), além de ter propiciado a inserção da categoria no sistema previdenciário oficial, o então denominado INPS (hoje, INSS).

Em síntese, apenas com a Lei n. 5.859, de 1972 (por décadas conhecida como Lei do Trabalho Doméstico), é que a ordem jurídica do País fez breve referência inclusiva ao contrato e à categoria domésticos. Referência rigorosamente modesta, por ter sido pouco expressiva do ponto de vista trabalhista, embora com o condão de também incluir esses trabalhadores empregatícios no âmbito da Previdência Social (mesmo assim, inclusão ainda limitada, ressalte-se).

Como adiantado, somente dois direitos trabalhistas foram estendidos aos empre-gados domésticos pela Lei n. 5.859/72 (assinatura de Carteira do Trabalho e Previdência Social — CTPS — e concessão de férias anuais remuneradas de 20 dias úteis); ao lado desses dois direitos eminentemente trabalhistas, foi também estendido importante direito previdenciário, consubstanciado na possibilidade de inserção dos empregados domésticos no sistema oficial da Previdência Pública.(3)

Nos anos de 1980, ainda antes da Constituição de 1988, outra parcela trabalhista iria se agregar a este exíguo rol: o direito ao vale-transporte, então criado pelas Leis ns. 7.418/85 e 7.619/87, com seu regulamento normativo aprovado pelo Decreto n. 95.247/87.

Sobre esse período inicial de inclusão trabalhista e previdenciária, precedente ao advento da Constituição de 1988, assim expõe Mauricio Godinho Delgado:

“Conforme visto, apenas no início da década de 1970, com a Lei n. 5.859, de 11.12.1972, é que a categoria adquiriu um mínimo de cidadania jurídica. Cidadania mínima, entretanto, uma vez que a Lei n. 5.859 não mais do que, praticamente, apenas formalizava a exclusão, ao não estender inúmeros direitos trabalhistas clássicos à categoria doméstica (o diploma legal fixou a pertinência da assinatura de CTPS, inserção na Previdência Social e férias

(3) Naturalmente que a inserção previdenciária ocorreria, na prática, caso a CTPS fosse assinada pelo empregador, passando este a recolher, em carnet e código próprios, as respectivas contribuições previdenciárias mensais (a sua cota-parte e a cota-parte do empregado). De todo modo, o direito à inserção previdenciária passou a existir apenas se configurada a relação de emprego doméstica e feitos os recolhimentos previdenciários. Contudo, essa inserção previdenciária não foi ampla, uma vez que não se estenderam todos os direitos da legislação previdenciária então vigorante aos empregados domésticos.

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anuais remuneradas de 20 dias úteis, silenciando-se por exemplo, sobre salário mínimo, irredutibilidade salarial, 13o salário, aviso-prévio, descanso semanal remunerado, garantia à gestante, etc).

A Lei n. 5.859/72 concedeu à categoria três únicos direitos: férias anuais remuneradas de 20 dias úteis, após cada 12 meses de trabalho (desde a Lei n. 11.324, arts. 4o e 5o — Diário Oficial de 20.7.2006 —, o prazo destas férias passou para 30 dias corridos); anotação de CTPS; inscrição do empregado como segurado obrigatório na Previdência Oficial. O decreto regulamentador da referida lei determinou ainda que se aplicasse ao empregado doméstico o capítulo celetista referente a férias (art. 2o, caput, Decreto n. 71.885/73).

A legislação do Vale-Transporte, surgida na segunda metade da década de 1980, também contemplou o empregado doméstico com a parcela que ins-tituiu (Leis ns. 7.418/85 e 7.619/87 e Decreto n. 95.247/87). Cabe notar-se que apenas o Decreto n. 95.247, de 17.11.87, ao regulamentar os diplomas mencionados, é que explicitou efetivamente a extensão do vale-transporte à categoria doméstica (art. 1o, II, Decreto n. 95.247/87).”(4)

2. Período deflagrado pela Constituição de 1988: ciclo de institucionalização da cidadania trabalhista doméstica

A Constituição da República deflagrou verdadeiro ciclo de institucionalização da cidadania trabalhista para a categoria doméstica, com ênfase nos períodos da cidadania deflagrada, da cidadania ampliada e da cidadania consolidada.

Esse ciclo foi aberto pelo texto original da Constituição de 88, que estendeu oito novos direitos à categoria em contraponto aos quatro anteriormente garantidos (cida-dania deflagrada); passou pela Lei n. 11.324, de 2006, que agregou novos quatro direitos ao rol dos 12 que a categoria doméstica já ostentava, na época (cidadania ampliada); finalmente consumou-se na segunda década do século XXI, mediante a promulgação da Emenda Constitucional n. 72, de 2013, e a subsequente aprovação da Lei Complementar n. 150, de 2015, que regulamentou os avanços produzidos pela EC n. 72 — diplomas normativos que, no conjunto, estenderam 16 novos direitos aos empregados domésticos, vários deles tendo caráter multidimensional e, assim, desdobrando-se em outros direitos trabalhistas e conexos (cidadania consolidada).

A) Cidadania deflagrada (CF/88)

Relativamente ao momento diferenciado aberto pelo texto original da Constituição de 1988, ora denominado de cidadania deflagrada, assim analisa Mauricio Godinho Delgado:

“A Constituição de 1988 garantiu à categoria doméstica um leque muito mais extenso de direitos do que as conquistas anteriormente alcançadas (até então, somente quatro direitos). O rol constitucional compreende as

(4) DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015. p. 404-405. (grifos no original)

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seguintes oito parcelas: salário mínimo; irredutibilidade de salário; 13o sa-lário; repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de cento e vinte dias; licença-paternidade, nos termos fixados em lei; aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo trinta dias, nos termos da lei; aposentadoria (art. 7o, parágrafo único, CF/88). O mesmo dispositivo refere-se, ainda, à integração à previdência social – o que já constava da legislação anterior”.(5)

Observe-se que o direito ao aviso-prévio de 30 dias para o empregado domésti-co passou a vigorar desde 5 de outubro de 1988, ao passo que a proporcionalidade da parcela mencionada pela Constituição somente foi regulamentada tempos depois, pela Lei n. 12.506, publicada em 13.10.2011. É que antes da vigência desse diploma legal regulamentador, a jurisprudência não reconhecia eficácia jurídica e efetividade à regra do “aviso-prévio proporcional” (a respeito, ver Súmula n. 441, TST).

Cabe esclarecer ainda que, anos depois de 1988, certa alteração jurídica ocorreria na Lei do Trabalho Doméstico (n. 5.859/72), produzida pela Lei n. 10.208, de 23.3.2001, produto da Medida Provisória n. 1.986, de 13.12.1999, e subsequentes reedições. O novo diploma normativo permitiu a inserção voluntária, por ato do empregador, do empregado doméstico no sistema do FGTS, com efeitos potenciais, caso dispensado sem justa causa, para a habilitação perante o sistema do seguro-desemprego (verba limitada, nesse caso, a apenas três parcelas, cada uma no valor do salário mínimo). Por se tratar, contudo, de regra jurídica voluntária, opcional, sem qualquer imperatividade, esse preceito singular não teve o condão de acrescer real e efetivo avanço no quadro normativo de inclusão trabalhista aberto pela Constituição de 1988.(6)

B) Cidadania ampliada (Lei n. 11.324/06)

Passados aproximadamente 18 anos da vigência da Constituição de 1988, novo diploma legal iria ampliar, de maneira significativa, o processo de cidadania que fora deflagrado pelo texto original da Constituição da República. Trata-se da Lei n. 11.324, publicada em 20.7.2006.

A nova lei iria acrescentar quatro novos direitos imperativos ao rol dos 12 direitos já existentes para essa categoria especializada. Também agregaria inovador incentivo fiscal em benefício do empregador doméstico, visando a favorecer a formalização trabalhista nesse peculiar segmento empregatício.

(5) DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015. p. 405. Também sobre o processo de abertura democrática e abrangente de direitos fundamentais promovido pela Consti-tuição de 1988, consultar: DELGADO, Gabriela Neves. A CLT aos 70 anos — Rumo a um direito do trabalho constitucionalizado. In: Revista do Tribunal Superior do Trabalho, v. 79, p. 268-294, 2013. Consultar, ainda: BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 279.

(6) A inscrição do empregado doméstico no sistema do FGTS, embora prevista, facultativamente, pela Medida Provisória n. 1986, ainda em 1999, somente se fez possível, do ponto de vista prático, a contar de março de 2000, depois da regulamentação procedida pelo Decreto n. 3.361, de 10.2.2000, em conformidade com o condicionamento previsto pelo próprio texto normativo posteriormente regulamentado.

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Tratando desse momento de ampliação da cidadania trabalhista doméstica, Mauricio Godinho Delgado assim disserta:

“A Lei n. 11.324/2006 (DOU de 20.7.06) fez nova extensão de direitos trabalhistas para a categoria doméstica: descanso remunerado em feriados (art. 9o da Lei n. 11.324/06, revogando exclusão constante no art. 5o da Lei n. 605/1949; 30 dias corridos de férias, para períodos aquisitivos iniciados após a data de sua publicação — 20.7.2006 (arts. 4o e 5o, Lei n. 11.324/06); garantia de emprego à gestante desde a confirmação da gravidez ate cinco meses após o parto (art. 4o-A, Lei n. 5.859/72, conforme Lei n. 11.324/06).

O novo diploma também ratificou antiga interpretação jurídica no sentido de ser vedado “... ao empregador doméstico efetuar descontos no salário do empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia” (art. 2o-A, Lei n. 5.859/72, conforme Lei n. 11.324/06). É que a oferta de tais bens, neste tipo de relação sociojurídica, tem evidente caráter instrumental, viabilizando a melhor prestação de serviços; não tendo fins retributivos, porém instrumentais, tais bens não poderiam mesmo ser descontados e nem somados ao montante salarial, para qualquer efeito (novo art. 2o-A, § 2o, Lei n. 5.859/72). Ressalva, contudo, a nova lei que poderão ser descontadas as despesas com moradia quando esta referir-se a local diverso da residência em que ocorra a prestação de serviço, e desde que tal possibilidade tenha sido expressamente acordada entre as partes (art. 2o-A, § 1o, Lei n. 5.859/72, conforme Lei n. 11.324/06).

O mesmo diploma também criou incentivo fiscal para o empregador doméstico, permitindo-lhe deduzir do imposto de renda, desde o ano fiscal de 2006 (exercício 2007) e até o ano fiscal de 2011 (exercício 2012), as contribuições previdenciárias patronais mensais (inclusive sobre o 13o salário e terço de férias), respeitados o teto de um salário mínimo como salário de contribuição e o lançamento de um único empregado (arts. 1o e 8o da Lei n. 11.324/06). Finalmente promoveu certa desburocratização, autorizando o recolhimento em guia única, até 20 de dezembro, das contribuições previdenciárias relativas ao mês de novembro e ao 13o salário (art. 2o, Lei n. 11.324/06).”(7)

Embora alguns desses direitos estendidos pela Lei n. 11.324, de 2006, já estivessem presentes em certas interpretações jurídicas efetuadas pela jurisprudência, sua inserção em texto legal foi muito importante, uma vez que pacificou, de fato, a matéria. Ademais, as anteriores interpretações sequer eram dominantes na jurisprudência trabalhista, não contando, por exemplo, qualquer uma delas, até então (2006), com texto favorável de súmula de jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho.

(7) DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015. p. 406-407. Esclareça-se que o incentivo fiscal criado pela Lei n. 11.324/2006 tem sido reiteradamente prorrogado para anos subsequentes a 2006/2011. Nesse quadro, está ora previsto para vigorar até o exercício de 2019, ano-calendário de 2018 (art. 12, VII da Lei n. 9.250/95, conforme redação conferida pela Medida Provisória n. 656, de 7.10.2014).

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