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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO ... · A cidadania é um status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade. Todos aqueles que possuem

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS NO ENSINO DE LÍNGUA

PORTUGUESA

Autora: Cleonice Terezinha Totti1

Orientador: José Luiz Zanella2

Resumo: Apresentamos, nos limites deste artigo, a experiência obtida com o Projeto de

Intervenção Pedagógica do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE/PR, turma 2013/2014. O projeto foi desenvolvido no Colégio Estadual Boa Esperança do Iguaçu – Município de Boa Esperança do Iguaçu – PR, tendo como público-alvo os alunos do 3º Ano do Ensino Médio, com o objetivo de ajudá-los a entender as concepções de cidadania e dos direitos humanos assegurados no Estatuto do Adolescente e na Constituição Federal. O artigo trata inicialmente de algumas considerações sobre a história da cidadania, a perspectiva liberal, a perspectiva crítica e a relação entre cidadania, escola e o ensino de Língua Portuguesa no contexto brasileiro e, em seguida, aponta os resultados obtidos com a implementação do Projeto de Intervenção pedagógica na escola. O estudo deste tema requer que os educadores sejam profissionais críticos e reflexivos, com uma postura interdisciplinar e construtivista, capaz de compreender as relações entre sociedade e ser humano, assim como nas relações entre o trabalho pedagógico e o exercício da cidadania.

Palavras – chave: Cidadania, Classe Social, Escola, Língua Portuguesa.

1 Introdução

Este artigo é resultado de estudos que foram realizados para a

elaboração do projeto de Intervenção Pedagógica durante a participação no

Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE/PR, na turma 2013/2014.

Busca-se através deste, relatar o que foi planejado no Projeto de Intervenção

Pedagógica, intitulado: “Cidadania e Direitos Humanos no ensino da Língua

Portuguesa”, que teve como objetivo formar cidadãos ativos a partir do trabalho

desenvolvido na escola, essencialmente no ensino de Língua Portuguesa para

1 Especialização em Ensino de Língua Portuguesa e Pedagogia: Supervisão, Orientação e

Administração Escolar, Licenciada em Língua Portuguesa e Literatura, Professora do Colégio Estadual Boa Esperança do Iguaçu – Ensino Fundamental e Médio. E-mail: [email protected] 2 Doutor em Educação, Especialização para Educadores de Jovens e Adultos, Graduado em Filosofia

e Professor Efetivo da Universidade Estadual do Centro Oeste, Campus de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected]

que sejam capazes de lutar pelos seus direitos no plano individual e social na

busca de uma sociedade mais justa e humana.

A escolha do tema do Projeto de Intervenção Pedagógica foi baseada no

contexto de nossos alunos, pois sabemos que a Constituição Federal garante

nossos direitos como cidadãos. Porém, vivemos num contexto histórico de

Estado neoliberal que tem continuamente atribuído a crise do sistema do

capital ao excesso de direitos dos trabalhadores, tornando-se senso comum a

negação dos direitos sociais, resultado da hegemonia neoliberal.

Por outro lado, este mesmo estado enfatiza a importância da cidadania.

Mas é uma cidadania da lógica do mercado, do instituído, com finalidades de

dinamizar o consumismo.

Colocamo-nos na perspectiva dos interesses da classe trabalhadora e

das lutas dos movimentos sociais. Por isso nos opomos a um ensino escolar

adaptado a lógica do estado neoliberal. Buscamos um ensino escolar que

desvele os processos de dominação e que propicie aos oprimidos o direito ao

trabalho digno com educação de qualidade.

O artigo trata, inicialmente, da reflexão teórico-metodológica que

perpassou os debates realizados durante a implementação do projeto na

escola e, num segundo momento, da sistematização das atividades realizadas

na escola.

Uma das principais funções da educação escolar é a formação para a

cidadania a partir da aquisição de conhecimentos sistematizados. Porém, nem

sempre nós professores da Língua Portuguesa conseguimos estabelecer esta

relação no ensino. Por isso o trabalho realizado na escola proporcionou aos

nossos alunos um ensino contextualizado, instrumentalizando-os para uma

leitura de mundo crítico a fim de que possam lutar pelos seus direitos, tendo

assim uma cidadania ativa.

2 Proposição teórico-metodológica do Projeto de Intervenção Pedagógica

2.1 Considerações sobre a história da cidadania

Ser cidadão é ter a garantia de todos os direitos civis, políticos e sociais que

asseguram a possibilidade de uma vida plena. Esses direitos não foram

conferidos, mas exigidos, integrados e assumidos pelas leis, pelas autoridades

e pela população em geral.

A cidadania não é dada, mas construída em um processo de

organização, participação e intervenção social de indivíduos ou de grupos

sociais. Só na constante vigilância dos atos cotidianos o cidadão pode

apropriar-se desses direitos, fazendo-os valer de fato. Se não houver essa

exigência, eles ficarão no papel.

O conceito de cidadania foi gerado nas lutas que estruturaram os direitos

universais do cidadão. Desde o século XVIII, muitas ações e movimentos foram

necessários para que ampliassem o conceito e a prática de cidadania. Assim

pode-se afirmar que defender a cidadania é lutar pelos direitos, pelo exercício

da democracia e a criação de novos direitos.

A cidadania está definida em cidadania formal e real. A formal é aquela

que está nas leis, principalmente na constituição de cada país, estabelecendo

que todos sãos iguais perante a lei e garantindo ao indivíduo a possibilidade de

lutar judicialmente por seus direitos. Essa garantia é muito importante, pois se

não houvesse leis para determinar nossos direitos, estaríamos nas mãos de

uma minoria, situação que os escravos viveram por muito tempo, sem direito

algum, sem ter autonomia. A cidadania substantiva ou real é aquela que

vivemos no dia a dia, nos mostra que não há uma igualdade fundamental entre

todos os seres humanos, entre homens e mulheres, crianças, jovens e idosos,

negros, pardos ou brancos. O direito à vida é o principal, sem ele os demais

nada valem. São elevados os números de pessoas, principalmente crianças,

morrendo de fome todos os dias em vários países. Percebe-se que estas

pessoas não conseguiram ter direito à vida, o direito real e substantivo à

cidadania.

O segundo direito básico em nossa sociedade, o de ir e vir, é

reconhecido desde o século XVII. No dia a dia, sabemos que nem sempre as

pessoas podem deslocar para qualquer lugar ou até mesmo permanecer no

mesmo. Como podemos perceber, existem algumas áreas públicas, mas

algumas foram fechadas por pessoas que consideram proprietárias e não

permitem a entrada de ninguém, como praias, ruas, vias públicas, os quais

impedem a livre circulação dos cidadãos, desrespeitando esse direito de ir e

vir.

Percebe-se que esses direitos básicos ainda não estão ao alcance da

maioria da população, pode-se imaginar o que acontece com os demais.

De acordo com (TOMAZI, 2010, p.p 140,141):

Cidadania, direitos e movimentos sociais são temas que

frequentemente são debatidos por governos, políticos, empresários

brasileiros ou não, estudantes, trabalhadores entre outro da

sociedade que enfrentam as piores condições de vida. A ideia da

cidadania está relacionada ao surgimento do Estado Moderno e a

expectativa de que este garanta os direitos essenciais dos cidadãos.

A cidadania é uma ideia e uma aspiração também, já existentes há

muitos séculos, mas se tornou consistência e veracidade com a Revolução

Francesa (1789). Foi um acontecimento histórico que encerrou de vez com os

privilégios de nascimentos, você tem direito pelo simples fato de nascer, numa

determinada cidade, num determinado país e tem direitos por que é cidadão e

é cidadão porque tem direito. Direitos esses, baseados nos princípios da

liberdade e da igualdade foram declarados universais, ou seja, válida para

todos os habitantes do planeta. Porém, esses direitos, expressos na

Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão aprovado pela Assembleia

Nacional Francesa, não se estendia para as mulheres. “É bom lembrar o caso

de Olympe de Gouges (1748-1793), ativista e dramaturga que em 1791, propôs

uma declaração dos direitos da mulher e acabou na guilhotina” (Apud:

Thomazi, 2010. p. 36).

Para (MARSHALL, 1967), a questão da cidadania só começou a

aparecer nos séculos XVII e XVIII, e ainda assim de forma sutis, por meio da

formulação dos chamados direitos civis. Naquele momento, procurava-se

garantir a liberdade religiosa e de pensamento, o direito de ir e vir, o direito à

propriedade, a liberdade contratual, principalmente a de escolher o trabalho,

finalmente, a justiça, que deveria salvaguarda (pôr fora de perigo, defender)

todos os direitos anteriores, mas não para todas as pessoas.

No século XX, chega a vez dos direitos sociais serem praticados. As

pessoas passaram a ter direito à educação básica, assistência à saúde,

programas de lazer, acesso ao sistema judiciário. Os direitos civis, políticos e

sociais estão assentados no princípio da igualdade, porém não podem ser

considerados universais, pois são vistos de modo diferente em cada estado e

em cada época. No final do século XX, e início do século XXI, surgem outros

direitos relacionados a segmentos e situações sociais específicas.

Nas palavras de (MARSHALL, 1967),

A cidadania é um status concedido àqueles que são membros

integrais de uma comunidade. Todos aqueles que possuem status

são iguais com respeito aos direitos e obrigações pertinentes ao

status. Não há nenhum princípio universal que determine o que estes

direitos e obrigações serão, mas a sociedade nas quais a cidadania é

uma instituição em desenvolvimento criam uma imagem de uma

cidadania ideal em relação à qual a aspiração pode ser dirigida. (...) A

classe social, por outro lado, é um sistema de desigualdade, e esta

também, como a cidadania, pode estar baseada num conjunto de

ideias, crenças e valores. É, portanto, compreensível que se espere

que o impacto da cidadania sobre a classe social tomasse a forma de

um conflito entre o princípio opostos (MARSHALL, 1967, p. 76).

2.2 A cidadania na perspectiva liberal

No contexto atual faz-se necessário uma reflexão de quais são as

dimensões que a perspectiva liberal atinge e a que classe social realmente

interessa.

Segundo John Locke (1632 -1704), somente os homens livres e iguais

podem fazer um pacto com o objetivo de estabelecer uma sociedade política.

Para o pensador francês Jean-Jacques Rousseau ( 1712-1778), a igualdade só

tem sentido se for baseada na liberdade, segundo sua definição, a igualdade:

“todos devem ser iguais perante a lei”.

Para que possamos entender a cidadania atual faz-se necessário voltar

no tempo e entender a ideologia capitalista como sistema econômico e político

que nasce a partir da crise do feudalismo. No século XIV surgiu nova classe

social que é a burguesia, sistema que se consolida no século XVIII, com a

revolução burguesa (Gloriosa Francesa e Independência dos EUA). Portanto, a

concepção de mundo liberal nada tem de natural, o que temos é uma maneira

de pensar historicamente determinada por uma classe social que é a

burguesia.

Para os liberais o mérito é tudo, talento, aptidões, esforço pessoal são

motivos de sua existência. Para eles o ser humano é como se fosse em

“átomo”, ser isolado com um grande potencial que precisa de espaço para

desenvolver o seu projeto de vida através do trabalho e talento que são os

mecanismos essenciais para a ascensão social e aquisição de riquezas,

qualquer indivíduo pobre que tenha vontade, que trabalhe pode adquirir bens e

datar- se de riquezas. (Cunha, 1991, p.31)

De acordo com os liberais as relações com o Estado e defendido com a

tese do estado “mínimo”, o melhor estado é aquele que governa menos, para

eles o bom seria que houvesse uma sociedade sem Estado, no entanto

defendem a existência do mesmo (Estado) entenderam que a natureza

humana é tão agressiva a ponto de comprometer a liberdade. Aí então, limita-

se a ação do Estado em três funções, que predominam a função policial:

proteção do indivíduo uns contra os outros; a função judicial: mediador das

desavenças (sociais), e a função militar: proteção dos indivíduos contra

agressões externas (Chaves, 2000, p.2).

O interessante do pensamento liberal foi à inserção na história do direito

de defesa do indivíduo com a criação de leis via parlamento e a liberdade de

expressão e de pensamento. A concepção liberal de cidadania é filha do

capitalismo, porém muito mais formal que ligada ao movimento real da história.

Formal, pois defende a liberdade de alguns indivíduos, daqueles que tem mais

riquezas e bens em relação à maioria de uma população empobrecida, ou seja,

muitas vezes filhos da miséria (miseráveis). Para os liberais a igualdade só

existe perante a lei, pois na realidade desde que nascemos somos diferentes, e

essa diferença que explica o porquê de tanta riqueza para poucos e a pobreza

para muitos, seria injusto para eles a igualdade real.

Para os liberais a cidadania se resume no comprimento das leis

(Constituições, Códigos de defesa do consumidor, Estatuto da Criança e do

Adolescente...). É conhecida a expressão dos direitos e dos deveres de cada

um, sendo que o meu direito começa onde termina a do outro... É este

individualismo que Marx (2000) denuncia e crítica na obra A Questão Judaica

(2000) como sendo um impedimento da emancipação humana.

O direito humano à propriedade privada, portanto, é o direito de

desfrutar de seu patrimônio e dele dispor arbitrariamente, sem

atender aos demais homens, independentemente da sociedade, é o

direito do interesse pessoal. (...) Nenhum dos chamados direitos

humanos ultrapassa, portanto, o egoísmo do homem, do homem

como membro da sociedade burguesa, isto é, do indivíduo voltado

para si mesmo, para seu interesse particular, em sua arbitrariedade

privada e dissociado da comunidade. Longe de conceber o homem

como um ser genérico, estes direitos, pelo contrário, fazem da própria

vida genérica, da sociedade, um marco exterior aos indivíduos, uma

limitação de sua independência primitiva. O único nexo que os

mantém em coesão é a necessidade natural, a necessidade e o

interesse particular, a conservação de suas propriedades e de suas

individualidades egoístas (Marx, 2000, p.p 36-37).

Sendo assim, a cidadania limita-se ao âmbito formal e no cumprimento

do que está prescrita pela lei, sempre numa perspectiva individual defendendo

alguns, sem muito preocupar-se com os outros.

De acordo com Émile Durklein, apud Tomazi (2010), a ideia de cidadania

está vinculada à questão da coesão social estabelecida com base na

solidariedade orgânica, que é gerada pela divisão de trabalho e se expressa

no direito civil.

Nos dias de hoje, em que predomina o individualismo, talvez essa seja a

maior obrigação do cidadão, que é garantir também os direitos dos outros

membros da comunidade. Esta prática deve ser aprendida na escola. Esta é a

ideia de Durkhein (1982) que trata a cidadania pela perspectiva da virtude

cívica que torna os cidadãos com consciência de coletividade, pois para ele

cidadãos virtuosos são aqueles que se preocupam com a comunidade, se

preocupa com o outro. Com esse pensamento se dá a promoção dos direitos

humanos.

2.3 A cidadania na perspectiva crítica

Tendo como ponto de referência a cidadania crítica, faz-se uma reflexão

sobre a cidadania e que esta não está no que o homem diz, nem no plano

jurídico, mas sim nas relações sociais a partir das práticas humanas numa

determinada sociedade, sendo este algo não isolado, fragmentado, totalmente

objetivo e desligado do pensar. Essa prática é complexa e é de tripla dimensão

que segundo Severino (1992), se expressa através da:

a) Prática produtiva: pelo trabalho, os homens interferem na natureza

com vistas a prover os meios de sua existência material, garantindo a

produção de bens e a reprodução da espécie;

b) Prática social: ao produzir seus meios de subsistência, os

homens estabelecem entre si relações que são funcionais e

caracterizadas por um coeficiente de poder;

c) Prática simbolizadora: as relações produtivas e sociais são

simbolizadas em níveis de representação e de apreciação

valorativa, no plano subjetivo visando a significação e a

legitimação da realidade social e econômica vivida pelos homens

(SEVERINO, 1992, p. 26).

Não é possível que as pessoas exerçam uma cidadania digna se não

tiverem um trabalho, mesmo que seja alienado. É pela ação do trabalho que

nós transformamos a natureza e nesse mesmo processo que nos sentimos

valorizados e respeitados como seres humanos. Por isso o homem vem

lutando por seus direitos: trabalho, educação de qualidade, moradia, saúde

e condições favoráveis a sua sobrevivência.

Os movimentos sociais são ações coletivas com os objetivos de manter

ou mudar a situação. Tais movimentos são organizados no dia a dia, como

greve trabalhista (por melhores salários e condições de trabalho), os

movimentos por melhores condições de vida entre outros. Tais movimentos

não são predeterminados, dependem sempre das condições específicas em

que se desenvolvem, ou seja, das forças sociais e políticas que os apoiam ou

confrontam, dos recursos existentes para mantém a ação e dos instrumentos

utilizados para obter repercussão. A greve é um dos instrumentos mais

utilizados pelos trabalhadores na sociedade capitalista.

2.4 Cidadania, escola e o ensino de Língua Portuguesa no contexto brasileiro

Depois de muitos anos da "Constituição cidadã" na qual estão

assegurados os direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros, bem como as

responsabilidades do poder público, da sociedade, da família e do indivíduo,

ainda não conseguimos fazer valer os direitos para o dia-a-dia da maioria da

população. Os problemas históricos da nossa sociedade como analfabetismo,

oferta precária de serviços de saúde, saneamento, educação e assistência

social, e os problemas mais recentes como a violência urbana, ineficiência da

segurança pública, desemprego acentuado, ainda estão longe de serem

resolvidos.

Permanecem no país uma gigantesca concentração de renda e seus

subprodutos, como a miséria e a exclusão social. Ao lado disso, a atuação

omissa e vacilante por parte do Estado não promoveu ainda políticas públicas

adequadas e suficientes para corrigir essas desigualdades sociais e regionais.

A garantia dos direitos políticos e civis não resolveu os problemas históricos da

cidadania no Brasil. Contudo, esses direitos formam um quadro no qual os

movimentos sociais podem aparecer publicamente trazendo suas

reivindicações e propostas e pode haver rodízio de grupos políticos no poder.

O termo cidadania é usado no nosso cotidiano, em documentos oficiais,

nas leis, nos Parâmetros Curriculares Nacionais, sendo este uma finalidade da

Educação. A cidadania tem o mesmo significado para todos? Ela é vista com

os mesmos objetivos pelas classes dominantes (capitalistas e o Banco

Mundial) e pelos trabalhadores (sindicatos e movimentos sociais).

O ser humano buscando conhecimento e esclarecimento quanto os

seus direitos. A cidadania está presente, mas ainda fraca insuficiente para a

maioria do povo brasileiro. Pensando nos problemas dessa maioria, a escola é

um alicerce muito importante para orientar esta causa, é um espaço de

socialização, intermediando o processo entre a família e a sociedade tendo

assim um papel de extraordinária importância no desenvolvimento da

cidadania.

Segundo GIROUX (1986), para que a educação para a cidadania se

torne emancipatória, seu objetivo não é ajustar os alunos à sociedade atual,

sua finalidade principal deve ser de estimular nos alunos sua imaginação e seu

intelecto. Os alunos devem ser educados para demonstrar coragem cívica,

disposição para agir, como se de fato vivessem em uma sociedade

democrática.

Por isso, é importante que os professores da disciplina de Língua

Portuguesa, insiram em seus planos de aula o tema "Cidadania e Direitos

Humanos”, ensinando e orientando seus alunos a serem críticos e refletirem

sobre o assunto, pois é uma disciplina em que engloba muitos recursos

pedagógicos que irão favorecer este ensinamento e esclarecimento,

salientando também todo andamento das atividades na vivência cotidiana dos

alunos. Diante de todos os fatos acontecidos no decorrer da história, a

educação ainda é o fator mais importante para esta busca. As Diretrizes

Curriculares da Língua Portuguesa estabelecem que os processos educativos

da Língua Portuguesa devem garantir ao estudante a sua inserção ativa e

crítica na sociedade, e ainda que “é” na escola que o estudante brasileiro, e

mais especificamente o da escola pública, deveria encontrar o espaço para as

práticas de linguagem que possibilitem interagir na sociedade, nas mais

diferentes circunstâncias de uso da língua materna, em instância públicas e

privadas. Neste aspecto, a Língua Portuguesa como língua mãe e marca de

nossa nacionalidade permite-nos ter a dimensão mais profunda de

pertencimento a nossa nação, preservando nossos direitos e expandindo a

proteção aos que podem não ter vez e voz.

Segundo Freire (2007),

“...o exercício da cidadania compreende a totalidade dos direitos que

o indivíduo tem de desempenhar nas mais diversas funções no tecido

social, do ponto de vista individual e social”. No cotidiano de cada um,

seja criança ou adulto, o conhecimento dos direitos, o

reconhecimento dos deveres, a adesão legítima às riquezas das

necessidades (mesmo as sociais, culturais e políticas) garantem o

princípio de liberda de de cidadania. Isso confere ao cidadão o

direito de escolher seus amigos, brinquedos, diversão, o seu

emprego, a mulher com quem vai se casar, o número de filhos, o

médico que ele vai frequentar, o partido político do qual vai aderir, as

concepções de Estado e sociedade para as quais vai destinar o seu

voto, o lugar que ela vai ocupar na sociedade” (FREIRE, 2007, p. 30-

31).

A educação para cidadania, então, deverá resultar da consciência crítica

dos alunos ativos e participativos na sociedade em que estão inseridos,

convivendo com as leis, os deveres, com a concepção de sujeitos, implicando o

aprendizado do que é viver a cidadania, além da compreensão de uma

organização política de um país regido pelos poderes legislativo, executivo e

judiciário, baseando-se na vivência social desses poderes com objetivos do

desenvolvimento intelectual e social dede cada aluno.

3 Implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica

Durante o período em que participei das atividades do Programa de

Desenvolvimento Educacional - PDE, considero que os encontros e debates

com os colegas de curso, com os Professores das Universidades, as reflexões

com os professores da rede, através do Grupo de Trabalho em Rede – GTR,

foram momentos importantes e contribuíram para o desenvolvimento das

atividades propostas pelo PDE.

Como Professora de escola pública a mais de vinte no Colégio Estadual

Boa Esperança do Iguaçu, pude vivenciar que os nossos alunos estão cada dia

mais acomodados com relação às questões sociais, o respeito ao outro, os

deveres enquanto aluno e o desinteresse com a construção do conhecimento.

Nossos jovens do Ensino Médio estão dominados pela tecnologia,

dependentes de redes sociais e indiferentes com o exercício da cidadania.

Diante dessa realidade as atividades desenvolvidas buscaram despertar nos

alunos o exercício da cidadania e da luta pelos seus direitos a partir da vivência

em sala de aula, na escola e depois na comunidade. Na Produção Didático-

Pedagógica foram desenvolvidas atividades que articulam o ensino da Língua

Portuguesa com a formação da cidadania, propiciando aos alunos uma

instrumentalização conceitual para que possam ler criticamente a realidade e

lutar pelos seus direitos.

Durante o desenvolvimento do Projeto de Intervenção na Escola com os

alunos do 3º Ano do Ensino Médio, foi possível perceber a alienação dos

mesmos, poucos buscando conhecimento para enfrentar o vestibular e a

grande maioria aguardando o término do curso para poder trabalhar horas

extras e aumentar o ganho salarial. Para eles, o mais importante é ter um

salário para custear suas despesas básicas (roupas de marca, calçados,

créditos para celular, internet e festas). Percebe-se que esses jovens não têm

perspectivas de crescimento pessoal e profissional, tornando-se sujeitos

alienados no contexto em que vivem.

Ao propor atividades de reflexão em grupos para problemas sociais, a

resposta era: não podemos mudar essa realidade. Quando questionados o

direito aos idosos em filas de banco, para muitos deles, os idosos é que

deveriam aguardar, pois, segundo eles, não trabalham então dispõe de tempo

para ficar esperando.

O objetivo do projeto só foi atingido quando surgiu um problema de

desrespeito de um professor com um aluno do Ensino Fundamental, momento

este em que fizemos o estudo do Estatuto do Adolescente e então eles

perceberam que os seus direitos estão assegurados e que não podemos ficar

indiferentes quando os nossos direitos, assegurados constitucionalmente,

forem desrespeitados e ignorados. A partir desse acontecimento, muitas outras

situações levantadas por eles foram discutidas em grupo e com resultados

satisfatórios.

Quando trabalhado o texto: “Escola de todos... Para todos”, com 32

alunos, onde relatava a situação de um aluno que abandonou a escola porque

a Professora não deixou participar da aula de Educação Física por não ter um

tênis, eles foram convidados a descrever o destino desse aluno. O resultado

foi: 4 deles encaminharam o caso ao Conselho Tutelar, 5 disseram que a

diretora resolveu o problema comprando um tênis para o aluno, 3 que o aluno

foi embora e matriculou-se em outra escola, 12 deram um final trágico ao

garoto dizendo que o mesmo entrou nas drogas, 3 que a professora foi punida

e que pediu desculpas ao aluno e 5 deles que o aluno ateou fogo no carro da

Professora sendo preso logo após. O texto gerou muita discussão, pois a

proposta era que eles deveriam fundamentar a sua decisão.

Diante disso, torna-se claro que o ensino deve ser contextualizado com

o cotidiano do aluno para que ele sinta-se como parte integrante desse

processo e que os conteúdos trabalhados tenham significado para a vida deles.

4 Considerações finais

Ao término da implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica,

pode-se afirmar que os objetivos propostos foram alcançados. Os trabalhos em

equipe e as discussões das situações-problemas propostas aos alunos

motivaram os mesmos a posicionar-se diante dos fatos do cotidiano e

desenvolver a sua cidadania. Mesmo quando se mostraram indiferentes ao

Projeto, mantive a postura e aos poucos foi possível ganhar a atenção dos

mesmos. Fica evidente que o ensino deve ser contextualizado e que diante de

algumas situações é preciso fazer valer os nossos direitos enquanto cidadãos.

Mas para que isso aconteça é necessário que a escola trabalhe por uma

educação emancipadora, onde os alunos tornem-se os sujeitos do processo.

Precisamos realizar um trabalho para que o jovem tenha perspectiva de vida e

não seja um adulto alienado. Se não podemos mudar o mundo, podemos

torná-lo melhor.

Os autores que fundamentaram esse projeto sustentam que muitos de

nossos direitos ainda existem só no papel, mas somos nós educadores que

temos a ferramenta para mudar essa realidade: a educação.

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