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GRAVEL ISSN 1678-5975 Janeiro - 2003 Nº 1 40-46 Porto Alegre Suporte financeiro: Organization of American States – OAS Paleoplataformas e Progradação Deltaica do Neógeno na Margem Continental do Uruguai e Norte da Argentina C. M. Urien*; L. R. Martins* and I. R. Martins* * South West Atlantic Coastal and Marine Geology Group – COMAR, Upper South West Atlantic Program – ASOS (Brazil, Uruguay, and Argentina) RESUMO Perfis sísmicos, obtidos em várias campanhas oceanográficas realizadas na margem continental do Uruguai e norte da Argentina, foram analisados e interpretados, visando à identificação dos aspectos relacionados com a seqüência sedimentar da área. Foram caracterizados sistemas progradacionais recorrentes do tipo deltaico e paleoplataformas, controlados, especialmente, pelo aporte de sedimentos de contribuição fluvial, pelas variações do nível do mar e pelos movimentos epirogênicos. ABSTRACT Seismic profiles obtained through several campaigns developed along Uruguay and northern Argentina continental margin were analysed and interpreted, in order to identify aspects related with the sedimentary sequences of the area. Assigned progradational systems of deltaic type and paleoshelves are present, mainly governed by sedimentary load of fluvial origin, sea-level fluctuations and regional epeirogenic movements. Palavras chave: paleoplataforma, progradação, Neógeno.

Paleoplataformas e Progradação Deltaica do Neógeno na Margem

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GRAVEL ISSN 1678-5975 Janeiro - 2003 Nº 1 40-46 Porto Alegre

Suporte financeiro: Organization of American States – OAS

Paleoplataformas e Progradação Deltaica do Neógeno na Margem Continental do Uruguai e Norte da Argentina C. M. Urien*; L. R. Martins* and I. R. Martins* * South West Atlantic Coastal and Marine Geology Group – COMAR, Upper South West Atlantic Program – ASOS (Brazil, Uruguay, and Argentina)

RESUMO Perfis sísmicos, obtidos em várias campanhas oceanográficas realizadas

na margem continental do Uruguai e norte da Argentina, foram analisados e interpretados, visando à identificação dos aspectos relacionados com a seqüência sedimentar da área.

Foram caracterizados sistemas progradacionais recorrentes do tipo deltaico e paleoplataformas, controlados, especialmente, pelo aporte de sedimentos de contribuição fluvial, pelas variações do nível do mar e pelos movimentos epirogênicos.

ABSTRACT Seismic profiles obtained through several campaigns developed along

Uruguay and northern Argentina continental margin were analysed and interpreted, in order to identify aspects related with the sedimentary sequences of the area.

Assigned progradational systems of deltaic type and paleoshelves are present, mainly governed by sedimentary load of fluvial origin, sea-level fluctuations and regional epeirogenic movements.

Palavras chave: paleoplataforma, progradação, Neógeno.

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INTRODUÇÃO As bacias sedimentares do complexo

Punta del Este–Salado (figuras 1 e 2) apresentam, em suas seqüências superiores, feições de um sistema transgressivo/regressivo, em resposta às variações ocorridas no nível do mar. Tais feições são constituídas por um conjunto seqüencial de um estado do tipo “marginal sag”, evidenciado mais particularmente desde o fim do Cretáceo (URIEN & MARTINS, 1991).

Estas seqüências foram geradas através de mudanças do nível do mar ocorridas desde o Oligoceno Tardio. O mapeamento das discordâncias presentes nas seqüências basais permite a identificação de paleoplataformas cobertas por sedimentos produzidos por eventos regressivos progradacionais, sendo sua identificação produzida através da análise sismo-estratigráfica. Tal tipo de análise estabelecida por URIEN & MARTINS (1991) para a região do Rio de La Plata, foi igualmente descrita para a Bacia de Campos por KOWSMANN & VIANA (1992), que descreveram movimentos de massa provocados por cunhas progradacionais em níveis de mar baixo. Segundo estes autores, tais cunhas de nível de mar baixo apresentam uma frente de deposição de ângulo elevado, gerando um plano inclinado que se torna instável pelo aporte de sedimentos de nível de mar mais elevado, produzindo o surgimento de fluxos de massa (MARTINS et al., 1980, 1990).

Estudos relativos às bacias marginais do Atlântico Sudoeste, desde o Rio Grande do Sul (Brasil) à Tierra del Fuego (Argentina) são expressivos, com resultados publicados por URIEN & ZAMBRANO (1973, 1995); URIEN & MARTINS (1978, 1981); URIEN et al. (1976, 1981, 1987a, 1987b, 1988, 1995, 1996, 1999). Tais estudos revelaram a estrutura geológica os mecanismos dinâmicos governantes da sedimentação, da estratigrafia e da potencialidade em hidrocarbonetos.

DISCUSSÃO Como resultado da transgressão

Maastrichtian/Danian sobre a margem

continental Atlântica sul-americana, a plataforma continental em si e os grandes embaiamentos existentes foram inundados pelo mar.

Um exemplo típico dessa paisagem pode ser observado na plataforma do Uruguai e na do Rio de La Plata. Nessa situação camadas progradacionais (HST - High System Track) geraram uma paleoplataforma identificável de forma bastante clara nos registros sísmicos e nas perfurações efetuadas na área de estudo (Figuras 3 e 4).

Este nível elevado do mar (HSLS – High Sea Level Stand), manifesta-se de uma maneira quase constante desde o Paleoceno até o Eoceno Médio e Oligoceno, através de ciclos regressivos intermitentes, culminando com a regressão oligocênica. Essa regressão mostra um marcado acamamento, como resultado da formação de uma paleoplataforma. No caso específico do terraço regional do Prata, foi constatado que tal feição representa uma superfície erosiva relíquia, recoberta por sucessivos eventos deltaicos até o Pleistoceno Superior.

Os efeitos sedimentares, durante este ciclo Paleoceno, são evidentes em uma situação de quase total estabilidade ou de tranqüilidade tectônica regional.

Ao final deste ciclo, como resultado dos eventos tectônicos cordilheranos, produz-se um basculamento regional desde o oeste, estabelecendo o início de um recuo do nível do mar, e uma correspondente deposição de seqüências sedimentares progradantes. Os efeitos transgressivos/regressivos, observados desde então, coincidem de forma evidente com a curva de VAIL et al. (1977); VAIL & MITCHUM Jr. (1979); VAIL & HARDENBOL (1979); VAIL (1987) e de POSAMENTIER & VAIL, 1988).

Ainda que a intensidade das mudanças eustáticas se apresente em um grau decrescente durante todo o Neógeno, os efeitos progradantes e a alternância de HST (High Sea Track) e do LST (Low Sea Track) são bem definidos para tempos possivelmente miocênicos e pliocênicos. Não obstante, é justo considerar que tal comportamento se relaciona mais com efeitos tectônicos, controlados por pulsos orogênicos

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Figura 1 – Mapa tectônico das bacias Punta del Este – Salado (modificado de URIEN et al., 1996).

andinos, do que com elevações e recuos do nível do mar.

Dessa forma, na região do Rio de La Plata, os acamamentos progradantes, em vez de gerarem um “offlap” contínuo, se apresentam como um sistema escalonado a partir do oeste.

Portanto, na margem continental da região estudada, mais particularmente no setor Rio de La Plata, são identificadas três feições predominantes:

a) o sopé continental, Cretáceo Superior,

Figura 2 – Linhas de reflexão e pontos de refração sísmica, discordâncias e seqüências

progradacionais surgem sucessivos ciclos marinhos (modificado de URIEN et al., 1996).

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b) o platô marginal do Plata, Paleoceno/Oligoceno e, c) o sistema progradante deltaico translapante desenvolvido a partir do Neógeno, cuja parte superior forma a atual plataforma continental.

Durante este último estágio, e no Holoceno Inferior, a dispersão sedimentar esteve vinculada especialmente a processos erosivos, através de “canyons” submarinos e de sedimentação profunda.

CONCLUSÕES

No atual estágio de desenvolvimento do

projeto “Bacias Marginais” (OEA), os autores, através de dados obtidos até o momento, podem confirmar que os parâmetros de controle mais salientes na configuração das seqüências estratigráficas na área pesquisada são o aporte sedimentar expressivo, como resultado das elevações andinas e conseqüente mudança na pendente regional, particularmente no ambiente marinho, dando lugar a sistemas progradantes recorrentes, associados às alterações relativas do nível do mar, conforme estabelecido previamente por URIEN & MARTINS (1991).

A paisagem sedimentar foi, portanto, esculpida por carga sedimentar aportada à bacia, por flutuações eustáticas e por movimentos epirogênicos atuantes na região.

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Figura 3 – Paleoplataformas e seqüências progradacionais da margem continental do Uruguai.

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Figura 4 – Paleoplataformas e seqüências progradacionais das bacias Punta del Este/Salado.