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Universidade do Sul de Santa Catarina Palhoça UnisulVirtual 2007 Psicologia da Educação II Disciplina na modalidade a distância

Psicologia da Educação II - pergamum.unisul.brpergamum.unisul.br/pergamum/pdf/88280_Ligia.pdf · Angelita Marçal Flores (Coordenadora) Caroline Batista Enzo de Oliveira Moreira

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Palhoça

UnisulVirtual

2007

Psicologia da Educação IIDisciplina na modalidade a distância

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CréditosUnisul - Universidade do Sul de Santa CatarinaUnisulVirtual - Educação Superior a Distância

Campus UnisulVirtualAvenida dos Lagos, 41 Cidade Universitária Pedra BrancaPalhoça – SC - 88137-100Fone/fax: (48) 3279-1242 e3279-1271E-mail: [email protected]: www.virtual.unisul.br

Reitor UnisulGerson Luiz Joner da Silveira

Vice-Reitor e Pró-Reitor AcadêmicoSebastião Salésio Heerdt

Chefe de Gabinete da ReitoriaFabian Martins de Castro

Pró-Reitor AdministrativoMarcus Vinícius Anátoles da Silva Ferreira

Campus SulDiretor: Valter Alves Schmitz NetoDiretora adjunta: Alexandra Orsoni

Campus NorteDiretor: Ailton Nazareno SoaresDiretora adjunta: Cibele Schuelter

Campus UnisulVirtualDiretor: João VianneyDiretora adjunta: Jucimara Roesler

Equipe UnisulVirtual

AdministraçãoRenato André LuzValmir Venício Inácio

Avaliação InstitucionalDênia Falcão de Bittencourt

BibliotecaSoraya Arruda Waltrick

Capacitação e Assessoria ao DocenteAngelita Marçal Flores (Coordenadora)Caroline BatistaEnzo de Oliveira MoreiraPatrícia MeneghelSimone Andréa de CastilhoVanessa Francine Corrêa

Coordenação dos CursosAdriano Sérgio da CunhaAloísio José RodriguesAna Luisa MülbertAna Paula Reusing PachecoCharles CesconettoDiva Marília FlemmingEduardo Aquino HüblerFabiano CerettaItamar Pedro BevilaquaJanete Elza FelisbinoJucimara RoeslerLauro José BallockLívia da Cruz (auxiliar)Luiz Guilherme Buchmann FigueiredoLuiz Otávio Botelho LentoMarcelo CavalcantiMaria da Graça PoyerMaria de Fátima Martins (auxiliar)Mauro Faccioni FilhoMichelle Denise Durieux Lopes DestriMoacir FogaçaMoacir HeerdtNélio HerzmannOnei Tadeu DutraPatrícia AlbertonRaulino Jacó BrüningRodrigo Nunes Lunardelli

Criação e Reconhecimento de CursosDiane Dal MagoVanderlei Brasil

Desenho EducacionalDesign InstrucionalDaniela Erani Monteiro Will (Coordenadora)Carmen Maria Cipriani PandiniCarolina Hoeller da Silva BoeingFlávia Lumi MatuzawaKarla Leonora Dahse NunesLeandro Kingeski PachecoLigia Maria Soufen TumoloMárcia LochViviane BastosViviani Poyer

AcessibilidadeVanessa de Andrade Manoel

Avaliação da AprendizagemMárcia Loch (Coordenadora)Cristina Klipp de OliveiraSilvana Denise Guimarães

Design Gráfi coCristiano Neri Gonçalves Ribeiro (Coordenador) Adriana Ferreira dos SantosAlex Sandro XavierEvandro Guedes MachadoFernando Roberto Dias ZimmermannHigor Ghisi LucianoPedro Paulo Alves TeixeiraRafael PessiVilson Martins Filho

Disciplinas a DistânciaEnzo de Oliveira Moreira

Gerência AcadêmicaMárcia Luz de Oliveira Bubalo

Gerência de EnsinoAna Paula Reusing Pacheco

Logística de Encontros PresenciaisGraciele Marinês Lindenmayr(Coordenadora) Aracelli AraldiCícero Alencar BrancoDouglas Fabiani da CruzFernando SteimbachLetícia Cristina BarbosaPriscila Santos Alves

Formatura e EventosJackson Schuelter Wiggers

Logística de MateriaisJeferson Cassiano Almeida da Costa (Coordenador)José Carlos TeixeiraEduardo Kraus

Monitoria e SuporteRafael da Cunha Lara (Coordenador)Adriana SilveiraAndréia DrewesCaroline MendonçaCláudia Noemi NascimentoCristiano DalazenDyego RachadelEdison Rodrigo ValimFrancielle ArrudaGabriela Malinverni BarbieriJonatas Collaço de SouzaJosiane Conceição LealMaria Eugênia Ferreira CeleghinRachel Lopes C. PintoTatiane SilvaVinícius Maykot Serafi m

Produção Industrial e SuporteArthur Emmanuel F. Silveira (Coordenador)Francisco Asp

Relacionamento com o MercadoWalter Félix Cardoso Júnior

Secretaria de Ensino a DistânciaKarine Augusta Zanoni Albuquerque(Secretária de ensino)Ana Paula Pereira Andréa Luci MandiraAndrei RodriguesCarla Cristina SbardellaDeise Marcelo AntunesDjeime Sammer Bortolotti Franciele da Silva BruchadoJames Marcel Silva RibeiroJanaina Stuart da CostaJenniff er CamargoLamuniê SouzaLiana Pamplona Marcelo José SoaresMarcos Alcides Medeiros JuniorMaria Isabel AragonOlavo LajúsPriscilla Geovana PaganiRosângela Mara SiegelSilvana Henrique SilvaVanilda Liordina HeerdtVilmar Isaurino Vidal

Secretária ExecutivaViviane Schalata Martins

TecnologiaOsmar de Oliveira Braz Júnior(Coordenador)Jeff erson Amorin OliveiraMarcelo Neri da SilvaPascoal Pinto VernieriRicardo Alexandre Bianchini

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Apresentação

Este livro didático corresponde à disciplina Psicologia da Educação II.

O material foi elaborado, visando a uma aprendizagem autônoma.

Com este objetivo, aborda conteúdos especialmente selecionados e

adota uma linguagem que facilite seu estudo a distância.

Por falar em distância, isso não signifi ca que você estará sozinho(a).

Não se esqueça de que sua caminhada nesta disciplina também será

acompanhada constantemente pelo Sistema Tutorial da UnisulVirtual.

Entre em contato sempre que sentir necessidade. Nossa equipe terá o

maior prazer em atendê-lo(a), pois sua aprendizagem é nosso principal

objetivo.

Bom estudo e sucesso!

Equipe UnisulVirtual.

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Ligia Maria Soufen Tumolo

Sandra Adriana Neves Nunes

Palhoça

UnisulVirtual

2007

Design Instrucional Viviani Poyer

Psicologia da Educação IIDisciplina na modalidade a distância

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Copyright © UnisulVirtual 2007 Nenhum a parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.

Edição --- Livro Didático

Professoras Conteudistas Ligia Maria Soufen Tumolo Sandra Adriana Neves Nunes

Design Instrucional Viviani Poyer

ISBN 978-85-60694-68-6

Projeto Gráfico e Capa Equipe UnisulVirtual

Diagram ação Pedro Teixeira

Revisão Ortográfica Amaline Boulus Issa Mussi

370.15 T83 Tumolo, Ligia Maria Soufen Psicologia da educação II : livro didático / Ligia Maria Soufen Tumolo, Sandra Adriana Neves Nunes ; design instrucional Viviani Poyer – Palhoça : UnisulVirtual, 2007. 188 p. : il. ; 28 cm. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-60694-68-6 1.Psicologia educacional. I. Nunes, Sandra Adriana Neves. II. Poyer, Viviani. III. Título.

Ficha catalográfi ca elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul

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Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3Palavras das professoras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

UNIDADE 1 – Epistemologia Genética de Jean Piaget . . . . . . . . . . . . . . . . 17

UNIDADE 2 – A Psicologia Histórico-Cultural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

UNIDADE 3 – A Psicogênese de Wallon . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109

UNIDADE 4 – Novas Tendências em Psicologia da Educação . . . . . . . . . 137

Para concluir o estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177Sobre as professoras conteudistas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181 Comentários e respostas das atividades de auto-avaliação . . . . . . . . . . . . 183

Sumário

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Palavras das professoras

Caro(a) aluno(a),

Bem-vindo(a) à disciplina Psicologia da Educação II.

Trata-se de uma disciplina interessante, instigante e, ao mesmo tempo, caracterizada por certa complexidade. Não porque tenhamos deixado de empreender esforços para torná-la acessível a você, mas porque esta é uma disciplina científi ca e que aborda fenômenos e processos educativos e de aprendizagem em suas múltiplas dimensões.

A Psicologia da Educação, diferentemente de outras áreas da Psicologia, volta-se especialmente à compreensão e explicação das mudanças que ocorrem nas pessoas, durante todo o seu ciclo vital, como resultado de sua participação no ambiente educacional, isto é, aquelas mudanças derivadas dos processos de aprendizagem, de desenvolvimento e, em especial, as que ocorrem nos ambientes educacionais.

Você já parou para pensar as questões que alinhamos a seguir? Considere-as, uma a uma:

Como as crianças desenvolvem seu pensamento?

Como as crianças internalizam as normas e regras sociais?

Qual a relação entre a atividade externa (motora ou verbal, por exemplo) e a atividade psicológica?

Por que as crianças, durante o processo de aprendizagem, apresentam avanços e retrocessos, quando se considera aquilo que estão aprendendo?

Quais as diferenças entre as crianças e os adultos, quando se considera o desenvolvimento dos processos psicológicos?

Qual a relação entre desenvolvimento e aprendizagem?

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Como os ambientes educacionais interferem no desenvolvimento e na aprendizagem?

Qual a relação entre educação familiar e educação escolar e de que forma estas devem se relacionar, a fim de que produzam resultados positivos nas crianças?

Para que você aprofunde a compreensão a respeito, serão apresentadas a você as principais teorias psicológicas que oferecem subsídios para o entendimento desses processos e para a intervenção na prática educacional, a saber: a Epistemologia Genética de Piaget, a Psicogênese de Wallon, a Psicologia Histórico-Cultural de Vygostsky, Leontiev, Luria, Galperin e Talìzina, e a Teoria da Aprendizagem Signifi cativa de Ausubel.

A Psicologia da Educação é uma área de conhecimento que oferece contribuições signifi cativas para a educação e que serve de disciplina-ponte entre a Psicologia e a Educação, na linha da investigação de problemas educacionais.

Mas a Educação não pode prescindir do olhar da Sociologia, da Antropologia, da Didática, da Psicopatologia, dentre outras disciplinas, para buscar compreender seus próprios problemas. Portanto estamos convidando-o(a) a desenvolver um olhar crítico e criativo sobre o que vai ler, diferentemente de buscar nesse texto respostas prontas para aplicar na sua prática docente.

Com uma boa base teórica, aliada à observação atenta em sala de aula -- esta que será o seu próprio laboratório--, surgirão problemas que lhe possibilitarão, como docente-pesquisador(a), levantar hipóteses e testá-las. Assim, sua prática será conduzida cientifi camente, e seus conhecimentos decorrerão de sua própria atividade intelectual. Essa é a melhor “receita” para não se deixar seduzir pelos modismos da Pedagogia.

Ao longo do estudo desta disciplina, você será convidado(a) a pensar a educação sobre novas bases, de modo que possa vislumbrar um projeto de escola adequado às necessidades da sociedade contemporânea e, ainda, situar o professor como principal mediador entre os conhecimentos socialmente produzidos pelos homens, fi xados na forma de conteúdos, tecnologia e arte, e as possibilidades reais e potencias de aprendizado dos alunos.

Sucesso! Professoras Ligia Maria Soufen Tumolo e Sandra Adriana Neves Nunes.

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Plano de estudo

O plano de estudo visa a orientar você no desenvolvimento da disciplina. Ele possui elementos que o ajudarão a conhecer o contexto da disciplina e a organizar o seu tempo de estudos.

O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva em conta instrumentos que se articulam e se complementam, portanto, a construção de competências se dá sobre a articulação de metodologias e por meio das diversas formas de ação/mediação.

São elementos desse processo:

o livro didático;

o Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem - EVA;

as atividades de avaliação (complementares, a distância e presenciais).

Ementa

As teorias de desenvolvimento humano na perspectiva construtivista de Jean Piaget, na concepção dialética de Henri Wallon. A perspectiva histórico-cultural do psiquismo humano: Vygotsky, Lúria e Leontiev. Novas Tendências em Psicologia da Educação.

Carga Horária

60 horas – 4 créditos

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Objetivos da disciplina

Objetivo geral

Compreender os principais pressupostos teóricos da Epistemologia Genética de Jean Piaget, da Psicogênese de Henri Wallon, da Psicologia Histórico-Cultural de Lev Seminovich Vygotsky, Alexei Leontiev e Alexander Luria e da Aprendizagem Signifi cativa de Paul Ausubel, bem como se apropriar de suas contribuições para orientar a prática docente. Estabelecer relações entre as teorias e a prática docente, reconhecendo sua aplicabilidade no contexto escolar.

Objetivo específi co

Compreender as origens e a construção do conhecimento a partir da Epistemologia Genética de Piaget.

Compreender a Teoria Integradora do Desenvolvimento da Criança (motricidade, afetividade e cognição), proposta por Wallon.

Conhecer os princípios fi losófi cos norteadores da Psicologia Histórico-Cultural de Vygotsky e seus colaboradores e compreender como essa teoria explica o desenvolvimento humano fi logenético e ontogenético, em especial o modo como os fatores sociais medeiam o desenvolvimento dos processos psicológicos qualitativamente superiores.

Entender como a linguagem atua como principal mediadora do desenvolvimento dos processos psicológicos superiores tipicamente humanos, e compreender o conceito de “atividade humana mediada” como central para a Psicologia Histórico-Cultural.

Apropriar-se dos elementos fundamentais da Teoria da Atividade e reconhecer seus pressupostos teóricos na atividade educativa.

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Fundamentos Teórico-Metodológicos do Projeto ALFA-MIFORCAL

Conhecer as principais contribuições da Psicologia da Educação contemporânea para a compreensão das práticas educativas formais e informais.

Compreender o processo de ensino-aprendizagem em sala de aula a partir de abordagens psicológicas contemporâneas: Ausubel, Galperin e Talizina. E entender o papel da educação escolar na formação da personalidade dos alunos.

Conteúdo programático

Veja, a seguir, as unidades que compõem o Livro Didático desta disciplina e os seus respectivos objetivos. Estes se referem aos resultados que você deverá alcançar ao fi nal de uma etapa de estudo. Os objetivos de cada unidade defi nem o conjunto de conhecimentos que você deverá possuir para o desenvolvimento de habilidades e competências necessárias à sua formação.

Unidades de estudo: 4

Unidade 1: Epistemologia Genética de Jean Piaget

Nesta unidade, você estudará o contexto histórico e as bases fi losófi cas que orientaram o pensamento de Jean Piaget na elaboração de sua Epistemologia Genética. Identifi cará os principais conceitos que explicam o processo de construção da capacidade cognitiva humana e o modo como esse processo ocorre. Conhecerá os conceitos de adaptação, organização, assimilação-acomodação e equilibração no contexto do desenvolvimento da inteligência humana. Compreenderá como ocorre o desenvolvimento das estruturas da inteligência em seus diferentes estágios, da inteligência sensório-motora à inteligência operatório-formal.

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Unidade 2: A Psicologia Histórico-Cultural

Nesta unidade, você estudará o surgimento e desenvolvimento da Psicologia Histórico-Cultural e compreenderá os métodos de pesquisa empregados por Vygotsky e Leontiev no desenvolvimento de suas teorias. Conhecerá como a Atividade e a Linguagem humanas estão relacionadas à constituição da consciência. Compreenderá como se desenvolvem os processos psicológicos superiores tipicamente humanos. Entenderá a relação entre desenvolvimento e aprendizagem para esta teoria.

Unidade 3: Psicogênese de Wallon

Nesta unidade, você estudará as bases fi losófi cas e os elementos que infl uenciaram a construção da Teoria Psicogenética. Conhecerá a concepção integradora de desenvolvimento humano, proposta por Wallon. Conhecerá como ocorre o desenvolvimento humano e o seu percurso pelos vários estágios, de acordo com esta teoria.

Unidade 4: Novas Tendências em Psicologia da Educação

Nesta unidade, você vai aprender a delimitar o objeto de estudo da Psicologia da Educação na atualidade. Conhecerá as principais contribuições da Psicologia da Educação contemporânea para a compreensão das práticas educativas formais e informais. Compreenderá o processo de ensino-aprendizagem em sala de aula a partir de abordagens psicológicas contemporâneas: Ausubel, Galperin e Talìzina. Entenderá o papel da educação escolar na formação da personalidade dos alunos.

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Agenda de atividades/ cronograma

Verifi que com atenção o “EVA”, organize-se para acessar periodicamente o espaço da disciplina. O sucesso nos seus estudos depende da priorização do tempo para a leitura, da realização de análises e sínteses do conteúdo e da interação com os seus colegas e tutor.

Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço a seguir as datas com base no cronograma da disciplina disponibilizado no EVA.

Use o quadro para agendar e programar as atividades relativas ao desenvolvimento da disciplina.

Atividades

Demais atividades (registro pessoal)

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UNIDADE 1

Epistemologia Genéticade Jean Piaget

Objetivos de aprendizagem

Compreender o contexto histórico e as bases fi losófi cas que orientaram o pensamento de Jean Piaget na elaboração de sua Epistemologia Genética.

Descrever o que inspirou Jean Piaget a desenvolver seu método de pesquisa e sua produção intelectual ao longo de sua vida.

Identifi car os principais conceitos que explicam o processo de construção da capacidade cognitiva humana e descrever o modo como esse processo ocorre.

Conceituar adaptação, organização, assimilação-acomodação e equilibração no contexto do desenvolvimento da inteligência humana.

Analisar e descrever o desenvolvimento das estruturas da inteligência em seus diferentes estágios, da inteligência sensório-motora à inteligência operatório-formal.

Conhecer as implicações da Epistemologia genética para o paradigma Construtivista na Educação.

Seções de estudo

Seção 1 História, método e objeto de estudo

Seção 2 O desenvolvimento da estrutura cognitiva: organização, adaptação, assimilação e acomodação. Equilíbrio e desequilíbrio da estrutura cognitiva

Seção 3 Os períodos do desenvolvimento cognitivo: sensório-motor; operatório (pré-operatório e operatório concreto) e operatório formal

Seção 4 Construtivismo e Educação

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo

Nessa unidade, você encontrará uma síntese das principais contribuições teóricas de um dos maiores estudiosos da inteligência humana: Jean Piaget.

Inicialmente, você conhecerá sua trajetória científi ca, desde as primeiras indagações efetuadas, ainda bastante intuitivas, até suas principais sínteses teóricas. Verá que essa trajetória foi impulsionada, inicialmente, pela curiosidade de Piaget em estabelecer uma lógica para o desenvolvimento psicológico humano, em especial, o da inteligência, semelhante à lógica própria de todas as estruturas que evoluíram nos demais seres vivos, ao longo da história da evolução das espécies.

Dessas indagações iniciais, surgidas ainda em sua infância, Piaget, assumindo, já, o papel de um jovem cientista, concentra-se na tentativa de compreender como surge o conhecimento no homem; quais as mudanças qualitativas que ocorrem, respectivamente, no modo da criança e do adulto conhecerem o mundo; como os conhecimentos aumentam e se complexifi cam, dando forma à estrutura cognitiva do sujeito; e, fi nalmente, qual é o papel do sujeito e do meio nesse processo.

Para responder a essas indagações Piaget trabalhou com crianças de modo bastante sistemático, observando-as e fazendo-lhes perguntas que as desafi avam a resolver problemas práticos e teóricos. Os resultados encontrados permitiram-lhe descrever o desenvolvimento cognitivo humano em períodos sucessivos que se orientam para uma fi nalidade essencialmente adaptativa: permitir aos seres humanos construírem sua própria capacidade de conhecer o mundo a sua volta e a si mesmos. Isso signifi ca dizer que a inteligência assumiu para o ser humano um valor de sobrevivência, assim como outras estruturas que evoluíram ao longo da fi logênese - ou a nossa história como espécie.

As seções dessa unidade foram pensadas de modo a fazê-lo(a) percorrer a lógica de construção da teoria de Piaget. Inicialmente, trataremos do contexto histórico em que o cientista desenvolveu seu método de estudo, para então focarmos a atenção no problema central investigado por Piaget: a natureza ou origem da inteligência humana e os processos envolvidos na construção da capacidade de conhecer. Daí a sua Episteme-logia genética (estudo do conhecimento a partir de sua gênese).

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Psicologia da Educação II

Unidade 1

Parece redundante, nos dias atuais, dizer que o legado teórico de Jean Piaget causou uma verdadeira revolução no conhecimento psicológico acerca do pensamento infantil na época. O que deve ser enfatizado, se consideramos o amadorismo inerente aos modismos na Educação (que atualmente elegeu o sócio-interacionismo vygotskyano como linha de ataque aos problemas educacionais), é que a teoria piagetiana, assim como todas as teorias que buscaram explicar o desenvolvimento infantil, precisa ser compreendida dentro de seu contexto histórico de produção e com base nos seus referenciais fi losófi cos e epistemológicos, para que então possa ser feito algum tipo de transposição da teoria para a prática de sala-de-aula.

A teoria piagetiana tem implicações na prática do profi ssional da educação, mas não dá conta de resolver todos os problemas que surgem no contexto educativo, porque ela não foi pensada a partir daí, tampouco com esse propósito. O contexto educativo e multifacetado sofre infl uências de várias ordens (desde individual até macrossocial e política) e só pode ser compreendido a partir de uma abordagem interdisciplinar.

Por isso, você encontrará uma detalhada revisão da Psicologia Educacional contemporânea em suas tendências mais atuais e suas implicações no campo da educação numa unidade dedicada

especialmente ao tema.

SEÇÃO 1 - História, método e objeto de estudo

Jean Piaget nasceu na Suíça em 9 de agosto 1896 e foi uma criança bastante precoce. Entre os sete e dez anos de idade, teve interesse em compreender os fenômenos envolvidos na mecânica, conhecer os pássaros, os fósseis e conchas marinhas. (Dolle, 2000).

Seu “espírito” investigativo pode ter sido impulsionado, segundo o próprio Piaget, pela sua historia pessoal e familiar: “A mãe era inteligente, energética e, no fundo, verdadeira e boa, mas seu temperamento de tendência neurótica tornou nossa

Figura: Jean PiagetFonte: www.monografi as.com/.../Image567.gif

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Universidade do Sul de Santa Catarina

vida familiar bastante difícil” (PIAGET apud DOLLE 2000, p. 7); e, com o pai, “aprendeu o valor de um trabalho sistemático mesmo quando ele se direciona aos detalhes” (PIAGET apud DOLLE, 2000, p. 7).

Piaget conclui que, desde muito cedo, acabou deixando de lado as brincadeiras para optar pelo trabalho sério, tendo como modelo seu pai. Segundo ele, esta era uma forma de refugiar-se em seu mundo pessoal: “Sou, fundamentalmente, um ansioso que só o trabalho consegue acalmar” (PIAGET apud DOLLE 2000, p. 9).

Depois de enviar um artigo para um jornal de história natural de Neuchâtel com observações que fi zera sobre um pardal Albino, obteve, com apenas 11 anos, permissão do diretor do Museu de História Natural de sua cidade para ajudá-lo a pesquisar moluscos. Nos próximos quatros anos que se sucederam ao convite, Piaget passou a conduzir suas próprias pesquisas com moluscos em diferentes ambientes.

A partir de suas observações, concluiu que o comportamento do organismo, em sua relação com o ambiente, produz transformações em sua estrutura original. Diante de condições ambientais adversas, o organismo precisaria construir novas formas de adaptação para manter o equilíbrio entre a própria estrutura e o meio.

Essa descoberta, que contém a gênese de seu pensamento sobre como se constitui a inteligência humana, foi publicada numa série de artigos sobre os moluscos da Suíça, da Savóia, da Bretanha e da Colômbia, quando ele tinha apenas 15 anos de idade, feito que o tornou conhecido nessa área científi ca, apesar da pouca idade.

Ainda adolescente, com 18 anos de idade, Piaget iniciou leituras fi losófi cas que abrangiam Kant, Spencer, Comte, James, Bergson, Darwin, entre outros, os quais contribuíram para dar forma às suas idéias originais sobre a cognição humana.

Nessa época, Piaget começa a perceber que a inteligência humana poderia estar sujeita às mesmas leis que regem todos os organismos na sua luta pela sobrevivência. Com 22 anos,

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apresenta sua tese de doutorado na área das ciências naturais e parte para Zurique, com intenção de trabalhar em um laboratório de Psicologia. Acaba mudando-se para Paris e leciona na Sorbonne, até ser convidado para trabalhar com o Dr. Simon, famoso doutor em Psicologia, reconhecido internacionalmente por produzir escalas métricas de inteligência.

Nesse laboratório, Piaget era encarregado de padronizar testes verbais de raciocínio de Burt, do tipo: “Edite é mais loura do que Suzana; Edite é mais morena do que Lili; qual é a mais morena?”. (PIAGET apud DOLLE, 2000, p. 11).

Nesse ofi cio, Piaget interessou-se por compreender as razões dos erros encontrados nas respostas dos testados: “Eu notava que embora os testes de Burt tivessem reais méritos quanto ao diagnóstico, por estarem baseados no número de sucessos e de fracassos, seria muito mais interessante tentar descobrir as razões desses fracassos” (PIAGET apud DOLLE, 2000, p. 11).

Para tentar compreender que raciocínio orientava os erros, o jovem cientista conversava com as pessoas submetidas ao teste, de forma semelhante aos que os psiquiatras e psicólogos utilizavam para desvendar os processos mentais inconscientes de seus pacientes.

Utilizava, portanto, o método clínico, deixando que a criança falasse livremente, sem direcioná-la com suas perguntas, ao mesmo tempo em que procurava avaliar como estaria funcionando o pensamento por trás de cada resposta. Após lançar perguntas, Piaget pedia que as crianças justifi cassem suas respostas.

Para utilizar este método, o interrogador deveria ser hábil em saber observar, deixar a criança falar sem interrompê-la, sem perder de vista uma hipótese para testar e controlar o pensamento da criança. Além disso, ele precisaria variar as condições em jogo, permitindo que o sujeito observado expusesse seu raciocínio, em especial, frente à contradição de seu ponto de vista. Segundo o próprio Piaget:

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“Foi com espanto que descobri que os raciocínios mais simples implicando a inclusão de uma parte no todo, ou o encadeamento de relações, ou ainda a multiplicação de classes (encontrar a parte comum de duas entidades), apresentavam, até os doze anos nas crianças normais, difi culdades não pressentidas pelos adultos”. (PIAGET apud DOLLE, 2000, p.12).

Assim, Piaget introduz, na pesquisa, o método clínico que utilizará por toda a sua vida.

Trabalhando com os testes de raciocínio utilizados para classifi car as pessoas em níveis de inteligência, Piaget conseguiu intuir que a inteligência, em si, seria algo mais do que uma propriedade quantifi cável, inata e imutável ao longo da vida.

Contrariando a racionalidade da época, Piaget tomou como problema de pesquisa a psicogênese da inteligência, isto é, as origens e o desenvolvimento da capacidade cognitiva humana e propôs que a inteligência não seria inata, mas construía-se na relação com o meio.

Inspirado em suas descobertas, escreveu três artigos e enviou-os a Claparède, diretor do Instituto Jean-Jacques Rousseau, em Genebra, fato que lhe rendeu o cargo de diretor desse Instituto em 1921. O estudo do pensamento infantil, que, inicialmente, iria tomar-lhe dois ou três anos de estudo, tornou-se inspiração por mais de cinqüenta anos de sua vida, até a sua morte, em 1980.

Entre 1920 e 1930, Piaget escreveu vários livros, os quais descrevem, com detalhes, suas principais conclusões acerca do Pensamento Infantil: “A linguagem e o pensamento da criança” (1923), “O julgamento e o raciocínio da criança” (1923), “A representação do real na criança” (1926), “A causalidade física na criança” (1927) e “O julgamento moral na criança” (1932). Todos foram muito bem recebidos pelo mundo científi co em vários países da Europa e nos Estados Unidos, para surpresa do autor, severo em sua autocrítica, e que julgava ter sido pouco sistemático na organização de suas idéias a respeito do pensamento das crianças.

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Nessa etapa de pesquisa, Piaget interessava-se tanto pela gênese das estruturas lógicas fundamentais (dedução, indução, abstração, generalização, etc), como pelo desenvolvimento de categorias de pensamento (noções de número, objeto, espaço, tempo e causalidade).

Julgando que ter acesso ao pensamento infantil via linguagem poderia constituir uma limitação de sua pesquisa, Piaget passou a pedir que as crianças manipulassem materiais concretos e que justifi cassem suas ações, impondo-lhes desafi os que exigiam delas raciocínios progressivamente mais elaborados.

Dessa forma, Piaget foi aperfeiçoando seu método clínico, buscando apreender a lógica infantil, não somente através da linguagem, mas também por meio de ações efetuadas sobre os objetos envolvidos em determinadas tarefas previamente planejadas. Além de sofi sticar seus estudos, isso lhe permitiu trabalhar com crianças mais jovens, ainda em fases pré-verbais de comunicação.

Nessa versão mais elaborada do método clínico, o pesquisador tinha alguns critérios de controle das situações:

Em submeter a criança a provas organizadas de maneira a satisfazer as seguintes condições: de um lado, a questão deve permanecer idêntica para todos os sujeitos, ser sempre colocada nas mesmas condições; de outro as respostas dadas pelos sujeitos devem ser consignadas em uma tabela ou uma série que permitam compará-las qualitativamente ou quantitativamente. (PIAGET apud DOLLE, 2000, p 15).

Um exemplo clássico das provas piagetianas é o de conservação de quantidades. Apresentam-se à criança duas quantidades iguais de coisas ou objetos, enfi leiradas lado a lado e justapostas com a mesma distância. Pergunta-se à criança se existe a mesma quantidade de bolinhas, por exemplo, nos dois grupos. Se a criança acerta e diz que sim, procede-se com uma simples modifi cação da sua aparência, no modo como ocupam o espaço: num dos agrupamentos, aumenta-se a distância entre os objetos de modo que a aparência de quantidade nesse seja maior do que no outro grupo, devido ao espaço que ocupam numa superfície.

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Em seguida, refaz-se a pergunta à criança: “E aqui há o mesmo número de bolinhas que ali?”. Dependendo da resposta que a criança dê, ela nos estará indicando o tipo de raciocínio que empregou para realizar essa operação mental. Mais especifi camente, sua resposta estará revelando se é capaz de perceber que a quantidade é uma propriedade que não se modifi ca, se apenas alterarmos sua apresentação. Ou seja, concluirá que não importam as ações que fazemos sobre as bolinhas; se elas permanecerão afastadas ou próximas uma das outras; a quantidade de elementos continuará sendo a mesma.

Crianças muito jovens, segundo Piaget, costumam não desvincular tamanho, área ocupada etc, de quantidade, pois estão presas a uma percepção mais sensorial do mundo. Mais do que isso, as crianças, à medida que exploram o mundo, conhecem os objetos nas suas mais variadas formas de apresentação e passam a construir a noção de conservação de quantidade, de área, de volume e assim por diante.

Certamente, na sua prática docente, ou fazendo pesquisa com crianças, você também perceberá, assim como Piaget o fez, que as crianças da Educação Infantil tendem a acreditar que ocorreu mudança na quantidade de um dos elementos da experiência, enquanto as crianças maiores conseguem ter certeza da conservação das quantidades.

Os conceitos que você precisará dominar para compreender e explicar esse processo de construção de conhecimento serão descritos na seção que trata dos processos de assimilação, acomodação e equilibração, bem como, na seção em que trataremos de abordá-los dentro do contexto evolutivo dos estágios de desenvolvimento propostos por Piaget.

Portanto esteja preparado(a) para identifi car na sua própria construção de conhecimento sobre a teoria, os processos de assimilação e acomodação. Isso signifi ca dizer que permanecemos ampliando nossa capacidade cognitiva incessantemente, a cada novo desafi o cognitivo que nos causa desequilibração. Somos empurrados por uma força de natureza biológica, diria Piaget,

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para superarmos as situações desequilibradoras, por meio de operações mentais mais ou menos complexas, de modo a encontrarmos níveis cada vez mais adaptativos de equilíbrio com o meio.

Para chegar a conclusões notáveis como essa, Piaget “utilizou” seus fi lhos como sujeitos de pesquisa e contou com a colaboração de sua esposa. O que a um primeiro olhar parece pouco científi co, precisa ser avaliado com as lentes do rigor metodológico que ele empregou para realizar suas observações, como já foi falado. Das observações de Jacqueline, Lucienne e Laurent, que nasceram entre 1925 e 1931, foram publicados “O nascimento da inteligência na criança” (1936) e “A construção do real na criança” (1937). São verdadeiros dossiês de observações, rigorosamente registradas e classifi cadas, para dar forma à teoria do pensamento infantil.

Nessas obras, Piaget deixa clara a dialética presente na relação do sujeito com os objetos: o sujeito se constitui no processo em que constitui para si mesmo o mundo que o cerca.

Antes dos trinta anos de idade, Piaget tornou-se mundialmente reconhecido pelas suas contribuições para a psicologia e pelas implicações de sua teoria para o campo da Educação. Entretanto nunca se formou em Psicologia, nem pretendeu criar um método de ensino, pautado em sua teoria.

Como se sabe, seu nome está diretamente relacionado com o modelo construtivista da Educação. Infelizmente, interpretações apressadas e equivocadas da teoria piagetiana e extrapolações indevidas para a sua aplicação nas salas de aula, utilizando-se do método construtivista, acabaram por causar sérias confusões acerca do papel do professor construtivista, especialmente, na década de 80, no Brasil.

O professor que “se viu obrigado” a tornar-se construtivista (mais uma faceta decorrente dos modismos na pedagogia) perdeu sua identidade tradicional de educador: daquele que ensina, corrige e orienta o aluno e acabou desiludido com Piaget e sua teoria.

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No fi nal da unidade, será abordada a relação entre Epistemologia Genética e construtivismo e tentar-se-á desmistifi car os equívocos produzidos por seguidores e críticos de Piaget. Isso não signifi ca dizer que Piaget acertou em tudo que escreveu e que sua teoria tenha dado conta de responder a todas as questões concernentes ao desenvolvimento humano.

Como toda teoria, a Epistemologia Genética é um recorte da realidade e não, a própria realidade. Ela tem uma abrangência, um problema que foi investigado exaustivamente, numa determinada época e lugar históricos e, portanto, está condicionada a esse contexto histórico e cultural. Seu autor é formado em biologia, e sua visão é a de um biólogo que tenta aplicar as leis da biologia evolucionista à estrutura de um fenômeno que é psicológico - a capacidade de conhecer. Nesse sentido, você precisa atentar para esse recorte epistemológico, ou seja, para o que ele pretendeu investigar e qual lente usou para fazê-lo.

Piaget não quis explicar o desenvolvimento da personalidade integral da criança, como o fez Vygotsky, Leontiev e Wallon, nem quis criar um método que facilitasse a aprendizagem, como fez Ausubel, autores que você verá nas próximas unidades. Ele interessou-se por apenas um dos seus aspectos: a cognição.

Seu objeto de estudo era o sujeito epistêmico (o sujeito que conhece). E ele realizou isso como ninguém, façamos justiça! Daí a força e, simultaneamente, os limites de sua Epistemologia Genética.

SEÇÃO 2 - O desenvolvimento da estrutura cognitiva: organização, adaptação, assimilação e acomodação. Equilíbrio e desequilíbrio da estrutura cognitiva

Nesta seção, será apresentado como Piaget explicou a origem e o desenvolvimento da estrutura cognitiva humana. Para isso, será preciso seguir uma trajetória de pensamento semelhante à que Piaget utilizou.

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Será que, desde que nascemos, já contamos como essa estrutura que nos permite conhecer o mundo? O que você pensa sobre isso?

Imagine um bebê recém-nascido. De quais recursos ele dispõe para compreender a realidade que o cerca? Ele sabe o nome dos objetos que estão no seu quarto? Sorri discriminadamente para as pessoas que o cercam antes dos dois meses de idade? Compreende o que lhe é falado? Mais do que isso: consegue diferenciar-se, como indivíduo, de sua mãe, já que, cada vez que chora, existe essa presença que o conforta?

Se você fez algum esforço para responder a essas questões, com base em suas próprias experiências cotidianas, terá concluído que NÃO, o bebê não nasce com estruturas cognitivas capazes de realizar todas essas façanhas intelectuais. Aliás, ele precisará de um período razoável e de muito “treino”, até que se diferencie da sua própria mãe, ou até que reaja com desaprovação à aproximação de estranhos. Algum tempo, também, será necessário para ele descobrir que aquela coisinha que passa diante de seus olhos, vez por outra, é algo que faz parte do seu próprio corpo: é seu braço; e ele pode controlá-lo de acordo com sua própria vontade, levando-o até um objeto, agarrando esse objeto com a mão e trazendo-o até sua boca.

Bom, essa idéia de que não nascemos inteligentes parece comum no mundo científi co nos dias de hoje (ainda que, nos meios mais populares, diga-se que quem é bom já nasce pronto!!), mas, na época de Piaget, era algo bastante inédito. Como foi esclarecido na seção anterior, a idéia surgiu das conclusões alcançadas nos primeiros trabalhos de Piaget, no campo da biologia. Desde o

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trabalho com os moluscos, Piaget estava convencido de que os atos biológicos são atos de organização e adaptação ao meio ambiente.

A premissa da qual ele parte é a seguinte: a estrutura biológica de um ser vivo evolui e se organiza para se adaptar ao meio e aumentar suas chances de sobrevivência. Todos os seres que evoluíram neste planeta, desde o mais simples até os mais complexos, estão aqui, porque conseguiram atingir, pelo menos até o momento, essa fi nalidade última: sobreviver e passar sua herança genética adiante, por meio da procriação. É o que Darwin chamou de luta pela preservação da espécie.

Dependendo das condições ambientais encontradas, cada espécie foi criando estratégias de sobrevivência. Estas promoveram, em sua estrutura física externa e interna, alterações, as quais foram sendo fi xadas em seu código genético. Os seres que nasceram e se desenvolveram nas proximidades da linha do Equador, na região dos trópicos, por exemplo, são estruturalmente diferentes dos que precisaram se desenvolver nas cercanias dos pólos terrestres. Seus corpos, em termos de estrutura (forma) e dinâmica (fi siologia), foram desenvolvidos para se adaptarem a essas condições. Do mesmo modo, cada espécie desenvolveu um sistema nervoso, para regular o funcionamento dos seus organismos.

Partindo dessa visão de evolução dos organismos, Piaget procurou responder: E quanto à inteligência? Por que ela surgiu e como se desenvolveu ao longo de nossa história? Como conhecemos mais coisas e de forma mais analítica ao longo da vida? Que processos operam essas mudanças? Obviamente, essas não são perguntas de respostas muito simples. Pensando assim, você consegue entender melhor por que Piaget passou mais de 50 anos tentando responder a elas, não é mesmo?

Piaget partiu do pressuposto de que a inteligência é mais uma forma adaptativa da espécie humana. Ela seria uma forma especial de adaptação biológica, desenvolvida em alguns mamíferos, e, de modo mais sofi sticado, nos primatas superiores - os homens. Nossa inteligência “precisou ser desenvolvida”, desde nosso passado remoto até os dias atuais, para continuarmos sobrevivendo e perpetuando nossos genes.

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Piaget sabia, portanto, que a inteligência não era algo dado, por dom divino, em função de sua orientação fi losófi ca e científi ca. Mas, se a inteligência em sua forma fi nal, não é inata na espécie, como ela surge na vida de cada bebê? De uma hora para outra, certamente não. Da mesma forma em todos os indivíduos, independente de sua idade? Também não.

Em suas pesquisas, Piaget concluiu que, em diferentes períodos evolutivos, pessoas raciocinam de modo diferente, para resolverem os mesmos problemas. Sua tarefa, agora, era conseguir capturar a gênese, ou seja, a trajetória inicial do surgimento da inteligência. Como ele não podia voltar no tempo e fazer perguntas aos nossos parentes da pré-história, optou por pesquisar crianças, já que, no desenvolvimento ontogenético, pareceria ser possível recuperar esse elo perdido da origem da inteligência, tal como o conhecemos na forma adulta. Na introdução do livro “A Psicologia da Criança”, que Piaget escreveu junto com Inhelder (2003), os autores afi rmam:

É, portanto, do ponto de vista da psicologia genética que nos colocaremos neste trabalho: se a criança apresenta grandíssimo interesse por si mesma, a isso deve acrescentar-se, na verdade, o fato de que a criança explica o homem tanto quanto o homem explica a criança, e não raro, ainda mais, pois se o homem educa a criança por meio de múltiplas transformações sociais, todo adulto, embora criador, começou, sem embargo, sendo criança (PIAGET e INHELDER, 2003, p.8).

Para descrever a gênese da inteligência humana, tomou emprestados alguns conceitos da biologia, os quais já foram previamente referidos: organização e acomodação. Também fez uso dos conceitos de assimilação e acomodação, que serão apresentados a seguir.

Conceitualmente falando, o termo organização refere-se a uma tendência inata e imutável dos organismos, a que ele chamou de tendência invariante. Essa tendência explica por que todas as espécies, invariavelmente, buscam sistematizar seus processos internos em sistemas coerentes com o meio em que vivem. Já a adaptação diz respeito à capacidade do organismo de se

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transformar em função do meio, de tal forma que o resultado dessa transformação permita um aumento das trocas entre ambos, favoráveis à conservação do organismo. Cada mudança no sentido da adaptação exige uma organização das estruturas de um organismo.

Se olharmos os fenômenos da adaptação-organização mais a fundo, buscando encontrar quais os processos envolvidos nesses fenômenos, precisaremos fazer um árduo trabalho mental, que envolve operações complexas de análise, abstração e síntese.

Bom, a boa notícia é que Piaget fez isso para você, e que lhe, cabe, apenas, a tarefa de conseguir acompanhar o seu raciocínio.

Para Piaget, a adaptação intelectual é resultado da interação, ou de trocas, entre o indivíduo e o seu ambiente (de modo que aumente as chances de sobrevivência do organismo nesse meio) e envolve dois processos conhecidos na biologia: a assimilação e a acomodação. São esses processos que permitem o surgimento e o desenvolvimento da inteligência.

Na assimilação, nossa estrutura cognitiva incorpora características do ambiente externo às suas próprias estruturas, sem modifi cá-la. Já, na acomodação, nossa estrutura cognitiva precisa se modifi car, fazer alguns ajustes, para incorporar as características do novo objeto e, assim, continuar alcançando novos patamares de equilíbrio frente às condições do ambiente. A assimilação e a acomodação são processos indissociáveis, na maioria das vezes, pois, a todo momento, estamos identifi cando no mundo fenômenos e objetos, os quais são incluídos na nossa bagagem de conhecimentos. Por outro lado, não é raro aperfeiçoarmos nossos esquemas mentais para acomodarmos novos conceitos na busca constante pela equilibração, outro conceito usado por Piaget.

Uma criança formando o conceito de fi guras geométricas passará a identifi car, nas ruas, na escola e em casa, tudo o que se encaixa no conceito de quadrado, círculo ou triângulo. Aliás, ela demonstrará prazer em encontrar mais um exemplo que pode ser assimilado como quadrado, triângulo ou círculo, e repetirá essa

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tarefa cognitiva enquanto ela for sentida como desafi o, como algo que ainda lhe causa desequilíbrio cognitivo.

Depois de alguns acertos, ela poderá se deparar com uma fi gura muito semelhante visualmente ao quadrado, mas diferente conceitualmente dele: o retângulo. Diante da fala de um adulto que lhe ensina que aquele parece um quadrado, mas tem um outro nome, pois seus lados apresentam proporções diferentes, a criança precisará ajustar sua estrutura cognitiva a esse fato, o qual mais uma vez lhe gerou um desequilíbrio cognitivo. Ela precisará buscar equilíbrio para se adaptar às novas exigências do meio. Por isso se diz que a adaptação reclama equilíbrio entre a assimilação e a acomodação.

Na equilibração, a estrutura de conhecimentos (conceitos, juízos, valores, idéias, representações do mundo) é colocada num novo patamar, mais adaptativo em relação ao meio, para que se consiga operar (pensar e compreender o mundo) de modo mais funcional, nas novas situações que se apresentem. E essa é, talvez, a mais notável descoberta de Piaget: A construção de conhecimento é incessante, pois nunca está acabada. Ela resulta de um processo de reestruturação no qual todo conhecimento novo é gerado a partir de conhecimentos prévios e que somente estão disponíveis porque foram uma vez construídos. E o que é novo passa a ser disponibilizado para servir como base assimiladora de conhecimentos ainda não adquiridos. Assim, nos aperfeiçoamos como seres inteligentes, num processo de transformação e de transcendência que só cessa com a morte do organismo.

Se você compreendeu a essência da assimilação e da acomodação cognitiva e a sua função para atingir a equilibração, concluirá facilmente que são processos os quais promovem nosso acúmulo de conhecimentos acerca da realidade até o fi m da vida. Neste exato momento em que você estuda este livro didático, está assimilando e acomodando conhecimentos e reorganizando-os em sua estrutura cognitiva, ampliando-a de modo que se sinta confortável diante do que lê.

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Enquanto houver a sensação de que “não entendi direito”, aí está o desequilíbrio cognitivo, ou o desafi o para a busca de níveis maiores de equilibrações. Sua atitude ativa diante desse desafi o resultará em uma estrutura cognitiva cada vez mais complexa e organizada, a qual tornará possível a compreensão de fenômenos e processos psicológicos progressivamente mais complexos, envolvidos na compreensão da capacidade cognitiva humana.

Realmente não é algo simples de compreender, pois se trata de sua estrutura cognitiva, analisando e compreendendo a si mesma - o que se denomina de metacognição. Algo que somente os humanos conseguem fazer, com “algum” treino e depois de alguns anos de estudo sobre sua própria cognição. Agora você já consegue, pois já construiu uma base assimiladora para isso. Vá adiante!

SEÇÃO 3 - Os períodos do desenvolvimento cognitivo

No 1º volume do livro de Coll, Marchesi e Palácios (2004), intitulado “Desenvolvimento Psicológico e Educação”, os autores dividem as teorias que explicam o desenvolvimento infantil em três grandes blocos: inatista, organicista e construtivista. Paradoxalmente, Piaget encontra-se no limbo, entre os modelos organicista e construtivista.

Veja por quê!

De acordo com o modelo organicista, os bebês nascem predestinados a seguir uma rota de desenvolvimento, com vistas a atingir uma meta universal. Haveria, portanto, uma espécie de programação a priori, que defi niria a trajetória do desenvolvimento infantil, bem como o tempo de duração de cada etapa evolutiva, até atingir a etapa mais avançada. As formas mais simples do desenvolvimento psicológico, a partir das bases refl exas inatas, iriam transformando-se, gradativamente, em

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formas mais especializadas. E é exatamente assim que Piaget descreverá o desenvolvimento da Inteligência humana.

Para organicistas como Piaget, o desenvolvimento das estruturas cognitivas depende tanto da qualidade estimuladora do ambiente que recebe o bebê, quanto da ação ativa da criança sobre o meio físico e social, conforme podemos observar na afi rmação a seguir de Piaget e Inhelder (2003, p.7): “O crescimento mental não se pode dissociar do crescimento físico, notadamente na maturação dos sistemas nervoso e endócrino, que se estende até cerca dos 16 anos”. Eles prosseguem, mais à frente, dizendo: “A psicologia da criança não poderia, portanto, recorrer apenas a fatores de maturação biológica, visto que os fatores que hão de ser considerados dependem assim do exercício ou da experiência adquirida como da vida social em geral.” (PIAGET; INHELDER, 2003, p.8).

Como você pode observar, além de inaugurar a abordagem construtivista na pedagogia, ao explicar como as crianças constroem seus conhecimentos acerca de si e do mundo, Piaget mantém uma lógica organicista para explicar a trajetória do desenvolvimento a ser percorrida, descrevendo-a em termos de etapas sucessivas e invariáveis, que atingem o máximo da maturidade nas operações formais do pensamento.

Assim, o recém-nascido tem uma longa trajetória a percorrer, que dependerá de seu esforço individual, em grande medida, e de um meio desafi ador (desequilibrador) para que atinja a uma meta universal: sair das impressões sensoriais que o ligam ao meio, passar por uma posição egocêntrica e intuitiva, até atingir uma lógica descentrada de seu próprio ponto de vista, compreendendo o que faz os fenômenos acontecerem, suas causas e efeitos, o que só será possível por meio de operações mentais. O caminho percorrido desde o período dos esquemas refl exos, passando pelos esquemas de ações, até as operações mentais, será descrito a seguir.

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Período sensório-motor

Ao nascer, a criança é naturalmente dotada de esquemas refl exos, como você deve saber. Os refl exos inatos nada mais são do que respostas que foram desenvolvidas e aperfeiçoadas num longo processo de evolução e que se mostraram extremamente úteis para a nossa sobrevivência. Por isso foram fi xados no nosso código genético e estão presentes em todos os bebês que nascem em condições normais.

Os refl exos apresentam-se como respostas automáticas que surgem frente a alguns estímulos específi cos. O choro e a sucção são as respostas refl exas inatas de valor imediato de sobrevivência. Uma criança que não é capaz de chorar alto, nem de sugar forte o sufi ciente, terá sérios problemas para sobreviver. O choro desperta uma forte reação de amparo e cuidado no meio que recebe a criança, garantindo seu crescimento físico e desenvolvimento afetivo e cognitivo, fato que foi analisado

por estudiosos do desenvolvimento psicológico precoce como Bowlby, Spitz, Winnicott e Wallon (ver sugestões de leitura para aprofundamento).

Outros refl exos parecem não ter muita utilidade para a sobrevivência imediata do bebê - os chamados refl exos atávicos - mas já foram determinantes para a sobrevivência de nossa espécie. Esses refl exos tendem a desaparecer até os seis meses de idade, dando lugar a condutas voluntárias mais úteis para a nossa vida. É o caso do refl exo de Moro, que desaparece por volta dos 6 meses. Manifesta-se através da extensão e abertura dos braços e da extensão da cabeça para trás. O refl exo de preensão palmar é percebido durante os primeiros dois meses de vida e aparece sempre que tocamos a palma da mão do recém-nascido, e ele a cerra com toda sua força. O refl exo de marcha automática, que também desaparece por volta dos dois ou três meses, consiste em movimentos alternados de fl exão e extensão das pernas, dando a impressão de que o bebê está tentando andar. Ele só aparece, quando o bebê é erguido pelas axilas e tem as plantas dos pés encostadas numa superfície. O refl exo natatório remonta a nosso passado anfíbio e permite que o bebê, ao ser submerso numa banheira, proteja suas vias aéreas da entrada de água, trancando a

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Unidade 1

respiração, e exiba movimentos que simulam o nado. Esse refl exo tende a desaparecer por volta do terceiro ou quarto mês.

Nunca é demais dizer que o teste desses refl exos deve ser conduzido por um especialista para fi ns de diagnóstico precoce de algumas anormalidades neurológicas. Portanto não tente isso em casa, por favor!

Você pode estar perguntando-se: E o que isso tem a ver com Piaget?

Bem: como todo biólogo, Piaget não pôde negar essa arquitetura biológica refl exa universal. Na realidade, ele partiu daí para explicar como essas respostas automáticas, não aprendidas, portanto, podem transformar-se em respostas aprendidas e inteligentes em crianças ainda muito jovens, que não são capazes de utilizar recursos verbais para resolver problemas práticos que surgem.

Para Piaget, Estágio Refl exo é o primeiro estágio do período sensório-motor. Já nos primeiros meses de vida, pela repetição dos esquemas refl exos e pela necessidade de assimilar novos objetos às suas experiências prévias, surge o Estágio das Reações Circulares Primárias, durante o qual o bebê centra suas ações sobre seu próprio corpo e no que ele pode fazer: ver as mãos, levá-las a boca, tocá-las entre si. Um bebê nesse estágio passa bastante tempo exercitando esses movimentos, até dominá-los e automatizá-los, o que depende de sua participação ativa e do amadurecimento de certas estruturas cerebrais.

Após a estabilização desses esquemas simples de ação sobre seu corpo, o bebê parece não mais encontrar grandes novidades ou desafi os. Seu interesse volta-se agora para novos elementos que estão fora do seu corpo. Ele passa a se interessar por objetos coloridos, redondos, que fazem barulho. E o seu quartinho, normalmente, é o paraíso desses objetos! Ele possui, agora, os esquemas antigos que podem ser usados para incorporarem novos objetos. Esquemas já construídos, como o de estender o braço, fechar a mão, levar à boca, podem ser empregados para

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estender o braço em direção a um objeto “interessante”, dadas suas características atrativas. Se os seus esquemas anteriores funcionarem bem, ele conseguirá agarrar esse objeto (assimilará ao seu esquema de pegar); se funcionarem com defi ciência, ele treinará repetidamente, até acomodar seu esquema de pegar às características desse novo objeto.

Assim, o bebê entra no Estágio das Reações Circulares Secundárias, estágio em que a mobilidade permitida pelo arrastar e engatinhar permite uma exploração mais intensa do mundo a sua volta. Esse estágio marca um acontecimento inédito. Mais equipado a ver, ouvir e comunicar-se com o meio, o bebê inicia algumas ações simples de imitação do que percebe a sua volta, como sons, ações e expressões faciais.

Outra aquisição importante é a capacidade de reproduzir, intencionalmente, eventos descobertos por acaso. Por exemplo: ao deixar cair sua colher no chão e ver sua mãe apanhando-a, ele a joga repetidamente, esperando que o comportamento da mãe se repita. Apesar de cansativo para o adulto, pode-se perceber o quanto é envolvente e prazeroso para o bebê. Assim, por trás de uma ação aparentemente banal, esconde-se uma atividade mental mais complexa e inédita, uma atividade intencional, que busca um determinado efeito, a partir de uma causa gerada por ele próprio.

Bastante fascinante para quem há tão pouco tempo só fazia mamar e dormir, não é mesmo?

A partir dessa conquista surge o comportamento instrumental, ou seja, suas ações passam a visar uma meta pré-estabelecida, ou planejada, e ele torna-se capaz de estabelecer relação entre meios e fi ns. O que isso signifi ca? Que, pela primeira vez, ele está fazendo uso de ações que reconhecemos como verdadeiramente inteligentes. Essas ações são típicas do Estágio da Coordenação dos Esquemas Secundários, no qual a criança busca resolver problemas simples através dos esquemas desenvolvidos anteriormente.

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Unidade 1

Por exemplo, se colocarmos uma fralda sobre um brinquedo, e o bebê presenciar nossa ação de esconder esse objeto, o que ele fará? Ele utilizará os esquemas de estender, agarrar, procurar, para remover o obstáculo e alcançar seu brinquedo. Ou seja, ele resolverá, por conta própria, um desafi o cognitivo que lhe é imposto.

Bom, a notícia um pouco decepcionante é que isso ainda não é sinal de genialidade, como pensam alguns papais e mamães orgulhosos dos feitos de sua cria!

Esse comportamento de busca por objetos desaparecidos é rapidamente generalizado para outras situações (assimilação generalizadora). Se escondermos um brinquedo nas nossas costas, se o colocarmos dentro de um baldinho de plástico e o colocarmos debaixo de uma almofada etc, o bebê também descobrirá onde está, mas desde que tenhamos feito a ação de esconder diante de seus olhos. Objetos interessantes aumentam as chances de sucesso, bem como o grau de difi culdade que a criança enfrenta para encontrá-los pode diminuí-las. As situações de sucesso serão reforçadoras e ampliarão os esquemas intelectuais desse período.

O último estágio do período sensório-motor da inteligência é denominado Estágio das Reações Circulares Terciárias. Nesse estágio, a aquisição da capacidade de se locomover com efi ciência e por conta própria permite à criança explorar cada vez mais os objetos e o mundo à sua volta. Das repetidas vezes que manipulou e explorou objetos, jogou-os longe, perdeu-os de vista e recuperou-os novamente, a criança descobre algo novo. Os objetos existem, independente de estarem à sua vista, ou não. Eles permanecem existindo.

É o que se denominou noção de permanência do objeto.

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Como você pode deduzir, a inteligência sensório-motora caracteriza-se pela ausência de representação ou linguagem, o que implica dizer que a atividade intelectual que nela se desenvolve é puramente sensorial e motora e é fruto de intensas interações com o ambiente.

Segundo o próprio Piaget:

Sejam quais forem os critérios de inteligência que se adotarem (tacteio dirigido, segundo Claparède, compreensão súbita, segundo W. Köhler ou Bühler, coordenação dos meios e dos fi ns etc.), toda gente admite uma inteligência antes da linguagem. Essencialmente prática, isto é, tendente a resultados favoráveis e não ao enunciado das verdades, essa inteligência nem por isso deixa de resolver, fi nalmente, um conjunto de problemas de ação (alcançar objetos afastados, escondidos etc.), construindo um sistema complexo de esquemas de assimilação, e de organizar o real de acordo com um conjunto de estruturas espácio-temporais casuais...à falta de linguagem e de função simbólica, tais construções se efetuam exclusivamente apoiadas em percepções e movimentos, ou seja, através de uma coordenação sensório-motora das ações, sem que intervenha representação ou pensamento. (PIAGET; INHELDER, 2004, p.12).

Período operatório

1.1 - Estágio pré-operatório

Por volta dos 18 a 24 meses de vida, surge, na criança, uma função inédita, que inaugura o estágio pré-operatório. Apresenta-se, agora, o que faltou no período sensório motor: a função simbólica ou semiótica. Essa função torna a criança capaz de representar algo mentalmente, dar-lhe um signifi cante único, um nome, por exemplo. A criança torna-se capaz de utilizar símbolos mentais e palavras para imaginar objetos ausentes ou falar sobre eles, e, portanto, liberta-se do “aqui e agora“, típico do período anterior.

O surgimento da função simbólica é marcado pelo aparecimento de, pelos menos, cinco condutas, mais ou menos simultâneas, na vida da criança: a imitação diferida, aquela que surge na

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Unidade 1

ausência do modelo, e não, ao mesmo tempo em que o modelo é exibido.

Por exemplo, algumas horas depois de ver a mãe cuidar das plantinhas, a criança faz o mesmo gesto de que estaria aguando plantinhas.

O jogo simbólico é bastante conhecido por quem trabalha com pré-escolares. A criança faz de conta que está fazendo a boneca dormir e dá-lhe mamadeira, assim como faziam com ela quando era menor. Uma terceira conduta é a do desenho, que permite o registro gráfi co da imagem mental, dentro das possibilidades motoras e visuoperceptivas da criança. E, fi nalmente, a linguagem, que permite a evocação por meio de palavras, algo que não está a sua vista.

Por exemplo, ao pedir “aba” (água), a criança intencionalmente comunica que deseja beber água.

O desenvolvimento da linguagem formal e o incremento do vocabulário são, portanto, fundamentais para que se internalize como pensamento aquilo que, antes, era ação. Assim, para Piaget, o pensamento constitui-se como uma linguagem interna. A ação intelectual deixa de ser puramente perceptiva e motora, tornando-se uma representação mental, por meio de imagens e experimentos mentais.

O egocentrismo, entretanto, ainda marca a vida mental da criança nesse período. Por isso seu pensamento é intuitivo (não marcadamente lógico) e está misturado com seus desejos, suas expectativas e suas experiências cotidianas. Se perguntarmos, por exemplo, a uma criança, se acha que fará sol no fi nal de semana, ela poderá responder que sim, pois sua família decidiu fazer um piquenique no sábado. Aqui, fi ca claro que a referência utilizada para construir seu raciocínio está impregnada pelo seu próprio desejo de passear e divertir-se, mais do que pelos

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estudos de meteorologia. Por utilizarem raciocínio intuitivo e egocêntrico, as crianças nesse período costumam nos surpreender pela ingenuidade e, ao mesmo tempo, pela sagacidade de suas respostas.

Outras condutas, típicas do egocentrismo, podem ser destacadas:

a) realismo - Corresponde a confundir a aparência com a realidade. Por exemplo: quando a criança diz “a lua acende toda noite”;

b) finalismo - A criança tende a buscar uma finalidade para tudo. Por exemplo: “a nuvem foi feita para o avião não cair no chão duro;

c) animismo - Dotar as coisas de intenções, como se fossem humanas. Por exemplo: se um carrinho de controle remoto vai em sua direção, a criança corre, pensando que ele “quer” pegá-la;

d) artificialismo - A criança acredita que tudo é produzido: “a nuvem é feita na fábrica de algodão”, seria um exemplo típico;

e) monólogo ou fala egocêntrica - Segundo Piaget, a criança fala sem intenção de comunicar-se e sem uma função especial para a organização de sua conduta. Ela apenas fala em voz alta, sem perceber que está acompanhada.

Finalmente, uma outra característica fundamental marca o pensamento simbólico das crianças, nesse estágio, e as diferencia das crianças mais velhas e dos adultos: é a falta da reversibilidade. Você estudará a reversibilidade a seguir, já que essa capacidade marca a transição para o período operatório concreto.

1.2 - Estágio operatório-concreto

A reversibilidade é a capacidade mental de fazer as coisas retornarem ao seu estado inicial, independentemente das transformações superfi cais que nelas ocorram. Quando conseguimos atingir a reversibilidade do pensamento, somos capazes de compreender que, se pegarmos uma determinada quantidade de massinha ou de água, podemos transformá-las de

Você verá que Vygotsky tem uma opinião divergente a esse respeito

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Unidade 1

várias formas, mas elas permanecerão tendo a mesma quantidade (de líquido ou de massa).

No período anterior, pré-operatório, a criança tende a ter muita difi culdade em alcançar a reversibilidade, mesmo se a desafi armos, mostrando, por meio de exemplos práticos, como é possível fazer com que as coisas voltem ao estado original.

A partir do período operatório-concreto, a criança consegue resolver uma série de problemas lógicos que envolvem seriação e classifi cação (organizar elementos de acordo com uma classe e em uma ordem determinada, e incluir novos elementos de acordo com esses critérios). Além disso, ela se torna capaz de solucionar problemas que envolvam a capacidade de reversibilidade já referida anteriormente.

Entretanto ela necessita realizar ações práticas para resolver esses problemas. Daí a denominação operatório-concreto para o período. A criança precisa testar, na prática, suas hipóteses.

Por exemplo, pegar uma quantidade de massinha e experimentar suas diferentes formas.

O que lhe falta, ainda, é a capacidade de aplicar a lógica da reversibilidade a problemas hipotéticos ou abstratos, somente possível no período seguinte.

Na esfera das relações sociais, a saída da posição egocêntrica que ocupará até muito recentemente, permite-lhe, agora, levar em consideração os sentimentos dos outros, seus pontos de vista e seus juízos em relação ao que faz. Portanto, nesse período, ela já é capaz de exibir julgamento moral com base na empatia, isto é, com a capacidade de se colocar no lugar de alguém e experimentar seus prováveis sentimentos. Ela agora deixa de fazer coisas que lhe parecem erradas, pois tem algum nível de consciência moral, e não, apenas porque seus pais irão repreendê-la.

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Período operatório-formal (11 a 15 anos)

De acordo com Piaget, esta seria nossa etapa fi nal, do ponto de vista das operações cognitivas. Seria o ápice do que o homem conseguiu atingir, até o momento, em termos de trajetória de desenvolvimento psicológico.

Nossas estruturas cognitivas (esquemas mentais) atingem a maturidade intelectual ainda muito cedo na vida, quando os indivíduos tornam-se capazes de aplicar operações lógicas para resolver problemas hipotéticos. Podem imaginar algo que não existe, resolver problemas mentalmente, sem nem sequer usar lápis e papel. Também se tornam plenamente capazes de pensar nas conseqüências de seus atos e tomar decisões importantes com base nessas conseqüências.

A partir desse período, você ingressa no mundo dos adultos e tem condições de compreender paulatinamente, por meio de sucessivas assimilações e acomodações, as leis que regem os fenômenos da natureza, assim como as leis que regem os fenômenos psicológicos. Como nos demais períodos, a construção da realidade é progressiva, trabalhosa e exige muito esforço e dedicação de sua parte. Exige, também, que o conhecimento seja dosifi cado e organizado de modo a ser acessível à sua estrutura cognitiva.

Agora o aprendizado não é mais natural e espontâneo, mas depende de uma grande dose de sistematização dos conteúdos por parte de quem ensina. Daí surgem os diferentes métodos pedagógicos e a didática para dar conta dessa tarefa.

SEÇÃO 4 - Construtivismo e Educação

Certamente você já viu o nome de Jean Piaget associado à educação em geral e ao construtivismo, em particular. Talvez lhe cause surpresa saber que Piaget não se considerava educador, tampouco se preocupou em sistematizar um método de ensino.

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Unidade 1

Entretanto o fato de ter desenvolvido uma teoria que desvendou a gênese do pensamento racional e seu processo de desenvolvimento, ao longo de estágios, rendeu-lhe o título de precursor do construtivismo na educação. Assim, mesmo sem ter-se dedicado, explicitamente, a contribuir com o processo de ensino e aprendizagem escolar, suas primeiras publicações, na década de 20, já causaram impacto no meio educacional, no contexto europeu e norte-americano.

Lembre-se que, antes de Piaget falar da construção do conhecimento, prevalecia na educação a idéia de que o conhecimento constituía algo de domínio do professor. Caberia aos alunos reproduzir passivamente o que o professor lhes ensinava. Apenas o produto fi nal da aprendizagem era medido por meio de perguntas que exigiam nada mais do que memorização mecânica dos conteúdos. A compreensão do conteúdo e o sentido individual que cada aluno atribuía ao que aprendia não era uma questão fundamental do ensino.

Sempre que foi convidado a se manifestar acerca da educação, Piaget sustentava que o papel da escola deveria ser o de oferecer ao aluno situações desequilibradoras, que o levassem a lançar hipóteses e testá-las, para ver os possíveis resultados. Defendia a aprendizagem por descoberta em oposição à aprendizagem mecânica. (Você estudará esses tipos de aprendizagem na unidade 4, que trata da teoria da aprendizagem signifi cativa de Paul David Ausubel, seu contemporâneo).

Para Piaget, os estágios do desenvolvimento cognitivos deveriam ser respeitados pelo professor. Deveriam constituir pontos de partida, para que as situações de aprendizagem fossem apresentadas. Neste sentido, a aprendizagem dependeria do estágio de desenvolvimento do indivíduo. A aprendizagem dependeria do desenvolvimento cognitivo; não se poderia ensinar algo para o qual a criança não estivesse preparada em termos de estrutura cognitiva. (Você estudará a contestação dessa visão, apresentada por Vygotsky, no capítulo 2, que trata da Teoria Histórico-Cultural).

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As idéias de Piaget, quando chegaram à América Latina, causaram impacto semelhante ao causado na Europa. Na década de 60, as implicações para a educação já se tornavam evidentes, especialmente com a contribuição de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (1985).

Ferreiro, psicóloga e pesquisadora argentina, naquela década, fazia seu doutorado sob a orientação de Jean Piaget em Genebra, dentro de uma linha de pesquisa que o autor chamou de psicolingüística genética. Lá desenvolveu seu interesse pela alfabetização e retornou à Argentina em 1971, para a Universidade de Buenos Aires, onde constituiu um grupo de pesquisa sobre alfabetização. Destacou-se, nesse grupo, a parceria com Ana Teberosky, cujo trabalho estava focado na psicogênese da língua escrita.

Com o golpe de estado que a Argentina sofre na década de 70, vê-se obrigada a buscar exílio em Genebra, onde inicia uma nova parceria com Margarida Gómez Palácio. Juntas, desenvolvem pesquisa sobre as difi culdades de aprendizagem das crianças mexicanas.

Cerca de 10 anos mais tarde, publica o livro “Novas perspectivas sobre os processos de leitura e escrita”, ainda com Margarida Gómez Palácio. Esse livro inaugura, no campo da educação, a visão construtivista da alfabetização. Na segunda década de 80, publicam vários livros, os quais tratam de experiências inovadoras na área de alfabetização, em países da América Latina, incluindo o Brasil. Dentre eles, destacam-se “A alfabetização em processo”; “A Psicogênese da língua escrita” e “Os fi lhos do analfabetismo (Propostas para a alfabetização escolar na América Latina)”.

É importante ressaltar: da mesma forma que Jean Piaget não desenvolveu um método de ensino, Emilia Ferreiro não desenvolve um método de alfabetização. Ela, seguindo os passos do mestre, procurou compreender como ocorria a construção da linguagem escrita nas crianças. Entretanto os resultados de suas pesquisas contribuíram para se pensar o modo como as crianças vinham sendo alfabetizadas. Suas contribuições para a área da educação renderam a essa educadora vários títulos de “Doutor Honoris Causa”. Em 1992, pela Universidade de Buenos Aires; em 1999, pela Universidade Nacional de Córdoba (Argentina); em 2000, pela Universidade Nacional de Rosário (Argentina); e,

Figura: Emília FerreiroFonte: www.nea.fe.usp.br/.../upload/emilia.jpg

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Unidade 1

em 2003, pela Universidade de Comahue (Argentina). No Brasil, recebe o mesmo título em 1995, conferido pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Um ano antes, recebeu da Assembléia Legislativa da Bahia a medalha “Libertador da Humanidade”, que apenas havia sido oferecida ao líder sul-africano Nelson Mandela e ao educador brasileiro Paulo Freire. É agraciada, mais uma vez, pelo governo brasileiro, em 2001, com a Ordem Nacional do Mérito Educativo.

Emilia Ferreiro causou uma verdadeira revolução conceitual na alfabetização, ao afi rmar que a escrita infantil não é adquirida via exercitação visomotora de modelos externos, mas resulta de um processo de construção pessoal. Ferreiro e Teberosky (1985) foram além, afi rmando que as crianças já constroem hipóteses sobre como ler e escrever muito antes de iniciarem a alfabetização formal nas escolas. Assim, as autoras propõem estágios do processo de construção da escrita, os quais você conhece em seguida.

Nível pré-silábico: Nesse nível, a criança começa a diferenciar o que pode ser considerado escrita daquilo que é meramente um desenho (ou escrita iconográfica). Entretanto suas tentativas de reprodução dos traços básicos da escrita são realizadas, sem que ela se dê conta de que esses sinais representam a fala. Geralmente, quando solicitada, ou por iniciativa própria, a criança “lê” em seus rabiscos aquilo que desejou escrever. Também é comum utilizar indiscriminadamente numerais, letras e inventar símbolos, ainda que respeite certa quantidade de letras (geralmente, não inferior a três) e não aceite repetição de letras. Além disso, pode ter como hipótese que a escrita dos nomes é proporcional ao tamanho do objeto ou, mesmo, que corresponde àquilo a que está se referindo, fenômeno que Ferreiro chamou de realismo nominal (associar a escrita à propriedade física dos objetos - como cor, peso, tamanho e idade, e etc.). Por exemplo, pode escrever hipopótamo com várias letras e outros símbolos; e formiga, com apenas três ou quatro letras. Nesse nível, a criança ainda não conhece o valor sonoro das letras.

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Nível silábico: Quando a criança lança a hipótese silábica, isto significa que ela começa a dar-se conta de que cada grafia traçada corresponde a uma sílaba pronunciada, podendo ser usadas letras ou outro tipo de grafia. Normalmente, são diferenciados dois momentos: no 1o momento, ela escreve qualquer letra para cada uma das sílabas (xpt –Macapá); já, no 2o momento, a criança passa a usar uma letra que tenha algum valor sonoro (JKR ou AAE para jacaré). Entretanto ainda apresenta dificuldades para compreender como o mesmo som pode ser representado por duas grafias diferentes.

Nível silábico-alfabético: Esse nível representa a transição da hipótese silábica para a alfabética. Agora a criança já começa a perceber que escrever é representar progressivamente as partes sonoras das palavras, ainda que continue cometendo erros de grafia.

Nível alfabético: Nesse nível, a criança é capaz de estabelecer a correspondência letra-fonema e compreende que cada um dos caracteres da escrita (m e a - eme e a) corresponde a valores menores que a sílaba (ma). Entende que, se palavra tiver duas sílabas, exigirá dois movimentos orofaciais para ser pronunciada e necessitará mais do que duas letras para ser escrita. Também descobre uma regra geral: a partir dos elementos simples (letras), é possível formar a representação de inúmeras sílabas, que podem formar palavras novas. Apesar dessas aquisições e progressos, a criança ainda continua a cometer erros gráficos, pois não domina as regras gramaticais da língua.

Nível ortográfico: Somente a partir desse nível, a criança passa a exibir o domínio progressivo das regras que convencionam a língua escrita. A escrita ortográfica depende da convivência e do confronto de sua escrita com a escrita de livros e revistas. Portanto a familiaridade com textos e a prática da leitura mantêm uma relação de interdependência com o domínio da escrita em seus vários níveis e modalidades.

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Unidade 1

Para fi nalizar, vale mencionar que o debate em torno da aplicação dos postulados da teoria psicogenética à educação está aberto até os dias de hoje. As contribuições do sócio-interacionismo vygotskyano levaram os construtivistas mais ferrenhos a repensar o processo educativo sobre novas bases, como você verá na Unidade 2. Entretanto não se pode deixar de relembrar que a aplicabilidade de qualquer teoria psicológica à compreensão da aprendizagem de conteúdos escolares deve evitar transposições apressadas, pois elas sempre resultam em reducionismos; e reducionismos nunca se irão prestar a explicar a totalidade e complexidade envolvida nas condições reais em que ocorre o processo ensino e a aprendizagem.

Neste momento você fi naliza esta unidade. Ao estudá-la pôde compreender o contexto histórico e as bases fi losófi cas que orientaram o pensamento de Jean Piaget na elaboração de sua Epistemologia Genética e descrever o que inspirou Jean Piaget a desenvolver seu método de pesquisa e sua produção intelectual ao longo de sua vida.

Identifi cou os principais conceitos que explicam o processo de construção da capacidade cognitiva humana e pôde descrever o modo como esse processo ocorre. Você pôde também conceituar adaptação, organização, assimilação-acomodação, e equilibração no contexto do desenvolvimento da inteligência humana.

Além disso pôde analisar e descrever o desenvolvimento das estruturas da inteligência em seus diferentes estágios, da inteligência sensório-motora à inteligência operatório-formal e também conhecer as implicações da Epistemologia genética para o paradigma construtivista na Educação.

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Síntese

Nesta unidade, você estudou a trajetória intelectual de Jean Piaget na construção de sua Epistemologia Genética. Jean Piaget desenvolveu uma teoria, a partir de um método até então pouco utilizado na ciência psicológica.

Através desse método, conseguiu perceber que o modo como as crianças, os jovens e os adultos pensam, exploram e conhecem o mundo e a si próprios, é qualitativamente diferente, já que cada um tem como base estruturas cognitivas progressivamente mais complexas. Agrupou essas estruturas em três grandes níveis ou períodos distintos: o período sensório-motor (que se divide em seis estágios); o período operatório, (que se divide em dois estágios, o estágio pré-operatório e o operatório concreto); e o período operatório formal. Cada período é marcado por aquisições particulares do sujeito diante de suas relações com o mundo à sua volta e está relacionado a uma determinada etapa cronológica, dada sua íntima relação com os fatores maturativos.

É claro que não se trata de estabelecer a idade precisa em que a transformação intelectual irá ocorrer, já que estamos olhando o desenvolvimento a partir de um prisma construtivista, mas sim, de delimitar etapas evolutivas que se relacionam com modos muito semelhantes de compreender a realidade. Isso signifi ca dizer que pode haver variações maiores ou menores, em função do meio ou das particularidades genéticas de uma criança, mas nunca a ponto de uma criança “pular” uma etapa, e atingir a seguinte.

Cada nível precedente é necessário para que o seguinte ocorra, e cada nível posterior incorpora e transforma aquisições do período anterior. Além disso, somente em casos patológicos, uma criança permanece estacionada num mesmo nível de inteligência, fato que está geralmente relacionado a problemas de ordem estrutural (neurológica), como no caso da defi ciência mental.

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Unidade 1

Em sua teoria, Piaget defi niu o egocentrismo intelectual como um dos aspectos mais evidentes da estrutura mental infantil. Para o autor, o que mais caracterizava o pensamento da criança em seus estágios iniciais do desenvolvimento intelectual era a incapacidade de se deslocar de seu próprio ponto de vista; ou seja, sua condição egocêntrica a impedia de passar de um pensamento centrado em si mesma e incomunicável para uma forma de pensamento socializado, que leva em conta o posicionamento e as ações de outros indivíduos.

Finalmente, você alcançou as implicações da epistemologia genética, a compreensão do processo de aprendizagem, em especial do processo de alfabetização, através de sua seguidora, a argentina Emilia Ferreiro.

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Atividades de auto-avaliação

Para praticar os conhecimentos apropriados nesta unidade, realize as atividades propostas.

1 ) Como você estudou ao longo dessa unidade, o egocentrismo infantil caracteriza-se, principalmente, pela indiferenciação entre o próprio ponto de vista e o dos outros, ou entre a própria atividade e as transformações que ocorrem na realidade. Daí a difi culdade de a criança, antes dos sete anos de idade, resolver problemas que envolvem a lógica formal a qual explica grande parte dos fenômenos que observamos na natureza. Explique (com suas palavras) o que você entendeu sobre esta passagem de texto. Apresente exemplos práticos.

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Psicologia da Educação II

Unidade 1

2) Construa um texto breve sobre o desenvolvimento intelectual infantil e, nele, introduza os conceitos de adaptação, organização, assimilação-acomodação e equilibração. Procure usar suas próprias palavras e sua própria lógica de construção textual como meio de desprender-se do texto original. Isso lhe permitirá colocar seus próprios recursos cognitivos à prova, bem como servirá de base para você perceber as difi culdades de construir um texto escrito sobre um texto já assimilado.

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Saiba mais

Para aprofundar as questões abordadas nesta unidade, você poderá pesquisar as seguintes obras e sites:

DOLLE, Jean-Marie. Para compreender Piaget. Trad. Regina Vasconcellos. Rio de Janeiro: Agir, 2000.

PIAGET, Jean e INHELDER, Bärbel. Trad. Octavio Mendes Cajado. A psicologia da criança, Rio de Janeiro: Difel, 2003, 144p.

PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação. Trad de Álvaro Cabral e Christiano Monteiro Oiticica. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1971.

PALÁCIOS, Jesus. Psicologia evolutiva: conceito, enfoques, controvérsias e métodos. in COLL, C., MARCHESI, A., PALÁCIOS, J Cols. Desenvolvimento Psicológico e Educação. Porto Alegre: Artmed, 2004. 1v.

MARCELLI, D. Manual de psicopatologia da infância de Ajuriaguerra. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

SPITZ, R. A. O primeiro ano de vida. Tradução de Erolthides Millan B. da Rocha. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

WINNICOTT, D. W. O brincar & a realidade. Rio de Janeiro: Imago Editora LTDA, 1975.

OLIVEIRA, Cecília Casali. O Apego infantil. Disponível em: <http://www.ceciliacasali.psc.br/Apego.html> Acesso em: 16 mai. 2007.

LA TAILLE, Ives. OLIVEIRA, Marta Kohl. e DANTAS, Heloisa. Piaget, Vygotsky, Wallon: Teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.

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UNIDADE 2

A Psicologia Histórico-Cultural

Objetivos de aprendizagem

Contextualizar o surgimento e desenvolvimento da Psicologia Histórico-Cultural.

Compreender os métodos de pesquisa empregados por Vygotsky e Leontiev no desenvolvimento de suas teorias.

Compreender como a estrutura da atividade está relacionada com a constituição da consciência humana.

Entender como a linguagem está envolvida com o desenvolvimento da consciência humana.

Compreender a relação entre desenvolvimento e aprendizagem.

Conhecer as contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a educação.

Seções de estudo

Seção 1 História da Psicologia Histórico-Cultural

Seção 2 O Método de Vygotsky

Seção 3 O Método de Leontiev

Seção 4 A função da linguagem no desenvolvimento do pensamento e da consciência

Seção 5 Conceitos espontâneos e científi cos

Seção 6 A relação entre desenvolvimento e aprendizagem

Seção 7 Contribuições para a Educação

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Confira, no Saiba Mais da unidade, uma explicação mais aprofundada sobre filogênese e ontogênese, para ampliar sua compreensão.

Para início de estudo

A Psicologia Histórico-Cultural é uma escola psicológica formada por um conjunto de pesquisadores que adotam o materialismo histórico e dialético como base epistemológica e fi losófi ca, especialmente a partir dos estudos de Marx e Engels.

Sua origem é atribuída a Vygotsky, mas são muitos os pesquisadores que deram continuidade aos seus projetos de pesquisa e ao seu legado teórico, permitindo que essa escola psicológica formasse um campo vasto e fértil de produção de conhecimento, que mudou a forma de pensar a psicologia no séc. XX, e que segue mudando nos dias atuais. Entre esses estudiosos, merecem destaque especial, pela amplitude de suas contribuições teóricas: Leontiev, Luria (que você estudará nesta unidade), Rubinstein, Elkonin, Galperin, Davidov e Talìzina, (além de vários autores contemporâneos que você acompanhará pelas referências apresentadas ao longo desta e da quarta unidade da disciplina).

Essa escola psicológica objetiva explicar o homem em sua totalidade, isto é, a natureza, o desenvolvimento e o funcionamento do psiquismo humano, considerando os aspectos cognitivos (que permitem ao homem conhecer os objetos do mundo e compreendê-los em suas propriedades e nas suas inter-relações); afetivos (que permitem ao homem estabelecer relações de cunho emocional com esses objetos e consigo próprio); e conativos (que permitem ao homem agir sob o controle da vontade). E o faz, predominantemente, por meio do estudo do desenvolvimento fi logenético (desenvolvimento que ocorre em nível das espécies) e ontogenético (desenvolvimento que ocorre em nível do indivíduo).

As pesquisas voltaram-se ao estudo do desenvolvimento dos processos psicológicos superiores, típicos da espécie humana, a partir de suas origens em formas de funcionamento psicológico elementar ou básico, comuns em outras espécies que nos antecedem na escala fi logenética. Concluíram que os motivos de ordem biológica e a aprendizagem derivada da experiência individual (por condicionamentos) os quais explicam a evolução do comportamento dos demais animais, não são apropriados para explicar a evolução da conduta humana.

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Unidade 2

Além disso, também defendem que, enquanto nos animais a maturação do cérebro é defi nida de acordo com um cronograma biológico, nos seres humanos o amadurecimento cerebral depende de uma interação complexa e recíproca entre a herança genética e as condições concretas de vida em que o homem se desenvolve. Isso signifi ca que o amadurecimento orgânico do cérebro é condição necessária, mas não sufi ciente, para que o desenvolvimento psicológico ocorra. São os fatores de ordem cultural, isto é, a apropriação de nossa herança simbólica (constituída de signos, signifi cados e sentidos), por meio das diferentes formas de educação, que determinam a formação humana em sua totalidade.

Ao longo do estudo dessa unidade, você compreenderá que, para a Psicologia Histórico-Cultural, os Processos Psicológicos qualitativamente Superiores (ou avançados) desenvolvem-se a partir das transformações que os homens empreendem sobre o meio material, por meio do desenvolvimento de atividades coletivas, com o objetivo de satisfação de suas necessidades e interesses. E, ao transformarem a natureza e o contexto social, transformam-se a si mesmos, tornando-se sujeitos de sua história.

Portanto, para se ir às origens do desenvolvimento dos processos psicológicos qualitativamente superiores, deve-se necessariamente partir de uma compreensão do homem na relação com sua história, e estabelecer como premissa que a consciência não se constitui de forma isolada, mas vinculada com a produção da vida material, nas relações sociais e na relação com o meio.

Sucesso em seu estudo!

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SEÇÃO 1 - História da Psicologia Histórico-Cultural

Tudo começa com o materialismo histórico-dialético

A Psicologia Histórico-Cultural tem como base epistemológica o materialismo histórico-dialético de Marx e Engels.

Entre as profundas análises que Marx realizou sobre o gênero humano, e que infl uenciaram a Psicologia Histórico-Cultural, destaca-se a atividade humana, em especial, o trabalho, como categorial central. Para Marx, o gênero humano se desenvolve enquanto tal, ao longo da história, pelas transformações que realiza sobre a natureza, para satisfazer suas necessidades de sobrevivência.

Ainda segundo Marx, pela necessidade de submeter a natureza à satisfação de suas necessidades, o ser

humano se uniu em atividades coletivas, criou instrumentos materiais para auxiliar nesse processo de transformação (como varas, machados, facas, rodas), e teve que aprender a se comunicar com os outros seres da espécie, o que promoveu o desenvolvimento da linguagem humana.

Marx observa que, no desenvolvimento do trabalho humano mediado por instrumentos materiais e pela linguagem, ao longo da história, ocorreu um duplo processo de transformação: o homem transformou a natureza e a si mesmo.

Este autor sustenta que, como produto deste processo de dupla transformação ocorrido ao longo de milhões de anos de história, o ser humano foi distanciando-se cada vez mais de outros animais, a tal ponto de desenvolver uma faculdade tipicamente humana, a consciência.

Por meio do trabalho, primeira atividade coletiva humana com o objetivo de transformar a natureza, o homem tornou-se sujeito de sua história, ao mesmo tempo que constituiu a si mesmo como sujeito humano.

Figura: EvolucionismoFonte: http://www.avph.hpg.ig.com.br/

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Unidade 2

De forma introdutória, pode-se afi rmar que as principais infl uências do materialismo histórico dialético na Psicologia Histórico-Cultural são:

a atividade humana como categoria central de análise para o entendimento do desenvolvimento do psiquismo humano;

a mediação realizada por instrumentos materiais (objetos concretos) e simbólicos (signos; significados e linguagem) como determinantes do desenvolvimento da consciência humana;

o método dialético como explicativo da realidade e também da gênese do psiquismo humano. Este deve ser entendido como uma unidade que se forma a partir de uma dinâmica de constantes superações, e que avança para patamares qualitativamente superiores.

Ao longo da unidade, esses aspectos serão esclarecidos detalhadamente para você.

Preparado(a) para aprofundar seus estudos?

A origem da Psicologia Histórico-Cultural

A Psicologia Histórico-Cultural teve sua origem na pós-revolução socialista (que ocorreu em outubro de 1917). Esta foi alicerçada em princípios que pretendiam o desenvolvimento de uma nova organização social na Rússia, o sistema socialista, princípios esses que tinham como base intelectual especialmente os estudos de Marx e Engels, o materialismo histórico-dialético.

Para falar da origem da Psicologia Histórico-Cultural, é necessário situar o desenvolvimento da Psicologia como ciência no mundo e, particularmente, na Rússia, no início do século XX.

O início do século XX constituiu um período de pleno desenvolvimento da Psicologia como ciência e esteve

Figura: Karl MarxFonte: www.culturabrasil.pro.br

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marcado por profundos embates entre os pesquisadores que adotavam diferentes concepções teóricas. Na Europa, começam a surgir novas escolas psicológicas, como a Psicanálise, a Gestalt, que adotavam a consciência subjetiva e idealista como objeto de estudo. Contrapondo-se a esta tendência, surge, nos EUA, uma corrente radical em Psicologia, que entendia serem os fatores externos observáveis (ambientais) o objeto desta ciência. Foi denominada de psicologia objetivista.

A seguir, veja mais detalhadamente em que consiste cada uma dessas correntes, pois elas defendem pontos de vista diametralmente opostos em relação ao modo como se deve abordar o objeto de estudo da Psicologia.

a) Psicologia introspectiva (ou subjetivista -Idealista)

Esta corrente entende que a “consciência” humana possui uma base ideal, como se a mente tivesse a capacidade inata de gerar signos, signifi cados e símbolos. Investiga a consciência a partir de uma análise mentalista, abstrata e generalizada, isto é, pesquisa a consciência pela própria consciência. Para isto, utiliza-se de métodos introspectivos, ou seja, métodos de pesquisa que partem do relato do próprio sujeito de pesquisa, acerca de seu estado de consciência, seus pensamentos ou suas percepções.

Como exemplos, podem ser citadas as teorias como a Psicanálise de Freud e a Psicologia Analítica de Jung, as quais defendem ser a consciência uma instância psicológica estruturada por imagens e símbolos que não possuem necessariamente uma relação lógica ou temporal com o contexto em que o indivíduo está inserido, mas que podem estar relacionados ao passado, ou, até mesmo, expressar fenômenos futuros, manifestos pela intuição individual.

b) Psicologia objetivista

Seus adeptos negam o estudo da consciência humana. Consideram como fenômenos psicológicos somente aqueles que podem ser mensurados, observados e descritos por meio sistemático, sem a interferência do sujeito e do pesquisador.

Estudam o psiquismo humano como se ele pudesse ser medido e reduzido a pequenas propriedades independentes e estudado como os fenômenos das ciências naturais, como a física de

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Psicologia da Educação II

Unidade 2

cores e formas. Adotam como método de pesquisa o método experimental. Defendem que os fatores determinantes do desenvolvimento humano são aqueles externos ao indivíduo (o ambiente externo).

Um exemplo desta concepção é verifi cado no Behaviorismo, desenvolvido nos EUA, o qual tem como objeto de investigação o comportamento (observável) humano e que é estudado por meio da análise experimental do comportamento.

Nesse período, na Rússia, a Psicologia ofi cial adotada para nortear a pesquisa na área era orientada, fundamentalmente, pela concepção idealista, embora houvesse alguns laboratórios experimentais de insignifi cante produção teórica.

Essas duas posturas epistemológicas irreconciliáveis estavam produzindo uma fragmentação na Psicologia, fato que leva Vygotsky a propor um método conciliador, de modo que a Psicologia se desenvolvesse, verdadeiramente, como ciência. Entretanto essa proposição é produto de um contexto histórico específi co da Rússia pós-revolucionária, como você verá em continuidade.

Você entendeu o que é Psicologia subjetivista e objetivista? Então, antes de avançar em seu estudo, identifi que as principais diferenças entre elas.

Na época em que Vygotsky iniciava seus estudos no campo da Psicologia, a Revolução Russa de 1917 impunha novas demandas às diferentes áreas de conhecimentos naquele país. As ciências humanas, em especial a Psicologia, precisariam passar por uma transformação radical em todos os sentidos e estar condizentes

O Behaviorismo, a Psicanálise e a Psicologia Analítica foram tratados aqui de forma sintética, com o simples objetivo de exemplifi cações e sem a pretensão de explicar seus fundamentos teóricos, os quais são muito mais complexos e profundos do que o exposto.

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com as matrizes teóricas que fundamentaram a revolução: praticamente, tratava-se de desenvolver uma nova psicologia em substituição à velha, no menor prazo possível.

A primeira exigência para esta ciência, que advinha da própria condição do país, o qual se encontrava destruído pela guerra, era a de construir uma nova psicologia, que se dedicasse a analisar os problemas práticos encontrados naquela sociedade.

Para tal, criou-se um novo departamento, o dos problemas aplicados, no Instituto de Psicologia da Universidade de Moscou, o qual estava sob a direção de um defensor do idealismo – Chelpanov.

Porém, para um outro grupo de psicólogos, o qual tinha em Kornilov seu principal representante, a tarefa essencial para a nova Psicologia era elaborar uma nova teoria que substituísse a psicologia idealista, até então cultivada no país. Para eles, a nova Psicologia deveria partir do materialismo histórico e dialético até converter-se em uma Psicologia marxista. Para este grupo, o estudo da consciência era considerado subjetivo demais e, portanto, deveria ceder lugar para o estudo de fenômenos mais concretos, por meio dos métodos experimentais.

Após vários confl itos entre esses dois grupos de psicólogos – idealistas de um lado e defensores da criação da psicologia marxista, de outro -- este último acabou prevalecendo, e Kornilov assume a direção do Instituto de Psicologia, no lugar de Chelpanov.

Desde este evento, em meados de 1924, houve uma intensa reorganização do Instituto de Psicologia, a partir da qual foram incorporados novos pesquisadores. Apesar da diversidade das posições que estes colaboradores adotavam, havia uma tendência que os direcionava: o entendimento de que a principal tarefa da Psicologia era criar uma psicologia marxista.

Nessa época, após escutar uma apresentação científi ca de Vygostsky (sobre o método de investigação refl exológica em psicologia), Kornilov o convida para trabalhar no Instituto de Psicologia. Este aceita, muda-se para Moscou e assume a função de pesquisador e professor do Instituto de Psicologia.

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Unidade 2

Como resultado de suas primeiras pesquisas, Vygostsky reafi rma que o estudo da consciência deve ocupar um lugar central na Psicologia.

E é a partir desta constatação que Vygostsky propõe seu método, o qual você conhecerá na seqüência.

SEÇÃO 2 - O método de Vygotsky

[...] todas as funções superiores vêm constituindo-se não na biologia, não na história da pura fi logênese, já que o próprio mecanismo, que se encontra na base das funções psíquicas superiores, constitui relações interiorizadas de ordem social, as quais são a base da estrutura social da personalidade. Sua composicão, a estrutura genética, o modo de acão, numa palavra, toda sua natureza, é social; inclusive, ao converter-se em processo psíquico, permanece sendo quase social. O homem, a sós consigo mesmo, segue funcionando em comunhão. (VYGOTSKY, 1987, p. 162).

Nas obras “A consciência como problema da Psicologia do comportamento”(publicada em 1925) e o “O signifi cado da crise da Psicologia”(publicada em 1926), Vygostsky defende que a consciência é o objeto de estudo da Psicologia e que esta dever ser estudada como uma realidade psicológica concreta. Demonstra como as abordagens idealistas e objetivistas se equivocaram no método de estudo do psiquismo humano, gerando cisões na própria psicologia como ciência.

Vygotsky defende que ambos os métodos, objetivista e subjetivista, eram insufi cientes para explicar a dinâmica do psiquismo humano de forma científi ca: O método objetivista negava os fatores internos (a consciência); e o subjetivista estudava a consciência pela própria consciência, isto é, tendo ela própria como princípio explicativo.

Figura: VygotskyFonte: www.igs.net/~cmorris/vygotsky_image.jpg

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Segundo os pesquisadores russos Davydov e Radzikhovshii (1988, apud SERRÃO, 2006, p. 98), Vygotsky considerava que “pode-se estudar a essência da consciência somente quando a consciência aparecer como uma função. É impossível estudar a essência da consciência se a própria consciência surge como um princípio explicativo”.

Assim, segundo um outro pesquisador russo, Alex Kozulin (2002, apud SERRÃO, p. 98), Vygotski sugere que o princípio explicativo geral da consciência deveria ser a atividade humana, já que aquele entende que a consciência humana se forma como uma função necessária para o desenvolvimento das atividades coletivas de trabalho, com o objetivo de transformar a natureza e sobreviver.

Portanto, ao falar da estruturação de uma psicologia marxista, Vygostsky defende que seu método deve estar fundamentado nas teses gerais do materialismo dialético e isso deveria começar a elaborar-se a partir da análise psicológica da atividade prática, a atividade laboral do Homem, já que é a partir dessa que acontecem as unidades iniciais da vida psíquica.

De acordo com Serrão (2006), especialmente em “Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores”, escrito entre 1930 e 1931, Vygotsky, ao recuperar as diferentes abordagens sobre a “conduta humana”, tece os princípios do que denominou de “novo método”.

Em outras palavras, Vygotsky estuda as várias formas de conduta, que quase não eram mais encontradas no homem de sua época, mas que fi zeram parte da conduta humana em tempos mais remotos e primitivos do desenvolvimento cultural do Homem. Desse modo, norteando-se pelos princípios do materialismo histórico-dialético, Vygotsky vai buscar na apreensão do movimento histórico da humanidade a origem do comportamento contemporâneo do ser humano.

Por isso, diz-se que Vygotsky busca explicar a conduta humana por meio da história da conduta, busca explicar os processos psicológicos superiores por meio da história desses processos, bem como busca explicar a consciência humana por meio da história da consciência.

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Unidade 2

E, ao aprofundar suas análises, conclui que a conduta instrumental material humana, isto é, a capacidade de operar com instrumentos mediadores materiais externos, ao longo da história, em atividades coletivas, oferece a base concreta para a capacidade humana de operar com os instrumentos psicológicos internos, os signos.

Para o autor, há uma analogia entre o uso dos signos e o uso dos instrumentos em atividades de trabalho. Ambos assumem um papel fundamental na conduta adaptativa humana, desempenhando uma função mediatizadora na atividade transformadora do homem. De acordo com Serrão (2006), é esta função mediatizadora que o instrumento assume na atividade humana material externa, a qual permite estabelecer uma analogia com o signo, em sua função na “atividade mental interna” do ser humano.

A relação de interdependência entre esses dois conceitos levou Vygotsky a concebê-los como conceitos subordinados a um outro conceito de extensão mais ampla: o conceito de atividade mediatizadora.

Neste momento em que se está falando de atividade mediatizadora, cabe uma pergunta: você entendeu o que é mediação?

Veja, em seguida, uma defi nição bem sintética, para facilitar ainda mais sua compreensão:

a mediação compreende o processo pelo qual o homem insere um elemento intermediário nas relações que estabelece com o meio material (instrumentos materiais) e social (signos), sendo que esse elemento transforma a base original em uma outra, de ordem qualitativamente superior, e, por seu valor instrumental, continua tendo uma existência própria após aquilo que foi transformado, não sendo consumido no processo de transformação.

Vygotsky, apesar de apontar para analogia entre o instrumento e o signo (instrumentos externos e internos), também elucida as suas diferenças fundamentais, afi rmando que o movimento de ambos assume direções opostas na atividade mediatizadora.

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Instrumento Signo

O instrumento está orientado ao meio externo. Sua utilização encontra-se vinculada à alteração dos objetos externos e ao controle dos processos da natureza. O homem utiliza o mesmo em sua interação com a natureza e o dirige ao exterior, ao próprio objeto de sua atividade. Como exemplos podem ser citados: a utilização de um machado para cortar uma árvore; a utilização de uma caneta para escrever; a utilização de um telefone celular para falar com outra pessoa. Todos eles funcionam como instrumentos materiais.

Já o signo assume um sentido contrário, está orientado para o próprio sujeito, dirigindo-se ao controle de ações psicológicas, quer seja do próprio sujeito, ou de outros sujeitos com os quais se relaciona. Orienta a própria atividade interna, agindo como veículo dirigido ao domínio da conduta humana. Como exemplo, podem ser citados os signos que representam positivo; negativo; feminino; masculino; o alfabeto; e, especialmente, a linguagem, que constitui o mais amplo sistema simbólico existente.

Acompanhe um outro exemplo para esclarecer ainda mais o que é instrumento material e signo:

Quando você utiliza um computador para elaborar um texto, você está utilizando um equipamento (a máquina) que funciona como um instrumento material, o qual lhe permite alterar um objeto externo, que é o documento que você está escrevendo (plano material). Ao mesmo tempo, as letras e palavras que compõem o documento, com seus respectivos signifi cados, funcionam como signos, pois se referem (e interferem) ao seu pensamento e ao da pessoa que o receberá.

Por meio da atividade mediatizadora, pode-se explicar a formação das funções psíquicas superiores. Assim, da mesma forma que a utilização de instrumentos modifi cou a atividade

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natural dos órgãos humanos (o biológico humano se transforma pela interação com o social), a utilização de meios auxiliares (instrumentos e signos) no desenvolvimento de atividades mediatizadas reestrutura em sua gênese todas as operações psíquicas. As funções psicológicas elementares se reequipam em funções psicológicas qualitativamente superiores ou conduta superior.

Verifi que os conceitos de funções psicológicas elementares e superiores:

Funções psicológicas superiores (ou avançadas)

São aquelas que se desenvolveram pela mediação cultural, os signos, e se caracterizam por ter a interferência da consciência e da vontade humanas. São funções tipicamente humanas. No processo de desenvolvimento (fi lo e ontogenético) humano, as funções psicológicas elementares sofrem as interferências dos mediadores culturais e se reequipam em superiores.

Neste caso, citam-se as funções tais como: o pensamento conceitual, a memorização intencional, a atenção voluntária, a imaginação, a linguagem racional, etc.

Funções psicológicas elementares

São aquelas naturalmente adquiridas pela espécie. Seu desenvolvimento está ligado ao amadurecimento do sistema nervoso central em interação com as experiências vividas desde o nascimento. Estão muito mais próximas dos determinismos biológicos e não se apóiam em mediadores culturais.

Neste caso, citam-se as funções tais como a memória automática, a atenção involuntária, a comunicação emocional e o pensamento prático. Além disso, essas funções estão presentes em alguns outros animais, especialmente nos mamíferos.

Atenção!

As funções psicológicas estão em processo, num movimento constante de transformação, e, por isso, também denominadas de processos elementares e superiores.

O desenvolvimento das funções psicológicas (ou processos psicológicos) ocorre de forma integrada, sendo que o desenvolvimento de cada uma delas possibilita e impulsiona a formação das outras.

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A atividade mediatizadora é a condição da produção da própria existência do homem, uma vez que viabiliza a satisfação de suas necessidades como gênero humano e, por conseguinte, propicia a produção de cultura, expressa em todos os artefatos simbólicos das sociedades (linguagem, crenças, valores, rituais, normas). Neste sentido, é no âmbito sociocultural que está a origem do desenvolvimento humano, principalmente a origem do processo de formação das funções psíquicas superiores.

Esse processo é possível, porque ocorre uma conversão do sistema de regulação externa dos instrumentos, em meios de auto-regulação, fato que muda a conduta geral do sujeito, pois permite que ele passe a controlar suas ações e seu comportamento.

Desse modo, torna-se evidente a importância da atividade mediatizadora e a atuação dos signos, como instrumentos psicológicos, que funcionam como intermediadores culturais, no desenvolvimento das funções psíquicas superiores, porque o homem está em diálogo com a cultura, que é produto e processo da sua constituição como ser humano. (SERRÃO, 2006).

Segundo Davydov e Zinchenko (apud SERRÃO, 2006, p.103), “a incorporação de signos na estrutura de uma função mental (mediação pelos signos) vincula essa função à cultura”.

Assim, prosseguem os autores, “para Vygotsky, a determinação da consciência individual segue este esquema: atividade social externa — cultura-signos— atividade individual — consciência”. (Vygostsky, 2001, p.163 apud SERRÃO, 2006, p.104).

Obs.: traços colocados por esta autora.

Ou seja, Vygotsky afi rma que todas as funções psicológicas superiores se constituem pela inter-relação de dois planos: primeiro, no plano social, como categoria interpsíquica; depois, no plano subjetivo, como categoria intrapsíquica. A vertente individual da consciência se constrói, como derivada e secundária, sobre a base do social.

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Antes que você avance para a próxima seção, responda:

Quais são os principais aspectos defi nidores do método de Vygotsky? Como você descreve o método deste autor?

SEÇÃO 3 - O Método de Leontiev

Leontiev foi sucessor de Vygostsky e adota suas premissas metodológicas, com o objetivo de aprofundar o estudo dos componentes estruturais da atividade como categoria central da psicologia e a relação destes com o desenvolvimento da consciência humana.

A ênfase dos estudos psicológicos de Leontiev encontra-se, portanto, na atividade humana, que, na compreensão do autor, se refere à atuação do ser humano, orientada para determinados fi ns, mediada por instrumentos e voltada a objetos que promovem a satisfação de necessidades.

A partir de suas pesquisas sobre a fi logênese da consciência, Leontiev enfatiza que a atividade instrumental no homem, diferentemente daquela realizada pelos animais, assume um caráter de processo social e é realizada coletivamente.

Verifi que um exemplo:

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Um exemplo clássico de atividade instrumental no homem é a caçada. Trata-se de uma ação coletiva mobilizada pela necessidade de um grupo de sujeitos que se organiza em ações individuais e coletivas com o objetivo de alcançar um produto – a caça – a qual, por sua vez, será objeto de consumo da coletividade envolvida na atividade.

Para este autor, assumem características essencialmente humanas as ações seqüenciadas e executadas pelos sujeitos em atividade, à medida que são planejadas e executadas coletivamente, superando a concepção instintiva própria dos animais. Na execução das ações, o homem faz uso de instrumentos que possibilitam a mudança de qualidade do próprio trabalho que, por sua vez, dá origem à forma humana de refl exo (no sentido de refl exão) da realidade, ou seja, a consciência. Pode-se abstrair desta compreensão que a consciência humana é o refl exo subjetivo da realidade objetiva.

Verifi que um outro exemplo:

Na atividade de Ensino, o professor participa de um planejamento que envolve a coletividade dos educadores e, depois disso, desenvolve uma série de ações em sala de aula, com o objetivo de promover a aprendizagem dos estudantes. Para isso, utiliza-se de instrumentos como seu Plano de Ensino, seu diário de classe, seus registros diários, o que lhe permite a refl exão sobre sua atuação e sobre o processo de aprendizagem dos alunos. Neste processo, ele atua, de forma consciente, como educador.

Segundo Leontiev, a atividade humana não é meramente um encadeamento de reações, mas um sistema que possui estrutura, transformações internas e desenvolvimento próprios.

Você vai compreender a estrutura e as transformações constituintes da atividade a partir de agora. Permaneça atento(a)!

De acordo com Leontiev, a estrutura da atividade está organizada da seguinte forma: toda atividade humana pressupõe a existência

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de um sujeito que atua sobre um objeto e é impulsionada por motivos para a realização de um objetivo. Movida pelos objetivos, a atividade é sempre orientada para algo ou alguém, como um movimento resultante das necessidades (ou interesses) internas e externas dos sujeitos.

Explicando:

Para Leontiev, toda a atividade humana, origina-se de necessidades materiais (concretas) e ideais (abstratas) impostas ao ser humano em sua existência. Isto confere à necessidade humana o papel de constituir a condição primeira da atividade. No entanto é no objeto que se encontra a determinação e direção da atividade, isto é, a orientação da atividade é defi nida pelo objeto que satisfaz a necessidade percebida.

O objeto da atividade são todos aqueles elementos transformados ao longo do desenvolvimento da atividade, para que sejam atingidos os objetivos.

Por exemplo: numa atividade de cozinhar, a necessidade é dada pela fome; o objeto da atividade é o alimento que está sendo cozido; e os objetivos se referem à possibilidade de alimentar-se (satisfazer a fome).

As necessidades podem ser naturais e/ou superiores. As naturais estão presentes em todas as espécies animais e têm uma base biológica, como aquelas relacionadas a satisfações das necessidades vitais. Como exemplo cita-se a necessidade de se alimentar, de beber água.

Já as superiores são encontradas somente no gênero humano. São as necessidades sociais, como, por exemplo, aquelas relacionadas às trocas sociais dentro de uma coletividade de trabalho. São também as necessidades espirituais, relacionadas à produção de objetos, idéias, a cultura, a arte e o conhecimento, com as suas devidas materializações. (SERRÃO, 2006). Como exemplos de atividades sociais, há o exercício de uma profi ssão, como a desempenhada pelo educador; e a relação que se estabelece entre coletividade de educadores e entre

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eles e os estudantes. Como exemplos de necessidades espirituais, pode-se citar assistir a uma peça de teatro; ou escutar uma boa música.

As necessidades humanas estão conformadas às condições sociohistóricas da produção da existência humana, e se desenvolvem ao longo do tempo e de acordo com as transformações que ocorrem nos contextos sociais.

As necessidades se manifestam em desejos e tendências, mas, segundo Leontiev (1983), é preciso que haja condições determinadas para que estes se concretizem e se direcionem a um fi m, a um objetivo que estimule a pessoa a agir numa direção específi ca, isto é, tem de existir um motivo para que a atividade ocorra.

Segundo Leontiev, o motivo parte do sujeito da atividade, de suas necessidades, impulsionando-o a agir, pois, sem ele, não ocorre o movimento da atividade. O motivo orienta a atividade para que ela seja concretizada em algum objeto. Os motivos podem ser considerados como forças impulsionadoras da atividade externa e interna dos sujeitos, quando estes estão conscientes de suas necessidades e das ações que devem realizar para satisfazê-las.

Portanto, a partir do momento em que as necessidades e as atividades são conscientes para o sujeito da atividade, elas se convertem em motivos que impulsionam o sujeito no sentido de alcançar um objetivo.

Os motivos podem ser individuais e coletivos, naturais e superiores e, neste caso, seguem a mesma lógica das necessidades descrita anteriormente, isto é, podem ser vitais, sociais e espirituais. Como exemplos: motivos vitais ocorrem quando você tem um impulso de buscar algo para alimentar-se; motivos sociais são despertados quando você é mobilizado(a) a desenvolver atividades coletivas que exerçam uma ação transformadora na

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sociedade; motivos espirituais são aqueles que fazem você assistir a uma apresentação de um cantor como Chico Buarque.

Leontiev (1983) demonstra que há diferenças entre os motivos que geram uma mesma ação e que esta pode estar relacionada com atividades também diferentes. Os motivos podem se alterar ao longo do desenvolvimento de atividades, o que possibilita o desenvolvimento de novas atividades.

Para ilustrar esta situação, o autor apresenta como exemplo clássico a situação de duas crianças em início de escolaridade diante da realização de seus deveres escolares: uma primeira criança faz seus deveres porque deseja receber boas notas na escola; e uma outra os faz porque foi permitido que ela brincasse somente após a conclusão dos deveres, portanto o faz porque deseja brincar.

Verifi que o exemplo explicativo no quadro que segue:

Leontiev denomina os motivos relacionados ao primeiro caso como motivos compreensíveis; e, aos do segundo, como motivos efi cazes. E afi rma que os motivos compreensíveis tornam-se motivos efi cazes em certas condições, e é assim que os novos motivos surgem e, por conseguinte, novos tipos de atividade.

No segundo caso, brincar é um motivo efi caz, porque este coincide com o objetivo da “atividade principal” daquela criança, o jogo/brinquedo [a atividade principal da criança antes de iniciar a atividade de estudo é a brincadeira]. Instituída esta condição de realizar os deveres para depois brincar, o motivo pode se alterar, alterando, portanto, sua “atividade”.

A criança poderá comportar-se assim, por algum período de tempo, e, ao realizar os deveres e compreender a relação entre os fatos de ter realizado os deveres, de ter obtido boas notas e de ter recebido reconhecimento das pessoas com as quais interage socialmente, poderá passar a agir de modo a fazer os deveres por si própria, atuando segundo “motivos compreensíveis”.

continua

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Além de identifi car os elementos que estruturam a atividade, Leontiev procurou descrever o aspecto dinâmico da atividade, isto é, o modo como se desenvolve.

Para o autor, toda e qualquer atividade requer, para ser realizada, o desenvolvimento de um conjunto de ações e operações. Para se entender a diferença entre elas, é necessário que você compreenda que a atividade, em suas várias etapas, é aquela que está diretamente ligada ao alcance dos objetivos.

As ações são os procedimentos necessários para desenvolver a atividade; e as operações são os meios ou formas de concretizar os procedimentos, os quais sempre dependem das condições concretas nas quais a atividade é desenvolvida.

Verifi que um exemplo que explica exatamente o que você está fazendo agora: a atividade de estudar!

Para estudar, que é um exemplo de uma atividade tipicamente humana, você precisa desenvolver e encadear uma série de ações físicas e mentais que devem estar vinculadas ao objetivo de aprender (sentar-se, tomar nota, prestar atenção no que lê, procurar estabelecer relações lógicas entre o que está lendo e o que já sabe, etc). Os modos ou meios que você empregar para estudar (as operações) irão variar em função das condições de que você se dispõe: se há mesa no seu quarto, se há cadeira, se já conhece algo sobre o que está lendo, etc. Ou seja, você pode utilizar operações diferentes para desempenhar ações, mas as ações devem estar voltadas para atender ao objetivo da atividade.

As ações desempenhadas pelos sujeitos podem ser externas ou internas e são sempre decorrentes de motivos. Podem ser realizadas de forma individual ou coletiva. Porém vale

Motivos esses que poderão tornar-se efi cazes, porque mobilizarão a criança a desempenhar ações que pertencem, agora, a uma outra “atividade principal”: o estudo. Desse modo, irá realizar os deveres porque ela quer conhecer o conteúdo. (LEONTIEV, 1978, p.70 apud SERRÃO, 2006, p.110).

Compreender isto tem uma importância fundamental para os educadores. Você vai percebê-la, quando estudar as contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a Educação na seção 7 desta unidade e também na unidade 4.

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ressaltar que, mesmo quando realizada individualmente, a dimensão coletiva estará presente, porque as ações e operações são aprendidas a partir das mediações culturais promovidas entre os diferentes sujeitos. Em todas as situações, a dimensão sociocultural confi gura-as. (Isto se refere aos níveis fi lo e ontogenético do desenvolvimento humano). (SERRÃO, 2006).

As atividades externa e interna, possuem uma dinâmica de intercondicionalidade no que se refere ao desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. Ao desenvolver atividades, ações e operações voltadas à transformação de objetos no mundo material externo, os sujeitos estão, ao mesmo tempo, internalizando ações e operações no plano psicológico interno.

As transformações qualitativas externas revertem-se em transformações qualitativas, em termos do desenvolvimento de todos os processos psicológicos superiores humanos e da consciência humana.

Por tudo que foi exposto até este momento, percebe-se que o conceito de atividade desempenhou e continua desempenhando um importante papel como princípio explicativo da formação humana e, por isso, constitui um tema central no desenvolvimento de pesquisas e formulações teóricas na perspectiva histórico-cultural, especialmente pelas seguintes características:

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a) a atividade é analisada por vários níveis, diferenciando-se das ações e operações, elementos que a constituem e caracterizam as especifi cidades de cada atividade desenvolvida pelo indivíduo;

b) a atividade é composta por necessidades, objetivos, motivos, condições, objeto (conteúdo), ações e operações;

c) a atividade ocorre sempre pela mediação, por instrumentos materiais e psicológicos, destacando-se, entre eles, a supremacia dos signos;

d) a atividade proporciona a formação do processo de signifi cação e o compartilhamento de signifi cados;

e) a atividade sempre tem um sentido (pessoal) para os sujeitos que a realizam;

f) a atividade promove o desenvolvimento humano, especialmente a formação dos processos psicológicos superiores;

g) a atividade desenvolve-se pela interação social, pela relação entre adultos e crianças e pela relação entre as próprias crianças;

h) a atividade é eminentemente social e cultural, sendo que seu desenvolvimento promove o processo de interiorização, fundamental para a constituição do ser humano.

(WERTSCH 1979, p.17-31 e DAVIDOV , 1999, apud SERRÃO, 2006 p. 115).

Você fi naliza aqui esta seção, mas, antes de seguir para a próxima, responda:

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Quais são os principais aspectos defi nidores do método de Leontiev? Como você descreve o método deste autor?

SEÇÃO 4 - A função da linguagem no desenvolvimento do pensamento e da consciência humana

Pelo termo linguagem humana entendemos um complexo sistema de códigos que designam objetos, características, ações ou relações; códigos que possuem a função de codifi car e transmitir a informação, introduzi-la em determinados sistemas. A ‘linguagem dos animais, que não possui estas características, é uma ‘quase-linguagem’. [...] Portanto, a linguagem desenvolvida do homem é um sistema de códigos sufi ciente para transmitir qualquer informação, inclusive fora do contexto de uma ação prática. (LURIA, 1987, p. 25).

Para Vygotsky e Luria, a linguagem tem uma estrutura funcional e instrumental que possibilita aos sujeitos interagirem entre si. Assim, a linguagem é considerada como um instrumento social que faz uso de signos para estabelecer a comunicação entre os sujeitos nas atividades que realizam.

Verifi ca-se nas obras de Vygotsky e de Luria, o entendimento de que a linguagem deve ser tida como uma unidade que organiza as ações e operações do homem com a realidade objetiva, ao mesmo tempo que permite ao homem apropriar-se das elaborações históricas e culturais da sociedade, humanizando o próprio homem e, ao mesmo tempo, transformando a sua própria constituição e conduta. (BERNARDES, 2006).

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Deduz-se daí que esta abordagem psicológica entende a linguagem como elemento constitutivo da consciência e, portanto, como elemento presente nas relações do pensamento.

Para a Psicologia Histórico-Cultural, o elo entre o pensamento e a linguagem é o signifi cado social da palavra, ou seja, todas as palavras são códigos gráfi cos que representam algo ou alguém. A comunicação entre os membros de uma cultura é possível, porque eles compartilham desse código e compreendem o seu signifi cado, daí a representação mental e o sistema lingüístico formarem a unidade na palavra.

Como você pode notar, a linguagem tornou-se elemento central na Psicologia Histórico-Cultural, especifi camente no modo como Vygotsky explica o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores.

Você verifi cará como a linguagem se relaciona com o pensamento, transformando-o e transformando-se, tanto na fi logênese como na ontogênese.

Permaneça atento(a)!

A relação entre pensamento e linguagem na fi logênese

Para compreender o desenvolvimento da linguagem e do pensamento na fi logênese, Vygostsky estudou os resultados de uma série de pesquisas sobre o assunto realizadas por cientistas como de Köhler, Borovski e Bühler, entre outros, com animais (como a abelha e as aves), especialmente os antropóides (animais considerados mais próximos ao homem, em termos de desenvolvimento fi logenético).

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Saiba mais

Acompanhe a descrição de alguns desses experimentos, para compreender, mais facilmente, as conclusões:

Os antropóides eram colocados em uma jaula, e um cacho de bananas era colocado numa distância (fora da jaula) em que o corpo do animal não o alcançava. Disponibilizam-se instrumentos, como varas, dentro do campo perceptual (da visão) dos animais.

Foram realizados inúmeros experimentos, inclusive outros desafi os com graus maiores de difi culdade e que requeriam a utilização de instrumentos diferenciados (como caixotes, cordas) ou, até mesmo, a combinação entre eles. Verifi cou que os macacos eram bem sucedidos nessas tarefas. A conclusão, portanto, foi que esses animais são capazes de resolver problemas práticos por meio da utilização de instrumentos, como mediadores. Quando esses experimentos envolviam mais de um animal da mesma espécie, percebeu-se que havia um processo de comunicação primitivo entre eles.

No entanto, ao fazer experimentos que disponibilizavam para eles argila e tinta, isto é, tarefas que pudessem leva-los a exercitar a atividade simbólica, da linguagem, constatou-se que os animais brincavam com o material, mas não realizavam qualquer tipo de representação mental com a tinta. Vale dizer: não eram capazes de utilizar signos, componentes essenciais da linguagem.

De acordo com estes estudos, Vygotsky afi rma que:

Os chimpanzés não conseguem utilizar a fala de forma funcional. Não são capazes de utilizar signos e não possuem ideação (representação mental). Mas, sob certas condições, são capazes de utilizar e criar instrumentos, além de recorrer a alguns artifícios para resolver problemas práticos, desde que esta situação inclua uma situação perfeitamente visível e clara.

Os chimpanzés possuem uma linguagem própria e extremamente rica, e seus signifi cados estão relacionados a situações de prazer ou desprazer, ou que exprimem

Figura: Chimpanzé Fonte: www.futura-sciences.com

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desejo, ressentimento, medo. São reações vocais afetivas, mais ou menos diferenciadas – e até certo ponto, relacionadas, à semelhança de um refl exo condicionado, com os estímulos ligados à alimentação ou outras situações vitais: uma linguagem estritamente emocional. Verifi ca-se, ainda, que a linguagem nos macacos também é um instrumento psicológico que favorece as interações sociais com outros membros da espécie.

Com base nesses resultados de pesquisas, Vygostsky conclui que:

o pensamento e a fala têm raízes genéticas diferenciadas, que seguem trajetórias distintas e independentes entre si;

não se pode identificar relações constantes entre o pensamento e a linguagem, pois assumem características diversas entre elas;

os antropóides apresentam um intelecto um tanto parecido com o do homem, em certos aspectos (o uso embrionário de instrumentos, o que caracteriza a existência de um pensamento prático); e uma linguagem semelhante à do homem (no aspecto fonético da sua fala, sua função de descarga emocional, no rudimento de uma função social), em aspectos totalmente diferentes;

a estreita correspondência entre o pensamento e a fala, característicos do homem, não existe nos antropóides;

pode-se distinguir claramente uma fase pré-lingüística no desenvolvimento do pensamento (pensamento prático vinculado aos processos perceptuais) e uma fase pré-intelectual no desenvolvimento da fala (fala desvinculada dos processos intelectuais).

Você deve estar pensando:

Por que é necessário conhecer a relação entre linguagem e pensamento nos antropóides?

A resposta para você:

Para que você saiba o que distingue os seres humanos de outros animais; o que se refere às funções psicológicas superiores.

Acompanhe na seqüência.

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O desenvolvimento da linguagem e do pensamento na ontogênese

No que se refere ao desenvolvimento do psiquismo dos seres humanos, as relações entre o pensamento e a linguagem se estabelecem de forma mais intrínseca e complexa.

De acordo com Vygotsky (1991), no desenvolvimento ontogenético, o pensamento e a linguagem partem de raízes distintas, semelhantemente à fi logenia. Identifi ca-se, também, no desenvolvimento da linguagem da criança, uma etapa pré-intelectual, assim como uma etapa pré-lingüística no desenvolvimento do pensamento.

Saiba mais

Os processos de pensamento começam a se organizar por meio de soluções de problemas práticos pelo bebê e se iniciam pela organização dos processos de percepção e pela capacidade de produzir imagens (pensamento por imagens).

Nessa fase, a linguagem cumpre uma função essencialmente comunicativa do bebê para com as outras pessoas. Apenas posteriormente, ao longo do desenvolvimento da criança, a linguagem, via interiorização dos signifi cados culturais, determina a organização interna do pensamento e o transforma em pensamento verbal.

As características da fi logenia fazem-se evidentes no desenvolvimento da criança no primeiro ano de vida, quando a linguagem assume função emocional e social e como recurso comunicativo. Por exemplo, o balbucio, o choro, as primeiras risadas.

Após o primeiro ano de vida, verifi ca-se que, progressivamente, o pensamento e a linguagem se interpenetram e coincidem, e o comportamento da criança assume características diferentes, essencialmente humanas. A criança passa de uma fase de domínio difuso do propósito da fala para querer dominar a linguagem. Isto ocorre quando a criança percebe que cada coisa tem seu nome.

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Nessa fase, a criança passa a relacionar cada objeto a uma palavra. Inicialmente, a criança relaciona mecanicamente o objeto ao nome, e, posteriormente, apropria-se do signifi cado social próprio de cada termo.

Conheça o conceito de signifi cado social

De acordo com Luria, o signifi cado da palavra é decorrente do sistema de relações formado objetivamente no processo histórico da própria palavra. Dessa forma, “o ‘signifi cado’ é um sistema estável de generalizações, que se pode encontrar em cada palavra, igualmente para todas as pessoas. Esse sistema pode ter diferente profundidade, diferente grau de generalização [...], mas sempre conserva um ‘núcleo’ permanente, um determinado conjunto de enlaces”. (LURIA, 1987).

A criança começa a expressar uma curiosidade peculiar e ativa pelas palavras, fenômeno que se manifesta em querer conhecer o nome dos objetos por meio de perguntas: O que é isto? O que é aquilo?

Relacionado a este, ocorre também um outro fenômeno: a criança amplia consideravelmente e de maneira muito rápida o seu vocabulário. Ocorre um salto qualitativo signifi cativo, em que a fala começa a servir ao intelecto e os pensamentos começam a ser verbalizados.

A criança, quando vê um objeto novo, pergunta como se chama. Sente a necessidade da palavra e trata ativamente de apropriar-se do signo pertencente a cada objeto, do signo que lhe serve para nomear e comunicar-se. Se na primeira etapa do desenvolvimento a linguagem infantil é [...] afetivo-volitiva no tocante a seu valor psicológico, a partir da segunda etapa, a linguagem entra na fase intelectual de seu desenvolvimento. Pelo que parece, a criança descobre a função simbólica da linguagem. (VYGOTSKI, 2001b, v.2, p. 104).

Neste momento, ela descobriu a função simbólica das palavras e começa a fazer um uso intencional da linguagem. A fala que, nos primeiros meses de vida da criança, tinha um caráter afetivo-

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conativo agora passa para a fase intelectual. Na fase intelectual, a criança compreende a relação entre o signo e o signifi cado. Essa ação mental transcende a simples utilização de idéias e suas associações. A criança passa a fazer uso dos primeiros conceitos, identifi cados como gerais. A palavra assume função signifi cativa para a criança. Mas, para descobrir a linguagem e se apropriar dela, de modo que possa utilizar as palavras e os conceitos de forma adequada ao contexto cultural, a criança tem de pensar. Acentua-se, assim, a função pensamento.

No movimento de identifi cação do signifi cado da palavra, do conceito, estabelece-se uma ação primordial do psiquismo humano: a relação entre o pensamento e linguagem, que se manifesta por meio de signos.

O entrelaçamento existente entre o signo e o signifi cado ocorre por meio do pensamento como característica essencialmente humana.

Saiba mais

A partir do que está sendo exposto, é possível concluir que:

no seu nível de desenvolvimento ontogenético, o pensamento e a fala têm raízes diferentes;

existe no desenvolvimento da fala da criança, um estágio pré- intelectual; e, no desenvolvimento do seu pensamento, um estágio pré-lingüístico;

a certa altura, essas linhas se encontram; conseqüentemente, o pensamento torna-se verbal e a fala, racional.

Constatam-se, no movimento de entrelaçamento entre a linguagem e o pensamento, dois processos de organização com estrutura e função distintas: a linguagem externa e a linguagem interna. A primeira cumpre uma função social, de comunicação com os demais sujeitos; e, a segunda, que se desenvolve posteriormente, assume função de planejamento nas diferentes situações-problema.

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A Psicologia Histórico-Cultural não aceita a proposição de que o pensamento seja simplesmente a linguagem inibida ou não-verbalizada.

Figura: bebê gritandoFonte: www.plorare.blogger.com.br

A análise do processo de transformação da linguagem externa à interna é fundamentada na concepção teórica de que o desenvolvimento das funções psíquicas ocorre, inicialmente, a partir da atividade social e colaborativa, uma atividade interpsíquica, e, posteriormente, torna-se própria da criança, constituindo-se numa atividade intrapsíquica.

Você verifi cará como isto acontece!

A partir da realização de vários experimentos com crianças, Vygostsky constata que ocorre uma transição da fala social (que é externa) até a fase em que a linguagem cumpre a função planejadora (interna). Nesta transição, passa necessariamente por uma fase intermediária, denominada de fala egocêntrica. Acompanhe as características e funções de cada uma delas.

Fala Social

Ao nascer, o primeiro som que o ser humano produz é o choro, que consiste numa resposta refl exa presente em todos os seres da espécie. Nos primeiros meses de vida, o bebê produz sinais vocais que servem para aliviar tensões que se originam no seu organismo: ele grita quando sente dor, fome ou quando se assusta. Por meio de sucessivas interações com os outros, a criança começa a compreender que a combinação de sons que ela produz pode ter um efeito no seu meio social.

Na fase da fala social, a criança se expressa sonoramente para comunicar-se com as pessoas. A linguagem, nos primeiros momentos de vida, cumpre a função de manifestação de emoções e sentimentos, que passa, rapidamente, a cumprir uma função de demonstrar interesses pessoais.

Na fase da fala social, a criança ainda atua na realidade, principalmente pelas suas ações práticas, por meio da manipulação direta dos objetos. Pode-se dizer, portanto, que,

nesta fase, as ações antecedem a fala. A criança age e depois fala, normalmente com intenção de descrever sua ação.

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Por exemplo, ela corre e dá um salto, volta-se para e mãe e diz: Viu? Eu corri bem rápido e pulei bem longe!

O impacto de sua participação ativa no ambiente produzirá novas relações com as pessoas do seu círculo social, o que exigirá uma reorganização do seu comportamento, isto é, as pessoas exigirão vocalizações e condutas cada vez mais organizadas da criança.

Fala egocêntrica

Vygostsky, após ter realizado uma série de experimentos com crianças que tinham a média de idade entre 4 e 5 anos, verifi cou que esta fase é particularmente identifi cada quando a criança é colocada diante de situações-problema.

Na realização destas tarefas, percebeu-se que a criança expressa verbalmente, em voz audível, as ações e operações que segue executando com os objetos concretos os quais estão diante dela (instrumentos). Ela começa a falar consigo própria, para organizar o seu plano de ações -- o que está fazendo nesse momento, o que vai fazer depois--, além de estabelecer relações entre os diferentes objetos que estão disponibilizados, o que já envolve a capacidade de operar com os signifi cados das palavras.

A criança fala com as outras pessoas do ambiente enquanto atua sobre os instrumentos externos para resolver a tarefa, mas começa, ao mesmo tempo, a operar internamente com os signos e signifi cados sociais relacionados à tarefa que desenvolve.

Começa a ocorrer um deslocamento temporal da fala; nesta fase, ela não aparece depois da ação, mas, enquanto a criança age, o que signifi ca uma mudança de sua função do ponto de vista psicológico. É quando ocorre um salto qualitativo no desenvolvimento da criança, já que ela passa a utilizar-se da fala, não mais para orientar o comportamento do outro (pedir ajuda, por exemplo), mas como recurso ativo para a solução do seu problema, ou seja, ela usa a fala para pedir ajuda para si mesma. Veja o exemplo no quadro.

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Enquanto desenha, uma criança pode falar: O que é que eu posso desenhar? Uma pessoa? Um cachorro?... Não, eu não sei desenhar cachorro, só o meu irmão sabe... Já sei, uma casinha! Primeiro eu vou fazer uma casa, depois vou botar uma arvorezinha do lado e um sol no céu, etc.

Como você pode deduzir, tais vocalizações têm o papel orientador da atividade global da criança, na medida em que organiza e direciona suas ações motoras, intelectuais e a mantém motivada a concluir a atividade.

Para Vygostsky, a linguagem vai sendo internalizada e, além de exercer uma função comunicativa (interpessoal), começa a exercer uma função planejadora (intrapessoal). Dito de outra forma, a fala e a ação, na fala egocêntrica, são parte de uma mesma função psicológica complexa, que consiste na resolução de um problema prático.

Temos de dizer que, ao que parece, a linguagem egocêntrica, além de sua função puramente expressiva e de descarga, além do simples acompanhamento da atividade infantil, converte-se com grande facilidade em pensamento, no sentido próprio da palavra, assim dizendo, assume a função de uma operação planejada, ou de resolução das difi culdades que surgem no curso da atividade. (VYGOTSKI, 2001, p. 108).

Na fase posterior, a linguagem externa se converte em linguagem interna. Torna-se possível identifi car mudanças signifi cativas no processo mental em relação à etapa anterior.

Fala interna

A criança começa a dispensar o elemento externo da fala como um recurso para a solução de problemas, porque não existe mais a necessidade de externalizar as tensões ou se comunicar com o outro, para isso. Ela se comunica com ela mesma por meio de um diálogo interno, que lhe permite organizar as suas ações mentalmente. O plano de ação que anteriormente precisava ser verbalizado, agora foi internalizado na função pensamento. Nesse momento do desenvolvimento da criança, o pensamento se transforma em pensamento verbal, e a linguagem, em linguagem racional.

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No processo de transformação da linguagem egocêntrica em linguagem interna, ocorre a redução da vocalização, criando a ilusão de desaparecimento, de fi m de uma forma de linguagem. “Na realidade, tal transformação representa um progresso evolutivo, representa não o fi m, mas o nascimento de uma nova forma de linguagem.” (VYGOTSKI, 2001, apud BERNARDES, 2006).

É o momento em que a linguagem internalizada antecipa as ações do sujeito num plano mental, o que lhe permitirá, paulatinamente, orientar todos os seus processos de decisão na vida cotidiana.

Do ponto de vista do pensamento, pela primeira vez, a criança deixa de agir dentro dos limites de um espaço imediato, do aqui e do agora. Ao compreender e utilizar a função planejadora da linguagem, está inaugurada a possibilidade de engajar-se em operações dentro de uma perspectiva temporal, pois se abre a perspectiva de lidar com eventos e circunstâncias que se encontram no passado, no presente e no futuro.

Verifi que um exemplo que, certamente, você já vivenciou:

Lembre-se da última vez em que você passou por uma situação muito agradável com alguém. Ao recordar-se naquela situação, sua memória, atenção e pensamento o(a) orientam a querer reviver o que sentiu. Você passa a ter vontade de rever a pessoa. Daí em diante, você pode pensar na possibilidade de ligar para ela, convidá-la para sair. Mas, para não parecer muito disponível e não fracassar (com experiência no passado), você planeja sua conduta para uma situação futura: Como entrará em contato? Via e-mail ou telefone? O que falará? Quando ligará? Ainda: como reagirá se a pessoa não lhe der o retorno esperado?

Nesse episódio cotidiano, você pode perceber todos os seus processos psicológicos da esfera cognitiva, afetiva e conativa sendo mediados pela linguagem e funcionando com base em experiências passadas, para planejar o seu comportamento futuro.

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Vygotsky e Luria defendem que a linguagem interna não é uma mera reprodução ou duplicação da linguagem externa para o plano interno. Ela não está baseada nas mesmas leis léxicas, sintáticas e semânticas da linguagem externa.

A linguagem interior é regulada por uma estrutura que se baseia em formas reduzidas e abreviadas e que se resume em indicar as ações que são necessárias e em quais direções elas devem ser tomadas. (Luria, 2001, p. 112).

Evidências desta condensação são verifi cadas por meio de pesquisas que demonstram que, nos atos intelectuais, as tomadas de decisões e as escolhas de alternativas corretas transcorrem muito mais rapidamente do que se todas as palavras fossem ditas de forma inteira, num plano verbal. Em curtos espaços de tempo, seria impossível dizer para si mesmo uma frase inteira e, menos ainda, um raciocínio.

Verifi ca-se, assim, que o pensamento vai constituindo-se como processo psicológico superior a partir de leis próprias, o que lhe confere uma unidade particular e funções específi cas, em relação à linguagem.

No entanto é possível afi rmar que as transformações que ocorrem na linguagem promovem o desenvolvimento do pensamento, permitindo que este avance de um nível perceptual e prático, para um funcionamento de ordem superior, relacionado à capacidade humana de estabelecer relações entre os objetos e situações, operar com raciocínios complexos e abstratos, realizar tarefas, resolver problemas e, portanto, refl etir e transformar a realidade social.

Referindo-se à função da linguagem na regulação da conduta humana, Luria, ao reportar-se aos experimentos realizados por Vygotsky, afi rma que:

com a aparição da linguagem interior surge a ação voluntária complexa como sistema de auto-regulação, que se realiza com a ajuda da própria linguagem da criança, no início exteriorizada e logo interiorizada. (LURIA, 1987, p. 111).

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Considerando a conduta integral dos sujeitos, a linguagem funciona como a via de integração entre os processos psicológicos cognitivos, afetivos e conativos, possibilitando a inter-relação entre as formas humanas de pensar, de sentir e de agir. Isto porque é por meio da representação mental e do diálogo interno que os sujeitos humanos se tornam conscientes do que está ocorrendo com eles próprios, nos momentos em que estão desempenhando atividades sociais.

Dito de outra forma, a linguagem, uma vez apropriada pelo sujeito, passa a mediar todas as demais funções psicológicas, elevando-as para um patamar superior. Assim, a memória, a atenção, a sensação e a percepção em nível elementar, tal como podemos observar nos bebês e em alguns animais, transformam-se, nos seres humanos, por intermédio da linguagem, em modos culturais de memorizar, permanecer atento e perceber os objetos do mundo. Por isso a linguagem desempenha um papel determinante na constituição da consciência humana.

Você tinha conhecimento de que nosso pensamento é a linguagem internalizada? O que você achou de interessante nisto?

Antes de avançar para a próxima seção, a qual aprofundará o estudo dos conceitos, registre o que você aprendeu sobre este assunto nas linhas que seguem:

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SEÇÃO 5 - O desenvolvimento dos conceitos espontâneos e dos científi cos

No processo de desenvolvimento da linguagem, os signifi cados, que são abstrações mais gerais, evoluem à medida que os sujeitos se apropriam das elaborações culturais acerca da realidade dos objetos. Esse processo de apropriação cultural caracteriza o desenvolvimento do pensamento no movimento de formação dos conceitos.

Os conceitos representam, num plano subjetivo (mental, interno), a realidade dos objetos que são encontrados no plano objetivo (material, externo). São as representações mentais dos objetos concretos, considerando suas particularidades.

Apropriados ao longo do desenvolvimento das atividades coletivas humanas em que os sujeitos compartilham os conhecimentos acumulados durante sua história; os conceitos são condensados em abstrações. Estas podem ser generalizadas e, também, divididas em categorias, formando a atividade característica do pensamento, que é de estabelecer relações entre as “coisas” e conhecer a realidade.

Os conceitos correspondem à reunião das características essenciais e defi nidoras dos objetos, as quais são selecionadas pelos diversos grupos culturais no processo histórico; e utilizados para a separação das coisas em categorias, bem como para a defi nição da relação existente entre elas.

O pensamento humano, que permite ao homem operar com conceitos, permite, ainda, que os seres humanos estabeleçam uma relação de ordem superior com os objetos da realidade. O conhecimento sobre os objetos e fenômenos, que ocorre no plano mental (pela capacidade de operar com conceitos), possibilita trabalhar com eles de uma maneira refl etida, mediada pela consciência, e, portanto, transcende a mera correspondência (cópia) dos objetos e fenômenos, num plano mental.

A capacidade de operar com conceitos permite que o homem refl ita de forma consciente sobre os objetos e fenômenos da

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realidade, o que é muito mais amplo do que lidar com os objetos em si, porque também permite transformá-los para além de suas condições físicas e concretas, determinadas pelo espaço e tempo. A utilização de conceitos permite a atividade transformadora humana nas mais diversas esferas da realidade.

Vygotsky desenvolveu uma série de estudos sobre o desenvolvimento dos conceitos na ontogênese, por meio de experimentos que verifi cavam as operações mentais realizadas pelas crianças ao longo do seu desenvolvimento. Este autor traz elementos para a compreensão de dois níveis de conceitos: os conceitos espontâneos e os conceitos científi cos.

O desenvolvimento dos conceitos espontâneos

Ao estudar a relação entre linguagem e pensamento na ontogênese, você verifi cou que, à medida que a criança interage com a realidade material e social, desenvolve a capacidade de compreender essa realidade e operar de modo cada vez mais racional. A capacidade da criança de inserir os objetos da realidade em categorias desenvolve-se em diferentes atividades como nas brincadeiras, na escola, ao observar adultos conversando, o que lhe permite utilizar um maior número de palavras e com maior precisão.

O uso de palavras adequadas a cada categoria de objetos ou situações exige da criança a realização de certas abstrações (decompor o objeto em partes, de acordo com suas propriedades, e tirar, mentalmente, aquelas partes que melhor defi nem o objeto) e de generalizações (aplicar essa descoberta de encontrar os elementos defi nidores de um objeto aos demais objetos que apresentam esses mesmos elementos ou propriedades defi nidoras) em sua atividade cotidiana, o que possibilitará a formação dos conceitos.

Inicialmente, a criança forma conceitos espontâneos ou não-científi cos nas interações sociais não-sistematizadas que ocorrem no seu cotidiano, de acordo com a funcionalidade deles. A função dos objetos, seria, portanto, a propriedade que defi ne o objeto, nessa etapa.

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Se você perguntar a uma criança de 3 a 6 anos, por exemplo, o que é uma vassoura, ela responderá: É para varrer. Se lhe perguntar o que é água, ela lhe dirá: É para beber, ou para tomar banho.

Os conceitos espontâneos formam-se, inicialmente, por tentativa e erro, tomando por base semelhanças concretas entre os objetos. Muitas vezes, os atributos eleitos não são os essenciais para que as defi nições conceituais propriamente ditas sejam estabelecidas.

Ao operar com conceitos espontâneos, a criança não demonstra ter consciência do domínio dos conceitos com os quais opera, nem das relações que tais conceitos mantêm entre si. Isso signifi ca que ela pode construir uma frase, utilizando conceitos como água, planeta e poluição, utilizá-la de modo apropriado, sem que consiga defi nir cientifi camente cada um desses conceitos e nem deduzir as relações possíveis entre eles.

Isso acontece, porque as generalizações vão do plano concreto para o abstrato. Isto é, os conceitos espontâneos dependem da experiência prática da criança com os objetos ou situações, vale dizer, formam-se a partir das características físicas percebidas primordialmente pelas vias sensoriais.

As noções de biologia, de universo e emissão de gases na atmosfera não são acessíveis aos órgãos sensoriais: não podemos ver as duas moléculas de hidrogênio e uma de oxigênio (são microscópicas); não conseguimos ver a extensão do universo e seus componentes (são macroscópicos); alguns dos elementos químicos poluentes podem ser invisíveis e inodoros.

Vygotsky (2000) procurou conhecer a trajetória das ações intelectuais envolvidas na formação de conceitos. Para isto, submeteu crianças de diferentes idades a experimentos utilizando palavras sem sentido e, também, utilizando objetos concretos, como blocos, com o objetivo de verifi car como essas crianças relacionariam e agrupariam esses objetos.

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Percebeu que as ações intelectuais envolvidas na formação de conceitos desenvolvem-se num processo que passa por três fases: fase do sincretismo; fase do pensamento por complexos; e de conceitos.

Você conhecerá cada uma delas a partir de agora. Está curioso(a)?

Fase do sincretismo

A criança inicia a formação de conceitos, quando agrupa objetos desiguais, desorganizadamente, num amontoado constituído sem qualquer critério lógico. No sincretismo, a criança estabelece elos entre os objetos a partir de suas impressões subjetivas. Nesta fase, as representações da realidade combinam-se das formas mais variadas e inusitadas, que podem ser, inclusive, determinadas pela proximidade dos objetos em questão. Não há o estabelecimento de relações entre os objetos, e não se verifi ca coerência nas palavras que denominam esse agrupamento.

Por exemplo: a criança pode agrupar uma bola, um quadrado, um retângulo somente porque estão próximos entre si. E, apesar de haver outros elementos iguais a estes disponíveis para ela, somente a proximidade de alguns é que foi usada como critério de agrupamento.

Pensamento por complexos

Na fase de formação de conceito por complexos, a criança utiliza operações mentais. Estas permitem o estabelecimento de alguma relação coerente entre os objetos que agrupa, mas essas relações têm como base características concretas dos objetos, e carecem de lógica, de modo que a escolha da inserção de um objeto num grupo ou noutro apóia-se em critérios pouco sólidos, que podem ser facilmente postos em questionamento por um adulto. O pensamento por complexos costuma resultar de uma síntese precipitada, não precedida de uma análise criteriosa que permita abstrações e generalizações apropriadas.

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Por exemplo: a criança agrupa 3 estrelas, provando que ela já consegue estabelecer relações entre as formas. Mas, inusitadamente, agrupa uma bola azul, porque duas entre as estrelas eram azuis. Neste momento, é utilizado um novo critério de agrupamento (a cor, e não, a forma), o que prova que a criança ainda não consegue conceituar esta categoria e utiliza-se de nomes para este grupo, que podem estar relacionados a qualquer um dos objetos identifi cados.

O pensamento por complexos expressa as primeiras tentativas de a criança organizar e unifi car as impressões desordenadas sobre a realidade a sua volta e a prepara para a etapa seguinte: a etapa da formação dos conceitos propriamente ditos.

Formação de conceitos

Formar um conceito, no sentido psicológico, não é uma tarefa simples. Como já foi mencionado, existem algumas operações mentais complexas como analisar e abstrair, isolar elementos e examiná-los em suas propriedades constituintes, para depois sintetizá-los em suas propriedades essenciais, ou seja, deixando de lado aquelas características que são secundárias, que não precisam estar presentes para defi nir um objeto.

Por exemplo: a cor e o tamanho são características secundárias do conceito de bola.

O agrupamento de objetos com base em um único atributo - no caso da bola, a forma arredondada, por exemplo-, de modo que essa propriedade ou atributo torne-se defi nidora desse agrupamento, permite a formação de conceitos potenciais, que, para Vygotsky, não são ainda considerados verdadeiros conceitos.

A capacidade de utilizar-se de verdadeiros conceitos, quando adquirida, torna-se o principal instrumento do pensamento, e isto ocorre, quando passa a promover, juntamente com as representações, imagens e idéias da realidade, a capacidade do sujeito de compreender e explicar a realidade a sua volta. (VYGOTSKY, 2000, p.98).

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Os conceitos científi cos

As operações mentais envolvidas na apropriação e utilização dos conceitos científi cos são muito mais complexas do que aquelas relacionadas aos conhecimentos espontâneos, sendo que estas últimas oferecem a base psicológica para o desenvolvimento das primeiras, ou seja, a operação com conceitos espontâneos prepara psicologicamente a criança para operar com conceitos científi cos.

O desenvolvimento dos conceitos científi cos depende diretamente da transmissão organizada e sistematizada de conhecimentos, o que geralmente ocorre na escola. A escola é uma instituição social que tem a função de promover a apropriação do conhecimento sociohistórico por meio de atividades de ensino-aprendizagem. Isto deve permitir à criança ampliar a sua capacidade de conhecer e compreender a realidade social e fazê-lo de forma consciente, para poder desenvolver-se e transformar essa realidade de acordo com as novas necessidades sociais que surgem.

Por meio das interações lingüísticas com os educadores, a qual ocorre no processo de apropriação dos conceitos científi cos, a criança vai desenvolvendo a capacidade de pensar sobre o modo como aprende e, aos poucos, vai tomando consciência dos processos psicológicos envolvidos nessa atividade.

Assim, faz uso consciente da atenção (esforça-se para manter-se atenta), da memória (tenta recordar um fato), da linguagem (escolhe as palavras apropriadas para usar) e do pensamento (emprega raciocínios específi cos, como dedução, por exemplo) para compreender a rede de relações envolvidas nos objetos e fenômenos das atividades educativas em que está inserida, o que possibilita, inclusive, defi ni-los verbalmente.

Isto permite um controle deliberado sobre as operações mentais, que envolve um duplo processo de crescimento: impulsiona o desenvolvimento das funções psicológicas (para níveis cada vez mais avançados) e permite um conhecimento cada vez mais ampliado do mundo, pela capacidade de realizar abstrações e generalizações cada vez mais complexas, por parte da criança.

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Sintetizando, operar com conceitos científi cos envolve a capacidade de operar com categorias que não têm uma existência concreta na realidade e, também, estabelecer relações entre elas, exclusivamente num plano mental ou teórico. Envolve a capacidade de operar com conceitos das ciências naturais, tais como atmosfera, átomos, moléculas, prótons, elétrons; e, ainda, com conceitos das ciências sociais como democracia, cidadania, epistemologia, gênero (que não possuem uma correspondência física direta com a realidade). Permite, também, utilizar-se de sistemas teóricos complexos como, por exemplo, as teorias sociológicas de Durkheim, Marx e Weber.

Esta capacidade de operar no plano teórico enseja compreender os fenômenos que ocorrem na realidade a partir de sistemas conceituais explicativos e, portanto, o movimento do pensamento vai do abstrato para o concreto.

Para fi nalizar esta seção, é importante esclarecer que o movimento de apropriação de conceitos pela criança ocorre seguindo as mesmas leis de desenvolvimento de todos os demais processos psicológicos superiores, inclusive da linguagem. Ou seja: eles seguem uma trajetória que vai do plano material (social) externo, para o plano verbal e, posteriormente, para o plano mental interno.

Você já havia pensado na forma como você utiliza os conceitos para entender a realidade? Imagine uma situação em que isto aconteça com você e verifi que se você está utilizando-se de conceitos espontâneos ou científi cos para explicar a realidade e quais operações estão envolvidas nisto.

Registre suas observações:

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Psicologia da Educação II

Unidade 2

SEÇÃO 6 - A relação entre aprendizagem e desenvolvimento

O estudo da relação entre Aprendizagem e Desenvolvimento ocupa um lugar central na Psicologia Histórico-Cultural.

Em oposição ao pensamento de Piaget, que afi rmava que o desenvolvimento de estruturas cognitivas (em grande medida condicionado à maturação biológica) determina a aprendizagem (conforme você já estudou na unidade 1), os autores da Psicologia Histórico-Cultural defendem que são os processos de aprendizagem que promovem o desenvolvimento psicológico.

Isto é: são os fatores de ordem cultural que interferem nos fatores biológicos e possibilitam o desenvolvimento fi lo e ontogenético humanos.

Como exemplo que respalda esta afi rmação, pode-se citar o famoso caso das meninas-lobo. Você conhece?

Saiba mais

Duas irmãs viveram na selva e cresceram na convivência com lobos, sem ter tido contato com outros seres humanos até por volta da fase da adolescência. Quando foram encontradas e trazidas para o convívio humano, percebeu-se que elas:

não haviam desenvolvido a postura ereta;

tinham muita difi culdade de coordenação fi na no momento de uso de instrumentos materiais, como garfos e facas;

haviam desenvolvido uma linguagem primitiva (utilizando-se de sons parecidos com os emitidos pelos lobos) e não apresentavam a capacidade de utilização simbólica da linguagem;

não haviam desenvolvido o pensamento conceitual.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Para os pesquisadores da Psicologia Histórico-Cultural, os estudos da fi logênese e casos como estes, ocorridos na ontogênese, demonstram que as interações sociais, mediadas pelas atividades humanas e pelos signifi cados culturais, são determinantes para o desenvolvimento humano.

Verifi que, no exemplo anterior, como a maturação biológica que ocorreu com essas crianças não foi sufi ciente para desenvolver qualitativamente suas funções psicológicas superiores no mesmo nível do desenvolvimento humano. Estas funções fi caram subdesenvolvidas em um nível elementar, praticamente animal.

Para aprofundar seu conhecimento e sua possibilidade constante de análise sobre a relação entre desenvolvimento e aprendizagem de acordo com a Psicologia Histórico-Cultural, é possível propor defi nições para esses processos, a partir das obras disponíveis. Veja a seguir.

Aprendizagem: é um conjunto complexo de aquisição de experiências, que ocorre no âmbito intrapsicológico (interno ao sujeito), por meio de relações interpsicológicas (entre sujeitos), mediado por instrumentos materiais e simbólicos, determinado pelas condições histórico-culturais, que leva a transformações quantitativas e qualitativas nas atividades internas e externas do sujeito.

Desenvolvimento: é a transformação dos processos psicológicos elementares em processos psicológicos qualitativamente superiores, que ocorre por meio das relações mutuamente constitutivas entre os fatores biológicos e culturais na atividade humana e que geram a re-configuração da forma e do conteúdo dos elementos constitutivos de tais processos e, portanto, da formação humana.

Ao estudar a importância dos fatores culturais no desenvolvimento humano, isto é, as relações entre aprendizagem e desenvolvimento, Vygotsky formula um dos conceitos mais conhecidos de sua teoria e que tem implicações signifi cativas para se pensarem as práticas educacionais: o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. Verifi que.

Lembre -se de todos os demais conceitos estudados nesta unidade ao refletir sobre as definições que seguem. Isto facilitará sua compreensão.

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Unidade 2

A Zona de Desenvolvimento Proximal compreende a faixa entre o Nível de Desenvolvimento Real, nível de funções exigidas nas atividades que as crianças (e os adultos) são capazes de realizar sozinhos, de forma independente e autônoma; e o Nível de Desenvolvimento Potencial, nível de funções nas atividades em que os sujeitos são capazes de realizar com a ajuda ou colaboração de outras pessoas mais capazes.

A Zona de Desenvolvimento Proximal corresponde àquelas funções que estão em processo de desenvolvimento para um patamar superior em termos qualitativos, o que ocorrerá a partir da mediação do outro, pelo oferecimento de dicas, orientações e instruções.

Mediante a internalização pelas crianças (e pelos adultos) das formas de resolução das atividades que eram apresentadas pelo outro e, portanto, do salto qualitativo em termos de capacidades de operar com funções mais complexas não conseguidas antes, a criança (e o adulto) avança em seu desenvolvimento. E o que era nível potencial antes, passa a ser nível real agora, num patamar qualitativamente superior.

Uma criança quando está aprendendo a operação de soma. Ela já sabe identifi car as unidades, mas ainda não possui a capacidade de compreender que uma unidade, quando acrescida de uma outra unidade, soma 2. O professor propõe uma atividade de aprendizagem, na qual simulam um jogo de boliche e questiona quantos peões ela derrubou. Por meio de intensas medições verbais e registros gráfi cos, demonstrando para a criança que ela derrubou o peão da extrema esquerda e aquele da extrema direita, e que isto equivale ao número 2 (e assim sucessivamente), a criança começa a compreender a lógica envolvida no ato de somar.

A operação de soma, que antes estava num nível de desenvolvimento potencial (a criança dependia da ajuda do professor para somar), é internalizada pela criança, que passa a resolvê-la de forma autônoma. Neste momento, esta operação se encontra num nível de desenvolvimento real.

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SEÇÃO 7 - Contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a educação

São infi nitas as contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a Ed ucação. Nesta seção, serão apresentados alguns subsídios teóricos para provocar em você uma postura ativa de pesquisa constante sobre o tema (necessária a qualquer formação em educação).

Os autores da Psicologia Histórico-Cultural defendem que a educação escolar tem o papel de oferecer uma organização sistematizada dos conhecimentos socialmente produzidos e acumulados ao longo da história, para que possa promover a apropriação da experiência cultural, o desenvolvimento da consciência e do pensamento teórico (conceitual) dos estudantes. Isto envolve o desenvolvimento, nestes, de novas formações psicológicas mais complexas e também a superação do pensamento empírico.

Ou seja: para estes autores, a fi nalidade da instituição educacional é, por excelência, o desenvolvimento da atividade de aprendizagem dos estudantes, por meio da formação do pensamento teórico e das interações sociais com os educadores, o que propicia a apropriação da experiência humana elaborada historicamente. Experiência esta que não somente deve ser assimilada, mas compreendida de forma ativa e crítica pelos alunos para que, inclusive, possa ser modifi ca e transformada.

No exercício de sua atribuição de ensinar, cabe aos educadores organizar meios e situações adequadas para a assimilação e re-signifi cação, por parte dos estudantes, dessa experiência histórico-social.

Como um dos pontos centrais desta organização, está a proposição de atividades educativas a serem desenvolvidas coletivamente, de modo a permitir que ações individuais e compartilhadas sejam realizadas pelos estudantes. Ao buscar a resolução das tarefas, cada estudante interage necessariamente com outras pessoas, principalmente pelas manifestações de comunicação dirigidas pelos educadores ou ocorridas entre os próprios estudantes na comparação e avaliação de possibilidades

Além disto, você terá oportunidade de ampliar consideravelmente seu conhecimento sobre o tema ao estudar a Unidade 4 deste livro, que trata das tendências atuais em Psicologia da Educação e consultando as obras indicadas no Saiba Mais das Unidades 2 e 4.

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Unidade 2

de encaminhamento para o desenvolvimento das ações resolutivas das tarefas.

Nesse processo coletivo, ocorrem diversas mediações culturais, necessárias à formação de novas aprendizagens por parte de cada um desses estudantes. Ou seja: por meio do desenvolvimento dessas atividades educativas, cujos objetivos já haviam sido previamente defi nidos pelos educadores, os estudantes mudam qualitivamente a sua forma de pensar e compreender um determinado fenômeno, em relação ao momento em que iniciaram a execução da atividade, transformando-se a si mesmos.

Em suma, é fundamental destacar que a educação tem o papel de formar cidadãos em todas as dimensões que lhes são constitutivas: afetivas, cognitivas e conativas (motivacionais, voltada para o alcance de objetivos), priorizando a formação integral dos sujeitos.

O processo educativo deve ser desenvolvido de forma a criar uma interconectividade entre as aptidões e interesses individuais dos estudantes, bem como as necessidades sociais, com vistas às transformações sociais que envolvam a melhoria da qualidade da vida humana em seus aspectos subjetivos e objetivos.

Para fi nalizar esta unidade, é importante que você conheça um conceito formulado por Vygostsky, desenvolvido especialmente na obra “Fundamentos de Defectologia”, e que possui implicações signifi cativas para se pensar a educação de pessoas consideradas defi cientes: o conceito de compensação social.

Considerando que o cérebro é extremamente plástico e que se modifi ca pelas intervenções sociais, compensação social corresponde ao conjunto de habilidades que as pessoas consideradas defi cientes podem desenvolver a partir das mediações específi cas oferecidas pelas pessoas da cultura e que lhe permitem compensar a defi ciência biológica original.

Verifi que um exemplo:

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Uma pessoa cega não pode utilizar-se da visão para ler, mas ela pode utilizar-se do sistema Braille, que é um código desenvolvido socialmente para ensejar-lhe acesso aos materiais escritos.

Neste exemplo, a pessoa precisa desenvolver habilidades específi cas, isto é, ser ensinada a ler o código Braille, para que possa compensar a defi ciência original (biológica) por meio da compensação social. Neste caso, a mediação social, via criação de um instrumento adequado à necessidade dos cegos, e também as orientações oferecidas para a utilização do código Braille são fundamentais.

Aplicado às práticas pedagógicas, este conceito possibilita compreender as defi ciências de uma forma distinta de preconceitos respaldados em idéias de que as pessoas defi cientes não possuem e não possuirão capacidade para aprender determinados conteúdos. Ao contrário, responsabiliza o sistema educacional a refl etir e criar os instrumentos e estratégias pedagógicas adequadas para promover a aprendizagem das pessoas consideradas defi cientes.

Você termina, neste momento, o estudo desta unidade. Ao acompanhá-la, pôde contextualizar o surgimento e desenvolvimento da Psicologia Histórico-Cultural e compreender os métodos de pesquisa empregados por Vygotsky e Leontiev no desenvolvimento de suas teorias.

Pôde também entender como a estrutura da atividade está relacionada com a constituição da consciência humana e como a linguagem está envolvida com o desenvolvimento da consciência humana.

Além disso, compreendeu a relação entre desenvolvimento e aprendizagem e conheceu as contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a educação.

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Síntese

Para a Psicologia Histórico-Cultural o desenvolvimento sociocultural do indivíduo é o desenvolvimento de um indivíduo histórico, portanto situado na história social humana. Para que ele ocorra, é necessário que o indivíduo se aproprie dos produtos culturais, materiais e intelectuais produzidos pela humanidade. Essa apropriação é, necessariamente, mediada pelos outros e, no caso específi co da criança, pelos adultos, os quais já se apropriaram da cultura.

Esta apropriação é, no caso, equivalente à constituição de si mesmo, a partir dos componentes da cultura. Isto só ocorre, segundo esta teoria, pela progressiva participação da criança (o homem) na trama da complexa rede de relações sociais em que, desde o nascimento, está sendo envolvida. É como integrante dessa rede, matéria de que é feito o tecido social da sociedade, que a criança (o homem) incorpora, por meio do outro, as signifi cações culturais que a tornam um ser humano à semelhança dos outros homens – semelhança que não é mera reprodução das características humanas, mas sua (re)constituição no plano da subjetividade.

Os autores da Psicologia Histórico-Cultural difundem que o desenvolvimento humano e a educação são dois fenômenos inseparáveis. Se aquela diz o que é o ser humano e como ele se constitui, esta é a concretização dessa constituição.

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Atividades de auto-avaliação

Para praticar os conhecimentos apropriados nesta unidade, realize as atividades propostas.

1 ) Considere uma situação de aprendizagem na qual você assume o papel de educador (se você ainda não atua na área, pense numa situação hipotética) e tem a responsabilidade de desenvolver atividades pedagógicas.

a) Quais os critérios que você utilizaria para a escolha da atividade pedagógica a ser desenvolvida com os alunos a partir do que estudou sobre a Psicologia Histórico-Cultural? Descreva - os.

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b) Proponha uma atividade educativa baseada nestes critérios.

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2 ) Pesquise uma atividade de aprendizagem dos estudantes (pode ser pela observação prática do contexto educacional ou por meio da leitura de livros). Analise esta atividade a partir dos elementos componentes da atividade humana, na perspectiva de Leontiev.

Para tanto, descreva e analise os seguintes aspectos:

Sujeitos;

Objetos;

Objetivos;

Motivos;

Ações;

Operações.

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Unidade 2

3) Considerando o que você estudou sobre a relação entre linguagem e pensamento no desenvolvimento humano e sobre o papel da educação, responda à seguinte pergunta:

De que forma os educadores devem priorizar a utilização da linguagem e do pensamento nas interações entre educadores e estudantes e entre eles, no contexto educativo?

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Saiba mais

Aprofunde seus conhecimentos sobre os conteúdos desta unidade, lendo o texto que segue no quadro abaixo e pesquisando as obras listadas adiante.

Saiba Mais sobre Filogênese e Ontogênese, apresentada no Para início de conversa, desta unidade.

continua

Filogênese

História das espécies animais. Defi ne as potencialidades e limitações de uma determinada espécie. No caso da espécie humana, compreende o desenvolvimento do ser humano ao longo da história da humanidade (nível da espécie). Inclusive considerando como as características biológicas desta espécie constituem o fundamento para o seu desenvolvimento psicológico posterior.

Por exemplo: o fato de o homem ser bípede (ter as mãos liberadas), ter uma visão binocular, possuir um cérebro com tamanha plasticidade, são características biológicas que oferecem o fundamento para o nível de desenvolvimento psicológico avançado que ele possui. O homem conseguiu desenvolver o pensamento abstrato pelo nível de abertura cerebral às experiências culturais que possui, mas não consegue voar sem auxílio de artifícios, porque não possui asas. Neste sentido é que a fi logênese determina as potencialidades e limites da espécie.

Ontogênese

Pertinência do sujeito a uma determinada espécie que defi ne um determinado percurso de desenvolvimento, e não, outro. Relaciona-se com a seqüência de desenvolvimento que um sujeito da espécie humana vai passar de bebê até a vida adulta (nível do indivíduo). Por exemplo: o bebê possui formas de comunicação (choro, balbuciou, risos), mas, até desenvolver a linguagem adulta, passará por vários avanços no que se refere à linguagem (construir sílabas, frases, sentenças, operacionalizar os signifi cados culturais, trabalhar com os tempos verbais, etc.).

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Unidade 2

Vygotsky entende que existe um paralelo entre os níveis fi logenético e ontogenético do desenvolvimento, ou seja, estabelece um paralelo entre o desenvolvimento da espécie humana e o desenvolvimento da criança até a vida adulta, concluindo que o desenvolvimento dos processos psicológicos qualitativamente superiores, ao longo da vida da criança, acontece de modo equivalente, mas não similar, ao desenvolvimento das funções mais complexas na espécie humana, que ocorreu ao longo da História.

Não similar, porque, se considerarmos o tempo que o homem levou para desenvolver uma habilidade (por exemplo, comer com auxílio de um instrumento) e os modos culturais de educar as novas gerações que foram sendo desenvolvidos, observaremos diferenças importantes entre o desenvolvimento fi lo e ontogenético.

Pesquise também as seguintes obras:

COLL, César, Palácios, Jesus, Marchesi, Álvaro(org). Desenvolvimento psicológico e educação. Psicologia da Educação Escolar. v.2. Porto Alegre: Artmed, 2004.

COLL, César. org. Psicologia do Ensino. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

COLL, César, Palácios, Jesus, Marchesi, Álvaro(org). Desenvolvimento psicológico e educação. Psicologia Evolutiva. v.1. Porto Alegre: Artmed, 2004.

KOHL DE OLIVEIRA, Marta. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento,um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1993.

______. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978b.

______. Actividad, conciencia y personalidad. Buenos Aires: Ciencias del Hombre, 1978c.

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______. O desenvolvimento do psiquismo. São Paulo: Moraes, [19—].

LURIA, Alexander. Pensamento e linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.

SERRÃO, M. I. B. Estudantes de pedagogia e a “atividade de aprendizagem”do ensino em formação. 2004. 220 f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004.

VIGOTSKI, L. S Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

______. O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

______. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: USP, 1998.

______. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

______. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

VIGOTSKI, L. S., LURIA, A. R., LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone/Edusp, 1988.

______Fundamentos de defectologia. Habana: Editorial Pueblo,1989.

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UNIDADE 3

A Psicogênesede Henri Wallon

Objetivos de aprendizagem

Conhecer as bases fi losófi cas e os elementos que infl uenciaram a construção da Teoria Psicognenética.

Compreender a concepção integradora de desenvolvimento humano proposta por Wallon.

Descrever os estágios de desenvolvimento de acordo com esta teoria.

Compreender as contribuições desta teoria para o desenvolvimento das práticas pedagógicas.

Seções de estudo

Seção 1 História e método

Seção 2 O papel da emoção e da motricidade no desenvolvimento humano

Seção 3 Os estágios do desenvolvimento humano

Seção 4 Contribuições para a educação

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Para início de estudo

Nesta unidade, você terá oportunidade de conhecer uma outra concepção de desenvolvimento humano: a teoria psicogenética proposta por Wallon.

Este autor busca compreender o psiquismo humano, seus mecanismos e relações mútuas a partir de uma perspectiva genética, assim como Piaget e Vygostsky o fi zeram. Portanto, para ele, bem como para os outros dois autores, o estudo do desenvolvimento da criança é a via de acesso por excelência à gênese dos processos psíquicos humanos. Por isso o seu interesse pelo desenvolvimento infantil, já que, nesta fase da vida, localiza-se a formação da maior parte dos processos psíquicos.

Wallon, norteado também pelo materialismo histórico e dialético, aproxima-se mais de Vygotsky do que de Piaget, na medida em que parte de uma perspectiva abrangente e global e enfoca o desenvolvimento nas suas dimensões constituintes, que são os domínios motor, afetivo e cognitivo. Busca explicar como cada um deles, por si mesmo e relacionado aos demais, forma a personalidade dos sujeitos humanos, ao longo de sua vida, levando em consideração o contexto histórico e cultural.

Por outro lado, propõe, assim como Piaget, uma organização do desenvolvimento infantil em estágios, já que estuda a criança nos vários momentos de seu desenvolvimento, mas considera as várias atividades em que ela está inserida e também a qualidade das interações que estabelece com o ambiente social.

Sua teoria é considerada, assim, uma proposta integradora do desenvolvimento, pelo fato de explicar, no processo de desenvolvimento dos sujeitos, de que modo as dimensões motora, afetiva e cognitiva se relacionam entre si e com o ambiente social.

Como Wallon explica os principais desafi os e conquistas psicológicas da criança em cada fase do desenvolvimento, sua teoria oferece contribuições signifi cativas para se pensarem as práticas pedagógicas de forma a potencializar o desenvolvimento integral dos sujeitos.

Preparado(a) para conhecer mais a fundo a Teoria de Wallon?

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Unidade 3

SEÇÃO 1 - História e método

História

Henri Wallon nasce aos 15 de junho de 1879, em Paris, onde viveu toda a sua vida. Esta foi marcada por intensa produção intelectual e participação nos acontecimentos sociais e políticos importantes de sua época. Wallon buscou integrar sua atividade científi ca à ação social transformadora, o que demonstra atitude de coerência e engajamento político.

Antes de se tornar um pesquisador da Psicologia, Wallon estudou Filosofi a e Medicina.

Em 1902, formou-se em Filosofi a (tinha 23 anos) e, a partir deste momento, tornou-se professor no ensino secundário. Na condição de professor, opunha-se aos métodos disciplinares empregados no ensino para controlar os alunos, o que, em sua opinião, gerava desconfi anças na relação entre professores e alunos. Além disso, incentivava os alunos à refl exão sobre as questões sociais e políticas, dentro do contexto da instituição escolar.

Infl uenciado pela tendência médico-fi losófi ca da psicologia francesa e, também, motivado a compreender a organização biológica do homem, cursou medicina (não havia na estrutura universitária da época uma formação específi ca em psicologia), graduando-se em 1908. Durante vários anos, atuou como médico em instituições psiquiátricas, onde se dedicou ao atendimento de crianças com defi ciências de base neurológica e distúrbios de comportamento.

Em 1914, durante a primeira guerra mundial, foi mobilizado como médico do exército, o que o fez atender a pessoas feridas na guerra. Este contato com lesões cerebrais de ex-combatentes o levaria a rever as concepções neurológicas que havia desenvolvido, quando atendia as crianças portadoras de defi ciência, especialmente a relação entre as lesões físicas e seus refl exos nos processos psíquicos. Isto lhe despertou interesse em investigar a relação entre emoção e razão.

Figura: Henri WallonFonte: http://senat.fr

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As pesquisas sobre neurologia e psicopatologia desenvolvidas nestes contextos vão determinar a trajetória de investigação científi ca de Wallon, a qual vai sendo afunilada para a compreensão da psicologia da criança.

Durante os anos de 1920 a 1937, realiza várias conferências sobre o tema. Além disso, funda, em 1925, o laboratório de Psicologia da Criança, destinado à pesquisa e ao atendimento de crianças consideradas “anormais”.

Wallon dedicou-se ao estudo do desenvolvimento infantil, mas procurou fazê-lo de forma que pudesse oferecer subsídios teóricos para a intervenção das práticas educacionais, pois entendia que a escola tinha uma grande responsabilidade em promover o desenvolvimento da criança. Esta atitude conferiu-lhe uma indicação para ocupar o Ministério da Educação Nacional, após a segunda guerra mundial, e para dirigir um movimento com o objetivo de reorganizar a universidade francesa. Wallon assumiu outros cargos políticos, fato que, aliado ao seu trabalho científi co, possibilitou-lhe participar da reforma educacional naquele país, no pós-guerra.

Ao longo de toda a sua trajetória como pesquisador e profi ssional da psicologia, Wallon envolveu-se com grupos que estudavam o materialismo histórico-dialético, tendo ele mesmo se apropriado das teses dessa concepção fi losófi ca, a qual acabou sendo determinante em sua elaboração teórica.

Método

Wallon defende que a principal questão, no estudo do psiquismo humano, é a consciência. Pela infl uência do materialismo histórico-dialético, entende que a consciência deve ser estudada como uma realidade objetiva e concreta, exatamente como concluíra Vygostsky, sem que os dois tivessem qualquer contato científi co nessa época.

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Unidade 3

Wallon propõe que o estudo da consciência deva ser conduzido de tal forma, que permita compreender a relação dialética existente entre as dimensões orgânica e psicológica. Propõe que estudar a consciência envolve entender a relação existente entre razão e emoção e a integração que ocorre entre elas como uma unidade funcional.

Este autor tece críticas também semelhantes àquelas realizadas pelos autores da Psicologia Histórico-Cultural às tendências subjetivistas e objetivistas do estudo da consciência. Contesta essas duas posições teóricas e afi rma que a consciência não pode ser reduzida às explicações orgânicas, tampouco às explicações abstratas e mentalistas. Para Wallon, o próprio orgânico é social, pois a realidade humana é inseparável das condições objetivas da realidade, as quais compõem a realidade social.

Da mesma forma, enfatiza a importância da base material orgânica dos seres humanos em suas pesquisas, pois entende que este é o substrato que vai assegurar condição para a função psíquica desenvolver-se. Afi rma, assim, com os teóricos marxistas, que a dimensão orgânica não é sufi ciente para explicar a formação dos processos psíquicos, pois, em sua concepção, são os fatores de natureza orgânica e os de natureza social que, inter-relacionados, determinam a formação do sujeito, num movimento dialético constante.

Os sujeitos humanos são determinados por um conjunto complexo de fatores, biológicos e sociais, em um contexto que engloba situações internas e externas ao longo de sua historicidade e no qual devem ser consideradas as exigências tanto do organismo quanto da sociedade.

Os processos sociais vão mediatizar o biológico em um complexo processo de subordinação do biológico ao social.

Se necessário, retorne à unidade 2, para recordar quais são elas.

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Até agora, certamente é possível perceber as semelhanças entre o método de Wallon e Vygotsky na busca da superação do dualismo ou reducionismo no estudo da consciência humana, por meio da adoção da base epistemológica do materialismo histórico-dialético. Como você estudou na Unidade 2, a utilização deste método permite resolver, logicamente, as contradições das relações entre o biológico e o social, pois permite entender a formação humana como uma unidade que se produz pela superação dessas contradições e pela dinâmica de um conjunto complexo de fatores que se organizam hierarquicamente.

Wallon sintetiza o seu pensamento marxista numa frase que se tornou bastante conhecida na Psicologia do Desenvolvimento contemporânea: “O ser humano é geneticamente social”, e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar. Aplicado isto à Psicologia Infantil, o estudo da criança, de acordo com o autor, deve ocorrer dentro do seu contexto social, considerando as relações que estabelece com seu ambiente.

Entretanto Wallon consegue sistematizar uma complexa teoria do desenvolvimento infantil, a qual busca explicar o desenvolvimento da pessoa completa ou da personalidade em todas as suas dimensões. Para ele, o desenvolvimento ocorre de forma integrada, pela inter-relação entre os campos funcionais da afetividade, motricidade e inteligência, expressos nas diversas atividades que as crianças desenvolvem em interação com as demais pessoas, com as quais convivem.

Por isto, a abordagem walloniana se caracteriza por ser uma proposta inovadora no campo da Psicologia Infantil, já que permite reformular algumas de suas questões centrais.

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Unidade 3

O que você considerou interessante no método de Wallon?

Registre aqui suas considerações.

SEÇÃO 2 - O papel da emoção e da motricidade no desenvolvimento humano

Wallon atribui uma importância especial às emoções, porque estas são as primeiras manifestações que o bebê empreende no mundo social e que, por conseqüência, promovem as primeiras interações do bebê com as pessoas que o cercam.

A primeira manifestação emocional do bebê é o choro. Ao chorar, o bebê comunica ao meio externo, ainda que de forma refl exa, estados de desconforto em seu corpo, como fome, dor ou frio. Tais manifestações tendem a causar impacto emocional em quem está a sua volta. Assim, imediatamente, o bebe será atendido pelos seus cuidadores, e, neste momento, uma série de interações sociais mais complexas iniciarão.

A criança será atendida em sua necessidade de ser alimentada, por exemplo, mas também será afagada, acariciada, o que lhe proporcionará contatos táteis, visuais, sonoros, sinestésicos com as pessoas que cuidam dela. No momento em que um adulto, geralmente a mãe, atende a criança, o faz de acordo com as regras e costumes socialmente cultivados em sua cultura, introduzindo-a em um mundo de relações e conhecimentos sociais.

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Ao longo deste processo, a criança vai conformando a determinados contextos sociais, suas reações emocionais e motoras (seu tônus, seus movimentos em relação à mãe). Isto é, vai aprendendo a diferenciar-se dos outros e a interagir com os outros, ao se apropriar, à medida que se desenvolve, das formas como as pessoas se relacionam com ela.

Por ser a primeira manifestação do bebê e por ser a condição primeira de interação social é que Wallon atribui um papel especial às emoções e considera que elas são as impulsionadoras iniciais do desenvolvimento infantil, para que avance para as fases posteriores, específi cas da formação humana.

Isto ocorre porque, ao se comunicar emocionalmente, expressando suas necessidades, promovem-se as interações necessárias para que evolua de um estágio de reações que se limitam às necessidades orgânicas vitais, para um estágio de atuação consciente no ambiente social.

Para Wallon, as emoções cumprem o papel de “ponte” entre o orgânico e o social. É que as emoções estão no limiar entre o orgânico e o social, impulsionando o desenvolvimento do plano fi siológico para o psíquico; da sensação subjetiva para a comunicação interpessoal.

Para cada sensação subjetiva de uma emoção básica (por exemplo, o medo, ou o susto), existem manifestações periféricas no organismo humano (eriçar de pêlos, alteração do ritmo cardíaco, dilatação pupilar e sudorese) que podem ser observadas e interpretadas. Dito de outra forma, no início da vida, o bebê comunica seus estados emocionais sem ter consciência disso. O recém-nascido dispõe de um aparato neuropsicológico que lhe permite estabelecer vínculos defi nitivos no caos interno, mas com um ambiente acolhedor e saudável (com o meio social imediato), o qual lhe garante os cuidados necessários à sua sobrevivência nessa fase. A expressão da afetividade é, portanto, vital na concepção deste autor.

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Unidade 3

Verifi ca-se uma distinção em relação à concepção de desenvolvimento cognitivo formulado por Piaget. Se necessário, retome o estudo deste autor, para identifi cá-la.

Partindo-se da perspectiva de Wallon, compreende-se que as emoções permitem à criança interferir no meio ambiente desde os tempos mais remotos de sua vida. Isto, mesmo não tendo ainda desenvolvido um aparato intelectual para fazê-lo. Destaca que a afetividade, expressa nas emoções, antecede o desenvolvimento cognitivo e, mais que isso, o impulsiona.

Para o autor, um desfecho satisfatório da afetividade, ou seja, uma adequada expressão e comunicação afetiva entre a criança e o seu meio social constituem a premissa para que se alcance um grau ideal de estabilidade cognitiva. Nesse sentido, a emoção não está desconectada da cognição. Uma nutre-se da outra para desenvolver-se, ainda que, ao mesmo tempo, sejam aspectos do psiquismo que mantêm uma relação confl ituosa entre si.

Para você entender isso, basta lembrar-se de que, para reagirem racionalmente a uma situação, as pessoas precisam controlar suas emoções impulsivas.

A contradição de opostos, os confl itos e as rupturas são uma marca na teoria do desenvolvimento desse autor. Longe de se desenvolver linearmente ou por acúmulo progressivo de capacidades, a criança, em sua relação ímpar com o meio, sofre alterações qualitativas constantes, que são verdadeiras reformulações do seu modo de ser.

Cada criança infl uencia, de forma singular, o seu meio, bem como sofre infl uências exclusivas e peculiares desse meio. Como resultado dessa interação recíproca, a maturação biológica e as condições ambientais são constantemente atualizadas, transformadas.

Além disso, Wallon pesquisa como as emoções também se expressam no movimento e no tônus do bebê e da criança, e como estas emoções vão sendo “impressas” na musculatura. Defende, portanto, que a emoção e afetividade vão atuar em conjunto com todas as ações humanas e expressando-se, signifi cativamente, na motricidade.

Wallon afi rma que, nos primeiros momentos da vida, a via principal de expressão das emoções é o movimento. Quando o

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bebê sente desconforto e o expressa emocionalmente com sinais de raiva ou protesto, o tônus tende a ser contraído e tenso; e os movimentos, desarticulados e impulsivos. Quando o bebê sente estados de tranqüilidade e prazer, o tônus se torna relaxado; e os movimentos, calmos e harmoniosos. Aos poucos, a mãe compreende e modula (o acalma, o afaga, fala com tom de voz baixo) o comportamento do bebê, o que se refl ete no tônus e no movimento global de seu corpo (incluídas expressões faciais).

Imprime-se assim o que Wallon chamou de “Diálogo Tônico”. Mãe e fi lho entendem-se, comunicam-se efi cientemente, sem que o código lingüístico da cultura esteja incorporado nessa relação.

Com a apropriação da Linguagem, a afetividade encontra, ao longo do desenvolvimento, outros canais de expressão, e a criança já consegue demonstrar sua afetividade por meio das palavras, bem como interpretar com mais precisão o que os demais sentem e pensam.

Verifi ca-se então que, para Wallon, a motricidade e afetividade formam as primeiras bases para o desenvolvimento psicológico da criança, antes mesmo do desenvolvimento cognitivo ocorrer.

Num primeiro momento do desenvolvimento, o bebê atua via uma comunicação primitiva e instintiva; num segundo momento, à medida que vai vivenciando as experiências sociais especialmente por meio das interações lingüísticas, o bebê vai desenvolver a capacidade de abstrair e de pensar o seu aparato cognitivo.

Por meio do estudo de cada estágio de desenvolvimento, você verifi cará como essas três dimensões estão entrelaçadas. Permaneça atento(a)!

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Unidade 3

SEÇÃO 3 - Os estágios de desenvolvimento humano

Como antecipamos na sessão anterior, de acordo com Wallon o desenvolvimento da criança é marcado por contradições e confl itos, resultado da interação entre a maturação biológica e as condições ambientais, o que provoca tensões na sua dinâmica psicológica, ao mesmo tempo que possibilita, também, avanços qualitativos na sua conduta em geral.

Para Wallon, o ritmo por meio do qual se sucedem as etapas do desenvolvimento é descontínuo, marcado por rupturas, retrocessos e avanços, e isto provoca, a cada etapa, profundas mudanças nas etapas anteriores, ao mesmo tempo que prepara para as posteriores.

A passagem dos estágios de desenvolvimento não se dá linearmente, pela simples ampliação de características ou habilidades, mas por reformulações complexas as quais ocorrem nos domínios motores, afetivos e cognitivos, processo gerador de “crises” que afetam a conduta geral da criança.

Cada estágio prepara para uma nova confi guração por meio da criação de novos recursos, os quais se articulam com as atividades que foram apropriadas no estágio anterior. A motricidade da criança vai sendo marcada pela aquisição de novas formas de atividade a serem desenvolvidas no meio externo. Do mesmo modo, ocorrem novas apropriações na esfera afetiva, o que altera signifi cativamente a forma de a criança sentir e expressar sua afetividade, bem como relacionar -se com os demais. Mudanças qualitativas também acontecem na dimensão cognitiva, e isto altera a forma como ela compreende e analisa a realidade externa e atua aí.

Em cada estágio, ocorre a preponderância de aquisições de uma dimensão sobre a outra, isto é, ora os desafi os estão mais centrados em aquisições afetivas, ora em aquisições cognitivas, sendo que cada uma dessas dimensões tem infl uência no desenvolvimento da outra.

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Ou seja, na sucessão de estágios há uma alternância entre as formas de atividades e de interesses da criança, denominada “alternância funcional”, onde cada fase predominante (de dominância afetiva, ou cognitiva) incorpora as conquistas realizadas pela outra fase, construindo-se, reciprocamente, num permanente processo de integração (da personalidade) e diferenciação (do outro).

A cada nova aquisição, a criança, munida das experiências do conjunto de atividades anteriores, sintetiza um novo arranjo, que lhe permite transformar signifi cativamente suas relações com o seu meio.

Porque o desenvolvimento individual resulta do embate entre as características constituintes de um organismo biológico único e da cultura (de condições ambientais concretas, de um momento e um lugar histórico), as rupturas, confl itos, saltos e retrocessos ocorrerão de forma também singular, o que, por conseguinte, dá forma à personalidade, com características idiossincráticas que não se repetem.

Segundo Galvão (1995), os cinco estágios de desenvolvimento do ser humano sucedem-se em fases com predominância afetiva e cognitiva, da forma que você vê a seguir.

Impulsivo-emocional

Ocorre durante o primeiro ano de vida. A predominância da afetividade orienta as primeiras reações do bebê às pessoas, as quais intermedeiam sua relação com a realidade material e social.

Os primeiros três meses de vida da criança se caracterizam, fundamentalmente, pela atividade motora refl exa, a qual é representada por descargas musculares, crises motoras, cuja reação, no tônus, se dá por meio de movimentos bruscos caracterizados por enrijecimento e relaxamento da tensão muscular. É a impulsividade em seu estado mais puro.

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Unidade 3

Neste período, não há qualquer diferenciação entre o eu e o outro. O bebê vive uma simbiose tanto fi siológica como afetiva, dependendo do adulto para a satisfação de suas necessidades de sobrevivência. A ação sobre o meio social já possui carga afetiva no jogo de bem-estar e mal-estar, sendo essas as primeiras comunicações da criança com esse meio.

Nesta fase, a predominância é de atividades de exploração do próprio corpo. Mas, nas interações com o meio, na espera da satisfação de suas necessidades, o bebê vai paulatinamente desenvolvendo uma percepção de si e de seu meio.

A partir dos três meses, passam a se defi nirem movimentos mais diferenciados, que atingem seu apogeu aos seis meses, tornando-se cada vez mais elaborados até a entrada no primeiro ano de vida. Começam a ocorrer formas mais claras de comunicação das emoções por meio do corpo: medo, raiva, alegria, tristeza, frustração se apresentam como variações no tônus. O grau de tensão expressa no tônus (aumento ou diminuição) caracteriza o tipo de emoção vivenciada pelo bebê.

A emoção atua como impulsionadora das ações e se expressa no corpo como um todo, predominantemente por meio de gestos, de vocalizações e de mímicas. Vai ocorrendo, portanto, a manifestação de uma proto-linguagem (uma linguagem primitiva), composta pelas reações expressivo-afetivas que possibilitam as trocas com as pessoas a sua volta. Aos poucos, essas manifestações começam a adquirir uma intencionalidade de interação com o meio, e, a partir da forma como as pessoas reagem a elas, as crianças passam a associar novas percepções e signifi cados às suas ações, e isto possibilita avanços em seu desenvolvimento geral.

Assim, a criança começa a adquirir uma percepção mais organizada de seu corpo, o que permite que comece a ocorrer um processo de identifi cação de si mesma.

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Começa, por exemplo, a brincar com seus braços e a apalpar partes de seu corpo. Esta percepção incipiente de seu esquema corporal vai permitindo que ela diferencie o seu corpo do de sua mãe, o que culminará na percepção de que a mãe e ela existem separadas.

São características dessa fase, especialmente por volta dos seis meses, as atividades circulares nas quais o bebê repete os movimentos, esperando a mesma resposta, tais como agarrar objetos, levá-los à boca, mordê-los, empurrá-los, trazê-los para perto, derrubá-los. Essas atividades funcionam como exercícios sensório-motores, os quais permitem o desenvolvimento da coordenação motora do bebê. Ao mesmo tempo, permitem ao bebê experienciar que suas ações provocam efeitos no ambiente.

Por volta dos nove meses, desenvolve os movimentos de preensão ou pinça, o que lhe possibilitará refi nar a exploração dos objetos.

A passagem do estágio impulsivo-emocional para o sensório-motor é marcada pela possibilidade de o bebê superar a simbiose física e afetiva. Por meio das intensas mediações com as outras pessoas, o bebê começa a diferenciar-se do outro e de seu meio e avança de uma qualidade de atividade caracterizada pelo automatismo e reatividade emocional, para uma atividade mais exploradora do ambiente externo, esta que será a atividade preponderante do próximo estágio.

Sensório-motor e projetivo

Este estágio ocorre entre as idades de um a três anos. Na passagem do estágio impulsivo-emocional para o sensório-motor, prepondera a intencionalidade da ação. A aquisição da postura ereta, o desenvolvimento da marcha e da capacidade de pegar os objetos de forma intencional (capacidade de preensão das mãos), permite à criança se portar com um grau maior de autonomia no ambiente, no que se refere à manipulação de objetos e na exploração dos espaços.

A aquisição da marcha e da linguagem contribui para ampliar o auto-referencial da criança em relação ao seu ambiente. Progressivamente, a experiência espacial da criança e a

O termo projetivo refere-se ao fato da ação do pensamento precisar dos gestos para se exteriorizar e desenvolver. O ato mental “projeta-se” em atos motores.

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capacidade de utilização das palavras permitem-lhe expressar seus desejos momentâneos, bem como a possibilidade de antecipar, imaginar, prever as noções de espaço e tempo e lidar com elas. Com a aquisição da linguagem, a atividade da criança dirige-se para nomear objetos, o que já requer que ela dirija a atenção para a identifi cação de determinadas características dos objetos e para perceber as semelhanças e diferenças entre eles. Isto também se vincula à capacidade de identifi car categorias de cor, tamanho e forma.

Utilizando-se dessas aquisições, a criança começa a perceber as distâncias entre os objetos e atua de forma ativa, ao ajustar os seus gestos para mudá-los de lugar e de posição, considerando os efeitos que isto provoca no ambiente. Esta experiência amplia suas possibilidades de desenvolvimento da inteligência prática.

Essa etapa é notoriamente mais intelectual do que a anterior. Agora o desenvolvimento da inteligência da criança está direcionado para a capacidade de representação da realidade objetiva, o que é possível pela crescente utilização da função simbólica da linguagem.

Nesse estágio, as atividades lúdicas no decorrer das quais as crianças vivenciam processos imaginativos, como as brincadeiras de faz-de-conta, são signifi cativamente impulsionadoras do desenvolvimento.

Inicialmente caracterizada pela imitação por meio de gestos, vocalizações e mímicas das ações dos adultos com os quais a criança possui vínculos afetivos, as atividades lúdicas vão transformando-se em complexas atividades nas quais a criança exercita a representação mental e o pensamento simbólico.

Nas atividades de faz-de-conta típicas desta fase, a criança utiliza o corpo para expressar as situações que não estão postas concretamente na realidade e, para tanto, faz uso do pensamento simbólico. Os movimentos efetuados pela criança criam as situações e substituem a presença dos objetos ou contextos concretos.

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Um exemplo disso pode ser constatado, se você observar um menino de três anos brincando com seu carrinho. Enquanto move o carrinho, ele faz sons de carro movendo-se, move a direção, olha para os lados e para trás, com o objetivo de verifi car se há outros “carros” e pára de empurrá-lo, imitando sons de freada, quando percebe um obstáculo.

Neste momento as ações da criança começam a ser reguladas pela capacidade de representação mental que ela faz das situações e, portanto, começa a se evidenciar um complexo processo de preponderância da atuação do pensamento sobre as ações. A cognição passa a se sobrepor ao movimento. A atividade motora começa a ceder espaço para a atividade cognitiva.

Esse processo imaginativo marca a relação específi ca da criança com o outro, especialmente os adultos que atuam como modelos. A criança identifi ca-se com o adulto, mas, ao mesmo tempo, começa a se perceber diferente dele, devido à capacidade de representar-se a si mesma e de começar a conquistar uma consciência de si, resultado de suas conquistas psicológicas e de sua maior autonomia diante do ambiente circundante. Esses desdobramentos preparam para a etapa seguinte - o estágio do personalismo.

Como ocorre o desenvolvimento da linguagem e da função simbólica neste estágio, pode-se af irmar que nele ocorre a passagem do biológico ao psicológico.

Personalismo

Neste estágio, que ocorre a partir de mais ou menos três anos e perdura até por volta dos seis anos de idade, o desafi o da criança está centrado em saber quem ela é (quem “sou eu”). Ao longo desta etapa, desenvolve-se a construção da consciência de si, em correspondência com as interações sociais que estabelece, e é aí que se evidencia o interesse das crianças pelas pessoas.

Destaca-se neste processo o papel cumprido pela linguagem como sistema simbólico que permite a representação mental.

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Destaca-se uma construção progressiva, em que a criança apropria-se de sua identidade como sujeito social e vai individualizando-se. A função da afetividade vai orientar o processo, mais que no estágio anterior, e a função da inteligência cede maior espaço para a atuação da dimensão afetiva.

É um período caracterizado por constantes embates nas relações interpessoais, por meio dos quais a criança constrói “seu eu”, afi rmando-se às custas da negação do adulto. Caracterizam essa fase a atitude de contrariedade e a rebeldia com as pessoas de seu entorno como formas de impor sua independência e de tomar consciência de si pela oposição.

A criança utiliza os pronomes meu e eu freqüentemente, defendendo seu espaço egocentricamente. Nesta fase, a criança sente prazer em brincar com outras crianças, mas defende seu espaço e seus objetos, competindo por eles, processo que está a serviço de sua auto-afi rmação. A criança expressa difi culdade em dividir seus brinquedos com outras crianças, além de querer apropriar-se daqueles brinquedos que não lhe pertencem, por exemplo.

Por meio das intensas mediações dos adultos e interações com outras crianças, ela vai cedendo em seu egocentrismo, aprendendo a perceber as necessidades de seus colegas e a dividir seus pertences com eles. Começa a perceber, também, que estar em interação pressupõe lidar com limites impostos pelos outros.

A criança requer atenção constante do adulto nesta fase, e se frustra quando não a recebe.

Nesse processo de percepção do outro e de reconhecimento da necessidade de ceder para manter a interação com os adultos e com outras crianças, a criança vai minimizando sua atitude opositora.

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Como produto, a criança dá um salto qualitativo na construção da consciência de si mesma. Este avanço traz consigo uma fase que se caracteriza por uma atitude eminentemente narcisista, na qual ela se deleita com o seu “eu” recém-conquistado. Chama a atenção dos outros sobre sua imagem, como uma condição de poder admirar-se, acreditar em si, pela aprovação do adulto. É uma fase determinante na construção da personalidade da criança, em que o outro desempenha um papel de referência neste processo contínuo de separação entre ela e o outro.

Por volta de, mais ou menos, cinco anos de idade, começa a ocorrer a realização de uma espécie de atividade que possui particular importância no desenvolvimento da criança. São as brincadeiras de jogos de papéis, nas quais a criança “imita” os papéis sociais desempenhados pelos adultos, principalmente as fi guras paternas e professores.

Esta forma de brincadeira imaginativa é mais elaborada e complexa, do ponto de vista psicológico, do que aquela realizada no período sensório-motor. No período sensório motor, inicia-se o que pode ser chamado de “imitação-cópia”, que exige certamente uma complexa interação entre os campos sensoriais e posturais. Para Wallon, trata-se de conexões ativas, isto é, que não se limitam à soma de relações simplesmente justapostas (WEREBE;NADEL-BRULFERT, 1999). Exemplo: a criança tenta saltar

ao ver uma outra saltando, mas não sai do lugar. De qualquer forma, fi ca bem claro o crescente domínio do seu corpo e de seus movimentos, e o prazer que isso proporciona a ela.

Já, no período do personalismo, o jogo de papéis envolve um processo de abstração mais profundo, a partir do qual a criança imita e recria os papéis sociais desempenhados pelos adultos em contextos cotidianos. Agora não se trata mais de uma cópia, traço por traço, do modelo observado. É o que Wallon chama de imitação inicialmente iniciadora. Ela adianta-se à representação e decorre de um processo de ajustamentos dos gestos a um protótipo que não é mais uma pessoa real. Nela, estão impregnadas impressões múltiplas da criança.

Essas impressões postas em contato com o seu sistema motor exigem a participação sensório-postural de alguém (de quem se imita) e a elaboração postural-gestual da criança. Mas

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será por volta dos três ou quatro anos de idade que a criança consegue realizar a “imitação fantasista” (WEREBE;NADEL-BRULFERT, 1999), ou a imitação dramática, que coincide com a crise de personalidade.

A necessidade de afi rmar-se cria a necessidade de observar outras pessoas e interessar-se por elas, recorrendo à imitação raciocinada e refl etida. Agora ela pode desempenhar as ações que a mãe desenvolve ao cuidar de uma criança, por exemplo, quando brinca de casinha com suas bonecas. Pode desempenhar as ações de uma professora orientando as demais crianças na suas tarefas, ao brincar de escolinha. Ela imita, assim, para ser admirada e aceita pelos adultos.

Este processo de imitação da criança em relação ao adulto envolve uma dinâmica em que a criança se identifi ca com o outro, ao mesmo tempo que vai criando e introjetando, progressivamente, o seu próprio jeito de ser e agir no mundo, de forma mais efetiva e objetiva.

A capacidade de lidar com o seu egocentrismo, de minimizar os confl itos envolvidos na crise de oposição, bem como o avanço no processo de construção de sua personalidade preparam a passagem da criança para o próximo estágio, o categorial.

Categorial

Este estágio envolve a idade que vai de seis a treze anos. Os progressos intelectuais dirigem o interesse da criança para os objetos da realidade, para o conhecimento e compreensão dos fenômenos envolvidos nestes objetos e uma busca mais efetiva de autonomia no que se refere à sua atuação na realidade externa.

Não é coincidência que, justamente nesta fase, a criança ingressa na escola e experiencia os desafi os impostos pela aquisição dos conhecimentos científi cos.

Pelos avanços conquistados na vivência dos estágios anteriores, agora a criança já é capaz de lidar com limites estabelecidos pelas regras sociais, de maneira mais apropriada: já desenvolveu a capacidade de controlar seus impulsos, já é capaz de estabelecer

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relações de companheirismo com outras crianças (já consegue identifi car seu espaço, bem como o espaço do outro, podendo expressar seus interesses e opiniões, como também ouvir os colegas) e de lidar com situações que envolvem disciplina, condições necessárias para a vivência escolar.

Este estágio é marcado por duas fases: a fase do pensamento pré-categorial e a fase do pensamento categorial.

A primeira delas é denominada de pré-categorial, na qual os elementos sincréticos são predominantes na forma como a criança compreende os objetos apresentados na realidade. Ela ainda não consegue reconhecer quais são as características essenciais que compõem os objetos e confunde-se facilmente, orientada por suas impressões sensoriais.

Nesta fase, a criança ainda não adquiriu a capacidade de análise e síntese necessárias para identifi car as categorias conceituais dos objetos e, portanto, guia-se pela sua experiência particular e pessoal com eles. Utiliza-se de argumentos que fogem da lógica para explicar as categorizações que estabelece.

Como exemplos, podem ser citados: a criança que atribui a mesma denominação a um caranguejo e a um escorpião; ou o fato de a criança explicar que a água do mar está gelada, porque venta (e não, porque existe uma corrente marítima polar).

Ao longo do seu desenvolvimento e estimulada pelo processo de escolarização, que possibilita a refl exão permanente sobre os objetos e fenômenos envolvidos na realidade para além de sua aparência sensível, a criança vai transformando, qualitativamente, sua capacidade de pensar sobre eles e começa a distinguir os elementos essenciais defi nidores dos conceitos e das categorias dos objetos.

Utiliza-se de categorias intelectuais mais complexas, como a análise e a síntese, e já começa a ser capaz de realizar tarefas que envolvem a classifi cação, a ordenação, a defi nição, a comparação, diante dos objetos e fenômenos da realidade. Conquista, também, a capacidade de explicar os fenômenos de forma lógica,

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utilizando-se do conhecimento das relações de tempo e espaço; e, de causa e efeito. Entra, assim, na segunda fase deste estágio, o pensamento categorial, fato que ocorre por volta dos 10 anos de idade.

Predominância funcional (Puberdade e Adolescência)

Neste estágio, ocorrem intensas transformações na personalidade do adolescente, devido às modifi cações corporais resultantes da ação hormonal, o que produz mudanças fi siológicas e o amadurecimento sexual, além do novo papel social que começa assumir nos contextos sociais.

Questões pessoais, morais e existenciais começam a assumir destaque na dinâmica psicológica.

Essas intensas transformações causam um processo de desorientação no jovem, que já não reconhece seu esquema corporal, bem como não tem clareza do lugar que ocupa na sociedade. Existe a necessidade de um novo processo de reconhecimento de si mesmo, relacionado à construção de sua identidade.

Essa dinâmica causa uma ambivalência de atitudes e de sentimentos do jovem, ora expressos pelo conformismo e pela dependência dos adultos, ora pela oposição e necessidade de independência com relação a eles.

O grupo tem um papel de extrema relevância neste período, pois o adolescente precisa estabelecer relações com pessoas com as quais possa compartilhar os mesmos interesses e idéias, para se reafi rmar e se fortalecer enquanto indivíduo e conseguir avançar na construção sua identidade pessoal. O grupo funciona como uma referência e permite ao adolescente, o acesso a outras formas de funcionamento, diferentes dos vividos em sua família de origem. Isto lhe permite se opor aos determinantes familiares e construir novos valores, metas e atitudes diante da realidade social.

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O adolescente começa a desempenhar novos papéis sociais e sexuais relacionados à sua vida como estudante, ao estabelecimento de relacionamentos afetivos com seus pares e, também, como futuro profi ssional. Caminha, assim, em direção à vida adulta, com a amplitude de autonomia e de responsabilidades que esta lhe confere.

Quais situações você recordou, ao estudar os diferentes estágios propostos por Wallon?

Antes de avançar para a seção seguinte, registre pelo menos 3 delas e identifi que a que estágios elas se referem.

SEÇÃO 4 - Contribuições para a educação

A teoria psicogenética walloniana oferece subsídios para aprofundar a refl exão sobre as práticas pedagógicas, ao mesmo tempo em que motiva a investigação educacional.

Wallon propõe que a escola deva transcender a função de instrutora de conteúdos escolares, além de desenvolver as atividades pedagógicas considerando e respeitando os aspectos psicológicos envolvidos nos vários estágios de desenvolvimento das crianças, de forma a proporcionar avanço meio aos desafi os psicológicos impostos em cada etapa.

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Ao assumir um papel de responsável pela unidade do grupo de estudantes, o educador deve reconhecer as manifestações das crises infantis como necessárias ao desenvolvimento, mas desempenhando o distanciamento necessário para poder auxiliar nas suas superações.

Ainda que seja o responsável pelo processo de escolha das atividades e dos conteúdos a serem ensinados e embora não assuma o papel de detentor do conhecimento, não deve deixar que a aprendizagem ocorra pela via da “espontaneidade infantil”

O professor deve adotar uma postura de observação dos estudantes para que possa compreendê-los em sua dinâmica psicológica, de forma integral, como pessoa completa. Deve permitir que eles expressem sua afetividade e seus sentimentos de modo a oferecer-lhes oportunidades e meios para que eles possam desenvolver suas ações em direção à autonomia. Nesta perspectiva, a aprendizagem vai ocorrer se estiver adequada às necessidades e interesses dos estudantes, por isso a importância em observá-las e direcioná-las.

A teoria de Wallon oferece elementos importantes para se pensar o papel da educação infantil, em particular pela importância que é dada à psicomotricidade e à afetividade, como foi visto anteriormente. Destaca-se em sua obra o papel atribuído à atividade lúdica no trabalho com grupos de crianças, nas atividades escolares.

De acordo com Wallon, as atividades lúdicas desenvolvidas em grupos permitem que as crianças, por meio das relações estabelecidas com as demais, passem pelos processos de identifi cação e diferenciação. Isto assegura que elas avancem pelos vários estágios, superando a si mesmas, num processo que vai da individualização até o alcance da socialização. Essas superações permitem que as crianças modelem sua conduta, do individual para o social.

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Com a experiência de grupos na escola, a criança também exercita a tolerância às frustrações e o controle da impulsividade. Aprende a assumir papéis e a lidar com os limites impostos pelas outras pessoas, ao mesmo tempo que internaliza as regras da cultura. Aprende a administrar confl itos nas várias dimensões que a sociabilidade implica.

Neste sentido é que o grupo assume um papel fundamental para a aprendizagem social da criança, bem como para o desenvolvimento de sua identidade e personalidade.

Ao mesmo tempo que serve de referência para que, por meio de processos de identifi cação, a criança compartilhe desejos e interesses comuns, o grupo serve de parâmetro, também, para sua diferenciação, na medida em que, pela vivência de grupo, esta vai perceber-se diferente e única, avançando no processo de conscientização de si mesma.

Nessa dinâmica, a criança tem a possibilidade de perceber-se a si mesma, ao mesmo tempo que começa a perceber o outro como diferente de si, adquirindo, inclusive, a capacidade de se colocar no lugar deste. Isto incrementa sua capacidade de estabelecer relações sociais nas quais a dimensão de si e do outro estejam presentes, o que, por sua vez, enseja o desenvolvimento da autonomia e promove o desenvolvimento de atitudes altruístas.

Na concepção de Wallon, a escola é compreendida como um ”meio social” que objetiva a formação humanizada dos sujeitos e também a interferência nos processos de transformação social com vista à construção de uma sociedade mais justa. Também defende que o acesso à escola deva ser democrático e que esta deve comprometer-se com o atendimento igualitário de crianças das diferentes classes sociais.

Neste momento, você fi naliza esta unidade. Ao estudá-la, pôde conhecer as bases fi losófi cas e os elementos que infl uenciaram a construção da Teoria Psicogenética e compreender a concepção integradora de desenvolvimento humano proposta por Wallon.

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Pôde também descrever os estágios de desenvolvimento de acordo com esta teoria e compreender as contribuições desta teoria para o desenvolvimento das práticas pedagógicas.

Síntese

Wallon propõe que o psiquismo humano deva ser entendido como resultado da interação dialética entre o biológico e o social. Defende que é possível compreender o psiquismo por meio do estudo da criança, visto ser nesta fase da vida que, predominantemente, se formam os processos psicológicos.

Entre as maiores contribuições da teoria de Wallon para a Psicologia como ciência, bem como para outras ciências de natureza aplicada, como a educação, está o fato de ter elucidado o papel de mediação que a afetividade e a motricidade cumprem em todo o processo de desenvolvimento da criança, e que esta se caracteriza por ter uma funcionalidade. A compreensão da relação entre emoção e movimento; da relação entre emoção e intelecto, bem como os vínculos que estas três dimensões estabelecem entre si fornecem subsídios para uma compreensão mais ampla dos sujeitos humanos. O pensamento deste autor apresenta noções da relação que se estabelece entre psiquismo, emoção, movimento, inteligência; e a integração desses, com a dimensão social. É por esse motivo que muitos autores se referem à teoria de Wallon, como a “teoria da pessoa completa”.

Um outro aspecto importante da teoria de Wallon é o entendimento do papel que o outro ocupa no desenvolvimento infantil. Nessa teoria, a construção do “eu” depende essencialmente do “outro”, seja para constituir referência de identifi cação, ou negação. Com maior ênfase a partir de quando a criança começa a vivenciar a denominada “crise de oposição”, na qual a negação do outro funciona como uma espécie de instrumento de descoberta de si própria. Mas a relação com o outro determina os avanços que ocorrem em todos os estágios de desenvolvimento do sujeito, perpassando todo o processo de constituição de si mesmo.

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O trabalho de Wallon marca a necessidade de utilização dos conhecimentos da Psicologia da Criança para que sejam pensadas e implementadas as práticas pedagógicas. Também atribui ênfase à necessidade do aprendizado do ensino pelos educadores, para que este seja realizado de forma a promover o desenvolvimento integral da criança, ao considerar suas dimensões individual e social.

Atividades de auto-avaliação

Para praticar os conhecimentos apropriados nesta unidade, realize as atividades propostas.

1 ) Leia contos infantis para crianças de sua convivência (com idades diferenciadas, em torno de um ano, três e cinco anos) e observe como elas se comportam em sua afetividade, motricidade e cognição. Crie, portanto, um espaço de leitura para elas e, na seqüência, descreva suas observações, considerando a teoria walloniana.

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2) Faça uma pesquisa (em sua realidade social / ou em sites) sobre as atividades que predominam nas fases de crianças e jovens que estão nos estágios categorial e da adolescência e descreva-as, considerando os aspectos centrais propostos pela teoria walloniana.

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Saiba mais

Para aprofundar os assuntos estudados nesta unidade, sugere-se a leitura das seguintes obras:

DANTAS, Pedro da Silva. Para conhecer Wallon. São Paulo: Editora Brasiliense, 1983.

GALVÃO, Izabel. Uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Petrópolis: Editora Vozes, 1995.

WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições 70, 1981.

______. Objetivos e métodos da psicologia. Lisboa: Editorial Estampa, 1975.

______. As origens do pensamento da criança. São Paulo: Manole, 1989.

______. Do ato ao pensamento. Lisboa: Portugália Editora, 1966.

______. Psicologia e educação da infância. Lisboa: Estampa, 1975.

WEREBE, Maria José Garcia; NADEL-BRULFERT, Jacqueline. Henri Wallon. São Paulo: Ática, 1999.

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UNIDADE 4

Novas tendências em Psicologia da Educação

Objetivos de aprendizagem

Delimitar o objeto de estudo da Psicologia da Educação na atualidade.

Conhecer as principais contribuições da Psicologia da Educação contemporânea para a compreensão das práticas educativas formais e informais.

Compreender o processo de ensino-aprendizagem em sala de aula a partir de abordagens psicológicas contemporâneas: Ausubel, Galperin e Talìzina.

Identifi car os conceitos-chaves da Teoria da Assimilação Cognitiva de David Paul Ausubel e explicar suas contribuições para a compreensão da promoção da aprendizagem signifi cativa.

Conhecer as produções teóricas atuais derivadas da Teoria da Atividade de Leontiev, aplicadas ao contexto atual da aprendizagem escolar: Galperin e Talìzina.

Compreender o papel da educação escolar na formação da personalidade dos alunos.

Compreender as possíveis implicações das práticas educativas parentais nas condutas pró-sociais ou agressivas das crianças, com vistas a adotar uma abordagem compreensiva e preventiva na escola.

Seções de estudo

Seção 1 Psicologia e Educação: uma revisão histórica da relação entre as duas áreas de conhecimento

Seção 2 Abordagens psicológicas da aprendizagem escolar: contribuições de Ausubel

Seção 3 Abordagens psicológicas da aprendizagem escolar: contribuições de Galperin e Talìzina

Seção 4 Práticas Educativas informais: implicações para a educação formal

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Para início de estudo

Nessa última unidade, você compreenderá por que, na atualidade, a Psicologia da Educação é mais do que um conjunto de conhecimentos e saberes desenvolvidos nos laboratórios e em contextos distantes da sala de aula, aplicados para uma classe particular de comportamentos relacionados à situação de aprendizagem escolar, como ocorreu até a década de 60.

A transmissão da cultura humana nos contextos informais de aprendizagem (família, rua, meios de comunicação) em parceria com a Educação Formal, sempre sistematizada e veiculada por meio dos diferentes níveis de ensino que conhecemos, tem a função de preparar as novas gerações de crianças e jovens para se desenvolverem como indivíduos, cidadãos e profi ssionais capacitados, cognitiva e emocionalmente, para serem produtivos, criativos e capazes de conviver socialmente.

Por essa razão, compreender o modo como a educação geral e particular deve ser conduzida para produzir mudanças positivas nas personalidades dos sujeitos que dela participam tornou-se foco de atenção dos pesquisadores da área da Psicologia da Educação contemporânea.

Inicialmente, forneceremos a você subsídios teóricos produzidos pela Psicologia, para que se possa pensar os aspectos psicológicos envolvidos na atividade concreta de quem aprende e de quem ensina, no contexto da sala de aula.

O referencial teórico-metodológico adotado é o da Psicologia Histórico-Cultural de Vygotsky e da Teoria da Atividade de Leontiev, aprofundado pelas contribuições de seus seguidores contemporâneos, Galperin e Talìzina. Serão vistas, também, as contribuições de Ausubel, pela relevância de sua teoria na pesquisa e prática educativa atual.

Os estudos científi cos orientados para compreender as práticas educativas informais tendem a concluir que existe uma correlação entre as práticas parentais e comportamentos pró-sociais ou agressivos dos fi lhos.

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Unidade 4

Esse tema fecha a unidade, lembrando a importância de o profi ssional da educação identifi car as práticas educativas nocivas ao desenvolvimento da personalidade infantil, com vistas a trabalhar, junto com os pais, na promoção do desenvolvimento saudável de seus alunos. As capacidades cognitivas e afetivas serão as ferramentas das quais a criança e jovens irão dispor para se apropriarem dos conhecimentos e habilidades escolares específi cas e sociais mais amplas, de modo a se transformarem a si próprios e educarem futuramente seus fi lhos.

Sucesso nesse estudo!

SEÇÃO 1 - Psicologia e educação: uma revisão histórica da relação entre as duas áreas de conhecimento

A psicologia, desde sua origem como ciência, no século XIX, sempre manteve uma relação íntima com a educação. Não é difícil compreender o porquê dessa intimidade. As descobertas científi cas no campo da aprendizagem, do desenvolvimento e do ensino, produzidas pela psicologia, são fundamentais para que se organize, conduza, avalie e corrija o processo de ensino-aprendizagem.

Em seu texto Concepções e tendências atuais em Psicologia da Educação, Coll (2004, p.19) sintetiza a relação inequívoca entre a Psicologia e a Educação:

A existência da psicologia da educação como uma área de conhecimentos e de saberes teóricos e práticos claramente identifi cável, relacionado com outros ramos e outras especialidades da psicologia e das ciências da educação, mas ao mesmo tempo distinto delas, tem sua origem na crença racional e na convicção profunda de que a educação e o ensino podem melhorar sensivelmente com a utilização adequada dos conhecimentos psicológicos.

Entretanto, falar que os conhecimentos psicológicos podem melhorar o modo como se educa as gerações mais jovens de nossa cultura não signifi ca dizer que a Psicologia, sozinha, é capaz de dar conta de tudo o que está envolvido no processo educativo. A crescente participação da sociologia, da antropologia, da fi losofi a

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da educação, da lingüística, da didática, dentre outras disciplinas científi cas que contribuem com as Ciências da Educação, permite uma maior aproximação da complexidade envolvida na educação em geral e na educação escolar, em particular.

Em contrapartida, o contexto educativo é um campo fértil para a investigação de fenômenos psicológicos, já que nele pode ser constatada a promoção do desenvolvimento integral do homem, em suas formas de comportar-se, pensar e sentir no mundo, em correspondência com as particularidades de cada momento histórico.

Essa promoção do desenvolvimento, via atividades de ensino e aprendizagem, sofre infl uências que não estão restritas ao contexto próprio da sala de aula. As infl uências de nível mais distal ou de âmbito de maior abrangência macro-estrutural, como é o caso dos contextos sociocultural, econômico e político de um país; e as infl uências mais contextuais, referentes ao sistema educacional e ao contexto escolar específi co (organização, funcionamento, gestão da escola, relações interpessoais e as relações de poder que nela se estabelecem), todas elas condicionam o contexto mais proximal, referente ao que ocorre na sala de aula (aspecto material e psicológico desse contexto). Este, por sua vez, também sofre infl uências de todos os indivíduos (sua cultura familiar, suas características de personalidade, suas crenças, expectativas e atribuições mútuas, suas representações do que é ser aluno, professor, aprender e ensinar).

Como você pode constatar, o objeto da Psicologia da Educação é de natureza multidimensional e caracteriza-se pela dinamicidade, pelo multiculturalismo, pela inter-relação recíproca entre os agentes educativos (quem ensina e quem aprende) e pelo caráter transformativo. (COLL; SOLÉ, 2004).

A Psicologia da Educação contemporânea, ao reconhecer a importância de outras disciplinas na compreensão e explicação dos fenômenos educativos, redimensiona seu foco de atenção para dois tipos de práticas educativas: as informais e as formais.

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As primeiras dizem respeito às práticas educativas que ocorrem de forma espontânea, nas famílias e em espaços sociais que não são ofi cialmente destinados à transmissão de conteúdos escolares. As segundas dizem respeito aos processos educacionais que ocorrem em instituições pensadas, criadas e organizadas especifi camente para desenvolverem atividades de formação, apresentando características, dentre outras de intencionalidade, sistematicidade e planejamento.

De um modo geral, a pedagogia está mais interessada na Psicologia da Educação que produz conhecimentos na área da aprendizagem escolar. Isto é, naquela que concentra seus esforços para entender os fatores e processos intrapsicológicos e interpsicológicos relevantes e, assim, explicar os processos de mudança que se produzem nas pessoas (alunos) como conseqüência de sua implicação e participação em processos educacionais escolares.

Neste aspecto, teorias como as de Piaget, Vygotsky e Wallon, que você estudou nas unidades anteriores, são consideradas as principais referências contemporâneas da educação. Assim, porque oferecem subsídios teóricos, os quais auxiliam o professor a compreender como os alunos pensam, sentem e aprendem em sua interação ativa com os objetos e com os demais sujeitos.

Tendo como base as idéias de Vygotsky e Leontiev, outros estudiosos contemporâneos estão interessados em entender de que forma os conhecimentos socialmente produzidos ao longo do tempo, em diferentes culturas, passam a fazer parte do mundo simbólico das crianças, por infl uência da ação educativa intencional do professor. Dentro dos fatores e processos psicológicos envolvidos na aprendizagem escolar, encontram-se constructos como atividade mental, ações e operações mentais, estratégias cognitivas, assimilação cognitiva, internalização, apropriação e metacognição, que são considerados fatores de caráter preponderantemente cognitivo.

Entretanto o processo de aprendizagem e ensino em sala de aula está longe de envolver aspectos puramente cognitivos. A Psicologia da Educação contemporânea reconhece, igualmente, a infl uência do desejo, dos motivos, da atribuição de juízos e valores, das expectativas e representações recíprocas do aluno e do professor, do autoconceito e da auto-estima do aluno e do

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professor no resultado da aprendizagem do aluno e na satisfação e na valorização da identidade do professor.

Dentre os pesquisadores mais estudados na atualidade, os quais se preocuparam com ambas as dimensões da aprendizagem escolar, a cognitiva e a afetiva, destacam-se Jean Paul Ausubel, com sua Teoria da Assimilação Cognitiva e da Aprendizagem Signifi cativa, e Galperin, com a Teoria de Formação das Ações Mentais por Estágios, que você estudará a seguir.

As contribuições da Psicologia da Educação no campo das práticas educativas informais, ou seja, aquelas que ocorrem, especialmente, no âmbito familiar, também vêm merecendo destaque. Por esta razão, foi feita a opção de abordar tal conteúdo nesta disciplina de Psicologia da Educação, ou seja, o reconhecimento da importância de o futuro profi ssional da educação, seja em seu laboratório vivo, a sala de aula, seja em atividade de pesquisa, compreender que seu trabalho pedagógico deve ser dirigido para produzir mudanças qualitativas em sujeitos sociais, os quais, além de alunos, são crianças ou jovens em processo de desenvolvimento.

Assim, os professores lidam com sujeitos dotados de personalidade própria, em constante processo de diferenciação e desenvolvimento, os quais, até chegarem à escola, estão dominantemente expostos à infl uência de seu meio familiar.

SEÇÃO 2 - Abordagens psicológicas da aprendizagem escolar: contribuições de Ausubel

Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um único princípio, diria isto: O fator isolado mais importante que infl uencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já conhece. Descubra o que ele sabe e baseie nisso os seus ensinamentos. (Ausubel, entre outros, 1980).

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David Paul Ausubel nasceu em Nova York, em 1918, e vive, atualmente, na cidade de Ontário, no Canadá. Sua família, entretanto, era originária da Europa Central e migrou para os Estados Unidos na época de guerras e de perseguição aos judeus na Europa Ocidental. Teve, na infância, a infl uência da educação judia de seus pais, marcada pela rigidez disciplinar, na qual a memorização e a submissão da criança à fi gura do professor eram valorizadas e severamente cobradas. É provável que este fato tenha tido infl uência no seu interesse por desenvolver uma teoria bastante arrojada da aprendizagem em sala de aula.

Estudou Psicologia na Universidade de Nova York e escreveu vários livros sobre Psicologia da Educação desde a metade da década de 60, mas, só na década de 90, tornou-se conhecido no Brasil. Desde o fi nal da década de 60, esse psicólogo já defendia uma visão a frente de seu tempo sobre os conteúdos da Psicologia da Educação:

A Psicologia da Educação é inequivocamente uma disciplina aplicada, mas não é uma psicologia geral aplicada a problemas de educação - do mesmo modo que a engenharia mecânica não é física geral aplicada a problemas de projetos de máquinas, ou a medicina não é a biologia geral aplicada a problemas de diagnóstico, de cura e de prevenção de doenças humanas. (AUSUBEL, 1969, apud COLL, 2004).

Tende-se a classifi car Ausubel como um pesquisador de orientação cognitivista, ainda que tenha tratado de aspectos motivacionais na aprendizagem e não discorde dos postulados da Epistemologia Genética de Piaget no que diz respeito à compreensão da aprendizagem como processo ativo construído pelo aluno, num esforço individual e contínuo, rumo às operações mentais formais.

Paradoxalmente, sua teoria foi desenvolvida num clima de muito pouca aceitação, tanto por parte dos behavioristas, que insistiam em conduzir suas pesquisas em laboratório e transpor os resultados para a sala de aula, como pelos construtivistas emergentes da década de 60, infl uenciados pela teoria piagetiana, os quais defendiam a aprendizagem por descoberta como a única alternativa possível para banir a aula expositiva e ensinar de modo signifi cativo em sala de aula.

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Autores contemporâneos que você pode pesquisar em vários sites, para um maior aprofundamento.

Ausubel, ente outros (1980), entendia que o problema da aprendizagem escolar não estaria no método expositivo em si. Na realidade, ele se dera conta de que o “bebê não poderia ser jogado fora com a água suja”. Para ele, o aluno poderia aprender tanto por meio de aulas expositivas (aquelas nas quais o professor, com o uso de giz, vai ao quadro e apresenta os conceitos e conteúdos que deverão ser assimilados pelos alunos), como pela via da descoberta (aquela em que o professor encoraja o aluno a testar hipóteses para descobri por si próprio a resolução de problemas).

O que estaria em jogo era o método didático empregado até então para conduzir as aulas expositivas. Para o autor, o oposto da “aprendizagem signifi cativa” seria a “aprendizagem mecânica”. Esse tipo de aprendizagem é sinônimo de aprendizagem por decoração ou memorização.

Ausubel passou vários anos de sua vida pensando em como aprimorar a aprendizagem tornada possível por métodos expositivos. Fez isso, porque achava que o estudo da aprendizagem em sala de aula havia sido negligenciado pela pesquisa educacional e que os estudos de Piaget estavam dando conta, plenamente, de fundamentar a aprendizagem por descoberta, divulgada pelo construtivismo nascente na época.

Ao pensar sobre a utilização efi ciente do método verbal expositivo em sala de aula, Ausubel acabou desenvolvendo uma teoria que descreve os fatores envolvidos no processo de aprendizagem receptiva signifi cativa - que chamou de Teoria da Assimilação Cognitiva - , e, também, sugeriu algumas estratégias de ensino que poderiam facilitar a aprendizagem escolar, como os Organizadores Prévios e os Mapas Conceituais. Seus estudos vêm sendo, atualmente, aperfeiçoados por estudiosos como Novak e Henesian.

Agora que você tem uma visão geral de quem é Ausubel e, ainda, das contribuições que ele trouxe para a educação, seus aportes conceituais serão descritos com maior detalhamento.

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Para entender o processo de assimilação cognitiva que deve ocorrer em toda aprendizagem signifi cativa, o autor parte da seguinte premissa: na aprendizagem signifi cativa há duas premissas básicas no que diz respeito ao que o professor deve saber: o que o aluno sabe, isto é, os seus conhecimentos prévios, e o modo como esses conhecimento estão organizados em sua estrutura cognitiva.

Os conhecimentos prévios dos alunos precisam ser sufi cientemente claros, abrangentes e estáveis e estar organizados de forma lógica e pessoal na estrutura cognitiva do aluno. Assim organizados, os conceitos podem ser evocados (capturados conscientemente da memória) para serem relacionados ao que o aluno está aprendendo pela primeira vez. Tais conceitos, idéias ou conhecimentos prévios foram denominados, por Ausubel, de subsunçores (ou inclusores) e podem ser vistos como âncoras ou ganchos, aos quais os novos conhecimentos serão conectados.

Dito de outra forma, para que a aprendizagem seja signifi cativa, é necessário que haja conceitos prévios, subsunçores disponíveis para possibilitar conexões e os novos conceitos a serem aprendidos.

Torna-se vital para qualquer professor, nessa teoria, conhecer a estrutura cognitiva, ou a forma como estão organizados os conceitos, os saberes, as representações de mundo ou as expectativas dos alunos em relação a um determinado conteúdo, pois será a partir desse conhecimento que ele buscará ativar os ganchos ou subsunçores, para apresentar os conteúdos aos alunos.

Por isso, intimamente relacionado com a noção de estrutura cognitiva está a idéia de que o material didático deve ser organizado de forma sistemática e respeitando essa hierarquia. Neste sentido, Ausubel fala que as aulas expositivas têm que ser organizadas de modo potencialmente signifi cativo, ou seja, de modo que facilite a aprendizagem signifi cativa do aluno.

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Para explicar o processo interno envolvido na aprendizagem signifi cativa, o autor lança mão de dois conceitos: a substancialidade e a não-arbitrariedade.

A “substancialidade” diz respeito àquilo que é essencial e necessário para que se compreenda um conteúdo, uma idéia ou um conceito qualquer. Dito de forma mais simples, o contrário de aprender algo substancialmente seria aprender ao “pé-da-letra”, e sem fl exibilidade cognitiva. O signifi cado essencial de um objeto de estudo pode ser captado a partir das características essenciais que são peculiares somente a esse objeto.

Por exemplo: se você tentar perguntar o que é “cadeira” a uma criança, ela tenderá a descrevê-la a partir de sua utilidade, de suas características físicas essenciais ou primárias, mas também, das secundárias.

E, como você já sabe, para tentar formar esse conceito espontâneo, ela usou como referência suas experiências cotidianas com cadeira: a de sua casa, de sua sala de aula, etc.

Ora, dizer que cadeira é uma coisa que serve para sentar, tem quatro pernas, é de madeira, tem uma almofada e tem um apoio para as costas não corresponde à essência do conceito cadeira. Apenas é uma descrição superfi cial, com base em percepções e experiências pessoais acerca do objeto cadeira.

Do que foi descrito, há características secundárias (como a cor, a quantidade de pernas e o tipo de assento) que não são peculiares a uma cadeira. Mas o que há de realmente essencial num objeto, para que seja conceituado como cadeira? Se analisarmos as partes que compõem uma cadeira e abstrairmos (retirarmos mentalmente) somente aquelas sem as quais não seria possível formar o conceito de cadeira, estaremos lidando com a substancialidade de um conceito.

Compreendendo dessa forma, as crianças podem aplicar esse conceito às cadeiras de outras cores, feita de outros materiais, e com bases ou assentos de palha, couro ou tecido. Se tivessem entendido ao pé-da-letra, pensariam que cadeira é apenas aquela que existe em sua casa ou na sua sala de aula.

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Um outro exemplo comentado por Cruz (2001) parece bem ilustrativo: se o aluno aprende signifi cativamente que o cão é um mamífero, ele deverá ser capaz de expressá-lo de diversas formas, como: “o fi lhote de cachorro mama de sua mãe” ou “o cachorro é um animal que, como nós, mama quando é fi lhote”.

Dando prosseguimento aos processos envolvidos na aprendizagem signifi cativa, Ausubel fala que, além de substancial, a assimilação deve ocorrer de forma não-arbitrária. Isto é, o que é ensinado precisa encontrar um sentido lógico e coerente na estrutura cognitiva do aluno. A noção de não-abitrariedade, portanto, diz respeito à maneira coerente pela qual os novos conceitos se ligam aos conteúdos já presentes na estrutura cognitiva do aluno.

Para você entender melhor o que isso quer dizer, pense que a estrutura cognitiva humana resulta dos processos de aquisição, processamento, armazenamento, organização e evocação de memórias ou idéias referentes às várias áreas de conhecimento. Na nossa “mente”, os conceitos obedecem a uma hierarquia: aqueles de maior abrangência, mais complexos e mais relevantes devem estar no topo dessa hierarquia e funcionam de modo a ancorar conceitos, imagens ou idéias mais específi cas, mais particulares ou com menor poder de generalização.

Veja a ilustração a seguir, para facilitar a visualização de algo bastante abstrato:

Figura 4.1: Modelo de hierarquia entre os conceitos na estrutura cognitiva

leguminosas, frutas, fl oresmamíferos, aves, peixes,

aracnídeos, insetos

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Isso traz óbvias implicações para o modo como você entende a aprendizagem dos alunos. Se um sujeito não organiza logicamente o que aprende, de acordo com critérios de subordinação -- ilustrando: incluir um exemplo particular numa classe mais geral --, ele o fará de modo arbitrário, ou seja, sem buscar nexo lógico algum.

Ausubel entende que, na aprendizagem mecânica ou por decoração, o aluno armazena, apenas por um curto espaço de tempo, itens aleatórios, os quais apresentam pouca ou nenhuma relação com os conteúdos disponíveis em sua estrutura cognitiva.

A essas alturas, é possível deduzir que você possa estar pensando:

Mas gente! Foi assim que eu aprendi tudo na escola?!?

Exatamente, muitos alunos que hoje freqüentam as universidades e que cursaram as séries iniciais (o então chamado primário) nas décadas de 60 e 70, tiveram essa infl uência educativa sobre sua forma de aprender. Não é de se admirar que muitos desses alunos encontrem, na atualidade, difi culdades para estudar de outra forma e recorram à memorização mecânica para tentar aprender os conteúdos das disciplinas que cursam.

Aprender mecanicamente implica memorizar os novos conteúdos ou conceitos, de modo literal, ou ao pé-da-letra, e sem estabelecer um nexo lógico com o que já se sabe. Dessa forma, pode-se deduzir que essa forma de aprendizagem pode causar uma espécie de rigidez ou pouca fl exibilidade cognitiva. E o que signifi caria essa pouca fl exibilidade cognitiva em termos práticos?

Signifi caria que um aluno, numa prova, pode ser capaz de conhecer como corretas afi rmações que incluam todas as palavras de uma frase, desde que elas sejam apresentadas na mesma ordem e da mesma forma em que foram apresentadas pela primeira vez.

Um exemplo corriqueiro disso está no modo como aprendemos algumas orações ou o Hino Nacional. Ainda que decorados e ditos na forma correta, seu signifi cado é certamente compreendido por poucos.

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Ausubel, ao falar das condições para que ocorra a aprendizagem signifi cativa, acrescenta à substancialidade e à não-arbitrariedade, mais dois fatores importantes: a atitude positiva do aluno para aprender e realizar o que é necessário para que possa aprender de modo signifi cativo; e o potencial signifi cativo do material a ser apresentado.

Vamos por partes: ao destacar a disposição do aluno para aprender, Ausubel nos remete a um fator subjetivo (motivação) que, num primeiro olhar, pode levar você a deduzir que seja algo intrínseco ao aluno -- subjetivo -- , e que não pode ser alterado.

Como se sabe, na atualidade, a motivação tem aspectos intrínsecos e extrínsecos. Isto signifi ca dizer que a motivação para a aprendizagem pode ser potencializada em função do modo como os professores apresentam os materiais de aprendizagem, do modo como valorizam as conquistas do aluno, do modo como o aluno sente-se respeitado em sua forma de ser, de vestir-se e de pensar (sua cultura), dentre outros fatores. (TAPIA E MONTERO, 2004).

Em outras palavras, a motivação para aprender está intimamente relacionada com o autoconceito acadêmico do aluno, que, por sua vez, depende do modo como o professor o ajuda a enfrentar tarefas escolares. Se a tarefa é passada, os objetivos clarifi cados e o modo de realizar a tarefa descrito em etapas, o aluno terá mais chances de compreender o que fez, por que fez e como o fez. Compreenderá o processo que o levou a conseguir encontrar os resultados. Isso por si só já é um grande reforçador de um autoconceito positivo (TAPIA; MONTERO, 2004 e MIRAS, 2004).

Além do mais, isso possibilita ao aluno desenvolver algo que também já foi citado anteriormente, a metacognição. Só para relembrar, metacognição diz respeito à consciência que nós podemos ter do nosso próprio processo cognitivo. As aptidões metacognitivas permitem uma melhoria na qualidade e rapidez da aprendizagem humana.

Pensando em como tornar o material educativo potencialmente signifi cativo para a aprendizagem, Ausubel procurou delinear estratégias de ensino, que se tornaram conhecidas no mundo

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inteiro, a partir da década de 90. Você estudará essas estratégias logo a seguir, após concluirmos dois pontos:

os processos que devem ocorrer durante a aprendizagem significativa;

os tipos de aprendizagem significativa que existem.

Os conceitos novos que interagem com os conhecimentos prévios são assimilados, mas vão modifi cando os antigos como resultado dessa interação. A esse processo, Ausubel chamou de diferenciação progressiva. Aqui está implicada a dialética da construção do conhecimento, onde o não-conhecido é relacionado ao conhecido e o transforma para transformar-se a si próprio. Há um claro paralelo aqui com os conceitos de assimilação - acomodação que você estudou na seção referente a Piaget. Dessa forma, conceitos vão tornando-se, progressivamente, mais abrangentes, inclusores e claros, para serem disponibilizados para novos aprendizados.

Na reconciliação integrativa, relaciona-se o que já está disponível na estrutura cognitiva (idéias, conceitos, proposições) do aluno, de um modo inédito, nunca realizado antes. Assim, o que é conhecido, mas está ainda pouco ou nada relacionado na estrutura cognitiva de um sujeito, pode assumir novos signifi cados, o que implica uma reorganização da estrutura cognitiva em si. Seria uma espécie de recombinação de elementos de modo a produzir relações signifi cativas e duradouras.

Ausubel ainda diferencia três tipos de aprendizagem signifi cativa, que você passa a conhecer.

a) Aprendizagem Significativa por Subordinação, que pode ser do tipo derivativa e correlativa. Quando se fala em aprendizagem por subordinação, deve-se ter em mente o seguinte: o que será ensinado é mais específico, mais particular ou menos abrangente do que aquilo que o aluno já conhece. Por exemplo: um conceito novo e mais específico (gato, cão) pode ser ensinado de forma que o aluno o subordine a uma classe de conceitos mais abrangentes (mamíferos).

Na aprendizagem subordinação derivativa, o novo conceito serve de exemplo direto de um conceito mais amplo ou proposição, já conhecidos pelo aluno,

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sem que ocorra alteração qualitativa do que já é conhecido. Cada novo conceito derivado de uma classe de conceitos maior é apenas incluído nessa classe, tornando o conceito mais abrangente (o subsunçor), mais claro e disponível na estrutura cognitiva do aluno para futuras aprendizagens.

Já, na aprendizagem por subordinação correlativa, a nova idéia, além de se subordinar a um conceito mais global ou abrangente, amplia-o. Seria algo equivalente ao conceito de acomodação de Piaget. Ao ser ensinado que a baleia também é um mamífero mesmo não apresentando características similares às dos cães e gatos, o aluno teria o seu conceito subsunçor mamífero modificado, redefinido e ampliado em sua abrangência para incorporar novos exemplos específicos. Esses dois tipos de aprendizagens permitem a diferenciação progressiva dos conceitos.

b) Aprendizagem por Supra-ordenação, que seria o oposto de aprendizagem por subordinação. Ou seja: as novas idéias, conceitos ou proposições que serão ensinados têm um grau maior de generalidade, isso é, são mais abrangentes do ponto de vista conceitual, do que os conhecimentos prévios de que o aluno dispõe. Para dar conta de supra-ordenar conceitos, o aluno necessita desenvolver um raciocínio indutivo, isto é, partir de idéias mais específicas e chegar a idéias mais abrangentes. Partir de exemplos particulares e construir uma classe geral de conceitos. Se pedirmos que os alunos dêem vários exemplos, já seus conhecidos, de animais que amamentam seus filhotes, podemos levá-los a deduzir que, por esse motivo, tal tipo de animal é chamado mamífero. Como você pode deduzir, esse tipo de aprendizagem permite a reconciliação integrativa dos conceitos.

c) Aprendizagem por Combinação, que se refere àquelas situações de aprendizagem nas quais o que está sendo aprendido não é mais específico nem mais abrangente do que aquilo que o aluno sabe a respeito do assunto. Portanto não é possível estabelecer uma relação subordinada nem supra-ordenada para permitir os

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ganchos cognitivos. Nesses casos, via de regra, o aluno nunca ouviu falar sobre ao assunto, assim não tem idéias próprias para relacionar com o que está sendo ensinado.

Em situações como essas, Ausubel sugere que sejam apresentadas idéias em combinação, ou ao mesmo tempo, para que o aluno compreenda a essência do que se está querendo ensinar. Combinando duas situações que ilustrem o conceito de reciclagem, por exemplo, o aluno pode deduzir o significado da palavra “reciclar”. Há outra situação que se torna inevitável à aprendizagem combinatória: quando o conteúdo em si somente pode ser explicado por meio da referência ao seu oposto (por exemplo, norte-sul, saúde-doença, normal-anormal).

Organizadores Prévios

Um Organizador Prévio serve para apresentar antecipadamente e, de forma mais abrangente e geral, o que será ensinado em aula. O que diferencia os organizadores prévios de resumos ou sumários, que já conhecemos, é o seu grau de generalidade, abstração e inclusividade. Normalmente, um resumo é uma pequena amostra de um texto maior, com uma linguagem idêntica à do texto base. Ele sintetiza os principais pontos de um texto, para que fi xemos esses pontos e, mais tarde, lembremo-nos do que trata o texto.

Os organizadores prévios, por outro lado, devem utilizar idéias mais genéricas ou amplas, de modo a facilitar a formação de uma estrutura conceitual de referência, a partir da qual o aluno poderá integrar as novas informações à sua estrutura cognitiva ou aí ancorá-las. Por exemplo: para prepará-lo(a) para estudar a próxima seção poder-se-ia ter:

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Na próxima seção, você conhecerá dois autores, Galperin e Talìzina, que procuraram desenvolver teorias similares à de Ausubel, ou seja, com a intenção de oferecer ao professor orientações sobre como ele pode organizar os conteúdos que trabalhará com seus alunos em sala de aula. Galperin e Talìzina são pesquisadores e seguidores de Vygotsky e Leontiev, e só, muito recentemente, vêm sendo estudados no Brasil.

Galperin e Talìzina, assim como Ausubel, criticam os modelos didáticos adotados pelas escolas tradicionais as quais utilizam métodos de ensino que tendem a produzir uma atitude de passividade no aluno. É que não lhe ensinam meios para compreender como aprendeu a resolver uma tarefa, tampouco para fazer transposição dos conhecimentos aprendidos a situações novas.

Ao estudar esses autores, você descobrirá novas estratégias, embasadas na Teoria da Atividade, para conduzir o processo de ensino em sala de aula, de modo que o aluno torne-se autônomo no seu processo de aprendizagem.

Mapas Conceituais

Desenvolvidos por Joseph D. Novak durante os anos 70, os mapas conceituais constituem-se numa das mais recentes estratégias de ensino desenvolvidas a partir da Teoria da Assimilação Cognitiva de Ausubel.

Você pode tentar compará-lo a um mapa geográfi co de um país, no qual são delimitados os estados por cores diferentes, destacadas as capitais com símbolos próprios para serem diferenciadas de cidades comuns e, mesmo, identifi car as estradas que ligam dois estados ou duas cidades por letras específi cas (BR, SC, etc). Um mapa geográfi co é a representação gráfi ca de um território. Serve unicamente para orientar as pessoas na sua locomoção dentro desse território.

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Os mapas conceituais são, entretanto, mais versáteis do que os mapas geográfi cos, na medida em que podem ser feitos para atingir diversos fi ns: para organizar uma disciplina, sistematizar os conceitos de uma teoria, avaliar o que o aluno aprendeu, ou como estratégia de ensino.

Ao produzir um mapa conceitual, o aluno pode querer organizar um esquema gráfi co do que estudou, com base em seus conceitos-chaves. Isso poderá ajudá-lo a diferenciar o que é importante do que é secundário naquilo que leu, e relacioná-los entre si (se por subordinação, por supra-ordenação ou por combinação) através de palavras conectoras, por exemplo.

Num sentido mais abrangente, os mapas conceituais podem ser entendidos como ferramentas para auxiliar os alunos a realizarem os nexos lógicos entre conceitos, idéias ou proposições de uma teoria e por meio de um diagrama de signifi cados (MOREIRA, 1997).

A versatilidade de um mapa conceitual é bem descrita por Moreira (1997, p. 2):

É possível traçar-se um mapa conceitual para uma única aula, para uma unidade de estudo, para um curso ou, até mesmo, para um programa educacional completo. A diferença está no grau de generalidade e inclusividade dos conceitos colocados no mapa. Um mapa envolvendo apenas conceitos gerais, inclusivos e organizacionais pode ser usado como referencial para o planejamento de um curso inteiro, enquanto que um mapa incluindo somente conceitos específi cos, pouco inclusivos, pode auxiliar na seleção de determinados materiais instrucionais. Isso quer dizer que mapas conceituais podem ser importantes mecanismos para focalizar a atenção do planejador de currículo na distinção entre o conteúdo curricular e conteúdo instrumental, ou seja, entre o conteúdo que se espera que seja aprendido e aquele que serve de veículo para a aprendizagem. O conteúdo curricular está contido em fontes de conhecimento tais como artigos de pesquisa, ensaios, poemas, livros. Mapas conceituais podem ser úteis na análise desses documentos a fi m de tornar adequado para instrução o conhecimento neles contido. Considera-se aqui que o currículo se refere a um

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conjunto de conhecimentos. Sendo assim, a análise da estrutura do conhecimento implica a análise do currículo e o mapeamento conceitual pode ser um instrumento útil nessa análise.

Veja o exemplo a seguir apresentado por Moreira (1997), bastante apropriado por se aplicar a essa teoria:

Figura 4.2: Alguns conceitos básicos da Teoria de Ausubel (Moreira e Buchweitz, 1993).

Para fi nalizar, parece oportuno oferecer a você a contribuição de Moreira (1997, p 11), no que diz respeito às etapas de construção de um Mapa Conceitual.

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Como construir um mapa conceitual1. Identifi que os conceitos-chave do conteúdo que vai

mapear e ponha-os em uma lista limite entre 6 e 10 o número de conceitos.

2. Ordene os conceitos, colocando o(s) mais geral(is), mais inclusivo(s), no topo do mapa e, gradualmente, vá agregando os demais até completar o diagrama de acordo com o princípio da diferenciação progressiva.

3. Se o mapa se refere, por exemplo, a um parágrafo de um texto, o número de conceitos fi ca limitado pelo próprio parágrafo. Se o mapa incorpora também o seu conhecimento sobre o assunto, além do contido no texto, conceitos mais específi cos podem ser incluídos no mapa.

4. Conecte os conceitos com linhas e rotule essas linhas com uma ou mais palavras- chave que explicitem a relação entre os conceitos. Os conceitos e as palavras-chave devem sugerir uma proposição que expresse o signifi cado da relação.

5. Evite palavras que apenas indiquem relações triviais entre os conceitos. Busque relações horizontais e cruzadas.

6. Exemplos podem ser agregados ao mapa, embaixo dos conceitos correspondentes. Em geral, os exemplos fi cam na parte inferior do mapa.

7. Geralmente, o primeiro intento de mapa tem simetria pobre e alguns conceitos ou grupos de conceitos acabam mal situados em relação a outros que estão mais relacionados.

8. Talvez neste ponto você já comece a imaginar outras maneiras de fazer o mapa, outros modos de hierarquizar os conceitos. Lembre-se de que não há um único modo de traçar um mapa conceitual. À medida que muda sua compreensão sobre as relações entre os conceitos, ou à medida que você aprende, seu mapa também muda. Um mapa conceitual é um instrumento dinâmico, refl etindo a compreensão de quem o faz no momento em que o faz.

9. Compartilhe seu mapa com colegas e examine os mapas deles. Pergunte o que signifi cam as relações, questione a localização de certos conceitos, a inclusão de alguns que não lhe parecem importantes, a omissão de outros que você julga fundamentais. O mapa conceitual é um bom instrumento para compartilhar, trocar e “negociar” signifi cados.

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SEÇÃO 3 - Abordagens psicológicas da aprendizagem escolar: contribuições de Galperin e Talìzina.

Galperin, assim como Ausubel, procurou desenvolver uma teoria comprometida com a melhoria das condições em que ocorre o processo de ensino-aprendizagem em sala de aula. Entretanto, seguindo a base fi losófi ca marxista e os pressupostos da Teoria Histórico-Cultural e da Atividade que você estudou na unidade 2 deste livro, propôs um modelo chamado formativo-conceitual, que preconiza o aprender por meio da prática. Galperin não estava preocupado apenas com o saber, mas, também, com os modos de fazer do aluno.

Neste sentido, procurou desenvolver uma estratégia de ensino que leva o aluno a compreender, por meio da atividade compartilhada com o professor, e depois a explicar como e por que conseguiu fazer uma determinada tarefa. O objetivo aqui é dominar os meios instrumentais de resolver uma situação-problema e transpô-los a novas situações.

A atividade de ensino do professor envolve ensinar a aplicar um esquema de referências conceituais (dicas) dirigidas para a aquisição de um método global de análise do conteúdo a ser aprendido (identifi cação dos invariantes). A atividade de aprendizagem do aluno, inicialmente vinculada à atividade de ensino do professor, vai, progressivamente, tornando-se autônoma, de modo a descobrir a melhor maneira de conjugar todas as características da ação (orientação, execução, problema e contexto), tomando a decisão sobre como agir para resolver o problema.

Organização da atividade de ensino-aprendizagem em sala de aula

Galperin é um autor contemporâneo que deu seguimento ao estudo da Teoria da Atividade, e suas contribuições representam um grande impacto na educação escolar da atualidade. Para fi ns desse livro pedagógico, seria impossível resumir todas as suas idéias para o ensino escolar. Por isso, destacamos de sua teoria, o modo como sintetiza os quatro momentos fundamentais da atividade de estudo em sala de aula e destaca o professor como mediador fundamental nesse processo.

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Segundo o autor, o processo de assimilação de um conteúdo escolar por parte de um aluno é regido de acordo com uma lógica psicológica particular, a qual deve ser identifi cada pelo professor, a fi m de que esse possa organizar a atividade de estudo do aluno de forma coerente e conseqüente. Sintetiza suas idéias em quatro etapas que o professor deve desenvolver na sua atividade de ensino para orientar a atividade de aprendizagem do aluno: a etapa da motivação, da orientação, da execução e da avaliação do processo de ensino-aprendizagem (REZENDE; VALDES, 2006).

O primeiro momento de atividade de estudo do aluno é a Etapa Motivacional. Assim como Ausubel, Galperin entende que o professor deve ter a habilidade de identifi car o nível de motivação do aluno para o aprendizado. Caso identifi que um baixo nível de motivação, o professor deve ser capaz de promover, por meio de estratégias específi cas, um nível apropriado de motivação para que o aluno desenvolva um tipo particular de atividade de estudo: a atividade de estudar para aprender, em oposição ao estudar para fazer prova ou qualquer outro motivo que descaracterize o estudar como verdadeira atividade, tal como proposto por Leontiev.

Nesse contexto, motivação é defi nida como uma disposição cognitivo-emocional do aluno para desenvolver a atividade de estudo, com vistas a atingir a fi nalidade de aprender, atendendo a objetivos intermediários, pré-estabelecidos e conscientizados.

O papel da conscientização dos objetivos da aprendizagem pelo aluno foi bastante discutido por Talìzina (1988), uma outra autora contemporânea que desenvolve alguns aspectos da Teoria da Atividade aplicada à Educação Escolar. Para Talìzina (1988), o desenvolvimento da motivação no aluno depende, em grande medida, do modo como os objetivos da atividade lhe são apresentados.

Ao iniciar um novo conteúdo, o professor deve enunciar os objetivos de modo claro, tornando-os atingíveis e interessantes para os alunos. Essa é a premissa para que se gere no aluno, a motivação para querer atendê-los. Para ser motivadora, uma tarefa deve respeitar as possibilidades cognitivas, defi nidas pelos conhecimentos prévios que possui e pelo modo como aprende (seu

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estilo cognitivo). Assim, as tarefas apresentadas pelo professor devem ser orientadas com vistas à sua solução e de modo que possam ser executadas pelo aluno.

Seguindo os pressupostos fi losófi cos da Teoria Histórico-Cultural e da Teoria da Atividade, Galperin (1982) entende que a força que dinamiza a atividade de aprendizagem do aluno é a contradição. Nesse caso particular, seria a contradição entre as habilidades e conhecimentos já assimilados e dominados pelos alunos e as novas necessidades que surgem na sua esfera de motivos, mediante a atividade de ensino do professor. Essas necessidades, num primeiro momento são geradas a partir de fora, quando o professor apresenta um conteúdo interessante ao aluno. Ao longo do processo de aprendizagem, as necessidades que aparecem na esfera interpessoal são internalizadas pelo aluno e passam a integrar a sua personalidade, tornando-se necessidades cognoscitivas, ou de conhecer. Uma vez internalizadas, tornam-se habilidades próprias do aluno, e o aluno se torna progressivamente independente no seu processo de aprendizagem. Dessa forma, se orientarmos o aluno com os meios apropriados, criando motivos para que ele queira aprender, estamos simultaneamente tornando-o cada vez mais autônomo como estudante.

Trata-se de criar um confl ito cognitivo no aluno, mas num nível tal, que seja percebido como superável pela sua própria atividade mental, para que esse confl ito converta-se em motor para a sua auto-superação. Ao tentar superar o confl ito cognitivo gerado pela tensão entre o saber e não-saber, o aluno precisa empreender esforços para assimilar as habilidades e os conhecimentos que lhe faltam, e que se tornaram vitais, pois se converteram em motivos de ação.

Ainda seguindo os pressupostos vigotskianos, Galperin (1982) entende que toda atividade de aprendizagem deve assumir um signifi cado pessoal, tanto cognitivo quanto emocional, para o aluno (REZENDE;VALDES, 2006). Dito de outra forma, o aluno deve encontrar sentido dentro do seu universo cultural e simbólico, para que as atividades de aprendizagem sejam motivadoras. Quanto mais sentido pessoal os alunos encontrarem

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naquilo que estudam, mais sua atividade de estudo é movida pela necessidade interna de aprendê-la e de encontrar uma utilidade prática nela.

Você tende a ter interesse por conteúdos que dizem respeito à sua vida, à sua realidade, e que, no futuro, o(a) auxiliarão na resolução de outras tarefas práticas do seu cotidiano. Assim, em geral dedica mais tempo de estudo a eles.

Para fi nalizar, você deve estar percebendo que o modo como o conceito de motivação é tratado por esses autores difere bastante do que se entende por motivação no senso-comum. Geralmente, a palavra motivação remete a uma qualidade psíquica natural, presente em alguns alunos -- e, em outros, não--, que depende muito mais de suas características individuais (de personalidade, de inteligência, do gosto pelo estudo etc). Na realidade, a motivação desenvolve-se junto com esses aspectos individuais, por meio de diferentes infl uências educativas.

A motivação é aqui apresentada, portanto, como atividade psíquica superior, desenvolvida nas inter-relações propiciadas pela educação parental, familiar e escolar. No contexto da educação formal, deve ser mediada pela atividade educativa do professor e por ele monitorada durante todo o processo de assimilação de conhecimento do aluno, e, não apenas impulsionada no momento inicial desse processo.

Etapa de orientação da atividade: é o momento destinado à apresentação de uma tarefa pedagógica ao aluno, concomitante à explicitação do seu objetivo específico e dos procedimentos para realizá-la. Galperin entende que é necessário estabelecer junto ao aluno uma base orientadora da atividade (BOA).

A BOA permite aos alunos ter uma imagem antecipada dos objetivos a serem alcançados e dos modos de ação necessários para atingi-los. O estabelecimento da BOA por parte do professor é condição necessária para que o aluno inicie a atividade de estudo de forma consciente e assuma autonomamente sua execução. Além disso, ao internalizar progressivament e a base de orientação oferecida pelo professor para desenvolver a tarefa pedagógica, ele não apenas tem mais chances de executá-la com

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sucesso, mas acaba assimilando os modos de fazer e de pensar a tarefa.

Nesse sentido, dentro desse referencial teórico-metodológico de ensino, não basta que o aluno chegue ao resultado correto. É necessário que, além disso, ele seja capaz de entender como e por que chegou a um determinado resultado. Muitas vezes, o aluno utiliza o raciocínio e os procedimentos corretos para resolver um problema, mas, por um descuido mínimo (de não colocar uma vírgula no lugar correto, por exemplo), não chega ao resultado desejado. Se o professor não estiver atento ao processo, e sim, apenas ao resultado, o esforço desse aluno terá sido em vão e, portanto, desmotivador.

Mais uma vez, fi ca bem evidente a importância de se estabelecerem os objetivos do ensino de forma clara, os quais, para o autor, são entendidos como guias orientadores do processo de ensino-aprendizagem. A clarifi cação de objetivos, na etapa de Orientação da Atividade, possibilita o desenvolvimento de uma atitude ativa e autônoma frente ao professor e aprendizagem.

Etapa de execução da atividade e de sistematização do conteúdo: nesse terceiro momento do trabalho pedagógico, pode-se observar, com mais nitidez, o caráter compartilhado da atividade de ensino-aprendizagem. Uma vez motivado a estudar para aprender e internalizada a base de orientação da atividade, aluno e professor iniciam ações específicas de ensino e de estudo voltadas para fins comuns. Assim, além de parceria, respeito, cooperação e sensibilidade, essa etapa promove uma clara diferenciação de papéis.

Cabe ao professor demonstrar as ações e operações necessárias para realizar a tarefa, no plano material ou materializado. Em seguida, o aluno deve ser convidado a buscar executá-la por conta própria, ainda com a ajuda da orientação verbal externa do professor. Num passo posterior, o aluno explica como realizar a tarefa, e demonstra verbal ou grafi camente como realizá-la, o que signifi ca que “o como fazer” saiu da esfera interpessoal e passou para a esfera intrapsicológica do aluno (o que Vygotsky chamou de internalização).

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No passo seguinte, as ações práticas e verbais orientadas à realização da tarefa são transformadas em ações mentais, o que resulta em assimilação dos conhecimentos e das habilidades essenciais à realização da tarefa, por parte do aluno. Nessa etapa, já não há mais necessidade de o aluno verbalizar em voz alta o que é necessário ser feito. É seu pensamento que orienta suas ações.

Finalmente, após ter assimilado os meios procedimentais de realizar a tarefa com autonomia, o aluno torna-se capaz de transferir essa BOA para resolver problemas semelhantes. Além disso, pode ser capaz de desenvolver procedimentos práticos, verbais e mentais similares para resolver novas tarefas, o que é premissa para todo processo criativo.

Etapa de avaliação da atividade: o desenvolvimento bem sucedido de uma tarefa pedagógica e o domínio, por parte do aluno, dos procedimentos e ações mentais envolvidos na sua execução não ocorre de modo mecânico, mas é resultado de um processo dinâmico, compartilhado e monitorado em suas diferentes etapas.

A etapa de avaliação da atividade consiste em momentos de observação ou monitoramento e controle da atividade realizada pelo professor e pelo aluno, tendo como base os objetivos previamente estipulados e conscientizados. Nesse sentido, a avaliação não é do produto da aprendizagem, mas de todo o processo envolvido nas diferentes formas de execução das ações que levam à assimilação dos conhecimentos e habilidades (nas formas material, verbal e mental).

Aqui pode ser destacada, mais uma vez, a natureza compartilhada do processo educativo. A avaliação do desempenho do aluno precisa ser feita em correspondência com a avaliação da atividade do professor, sem se deixar de considerar as condições concretas nas quais a atividade transcorreu. Finalmente, e em concordância com os pressupostos teóricos vigotskianos, toda avaliação deve levar em conta os níveis reais e potenciais do aluno.

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SEÇÃO 4 - Práticas educativas informais: implicações para a educação formal

As práticas educativas informais englobam o conjunto de ações adotadas pelos pais ou cuidadores que visam a educar, a promover a socialização e a monitorar a conduta dos fi lhos (GOMIDE, 2004). Envolvem estratégias verbais, posturas, atitudes e atos que os pais empregam em contextos específi cos de educação para promover, ou inibir, comportamentos infantis que julgam ser apropriados, ou não.

De um modo bastante sintético, as práticas positivas podem ser classifi cadas em dois tipos:

monitoria positiva (acompanhamento e supervisão das atividades dos fi lhos, com adequada distribuição de atenção, privilégios, afetos e regras); e,comportamento moral (criação de um contexto propício ao desenvolvimento de valores pró-sociais, como empatia, senso de justiça, generosidade, responsabilidade quanto às conseqüências dos seus comportamentos).

As práticas educativas negativas podem ser vistas nas diferentes formas de negligência (ausência de cuidados físicos e afetivos), abuso físico ou psicológico (coerção por meio de chantagem, punições físicas, ameaças de abandono ou de castigos severos, etc), na disciplina relaxada (ausência de estabelecimento ou de controle de regras), na punição inconsistente (que é determinada pelo estado de humor dos pais e não, pelo comportamento do fi lho) e na monitoria negativa (controle excessivo, por meio de exigências e instruções, com a criação de um ambiente hostil e perseguidor para os fi lhos, e ausência de afeto e respeito pela individualidade). (GOMIDE, 2004; De SALVO et al, 2005). O conjunto de práticas adotadas pelos pais, que têm por base as crenças, valores e expectativas acerca da sua infl uência educativa no desenvolvimento de seus fi lhos, resulta em diferentes estilos parentais.

Modelos de estilos parentais foram propostos por alguns autores, em correspondência com as infl uências danosas ou benéfi cas que tendem a produzir nos fi lhos. Estudos desse tipo

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estão mais interessados em descobrir evidências empíricas de que haja uma correlação signifi cativa entre comportamento e crenças paternas e maternas e desenvolvimento infantil, ainda que não neguem as diferenças individuais derivadas das particularidades de desenvolvimento de cada criança (fatores genéticos, temperamento, formas de apego). Suas implicações práticas tornam-se particularmente relevantes para a psicologia da educação, do desenvolvimento e da personalidade e para as ciências da educação, de forma particular.

Por trás dos estilos e das práticas educativas que os pais adotam, está à idéia de uso e distribuição de Poder. O poder na relação parental foi estudado por Hoff man (1960 apud CECONETTO entre outros, 2003). Partindo da premissa de que o poder autoritário representa o potencial de uma pessoa para convencer, coagir ou obrigar uma outra a agir de maneira contrária à sua própria vontade, concluiu que os pais educam seus fi lhos através de estratégias indutivas, ou coercitivas. As primeiras visam a desenvolver na criança a capacidade de vislumbrar o impacto do seu comportamento em outras pessoas, por meio do raciocínio lógico, levando-a a concluir sobre as necessidades de mudança no seu modo de agir, no seu comportamento.

Por outro lado, as estratégias que usam de meios coercitivos podem envolver desde ameaças de castigos ou retiradas de privilégios ou afeto, até punições físicas severas. Como é possível deduzir, a criança pode modifi car o comportamento indesejável, não porque compreende suas implicações para os outros, nem para sua vida futura (por exemplo, o afastamento dos amiguinhos devido à sua conduta agressiva nas brincadeiras), mas porque teme a reação punitiva dos pais.

A criança é condicionada, mais do que educada a comportar-se de modo sociável.

Além de serem potencialmente mobilizadoras de emoções intensas e prejudiciais ao desenvolvimento autônomo e criativo da criança, essa estratégia educativa lhe impede a plena internalização de regras morais e de valores sociais. Isso porque, longe da monitora parental, as crianças tendem a reproduzir

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comportamentos coercitivos frente aos seus pares, o que torna esse tipo de educação, não apenas contraproducente, mas perpetuadora da violência intergeracional. Esse conjunto de práticas educativas pode ser agrupado em diferentes estilos parentais. (GOMIDE, 2004).

Maccoby e Martin (1983, in Costa, entre outros, 2000; CECCONELLO, 2003), partindo das possibilidades de combinações entre duas dimensões qualitativas da educação familiar - a responsividade e a exigência - propuseram quatro tipos de estilos parentais e suas relações com o comportamento infantil: os estilos autoritativo, indulgente, negligente e autoritário.

Pais autoritativos apresentam um alto nível de responsividade e de exigência, isto é, são sensíveis às necessidades e interesses dos fi lhos, dando-lhes apoio e orientações que favorecem a individualidade e a auto-afi rmação dos fi lhos e, ao mesmo tempo sabem exigir-lhes senso de responsabilidade, respeito aos cumprimentos de tarefas e regras sociais, com fi rmeza, tolerância e afetividade. Pais negligentes apresentam baixa responsividade e exigem muito pouco ou nada dos fi lhos, como se não se sentissem responsáveis pelo desenvolvimento da sua personalidade. Pais indulgentes tendem a ser excessivamente responsivos, mas pouco exigentes, sobrecarregando a criança de atenção e mimos e exigindo-lhe pouco controle do comportamento. Por último, pais autoritários são bastante exigentes e pouco responsivos, o que torna sua postura excessivamente crítica e policialesca e pouco afetiva com os fi lhos.

Estudos nessa área (por exemplo, COSTA, entre outros, 2000; CECCONELLO et al. 2003) concordam que o estilo parental autoritativo está mais fortemente relacionado com o desenvolvimento de aspectos positivos na personalidade dos fi lhos. Os demais estilos parentais tendem a estar relacionados com problemas de comportamento relacionados à agressividade, instabilidade afetiva, na primeira infância, e a condutas delinqüentes ou extremante passivas na adolescência. Além disso, aspectos relacionados à auto-estima, como o autoconceito, a autoconfi ança e o senso de competência também variam de acordo com o estilo parental.

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Como você pode perceber, os estilos parentais e as práticas educativas que os pais adotam na educação de fi lhos podem predizer uma série de competências sociais na criança e no adolescente (De SALVO, entre outros, 2005; ALVARENGA, Patrícia e PICCININI 2001 e GOMIDE, 2004).

E qual a relevância para que você, futuro profi ssional da educação, se familiarize com esses conhecimentos?

Como educador, você desenvolverá atividades educativas que ultrapassarão o campo dos conteúdos curriculares formais. Você constatará que os alunos também são crianças ou adolescentes dotadas(os) de capacidades individuais e histórias de vida únicas, cujas personalidades em desenvolvimento sofreram infl uências mais ou menos profundas de suas famílias. A forma como esses sujeitos orientarão suas ações futuras para atitudes pró-sociais, agressivas ou individualistas dependerá, em boa medida, da qualidade reforçadora ou inibidora que a escola exercer sobre a infl uência educacional promovida pela família.

Não se trata aqui de desrespeitar os valores culturais e as crenças familiares sobre o modo como devem educar os fi lhos. Trata-se de considerar a infl uência da educação escolar sobre a criança e sua estrutura familiar, bem como considerar a infl uência da cultura familiar nos modos de pensar e agir da criança. Além do mais, pais e mães, ainda que bem intencionados para promoverem a educação de valores positivos nos fi lhos, nem sempre o fazem por meio de estratégias efi cazes e eticamente aceitáveis para os padrões da sociedade atual, que, há mais de quase duas décadas, conta com um documento legal que defende os direitos da criança e do adolescente num estatuto - o ECA, instituído pela Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, da qual você certamente já ouviu falar. (ECA, 1990).

A ação educativa familiar é, preponderantemente, espontânea, baseada no ensaio e erro e, geralmente, infl uenciada pelas experiências positivas ou negativas de terem sido fi lhos, alunos e crianças um dia. Isso signifi ca que os pais e mães contam com o aprendizado retirado de sua própria educação, via seus modelos parentais, adicionados às experiências que ouvem de amigos, da

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orientação que recebem de especialistas, ou que lêem e ouvem nos veículos de comunicação, quando têm acesso a informações de qualidade.

Torna-se fundamental, portanto, buscar conhecer os valores e crenças que norteiam as práticas educativas e os estilos parentais e compreender suas possíveis infl uências sobre o desenvolvimento dos fi lhos.

Conhecendo o contexto educativo familiar, a escola pode dar aos pais orientação para aumentar as chances de acompanharem as crianças e adolescentes a sucederem como cidadãos produtivos e felizes. Trata-se, portanto, de buscar na família a parceria para conduzir de modo mais congruente a educação de valores democráticos, igualitários e humanitários, que são os pilares de uma sociedade justa e não-discriminatória, que todos almejamos.

Você fi naliza esta unidade aqui. Ao estudá-la, pôde delimitar o objeto de estudo da Psicologia da Educação na atualidade e conhecer as principais contribuições da Psicologia da Educação contemporânea para a compreensão das práticas educativas formais e informais.

Pôde compreender o processo de ensino-aprendizagem em sala de aula a partir de abordagens psicológicas contemporâneas: Ausubel, Galperin e Talìzina. Pôde identifi car os conceitos-chaves da Teoria da Assimilação Cognitiva de David Paul Ausubel e explicar suas contribuições para a compreensão da promoção da aprendizagem signifi cativa.

Conheceu, também, as produções teóricas atuais, derivadas da Teoria da Atividade de Leontiev aplicadas ao contexto atual da aprendizagem escolar: Galperin e Talìzina.

Além disso, compreendeu o papel da educação escolar na formação da personalidade dos alunos e as possíveis implicações das práticas educativas parentais nas condutas pró-sociais ou agressivas das crianças, com vistas a adotar uma abordagem compreensiva e preventiva na escola.

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Síntese

Falar de educação remete a que se pense além do papel da fi gura do professor, e também para que se reconheça a importância dos primeiros agentes socializadores, os pais ou cuidadores, com quem você, como futuro profi ssional da educação, precisará aprender a desenvolver um vínculo baseado no respeito recíproco e na confi ança, visando ao desenvolvimento integral da personalidade dos alunos.

Quando se fala do papel do professor no processo educativo, é possível que lhe venha à cabeça aquele profi ssional que instrui os alunos a realizarem tarefas escolares específi cas: resolver um problema de matemática, produzir uma redação ou descrever um fenômeno da natureza, por exemplo. Instruir envolve planejar, desenvolver e controlar as condições ideais para que o aluno aprenda e se desenvolva, por meio da resolução de tarefas pedagógicas específi cas. Entretanto, se é considerado o papel que a educação escolar assumiu na sociedade contemporânea, pode-se concluir que o papel do professor não pode se restringir à tarefa puramente instrutiva, ainda que essa, por si só, seja extremamente complexa e importante.

Isso porque a instrução de conteúdos está impregnada de aspectos éticos e morais que, de uma forma ou de outra, poderão promover mudanças nas emoções e na conduta geral do educando. Dito de outra forma, existe uma unidade indissolúvel entre os processos cognitivos e afetivos no processo de aprender.

Além disso, mesmo sem planejar, o professor, por meio de sua postura geral em relação aos fatos e acontecimentos que ocorrem em sala de aula ou fora dela, e de suas ações específi cas diante de situações que surgem inadvertidamente no cotidiano escolar, acaba servindo de modelo para orientar a formação de capacidades, habilidades e conhecimentos, fundamentais para o convívio social e para a tomada de decisões na vida futura do aluno.

Aliado ao modo como o aluno é educado no seio familiar, o modelo que o professor oferece pode ter repercussões positivas ou negativas para a personalidade do aluno, em termos de seu modo

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de compreender o mundo, conduzir suas relações interpessoais e adotar posturas socialmente condizentes com uma sociedade igualitária e tolerante às diferenças.

Você aprendeu com Ausubel e Galperin que a aprendizagem escolar não pode ser conduzida de forma mecânica, respaldada na memorização de informações irrelevantes para o aluno e seu contexto social. Isso implica dizer que aspectos motivacionais, como interesses, necessidade, desejo e motivos para aprender precisam ser conhecidos, respeitados pelo professor e promovidos nos alunos, quando esses, por si só, parecerem não ter condições de identifi cá-los. Todos os autores aqui apresentados concordam que os alunos interpretarão e darão sentido ao que aprendem com base em seus conhecimentos prévios e na percepção de que tais conhecimentos serão úteis para compreenderem a si mesmos e ao seu entorno social. A educação escolar, portanto, deve ter como ponto de partida e chegada a situação social concreta de vida dos alunos.

Com os teóricos da corrente russa da psicologia, derivada da Teoria da Atividade de Leontiev, você aprendeu que a atividade de ensino e aprendizagem, não pode ser vista como duas entidades desconectadas, ainda que cada uma tenha suas particularidades. A natureza bidirecional e recíproca que têm, deve-se ao fato de perseguirem a fi nalidade de produzir transformações qualitativas na personalidade de quem aprende.

Dito de outra forma, a aprendizagem está longe de ser um processo que envolve apenas transformações cognitivas no aluno. Para aprender, os alunos precisam ser orientados a desenvolver um processo de construção e reconstrução, não apenas de seus modos de compreender o mundo, com seus objetos e fenômenos, mas também de habilidades sociais, atitudes, afetos e valores que defi nem os diferentes modos de agir e sentir nesse mundo.

Com base nas contribuições de Ausubel, Galperin e Talìzina, você aprendeu que o professor deve conduzir o ensino na direção de solução de tarefas pedagógicas, que sejam percebidas como motivadoras pelos alunos, ou que criem neles uma necessidade interna para superarem a contradição vivenciada entre o conhecido e o desconhecido. A busca pela superação dessa contradição propiciará o desenvolvimento e o domínio de um

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sistema de ações que envolvem aspectos intelectuais, sociais, comportamentais e afetivos com relação ao processo de aprender.

Resumindo, a Psicologia da Educação atual oferece uma série de habilidades que são necessárias para você desenvolver competências específi cas em sua profi ssão, como educador. Entre elas, destacam-se:

identificar os conhecimento e capacidades reais e potenciais dos alunos, com base nos seus conhecimentos prévios e no modo como desenvolvem suas tarefas pedagógicas;

conhecer e valorizar a cultura familiar dos alunos, procurando intervir preventivamente nas situações que podem trazer danos psicológicos aos alunos;

promover um clima psicológico favorável ao aprendizado, caracterizado pelo respeito mútuo, pela promoção da auto-estima, da criatividade, do trabalho colaborativo, do sentimento de inclusão e pertença no grupo, oportunizando o máximo de trocas de experiências, de vivências e de construção coletiva de conhecimentos e habilidades;

dominar as estratégias de ensino que têm demonstrado ser eficazes na produção de aprendizagens significativas e na construção de personalidades criativas, autônomas e responsáveis pelo bem comum.

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Psicologia da Educação II

Unidade 4

Atividades de auto-avaliação

Para praticar os conhecimentos apropriados nesta unidade, realize as atividades propostas.

1 ) Com base no mapa conceitual sobre a teoria de Ausubel desenvolvido por Moreira (1997), que segue, sintetize o que você compreendeu dessa teoria, procurando utilizar todas as informações ali providas.

Figura 4.2: Alguns conceitos básicos da Teoria de Ausubel (Moreira e Buchweitz, 1993).

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2) Explique por que a Teoria de Formação das Ações Mentais por Estágios de Galperin pode ser útil na sua prática pedagógica futura.

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Unidade 4

3) Descreva como os estilos parentais e a práticas educativas se relacionam com os comportamentos das crianças e destaque a relevância desse conteúdo para a atuação do professor junto aos familiares.

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Saiba mais

Para aprofundar os assuntos estudados nesta unidade, sugere-se a leitura das seguintes obras:

AUSUBEL, D.P., NOVAK, J.D. e HANESIAN, H. (1978). Psicologia Educacional. Rio de Janeiro: Editora Interamericana, 1980.

ALVARENGA, Patrícia e PICCININI, Cesar. Práticas Educativas Maternas e Problemas de Comportamento em Pré-Escolares. Psicologia: Reflexão e Crítica, 2001, 14(3), pp. 449-460. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/prc/v14n3/7832.pdf.> Acesso em: 20m maio 2007

GOMIDE, Paula Inez Cunha. Inventário de estilo parentais. Petrópolis: Vozes, 2004.

MOREIRA, Marco Antonio, Mapas Conceituais e Aprendizagem Significativa, Apostila do Instituto de Física – UFRGS, adaptada em 1997, do artigo O ENSINO, Revista Galáico Portuguesa de Sócio-Pedagogia e Sócio-Linguística, Pontevedra/Galícia/Espanha e Braga/Portugal, n° 23 a 28: 87-95, 1988. Disponível em: <www. http://www.emack.com.br/info/apostilas/nestor/mapasmoreira.pdf> Acesso em: 12 abr. 2007.

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Para concluir o estudo

Caro(a) aluno(a),

Você acaba de concluir o estudo da disciplina Psicologia da Educação.

Mas, de acordo com o que você mesmo(a) estudou, o processo de apropriação de conhecimentos é contínuo e, justamente por isso, a fi nalização desta disciplina deve signifi car para você, o início de novas atividades de estudo, quer através da pesquisa autônoma (eletivamente, através dos autores citados nos Saiba Mais e nas referências), ou pelo ingresso em outros cursos de formação.

Foi pensando nisto que as autoras, ao elaborarem este livro, fi zeram uma compilação de pesquisadores renomados na área da Psicologia e Educação e planejaram os conteúdos desta forma: para que você tivesse acesso ao que há de mais signifi cativo e atual nesta temática; e, também, para que tivesse despertado em você o desejo de conhecer mais e mais, superando-se sempre no seu processo de formação profi ssional.

Esperamos que você tenha gostado da leitura desta disciplina e, acima de tudo, que ela possa contribuir para o seu exercício profi ssional atual ou futuro. E que os conteúdos apresentados sejam utilizados por você como ferramentas para a sua análise e pesquisa constantes nos contextos educacionais em que você estiver inserido.

Esperamos que você possa atuar, por meio de sua atividade docente, como um mediador no desenvolvimento da atividade mental construtiva dos seus estudantes, reconhecendo que, para que tal ocorra, um conjunto de fatores cognitivos, afetivos (relacionais) e conativos devem ser criteriosamente equacionados. E

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que, considerado isto, a produção da aprendizagem por parte dos seus estudantes permita que eles não apenas construam signifi cados mais complexos sobre os conteúdos estudados, mas que sejam capazes de atribuir a esses conteúdos um sentido pessoal progressivamente mais integrado. Sendo assim, os estudantes terão critérios pessoais para avaliar o conhecimento socialmente produzido até então e criar formas cientifi camente embasadas e socialmente orientadas, de pensar a sociedade, o que se desdobra em novas formas de compreensão e intervenção na realidade.

Assim você estará promovendo uma educação crítica e transformadora.

Sucesso em sua trajetória!

Ligia Maria Soufen Tumolo

Sandra Adriana Neves Nunes.

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Referências

AUSUBEL, David et al. Psicologia Educaciovnal. 2. ed. Rio de Janeiro: Interamericana, 1980.

ALVARENGA, Patrícia e PICCININI, Cesar. Práticas Educativas Maternas e Problemas de Comportamento em Pré-Escolares. Psicologia: Refl exão e Crítica, 2001, 14(3), pp. 449-460 disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/prc/v14n3/7832.pdf.> Acesso em: 05 mar. 2007.

BERNARDES M. E. M. Mediações Simbólicas na Atividade Pedagógica: contribuições do Enfoque Histórico-Cultural para o Ensino e Aprendizagem. 2006. 330 f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.

CECCONELLO Alessandra Marques, DE ANTONI, Clarissa e KOLLER, Sílvia Helena. Práticas educativas, estilos parentais e abuso físico no contexto familiar. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 8, num. esp., p. 45-54, 2003.

COLL, C., MARCHESI, A., PALÁCIOS, J (org.). Desenvolvimento Psicológico e Educação. Porto Alegre: Artmed, 2004. 1v.

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CRUZ, Cristiano Cordeiro (2001), Teoria de David Ausubel. Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação – Unicamp, www.decom.fee.unicamp.br/~cristia/#artigos.

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Sobre as professoras conteudistas

Ligia Maria Soufen Tumolo é graduada em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP), Especialista em Psicologia pela UNICAMP e Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Tem ampla experiência no Ensino presencial e a distância, tendo ministrado as disciplinas de Psicologia Geral, Psicologia Social, Psicologia Jurídica, Psicologia da Educação e Psicologia do Desenvolvimento. Possui vários artigos publicados na Área da Psicologia e Trabalho e também livros didáticos sobre Psicologia da Educação. É consultora da revista científi ca Espaço Acadêmico (www.espacoacademico.com.br). Já atuou como psicóloga nas áreas da Psicologia Clínica, Organizacional e Social. Atualmente trabalha como Assistente Pedagógica da Unisul e como tutora da UnisulVirtual.

Sandra Adriana Neves Nunes é graduada em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (1992) e Mestre em Psicologia pela Universidade de Greenwich, Londres (2000). Atualmente é professora visitante da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC/BA) e professora da Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC/BA). No último ano, desenvolveu atividades de ensino na graduação em Psicologia e na pós-graduação em Saúde Mental, com as disciplinas Processos Psicológicos Básicos, Teorias Construtivistas, Psicodiagnóstico, Psicopatologia e Práticas Educativas I e II. Também supervisionou estágios na área de Psicodiagnóstico. Na Especialização em Saúde Mental, trabalhou com a disciplina Transtornos Mentais e Comportamentais. No curso de Pedagogia, lecionou as disciplinas Educação Infantil, Educação Inclusiva e supervisionou Estágio em Educação Infantil, além de desenvolver atividades de extensão na área de Educação Infantil. Também participou de pesquisa e publicou artigos na

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área Ansiedade Humana. Atualmente, integra um grupo de pesquisa cadastrado no CNPq, intitulado “Resiliência e políticas socioeducativas”, coordenado pelo professor Dr. Renê Alexandre Giampedro. Neste, coordena uma linha de pesquisa com objetivo de compreender as particularidades envolvidas nas interações sociais precoces e as possíveis relações entre competência social infantil e características sociocognitivas paternas e maternas.

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Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação

Unidade 1

1) Como você estudou ao longo dessa unidade, o egocentrismo infantil caracteriza-se, principalmente, pela indiferenciação entre o próprio ponto de vista e o dos outros, ou entre a própria atividade e as transformações que ocorrem na realidade. Daí a difi culdade de a criança, antes dos sete anos de idade, resolver problemas que envolvem a lógica formal, a qual explica grande parte dos fenômenos que observamos na natureza. Explique (com suas palavras) o que você entendeu sobre esta passagem de texto. Apresente exemplos práticos.

R. Para responder a essa atividade de auto-avaliação, você deve ter claro que o modo como a criança pensa e compreende o mundo, antes de conseguir colocar-se no ponto de vista dos outros e antes de conseguir compreender a lógica que engendra o movimento dos fenômenos e processos naturais, é essencialmente intuitivo e baseado em suas próprias experiências e desejos. Para isso, você precisará descrever o que signifi ca pensar de modo intuitivo e egocentrado. Não se esqueça de fornecer exemplos que tornem mais clara a sua resposta.

2) Construa um texto breve sobre o desenvolvimento intelectual infantil e, nele, introduza os conceitos de adaptação, organização, assimilação-acomodação e equilibração. Procure usar suas próprias palavras e sua própria lógica de construção textual como meio de desprender-se do texto original. Isso lhe permitirá colocar seus próprios recursos cognitivos à prova, bem como servirá de base para você perceber as difi culdades de construir um texto escrito sobre um texto já assimilado.

R. Para construir esse texto, nada impede que você utilize outros textos de apoio, os quais poderão ser encontrados na internet ou na biblioteca. Procure, entretanto, evitar o recurso de cópia, pois, desse modo, o texto não constituirá uma produção sua. O objetivo dessa atividade de auto-avaliação é fazê-lo(a) construir um texto original, utilizando os conceitos que acabou de estudar, respeitando a coerência teórica da teoria piagetiana.

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Unidade 2

1) Considere uma situação de aprendizagem na qual você assume o papel de educador (se você ainda não atua na área, pense numa situação hipotética) e tem a responsabilidade de desenvolver atividades pedagógicas.

a) Quais os critérios que você utilizaria para a escolha da atividade pedagógica a ser desenvolvida com os alunos a partir do que estudou sobre a Psicologia Histórico-Cultural? Descreva - os.

R. Para elaborar uma atividade educativa, é necessário que o educador considere os seguintes aspectos: a atividade deve ser signifi cativa, isto é, promover o desenvolvimento de novos conhecimentos e novas habilidades por parte dos estudantes, de forma que estes possam atuar em sua realidade social de modo mais efi caz. Assim, os motivos (a motivação) dos estudantes serão mobilizados para que eles realizem a atividade, considerando que terão suas necessidades ou interesses atendidos por meio daqueles novos conhecimentos. O educador terá clareza dos objetivos que os estudantes deverão alcançar ao fi nalizar aquela atividade, bem como terá ciência de todas as ações e operações necessárias, para que estes objetivos sejam alcançados. O educador deve atuar como mediador neste processo, orientando constantemente os alunos para que eles possam realizar a atividade no plano externo e interno de forma coerente com os objetivos de aprendizagem que devem alcançar, o que promoverá um resultado em termos de novos conhecimentos e novas habilidades por parte dos estudantes, e, portanto, o desenvolvimento qualitativo de suas funções psicológicas e, também, enquanto seres humanos. Deve haver o privilégio de atividades coletivas para favorecer as trocas sociais (mediações).

b) Proponha uma atividade educativa baseada nestes critérios.

R. Esta resposta poderá ser melhor discutida no EVA da disciplina, pelas inúmeras possibilidades que ela apresenta.

2) Pesquise uma atividade de aprendizagem dos estudantes (pode ser pela observação prática do contexto educacional ou por meio da leitura de livros). Analise esta atividade a partir dos elementos componentes da atividade humana, na perspectiva de Leontiev.

Para tanto descreva e analise os seguintes aspectos:

Sujeitos;Objetos;Objetivos;

Motivos;Ações;Operações.

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R. Trata- se de uma pergunta com várias possibilidades de resposta e que poderá ser mais adequadamente respondida no EVA da disciplina. A seção 3 desta unidade serve como orientadora para a descrição e análise dos aspectos citados.

3) Considerando o que você estudou sobre a relação entre linguagem e pensamento no desenvolvimento humano e sobre o papel da educação e responda à seguinte pergunta:

De que forma os educadores devem priorizar a utilização da linguagem e do pensamento nas interações entre educadores e estudantes e entre eles, no contexto educativo?

R. A linguagem é o sistema de símbolos que permite a ocorrência das mediações sociais necessárias ao desenvolvimento humano.Neste sentido, o educador deve interagir por meio do diálogo com estudantes, em todas as atividades educativas, promovendo a capacidade dos estudantes de operar no nível simbólico, o que lhes permitirá trabalhar num plano teórico, fato este que permite a compreensão e análise da realidade numa perspectiva científi ca. Este processo é que assegura a ação crítica e transformadora do homem, por meio do desenvolvimento de sua capacidade de entender a realidade social presente, mas de projetar mudanças para a sua constante transformação.

Unidade 3

1) Leia contos infantis para crianças de sua convivência (com idades diferenciadas em torno de um, três e cinco anos) e observe como elas se comportam em sua afetividade, motricidade e cognição. Crie, portanto, um espaço de leitura para elas e na seqüência descreva suas observações, considerando a teoria walloniana.

R. Esta questão também poderá ser melhor discuta no EVA, mas o conteúdo da seção e da unidade encerra subsídios para respondê-la. O fundamental é que você preste atenção nas dimensões citadas acima e na média de idade das crianças para aprimorar seu aprendizado sobre o desenvolvimento; mas que tenha um olhar crítico para entender a singularidade de cada criança.

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2) Faça uma pesquisa (em sua realidade social / ou em sites) sobre as atividades que predominam nas fases de crianças e jovens que estão nos estágios categorial e da adolescência e descreva-as, considerando os aspectos centrais propostos pela teoria walloniana.

R. Aqui também você deverá encontrar crianças que estão no estágio categorial e se interessam por atividades que se relacionam ao conhecimento do mundo e a realização de experiências que as ajudem a entender os fenômenos da realidade. Verifi cará também como na adolescência as atividades em grupo são priorizadas, bem como a relação com os pares e o questionamento sobre a realidade social, a partir de uma perspectiva teórica e idealizadora. A questão da identidade e da imagem pessoal também ocupa lugar central nas atividades que os adolescentes desenvolvem.

Unidade 4

1) Com base no mapa conceitual sobre a teoria de Ausubel desenvolvido por Moreira (1997), que segue, sintetize o que você compreendeu dessa teoria procurando utilizar todas as informações ali providas.

R. Da mesma forma, para construir esse texto você poderá utilizar outros textos de apoio, que poderão ser encontrados na internet ou na biblioteca. Procure, também aqui, evitar o recurso de cópia, pois, desse modo, o texto não será uma produção sua. O objetivo dessa atividade de auto-avaliação é fazê-la(o) construir um texto original, utilizando os conceitos que acabou de estudar e o recurso de aprendizagem que Ausubel desenvolveu, respeitando a coerência teórica da sua teoria.

2) Explique por que a Teoria de Formação das Ações Mentais por Estágios de Galperin pode ser útil na sua prática pedagógica futura.

R. Nessa atividade de auto-avaliação, você precisará fazer um genuíno exercício de refl exão. Procure se apoiar no texto original e se reportar ao que sabe sobre o trabalho pedagógico, tanto em nível teórico como prático (se for possível). Trata-se de uma tarefa cognitiva que exige pensar a teoria estudada a partir de suas implicações práticas. Você pode conversar com colegas que tenham experiência prática de sala de aula para ajudá-lo(a) em sua realização.

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3) Descreva como os estilos parentais e a práticas educativas se relacionam com os comportamentos das crianças e destaque a relevância desse conteúdo para a atuação do professor junto aos familiares.

R. Para responder a essa atividade de auto-avaliação, você precisará, necessariamente, reler a seção que trata do assunto. Nela está descrita a tipologia oferecida por Gomide (2004) sobre as seis práticas educativas (duas positivas e quatro negativas) que se concretizam em estilos parentais e suas principais implicações no desenvolvimento de comportamentos pró-sociais e agressivos em crianças e adolescentes. Pense como futuro(a) educador(a) sobre como esse conhecimento, que dispõe de boa base empírica, poderá ajudá-lo(a) a compreender o comportamento de alguns alunos, não para rotulá-los ou marginalizá-los, mas, para com ética e responsabilidade profi ssional, pensar junto à direção da escola, em meios de trabalhar junto às famílias, no sentido de promover a conscientização sobre o efeito das práticas educativas parentais sobre o desenvolvimento psicológico dos fi lhos.

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