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Publicidade e consumo na infância: Estratégias publicitárias e resultados econômicos (São Paulo, 1969 a 1978). Deividi de Santana Silva* 1 Publicidade e Acumulação Tardia As agências de publicidade ou propaganda 2 no Brasil começaram a se desenvolver na década de 1920, contudo, as condições históricas para seu pleno desenvolvimento só foram possíveis na década de 1950, momento em que o modo de produção capitalista brasileiro passou por um “processo de industrialização pesada”. Segundo João Manuel Cardoso de Mello, o desenvolvimento capitalista neste período: “[...] implicou um crescimento acelerado na capacidade produtiva do setor de bens de produção e do setor dos bens duráveis de consumo antes de qualquer expansão previsível dos mercados” (MELLO, 1976: 117) Neste contexto histórico de mercado reduzido, em relação a capacidade produtiva instalada entre nós, a publicidade se tornou fundamental para ampliar as demandas de bens de consumo duráveis. De acordo como Maria Arminda Arruda este fato levou as agências de publicidade há uma nova de organização interna: [...] é preciso muito mais esforço para convencer a poucos a consumir mais do que induzir muitos a comprar bastante. “Este fato essencial empurra o setor publicitário em direção á organização empresarial, o que, indiscutivelmente aconteceria, *Mestrando pela Universidade, na linha Instituições, Vida Material e Conflito, turma 2015. Tem experiência na área de História, com ênfase na História e Historiografia do consumo, atuando nos principais temas: Publicidade e Consumo na infância no Brasil na década de 1970. Vice coordenador do Grupo de Estudos Sobre o Consumo no Mundo Contemporâneo registrado no Diretório Nacional do CNPq da Universidade Federal de São registro (dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/3468275717655657 ) 2 Há um extenso debate nas ciências humanas sobre o termo publicidade e propaganda. Ora estes conceitos costumam aparecer como sinônimos ou como conceitos incongruentes. Os que costumam trabalhar os termos publicidade e propaganda seguindo uma distinção que se encontra na raiz palavra que existe em língua inglesa/americana nas palavras advertising e propaganda. Seguindo o silogismo, o termo publicidade só aplicaria á publicidade com fim comercial, e, o conceito propaganda só se aplicaria com a finalidade política e ideológica. Contudo, considero que estas definições não podem ser tão estanques, pois correm o sério risco de tornar conceitos históricos em conceitos ahistóricos. Para tanto ao longo do texto utilizarei os termos publicidade e propaganda como sinônimos, pois sigo nos termos dispostos das Normas Padrão que regulam a atividade publicitária em caráter nacional, onde os termos Publicidade e Propaganda foi nos termos do art. 2º do Dec. nº 57.690/66, qualquer forma remunerada de difusão de idéias, mercadorias, produtos ou serviços por parte de um anunciante identificado. Considero que trabalhar nestes termos recuperamos a historicidade dos conceitos que devem ser compreendidos ao longo do tempo e espaço.

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Publicidade e consumo na infância: Estratégias publicitárias e resultados

econômicos (São Paulo, 1969 a 1978).

Deividi de Santana Silva*1

Publicidade e Acumulação Tardia

As agências de publicidade ou propaganda2 no Brasil começaram a se desenvolver na

década de 1920, contudo, as condições históricas para seu pleno desenvolvimento só foram

possíveis na década de 1950, momento em que o modo de produção capitalista brasileiro

passou por um “processo de industrialização pesada”. Segundo João Manuel Cardoso de

Mello, o desenvolvimento capitalista neste período: “[...] implicou um crescimento acelerado

na capacidade produtiva do setor de bens de produção e do setor dos bens duráveis de

consumo antes de qualquer expansão previsível dos mercados” (MELLO, 1976: 117)

Neste contexto histórico de mercado reduzido, em relação a capacidade produtiva

instalada entre nós, a publicidade se tornou fundamental para ampliar as demandas de bens de

consumo duráveis. De acordo como Maria Arminda Arruda este fato levou as agências de

publicidade há uma nova de organização interna:

[...] é preciso muito mais esforço para convencer

a poucos a consumir mais do que induzir muitos a

comprar bastante. “Este fato essencial empurra o

setor publicitário em direção á organização

empresarial, o que, indiscutivelmente aconteceria,

*Mestrando pela Universidade, na linha Instituições, Vida Material e Conflito, turma 2015. Tem experiência na

área de História, com ênfase na História e Historiografia do consumo, atuando nos principais temas: Publicidade

e Consumo na infância no Brasil na década de 1970. Vice coordenador do Grupo de Estudos Sobre o Consumo

no Mundo Contemporâneo registrado no Diretório Nacional do CNPq da Universidade Federal de São registro

(dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/3468275717655657 ) 2Há um extenso debate nas ciências humanas sobre o termo publicidade e propaganda. Ora estes conceitos

costumam aparecer como sinônimos ou como conceitos incongruentes. Os que costumam trabalhar os termos

publicidade e propaganda seguindo uma distinção que se encontra na raiz palavra que existe em língua

inglesa/americana nas palavras advertising e propaganda. Seguindo o silogismo, o termo publicidade só aplicaria

á publicidade com fim comercial, e, o conceito propaganda só se aplicaria com a finalidade política e ideológica.

Contudo, considero que estas definições não podem ser tão estanques, pois correm o sério risco de tornar

conceitos históricos em conceitos ahistóricos. Para tanto ao longo do texto utilizarei os termos publicidade e

propaganda como sinônimos, pois sigo nos termos dispostos das Normas Padrão que regulam a atividade

publicitária em caráter nacional, onde os termos Publicidade e Propaganda foi nos termos do art. 2º do Dec. nº

57.690/66, qualquer forma remunerada de difusão de idéias, mercadorias, produtos ou serviços por parte de um

anunciante identificado. Considero que trabalhar nestes termos recuperamos a historicidade dos conceitos que

devem ser compreendidos ao longo do tempo e espaço.

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com a presença dos grandes oligopólios, mais foi

certamente acelerada pela vigência dessas

condições”. (ARRUDA, 1978: 114)

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Contudo, a publicidade ainda não dispunha na década de 1950 e meados da década

seguinte, de veículos de comunicação na qual suas mensagens publicitárias pudessem circular

de modo massivo, para incentivar que cada vez mais pessoas aderissem ou almejassem uma

organização social em que o consumo de bens ou produtos industrializados informasse e/ou

incentivassem valores sociais e culturais.

Este processo ocorreu em um novo momento de inflexão do modo de produção

capitalista brasileiro, promovido no regime militar, em um momento de internacionalização

do capital (ORTIZ, 1988: 114), a consolidação deste processo encontrou seu auge na década

de 1970. Cabe ressaltar, como não nos deixa esquecer o historiador Fernando Novais:

capitalismo não é sinônimo de sistema econômico, o autor ressalta que capitalismo é um

sistema econômico, social, político e, sobretudo, ideológico (NOVAIS & FORASTIERI,

2011).

Neste momento, o desenvolvimento das agências publicitárias, foi alavancado por

meio da base tecnológica fornecida pelo Sistema Nacional de Telecomunicações e a da

modernização dos grandes conglomerados de impressos como da Editora Abril e audiovisuais

como a Rede Globo de Televisões. Cabe ressaltar, que essas transformações ocorreram em

consonância com o crescimento dos centros urbanos3, cujo espaço foi à base do mercador

consumidor a ser prospectado pelas agências publicitárias e lugar da afirmação e disputa de

novos bens simbólicos da moderna tradição brasileira (ORTIZ, 1998: 114)

Desta forma, as mensagens publicitárias se espraiaram podendo assim: agir de forma

massiva e intensa para todo um público que, consumidor ou não, terá diante de si uma

disseminação de representações e concepções de mundo em que a publicidade se tornou porta

voz principal deste processo de modernização brasileira.

É preciso salientar que a consolidação de nosso “Capitalismo Tardio” 4 cimentou

novas modalidades de dominação social e ideológica que passaram a ser transmitidas,

3 Daniel Roche, historiador francês do consumo, ao estudar o consumo de corte na França no século XVIII foi

enfático ao dizer que as transformações do consumo na corte francesa não residem na sociedade de corte, ou

seja, na esfera privada, mas nas mudanças na função nas cidades francesas no decorrer do século XVII e nos

novos valores em relação ao consumo. Esta conclusão nos serve para entender o desenvolvimento de uma

Sociedade de Consumo que se desenvolveu no espaço urbano. C. f. ROCHE, Daniel. Histórias das coisas

banais.Nascimento de uma sociedade de consumo séculos XVII e XIX. São Paulo, 2000, p. 46. 4 Utilizo o conceito “Capitalismo Tardio” baseado em João Manuel Cardoso de Mello. Para o autor “Capitalismo

Tardio” se refere ao nosso processo de industrialização retardatária trouxe nosso processo de modernização

baseado em uma estrutura social em que o consumo de bens industrializado acirraria, ainda mais, os contrastes

sociais ao combinar profundo desenvolvimento em nosso sistema capitalista combinando com profundas

desigualdades sociais. C.f. MANUEL, João Manuel Cardoso de. Capitalismo Tardio. Cia das Letras. 1976,

sobretudo, o terceiro capítulo a industrialização retardatária.

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também, pela publicidade e cujo a realização material correspondiam as condições de classe e

gosto5. Isto não quer dizer, por outro lado, que fatores como: o Estado e seu aparato

burocrático; a organização no mundo do trabalho e componentes das tradições culturais

perdeu sua importância na produção e reprodução das relações sociais, pelo contrário, muito

desses componentes ganharam maior alcance por meio da linguagem publicitária

ressignificado assim, o projeto de dominação ideológica da burguesia.

As novas formas de configuração social em que a publicidade se tornou porta voz

refletem as contradições históricas em nosso capitalismo. Desta forma, os anúncios de

mercadológicos aprofundaram preconceitos latentes em nossa sociedade e conservou nosso

desenvolvimento combinado e desigual6 por meio de uma esfera pública burguesa7.

Foram sob estas bases que a linguagem publicitária trabalhou na tentativa de abrir

novos nichos de mercados para bens de consumo que, em muitos casos, era inédito entre nós,

inclusive para grande burguesia. Neste sentido, a consolidação de um mercado de massas,

haja vista a nossa desigualdade social e os distintos gostos construídos historicamente, a

estratégia de segmentação de mercado se tornou um artifício fundamental para o mercado

publicitário fazendo com que determinados bens ou serviços se acomodassem com maior

sucesso na acumulação de capital.

A publicidade investiu pesado na segmentação do mercado para jovens, homens de

meia idade, idosos, donas de casa e crianças. A de se dizer que, a segmentação do mercado

não significou, de forma alguma, homogeneização do nicho de mercado que pretendia se

5 Não quero com esta afirmação propor estruturas sociais rígidas que impedem que indivíduos de rendas e

formas de sociabilidades diferentes consumam o mesmo produto ou bem de consumo. Pois o consumo e a forma

de consumir é uma das formas com que os indivíduos lutam por status social e procuram superar sua condição de

classe. C. f. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas, São Paulo. Perspectiva, 2005. Contudo,

quero ressaltar que o capital cultural e econômico são os principais determinantes para que determinados

indivíduos ou grupos consumam determinados bens ou produtos. 6 Há importantes estudos sobre a formação e as contradições do capitalismo brasileiro. C.f. CARDOSO,

Fernando Henrique. “O modelo político brasileiro” in ____. O modelo político brasileiro e outros ensaios. 2ª

edição. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1973; ____. e FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento

na América Latina. 8ªedição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004; FERNANDES, Florestan.

“Capitalismo dependente e imperialismo” in ____ Em busca do socialismo. Últimos escritos e outros textos.

São Paulo: Xamã, 1995. FERNANDES, Florestan. Sociedade de classes e subdesenvolvimento. Rio de Janeiro:

Zahar, 1996.

7 A utilização de esfera pública é feita através das afirmações do historiador inglês JamesThompson. Sobre a

constituição de uma esfera pública, o historiador aponta como principal definidor um dos principais nomes da

segunda geração da Escola de Frankfurt Jurgen Habermas. Habermas define como cimentos da esfera pública a

partir do aparelho do Estado e da ação da imprensa, estes dois motores, em consonância com os sujeitos

históricos, seriam os formadores principais de uma esfera pública que incorporava os pressupostos de uma

sociedade burguesa. C.f. THOMPSON, James. British Political Culture and the idea of Public Opinion, 1867-

1914. Cambridge: Cambridge University Press, 2013, pp. 7-9.

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atingir. Desta forma, podemos dizer que no caso brasileiro, consumo de massa e segmentação

de mercado não são antagônicos, mas sim parte de um mesmo processo interligado.

É dentro deste contexto, que os historiadores Olga Brites e Eduardo Silveira Neto

nos diz que a publicidade infantil8 começou, de forma cada vez mais intensa, a identificar a

criança em seus anúncios como consumidor “autônomo”. Esta modelo publicidade, segundo

os autores, se consolidou, entre nós, na década de 1970 em consonância com o nosso

desenvolvimento capitalista (BRITES & NUNES, 2012: 89)

Cabe ressaltar que embora o mercado publicitário brasileiro direcionado às crianças

passou a vê-las como consumidores “autônomos” isto não garantiu que os mesmos estivessem

livres, como os adultos, para consumirem ao seu gosto e poder aquisitivo. Embora o mercado

publicitário os compreendesse como consumidores “independentes”, as crianças continuaram

tutelada pelos adultos, ou seja, os que detinham o poder aquisitivo que propiciava o consumo

infantil.

É justamente nos anos de 1970 que, a linguagem publicitária que entendia a criança

como “autônoma” em suas escolhas começou a se espraiar nos grandes centros urbanos no

Brasil. Na cidade de São Paulo temos a Editora Abril como principal precursora desta forma

de fazer publicidade infantil que caracteriza o Brasil contemporâneo nos dias de hoje.

A Editora Abril se modernizou na década de 1960 e na década de seguinte se tornou

o principal conglomerado de impressos do Brasil com atuação importante nas grandes cidades

brasileiras e, sobretudo, na cidade de São Paulo, como principal veículo impresso utilizado

pelas agências publicitárias para divulgar a modernidade que poderia ser “conquista” por

novas relações no espaço publico que invariavelmente envolvia o consumo de bens. As

diversas revistas produzidas pela Editora Abril foram de fundamental importância para

expansão e segmentação do mercado de bens e produtos industrializados que imprimiram,

entre nós, uma estética social cada vez mais americanizada.

Maria Celeste Mira realizou importante estudo sobre a segmentação de mercado,

utilizado pela Editora Abril, para cooptar cada vez mais consumidores de setores médios e

altos da sociedade brasileira. É importante ressaltar, como demonstra a autora, que as

publicações das revistas produzidas pela editora em questão operavam para além das questões

8 Não cabe aqui resgatar todo o debate desenvolvido na historiografia sobre o que é infância. Cabe-nos explicitar

que a infância é uma construção social ao longo do tempo e espaço. Para conferir o debate sobre a construção

histórica da infância ver: ARIÈS. Philippe. História social da infância e da família. Rio de Janeiro, Guanabara,

1981. [Tradução Dora Flaksman]; GÉLIS, Jacques. A individualização da criança. In: ARIÈS, Philippe;

CHARTIER, Roger. História da vida privada v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1992; DELL PRIORI,

Mary (orgs) História da infância no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 2002

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de poder aquisitivo do consumidor em potencial, elas transitavam nas questões de gostos

construídos e ressignificado socialmente (MIRA, 2010).

As revistas, ao contrário de veículos como a TV, por necessitarem de investimentos

mais específicos em virtude de seu diminuto alcance, em relação à televisão, passaram cada

vez mais, a atuarem no fracionamento do mercado em consonância com as necessidades do

patrocinador.

Se por um lado a investigação histórica de Maria Celeste Mira sobre a divisão de

mercado apresentadas-nos magazines da Editora Abril é reveladora sobre a atuação do

mercado, por outro lado, a autora não percebeu o importante setor de mercado que na década

de 1970 se tornou importante alvo dos patrocinadores: as crianças.

Pesquisas empíricas realizadas por mim, em outros momentos de minha vida

acadêmica, e agora no mestrado revelaram que revistas infantis como os HQs da Turma da

Mônica e da Wall Disney e outras revistas da Editora Abril, destinados ao público adulto,

foram de suma importância para que o mercado de bens e serviços alcançassem os

consumidores infantis na cidade de São Paulo9.

As propagandas realizadas nesses impressos consolidaram uma linguagem

publicitária que percebiam as crianças como consumidores “independentes”, ou seja,

consumidores capazes de escolherem que bem ou produto poderiam ser consumidos de

acordo com suas vontades.

Se por um lado foi na década de 1970 que entre nós se consolidou uma linguagem

publicitária infantil de forma mediata e imediata tendo como alvo a criança como sujeito

“autônomo” e o modelo de sociabilidade impactados pelo consumo com características de uma

americanização, foi nesta mesma década que os debates sobre o uso da publicidade infantil

entram, de forma incisiva, para a pauta de discussões de palestras, congressos, colunas de

jornais e revistas publicitárias.

As discussões realizadas sobre a regulamentação infantil entre publicitários, setores

da comunidade cível e setores sociais ligados de forma mais direta ao mercado, em diversas

9 Em minha monografia analiso as publicidades voltadas para o publico infantil de modo mediato e imediato. As

publicidades que chamo de modo mediato são aquelas que mesmo voltadas de modo direto para os pequenos eles

prevêem o intercambio do adulto para a realização da compra do produto. Uma das frases características deste

modelo de se chegar ao consumidor infantil é: “peça para sua mãe comprar”. Os anúncios que defino como

imediato são aqueles que no enunciado da propaganda a apenas a criança aparece como alvo, como se apenas o

pequeno em questão tivesse o poder aquisitivo e/ou não houvesse a necessidade de um adulto para regular sua

escolha. C.f SILVA, Deividi de Santana. Propaganda e Consumo na Infância: Construção da criança como

consumidor “autônomo” (década de 1970). Monografia apresentada na Universidade Federal de São Paulo.

2014; ver também ROSSI, Eliane Pompeu. A criança consumidora: a genealogia de um fenômeno

contemporâneo 1950-2000. Tese de mestrado apresentada a Universidade Federal de Urbelândia.2007.

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revistas, colunas de jornais e fóruns publicitários dão o ar e a graça de minha analise realizada

no primeiro capítulo de minha tese de mestrado.

Que tipo propaganda infantil “Queremos”?

O II Congresso Brasileiro de Propaganda, realizado no Pavilhão da Bienal entre os

23 a 28 de fevereiro de 1969, no Parque do Ibirapuera, capital de São Paulo, entre suas pautas

realizou discussões direcionadas à publicidade voltada de forma direta para o público infantil.

Entre os publicitários reunidos não era consenso sobre a forma de se fazer anúncios

infantis, mas estava claro, em boa parte dos presentes, que o setor necessitava de uma

regulamentação e autonomia, principalmente, em virtude da ditadura militar implantada em

1964 e que mostrava ares de que poderia regulamentar a publicidade podendo assim: causar

sérios danos ao mercado e o(s) projeto(s) de civilização cuja publicidade havia se tornado

porta voz capital.

Já no III Congresso Brasileiro de Propaganda, realizado no Palácio das Convenções

entre os dias 17 a 20 de abril de 1978, no Parque do Anhembi, se atribuiu ao Conselho

Nacional de Autoregulamentarão: CONAR, a atribuição de estabelecer e aplicar normas do

Código Brasileiro de Autoregulamentarão. É importante ressaltar que: grande parte dos 50

artigos do Conar discute a regulamentação da publicidade infantil, sobretudo, no que tange o

consumo de alimentos industrializados e ensino.

A atribuição concedida ao Conar de regulamentar à publicidade, e de modo mais

especifico a publicidade infantil, não foi fortuita. Houve uma pressão da própria categoria de

profissionais ligados a propaganda e setores da comunidade civil organizada, sobretudo por

meio de colunas publicitárias, de debates em organizações publicitárias e outros setores da

sociedade para que as publicidades dirigidas aos pequenos passassem por um crivo de

fiscalização mais atuante10

Desta forma, a presente apresentação irá mostrar discussões sobre publicidades

infantis iniciadas no II Congresso de Propaganda Brasileira, em 1969, sobre publicidade

10 Já existia várias organizações de publicitários que procuravam regulamentar a profissão como: ANP (Agência

Nacional de Propaganda), APP (Associação Paulista de Propaganda), ABP (Associação Brasileira de

Propaganda), ACP (Associação Carioca de Propaganda) e projetos atuantes como o IVC (Instituto Verificador de

Comunicação) atuante desde 1962 e seguido pelas principais agências de propaganda, o código de ética

incorporado a lei 4. 680/65 que se tornou decreto de lei 57.690/66. Contudo, grande parte das agências achavam

insuficiente essas normas para dar basilar uma atividade crucial para o desenvolvimento da sociedade brasileira.

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infantil que continuaram em vários meios11, principalmente na cidade de São Paulo e Rio de

Janeiro, cidades em que o nosso “Capitalismo Tardio” encontrou sua forma mais acabada, ao

III Congresso de Propaganda Brasileira, em 1978, no qual se criou o CONAR.

Muito embora, não serão discutidos nesta apresentação de modo mais detido, deve se

pontuar que os debates analisados estão em consonância com as transformações ocorridas na

cidade de São Paulo como: crescimento urbano, transformações no parque industrial, novas

de vivências públicas impactados por novas formas de consumo.

O debate sobre a regulamentação publicitária e a propaganda infantil, de modo mais

específico, não foi exclusividade do Brasil, pelo contrário, países onde o modo de produção

capitalista já possuía certa maturidade e onde os anúncios de caráter mercadológico foram

peças chaves na construção de uma Sociedade de Consumo Moderna, órgãos reguladores da

atividade profissional eram atuantes.

Este processo se deve a dois fatores fundamentais: a expansão da propaganda como

elemento fundamental no processo de acumulação capitalista e o processo de mundialização

da cultura ao longo do século XX12. Muito, embora processos como a feitura publicitária e

órgãos da regulamentação começaram a ser generalizado ao longo do globo terrestre isto não

que dizer que foram iguais. Foram, em alguns casos, parecidos em muitos aspectos, mas

nunca iguais.

Desta forma, os processos históricos devem ser entendidos ao longo do tempo e

espaço. Ou seja, dentro do movimento histórico as quais estão inseridos de acordo com as

condições materiais e culturais específicas.

Em se tratando de órgãos de regulamentação da publicidade e, em especifico, a

propaganda infantil que nos interessa para a presente apresentação, os processos históricos

que mais nos influenciaram foram os de origem estadunidense e francesa, muito embora

outros órgãos regulamentários como de países como a Alemanha, Suíça, Bélgica tenham sido

11 Há ANP (Agência Nacional de Propaganda), APP (Associação Paulista de Propaganda), ABP (Associação

Brasileira de Propaganda), ACP (Associação Carioca de Propaganda). Entre outras associações do gênero, nos

anos de 1970, discutiram em seus congressos os modos de fazer publicidade infantil. As discussões variavam de

temas como: pesquisas de mercado, formas de fazer o anúncio em si e debates éticos e morais, entre outros

temas. Tem sido função do pesquisador deste projeto, junto a Associação Nacional de Memória da Propaganda,

organizar estes congressos com a finalidade de ajudar a atual pesquisa e futuras pesquisas de outros

pesquisadores, haja em vista a importância do material para se compreender momentos importantes da história

contemporânea brasileira. 12 Sem negligenciar a especificidade histórica Renato Ortiz nos diz que o século XX é marcado por um processo

de mundialização. Para o autor, no século XX, as cidades ao longo do globo terrestre passam se assemelhar cada

vez mais entre si por compartilhar códigos sociais que são muito próprios entre si. Este espaço impessoal, no

qual o indivíduo se transforma um usuário, isto é, em alguém capaz de decodificar a intengibilidade funcional a

malha que o envolve. O autor nos ressalta que estas construções sociais mundializadas estão impregnadas pelas

tradições que a legitimam. C. f ORTIZ, Renato. Mundialização e cultura. Rio de Janeiro. Ed. Brasiliense. 1994

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citados, mas raramente aprofundados. Farei uma analise, nos próximos parágrafos, de dois

artigos que mostram posições dissonantes quanto à regulamentação publicitária infantil e suas

possíveis implicações na forma que a propaganda se consolidou entre nós.

Na Revista Bloch de Comunicação, o artigo traduzido de Elisabeth Gérin, intitulado

Código de Publicidade para Jovens13, nos é muito esclarecedor para entendermos um projeto

de publicidade infantil inspirado Federação Francesa de Publicidade destinada a jovens e

crianças. Segundo o documento a propaganda deveria ser regulada por um órgão que não

fosse composto por apenas publicitários e sim por uma comissão mista. Elogiando a eficácia

de uma composição mista de profissionais, a autora escreveu:

[Os] membros da Federação Francesa

de Publicidade, psicólogos, educadores,

estabeleceram um conjunto de princípios a serem

respeitados pelas campanhas publicitárias

destinados aos jovens [ao longo do texto a autora

parece utilizar jovem e criança como sinônimos

ou processos integrados]. Foi assim que nasceu o

Código da Publicidade destinada á Infância, cuja

eficácia dedo se fez sentir no plano da higiene

mental e da proteção da juventude14

Como observamos acima, a propaganda destinada aos mancebos e pequenos deveria

ser guiado por uma lógica que não corresponde a fins mercadológicos, mas sim contribuir

para “uma integração cívica e social” 15. Gérin conclui seu texto dizendo que: “para o estudo

das campanhas de publicidade destinadas á criança, os publicitários não devem hesitar em

consultar educadores, psicólogos e pais”.

Tal prática de fazer com que a propaganda fosse, acima de tudo, um veículo

formativo é contrária a prática principal da publicidade comercial que é “lubrificar” o

mercado (LAMBERT, 2000: 125). O vínculo que se estabelece entre os anúncios

mercadológicos e os interesses econômicos são intrínsecos. Pois, o desenvolvimento da

propaganda esta diretamente ligada com a dinâmica de acumulação capitalista.

A intervenção de outra categoria social na feitura publicitária era vista com maus

olhos pelos publicitários. Desde a década de 1930 quando nossa publicidade passou a ser

fortemente influenciada por agências estadunidenses, o discurso imperante entre os

profissionais da propaganda eram os arautos da modernidade que, entre nós, se pretendia

13REVISTA BLOCH DE COMUNICAÇÃO, São Paulo, março de 1972, p. 35 14Idem, 35 15 Idem, 36

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10

instalar. Data deste momento, uma crescente mobilização dos publicitários em regular suas

atividades cujo auge foi à criação do CONAR criado em 1978.

Se a intervenção de outros setores na atividade daqueles que profissionalmente

“fabricam” anúncios já era vista com maus olhos pelos mesmos. Na década de 1970, as

intervenções deste gênero passam a ser visto como uma ameaça para atividade publicitária de

forma mais incisiva. Muito embora, os anos de 1970 foi o momento em que atividade

publicitária encontrou seu auge alavancado pelo “crescimento do parque industrial e do

mercado interno de bens materiais, fortalece-se o parque industrial de produção de cultura e o

mercado de bens culturais” (ORTIZ, 1988: 115)

Não podemos esquecer que estávamos no regime militar onde a censura era algo

vigente e que poderia ameaçar as atividades econômicas e culturais que, em certa medida,

estavam integradas em nossa sociabilidade moderna. Muito embora, é preciso entender que a

censura possuía duas faces: “uma repressiva, outra disciplinadora. A primeira diz não; a outra

é mais complexa, afirma e incentiva um tipo de orientação” (ORTIZ, 1988: 115).

É sobre esta última que estava assentada a publicidade no regime militar. Contudo,

os profissionais envolvidos temiam que a intervenção pudesse trazer prejuízos para atividade.

Sobre a preocupação fundamental do publicitário na década de 1970 Ricardo Ramos nos diz:

“o publicitário é um profissional que esta interessado em liberdade de imprensa, liberdades

individuais e abertura política” 16. Muito embora, a tão sonhada liberdade professada era mais

questionada quando forças do próprio Estado autoritário ameaçava seus interesses17.

Devemos atentar para a relação entre setores da comunidade civil e o golpe militar.

Setores médios e da alta burguesia foram, em certa medida, apoiadores do golpe e regime

militar, pois foi por meio do desenvolvimento adotado pelo Estado autoritário que estes

setores mais cresceram. Os publicitários eram, em grande medida, signatários do golpe e,

inclusive, apoiando a censura da impressa que se opunham de forma drástica ao governo

quando esta não ameaçava interesses econômicos.

É certo que houve tensão entre publicitários e o regime militar. Contudo, as

manifestações divergentes de profissionais da propaganda ao governo militar, não raro, era

16JORNAL DA TARDE, São Paulo, segunda feira, 17 de abril de 1977. 17A tensão entre o setor de anúncios mercadológicos e a censura militar nunca se deu no plano estrutural do

governo. A conferência do publicitário Mauro Salles na Escola Superior de Guerra é bem sintomática para

entender que tipo de liberdade os profissionais do setor estavam interessados: “é de uma imprensa livre

economicamente, com sua sobrevivência garantida pela publicidade julgada em bases técnicas, que se deve

esperar uma imprensa livre em termos políticos. É certo que estamos todos ainda com problemas da censura.

Mas também é certo que os censores são passageiros e a censura não se institucionalizará e não há nenhum sinal

de que vamos marchar na direção inversa do progresso”. C.f. SALLES, Mauro. Conferência Superior de Guerra,

04 de setembro de 1974, p. 6.

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em virtude de que o mesmo regime sufocasse o mercado e os projetos de modernidade que

grande parte dos publicitários se dizia portadores.

Outro conflito que um órgão de regulamentação publicitária nos moldes franceses

poderia trazer ao um nicho publicitário que estava voltado para a criança era o caráter de

verdade e de racionalidade que segundo o documento a publicidade deveria ter. Em seu artigo

II, o documento nos diz: “a publicidade destinada á criança deve empregar argumentos

verídicos, precisos acessíveis e despidos de quaisquer segundas intenções” 18.

Novamente o projeto de regulamentação dos anúncios infantis nestes moldes

franceses apresenta dissonâncias com o modelo de propaganda que se consolidou entre nós,

inclusive ao destinado as crianças.

Analisando a linguagem publicitária em todos os públicos, Ricardo Ramos nos diz

que na segunda metade da década do século passado houve uma “mudança radical na forma e

no conteúdo (...) com uma total libertação de cerimônias em sua linguagem e em afastamento

paulatino da sistemática argumentação racional para sempre maior apelo ás emoções mais

provocadas pelo condicionamento social que as individuais” (RAMOS, 1972: 65)

Ou seja, na publicidade comercial, o caráter de “verdade” ou de racionalidade não é

uma questão, uma vez que a publicidade comercial moderna se consolida por criar discursar

em uma linguagem em que o individuo ou grupo social aparece associado a uma experiência

que determinado bem ou serviço de consumo pode proporcionar.

A racionalização esta ligado na publicidade no que os profissionais da propaganda

costumam chamar de briefing. Onde aparece dados característicos do consumidor como faixa

etária, renda, preferências entre outros fatores ligados a otimização da vendas. Já no layout é a

publicidade propriamente dita.

Se algumas propostas de regulamentação dos anúncios infantis poderiam causar

certos prejuízos para as agências de propaganda, inclusive danos financeiros. Outras “vozes”

acreditavam que não havia a necessidade de regulamentação da publicidade infantil em

relação ás propagandas destinadas aos adultos.

É o caso do educador Edelweiss de Paiva Santos, o referido autor inicia seu texto

mostrando-se contrário a regulamentação de anúncios publicitários voltados para crianças.

Para ele será o processo de educação responsável por incutir nos pequenos desde primórdios

da educação o discernimento sobre o que deve ou não ser consumido.

18 REVISTA BLOCH DE COMUNICAÇÃO, São Paulo, 1977.p. 37

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Ele prossegue seu texto argumentando que uma possível regulamentação publicitária

seria menosprezar a inteligência dos pequenos: “Você já curtiu um papo com crianças

inteligentes sabe o quanto elas são perspicazes e ‘pegam’ até mais que um adulto que se crê

bem avisado” 19.

Seu discurso não deve se descolado do tempo de sua produção. Muito embora, o

regime exceção incentivou entre nós uma indústria cultural na qual serviu como um dos

suportes de sustentação ideológica do regime de governo instalado. Havia entre os

profissionais da propaganda e empresas ligadas ao setor de bens e produtos infantis que um

possível temor que a regulamentação da linguagem publicitária voltadas para as crianças

pudesse causar danos aos seus negócios.

Para tanto, o discurso de Paiva Santos estava ancorado em uma suposta pesquisa

empírica realizada em uma escola com alunos, a qual o autor não cita o nome, com alunos

entre doze e quatorze anos, mas que dava base para suas argumentações contrárias a qualquer

intervenção estatal ou dos próprios profissionais da propaganda em regulamentar uma

linguagem publicitária voltada para os pequenos.

A partir dos próprios discursos dos alunos que realizaram a pesquisa o autor reafirma

seu argumento. Em discursos, supostamente consciente das crianças, Paiva Santos tenta

convencer seus leitores de que os pequenos eram abeis suficientes para analisarem a

propagandas até mesmo melhor do que os adultos.

A transcrição de uma fala de algumas crianças é bem sintomática para entender os

propósitos do autor: “Meu Deus, por tudo de bom que o senhor nos deu, mas obrigada

excelente ideia dos homens que construíram uma coisa que nos atrai e nos ensina, que ela seja

para o bem de todos e que só haja propagandas bonitas e boas, mas que o senhor nos proteja

daquelas que nos vão fazer mal ( GIANE de Souza – 14 anos 5° l)”20.

A frase é bem elucidativa quando se quer entender os argumentos do autor. A menina

recorre para a proteção divina quanto às propagandas maléficas as pessoas e ressalta as

propagandas “bonitas e boas” e ressalta o engenho das mesmas. Neste sentido, empresas que

produzem bens ou serviços de consumo voltado para as crianças estariam e profissionais do

setor estariam isentos de sua responsabilidade.

Estranhamente as outras dez falas transcritas pelo autor, as crianças mostram ter

discernimento sobre propagandas e recorre à proteção divina como proteção de possíveis

19 JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, julho, 1974, p. 30. 20JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, julho, 1974, p. 30.

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males que uma propaganda nociva poderia ter. Desta forma, o autor isenta os responsáveis e

colocar a educação como produtora de um censo crítico em relação a propaganda.

Usar o argumento da educação e da crença em Deus é característico do próprio

discurso do regime militar que, muito embora sua constituição fosse laica, a profissão de fé

em discursos políticos, a legitimação da família nuclear católica e a educação eram tidas como

pilares de uma sociedade civilizada e moderna, cujos militares diziam prover. Induzir as

crianças colocarem tais valores em suas falas era, em certa medida, que estavam postas como

ideologia do sistema.

Paiva Santos, conclui seu texto justificando o uso do termo “Meu Deus”, em suas

palavras: “Em primeiro, porque a tarefa era redigir uma tarefa para meu bom Deus por

ocasião do dia das Comunicações e Segundo, porque só o bom Deus dará jeito nisso”21.

Conclusão e novas questões.

Em suma, procurei tratar aqui de algumas discussões que estão sendo elencadas no

primeiro capítulo de minha tese de mestrado. As fontes analisadas em certa medida nesta

apresentação devem ser lidas de acordo com outros movimentos históricos que são

fundamentais para entender a articulação de um mercado publicitário para o publico infantil:

A maturidade de nosso “Capitalismo Tardio”; o regime militar e a ameaça de censura para os

veículos de comunicação ligados ao regime; uma sociedade de bens de consumo tidos como

da modernidade capitalista; os debates sobre a regulamentação publicitária; a feitura das

cidades para este novo modelo de modernidade, em particular a cidade de São Paulo recorte

físico da pesquisa.

Contudo, devo ressaltar que outras fontes estão sendo consultadas a partir de

questões que a problemática da pesquisa possa trazer. Para tanto, estou analisando outros

documentos com a finalidade de responder algumas questões que a pesquisa em

desenvolvimento têm me suscitado: Até que ponto este debate sobre a regulamentação da

publicidade infantil implicou, ou não, a forma como os profissionais da propaganda

produziam anúncios? Os dados sobre as pesquisas de mercado como o IBOPE22, compulsados

pelas agências de publicidade para conquistar mercado alterou a forma de se fazer publicidade

para este nicho de mercado e se é possível observar discussões como aqui expostas neste tipo

de material?

21 JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, julho, 1974, p. 30. 22Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística

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JORNAL DA TARDE, SÃO PAULO

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