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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Educação Física CARLA RIGHETO “ÁRBITROS: VILÕES E/OU MEDIADORES DO ESPETÁCULO?CAMPINAS 2016

Repositorio da Producao Cientifica e Intelectual da Unicamp: … · 2018. 8. 30. · interpretações e decisões são, quando no exercício da função de árbitro, na maior parte

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Educação Física

CARLA RIGHETO

“ÁRBITROS: VILÕES E/OU MEDIADORES DO

ESPETÁCULO?”

CAMPINAS

2016

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CARLA RIGHETO

“ÁRBITROS: VILÕES E/OU MEDIADORES DO

ESPETÁCULO?”

Dissertação de Mestrado apresentada à

Faculdade de Educação Física da

Universidade Estadual de Campinas como

parte dos requisitos exigidos para a

obtenção do título de Mestra em Educação

Física, na Área de Concentração Educação

Física e Sociedade.

Orientadora: Profa. Dra. Heloísa Helena Baldy dos Reis

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL

DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA CARLA

RIGHETO E ORIENTADA PELA PROFA. DRA.

HELOÍSA HELENA BALDY DOS REIS.

CAMPINAS

2016

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COMISSÃO EXAMINADORA

PROFA. DRA. HELOÍSA HELENA BALDY DOS REIS

Orientadora

PROF. DR. VAGNER REOLON MARCELINO

PROF. DR. CARLOS JOSÉ MARTINS

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora consta no processo de

vida acadêmica do aluno.

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DEDICATÓRIA

Aos amores da minha vida:

Andrea, Daniele, Luísa, Silvana e Tatiana

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AGRADECIMENTOS

Agradecer vem do latim “gratus” e significa mostrar gratidão, reconhecer um favor recebido.

E foram muitos!!! Em forma de conhecimento, palavras, abraços, torcida, tempo e silêncio.

Ajudaram-me a estudar, trabalhar, produzir, aprender, relaxar e me divertir. Alguns mais

espontâneos e efusivos. Outros contidos e tímidos. Todos muitos carinhosos, calorosos e

sinceros. Quero aqui deixar meu abraço e minha gratidão a todos os meus familiares,

professores, funcionários e amigos que me ajudaram a tornar possível esta dissertação.

Namastê!

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AGRADECIMENTO ESPECIAL

À Heloisa Helena Baldy dos Reis

Uma amiga orientadora!

Vou voltar a estudar. Comentei com você após uma aula sobre regras de Handebol para

alunos da Graduação da FEF em 2009. Estes convites para ministrar uma aula de regras para

os alunos da graduação são anuais, uma vez que você leciona Handebol e eu sou árbitra

internacional da modalidade.

Você me respondeu: Demorou!

Não, Heloisa. Agora eu tenho um tema que me motiva a estudar e pesquisar.

Começou o meu “longo processo”, embora planejado, de fazer um mestrado na UNICAMP.

Foram três disciplinas como ouvinte, todas sugeridas por você, para que eu tivesse a certeza

de que era isto mesmo que eu queria. Afinal, eram 23 anos longe da universidade.

Nas aulas de Sociologia conheci as obras de Norbert Elias. Em um Simpósio sobre o

Hooliganismo em 2010 presenciei as palestras de Eric Dunning, tendo o privilégio de

acompanhá-lo durante sua estada em Campinas. Somente quando ingressei no Mestrado em

março de 2013 e comecei a estudar é que me dei conta da importância de Norbert Elias e Eric

Dunning para a Sociologia do Esporte.

Este período foi fundamental e enriquecedor para a minha aprovação no processo seletivo de

ingresso no Mestrado.

Enfim, tudo certo e comecei a me “divertir”. A diversão, para os que não acompanham as

nossas orientações, quer dizer: o meu desejo de entender o tema torna meu estudo um grande

prazer. Quantas novidades: Curriculum Lattes, Plataforma Brasil, Créditos, Comitê de Ética,

PED e por aí vai. Quanto conhecimento adquirido nestes cinco anos de preparação e como

mestranda.

Eu tinha certeza que manteríamos o distanciamento necessário para concluirmos este meu

projeto, este meu desejo.

Você foi e é fundamental em todo este “processo de longa duração”. Obrigada por acreditar

em mim, investir em meu objeto de estudo e corrigir-me com seriedade, firmeza, paciência,

suavidade e carinho.

Admiro sua autenticidade, honestidade e simplicidade entre muitas das suas qualidades e

virtudes. Você trata a todos igualmente: alunos, funcionários, professores e professores

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doutores e isto não é nenhuma surpresa para os que têm o privilégio de conviver com você,

sua família e suas escolhas.

Também quero compartilhar algumas decepções nesta trajetória.

Eu esperava encontrar na universidade um ambiente de troca de conhecimento neste meu

retorno. Que decepção. A competição nem sempre é sustentada em um fair play e quem perde

é toda a sociedade que investe na produção de conhecimento.

Outra decepção foi conhecer pessoas que nos livros, artigos e palestras discursam pela

democratização, contra as diferenças, por um país mais justo e de acesso a todos e, no entanto,

se mostram indiferentes a tudo e a todos quando podemos conviver no dia a dia da FEF. Estas

pessoas visam benefícios próprios.

Claro que encontrei muitas pessoas interessantes, generosas, maravilhosas.

Professora e amiga, a você a minha eterna gratidão. Por acreditar, trabalhar neste projeto,

pelas confidências do dia a dia, por partilhar seu conhecimento, pela sua amizade e pela sua

orientação, na vida e neste mestrado.

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RESUMO

O presente trabalho teve por objetivo estudar a violência contra os árbitros de futebol no

Brasil. Conhecido na sociedade brasileira como “juiz”, é o responsável por fazer com que as

regras do jogo sejam cumpridas e respeitadas por todos os participantes do jogo. Personagem

polêmico, criticado e questionado por dirigentes, comissão técnica, atletas, mídia, torcedores e

espectadores, os árbitros são hostilizados antes mesmo de entrarem em campo, as suas

interpretações e decisões são, quando no exercício da função de árbitro, na maior parte das

vezes, compreendidas como má-fé se contrariam a percepção do observador sobre a cena do

jogo. A teoria do processo civilizatório de Norbert Elias é o nosso referencial teórico.

Entrevistamos os três árbitros FIFA da Federação Paulista de Futebol. As entrevistas foram

realizadas de forma semiestruturada e com análise qualitativa as quais visaram compreender a

violência contra os árbitros e como eles sentem e interpretam esta violência. A violência

contra as mulheres árbitras de futebol que adentram um espaço construído culturalmente para

os homens e onde se busca a validação da masculinidade também se apresenta na nossa

análise. Concluímos que a violência dirigida aos árbitros de futebol está relacionada à

violência presente na sociedade brasileira. Embora os árbitros compreendam o futebol como

uma atividade mimética, eles repudiam a violência gerada pela falta de controle dos impulsos

e das emoções. A mídia também é responsável pela violência contra os árbitros de futebol no

Brasil. As mulheres árbitras somente terão conquistado o respeito na arbitragem brasileira

quando simultaneamente os árbitros ocuparem cargos de gestão no futebol brasileiro,

conseguindo assim equilíbrio nas relações de poder.

PALAVRAS CHAVE: Árbitros de Futebol, Violência contra Árbitros, Futebol.

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ABSTRACT

The present work aimed to study the violence against soccer referees in Brazil. Known in

Brazilian society as "judge", he is responsible for making the games rules are complied with

and respected by all participants.

Controversial character criticized and questioned by officers, technical committee, athletes,

media, fans and spectators, the referees are harassed even before they enter the field. Their

interpretations and decisions are, when in the exercise of the referee function, for the most

part, understood as bad faith contrary to the perception of the observer on the game scene.

The theory of the civilizing process of Norbert Elias is our theoretical framework. We

interviewed three FIFA referees from São Paulo Football Federation. The researches were

conducted in a semi-structured form and with qualitative analysis which aimed at

understanding the violence against referees and how they feel and interpret this violence.

The violence against women soccer referees who enter a space built culturally for men and

where the search for masculinity validation is also shown in our analysis.

We concluded that the violence directed at soccer referees is related to the same violence in

Brazilian society.

Although the referees understand soccer as a mimetic activity, they repudiate the violence

generated by the lack of impulse and emotion control.

The media is also responsible for violence against soccer referees in Brazil.

Women referees will only have earned the respect in Brazilian arbitration when

simultaneously the referees occupy management positions in Brazilian soccer thereby

achieving balance in power relations.

KEY WORDS: Soccer Referee, Violence against Referees, Soccer

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LISTA DE SIGLAS

ANAF - Associação Nacional dos Árbitros de Futebol

CBF - Confederação Brasileira de Futebol

CBHb - Confederação Brasileira de Handebol

CBJD - Código Brasileiro de Justiça Desportiva

CEAF/SP - Comissão Estadual de Árbitros de Futebol de São Paulo

CND - Confederação Nacional de Desportos

CONAF - Comissão Nacional de Árbitros de Futebol

CONMENBOL - Confederação Sul-Americana de Futebol

FA - Football Association

FBI - Federal Bureau of Investigation

FIFA - Fédération Internationale de Football Association

FPF - Federação Paulista de Futebol

FPFS - Federação Paulista de Futebol de Salão

FPH - Federação Paulista de Handebol

IFAB - Internacional Football Association Board

IHF - Internacional Handball Association

LCF - Liga Campineira de Futebol

LCFS - Liga Campineira de Futebol de Salão

RENAF - Relação Nacional de Árbitros de Futebol

SAFESP - Sindicato dos Árbitros de Futebol de São Paulo

STJD - Superior Tribunal de Justiça Desportiva

UEFA - Union of European Football Association

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Sumário

1.1 COMO SURGIRAM AS REGRAS ............................................................................................... 25

1.2 OS ÁRBITROS ........................................................................................................................ 38

1.3 AS MULHERES NA ARBITRAGEM ............................................................................................. 41

1.4 A TELEVISÃO, A MÍDIA E OS ÁRBITROS DE FUTEBOL ................................................................ 45

2.1 “UM DOS SOCIOLÓGOS DE MAIOR DESTAQUE DO SÉCULO XX”................................................ 51

2.2 ELIAS E A SOCIOLOGIA ........................................................................................................... 52

2.3 AS RELAÇÕES HUMANAS ....................................................................................................... 54

2.4 “UM PROCESSO LONGO E NÃO PLANEJADO” .......................................................................... 61

2.5 A IMPORTÂNCIA DO FUTEBOL ................................................................................................ 65

2.6 O PROCESSO CIVILIZATÓRIO E O FUTEBOL .............................................................................. 68

2.7 O AUTOCONTROLE E AS ATIVIDADES MIMÉTICAS ................................................................... 69

3.1 A VIOLÊNCIA ......................................................................................................................... 74

3.2 A VIOLÊNCIA E AS MULHERES ÁRBITRAS NO BRASIL ................................................................ 82

4.1 OS ÁRBITROS E O FUTEBOL .................................................................................................... 86

4.2 QUEM SÃO OS ÁRBITROS? E POR QUE ELES ESCOLHERAM ESTA PROFISSÃO? ........................... 87

4.3 A PREPARAÇÃO E A “PROFISSIONALIZAÇÃO” .......................................................................... 91

4.4 A “TECNOLOGIA E A ARBITRAGEM ....................................................................................... 101

4.5 A IMPORTÂNCIA SOCIAL DO ÁRBITRO DE FUTEBOL ............................................................... 104

4.6 A VIOLÊNCIA E AS RELAÇÕES DE PODER ................................................................................ 106

4.7 A VIOLÊNCIA SIMBÓLICA CONTRA AS MULHERES ÁRBITRAS .................................................. 122

ROTEIRO DA ENTREVISTA .......................................................................................................... 132

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................................................................... 135

TRANSCRIÇÃO 1 ........................................................................................................................ 142

TRANSCRIÇÃO 2 ........................................................................................................................ 158

TRANSCRIÇÃO 3 ........................................................................................................................ 173

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13

1. AS REGRAS, OS ÁRBITROS E AS INSTITUIÇÕES .................................................. 25

2. A TEORIA FIGURACIONAL DE NORBERT ELIAS ................................................. 51

3. A VIOLÊNCIA E O PROCESSO CIVILIZATÓRIO .................................................... 74

4. COM A PALAVRA: OS ÁRBITROS .............................................................................. 86

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 124

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 127

ANEXOS ............................................................................................................................... 132

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INTRODUÇÃO

A Copa do mundo de futebol de 2014 no Brasil foi “o evento mais visto, rico e

caro da história dos mundiais” 1. Sucesso de público contou com três milhões de ingressos

vendidos, estádios lotados, a vinda de 692.000 turistas estrangeiros e a movimentação de

3.056.397 pessoas pelo país. Os investimentos econômicos do governo e da iniciativa privada

ultrapassaram valores de 33 bilhões de reais, grande parte destes investimentos foi feita na

infraestrutura das cidades sedes para a construção de estádios (8,5 milhões de reais),

aeroportos, hotéis e sistema de transportes. Foram gerados 3,6 milhões de empregos

temporários e ao término do evento a FIFA (Internacional de Futebol) superou a marca de

todos os mundiais e faturou 10 bilhões Federação de reais com 100% de isenção fiscal

concedida pelo governo federal do Brasil que necessitou atender esta exigência da FIFA para

poder sediar a competição2.

São 152 anos de história de um esporte que nasceu das práticas de jogos com

bolas nas escolas públicas inglesas e que hoje é um fenômeno mundial. O empenho dos

alunos e ex-alunos destas instituições de ensino para que se chegasse à unificação das regras

do jogo foi coroado no dia 26 de outubro de 1863 em um pub na cidade de Londres. Estava

fundada a Football Association que se tornaria a instituição responsável por reger o futebol

local. Segundo Franco Jr. (2007, p.28):

Finalmente, a 26 de outubro de 1863 representantes de várias escolas e clubes

encontraram-se na Freemason’s Tavern, no centro de Londres, para criar a Football

Association e um comitê que uniformizasse as regras. A codificação foi aprovada

em assembleia no dia 24 de novembro e publicada no jornal esportivo Bell’s Life de

oito de dezembro. Eram catorze regras simples, que davam identidade própria ao

football.

Nas primeiras regras do jogo não existiam os árbitros. As decisões de uma partida

eram de responsabilidade dos próprios capitães das equipes. Não era aceito entre os

participantes do jogo que um gentleman cometesse uma ação deliberada sobre um outro

jogador, mas o desenvolvimento e o crescimento do futebol fizeram com que as disputas

1 Reportagem de Diego Salgado e Paulo Favero, A copa que durou 7 anos. O Estado de S. Paulo, São Paulo. 13

jul 2014 Caderno de Esportes, p.11-14. 2 Os dados estatísticos foram retirados da mesma reportagem citada na nota de rodapé número 1.

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fossem mais acirradas e os árbitros adentram o campo em 1891 para que decidissem sobre as

penalidades e expulsões de jogadores.

Este é um fato histórico importante e porque não dizer curioso. A função de

árbitro de um jogo de futebol surge quando os gentleman não mais se entendem, quando

possuem opiniões divergentes e, portanto se faz necessário alguém neutro, para ambas as

equipes que possa assumir a responsabilidade das decisões.

A pesquisa que estamos realizando estuda os árbitros3 de futebol no Brasil. O

árbitro conhecido na sociedade brasileira como “juiz”, é juntamente com sua equipe de

trabalho4, o responsável em fazer com que as regras do jogo sejam cumpridas e respeitadas

por todos os participantes5

do jogo. Personagem polêmico, criticado e questionado por

dirigentes, comissão técnica, atletas, mídia, torcedores e espectadores; as suas interpretações e

decisões são, quando no exercício da função de árbitro, na maior parte das vezes,

compreendidas como má-fé se contrariam a percepção do observador sobre a cena do jogo.

O bom árbitro é aquele que conhece as regras, identifica os momentos para aplicá-

las e também quando não é necessário apitar, sabe escolher o que é melhor para o jogo, mas

decide sempre com honestidade e estabelecendo critérios de igualdade para as duas equipes.

Não somente as regras técnicas, mas também as disciplinares devem ser respeitadas, a disputa

precisa ser realizada no chamado fair-play, ou seja, dentro de um código de ética e respeito

estabelecido pela FIFA. Uma conduta antidesportiva, seja de jogadores, comissão técnica ou

dirigente, que possa ser “administrada”, muitas vezes é a melhor escolha para aquele jogo.

Importante é que uma conduta seja “administrada” da mesma forma para a outra equipe

participante do jogo. As punições disciplinares nem sempre conduzem a partida para tensões

controladas, um árbitro experiente saberá quando aplicar a punição para evitar o aumento da

violência entre jogadores em uma partida. A violência também se faz presente entre jogadores

e equipe de arbitragem, uma das razões para que isso ocorra é quando um ou mais jogadores

discordam das marcações e punições disciplinares aplicadas pelo árbitro e perdem o controle

emocional recorrendo a agressões verbais e muitas vezes agressões físicas.

Quando experiente na função, não se faz notar durante toda a partida, é conhecido

pelos espectadores e torcedores e, por eles será xingado pelo nome. “A suposição de má-fé na

3 Com o objetivo de simplificar a redação do texto nesta pesquisa, a palavra árbitro será escrita na forma

masculina, embora se refira à função exercida por homens e/ ou mulheres. 4 Os componentes de uma equipe de arbitragem seguem as regras internacionais dos esportes.

5 Entenda-se por participantes: dirigentes, comissão técnica, jogadores e outras denominações usadas em cada

regra de uma modalidade esportiva.

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série impressionante de equívocos em campo está sempre à frente da possibilidade mais

razoável de despreparo generalizado para o exercício da profissão” 6.

O primeiro capítulo desta dissertação nos remete a história das regras e como

surgiram os árbitros. No início a fundação da Football Association e posteriormente a

fundação da FIFA, instituições responsáveis pelo futebol na Inglaterra e no mundo

respectivamente, promoveram o desenvolvimento e o crescimento do futebol, sua

profissionalização e espetacularização e apesar de toda a importância que aqui se faz

reconhecida, não deixaremos de comentar as investigações das denúncias de corrupção na

FIFA.

A formação do árbitro de futebol, o difícil caminho das mulheres que decidem se

tornar árbitras de futebol, o uso da tecnologia e como os árbitros são tratados pelos

comentaristas e mídia esportiva também serão contemplados neste capítulo.

Para os torcedores fanáticos, o árbitro é o sujeito que “faz o seu time perder” ou

que, apesar do “juiz” atrapalhar, o seu time conseguiu vencer.

Se todos os participantes do jogo de futebol conhecem as regras do jogo, por que a

necessidade de alguém, neste caso um árbitro, atuar como mediador das decisões? Seria

possível um jogo sem árbitros?

Em vinte e dois de Junho de 1986, na Copa do Mundo de Futebol, a Argentina

venceu a Inglaterra por 2 X 1, com a “mão de Deus” 7 de Diego Maradona. Em 2009 a França

classificou-se para a Copa do Mundo de 2010, na África do Sul, com gol irregular, quando o

jogador francês, Thierry Henry, utilizou-se da mão para ter o domínio da bola em jogo contra

a Seleção da Irlanda. O atacante brasileiro, Luís Fabiano, na Copa do Mundo de 2010, na

África do Sul, utilizou-se do mesmo recurso irregular, duas vezes no mesmo lance, para

marcar um gol no jogo Brasil x Costa do Marfim, declarando ao final do jogo: “O primeiro

toque foi sem querer, então pode”. O segundo foi à “mão santa”. “Ele (o árbitro) me

perguntou se eu tinha tocado a bola com o braço”. Eu disse “no” 8.

Ao relatar estes fatos, a mídia descreve estes jogadores como espertos, malandros

e maliciosos; a malandragem faz parte do futebol, segundo a mídia brasileira. Teriam os

jornalistas a mesma opinião se a decisão errônea dos árbitros fosse contra a seleção de futebol

do seu país? Provavelmente não estariam enaltecendo a esperteza e habilidade destes

6 Reportagem do jornalista Alfredo Ribeiro Bastos que mantém uma coluna de humor, Tutty Vasquez, no jornal

“O Estado de S. Paulo”. O texto citado foi publicado na página 8, em 04 set.. 2012. 7 O jogador argentino, Diego Maradona, disse que “se houve mão na bola, foi a mão de Deus”, frase que ficou eternizada após o torneio. Este gol desclassificou a Inglaterra

da Copa (Site UOL Notícias reportagem publicada durante a Copa do Mundo de futebol 2010 realizada na África do Sul).

8 Reportagem do jornalista Robson Morelli, enviado especial do jornal “O Estado de S. Paulo” na Copa do

Mundo de 2010 na África do Sul, no Caderno de Esportes, pág. 3 em 22 Jun. 2010.

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jogadores e sim criticando, muitas vezes de maneira impiedosa, o responsável por validar o

gol, ou seja, o árbitro.

Creio que apesar de estarmos convivendo com frequentes erros de arbitragem não

podemos depender do fair play dos jogadores. Consequentemente, o árbitro é um “mal

necessário”.

Com a esportivização, grandes investimentos foram realizados pelas equipes de

diferentes modalidades esportivas. A pressão por resultados satisfatórios e o jogo de

interesses por parte dos dirigentes coloca o árbitro não apenas como alguém que fará com que

as regras sejam cumpridas e respeitadas, mas também como um mediador de conflitos.

Os investimentos feitos na arbitragem não são proporcionais aos investimentos

feitos na preparação dos jogadores e qualificação das comissões técnicas. Na maioria das

modalidades esportivas, o próprio árbitro é quem investe em cursos de capacitação e adquire o

seu material de trabalho. A função de árbitro esportivo não é regulamentada como profissão.

Os árbitros exercem a arbitragem concomitantemente a outra profissão9. Isto interfere na

formação, preparação e na atuação do árbitro que precisa conciliar vida profissional e

arbitragem. Acredito ser a falta de investimentos em formação de árbitros um fator

importante, ao considerarmos grande parte dos erros que eles cometem numa partida. Em

muitas modalidades os iniciantes na função, recém-aprovados em cursos deixam de ser

orientados após concluírem os cursos de formação de árbitros e, ainda que se tornem aptos a

dirigir partidas, falta-lhes a experiência, e por isso iniciam o trabalho em jogos de crianças.

Aqui se faz necessário destacar outro problema na nossa organização esportiva.

São os árbitros que durante uma partida, utilizando-se do apito, apontam erros e acertos no

jogo, sejam de caráter técnico ou disciplinar dos jogadores. Um árbitro recém-formado10

estaria apto a dirigir jogos de crianças em plena formação esportiva11

, contribuindo para que

esta criança aprenda a jogar corretamente? Particularmente, pensamos que toda a estrutura,

tanto da base teórica quanto da vivência prática, para que o jovem árbitro adquira experiências

na direção de uma partida esportiva, deveria ser proporcionada pelas entidades as quais estes

árbitros representam, sejam elas federações, confederações ou ligas.

No Brasil, poucas são as federações de futebol que investem na formação

continuada dos árbitros e acompanham o desenvolvimento do trabalho como faz a Federação

9 A regulamentação da profissão, em 10 de outubro de 2013, não trouxe mudanças significativas para os árbitros.

10 Para participar de um curso de formação de árbitro de qualquer modalidade esportiva, não é necessário ter sido

atleta ou ser graduado ou licenciado em Educação Física. 11

Os jogos de crianças, chamados de categorias de base da Federação Paulista de Futebol são dirigidos por

árbitros.

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Paulista de Futebol (FPF). Este acompanhamento e orientação impedem que os árbitros se

acomodem, parem de estudar e treinar fisicamente. A remuneração também é um item a ser

considerado. Um árbitro recebe uma boa remuneração para dirigir uma partida quando

comparamos a média salarial da população brasileira, mas esta remuneração passa a ser

insignificante quando comparada as cifras dos salários de jogadores, e comissão técnica das

equipes profissionais, em especial de futebol.

Para o jornalista Luiz Zanin12

, cada árbitro interpreta e aplica a lei segundo seus

próprios critérios, os árbitros adotam posturas e interpretações diferentes a cada jogo.

Embora a regra seja única para todos os jogos e categorias: profissional ou

equipes de base, as ações dos jogadores requerem uma tomada de decisão dos árbitros que

não deixa de ser interpretativa, pois está associada a muitos outros fatores relacionados à

dinâmica do jogo como: deslocamento dos jogadores, velocidade da jogada, posicionamento

do árbitro. A experiência do árbitro e a importância da partida também são fatores que devem

ser considerados uma vez que exige do árbitro um melhor desempenho no equilíbrio das

tensões dos jogadores.

Quando o desempenho da equipe de arbitragem é analisado e comentado por

jornalistas e comentaristas esportivos, acreditamos estar diante de um problema mais

relevante. Muitos destes profissionais, sem jamais terem lido um livro de regras, se colocam

no direito de questionar e criticar as decisões dos árbitros, após terem utilizado, inúmeras e

repetidas vezes, recursos tecnológicos para verem a cena e exporem suas opiniões.

Na Copa do Mundo de futebol masculino de 2010, realizada na África do Sul, a

arbitragem também foi destaque na imprensa. Estadunidenses protestaram quando o árbitro da

partida anulou um gol que impediu a vitória da Seleção dos Estados Unidos contra a Seleção

da Eslovênia. Esta havia sido a primeira participação em Copas do Mundo do árbitro de Mali,

Koman Coulibaly. Comprovado o erro do árbitro, o mesmo não apitou mais nenhum jogo,

sendo dispensado do grupo de árbitros da Copa do Mundo de futebol de 2010.

Normalmente, os árbitros que se equivocam em suas interpretações ou cometem

erros, não são mais escalados se estes erros ocorreram em um megaevento, e se ocorreram em

eventos regionais e nacionais, são afastados da função temporariamente. Existe sim, a punição

para erros técnicos de arbitragem, no entanto esta informação não é disseminada pela mídia

como são divulgados os erros da arbitragem. Na Copa do Mundo de Futebol em 2014, o

12

Luiz Zanin é colunista do jornal “O Estado de S. Paulo”.

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jornal “O Estado de S.Paulo” publicou reportagem do técnico holandês, Van Gaal, pedindo à

FIFA que árbitros sejam punidos pelos seus erros13

.

O fato é que erros de arbitragem sempre existirão, assim como os erros dos

jogadores. Os erros que ocorrem na arbitragem podem ser atribuídos à formação e experiência

do árbitro, ao seu posicionamento em campo no momento da tomada de decisão, a velocidade

da jogada, a erros de interpretações, ou seja, todos da condição humana. Apesar de todo este

contexto, há uma cobrança de que o árbitro jamais pode errar.

Apresentados os temas e problemas da pesquisa, nos cabe trazer os objetivos:

- Conhecer quem são os árbitros FIFA em atuação na Federação Paulista de

Futebol e o que os levou a escolher a arbitragem como “profissão”.

- Estudar os tipos de violências sofridas por estes, assim como o que eles sentem e

interpretam da violência sofrida.

Durante as partidas de futebol, os árbitros são hostilizados, antes do início dos

jogos, antes mesmo de entrarem em campo. Embora o futebol seja o meu objeto de estudo, a

violência contra árbitros se mostra também presente em outros esportes nos quais existe o

contato físico entre jogadores. A violência também se faz presente nas condições de trabalho,

na coação por parte dos dirigentes, nos comentários e exposições feitas pelos comentaristas

esportivos e na mídia em geral.

Sou professora de Educação Física da Rede Municipal de Ensino em

Campinas/SP. Pratiquei esportes ininterruptamente no decorrer de minha infância e

adolescência. Quando cursava a faculdade de Educação Física, em 1987, joguei handebol pela

cidade de Campinas nos Jogos Regionais, competição entre cidades do Estado de São Paulo.

O fato de haver duas árbitras atuando nos jogos me chamou a atenção14

. Ao término da

competição e sabendo que a Federação Paulista de Handebol (FPH) abria espaço para a

inscrição de mulheres no quadro da arbitragem, participei de um curso para a formação de

árbitros em 1987 e ao término do curso iniciei meus trabalhos como árbitra de Handebol na

FPH.

A minha prioridade não era ter a arbitragem como profissão e sim exercer mais

uma atividade dentro do esporte, contando ainda com a possibilidade de remuneração.

Quando fiz a opção por deixar de ser atleta, que na época não era uma função remunerada

13

Reportagem de Ciro Campos e Fábio Hecico, no jornal “O Estado de S.Paulo”, Caderno de Esportes, pág. 9,

em 24 de junho de 2014. 14

As árbitras são Silvana Maria Silva atualmente Árbitra Internacional de Handebol e Maria Isolina Fazzani

atualmente Árbitra Nacional de Handebol.

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19

como nos dias de hoje, dediquei-me ao trabalho na Educação, quanto ao esporte, segui apenas

com a arbitragem.

Em 1996 fui aprovada para o quadro de árbitros da Confederação Brasileira de

Handebol (CBHb) e em 1997 na Federação Internacional de Handebol (IHF). Exerço a função

de árbitra até os dias de hoje, e sempre me incomodou a violência simbólica e a violência

física sofrida por árbitros de todas as modalidades esportivas. Acredito ser o árbitro vítima de

violência e também, em algumas ocasiões, fator gerador desta violência. Para Reis (2006,

p.16)

Normalmente a violência com agressões físicas ocorre precedida de agressões de

violência simbólica, e a transformação das agressões simbólicas em físicas ocorre

quando o indivíduo perde o controle durante suas manifestações afetiva /simbólicas

e parte para a violência manifesta - física.

Nos Jogos Olímpicos em Pequim 2008, pude acompanhar pela mídia, algumas

situações de violências contra árbitros. O cubano Angel Valodia Matos, atleta da modalidade

de Tae Kwon Do, foi banido para sempre do esporte depois de agredir o árbitro durante a

decisão da medalha de bronze. O atleta cubano, que foi campeão nos Jogos Olímpicos de

Sidney em 2000, na mesma modalidade de luta, Tae Kwon Do, chutou o rosto do árbitro ao

término da luta por discordar da não marcação de suposto golpe irregular do adversário. No

dia seguinte da luta do atleta cubano o jornal “O Estado de S. Paulo”, estampava: “Fidel apoia

agressor”.

Na matéria, o ex-presidente cubano dizia apoiar a atitude do lutador que não

conseguira se controlar ao ser injustiçado pelas marcações do árbitro e culpava a máfia que

burlava as regras do Comitê Olímpico. Na mesma reportagem, Fidel referia-se a outra

modalidade olímpica, boxe, na qual também protestava: “Foi criminoso o que fizeram com os

jovens da nossa equipe de boxe, para complementar o trabalho dos que se dedicam a roubar

atletas do Terceiro Mundo [...]. Há esportes em que a arbitragem está muito corrompida.

Nossos atletas lutam contra o adversário e o árbitro”15

. O árbitro agredido fora o sueco Chakir

Chelbat.

Em partida realizada em 26 de Agosto de 2012, entre as equipes do Cruzeiro/MG

x Atlético Mineiro pelo Campeonato Brasileiro de Futebol, o jornalista, Gonçalo Júnior, do

jornal “O Estado de S. Paulo”, assim descreve a partida:

15

Reportagem de Paula Pereira no jornal “O Estado de S. Paulo”, São Paulo. 26 ago. 2008, Caderno de Esportes,

p.2.

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20

O empate por 2x2 teve três expulsões e lances polêmicos. Além disso, o Estádio

Independência viu cenas que pareciam ter sido abolidas do futebol brasileiro: os

cruzeirenses (torcida única no estádio) atiraram um celular (e também a bateria),

uma buzina de gás, uma camisa e vários copos de água no gramado, de acordo com

a súmula. O árbitro também relatou invasão do gramado e agressão verbal dos

dirigentes cruzeirenses. O presidente alvinegro, Alexandre Kalil, fez uma relação

entre as supostas falhas do árbitro e uma agressão que ele teria sofrido no intervalo.

Por que o juiz quase apanhou no intervalo ele se acovardou no segundo tempo e fez

a lambança que fez16

.

A violência direcionada aos árbitros fez com que os pesquisadores Andrea

Praschinger, Christine Pomikal e Stefan Stieger, do Departamento de Psicologia da

Universidade de Viena na Áustria, realizassem a pesquisa: “Posso ofender um árbitro?

Ofensas e consequências”. Os pesquisadores entrevistaram árbitros e árbitras de futebol e

identificaram quais são os tipos de ofensas que estes profissionais não toleram, punindo com

o cartão vermelho, além de um relatório disciplinar. Os insultos e agressões que eles recebem

são relacionados à: inteligência, aparência, áreas genitais, orientação sexual e o poder de

decisão dos árbitros e árbitras.

Expressões como a “máfia do apito”17

, tornaram-se mais comuns após os

escândalos que envolveram o árbitro Edílson Pereira de Carvalho, no Campeonato Brasileiro

de 2005, criminalmente punido por manipulação de resultados de jogos, favorecendo terceiros

em apostas financeiras.

O que justificaria as pessoas com diferentes expectativas sobre uma partida

adotarem a mesma postura de criticar os árbitros? Por que estes profissionais sofrem

violência? Estas são algumas das perguntas que nos motivaram a realização este trabalho e

que esperamos ter conseguido responde-las com êxito.

O segundo capítulo foi dedicado a Teoria do Processo Civilizatório de Norbert

Elias, nosso referencial teórico para esta pesquisa. As mudanças de comportamento e atitudes

dos indivíduos para uma melhor convivência em sociedade, o Processo Civilizatório, as

figurações, as relações de poder, as emoções que buscamos na prática esportiva e a violência

são neste capítulo estudadas.

No primeiro capítulo do livro El Fenómeno Deportivo, Eric Dunning (2003)

escreve sobre o quanto as emoções vividas por ele e por Norbert Elias durante as partidas de

futebol da Copa do Mundo da Inglaterra em 1966, tornaram-se os primeiros estímulos para

16

Reportagem de Gonçalo Júnior no jornal “O Estado de S. Paulo”, São Paulo. 28 ago. 2012, Caderno de

Esportes, p.1. 17

Em 2005, Promotores de Justiça de Combate ao Crime Organizado, em São Paulo, descobriram esquema de

manipulação de resultados futebolísticos envolvendo o árbitro Edílson Pereira de Carvalho e um grupo de

investidores.

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21

que realizassem estudos sobre a importância social e psicológica das emoções proporcionadas

pelos esportes e atividades de lazer.

Segundo Elias em Elias e Dunning (1992), as atividades de lazer provocam uma

“excitação agradável” e proporcionam a liberação das tensões do stress. As tensões são

causadas pela rotina e obrigações de uma vida em sociedade e para conviver dentro de um

padrão de civilidade, os indivíduos reprimem os seus sentimentos e emoções em público.

Quanto mais desenvolvidas são essas sociedades, maior a variedade de atividades propostas

onde esta excitação é favorecida e as tensões são liberadas. As atividades de lazer, em

especial os esportes, permitem aos indivíduos liberar tensões e viver emoções extremas sem

correr riscos, portanto uma atividade mimética. Para Elias e Dunning(1992, p.69-70):

[...] para cumprir a função de liberação das tensões derivadas das pressões, estas

actividades devem conformar-se à sensibilidade existente face à violência física que

é característica dos hábitos sociais das pessoas no último estágio de um processo de

civilização.

Outro aspecto a ser considerado seriam as relações de poder que envolvem

jogadores e árbitro, árbitro e torcedores. Ao fanático torcedor, resta apenas torcer por um

excelente espetáculo e pela vitória de sua equipe na partida, mas a imagem da autoridade e do

poder de decisão do árbitro coloca este torcedor em uma situação de espectador impotente,

sem poder interferir nas decisões dos árbitros contra a equipe da qual é torcedor. O torcedor

acaba utilizando-se de manifestações agressivas ao tentar reclamar das decisões dos árbitros.

Relações de poder são apresentadas por Norbert Elias no livro: "Os Estabelecidos e os

Outsiders”. Seriam estes fanáticos torcedores os outsiders, aos quais é reservado apenas o

direito de assistir a partida enquanto os estabelecidos, árbitros, tem o poder de decidir? Ou

seriam os árbitros, que sofrem com estas manifestações agressivas dos torcedores, os

“outsiders”? Quem detém o poder? Árbitros ou Torcedores?

O comportamento agressivo em relação à arbitragem também ocorre em jogos de

crianças nos quais pais, fanáticos torcedores, parecem se esquecer, ou não saberem, que o

esporte é também um meio de educação e formação das crianças e adolescentes. As atitudes

agressivas em relação aos árbitros, como até mesmo contra as equipes adversárias,

proporciona um espetáculo à parte, de maus exemplos, os quais muitas vezes serão copiados

pelos filhos. Ofensas e xingamentos em eventos e competições esportivas parecem ser

“normais” desde a infância para aqueles que presenciam cenas desta natureza nos recintos

esportivos.

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22

Segundo Reis (2006, p.16), “a situação estrutural brasileira contribui para uma

sociedade de indivíduos frustrados, descontentes, desiludidos, que podem expressar seus

sentimentos de maneira agressiva”. As crianças brasileiras não tem acesso a uma educação

básica de qualidade. O esporte e as demais manifestações culturais deveriam ser vivenciados e

aprendidos desde a primeira infância e poderíamos assim criar uma cultura esportiva.

Muitos torcedores que assistem aos jogos de Handebol nos quais trabalho

manifestam-se com palavras e gestos agressivos durante a partida, apresentando um

comportamento antagônico ao seu término. A agressão parece não ser direcionada ao cidadão

que atua em determinado jogo e sim, direcionada a figura do árbitro, independente destes

árbitros serem conhecidos ou não, terem dirigido anteriormente partidas do seu time ou não.

Entendemos que a agressão está relacionada à função que este indivíduo representa.

Em consulta a SCIELO18

, nota-se uma escassez de pesquisas acadêmicas na área

de esportes e sociologia, no Brasil, relacionadas aos temas: árbitro esportivo, arbitragem e

violência dirigida a árbitros.

Os grandes investimentos feitos no futebol e a crescente pressão que sofrem as

equipes por resultados positivos, por parte de dirigentes e torcedores, acabam colocando em

evidência a qualidade do serviço prestado por árbitros. Os resultados das equipes nos

campeonatos e torneios realizados trazem visibilidade, prestígio, premiações milionárias e

aumentam as possibilidades de excelentes contratos de patrocínio. Os árbitros, até então os

“outsiders”, despertou o interesse de alguns pesquisadores. Em levantamento bibliográfico

encontramos pesquisas sobre aptidão física dos árbitros (área de fisiologia) e estresse vivido

por árbitros (área de psicologia). Estas pesquisas visam entender e contribuir para uma melhor

performance desse “profissional” e uma melhor qualidade na formação dos árbitros. Árbitros

melhores formados e treinados deveriam cometer menos erros, portanto terem menor

interferência nos resultados dos jogos e consequentemente melhor qualidade de serviços

prestados. Poucas foram às pesquisas na área de Sociologia. Gostaria de citar uma importante

dissertação de mestrado e artigos publicados relacionados à área de Sociologia do pesquisador

e árbitro de futebol Bruno Boschilia 19

. Com as mulheres tendo a oportunidade de atuarem

como árbitras iniciaram-se também as pesquisas de gênero na arbitragem20

.

18

Em consulta ao Scielo, em 21 de outubro de 2012, foram encontrados sete artigos relacionados a árbitros na

área de sociologia. Acesso em 21 de outubro de 2012. 19

BOSCHILIA, Bruno. Futebol e Violência em Campo: análise das interdependências entre árbitros,

regras e instituições esportivas. 2008. 192 p. Dissertação (Mestrado em Educação Física), Departamento de

Educação Física, Setor de Ciências Biológicas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2008.

20 NASCIMENTO, A.S.; NUNES,M.L.F. A mulher árbitra de futsal: entre a norma e a resistência.

Interseções, Rio de Janeiro, v.16, n.1, p.197-216, jun.2014.

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23

No terceiro capítulo estudamos a violência seus conceitos, assim como o de

agressividade. Apresentamos também os estudos sobre a tipologia da violência de Norbert

Elias e Eric Dunning e as raízes e razões da violência na sociedade brasileira e no futebol.

O quarto capítulo foi dedicado às analises das entrevistas que foram realizadas

com os três árbitros FIFA da Federação Paulista de Futebol (FPF).

A pesquisa foi desenvolvida na abordagem qualitativa. Segundo Negrini (2010) o

interesse desta abordagem está na interpretação e análise das informações e não em

generalizar os dados obtidos.

Entrevistamos os três árbitros FIFA da Federação Paulista de Futebol, ou seja,

100% dos árbitros classificados na categoria máxima da arbitragem em futebol. A escolha por

árbitros desta categoria é porque acreditamos que estes vivenciaram todas as fases da

formação na carreira de um árbitro e hoje podem arbitrar em qualquer campeonato oficial de

futebol nacional ou internacional. Com a anuência da Federação Paulista de Futebol, uma vez

que os árbitros pertencem a esta instituição, entramos em contato com os três árbitros,

explicamos o propósito da pesquisa e enaltecemos a importância de podermos contar com a

participação dos três. As entrevistas foram realizadas nos meses de Agosto e Setembro de

2015, gravadas em áudio21

, posteriormente transcritas na íntegra para análise. Optamos por

realizar as entrevistas em dias em que não havia rodadas de jogos de futebol, na cidade onde

reside cada um dos entrevistados favorecendo assim a coleta das informações em um

ambiente tranquilo e sugerido pelo entrevistado. Embora o tempo previsto para as entrevistas

fosse estipulado em aproximadamente duas horas, os três árbitros se mostraram atenciosos e

participativos e usufruindo da liberdade que um questionário semiestruturado possibilita

contribuíram com outras informações e dados que pretendemos incorporá-los brevemente em

novas pesquisas e/ ou artigos. As transcrições acompanham os anexos desta pesquisa

juntamente com a Carta de Anuência da Federação Paulista de Futebol e a cópia do Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido.

Segundo Negrine (2010, p.70) as entrevistas semiestruturadas e com perguntas

“abertas”, embora apresente questões definidas pelo entrevistador “[...] permite que se

realizem explorações não previstas, oferecendo liberdade ao entrevistado para dissertar sobre

o tema ou abordar aspectos que sejam relevantes sobre o que pensa”.

21

Gravador de áudio Smartphone Samsung

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24

Os dados coletados nas entrevistas dos três árbitros foram analisados

qualitativamente inicialmente no conjunto da entrevista de cada indivíduo, posteriormente,

procuraram-se pontos convergentes entre as entrevistas. Estas foram realizadas após os

estudos teóricos o que permitiu a extração e incorporação de falas sobre os temas pesquisados

e atendendo os objetivos desta pesquisa que são: conhecer quem são estes profissionais que

optam por trabalhar como árbitros de futebol, estudar os tipos de violências sofridas por estes,

assim como o que eles sentem e interpretam da violência sofrida.

Esperamos ao término desta pesquisa termos contribuído para um melhor

entendimento da violência sofrida pelos árbitros de futebol, colaborando assim para que sejam

criadas propostas socioeducacionais que possibilitem diminuir as manifestações agressivas

aos árbitros no Brasil. Um estudo desta natureza poderá proporcionar alternativas que

colaborem com o controle da violência sofrida pelos árbitros, nas competições esportivas no

Brasil.

Segundo Elias e Dunning (1992, p.17), “o desporto demonstra com toda clareza

que constitui um campo de considerável significado social,...” e sendo Elias nosso referencial

teórico acreditamos estar contribuindo com este estudo para os estudos de violência sofrida

pela arbitragem de futebol. Para Elias a compreensão do esporte ajuda no entendimento da

sociedade e quando os estudos de esporte não são simultaneamente estudos de sociedade são

desprovidos de contexto.

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1. AS REGRAS, OS ÁRBITROS E AS INSTITUIÇÕES

1.1 COMO SURGIRAM AS REGRAS

No XIX século a Inglaterra viveu uma série de transformações sociais, políticas e

econômicas. A Revolução Industrial normatizava o trabalho e projetava o desenvolvimento

econômico, o parlamentarismo propunha um jogo político civilizado e as diferentes formas de

restrições sociais impostas à população tinham por objetivo melhorar o convívio social nos

espaços públicos.22

A regulamentação das muitas modalidades esportivas surge na Inglaterra

nessa época, acompanhando este cenário vivido pelo país. A Inglaterra é hoje reconhecida

como a responsável pela esportivização e considerada o “berço” do futebol moderno. Segundo

Reis e Escher (2006, pág. 20):

Na fase anterior à esportivização (adoção de regras universais), os jogos eram

regulamentados por tradições locais, sendo assim variáveis suas regras de um local a

outro. A normatização desses jogos na Inglaterra passou por vários “estágios”, até se

chegar ao que hoje é denominado de esporte.

Franco Jr. (2007) comenta que nesse período, não eram apenas as práticas

esportivas que passavam por normatizações. A necessidade de regulamentos era notada

também nas estruturas da vida político-social inglesa que desejava diminuir as tensões sociais

e prevenir assim, excessos e desorganizações por parte da população, melhorando o convívio

social. Segundo o autor, estas normatizações e restrições estavam presentes também nas

práticas esportivas. Era uma época de padronização, o Estado estabelecia a constituição, leis,

decretos e códigos; as instituições informais criavam suas regras, normas e costumes; os

esportes se institucionalizavam e iniciava-se o processo de padronização das regras esportivas

tais como: as corridas de cavalo por volta de 1750, golfe em 1751, críquete em 1788, rúgbi

em 1846, futebol em 1863 e ciclismo em 1868.

Para Elias e Dunning (1992) os esportes acompanham o que foi definido por ele,

como um processo civilizatório, processo este de longa duração vivido pela sociedade em que

22 Sobre estes temas consultar: FRANCO JÚNIOR, Hilário. A dança dos deuses: Futebol, Cultura e

Sociedade. São Paulo: Companhia Das Letras, 2007.

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um conjunto de regras e restrições levavam os indivíduos a um maior autocontrole, visando

um melhor convívio entre os cidadãos.

As public schools (escolas privadas) e as universidades de Oxford e Cambridge,

instituições de ensino destinadas as classes dominantes inglesas, foram de fundamental

importância para o processo de codificação das regras do futebol moderno. As práticas de um

jogo com bola entre os estudantes faziam parte das rotinas escolares, porém cada escola

estabelecia e jogava o futebol com regras e costumes próprios. Segundo Murray (2000, p. 21,

22):

Os rapazes da Rugby School, com seus grandes campos gramados e espaços abertos,

jogavam uma forma de futebol que permitia agarrar o jogador adversário e correr

com a bola na mão. Em Winchester, o campo era estreito, o drible era estimulado e

não havia baliza; para marcar pontos os jogadores precisavam levar a bola para o

outro lado da linha. Em Harrow, cujos os praticantes estavam entre os pioneiros do

association football, os times tinham onze jogadores, e uma grande bola era chutada

sobre um campo frequentemente enlameado. Em Westminster e Charterhouse, o

jogo era restrito a estabelecimentos fechados, impossibilitando chutes e lançamentos

longos.

Estas instituições de ensino (public schools), que inicialmente eram encarregadas

da educação de alunos pobres foram sendo transformadas, no final do século XVIII e início

do século XIX, em internatos pagos e atendiam alunos da classe média alta e classe alta. Nas

regras e costumes para se jogar futebol nas public schools, além de serem determinantes os

espaços físicos dos quais dispunham as instituições havia também uma diferença de status

entre as escolas. Enquanto a Escola de Rubgy atendia alunos das camadas sociais mais baixas,

entre a elite, a Escola de Eton tinha associações com a corte da Inglaterra. A rivalidade

presente nos jogos internos de futebol evidenciavam os problemas de disciplina e as relações

violentas que existiam entre alunos veteranos e calouros. Segundo Dunning e Curry (2006),

Thomas Arnold, diretor da Escola de Rubgy de 1828 a 1842 estabeleceu medidas

disciplinares eficazes nas relações entre os estudantes (veteranos – calouros) e entre

funcionários e estudantes. Embora não possamos afirmar, acreditamos que a normatização das

regras escolares, para um melhor convívio e maior autocontrole dos estudantes, passava

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27

também pelos “grandes campos gramados” e contribuíram substancialmente ao

desenvolvimento do futebol23

.

O futebol era praticado pelos alunos nessas instituições e pelos bad-boys, ex-

alunos das public schools, segundo Murray (2000), os ex-alunos deram o impulso para que

ocorresse todo o processo de padronização das regras do jogo. Estes desejavam continuar

praticando os esportes favoritos da faculdade, uma vez que iniciavam na vida profissional e a

padronização das regras era fundamental para que clubes e instituições pudessem jogar entre

si.

Um dos mais prestigiados árbitros do futebol brasileiro e autor do livro “A regra é

clara”, Arnaldo Cezar Coelho, relata que em 1846, a Escola de Rugby, estabeleceu regras

próprias para a prática interna do futebol e menciona a reunião realizada em 1848, no Trinity

College, como o encontro que instituiu as “Regras de Cambridge”.

No início do séc. XIX, o futebol fazia parte da educação regular dos jovens ingleses,

sendo comum que cada colégio estabelecesse suas próprias regras. Em setembro de

1846, o colégio de Rugby decide publicar a mais antiga lei para o jogo com bola:

The lays of football founded on the rules of the game as played at Rugby school 24

·.

[...] Dois anos depois, é a vez dos estudantes de Cambridge reunirem-se no Trinity

College com o intuito de criar um código para o esporte bretão, com 11 regras, no

qual era proibido golpear a pelota com as mãos (COELHO, 2002, p.136).

Murray (2000) relata encontros de ex-alunos de Salop e Eton, em 1846 e converge

com Coelho (2002), no que diz respeito, a reunião realizada pelos alunos de Cambridge em

1848, reunião esta que tinha o propósito de redigir um conjunto uniforme de regras.

As primeiras regras combinadas foram delineadas em 1846 por ex-alunos de Salop e

Eton; uma delas proibia chutar os adversários com botas revestidas de aço. Porém,

em 1848, uma primeira tentativa séria de se criar um conjunto uniforme de regras

realizou-se em Cambridge (MURRAY, 2000, p.22).

23

Ler sobre este tema em: DUNNING, Eric; CURRY, Graham (2006). 24

As leis do futebol baseadas nas regras do jogo como disputado no Colégio de Rugby.(Tradução de Arnaldo

Cezar Coelho).

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As regras propostas pela Escola de Eton eram de um jogo quase que inteiramente

jogado com os pés. Jogar com os pés exigia um maior autocontrole e os estudantes de Eton

acreditavam que seria mais difícil a classe trabalhadora jogar com estas regras. Propondo o

uso dos pés e sustentados no status de escola fundada pela realeza, que se vangloriava de

manter associações com a corte e que recebia os alunos das classes mais altas da sociedade, as

regras propostas pelos etonianos não deixava de ser uma “provocação” aos alunos da Escola

de Rugby. Jogar futebol de uma maneira diferente, com os pés, estava associado à rivalidade

das escolas que queriam manter o status e as “competições” de classe social25

. O fato é que as

regras precisavam ser unificadas. Segundo Dunning e Curry( 2006), os jogos de futebol entre

as escolas inglesas e os jogos dos ex-alunos eram problemáticos e isto justificou a reunião

realizada em Cambridge em 1848. Esta reunião em Cambridge também é mencionada por

Franco Jr. (2007, p.27), “Foi com este espírito que representantes de diversas escolas

reuniram-se em 1848, em Cambridge, para tentar uniformizar as regras daquele esporte”.

Os autores Franco Jr.(2007) e Murray (2000) consideram a reunião de Cambridge

em 1848, como o “pontapé inicial” para que fosse criado um código comum de regras para o

futebol.

Sendo a rivalidade das public schools tão significativa era compreensível que ex-

alunos e a imprensa tivessem papel fundamental na unificação das regras. Segundo Dunning e

Curry (2006, p.67)

Em 1863, uma verdadeira enxurrada de opiniões resolutas, defendendo vários jogos

foi manifestada através de cartas enviadas ao The Times por correspondentes de

escolas públicas. Entretanto, o que pode se chamar de defesa de “particularidades

das escolas” era forte no período e essas correspondências parecem ter servido

somente para acentuar as diferenças entre as formas rivais do football. Toda a

iniciativa prática para resolver o impasse teria de vir de fora das escolas públicas ou

de ex- estudantes destas escolas, que poderiam abordar a introdução de regras de

football de uma maneira relativamente mais desprendida.

A imprensa também colaborou. O Daily Telegraph publicava sugestões de um

correspondente para um “Parlamento do Football” em setembro de 1863, o jornalista John

25

Ler sobre este tema em: DUNNING, Eric; CURRY, Graham ( 2006).

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29

Cartwright, escrevia artigos sobre o assunto no The Field, tudo isto, fortalecido pela opinião

pública que também almejava regras claras e unificadas para o futebol26

.

Em 1863, em uma reunião de alunos e ex-alunos de várias instituições

educacionais inglesas é fundada em Londres, a Football Association (FA), nascia assim, o

futebol moderno. Os autores Franco Jr.(2007), Reis (2006), Murray (2000) e Coelho (2002)

assim descrevem este momento histórico:

Finalmente, a 26 de outubro de 1863 representantes de várias escolas e clubes

encontraram-se na Freemason’s Tavern, no centro de Londres, para criar a Football

Association e um comitê que uniformizasse as regras. A codificação foi aprovada

em assembleia no dia 24 de novembro e publicada no jornal esportivo Bell’s Life de

oito de dezembro. Eram catorze regras simples, que davam identidade própria ao

football (FRANCO JR., 2007, p.28).

A transformação de um jogo de bola com os pés em esporte deu-se a partir de 1863,

quando foi criada a Football Association, na Inglaterra, instituição que codificou o

futebol, criando suas regras universais (REIS, 2006, p.5).

Esse regulamento fornece a base das regras do futebol, que foram debatidas em um

evento histórico com ex-alunos de diversos internatos particulares, realizado na

Freemason’s, uma taverna londrina, em 26 de outubro de 1863, e em cinco

encontros subsequentes (MURRAY, 2000, p.22).

Em 1863, alunos e ex-universitários de Cambridge, sob a liderança do jornalista

John Cartwright, iniciam uma campanha para a padronização das regras. Depois de

muita discussão, finalmente representantes de várias escolas reúnem-se na

Freemason’s Tavern, em Londres, em 26 de outubro, para criar a The Football

Association (FA), que até hoje é a responsável pelo futebol inglês. Na mesma

reunião formou-se um comitê incumbido de redigir as novas regras. Em 24 de

novembro, uma assembleia aprovou o texto e no dia 8 de dezembro a FA publicou-o

na grande imprensa (COELHO, 2002,137).

O primeiro código de regras, segundo Coelho (2002) e Franco Jr. (2007), foi

aprovado na assembleia de 24 de novembro de 1863. No grupo de alunos e ex-alunos

representantes das várias public schools houve divergências. Os representantes da Escola de

Rugby discordavam das regras que proibiam o uso das mãos27

e representantes da Escola de

26

DUNNING, Eric; CURRY, Graham (2006). 27

Sobre este tema consultar Boschilia ( 2008).

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30

Blackheath, defendendo a virilidade do jogo, não aceitavam regras que punissem as ações

violentas como os “chutes na canela” 28

por parte dos jogadores. Discordando das decisões e

dos resultados das votações nas assembleias, os representantes destas duas instituições

(Rugby School e Blackheath) se retiraram das reuniões da Football Association. Em 08 de

dezembro de 1863, com a aprovação de representantes de onze instituições foram publicadas

as 14 (quatorze) regras do futebol no jornal esportivo londrino Bell’s Life.

O nosso interesse ao descrever, apoiados pelos autores, à institucionalização do

futebol moderno, além de todo o fato histórico, é mostrar que a normatização das regras, fez

parte de um processo. A esportivização do futebol comprova o que Norbert Elias definia

como processo de longa duração presente nas sociedades. Segundo Elias e Dunning (1992,

p.17), “o desporto demonstra com toda clareza que constitui um campo de considerável

significado social...”, estudos de esportes não podem ser dissociados dos estudos da

sociedade. Para este, o esporte ajuda no entendimento da sociedade e quando os estudos de

esporte não são simultaneamente estudos de sociedade são desprovidos de contexto. Todo o

processo de normatização e institucionalização vivido pelo futebol está relacionado ao

período histórico da Inglaterra.

No site da FIFA, instituição responsável pelo futebol em todo o mundo, é possível

encontrar textos sobre a história do futebol. As informações corroboram com os fatos

apresentados pelos autores supracitados e destaca a presença de onze representantes de

escolas e clubes londrinos na Freemason’s Tavern, destaque este que nos leva a pensar que a

constituição de uma equipe de futebol com onze jogadores em campo seja uma homenagem

aos participantes deste encontro.

A criação da Football Association permitiu que as regras fossem padronizadas, o

jogo aprimorado, possibilitando o desenvolvimento do futebol. Havia a preocupação de que as

regras fossem aceitas por todos os representantes, pois assim seriam respeitadas e praticadas

nos jogos entre eles.

As regras nos ensinam os limites do jogo, quais são os elementos necessários para

jogar (espaço, tempo, sujeitos e materiais) e como proceder em relação aos objetivos (bola,

gol/ alvo) e ao adversário. Estabelecem condutas comportamentais e como se deve punir um

jogador infrator. Para Elias e Dunning (1992) as práticas físicas e as competições esportivas

28

Sobre este tema consultar Murray (2000).

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31

são confrontos de tensão entre indivíduos e equipes, sendo assim as regras deveriam manter a

disciplina dos praticantes e o jogo sob controle.

Para participar de um jogo de qualquer modalidade esportiva o jogador precisa

respeitar as regras do jogo As regras e normas que regem um esporte são determinadas pelas

federações internacionais de cada modalidade esportiva. Segundo Lagardera Otero e Lavega

Burgués (2008, pág. 48):

É importante destacar que, independente de quem sejam os jogadores intervenientes

em cada partida de futebol, esse jogo ostenta características e peculiaridades que o

diferenciam nitidamente de outras modalidades, em que os participantes devem

adaptar-se inevitavelmente. Essas condições exigidas pelo jogo estão estabelecidas

em seu regulamento. Daí que participar do jogo de futebol, ou qualquer outro, requer

submeter-se à coação de suas regras.

As regras do jogo foram sendo modificadas para acompanhar o desenvolvimento

do futebol, não mais restrito a alunos e ex-alunos das escolas públicas inglesas. Nas primeiras

regras não existia a presença de nenhum árbitro ou mediador. As decisões eram tomadas pelos

próprios capitães das equipes. Para Franco Jr. (2007), muitas das regras do futebol são

fundamentadas em eventos significativos para o povo inglês. A regra do offside, impedimento

ou “fora de jogo” introduzida em 1867, estaria relacionada a um “fair play”29

presente no

espírito britânico, segundo os historiadores italianos Antonio Papa e Guido Panico30

, “ Fica

‘fora de jogo’ quem adota comportamento furtivo. Quem se esconde nas costas do adversário

para fazer o gol”.

A regra do offside exigiu a necessidade de alguém presente no jogo, em local

privilegiado, a quem os capitães das equipes pudessem se reportar em caso de dúvidas. Surge

assim a figura do árbitro de futebol em 1868. Segundo Franco Jr.(2007, p.31):

Anteriormente as decisões eram consensuais entre os jogadores ou tomadas entre os

capitães dos times, mas com o impedimento ----- a regra mais inteligente do futebol,

por isso mesmo a mais difícil de ser aplicada ------ foi preciso alguém que de fora do

29

“Fair play” refere-se a uma disputa ética e honesta. Jogar segundo as regras e respeitando companheiros,

árbitros, adversários e torcedores. O programa fair play da FIFA “propõe um jogo limpo e esportividade de todos

os participantes e mantém atividades anuais relacionadas ao tema desde 1997”. A FIFA também possui uma

Comissão de esportividade e responsabilidade social que se ocupa de assuntos relacionados ao futebol e

supervisiona a conduta das pessoas relacionadas ao futebol. 30

Informação presente no livro de Franco Jr. (2007).

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campo, e próximo a ele, tivesse melhor visão da jogada como um todo (englobando

o lançador, o receptor da bola, a posição dos defensores) para saber se ela era legal

ou não. O árbitro, portanto, nos primeiros tempos do futebol ficava fora do campo e

na verdade só atuava sob consulta dos times: exercia efetivamente uma arbitragem.

Para Coelho (2002), “Em 1868, surge a figura do juiz (umpire), que na época

ficava fora de campo e era consultado para dirimir dúvidas a pedido dos capitães das

equipes”. Hoje modalidades esportivas como o tênis de campo e o cricket ainda utilizam a

denominação de umpire para os árbitros.

Alunos e ex-alunos das public schools acreditavam que um “gentleman” jamais

cometeria uma falta deliberadamente, de maneira intencional, porém com crescimento do

futebol nasciam os clubes, as associações e consequentemente o aumento da competitividade

e das tensões nas partidas. Segundo Murray (2000, p.24), “No fim da década de 1860 e

começo da seguinte, os dirigentes da FA de Londres, que antes controlavam alguns poucos

times da cidade, estenderam seu domínio à maioria dos times ingleses e fizeram acordos com

outros países do Reino Unido”.

Com a popularidade da Copa Desafio, competição organizada pela FA a partir de

1871, a instituição se fortalecia no comando do futebol. Em 1877, acordos com outras

associações, de Londres e Sheffield, que também organizavam torneios e eram consideradas

rivais, da FA, permitiram que a FA fosse reconhecida, “como a única autoridade de futebol da

Inglaterra, e cada vez mais associações locais eram afiliadas a ela”, Murray (2000).

Para Franco Jr. (2007) a FA inspirou o surgimento das outras federações. A

Federação escocesa em 1873, a galesa em 1876 e a irlandesa em 1882. A FA foi decisiva para

o desenvolvimento do futebol. Este desenvolvimento partilhava do crescimento econômico da

Inglaterra. A realização de torneios e as disputas eram facilitadas pelo surgimento dos novos

meios de transporte. Profissionais ingleses que iam trabalhar em outros países e nas colônias

inglesas ajudavam a divulgar o futebol, uma vez que queriam continuar a prática desse

esporte. Jovens que iam estudar na Inglaterra, aprendiam a jogar futebol e retornavam aos

seus países de origem com o livro de regras e bolas nas bagagens. Foi o que aconteceu com

Charles Willian Miller, paulista, filho de pais ingleses, nascido em 1874, que foi estudar na

Inglaterra, e ao retornar ao Brasil em 1894, atuou como jogador, árbitro e dirigente até 1910.

Charles Miller é recorrentemente considerado o “pai do futebol no Brasil” e um dos

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33

responsáveis pela sua propagação e desenvolvimento, ainda que pesquisas já tenham

identificado práticas de futebol no Brasil, anteriores a sua chegada.

O crescimento do esporte era evidente e com as novas associações e federações

aumentavam as divergências sobre as regras que ainda não estavam consolidadas a ponto de

atender tal abrangência. Em junho de 1886, é fundada a Internacional Football Association

Board (IFAB), com o propósito de acabar com todos os argumentos e divergências das

diferentes ligas e associações britânicas, unificando assim as regras entre elas. Para Coelho

(2002), “O dia 2 de junho de 1886 marca outro momento histórico para o futebol, quando as

quatro associações britânicas promovem a primeira reunião do Internacional Football

Association Board.” O autor descreve a IFAB como o xerife das regras.

A Internacional Football Association Board foi fundada pelas quatro associações

britânicas: Football Association (Inglaterra), a Scotish Football Association (Escócia), a

Football Association of Wales (País de Gales), e a Irish Football Association (Irlanda do

Norte) e até os dias de hoje é a “guardiã” das regras do jogo em todo mundo. Criticada por ser

considerada uma instituição conservadora e que dificulta a modernização do futebol, IFAB se

defende justificando que muitas alterações propostas estariam mudando a essência do futebol

que, segundo Franco Jr. (2007), teve muitas das suas regras escritas fundamentadas em

costumes ingleses. A IFAB atualmente realiza duas reuniões anuais, normalmente as que

discutem modificações das regras ocorrem em fevereiro e/ou março e qualquer federação

nacional associada a FIFA pode enviar propostas de modificação das regras, que serão

estudadas, analisadas e votadas pelos membros da IFAB.

Em 1886, a IFAB, era representada por dois membros de cada associação

britânica. Hoje cada uma das federações britânicas tem direito a um voto, totalizando quatro

votos. A FIFA representando as 205 federações nacionais tem direito a quatro votos. Para que

uma regra seja modificada são necessários ¾ dos votos, portanto seis votos.

No ano de 2014, na Copa do Mundo de Futebol realizada no Brasil, colocou-se

em prática, após anos de resistência, o uso da tecnologia. O chip colocado na bola e sensores

nas traves que confirmam através de um sinal sonoro no relógio do árbitro da partida se a bola

ultrapassou a linha de gol. O recurso foi usado pela primeira vez pelo árbitro brasileiro Sandro

Ricci, representante do Brasil, na Copa 2014, em partida disputada entre Alemanha 3 x 0

Gana. Nas reuniões de 2015, a FIFA rejeitou a proposta de uso do replay. A federação

holandesa estava realizando testes em partidas onde em caso de dúvidas o árbitro poderia

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34

consultar um quarto árbitro que estaria assistindo a partida por um vídeo. Outra alteração

adiada para novos estudos e testes, seria a autorização de uma quarta substituição de

jogadores, nas partidas que necessitassem de prorrogações31

.

Em 1863, foram estabelecidas 14 regras para o jogo. As regras passaram por duas

grandes modificações, no final da década de 1930, quando o regulamento já se apresentava

com 17 regras, foi solicitado a Stanley Rous32

que fossem feitas adequações. As regras nesta

época eram escritas em uma linguagem arcaica e não possuíam uma sequência lógica33

.

Stanley Rous tornou-se o presidente da FIFA em 1961 e as regras passaram por uma segunda

revisão somente em 1997. No site da FIFA34

podemos encontrar de maneira detalhada, todas

as modificações feitas nas regras do jogo a partir de 1980.

Outras determinações não constam no corpo das regras, como a utilização do

apito pelo árbitro. Segundo Coelho (2002, p.139):

Somente em 1878 é que alguém teve a brilhante ideia de dar um apito aos juízes. O

primeiro jogo “apitado” na História ocorreu naquele ano entre Nottingham Forest e

Sheffield Norfolk. Ainda sobre o principal instrumento de trabalho do juiz, ele foi

inventado em Birmigham, também na Inglaterra, por um marceneiro chamado

Joseph Hudson.

Na origem do futebol moderno, um jogo criado para cavalheiros, não se podia

compreender que um gentleman pudesse cometer uma falta propositalmente. Talvez seja por

esse motivo que no início as regras não previam árbitros e os lances duvidosos durante as

partidas eram decididos pelos capitães das equipes. Porém a crescente competitividade entre

as equipes no período vem acompanhada do aumento da tensão e das reclamações durante o

jogo. Esta informação, presente no texto, From 1863 to the Present Day35 (FIFA, 2015), não

deixa de ser um tanto surpreendente se creditarmos a necessidade de um árbitro para as

partidas ao aumento de reclamações entre os próprios jogadores e capitães das equipes. Hoje

31

CHADE, Jamil. FIFA veta vídeo e quarta substituição. O Estado de S. Paulo, São Paulo, Esportes, 1 mar

2015, p. 6. 32

Stanley Rous foi árbitro Internacional de Futebol. No final da década de 1930 ajudou a reescrever as Regras

do Jogo. Em 1961 tornou-se presidente da FIFA. Fonte: www. FIFA.com 33

Sobre este tema consultar o site da FIFA: www.fifa.com 34

Site da FIFA: www.fifa.com 35

Tradução: De 1863 até os dias de hoje.

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35

eu considero o árbitro um outsider36

, único, entre vinte e dois jogadores estabelecidos. O fato

é que as disputas ficaram acirradas e em 1891 para punir as ações deliberadas dos jogadores a

IFAB, introduz a regra do pênalti, conhecido originalmente como: “O chute da morte”.

Apenas em 1894, após quatro anos da introdução da regra do pênalti, o árbitro que havia

adentrado o campo de jogo em 1891, é autorizado a decidir sobre penalidades e expulsões de

jogadores. Segundo Coelho (2002, p.140):

[...] em 1891, finalmente é permitido ao árbitro entrar no campo de jogo para fazer

cumprir algumas regras. Ele deveria ser neutro e passaria a ser auxiliado por dois

linesman ou fiscais de linha. Três anos mais tarde, o árbitro receberia mais poder,

podendo assinalar tiros livres e penais. Suas decisões passavam a ser inapeláveis.

Franco Jr. (2007) diverge das datas apresentadas por Coelho (2002) e aponta o

ano de 1886 para a entrada do árbitro em campo. Assim, Franco Jr. (2007, p.37) descreve o

fato: “Em 1886 o árbitro de futebol passou a atuar dentro do campo e em 1891 surgiram os

bandeirinhas, hoje chamados de árbitros auxiliares, para acompanhar, sobretudo os offside”.

Embora os dirigentes da FA, quisessem que o futebol permanecesse como um

esporte de lazer, o profissionalismo já se fazia presente e era necessário o seu

reconhecimento. Em 1885, a FA reconhece o futebol como esporte profissional e em 1888

clubes fundam a Liga Inglesa. Segundo Murray (2000, p.30-31), “a FA tinha o controle da

Copa FA, das disputas internacionais (nas quais o profissionalismo dominava) e do futebol

amador”.

A Fedération Internationale de Football Association (FIFA) foi fundada em 21 de

maio de 1904, em Paris. Na reunião estavam presentes representantes da França, Bélgica,

Dinamarca, Holanda, Espanha, Suécia e Suíça. Os ingleses contrários à fundação da FIFA

por acreditarem ser a FA, a única autoridade no esporte, não participaram da reunião e

filiaram-se a FIFA apenas em 1906. Segundo Boschilia (2008, p.89):

36

Analogia ao termo outsider do livro: “Os estabelecidos e os outsiders” de Norbert Elias e John Scotson de

2000. Elias utiliza-se deste termo para designar os novos moradores de um bairro londrino que não são aceitos

pelos moradores que neste bairro já viviam há cinquenta anos.

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36

Apesar da filiação a FIFA, inicialmente, em 1906 com a condição de que o IFAB

fosse o responsável pelas modificações das regras do futebol, a Inglaterra, após duas

desfiliações, voltaria a figurar no quadro de membros da FIFA, de forma definitiva,

somente em 1946.

A FIFA é a instituição responsável pelo futebol no mundo e conta atualmente

(2015) 209 federações nacionais associadas. Para Boschilia (2008, p.92):

Além da possibilidade de votar e modificar a regra do jogo, a FIFA organiza e

gerencia administrativamente o futebol. Esse gerenciamento possibilita a

organização de campanhas incentivando, por exemplo, o aumento da prática do

futebol, a transformação social pelo esporte ou mesmo campanhas que tenham por

objetivo um futebol menos violento.

Aqui se faz necessário lembrar que a FIFA, embora tenha direito a 50% dos votos

nas reuniões da IFAB, não pode modificar a regra do jogo sem a concordância de pelo menos

25% dos votos da IFAB.

Responsável pelo futebol em todo o mundo, a FIFA “jamais esteve tão rica como

agora” 37

. A entidade confirmou um ganho líquido recorde de US$ 8,3 bilhões com a Copa

do Mundo do Brasil em 2014, valor adquirido com acordos comerciais, de transmissão e

venda de ingressos. O valor arrecadado ainda foi beneficiado pela isenção fiscal concedida

pelo governo brasileiro. Chade (2015) diz que:

Segundo cálculos internos da FIFA, foi ‘o evento foi o mais lucrativo da história,

incluindo Olimpíadas, Mundiais e outros torneios. Ontem, a FIFA, publicou

oficialmente seus números, confirmando que o Brasil realizou a ‘Copa das Copas’,

pelo menos para os cofres da entidade.

Nem tudo são glórias na história da instituição. O presidente da FIFA, Joseph

Blatter, suíço, nascido em 1936, foi eleito para o primeiro mandato de presidente em 1998.

Antes passou pelos cargos de diretor técnico (1975-1981) e secretário geral (1981-1998).

Foram 17 anos como presidente da FIFA e em 29 de maio desde ano, aos 79 anos de idade,

37

CHADE, Jamil. Lucro da entidade daria para construir as 12 arenas da Copa. O Estado de S. Paulo, São

Paulo, pág. 29, 21 mar 2015.

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37

foi eleito para o seu quinto mandato consecutivo. O congresso para eleger o futuro presidente

da entidade estava preparado para que Blatter e seus colaboradores comemorassem a sua

reeleição, uma vez que ele despontava como favorito, porém as prisões realizadas há dois dias

das eleições estragaram a festa, pelo menos para os cartolas da entidade. A polícia suíça, a

pedido do Federal Bureau of Investigation (FBI), justiça americana, prendeu sete dirigentes

da entidade entre eles o brasileiro José Maria Marin. O que legitimou as investigações da

polícia americana foi o fato das transações ilícitas passarem por bancos e empresas

americanas, outros suspeitos estão sendo investigados como o ex- presidente da Confederação

Brasileiro de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira e o atual presidente Marco Polo Del Nero.

Denúncias de propinas para contratos de patrocínios e corrupção para a escolha das sedes das

Copas de 2018 e 2022 somam-se as acusações de corrupção, lavagem de dinheiro, fraude,

conspiração e extorsão. Em meio a esta turbulência a eleição ocorreu e Blatter reeleito. Dias

depois chegou a renunciar, arrependeu-se e decidiu convocar novas eleições para 2016. Em

dezembro baseados nas denúncias e investigações, o Comitê de Ética da FIFA decidiu pelo

afastamento de Joseph Blatter e Michel Platini, presidente da Union of European Association

(UEFA) por oito anos das atividades ligadas ao futebol. O escritor, repórter investigativo e

documentarista britânico, Andrew Jennings autor do livro: “O jogo sujo”, contendo várias

denúncias de corrupção deve estar comemorando. Segundo Jennings (2014):

Graças à egocêntrica determinação de Blatter, de se manter na presidência da FIFA,

o futebol mundial apresenta hoje um amargo cisma, jornalistas como eu, que

revelam como ele e seus associados subornaram funcionários menos ricos na África

e na Ásia, são denunciados como “racistas”. Ele não tem limite. Sem nenhum

constrangimento, mais dinheiro é doado aos gananciosos funcionários para que

comprem votos para Blatter. Independente se ele vencer a eleição ou não, seu legado

será marcado pela corrupção e pelo ódio.

Na mesma reportagem, Jennings, cita o ex-jogador dinamarquês, Olê Anderson,

atualmente artista gráfico, que produziu um livro de caricaturas, “The Blatter Cartoons”,

agora se defende nos tribunais para garantir a circulação do livro sob a acusação dos

advogados de Blatter, que ‘O livro destruirá o nome de Blatter, arruinando sua reputação’38

.

Diante de tantas denúncias de corrupção que rondam e ameaçam muitos dirigentes do Comitê

38

JENNNINGS, Andrew. Salvem o futebol das mãos da FIFA. O Estado de S. Paulo, Caderno Aliás, pág. 2, 15

jun 2014.

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38

Executivo da FIFA, não será mais o livro de Olê Anderson o responsável por destruir a

reputação de Joseph Blatter e a da instituição. Ele e seus “amigos” se encarregaram disso.

Diante de tantas denúncias de propinas para contratos de patrocínios e acusações de

corrupção, lavagem de dinheiro, fraude, conspiração e extorsão retomamos aqui os

comentários de Fidel Castro: “Há esportes em que a arbitragem está muito corrompida.

Nossos atletas lutam contra o adversário e o árbitro”. Mesmo que Fidel possa ter razão nas

suas afirmações, os árbitros que se corrompem são instrumentos de alguns dirigentes do

futebol nacional e mundial que de maneira ilícita visam o futebol para enriquecimento e

benefícios próprios como tem demonstrado o início das investigações do FBI e da justiça

suíça.

1.2 OS ÁRBITROS

O árbitro esportivo é a autoridade máxima durante o jogo. Sua função é fazer com

que as regras sejam cumpridas por todos os participantes e que a disputa seja realizada no

chamado fair-play, ou seja, de acordo com as regras técnicas e disciplinares do esporte, dentro

de um código de ética e respeito estabelecido pela FIFA.

Se todos os participantes do jogo de futebol conhecem as regras do jogo, por que a

necessidade de alguém, neste caso um árbitro, atuar como mediador das decisões? Seria

possível um jogo sem árbitros?

A história nos mostra que o aumento da competitividade e popularidade do

futebol exigiu a figura de um mediador para acompanhar as disputas. Nos dias de hoje, os

grandes investimentos realizados pelas equipes e o jogo de interesses por parte dos dirigentes

esportivos aumentam a pressão sobre os jogadores, comissão técnica e árbitros por resultados

satisfatórios.

O árbitro tem o dever de conhecer as regras do jogo e saber aplicá-las, como

mediador de conflitos escolhe o que é melhor para o jogo, estabelece critérios de igualdade

para as duas equipes, decide com honestidade e procura manter as tensões dos jogadores e

comissão técnica sob controle. Segundo o regulamento de arbitragem da Federação Paulista

de Futebol (2015), artigo 21, primeiro parágrafo, são deveres do árbitro:

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39

Cumprir e fazer cumprir as Leis do Jogo, o Regulamento das Competições e o

Regulamento Geral da Arbitragem, mantendo a conduta conforme os princípios

desportivos de lealdade, probidade, verdade e retidão, em tudo o que diga respeito à

direção dos jogos e às relações de natureza desportiva, econômica e social.

Personagem polêmico, criticado e questionado por dirigentes, comissão técnica,

atletas, mídia, torcedores e espectadores; as suas interpretações e decisões são, quando no

exercício da função de árbitro, na maior parte das vezes, compreendidas como má-fé se

contrariam a percepção do observador sobre a cena do jogo. “A suposição de má-fé na série

impressionante de equívocos em campo está sempre à frente da possibilidade mais razoável

de despreparo generalizado para o exercício da profissão” 39

. Para os torcedores fanáticos, o

árbitro é o sujeito que “faz o seu time perder” ou que, apesar do “juiz” atrapalhar, o seu time

conseguiu vencer. Segundo Franco Jr. (2007, p. 249):

Enquanto símbolo de autoridade são identificados com governos autoritários e

corruptos, frequentes na nossa história, e de maneira sistemática são agredidos

verbalmente pelas torcidas antes mesmo de começar a trabalhar. De um ponto de

vista sociológico, é como partir do pressuposto que todo árbitro é corrupto.

Para se formar como árbitro de futebol é preciso se inscrever, participar e ser

aprovado nos cursos de formação para árbitros oferecidos pelas federações nacionais. A

Escola de Árbitros da Federação Paulista de Futebol (FPF) foi criada em 1949 e mantém

cursos regulares para a formação de árbitros com duração de dezoito meses. O curso consiste

de aulas teóricas e práticas e sendo aprovado o aluno fará estágios supervisionados nas

categorias de base da Federação Paulista de Futebol. Cumpridas as exigências da Escola de

Árbitros será da competência da Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol da FPF

(CEAF/SP) todos os assuntos relacionados aos árbitros paulistas na FPF. Assim consta no

Regulamento da Arbitragem no Capítulo 1, intitulado: Definição de Competência:

Art. 1º – Compete à Federação Paulista de Futebol (FPF) coordenar e administrar o

sistema de arbitragem no âmbito das competições organizadas, promovidas ou

patrocinadas pela entidade, bem como para os jogos amistosos entre associações que

39

Reportagem do jornalista Alfredo Ribeiro Bastos que mantém uma coluna de humor, Tutty Vasquez, no

jornal “O Estado de S. Paulo”. O texto citado foi publicado na página 8, em 04 de setembro de. 2012.

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pratiquem futebol profissional e não profissional nos termos definidos do presente

Regulamento.

Art. 2º – As competências previstas no artigo anterior serão exercidas pela

Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol (CEAF/SP).

A CEAF/SP, segundo o regulamento, é constituída por:

I – 01 (um) Presidente, nomeado pelo Presidente da FPF;

II – 03 (três) membros, indicados pelo Presidente da Comissão, todos ex-árbitros ou

ex-árbitros assistentes de futebol profissional que tenham atuado por mais de 5

(cinco) anos no quadro de árbitros da Federação Paulista de Futebol.

Uma equipe de arbitragem, segundo o regulamento, é composta por:

I- Um árbitro;

II- Dois árbitros assistentes;

III- Um quarto árbitro, exceto em competições sem previsão pela organização, o

qual exercerá as suas funções de acordo com as Leis do Jogo; e

IV– Dois árbitros assistentes adicionais, quando constar do Regulamento Particular

da Competição.

Entre as muitas competências da Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol,

destacamos as seguintes:

- Designar a equipe de arbitragem para os jogos das competições organizadas ou

apoiadas pela FPF, nos termos deste Regulamento e da legislação desportiva em vigor.

- Elaborar e divulgar os critérios de avaliação para os árbitros integrantes da Relação

Anual dos Árbitros, para fins de classificação e mudança de categoria.

A CEAF/SP classifica seus árbitros e assistentes em seis categorias, sendo a

Categoria Especial os que podem atuar em todas as competições organizadas pela FPF e os

árbitros da 6a categoria os alunos que finalizaram o curso da Escola de Árbitros e que passarão

pelo estágio supervisionado nas categorias de base. Também é da competência da CEAF/SP a

indicação dos árbitros paulistas para o Quadro Nacional de Árbitros.

Para atuar na FPF é necessário que o árbitro esteja de acordo com todos os itens

que constam no Regulamento de Arbitragem e embora cumpra todas as exigências isto não

caracteriza vínculo empregatício com a entidade. O árbitro precisa ser credenciado ao

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Sindicato (SAFESP) e/ou a Associação Nacional de Árbitros de Futebol (ANAF). Segundo o

Regulamento de Arbitragem:

Os árbitros de futebol e seus auxiliares exercerão as suas atividades e serão

remunerados em conformidade com o disposto no § único, do art. 88, da Lei

9.615/98, ou seja, prestação de serviço autônomo, sem vínculo empregatício com as

entidades desportivas diretivas onde atuarem, e sua remuneração, como autônomo,

exonera a Federação Paulista de Futebol de quaisquer outras responsabilidades

trabalhistas, securitárias e previdenciárias.

Em 10 de Outubro de 2013, a presidente Dilma Rousseff, sancionou a Lei número

12.867/13 que regulariza e reconhece a profissão de árbitro de futebol. Publicada no Diário

Oficial da União (DOU) em 11 de outubro de 2013 consta dos seguintes artigos:

Art. 1ºA profissão de árbitro de futebol é reconhecida e regulada por esta Lei, sem

prejuízo das disposições não colidentes contidas na legislação vigente.

Art. 2ºO árbitro de futebol exercerá atribuições relacionadas às atividades

esportivas disciplinadas pela Lei no 9.615, de 24 de março de 1998, destacando-se

aquelas inerentes ao árbitro de partidas de futebol e as de seus auxiliares.

Art. 3º(VETADO)

Art. 4ºÉ facultado aos árbitros de futebol organizar-se em associações profissionais

e sindicatos.

Art. 5º É facultado aos árbitros de futebol prestar serviços às entidades de

administração, às ligas e às entidades de prática da modalidade desportiva futebol.

Art. 6ºEsta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Apesar de ser facultativo aos árbitros organizar-se em associações e sindicatos, a

FPF exige que todos os seus árbitros sejam associados e/ou sindicalizados. Embora a lei

reconheça e regularize a profissão, sua homologação não trouxe mudanças significativas à

categoria até o momento. Os árbitros continuam sem vínculo empregatício e sem os

benefícios trabalhistas que advém de registro na Carteira de Trabalho.

1.3 AS MULHERES NA ARBITRAGEM

O Brasil se prepara para sediar os XXXI Jogos Olímpicos, na cidade do Rio de

Janeiro, em 2016. Na expectativa de resultados positivos que atendam a previsão do Comitê

Olímpico Brasileiro de finalizar as competições entre os dez melhores países no quadro de

medalhas, investimentos estão sendo feitos e a esperança e o trabalho dos organizadores

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brasileiros é que possam ao término do evento comemorar muitas conquistas douradas pelas

equipes brasileiras masculinas e femininas.

As conquistas das seleções brasileiras femininas há tempo deixaram de ser

surpresas. A equipe de voleibol feminina é bicampeã olímpica. O handebol brasileiro

feminino foi campeão mundial em 2013 e sempre foi a equipe mais vitoriosa nessa

modalidade esportiva, temos conquistas em muitas modalidades individuais como atletismo,

judô, ginástica artística, iatismo entre outras.

Para os torcedores brasileiros, o futebol feminino tem nos representado melhor

que a equipe masculina de futebol, isto porque a equipe feminina sempre surpreende com

excelentes resultados, enquanto o torcedor brasileiro, não aceita da equipe masculina, outro

resultado que não seja a vitória. Nós, brasileiros, ainda não pudemos comemorar um título

olímpico no futebol.

Embora possamos enxergar avanços para a prática das mulheres no futebol em

relação a preconceitos e a aceitação das meninas jogarem futebol, segundo Souza Jr. (2013) o

futebol feminino continua sendo preterido e as jogadoras não profissionalizadas. Os

investimentos e as melhores condições de treinamento ocorrem apenas quando há o interesse,

por parte dos dirigentes, de uma boa participação na Copa do Mundo de Futebol Feminino e

dos Jogos Olímpicos. Para Dunning e Maguire (1997), a história das mulheres atletas é

marcada pelas restrições, discriminação e preconceito.

Desde o início, as mulheres tiveram de lutar com firmeza para tomar pé no mundo

do esporte e assim mesmo seu status, embora não gravemente ameaçado, continua

marginal, como o mostra a hierarquia prestigiosa dos esportes ainda dominados por

homens, a cobertura ainda pequena dos esportes femininos pela mídia, os prêmios de

pouco valor que as grandes esportistas recebem em comparação com os dos homens,

além da participação relativamente pequena das mulheres em manifestações como

os Jogos Olímpicos.

Pelo menos quanto à participação das mulheres, podemos comemorar avanços.

Nos Jogos Olímpicos em Londres em 2012, as mulheres correspondiam a 46% dos atletas

participantes e pela primeira vez na história as mulheres participaram de todas as modalidades

esportivas com a introdução do Boxe Feminino. É um fato histórico a considerar que Barão de

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43

Coubertin, o pai das olimpíadas da Era Moderna, era contra a participação feminina. Em

Goellner (2005) podemos acompanhar o texto de Coubertin de 1938.

Technicamente as jogadoras de futebol ou as pugilistas que se tentou exhibir aqui e

ali não apresentam interesse algum; serão sempre imitações imperfeitas. Nada se

aprende vendo-as agir; e assim os que se reúnem para vel-as obedecem

preocupações de outra especie. E por isso trabalham para a corrupção do esporte,

aliás, para o levantamento da moral geral. Si os esportes femininos forem

cuidadosamente expurgados do elemento espetaculo, não há razão alguma para

condena-los. Ver-se-á, então, o que delles resulta. Talvez as mulheres

comprehenderão logo que esta tentativa não é proveitosa nem para seu encanto nem

mesmo para sua saúde. De outro lado, entretanto, não deixa de ser interessante que a

mulher possa tomar parte, em proporção bem grande, nos prazeres esportivos do seu

marido e que a mãe possa dirigir intelligentemente a educação physica dos seus

filhos (COUBERTIN, 1938, p.46).

Em 1941, apoiados no discurso os médicos higienistas, que acreditavam ser os

esportes de contato, força e resistência prejudicial à saúde, o governo brasileiro por meio do

Conselho Nacional de Desportes proibiu a prática de algumas modalidades esportivas para as

mulheres. Segundo Goellner (2005) foi uma época de diferentes concepções acerca da relação

entre mulheres e atividades físicas, não somente no que se refere à preocupação com a

natureza do corpo feminino, mas por acreditar que “na fase de estruturação do esporte

feminino no país, idéias progressistas e moralistas seduziam e desafiavam as mulheres...”.

Em 1965, a Deliberação no

7, do Conselho Nacional de Desportes proibiu as

mulheres de práticas de lutas de qualquer natureza, futebol, futebol de salão, futebol de praia,

polo aquático, rugby, halterofilismo e baseball. Esta deliberação somente seria revogada em

1979.

Se para as mulheres atletas a situação nunca foi favorável, à situação vivida pelas

mulheres que querem se tornar árbitras é mais complicada. Sendo o esporte criado pelos

homens e para os homens, uma mulher que pretende dirigir, arbitrar partidas e disputar

espaços hegemônicos masculinos sofre uma série de barreiras, preconceitos e discriminação,

que vão desde os estereótipos de homossexual à erotização do corpo feminino. Segundo Reis

(1998, p. 46)

Os esportes modernos foram construídos culturalmente para os homens, o que

significa dizer que, assim como em todos os ramos sociais, também nos esportes a

mulher teve de conquistar sua participação e ganhar reconhecimento.

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Na arbitragem a mulher luta pela igualdade de direitos e pelo reconhecimento para

poderem dirigir partidas de futebol profissional. Para Reis (1996, p.37):

As conquistas no campo esportivo seguem as conquistas do campo social. Como

vivemos em uma sociedade onde os valores predominantes ainda são os masculinos,

certamente no campo dos esportes o que predomina são os valores masculinos.

Nascida em 1945, a brasileira Asaléa Campos Micheli tornou-se em 1971, a

primeira árbitra do mundo de futebol. Léa Campos cursou a Escola de Árbitros do

Departamento de Futebol Amador da Federação Mineira de Futebol em 1967 e aproveitando a

“lacuna” na lei, que proibia a prática de futebol pelas mulheres, porém não mencionava que as

mulheres não poderiam ser árbitras de futebol, ao concluir o curso, buscou por quatro anos a

liberação do seu diploma junto a Confederação Brasileira de Desportes (CND) na época

presidida por João Havelange. Para que pudesse participar de um torneio amistoso e do

mundial de futebol feminino no México convidada pela FIFA, Léa necessitava da autorização

da CND que somente foi conseguida com a intervenção do presidente Emílio Garrastazu

Médici junto a CND. Embora com mais de 100 jogos apitados no Brasil e no exterior, Léa

não conseguiu atuar pela Federação Paulista de Futebol porque Álvaro Paes Leme, diretor do

Departamento de árbitros da Federação Paulista de Futebol não quis reconhecer o diploma da

árbitra40

.

Situação congênere Heloisa Helena Baldy dos Reis passou com a FPF quando em

1984 a mesma se negou a reconhecer seu curso da Liga Campineira de Futebol (LCF), na

ocasião todos os seus colegas árbitros (homens) da LCF tiveram seu diploma reconhecido

pela FPF, a resposta à entidade sobre o registro de Heloisa foi que mulher não podia apitar

futebol. A árbitra campineira teve que atuar apenas na LCF41

.

Para Dunning e Maguire (1997), ressentidas com um passado de restrições e

limitações vinculadas aos papéis femininos, as mulheres buscaram nos esportes além da

satisfação, mobilidade, sociabilidade, autoconfiança, “o desejo de ser iguais aos homens”.

40

Fonte: www.globoesporte.com 41

Em 1985 a árbitra Heloisa decide dedicar-se apenas a arbitragem de Futebol de Salão por ter os dirigentes e

seus colegas árbitros da Liga Campineira de Futebol de Salão (LCFS) incentivado. No entanto a Federação

Paulista de Futebol de Salão (FPFS) relutou em aceitar a árbitra em seu quadro de árbitros. Retornando o pedido

de árbitra como o de mesário à revelia. A queixa do erro foi levada à FPFS pelos dirigentes que retornaram com

a mesma resposta da LCF.

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Apesar da busca pela igualdade de direitos acompanhar a história das mulheres,

acreditamos que a satisfação, o prazer em praticar e arbitrar jogos de futebol e “a busca pela

excitação” é que fazem com que muitas mulheres se aventurarem na conquista por espaço na

arbitragem e em diferentes campos sociais. Muitas vezes sofrem preconceito de outras

mulheres que corroboram com os estereótipos de feminilidade. Na busca pelo reconhecimento

as mulheres têm vencido dificuldades e tendo destaque nas diferentes profissões e a fala da

comandante do primeiro batalhão feminino afegão traduz este empenho e dedicação. Segundo

Fahima Misbah, “O que digo para as minhas recrutas é que, não podemos errar. Temos de ser

melhores do que os homens, para ter o respeito deles” 42

. O que a comandante deixa claro para

o seu batalhão feminino é que as mulheres precisam ser eficientes na função. Os erros ou até

pequenos descuidos das mulheres nas mais variadas profissões não são aceitos, se estas

profissões ainda mais se forem predominantemente exercidas por homens.

1.4 A TELEVISÃO, A MÍDIA E OS ÁRBITROS DE FUTEBOL

O interesse em assistir aos jogos de futebol começou no final do século XIX.

Segundo Reis e Escher (2006) a profissionalização do futebol em 1885 na Inglaterra, permitiu

as pessoas que não haviam estudado nas escolas públicas inglesas, que não tinham profissões

definidas e ou estivessem desempregados tivessem tempo para se dedicar aos treinamentos

desenvolvendo assim habilidades e melhorando a qualidade dos jogos. Isto nos apresenta um

significado social relevante também presente no futebol brasileiro. Vários jogadores que se

destacaram nos gramados brasileiros e até internacionais apresentavam um baixo nível de

escolaridade. Atualmente muitos jovens brasileiros abandonam os estudos para “correr” atrás

do sonho de se tornar um jogador de futebol profissional.

Consideramos a profissionalização como um marco essencial para o entendimento

do futebol como espetáculo, pois o interesse pela assistência do futebol começa a

surgir nas duas últimas décadas do século 19, quando também começam as

cobranças para ingressos nos jogos esportivos na Inglaterra e também se iniciam as

competições formais na forma de campeonatos (REIS e ESCHER, 2006, p.26).

42

Reportagem Especial de Adriana Carranca, no jornal “O Estado de S. Paulo”, Caderno Internacional, pág. 20

em 23 de setembro de 2012.

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Se a profissionalização é considerada um marco para o crescente interesse pelo

futebol, o papel da imprensa na divulgação deste futebol e, portanto, sua contribuição para o

desenvolvimento desse esporte foi e continua sendo fundamental, desde as primeiras reuniões

dos estudantes das escolas públicas inglesas pela unificação das regras. As transmissões, no

Brasil, das partidas pelo rádio na década de 1930 e a televisão que surge na década de 1950

foram fatores importantes para que o futebol se tornasse um fenômeno mundial. Para Reis e

Escher (2006, p.6), o advento da televisão transforma o futebol em telespetáculo.

A televisão surge na década de 1950, mas a sua difusão e massificação ocorrem

somente no final da década de 1960 e principalmente na década de 1970.

Particularmente acredito que a transformação do futebol em telespetáculo se dá

depois das décadas de 1980 e 1990, com o futebol voltado quase que exclusivamente

para os interesses televisivos.

As transmissões esportivas pelo rádio somente começam a perder a preferência

após 1970, ano em que a televisão transmitiu a primeira Copa do Mundo ao vivo e em cores.

A possibilidade das transmissões ao vivo das partidas de futebol pela televisão surgiram com

o lançamento do primeiro satélite dos Estados Unidos. Na Copa do Mundo de 1966, alguns

países europeus tiveram o privilégio de acompanhar as transmissões ao vivo, oportunidade

que os brasileiros teriam apenas em 1970. Segundo Gomes e Silva (2005):

Os compêndios sobre a história do futebol brasileiro também mostram que a partir

da Copa de 1962 o Brasil passa a ter imagens através do videotape, tecnologia usada

em prol do futebol que ajudou a divulgar ainda mais este esporte. Eram imagens em

preto & branco, gravadas e transmitidas pela televisão. A desvantagem deste

sistema, neste caso, é que a emoção não era a mesma, pois o público já tinha

conhecimento do resultado. Na copa de 1966 a sistemática foi a mesma.

Vivemos a era da globalização. A tecnologia permite que a informação e a notícia,

que dependendo da notoriedade, é transmitida e divulgada em tempo real, nos coloquem

conectados e acompanhando o futebol, suas equipes e campeonatos por todo mundo. As

pesquisas científicas associadas aos treinamentos cada vez mais específicos contribuem para

que atletas estejam bem preparados para poderem proporcionar excelentes espetáculos de

futebol. Segundo Betti (2006), “O esporte vem se tornando uma parte cada vez maior da

indústria de lazer, e um fator decisivo para isto é o papel desempenhado pelos meios de

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comunicação, em especial a televisão”. Segundo o autor, o futebol espetáculo é um “evento da

mídia com finalidades comerciais, que inclui televisionamento e reportagem com maior

espectro de cobertura que o evento da partida”. O futebol espetáculo é hoje uma mercadoria e

o que almejam os grandes investidores, empresários nacionais e internacionais, é que

“consumir” este espetáculo e seus produtos tragam muitos lucros, as empresas e aos

dirigentes. Na base desta pirâmide econômica estão os maiores responsáveis pelo espetáculo:

os jogadores. Mídia e futebol parece ter sido o casamento perfeito, pelo menos para atender

aos interesses econômicos. As emissoras favorecidas pelos recursos tecnológicos de captação

e edição de imagens, do videotape e paixão do povo brasileiro pelo futebol, investem cada vez

mais no jornalismo esportivo e nos programas de debate. Os jogadores tem sua imagem

associada a produtos e os interesses da televisão como horário das partidas, calendário dos

jogos entre muitos outros, estão acima dos interesses do “consumidor final”, o torcedor

brasileiro.

Distante da possibilidade de usufruir de toda esta tecnologia e investimentos está

o árbitro de futebol. Analisar e comentar os erros cometidos pelos árbitros é uma prática

comum no meio jornalístico. Esta prática cria visibilidade e rende horas de exposição na

mídia esportiva televisiva. Poderíamos dizer que esta prática até torna o futebol mais

empolgante. Os erros e acertos são o assunto das rodas de amigos, principalmente após a

rodada do final de semana e se todos os brasileiros são técnicos de futebol, as segundas-feiras

também são os melhores árbitros. Estas conversas são recheadas de muita emoção quando a

discussão é sobre a partida do “time de coração” e se o amigo da roda de conversa for do time

adversário, não será tão fácil concordar ou não com o verdadeiro árbitro da partida.

A FIFA mantém sua posição de entidade conservadora quando o assunto é alterar

as regras e principalmente para que o uso da tecnologia possa auxiliar árbitros e assistentes a

minimizar os erros em uma partida de futebol. Poucas foram as alterações significativas que

auxiliaram o trabalho da arbitragem. A possibilidade de utilizar uniformes de várias cores

suavizou a imagem dos árbitros, porém parece ter atendido muito mais aos interesses dos

patrocinadores dos materiais esportivos, das instituições e das imagens do espetáculo do que

para atender aos interesses dos próprios. É frequente que estes uniformes contenham

propagandas e os árbitros não recebem nenhum benefício ao usá-los. Boschilia, Vlastuin e

Marchi Jr. (2008) dizem que:

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O aspecto autoritário, sombrio ou mesmo suspeito do árbitro, reforçado pelo seu

tradicional uniforme preto, vem sendo rompido desde a Copa de 1994, na qual foi

possibilitada a implementação de mudanças visuais e estéticas àqueles que

comandam os jogos. Dessa maneira os conhecidos “homens de preto” puderam pela

primeira vez utilizar camisas com cores que variavam do preto e do amarelo, outra

cor bastante utilizada.

Coincidentemente ou não, a utilização dos cartões amarelo e vermelho vem

acompanhando as transmissões em cores pela televisão. Antes da Copa de 1970 as

advertências aos jogadores eram anotadas em cadernetas. Um jogador que fosse expulso seria

acompanhado pelo árbitro até a linha lateral do campo. Os cartões possibilitaram que a

informação sobre as punições dos jogadores fossem visualizadas por todos e contribui para

sanar problemas de comunicação entre árbitro e jogadores principalmente em jogos

internacionais. Segundo Simon (2004, p.87) os cartões foram uma “brilhante associação de

ideias” do inglês, Ken Aston, na época, diretor de arbitragem da FIFA, que transferiu a

simbologia internacional usada nos semáforos de trânsito para o futebol.

A bandeira eletrônica, recurso utilizado pela primeira vez na Copa de 1998

favoreceu a comunicação entre árbitro e assistentes. Este recurso permitiu melhora na

mecânica dos deslocamentos do árbitro que não precisa estar em constante comunicação

visual com os assistentes. Assim, Simon (2004, p.26) descreve o equipamento:

No braço esquerdo ele terá um signal bip, aparelho em conexão com um sinalizador

na bandeirinha dos árbitros assistentes: quando estes apertam o botão que há no cabo

da bandeirinha, o signal bip dá sinal, chamando a atenção do juiz para alguma

irregularidade.

Enfim, o chip na bola e sensores instalados dentro da baliza (gol) possibilitam ao

árbitro a confirmação do gol. Um sinal é transmitido no relógio do árbitro quando a bola

ultrapassa totalmente a linha de gol. Esta tecnologia foi utilizada pela primeira vez na Copa

de 2014 e ajudou para que erros como na Copa de 2010, na qual um gol legítimo da seleção

dos Estados Unidos não fosse confirmado no jogo contra a seleção da Eslovênia e um gol

legítimo dos ingleses anulado na partida entre Alemanha e Inglaterra não se repetissem. Estes

erros eram frequentes na história das Copas.

A tecnologia do chip, apesar de importante, é ínfima se considerarmos todos os

recursos e toda tecnologia hoje disponível, que poderia auxiliar a equipe de arbitragem. Os

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recursos do videotape, presente em algumas modalidades esportivas, para que em momentos

decisivos e importantes de uma partida, o árbitro possa se certificar de uma marcação de um

lance decisivo, não é autorizado no futebol. Segundo Reis e Escher (2005), com narrações

entusiasmadas, replays e super imagens, os torcedores saem do estádio com vontade de rever

os melhores momentos da partida e sanarem suas dúvidas sobre os lances duvidosos na TV. O

árbitro é analisado constantemente, porém as imagens televisivas é que são aceitas como

verdades absolutas e inquestionáveis. A câmera é infalível. Para Reis e Escher (2005, p.29):

O juiz seria um ser humano, portanto limitado, passível de erros, que não consegue

perceber com a exatidão das câmeras o que ocorre dentro do campo de jogo, local

supostamente comandado pelo árbitro. Supostamente porque ele está sendo vigiado

pelas câmeras e qualquer falha será corrigida, porque o juiz pode falhar, mas à

câmera não falha nunca, ‘as imagens não mentem’ como diria o comentarista, ou

então ‘as câmeras da Globo’ mostram todos os detalhes para você.

Lances polêmicos, repetidos a exaustão, incriminam “àquele” que não poderia ter

errado, tendo uma única chance de decidir. Sendo o jogo transmitido para milhões de

espectadores, muitos destes jornalistas, profissionais que são formadores de opinião, parecem

não compreender a importância e a responsabilidade de seus comentários direcionados a todos

os participantes do espetáculo esportivo (para o propósito deste trabalho, a equipe de

arbitragem) em incitar a violência. Muitos destes profissionais, provavelmente, sem jamais

terem lido um livro de regras, se colocam no direito de questionar e criticar as decisões dos

árbitros, após terem utilizado, inúmeras e repetidas vezes, recursos tecnológicos para verem a

cena e exporem suas opiniões. Para Simon (2004, p.100):

Observar os jogos por meio de recursos eletrônicos de que hoje se pode dispor numa

emissora de TV é uma coisa completamente diferente de apitar um jogo. Por isso,

parece essencial que o analista mantenha sempre um rigoroso distanciamento crítico:

tem que levar em conta as circunstâncias em que está envolvido o árbitro: frações de

segundo para tomar uma decisão, visão de jogo desde o mesmo plano em que ele

acontece etc. O árbitro em campo não conta com um monitor de TV que lhe mostre

o lance repetidas vezes. Deveria ter um?

Carlos Eugênio Simon, representante da arbitragem brasileira nas Copas de 2002,

2006 e 2010, considera que a presença de analistas de arbitragem nas emissoras de TV tem

contribuído para que o torcedor conheça melhor as regras do jogo, apesar da credibilidade de

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que desfrutam por terem sido árbitros, o telespectador ou ouvinte não deveria considerar a

opinião destes comentaristas “definitivamente inequívoca”.

Segundo o árbitro de futebol espanhol, Eduardo Gonzalez entrevistado no

programa “Liga Confidencial” da ESPN Internacional, “Este é um jogo no qual o único em

desvantagem é o árbitro. Por quê? Porque nos julgam com 20 câmaras contra dois olhos. Eu

só tenho um ângulo. E tomara que esteja bem posicionado para ver este ângulo”.

O fato é que erros de arbitragem sempre existirão, assim como os erros dos

jogadores, porém os torcedores parecem ser mais complacentes com os erros dos jogadores. O

árbitro jamais pode errar.

Pesquisa realizada na Universidade Católica Australiana em 2008, em Sidney, por

Christopher Baldwin, tinha por objetivo examinar se o trabalho realizado por comentaristas e

jornalistas esportivos, quando analisam o trabalho da arbitragem, causa stress e ansiedade nos

árbitros e pode interferir nas tomadas de decisões destes, durante uma partida. Para os árbitros

entrevistados a mídia exagera nos comentários sobre os supostos erros da arbitragem, os

árbitros sentem-se “incomodados” ao ouvirem ou lerem os artigos publicados e análises das

partidas e acreditam que os jornalistas e analistas esportivos tem pouco conhecimento sobre

esportes. A conclusão da pesquisa mostra que a mídia embora não seja a única responsável,

causa stress e ansiedade nos árbitros. Utilizando-se de uma linguagem agressiva e de recursos

tecnológicos, expõe os árbitros e contribui para uma imagem negativa dos mesmos na

sociedade.

Para Betti (1997, p. 132), “Mas não é também isso - polêmica, dúvida e discussão

– que torna o futebol tão apaixonante as multidões, e é objeto privilegiado na temática da

própria mídia”. O fato é que o árbitro é também responsável pelo sucesso de público e

financeiro do espetáculo. E para encerrarmos este capítulo, utilizamos algumas expressões

usadas por jornalistas e comentaristas esportivos, expressões estas encontradas nas pesquisas

de Mauro Betti (1997): Oh, seu juiz, a regra é “clara”. Nada de “fazer média” e “usar dois

pesos e duas medidas” porque se o senhor não estiver “mal intencionado” hoje não vamos

perder este jogo.

No capítulo 2 abordaremos a teoria do processo civilizatório de Norbert Elias, a

qual é referência para a análise dos nossos dados e para a pesquisa como um todo.

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2. A TEORIA FIGURACIONAL DE NORBERT ELIAS

2.1 “UM DOS SOCIOLÓGOS DE MAIOR DESTAQUE DO SÉCULO XX”43

Norbert Elias nasceu em Breslau em 22 de Junho de 1897 e faleceu em Amsterdã

em 1990. Quando perguntado sobre sua nacionalidade, Elias se identificava como: “um judeu

alemão que viveu trinta anos na Inglaterra.” Considerado um dos maiores sociólogos do

século XX, atribuía muito dos seus interesses intelectuais ao privilégio de uma excelente

formação no ensino secundário no liceu Johnnes de Breslau, hoje Wroclaw na Polônia, onde

conviveu com professores e colegas, descritos por ele como: “brilhantes”. Estudante de

medicina por influência do pai, que não teve a oportunidade de ter feito estudos universitários

e estudante de filosofia, por opção, interesse este que surgiu com os estímulos intelectuais

recebidos no liceu Johnnes. Convocado para a I Guerra Mundial dizia: “... dirigia-me para a

morte porque era obrigado”. Segundo Elias, a experiência que teve como soldado, sem direito

a escolhas, trabalhando muito duro o ajudou a conciliar dois cursos acadêmicos tão distintos.

“Para mim, o mundo só mudou com a guerra”. E realmente mudou. Segundo Elias, a guerra e

a necessidade de trabalhar em uma fábrica quando os pais já não dispunham de uma situação

econômica estável possibilitou novos interesses acadêmicos, para Elias “depois de minha

experiência durante a guerra e na fábrica, era natural que quisesse fazer estudos que

estivessem mais próximos da realidade da vida” (ELIAS, 2001, p.44).

Sua adesão à Sociologia deu-se em Heidelberg onde conviveu com Alfred Weber

e Karl Mannheim entre outros sociólogos. Em 1929 tornou-se assistente de Karl Mannheim

na Universidade de Frankfurt. Em 1933 quando percebeu os perigos de continuar a viver na

Alemanha de Hitler foi para França. Dois anos depois se mudou para a Inglaterra e escreveu a

obra: O processo civilizador, publicada em 1939, com a ajuda financeira do pai. Após o difícil

começo para se estabelecer na Inglaterra profissionalmente, por ser um imigrante, tornou-se

professor da Universidade de Leicester em 1954.

Elias nunca se perdoou por não ter conseguido convencer os pais do real perigo

que a Alemanha significava para os judeus. Seu pai morreu em 1940 e sua mãe morre em

Auschwitz.44

43

Esta frase foi retirada do texto da contra capa do livro: “Os Estabelecidos e os Outsiders”. 44

Informação retirada na dedicatória da obra: O Processo Civilizador I.

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O jovem que queria ser professor universitário e que ouvira de um aluno de classe

no liceu, em meio a gargalhadas de outros colegas e do professor, que “O caminho que te leva

a esta carreira te foi barrado desde o nascimento”, trabalhou muito para que seu objetivo se

concretizasse. Segundo Elias (2001, p.22), ele:

Soube muito cedo o que queria fazer: queria ir para a universidade, queria ensinar e

pesquisar. Soube isso desde a minha infância, e trabalhei tenazmente para atingir

esse objetivo, mesmo que às vezes me parecesse impossível.

O “judeuzinho”, assim chamado agressivamente por alguns colegas de turma,

descritos por ele como “patifes”, nos brindou em 1994 com a obra “Estabelecidos e

Outsiders” escrita em conjunto com John Scotson. Não somente as suas obras e pesquisas,

mas toda a sua vida, nos possibilitam compreender e reconhecer a importância de Norbert

Elias, não apenas para a Sociologia, mas para todas as ciências humanas. Este é o referencial

teórico escolhido para essa pesquisa, pelas suas brilhantes obras e porque não por sua

trajetória de vida. Nas palavras de Elias (2001, p.22), ele não tinha certeza absoluta, “ mas não

duvidava nem um pouco de que minha obra um dia seria reconhecida como contribuição de

qualidade ao saber da humanidade”.

2.2 ELIAS E A SOCIOLOGIA

Elias considerava que o fato de muitos sociólogos da sua geração serem de

diferentes áreas de conhecimento isto não deveria ser entendido como um descrédito. A

sociologia se “beneficiava enormemente” de poder contar com representantes que estudaram

outras matérias. Elias dizia que a importância de Comte para a sociologia não se limitava

apenas a uma designação, em ser o “pai da sociologia” e que entre tantos trabalhos, teorias e

problemas sociológicos pesquisados, Comte já se dedicava a problemática da especialização

científica. Assim, Elias escreve sobre este tema:

Hoje em dia, a própria sociologia corre o perigo de se fragmentar em sociologias

cada vez mais especializadas --- da sociologia da família à sociologia das

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organizações industriais, da sociologia do conhecimento à sociologia das mutações

sociais, da sociologia do crime à sociologia da arte e literatura, da sociologia do

desporto a sociologia da linguagem. Em breve, haverá especialistas em todos estes

campos, elaborando os seus próprios termos técnicos, as suas teorias e métodos que

se tornarão inacessíveis aos não especialistas. (ELIAS, 2008, p.53)

O fato de Elias ter uma formação acadêmica em medicina, interrompida nos

estágios clínicos e filosofia reforça e legitima a sua critica a toda forma de dicotomia. Sempre

contrário aos estudos que fracionam o ser humano, Elias não concordava com a separação

corpo e mente, consciência e ser, defendia que não podemos pensar e estudar os indivíduos

isolados da sociedade.

Em geral, os biólogos e os sociólogos agem como se os aspectos biológicos e sociais

dos seres humanos estivessem tão estritamente divididos e fossem tão independentes

entre si como as profissões dos biólogos e dos sociólogos e, nos casos específicos,

como os dois departamentos de biologia e de sociologia pretendem estar (ELIAS,

1994, p.21).

As suas críticas não eram direcionadas apenas aos biólogos e sociólogos, em

vários de suas obras questiona o porquê de tanta especialização e divisão entre as ciências.

Áreas de conhecimento como a economia, história, sociologia, psicologia e biologia são

frequentemente criticadas por ele por pesquisar e estudar o ser humano dividido e

individualizado. As ciências trabalham isoladamente, “grandes cientistas ocupam,

individualmente, o centro do palco”, neste quadro as descobertas anteriores, os conhecimentos

adquiridos, os erros e acertos de pesquisas anteriores são desprezados e não considerados

como parte de um processo.45

Para ele:

Normalmente, o conhecimento pré-científico é desvalorizado mesmo no caso de ser,

de forma óbvia, um conhecimento válido ou verdadeiro, por exemplo, o dos

trabalhadores da pedra e do metal ou dos primeiros agricultores dos tempos pré-

histórico (ELIAS, 1994, p.86).

Aos sociólogos também não faltaram críticas. Para Elias e Dunning (1992, p.17),

os sociólogos se preocupavam, principalmente, com estudos relacionados a economia e a

45

Estaremos mais adiante esclarecendo o significado atribuído por Elias ao termo processo.

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política e desprezavam outros temas vistos por eles como assuntos não sérios, sem relevância

para toda a humanidade. Segundo Elias e Dunning (1992, p.16):

[...] a sociologia orientou-se para o campo restrito dos aspectos “sérios” e “racional”

da vida, o que teve como efeito que o divertimento, o prazer, o jogo, as emoções e as

tendências “irracionais” e “inconscientes” do homem e da mulher tivessem merecido

escassa atenção no âmbito da teoria e da investigação científica.

Isto parece acontecer ainda nos dias de hoje, poucos são os sociólogos que

estudam o esporte. A Sociologia do Esporte ainda é um campo pouco estudado.

2.3 AS RELAÇÕES HUMANAS

Os seres humanos possuem uma constituição biológica, neural e motora, que

possibilita o aprendizado de uma língua. A linguagem, constituída por padrões sonoros, que

não possuem a mesma representação simbólica em todas as sociedades, é a capacidade que

permite aos seres humanos se desenvolverem e transmitirem conhecimento. Em razão disso,

mais uma vez em Elias nos deparamos com o aspecto biológico e social não podendo ser

entendidos de maneira independente um do outro. Para este:

O desenvolvimento do conhecimento humano tal como o conhecemos seria

impossível sem a capacidade humana única de transmitir conhecimento, sob a forma

de componentes da linguagem, de uma geração para a outra. É um facto que o

conhecimento, quer seja uma transmissão oral ou uma transmissão por meio de um

livro, pode ser comunicado, na forma de uma língua, de uma pessoa para outra, o

que possibilita a transmissão massiva de conhecimento de uma geração para outra

(ELIAS, 1994, p.114).

Os bebês precisam dos cuidados dos pais para sobreviver e se desenvolverem. É

através de um longo processo de aprendizagem que as crianças aprendem com os adultos e

com outras crianças e que todos, crianças e adultos, transmitem conhecimento. Sendo assim,

Elias critica a concepção dos seres humanos como “homo clausus”, “indivíduos inteiramente

autossuficientes, isolados de todos os demais seres e coisa (ELIAS, 2011, p.230)”. A

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capacidade de comunicar-se e a dependência que todos temos dos outros seres humanos é que

justifica a rejeição por uma concepção de homem isolado do mundo exterior e reforça a

concepção de “homo aperti”. Segundo Elias (2001), “um indivíduo fundamentalmente em

relação com o mundo que não é ele mesmo ou ela mesma, com outros objetos e em particular

com outros homens...”.

Os seres humanos ao nascerem necessitam de cuidados para sobreviverem,

cuidados com alimentação, proteção, higiene e amor, precisam de um ambiente saudável tanto

físico como emocionalmente para se desenvolver e se tornarem cada vez mais autônomos e

independentes para poderem fazer suas escolhas profissionais e afetivas. Esta dependência

que temos dos adultos ao nascermos, nos mostra que somos indivíduos que nos relacionamos

com outros indivíduos, que pertencemos a diferentes grupos e necessitamos de diferentes

tipos e ligações sociais. Segundo Elias (2008): “A sociedade é formada por nós e pelos outros.

Aquele que estuda e pensa a sociedade é ele próprio um de seus membros” e por que

pertencemos à sociedade, Elias sugere que o pesquisador mantenha um distanciamento uma

vez que somos também um membro desta sociedade. Embora possuam características

próprias, estudos sobre indivíduos e sociedade não podem ser considerados isoladamente e em

estado de repouso, estado este que sugere algo imutável. Nascemos, crescemos, envelhecemos

e morremos. Durante toda a nossa vida, as nossas relações com grupos específicos de seres

humanos vão se tornando cada vez mais amplas e complexas. Criamos laços de

interdependências com diferentes grupos de seres humanos. Somos dependentes da família,

escola, trabalho e Estado entre outros, mas os outros também são dependentes de nós. Esta

teia de interdependência entre as pessoas é chamada por Elias de figuração46

. Segundo Elias

(2008, p.144):

O que é que na realidade, une as pessoas em configurações? Perguntas como estas

não podem ser respondidas se começarmos por considerar todas as pessoas

individuais por si mesmas, como se cada uma fosse um Homo clausus .

46

No livro Sociologia do Esporte de Eric Dunning ( 2014, p.24 nota 4) produzido no Brasil , o autor apresenta

esclarecimentos sobre a mudança de posição de Elias no uso da palavra configuração. Elias que inicialmente

utilizou o termo configuração percebeu posteriormente que o prefixo “con” era redundante e passou a usar o

termo figuração.Sendo assim, adotamos a última forma nesta dissertação quando não se tratar de citação literal.

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Segundo este o que une as pessoas são as diferentes formas de ligações sociais.

Ligações afetivas relacionadas às necessidades emocionais, ligações econômicas e políticas.

Segundo Elias (2008): “As dependências recíprocas das pessoas não são obviamente sempre

as mesmas em todas as sociedades nos seus vários estágios de desenvolvimento.” e em

sociedades mais desenvolvidas economicamente, as interdependências são cada vez mais

complexas. As diferentes funções exigem uma especialização cada vez maior para atender o

surgimento de novas profissões. Então, para Elias (1994, p.51):

As relações das pessoas entre si não são aditivas. A sociedade não é um amontoado

de acções individuais comparável a um monte de areia, nem um formigueiro de

indivíduos programados no sentido de uma cooperação mecânica. Ela assemelha-se

antes a uma teia de pessoas vivas que, sob uma diversidade de formas, são

interdependentes. Os impulsos e os sentimentos, os padrões e as acções de uma

pessoa podem reforçar os de outras ou desviá-los do seu objetivo inicial.

No livro “Introdução à Sociologia” de 1970, Elias sugere modelos em forma de

representações gráficas de uma sociedade egocêntrica, formada por indivíduos com a imagem

de “personalidade fechada”, o “homo clausus” que centrado em seu “ego particular” se julga

independente de todos no seu meio social e como se o mundo girasse em torno dos seus

desejos e ambições.

Figura 1 – Padrão básico de uma visão egocêntrica da sociedade.

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A segunda representação traz a visão mais realista de indivíduos interdependentes que

constroem relações cada vez mais complexas e amplas no meio social em que vive.

Figura 2 – Representação de indivíduos interdependentes (<família>, <estado>,<grupos>e

<sociedade>, etc)47

.

À direita deste diagrama temos as seguintes representações:

1- Indivíduo (Ego, Eu);

2- Símbolo de um equilíbrio de poder mais ou menos instável;

3- Valências abertas (desligadas).

Para Elias (2011, p.240), devemos pensar a sociedade apartir de uma visão de indivíduos

dependentes. Segundo ele:

A imagem do homem como “personalidade fechada” é substituída aqui pela de

“personalidade aberta”, que possui um maior ou menor grau (mas nunca absoluto ou

total) de autonomia face a de outras pessoas e que, na realidade, durante toda a vida

47

As figuras são da obra: Introdução à Sociologia de Norbert Elias págs. 14 e 15.

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é fundamentalmente orientada para outras pessoas e dependentes delas. A rede de

interdependências entre os seres humanos é o que os liga. Elas formam o nexo do

que aqui é chamado configuração, ou seja, uma estrutura de pessoas mutuamente

orientadas e dependentes. Uma vez que as pessoas são mais ou menos dependentes

entre si, inicialmente por ação da natureza e mais tarde através da aprendizagem

social, da educação, socialização e necessidades recíprocas geradas, elas existem,

poderíamos nos arriscar a dizer, apenas como pluralidades, apenas como

configurações.

Elias denomina figuração toda esta rede de interdependências que liga os seres

humanos, ou seja, toda esta complexa teia de relações sociais. É a relação de dependência

homem e mulher que nos possibilita nascer. Elias (2011, p.240) atribuiu como ação da

natureza, uma dependência elementar e biológica e considerou como um dos exemplos mais

significativos da dependência dos seres humanos. Existimos porque nos relacionamos.

Para um dos propósitos desta pesquisa, que é a aplicação da Teoria Figuracional

aos esportes, Elias considera o esporte como um tipo de figuração social, que atua de forma

dinâmica e como equilíbrio de tensões entre opostos. Segundo Elias,

Um desporto ou um jogo é uma << estrutura>> ou padrão que um grupo de seres

humanos interdependentes forma entre si. Esta estrutura, padrão ou, de forma mais

correcta, configuração compreende: 1) dois indivíduos ou equipes que cooperam

uma com a outra numa rivalidade mais ou menos amigável; 2) agentes de controlo,

como árbitros e juízes de linha; e, 3), por vezes, mas nem sempre um número maior

ou menor de espectadores (ELIAS, 1992, p.302).

Embora esta figuração seja a condição necessária para a existência de um jogo,

Elias afirma que esta pertence a figurações mais alargadas, formada pela organização do

clube, os órgãos legislativos e administrativos que formulam as regras, que no futebol

compreende as Ligas, Federações e Confederações e que por sua vez também estão

interligadas com figurações mais vastas num quadro internacional. A FIFA é a instituição

máxima do futebol. É responsável pela organização mundial do futebol e pelo seu

desenvolvimento em todo o mundo. Em toda esta rede de interdependência podemos

acrescentar as inúmeras redes de pessoas que hoje trabalham e vivem do futebol, ou seja,

membros desta vasta figuração que trabalham nos bastidores para que o futebol espetáculo

aconteça são desde os trabalhadores em indústrias de artigos esportivos, operários da

construção civil, patrocinadores, jornalistas e muitos outros profissionais que nos

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impossibilita mencionar e que comprova uma vasta e complexa configuração existente para a

realização de um jogo de futebol.

As regras de determinada modalidade esportiva, legisladas no caso do futebol

mundial pela Internacional Football Association Board (IFAB), é que garantem, em grande

parte durante uma partida de futebol, a dinâmica de toda a figuração formada pelos jogadores

das duas equipes. O árbitro e os assistentes (bandeirinhas) são os responsáveis por manter o

cumprimento das regras e o equilíbrio destas polaridades opostas, dentro de campo e nos

estádios, mas que se complementam em um equilíbrio de tensão. O árbitro e toda a equipe de

arbitragem são os mediadores ou os agentes de controles como descrito por Elias, que devem

garantir o pleno funcionamento da partida.

A dinâmica das figurações nos remete a outro conceito desenvolvido por Elias:

“poder”. Segundo Elias, o termo “poder” sempre é visto por nós, como algo “desagradável”

por ter sido durante a história do desenvolvimento da sociedade relacionado a desigualdades

sociais, ao abuso e falta de escrúpulos dos considerados mais fortes sobre os mais fracos. O

poder não pode ser reduzido “a uma ou outra concepção unidimensional, por exemplo, a

perspectiva marxista, que o reduz a propriedade e ao controlo dos meios de produção”... Para

Elias e Dunning, (1992), poder não deve ser entendido como uma “coisa” que alguns

indivíduos ou grupos possuem e outros não. Dependemos de outros e outros dependem de

nós, o poder deve ser compreendido como uma característica fundamental de todas as

relações humanas.

Dizemos que uma pessoa detém grande poder, como se o poder fosse uma coisa que

ela metesse na algibeira. Esta utilização da palavra é uma relíquia de ideias mágico-

míticas. O poder não é um amuleto que um indivíduo possua e outro não; é uma

característica estrutural das relações humanas---de todas as relações humanas

(ELIAS, 2008, p.81).

Para estes autores, embora nem sempre possamos observar equilíbrio nas relações

de poder, ela está presente sempre que existe uma relação de interdependência: relações de

pais e filhos, patrão e funcionários, homens e mulheres e equipes esportivas. Pensando nos

jogos entre equipes esportivas, o equilíbrio de poder e o equilíbrio de tensões entre as equipes

envolvidas durante um jogo de futebol é o que tornará o espetáculo atraente e excitante para

os jogadores e espectadores. Segundo Elias e Dunning (1992, p. 303), “este equilíbrio de

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tensão é conceptualizado de uma maneira mais correcta se o considerarmos como um

equilíbrio desencadeado entre opostos, num complexo global de polaridades

interdependentes”.

Para estes, um jogo de futebol se faz apropriado ao equilíbrio de tensão entre as

equipes. Uma partida que não possamos observar equilíbrio entre as equipes se torna

desinteressante porque podemos antecipadamente prever o resultado ou porque poderá ocorrer

atitudes indisciplinares de jogadores e manifestações de violência, o que não será bom e muito

menos interessante para o espetáculo e para os interesses dos investidores e patrocinadores.

Elias e Dunning (1992, p. 303) especificam as polaridades opostas como:

1) A polaridade global entre duas equipes em oposição;

2) A polaridade entre ataque e defesa;

3) A polaridade entre cooperação e tensão entre as equipes;

4) A polaridade entre cooperação e competição em cada equipe;

5) A polaridade entre o controlo externo dos jogadores, a vários níveis (por

exemplo, dirigentes, capitães, colegas de equipa, árbitros, juízes de linha,

espectadores e por aí adiante), e o controlo flexível que o jogador exerce

sobre si próprio, quer seja de um de um ou de outro sexo;

6) A polaridade entre a identificação afectuosa e rivalidade hostil em relação

aos oponentes;

7) A polaridade entre o prazer da agressão manifestada pelos jogadores e a

limitação imposta pelo padrão de jogo sobre esse prazer;

8) A polaridade entre flexibilidade e rigidez das regras.

Para exemplificar o equilíbrio de poder de grupos, Elias (1993) utiliza a figura de

um cabo de guerra. Nesta atividade dois grupos que possuem o mesmo número de

participantes puxam uma corda em sentido contrário, o objetivo é deslocar o grupo adversário

de sua posição inicial. O que aconteceria caso surgisse um homem no jogo que não pertença a

nenhuma das equipes? Segundo (1993, p. 150), este homem,

[...] que não pertença inteiramente a qualquer dos grupos contendores, que tenha a

possibilidade de lançar a sua força pessoal ora de um lado, ora de outro, ao mesmo

tempo tomando grande cuidado para permitir que a tensão se reduza ou que qualquer

dos lados obtenha uma clara vantagem, --- então ele é a pessoa que realmente

controla toda essa tensão. O poder mínimo à disposição de um único homem, que

sozinho não poderia pôr nenhum dos grupos em movimento e, com certeza, nunca

os dois juntos, é suficiente, mediante esse arranjo de forças sociais, para mover o

todo. E é clara a razão por que é suficiente. Nesse mecanismo equilibrado, há forças

enormes, mas controladas.

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No equilíbrio de tensões que ocorrem entre as duas equipes em uma partida de

futebol, este homem que está presente no jogo, porém atuando apenas como agente de

controle é o árbitro.

Podemos realizar um jogo de futebol apenas entre jogadores, duas equipes

adversárias que se interagem e são interdependentes nas suas ações, porém para a realização

de uma partida oficial de futebol profissional esta rede de interdependências se apresenta com

um grande grau de complexidade e tensão que invariavelmente necessita dos árbitros como

agente de controle. Embora as ações dos jogadores não dependam da presença de uma equipe

de arbitragem, são os árbitros e seus assistentes que vão garantir o cumprimento das leis do

jogo e a manutenção do equilíbrio de tensões. E a “cadeia de interdependência” não se esgota

nesta figuração, existem os espectadores, que para nós são a razão de todo o espetáculo, a

imprensa, os patrocinadores e muitos outros agentes envolvidos no espetáculo esportivo.

Pensando nas relações de poder desta figuração, que aqui chamaremos de futebol,

percebemos que para a realização de uma partida muitas relações de interdependências se

entrelaçam e precisam trabalhar harmoniosamente para que a engrenagem desta “máquina”,

como gostava de comparar Elias, não corra o risco de enguiçar.

No livro El fenômeno deportivo (2003), Eric Dunning considera como

fundamentais as seguintes características da teoria figuracional de Norbert Elias: o estudo dos

seres humanos como seres sociais e interdependentes, o propósito de associar a sociologia

clássica e a sociologia moderna com conceitos de classe social e poder, distante de uma

concepção apenas econômica e o conceito de Estado como instituição que detém o monopólio

legítimo sobre a violência.

2.4 “UM PROCESSO LONGO E NÃO PLANEJADO”

O processo civilizatório é considerado a teoria central de Norbert Elias. A história dos

costumes e as mudanças de comportamentos dos indivíduos e da sociedade do período

medievo-feudal à Idade Moderna e a Formação do Estado são nesta teoria analisados. Os

indivíduos aprendem deste a infância conceitos e comportamentos, adquirimos conhecimentos

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que são transmitidos para sucessivas gerações mesmo sem termos consciência de que tudo faz

parte de um processo de longa duração e não planejado.

Em meu livro O processo civilizador, eu esperava ter conseguido, com a ajuda de

provas empíricas detalhadas, dominar problemas teóricos, sobretudo a mutação

civilizadora dos homens e a transformação a longo prazo do estágio de integração do

Estado. Esperava que fosse possível às gerações futuras dar sequência a esses

trabalhos assim como a outros referentes aos processos sociais de longa duração e,

caso se fizesse necessário, corrigir esses primeiros passos --- portanto, em todo caso,

garantir o desenvolvimento contínuo da sociologia, até então precário em muitos

domínios (ELIAS, 2001, p. 146).

Ao desenvolver esta teoria, Elias (2011), publicada em 1939, que pretende focar:

“tipos de comportamentos considerados típicos do homem civilizado ocidental” e questiona:

O que é ser civilizado hoje?48

.

Se algumas atitudes dos seres humanos na Idade Média são consideradas como

barbárie, o que poderíamos dizer da II Guerra Mundial e nos dias de hoje, a Era da

Globalização, das diversas barbáries, em nome do fanatismo religioso e dos crimes contra a

humanidade que visam os interesses econômicos e políticos de poucos? Elias (2011, p.178)

nos diria que tudo está em processo e durante este, viveremos processos de descivilização que

embora nos de a sensação de retroceder, quando avaliado com cautela nos mostra que

avançamos em relação a outras épocas. Esta certeza nos vem quando conseguimos observar e

acompanhar que as reações dos seres humanos perante atos de violência nos causa cada vez

mais repugnância e que toleramos cada vez menos todas as formas de violência seja esta

dirigida aos seres humanos, aos animais e ao meio ambiente.

Para melhor compreensão se faz necessário entender como Elias conceitua

civilização e civilidade e o significado destes na França/Inglaterra e Alemanha.

O conceito de “civilização” refere-se a uma grande variedade de fatos: ao nível da

tecnologia, ao tipo de maneiras, ao desenvolvimento dos conhecimentos científicos,

às ideias religiosas e aos costumes. Pode se referir ao tipo de habitações ou à

maneira como homens e mulheres vivem juntos, à forma de punição determinada

pelo poder judiciário ou ao modo como são preparados os alimentos. Rigorosamente

48

No prefácio do livro: O Processo Civilizador I, Elias escreve que comportamentos e atitudes observadas no

homem ocidental e consideradas civilizadas diferem do que era aceito pelas sociedades medievo-feudal. O livro

foi publicado em 1939, portanto, o que era ser civilizado em 1939.

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falando, nada há que não possa ser feito de maneira “civilizada” ou “incivilizada”.

Daí ser sempre difícil sumariar em algumas palavras o que se pode descrever como

civilização (ELIAS, 2011, p.23).

O conceito de civilização por Elias (2011) nos apresenta um “Ocidente”

orgulhoso de suas conquistas sociais e econômicas. Acreditam serem superiores as demais

sociedades e atribuem a isto as suas conquistas tecnológicas e científicas. Porém mesmo nas

sociedades ocidentais o conceito é divergente. Na Alemanha, país que tardiamente unificou o

seu território, este conceito é definido pela palavra “Kultur” encontrando significado nas

expressões artísticas, literárias, religiosas, enfim associado a “fatos intelectuais”. Para

franceses e ingleses, segundo Elias (2011, p.23), “o conceito resume em uma única palavra

seu orgulho pela importância de suas nações para o progresso do Ocidente e da humanidade”.

Para Elias (2011), as mudanças das atitudes humanas e das instituições sociais

acompanham o fluxo dos fenômenos históricos, estes não podem ser entendidos como

formações estáticas porque se transformam, se desenvolvem, tem caráter de movimento.

O que cabe ser frisado aqui é o simples fato de que, mesmo na sociedade civilizada,

nenhum ser humano chega civilizado ao mundo e que o processo civilizador

individual que ele obrigatoriamente sofre é uma função do processo civilizador

social (ELIAS, 2011, p.15).

Na Idade Média, as sociedades eram descentralizadas, os guerreiros, seus

governantes, eram selvagens, cruéis e não necessitavam de formas de moderação para os seus

atos. As divergências com guerreiros rivais e o sustento do seu território eram resolvidos na

espada e as mulheres, consideradas seres inferiores, “serviam” para satisfazer os desejos

masculinos. Num processo longo e não planejado as sociedades foram se desenvolvendo

geográfica e demograficamente. As relações econômicas, a interdependência das funções

sociais e a ascensão da classe burguesa fortaleceu um poder central, uma nova aristocracia

que passava a deter o monopólio da força e o monopólio dos impostos. Neste cenário

surgiram conceitos como “cortesia”, associado às formas de comportamento que se esperava

dos frequentadores da “corte” no séc. XVI e XVII e o conceito de “civilidade” que

determinava qual deveria ser o comportamento aceitável dos indivíduos em uma sociedade

em que não era mais necessária uma nobreza guerreira e na qual ascendia uma burguesia forte

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e participante dos mesmos espaços de convívio dos nobres. Em 1530, um tratado de autoria

de Erasmo de Rotterdam é publicado e nos seis anos seguintes a publicação chega à marca de

trinta reedições. A obra, segundo Elias (2011) “... reveste-se de uma importância especial

menos como fenômeno ou obra isolada do que como sintonia de mudança, uma concretização

de processos sociais.” A sociedade esperava e cobrava de seus indivíduos um maior controle

dos impulsos, um comportamento mais polido: à mesa, nos gestos, na maneira de falar e se

expressar, em relação as suas funções corporais e nas relações entre os sexos.49

Para Elias (2011), o controle dos impulsos e um maior autodomínio dos instintos

corporais lentamente foram se transformando de uma imposição devido à presença de outras

pessoas, para um “autocontrole automático” e incorporado. Para Elias (2011, p.137):

Tanto o tipo como o grau de controle correspondem à posição social da pessoa que

os impõe, em relação à posição daqueles em cuja companhia está. Isto muda

lentamente, à medida que as pessoas se aproximam mais socialmente e se torna

menos rígido o caráter hierárquico da sociedade. Aumentando a interdependência

com a elevação da divisão do trabalho, todos se tornam cada vez mais dependentes

dos demais, os de alta categoria social dos socialmente inferiores e mais fracos.

Estes últimos tornam-se a tal ponto iguais aos primeiros que eles, os socialmente

superiores, sentem vergonha até mesmo de seus inferiores. Só nesse momento é que

a armadura dos controles é vestida em um grau aceito como natural nas sociedades

democráticas industrializadas.

A pressão e a coação para que os indivíduos se moldem, aprendam e incorporem

“comportamentos civilizados” e reprimam atitudes e emoções, inicia-se na infância. As

crianças passam por um condicionamento precoce para que se comportem em público e não

causem vergonha aos familiares. O padrão de comportamento e controle dos impulsos

também está presente nas mudanças na agressividade dos indivíduos. Segundo Elias (2011, p.

185):

O guerreiro da Idade Média não amava só a guerra, vivia dela. Passava a juventude

preparando-se para isso. Ao chegar à idade apropriada, era armado cavaleiro e fazia

a guerra enquanto as forças lhe permitissem até a velhice. Sua vida não tinha outra

função.

49

Ler sobre estes temas em Elias (2011) e Elias ( 1993).

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No entanto, a sociedade se desenvolveu, a cada dia aumentam as ligações e

funções sociais em uma rede complexa de interdependências e o Estado controla o monopólio

da força. Não mais resolvemos as divergências na espada. Desejam-se indivíduos equilibrados

e conscientes de sua função social, e atitudes violentas e agressivas nos causam repugnância.

O Estado, mesmo nas nações consideradas civilizadas, nem sempre cumpre com o dever de

proporcionar aos seus indivíduos o mínimo necessário para uma vida digna, e o direito à

segurança e a integridade física. Mesmo assim, como cidadãos não podemos recorrer a atos de

violência nos diferentes tipos de cadeias sociais as quais pertencemos. Espera-se que depois

de um longo processo de aprendizagem e condicionamento dos corpos, que se inicia quando

nascemos que os indivíduos consigam agir naturalmente e da mesma forma nos espaços

públicos e privados sem que isso cause uma tensão interna e traga prejuízos a sua saúde física

e emocional. Segundo Elias (2011, p.181):

A pressão para restringir seus impulsos e a vergonha sociogenética que os cerca

estes são transformados tão completamente em hábitos que não podemos resistir a

eles mesmo quando sozinhos na esfera privada. Impulsos que prometem e tabus e

proibições que negam prazeres, sentimentos socialmente gerados de vergonha e

repugnância, entram em luta no interior do indivíduo.

E é neste processo de autocontrole e da nossa luta interior para reprimirmos

nossos impulsos e nossas emoções, que o esporte e as atividades que lazer encontram

importância e significado e que nações consideradas desenvolvidas e civilizadas, se

preocupam em oferecer aos seus cidadãos uma variedade de atividades miméticas.

2.5 A IMPORTÂNCIA DO FUTEBOL

Escrever sobre a importância do esporte e seu significado social não é uma tarefa

simples, devido à complexidade do tema. No mundo globalizado, diferentes formas de jogos e

modalidades esportivas referenciam e identificam mundialmente estas sociedades e suas

culturas. O basquete americano, o judô japonês, o tênis de mesa chinês, poderíamos enumerar

muitas delas, mas nenhuma modalidade tem a aceitação mundial que teve o futebol. Se

considerarmos o esporte como prática esportiva como consumo e pelo seu prestígio

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dificilmente acharemos alguma modalidade esportiva que supere o futebol em divulgação nos

meios de comunicação e em rentabilidade financeira. E o futebol não para de crescer. A

estratégia da FIFA é levar o esporte para os quatro cantos do mundo, aumentando o número

de praticantes e consumidores de futebol. Embora a FIFA utilize de meios suspeitos e

obscuros, como reforçam as denúncias de corrupção citadas no capítulo anterior, a FIFA tem

conseguido êxito no seu objetivo. A Copa do Mundo no Brasil foi a mais rentável já

registrada na história da competição, o número de espectadores, inclusive nos Estados Unidos

que reverência outras modalidades, cresce assustadoramente e as próximas Copas da FIFA

estão previstas para a Rússia 2018 e Catar 2022. Segundo Murphy, Willian e Dunning (1994),

“Quais serão, então, as principais razões para esta tremenda popularidade”?

Os autores atribuem à popularidade do futebol, que não está relacionada ao nível

de desenvolvimento dos países e nem as suas características sociopolíticas, há muitos fatores:

o reduzido equipamento para à sua prática e, portanto o baixo custo poder ser praticado como

lazer em campos, quadras, na rua, ou seja, em diversos tipos de terreno e adaptado para o

número de participantes, possuir regras básicas e que permanecem em sua grande maioria

inalterada desde 1863, possibilidades de inovações táticas e o equilíbrio das polaridades

ataque e defesa que torna o futebol imprevisível e excitante. Para Murphy, Willian e Dunning

(1994, p.8):

[...] uma partida de futebol permite ao espectador viver, de forma controlada e

socialmente aceitável, durante um curto espaço de tempo, todo um conjunto de

sentimentos poderosos: a esperança de ver a sua equipe marcar e a sensação

gratificante de ver concretizado o almejado gol; o medo quando a equipa adversária

ameaça marcar e o desapontamento quando esta é bem sucedida. Durante o curto

período do jogo, os espectadores alternam constantemente entre estas sensações até

que, por fim, a partida fica decidida. Então, os adeptos do lado vencedor vivem

momentos de triunfo e júbilo, enquanto os seus oponentes provam o sabor amargo

da derrota e do desespero. Se o jogo terminar num empate, os adeptos de ambos os

lados poderão experimentar um misto de todas essas emoções.

Para que uma partida de futebol proporcione todas estas emoções é necessário se

identificar com uma das equipes participantes do jogo, é necessário “viver o jogo”.

Participamos como espectadores do futebol porque temos paixão e nos identificamos com

uma das equipes. Segundo Murphy, Willian e Dunning (1994, p.11):

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Do princípio ao fim das nossas vidas, os seres humanos orientam-se para os seus

semelhantes, estabelecendo com estes uma relação de interdependência. As pessoas

necessitam de estabelecer estreitos vínculos afetivos, quer o façam directamente com

as outras pessoas que indirectamente através dum veículo simbólico, como é o caso

das bandeiras.

Aprendemos a nos identificar porque moramos em determinada cidade ou país,

porque nos encantamos com a torcida de uma agremiação, pelos nossos vínculos afetivos com

familiares, amigos e professores. Seja qual for a nossa referência, a questão da identificação

está estreitamente ligada à questão do pertencimento. Pertencer a um “grupo”, se identificar

com este, gera sentimentos positivos em relação aos membros deste “grupo” e se nosso estudo

é sobre o futebol, um sentimento de competitividade com os outros “grupos”. Nem sempre

este sentimento pode ser entendido como exclusivo e negativo para com pessoas participantes

das equipes adversárias, o outro “grupo”, mas a razão para as atitudes agressivas em relação

aos torcedores das equipes adversárias está também relacionada a questão do pertencimento.

Para Elias (2000), o carisma grupal e o auto grau de coesão de um grupo proporciona aos

membros do grupo uma elevada autoestima e a satisfação de pertencer ao “grupo dos

melhores”. A imagem do “nós” e o ideal do “nós” contrapõe-se a imagem do “eles” como o

“grupo dos piores”.

A identificação com os “craques” do time do coração e, às vezes, o apoio da

família faz com que meninos e meninas deixem suas casas para se submeter ao processo

doloroso e excludente de conseguir pertencer às escolinhas de futebol das melhores equipes

brasileiras. Este sonho e o desejo de inúmeras crianças brasileiras são reforçados pelos meios

de comunicação que mostram com entusiasmo os “ídolos esportivos” que conseguiram vencer

obstáculos e ascender socialmente. Segundo Escher e Reis (2006):

O mito da ascensão social pelo esporte, que é constantemente enfatizado pelos

meios de comunicação, que não se cansam de mostrar exemplos de meninos pobres

que conseguiram ter sucesso financeiro por causa do futebol, é que faz milhares de

garotos tentarem alguma sorte nos testes e “peneiras” dos clubes em todo o país.

Aqui não estamos a criticar famílias e deixando de incentivar nossas crianças e

jovens nesta busca, porém acreditar no futebol como meio de ascensão social encontra um

importante significado: o baixo nível de escolaridade dos jogadores brasileiros, tanto quando

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estes são bem sucedidos e encontram trabalho no futebol e no grande número de jovens que

abandonaram os estudos, apostaram “todas as fichas” e se deparam com uma carreira

esportiva frustrada e sem nenhuma formação profissional.

2.6 O PROCESSO CIVILIZATÓRIO E O FUTEBOL

Elias e Dunning (1992) tinham “a profunda consciência de que a compreensão do

desporto contribuía para o conhecimento da sociedade”. O processo civilizatório das

sociedades europeias que exigia dos indivíduos uma maior consciência e maior autocontrole

sobre os seus atos e suas emoções não pode entendido separado dos fatores históricos. A

formação de um Estado que detinha o controle da força física e militar e do monopólio dos

impostos proporcionando um maior equilíbrio de poderes entre as diferentes classes sociais

possibilitou uma maior pacificação e um avanço de civilização.

Durante o século XVIII, manifesta-se na Inglaterra um novo conceito de esporte,

com confrontos altamente regulamentados e com menor violência entre os participantes. Para

Elias e Dunning (1992), a estrutura de poder na Inglaterra no século XVIII é que propicia a

compreensão da gênese do esporte moderno. A Inglaterra passou por intensos ciclos de

violência que se iniciam em 1641, com a execução do Rei Carlos que invadiu o Parlamento

para prender opositores aos seus desejos. O medo e a desconfiança mútua gerada por este

episódio ainda podiam ser sentidos no século XVIII. A Inglaterra demorou para recuperar a

estabilidade e a confiança política e instaurar novamente a pacificação da sociedade. Porém a

principal divisão política era entre grupos de proprietários rurais, whigs e tories, ou seja, não

havia rivalidade entre classes sociais. Embora adversários políticos possuíssem os mesmos

interesses durante o século XVIII as tensões se acalmaram e unidos por um código de

conduta, comprometeram-se a debater e decidir de comum acordo suas posições políticas em

confrontos não violentos no Parlamento. Segundo Elias e Dunning (1992, p.54):

A presença de uma classe de proprietários rurais que não pertencia aos pares do

reino e que não se sentava na Câmara dos Lordes, mas que se encontrava

representada em número considerável na Câmara dos Comuns, teve consequências

importantes na forma que tomou o processo de distribuição das oportunidades de

poder no país. Os interesses dos proprietários, em vários dos mais importantes países

continentais, eram representados, habitualmente pelas câmaras de estado dos nobres,

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enquanto a assembleia dos comuns representava, em geral, os interesses dos grupos

urbanos e, algumas vezes, dos camponeses. Mas em Inglaterra, devido, em parte a

existência da pequena nobreza, os interesses dos proprietários também estavam

fortemente representados na Câmara dos Comuns.

Para Elias e Dunning (1992), a distribuição das oportunidades de poder e as

decisões políticas tomadas de forma pacífica exigiam um elevado grau de moderação dos

membros do Parlamento e apontaram para um avanço de civilização na sociedade inglesa

neste período. Estas mudanças influenciaram também os comportamentos das classes altas

inglesas nos seus passatempos. Os confrontos esportivos pedem um melhor nível de

organização e uma regulamentação que garantisse a moderação da violência. Os cavalheiros

ingleses inseridos no desenvolvimento político do país podiam se reunir livremente e isto

encontra significado nas formações dos clubes esportivos de diferentes modalidades

esportivas. É neste contexto histórico de moderação da violência e da busca por regras

comuns que surge o futebol moderno com a criação da Football Association em 1863.

2.7 O AUTOCONTROLE E AS ATIVIDADES MIMÉTICAS

O desenvolvimento das sociedades e a sua industrialização registrou um aumento

no número de funções e uma crescente diversificação das profissões. Nos dias de hoje, a era

da globalização, o mercado de trabalho exige cada vez mais profissionais especializados e o

tempo dedicado ao trabalho está associado à produtividade, tempo é dinheiro nas sociedades

capitalistas. Nestas sociedades a interação, as cadeias de interdependência dos diferentes

grupos sociais são densas e para que estas relações se mantenham com um satisfatório nível

de harmonia seus indivíduos necessitam controlar seus impulsos e suas emoções. Para Elias e

Dunning (1992, p.69): “[...] a contenção de sentimentos fortes, no sentido de alguém preservar

um controlo regular firme e completo dos impulsos, afectos e emoções é um factor de origem

de novas tensões.”

O autocontrole individual para conviver com as restrições impostas pela sociedade

é de tal forma incorporado na nossa educação primária que quando temos um descontrole no

trabalho, família ou em qualquer figuração da qual pertencemos nossas atitudes nos causam

sentimentos de vergonha e medo. Segundo Elias (1993, p.242):

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O sentimento de vergonha é uma exaltação específica, uma espécie de ansiedade que

automaticamente se reproduz na pessoa em certas ocasiões, por força do hábito.

Considerado superficialmente é o medo de degradação social ou, em termos mais

gerais, de gestos de superioridade de outras pessoas.

Segundo este mudanças na estrutura da sociedade exigiram mudanças na estrutura

da personalidade dos indivíduos. O controle é exercido pela razão, mas o medo que sentimos

da pressão que os outros exercem sobre nós moderam os nossos atos. Quanto maior a nossa

dependência dos outros, maior será o nosso espírito de previsão, nosso autocontrole a

regulação das nossas emoções. Para Elias (1993, p.247):

Na esteira da pacificação, mudou também a sensibilidade das pessoas à conduta

social. Os medos interiores crescem na mesma medida que diminuem os exteriores -

-- os medos de um setor da personalidade no lugar dos de outro. Como resultado

dessas tensões internas, as pessoas começaram a sentir experiências uma das outras

que haviam sido vedadas enquanto enfrentavam constantemente sérias e

inescapáveis ameaças de origem externa. Assim grande parte das tensões que antes

se liberavam diretamente no combate de um homem com outro tinham que se

resolver, convertidas em tensão interior, na luta do indivíduo consigo mesmo.

Se os guerreiros na Idade Média eram selvagens, cruéis e inclinados a explosões

de violência física e o ambiente em que viviam proporcionava riscos e perigos, hoje nas

sociedades civilizadas os indivíduos encontram tensões nos seus medos interiores e como não

devem expor suas emoções em público e não podem manifestar-se violentamente necessitam

transformar e canalizar os seus impulsos.50

Nas sociedades altamente industrializadas e que atingiram um avançado nível de

civilização as pessoas conseguem transformar e canalizar os seus impulsos para diferentes

tipos de atividades esportivas e culturais. Quanto maior o nível de desenvolvimento destas

sociedades maior são as oportunidades e variedades das atividades de lazer propostas para a

população. Estas atividades cumprem a função de libertação das tensões criadas pela pressão

e stress das rotinas e do autocontrole dos impulsos libidinais, afetivos e emocionais.51

Segundo Elias e Dunning (1992, p.69):

50

Ler sobre este tema em Elias (2011) e Elias (1993). 51

Não são todos os indivíduos que são bem sucedidos na sua luta interior para conter seus impulsos e

manifestações violentas.

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As pessoas que se agitam demasiado, sob o domínio dos sentimentos que não podem

controlar, são casos para hospital ou para prisões. Determinadas condições de

elevada excitação são consideradas como anormais em qualquer pessoa e, no caso

das multidões, como um perigoso prelúdio de violência.

No avanço da civilização, poderíamos dialogar com Elias e Dunning, pois

acreditamos que a psicologia e a medicina tem alcançado resultados satisfatórios e que não

precisamos expor as pessoas a tratamentos tão radicais que requerem confinamentos. Por

outro lado a rotina e a complexidade das funções sociais colaboram para um aumento das

tensões e uma maior necessidade de autocontrole e tolerância nas sociedades que se entendem

como civilizadas.

Enquanto a excitação é bastante reprimida na ocupação daquilo que se encara

habitualmente como as actividades sérias da vida --- excepto a excitação sexual, que

está mais estritamente confinada à privacidade ---, muitas ocupações de lazer

fornecem um quadro imaginário que se destina a autorizar o excitamento, ao

representar, de alguma forma, o que tem origem em muitas situações da vida real,

embora sem os perigos e riscos. Filmes, danças, pinturas, jogos de cartas, corridas de

cavalo, óperas, histórias policiais e jogos de futebol --- estas e muitas outras

actividades de lazer pertencem a esta categoria (ELIAS e DUNNING, 1992, p. 70).

Estas atividades de lazer denominadas como miméticas cumprem a função de

proporcionar a excitação, liberar tensões e emoções reprimidas, porém ao fazê-los não

corremos perigos e riscos. Possuem um caráter imaginário, causam um descontrole, porém um

“descontrole controlado” que não será reprimido caso não ocorra excessos. É por este motivo

que quando participamos e estamos identificados com estas atividades, choramos, gritamos,

pulamos, xingamos e dentro de um nível aceitável de sociabilidade não causaremos

estranhamento às pessoas ao nosso redor. Mas como esta excitação é favorecida? Segundo

Elias e Dunning(1992, p.71):

Se perguntarmos de que modo é que se animam os sentimentos, como é que a

excitação é favorecida pelas actividades de lazer, descobre-se que isto é dinamizado,

habitualmente, por meio da criação das tensões. Perigo imaginário, medo ou prazer

mimético, tristeza e alegria são produzidos e possivelmente resolvidos no quadro

dos divertimentos. Diferentes estados de espírito são evocados e talvez colocados

em contraste, como a angústia e a exaltação, a agitação e a paz de espírito. Deste

modo, os sentimentos dinamizados em uma situação imaginária de uma actividade

humana de lazer têm afinidades com os que são desencadeados em situações reais da

vida --- é isso que a expressão << mimética >> indica ---, mas o último está

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associado aos riscos e perigos sem fim da frágil vida humana, enquanto o primeiro

sustenta, momentaneamente, o fardo de riscos e de ameaças, grandes e pequenas,

que rodeia a existência humana.

O interesse desta pesquisa está no comportamento e nas atitudes das pessoas ao

assistirem e participarem das partidas de futebol. A identificação com uma das equipes

participantes do jogo e o equilíbrio das polaridades anteriormente citadas é o que possibilitará

a uma partida de futebol alcançar um nível de excitação que, segundo Elias e Dunning (1992),

permitirá a liberação das tensões e do stress das coisas sérias da vida. O futebol é uma

modalidade que pode ser considerada imprevisível e esta característica reforça a razão de seu

sucesso mundial. Diferente de outras modalidades esportivas onde o resultado pode ser

previsto e “apostado” na equipe que apresentar o melhor nível técnico e tático, no futebol a

vitória nunca está garantida até que o árbitro apite o final do jogo. Um contra-ataque, uma

falha do goleiro, “um lance de bola parada”, tudo pode interferir no resultado da partida.

Associado a isto, no futebol as equipes interagem e se confrontam também fisicamente.

Dentro do campo de jogo contamos com o árbitro e os assistentes, agentes de controle para

assegurar que as regras sejam respeitadas e cumpridas e que as tensões geradas pela partida

não desencadeiem em um confronto violento. As emoções vividas pelos jogadores não podem

ser comparadas com as emoções vividas pelos torcedores e/ou espectadores do jogo. Os

jogadores possuem com os clubes os quais pertencem uma relação trabalhista e são

pressionados pelos torcedores e dirigentes para conseguirem resultados positivos nos jogos.

Os torcedores e/ou espectadores possuem uma relação de identificação e pertencimento com o

clube. Existe paixão e as partidas do time do coração cumprem o propósito de uma atividade

mimética. A imprevisibilidade e o medo da derrota são sentimentos vividos pelos torcedores

durante a partida que ao seu término se modificam em sentimentos de frustração pela derrota

ou prazer e satisfação pela vitória.

O desporto, tal como qualquer actividade de lazer, no seu quadro específico pode

evocar através dos seus desígnios, um tipo especial de tensão, um excitamento

agradável e, assim, autorizar os sentimentos a fluírem mais livremente. Pode

contribuir para perder, talvez para libertar, tensões provenientes do stress. O quadro

do desporto, como o de muitas outras atividades de lazer, destina-se a movimentar, a

estimular as emoções, a evocar tensões sob a forma de uma excitação controlada e

bem equilibrada, sem riscos e tensões habitualmente relacionadas com o

excitamento de outras situações da vida, uma excitação mimética que pode ser

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apreciada e que pode ter um efeito libertador, catártico52

, mesmo se a ressonância

emocional, ligada ao desígnio imaginário conviver, como habitualmente acontece,

elementos de ansiedade, medo --- ou desespero (ELIAS e DUNNING, 1992, p.79).

O efeito libertador, a alegria que se faz presente na vitória se contrapõe ao

sentimento de frustração, desânimo dos torcedores da equipe adversária. É necessário que os

confrontos miméticos que ocorrem nas partidas de futebol consigam permanecer na esfera

esportiva, que a provocação e as brincadeiras sejam salutares e consigam compor o espetáculo

para que mesmo derrotado o torcedor adversário possa ter usufruído de toda a excitação,

ansiedade e prazer que naturalmente afloraram na expectativa do confronto e durante os

noventa minutos do jogo. Quanto mais desenvolvida e civilizada forem as sociedades e mais

igualitárias as condições de vida de seus indivíduos maiores as chances de conseguirmos

manter o descontrole controlado e conseguir êxito para que as atividades de lazer tenham o

seu significado salvaguardado. Caso contrário o descontrole pode desencadear atitudes

violentas e este é o tema que nos propomos a seguir.

52

O conceito de catarse de Aristóteles se associa a sentimentos de alegria e purificação, um aumento da

autoestima e satisfação pós tensão como prêmio pela vitória.

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3. A VIOLÊNCIA E O PROCESSO CIVILIZATÓRIO

3.1 A VIOLÊNCIA

O estágio de desenvolvimento atingido por uma sociedade pode ser determinado

pelo que Elias e Dunning (1992) considerou como a tríade de controles básicos53

, a qual tríade

é formada pelo controle que uma sociedade tem sobre três aspectos: o controle dos

acontecimentos naturais, portanto extra-humano, associado ao nível de desenvolvimento

científico e tecnológico, o controle que seus indivíduos têm nas diferentes formas de relações

sociais e o controle que cada pessoa tem de si mesmo, o autocontrole. Neste processo de

civilização longo e não planejado, alguns elementos foram fundamentais: a formação do

Estado, o controle do monopólio dos impostos, o equilíbrio de poderes entre as classes sociais

e o monopólio da utilização da força física. A história das civilizações desde a Idade Média

até a Era Moderna nos auxilia na compreensão das mudanças de comportamento e atitudes

dos indivíduos, segundo Elias e Dunning (1992), os fatos históricos não devem ser

dissociados dos estudos sociológicos e são determinantes em todo o processo de civilização.

Para Elias e Dunning (1992) em sociedades pacificadas as disputas políticas ocorrem sem

estratégias violentas e o governo cumpre com jurisprudência o uso da força física para

controlar as diferentes tensões que surgem das relações sociais. Segundo Elias e Dunning

(1992, p.89):

[...] o inflamar periódico de estratégias violentas no caso do público de futebol, pode

ser considerado, talvez, num contexto mais alargado, como um sintoma de algum

defeito na sociedade em geral, mais do que apenas neste aspecto particular, a qual

sente prazer em cometer actos de violência --- um defeito que se aninhou sob esta

forma.

A violência no futebol não pode ser entendida se for estudada separada da

violência presente na sociedade brasileira. Para Elias e Dunning (1992, p.16), o eesporte e a

guerra “podem desencadear quer emoções de prazer quer de sofrimento e compreendem uma

mistura complexa e variável de comportamento racional ou irracional”. A busca das emoções

por meio dos esportes é necessária para combater o stress adquirido pela rotina das “coisas

sérias” da vida, mas são com frequência acompanhadas de manifestações de violência.

53

Conceito desenvolvido por Elias utilizado para determinar e medir o estágio de desenvolvimento que uma

sociedade atingiu. Este conceito foi tratado em sua obra: Introdução a Sociologia em 1970.

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O desenvolvimento do futebol nos mostra um processo civilizatório. As práticas

esportivas realizadas nas escolas inglesas eram confrontos violentos entre os grupos de

participantes e de difícil controle das tensões. Desde o surgimento do primeiro código de

regras em 1863, as regras tem coibido a violência por parte jogadores em uma partida. As

regras e normas presentes no futebol espetáculo são instrumentos de controle para o equilíbrio

das tensões. No equilíbrio das tensões entre as polaridades interdependentes descritas por

Elias e Dunning (1992), que fazem do futebol um esporte excitante, quatro das oito

polaridades especificadas são instrumentos de controle dentro da dinâmica da figuração

formada pelos jogadores. Segundo Elias e Dunning (1992):

1) A polaridade entre o controlo externo dos jogadores, a vários níveis (por

exemplo, dirigentes, capitães, colegas de equipa, árbitros, juízes de linha,

espectadores e por aí adiante), e o controlo flexível que o jogador exerce sobre si

próprio, quer seja de um ou de outro sexo;

2) A polaridade entre a identificação afectuosa e rivalidade hostil em relação aos

oponentes;

3) A polaridade entre o prazer da agressão manifestada pelos jogadores e a

limitação imposta pelo padrão de jogo sobre esse prazer;

4) A polaridade entre flexibilidade e rigidez das regras.

O árbitro de futebol e os assistentes são agentes de controle da conduta dos

jogadores e comissão técnica e embora Elias e Dunning (1992) estejam se referindo a normas

de controles determinadas pelas regras da modalidade é o árbitro e seus assistentes, citados no

texto como juízes de linha, que farão com que a rivalidade hostil, o prazer da agressão e a

flexibilidade e rigidez das regras na partida se desenvolvam dentro do que é permitido pelas

regras e pelo código ético de condutas, o fair play.

A função do árbitro como autoridade responsável em salvaguardar as regras e a

correta interpretação destas faz com que o árbitro sofra violência e que em determinadas

situações gere a violência quando tem decisões equivocadas. Erros nas interpretações dos

árbitros nos lances do jogo podem estar associados a vários motivos como: posicionamento

do árbitro, velocidade da jogada, formação e experiência do árbitro e muitas vezes só serão

esclarecidos após a utilização dos recursos tecnológicos nas imagens das câmaras televisivas.

Recursos estes não disponíveis à equipe de arbitragem e utilizados pela mídia nas

transmissões dos jogos. Aqui se faz necessário conceituar os termos: agressividade e

violência. Segundo Pereira (1975) apud Boschilia (2008) a agressividade é:

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inata no ser vivo. Existe na face da terra antes mesmo do aparecimento do homem

no globo. Não é condição exclusiva do ser humano. O que é exclusiva do ser

humano, à vista da sua racionalidade, é a violência, não a agressão, que é própria,

biologicamente, de todo ser vivente. Assim, pois, toda a violência é agressão, mas

nem toda agressão é violência.

A agressividade é inata nos seres humanos e está associada a princípios de

sobrevivência, nos esportes a agressividade é entendida como o ímpeto de jogadores e equipes

para obter resultados satisfatórios nas disputas, portanto, dizer que um jogador é agressivo ou

que uma equipe se posta de maneira agressiva em relação ao adversário não pode ser

entendido como violência. Esta pesquisa pretende entender a violência contra árbitros e

estaremos utilizando o conceito definido por Reis (2006) “... utilização da força (física ou

não) que atende contra a lei e/ou o direito da soberania da pessoa”. Para a autora existem

diferentes tipos de violência e esta não pode ser entendida apenas como força física e

manifestada por contatos físicos. Elias e Dunning (1992) estabelecem uma tipologia da

violência que se distingue em termos de meios utilizados, intencionalidade da ação e

parâmetros sociais, uma vez que diferentes sociedades podem distinguir atitudes violentas de

maneira diferenciada. Segundo Elias e Dunning (1992):

1) Se a violência é real ou simbólica, isto é, se apresenta a forma de uma

agressão física directa ou envolve simplesmente atitudes verbais e/ou não verbais.

2) Se a violência apresenta a forma de um “jogo” ou “simulação” ou se ela é

“séria” ou “real”. Esta dimensão pode também ser aprendida através da distinção

entre violência “ritual ou não ritual”, embora se tenha que assinalar que, com a

devido respeito a Marsh e aos seus colegas54

, ritual e jogo podem possuir um

conteúdo violento.

3) Se uma arma ou armas são utilizadas ou não.

4) No caso de as armas serem utilizadas, se os atacantes chegam a estabelecer

contacto directo.

5) Se a violência é intencional ou consequência acidental de uma sequência de

ações que, no início, não tinha a intenção de ser violenta.

6) Se se a violência iniciada sem provocação ou como sendo uma resposta, em

retaliação a um acto intencionalmente violento, ou sem a intenção de o ser.

7) Se a violência é legítima no sentido de estar de acordo com as regras,

normas e valores socialmente prescritos ou se não é normativa ou ilegítima no

sentido de envolver uma infraccão dos padrões sociais aceites.

8) Se a violência toma uma forma “racional” ou “afectiva”, isto é, se é

escolhida como modo racional como um meio de assegurar a realização de um

objectivo dado, ou subordinada a “um fim em si mesmo” emocionalmente

satisfatório e agradável. Outra forma de conceptualizar esta diferença seria distinguir

entre a violência “instrumental” e “expressiva”.

54

P. Marsh, E. Rosser e R. Harré, The Rules of Disord, Londres, 1978.

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Hoje com os avanços científicos e tecnológicos nas sociedades a internet deve ser

considerada como meio de reprodução da violência simbólica divulgando informações

fraudulentas e difamando os indivíduos, ferindo assim, os direitos institucionalizados.

Normalmente a violência com agressões físicas ocorre precedida de agressões de

violência simbólica, e a transformação das agressões simbólicas em físicas ocorre

quando o indivíduo perde o controle durante suas manifestações afetivas/simbólicas

e parte para a violência manifesta – física (REIS, 2006, p.16).

Estaremos neste trabalho apropriando-se dos conceitos de violência simbólica e

violência física por acreditarmos estes serem os tipos de violência sofridas pelos árbitros de

futebol. A violência segundo Reis (2006), não pode ser compreendida sem a relação futebol e

sociedade.

As raízes da violência relacionada ao futebol estão na sociedade brasileira. A

formação de indivíduos apáticos ou agressivos e violentos ocorre a partir de sua

sociabilidade primária, quando já podem ser percebidas tendências a manifestações

agressivas ou apáticas: ou será mais explicitada na juventude, podendo permanecer

na fase adulta. Nas relações sociais ao longo da vida, irão demonstrar as preferências

de relacionamentos, se de forma pacífica, por um lado, ou em outro extremo de

forma agressiva (REIS, 2006, p.15).

Na formação da sociedade brasileira encontramos uma sociedade patriarcal,

escravocrata e miscigenada. O índio e o negro trabalhavam para enriquecer os senhores

brancos europeus. Tinham sua cultura desintegrada pelos padres jesuítas que os julgavam

incivilizados e neste contexto de exploração e discriminação, soma-se a exploração sexual das

mulheres. Neste ambiente de segregação criavam-se as crianças. Eram tratadas como

pequenos adultos, e com uma educação rígida e formal reproduziam os valores sociais que

recebiam dos adultos. Segundo Freire (2004, p.213), “É natural que na noção de propriedade

como de outros valores, morais e materiais inclusive o da vida humana, seja ainda o Brasil um

campo de conflitos entre antagonismos os mais violentos.”

A história social brasileira no séc. XXI apresenta-se com traços de continuidade

do que foi o processo de colonização no Brasil, uma sociedade patriarcal, com valores de

masculinidade, com desequilíbrio nas relações de poder entre os gêneros e nas diferentes

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classes sociais com estruturas econômicas, políticas e sociais contribuindo para gerar fatores

de violências. Segundo Reis (2006, p.16): ”Essa situação estrutural brasileira contribui para

uma sociedade de indivíduos frustrados, descontentes, desiludidos, que podem expressar seus

sentimentos de maneira agressiva. Isso é preocupante para o convívio social.”

Embora os autores Freire (2004) e Reis (2006) descrevam a sociedade brasileira

em diferentes períodos históricos, estes convergem que manifestações e conflitos violentos

estão relacionados aos fatores estruturais e culturais da sociedade. Estes fatores potencializam

uma agressividade que se faz presente nos confrontos esportivos, mas que deveria se manter

sob controle e não concretizar-se em violência, se temos como referência a teoria dos

processos civilizatórios. Segundo Reis (2006), "A violência é gerada socialmente e suas raízes

e soluções são complexas, assim como o é a própria relação entre futebol e violência”. A

autora atribui a violência:

1) A formação do indivíduo e o seu entorno social que interferem na construção da

identidade e da identificação coletiva.

2) A situação estrutural brasileira que não atende as necessidades da população.

3) Os indivíduos com alto grau de agressividade, que colocam a integridade do próximo

ou de bens em risco e que no Brasil se favorecem de um sistema judiciário ainda sem

credibilidade, extremamente lento nos trâmites legais.

4) A crença, estimulada pelos meios de informação, que o futebol é um poderoso meio de

ascensão social.

5) Os valores de masculinidade e valores exacerbados de virilidade, força e sobrepujança

presente na criação do futebol e nas sociedades patriarcais como a nossa.

Segundo Reis (2006), “Os fatores geradores da violência são vários e

complexos...” e embora o interesse deste estudo seja a violência dirigida a árbitros de futebol,

esta não pode ser estudada e entendida sem a compreensão da sociedade. Sendo assim, é

importante destacar o momento atual, este ano de 2015, vivido pela sociedade brasileira de

crise moral perceptível inclusive na ordem política e econômica, gerada pela falta de

credibilidade e capacidade dos políticos na gestão deste país e as inúmeras denúncias de

corrupção no governo. Na esfera esportiva, os dirigentes incorporam as mesmas atitudes e

condutas fraudulentas e corruptas dos políticos e abrem uma crise de credibilidade nas

entidades que administram e organizam o futebol brasileiro e mundial (FIFA) envolvidas em

escândalos de corrupção.

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Outros fatores responsáveis pela violência são mencionados por Reis (2006),

porém fatores estes observados no âmbito esportivo e para nosso interesse no futebol:

1) O consumo de álcool crescente entre jovens no Brasil;

2) A falta de autocontrole de torcedores que geram uma rivalidade hostil;

3) Reportagens na mídia e comentários de jornalistas que incitam a violência entre

torcedores e contra árbitros;

4) As decisões dos árbitros;

5) As declarações de jogadores, técnicos e dirigentes.

O que pretendemos aqui destacar é o quanto a violência está intimamente ligada

às questões estruturais e culturais de uma sociedade e o quanto as manifestações agressivas e

violentas dos pais e adultos interferem na formação das crianças. Segundo Elias (2011,

p.180), os hábitos e impulsos dos pais são incorporados pelos filhos e a família “transformou-

se no órgão principal para cultivar o controle socialmente exigido dos impulsos, e do

comportamento dos jovens”. A preocupação de Elias com as crianças é corroborada por Reis

(2006) na desestruturação da instituição família no século XXI. Segundo Reis (2006, p.18),

[...] grande parte da população jovem sofre pelas condições indignas de vida, pelo

baixo nível educacional, pela desestruturação acelerada da instituição família

vivenciada nas últimas décadas do século XX. Mesmo nas famílias estruturadas do

ponto de vista econômico, há uma falência dos valores morais e éticos que faz com

que os papéis sociais do pai e mãe deixem de ser cumpridos, gerando dessa forma

uma grande parcela de adolescentes e jovens extremamente carentes, que buscam

nos clubes futebolísticos seus ídolos e sua identidade.

Os valores éticos e morais destacados pela autora transpassam a gestão do esporte

e chega a campo. Técnicos orientam seus jogadores para a violência física como estratégia

para fazer fracassar as ações dos adversários, observamos jogos com números excessivos de

faltas e que beneficiam as equipes infratoras, uma vez que as chances de gols são destruídas e

nem sempre o comportamento do jogador violento conta com uma punição severa do árbitro.

Mauro Betti em seu livro: Violência em Campo relata depoimentos de ex-jogadores

confirmando o uso da violência como estratégica técnica e credita este comportamento, de

violação as regras, a pressão que sofrem técnicos e jogadores para a vitória que vem

acompanhada de vantagens econômicas. Para Mauro Betti, 1997, p.38:

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Já que os profissionais são fortemente pressionados para vencer, e como as suas

recompensas econômicas são determinadas pelo seu registro de vitórias, a violência

intensifica-se conforme aumenta o grau de profissionalização e a competição torna-

se mais acirrada.

É importante destacar que os valores éticos e morais ausentes nas gestões

fraudulentas e corruptas dos dirigentes esportivos e no comportamento de técnicos e

jogadores em campo contribuem para a violência dos espectadores e torcedores. Estes

profissionais são formadores de opinião e muitos deles são ídolos dos torcedores. Suas

declarações na mídia e suas atitudes e posturas em campo e fora deste podem incitar a

violência. A falta de controle emocional, o autocontrole dos atletas é comumente interpretado

pelo torcedor como se o grupo “deles” quisesse prejudicar o “nosso” grupo e para o propósito

desta pesquisa o grupo “deles” entendemos adversários e equipe de arbitragem. Com tantas

atitudes reprováveis de dirigentes, técnicos e jogadores contrárias ao que se espera em relação

aos valores morais presentes em uma sociedade civilizada, a bandeira do fair play instituída

pela FIFA nos jogos oficiais da entidade e no significado dos lançamentos das bolas

propositalmente para a lateral para que um jogador lesionado seja atendido pela comissão

médica, nos soa como insignificante e hipócrita uma vez que contradiz com os outros

comportamentos e atitudes observáveis. Segundo Boschilia (2014):

À manutenção da violência no esporte são atribuídas diversas razões, como as

elevadas cifras investidas, a necessidade de retorno para os investidores, as

exigências físicas colocadas aos atletas, a influência gerada pelos meios midiáticos e

a exacerbação dos níveis de competição (BOSCHILIA, 2014, p.167).

Ao estudarmos os dois autores, Boschilia e Betti, e nos certificarmos da data da

publicação de suas obras, percebemos que pouco avançamos para uma cultura mais civilizada

de todos os profissionais envolvidos no futebol, principalmente quando observamos o que

Elias e Dunning (1992), considerando o esporte um << confronto simulado>>>>, diziam em

relação à violência física socialmente aceita nos jogos esportivos. Para Elias e Dunning

(1992), o equilíbrio das tensões entre as equipes precisam ser controlados para que a

rivalidade amigável não se transforme em rivalidade hostil. Segundo Elias e Dunning (1992,

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p.331): “Isto pode acontecer quando se participa demasiado a sério num desporto, talvez na

sequência de pressões sociais ou de recompensas financeiras e do prestígio envolvido”.

O prestígio envolvido nas disputas esportivas citados pelos autores não encontram

significado apenas para a fama e valorização dos jogadores e clubes, mas faz parte dos

objetivos das nações em conquistar projeção e visibilidade mundial. Estar na mídia pode

favorecer relações diplomáticas e proporcionar acordos econômicos. Hoje os problemas

relacionados ao futebol parecem estar extra campo. Em uma perspectiva de longa duração os

níveis de violência em campo, presentes nas atitudes e comportamentos dos jogadores são

menores, o esporte requer um maior autocontrole e as regras estão mais rigorosas. Segundo

Elias e Dunning (1992):

Em comparação com o passado, também aqui se encontra, como sucede no

desenvolvimento do futebol, um nível de organização, de auto-restrição e de

segurança muito mais elevado. Como e por que razão acontece este

desenvolvimento em termos de longa duração, no sentido de padrões mais

<<civilizados>> das relações humanas verificadas nas sociedades em geral, são

questões que não necessitam nos preocupar aqui. Mas foi possível descobrir algumas

das razões por que, em paralelo com uma orientação semelhante na sociedade em

geral, um jogo como o futebol se desenvolveu a partir de uma forma de dinâmica de

grupo mais violenta para outra forma menos violenta e menos incontrolada e, por

correspondência, para um tipo de padrão de jogo diferente. Esta compreensão da

dinâmica do futebol na longa duração esclarece, em grande parte, o que é a dinâmica

do jogo no curto prazo, tal como hoje se realiza (ELIAS e DUNNING, 1992, p.

287).

A dinâmica de grupo presente no futebol e a qual se referem os autores é de um

jogo que apresenta tensões controladas pelo equilíbrio das polaridades descritas anteriormente

e que exige cooperação de todos os jogadores nesta figuração. O paralelo com a sociedade se

faz porque em uma sociedade industrializada e desenvolvida estão presentes inúmeras

ligações funcionais que como em um jogo de futebol requer autocontrole e cooperação.

O que desejamos é que a função do esporte de “excitação libertadora” possa ser

encontrada nos confrontos esportivos nos quais o espetáculo e a qualidade técnica dos jogos

não sejam substituídos por vantagens ilícitas dentro e fora do campo que justifiquem a

“vitória a qualquer preço”.

Vivemos uma cultura da violência e nossas crianças são expostas a violência

doméstica, escolar (bullying), e nos programas na televisão, em forma de entretenimento ou

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noticiários, que banalizam e espetacularizam a violência diária presente na sociedade. Embora

atualmente estas várias manifestações violentas, com diferentes raízes e causas nos leve a

acreditar que vivemos um processo de descivilização, Dunning (2011)55

, refutou as visões

exageradas. Em uma análise de longo prazo, os níveis de violência mostram que a

convivência dos homens hoje é mais pacifica e a nossa repugnância e a empatia das pessoas

com os que sofrem violência são características de um processo civilizatório.

3.2 A VIOLÊNCIA E AS MULHERES ÁRBITRAS NO BRASIl

No final da década de 1950 e início da década de 1960, Norbert Elias e John L.

Scotson realizaram um estudo em uma pequena comunidade chamada de Winston Parva56

em

Leicester na Inglaterra. O que motivou o estudo foi o nível de delinquência juvenil em uma

das zonas que compunham aquela comunidade. Durante as investigações dos fatos e buscas

pelas explicações o interesse da pesquisa se deslocou para as relações sociais entre o grupo da

Zona 2 e o grupo da Zona 3. A Zona 2, chamada de “aldeia”, havia sido formada há 80 anos.

Todos os moradores se conheciam e detinham o controle de todos os cargos de gestão na

“aldeia”. A Zona 3, chamada de “loteamento”, tinha 20 anos e os moradores não tinham uma

relação social. Em analogia a pesquisa de Elias e Scotson (1965), utilizamos o termo

“Estabelecidos” para nos referirmos aos homens no futebol e “Outsiders” para as mulheres no

futebol. Denunciamos com isto que homens e mulheres não possuem direitos iguais no mundo

esportivo como prevê a Constituição Brasileira.

Tendo como referência a dinâmica dos grupos esportivos estudados por Elias, as

duas equipes de jogadores, participantes do jogo, seriam na nossa análise os “Estabelecidos” e

os árbitros seriam os “Outsiders”, porém embora os árbitros sofram violência e é este o

propósito desta pesquisa, estudar as violências sofridas por eles, os árbitros homens tem seu

espaço garantido e reconhecido no futebol, eles são “Estabelecidos” nas leis do jogo, pois não

existe espetáculo futebolístico atualmente sem a presença de árbitro, mas as mulheres árbitras,

as “Outsiders” continuam excluídas do direito de arbitrar partidas masculinas de futebol. A

Constituição Brasileira garante a igualdade de direitos aos homens e mulheres e a todos os

cidadãos brasileiros direitos sociais como o direito ao trabalho, a saúde e ao esporte entre

55

Palestra realizada na Faculdade de Educação Física da UNICAMP, em maio de 2011. 56

Nome fictício dado pelos autores.

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outros, porém o esporte continua sendo uma área reservada masculina. Segundo Reis (2006,

p.15),

Em sociedades como as nossas, patriarcais, caracterizadas por valores de

masculinidade e com um poder predominantemente masculino, o futebol encontrou

terra fértil para solidificar-se e dar muitos frutos, principalmente ao capital.

A identidade dos homens foi construída social e historicamente sob valores de

masculinidade como força física, trabalho e ele devia ser o provedor da família. A história dos

homens era relacionada às coisas “sérias” da vida: economia e política. A identidade das

mulheres sempre esteve associada à maternidade, a família e aos valores de feminilidade

como delicadeza, fragilidade e dependência. A história das mulheres era relacionada à família

e sexo.

O aumento da sensibilidade e do autocontrole nas atitudes e comportamento dos

indivíduos juntamente com o controle do monopólio da força física pelo Estado,

características do processo civilizatório, associado ao desenvolvimento tecnológico e

científico, com o aumento das cadeias de interdependência e a entrada das mulheres no

mercado de trabalho transformou o esporte no principal espaço de validação da

masculinidade. Segundo Dunning e Maguire (1997), ‘... o esporte se transformou no “últimos

bastiões” do poder e da superioridade masculina para combater a “feminização” da sociedade,

e distanciar-se desta feminização’.

As relações entre homens e mulheres são relações de interdependência e, portanto

pautadas em equilíbrio de poder. Com a restrição do uso da força física e o monopólio deste

direito nas mãos do Estado as mulheres sentiram-se mais seguras para buscarem e exigirem

uma relação mais igualitária entre os sexos. No esporte as mulheres atletas têm conseguido

grandes conquistas esportivas e sociais. A representatividade feminina nos diferentes esportes

e nas representações nacionais é uma realidade. As mulheres continuam a margem quando

dirigimos nosso olhar para outros fatores:

1) A diferença nos valores das premiações masculinas e femininas;

2) A visibilidade e espaço nas mídias;

3) Número de mulheres em cargos de gestão esportiva;

4) Número de mulheres em cargos de comissões técnicas;

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5) Investimentos em espaços físicos para treinamento;

6) Investimentos em equipes femininas e salários das atletas;

7) Condições de acesso e participação das mulheres em práticas corporais e esportivas

(MOURÃO, 2012)57

;

8) Espaço para o acesso das mulheres árbitros em campeonatos masculinos e femininos.

Estes fatores comprovam a hegemonia masculina nos esportes de rendimento e as

dificuldades de acesso das mulheres nos esportes de lazer. Segundo Mourão (2012),58

as

maiores barreiras enfrentadas pelas mulheres são:

1) O domínio masculino nos esportes;

2) Estereótipos de homossexualidade;

3) Preconceito;

4) Baixa remuneração;

5) Aceitação da família;

6) Conflito da Vida Pessoal X Vida Profissional.

Todas estas dificuldades enfrentadas pelas mulheres nos remetem ao estudo das

relações de poder de Elias e Scotson (2000). A pesquisa realizada na Inglaterra e os dados

desta pesquisa (que são apresentados no capítulo 4) nos ajudam a compreender relações de

poder presentes no âmbito esportivo.

Os “Estabelecidos” de Elias e Scotson (2000), moradores de um bairro muito

antigo, desejavam preservar a identidade do grupo e o status e por esta razão estigmatizaram

os recém-chegados moradores da nova comunidade. Consideravam os “outsiders” indignos,

pessoas de menor valor e o alto grau de coesão do grupo permitia que reservassem para si os

cargos importantes das organizações locais e o monopólio das principais fontes de poder na

comunidade.

Os Outsiders de Elias e Scotson (2000), depois de algum tempo, pareciam aceitar

com uma espécie de resignação e perplexidade a ideia de terem um grupo de menor virtude e

respeitabilidade. Estes grupos por serem de novos moradores não se conheciam e, portanto,

careciam de coesão e organização grupal.

As mulheres que almejam trabalhar como árbitras são estigmatizadas como se não

tivessem capacidade técnica e física para dirigir as partidas profissionais masculinas. Os

57

Palestra na Faculdade de Educação Física da UNICAMP em 27/06/2012. 58

Idem 4.

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dirigentes homens querem preservar a identidade do grupo, o espaço masculino e consideram

as mulheres como indignas e com menor valor. Na sociodinâmica desta estigmatização, os

dirigentes homens atribuem características ruins ao grupo de mulheres e modelam o trabalho

dos homens pela minoria dos melhores membros do grupo considerando todos os homens

melhores que todas as mulheres. A fofoca que estabelece crenças coletivas e causam

sentimentos de virtude, prazer e excitação no grupo “Estabelecido” contribui para a exclusão

profissional das árbitras e para o preconceito, a erotização dos corpos femininos e

contraditoriamente também o estereótipo de homossexual.

O que nos causa surpresa é que como em Elias e Scotson (2000) os dados da

nossa pesquisa revelam que não existem diferenças significativas de nível educacional,

nacionalidade e profissional entre os grupos de árbitros masculinos e o grupo de árbitros

feminino. As mulheres frequentam o mesmo curso de formação e se submetem as mesmas

avaliações que os homens para serem aprovadas árbitras. É importante destacarmos que toda

estigmatização não ocorre nas relações de árbitros e árbitras e sim nas relações de dirigentes

esportivos e árbitras femininas. São estes dirigentes esportivos e os responsáveis pelo

departamento de árbitros das federações nacionais e internacionais que avaliam, indicam e

escalam as mulheres para trabalhar. E é este equilíbrio estável de poder, destes dirigentes,

alguns com cargos vitalícios que possibilitam estigmatizar as mulheres com eficácia. Hoje,

podemos observar um pequeno avanço no reconhecimento e valorização do trabalho das

árbitras assistentes, bandeirinhas, mas a função de árbitra central em jogos de equipes

masculinas de jogadores profissionais ainda é um espaço a ser conquistado pelas mulheres,

este espaço é ainda exclusividade dos árbitros homens.

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4. COM A PALAVRA: OS ÁRBITROS

4.1 OS ÁRBITROS E O FUTEBOL

Jogar futebol faz parte da cultura brasileira, mas o que é preciso para jogar

futebol? A prática requer uma pequena estrutura e isto contribui para o sucesso da modalidade

esportiva. Precisamos apenas de uma bola, mas é comum vermos crianças chutarem uma

latinha, uma garrafa pet e outros objetos que permitam o fascínio do jogo. Marcam a baliza

com chinelos, tijolos ou latinhas. Jogam na rua, campo ou quadra. Em dias de sol e nos dias

de chuva e não precisam de árbitros. Quando muito, um colega ou amigo vai contrariado para

a função já que o número de participantes é impar ou ele fica “de próximo” 59

. Esta maneira

lúdica de jogar acompanhou a infância de muitos meninos e meninas, época que podíamos

brincar na rua e que nos esquecíamos da hora de retornar para casa. Nos dias de hoje jogar na

rua é cada vez mais difícil devido ao desenvolvimento das cidades e a falta de segurança. Para

Murphy, Willian e Dunning (1994, p.6), boa parte da atração exercida pelo jogo de futebol

“decorre, sem dúvida, do reduzido equipamento necessário à sua prática, o que o coloca ao

nível dos desportos mais baratos e acessíveis”.

Na dinâmica dos grupos esportivos estudados por Elias e Dunning (1992, p.282),

“[...], a configuração dos jogadores de uma das equipas e a dos jogadores da outra equipa são

interdependentes e inseparáveis”. Entre os jogadores da mesma equipe existem relações de

cooperação, com os adversários as relações são de oposição. Nesta dinâmica de grupos o

árbitro e seus assistentes (bandeirinhas) são agentes de controle para manter o equilíbrio das

tensões entre as equipes e para que as regras sejam respeitadas e cumpridas pelos jogadores.

Como já mencionamos as primeiras regras do jogo em 1863, não existia a figura do árbitro.

As decisões e divergências entre os jogadores eram resolvidas entre os capitães das equipes. A

regra do offside necessitou de alguém presente de jogo, em local privilegiado, a quem os

capitães das equipes pudessem se reportar em caso de dúvidas, mas o desenvolvimento do

futebol e a crescente competitividade entre as equipes fizeram com as tensões e reclamações

aumentassem e o árbitro adentrou o campo podendo decidir sobre faltas, pênaltis e punições

de jogadores em 1891. Segundo Boschilia (2008, p. 98):

59

Linguagem utilizada pelos meus alunos do Ensino Fundamental para o colega que aguarda a vez de jogar.

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A palavra referre provém do verbo to refer que significa recorrer, assim, no limite

da expressão, sua definição original refere-se a alguém a que se deve recorrer. Com

a evolução e desenvolvimento do esporte não se torna mais necessário, nos lances

dúbios, recorrer ao referee, este interfere no jogo sem ser solicitado, sendo esta sua

função no futebol atual.

Para este trabalho de pesquisa entrevistamos os três árbitros FIFA da Federação

Paulista de Futebol. A escolha por esta categoria, FIFA, foi por acreditarmos que o árbitro

quando chega a este nível cumpriu todas as fases para a sua formação e tem a qualificação

exigida no que diz respeito às questões administrativas e regulamentares para trabalhar em

todos os campeonatos organizados pela FPF, CBF e campeonatos reconhecidos pela FIFA.

Nossos entrevistados estão na faixa etária compreendida entre 36 e 41 anos de idade e são

dois homens e uma mulher. Todos são árbitros centrais, portanto não temos entre os três

nenhum assistente (bandeirinha). Procuramos entender a escolha por esta função e como

interpretam e sentem a violência que sofrem.

4.2 QUEM SÃO OS ÁRBITROS? E POR QUE ELES ESCOLHERAM ESTA

PROFISSÃO?

Para se inscrever em um curso de formação de árbitros de futebol da FPF o

candidato precisa ter no mínimo o Ensino Médio. Segundo o Regulamento Geral da

Arbitragem da FPF (2015), “Art. 29 – A prestação de serviço como árbitro de futebol na FPF

fica condicionada às seguintes condições: II – Possuir curso de 2º grau ou de nível superior”.

Os árbitros entrevistados nesta pesquisa possuem curso superior completo, dois

são formados em Educação Física e um árbitro formado em Gestão Esportiva e Lazer.

Atualmente apenas um não trabalha na área de Educação Física é comerciante. Este dado nos

mostra um fato importante, os entrevistados atingiram um nível de excelência como árbitros, e

todos possuem curso superior, não abandonaram os estudos. Dedicam se profissionalmente a

outras atividades concomitantes ao trabalho como árbitros.

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Arnaldo Cezar Coelho foi o primeiro árbitro não europeu a apitar uma decisão da

Copa do Mundo de Futebol em 198260

, empresário bem sucedido, comentarista de futebol da

Rede Globo de Televisão e autor do livro “A Regra é Clara”, segundo Coelho (2002, p.17):

Às vezes, fico pensando: como me tornei árbitro de futebol? Alguns dizem que o

sujeito escolhe esse caminho porque não passa de um perna-de-pau e encontra na

arbitragem um jeito de participar do jogo. Mas, no meu caso, até que eu batia uma

bolinha razoável. Não sei, não sei mesmo. Será que foi destino? O prazer em correr

riscos? Certo Masoquismo? Alguma vocação? Desde garoto, sempre gostei de

liderar.

Embora seja comum ouvirmos, que um árbitro é um jogador fracassado, este

comentário não encontra sustentação nos nossos entrevistados, quando perguntados se foram

atletas disseram:

Por incrível que pareça não. A maioria dos árbitros são ex-atletas, jogaram futebol.

Mas eu não fui atleta não. [...]. Não, só na escola, na atividade física mesmo. Joguei

Handei [sic],vôlei, essas coisas, mais nada profissional, só lazer mesmo

(ENTREVISTADO 1).

Fui jogador de futebol. Joguei aí dos sete aos 20 depois continuei jogando no

amador, até 2010 jogava futebol amador. Só parei depois que minha vida na

arbitragem tomou uns rumos maiores né [sic] (ENTREVISTADO 2).

Não, joguei futebol amador até os 19 anos de idade, mas profissionalmente não

(ENTREVISTADO 3).

O que nos parece ser significativo, porém, longe de ser essencial, que bons

árbitros quando crianças e adolescentes sempre praticaram esportes. A prática esportiva seja

por lazer, escolar ou formação esportiva esteve presente, se não de maneira contínua, em

algumas fases da vida destes árbitros. E por que alguém que possui um curso superior

completo escolhe ser árbitro de futebol tendo pleno conhecimento das dificuldades que

enfrentarão? Segundo Franco Jr. (2007, p.309):

Em teoria ele é o elemento neutro em campo, na prática é alvo a priori das

desconfianças dos dois lados que disputam a partida. Ele desperta pouca simpatia. É

o ator maldito do espetáculo futebolístico. Pode arruiná-lo, e será criticado e

60

Fonte: Wikipédia.

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ofendido, talvez agredido. Pode contribuir para o seu sucesso, porém não terá a

glória e a remuneração de seus colegas de palco.

Considerado pelo autor como: “o ator maldito” não é possível na esfera

profissional realizar este “espetáculo futebolístico” sem a presença do vilão da história.

Vejamos o que dizem dois ex- árbitros de futebol sobre a escolha pela profissão de árbitro:

Arnaldo Cezar Coelho e Carlos Eugênio Simon.

Arnaldo era jogador de futebol de areia e segundo ele, durante os jogos das

equipes sempre algum espectador se apresentava para apitar. A exceção eram as partidas

consideradas clássicos do futebol de areia nas quais havia muita rivalidade e riscos e ninguém

se oferecia para arbitrar. Segundo Coelho (2002, p.24),

[...] para apitar aquele Radar e Copaleme, um dos maiores clássicos de futebol de

areia, ninguém parecia reunir disposição e coragem para enfrentar parada tão

indigesta. De repente, sou empurrado do alto do paredão, com cerca de um metro de

altura. E fui jogado lá de cima. Ao aterrissar na areia, vejo os dois capitães vindo na

minha direção para entregar o apito. Fui abordado como uma espécie de herói,

porque, como já disse, ninguém queria apitar aquele jogo. Acabei levando o jogo até

o final, e a partir daí o pessoal dos clubes começou a telefonar para minha casa me

convidando para apitar.

Carlos Eugênio Simon, autor do livro: Na diagonal do campo, relembra que sua

carreira na arbitragem teve início quando aluno da Escola Técnica Parobé em 1984 em Porto

Alegre/ RS. Na final dos jogos da escola depois de confusão nas semifinais ninguém se

ofereceu para apitar a partida. Em uma assembleia geral um colega levantou-se e falou: “‘Por

que o Simon não apita, pelo menos ele sabe jogar futebol’. Olhei para o cara e disse

contrariado: ‘Só podes estar brincando!’. Mas como ninguém, em hipótese nenhuma, quisesse

apitar, resolvi encarar o desafio” (SIMON, 2004, p. 20).

Os autores nos apresentam duas características importantes para a profissão de árbitro: a

coragem para tomar decisões impopulares e uma característica técnica que é o conhecimento

do jogo. Mas o que dizem os árbitros entrevistados?

Eu sempre fui muito apaixonada pelo futebol e influenciada pelo meu irmão mais

novo Eraldo, porque eu sou de uma família de seis filhos, quatro mulheres e dois

homens, onde eu sou a caçula e o Eraldo é o próximo depois de mim. [...] Então

restava nóis[sic] brincar entre nóis[sic] nós mesmos, como eu e o Eraldo éramos os

mais novos ele não brincar de boneca comigo, eu que tinha que brincar de bola com

ele, de bolinha de gude, de soltar pião, então começou a paixão de futebol

influenciada por ele, que ele é muito louco por futebol. [...] Depois ele machucou o

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joelho, parou de jogar bola e fez o curso de árbitro, então eu sempre ia ver apitando

futebol estava no meio do futebol, jogo de futebol. E eu entendia muito de futebol, e

os amigos dele todos falavam: “você precisa fazer um curso, você é uma árbitra

nata”. [...] mas já adianto que eu não queria ser árbitra central, eu queria ser árbitra

assistente, é na época eu estava casada, e o meu esposo falava assim pra mim: ‘’você

tem que ser árbitra central porque você é muito mandona, você é muito autoritária,

você tem perfil de árbitra porque você manda demais’’. De tanto ele falar eu me

convenci e fui apitar, até então eu estava só bandeirando, fui apitar e realmente me

dei muito bem apitando, tanto que cheguei no quadro internacional, então ele tinha

razão (ENTREVISTADO (1).

Na verdade o, o futebol tá no meu sangue assim né[ sic], meu pai, meu irmão mais

velho foram profissionais. Eu também joguei futebol até os 20 e, um grande amigo

meu que é da Federação Paulista e da CBF que é o [...] que fez o curso um ano

antes, na turma anterior, 2000, 2001. Ele já queria que eu fizesse com ele aquela

época, mas eu não me via muito como árbitro assim, eu não era um jogador que

dava problema pra arbitragem assim, eu era um pouco esquentado, digamos. Então

eu tinha mais problema com adversário do que com a arbitragem. Então eu não me

via muito nesse papel de arbitro e aí em 2001 ele ficou falando tanto na minha

orelha que eu, ele me convenceu. Aí eu fui fazer a prova, tipo um vestibular assim

pra entrar, aí fui eu, o irmão dele e mais dois amigos, e tinha 450 pessoas pra 50

vagas. E eu fui aprovado, só eu passei dos quatro que fomos pra lá, e aí a partir daí

eu disse, vou começar. Iniciei o curso e aí você vai pegando gosto né[sic], você

começa a trabalhar nos jogos, você começa a receber elogios né[sic], então isso aí

vai te motivando a aperfeiçoar cada vez mais e buscar novos horizontes dentro da

área (ENTREVISTADO 2).

Bem, eu comecei arbitrando jogos na faculdade, como estagiário né[sic], tinha uma

bolsa, e na época o professor Elineu colocava estagiários trabalhar em coisas e, e ele

consequentemente trabalhava de secretário de esportes da cidade, então ele nos

colocava pra trabalhar em futebol de campo, futebol de campo, voleibol, ele era

professor acadêmico de voleibol. Então na verdade eu comecei trabalhando em

varias modalidades até me afirmar na arbitragem de futebol, então foi em conta

também pela faculdade (ENTREVISTADO 3)

Ao ser questionado sobre a influência de alguém para se tornar árbitro, o

entrevistado número 3, acrescentou:

Do irmão, [...]. Até o motivo de fazer o curso da Federação foi em, com o espelho

nele, espelho no [...]. Já era árbitro da Federação e quando eu entrei no quadro da

CBF, quando eu entrei na escola da Federação Paulista, ele já estava indo pro quadro

da FIFA (ENTREVISTADO 3).

Ser árbitro de futebol parece não estar nos sonhos das crianças e dos adolescentes.

Os autores citados e os entrevistados demonstram que a escolha pela profissão não foi

planejada. A influência de amigos, professores e familiares foi o pontapé inicial para a

identificação com a função. As reações de amigos e familiares são relatadas a seguir:

Olha os amigos e a família sempre me apoiaram bastante porque sempre souberam

da minha paixão pelo futebol, sempre acompanhei meu irmão tanto jogando, quanto

apitando. Então eles sabiam que era totalmente envolvida com aquele meio, com

aquele ambiente, então eles me apoiaram muito. E minha família me apoia muito até

hoje, graças a Deus (ENTREVISTADO 1).

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É, eu tive um pouco assim. Nós dirigíamos um, outra época, a época do meu pai,

época até do meu irmão, ele é 12 anos mais velho que eu. Então existe um certo

receio assim com, com a relação da função do árbitro né, um pouco de insegurança

em relação a sua integridade física. Mas eu tive um pouco de restrição dos meus

pais, os amigos nem tanto, é porque também sabiam que eu tava partindo pra um

lado mais profissionalizado do futebol, não ia fazer amador, esse tipo de coisa

(ENTREVISTADO 2).

Ah, já imaginavam, até pelo fato de estar, por eu trabalhar, por eu estar, fazer

faculdade de educação física e já ter um irmão na família sendo um árbitro nacional

(ENTREVISTADO 3).

O depoimento dos entrevistados 1 e 3 nos mostra que não foi nenhuma surpresa

para familiares e amigos a escolha pela profissão. Nosso entrevistado número 2 nos aponta a

preocupação do pai e do irmão sobre a segurança e a integridade física corroborando com esta

pesquisa que se propôs estudar e entender a violência contra os árbitros.

4.3 A PREPARAÇÃO E A “PROFISSIONALIZAÇÃO”

Para alcançar sucesso na carreira algumas qualidades e características são necessárias para o

árbitro. Para Simon (2004, p.33):

Um bom árbitro tem que reunir algumas qualidades. Futebol é paixão, é disputa.

Dentro e fora do campo. As circunstâncias, no gramado limitado pelas quatro linhas,

são imprevisíveis, e quem está no controle precisa saber, a cada momento, o que

deve fazer sem vacilar. São cinco, segundo penso, os traços que basicamente,

comporão o perfil do bom árbitro:

Autoridade

Personalidade

Inteligência

Tranquilidade

Organização

Este autor considera estas cinco características como básicas para o perfil de um

bom árbitro. Corroborando com o autor, mas sustentada pelos meus estudos e na experiência

de pertencer à arbitragem, embora de outra modalidade esportiva, acredito poder aqui

considerar muitas outras características importantes para a formação de um bom árbitro.

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Segundo Gallego (2011)61

, quatro palavras mágicas acompanham o sucesso na carreira:

Trabalho, Esforços, Sacrifícios e Sorte.

A preparação de um árbitro divide-se em quatro partes que embora distintas estão

interligadas: Preparação técnica, preparação física, preparação humana e preparação

psicológica.

A preparação técnica está relacionada a todo o conhecimento das regras e da

lógica do jogo. Estudar regras, vídeos de jogos, assistir jogos de outros árbitros, participar em

cursos e palestras e ter conhecimento técnico e tático do jogo de futebol, isto inclui sistemas

defensivos e ofensivos.

A preparação física deve fazer parte da rotina de um árbitro. Avaliações físicas

são constantes e um árbitro bem preparado fisicamente terá condições de decidir as ações do

jogo de maneira tranquila, rápida e segura.

A preparação humana diz respeito a sua formação educacional e acesso a

informação e cultura. Deve estudar idiomas porque estará interagindo com pessoas de todo o

mundo.

A preparação psicológica talvez a parte mais difícil de todas as outras

mencionadas porque requer algumas características aprendidas e incorporadas desde a nossa

infância. São elas: personalidade, independência, imparcialidade e honestidade, educação,

superação, autoestima, cooperação, concentração e atenção, senso de humor, autoconfiança,

regularidade, segurança, saber trabalhar sob pressão e ter humildade.

No regulamento de árbitros da FPF constam as avaliações periódicas as quais são

submetidos todos os árbitros. Segundo o regulamento da arbitragem da FPF:

Dos Direitos e dos Deveres Art. 20 – São direitos dos árbitros:

IV – Ser promovido de acordo com as Normas de Classificação dos Árbitros;

V – Ser indicado para o Quadro Nacional de Árbitros em conformidade com as

diretrizes emanadas pela Comissão Nacional de Arbitragem da Confederação

Brasileira de Futebol;

VIII – Requerer cópia do Relatório Técnico de Avaliação dos jogos em que tenha

atuado;

X – Requerer, da Comissão de Arbitragem, as cópias dos testes escritos e físicos,

após a divulgação dos resultados.

61

Informação Oral em palestra para árbitros de Handebol em são Paulo em 2011.

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A relação anual dos árbitros é realizada com bases nos resultados das avaliações

escritas e físicas no início da temporada e avaliações dos jogos da temporada anterior. As

exigências da FPF estão relacionadas ao que indicamos como fundamental para a preparação

dos árbitros. Quando perguntados sobre o apoio que as instituições (FPF e CBF)

disponibilizam para toda esta preparação, assim responderam os nossos entrevistados:

Olha só, hoje de uns 3, 4 anos pra cá, melhorou muito, essa relação da entidade se

preocupar com árbitro, com o ser humano. Se preocupar com a parte psicológica, a

parte física, mas eu ainda acho que tá muito, muito aquém do que podia ser, acho

que ainda tá bem atrasado, poderia fazer muito mais coisa pra reverter pro árbitro.

Porque é muita, é muita responsabilidade, é muita, é uma carga muito pesada que o

árbitro leva né. Ficar mexendo com milhões em dinheiro, que milhões de pessoas

com paixão. Então eu acho que ele deveria ter uma coisa maior aí, em relação à

parte psicológica é, na parte física, mas acho que a gente ta caminhando pra mudar

isso. Hoje no quadro da CBF, a Confederação Brasileira de Futebol, nós temos uma

psicóloga que nos acompanha que a gente faz consultas mensais, passa relatório pra

ela de como a gente tá, como tá nosso treinamento, como tá nossa vida pessoal, no

geral. Na Federação Paulista também tem, não é um acompanhamento tão especifico

e os treinamentos físicos são feitos periodicamente na Federação Paulista, onde tem

um convênio próximo ali na Barra Funda, que a gente faz um treinamento técnico de

físico. Mas eu ainda acho que podia ter um investimento maior, porque eu acho que

é muita responsabilidade que o árbitro carrega pra não ter tanto investimento no

árbitro né. É tanta cobrança, tanta dificuldade, eles cobram tanto do árbitro, mas eu

acho que não tem tanto retorno, não tem tanto investimento como deveria ter

(ENTREVISTADO 1).

É a Federação Paulista, por exemplo, ela tem um aspecto técnico assim,

Campeonato Paulista, tem uma pré temporada né, ficamos uma semana

concentrados, e foca muito mais a parte técnica né, temos o acompanhamento físico,

de todas as instituições, mas é um acompanhamento assim, pequeno durante o ano,

é, mas tem o acompanhamento psicológico, é, tem o Gustavo Corte que é daqui da

Federação Paulista psicólogo e a Doutora Marta Magalhães que é da CBF. É um

trabalho que já tem um contato maior assim, durante o ano todo, é, eu tenho meus

investimentos pessoais. Tenho nutricionista, tenho um preparador físico que me

acompanha o ano todo é, espaço que eu utilizo assim, em termos de academia

também é pago pela minha conta, aqui em [...] eu consigo ter um espaço assim que

eu consiga treinar que tem uma pista de atletismo, um campo, mas e cursos assim

durante o ano todo a CBF proporciona, a FIFA, tipo em termos de uma reciclagem

né. Mas acho que o maior investimento parte do árbitro em si assim. No dia a dia eu

tenho mais contatos com meus investimentos do que das instituições

(ENTREVISTADO 2).

Hoje eu posso falar mais especificamente da Federação na qual eu sou vinculado que

é a Federação Paulista, lá quando eu fiz o curso lá, numa fase bem anterior 98, 99,

nós tínhamos um curso de alguns meses e nós tínhamos baseados, muito focados nas

regras de jogo, tivemos pouca situação de assistir um jogo, na época não tinha um

trabalho assim era uma parte muito mais teórica e os estádios era considerados

juvenis, que você ia para os jogos, e ali nos jogos você tinha aquela correção em

relação ao seu posicionamento, essa parte bem campo de jogo. Aí nesse estagio dos

árbitros que tinham mais facilidade, que já trabalhava com amador já acabava

levando um pouco mais de vantagem e ali o árbitro ia subindo de categoria, sub20,

terceira divisão, segunda divisão, até chegar na primeira divisão. Hoje, a federação

paulista tem curso de duração de dois anos que ela trabalha com varias matérias,

varias habilidades. Ela trabalha com varias matérias, dentre elas a federação tem um

profissional, um psicólogo para acompanhar os alunos que realiza o curso,

acompanha nos jogos, acompanha nas pré-temporadas, acompanha nos

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treinamentos, então hoje é um trabalho integrado com a preparação física, a

preparação técnica e mais a presença do psicólogo nos treinamentos e essa além e

nós por morarmos no estado de São Paulo, grande como moramos, moramos cada

um em uma região do estado e, a cada dois, três meses nós temos um trabalho

conjunto de aprimoramento em São Paulo que eles vão levando 30, 40 árbitros por

trabalho, as vezes por semana, com acompanhamento desses profissionais. Mas no

caso do treinamento físico, essa equipe técnica, uma empresa contratada pela

federação nos passa através de email, todo treinamento que a gente tem que fazer

durante a semana, cada um na sua cidade, cada um no seu tempo, intercalando com

sua rotina, intercalando com seu dia a dia. E na CBF hoje também tem toda essa

estrutura de psicólogo que nos acompanha essa parte de pratica, física e a parte

técnica, também com pré temporada, e aprimoramento dentre outros atividades. No

caso da FIFA é, como acaba sendo menos jogos, é uma carga menor de partidas,

mas todas essa estrutura de todos os países, todas essas confederações são utilizados

pra aprimoramento do arbitro da FIFA e só tem mais essa estrutura mais quando são

os jogos internacionais, competições internacionais, aí tem todo esse aparato, equipe

técnica, terapeutas, psicólogos, médicos, nutricionistas, entre outros. Mas são

competições mundiais (ENTREVISTADO 3).

Os árbitros reconhecem que nos últimos anos são sensíveis as melhoras na

formação do árbitro e no seu aprimoramento, porém consideram os investimentos pequenos se

comparados as possibilidades das instituições. Valorizam poderem contar com uma

preparação psicológica durante toda a temporada. A preparação física favorece os árbitros

residentes na cidade de São Paulo onde existe uma parceria com uma empresa contratada pela

FPF, os árbitros residentes em outras cidades recebem orientação para os treinamentos por

email. O treinamento técnico é realizado em pré-temporadas. O entrevistado 02 afirma que

investe financeiramente mais que as instituições para a sua preparação. Embora haja avanços

pensamos serem os investimentos muito aquém da necessidade se considerarmos as

exigências da profissão. Entendemos que toda a preparação se resume a uma consultoria para

treinamentos, o árbitro fica responsável por cumprir planilhas de orientação. Investir e

assessorar árbitros em todo o estado é uma tarefa difícil, mas acreditamos que ampliar as

oportunidades e possibilidades para estudos e treinamentos não seria árduo para os cofres das

federações. O trabalho deve ser contínuo.

A trajetória de um árbitro pode ser resumida em: curso de formação na Escola de

Árbitros da Federação Paulista de Futebol, início do trabalho em categorias de base e

feminino, frequentes avaliações e mudanças de categoria até pertencer ao quadro de árbitros

da FIFA.

As avaliações práticas não podem ser tratadas como mero detalhe de todo o

processo de avaliação. Para ser um bom árbitro é necessário transferir os conhecimentos para

o campo de jogo. Dirigir partidas e mediar conflitos. Os avaliadores são ex-árbitros que hoje

trabalham na formação. Avaliados a cada jogo os árbitros recebem uma pontuação que é

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registrada em seu prontuário. Porém apitar jogos e ter possibilidades de desafios implica em

ser escalado e ser sorteado. O que dizem os árbitros a respeito das escalas e dos sorteios:

O sorteio de escala é um tema bem, bem delicado que as nossas entidades de classe

vêm lutando bastante pra tentar tirar isso do estatuto do torcedor porque tá no

estatuto do torcedor. Então tem que ser respeitado, mas é uma coisa que ninguém

concorda, acho que nem os dirigentes da arbitragem, da federação, da CBF concorda

porque fica difícil até pra eles também pra fazer essa escala, esse sorteio. Eu também

acho que eles preferiam que não tivesse, mas como a gente tem que seguir a

constituição que tá lá na, no estatuto do torcedor, que tem sorteio, então respeita o

sorteio. Mas eu acho que prejudica um pouco a carreira do árbitro porque como um

Campeonato Paulista um árbitro internacional, apitou 4 jogos porque ele não era

sorteado, sendo que se fosse por escala, com certeza ele teria um número maior de

jogos porque um jogo importante, sabia que ele era a pessoa certa pra apitar aquele

jogo, podia ter apitado aquele jogo seria muito mais fácil pra comissão de

arbitragem escalar ele e até pra comissão de arbitragem fica difícil. Porque às vezes

tem um jogo que precisa daquele árbitro, só que você tem que colocar no globo

quatro árbitros, e às vezes cai um que você queria que não caísse, mas tem que tá lá

no globo, então o sorteio eu acho que não ajuda em nada a arbitragem, nem estadual,

nem Brasileira. E as escalas seguem esse critério, então na verdade tipo assim, o

árbitro é escalado se ele for sorteado (ENTREVISTADO 1).

Eu acho que é péssimo pra todos, não é bom pra ninguém assim, é bom pro Estatuto

do Torcedor que foi quem criou isso, mas é ruim pro árbitro, porque as vezes tem

um determinado jogo que até a comissão quer escalar o determinado árbitro, mas

não consegue porque tem que fazer o sorteio é... É ruim pras equipes, que às vezes

um árbitro que seria ideal pra determinada partida de clima hostil, ou assim, coloca

um árbitro inexperiente que ta lá prejudicando ainda mais o espetáculo, e é muito

ruim assim, a gente espera que nessa MP meio 71 aí também ta embutido pra acabar

com o sorteio né[sic] (ENTREVISTADO 2).

Sim, quando criou o Estatuto do Torcedor foi uma das exigências das pessoas que

fizeram a lei de que houvesse sorteio porque eles achavam que as comissões não

eram bem claras, as escalas de árbitros, porque esse jogo não o outro árbitro, então

uma das coisas que eles fizeram foi instituído nosso país o sorteio de arbitragem, pra

se te ruma ideia eu acho que na America do Sul, acho que só dois países, Brasil e

Uruguai tem sorteio, os outros países todos são escalas, porque o sorteio teve mais

pratica pras pessoas, pras pessoas que imaginavam que teria problemas na

arbitragem pode ser que tenha sido uma forma de, de... Mas pra você lançar um

árbitro jovem não é fácil você colocar ele num sorteio, como é feito em São Paulo.

Em São Paulo você coloca 20, o numero depende, 20, 30 chegamos a ter sorteios

com 35 árbitros para 10 jogos. Pode ser que você tenha um jogo clássico que não

seja um jogo que determinado árbitro no momento, por um árbitro em inicio de

carreira, você que fica no meio de arbitragem sabe disso, que se faz as vezes em

anos, e você acaba perdendo um árbitro em uma partida, então um problema da

arbitragem que querem estreiar novos árbitros é a questão do sorteio, pra nós que

estamos diretamente com isso. Se você faz um sorteio não direcionado, não dirigido,

hoje na CBF a gente tem um exemplo que cada jogo, cerca de 2, 3 árbitro por

sorteio, então você pode direcionar também por determinados jogos na primeira

divisão de árbitros, com 20 árbitros por sorteio corre-se o risco do arbitro não estar

preparado para determinada partida que ele ta sendo indicado, muita das vezes ele é

muito jovem, e as vezes ele ta envolvido no meio desses árbitros especiais, mas as

vezes pode não ser um jogo determinado pra ele, pode ser um jogo de televisão, ele

não esteje tão preparado pra aquele jogo, então eu, [...] tenho minha opinião de que

esse sorteio de todos os árbitros acaba sendo prejudicial pra lançamento de novos

árbitros, essa é a opinião própria pra mim (ENTREVISTADO 3).

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O sorteio é contestado por todos os entrevistados. As reclamações baseia-se que

um árbitro pode ficar rodadas sem trabalhar enquanto outros são sorteados muitas vezes, o

que acaba interferindo nas avaliações e mudanças de categoria. Defendem que a escolha de

um árbitro para um determinado jogo deva ser por nível técnico e pelo perfil do árbitro como

ser mais punitivo, mais tranquilo, enfim que estilo se adapta melhor as exigências da partida.

Segundo o Estatuto do Torcedor, capítulo VIII, Art. 32,“ É direito do torcedor que os árbitros

de cada partida sejam escolhidos mediante sorteio, dentre aqueles previamente selecionados”.

Embora a FPF e a CBF tenham estabelecido um ranking de árbitros

fundamentado em avaliações periódicas existem critérios subjetivos que fazem parte destas

avaliações. Segundo nossos entrevistados:

Então na CBF alguns árbitros, que eu não sei qual é, qual tipo de que forma é feito a

escolha, ao contrário, eles passam a ser aspirantes. Árbitro aspirante a FIFA, árbitro

central aspirante a FIFA, que deve ser também pelo desempenho nos jogos, no teste

físico, na prova teórica, que a gente também tem prova teórica. Teste físico na CBF,

e os jogos, também os jogos, creio eu que seja pelo desempenho, os melhores são

indicados a ser aspirante (ENTREVISTADO 1).

A federação paulista ela indica dos quadros, do quadro estadual, ela indica os

árbitros pro quadro nacional, aí a CBF pega os árbitros do quadro nacional que

indica pra CONMEBOL e FIFA (ENTREVISTADO 2).

Sim, hoje a federação paulista colocou os árbitros especiais que eles acabam não

abrindo mão das pessoas que são ranqueados, existe sim uma numeração nesse

ranking especiais. Existe sim, não, nós temos o conhecimento. Temos o

conhecimento dessa posição do ranking (ENTREVISTADO 3).

Entendendo todo o processo da FPF, ao finalizar o curso de formação de árbitros,

o recém-formado passará por cinco categorias até ser indicado ao quadro de árbitros da CBF,

pertencendo ao quadro da CBF será indicado a árbitro aspirante e em seguida árbitro FIFA. O

que não parece ser transparente, mesmo para os árbitros são as indicações, uma vez que

pertencendo a um seleto grupo de aspirantes, quem será o próximo indicado ao quadro da

FIFA?

Em entrevista ao jornal “O Estado de São Paulo” o árbitro Guilherme Ceretta de

Lima, pertencente ao quadro da CBF há dez anos, justifica a sua decisão de desistir de

pertencer ao quadro de aspirantes à FIFA. Segundo Ceretta62

A falta de critério fez com que eu resolvesse que aquilo não era mais para mim.

Existe uma política que faz com que precise mais que capacidade para ganhar

espaço e as pessoas que comandam a arbitragem hoje não são preparadas. Eles não

62

Entrevista fornecida aos jornalistas Almir Leite e Daniel Batista do jornal “O Estado de S.Paulo, São Paulo. 25

out. 2015, Caderno de Esportes, p.4.

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foram grandes árbitros e não tem conhecimento para estarem lá. [...] Abrimos

demais o leque da arbitragem. Na necessidade de fazer política com todos

presidentes de federações, temos árbitros no Brasileiro que apitam jogos de

Estaduais com pouca expressão e quando chegam em jogos grandes, se assustam.

Vejo árbitros no Paulistão, que não estão na CBF, melhores do que alguns que estão.

Eu e um outro árbitro erramos na mesma rodada. Ele voltou duas rodadas depois e

eu ficava dez fora. Esses dois pesos e duas medidas incomodam.

Segundo Boschilia (2008), “Politicagem, ‘apadrinhamento’, troca de favores e um

estreito relacionamento com dirigentes acabam sendo considerados, pelos próprios árbitros,

como fatores importantes na escolha para testes e escalas [...].” As “palavras mágicas” para o

sucesso, como afirmou Gallego (2011), trabalho, esforços, sacrifícios e sorte parecem não

depender apenas da dedicação e comprometimento do árbitro.

As escalas, sorteios e ranking nos direcionam para outro tema importante, a

profissionalização. Nossos entrevistados possuem curso superior e trabalham em outra

atividade concomitante, porém como respondem as seguintes perguntas: A arbitragem

equivale a que porcentagem do seu tempo de trabalho? E a arbitragem equivale a que

porcentagem da sua renda salarial?

Olha eu posso te falar que a arbitragem equivale a 90% do meu tempo de trabalho.

Porque eu me dedico exclusivamente na arbitragem. Eu treino por causa da

arbitragem, eu trabalho com isso, mesmo quando eu não estou atuando no campo do

jogo, eu estou fazendo palestra, dando curso de árbitro, então na verdade a

arbitragem é minha principal atividade hoje, a minha única atividade hoje, eu vivo

pra arbitragem e da arbitragem. [...] 100% (ENTREVISTADO 1)

Ahhhh, eu acho que 90%.

Financeiros? Eu acho que 60% (ENTREVISTADO 2).

Uns 60%, 70% meio que corresponde a arbitragem aí.

75% ( ENTREVISTADO 3)

Com tantas exigências para exercer a função de árbitro como treinamentos e

disponibilidade para viagens estaduais, nacionais e internacionais nos parece compreensivo

que somente alcançarão um nível de excelência na arbitragem os candidatos que se dedicarem

integralmente a função. A escolha por trabalhos autônomos ou com flexibilidades de horários

facilitam o cumprimento de escalas e convocações, o que pensam da profissionalização?

É uma coisa que todo mundo espera né, que é um sonho nosso você poder se

dedicar. Hoje eu me dedico assim integralmente a isso, mas é, eu sei que se eu

cometo um equivoco muito grande a gente praticamente fica fora de escala assim,

reflete totalmente no meu rendimento mensal assim né, quantos mais jogos eu faço,

mais eu ganho, porque eu ganho por jogo. E se profissionalizar, pelo menos nós

temos o fixo né[sic], o fixo, aí você consegue se dedicar mais, consegue prevenir

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lesões. Por exemplo, semana passada eu tive uma lesão fiquei dois meses parado

(ENTREVISTADO 2).

Nós acreditamos, eu acredito, eu ainda sempre colocava né, tenho essa esperança de

ver o árbitro profissional assim como outras aéreas do futebol, que hoje a gente pode

dizer que um dos poucos que não é profissional no futebol que envolve milhões,

bilhões, envolve bilhões, é o árbitro de futebol, e é um dos mais cobrados, quase

toda a responsabilidade transferência de responsabilidade que acaba passando pela

arbitragem, se a gente parar pra pensar, vários profissionais de arbitragem, que tem

seu emprego federal né, seja lá de qualquer área, hoje os maiores exemplos que nós

temos na arbitragem é os professores. São árbitros que trabalham na sua atividade na

parte da manha, principalmente em estados estaduais, ele trabalha de manha dando

aula, na parte da tarde ele se prepara e vai fazer um clássico 22h da noite num jogo

de televisão aberto pro Brasil inteiro. Ou exemplo maior, nós temos vários bancários

que trabalham na boca do caixa de um banco até as 16h, e as 22h estão

intermediando um clássico seja lá de qual jogo, numa rede aberta de televisão e

além, faz esse jogo as 22, termina meia noite, chega em casa 3, 4 horas da manha no

dia seguinte retorna pra essa jornada de trabalho, pelo ritmo que esta o futebol, os

árbitros corriam 2, 3, 4 km na década de 80. Hoje estão correndo na media de 11 a

13 por partida se a gente for analisar fisicamente, do primeiro momento,

fisicamente, se nós dois não formos profissionais atletas dificilmente é, a gente vai

conseguir acompanhar essa evolução do futebol tão profissional, com um

departamento de futebol tão profissionais que são hoje, se não houver uma melhora

em relação ao uma semi profissionalização ou uma profissionalização de fato o

árbitro poder viver realmente da arbitragem pra poder se manter, pra poder se

preparar, descanso pós jogos, nós teremos, a cada ano que passar nós teremos

dificuldades maiores pra lidar com o futebol ( ENTREVISTADO 3).

Quando perguntamos quem se responsabilizaria pelo salário fixo, como seria o

rendimento e o que está sendo proposto eles responderam:

É, teria que ser as Federações né[sic], mas a verdade que hoje nós somos pagos

pelos Clubes mandantes né[sic], um valor que é tirado da renda, tem que ter uns

investimentos não sei o que faria, da onde sairia mais eu acho que árbitro

conseguiria se dedicar mais aí prevenir lesão, às vezes não ir pra um jogo porque ele

ta machucado, se você ta com uma lesão já você vai pro jogo, taca um remédio, o

desgaste é muito grande, não é um esporte assim que as vezes que nem você falou

do Handebol, eu não sei qual é o desgaste físico do Handball, do Basquete, do Vôlei,

por exemplo, não tem um desgaste físico quanto o nosso né[sic], às vezes ate

consegue camuflar uma lesão e tal. Não por muito tempo, uma hora seu corpo não

aguenta, que nem aconteceu comigo ano passado, eu fiquei 3 meses fazendo jogo

com dor, sabia que era um ano importante pra mim, que eu tava um passo de entrar

na FIFA então não queria ficar longe ate meu corpo não aguentar mais, uma fissura

aí tive que parar, porque não conseguia nem andar né[sic]. Mas eu acho que a

profissionalização assim, ela vem pra ajudar nesse aspecto do árbitro, o árbitro

trabalhar assim como, como um profissional mesmo, não como um autor ou

prestador de serviço, você ta machucado, ta fora, vai outro no seu lugar, você fica

sem um centavo ( ENTREVISTADO 2).

Exato, são questões né[sic], acho que são um dos motivos que a presidente já, já

regulamentou a profissão. Ou melhor, ela já, já sancionou a profissão da arbitragem

agora falta a regulamentação. Então esses são, essas são uma das questões que a

própria a ANAF a profissionalização de árbitros, o sindicatos de todos os estados,

nós de São Paulo ainda busca essa proposta, qual seria melhor? Será que alguém que

já tivesse seu emprego federal com toda sua renda Abriria a mão pra ser árbitro de

futebol? Seria que haveria profissionalização só dos árbitros da FIFA, como é da

argentina. Então ainda são questões que ainda não regulamentou também por conta

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disso, você trabalharia dois, três anos como árbitro e depois voltaria pro mercado de

trabalho normalmente, como empresa? A gente fala que o futebol no nosso pais

envolve tanta paixão, qual empresário, também um diretor, ou algo de um

profissional ia querer em seu quadro de funcionários um ex árbitro de futebol.

Então ainda são questões, ate nós mesmo sabemos dessa dificuldade mas esperamos

um meio que pessoas para que ate futuramente os próximos árbitros não sofram

tanto com essa dificuldade de você ter que dividir seu tempo, seu período ser arbitro

de futebol e ser profissional de qualquer outra área ai do mercado de trabalho

(ENTREVISTADO 3).

A profissão de árbitro de futebol foi reconhecida e regulamentada por lei em 11 de

Outubro de 2013, deste então estudam se propostas para que a profissionalização de fato

aconteça. Os árbitros continuam sem vínculo empregatício e benefícios trabalhistas. Haveria

interesse das federações em assumir este ônus? O árbitro que pertence ao quadro da FIFA

geralmente é bem escalado. E os árbitros das outras categorias que possuem rendimentos

maiores na sua profissão aceitariam ter vínculos empregatícios com entidades esportivas?

Estas são apenas algumas dúvidas presentes nas discussões para a construção de um modelo

de profissionalização para os árbitros brasileiros. As maiores preocupações demonstradas

pelos entrevistados atualmente são: a incerteza de que serão escalados semanalmente e as

lesões, períodos em que deixam de trabalhar, assumem gastos com tratamento médico e não

tem rendimentos. Segundo Paulo Calçade63

, “Não é justo que o destino de uma partida esteja

nas mãos e no sopro de um apito amador. [...] Apitar um jogo de futebol não pode ser um

bico.” Nesta reportagem, o jornalista cobrava da CBF a responsabilidade sobre a

profissionalização da categoria e comentava os protestos dos árbitros que discordavam do

veto da presidente da república, de artigo na Medida Provisória número 671 do Futebol, que

destinaria 0,5% do dinheiro da venda de direitos de televisão para os árbitros. Os árbitros,

hoje, não recebem direito de imagem. A Associação Nacional de Árbitros de Futebol (ANAF)

exige que o direito de imagem dos árbitros seja pago como são pagos os direitos de imagem

dos jogadores.

Todos os anos a imprensa divulga alguns detalhes sobre os contratos milionários

dos jogadores e técnicos de futebol. Valor pago na transferência de jogadores de equipes,

renovações de contratos e patrocínios, cota de televisão entre outros acordos financeiros.

Vejamos o que pensam os árbitros entrevistados sobre as taxas pagas para a equipe de

arbitragem.

63

Reportagem Hora de arrumar a casa, no jornal “O Estado de S. Paulo”, São Paulo. 17 ago 2015, Caderno de

Esportes, p.4.

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Pensando no mundo do futebol eu acho que os valores pagos são absolutamente

baixo, o dinheiro que envolve o futebol, nessas novas arenas aí que as torcidas estão

acompanhando suas equipes, onde a renda passa de milhões, onde um árbitro de

futebol receber 3 mil reais é dinheiro de pinga pra eles no caso da renda que teve no

jogo, mas se você pensa na situação sócio econômica do país, se você pensar o cara

em 90 minutos ganha 3 mil reais daí é muito, que as vezes tem um pai de família

que trabalha o mês inteiro e não ganha metade disso. Mas falando no futebol,

primeiro que envolve o futebol, acho que é pouco o cache que eles pagam ao árbitro

de futebol pela responsabilidade que ele carrega, porque é muita, é muita pressão

que o árbitro carrega, é muita responsabilidade, de não poder errar, óbvio que vamos

errar sempre, nós somos seres humanos. Mas a responsabilidade é muito grande pra,

pra o dinheiro que a gente recebe, grandes rendas de jogadores, os valores

exorbitantes que recebem, os treinadores. E o principal pessoa que tem que ter que

realizar o jogo, porque sem o árbitro de futebol, apesar da gente ser odiado, mas sem

árbitro de futebol, não tem jogo (ENTREVISTADO 1).

Ah, eu acho assim, se analisar com o trabalho aí, fora do futebol, é um bom salário,

porem, no meio nosso tudo que gera assim futebol, então tem uma ideia pelos os que

os outros ganham né, os outros profissionais ganham e a arbitragem é uma, é

transmitida muita responsabilidade pro árbitro, então eu acho que tinha que ter uma

remuneração pouco melhor aí. Eu acredito assim, que aprovando esse 0,5% vai dar

uma boa melhorada né[sic] (ENTREVISTADO 2).

Eu falo assim, se a gente for levar em consideração o que se paga num país um

salário mínimo, o que se ganha varias profissões do nosso país, o árbitro se a gente

levar por esse, por essa comparação o árbitro é bem remunerado. Mas pela

responsabilidade em volta de uma partida de futebol, uma decisão de campeonato,

decisão de vaga, o investimento que é feito em equipes em milhões que são

investidos nas equipes, nós podemos dizer que o arbitro não ganha nada em relação

ao jogo de futebol. O tamanho de uma responsabilidade uma final de Copa do

Brasil, um Campeonato Nacional que vai dar uma vaga internacional, uma vaga pra

Libertadores possivelmente um Mundial de Clubes, toda visibilidade que envolve

uma partida de futebol a pressão, a televisão, grandes as equipes que ganham em

relação a direitos de televisão o árbitro não ganha pra apitar um futebol, eu posso

dizer que nós somos muito mais apaixonados do que bem remunerados para

trabalhar numa partida de futebol. Então é uma remuneração boa em relação ao

nosso país e, em relação a minha cidade, sim, mas em relação ao meio ao qual eu

estou envolvido eu não ganho, não sou bem remunerado pelo tamanho da

responsabilidade que são passados para nós nesse tempo ali de 90 minutos,

intermediando esses 90 minutos. Um exemplo, que eu fiz uma final de Copa do

Brasil envolvendo duas equipes de um mesmo estado, pela primeira vez elas

disputavam essa final de Copa do Brasil nós tivemos, um exemplo básico, nós

tivemos um valor de seis milhões e o árbitro, no caso eu que tava resolvendo aquela

partida, não tinha nem verba 000,01% daquela, pra ta sendo responsabilizado por

apitar aquela final de jogo (ENTREVISTADO 3).

A palavra responsabilidade aparece na fala de todos os árbitros entrevistados. Eles

consideram a arbitragem uma profissão de muita responsabilidade e sendo assim, os valores

das taxas são insignificantes quando comparados as cifras que envolvem o futebol. São

coerentes e sensíveis quando comparam os valores que recebem ao salário mínimo pago aos

trabalhadores brasileiros. O entrevistado número 01 deixa claro que um árbitro central FIFA

recebe três mil reais para dirigir uma partida de um campeonato profissional. Você que lê esta

dissertação e sabe que o futebol tem duas rodadas semanais provavelmente esteja fazendo

contas para saber aproximadamente qual seria o rendimento de um árbitro. Não vamos nos

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iludir. A situação dos apaixonados pela arbitragem no Brasil é a mesma encontrada pelos

jogadores e técnicos de futebol. Estamos aqui nos reportando a uma classe que com talento e

muito trabalho alcançaram a maior qualificação que um árbitro pode receber: são árbitros

FIFA. Atualmente na CBF este quadro é composto por dez árbitros, sim, são dez árbitros

FIFA em todo o Brasil. Embora não possamos afirmar sobre a realidade dos árbitros FIFA

que são representantes das outras federações nacionais acreditamos que estes árbitros

consigam uma relativa estabilidade financeira por serem um pequeno grupo (FIFA), pelo

número de campeonatos realizados no Brasil e por serem estes árbitros os representantes da

arbitragem brasileira em campeonatos internacionais.

4.4 A “TECNOLOGIA E A ARBITRAGEM

A discussão sobre o uso da tecnologia na arbitragem é um assunto frequente e

divergente em todas as esferas do futebol. Os avanços tecnológicos presentes em todas as

áreas do conhecimento chegam de maneira discreta nos gramados esportivos e encontram um

espaço de equilíbrio entre adeptos e opositores. Os adeptos atribuem à seriedade do futebol,

quando este é tratado exclusivamente como produto, movimentando bilhões de investimentos

que são comprometidos por erros dos árbitros. Consideram também as emoções dos

torcedores que veem o time ser prejudicado por lances questionáveis e por isso,

responsabilizam a IFAB e a FIFA por atrasar as mudanças necessárias as regras que viabilize

a tecnologia como um suporte as decisões dos árbitros. Os opositores alegam que o fascínio

do futebol também se sustenta nas discussões dos torcedores após as rodadas dos jogos. São

os erros e as dúvidas sobre as jogadas que preenchem a programação esportiva das diferentes

emissoras de televisão e faz com que a curiosidade do torcedor aumente a audiência.

Defendem que as brincadeiras e gozações dos torcedores precisam ser saudáveis e fazem parte

da essência e da magia do futebol. O que pensam os árbitros entrevistados sobre o uso da

tecnologia na arbitragem de futebol:

Depende que tipo de tecnologia, hahaha. Se for a tecnologia que vai beneficiar o

árbitro eu sou. No caso de rádio comunicadora que as equipes de arbitragem usam o

sistema de detectar o gol, que eles têm um relógio se a bola entrou totalmente ou

não, chega um sinal sonoro no braço do árbitro e ele pode validar o gol ou não, esse

tipo de tecnologia é hiper, super, válido (ENTREVISTADO 1).

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Sou a favor em alguns aspectos, hoje já temos a bandeira eletrônica que nos auxilia

né, o rádio auxiliador que fica praticamente o tempo todo ligado em outros

participantes. Porém, assim, eu sou a favor assim, chip na bola, entrou ou não

entrou, a bola porque, o impedimento pode até ser utilizado, também ou é 8 ou é

80, mas alguns lances são interpretativos, e as vezes você pega uma imagem, você

coloca nos programas esportivos ali, três acham que foi pênalti, quatro acham que

não foram, então o que não foi, você corre risco de parar o lance pra ver na TV e

tirar uma conclusão, então em alguns aspectos sim, em outros que são interpretativos

não (ENTREVISTADO 2).

Eu sou favorável sim a tecnologia mas essa que foi utilizada para a Copa do

Mundo, gol e não gol. É muito triste, é muito complicado principalmente pra nós

árbitros você terminar uma partida, você saber que aquele resultado final não foi

legitimado por conta de uma decisão. A bola entrar, você não vê, e você não dar um

gol, então uma partida que poderia ter terminado um a zero, termina zero a zero, ou

você dar o gol numa bola que não entrou. Para mim essas duas situações deveriam

sim, como foi feito na Copa do Mundo ter a utilização da tecnologia, gol, não gol.

Mas agora a gente não é pra colocar a tecnologia em todas as decisões, o futebol que

já tem aí uma duração de duas, quase duas horas, passaríamos pra duas horas e meia,

três horas, eu acho que isso ficaria mais complicado. Eu não sou favorável em todas

as situações, em todas as decisões. Mas essa de gol e não gol, aí sim na maioria das

vezes o resultado pode não ser legitimado, por causa de uma decisão que eu tomei

durante a partida ( ENTREVISTADO 3).

Os nossos entrevistados defendem o uso da tecnologia, porém com resalvas.

Concordam que toda a tecnologia que for utilizada em benefício da equipe de arbitragem deva

sim ser aprovada e incorporada às regras, porém ampliam as dúvidas quanto ao uso da

tecnologia. O recurso do chip na bola utilizado na Copa do Mundo 2014 foi citado pelos três

árbitros como positivo e necessário, mas esta tecnologia não se faz presente em todos os jogos

de futebol. Acreditamos que uma das dificuldades de implantação da tecnologia sejam as

questões financeiras, pois como proporcionar, a todos os jogos de futebol, as mesmas

condições de realização em relação às regras? Seria correto introduzir e regulamentar recursos

apenas em eventos com grandes investimentos e privar os torcedores dos campeonatos locais

das mesmas tecnologias? Pensamos que se a IFAB não puder incorporar estas mudanças as

regras, a razão maior da institucionalização do esporte, sem condições de proporcionar estes

recursos a todos os jogos, as questões ainda serão amplamente discutidas e acreditamos que

no momento, as decisões passam por regulamentos diferenciados para diferentes federações e

campeonatos de futebol.

Embora os árbitros concordem que a tecnologia ajudaria a legitimar o resultado

nos deixam transparecer muitas dúvidas de como e em quais situações estes recursos seriam

utilizados. As dúvidas que rondam a categoria sobre as mudanças são muitas e caso ocorram

mudanças não serão em um futuro breve. A preocupação com a dinâmica do jogo de futebol

verbalizada pelos três entrevistados que afirmam que mesmo com estes recursos existirão

polêmicas sobre as decisões dos árbitros.

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Eu basicamente sou apaixonada por futebol, que sou uma amante do futebol, que

sou eu não concordo. Porque eu acho que ia acabar aquela cultura de, no outro dia

chegar e comentar com o amigo, aquela brincadeira no trabalho, na família de: ‘’ah

seu time perdeu, seu time ganhou e coisa e tal ’’. Eu que a, o futebol ele é muito

dinâmico por isso que até hoje num, num entrou esse tipo de recurso pra, no tênis

pode fazer se foi dentro ou foi fora, no vôlei dá pra ver, mas o futebol é muito

dinâmico. Já pensou? São 90 minutos, às vezes quando para pra um atendimento,

pra um, pra uma substituição, pra qualquer coisa parecida o árbitro já dá um monte

de acréscimo e já foi pouco, imagina se você parar pra decidir: ‘’perai, vamo[sic}

olha no monitor se foi, não foi’’. Isso você vai perdendo no mínimo um minuto e

meio, um minuto, sei lá, pra poder, volta, vê, volta de novo. Então eu acho que

acaba com a dinâmica do futebol, ia perder a graça, o jogo não ia ter mais 90

minutos, ia ter 1 hora e 20, porque quantas decisões são contestadas de futebol

várias durante os 90 minutos são contestadas, se toda decisão foi contestar vamo

para e vamo[sic] olha o monitor, pra mim ia perder a graça. Como amante de

futebol, como árbitra de futebol, eu acho que não seria interessante não, então eu não

sou a favor não (ENTREVISTADO 1).

É só que esses jogos vão ser utilizados que recurso, jogos de Copa do Mundo, jogos

de competições maiores assim, porque não tem condição de você fazer isso no

estadual, por exemplo, não tem recurso e acho que é um custo alto porque tem que

ter câmera, tem que ter muitas câmeras. Porque duas câmeras no estádio às vezes

podem acontecer um lance que eu vi no vôlei o lance, que o jogador deu um

peixinho assim colocou a mão pra bola bater que nenhuma câmera pegou a pedido

da FIVb acho que tinha lá 12 câmeras, no ginásio, e as únicas câmeras que tinham

que conseguiriam visualizar o lance tinham jogadores na frente, então tinha

jogadores e não viram o lance. Então o futebol tem que ter, tem que ter muitas

câmeras e eu acho também que perde a dinâmica do jogo né[sic], até pelo campo ser

maior[...] (ENTREVISTADO 2).

Na polemica e no desafio, o medo é que o futebol chegue nesse desafio que toda

decisão que você tomar no jogo alguém que vê o direito de parar aquele jogo, voltar

a essa decisão. Mas agora em que for em benefício da arbitragem, do trio de

arbitragem propriamente dito, essas situações que eu falei de gol e não gol, e essa

daí complementando depois de penais, principalmente de pênalti aí sim sou

favorável. Agora desafios para o jogo, essa decisão que você tomou não, retorna

com bola no chão, aí o futebol começa perde um pouco a graça (ENTREVISTADO

3).

A CBF busca autorização da IFAB (Internacional Football Association Board),

órgão que regulamenta as regras do futebol, para que possa testar o árbitro de vídeo. Segundo

Dolzan64

,

Pela proposta, será criado o cargo de árbitro de vídeo, que acompanhará os lances

pela TV. Com o recurso do replay, ele poderá acionar o árbitro de jogo, por meio do

ponto eletrônico para informar erros de marcação. Segundo a CBF, o árbitro de

vídeo ‘terá a atribuição de corrigir erros técnicos ou disciplinares claros e

indiscutíveis que possam alterar diretamente o resultado ou o desenvolvimento das

partidas’.

Na reportagem são citados os lances que teriam a interferência imediata do árbitro

de vídeo:

64

Reportagem de Marcio Dolzan, “CBF tenta emplacar árbitro de vídeo”, no jornal: O Estado de S. Paulo, São

Paulo. 12 set. 2015,Caderno de Esportes,.p. 21.

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a) Dúvida se a bola entrou ou não no gol;

b) Saídas da bola pela linha de fundo, quando na mesma jogada for marcado gol

ou pênalti;

c) Definição do local de tiros livres diretos, ocorridos nos limites da grande

área, para definir se houve ou não pênalti;

d) Gols e pênaltis marcados em razão de erro em lances de falta discutíveis, não

vistas ou marcadas de modo claramente equivocado;

e) Impedimentos, caso na mesma jogada haja gol ou pênalti;

f) Jogo brusco grave ou agressão física indiscutíveis não vistos ou mal

decididos pela arbitragem.

Nestes lances que podem decidir uma partida de futebol, o árbitro conta hoje com

a ajuda dos assistentes e do quarto árbitro que trabalhando nas laterais do campo possuem um

ângulo de visão diferente do árbitro central. O uso da tecnologia ajudaria nas decisões, mas

não podemos esperar que o uso das imagens resolva todo o problema da polêmica das

interpretações das jogadas. Para a CBF que encaminha as propostas à IFAB utilizando-se do

termo lances indiscutíveis, vejamos o que diz o jornalista Antero Greco comentando uma

jogada no jogo Corinthians e Avaí do Campeonato Brasileiro de 201565

: “Lance que precisou

ser passado, reprisado, analisado com tira-teima para se chegar a alguma conclusão – e ainda

assim contraditória”.

4.5 A IMPORTÂNCIA SOCIAL DO ÁRBITRO DE FUTEBOL

Poderia ser atribuída ao árbitro de futebol alguma função social?

O futebol como qualquer outra atividade mimética tem encontrado a cada dia mais

significado na vida de muitas pessoas. O aumento das tensões geradas pela vida em

sociedade, no quadro atual intensificado pela falta de credibilidade nos dirigentes e nas

instituições deste país, devido as constantes denúncias de corrupção que parecem ser apenas a

ponta do iceberg em um cenário de abuso de poder e ganância. Estas administrações

fraudulentas e irresponsáveis com a vida dos seres humanos interferem diretamente para os

descasos na área da educação, saúde e segurança e fazem dos momentos vividos nas

atividades esportivas e culturais a oportunidade de catarse para muitos indivíduos. Para Elias

e Dunning (1992, p.70):

65

Reportagem de Antero Greco, “E as polêmicas persistem...”, no jornal: O Estado de S. Paulo, São Paulo. 17

ago 2015, Caderno de Esportes, p. 2.

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Enquanto, nas sociedades, as rotinas públicas ou privadas da vida exigem que as

pessoas mantenham um perfeito domínio sobre os seus estados de espírito e sobre os

seus impulsos, afectos e emoções, as ocupações de lazer e de algumas formas

reminiscentes da sua realidade exterior autorizam-nas, de um modo geral, a fluir

mais livremente num quadro imaginário especialmente criado para estas actividades.

Embora a corrupção esteja presente nas instituições esportivas e na CBF as

investigações envolvem os três últimos presidentes sendo que um deles se encontra preso nos

Estados Unidos, o futebol ainda encanta e a decepção com a Seleção Brasileira de Futebol na

Copa do Mundo do Brasil em 2014, fortalece as paixões clubísticas, mas o que os árbitros

pensam quando perguntados sobre qual a importância em ser árbitro de futebol em um país

com tantas diferenças sociais e sendo o futebol considerado uma paixão nacional, uma

religião. Vejamos:

Olha só, a função de ser árbitro é dentro do campo, e fora do campo eu acho que o

árbitro age como psicólogo. Porque é, às vezes todo jogador, não falo nem tanto no

lado profissional, falando um pouco do amador, é que às vezes o jogador amador

passa a semana inteira trabalhando e sai de domingo pra se divertir. Mas às vezes ele

tá com problema em casa ou então a torcida vai só pra xingar o árbitro. O árbitro

entra no campo, ele já tá xingando, nem deu o direito de ele acertar ou errar, ele já tá

xingando. Mas aí eu sempre falo pra mim mesma, pros meus colegas, que esse é o

papel social do árbitro, o cara tá com problema dentro de casa, então ele desabafa,

relaxa, põe pra fora todo o seu problema. A gente escuta a gente tá aqui pra isso,

afinal entra em um ouvido, sai pelo outro, porque não dá pra levar a sério, o que a

torcida fala, o que os jogadores falam, então eu acho que o papel do árbitro é o

psicólogo (ENTREVISTADO 1).

O árbitro é o, como eu posso dizer, em relação a diferença social o futebol é o

esporte que nivela né{sic], que todo mundo, até do mais pobre, o mendigo ali, até o

mais rico, todo mundo tem o time e tá[sic] sempre acompanhando. O árbitro ele, ele

que dita as regras dentro do campo do jogo né[sic], mas eu não vejo assim uma, uma

relação da classe social com o árbitro assim, não tenho uma precisão sobre isso

(ENTREVISTADO 2).

Eu falo que, acho que aqui no Brasil acaba sendo né[sic], principalmente na América

Latina acaba sendo, na América do Sul posso te dizer porque eu to vivenciando isso,

existe essa dificuldade maior de ser árbitro de futebol por questões sociais, educação

né, nós lidamos com o povo que quase ninguém tem primeiro ou segundo grau

completo, a grande maioria de todos esses países e sabendo-se que o futebol a gente

mexe com a paixão das pessoas, eu falo as vezes que a pessoa não tem religião, não

tem família, mas tem uma equipe de futebol. Então a gente mexe demais, eu falo que

essa é uma responsabilidade que a gente tem que a gente mexe demais com a

emoção dessas pessoas, o tamanho dessa responsabilidade, e pelo fato ainda de não

terem um grau de instrução ou o princípio básico de educação necessário né[sic], pra

toda nossa população acaba partindo da parte governamental entre um, entre outros.

Ou própria disciplina dentro de casa (ENTREVISTADO 3).

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O árbitro número 1 considera-se um psicólogo e diferencia a postura que se espera

dos jogadores profissionais e amadores. Parece não interpretar o xingamento dos jogadores

amadores e dos torcedores como uma forma de violência e podemos encontrar no seu

depoimento o que Elias atribuiu serem as “coisas sérias” da vida e a busca das emoções nas

atividades miméticas. O árbitro número 2 comenta as diferenças sociais e se coloca em uma

função de educador que necessita ditar as regras e controlar as tensões e o árbitro número 03

fala da dificuldade e da responsabilidade da função por mexer com a paixão das pessoas

deixando subentendido que questões sociais importantes como a falta de acesso a uma

educação de qualidade e pelo falta de uma estrutura familiar potenciavam estas emoções

porque os indivíduos fazem do futebol o seu sentido da vida. Para Elias e Dunning (1992,

p.70), muitos jovens “encontram pouca excitação na sua vida normal [...] a vida é

particularmente monótona”. No texto a preocupação de Elias é com a violência, pois faltam

aos jovens perspectivas e objetivos na vida, a vida destes jovens para Elias e Dunning (1992,

p. 92), “é acima de tudo vazia”.

4.6 A VIOLÊNCIA E AS RELAÇÕES DE PODER

No futebol a violência dirigida a árbitros parece ser entendida como parte da

cultura do jogo. Em todas as rodadas dos campeonatos de futebol existem polêmicas,

divergências e violência. Sejam jogos profissionais, amadores ou até em categorias de base. A

violência parte dos jogadores, comissão técnica, dirigentes, torcedores e imprensa. Em jogos

de crianças a violência dirigida aos árbitros parte dos pais que na presença de seus filhos

jogadores perdem o controle e “ensinam” para os filhos a cultura da violência nos jogos de

futebol. Xingar e agredir árbitros parece ser normal, mas como entender esta violência? Seria

a falta de controle das emoções? Justifica-se nas classes sociais e encontra na sociedade as

suas causas? Entender a violência contra árbitros e como eles sentem e interpretam esta

violência é o que nos propomos. Segundo Coelho (2002, p. 15):

Durante minha carreira como árbitro de futebol, envolvi-me em situações difíceis e

assustadoras. Angústias que fariam muitos desistirem da profissão. Padeci agressões

e xingamentos. Por anos a fio, fui obrigado a sair de estádios escondido em

camburão de polícia.

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Coelho deixou os gramados em 198966

quando recebeu o convite para trabalhar

como comentarista de futebol na Rede Globo. No Campeonato Brasileiro de 2015 em partida

realizada no dia 02 de setembro entre os clubes Atlético MG x Atlético PR acompanhamos o

relato do árbitro Marcelo de Lima Henrique que dirigiu a partida no dia seguinte da derrota do

Atlético MG67

.

Henrique disse que só consegui sair do Estádio Independência, local da partida, bem

depois do fim do jogo e que só chegou ao hotel onde estava hospedado por volta das

2h45 de quinta-feira, pois temeu ser agredido. “Após a partida recebemos uma

ligação por volta das 0h15, dizendo que na volta do nosso hotel tinha um grande

grupo de torcedores aguardando a nossa chegada. Tivemos que acionar todo um

aparato policial para nos escoltar do estádio ao hotel e uma outra viatura para limpar

a área em frente ao hotel, para que pudéssemos entrar sem nenhum problema”,

contou.

São, no mínimo, vinte e seis anos que separam os relatos dos dois árbitros e as

histórias de ameaças de violência contra os árbitros se repetem todos os dias, mas o que os

árbitros entrevistados entendem por violência?

É uma boa pergunta, hahaha. O que eu entendo sobre violência? Olha eu acho que a

violência é a incapacidade do ser humano não conversar, não resolver no diálogo.

Na discussão, o tipo de discussão verbal assim, conversar, não já partir pra, é...

violência verbal, agressão verbalmente ou até mesmo agressão física. Então eu acho

que a violência, a incapacidade do ser humano de poder tentar esclarecer as

diferenças, a esclarecer a opinião, falar a dele, escutar a do outro e respeitar, ter a

capacidade do ser humano a respeitar as diferenças (ENTREVISTADO 1).

Aí... Eu acho que violência é tudo que pode te, você me falou isso, tudo que pode te

afetar de uma forma negativa assim, eu nunca tinha pensado dessa forma, mas

depois que eu conversei com você aquele dia eu fiquei refletindo e, eu acho que esse

tipo de coisa de entrevista, por exemplo, que transfere responsabilidade, é uma

violência e pode acarretar numa violência, até física. Mas tudo que tenta denegrir

sua imagem, seu trabalho, eu acho que pode ser entre aspas aí, consideradas uma

violência (ENTREVISTADO 2).

Ah eu acho que, que seria de um modo geral a violência é você expor um individuo,

não diria nem adversário.. Você expor um indivíduo a uma situação constrangedora.

Se essa violência da forma, da forma que parecer, seja lá uma ofensa moral ou até

mesmo vias de fato, a violência pode acontecer de várias maneiras hoje, então por

meio eletrônico. Então você expor um indivíduo a uma situação constrangedora pra

mim acaba sendo uma violência (ENTREVISTADO 3).

66

Fonte: http://memoriaglobo.globo.com/perfis/talentos/arnaldo-cezar-coelho/trajetoria.htm, acesso em 08 dez

2015. 67

Fonte: Jornal: “O Estado de S. Paulo, São Paulo. 4 set. 2015, Caderno de Esportes, p. 17.

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Nas respostas dos árbitros números 1 e 3, observamos que eles se referem a

violência simbólica e a violência física. O entrevistado 2 quando convidado a participar da

pesquisa nos disse que não saberia se poderia nos ajudar porque nunca havia sido agredido,

mesmo assim, aceitou participar. Um mês após o agendamento realizamos a entrevista e nos

disse ter refletido e pensado a violência de forma mais abrangente.

Os árbitros interpretam a violência como falta de respeito, falta de capacidade de

dialogar, a exposição de um indivíduo a situações constrangedoras e a tentativa de denegrir a

imagem, neste caso, do profissional árbitro. Notamos que a violência simbólica é citada pelos

três e é frequente na vida destes profissionais.

Considerando-se que as informações sobre a violência dirigida a estes

profissionais nos são transmitidas pela mídia, como jornalistas e comentaristas esportivos

tratam os árbitros no Brasil? Segundo Betti (1997, p.34), “Os jornalistas são capazes de

influenciar as ações dos atletas e espectadores mediante o uso da linguagem” e nos apresenta

a forma como os árbitros são tratados pelos jornalistas.

Contudo, nada é mais polêmico que a atuação de um árbitro em certas partidas. Uma

arbitragem “polêmica” divide as opiniões: “Mal intencionado” ou “bandeira da

moralidade”? “Abusou da autoridade” ou foi “energético o suficiente”? “Herói ou

Vilão”? Ora os árbitros são criticados por terem sido “muito rigorosos”, ora pela sua

“complacência”. Uma arbitragem é considerada “polêmica” em partidas nas quais

muitos jogadores são expulsos ou recebem cartão amarelo. Como declarou um

árbitro: “Se não expulso, dizem que sou um banana, se ajo com rigor, sou

criticado”. De fato, “boleiros, bandoleiros, cartolas e até jornalistas acatam os

senhores de preto”: expulsou porque “foi pressionado”, “precipitado”, “exagerou”,

foi “muito rigoroso”, “quis mostrar autoridade”, teve “atitudes radicais”, ou

“compensou”, expulsando igual número de jogadores das duas equipes. Estava

“mal-intencionado”, entra “para o rol dos suspeitos”, ou, simplesmente: “ele

roubou”. Questiona-se, então, a “impunidade dos árbitros”, e sugere-se um tribunal

para julgar “os erros da arbitragem”, para punir os “árbitros que erraram”( BETTI,

1997, p. 89).

Os árbitros que comentem erros em partidas são afastamentos das escalas, existe

sim, um acompanhamento do trabalho que é desenvolvido na arbitragem paulista e brasileira.

Em todos os jogos profissionais encontramos a figura do “avaliador da equipe de arbitragem”,

por meio do relatório deste profissional, geralmente um ex-árbitro árbitros e assistentes são

avaliados. A pontuação por eles adquirida a cada jogo será parte fundamental para a formação

do ranking da temporada seguinte. O que os árbitros pensam do trabalho da mídia?

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Como eu falei é desumano essa, esse tipo de análise, porque um comentarista de

futebol ele tá equipado de várias câmeras, várias imagens que chega pra ele, ele vê

quatro, cinco vezes pra ele poder dar o parecer dele. O árbitro vai decidir ali em três

com a foto que ele tirou aquele momento. E aí depois o comentarista de arbitragem

crucifica o árbitro por causa daquele erro, mas porque ele viu na tecnologia, e a

maioria dos comentaristas de futebol são ex- árbitros e eles na época deles, erravam

muito mais, mais muito mesmo. Só que não tinha câmera pra ser cobrado, então hoje

tá fácil pra ele comentar ou não na verdade, comentar o árbitro, hoje tá fácil pra ele

porque tem milhões de câmara pra ele olhar. Será que ele lembra quando ele tava lá

no jogo? Qual era a dificuldade que ele tinha, o quão era difícil apitar uma partida de

futebol, pra hoje ele ficar criticando o árbitro, formando opinião. Eu acho, eu não

vou nem falar o que eu acho, eu acho um absurdo (ENTREVISTADO 1).

Olha assim, eu acho que tem melhora, tem melhorado muito hoje né[sic], eu acho

que a mídia assim, uma boa parte da mídia ela vem junto com, buscando o melhor

espetáculo assim, e devido aos últimos acontecimentos da Copa do Mundo, a gente

vive um país fora do futebol que todo mundo tá um pouco de saco cheio né[sic].

Então eu acho que a mídia em termos de jogador, de arbitragem a mídia ta batendo

mais do que batia antes, mas eu acho que também tem muita mídia que é torcedora

ainda, e às vezes dão muita voz assim, quando alguém quer transferir o resultado pro

árbitro. Porque o próprio jornalista se incomodou com aquele resultado e aí também

da uma carga maior na noticia do jogador, do treinador, o dirigente que tá

transferindo. Então eu acho que tem os dois, tem que colocar na balança os dois

lados assim, tem muitos jornalistas que são sérios, buscam melhor o futebol e uns

com pensamentos antigos, então é difícil perder esse vicio do jornalista que torce,

que tem um contato muito próximo de dessa paixão de torcedor que continua

desenvolvendo o trabalho de jornalista, que é aquele jeito(ENTREVISTADO 2).

Eu acho que ela poderia ajudar muito mais com informações que mostra ai,

principalmente como a população, os torcedores, ganharam com os comentaristas de

arbitragem, desde lá dos primeiros que vieram a trabalhar, hoje, quase todos os

canais tem um comentarista de arbitragem. Então quanto mais a gente puder

divulgar as regras de jogo pra que as pessoas entendam o mínimo de regra do jogo,

facilita a nossa vida. Mas agora se for àquela mídia bairrista, torcedora, não vai

somar em nada, não vai ajudar em nada, a gente sabe que tem muito torcedor

trabalhando na mídia, tem muitas pessoas, acaba tendo o time tem paixão por

determinada equipe, mas a gente acaba respeitando. Mas às vezes não concordando

com alguns comentários que são feitos. Agora se for àquela mídia que vem pra

esclarecer, que vem pra tirar a dúvida do torcedor, pra mostrar realmente quando a

gente falha, quando a gente se equivoca, quando a gente erra, aí sim a gente a gente

somos favoráveis ai (ENTREVISTADO 3).

O trabalho dos jornalistas e comentaristas recebe duras críticas dos árbitros.

Considerado como desumanas as avaliações feitas pela mídia, uma vez que, os jornalistas e

comentaristas possuem recursos de análises não disponíveis aos árbitros. Outro fator

considerado é o tempo que o árbitro tem para tomar suas decisões. Observam melhoras no

trabalho e interesse em apresentar um trabalho de melhor qualidade com o surgimento de

jornalistas “sérios”. Esperam um trabalho mais informativo, que os profissionais da mídia se

atualizem sobre regras e se mostram desapontados com os profissionais que não conseguem

separar o trabalho jornalístico do seu lado torcedor de futebol. A “leitura” feita pelos árbitros

sobre o comportamento dos jornalistas que não separam o trabalho das emoções de torcedores

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nos remete ao que Elias explicava como envolvimento e a necessidade de distanciamento.

Segundo Elias (2011, p.236):

O ato de distanciamento conceitual dos objetos do pensamento, que qualquer

reflexão mais emocionalmente controlada envolve [...] uma distância que existe de

fato entre o sujeito pensante e os objetos de seu pensamento. E o maior controle de

impulsos afetivos diante dos objetos de pensamento e de observação, que

acompanha todos os passos no sentido de maior distanciamento conceitual, aparece

neste momento na autopercepção das pessoas como uma grade que existe realmente

e que separa e exclui o “ser”, “razão” ou “existência”, dependendo do ponto de vista,

do mundo “externo” ao indivíduo.

Sendo a mídia formadora de opinião, o que pensam os árbitros sobre a

responsabilidade da mídia na violência entre torcedores de futebol e sobre a violência contra a

equipe de arbitragem. Segundo os árbitros:

Eu acho que sim, porque eu acho que com esses comentários que a mídia faz, com

esses comentários... Quando é ex-árbitros de futebol você entende um pouco porque

o cara foi árbitro, ele entende da regra, mas tem muito comentarista que nunca

pegou um livro de regra, não sabe nem quantas regras têm no futebol e ele comenta

absurdos, isso ele forma uma opinião. Se ele forma uma opinião negativa em relação

a árbitro, ele tá indiretamente ou diretamente insultando pouco aquilo ali. Ele acaba

sendo responsável sim, pela violência nos estádios, violência com os árbitros, com

os assistentes porque a gente tem alguns casos que o árbitro, a equipe de arbitragem

foi agredida ou insultada, ou a caminho do estádio, em tudo isso eu acho que a mídia

tem uma grande responsabilidade porque ela é formadora de opinião. Então às vezes

eles fazem um tipo de comentário desnecessário e errôneo, quando comenta

desnecessariamente, mas ainda comentando com coerência, não tá certo, mas é

desnecessário. E às vezes tem coisa que não adianta passar, ao não ser a incitar a

violência (ENTREVISTADO 1).

Olha eu acho que as violências nos estádios estão mais localizadas mais na classe

social, diferença social. Porque quem briga nos estádios não são as pessoas do bem

assim, que vão pra assistir o espetáculo, quem vê quem briga são os bandidos que

estão infiltrados nas grandes torcidas porque as vezes ele quer acompanhar uma

paixão que ele tem, isso quem financia é o próprio clube, pagam pra assistir, tem

viagem pra ir pra lá. E quando tiver esse tipo de pessoa infiltrada nas torcidas

organizadas, vai ter sempre violência, eu nunca vi assim, eu conheço muitas pessoas

que vão em estádio assim, eu nunca vi que foi no estádio e falar que brigou. Eu

escuto falar que brigou nos jornais ali que olha, aquele lá tava envolvido na briga

três meses atrás, mas, não, ele estava em outra a um ano atrás, são sempre as

mesmas pessoas que eu não sei qual é o procedimento da justiça, se pode brigar no

estádio, porque briga, depois o cara ta solto. Não sei a mídia, a mídia às vezes

divulga muito essa imagem também, se não estimula esses caras a fazer lá. Na

Europa a gente nem vê isso, o cara invade o estádio, muda o foco, talvez fosse o

caminho. Eu acho assim, esses jornalistas que dão muita ênfase, como eu falei

anteriormente nessa transferência de responsabilidade do árbitro, ou dirigente que

quer jogar tudo nas costas do árbitro porque essas respostas que eles tão dando não é

pra mídia, não é pra mim, tá falando pros torcedores deles, que ao invés de falar que

ah, o time ta mal, mexeu errado, perdeu. Não, eles preferem falar pros torcedores

deles, talvez essa violência pode acontecer pelas palavras que eles tão usando não

que aconteceu dentro do campo (ENTREVISTADO 2).

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Eu acho que poderia ser melhor, eu acho que poderia ser melhor na forma que eles

vendem as vezes, um clássico ou uma partida buscando o que já aconteceu no

passado, o que for principalmente de uma forma negativa, ao invés de ajudar eu

acho que apimenta muito mais, coloca ainda muito mais emoção. Já cria-se um

clima desfavorável pra que você possa levar família pro campo de jogo, levar um

filho, levar um parente. Leva os torcedores, colocando como os torcedores então a

forma que se coloca, a forma de como eles colocam às vezes, umas informações,

torcidas organizadas é, eu acho que acaba sendo uma mídia vendida de uma forma

negativamente. Então eu acho que poderia ser melhor, poderia ser melhor,

principalmente com comentarista né[sic], essa mídia de torcedores já começa falar

que pode ser um problema em relação ao arbitro, em relação aquele jogador, já

começa vender aquela briga entre jogadores de jogos anteriores, pra mim é uma

mídia negativa nesses jogos. Também muito grande, principalmente quando um

equívoco, um erro que as vezes acontece de uma forma que ninguém quer e a forma

como é passada, repassa essa informação tanto ali no rádio, principalmente no rádio

ne, que são pesos locais, na maioria das vezes. A forma como eles colocam mexe

com o emocional e consequentemente com a segurança da arbitragem pós jogo.

Porque dentro de campo todos veem, nós temos 3 ,5,10, 15 policiais a nossa volta.

Mas no dia seguinte? E o aeroporto, e a rodoviária, e a estrada, e o restaurante que

você ta no dia seguinte correndo esse risco de encontrar esse torcedor,

principalmente quando você acerta e eles defendem até o último momento que o

árbitro se equivocou naquela decisão que todos já viram que tinha acertado. Então

ela poderia, assim como eu coloquei dos comentaristas de arbitragem, poderia ser

uma mídia mais esclarecedora do que defender às vezes uma opinião de que todos

tão vendo que foi de uma forma contrária (ENTREVISTADO 3).

Os árbitros responsabilizam a mídia pela violência nos estádios e a violência

contra a equipe de arbitragem. Atribuem a violência entre os torcedores pela maneira como a

mídia “vende o jogo” para que o clima de rivalidade aumente a audiência. Comentários

desnecessários e um clima de guerra parecem fazer parte da propaganda do jogo de futebol.

A violência contra a equipe de arbitragem é estimulada pelos jornalistas e comentaristas nos

comentários dos erros dos árbitros que nem sempre, segundo os árbitros são análises

fundamentadas e corretas. Por se tratar de entrevistas semiestruturadas a fala do terceiro

árbitro entrevistado nos direcionou a outra pergunta quando ele citou: o dia seguinte do

árbitro. Perguntamos a ele se a manifestação do torcedor não terminava após o apito final. O

que ele queria dizer sobre o dia seguinte. Segundo nosso terceiro entrevistado:

Sim, nós temos relatos de vários árbitros que tiveram problemas no aeroporto,

dentro do avião, você ir viajar com vários torcedores organizados no mesmo voo.

Você faz partidas em alguns estádios que só tem um voo de retorno, cê [sic] volta

com dirigente de equipe, CE volta com torcedor uniformizado ou torcedor comum

entendeu. Por isso que a gente fala que eu não quero só a profissionalização da

arbitragem, eu comentava no último final de semana que eu tava ali, eu quero a

melhoria na estrutura do que envolve um jogo de futebol, que todo mundo vê a

arbitragem apenas nos 90 minutos, mas muita gente não vê as arbitragem antes né a

sua chegada num estádio, numa cidade, num país as vezes, o seu retorno encontra

aquelas pessoas no dia seguinte, o restaurante que você vai pós o jogo que você tem

que tomar cuidado de não ir, você sabe que pode encontrar com torcedor organizado.

Então o que a gente pede é essa melhora, essa melhoria de estrutura, uma segurança

maior, segurança nos hotéis, segurança nos aeroportos, uma equipe de segurança

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seja lá por parte dos sindicatos das associações ou parte de quem ta organizando,

gerindo essas situações (ENTREVISTADO 3).

Podemos confirmar pelo seu depoimento que o lugar que parece ser mais seguro

para os árbitros seja surpreendentemente o campo de jogo. Com as mudanças nos

regulamentos dos campeonatos prevendo maior policiamento e segurança aos árbitros, a

violência contra estes profissionais acontece agora fora dos gramados. Os árbitros não se

sentem seguros nos deslocamentos para os jogos e nas cidades onde necessitam se hospedar.

Na dinâmica do jogo precisamos apenas da interação de duas equipes de

jogadores, porém se pensarmos no futebol espetáculo as relações de interdependência são

complexas. Os jogadores necessitam pertencer a uma equipe, precisamos de equipes

adversárias, comissões técnicas, dirigentes, árbitros e jornalistas. Isto sem considerar todos os

profissionais que trabalham nos “bastidores”. Operários, indústrias de materiais esportivos e

muitos outros. Se as relações são necessárias porque os dirigentes das equipes detêm tanto

poder? Perguntamos aos árbitros como são as relações entre os árbitros e os jogadores,

comissão técnica e torcedores?

Dependendo da comissão técnica, dependendo da equipe, dependendo do jogador, é

bem difícil a, a convivência, a relação. Porque que nem eu te falei, às vezes é do

indivíduo, se ele não, não, não convive bem vai ser em qualquer lugar que ele tiver,

e têm realmente alguns jogadores, alguns técnicos, algumas comissões que são

problemáticas, que são mal-educados, que são reclamam acentuadamente, que

gesticulam. Jogador que não você não bate uma falta ele já quer reclamar, já quer

abrir o braço, já quer xingar, só que vai da pessoa, do indivíduo, não é uma questão

de: ‘’ah, é porque é jogador’’. Eu acho que se tivesse, sei lá, jogando tênis, jogando

vôlei, jogando basquete, qualquer coisa, qualquer meio que ele iria ter esse

comportamento, porque é dele, não é por causa do futebol. Eu particularmente, não

tenho muito problema com as condições técnicas porque já tô na arbitragem aqui no

estado de São Paulo há 11 anos, eu tenho um respeito, já conhece, já tem um nome

assim, já tem uma reputação, o cara vem resolver e você já sabe quem é. O cara não

é que eu vou pro campo do jogo que eu... Eles respeitam bastante, eu sinto até, os

jogadores e as comissões técnicas me respeitam mais do que respeitam os homens,

porque com homem ele vai falar no linguajar dele, de homem pra homem. Comigo

não, eu sou mulher, ele não vai falar uma coisa que ele fala pra homem, não vai falar

pra mim, então já tem aquele cuidado, aquele jeito de lidar com a árbitra feminina e,

é isso (ENTREVISTADO 1).

Eu não tenho relação nenhuma com jogador, não faço questão nenhuma de ser

amigo, é, até porque quando o calo aperta a primeira pessoa que eles vão querer

transferir é o árbitro. Você pode ter jogado 90 minutos, errou 15 gols, aí tem o lance

polêmico que decidiu o resultado do jogo, é você que decidiu os erros dele. Então eu

prefiro evitar, assim não ter contato nenhum com jogador, com comissão técnica, às

vezes encontra em aeroporto, tem o associado, que entra, conversa, mas eu não faço

questão nenhuma de me envolver. Mídia também, falo muito pouco, já participei

bastante já dei entrevistas e, os programas esportivos que fui convidado mas hoje

evito porque você não vai ganhar nada com isso, você só corre o risco de falar

alguma bobagem e virar contra você ainda, eu evito também por causa da família. E

torcedores as vezes que eles querem é um pouquinho de atenção, queira ou não

queira, você esta na casa deles né, isso quem me ensinou foi o Paulo Cesar que ele

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tem um... O Paulo Cesar é um dos caras mais conhecidos do meio do futebol, dos

árbitros, faria um jogo de quarto árbitro com ele, todo mundo reconhece ele. Ele tem

um nome marcante assim, e às vezes o torcedor brinca, às vezes ate uma brincadeira

assim, que não me agrada, que tem que saber lidar com a situação pra não gerar um

atrito né, até porque a pessoa publica ali é você né[sic]. Então eu tenho uma relação

tranquila com torcedores e tal ENTREVISTADO 2).

Eu, eu falo por mim que eu acabo sendo, eu, eu, eu levo de uma maneira, de uma

forma que eu costumo respeitar os jogadores né[sic], dentro de campo de jogo, não

falar palavrão com eles, não partindo pra uma linguagem grosseira ou ofensiva, ate

pelo fato de não permitir que eles façam isso no jogo, então não tem esse direito de

ter um autoritário dentro de campo. Eu procuro é, que eles me respeitem, mas

também tenho que respeita-los, eu quero autoridade sem ser autoritário, é, eu sempre

levei dessa forma mesmo nos jogos amadores uma, uma, não chega a ser uma

amizade, mas um certo respeito, um certo diálogo com esses jogadores,

principalmente durante a partida, a que você não perca essa autoridade durante os

jogos. E pós jogo acontece um diálogo mais estendido mas sempre respeitando o

limite mesmo fora do jogo, o limite entre o árbitro e o jogador de futebol. Com a

comissão também, com a comissão acaba sendo, acaba sendo um diálogo um pouco

maior né [sic], com a imprensa a gente respeita também o trabalho dela ali durante o

jogo, a maioria das vezes o torcedor, a equipe do seu estado, da sua cidade, do seu

país a gente respeita isso. Mas nós não podemos perder em nenhum momento essa

oportunidade de, de exigir e de ter respeito entre essas pessoas, com nós todos

envolvidos dentro do futebol. Em relação aos torcedores são né[sic], que eu venho

falando em toda a minha, que eu venho colocando em toda minha fala que eles

acabam atuando muito mais na parte emocional, na parte do fanatismo, de querer a

vitória da sua equipe a todo custo né[sic]. E ainda tem aquele intermediário, aquele

árbitro tomando decisões impopulares, nós temos que tomar um cuidado maior,

principalmente com os fanáticos né[sic], em relação a nossa vida depois no dia a dia,

você ta na rua, você ta encontrando com esses torcedores, em aeroportos, rodoviária,

restaurantes, tem que ter esse cuidado um pouco maior. Mas também de muito

respeito e principalmente o que eu coloco muito nos meus planos de trabalho é essa

parte, de respeitar as gremiações, de respeitar jogadores, torcedores porque a gente

sabe que o futebol sendo apaixonante demais, então a gente não pode perder essa

oportunidade de, de, a gente não pode perder esse respeito né[sic] por essas pessoas,

aprender a respeitar em todos os momentos por conta dessa paixão que envolve o

futebol (ENTREVISTADO 3).

Os árbitros comentam que as relações com os jogadores e comissão técnica são

relações de respeito, porém nem sempre a recíproca é verdadeira. As decisões impopulares

associadas à necessidade de vitória das equipes acabam gerando tensões e conflitos. Os

jogadores costumam transferir a responsabilidade de um resultado negativo no jogo para a

equipe de arbitragem. Segundo os árbitros a melhor coisa é não se envolver com jogadores e

técnicos e dirigentes. Neste quadro onde se procura manter a autoridade sem ser autoritário,

alguns comportamentos e atitudes dos jogadores e comissão técnica dificultam o controle da

partida. Perguntamos: Quais são as atitudes de jogadores e comissão técnica que dificultam o

trabalho do árbitro?

A atitude de indisciplina falta de educação é reclamação acintosa, gesticulando. Esse

tipo de atitude dificulta porque às vezes o jogo tá tranquilo e o técnico, a comissão

técnica tá irritada, tá gesticulando e às vezes isso passa pro jogador, tá tudo sob

controle e o cara tá louco fora do campo, transfere pra dentro do campo e acaba

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passando pro jogador, acaba estressando o jogo e a sua atuação no jogo. Então esse

tipo de atitude acaba dificultando o trabalho dentro do campo de jogo

(ENTREVISTADO 1).

Transferência de responsabilidade é a maior. O restante é quando reclama de uma

decisão de algum resultado ponderada, tipo assim, um questionamento, não uma

reclamação, eu acho que faz parte do futebol, às vezes você marcou alguma coisa

que você não entendeu que faz parte do dialogo assim. Mas quando quer transferir

de qualquer forma o resultado do jogo pra você, isso é a pior coisa. É o que pesa

mais do árbitro trabalhar de uma forma mais, o objetivo dele é criar um ambiente

que deixa suscetível a errar a favor da equipe dele (ENTREVISTADO 2).

A reclamação de situações que não ocorrem. A reclamação acintosa de uma coisa

que todos e depois até as imagens mostra que você não tava equivocado, que nós

chamamos de transferência de responsabilidade, essa é uma coisa que o árbitro não

aceita, não tolera (ENTREVISTADO 3).

Nas palavras dos árbitros as reclamações e a transferência de responsabilidade68

parecem ser as atitudes que mais dificultam o trabalho da equipe de arbitragem. Embora o

quarto árbitro procure cumprir as regras e o regulamento na área das comissões técnicas, a

falta de respeito, falta de disciplina e excessos colaboram para o aumento das tensões nas

partidas e tiram o foco do jogo. A transferência de responsabilidade é novamente mencionada

pelos árbitros como uma atitude que dificulta o trabalho e as relações, para o entrevistado

número 2 é visto como “a pior coisa” e para o entrevistado número 3 esta atitude não pode ser

aceita e tolerada.

Na introdução da dissertação citamos a pesquisa do departamento de Psicologia

da Universidade de Viena na Áustria: “Posso ofender um árbitro”? Perguntamos aos árbitros

quais as ofensas de jogadores e comissão técnica que eles não toleram e que ficam mais

susceptíveis a mostrar o cartão vermelho, pois na Áustria, os insultos e agressões dizem

respeito à: capacidade técnica, aparência física, caráter, orientação sexual e outros. Para os

nossos entrevistados:

[...] dentro dessas ofensas aí, foi uma ofensa moral, direto com a minha pessoa

entendeu (ENTREVISTADO01).

Racismo, eu acho que é uma coisa assim que eu não pensaria duas vezes, porque

isso ai é uma coisa que infelizmente no ano de 2015 assim não da pra aceitar, não

consigo entender o que a pessoa tem em mente pra ter uma postura dessas

(ENTREVISTADO 2).

[...] seria o caráter, a partir do momento que duvida do meu caráter de que eu possa

ta[sic] ali com segunda, terceiras intenções, pra mim acho que é o absurdo do

absurdo, que eu considero que me dedico como eu disse no inicio quase

exclusivamente pra arbitragem hoje ainda propriamente como árbitro do quadro

internacional, me considero um arbitro nacional mesmo eu não, de fato, não de

68

A transferência de responsabilidade que se referem os árbitros é quando jogadores, comissões técnicas e

dirigentes atribuem os resultados negativos dos jogos a atuação dos árbitros.

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direito, me preparo, me programo para o que eu estou envolvido, e duvidar do

caráter acho que seria o primeiro momento (ENTREVISTADO 3).

As ofensas morais são para os nossos entrevistados as mais significativas e

puníveis com cartão vermelho. Erros dos árbitros são entendidos pelos jogadores, comissão

técnica, dirigentes e torcedores como má-fé. O árbitro não pode errar. Segundo Franco Jr.

(2007, p.249),

Enquanto símbolo de autoridade, são identificados com governos autoritários e

corruptos, frequentes na nossa história, e de maneira sistemática são agredidos

verbalmente pelas torcidas antes mesmo de começar a trabalhar. De um ponto de

vista sociológico, é como partir do pressuposto de que todo árbitro é corrupto.

Ser árbitro não é uma tarefa fácil. O sujeito precisa ser imparcial, neutro e deve

mediar conflitos e tensões. Todo o trabalho pode ser perdido em questões de minutos por um

erro que pode determinar o placar do jogo. Quanto mais equilibrada for a disputa maior a

exigência de atenção e concentração do árbitro. As tensões crescem de acordo com a

importância do jogo, porém, esperamos de todos o autocontrole e do árbitro e sua equipe o

controle de todas as tensões que um jogo envolve. O árbitro será sempre o mediador e os

jogadores os atores neste espetáculo. Para Elias (2008, p.99), “Durante muito tempo é

particularmente difícil que os jogadores compreendam que a sua incapacidade de controlar o

jogo deriva da sua dependência mútua, das posições que ocupam enquanto jogadores e das

tensões e conflitos inerentes a esta teia que se entrelaça”.

Como mediador de conflitos e responsável pelo cumprimento das leis do jogo

precisa tomar decisões impopulares, às vezes se equivoca e é xingado em coro pelos

torcedores em outras ocasiões as atitudes perdem o controle e se transformam em agressões.

Perguntamos aos árbitros: Você já sofreu violência? e sendo a resposta afirmativa, quais os

tipos de violência que você já sofrem na função de árbitro?

Diretamente não. Uma violência assim é nunca fui agredida né. Nunca colocaram a

mão em mim, apesar que já teve tentativas, tanto no amador, quanto no profissional

pelo jogo da Copa do Brasil Feminino onde uma equipe que foi desclassificada e na

hora que acabou o jogo a equipe veio tentar me agredir. Se não fosse a guarda

municipal, o policiamento que tava no campo de jogo, eu seria linchada, talvez não

estivesse aqui nem pra, pra ta[sic] dando entrevista. Por quê? Pelo simples fato de

ter perdido o jogo, com o que eu faço o jogo, gol, com essa altura nem eu posso

fazer e se eu fosse jogadora, eu não era árbitra. E pra mim é uma violência sim,

porque pra mim o que importa é a tentativa, elas tentaram me agredir, só não

agrediram porque graças a Deus tinham anjo da guarda lá. E outro tipo de violência,

que eu sofri, que nossa, até hoje eu não esqueço como eu falei, foi um jogo aqui em

São Bernardo, no estádio Primeiro de Maio, válida pelo campeonato da OAB,

Ordem dos Advogados do Brasil, onde eu fui xingada de uma forma tão, tão, baixa,

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tão, sei lá o que falar viu, porque me machucou demais, até hoje eu não esqueço. E

foi só uma agressão verbal, mas que pra mim marcou muito (ENTREVISTADO 1).

Assim, eu nunca fui, nunca, em termos de jogo eu nunca tinha sido agredido. Eu tive

um problema com um jogador esse ano, ano passado né, num clássico que eu fiz que

tive um tranco nas costas, mas eu já trombei varias vezes com um jogador, pra mim

tinha sido uma trombada natural e depois vendo pelas imagens ele veio pra me

acertar. O único problema que eu tive com jogador, torcedor, eu pensava, eu penso

muito por ter um sangue um pouco quente assim, sabe, é... Eu não sei como me

controlaria, nessa situação me controlei muito bem porque pra mim foi natural, só

depois que eu vi que não tinha sido mais. Não assim, o que a gente sofre mais é no

estádio né, assim de torcedor, verbal né. No amador sofre muito menos, porque cê

[sic] ta ali, ali todo mundo é homem né, e às vezes não tem policiamento, então se

você quiser partir pra cima de alguém você vai partir e aí pode chegar ate o de fato.

Mas como no amador é diferente do estádio, no estádio o torcedor que eu to vendo

da arquibancada, eles não vão me encontrar, muito difícil, agora no amador não, eu

acabei, terminei o jogo, eu to ali se ele quiser me encontrar, ele vai me encontrar.

Então às vezes tem ate menos, pelo menos na época que eu trabalhava no amador,

hoje eu acho que ta bem pior né assim, tava conversando hoje mesmo com um

amigo meu que jogou muito tempo no amador e ele falou que não joga mais porque

não tem segurança nenhuma. Mas assim, o maior tipo de agressão que eu sofri, foi

verbal, dentro do estádio assim (ENTREVISTADO 2).

Sim, já sofri situações de jogadores dentro de jogo, de te empurrar, de torcida,

dirigente na porta do vestiário, falar bastante, antes de partida já estar reclamando do

árbitro que vai trabalhar naquele jogo ou pós-jogo, abrir em redes sociais coisa que

eu não tenho e nem tenho intenção de ter, de você ouvir comentários de vários

árbitros de, de vários dirigentes, torcedores. Então pra gente acaba sendo sim, não

precisa ser essa violência explicita de vias de fato, mas a gente acaba sofrendo, passa

por situações constrangedoras sempre, principalmente sendo nós os intermediadores

dessas partidas, de pessoas na sua cidade, às vezes, não tendo gostado de uma

atuação e acabar te xingando, reclamando daquela situação, então isso acaba sendo

meio que uma constância na vida do árbitro. Não, não, só no campo de jogo que já

cheguei a ter esse problema de vias de fato, mas assim, nunca uma agressão de soco

assim, mas empurrão daquela coisa de rodinha, de xingamento principalmente já

sofri (ENTREVISTADO 3) .

Os árbitros sofreram e continuam sofrendo violência. Para o entrevistado 3, isto

“acaba sendo meio que uma constância na vida do árbitro”. Sofrem agressões verbais,

agressões físicas, intimidação de dirigentes nas portas dos vestiários, xingamentos de

torcedores, jogadores, comissões técnicas e dirigentes. Quando estão fora dos gramados

sofrem comentários depreciativos nas redes sociais e na imprensa, afirmam passar por

situações constrangedores em restaurantes e aeroportos comprometendo assim a sua vida

pessoal.

A estrutura do campeonato e/ou torneio e seus respectivos regulamentos são de

fundamental importância na segurança da equipe de arbitragem. Nos campeonatos

profissionais da CBF e FPF não se realizam os jogos se o policiamento não estiver presente.

Os árbitros têm os policiais como parceiros e as punições previstas no Código de Justiça

Desportiva contra as instituições, jogadores e comissões técnicas por agressões a árbitros. Os

trabalhos do tribunal do tribunal de justiça reprimem as atitudes descontroladas dos

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participantes do jogo embora o mesmo tribunal que pune crie espaços para recursos e

absolvições. Vejamos o que disseram os árbitros sobre a proteção que recebem do

policiamento:

[...] só não agrediram porque graças a Deus tinham anjo da guarda lá

(ENTREVISTADO 1).

O jogo em termos de série A e série B não muda praticamente nada, temos uma

equipe de policiamento que nos acompanha durante todo o jogo, entrada, saída do

campo, enquanto estamos no vestiário (ENTREVISTADO 2).

[...] com a providencia rápida do policiamento e também não deixasse que as vias de

fato ocorresse (ENTREVISTADO 3).

No Capítulo VII do Código Brasileiro de Justiça Desportivas estão previstas as

infrações relativas à arbitragem. A equipe de arbitragem poderá ser punida caso deixe de

observar as regras da modalidade e por se omitir no dever de prevenir ou de coibir violência

ou animosidade entre os atletas.

A violência contra os árbitros é tratada no Capítulo V, DAS INFRAÇÕES

CONTRA ÉTICA DESPORTIVA e no Capítulo VI, DAS INFRAÇÕES RELATIVAS À

DISPUTA DAS PARTIDAS, PROVAS OU EQUIVALENTES. Segundo o CBJD, Capítulo

V,

Art. 243-F. Ofender alguém em sua honra, por fato relacionado diretamente ao

desporto.

(Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

§ 1º Se a ação for praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou

membro da comissão técnica, contra árbitros, assistentes ou demais membros de

equipe de arbitragem, a pena mínima será de suspensão por quatro partidas.

(Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

§ 2º Para todos os efeitos, o árbitro e seus auxiliares são considerados em função

desde a escalação até o término do prazo fixado para a entrega dos documentos da

competição na entidade (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

No capítulo VI, encontramos a seguinte redação:

Art. 254-A. Praticar agressão física durante a partida, prova ou equivalente.

(Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

PENA: suspensão de quatro a doze partidas, provas ou equivalentes, se praticada por

atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e

suspensão pelo prazo de trinta a cento e oitenta dias, se praticada por qualquer outra

pessoa natural submetida a este Código. (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de

2009).

O fato das agressões contra árbitros estar prevista no CBJD não significa que os

infratores serão punidos com todo o rigor previsto. O presidente do Atlético-PR, Mário Celso

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Petraglia, foi absolvido das insinuações que publicou em rede social de favorecimento dos

árbitros para a equipe do Corinthians e poder dos clubes paulistas69

. O jogador Dudu, da

Sociedade Esportiva Palmeiras, seria julgado por empurrão no árbitro Guilherme Ceretta após

ser expulso na partida da final do Campeonato Paulista. Segundo a reportagem de Daniel

Batista70:

A suspensão de 180 dias seria o pior cenário possível, mas dificilmente Dudu deve

ser condenado por um tempo tão grande. Geralmente, o jogador recebe uma pena

pesada, o clube recorre e a punição é revertida para poucos jogos ou multa. Pelo

menos essa é a crença da diretoria do Palmeiras nos bastidores.

A diretoria do Palmeiras tinha o exemplo da condenação do volante Petros do

Corinthians que no ano de 2014 julgado por situação similar a de Dudu foi condenado a 180

dias, a pena depois que o clube recorreu foi revertida a suspensão em três partidas. Segundo

nosso entrevistado número 2:

Interpreto como uma passada de mão na cabeça, pra não ficar ruim com ninguém às

vezes o tribunal toma essas medidas, sabe. Ah, tomou lá, seis meses, aí não, 6 vezes

é muito, e vai entrando em instância, vão brigando, e isso chega no meio termo, mas

quem busca justiça assim não tem que ter, o Brasil é diferente né[sic], se ver nosso,

nossa sociedade, isso acontece então futebol é só um reflexo.

Os insultos e xingamentos parecem ser considerados pelos agressores apenas

como uma forma de reclamação e crítica ao trabalho realizado pelos árbitros. Perguntamos

para o entrevistado 1 se ele reconhecia que a violência pode ser simbólica. Segundo ele:

Sim, sim. Pra mim a violência verbal, dependendo do que for falado é pior que um

tapa na cara, eu assim, no meu caso particular, eu nunca fui agredida de fato com um

tapa, com um soco. Tentativa eu já tive, mas nunca fui agredida chegar a..., mas eu

fui agredida de uma forma verbal que me machucou muito mais que eu não esqueço

até hoje, talvez se tivesse me dado um tapa eu já tivesse esquecido. Mas as palavras

que foram ditas machucou muito mais, é um tipo de violência sim.

O árbitro relatou ter sofrido violência de maneira bastante significativa duas

vezes. A primeira em um jogo de quartas de final da Copa Brasil Feminina de Futebol em

2014, quando após o jogo a equipe perdedora tentou agredi-lo responsabilizando-o pela

desclassificação. As atletas foram contidas pela comissão técnica e pelo policiamento. A

segunda vez foi em um campeonato amador da OAB onde um jogador da equipe perdedora

69

Fonte: Jornal: “O Estado de S. Paulo”, São Paulo. 4 set. 2015,Caderno de Esportes, p. 17. 70

Fonte: Jornal: “O Estado de S. Paulo”, São Paulo. 5 maio 2015, Caderno de Esportes, p. 15.

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ao término da partida dirigiu-lhe ofensas morais. Questionado sobre o que teria motivado as

agressões, respondeu:

No primeiro caso, no jogo da OAB pra mim o que motivou foi à falta de educação, e

a falta de respeito com a figura do árbitro, porque talvez o cara fosse um, não sei,

porque além de ser advogado, ele pode ser um prele [sic] reitor, pode ser um oficial

de justiça, pode ser qualquer coisa que tem direito. Então ele se acha o dono da

razão, o poderoso, mas ali no campo do jogo quem manda é o árbitro, e talvez ele,

ele teve dificuldade de aceitar que ali ele era só mais um só mais um jogador entre

os 22, que ele ali não tinha privilegio nenhum, era exatamente igual o outro e quem

mandava, quem tava superior a ele, no caso era eu e o outro árbitro. E no caso da,

da, do Jogo Feminino o que motivou foi à falta de, de preparo psicológico nas

meninas, porque eu sempre falo, o jogo de futebol tem três resultados, a vitória, a

derrota e o empate. E tem que estar preparado pra um desses três resultados, e tem

que ser construído dentro do campo do jogo o resultado, que não vai ter um fator

externo ou um árbitro vai fazer eu ganhar. É você faz isso dentro do campo do jogo,

elas sofreram um gol, acabou o jogo, perderam a cabeça, falta de preparo

psicológico. E infelizmente nós temos mais no futebol feminino, esse despreparo,

esse destempero as mulheres não estão muito acostumadas, eu sou mulher, to[sic]

num futebol, é por estar, é por saber da dificuldade, as mulheres não tem esse

autocontrole. Porque no jogo masculino, um cara quer brigar sempre chega, a turma

deixa disso pra segurar, o que quer brigar. Num jogo feminino, quando as meninas

querem brigar, as outras não querem nem saber por que elas tão brigando, quer

brigar também. Então, é... Essa é a realidade, não adianta a gente contar historinha

pra você, tem que falar a verdade.

No depoimento do árbitro novamente aparecem como causas para a violência a

falta de educação, falta de respeito e a transferência de responsabilidade. Ao comentar o

campeonato amador, ele atribui ao jogador, possível advogado, o sentimento de ser autoridade

e ter o poder que provavelmente pense ter na sua vida profissional. Para Elias, o poder está

presente em todas as relações humanas e no jogo de futebol como muito bem foi mencionado

pelo árbitro a autoridade como representante das leis do jogo é do árbitro. No campeonato

feminino atribui à violência a falta de controle emocional das jogadoras. Para Elias e Dunning

(1992, p. 69), [...] a contenção de sentimentos fortes, no sentido de alguém preservar um

controlo regular firme e completo dos impulsos, afectos e emoções é um factor de origem de

novas tensões. O fato de a primeira agressão ser em um canpeonato amador da OAB nos

direcionou para duas novas perguntas: Os jogadores desta partida eram advogados? E você

acha que o nível cultural, socioeconômico interfere e tem diferença em relação ao torcedor?

Sim, o que me agrediu era advogado sim. O que me deixa mais triste ainda, porque

eu já fiz jogos em comunidades né, é que os caros chamam de favela, mas agora não

pode mais chamar favela, tem que chamar comunidade né. Já fiz muito jogos em

comunidade, assim o nível intelectual das pessoas que estavam jogando baixíssimo,

talvez nenhum, mas às vezes me respeitaram muito mais, nunca tive esse tipo de

problema em, nesses jogos. E aí o jogo da OAB, o Campeonato da OAB onde só

jogam advogados, eu fui agredida dessa forma, isso que me deixa mais triste, ou não

né, porque aí você fala, não é o nível cultural da pessoa que vai levar a ser educado

ou não, se tem respeito pelo próximo ou não.[...] porque é como te falei, não

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depende do intelectual do indivíduo, acho que é dele. Porque às vezes você vê

pessoa de, de, de nível cultural baixo, ou nenhum, intelectual nenhum e tem respeito

pelo próximo, pela figura do árbitro, pela figura do, do assistente. Aí você fala

assim: ‘’como, o cara não tem nem estudo. É, mas ele tem educação’’. Porque tudo

eu acho que é uma coisa, educação é outra que você tem e eu não tenho, é uma coisa

de berço. E às vezes tem pessoas que tem o nível intelectual lá em cima e tem é,

graduado, pós-graduado, mestrado, só que ele não tem educação nenhuma, ele não

tem respeito nenhum com o ser humano. Então eu acho que isso aí não tem nada a

ver com nível intelectual, eu acho que vai um pouco da criação da pessoa, da, da

família, não sei, eu acho que não sei.

Para o entrevistado o nível cultural e socioeconômico do indivíduo não é

determinante para o seu autocontrole em uma partida de futebol. O entrevistado atribui à

formação e educação primária quando a criança incorpora comportamentos e valores para

uma vida em sociedade este tipo de atitude. Segundo Elias (2011, p.180),

A inter-relação dos pais e filhos, através da qual a vida instintiva da criança é

lentamente modelada, é assim determinada por nada menos do que a “razão”.

Conduta e palavras associadas pelos pais à vergonha e repugnância são muito cedo

associadas da mesma maneira pelos filhos, através de manifestações de desagrado

dos pais, por pressão mais ou menos suave. Desta maneira, o padrão social da

vergonha e da repugnância é gradualmente reproduzido no filho.

Para Reis (2006, p.18), “[...] há uma falência dos valores morais e éticos que faz

com que os papéis sociais de pai e mãe deixem de ser cumpridos” e as crianças acabam

encontrando dificuldades na escola para a convivência em sociedade.

Nosso segundo entrevistado diz ter sofrido apenas uma agressão física e sofrer

agressões verbais dentro do estádio. Na agressão física diz somente ter tomado consciência da

situação após ver o lance pela televisão, pois o empurrão, “trombada” do jogador foi pelas

suas costas. Segundo o entrevistado 2, “tive um tranco nas costas, mas eu já trombei várias

vezes com um jogador, pra mim tinha sido uma trombada natural e depois vendo pelas

imagens ele veio pra me acertar”. Ao ser perguntado sobre o que motivou a agressão o árbitro

respondeu:

Foi um lance assim que eu falei que me lesionei, eu falei que tava lesionado, e meu

posicionamento atrapalhou uma jogada do time e ele foi passar por mim e deu uma

esbarrada em mim. Mas não me derrubou nada, só me desequilibrou, é que era um

jogo de TV aberta e tal, foi buscado demais e tal, ai isso mostra que ele muda a

trajetória pra me acertar. [...] o fato de eu ter atrapalhado a jogada assim. [...] acho

que muito mais da índole dele do que, do que qualquer outra coisa.

O árbitro atribui a agressão à “índole” do jogador e reforça a fala do entrevistado

número 1 em relação a posturas e comportamentos adquiridos no convívio familiar. As outras

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agressões por ele mencionadas parecem não terem sido significativas, porém entendemos

como agressões frequentes dos torcedores nos estádios de futebol.

O árbitro 3 entrevistado comentou assim a agressão física que sofreu: “[...] no

campo de jogo que já cheguei a ter esse problema de vias de fato, mas assim, nunca uma

agressão de soco assim, mas empurrão daquela coisa de rodinha, de xingamento

principalmente já sofri”. Afirma que as situações de violência simbólica são constantes e

partem de jogadores, comissão técnica, dirigentes e torcedores. Na agressão física sofrida

disse ter ocorrido em um jogo profissional da segunda divisão do Estado de São Paulo.

Perguntado sobre o que teria motivado a agressão respondeu: “Questão social

primeiro momento, educação, indisciplina e a paixão, emoção envolvida, emoção envolvida

no jogo propriamente. Mas acho que os maiores momentos, maiores questão pra essa

violência ainda seja educação.

O entrevistado número 3 atribui como a maior causa da violência a educação que

para nós foi entendida como a educação primária. O árbitro cita as emoções e a paixão. O

futebol é uma atividade mimética para os espectadores e os jogadores profissionais precisam

manter o controle das suas emoções.

Perguntamos aos três árbitros como eles veem e interpretam a violência contra os

árbitros de futebol. Vejamos os sentimentos que nos transmitiram ao responderem este

questionamento:

Como eu interpreto a violência contra os árbitros? É, é, é... Qualquer tipo de

violência é inaceitável né[sic], ainda mais contra um árbitro, que é o que eu sempre

falo, o cara tá se divertindo, a gente tá trabalhando, até os jogadores estão se

divertindo, acaba sendo uma forma de lazer para os jogadores. O torcedor que ta no

estádio ele tá divertindo, ele escolheu tá lá. O árbitro não, o árbitro tá trabalhando,

então imagina você. Você tá trabalhando, seu caso é, você é professora, você tá

numa sala de aula você toma um tapa, um soco, um chute de um aluno, você

trabalhando. Então assim, é inaceitável, a violência, qualquer tipo de violência, de

qualquer tipo de pessoa é inaceitável e pro árbitro ainda mais. O árbitro tá

trabalhando, ele não tá lá se divertindo, ele tá lá trabalhando, enquanto todos se

divertem, o árbitro tá trabalhando (ENTREVISTADO 1).

Eu já vi depois que já aconteceu comigo teve muitos outros casos, como se tivesse

sido comigo, como se tivesse me agredido. Sinto a dor deles lá me coloco no lugar

deles, enquanto não tiver uma punição exemplar provavelmente é o que vai

continuar acontecendo (ENTREVISTADO 2).

Muito triste né[sic], muito triste, acho que ali revela, revela o, a falta de preparo, de

educação e de respeito a esse profissional que ainda faz parte do jogo que não é o

principal, que os principais são os jogadores, mas que se faz necessário a presença

de intermediadores e desse arbitro na partida de futebol. Então essa componente

desse universo que não deveria passar pelo o que passa ou que passou

(ENTREVISTADO 3).

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Indignados e repudiando qualquer forma de violência não apenas nos gramados,

mas em toda a sociedade os árbitros cobram mais respeito e acreditam que a violência não

pode ficar impune.

4.7 A VIOLÊNCIA SIMBÓLICA CONTRA AS MULHERES ÁRBITRAS

Quando decidimos por entrevistar os árbitros FIFA do Estado de São Paulo nossa

primeira decisão foi procurar nos sites da Confederação Brasileira de Futebol quem eram os

árbitros desta categoria. Para a nossa surpresa temos em São Paulo uma árbitra FIFA. A

surpresa se justifica por não vermos esta mulher e outras que pertencem a esta categoria

porém, de outros Estados brasileiros, atuando nos campeonatos profissionais de futebol em

São Paulo ou no Brasil como árbitras centrais. Nos últimos anos aumentou a presença de

árbitras assistentes (bandeirinhas) nos jogos profissionais e em todo o campeonato brasileiro

de 2015 nenhuma mulher dirigiu uma partida profissional masculina. Pedimos que o

entrevistado 1 comentasse esta postura das instituições e perguntamos se ele considerava esta

discriminação como uma forma de violência. Vejamos o que ele nos respondeu:

Eu considero sim, porque como você falou, nós mulheres. Tem eu que sou FIFA, e

tem mais quatro árbitras centrais na Federação Paulista de Futebol e realmente a

gente não tem as mesmas oportunidades que tem os homens, que são mesmas

categorias, é de referência né[sic]. No caso eu sou categoria 1, eu não tenho o

mesmo número de jogos que a outra categoria tem, se eu to na categoria 1 eu tenho

que ter o mesmo número de jogos. Aí o que estão na mesma categoria, não tem o

mesmo número de jogos, quer dizer, a gente tem menos número de jogos, menos

oportunidade[sic], pra mim é pelo simples fato de ser mulher sim é, porque nós

somos cobradas da mesma forma, nós somos cobradas no mesmo teste físico, prova

teórica, no procedimento a seguir o regulamento, só que na hora de ter o retorno da

mesma forma a gente não tem, infelizmente. Mas pra mim é um tipo de violência

sim, porque nós estamos aí lutando pelo nossos espaços, fazendo tudo que eles são

obrigado a fazer. ‘’Ah, mas pra vocês são diferentes’’ mas nós somos diferentes

porque a gente quer que seja diferente, a gente faz o que a gente tem que fazer, então

pra mim é um tipo de violência sim, pelo simples fato de ser mulher, porque tem

muita resistência ainda e tem muito preconceito. Mas infelizmente, infelizmente tem

(ENTREVISTADO 1).

Perguntamos ao entrevistado 3 porque as mulheres não apitam jogos profissionais

em São Paulo. Vejamos o que ele respondeu:

Na verdade é, a federação tem esse ranking só que nós temos mesmo FIFA, nós

temos os árbitros que são FIFA pras categorias masculinas, e o quadro também de

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árbitros FIFA para as competições femininas, levando-se em consideração que nada

impede de uma árbitra ou de uma árbitro, dos árbitros trabalhar em competição

feminina e as árbitras nas competições masculinas. A gente nota a maioria dos

árbitros trabalha nas competições, a maioria das meninas que trabalham em

competições masculinas na primeira divisão, são as árbitras assistentes, elas acabam

achando que né[sic], que o comentário geral é muito mais fácil, prático, trabalhar

como árbitro assistente, do que como árbitro central em competições masculinas. No

caso as árbitras estarem aptas a trabalharem nos jogos masculinos hoje, elas tem que

passar no teste masculino, e é uma das coisas que é mais acontecem [sic] as vezes

conseguem para fazer parte internacional feminino mas não consegue ir por causa do

quadro. São dois quadros, são dois testes, são quadros masculinos e quadros

femininos. Nós temos também situações de mulheres que passam em testes

masculinos mas depois vem a questão da escala que aí já não é uma coisa que

depende mais dos árbitros e sim da comissão que nos escala. Aí é a preferência, a

dificuldade do jogo, aí já depende muito mais da comissão do que do próprio árbitro,

nós fazemos a nossa parte mas também dependemos muito depois de momentos que

são as escalações dos jogos.

A árbitra afirma passar pelas mesmas formas de avaliações e mesmo tendo

aprovação não possui as mesmas oportunidades que árbitros homens. Esta informação é

confirmada pelo entrevistado 3 que diz que após as avaliações “ a questão da escala que aí

já não é uma coisa que depende mais dos árbitros e sim da comissão que nos escala”.

Interpretamos esta forma de violência simbólica apoiada em dois autores. Para Reis (1998,

p.46), “Os esportes modernos foram construídos culturalmente pelos homens, o que significa

dizer que, assim com em todos os ramos sociais, também nos esportes a mulher teve de

conquistar sua participação e ganhar reconhecimento”. E pensamos que esta conquista e

reconhecimento em todos os espaços sociais precisa ser acompanhada de conquistas em

cargos de gestão das instituições esportivas no Brasil. Enquanto os homens estiverem

confortavelmente instalados nestes cargos e monopolizando as decisões dificilmente as

mulheres encontram respeito e continuarão como “outsiders” na arbitragem brasileira.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer da pesquisa constatei a existência de poucas pesquisas e artigos

acadêmicos na área de Sociologia do Esporte. Como dizia Elias, a Sociologia parece não

considerar o Esporte um tema sério e relevante e nós nos referenciamos em seus estudos e

compartilhamos da ideia que o esporte ajuda na compreensão da sociedade.

Um dos objetivos da nossa pesquisa foi entender porque alguém escolhe ser

árbitro de futebol. Nossos dados contradizem o que de maneira pejorativa nos acostumamos a

ouvir na mídia e de torcedores de futebol, que os árbitros são jogadores frustrados. Os árbitros

que entrevistamos se dizem apaixonados pela arbitragem e pelo futebol. Dois entrevistados

declararam a influência de familiares e amigos para se formarem e seguirem na profissão de

árbitros. O entrevistado 2, apesar de ter jogado futebol, diz ter percebido ainda jovem que a

carreira de jogador profissional é para poucos este, assim como os outros dois entrevistados

possui curso superior e também teve a influência de familiares e amigos.

O segundo objetivo foi entender a violência contra árbitros e como eles sentem e

interpretam esta violência. As raízes e causas da violência contra árbitros também estão

relacionadas à violência que presenciamos todos os dias em nossa sociedade. A teoria do

processo civilizatório de Norbert Elias nos ajuda a compreender que viver em sociedade exige

dos seres humanos autocontrole e para isso eles reprimem as suas emoções. Os indivíduos

encontram nas atividades miméticas um espaço para extravasar estas emoções. Estas

atividades possibilitam que tenhamos reações descontroladas, porém dentro de um limite

aceito no convívio social. Nossos entrevistados entendem a violência como falta de

capacidade para dialogar, expor os árbitros a situações constrangedoras, denegrir a imagem do

profissional e ser humano. Acrescentamos a estas tentativas de agressão física que sofreram

impedidas pelo policiamento presente nos jogos, policiais estes elogiados pelos árbitros; e as

ameaças e intimidações em outros lugares como aeroportos e restaurantes que estão

relacionados ao deslocamento para a realização do jogo. A impunidade é considerada pelos

árbitros um agravante, pois faz com que estas atitudes continuem a ocorrer.

A mídia, segundo os árbitros, também é responsável pela violência contra eles. Os

jornalistas e comentaristas se beneficiam de recursos tecnológicos e fazem avaliações do

trabalho da equipe de arbitragem consideradas por eles como desumanas. Os programas de

debate esportivo após as rodadas dos jogos se beneficiam dos possíveis erros e os árbitros

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demonstram desapontamento e esperam um trabalho mais informativo e menos “torcedor” de

toda a mídia.

A violência simbólica vivida pelas mulheres árbitras de futebol se faz presente na

falta de oportunidade de trabalho. Embora estas mulheres participem dos mesmos cursos de

formação de árbitros e dos mesmos testes e critérios de avaliações durante toda a temporada,

elas não são escaladas nos campeonatos profissionais masculinos. Pensamos que o

reconhecimento pelo trabalho e a igualdade de oportunidades precisam ser concretizados,

assim como outras conquistas como a maior presença das mulheres em cargos de gestão nas

instituições esportivas no Brasil. Para Norbert Elias, o poder faz parte de todas as relações

humanas e não deve ser entendido como algo negativo nestas relações. É necessária à

equidade de gênero em uma modalidade em que os homens encontram-se confortavelmente

instalados.

Nossos entrevistados se mostraram favoráveis ao uso da tecnologia na arbitragem

e apresentaram dúvidas sobre quais recursos poderiam ser utilizados, preocupando-se com a

dinâmica do jogo. Acreditamos que o futebol precisa usufruir dos recursos tecnológicos sendo

necessário intensificar testes de aplicação destes recursos. Como os árbitros, pensamos que

estes recursos não podem interferir na dinâmica do jogo, comprometer as emoções dos

torcedores. O futebol não pode perder sua essência.

A profissionalização é desejada e esperada por nossos entrevistados. Torcemos

para que a ANAF e demais associações e sindicatos de árbitros apresentem alternativas para

que a Lei 12.867/13 que regulariza a profissão, estabelecendo critérios para os vínculos

empregatícios que proporcionariam aos árbitros dedicarem-se apenas a esta profissão.

São 152 anos de um esporte que apaixona milhões de pessoas em todo o mundo.

Nas primeiras regras não existiam os árbitros, eles passaram a fazer parte do espetáculo

quando o esporte se desenvolveu, profissionalizou-se e os gentleman não mais se entendiam

necessitando de alguém neutro, não pertencente a nenhuma das equipes para mediar às

decisões e tensões da partida. Nos dias de hoje, os gentleman continuam não se entendendo.

As altas cifras investidas no futebol aumentam a pressão por resultados positivos nos jogos,

exigindo deste mediador capacidades sobre humanas para decidir corretamente em segundos.

Os erros fazem parte da “condição humana” e perguntamos: Quem gostaria de errar diante das

várias câmeras de televisão?

Esperamos que esta pesquisa tenha proporcionado um melhor conhecimento sobre

o trabalho da arbitragem no futebol paulista e brasileiro e possa contribuir para uma maior

aceitação e valorização do trabalho dos árbitros no Brasil. Desejamos que esta dissertação

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estimule pesquisas acadêmicas sobre os árbitros esportivos e a arbitragem em todas as áreas

de conhecimento.

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ANEXOS

ROTEIRO DA ENTREVISTA

1. Identificação

1.1. Nome (não obrigatório):

1.2. Data de Nascimento:

1.3. Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino

1.4. Escolaridade?

1.5. Profissão:

1.6. Foi atleta?

1.6.1 ( ) Sim

1.6.2 ( ) Não

1.7. Em caso afirmativo, de qual modalidade?

1.8. Em qual instituição realizou o curso de formação para árbitros de futebol?

1.9. Ano em que concluiu o curso de arbitragem?

1.10. Entidade esportiva na qual é registrado (Liga Federação ou Confederação)?

1.11. A arbitragem equivale a qual porcentagem da sua jornada de trabalho semanal?

1.12. A arbitragem equivale a qual porcentagem do seu rendimento mensal?

2. Ser Árbitro

2.1. Por que optou em ser árbitro de futebol? Como a arbitragem “entrou” na sua vida?

2.2. Você recebeu alguma influência para optar pela arbitragem (pessoas, fatos ou experiências)?

2.3. Como foi a reação dos amigos e familiares quanto optou em ser árbitro e qual é esta relação hoje (Apoio ou

não)?

2.4. Comente a sua trajetória como árbitro de futebol.

2.5. Qual a imagem que você, quando espectador / torcedor de jogos esportivos, tinha dos profissionais da

arbitragem antes de se formar árbitro?

2.6. Hoje, você também é um profissional da arbitragem, quando espectador / torcedor, qual a imagem que tem

do árbitro de futebol?

2.7. Quando assiste seu time jogar, como você reage em relação ao trabalho do árbitro?

2.8. Na sua opinião, qual a importância da função de árbitro? Como entende a função de ser árbitro de futebol

em um país com tantas diferenças sociais e sendo o futebol considerado uma paixão nacional, uma religião?

2.9. Comente e de sua opinião sobre a profissionalização do trabalho de árbitro de futebol.

3. Situações Políticas

3.1. Considerando-se a formação de um árbitro desde o Curso para formação de árbitro até a sua ascensão à

categoria de Árbitro Internacional (FIFA), como é a relação de trabalho, investimentos, assessoria e suporte

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(psicológico, físico, intelectual, jurídico...) dados aos árbitros pelas Instituições (Federação, Confederação, FIFA

e Associação de árbitros) para o desenvolvimento profissional / humano?

3.2. Comente:

3.2.1- Os critérios de mudança de categoria e indicação ao quadro nacional, utilizados pela comissão de

arbitragem.

3.2.2- Os critérios de mudança de categoria e indicação ao quadro internacional (FIFA), utilizados pela

comissão de arbitragem.

3.2.3- Escalas dos jogos (sorteios)

3.2.4- Valores pagos a arbitragem

4. Relações Humanas

4.1. Como são as relações pessoais com os colegas de arbitragem? (Competitividade e/ou companheirismo e

parceria).

4.2. Existem muitos comentários sobre as escalas: quem deveria trabalhar em determinados jogos?

4.3. Comente as suas relações com jogadores, comissão técnica, torcedores, espectadores e mídia, durante a

partida e não exercendo a função de árbitro.

5. Tecnologia e Mídia

5.1. Você é a favor do uso da tecnologia nas partidas de futebol para auxiliar a arbitragem?

5.2. Caso a resposta da questão anterior seja afirmativa, quais são os recursos tecnológicos sugeridos que você

aprovaria?

6. Mídia

6.1 Como você avalia o trabalho da mídia no futebol em relação:

6.1.1 Ao desempenho da equipe de arbitragem nos jogos

6.1.2 Ex-árbitros comentaristas

6.1.3 A responsabilidade / influência da mídia em relação à violência nos estádios

6.1.4. A responsabilidade / influência da mídia em relação à violência contra a equipe de arbitragem

7. Violência

7.1. Poderia me explicar o que você entende por violência?

7.2. Você já sofreu violência na função de árbitro?

7.3. Quais os tipos de violência que você já sofreu?

7.4. Qual era o campeonato / evento e a importância da partida?

7.5. Qual era a categoria do jogo (faixa etária dos jogadores)?

7.6. De quem partiu a violência:

7.6.1 ( ) jogadores

7.6.2 ( ) comissão técnica

7.6.3 ( ) torcedores

7.6.4 ( ) espectadores

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7.6.5 ( ) policiais

7.6.6 ( ) jornalistas

7.6.7 ( ) outros

7.7. A violência ocorreu:

7.7.1 ( ) antes da partida

7.7.2 ( ) durante a partida

7.7.3 ( ) após a partida

7.8. Local em que a violência ocorreu:

7.8.1. ( ) No terreno de jogo

7.8.2. ( ) Nas dependências dos estádios

7.8.3. ( ) Fora das dependências do estádio

7.9. Na sua opinião o que motivou a violência/agressão?

7.10. Em relação à segurança / violência, quais são as diferenças entre trabalhar em jogos amadores /

profissionais, Série A e Série B?

7.11. Como você avalia a segurança nos estádios e a segurança dada a equipe de arbitragem?

7.12. Como você vê e interpreta a violência contra árbitros?

7.13. Uma pesquisa realizada com árbitros de futebol na Áustria tinha como objetivo investigar quais as

situações de conduta antidisciplinar de jogadores e técnicos que levavam um árbitro a utilizar um cartão

vermelho. As respostas mais citadas pelos árbitros foram: Ofensas relacionadas à capacidade técnica, a aparência

física, ao caráter, a orientação sexual e outros. Qual é o tipo de ofensa citados na pesquisa que você menos tolera

tornando possível a punição com o cartão vermelho?

7.14 Na sua opinião, quais ofensas são de maior relevância?

7.15 Você poderia numerar as ofensas de acordo com a gravidade e necessidade de punição?

7.15.1 ( ) capacidade técnica

7.15.2 ( ) a aparência física

7.15.3 ( ) caráter

7.15.4 ( ) orientação sexual

7.15.5 ( ) outros

8. Stress e Autocontrole

8.1 Você poderia numerar quais são os motivos de maior tensão e stress:

8.1.1 ( ) Você ou a equipe de arbitragem sofrer agressão

8.1. ( ) Falta de segurança nos estádios

8.1. ( ) Trabalhar em partidas de equipes com as quais você já teve problemas em partidas anteriores

8.1.4 ( ) Atrasos e pontualidade

8.1.5 ( ) Pagamentos de taxas

8.1.6 ( ) Cometer erros em momentos decisivos da partida

8.2. Quais são as atitudes de jogadores e técnicos que dificultam seu trabalho de árbitro?

9. Existe algum outro tema ou comentário que gostaria de registrar?

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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

“Árbitros: Vilões ou Mediadores do Espetáculo”

Carla Righeto

Número do CAAE: 1.164.183

Você está sendo convidado a participar como voluntário de um estudo. Este documento, chamado

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa assegurar seus direitos como participante e é

elaborado em duas vias, uma que deverá ficar com você e outra com o pesquisador.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se houver perguntas

antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com o pesquisador. Se preferir, pode

levar para casa e consultar seus familiares ou outras pessoas antes de decidir participar. Se você não

quiser participar poderá retirar sua autorização, a qualquer momento, não haverá nenhum tipo de

penalização ou prejuízo.

Objetivos

Os objetivos deste projeto de pesquisa é identificar quem são os árbitros FIFA em atuação na

Federação Paulista de Futebol, o que os levou a escolher a arbitragem como profissão. Estudar os tipos

de violências sofridas por estes, assim como eles sentem e interpretam a violência sofrida.

Justificativa

A escassez de pesquisas acadêmicas relacionadas ao tema na área de sociologia, o desejo de contribuir

para um melhor entendimento da violência sofrida pelos árbitros de futebol, possibilitando assim para

que sejam criadas propostas sócio-educativas que permitam diminuir as manifestações agressivas aos

árbitros no Brasil.

Procedimentos

Participando do estudo você está sendo convidado a: conceder uma entrevista que será gravada em

áudio e/ou vídeo e preencher um questionário.

Observações: a) Não haverá necessidade de deslocamento do voluntário(a); b)A entrevista ocorrerá na

cidade e local escolhido pelo voluntário (a); c)Não haverá grupo experimental ou grupo de controle;

d)Para a aplicação do questionário e a realização da entrevista serão necessárias duas horas em dia e

horário a ser acordado com os (as) voluntários (as); e)Todas as despesas serão de responsabilidade do

responsável pela pesquisa.

Desconfortos e riscos

Você não deve participar deste estudo se não se sentir confortável em responder questionários e/ou

participar de entrevistas gravadas sob o formato de áudio e/ou vídeo.

O questionário e/ou as entrevistas poderão causar algum tipo de constrangimento ou desconforto em

virtude das perguntas que serão feitas. Caso isso ocorra o pesquisador se compromete a esclarecer o

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motivo de tais perguntas ou questionamentos e caso o desconforto permaneça o pesquisador se

compromete a retirar as perguntas e não utilizar as respostas referentes às perguntas e/ou

questionamentos feitos.

Benefícios

As vantagens dos voluntários (as) que optarem por participar da pesquisa será a de contribuir para um

melhor entendimento da violência sofrida pelos árbitros (as) de futebol no Brasil.

Acompanhamento e assistência

Caso ocorra a necessidade de acompanhamento e assistência esta se dará por meio de contato

telefônico e email. Em havendo a necessidade o pesquisador se compromete a agendar um encontro

pessoal.

Sigilo e privacidade

Você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo, as entrevistas gravadas em áudio e

as filmagens não serão divulgadas e nenhuma informação será dada a outras pessoas que não façam

parte da equipe de pesquisadores. Na divulgação dos resultados desse estudo, seu nome não será

citado.

Rubrica do pesquisador:______________ Rubrica do participante:______________

Ressarcimento

Caso o sujeito da pesquisa venha a ter alguma despesa que seja fruto da participação na presente

pesquisa este deverá apresentar os comprovantes da despesa para o responsável pela pesquisa para

ressarcimento. O ressarcimento será feito por meio de depósito bancário e o comprovante será enviado

por email ao sujeito da pesquisa.

Contato: Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato com Profa. Carla Righeto

Endereço Profissional: Rua Ademar Manarini, no 60 , Campinas, SP, CEP: 13058-700 , Telefone:

(19) 32611244, Tel. Celular (19) 997727665, Email Pessoal: [email protected] (pesquisador)

Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação e sobre questões éticas do estudo, você

pode entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UNICAMP: Rua:

Tessália Vieira de Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19)

3521-7187; e-mail: [email protected]

Consentimento livre e esclarecido:

Após ter sido esclarecimento sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios

previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar:

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Nome do (a) participante: ________________________________________________________

_______________________________________________________ Data: ____/_____/______

_____________________________________

(Assinatura do participante ou nome e assinatura do seu responsável LEGAL)

Responsabilidade do Pesquisador:

Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na elaboração

do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Asseguro, também, ter

explicado e fornecido uma cópia deste documento ao participante. Informo que o estudo foi aprovado

pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado e pela CONEP, quando pertinente. Comprometo-me

a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as finalidades previstas

neste documento ou conforme o consentimento dado pelo participante.

______________________________________________________ Data: ____/_____/______.

(Assinatura do pesquisador)

Rubrica do pesquisador:______________ Rubrica do participante:______________

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TRANSCRIÇÃO 1

Entrevistado 1

Realizada em 25/08/2015

São Bernardo do Campo / SP

Bom, boa tarde, queria te agradecer demais pra, por você tá me recebendo aqui.

Magina! É uma satisfação poder ajudar.

E tá contribuindo pra, pra esta pesquisa.

Identificação

1. Seu nome completo

1.1.

1.2. Data de nascimento

1.2. 08/02/74:

1.3. Sexo

1.3. (x) Feminino

1.4. Escolaridade

1.4. Superior Completo

Você se formou?

Gestão Desportiva e Lazer

1.5. Profissão

1.5. Árbitra de Futebol.

1.6. Você foi atleta?

1.6. Por incrível que pareça não. A maioria dos árbitros são exs atletas, jogaram futebol. Mas eu não fui atleta

não.

1.7. De nenhuma modalidade esportiva?

1.7. Não, só na escola, na atividade física mesmo. Joguei Handei, vôlei, essas coisas, mais nada profissional, só

lazer mesmo.

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1.8. Em qual instituição você fez o seu curso de arbitragem?

1.8. Primeiro curso de arbitragem eu fiz em 2000 aqui em São Bernardo do Campo na Araputi, era uma empresa

de arbitragem, que é aqui em São Bernardo. Em 2003 eu fiz outro curso no Sapesp, que é o Sindicato de Futebol

do São Paulo e em 2004 eu fiz um curso na Federação Paulista de Futebol.

E por que você precisou fazer três cursos, eles não eram reconhecidos?

Não o daqui de São Bernardo na Araputi era só pra trabalhar aqui na região mesmo. O Sapesp é o sindicato de

árbitro é reconhecido, mas também só pra trabalhar no amador. E a Federação Paulista te dá o direito de

trabalhar em competições organizadas pela Federação Paulista de Futebol.

1.9. O da Federação em 2000?

1.9. Em 2004

1.10. Hoje você é filiada a qual instituição

1.10. Hoje eu continuo sendo filiada no Sindicato de Árbitros porque todo árbitro é necessário ser sindicalizado,

de preferência. Sou árbitra da Federação Paulista, no ano de 2007 entrei no quadro da Confederação de Futebol,

na CBF. Em 2012 eu entrei no quadro internacional, no quadro da FIFA. Então hoje eu sou das quatro entidades.

Em todas você tem vínculo?

Sim.

1.11. A arbitragem equivale a que porcentagem do seu rempo de trabalho?

1.11. Olha eu posso te falar que a arbitragem equivale a 90% do meu, tempo de trabalho. Porque eu me dedico

principalmente na arbitragem. Eu treino por causa da arbitragem, eu trabalho com isso, mesmo quando eu não

estou atuando no corpo do jogo, eu estou fazendo palestra, dando curso de árbitro, então na verdade a arbitragem

é minha principal atividade hoje, a minha única atividade hoje, eu vivo pra arbitragem e da arbitragem.

1.12. E ela equivale a quanto por cento da sua renda salarial?

1.12. 100%

2. Ser árbitro

2.1. Por que você optou em ser árbitra de futebol? Como a arbitragem de futebol entra na sua vida?

2.1. Eu sempre fui muito apaixonada pelo futebol e influenciada pelo meu irmão mais novo Eraldo, porque eu

sou de uma família de 6 filhos, 4 mulheres e 2 homens, onde eu sou a caçula e o Eraldo é o próximo depois de

mim. E fui criada em Juazeiro da Bahia, apesar de ter nascido no Pernambuco. Eu só nasci no Pernambuco, fui

criada em Juazeiro da Bahia e minha mãe falava assim: ‘’eu já tenho muito filho, não quero ninguém brincando

na rua e nem ninguém da rua brincando aqui’’. Então restava nóis brincar entre nóis nós mesmos, como eu e o

Eraldo éramos os mais novos ele não brincar de boneca comigo, eu que tinha que brincar de bola com ele, de

bolinha de gude, de soltar pião, então começou a paixão de futebol influenciada por ele, que ele é muito louco

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por futebol. E aí nós viemos pra São Paulo em 91 é, ele foi jogar bola no time da vila, eu sempre eu ia ver ele

jogando bola. Depois ele machucou o joelho, parou de jogar bola e fez o curso de árbitro, então eu sempre ia ver

ele apitando futebol estava no meio do futebol, jogo de futebol. E eu entendia muito de futebol, e os amigos dele

todos falavam: : ‘’você precisa fazer um curso, você é uma árbitra nata’’. E em 2000 eu fiz o curso aqui em São

Bernardo como eu já falei, em 2003 no Safesp e em 2004 na Federação Paulista de Futebol, mas já adianto que

eu não queria ser árbitra central, eu queria ser árbitra assistente, é, na época eu estava casada, e o meu esposo

falava assim pra mim: ‘’você tem que ser árbitra central porque você é muito mandona, você é muito

autoritária, você tem perfil de árbitra porque você manda demais’’. De tanto ele falar eu me convenci e fui

apitar, até então eu estava só bandeirando, fui apitar e realmente me dei muito bem apitando, tanto que cheguei

no quadro internacional, então ele tinha razão.

2.2. A pergunta seguinte diz respeito a alguma influência. Nào sei se você queria completar por você falou

do seu irmão, mas se teria alguma outra influência de fatos, pessoas...

2.2. Não, a influência foi o meu irmão mesmo o Eraldo.

2.3. E a reação dos amigos quando você falou que ia ser árbitra?

2.3. Olha, os amigos e a família sempre me apoiaram bastante porque sempre souberam da minha paixão pelo

futebol, sempre acompanhei meu irmão tanto jogando, quanto apitando. Então eles sabiam que era totalmente

envolvida com aquele meio, com aquele ambiente, então eles me apoiaram muito. E minha família me apoia

muito até hoje, graças a Deus.

2.4. Queria que você comentasse a sua trajetória no futebol. Quando você começa até os dias de hoje.

Como foi esta trajetória?

2.4. Vou falar pra você que apesar de, de estar no árbitro da FIFA, de ser uma árbitra internacional onde a gente

imagina que o árbitro internacional é o topo, é o limite, é, eu não sou ainda totalmente realizada, porque ainda

sinto que eu sinto muita resistência, muito preconceito no meio com a figura aí da mulher no meio futebol. Mas a

minha trajetória foi o seguinte, comecei aqui em São Bernardo do Campo em 2000, comecei bandeirando jogos

menores, José Roque, jogos é, Copa São Bernardo, jogos de menores expressão. Em 2003 eu fui fazer o curso no

Sindicato dos Árbitros, lá eu já tinha optado por ser árbitro central, onde a primeira escala já foi apitando né.

Apitando um jogo, bandeirando dois no clube Mercedes, onde eu tive assim um grande apoio do diretor de

árbitro na época, era o atual Júlio, que hoje é o atual presidente da Sapesp e de lá pra cá, ele veio me dando

oportunidades como Copa Metropolitana, na Copa Kaiser, no Campeonato da UOV, e eu fui tendo um

reconhecimento, em 2003 pra 2004 eu fui fazer um curso na Federação Paulista de Futebol, onde eu já cheguei

assim, com um certo nome né: ‘’poxa a [...]apita’’. Então assim, já abriu algumas portas da trajetória que eu

tinha desde ao ano 2000. Na Federação Paulista comecei fazendo também jogos da categoria de bases, sub 15,

sub 17 femininos, e teve uma época na Federação Paulista, 2005 e 2006, que foi bem complicado pra mulher né.

Onde ele já não dava tanto apoio pra mulher, árbitra de futebol, queria mais pra bandeirar, foi essa que eu tive

um pouco mais de resistência, mas assim, eu me mantive forte, era isso que eu queria, então eu não desisti. Teve

dirigente da Federação Paulista de Futebol, que falou assim ó: ‘’desisti de apita, vai bandeirar porque a

Federação Paulista não quer mais mulher apitando, se você quiser apitar você pode até chegar na 1, mas difícil

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de apitar. Porque apitando você não vai chegar em lugar nenhum, você vai passar no feminino sub 15 pro resto

da sua vida’’. A minha resposta foi: ‘’quando eu estiver escalada no feminino, no sub 15, eu vou lá e vou apitar

como se fosse a Copa do Mundo, porque eu to fazendo o que eu gosto, então eu não vou desistir. E a minha

esperança quem me veja apitando um sub 15 femininos e vê, ela apita direitinho e, alguém me vê no sub 17 e

fala pra me colocar no sub 20 e, esperar a oportunidade chegar. ‘’ E graças a Deus essa oportunidade chegou,

no dia 12 de outubro de 2003 eu tava apitando que não era jogo oficial, era um jogo dos árbitros de Brasília

contra os árbitros de São Paulo no Morumbi, onde pela primeira vez o Coronel Marinho me viu apitando, me viu

atuando, ele gostou da minha atuação, ele falou pra mim: ‘’se prepara que você vai ter sua oportunidade’’. Na

semana seguinte eu estava escalada pra apitar meu primeiro clássico que foi o Palmeiras e Corinthians sub 17 no

Flamengo de Guarulhos, na semana seguinte, na outra semana eu fui escalada pra apitar o meu primeiro sub 20 e

de lá pra cá eu tive uma sequência boa, isso já foi no final de 2006. No começo de 2007 entrei na Copa São

Paulo de Futebol Júnior, que é a vitrine de futebol, porque não tem nada no começo do ano, todo mundo tá de

olho na Copa São Paulo, e também pros árbitros que está buscando seu lugar ao solo, seu espaço, também é uma

grande oportunidade, porque são jogos bem disputados, equipes grandes, equipes de outros estados e graças a

Deus também eu tive um bom desempenho, nesse mesmo ano eu estreei no profissional na Federação Paulista.

Eu entrei na A3 que foi Independente de Limeira e União Barbarense e daí, no ano seguinte estreei na A2. Em

2010 entrei na A1 como quarto árbitro, em 2011 eu fui árbitro assistente adicional, aquele árbitro que ficava do

lado do gol, e de lá pra cá teve uma sequência boa. Infelizmente não consegui realizar ainda meu grande sonho

que seria apitar aqui no Paulista né, mas eu não perco as esperanças, eu acho que a esperança é a última que

morre e quando você tem um objetivo, quando você se dedica, quando você se prepara a oportunidade uma hora

aparece. Se não aparecer, pelo menos você sabe que fez tudo que lhe cabia, sua parte você fez.

2.5. Qual a imagem que você tinha da equipe de futebol antes de ser árbitra?

2.5. Sim, eu tinha um time de futebol sim. Porque seria hipocrisia falar: ‘’ah, não tenho um time’’. Porque

quando você entra pra arbitragem, você gosta de futebol. Se você gosta de futebol, você gosta de algum time

automaticamente, mas quando você entra pra arbitragem você esquece toda essa paixão e realmente pelos seus

colegas que estão no campo de jogo, do time da arbitragem. E a imagem que eu tinha era imagem nenhuma,

porque eu não via o árbitro em campo, antes de ser árbitra de futebol, eu nem me ligava em equipe de

arbitragem, realmente eu só me preocupava em torcer e nem, nunca, nunca visualizei assim: ‘’ah, o árbitro’’.

Também nunca xinguei árbitro, talvez inconscientemente eu achei que seria árbitro um dia, porque nunca

também xinguei árbitro. Xingava o jogador que perdia pênalti, um gol lá, mas arbitragem não.

2.6. Quando você se torna árbitra, qual a imagem da equipe de arbitragem?

2.6. Ah, quando se torna árbitro de futebol, na verdade você vai assistir o jogo, mas você não, não vê o jogo em

si, o futebol. Você vê as ações do árbitro, você vê a arbitragem, você vai pro jogo, você vai pro estádio, você vê

na televisão, você vê a atuação do árbitro. Então você já não se preocupa mais com o time, você se preocupa já

com a equipe de arbitragem. Por isso que eu falei que quando, você pra ser árbitro esquece seu time, porque você

não importa se o time que você torcia vai ganhar ou vai perder, na verdade você torce pro árbitro. Porque você

não quer que um time ganhe com um gol de pênalti que não pênalti, que foi um gol impedido, porque a gente

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sabe como o árbitro ta se sentindo. A gente se sente muito mal quando erra, então você passa realmente a torcer

pelo time da arbitragem.

2.7. Quando assiste seu time jogar, como você reage em relação ao trabalho do árbitro?

2.7. Não tenho time mais, meu time hoje é o time de arbitragem futebol clube.

2.8. Na sua opinião, qual a importância da função de árbitro? Como entende a função de ser árbitro de

futebol em um país com tantas diferenças sociais e sendo o futebol considerado uma paixão nacional, uma

religião?

2.8. Olha só, a função de ser árbitro é dentro do campo, e fora do campo eu acho que o árbitro age como

psicólogo. Porque é, as vezes todo jogador, não falo nem tanto no lado profissional, falando um pouco do

amador, é que as vezes o jogador amador passa a semana inteira trabalhando e sai de domingo pra se divertir.

Mas as vezes ele ta com problema em casa ou então a torcida vai só pra xingar o árbitro. O árbitro entra no

campo, ele já tá xingando, nem deu o direito de ele acertar ou errar, ele já tá xingando. Mas aí eu sempre falo pra

mim mesma, pros meus colegas, que esse é o papel social do árbitro, o cara tá com problema dentro de casa,

então ele desabafa, relaxa, põe pra fora[...]. A gente escuta, a gente ta aqui pra isso, afinal entra em um ouvido,

sai pelo outro, porque não dá pra levar a sério, o que a torcida fala, o que os jogadores falam, então eu acho que

o papel do árbitro é o psicólogo.

3. Situações políticas

3.1. Considerando-se a formação de um árbitro desde o Curso para formação de árbitro até a sua

ascensão à categoria de Árbitro Internacional (FIFA), como é a relação de trabalho, investimentos,

assessoria e suporte (psicológico, físico, intelectual, jurídico...) dados aos árbitros pelas Instituições

(Federação, Confederação, FIFA e Associação de árbitros) para o desenvolvimento profissional / humano?

3.1. Olha só, hoje de uns 3, 4 anos pra cá, melhorou muito, essa relação da entidade se preocupar com árbitro,

com o ser humano. Se preocupar com a parte psicológica, a parte física, mas eu ainda acho que tá muito, muito

além do que podia ser, acho que ainda tá bem atrasado, poderia fazer muito mais coisa pra reverter pro árbitro.

Porque é muita, é muita responsabilidade, é muita, é uma carga muito pesada que o árbitro leva né. Ficar

mexendo com milhões em dinheiro, que milhões de pessoa de paixão. Então eu acho que ele deveria ter uma

coisa maior aí, em relação a parte psicológica é, na parte física, mas acho que a gente ta caminhando pra mudar

isso. Hoje no quadro da CBF, a Confederação Brasileira de Futebol, nós temos uma psicóloga que nos

acompanha, que a gente faz consultas mensais, passa relatório pra ela de como a gente tá, como tá nosso

treinamento, como tá nossa vida pessoal, no geral. Na Federação Paulista também tem, não é um

acompanhamento tão especifico e os treinamentos físicos são feitos periodicamente na Federação Paulista, onde

tem um convênio próximo ali na Barra Funda, que a gente faz um treinamento técnico de físico. Mas eu ainda

acho que podia ter um investimento maior, porque eu acho que é muita responsabilidade que o árbitro carrega

pra não ter tanto investimento no árbitro né. É tanta cobrança, tanta dificuldade, eles cobram tanto do árbitro,

mas eu acho que não tem tanto retorno, não tem tanto investimento como deveria ter.

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3.2. Comente:

3.2.1- Os critérios de mudança de categoria e indicação ao quadro nacional, utilizados pela

comissão de arbitragem.

3.2.2- Os critérios de mudança de categoria e indicação ao quadro internacional (FIFA), utilizados

pela comissão de arbitragem.

3.2.3- Escalas dos jogos (sorteios)

3.2.4- Valores pagos a arbitragem

3.2.1. Aqui na, eu posso falar diretamente da Federação Paulista porque é da onde parte tudo. Federação Paulista

indica os melhores da CBF, que ta indicando pra FIFA. Aqui na Federação Paulista de Futebol, depois que o

Coronel Marinho assumiu em 2005, depois que teve o problema da máfia do apito, foi criando o ranking, ranking

da arbitragem, onde os árbitros são divididos por categoria especial, categoria 1, categoria 2, categoria 3,

categoria 4, categoria 5 e estagiário. Onde na especial até categoria 3, o árbitro pode fazer jogos profissionais e

também jogos amadores, jogos da categoria de base. Categoria 4, 5 e 6 e estagiários são mais jogos pra fazer

amador ou feminino. Esse mundo de avaliação a gente é avaliado pelo teste físico, que são 2 testes físicos no

ano. Um no final do ano e um no meio do ano, tem prova teórica também, uma no meio do ano e um no final do

ano, é, relatórios dos observadores que vão nos jogos, que vê o seu desempenho no campo do jogo, aplicando

bem todas as técnicas de arbitragem e esse observador ele te dá uma nota e tudo isso vai pro seu prontuário, onde

no final do ano a comissão de arbitragem se reúne, vê os árbitros que tiveram as melhores notas, tanto em teste

físico, quanto em jogos. Prontuário também pediu, o regulamento da Federação Paulista em relação a vestimenta,

então você tem que tá enquadrada toda num procedimento, na que eles pedem, ao final do ano os melhores

sobem de categoria. No caso 4 sobe pra 3, o 3 pra 2, o 2 pra 1 como também pode cair, então tem essa, como

diria no senado, é a dança das cadeiras né. Na Federação que ta dentro das posições.

3.2.2. O critério de mudança de categoria na indicação pra internacional, na Confederação, como

funciona isso?

Então na CBF alguns árbitros, que eu não sei qual é, qual tipo de que forma é feito a escolha, ao contrário, eles

passam a ser aspirantes. Árbitro aspirante a FIFA, árbitro central aspirante a FIFA, que deve ser também pelo

desempenho nos jogos, no teste físico, na prova teórica, que a gente também tem prova teórica. Teste físico na

CBF, e os jogos, também os jogos, creio eu que seja pelo desempenho, os melhores são indicados a ser aspirante.

E dentro dos aspirantes, a partir do momento que surge uma vaga pra, pra ter árbitro assistente, dentro dos

melhores escolhidos. Porque no caso, aqui na Federação Paulista de Futebol, tinha três árbitros FIFA, era o [...] e

o [...]. Aí o[...] saiu, o escudo dele foi pra outro árbitro que já estava, ficou o[...] e o [...], os dois saíram,

automaticamente entrou os dois que eram aspirantes São Paulo. No caso, o[...] e o[...].

Quem indica pra FIFA é a Confederação?

É a CBF, é a Confederação Brasileira de Futebol.

E no mesmo jeito que a Confederação Paulista tem todo um regimento de ranking, na Confederação não

existe?

Deve existir sim.

Mas não claro pra todos, como funciona...

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Pelo menos eu não tenho conhecimento.

E quantas vagas o estádio tem de árbitros e assistentes? Ou não existe um número certo de vagas pra

árbitros internacionais na Confederação?

Não tem mais essa coisa de a, o estado de São Paulo tem dois, o estado do Rio tem dois não, quem decide agora

é a.... Confederação.

3.2.3. O sorteio de escala é um tema bem, bem delicado que as nossas entidades de classe vêm lutando bastante

pra tentar tirar isso do estatuto do torcedor porque tá no estatuto do torcedor. Então tem que ser respeitado, mas é

uma coisa que ninguém concorda, acho que nem os dirigentes da arbitragem, da federação, da CBF concorda

porque fica difícil até pra eles também pra fazer essa escala, esse sorteio. Eu também acho que eles preferiam

que não tivesse, mas como a gente tem que seguir a constituição que tá lá na, no estatuto do torcedor, que tem

sorteio, então respeita o sorteio. Mas eu acho que prejudica um pouco a carreira do árbitro porque como um

Campeonato Paulista um árbitro internacional, apitou 4 jogos porque ele não era sorteado, sendo que se fosse por

escala, com certeza ele teria um número maior de jogos porque um jogo importante, sabia que ele podia ter

apitado aquele jogo seria muito mais fácil pra comissão de arbitragem escalar ele e até pra comissão de

arbitragem fica difícil. Porque as vezes tem um jogo que precisa daquele árbitro, só que você tem que colocar no

globo quatro árbitros, e as vezes cai um que você queria que não caísse, mas tem que tá lá no globo, então o

sorteio eu acho que não ajuda em nada a arbitragem, nem estadual, nem Brasileira. E as escalas seguem esse

critério, então na verdade tipo assim, o árbitro é escalado se ele for sorteado.

Não existe um controle entre um número de árbitro e um número de jogos?

É difícil ter esse controle por causa do sorteio.

Então eu tenho árbitro que trabalham muito e tenho árbitro que trabalho pouco?

Sim. Infelizmente por causa do sorteio, sim, se não tivesse o sorteio era mais fácil controlar.

3.2.4- Pensando no mundo do futebol eu acho que os valores pagos são um absolutamente baixo, o dinheiro que

envolve o futebol, nessas novas arenas aí que as torcidas estão apanhando suas equipes, onde envolve milhões,

onde um árbitro de futebol receber 3 mil reais é dinheiro de pinga pra eles que, com a renda que teve no jogo,

mas se você pensa na situação sócio econômica do país, se você pensar o cara em 90 minutos ganha 3 mil reais

daí é muito, que as vezes tem um pai de família que trabalha o mês inteiro e não ganha metade disso. Mas

falando no futebol, primeiro que envolve, o futebol, acho que é pouco o cache que eles pagam pela

responsabilidade que ele carrega, porque é muita, é muita pressão que o árbitro carrega, é muita

responsabilidade, de não poder errar, óbvio que vamos errar sempre, nós somos seres humanos. Mas a

responsabilidade é muito grande pra, pra o dinheiro que a gente recebe, grandes rendas de jogadores, os valores

exorbitantes que recebem, os treinadores. E o principal pessoa que tem que ter que realizar o jogo, porque sem o

árbitro de futebol, apesar da gente ser odiado, mas sem árbitro de futebol, não tem jogo.

4. Relações Humanas

4.1. Como são as relações pessoais com os colegas de arbitragem? (Competitividade e/ou companheirismo

e parceria).

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4.1. Olha, a relação do árbitro de futebol é mais de parceria do que de competitividade, apesar de acontecer a

competitividade entre nós, que é fato, que a gente tem sempre que fazer o melhor porque ao final do ano poderia

subir de categoria e fazer melhor os jogos, isso é fato, a competição existe. Só que é uma competição saudável,

um torce pelo outro, apesar da gente ser concorrente a gente torce pelo outro, porque tem espaço pra todos. Se

você tiver competência, se você tiver qualidade, vai ter espaço pra todos. Então tem muita parceria, um exemplo

meu mesmo, eu sou aqui do ABC Paulista e a gente tem um grupo de árbitro aqui do ABC, de São Bernardo, de

São Caetano, de Santo André, onde a gente se reuniu, contratou um professor que passa treino pra gente e

acompanha a gente nos treinos, então fica tudo mais gostoso, tudo mais prazeroso, você treinar numa turma.

Porque as vezes tá frio, as vezes você tá cansado, não a afim mas o colega já liga e já fala: ‘’vamo treina hoje,

vamo lá, tal’’. Cê chega na pista desanimado, o cara já fala ‘’vamo aí, vamo faze o treino proposto pra hoje’’

Então um acaba incentivando o outro, motivando o outro. E é assim uma relação de muita parceria e isso no

geral, nos árbitros brasileiros, árbitros estaduais. Óbvio que tem um ou outro que não se dá bem, mas isso é ser

do árbitro, de ter parceria, até no dia a dia, foi só quando num, não consegue um convívio na sociedade, pode ser

em qualquer meio que seja, no familiar, no meio do trabalho, no meio da arbitragem, mas é um problema dele. A

grande maioria tem muita parceria.

4.2. Existem muitos comentários sobre as escalas: quem deveria trabalhar em determinados jogos?

4.2. Ah existe! Existe, existe, porque seria hipocrisia eu falar pra você que não, não existe não, é tudo um mar de

rosas, não é. Nós somos seres humanos, a gente reclama quando não ta escalado, a gente reclama assim: ‘’ah,

porque que ele foi semana passada, essa novamente e eu não tô’’. Esse tipo de comentário existe, em qualquer

meio de sociedade existe, e não adianta falar que na arbitragem não tem porque seria mentira, seria hipocrisia.

4.3. Comente as suas relações com jogadores, comissão técnica, torcedores, espectadores e mídia, durante

a partida e não exercendo a função de árbitro.

4.3. Dependendo da comissão técnica, dependendo da equipe, dependendo do jogador, é bem difícil a, a

convivência, a relação. Porque que nem eu te falei, as vezes é do indivíduo, se ele não, não, não convive bem vai

ser em qualquer lugar que ele tiver, e tem realmente alguns jogadores, alguns técnicos, algumas comissões que

são problemáticas, que são mal-educados, que são reclamam acentuadamente, que gesticulam. Jogador que não

você não bate uma falta ele já quer reclamar, já quer abrir o braço, já quer xingar, só que vai da pessoa, do

indivíduo, não é uma questão de: ‘’ah, é porque é jogador’’. Eu acho que se tivesse, sei lá, jogando tênis,

jogando vôlei, jogando basquete, qualquer coisa, qualquer meio que ele iria ter esse comportamento, porque é

dele, não é por causa do futebol. Eu particularmente, não tenho muito problema com as condições técnicas

porque já tô na arbitragem aqui no estado de São Paulo há 11 anos, eu tenho um respeito, já conhece, já tem um

nome assim, já tem uma reputação, o cara vem resolver e você já sabe quem é. O cara não é que eu vou pro

campo do jogo que eu... Eles respeitam bastante, eu sinto até, os jogadores e as comissões técnicas me respeitam

mais do que respeitam os homens, porque com homem ele vai falar no linguajar dele, de homem pra homem.

Comigo não, eu sou mulher, ele não vai falar uma coisa que ele fala pra homem, não vai falar pra mim, então já

tem aquele cuidado, aquele jeito de lidar com a árbitra feminina e, é isso.

5. Tecnologia e mídia

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5.1. Você é a favor do uso da tecnologia nas partidas de futebol para auxiliar a arbitragem?

5.1. Depende que tipo de tecnologia, hahaha. Se for a tecnologia que vai beneficiar o árbitro eu vou. No caso de

rádio comunicadora que as equipes de arbitragem usam, o sistema de detectar o gol, que eles têm um relógio se a

bola entrou totalmente ou não, chega um sinal sonoro no braço do árbitro e ele pode validar o gol ou não, esse

tipo de tecnologia é super, hiper, válido. Agora a tecnologia que só serve pra crucificar o árbitro, onde a gente

tem 3 segundos de jogo, pra uma jogada de falta, se não foi falta, se foi impedimento, não foi impedimento, e aí

o cara tá atrás da câmera monitorando, 30 câmeras pra poder definir se realmente tava impedido ou não, se foi

pênalti ou não. Esse tipo de tecnologia eu não concordo porque acaba sendo desumano pro árbitro, porque no

campo do jogo é com dois olhos e os sentidos que a gente vai decidir, só que nós somos crucificados pelas

câmeras, pelas milhões de câmeras que está no estádio de futebol. Então eu acho desumano com o árbitro de

futebol e depois reprisar várias vezes pra o, pra o analista lá da Seleção falar: ‘’não, realmente errou, coisa e

tal’’. Poxa, na Seleção ele vê em cinco tvs e nós ali na hora que tem 3 segundos pra decidir, então esse tipo de

tecnologia eu acho desleal, desumana com o árbitro.

Existem algumas questões tecnológicas, recursos na tecnologia que tão tentando ser testados né, pela

FIFA, alguns testes são feitos na Holanda do monitor ser a favor do árbitro. Esses recursos que estão

sendo testados para, como por exemplo, no voleibol, você é a favor disso, ou não? Se for pra benefício do

árbitro mesmo que mude um pouco a dinâmica da partida?

5.2. Caso a resposta da questão anterior seja afirmativa, quais são os recursos tecnológicos sugeridos que

você aprovaria?

5.2. Eu basicamente sou apaixonada por futebol, que sou uma amante do futebol, que sou eu não concordo.

Porque eu acho que ia acabar aquela cultura de, no outro dia chegar e comentar com o amigo, aquela brincadeira

no trabalho, na família de: ‘’ah seu time perdeu, seu time ganhou e coisa e tal ’’. Eu que a, o futebol ele é muito

dinâmico por isso que até hoje num, num entrou esse tipo de recurso pra, no tênis pode fazer se foi dentro ou foi

fora, no vôlei dá pra ver, mas o futebol é muito dinâmico. Já pensou? São 90 minutos, as vezes quando para pra

um atendimento, pra um, pra uma substituição, pra qualquer coisa parecida o árbitro já dá um monte de

acréscimo e já foi pouco, imagina se você parar pra decidir: ‘’perai, vamo olha no monitor se foi, não foi’’. Isso

você vai perdendo no mínimo um minuto e meio, um minuto, sei lá, pra poder, volta, vê, volta de novo. Então eu

acho que acaba com a dinâmica do futebol, ia perder a graça, o jogo não ia ter mais 90 minutos, ia ter 1 hora e

20, porque quantas decisões são contestadas de futebol várias durante os 90 minutos são contestadas, se toda

decisão foi contestar vamo para e vamo olha o monitor, pra mim ia perder a graça. Como amante de futebol,

como árbitra de futebol, eu acho que não seria interessante não, então eu não sou a favor não.

6. Mídia

6.1 Como você avalia o trabalho da mídia no futebol em relação:

6.1.1 Ao desempenho da equipe de arbitragem nos jogos

6.1.2 Ex-árbitros comentaristas

6.1.3 A responsabilidade / influência da mídia em relação à violência nos estádios

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6.1.4. A responsabilidade / influência da mídia em relação à violência contra a equipe de

arbitragem

6.1.1. Como eu falei é desumano essa, esse tipo de análise, porque um comentarista de futebol ele tá equipado de

várias câmeras, várias imagens que chega pra ele, ele vê 4,5 vezes pra ele poder dar o parecer dele. O árbitro vai

decidir ali em 3 segundos, com a foto que ele tirou aquele momento. E aí depois o comentarista de arbitragem

crucifica o árbitro por causa daquele erro, mas porque ele viu na tecnologia, e a maioria dos comentaristas de

futebol são exs árbitros e eles na época deles, geravam muito mais, mais muito mesmo. Só que não tinha câmera

pra ser cobrado, então hoje tá fácil pra ele comentar ou não na verdade, comentar o árbitro, hoje tá fácil pra ele

porque tem milhões de câmera pra ele olhar. Será que ele lembra quando ele tava lá no jogo? Qual era a

dificuldade que ele tinha, o quão era difícil apitar uma partida de futebol, pra hoje ele ficar criticando o árbitro,

formando opinião. Eu acho, eu não vou nem falar o que eu acho, eu acho um absurdo.

6.1.3. Eu acho que sim, porque eu acho que com esses comentários que a mídia faz, com esses comentários....

Quando é ex árbitro de futebol você entende um pouco porque o cara foi árbitro, mas tem muito comentarista

que nunca pegou um livro de regra, não sabe nem quantas regras tem no futebol e ele comenta absurdos, isso ele

forma uma opinião. Se ele forma uma opinião negativa em relação a árbitro, ele tá indiretamente ou diretamente

insultando aquilo ali. Ele acaba sendo responsável sim, pela violência nos estádios, violência com os árbitros,

com os assistentes porque a gente tem alguns casos que o árbitro, a equipe de arbitragem foi agredida ou

insultada, ou a caminho do estádio, em tudo isso eu acho que a mídia tem uma grande responsabilidade porque

ela é formadora de opinião. Então as vezes eles fazem um tipo de comentário desnecessário e errôneo, quando

comenta desnecessariamente mas comenta com coerência, não tá certo mas é desnecessário. E as vezes tem coisa

que não adianta passar, ao não ser a incitar a violência.

7. Violência

7.1. Poderia me explicar o que você entende por violência?

7.1. É uma boa pergunta, hahaha. O que eu entendo sobre violência? Olha eu acho que a violência é a

incapacidade do ser humano não conversar, não resolver no diálogo. Na discussão, o tipo de discussão verbal

assim, conversar, não já partir pra, é, violência verbal, agressão verbalmente ou até mesmo agressão física. Então

eu acho que a violência, a incapacidade do ser humano de poder tentar esclarecer as diferenças, a esclarecer a

opinião, falar a dele, escutar a do outro e respeitar, ter a capacidade do ser humano a respeitar as diferenças.

Você reconhece então que a violência pode ser simbólica ou ela pode ser simbólica?

Sim, sim, sim. Pra mim a violência verbal, dependendo do que for falado é pior que um tapa na cara, eu assim,

no meu caso particular, eu nunca fui agredida de fato com um tapa, com um soco. Tentativa eu já tive, mas

nunca fui agredida chegar a...., mas eu fui agredida de uma forma verbal que me machucou muito mais que eu

não esqueço até hoje, talvez se tivesse me dado um tapa eu já tivesse esquecido. Mas as palavras que foram ditas

machucou muito mais, é um tipo de violência sim.

7.2. Você já sofreu violência na função de árbitro?

7.3. Quais os tipos de violência que você já sofreu?

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7.2. e 7.3. Diretamente não. Uma violência assim, é, nunca fui agredida né. Nunca colocaram a mão em mim,

apesar que já teve tentativas, tanto no amador, quanto no profissional pelo jogo da Copa do Brasil Feminino

onde uma equipe que foi desclassificada e na hora que acabou o jogo a equipe veio tentar me agredir. Se não

fosse a guarda municipal, o policiamento que tava no campo de jogo, eu seria linchada, talvez não estivesse aqui

nem pra, pra ta dando entrevista. Por que? Pelo simples fato de ter perdido o jogo, com o que eu faço o jogo, gol,

com essa altura nem eu posso fazer e se eu fosse jogadora, eu não era árbitra. E pra mim é uma violência sim,

porque pra mim o que importa é a tentativa, elas tentaram me agredir, só não agrediram porque graças a Deus

tinham anjo da guarda lá. E um outro tipo de violência, que eu sofri, que nossa, até hoje eu não esqueço como eu

falei, foi um jogo aqui em São Bernardo, no estádio Primeiro de Maio, válida pelo campeonato da OAB, Ordem

dos Advogados do Brasil, onde eu fui xingada de uma forma tão, tão, baixa, tão, sei lá o que falar viu, porque me

machucou demais, até hoje eu não esqueço. E foi só uma agressão verbal, mas que pra mim marcou muito.

7.4. Qual era o campeonato / evento e a importância da partida?

7.4. Um era disputa, era quartas de final da Copa do Brasil Feminina de 2014, quando era jogos eliminatórios,

jogo de ida e jogo de volta. Era o jogo da volta, então era partida decisiva onde a equipe ficou fora. E esse outro

que eu te falei foi não foi uma partida decisiva nem nada, o cara perdeu a cabeça mesmo, sei lá.

7.5. Qual era a categoria do jogo (faixa etária dos jogadores)?

Os jogadores dessa partida eram advogados?

Sim, o que me agrediu era advogado sim. O que me deixa mais triste ainda, porque eu já fiz jogos em

comunidades né, é que os cara chama de favela, mas agora não pode mais chamar favela, tem que chamar

comunidade né. Já fiz muito jogos em comunidade, assim o nível intelectual das pessoas que estavam jogando

baixíssimo, talvez nenhum, mas as vezes me respeitaram muito mais, nunca tive esse tipo de problema em,

nesses jogos. E aí o jogo da OAB, o Campeonato da OAB onde só jogam advogados, eu fui agredida dessa

forma, isso que me deixa mais triste, ou não né, porque aí você fala, não é o nível cultural da pessoa que vai

levar a ser educado ou não, se tem respeito pelo próximo ou não.

7.6. De quem partiu a violência:

7.6.1 ( ) jogadores

7.6.2 ( ) comissão técnica

7.6.3 ( ) torcedores

7.6.4 ( ) espectadores

7.6.5 ( ) policiais

7.6.6 ( ) jornalistas

7.6.7 ( ) outros

No caso campeonato foi o jogador

No caso da equipe, foi a equipe toda. Só as jogadoras, na verdade a comissão técnica tentou conter. Mas foi as

jogadoras.

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Em relação aos jogadores você acha que o nível cultural, sócio econômico interfere e tem diferença em

relação ao torcedor?

Eu acho que não, eu acho que não, porque é como te falei, não depende do intelectual do indivíduo, acho que é

dele. Porque as vezes você vê pessoa de, de, de nível cultural baixo, ou nenhum, intelectual nenhum e tem

respeito pelo próximo, pela figura do árbitro, pela figura do, do assistente. Aí você fala assim: ‘’como, o cara

não tem nem estudo. É, mas ele tem educação’’. Porque tudo eu acho que é uma coisa, educação é outra que

você tem e eu não tenho. E as vezes tem pessoas que tem o nível intelectual lá em cima e tem é, graduado, pós-

graduado, mestrado, só que ele não tem educação nenhuma, ele não tem respeito nenhum com o ser humano.

Então eu acho que isso aí não tem nada a ver com nível intelectual, eu acho que vai um pouco da criação da

pessoa, da, da família, não sei, eu acho que não sei.

7.7. Os dois casos que você citou no Campeonato Feminino a violência ocorreu antes, durante ou após a

partida?

A violência ocorreu:

7.7.1 ( ) antes da partida

7.7.2 ( ) durante a partida

7.7.3 ( ) após a partida

Após.

E no Campeonato Masculino?

Durante. No caso especifico.

7.8. Local em que a violência ocorreu:

7.8.1. ( ) No terreno de jogo

7.8.2. ( ) Nas dependências dos estádios

7.8.3. ( ) Fora das dependências do estádio

Nos dois casos dentro do campo do jogo.

7.9. Na sua opinião o que motivou a violência/agressão?

7.9. No primeiro caso, no jogo da OAB pra mim o que motivou foi a falta de educação, e a falta de respeito com

a figura do árbitro, porque talvez o cara fosse um, não sei, porque além de ser advogado, ele pode ser um reitor,

pode ser um oficial de justiça, pode ser qualquer coisa que tem direito. Então ele se acha o dono da razão, o

poderoso, mas ali no campo do jogo quem manda é o árbitro, e talvez ele, ele teve dificuldade de aceitar que ali

ele era só mais um, só mais um jogador entre os 22, que ele ali não tinha privilegio nenhum, era exatamente

igual o outro e quem mandava, quem tava superior a ele, no caso era eu e o outro árbitro. E no caso da, da, do

Jogo Feminino o que motivou foi a falta de, de preparo psicológico nas meninas, porque eu sempre falo, o jogo

de futebol tem três resultados, a vitória, a derrota e o empate. E tem que estar preparado pra um desses três

resultados, e tem que ser construído dentro do campo do jogo, que não vai ter um fator externo ou um árbitro vai

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fazer eu ganhar. É o, você faz isso dentro do campo do jogo, elas sofreram um gol, acabou o jogo, perderam a

cabeça, falta de preparo psicológico. E infelizmente nós temos mais no futebol feminino, esse despreparo, esse

destempero as mulheres não estão muito acostumadas, eu sou mulher, to num futebol, é por estar, é por saber da

dificuldade, as mulheres não tem esse autocontrole. Porque no jogo masculino, um cara quer brigar sempre

chega, a turma deixa disso pra segurar, o que quer brigar. Num jogo feminino, quando as meninas querem brigar,

as outras não querem nem saber porque elas tão brigando, quer brigar também. Então, é.... essa é a realidade, não

adianta a gente contar historinha pra você, tem que falar a verdade.

7.10. Em relação à segurança / violência, quais são as diferenças entre trabalhar em jogos amadores /

profissionais, Série A e Série B?

7.10. Em todos os campeonatos organizados pela Federação Paulista de Futebol, pela CBF tá no regulamento da

competição precisa ter segurança externa né, policiamento, precisa ter ambulâncias equipadas com ventiladores e

tudo mais. É obvio que o jogo de campeonato da séria A1 o número de, de policias é maior, mas até se entende

porque o público também é maior, então tem que ter a segurança, tanto dentro do campo de jogo, como fora.

Então realmente a segurança é maior, o número de segurança é maior, em todos os jogos que não tiver

policiamento, não se deve começar a partida de futebol. No amador o Deus guarda hahaha, Deus é a nossa

segurança, amador é amador, a gente já ta falando.

7.11. Como você avalia a segurança nos estádios e a segurança dada a equipe de arbitragem?

7.11. Nos jogos profissionais, da Confederação Paulista de Futebol e da CBF, porque o jogo da Confederação

Paulista fica responsável por esse, esse deslocamento. Os jogos profissionais nós vamos com o nosso carro até a

Federação Paulista e lá, pegamos um taxi. Aí a equipe de arbitragem vai indo pra um só táxi, entra no estádio

numa vaga reservada pra arbitragem, o táxi continua lá parado, não sai do lugar esperando a gente, pra ir e voltar

nos jogos da Federação Paulista. Nos jogos da Categoria de Base que no caso é amador também, mesmo sendo

da Federação Paulista é amador porque é categoria de base né, sub 11, sub 12, sub 13, sub 15, sub 17, sub 20

femininos, a Confederação Paulista paga o valor do deslocamento, mas a gente que tem que ir pro campo.

Assim, geralmente esse, se não é todo mundo da mesma cidade, tem um ponto de encontro pra chegar todo

mundo junto e de preferência em um carro só, que é pra você, num, num, pelo um modo de segurança chegar

todo mundo junto, pra não ter nenhum tipo de problema.

No caso de deslocamento de táxi, existe um grupo, que cada dia é motorista diferente?

Tem uma equipe né que a pessoa é responsável pelo esse. Tem uma equipe que uma pessoa é responsável pra

escalar os árbitros, pra cada jogo mais não é sempre o mesmo motorista que a gente pega uma hora é um, uma

hora é outro, mas é sempre a mesma equipe de motorista.

7.12. Como você vê e interpreta a violência contra árbitros?

7.12. Como eu interpreto a violência contra os árbitros? É, é, é.... qualquer tipo de violência é inaceitável né,

ainda mais contra um árbitro, que é o que eu sempre falo, o cara tá se divertindo, a gente tá trabalhando, até os

jogadores estão se divertindo, acaba sendo uma forma de lazer para os jogadores. O torcedor que ta no estádio

ele tá divertindo, ele escolheu tá lá. O árbitro não, o árbitro tá trabalhando, então imagina você. Você tá

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trabalhando, seu caso é, você é professora, você tá numa sala de aula você toma um tapa, um soco, um chute de

um aluno, você trabalhando. Então assim, é inaceitável, a violência, qualquer tipo de violência, de qualquer tipo

de pessoa é inaceitável e pro árbitro ainda mais. O árbitro tá trabalhando, ele não tá lá se divertindo, ele tá lá

trabalhando, enquanto todos se divertem, o árbitro tá trabalhando.

7.13. Uma pesquisa realizada com árbitros de futebol na Áustria tinha como objetivo investigar quais as

situações de conduta antidisciplinar de jogadores e técnicos que levavam um árbitro a utilizar um cartão

vermelho. As respostas mais citadas pelos árbitros foram: Ofensas relacionadas à capacidade técnica, a

aparência física, ao caráter, a orientação sexual e outros. Qual é o tipo de ofensa citados na pesquisa que

você menos tolera tornando possível a punição com o cartão vermelho?

7.13. Olha eu vou falar pra você. Então na verdade, eu nunca tive esse tipo de problema assim, porque eu

também acho que assim, que o grau de ofensa ou de reclamação depende muito assim, de erros e acerto da

arbitragem né. Então se um árbitro infelizmente tiver errando muito, o cara vai falar que você não sabe nada, que

você não apita coisa nenhuma. Então tipo assim, meio você não pode nem achar ruim, porque você tá errado,

então esse tipo de problema eu nunca tive. No caso que o, que o, que o advogado me ofendeu foi depois de uma

marcação de uma falta e ele não me ofendeu assim, dentro dessas ofensas aí, foi uma ofensa moral, direto com a

minha pessoa entendeu. Porque esse tipo de problema eu nunca tive no meio do jogo. ‘’Ah, porque você é muito

ruim e coisa e tal’’ porque o jogador ele tem que respeitar o árbitro. Porque se ele não respeita uma coisa dessa,

não vai ter perdão, você é uma muito brava, sei lá. Esse tipo de problema dentro do campo de jogo, eu não tive,

não tive. Uma ofensa que eu tive, foi uma ofensa moral completamente, depois que desligar o microfone eu te

falo hahaha.

7.14 Na sua opinião, quais ofensas são de maior relevância?

7.15. Você poderia numerar as ofensas de acordo com a gravidade e necessidade de punição?

7.15.1 ( ) capacidade técnica

7.15.2 ( ) a aparência física

7.15.3 ( ) caráter

7.15.4 ( ) orientação sexual

7.15.5 ( ) outros

8. Stress e Autocontrole

8.1. Você poderia numerar quais são os motivos de maior tensão e stress:

8.1.1. ( ) Você ou a equipe de arbitragem sofrer agressão

8.1.2. ( ) Falta de segurança nos estádios

8.1.3.. ( ) Trabalhar em partidas de equipes com as quais você já teve problemas em partidas

anteriores

8.1.4 ( ) Atrasos e pontualidade

8.1.5 ( ) Pagamentos de taxas

8.1.6 ( ) Cometer erros em momentos decisivos da partida

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8.2. Quais são as atitudes de jogadores e técnicos que dificultam seu trabalho de árbitro?

8.2. Primeiro o pra mim que mais me estressa é trabalhar em equipes onde eu já tive problemas anteriores,

porque você já vai pro jogo com um tipo de preocupação a mais né, porque a equipe já não tem uma certa

tolerância com você. E aí você, olha no jogo, e essa equipe de novo, então você já começa a se preocupar. Então

é um estresse maior, é atrasos e pontualidades também é uma coisa que me irrita bastante e as equipes também

quando, quando atrasam, quando entrega documentação atrasada assim, irrita porque tira você de um

cronograma que também, da rotina que você precisa fazer no vestiário. Então assim, se eles não entrega no

horário, aí você já fica com o pouco tempo bagunçado, não segue uma ordem assim. Eu sou muito organizada, ó

duas horas a gente chega, vamos olha o estádio, vamo olha o campo se tá tudo ok. Depois a gente se troca, tem

tudo um cronograma e se uma dessas partes não funciona, aí já gera um estresse. Falta de segurança, mas aí a

falta de segurança aí já não, já não é muito um problema, onde não tem a segurança, já não faz jogo. Aí passa a

ser um problema do responsável pelo campo, da equipe do campo, que é eles que tem que providenciar. A

equipe de arbitragem sofrer alguma agressão também é uma coisa que incomoda bastante, que é um fator de

estresse sim. Cometer um erro em momentos decisivos, mas aí tem que ter, você tem que saber ter o autocontrole

né, se você sabe que cometeu um erro, você tem que ter o autocontrole, tem que discernir e bola pra frente, o

próximo lance tentar acertar, não dá pra você ficar pensando no que você errou porque você tem uma próxima

jogada, você tem que ter uma decisão acertada também pra tirar aquela imagem que ficou do erro, então você

precisa acertar o próximo. E o último é o pagamento de taxas, porque isso daí com certeza a gente vai receber.

Não.

Quais as atitudes de jogadores e comissão técnica que dificultam o teu trabalho?

A atitude de indisciplina, falta de educação é, reclamação acintosa, gesticulando. Esse tipo de atitude dificulta

porque as vezes o jogo tá tranquilo e o técnico, a comissão técnica tá irritada, tá gesticulando e as vezes isso

passa pro jogador, tá tudo sob controle e o cara tá louco fora do campo, transfere pra dentro do campo e acaba

passando pro jogador, acaba estressando o jogo e a sua atuação no jogo. Então esse tipo de atitude acaba

dificultando o trabalho dentro do campo de jogo.

Apesar de não estar aqui no roteiro, eu queria te fazer uma pergunta, se você. Uma coisa que me causou

muita surpresa, foi quando eu estava definindo o projeto, eu tinha definido com minha orientadora, que

nós tentaríamos entrevistar os árbitros FIFA. E foi surpresa descobrir que a mulher que era FIFA em São

Paulo porque quando eu chequei o site da Confederação, eu acho que foi bem no momento da transição do

Paulo César né. E a gente não viu assim muitas escalas, então eu queria que você comentasse se você

considera isso uma forma de violência, em relação a mulher, em relação ao gênero que você tem toda uma

capacidade técnica pra tá atuando, mas se você tem menos oportunidade porque você. Então é uma

pergunta que eu to acrescentando, mas eu queria que você comentasse como vê esse tipo de conduta, se

você considera isso uma violência

Eu considero sim, porque como você falou, nós mulheres. Tem eu que sou FIFA, e tem mais quatro árbitras

centrais na Federação Paulista de Futebol e realmente a gente não tem as mesmas oportunidades que tem os

homens, que são mesmas categorias, é de referência né. No caso eu sou categoria 1, eu não tenho o mesmo

número de jogos que a outra categoria tem, se eu to na categoria 1 eu tenho que ter o mesmo número de jogos.

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Aí o que estão na mesma categoria, não tem o mesmo número de jogos, quer dizer, a gente tem menos número

de jogos, menos oportunidade, pra mim é pelo simples fato de ser mulher sim é, porque nós somos cobradas da

mesma forma, nós somos cobradas no mesmo teste físico, prova teórica, no procedimento a seguir o

regulamento, só que na hora de ter o retorno da mesma forma a gente não tem, infelizmente. Mas pra mim é um

tipo de violência sim, porque nós estamos aí lutando pelo nossos espaços, fazendo tudo que eles são obrigado a

fazer. ‘’Ah, mas pra vocês são diferentes’’ mas nós somos diferentes porque a gente quer que seja diferente, a

gente faz o que a gente tem que fazer, então pra mim é um tipo de violência sim, pelo simples fato de ser mulher,

porque tem muita resistência ainda e tem muito preconceito. Mas infelizmente, infelizmente tem.

9. Não, eu acho que não, acho que sua partida assim abordou os assuntos bem com delicadeza, bem, bem, bem

importante. Nenhum tema assim abordado não.

Eu te agradeço, a disponibilidade, a generosidade de estar participando dessa pesquisa. Obrigada.

Magina! Eu que agradeço a oportunidade de expor a nossa opinião, o nosso pensamento, as nossas ideias.

Sempre que precisar é só entrar em contato que estou sempre à disposição.

Obrigada.

De nada.

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TRANSCRIÇÃO 2

Entrevistado 2

01/09/2015

Santa Bárbara D’Oeste

Então vamo lá. Queria te agradecer, começar te agradecendo de, de você tá participando da pesquisa.

Identificação

1.1. Nome (não obrigatório):

1.1.

1.2. Data de Nascimento:

1.2. 06/09/79

1.3. Sexo: Masculino

1.4. Escolaridade?

1.4. Superior Completo

1.5. Profissão:

1.5. Me formei em Educação Física pela UNIMEP né, faculdade em Piracicaba. Sou formado também em

técnico eletrônico, primeiro estudo que fui fazer assim logo após o colegial depois minha vida tomou outros

rumos assim, consegui fazer realmente o que eu gostava.

Então parabéns pelo dia do professor de Educação Física.

Obrigada, pra você também.

A sua profissão?

Sou treinador físico e me considero árbitro de futebol, mesmo não sendo oficializado é, mas eu me considero um

profissional da área.

1.6. Foi atleta l?

1.6.1 (x) Sim

1.6.2 ( ) Não

1.6. Fui jogador de futebol. Joguei aí dos 7 aos 20 depois continuei jogando no amador, até 2010 jogava futebol

amador. Só parei depois que minha vida na arbitragem tomou uns rumos maiores né.

Você passou por vários clubes?

Joguei pelo Rio Branco de Americana e no União Barbarense.

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Nossa, os dois rivais.

É, os dois (haha)

1.7. Em caso afirmativo, de qual modalidade?

1.8. Em qual instituição realizou o curso de formação para árbitros de futebol?

1.8. Fiz pela Federação Paulista minha turma de 2001 e 2002. Então comecei em 2001 e finalizei em 2002.

1.9. Ano em que concluiu o curso de arbitragem?

1.10. Hoje você é registrado nas três instituições Federação, Confederação e FIFA, como é o registro?

1.10. É, na verdade a gente não tem registro assim, profissional né. É, na verdade nós somos autônomos que

prestamos serviços as Confederações e Federações né. Então a principio eu tive na Federação de 2002 a 2010 e

aí fui indicado ao Quadro Nacional e a partir daí a gente passamos a prestar serviços pra CBF e agora em 2015

pra CONMEBOL e FIFA.

1.11. A arbitragem hoje, ela equivale a que porcentagem da sua jornada de trabalho?

1.11. Ahhhh, eu acho que 90%.

1.12. A arbitragem equivale a qual porcentagem do seu rendimento?

1.12. Financeiros? Eu acho que 60%.

2. Ser árbitro

2.1. Por que optou em ser árbitro de futebol? Como a arbitragem entra na sua vida?

2.1. Na verdade o, o futebol tá no meu sangue assim né, meu pai, meu irmão mais velho foram profissionais. Eu

também joguei futebol até os 20 e, um grande amigo meu que é[...] que é da Federação Paulista e da CBF que é o

[...] que fez o curso um ano antes, na turma anterior, 2000, 2001. Ele já queria que eu fizesse com ele aquela

época mas eu não me via muito como árbitro assim, eu não era um jogador que dava problema pra arbitragem

assim, eu era um pouco esquentado, digamos. Então eu tinha mais problema com adversário do que com a

arbitragem. Então eu não me via muito nesse papel de arbitro e aí em 2001 ele ficou falando tanto na minha

orelha que eu, ele me convenceu. Aí eu fui fazer a prova, tipo um vestibular assim pra entrar, aí fui eu, o irmão

dele e mais dois amigos, e tinha 450 pessoas pra 50 vagas. E eu fui aprovado, só eu passei dos 4 que fomos pra

lá, e aí a partir daí eu disse, vou começar. Iniciei o curso e aí você vai pegando gosto né, você começa a trabalhar

nos jogos, você começa a receber elogios né, então isso aí vai te motivando a aperfeiçoar cada vez mais e buscar

novos horizontes dentro da área.

2.2. Você era uma segunda pergunta acho que você acabou respondendo. Se você teve a influência de

alguém pra entrar na arbitragem?

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2.2. Sim, esse amigo meu, ainda ele fica meio puto comigo assim. Pô mais toda vez você fala, eu faço questão de

falar em qualquer entrevista que eu participo que eu sou muito grato que isso aí realmente mudou minha vida e a

vida da minha família.

2.3. Como foi a reação dos amigos e familiares quanto optou em ser árbitro. Você chegou assim: ‘’vou ser

árbitro de futebol’’

2.3. É, eu tive um pouco assim.. Nós dirigíamos um, outra época, a época do meu pai, época ate do meu irmão,

ele é 12 anos mais velho que eu. Então existe um certo receio assim com, com a relação da função do árbitro né,

um pouco de insegurança em relação a sua integridade física. Mas eu tive um pouco de restrição dos meus pais,

os amigos nem tanto, é porque também sabiam que eu tava partindo pra um lado mais profissionalizado do

futebol, não ia fazer amador, esse tipo de coisa.

2.4. Queria que você me comentasse a sua trajetória. Quando você começa, até agora que você é FIFA. Se

você puder comentar rapidamente sua trajetória.

2.4. Olha eu terminei o curso em 2002, aí comecei trabalhar em jogos na categoria de base assim né, na minha

época não tinha ainda sub11, sub13, ou de amador assim que a Federação também escala e, então eu fazia muitos

jogos assim, sub15, sub17. E eu fiquei ai nessa categoria mais ou menos uns 4 anos, sem ter praticamente,

evolução assim, de evolução assim que eu falo de categoria de sub20. Uma coisa que me ajudou muito foi o

amador que eu acho que o fato de ter jogado futebol assim, eu tinha uma interpretação diferenciada sabe? É...

Outro fato foi apitar amador em Limeira, eu apitei muito tempo no amador em Limeira com o [...], um ex árbitro.

E a gente na época é, você tinha pouco retorno de observadores pela Federação assim, então você não sabe muito

que CE ta deixando a desejar, o que CE pode evoluir, as coisas boas que você deve manter, e Flávio foi uma

pessoa muito importante, porque eu fazia amador pra ele em Limeira, e ele praticamente assistia todos os meus

jogos assim, ele dava esse feedback logo após o jogo né. Então foi uma fase que eu me lapidei muito, que eu

ganhei um jogo de cintura muito bom pra lidar com situações de conflito e, aí em 2006 eu comecei a... Em 2006,

2005 eu já foquei com o que eu queria, eu foquei 100% na arbitragem. Assim, tinha meus trabalhos paralelos,

porem meus patrões sabiam que apitava na arbitragem, tanto que me liberavam durante a semana, eu acho que

isso é uma das maiores dificuldades que os árbitros encontram conciliar seu trabalho com a arbitragem já que

poucos conseguem chegar num nível maximo assim, então às vezes você fica meio em cima do muro. Aonde eu

me dedico mais, até quando eu vou ta apitando ou não. E aí em 2006 eu comecei a fazer profissional e fui tendo

uma evolução assim, gradativa, mas assim, foi bem assim, lenta e que foi muito importante pra mim, porque eu

fui criado numa maturidade bacana. Eu não fui apitar divisão assim, da noite pro dia, então em 2010 o Coronel

Marinho me lançou na primeira divisão. 2009 eu fiz bons jogos da segunda divisão, jogos de líderes

praticamente, trabalhei muito, fui em bastante jogos, e, aí cheguei em 2010 ai estreei, tive um bom ano no meu

primeiro, fiz 7 jogos na serie A1, e fui indicado pro Quadro Nacional. Aí passei a fazer quarto árbitro na CBF,

na serie A, na serie B, apitei apenas 3 jogos na serie B mas foram assim, começou a fazer diferença na minha

vida, financeiramente também na minha carreira, porque o árbitro da federação paulista do primeiro semestre,

que apita a primeira divisão, apita um jogo por mês. É, tem muitos jogos pra poucos árbitros, tem poucos jogos

pra muitos árbitros. E aí fiz um bom campeonato em 2010, aí em 2011 comecei apitando os Clássicos, e graças a

Deus eu fui muito bem assim, fiz meu primeiro Clássico com Corinthians e Santos no Pacaembu, aí fiz a

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semifinal do Paulista aquele ano São Paulo e Santos, no Morumbi e ganhei o premio de melhor árbitro em 2011.

Aí minha carreira começou meia que consolidar assim né, mas em 2011 eu não fiz serie A do Brasileiro

continuei fazendo serie B, fiz bastante serie B, fiz Copa do Brasil. Aí em 2012 estreei na Copa na serie A

também fiz um bom campeonato, poucos erros, ganhei o premio de segundo lugar aqui em São Paulo,

novamente, e aí que começou meio que os olhos começaram a se abrir pra mim né, já tive um retorno assim da

Comissão Profissional, que, que eu tinha o perfil que eles gostavam e, só que o importante do árbitro é ter uma

regularidade né, e eu acho que é uma coisa que eu tenho na minha carreira, eu erro muito pouco assim. Assim,

erros que marcam né, então, aí ano passado eu me tornei aspirante em maio e no final do ano me tornei FIFA.

Parabéns!!

Obrigada.

2.5. Qual a imagem que você, quando espectador / torcedor de jogos esportivos, tinha dos profissionais da

arbitragem antes de ser árbitro? Como que você via os árbitros, você era jogador, torcedor, qual imagem

que você tinha?

2.5. Eu tinha imagem de uma autoridade, assim, não autoritário. Autoridade como um policial tem na rua assim,

então eu sempre tive respeito em relação a arbitragem, eu tinha problemas assim, como eu falei, com adversários

assim sabe. Eu não gosto, não gostava, ate hoje assim, não só no profissional, mas no pessoal também,

empolgados assim, que quer levar vantagem assim, sabe. Qualquer custo quer passar por cima das regras.

Você jogava em que posição?

Eu era meio esquerda.

E você para pra jogar por conta da arbitragem, ou foi alguma coisa que?

Não, eu parei porque eu tinha um exemplo do meu irmão, do meu pai em casa, que poucos também... Jogador de

futebol é uma ilusão né, poucos ganham bem, então eu acho que 5% dos jogadores profissionais ganham bem,

tem uma vida assim, mediana. Meu irmão jogou profissional ate os 35 e ele conseguiu assim, fazer um bom pé

de meia assim, então é como se fosse um profissional de qualquer outra área, meu irmão conseguiu jogar por

muito tempo, então outros que não conseguem... Então tinha isso um pouco de ilusão, aí resolvi estudar, fazer

mais...

2.6. Hoje, profissional da arbitragem, quando espectador, você deve ter um time do coração né?

2.6. Não tenho, te juro, quando eu era garoto eu tinha, você fica no meio, mas é um meio que, sobre transferência

de responsabilidade, é um meio que você acaba desiludindo assim, com relação essa parte de paixão, de ídolo

assim..Claro que tem muitas pessoas boas né, mas também bastante ruim, hoje assim, eu sou totalmente isento

com relação a..

Você torce em relação ao futebol, como que você vê a imagem do árbitro?

Eu analiso muito assim com, o árbitro é um maestro né, ele que dita o ritmo do jogo, ele consegue, ele dita

conforme os jogadores querem, se o jogador não quer jogador, pode colocar 500 árbitros ali que ele não

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consegue segurar o jogo. Aí o arbitro não vai deixar rolar muito, mas assim, eu tenho ele como um maestro. E

hoje se acontece um equivoco, as vezes quando eu to assistindo, vendo algum amigo apitar ou ate qualquer outro

esporte assim, eu consigo, eu me coloco no lugar do árbitro né, o que levou ele ao erro, e eu trabalho muito

assim, eu gosto de assistir meus jogos, logo depois, pra ver o que eu errei, porque eu errei, o que eu podia ter

feito, pra ter acertado. E eu, gosto de usar os exemplos de outros árbitros que às vezes acontecem algumas coisas

num, que nunca aconteceu, nem no futebol aconteceu, aí acontece no teu jogo. Então eu gosto de totalmente usar

exemplos de outros árbitros que passaram por algumas situações assim peculiares, porque pode ser que tenha

ocorrido e o que eu poderia ter feito pra ter solucionado.

2.7. Tem uma pergunta aqui que eu acho que vou pular.. Quando assiste seu time jogar, como você reage?

2.7. A única coisa assim hoje que eu torço, é a seleção, eu gosto né. Torcia na Copa, fiquei chocado também,

mas sem essa paixão de..

Você xinga árbitro?

Nem árbitro, nem jogador, tá todo mundo lá pra fazer seu melhor. Jogador também quando erra, o que é errar né,

2.8. Na sua opinião, qual a importância da função de árbitro num país, onde a gente tem tantas diferenças

sociais e o futebol é uma paixão nacional, é quase uma religião. Qual a importância dessa função?

2.8. O árbitro é o, como eu posso dizer, em relação a diferença social o futebol é o esporte que nivela né, que

todo mundo, até do mais pobre, o mendigo ali, até o mais rico, todo mundo tem o time e tal, sempre

acompanhando. O árbitro ele, ele que dita as regras dentro do campo do jogo né, mas eu não vejo assim uma,

uma relação da classe social como covarde, assim no tema federal sobre isso.

2.9. Eu queria que você comentasse sobre a profissionalização de ser árbitro. Profissionalizar a função de

árbitro de futebol.

2.9. É uma coisa que todo mundo espera né, que é um sonho nosso você poder se dedicar. Hoje eu me dedico

assim integralmente a isso, mas é, eu sei que se eu cometo um equivoco muito grande a gente praticamente fica

fora de escala assim, reflete totalmente no meu rendimento mensal assim né, quantos mais jogos eu faço, mais eu

ganho, porque eu ganho por jogo. E se profissionalizar, pelo menos nós temos o fixo né, o fixo, aí você consegue

se dedicar mais, consegue prevenir lesões. Por exemplo, semana passada eu tive uma lesão fiquei dois meses

parado.

Mas existe algo, tipo, eu vou ganhar um fixo e vou ganhar...?

Bônus.

Quem se responsabilizaria por esse fixo?

É, teria que ser as Federações né, mas a verdade que hoje nós somos pagos pelos Clubes mandantes né, um valor

que é tirado da renda, tirei tem que ter uns investimentos não sei o que faria, da onde sairia mais eu acho que

árbitro conseguiria se dedicar mais aí prevenir lesão, às vezes não ir pra um jogo porque ele ta machucado, se

você ta com uma lesão já você vai pro jogo, taca um remédio, o desgaste é muito grande, não é um esporte assim

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que as vezes que nem você falou do Handball, eu não sei qual é o desgaste físico do Handball, do Basquete, do

Vôlei, por exemplo, não tem um desgaste físico quanto o nosso né, às vezes ate consegue camuflar uma lesão e

tal. Não por muito tempo, uma hora seu corpo não guenta, que nem aconteceu comigo ano passado, eu fiquei 3

meses fazendo jogo com dor, sabia que era um ano importante pra mim, que eu tava um passo de entrar na FIFA

então não queria ficar longe ate meu corpo não aguentar mais, uma fissura aí tive que parar, porque não

conseguia nem andar né. Mas eu acho que a profissionalização assim, ela vem pra ajudar nesse aspecto do

árbitro, o árbitro trabalhar assim como, como um profissional mesmo, não como um autor ou prestador de

serviço, você ta machucado, ta fora, vai outro no seu lugar, você fica sem um centavo.

Uma pergunta recente, as ultimas noticias do direito de imagem do 5% que é negado pelo governo. Quem

administraria esse 5%, porque segundo o governo não tinha o investimento nesses gastos, seria a

associação de árbitros, seria divididos pelos jogos que você, seria divididos com muitos árbitros. Existe um

plano de aplicação nesses 5%?

É, a intenção é a própria NAPI que é a Associação Internacional dos Árbitros que vai fazer, que ta encaminhando

o projeto né, e provavelmente seja por aparições, então vai ser é, recolhido né, os 0,5% vai ser divididos por

partidas e aí encaminhado o valor quando acaba a partida, e acaba sendo dividido proporcional como as taxas.

Então os árbitros que tem muitas aparições são centrais né, os assistentes e o quarto árbitro, então eu acho que é

dessa forma.

Então vocês não tem conhecimento desse projeto?

A gente tem assim, em relação ao recolhimento e a divisão. Mas a divisão entre árbitros, assistentes, é o segundo

passo né.

3. Situações políticas

3.1. Considerando-se a formação de um árbitro desde o Curso para formação de árbitro até a sua

ascensão à categoria de Árbitro Internacional (FIFA), como é a relação de trabalho, investimentos,

assessoria e suporte (psicológico, físico, intelectual, jurídico...) dados aos árbitros pelas Instituições

(Federação, Confederação, FIFA e Associação de árbitros) para o desenvolvimento profissional / humano?

3.1.1. É a Federação Paulista, por exemplo, ela tem um aspecto técnico assim, Campeonato Paulista, tem uma

pré temporada né, ficamos uma semana concentrados, e foca muito mais a parte técnica né, temos o

acompanhamento físico, de todas as instituições, mas é um acompanhamento assim, pequeno durante o ano, é,

mas tem o acompanhamento psicológico, é, tem o Gustavo Corte que é daqui da Federação Paulista psicólogo e

a Doutora Marta Magalhães que é da CBF. É um trabalho que já tem um contato maior assim, durante o ano

todo, é, eu tenho meus investimentos pessoais. Tenho nutricionista, tenho um preparador físico que me

acompanha o ano todo é, espaço que eu utilizo assim, em termos de academia também é pago pela minha conta,

aqui em Santa Bárbara eu consigo ter um espaço assim que eu consiga treinar que tem uma pista de atletismo,

um campo, mas e cursos assim durante o ano todo a CBF proporciona, a FIFA, tipo em termos de uma

reciclagem né. Mas acho que o maior investimento parte do árbitro em si assim. No dia a dia eu tenho mais

contatos com meus investimentos do que das instituições.

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No caso das avaliações dos jogos, vocês fazem uma pré-temporada, mas vocês não têm reuniões periódicas

pra analisar, por exemplo, vídeos, algumas coisas assim?

Temos assim, que nem a federação fazemos na pré-temporada que tem isso, a CBF faz mais ou menos em abril,

maio, no inicio do campeonato brasileiro é, a FIFA faz agora em agosto, passamos então pelo um treinamento,

então só os três por ano aí vai, nós fazemos. Mas é também, eu vou pra partida de quinta-feira, chegamos no

hotel na quarta, ate as 14h da tarde e a noite a gente faz uma reunião técnica assim, a gente conversa sobre os

principais tópicos das equipes né, estuda um pouco as equipes e também vemos alguns vídeos de alguns fatos

que ocorreram, tivemos um problema com lesão de árbitros nessa ultima rodada, então a gente trabalha assim,

mais focado pelo momento que estamos vivendo. Mas contato com a regra assim é, continua.

Os avaliadores eles foram árbitros?

Sim, hoje tanto a CBF quanto a Federação e ate mesmo a FIFA, as pessoas que nos avaliam são árbitros que

pouco tempo pararam, então eles tão muito bem atualizados. A CBF faz um trabalho hoje que os avaliadores

estão conosco dentro do vestiário, então estão vivenciando a partida dali, não estão nos avaliando pela TV,

embora tenha um assessor da CBF que nos avaliam por lá e depois nos contatam após a partida e depois que a

partida termina, sentamos todos e temos esse feedback de como foi o nosso trabalho. E eu acho que isso é

fundamental pro crescimento do árbitro porque quando você vai pra uma partida, você não sabe se foi bem, se

foi mal, como eu falei anteriormente isso acontece muito no começo de carreira, e assim a gente vai se lapidando

cada vez mais né.

Então são parceiros?

Sim, a gente tem hoje avaliadores como parceiros, até a própria comissão, ate porque todo mundo ta em busca do

mesmo objetivo né, de legitimar o resultado, de fazer um bom trabalho, então as vezes tem uma cobrança mais

enérgica da comissão mas é visando bem total. Simplesmente como toda área né, temos alguns desgarro assim

né.

3.2. Comente:

3.2.1- Queria que você comentasse os critérios de mudança de categoria. Federação Paulista, na CBF não

sei como funciona.

3.2.1. É assim, a Federação Paulista ela tem um ranking né, que foi criado pelo Coronel Marinho, é e pra mim foi

uma grande valia assim, porque ele é muito bom assim, em liderar. E aí a partir desse ranking, ele numerou todos

esses árbitros, os 25 primeiros do ranking apitam primeira divisão e em ano a ano esse ranking é atualizado

devido aos seus jogos, devido aos testes físicos que você faz as provas teóricas, então faz uma montagem final e

reavalia o ranking. E, esses 25 apitam primeira divisão e os 18 primeiros ali do ranking são indicados pra, pro

Quadro Nacional da CBF. CBF visa um outro ranking, que é dividido lá por CBF 1, a Federação Paulista tem um

ranking que é dividido entre ouro, prata e bronze, especial acho que tem agora, acho que são os árbitros que são

do quadro nacional. Aí na CBF tem CBF 1 , CBF 2, CBF 3, e ai em cima do CBF 1 tem os aspirantes FIFA, tem

os especiais 2, que são exs árbitros aspirantes a FIFA, que saíram, que atingiram 38 anos, e passam ser especiais.

Aí tem os especiais 1, que são árbitros FIFA que deixaram de ser FIFA mas continuam atuando, e os FIFAS né,

aí, é um outro ranking.

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Mas você não faz uma avaliação pra, você só vai pontuando?

As avaliações são constantes ne, teste físico, prova teórica, é... Jogos, que são varias avaliações é, todo ano, todo

final de semana você vai ta pontuando ali, vem chegando o final do ano eles reavaliam a situação de cada um

que...

Pra fazer uma indicação a Confederação é a Federação que faz a solicitação dentro do grupo?

A federação paulista ela indica dos quadros, do quadro estadual, ela indica os árbitros pro quadro nacional, aí a

CBF pega os árbitros do quadro nacional que indica pra conmebol e FIFA.

Os estados tem uma vamos supor um número de vagas, por exemplo, São Paulo são tantos FIFA, se um do

São Paulo deixa de apitar e aquela vaga continua sendo de São Paulo?

É, nos tínhamos duas vagas aqui que era o Paulo Cesar e do ????. Entrou eu e o [...], mas São Paulo tinha 3, aí

entrou um de outro estado, não é certeza, não é uma garantia, é que em termo, acho que de logística assim, não é

interessante pra CBF ter muitos árbitros FIFA em um estádio só. Porque quando vai cruzar pro Campeonato

Brasileiro, Copa do Brasil, ela fica meio sem opções assim, se tiver um árbitro, muitos árbitros, por exemplo,

vamos supor que tenha 5 em São Paulo, 5 no Rio, ai vai ter uma final de um time carioca com um paulista, mas

não tem nenhum arbitro FIFA pra ficar lá. Então é interessante ela dar uma, uma medida né.

3.2.2- Os critérios de mudança de categoria e indicação ao quadro internacional (FIFA), utilizados pela

comissão de arbitragem.

3.2.3- Escalas dos jogos (sorteios)

3.2.3. Eu acho que péssimo pra todos, não é bom pra ninguém assim, é bom pro Estatuto do Torcedor que foi

quem criou isso, mas é ruim pro árbitro, porque as vezes tem um determinado jogo que ate a comissão quer

escalar o determinado árbitro, mas não consegue porque tem que fazer o sorteio é... É ruim pras equipes, que às

vezes um árbitro que seria ideal pra determinada partida de clima hostil, ou assim, coloca um árbitro inexperiente

que ta lá prejudicando ainda mais o espetáculo, e é muito ruim assim, a gente espera que nessa MP meio 71 aí

também ta embutido pra acabar com o sorteio né.

Quantos vão pro sorteio?

Então na CBF o sorteio já é mais direcionado assim, por exemplo, vai eu e você pra sorteio de dois jogos, e aí eu

to na coluna A do jogo 2 e coluna B do jogo 7, mas e você ta também só que invertido. Você vai apitar de

qualquer forma, na Federação Paulista já vai muitos árbitros, esse ano ia, rolou 25, aí sorteiam lá aleatórios,

sorteou os 10, a próxima rodada os 10 está fora, aí ficam 15, aí sorteam 10, sobra 5, volta os 10 da primeira e

assim vai rodando. E aí nos jogos mais difíceis, Clássicos, há um numero menor assim de árbitros, vão 5, 4, 5

árbitros por jogo.

3.2.4- Valores pagos a arbitragem

3.2.4. Ah, eu acho assim, se analisar com o trabalho aí, fora do futebol, é um bom salário, porem, no meio nosso

tudo que gera assim futebol, então tem uma ideia pelos os que os outros ganham né, os outros profissionais

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ganham e a arbitragem é uma, é transmitida muita responsabilidade pro árbitro, então eu acho que tinha que ter

uma remuneração pouco melhor aí. Eu acredito assim, que aprovando esse 0,5% vai dar uma boa melhorada né.

4. Relações Humanas

4.1. Como são as relações pessoais com os colegas de arbitragem? Se é uma relação de competição ou de

parceria?

4.1. Eu tenho bons exemplos assim comigo, eu nunca tive problema assim, de relacionamento com nenhum

árbitro, mas a gente sabe que como qualquer outra profissão algumas pessoas que são mais egoístas né, se

preocupam mais com os outros do que com ele mesmo. Mas eu sou muito tranquilo assim, o fato de ser do

interior me ajuda muito, porque eu não tenho contato com árbitros no dia a dia, praticamente, fora do ambiente

de trabalho. Quando eu to em jogos, eu tenho um bom relacionamento sim, eu acho que num...

4.2. Existem muitos comentários sobre as escalas: quem deveria trabalhar em determinados jogos?

4.2. Eu acredito que exista sim, eu falo muito pouco, prefiro não me envolver sabe, porque temos muitos

exemplos assim, porque dentro do campo quando você atinge um nível como estamos assim hoje, você ta lá

porque você chegou por mérito, então dentro de campo eu já cometi poucos equívocos, como se vê os árbitros

FIFA à regularidade predominante deles. Os árbitros que se perdem, se perdem fora do campo, se perdem

preocupados em falar da vida do outro, em ver a escala do outro, é, então eu procuro ficar muito isento disso, e

eu até aconselho os mais jovens se tem uma coisa que ta te desagradando, tal fala diretamente com a pessoa, que

resolve o problema ou desabafa com alguém fora do futebol. Essa história você fala aqui, vai chegar lá na frente

de outra forma e só tende a prejudicá-lo então, eu sou muito tranquilo com isso.

4.3. Comente as suas relações com jogadores, comissão técnica, torcedores, espectadores e mídia, durante

a partida e não exercendo a função de árbitro.

4.3. Eu não tenho relação nenhuma com jogador, não faço questão nenhuma de ser amigo, é, até porque quando

o calo aperta a primeira pessoa que eles vão querer transferir é o árbitro. Você pode ter jogado 90 minutos, errou

15 gols, aí tem o lance polêmico que decidiu o resultado do jogo, é você que decidiu os erros dele. Então eu

prefiro evitar, assim não ter contato nenhum com jogador, com comissão técnica, às vezes encontra em

aeroporto, tem o associado, que entra, conversa, mas eu não faço questão nenhuma de me envolver. Mídia

também, falo muito pouco, já participei bastante já dei entrevistas e, os programas esportivos que fui convidado

mas hoje evito porque você não vai ganhar nada com isso, você só corre o risco de falar alguma bobagem e virar

contra você ainda, eu evito também por causa da família. E torcedores as vezes que eles querem é um pouquinho

de atenção, queira ou não queira, você esta na casa deles né, isso quem me ensinou foi o Paulo Cesar que ele tem

um... O Paulo Cesar é um dos caras mais conhecidos do meio do futebol, dos árbitros, faria um jogo de quarto

árbitro com ele, todo mundo reconhece ele. Ele tem um nome marcante assim, e às vezes o torcedor brinca, às

vezes ate uma brincadeira assim, que não me agrada, que tem que saber lidar com a situação pra não gerar um

atrito né, até porque a pessoa publica ali é você né. Então eu tenho uma relação tranquila com torcedores e tal.

5. Tecnologia e mídia

5.1. Você é a favor do uso da tecnologia nas partidas de futebol para auxiliar a arbitragem?

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5.1. Sou a favor em alguns aspectos, hoje já temos a bandeira eletrônica que nos auxilia né, o rádio auxiliador

que fica praticamente o tempo todo logado em outros participantes. Porém, assim, eu sou a favor assim, chip na

bola, entrou ou não entrou, a bola porque, o impedimento pode até ser utilizado, também ou é 8 ou é 80, mas

alguns lances são interpretativos, e as vezes você pega uma imagem, você coloca nos programas esportivos ali,

três acham que foi pênalti, quatro acham que não foram, então o que não foi, você corre risco de parar o lance

pra ver na TV e tirar uma conclusão, então em alguns aspectos sim, em outros que são interpretativos não.

No caso assim como surgiu, e eu tava vendo uma reportagem de testes feito na Holanda, tipo voleibol, ter

direito desse desafio, parar o jogo. O que você pensa disso?

Sim, nesses casos sim, de impedimento e de bola entrar ou não.

Mas você acha que seria legal, para o jogo normal, olha rapidinho e continuamos?

É só que esses jogos vão ser utilizados que recurso, jogos de Copa do Mundo, jogos de competições maiores

assim, porque não tem condição de você fazer isso no estadual, por exemplo, não tem recurso e acho que é um

custo alto porque tem que ter câmera, tem que ter muitas câmeras. Porque duas câmeras no estádio às vezes

podem acontecer um lance que eu vi no vôlei o lance, que o jogador deu um peixinho assim colocou a mão pra

bola bater que nenhuma câmera pegou a pedido da FIVA acho que tinha lá 12 câmeras, no ginásio, e as únicas

câmeras que tinham que conseguiriam visualizar o lance tinham jogadores na frente, então tinha jogadores e não

viram o lance. Então o futebol tem que ter, tem que ter muitas câmeras e eu acho também que perde a dinâmica

do jogo né, até pelo campo ser maior né, eu acho que...

5.2. Caso a resposta da questão anterior seja afirmativa, quais são os recursos tecnológicos sugeridos que

você aprovaria?

6. Mídia

6.1 Como você avalia o trabalho da mídia no futebol em relação:

6.1.1 Ao desempenho da equipe de arbitragem nos jogos

6.1.1. Olha assim, eu acho que tem melhora, tem melhorado muito hoje né, eu acho que a mídia assim, uma boa

parte da mídia ela vem junto com, buscando o melhor espetáculo assim, e devido aos últimos acontecimentos da

Copa do Mundo, a gente vive um país fora do futebol que todo mundo tá um pouco de saco cheio né. Então eu

acho que a mídia em termos de jogador, de arbitragem a mídia ta batendo mais do que batia antes, mas eu acho

que também tem muita mídia que é torcedora ainda, e às vezes dão muita voz assim, quando alguém quer

transferir o resultado pro árbitro. Porque o próprio jornalista se incomodou com aquele resultado e aí também da

uma carga maior na noticia do jogador, do treinador, o dirigente que tá transferindo. Então eu acho que tem os

dois, tem que colocar na balança os dois lados assim, tem muitos jornalistas que são sérios, buscam melhor o

futebol e uns com pensamentos antigos, então é difícil perder esse vicio do jornalista que torce, que tem um

contato muito próximo de dessa paixão de torcedor que continua desenvolvendo o trabalho de jornalista, que é

aquele gênio.

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6.1.2 Ex-árbitros comentaristas

6.1.2. Eu acho muito bom, eu acho muito bom. Acho que é uma coisa que veio pro nosso lado né, são pessoas

que estavam ali dentro tem uma visão, que eu falei que eu vejo o jogo depois onde tem um erro. Então esses

comentaristas que foram árbitros consegue ver dessa forma, alguns estão um pouco desatualizados assim, então

tem umas relações novas que ele nem sabe e às vezes ele acaba falando no ar que, infelizmente, forma opinião

alheia do que tão vendo lá e falam. Mas é uma coisa que eu gosto assim, se tiver que ver alguém na TV

comentando meu trabalho, eu prefiro pegar os que são especializados.

6.1.3 A responsabilidade / influência da mídia em relação à violência nos estádios. Você acha que ela é

responsável, não?

6.1.3. Olha eu acho que as violências nos estádios estão mais localizadas mais na classe social, diferença social.

Porque quem briga nos estádios não são as pessoas do bem assim, que vão pra assistir o espetáculo, quem vê

quem briga são os bandidos que estão infiltrados nas grandes torcidas porque as vezes ele quer acompanhar uma

paixão que ele tem, isso quem financia é o próprio clube, pagam pra assistir, tem viagem pra ir pra lá. E quando

tiver esse tipo de pessoa infiltrada nas torcidas organizadas, vai ter sempre violência, eu nunca vi assim, eu

conheço muitas pessoas que vão em estádio assim, eu nunca vi que foi no estádio e falar que brigou. Eu escuto

falar que brigou nos jornais ali que olha, aquele lá tava envolvido na briga três meses atrás, mas, não, ele estava

em outra a um ano atrás, são sempre as mesmas pessoas que eu não sei qual é o procedimento da justiça, se pode

brigar no estádio, porque briga, depois o cara ta solto. Não sei a mídia, a mídia às vezes divulga muito essa

imagem também, se não estimula esses caras a fazer lá. Na Europa a gente nem vê isso, o cara invade o estádio,

muda o foco, talvez fosse o caminho.

6.1.4. A responsabilidade / influência da mídia em relação à violência contra a equipe de arbitragem. Você

acha que ela contribui?

6.1.4. Eu acho assim, esses jornalistas que dão muita ênfase, como eu falei anteriormente nessa transferência de

responsabilidade do árbitro, ou dirigente que quer jogar tudo nas costas do árbitro porque essas respostas que

eles tão dando não é pra mídia, não é pra mim, tá falando pros torcedores deles, que ao invés de falar que ah, o

time ta mal, mexeu errado, perdeu. Não, eles preferem falar pros torcedores deles, talvez essa violência pode

acontecer pelas palavras que eles tão usando não que aconteceu dentro do campo.

7. Violência

7.1. Poderia me explicar o que você entende por violência?

7.1. Aí... Eu acho que violência é tudo que pode te, você me falou isso, tudo que pode te afetar de uma forma

negativa assim, eu nunca tinha pensado dessa forma, mas depois que eu conversei com você aquele dia eu fiquei

refletindo e, eu acho que esse tipo de coisa de entrevista, por exemplo, que transfere responsabilidade, é uma

violência e pode acarretar numa violência, até física. Mas tudo que tenta denegrir sua imagem, seu trabalho, eu

acho que pode ser entre aspas aí, consideradas uma violência.

7.2. Você já sofreu violência na função de árbitro?

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7.2. Assim, eu nunca fui, nunca, em termos de jogo eu nunca tinha sido agredido. Eu tive um problema com um

jogador esse ano, ano passado né, num clássico que eu fiz que tive um tranco nas costas, mas eu já trombei

varias vezes com um jogador, pra mim tinha sido uma trombada natural e depois vendo pelas imagens ele veio

pra me acertar. O único problema que eu tive com jogador, torcedor, eu pensava, eu penso muito por ter um

sangue um pouco quente assim, sabe, é... Eu não sei como me controlaria, nessa situação me controlei muito

bem porque pra mim foi natural, só depois que eu vi que não tinha sido mais.

E como você interpreta no caso, o jogador ter uma atitude, anti esportiva, vamos dizer assim, e depois de

serem compreensivos, como vocês árbitros, ou você no caso, interpreta isso?

Interpreto como uma passada de mão na cabeça, pra não ficar ruim com ninguém às vezes o tribunal toma essas

medidas, sabe. Ah, tomou lá, 6 vezes, aí não, 6 vezes é muito, e vai entrando em instancia, vão brigando, e isso

chega no meio termo, mas quem busca justiça assim não tem que ter, o Brasil é diferente né, se ver nosso, nossa

sociedade, isso acontece então futebol é só um reflexo.

7.3. Quais os tipos de violência que você já sofreu?

7.3. Não assim, o que a gente sofre mais é no estádio né, assim de torcedor, verbal né. No amador sofre muito

menos, porque CE ta ali, ali todo mundo é homem né, e às vezes não tem policiamento, então se você quiser

partir pra cima de alguém você vai partir e aí pode chegar ate o de fato. Mas como no amador é diferente do

estádio, no estádio o torcedor que eu to vendo da arquibancada, eles não vão me encontrar, muito difícil, agora

no amador não, eu acabei, terminei o jogo, eu to ali se ele quiser me encontrar, ele vai me encontrar. Então às

vezes tem ate menos, pelo menos na época que eu trabalhava no amador, hoje eu acho que ta bem pior né assim,

tava conversando hoje mesmo com um amigo meu que jogou muito tempo no amador e ele falou que não joga

mais porque não tem segurança nenhuma. Mas assim, o maior tipo de agressão que eu sofri, foi verbal, dentro do

estádio assim.

7.4. Eu tinha umas perguntas considerados violência, não sei se você quer considerar essa verbal, quer

considerar a violência desse empurrão. Porque eu pergunto a importância do campeonato. Que

campeonato que era, onde ocorreu isso. Qual era o campeonato / evento e a importância da partida?

7.4. Campeonato Brasileiro

7.6. De quem partiu a violência:

7.6.1 (x) jogadores

7.6.2 ( ) comissão técnica

7.6.3 ( ) torcedores

7.6.4 ( ) espectadores

7.6.5 ( ) policiais

7.6.6 ( ) jornalistas

7.6.7 ( ) outros

7.6.1. Foi um lance assim que eu falei que me lesionei, eu falei que tava lesionado, e meu posicionamento

atrapalhou uma jogada do time e ele foi passar por mim e deu uma esbarrada em mim. Mas não me derrubou

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nada, só me desequilibrou, é que era um jogo de TV aberta e tal, foi buscado demais e tal, ai isso mostra que ele

muda a trajetória pra me acertar.

7.7. A violência ocorreu:

7.7.1 ( ) antes da partida

7.7.2 (x) durante a partida

7.7.3 ( ) após a partida

7.7. Durante a partida, a bola rolando, trombei, continuei correndo, eu nem falei nada. Pra mim tinha sido

natural.

7.8. Local em que a violência ocorreu:

7.8.1. (x) No terreno de jogo

7.8.2. ( ) Nas dependências dos estádios

7.8.3. ( ) Fora das dependências do estádio

7.9. O que você acha que motivou essa atitude do jogador?

7.9. Não, o fato de eu ter atrapalhado a jogada assim. Não, acho que muito mais da índole dele do que, do que

qualquer outra coisa.

7.10. Em relação à segurança / violência, quais são as diferenças entre trabalhar em jogos amadores /

profissionais, Série A e Série B?

7.10. O jogo em termos de serie A e serie B não muda praticamente nada, temos uma equipe de policiamento que

nos acompanha durante todo o jogo, entrada, saída do campo, enquanto estamos no vestiário. No amador isso

não existe ne, muita pouca cidade tem um policiamento que ta no campo de jogo pra proteger os árbitros, então

no amador praticamente 0 segurança.

7.11. Então pela sua fala anterior, antes eu tinha muito mais segurança em trabalhar na categoria

amadora, do que hoje?

7.11. Eu acho que assim em termos de como a violência desenvolve o país né, não só no futebol, mas criança,

por exemplo, na minha época eu ia pra escola, voltava, ficava na rua o dia todo. Hoje você não vê nenhuma

criança pra rua, você não tem segurança nenhuma, o bandido chega, leva seu filho hoje, não acha nunca mais.

Tava acompanhando um noticiário lá em São Paulo, a pessoa rouba assim na cara dura, com arma durante o dia,

eu acho que isso vai pro futebol hoje em dia, ou então tem muita gente, os bandidos não tem mais, não se

escondem mais. E às vezes da paixão, que tem o time amador, tem um cara armado, e fica puto com um lance

que acontece no profissional e te da um tiro lá, não sabe nem quem foi, então eu acho que isso, vale no amador.

7.12. Como você vê e interpreta a violência contra árbitros? Você citou um caso, mas você trabalha num

grupo grande, como você vê.

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7.12. Eu já vi depois que já aconteceu comigo teve muitos outros casos, como se tivesse sido comigo, como se

tivesse me agredido. Sinto a dor deles lá me coloco no lugar deles, enquanto não tiver uma punição exemplar

provavelmente é o que vai continuar acontecendo.

7.13. Uma pesquisa realizada com árbitros de futebol na Áustria tinha como objetivo investigar quais as

situações de conduta antidisciplinar de jogadores e técnicos que levavam um árbitro a utilizar um cartão

vermelho. As respostas mais citadas pelos árbitros foram: Ofensas relacionadas à capacidade técnica, a

aparência física, ao caráter, a orientação sexual e outros. Qual é o tipo de ofensa citados na pesquisa que

você menos tolera tornando possível a punição com o cartão vermelho?

7.13. Eu tenho, eu ficaria em outros. Racismo, eu acho que é uma coisa assim que eu não pensaria duas vezes,

porque isso ai é uma coisa que infelizmente no ano de 2015 assim não da pra aceitar, não consigo entender o que

a pessoa tem em mente pra ter uma postura dessas.

7.14 Na sua opinião, quais ofensas são de maior relevância?

7.15. Você poderia numerar as ofensas de acordo com a gravidade e necessidade de punição?

7.15.1 (5) capacidade técnica

7.15.2 (4) a aparência física

7.15.3 (3) caráter

7.15.4 (2) orientação sexual

7.15.5 (1) outros

7.15. Orientação sexual, caráter, aparência física e técnica. Porque eu acho que a técnica faz parte do ambiente

sabe, as outras não, ta fora. Então quem trás isso pra dentro do campo é porque esta no lugar errado, não no

esporte.

8. Stress e Autocontrole

8.1. Você poderia numerar quais são os motivos de maior tensão e stress:

8.1.1 (3) Você ou a equipe de arbitragem sofrer agressão

8.1. (2) Falta de segurança nos estádios

8.1. (4) Trabalhar em partidas de equipes com as quais você já teve problemas em partidas

anteriores

8.1.4 (5) Atrasos e pontualidade

8.1.5 (6) Pagamentos de taxas

8.1.6 (1) Cometer erros em momentos decisivos da partida

8.1. Eu acho que cometer erros decisivos na partida, é tem alguns que eu nunca vivenciei assim, pagamento de

taxa eu nunca tive problema, é... Eu acho que falta de segurança nos estádios, três é a equipe de arbitragem sofrer

alguma agressão, trabalhar em partidas de equipes quais, atrasos e pagamentos.

8.2. Quais são as atitudes de jogadores e técnicos que dificultam seu trabalho de árbitro?

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8.2. Transferência de responsabilidade é a maior. O restante é quando reclama de uma decisão de algum

resultado ponderada, tipo assim, um questionamento, não uma reclamação, eu acho que faz parte do futebol, às

vezes você marcou alguma coisa que você não entendeu que faz parte do dialogo assim. Mas quando quer

transferir de qualquer forma o resultado do jogo pra você, isso é a pior coisa. É o que pesa mais do árbitro

trabalhar de uma forma mais, o objetivo dele é criar um ambiente que deixa suscetível a errar a favor da equipe

dele.

9. Existe algum outro tema ou comentário que gostaria de registrar

Não, eu gostaria de ver depois a conclusão do trabalho, bacana assim. Até pedir pra você esse negocio de, que

citei do jogador que me acertou, nem, não sei, se tiver citado, vão saber que sou eu.

Tudo bem, eu te agradeço, te agradeço por você participar da pesquisa e por essa disponibilidade de me

atender e dedicar esse seu tempo dentro desse seu dia corrido aí.

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TRANSCRIÇÃO 3

Entrevistado 3

Cruzeiro / SP

28/09/2015

Bom, vou começar te agradecendo por você ter aceitado participar da entrevista. A primeira parte eu

tenho umas perguntas de identificação e depois eu vou mudando o tema, tá?

Tudo bem.

1. Identificação

1.1. Nome (não obrigatório):

1.1

1.2. Data de Nascimento:

1.2. 13/06 de Junho de 77

1.3. Sexo: (X) Masculino

1.4. Escolaridade?

1.4. Terceiro grau completo

E você graduou em?

Em Educação Física

1.5. Profissão:

1.5. Hoje trabalho com o comercio, sou comerciante, tenho uma lanchonete aqui na cidade de Cruzeiro.

1.6. Foi atleta?

1.6.1 ( ) Sim

1.6.2 (X) Não

1.6.2. Não, joguei futebol amador até os 19 anos de idade, mas profissionalmente não.

1.7. Em caso afirmativo, de qual modalidade?

1.8. Em qual instituição realizou o curso de formação para árbitros de futebol?

1.8. Na escola Flávia Zetti da Federação Paulista de Futebol.

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1.9. Ano em que concluiu o curso de arbitragem?

1.9. Eu terminei o curso em 99 né, mas no final do estagio, final de 2000.

1.10. Entidade em que você é registrado hoje (Liga Federação ou Confederação)?

1.10. Nós somos árbitros Federação Paulista, Confederação Brasileira e agora 2015, Confederação Brasileira

CBF, e agora 2015 árbitro internacional da FIFA.

1.11. A arbitragem equivale a qual porcentagem da sua jornada de trabalho semanal?

1.11. Ah... Uns 60%, 70% meio que corresponde a arbitragem aí.

1.12. A arbitragem equivale a qual porcentagem do seu rendimento mensal?

1.12. 75%.

2. Ser árbitro

2.1. Por que optou em ser árbitro de futebol? Como a arbitragem “entrou” na sua vida?

2.1. Bem, eu comecei arbitrando jogos na faculdade, como estagiário né, tinha uma bolsa, e na época o professor

Elineu colocava estagiários trabalhar em coisas e, e ele consequentemente trabalhava de secretário de esportes da

cidade, então ele nos colocava pra trabalhar em futebol de campo, futebol de campo, voleibol, ele era professor

acadêmico de voleibol. Então na verdade eu comecei trabalhando em varias modalidades até me afirmar na

arbitragem de futebol, então foi em conta também pela faculdade.

2.2. Você recebeu alguma influência pra optar pela arbitragem de fato?

2.2. Do irmão,[...]. Ate o motivo de fazer o curso da Federação foi em, com o espelho nele, espelho no[...].

Quando você começa a trabalhar na arbitragem aqui na cidade, seu irmão já era árbitro?

Já era árbitro da Federação e quando eu entrei no quadro da CBF, quando eu entrei na escola da Federação

Paulista, ele já estava indo pro quadro da FIFA.

2.3. Como foi a reação dos amigos e familiares quanto você disse que ia ser árbitro?

2.3. Ah, já imaginavam, ate pelo fato de estar, por eu trabalhar, por eu estar, fazer faculdade de educação física e

já ter um irmão na família sendo um árbitro nacional.

2.4. Comente um pouquinho a sua trajetória na arbitragem.

2.4. Então, eu comecei trabalhando com arbitragem no ano de 2007, 2006. Desculpa, de 96 á 97, aí fui fazer o

curso na Federação em 31, a minha aula dia 31 de outubro de 98, e de lá o curso terminou em agosto de 99 e

antes disso eu trabalhava na minha cidade no Campeonato amador, nas Categorias de Base, então já trabalhava

no futebol amador desde 96. Como eu disse também trabalhei em outras modalidades, principalmente no futsal

até o momento que eu me decidi largar as outras modalidades e definir só pra arbitragem de futebol de campo.

De lá, dali pra frente em 2001 já fui pro Quadro Nacional muito rapidamente fiquei no quadro, to no quadro

nacional ate hoje e em 2015 agora entrei no Quadro Internacional, em 2010 como aspirantes FIFA e agora em

2015 como árbitro da FIFA.

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Agora então eu posso considerar que você já fez a categoria principal, não sei se é assim que chama o

profissional da federação, na confederação também e, em relação a FIFA agora você entrou em 2015?

Eu fiquei dois jogos apitando, entrei em dois jogos esse ano. Eu fiz dois jogos na Venezuela Amoura e Bocas

Juniors pela libertadores, e a duas semanas atrás eu fiz um jogo no Paraguai, nacional do Paraguai em LDU, em

La Copa Sul Americana fora mais quatro, cinco oportunidades que eu fiquei como quarto árbitro, um amistoso

do Brasil e México até, e agora já estou escalado pra trabalhar no dia 13 de Outubro no jogo entre Uruguai e

Colômbia pela eliminatória da Copa do Mundo, pra mim ta sendo um fato assim, uma surpresa muito grande

nesse meu primeiro ano porque ter essa oportunidade de trabalhar numa eliminatória de Copa do Mundo.

Parabéns!

Obrigado.

2.5. Qual a imagem que você, quando espectador / torcedor de jogos esportivos, tinha dos profissionais da

arbitragem antes de se formar árbitro?

2.5. É, sempre tive uma imagem de respeito né, por ver aquela pessoa ali como eu via, acho que como um

professor. Eu falo que eu perdi meu pai muito cedo, então meu exemplo, meu espelho sempre foi o professor de

Educação Física, o Professor Laércio e, e ele sempre exigia que respeitássemos o que tivesse respeitar o

adversário, respeitar o árbitro, então já o via como um professor, e fui ter essa certeza depois de quando eu passei

a ser árbitro de futebol, então eu sempre vejo o árbitro ali como um juiz mesmo que determinava as leis de jogo,

nós tínhamos que ter um respeito enorme pra aquele intermediador do jogo.

2.6. Hoje, você também é um profissional da arbitragem, quando espectador / torcedor, qual a imagem

que tem do árbitro?

2.6. Olha ainda continuo com essa imagem que é intermediador, é uma frase muito interessante que eu recebi

durante o curso da FIFA que ele é uma pessoa que toma decisões impopulares né, que não agradam todas as

pessoas mas sabendo assim da necessidade, da responsabilidade desse profissional hoje, profissional que ainda

de fato não tem direito mas que tem essa responsabilidade de intermediar esse jogo.

2.7. Quando assiste seu time jogar, se você tem um time do coração, como você reage em relação ao

trabalho do árbitro?

2.7. Hoje eu posso dizer que eu não tenha assim essa identificação com equipe nenhuma né, mas posso falar ai

dos jogos do Brasil, por mais que a gente note que tem uns equívocos, assim como eu tenho os meus equívocos

mas sempre com muito respeito porque hoje eu também sinto na pele como são difíceis as decisões na 120 das

decisões da partida. Então a gente sabe da dificuldade ali daquele árbitro de tomar todas essas decisões em

poucos segundos.

Você consegue assistir o jogo, ou hoje você assiti o árbitro?

Não, hoje eu não consigo assistir mais jogo nenhum. Meu filho vem jogar eu só consigo prestar atenção nos

profissionais, árbitros e assistentes que, que a gente fala que assisti jogo de futebol com a arbitragem é a coisa

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mais chata do mundo. Fica todo mundo vendo as jogadas e nós estamos preocupados com o posicionamento

tanto dos árbitros quanto dos árbitros assistentes.

2.8. Na sua opinião, qual a importância da função de árbitro? Se a gente for pensar que a gente vive num

país com tantas diferenças sociais e que o futebol é a paixão nacional, é quase uma religião?

2.8. Eu falo que, acho que aqui no Brasil acaba sendo né, principalmente na América Latina acaba sendo, na

América do Sul posso te dizer porque eu to vivenciando isso, existe essa dificuldade maior de ser árbitro de

futebol por questões sociais, educação né, nós lidamos com o povo que quase ninguém tem primeiro ou segundo

grau completo, a grande maioria de todos esses países e sabendo-se que o futebol a gente mexe com a paixão das

pessoas, eu falo as vezes que a pessoa não tem religião, não tem família, mas tem uma equipe de futebol. Então a

gente mexe demais, eu falo que essa é uma responsabilidade que a gente tem que a gente mexe demais com a

emoção dessas pessoas, o tamanho dessa responsabilidade, e pelo fato ainda de não terem um grau de instrução

ou o principio básico de educação necessário né, pra toda nossa população acaba partindo da parte

governamental entre um, entre outros. Ou própria disciplina dentro de casa.

Apesar de você ter entrado no quadro da FIFA agora, você citou os países latinos né. Você acha que essa

postura e esse comportamento que a gente vê da população brasileira então é um comportamento comum

do país?

Sim, também. Eu vejo até, pra você ter uma ideia no Brasil nós estamos com a cruzada do respeito, que no

primeiro momento toda imprensa nacional bateu muito nos árbitros, teve muitas discussões, mas de uma forma

geral todos compraram a ideia de que futebol melhorou que tempo de bola melhorou, já diminuiu o numero de

cartões, de advertências das posições dos jogos. E quando nós estamos nós hoje brasileiros estamos trabalhando

com os árbitros da América do Sul na Libertadores e Sul Americana, isso é notório da parte deles que a gente ta

conseguindo implantar aqui no nosso campeonato principalmente porque os jogos locais hoje entre brasileiros

estão vindo árbitros de outros países. São clássicos nacionais locais são um árbitro de um terceiro, de um terceiro

país, de um segundo país e eles já notam as diferença, é o comentário geral dos árbitros da America do Sul, dessa

questão de disciplina e respeito. Entao se nós estamos conseguindo de todas as dificuldades, com todos nossos

erros ainda né, nas nossas limitações já estamos conseguindo então a gente crê que não seja tão difícil na

educação e na população assim, como um todo a gente tem uma revolução, uma melhoria aí na parte de

disciplina e na educação de pessoas.

Quando você citou a cruzada do respeito é uma coisa recente então?

Sim, essa foi... Todo ano, todo ano a CBF bate muito em um tema pra gente trabalhar nos campeonatos

nacionais, cada ano a gente tem uma bandeira, a gente diz assim. O ano passado a gente falava muito na questão

de, de respeito mesmo entre as pessoas né, principalmente de torcedores entre eles, o árbitro também tinha um

pouco dessa responsabilidade, e esse ano a cruzada do respeito dentro do campo de jogo, doa a quem doer todas

as dificuldades que teríamos, mas os jogadores teriam que ser um pouco mais disciplinados e mais educados

dentro do campo de jogo. E é o que esta acontecendo, nós tivemos a melhoria, temos a bola rolando como eu

falei diminuição de cartões, diminuição de reclamações, menos simulação, porque no segundo turno do

campeonato brasileiro foi um outro tema que foi colocado, é, acabar com a praga da simulação que também

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mexe muito com o emocional das pessoas, que as pessoas se sentem burlados e hoje os árbitros temos um pouco

de responsabilidade em cima da simulação pra que os jogadores simulem menos durante a partida.

Então você, pelo seu pouco tempo, posso dizer assim, de experiência internacional. Você acredita que o

comportamento do europeu é diferente?

Acredito sim, até assistindo jogos, que nós hoje passamos assistindo, a maior parte do nosso tempo assistindo

arbitragem não só nacionais, não só Sul americano, mas também os europeus que ta ai na nossa televisão no

nosso dia a dia, e a gente nota eu lá realmente o numero de falta é menor, e o respeito principalmente pelo árbitro

de futebol acaba sendo maior. Pra você ter uma ideia começou a dificuldade na Europa dos árbitros lidar com

essa disciplina e já foi a bandeira da UEFA e isso sim, quando eles sentiram que estavam perdendo o controle já

entrou com essa bandeira também do respeito. E assim a CBF também levantou essa questão no Brasil e nós

estamos conseguindo dar essa volta por cima.

2.9. Queria que você comentasse um pouco sobre a profissionalização de árbitro de futebol.

2.9. Nós acreditamos, eu acredito, eu ainda sempre colocava né, tenho essa esperança de ver o árbitro

profissional assim como outras aéreas do futebol, que hoje a gente pode dizer que um dos poucos que não é

profissional no futebol que envolve milhões, bilhões, envolve bilhões, é o árbitro de futebol, e é um dos mais

cobrados, quase toda a responsabilidade transferência de responsabilidade que acaba passando pela arbitragem,

se a gente parar pra pensar, vários profissionais de arbitragem, que tem seu emprego federal né, seja lá de

qualquer área, hoje os maiores exemplos que nós temos na arbitragem é os professores. São árbitros que

trabalham na sua atividade na parte da manha, principalmente em estados estaduais, ele trabalha de manha dando

aula, na parte da tarde ele se prepara e vai fazer um clássico 22h da noite num jogo de televisão aberto pro Brasil

inteiro. Ou exemplo maior, nós temos vários bancários que trabalham na boca do caixa de um banco até as 16h, e

as 22h estão intermediando um clássico seja lá de qual jogo, numa rede aberta de televisão e além, faz esse jogo

as 22, termina meia noite, chega em casa 3, 4 horas da manha no dia seguinte retorna pra essa jornada de

trabalho, pelo ritmo que esta o futebol, os árbitros corriam 2, 3, 4 km na década de 80. Hoje estão correndo na

media de 11 a 13 por partida se a gente for analisar fisicamente, do primeiro momento, fisicamente, se nós dois

não formos profissionais atletas dificilmente é, a gente vai conseguir acompanhar essa evolução do futebol tão

profissional, com um departamento de futebol tão profissionais que são hoje, se não houver uma melhora em

relação ao uma semi profissionalização ou uma profissionalização de fato o árbitro poder viver realmente da

arbitragem pra poder se manter, pra poder se preparar, descanso pós jogos, nós teremos, a cada ano que passar

nós teremos dificuldades maiores pra lidar com o futebol.

Na minha falta de conhecimento sobre a profissionalização, como que funcionaria, por exemplo, você seria

vinculado em alguma entidade ou ao seu, como é que seria seu rendimento, o que que ta sendo proposto?

Exato, são questões né, acho que são um dos motivos que a presidente já, já regulamentou a profissão. Ou

melhor, ela já, já sancionou a profissão da arbitragem agora fala a regulamentação. Então esses são, essas são

uma das questões que a própria a ANAC a profissionalização de árbitros, o sindicatos de todos os estados, nós de

São Paulo ainda busca essa proposta, qual seria melhor? Será que alguém que já tivesse seu emprego federal com

toda sua ??? Abriria a mao pra ser árbitro de futebol? Seria que haveria profissionalização só dos árbitros da

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FIFA, como é da argentina. Então ainda são questões que ainda não regulamentou também por conta disso, você

trabalharia dois, três anos como árbitro e depois voltaria pro mercado de trabalho normalmente, como empresa?

A gente fala que o futebol no nosso pais envolve tanta paixão, qual empresário, também um diretor, ou algo de

um profissional ia querer em seu quadro de funcionários um ex árbitro de futebol. Então ainda são questões, ate

nós mesmo sabemos dessa dificuldade mas esperamos um meio que pessoas para que ate futuramente os

próximos árbitros não sofram tanto com essa dificuldade de você ter que dividir seu tempo, seu período ser

arbitro de futebol e ser profissional de qualquer outra área ai do mercado de trabalho.

3. Situações políticas

3.1. Considerando-se a formação de um árbitro desde o Curso para formação de árbitro até a sua

ascensão à categoria de Árbitro Internacional (FIFA), como é a relação de trabalho, investimentos,

assessoria e suporte (psicológico, físico, intelectual, jurídico...) dados aos árbitros pelas Instituições

(Federação, Confederação, FIFA e Associação de árbitros) para o desenvolvimento profissional / humano?

3.1. Hoje eu posso falar mais especificamente da Federação na qual eu sou vinculado que é a Federação

Paulista, lá quando eu fiz o curso lá, numa fase bem anterior 98,99, nós tínhamos um curso de alguns meses e

nós tínhamos baseados, muito focados nas regras de jogo, tivemos pouca situação de assistir um jogo, na época

não tinha um trabalho assim era uma parte muito mais teórica e os estádios era considerados juvenis, que você ia

para os jogos, e ali nos jogos você tinha aquela correção em relação ao seu posicionamento, essa parte bem

campo de jogo. Aí nesse estagio dos árbitros que tinham mais facilidade, que já trabalhava com amador já

acabava levando um pouco mais de vantagem e ali o árbitro ia subindo de categoria, sub20, terceira divisão,

segunda divisão, até chegar na primeira divisão. Hoje, a federação paulista tem curso de duração de dois anos

que ela trabalha com varias matérias, varias habilidades. Ela trabalha com varias matérias, dentre elas a

federação tem um profissional, um psicólogo para acompanhar os alunos que realiza o curso, acompanha nos

jogos, acompanha nas pré-temporadas, acompanha nos treinamentos, então hoje é um trabalho integrado com a

preparação física, a preparação técnica e mais a presença do psicólogo nos treinamentos e essa além e nós por

morarmos no estado de São Paulo, grande como moramos, moramos cada um em uma região do estado, ;e, a

cada dois, três meses nós temos um trabalho conjunto de aprimoramento em São Paulo que eles vão levando 30,

40 árbitros por trabalho, as vezes por semana, com acompanhamento desses profissionais. Mas no caso do

treinamento físico, essa equipe técnica, uma empresa contratada pela federação nos passa através de email, todo

treinamento que a gente tem que fazer durante a semana, cada um na sua cidade, cada um no seu tempo,

intercalando com sua rotina, intercalando com seu dia a dia. E na CBF hoje também tem toda essa estrutura de

psicólogo que nos acompanha essa parte de pratica, física e a parte técnica, também com pré temporada, e

aprimoramento dentre outros atividades. No caso da FIFA é, como acaba sendo menos jogos, é uma carga menor

de partidas, mas todas essa estrutura de todos os países, todas essas confederações são utilizados pra

aprimoramento do arbitro da FIFA e só tem mais essa estrutura mais quando são os jogos internacionais,

competições internacionais, aí tem todo esse aparato, equipe técnica, terapeutas, psicólogos, médicos,

nutricionistas, entre outros. Mas são competições mundiais.

3.2. Comente:

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3.2.1. Você já entrou em alguma coisa em mudança de categoria, mas eu queria que você comentasse um

pouquinho mais como é feita essa mudança de categoria, quando você é formado, até você ser indicado

nacional. Como é que funciona esse critério.

Bem na verdade, toda partida que você faz né, sendo lá na federação ou confederação né, seria paulista no meu

caso CBF, todos os jogos são acompanhados pelos professores de arbitragem. Entao você tem uma nota a cada

partida que você faz, e eles acabam como toda comissão nacional ou comissão nacional pega todas aquelas

notas, como foi o rendimento desse árbitro durante a competição, e eles formam hoje, dividem hoje essas

equipes por ranking. Os rankings são árbitros que trabalham na primeira divisão, dos árbitros que trabalham em

segunda, dos árbitros que trabalham serie A, caso especifico de estado, tem caso que trabalha em serie A1, aí a

segunda, um segundo bloco de árbitro trabalha na serie A2, na serie A3, e assim vão dividindo esses blocos ate

chegar na inferior, que seria sub11, sub13, campeonato feminino, e a cada ano vai tendo essa alteração de

ranking de 20 nomes, de 5 nomes, de 10 nomes. Cada categoria tem seu numero especifico de árbitro que sobem

e desce. O quadro nacional hoje também é assim e o quadro internacional também é assim, se o árbitro ta tendo

um bom rendimento ele vai subindo, se ele tem muitos problemas físicos, psicológicos, físicos, ou técnicos

durante suas partidas, no caso da FIFA, ele acaba sendo substituído por algum outro árbitro né, o árbitro que tem

dificuldade né, tanto na prova física, no campo de jogo na técnica, ou na prova teórica que nós temos também,

ele é trocado pelo melhor companheiro que é

Mas eu não tenho esse rendimento, ele não fica restrito assim, ah eu tenho que fazer tantos números de

jogos ou eu tenho um tempo pra fazer isso. Tanto tempo em uma categoria?

No caso da confederação nacional, da CBF é, fica bem, é, fica bem restrito as partidas que você faz a sua prova

teórica e a sua, o seu desenvolvimento, perdão. No caso da CBF você é avaliado pelo, pelo campo de jogo, pelas

suas partidas, pela prova teórica e pelo teste físico, isso faz com que o árbitro suba ou não no ranking nacional.

No caso da federação os árbitros tem um mínimo de avaliações, então são 5 partidas por ano e por mais que ele

faca 50 partidas, ele tem um mínimo de 5 avaliações que são consideradas desse ranking, e os melhores de cada

federação estadual são indicados ano a ano do quadro da lista nacional pra que se chegue ao quadro nacional

depende muito das federações e pra chegar no quadro internacional do seu rendimento na CBF.

Eu acompanhei um pouquinho esse ranking de vocês quando eu comecei a estudar, porque tinha toda

relação com os árbitros que eu faria a entrevista e até achei que entrevistaria seu irmão, e ele parou, optou

por encerrar a carreia, e agora achei interessante e surpresa pra mim que tinha uma menina no quadro

da FIFA, e essa menina não apita. Então como funciona isso, se ela é FIFA, entende-se que ela tem uma,

um nível técnico que tem uma capacidade pra ser FIFA. E porque ela não apita os jogos em São Paulo?

Na verdade é, a federação tem esse ranking só que nós temos mesmo FIFA, nós temos os árbitros que são FIFA

pras categorias masculinas, e o quadro também de árbitros FIFA para as competições femininas, levando-se em

consideração que nada impede de uma arbitra ou de uma árbitro, dos árbitros trabalhar em competição feminina

e as árbitras nas competições masculinas. A gente nota a maioria dos árbitros trabalha nas competições, a

maioria das meninas que trabalham em competições masculinas na primeira divisão, são as árbitras assistentes,

elas acabam achando que né, que o comentário geral é muito mais fácil, pratico, trabalhar como árbitro

assistente, do que como árbitro central em competições masculinas. No caso as árbitras estarem aptas a

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trabalharem nos jogos masculinos hoje, elas tem que passar no teste masculino, e é uma das coisas que é mais

acontecem as vezes conseguem para fazer parte internacional feminino mas não consegue ir por causa do quadro.

São dois quadros, são dois testes, são quadros masculinos e quadros femininos. Nós temos também situações de

mulheres que passam em testes masculinos mas depois vem a questão da escala que aí já não é uma coisa que

depende mais dos árbitros e sim da comissão que nos escala. Aí é a preferência, a dificuldade do jogo, aí já

depende muito mais da comissão do que do próprio árbitro, nós fazemos a nossa parte mas também dependemos

muito depois de momentos que são as escalações dos jogos.

Nesse ranking ainda citando sobre o Paulo quando deixou a arbitragem ele abre espaço pra que seja

indicados, naquele ranking que são especiais também existe primeiro, segundo, terceiro, ou no ranking

não? Que tão lá?

Sim, hoje a federação paulista colocou os árbitros especiais que eles acabam não abrindo mao das pessoas que

são rankiados, existe sim uma numeração nesse ranking especiais.

Mas vocês não tem conhecimento?

Existe sim, não, nós temos o conhecimento. Temos o conhecimento dessa posição do ranking.

Não é divulgado no site?

Pode ser que não seja divulgado no site, mas os árbitros entrando nas suas escalas online, aí no seu email que faz

contato direto na confederação, ele tem sim a possibilidade e a condição de saber essa numeração nesse ranking.

Existe numero de vagas na CBF?

Sim, sim.

Por estado?

Sim, cada estado tem seu numero, o estado que tem mais árbitro da CBF é o de São Paulo, são 20 árbitros.

Estado do Rio de Janeiro 18 árbitros e aí os outros estados já vão diminuindo de vagas, pra gente ter uma ideia,

das cidades que tem poucas equipes, disputando competições nacionais tem 2, 3 vagas pra árbitros e 4, 5 por

assistentes, são pautas que o estado marca por ter muito mais equipes participando do quadro das competições,

acaba sendo um numero maior de árbitros, um exemplo, pra que se tenha um quarto árbitro em varias partidas

das competições na maioria das vezes o árbitro seja do estado. Nós temos um exemplo em São Paulo, nós temos

5 equipes serie A, duas, uma equipe hoje na serie B, 3, 4 equipes na serie C e 2, 3 equipes na serie D. Então você

precisa de um numero maior de árbitro e eles dificilmente colocam o árbitro da FIFA como quarto árbitro, até

coloca, mais dificilmente. Se você considerar que o árbitro da FIFA tá envolvido em competição nacional ou até

internacional e os outros árbitros envolvidos no quadro nacional em diversas series, você acaba tendo um

numero de árbitros em estados que tem maiores números de equipe.

No caso quando você tem dentro da CBF, três árbitros FIFA pra que um outro árbitro chegue a indicação

de FIFA, precisa abrir essas três vagas? Ou pode ter mais árbitros?

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No Brasil nós temos 10 árbitros da FIFA masculinos, esse é ó numero de vagas Maximo que a FIFA coloca,

FIFA e CONMEBOL, Confederação Sul americana de futebol coloca em disponibilidade do Brasil, 10 árbitros

da FIFA. Então para que entre outro algum árbitro do Brasil no quadro internacional, nós temos um exemplo do

ano passado né, nessa mudança de 2014 pra 2015 que o Paulo Cesar saiu e foi proposta, acabou indo pra

COMEBOL o representante nacional hoje da comebol, e abriram mais duas vagas pra outros árbitros. Então com

essa de abrir quatro vagas, entrou eu,[...], Anderson Daron e Delson Freitas. Anderson Daron do Sul e Delson do

Pará, e eu e o Claus é meu outro companheiro aqui de São Paulo. Também não existe vaga limitada pra

determinado estado, qualquer árbitro que tiver bem em qualquer momento do país pode ser indicado. Porque

hoje nós temos no país 10 árbitros da FIFA e 10 árbitros aspirantes não é que abriu uma vaga vamos pegar

qualquer árbitro da CBF colocar no quadro internacional, não. Hoje já se tem um quadro aspirante a FIFA que

são 10, quase no mesmo nível no quadro da FIFA esperando uma oportunidade pra entrar nesse quadro.

3.2.3- Queria que você comentasse os sorteios, as escalas e os sorteios.

3.2.3. Sim, quando criou o Estatuto do Torcedor foi uma das exigências das pessoas que fizeram a lei de que

houvesse sorteio porque eles achavam que as comissões não eram bem claras, as escalas de árbitros, porque esse

jogo não o outro árbitro, então uma das coisas que eles fizeram foi instituído nosso país o sorteio de arbitragem,

pra se te ruma ideia eu acho que na America do Sul, acho que só dois países, Brasil e Uruguai tem sorteio, os

outros países todos são escalas, porque o sorteio teve mais pratica pras pessoas, pras pessoas que imaginavam

que teria problemas na arbitragem pode ser que tenha sido uma forma de, de... Mas pra você lançar um árbitro

jovem não é fácil você colocar ele num sorteio, como é feito em São Paulo. Em São Paulo você coloca 20, o

numero depende, 20, 30 chegamos a ter sorteios com 35 árbitros para 10 jogos. Pode ser que você tenha um jogo

clássico que não seja um jogo que determinado árbitro no momento, por um árbitro em inicio de carreira, você

que fica no meio de arbitragem sabe disso, que se faz as vezes em anos, e você acaba perdendo um árbitro em

uma partida, então um problema da arbitragem que querem estreiar novos árbitros é a questão do sorteio, pra nós

que estamos diretamente com isso. Se você faz um sorteio não direcionado, não dirigido, hoje na CBF a gente

tem um exemplo que cada jogo, cerca de 2, 3 árbitro por sorteio, então você pode direcionar também por

determinados jogos na primeira divisão de árbitros, com 20 árbitros por sorteio corre-se o risco do arbitro não

estar preparado para determinada partida que ele ta sendo indicado, muita das vezes ele é muito jovem, e as

vezes ele ta envolvido no meio desses árbitros especiais, mas as vezes pode não ser um jogo determinado pra ele,

pode ser um jogo de televisão, ele não esteje tão preparado pra aquele jogo, então eu, Luiz Flávio tenho minha

opinião de que esse sorteio de todos os árbitros acaba sendo prejudicial pra lançamento de novos árbitros, essa é

a opinião própria pra mim.

Quem determina a forma do sorteio é a instituição?

Sim, é a instituição que decide, São Paulo o motivo do sorteio ser todos os jogos dos 10 árbitros é uma decisão

de... Na época foi decisão da presidente da confederação que era a ???, que pediu que o sorteio foi de todos os

árbitros para os 10 jogos independendo dos árbitros, pra ele todos os árbitros tinham condição de trabalhar

nesses jogos e na CBF temos a diferença que acaba indo dois ou no máximo três árbitros por seleção.

3.2.4- Valores pagos a arbitragem.

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3.2.4. Eu falo assim, se a gente for levar em consideração o que se paga num país um salário mínimo, o que se

ganha varias profissões do nosso país, o árbitro se a gente levar por esse, por essa comparação o árbitro é bem

remunerado. Mas pela responsabilidade em volta de uma partida de futebol, uma decisão de campeonato, decisão

de vaga, o investimento que é feito em equipes em milhões que são investidos nas equipes, nós podemos dizer

que o arbitro não ganha nada em relação ao jogo de futebol. O tamanho de uma responsabilidade uma final de

Copa do Brasil, um Campeonato Nacional que vai dar uma vaga internacional, uma vaga pra Libertadores

possivelmente um Mundial de Clubes, toda visibilidade que envolve uma partida de futebol a pressão, a

televisão, grandes as equipes que ganham em relação a direitos de televisão o árbitro não ganha pra apitar um

futebol, eu posso dizer que nós somos muito mais apaixonados do que bem remunerados para trabalhar numa

partida de futebol. Então é uma remuneração boa em relação ao nosso país e, em relação a minha cidade, sim,

mas em relação ao meio ao qual eu estou envolvido eu não ganho, não sou bem remunerado pelo tamanho da

responsabilidade que são passados para nós nesse tempo ali de 90 minutos, intermediando esses 90 minutos. Um

exemplo, que eu fiz uma final de Copa do Brasil envolvendo duas equipes de um mesmo estado, pela primeira

vez elas disputavam essa final de Copa do Brasil nós tivemos, um exemplo básico, nós tivemos um valor de 6

milhões e o árbitro, no caso eu que tava resolvendo aquela partida, não tinha nem verba 000,01% daquela, pra ta

sendo responsabilizado por apitar aquela final de jogo.

4. Relações Humanas

4.1. Como são as relações entre colegas de arbitragem, se é uma relação de parceria ou de

competitividade.

4.1. Existe sim uma competitividade, mas na minha opinião, na minha opinião né, particularmente sadia, pra

mim. Mas existe muita amizade, muito trabalho em equipe que é o nosso lema, o nosso tema em todas as

partidas que a gente vai resolver, mesmo sendo árbitro central ou o quarto árbitro existe sim uma, uma amizade

muito grande né, um companheirismo, trabalho em equipe, é um torcendo muito pelo outro, porque a gente fala

que são poucas as pessoas que torcem por nós, os nossos familiares e comissões de arbitragem e poucos amigos

que não são fanáticos e nem tão apaixonados, então eu parto do principio que eu torço muito pelos meus

companheiros, tenho pouco de dificuldade nos meus jogos para que os outros jogos também sejam facilitados.

Então eu sou um dos maiores torcedores da arbitragem para que o meu trabalho seja bem facilitado, mas existe a

competitividade, existe um outro caso mesmo de os exs árbitros não ter ali uma certa intimidade com alguns

outros companheiros, problemas de personalidade né, de opinião própria mais na grande maioria são assim,

árbitros que tão sempre preocupados um com o outro.

4.2. Existem muitos comentários sobre as escalas: quem deveria trabalhar em determinados jogos ou não?

4.2. Isso é normal, isso é normal, normal, é natural em todas as áreas. Acho que na arbitragem de todas as

modalidades, mas acima de tudo existe o respeito muito grande que é aquilo que a gente fala, se ela foi no

momento determinada pra um, escalada pra um determinado jogo é porque ele tem uma pequena condição de

levar com condição de atua com responsabilidade e competência, mas que as vezes é um comentário natural, que

as vezes acontece sim. É que nós como árbitros também as vezes não sabemos de uma estreia, de um lançamento

que trabalha minuciosamente ali naquele árbitro e as vezes nós não estamos lá tão envolvidos com aquele dia a

dia do árbitro, então é normal que saia sim esse comentário, mas com muito respeito.

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4.3. As relações com jogadores, comissão técnica, torcedores, espectadores e mídia, durante a partida e

quando você termina uma partida. Existe diferença, como são essas relações dentro do futebol?

4.3. Eu, eu falo por mim que eu acabo sendo, eu, eu, eu levo de uma maneira, de uma forma que eu costumo

respeitar os jogadores né, dentro de campo de jogo, não falar palavrão com eles, não partindo pra uma linguagem

grosseira ou ofensiva, ate pelo fato de não permitir que eles façam isso no jogo, então não tem esse direito de ter

um autoritário dentro de campo. Eu procuro é, que eles me respeitem, mas também tenho que respeita-los, eu

quero autoridade sem ser autoritário, é, eu sempre levei dessa forma mesmo nos jogos amadores uma, uma, não

chega a ser uma amizade, mas um certo respeito, um certo diálogo com esses jogadores, principalmente durante

a partida, a que você não perca essa autoridade durante os jogos. E pós jogo acontece um diálogo mais estendido

mas sempre respeitando o limite mesmo fora do jogo, o limite entre o árbitro e o jogador de futebol. Com a

comissão também, com a comissão acaba sendo, acaba sendo um dialago um pouco maior ne, com a imprensa a

gente respeita também o trabalho dela ali durante o jogo, a maioria das vezes o torcedor, a equipe do seu estado,

da sua cidade, do seu país a gente respeita isso. Mas nós não podemos perder em nenhum momento essa

oportunidade de, de exigir e de ter respeito entre essas pessoas, com nós todos envolvidos dentro do futebol. Em

relação aos torcedores são né, que eu venho falando em toda a minha, que eu venho colocando em toda minha

fala que eles acabam atuando muito mais na parte emocional, na parte do fanatismo, de querer a vitória da sua

equipe a todo custo ne. E ainda tem aquele intermediário, aquele árbitro tomando decisões impopulares, nós

temos que tomar um cuidado maior, principalmente com os fanáticos ne, em relação a nossa vida depois no dia a

dia, você ta na rua, você ta encontrando com esses torcedores, em aeroportos, rodoviária, restaurantes, tem que

ter esse cuidado um pouco maior. Mas também de muito respeito e principalmente o que eu coloco muito nos

meus planos de trabalho é essa parte, de respeitar as gremiacoes, de respeitar jogadores, torcedores porque a

gente sabe que o futebol sendo apaixonante demais, então a gente não pode perder essa oportunidade de, de, a

gente não pode perder esse respeito ne por essas pessoas, aprender a respeitar em todos os momentos por conta

dessa paixão que envolve o futebol.

5. Tecnologia e mídia

5.1. Você é a favor do uso da tecnologia pra arbitragem e você é a favor, qual a tecnologia que é favorável.

5.1. Eu sou favorável sim a tecnologia mas essa que foi utilizada para a Copa do Mundo, gol e não gol. É muito

triste, é muito complicado principalmente pra nós árbitros você terminar uma partida, você saber que aquele

resultado final não foi legitimado por conta de uma decisão. A bola entrar, você não vê, e você não dar um gol,

então uma partida que poderia ter terminado um a zero, termina zero a zero, ou você dar o gol numa bola que

não entrou. Para mim essas duas situações deveriam sim, como foi feito na Copa do Mundo ter a utilização da

tecnologia, gol, não gol. Mas agora a gente não é pra colocar a tecnologia em todas as decisões, o futebol que já

tem aí uma duração de duas, quase duas horas, passaríamos pra duas horas e meia, três horas, eu acho que isso

ficaria mais complicado. Eu não sou favorável em todas as situacoes, em todas as decisões. Mas essa de gol e

não gol, aí sim na maioria das vezes o resultado pode não ser legitimado, por causa de uma decisão que eu tomei

durante a partida.

Eu tomei conhecimento na imprensa, uns dias atrás a autorização na FIFA pro uso de um ponto por

questões de finalidade. Então você acha que essa tecnologia não estaria ajudando?

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Eu creio que vai ajudar sim, vai ajudar muito, e eu falo que quanto mais coisas puder colocar pra ajudar a

arbitragem, né, porque hoje é difícil nós querermos competir com a tecnologia, olho humano, três pessoas, no

máximo quatro, trabalhando num jogo. Tínhamos já o auxilio, o apoio de dois árbitros nacionais que foram

tirados né, foi apenas um teste que não continua, pra nós quanto mais pessoas tiverem envolvidos é melhor pra

nós, pra legitimar os resultados, vai ser um teste que vai ser muito benefico, assim como a FIFA foi pioneiro em

colocar dois árbitros dentro de campo, colocar 7 bolas que se usa no mundo inteiro nós esperamos que também

dê certo a questão da tecnologia. Eu falei do gol e não gol mas lembrando que lances diários, o que puder vir

para nos ajudar e nos auxiliar vai ser sempre em benefício do futebol.

Na verdade então o que você coloca de uma maneira contraria, tem aquela coisa da polemica para o jogo,

o que foi, vamos ver de novo... Tipo voleibol.

Na polemica e no desafio, o medo é que o futebol chegue nesse desafio que toda decisão que você tomar no jogo

alguém que vê o direito de parar aquele jogo, voltar a essa decisão. Mas agora em que for em benefício da

arbitragem, do trio de arbitragem propriamente dito, essas situações que eu falei de gol e não gol, e essa daí

complementando depois de penais, principalmente de pênalti aí sim foi favoravel. Agora desafios para o jogo,

essa decisão que você tomou não, retorna com bola no chao, aí o futebol começa perde um pouco a graça.

6. Mídia

6.1.1. Como você avalia o trabalho da mídia no futebol em relação à equipe de arbitragem?

Eu acho que ela poderia ajudar muito mais com informações que mostra ai, principalmente como a população, os

torcedores, ganharam com os comentaristas de arbitragem, desde lá dos primeiros que vieram a trabalhar, hoje,

quase todos os canais tem um comentarista de arbitragem. Então quanto mais a gente puder divulgar as regras de

jogo pra que as pessoas entendam o mínimo de regra do jogo, facilita a nossa vida. Mas agora se for àquela

mídia bairrista, torcedora, não vai somar em nada, não vai ajudar em nada, a gente sabe que tem muito torcedor

trabalhando na midia, tem muitas pessoas, acaba tendo o time tem paixão por determinada equipe, mas a gente

acaba respeitando. Mas às vezes não concordando com alguns comentários que são feitos. Agora se for àquela

mídia que vem pra esclarecer, que vem pra tirar a dúvida do torcedor, pra mostrar realmente quando a gente

falha, quando a gente se equivoca, quando a gente erra, aí sim a gente a gente somos favoráveis ai.

6.1.2 A segunda em relação aos comentarias, Ex-árbitros.

6.1.2. Sim, eu acho que pra informar os torcedores, em geral, no ambianto geral, quem ta acompanhando a

partida, entende qual foi a decisão que aquele árbitro tomou, ou porque não tomou, esse profissional, esse ex

árbitro principalmente faz um papel de educador, de professor até para ensinar as pessoas em relação ao, ao que

o árbitro está de comandante de jogo. Então facilita muito mais até em relação a polêmica. Dentre esses

comentaristas, já diminui, principalmente no acerto do arbitro, já diminui essa polêmica em relação ao dia

seguinte.

6.1.3 A responsabilidade da mídia em relação à violência nos estádios

6.1.3. Eu acho que poderia ser melhor, eu acho que poderia ser melhor na forma que eles vendem as vezes, um

clássico ou uma partida buscando o que já aconteceu no passado, o que for principalmente de uma forma

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negativa, ao invés de ajudar eu acho que apimenta muito mais, coloca ainda muito mais emoção.. Já cria-se um

clima desfavorável pra que você possa levar família pro campo de jogo, levar um filho, levar um parente. Leva

os torcedores, colocando como os torcedores entao a forma que se coloca, a forma de como eles colocam as

vezes, umas informações, torcidas organizadas é, eu acho que acaba sendo uma mídia vendida de uma forma

negativamente. Então eu acho que poderia ser melhor, poderia ser melhor, principalmente com comentarista né,

essa mídia de torcedores já começa falar que pode ser um problema em relação ao arbitro, em relação aquele

jogador, já começa vender aquela briga entre jogadores de jogos anteriores, pra mim é uma mídia negativa

nesses jogos.

6.1.4. A responsabilidade da mídia em relação contra a equipe de arbitragem

6.1.4. Também muito grande, principalmente quando um equívoco, um erro que as vezes acontece de uma forma

que ninguém quer e a forma como é passada, repassa essa informação tanto ali no rádio, principalmente no rádio

ne, que são pesos locais, na maioria das vezes. A forma como eles colocam mexe com o emocional e

consequentemente com a segurança da arbitragem pós jogo. Porque dentro de campo todos vêem, nós temos

3,5,10, 15 policiais a nossa volta. Mas no dia seguinte? E o aeroporto, e a rodoviária, e a estrada, e o restaurante

que você ta no dia seguinte correndo esse risco de encontrar esse torcedor, principalmente quando você acerta e

eles defendem até o último momento que o árbitro se equivocou naquela decisão que todos já viram que tinha

acertado. Então ela poderia, assim como eu coloquei dos comentaristas de arbitragem, poderia ser uma mídia

mais esclaredora do que defender às vezes uma opinião de que todos tão vendo que foi de uma forma contrária.

Eu vou precisar voltar numa pergunta que eu te fiz por conta da sua resposta nessa pergunta. Então você

acha que a manifestação do torcedor não é só no calor da partida, porque você citou e no dia seguinte ,

quando você encontra no aeroporto, então você acha também que teria problemas?

Sim, nós temos relatos de vários árbitros que tiveram problemas no aeroporto, dentro do avião, você ir viajar

com vários torcedores organizados no mesmo voo. Você faz partidas em alguns estádios que só tem um voo de

retorno, CE volta com dirigente de equipe, CE volta com torcedor uniformizado ou torcedor comum entendeu.

Por isso que a gente fala que eu não quero só a profissionalização da arbitragem, eu comentava no ultimo final

de semana que eu tava ali, eu quero a melhoria na estrutura do que envolve um jogo de futebol, que todo mundo

vê a arbitragem apenas nos 90 minutos, mas muita gente não vê as arbitragem antes ne a sua chegada num

estado, numa cidade, num país as vezes, o seu retorno encontra aquelas pessoas no dia seguinte, o restaurante

que você vai pós o jogo que você tem que tomar cuidado de não ir, você sabe que pode encontrar com torcedor

organizado. Então o que a gente pede é essa melhora, essa melhoria de estrutura, uma segurança maior,

segurança nos hotéis, segurança nos aeroportos, uma equipe de segurança seja lá por parte dos sindicatos das

associações ou parte de quem ta organizando, gerindo essas situações.

7. Violência

7.1. O que você entende por violência?

7.1. Ah eu acho que, que seria de um modo geral a violência é você expor um individuo, não diria nem

adversário.. Você expor um individuo a uma situação constrangedora. Se essa violência da forma, da forma que

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parecer, seja lá uma ofensa moral ou até mesmo vias de fato, a violência pode acontecer de varias maneiras hoje,

então por meio eletrônico. Então você expor um individuo a uma situação constrangedora pra mim acaba sendo

uma violência.

7.2. Você já sofreu violência na função de árbitro?

7.2. Sim, já sofri situações de jogadores dentro de jogo, de te empurrar, de torcida, dirigente na porta do

vestiário, falar bastante, antes de partida já estar reclamando do árbitro que vai trabalhar naquele jogo ou pós-

jogo, abrir em redes sociais coisa que eu não tenho e nem tenho intenção de ter, de você ouvir comentários de

vários árbitros de, de vários dirigentes, torcedores. Então pra gente acaba sendo sim, não precisa ser essa

violência explicita de vias de fato, mas a gente acaba sofrendo, passa por situações constrangedoras sempre,

principalmente sendo nós os intermediadores dessas partidas, de pessoas na sua cidade, às vezes, não sendo uma

sala de atuação e acabar te xingando, reclamando daquela situação, então isso acaba sendo meio que uma

constância na vida do árbitro.

Você já sofreu violência física, além desse empurrão que você citou?

Não, não, só no campo de jogo que já cheguei a ter esse problema de vias de fato, mas assim, nunca uma

agressão de soco assim, mas empurrão daquela coisa de rodinha, de xingamento principalmente já sofri.

A sua família já sofreu algum tipo de violência?

Já de reclamações aqui na cidade onde a gente mora e aquela, mandar uma reclamação por terceiro, através de

um familiar. Mas já, já aconteceu.

7.4. Nesse jogo que você citou de ter sofrido a violência, qual era a importância da partida?

7.4. Ah, foi uma competição de segunda divisão do estádio de São Paulo.

7.5. Qual era a faixa etária dos jogadores?

7.5. Profissional. E também em competições amadoras, principalmente no amador que não tem policiamento,

não tem segurança, que ali que a gente fala que o árbitro, é uma das maiores virtudes de um árbitro é a coragem.

A gente fala que a gente tira o chapéu pros árbitros amadores, que eu também já passei que vale mesmo no

profissional, que acaba contando em torcidas, sem a presença de segurança de policiais ou de seguranças que

pode sofrer que ele possa trabalhar naquele jogo. Também já sofri essa violência de empurrão, de chute até em

campeonato amador, mas em profissional uma vez no jogo da segunda, terceira divisão.

7.6. De quem partiu a violência:

Eu vou fazer alguns itens, se você quiser citar você comenta se não responde sim ou não.

7.6.1 (x) jogadores

7.6.1 (x) jogadores

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7.6.2 ( ) comissão técnica

7.6.2 (x) comissão técnica

Só por ofensa grosseira.

7.6.3 ( ) torcedores

7.6.3 (x) torcedores

Também ofensas, graças a Deus, só ofensa grosseira, nunca via de fato.

7.6.4 ( ) espectadores

7.6.4 (x) espectadores

Também não.

7.6.5 ( ) policiais

7.6.5 (x) policiais

Se eu já sofri violência da policia? Não, não

7.6.6 ( ) jornalistas

7.6.6 (x) jornalistas

Jornalista ofensa moral, verbal, poderia ser. Em trabalho isso é quase que normal natural na nossa profissão.

Agora de dirigentes teve uma vez que se não fosse a escolta policial eu poderia sofrer uma via de fato em uma

competição profissional.

E jornalista em campo?

Já ouvi, comigo não, e aconteceu de colocar o microfone na boca do árbitro de uma, aquela coisa de querer

enfrentar no final do jogo, mas agredir o árbitro, chegar abrir boletim de ocorrência. Mas comigo não.

7.6.7 (x) outros.

Não, não cheguei graças a Deus eu tive poucos problemas até hoje aí, na minha carreira. Graças a Deus.

7.7. A violência ocorreu:

7.7.1 ( ) antes da partida

7.7.2 (x) durante a partida

Aquela coisa de marcação falta ou pênalti e ver todos os jogadores mais exaltados te empurrando.

7.7.3 ( ) após a partida

Término não?

Término de partida também aconteceu, mas com a providencia rápida do policiamento e também não deixasse

que as vias de fato ocorresse.

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7.8. Local em que a violência ocorreu:

7.8.1. ( ) No terreno de jogo

7.8.2. ( ) Nas dependências dos estádios

7.8.3. ( ) Fora das dependências do estádio

7.8. Caminho, como diria trajeto de campo e vestiário, túnel, túnel, dirigente foi no túnel. Não, não me recordo

coisas de torcedores de ficar reclamando.

7.9. O que você acha que motivou a violência, esse motivo à violência?

7.9. Questão social primeiro momento, educação, indisciplina e a paixão, emoção envolvida, emoção envolvida

no jogo propriamente. Mas acho que os maiores momentos, maiores, maiores questão pra essa violência ainda

seja educação.

7.10. Eu vou te fazer uma pergunta, mas eu acho que você já respondeu. Em relação a violência, quais são

as diferenças em trabalhar em jogos amadores e jogos profissionais em Série A, Série B.

7.10. A diferença acaba sendo segurança, falta de garantia que a gente diz. A falta de garantia que a gente diz na

maioria das vezes, estrutura de estádio, às vezes tem alambrado ou algo mais, ou a falta de policiamento,

segurança mesmo no jogo.

7.11. Como você avalia a segurança nos estádios e a segurança dada a equipe de arbitragem?

7.11. Excelente, excelente, em quase todas as partidas que a gente trabalha é uma responsabilidade muito grande

por parte da policia, da segurança, com a equipe de arbitragem principalmente, é uma responsabilidade. Eu já

cheguei a conversar com um tenente né, comandante de policiamento, ele fala que nós árbitros não temos noção

do tamanho da responsabilidade deles em relação a essa segurança. E a cada ano que passa a gente nota que

melhora, antigamente tudo dentro do campo de jogo, a partir do momento que coloca dentro do regulamento de

competição que a equipe perde mando, perde isso, perde aquilo, pega 100, 150 km pra uma cidade vizinha, já

diminui, já começa educar mais, a treinar um pouco mais e diminui aonde a indisciplina dentro de campo de

jogo. Hoje nós vemos nos estádios, quando um torcedor joga alguma coisa, todos os outros torcedores na hora já

entrega pra policia o torcedor que jogou algum objeto, então acaba sendo mesmo educacional, é uma questão

disciplinar e educacional ao mesmo tempo.

Quando vocês realizam jogos do campeonato paulista, vocês deslocam da Federação pro jogo?

Sim, nós vamos de fretado, um táxi fretado que nos pega na nossa sede e nos leva para o estádio. E quando

trabalhamos em jogos em outro estado as vezes é o quarto árbitro ou o delegado regional, delegado representante

da federação que esta envolvido com a gente dentro de jogo, com a arbitragem e equipe de arbitragem. Nos pega

no hotel, nos leva para o jogo e retorna para o hotel ou diretamente ao aeroporto.

Mas esse transporte não tem nenhum tipo de acompanhamento?

Só em jogos de muita responsabilidade ou finais de campeonatos, ou jogos que pensam comentários. Um jogo de

alto risco nós vamos com abatedores ou escolta policial, somente nessas situações.

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7.12. Como você vê e interpreta a violência contra árbitros?

7.12. Muito triste né, muito triste, acho que ali revela, revela o, a falta de preparo, de educação e de respeito a

esse profissional que ainda faz parte do jogo que não é o principal, que os principais são os jogadores, mas que

se faz necessário a presença de intermediadores e desse arbitro na partida de futebol. Então essa componente

desse universo que não deveria passar pelo o que passa ou que passou

7.13. Uma pesquisa realizada com árbitros de futebol na Áustria tinha como objetivo investigar quais as

situações de conduta antidisciplinar de jogadores e técnicos que levavam um árbitro a utilizar um cartão

vermelho. As respostas mais citadas pelos árbitros foram: Ofensas relacionadas à capacidade técnica, a

aparência física, ao caráter, a orientação sexual e outros. Qual é o tipo de ofensa citados na pesquisa que

você menos tolera tornando possível a punição com o cartão vermelho?

7.13. Tudo bem, a quinta não entrarei em detalhe. A capacidade técnica nenhum arbitro gosta de achar que não ta

bem na partida, por mais que ele sofra, que ele tenha um equivoco durante o jogo, pra ser mais exato, porque na

maioria das vezes quando o jogador ou dirigente fala com você, ele acha que você não sabe nada, que você

desconhece tudo por conta de um erro, ele acha que você desconhece tudo, então eu acho que deixa o arbitro

muito mais aborrecido é quando o arbitro acha que não esta preparado tecnicamente pra aquela partida. Mas em

primeiro lugar seria o caráter, a partir do momento que duvida do meu caráter de que eu possa ta ali com

segunda, terceiras intenções, pra mim acho que é o absurdo do absurdo, que eu considero que me dedico como

eu disse no inicio quase exclusivamente pra arbitragem hoje ainda propriamente como arbitro do quadro

internacional, me considero um arbitro nacional mesmo eu não, de fato, não de direito, me preparo, me programo

para o que eu estou envolvido, e duvidar do caráter acho que seria o primeiro momento. Segundo parte técnica,

parte física eu me preparo o máximo possível para os jogos, ao não ser quando tive lesão. Já tive 3 lesões sai, por

conta de lesão mas ai era uma coisa que não dependia tanto de mim, orientação sexual é uma coisa que já caiu no

gosto do torcedor, ele gosta mesmo de xingar e alem de tudo não liga pra isso. Mas caráter em primeiro

momento, capacidade técnica dois, aparência físicas três, orientação sexual quatro e outros cinco. Não, outro

qualquer outra coisa que se fala ou que se faça, mas assim, hoje a gente fala que se concentra se procura estar tão

equilibrado nos jogos que às vezes quando surge qualquer outro comentário durante o jogo você não consegue

perceber tamanho foco que você esta envolvido no jogo.

8. Stress e Autocontrole

8.1. Você poderia numerar quais são os motivos de maior tensão e stress:

8.1.1 (1) Você ou a equipe de arbitragem sofrer agressão

8.1.2 (2) Falta de segurança nos estádios

8.1.3 (5) Trabalhar em partidas de equipes com as quais você já teve problemas em partidas

anteriores

8.1.4 (4) Atrasos e pontualidade

8.1.5 (6) Pagamentos de taxas

8.1.6 (3) Cometer erros em momentos decisivos da partida

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8.1. A primeira é a equipe de arbitragem sofrer agressão, inadmissível, como eu falei, nós somos mais

apaixonados, do que bem remunerados para trabalhar num jogo, então é inadmissível, seja no campeonato

amador. Seja inadmissível um jogador sai da sua casa, to envolvido no futebol amador que seja e sofrer uma

agressão, ele não esta ali brincando, ele esta ali trabalhando e fazendo ali na maioria das vezes de uma forma,

envolvendo muito mais paixão do que remuneração, então primeiro momento o que pode deixar o arbitro muito

mais aborrecido, essa situação da agressão. Em segundo lugar pra mim, é a falta de segurança nos estádios,

inadmissível você fazer um grande jogo, tanto que todos os regulamentos não nos autoriza a começar um jogo,

uma partida sem policiamento. Hoje eu falei que nós mexemos com emoção e com paixão é difícil você fazer

sem ter o mínimo de confiança. Cometer erros em momentos decisivos da partida, isso pra mim também enrosca

né, tá ali concentrado, com o controle da situação e nada mais triste para um arbitro é você chegar na sua casa, e

saber que uma decisão equivocada sua é, envolveu o resultado final da partida, acho que não tem erro maior para

o árbitro é você não legitimar o resultado final de uma partida. Se você fizer uma outra, não uma pesquisa, mas

uma outra, no comentário geral da arbitragem nós não esquecemos da partida que fomos bem, dois, três, você

esquece. Mas o arbitro nunca tira da cabeça o momento que ele se equivocou, que ele foi mal, que ele prejudicou

uma equipe, isso morre com o arbitro, tamanho responsabilidade e a situação que a gente não quer cometer erros

em momentos decisivos das partidas, pra mim essa fica em terceiro lugar. Trabalhar em atraso, pontualidade não

da, não da para um arbitro que trabalha em grandes jogos viver no atraso. Eu acho que disciplinou muito minha

vida foi ser arbitro de futebol e trabalhar com essa pontualidade de arbitragem, que se eu faço um jogo as quatro,

eu tenho que estar as duas no estádio, se eu chegar duas e meia eu já sou punido. Então pontualidade em relação,

se for relacionado ao arbitro pra mim acaba não caindo porque acabei me disciplinando muito bem em relação a

isso. Agora atrasos e pontualidades pela equipe não é só uma falta de respeito com o árbitro, mas também com o

publico envolvido. A partir do momento em que as pessoas respeitar mais, jogadores, arbitragem, o publico que

esta pagando por esse evento futebol, eu acho que a gente vai, ai sim a gente vai crescer muito mais em muitas

outras situações que envolvem o respeito. Ai sim o futebol vai passar a ser um espetáculo no nosso país, a partir

do momento que começar a respeitar o torcedor de maneira correta, com pontualidade, não haver atrasos de

jogos e uma coisa que a CBF e a Federação já esta conseguindo implementar nesses últimos dois, três anos nas

competições nacionais e internacionais. Eu falei das quatro né? Essa é o que fica em quinto, pagamentos de taxas

claro que todo mundo quer ser remunerado, mas você sabe que uma hora ou outra você vai ser remunerado por

esse jogo, então eu acabo não me estressando nesse fato com os dirigentes que não querem pagar porque de uma

hora ou outra você vai receber por isso. Como a gente fala né, a gente acaba trabalhando mais por paixão do que

realmente pra esse pagamento de taxa, sabendo que você vai receber lá na frente, então procuro não me estressar.

Eu já me preparo, posso ter, posso passar por essas situações em todas as partidas que eu trabalho.

8.2. Quais são as atitudes de jogadores e técnicos que dificultam seu trabalho?

8.2. A reclamação de situações que não ocorrem. A reclamação acintosa de uma coisa que todos e depois ate as

imagens mostra que você não tava equivocado, que nós chamamos de transferência de responsabilidade, essa é

uma coisa que o árbitro não aceita, não tolera.

9. Existe algum outro tema ou comentário que gostaria de registrar?

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9. Acho que foi bem completa, a maior questão foi bem completa, mas eu creio, acredito que foram bem

abordados todos os temas né, falamos bem dessa parte psicológica, falamos dos nossos treinamentos, da nossa

responsabilidade que tem com o que a gente tá envolvida né e, a questão da família que sofre muito com as

nossas atuações, torcem. Como nós moramos em cidade do interior, a cidade acaba respirando arbitragem, as

pessoas veem falar pra gente: ``hoje eu não vou torcer pra minha equipe, to aqui pra você fazer um belo

trabalho``. Então não tem nada mais que prazeroso e realização pessoal que você adquirir o respeito dessas

pessoas, sabendo ali que você ta tentando trabalhar ali com ética e com responsabilidade. Independente da

categoria, do gênero que você ta trabalhando. Então essa é a satisfação pra gente, legitimar o resultado e chegar

no vestiário com a sensação de dever cumprido e maior ainda, as pessoas ate esquecem aquele arbitro que estava

envolvido no jogo, não tem satisfação melhor saber que a gente não teve participação de erro no resultado final

do jogo.

Queria te agradecer, por essa segunda-feira, por essa tarde que você muito solícito, muito generoso por

dar essa entrevista.

Eu que agradeço Carla né, mais uma, mais um trabalho né, principalmente acadêmico que a gente tem essa

oportunidade de falar de arbitragem. E falar de arbitragem pra mim, eu ficaria aqui até dez horas da noite, se

tivesse assunto, que me dá prazer de falar de arbitragem, eu faço o que eu faço porque eu gosto, sou apaixonado

pelo o que faço, às vezes as pessoas não entendem né, que as vezes é uma pergunta, você também sabe do que

estou falando. As vezes as pessoas perguntam: ``como você foi gostar de ser arbitro, ser xingado, passar o final

de semana longe da sua família, da sua mulher, do seu filho?``. As vezes deixa o filho chorando, mudar data de

aniversario, é que nós gostamos muito do que nós fazemos, somos apaixonados pelo o que fazemos e temos o

prazer de ta falando disso e de procurar passar essa informação pra o maior numero de pessoas possíveis né. É o

que muitas mais pessoas tenham entendimento dessas regras que possa atuar ou trabalhar de uma forma que nós

trabalhamos.

Eu te agradeço e te desejo muito sucesso!

Muito obrigado, pra nós.