RESUMO - Sociologia

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RESUMO1. A sociologia o estudo dos fenmenos sociais, da interao e da organizao social. 2. A sociologia importante para cada dia de nossas vidas, pois fornece instrumentos para entender as foras externas que regulam nossos pensamentos, percepes e aes. 3. A sociologia surgiu sob as condies de mudana associadas com: a) o declnio do feudalismo e o aparecimento do comrcio, da indstria e da urbanizao; b) o movimento intelectual conhecido como Iluminismo, no qual a cincia e o pensamento laico sobre os mundos fsico, biolgico e social poderiam prosperar; e c) o choque traumtico e a mudana social brusca decorrentes da Revoluo Francesa. 4. O nome sociologia foi proposto pelo pensador francs, Auguste Comte, que acreditaxia que a cincia da sociedade poderia competir com as cincias naturais. Comte tambm sentia que o descobrimento das leis da organizao social humana poderia ser usado para reconstruir a sociedade de uma forma mais humana. 3. I-ierbert Spencer na Inglaterra similarmente argumentava que as leis da organizao humana poderiam ser desenvolvidas. Essas leis iriam

concentrar-se no crescimento e na complexidade da sociedade, visto que essas causas criavam presses para: a) o aumento da interdependncia e troca entre as pessoas e organizao de uma sociedade: e b) o aumento do uso do poder para regular, controlar e coordenar as atividades desses membros e unidades organizacionais. Spencer fundou uma teoria sociolgica conhecida como funcionalismo, em que a funo de uma estrutura social na manuteno da sociedade era enfatizada. 6. mile Durkheim adotou as idias de Spencer, mas deu continuidade tradio francesa de enfatizar a importncia das idias culturais para a integrao da sociedade. Como Spencer, ele era um funcionalista e acreditava que as leis da organizao humana poderiam ser descobertas, mas acrescentou teoria de Spencer a importncia de se descobrir as causas e funes dos smbolos que buscam integrar a sociedadc. 7. Karl Marx, um alemo que foi expulso de sua terra natal e que acabou se estabelecendo na Inglaterra, enfatizou a natureza contraditria da sociedade, inspirando uma teoria conhecida como a teoria do conflito ou sociologia do conflito. Na opinio de Marx, as desigualdades

na distribuio de meios de produo armam o palco para a transformao da sociedade, pois as pessoas sem os meios de produo se organizam para entrar em conflito com aquelas que controlani a produo, que detm o poder, e que manipulam os smbolos culturais para legitimar seus privilgios. Ao contrrio de Comte, Spencer e Durkheim, Marx no acreditava no desenvolvimento de leis gerais para a organizao humana. 8. Max Weber, outro importante fundador alemo da sociologia, engajou-se num dilogo vitalcio mas silencioso com Marx, enfatizando que a desigualdade multidirnensional e no exclusivamente baseada na economia, que o conflito contingente em condies histricas e no o resultado inevitvel e inexorvel da desigualdade, e que a mudana poderia ser causada pelas idias assim como a base material e econmica de uma sociedade. Ele tambm realou que a sociologia deve olhar tanto para a estrutura da sociedade como um todo para os significados que os indivduos conferem para essas estruturas. Como Marx, ele duvidava de que houvesse leis gerais da organizao humana, mas, ao contrrio de Marx, ele sentia que necessrio que sejam isentas de

juzos de valor, ou objetivas, na descrio e anlise dos fenmenos sociais. 9. A sociologia norte-americana antiga adotava as idias europias para problemas especficos associados com a urbanizao e a industrializao, mas de fato iniciou duas importantes tendncias: a) o uso ampliado das tcnicas estatsticas, quantitativas; e b) a proposta terica conhecida como Interacionismo, em que a nfase dada aos processos que sustentam e transformam a sociedade, atravs de interaes face a face. 1(1. A sociologia agora uma rea ampla e diversa que analisa todas as facetas da cultura, da estrutura social, do comportamento e interao e da mudana social. No mundo contemporneo, a cincia tornou-se o modo predominante para se entender o universo. A cincia no a nica forma para isso, pois a religio, o senso comum, a literatura, a poesia, as ideologias, a filosofia e a intuio pessoal so tambm usadas para compreender o mundo. Assim, a cincia tem concorrentes; e essa competio mais intensa em algumas reas do que em outras. Alguns no-cientistas questionam as alegaes dos fsicos sobre como o universo fsico funciona; o

mesmo verdade para os qumicos, bioqumicos e bilogos. Entretanto, ainda que ocultamente, as crenas religiosas quanto ao creacionismo freqentemente se posicionam num patamar de hostilidade em relao concepo evolucionista darviniana da espcie. Na rea social, entretanto, a cincia dificilmente reina. (lis homens e suas criaes -- sociedade e cultura no so freqentemente vistos como acessiveis ao estudo cientfico. E h mais de 150 anos, desde a proposta de Auguste Comte (l830-1848), de que a sociologia poderia ser uma cincia natural, que os prprios socilogos permanecem divididos nessa questo: a sociologia pode, ou deve, ser tomada como cincia? S porque Karl Marx e Max Weber questionavam as possibilidades da sociologia cientfica , que muitos socilogos contemporneos (Halfpenny, 1982; Denzin,1970) tambm o fazem. Todavia, por ora, vamos assumir que essa controvrsia sobre o status cientfico da sociologia no exista, e examinar como a sociologia cientfica procede.

A NATUREZA DA CINCIA

O objetivo da cincia possibilitar-nos entender e acumular conhecimento sobre o universo. O veculo para tais entendimentos a teoria, que procura nos contar por que os fenmenos existem e como eles funcionam (J. Turner, 1991). As teorias cientficas tm algumas caractersticas especiais que as separam de outros tipos de explicaes como as religiosas, as de dogma poltico e as opinies pessoais (J. Turner, 1985a). Uma caracterstica distinta das teorias cientficas sua abstrao. Elas so determinadas em termos muito genricos porque o objetivo explicar os fenmenos,em todas as pocas e lugares. Por exemplo, a frmula famosa de Albert Einstein, E = mc2, no diz qualquer coisa sobre a emisso especfica de energia (E), ou o corpo da matria (m), ou a velocidade da luz (c) num momento especfico no tempo; o que diz que a energia, a matria e a velocidade da luz so fundamentalmente relacionadas em todos os tempos, em todos os lugares e em todas manifestaes de energia. Em resumo, essa equao revolucionria e abstrata porque nasce alm das particularidades e estados que verdade em todos os tempos e lugares em nosso universo. As teorias sociolgicas tambm podem ter essa qualidade. Por exemplo, como observei no ltimo

captulo, Herbert Spencer (1874-1896) props que com o crescimento populacional os membros de uma sociedade se tornam mais diferenciados, levando a fragmentaes e especializao de grupos que so integrados por interdependncias e concentraes de poder. Esta teoria tambm abstrata porque no se retere uma populao especfica num ponto determinado do tempo, mas a boas as populaes em todos os tempos e lugares. Uma segunda caracterstica nica das teorias cientficas que elas so sujeitas a provas. l foi inclusive dito que as teorias cientficas existem para serem refutadas (Popper, 1959, 1969), posto que o objetivo da cincia seja submeter suas teorias a tantas provas quantas forem necessrias para se ter a segurana de que a teoria no facilmente refutada, e e, portanto, plausvel. Pois se uma teoria permanece intacta aps repetidas confrontaes de dados empricos, ento considerada por ora como a melhor explicao da maneira que as coisas so. Quando as teorias resistem prova de tempo isto , esforos repetidos de contestao , ento se tornam provisoriamente aceitas como verdade, como a maneira que as coisas realmente so (Popper, 1969).

Esse o modo de funcionamento de toda cincia. No um processo eficiente, mas um meio de mantermos nossas teorias presas a fatos reais. Ns defendemos ceticamente as teorias e constantemente as verificamos contra os fatos. Compare essa proposta a formas alternativas para a compreenso do mundo. Em interpretaes religiosas, os poderes dos deuses e as foras sobrenaturais so tidos como controladores do fluxo de acontecimentos, e h uma suposio de que as coisas deveriam ocorrer; e, se essa viso no corresponde maneira real pela qual os acontecimentos se desdobram, as crenas no poder dos deuses ou a verdade das suposies no so contestadas, como seriam no caso de uma teoria cientfica. Melhor, uma nova interpretao oferecida para sustentar as crenas. Similarmente, os preconceitos pessoais so freqentemente mantidos quando os fatos os contradizem; de fato, ns nos apegamos aos nossos preconceitos e percepes porque eles nos confortam e porque estamos acostumados a eles. As ideologias polticas tm essa mesma qualidade; as pessoas apiam-se em suas crenas polticas at mesmo quando os programas defendidos em nome dessas crenas fracassam. Em contrapartida, as teorias cientficas so finalmente refutadas ou

transformadas quando elas no correspondem aos fatos empricos. As teorias no so casualmente testadas, embora freqentemente comecemos apenas com a intuio de que os dados correspondem teoria. Eventualmente a teoria deve ser avaliada de um modo sistemtico, em termos de alguns procedimentos genricos, geralmente denominados de mtodo cientfico. A idia geral por trs dos mtodos da cincia desenvolver procedimentos imparciais para coletar dados e ento especificar claramente o percurso escolhido. Dessa forma, outros dados podem surgir e verificar que fomos honestos e no cometemos quaisquer erros bobos ou impusemos preconceitos. Sem dados nos quais possamos acreditar, ou ter confiana, no sabemos se temos registros precisos dos acontecimentos nem sabemos se os dados realmente se sustentam na teoria que estamos testando.

QUADRO 2.1 O Que Torna a Cincia nica?1. A cincia no busca avaliar o que deveria, 5. A cincia usa mtodos de coleta de dados ou no deveria, existir ou ocorrer. que podem ser contestados por outros

2. A cincia busca apenas compreender para testar as teorias no so parciais. por que os fenmenos existem e como eles funcionam, sem julgamentos de 6. A cincia acumula conhecimento valor, quando as teorias encontram sustentao consistente em testes empricos e quando 3. A cincia gera determinada compreenaquelas que no recebem tal sustentao so que desenvolve teorias abstratas e so refutadas ou modificadas. isentas de juzos de valo; as quais explicam o como e o porqu dos fenmenos. 4. A cincia ento sujeita essas teorias verificao emprica, refutando-as ou modificando-as se os fatos no correspondem a elas.

para certificar-se de que os dados usados

Assim, a cincia encontra a sociologia medida que ns usamos teorias para explicar o mundo social e, ao mesmo tempo, verificamos essas teorias com fatos reais. Como as teorias so

desenvolvidas e testadas, acumula-se conhecimento e sabemos mais sobre o mundo social que nos cerca.

AS TEORIAS SOCIOLGICASSeria bom nesse momento apresentar as grandes realizaes da teoria sociolgica para explicar o comportamento humano, a interao e a organizao. Mas atualmente h pouco consenso sobre quais teorias so as melhores, e tampouco existe entre os pesquisadores a iniciativa de testar cada uma de nossas muitas teorias e ver qual parece melhor. De fato, a sociologia revela uma tendncia infeliz, para os tericos, de criar teorias que no so muito acessveis aos testes e, para os pesquisadores, de coletar e analisar os dados sem prestar muita atenao a teoria (Turner e Tumer, 1990). Assim, triste mas verdadeiro que os tericos e pesquisadores tendem a seguir caminhos isolados. O lado ctico das teorias evidencia para a sociologia uma srie de propostas tericas, interessantes apesar de muitas vezes nao verificadas empiricamente, para interpretar os fatos no mundo social (Ritzer, 1975, 1988; J. Turner, 1991). Deixe-me esboar amplamente

algumas das mais importantes dessas propostas, deixando para captulos posteriores as teorias especficas que foram desenvolvidas dentro dessas amplas perspectivas. Ns j encontramos algumas dessas perspectivas quando discutimos a emergncia da sociologia no captulo anterior. Aqui seremos mais explcitos nos elementos fundamentais dessas amplas propostas (1. Turner, 1991).

Teorizao FuncionalA teoria funcionalista foi criada por l-lerbert Spencer e retomada por mile Durkheim no sculo XX. Durante certo perodo dos anos 50, esse tipo de teoria dominou a sociologia; agora, representa apenas uma das diversas propostas. Todas as teorias funcionalistas examinam o universo social como um sistema de partes interligadas (Turner e Maryanski, 1979). As partes so ento analisadas em termos de suas conseqncias, ou funes para o sistema maior. Por exemplo, a famlia seria vista como uma instituio social bsica, que ajuda a manter a sociedade maior, regulamentando o sexo e unindo os adultos, e socializando os jovens para

que eles possam se tornar membros competentes de uma sociedade. Alem disso, pode-se examinar qualquer estrutura isto , sua atual faculdade ou universidade em termos funcionalistas basta fazer uma nica pergunta: como algum aspecto de sua escola conjunto de estudantes, grmios e~ (issociaes, diretrio acadmico, classe, corpo docente, administradores etc. contribui para o funcionamento do sistema global? A maioria das teorias funcionalistas postula necessidades ou requisitos do sistema. Quando isso feito, uma parte examinada com respeito a como se preenche uma necessidade ou requisito do todo. Por exemplo, muitos sistemas sociais tm necessidades de tomar decises, coordenar pessoas e alocar recursos; portanto, se issO constitusse um requisito bsico, algum perguntaria: que partes do sistema preenchem essas necessidades relacionadas? E ento ns explica ramos como uma parte especficapor exemplo, o governO, se o nosso sistema central uma sociedade funciona para preencher essa necessidade bsica. H muitos problemas com teorias funcionalistas. Um dos mais importantes que elas freqentemente vem as sociedades como

demasiadamente bem integradas e organizadas (Dahrendorf, 1958, 1959). Assim, se toda parte do sistema tem uma funo ou preenche uma necessidade, as sociedades pareceriam ser mquinas de movimento suave e bem lubrificadas. Todos ns sabemos, claro, que isso no verdade, pois o conflito e outros processos disfuncionais tambm existem. Contudo, teorias funcionalistas ainda tm um atrativo porque elas nos levam a ver o universo social, ou qualquer parte dele, como um todo sistmico cujos elementos constitutivos funcionam em conjunto; ou seja, o funcionamento de cada elemento tem conseqncias sobre o funcionamento do todo.

Teorias do conflitoKarl Marx e Max Weber foram as origens intelectuais de teorias sobre o conflito, embora outros socilogos antigos tambm vissem o mundo social segundo suas contradies. Ao contrrio das teorias funcionalistas, que enfatizam a contribuio das partes para um todo maior, as teorias do conflito vem os todos sociais cheios de tenso e os contradies (Collins, 1975). Embora haja muitas teorias distintas sobre o conflito,

todos partilham um ponto em comum: a desigualdade a fora que move o conflito; e o conflito a dinmica central das relaes humanas. De fato, seria difcil no notar as tenses e os conflitos que emanam da desigualdade. Por exemplo, em sua aula de sociologia h uma contradio inerente entre voce e seu professor sobre um elemento bsico: sua nota. O professor controla a nota, e isso significa que ele tem poder sobre voc. Voc est, ento, numa situao de grande desigualdade, e a tenso est apenas sob a superfcie. Se no consegue a nota que voc queria, voc pode ficar contrariado, e, se voc pudesse, faria algo para reverter a situao. A mesma fora bsica funciona em todas as relaes sociais entre atores distintos, como indivduos, grupos tnicos, escritrios e pessoal num escritrio, classe social, ou naes. Ao olharmos ao redor de nossa prpria sociedade, vemos os efeitos da desigualdade que a contradio produz em todo lugar Os trabalhadores e gerentes nas empresas freqentemente esto inquietos; as pessoas pobres agridem as pessoas ricas; as mulheres se ressentem dos salrios mais altos e poder que os homens tm na sociedade; as minorias tnicas se ressentem com o status de segunda classe que

lhes dado; e assim vai. Todas essas fontes de contradio que se manifestam em formas distintas de conflitocrime violento, desordens, protestos, manifestaoes, greves e movimentos sociais originam-se da distribuio desigual de recursos valorizados pelas sociedades, como dinheiro, poder, prestgio, moradia, sade e empregos. O conflito , portanto, uma contingncia bsica da vida social; ele potencialmente sentido em todo lugar, desde as relaes interpessoais entre homens e mulheres, passando pela exigncia de interaes entre diferentes etnias, at os ressentimentos contra o poder dos pais, professores e empregadores.

Teorias uteraccionistas bom falar sobre partes, todos, funes,desigualdades e conflitos, mas o que dizer das pessoas reais que devem se encarar e lidar umas com as outras? As teorias interacionistas tentam responder a essa questo, como veremos em detalhe no Captulo 5 quando retornamos ao trabalho de George Herbert Mead (1934, 1938) e todos aqueles que foram seus discpulos. Por ora,

deixe-me esboar a posio bsica das teorias interacionistas. Os homens interagem emitindo smbolos palavras, expresses faciais, corporais, ou qualquer sinal que signifique algo para os outros e para mesmos (Goffman, 1959, 1961, 1967; J. Turner, 1988). Atravs de gestos simblicos, demonstramos nosso estado de esprito, intenes e sentido da ao; e contrariamente, pela leitura dos gestos dos outros, obtemos um sentido do que eles pensam e como eles se comportaro. Ns podemos at mesmo fazer isso quando outras pessoas no esto fisicamente presentes por exemplo, quando voc pensa em pedir mais dinheiro de um pai, reclamar de uma nota dada por um professor ou encantar algum por quem esteja interessado. Aqui h uma troca de gestos em sua mente visto que voc mentalmente interage com essa pessoa. Assim, a vida social est mediada por smbolos e gestos; e usamos esses gestos para nos entendermos uns com os outros, para criarmos imagens de ns mesmos e das situaes e construirmos uma idia de situaes futuras ou desejadas. Para os interacionistas, ento, a explicao da realidade social deve emanar da investigao meticulosa do micromundo dos indivduos que

mutuamente interpretam os gestos, que constroem as imagens de si prprios e definem as situaes segundo certos princpios (Blumer, 1969; Stryker, 1980). As macro ou grandes estruturas da sociedade o Estado, a economia, a estratificao e similares so construdos e sustentados por microinteraes (Collins, 1981, 1986); e para os interacionistas seria impossvel entender o mundo social sem investigar esses encontros no micronvel. Pense nos seus gestos e nos das pessoas que esto ao seu redor numa sala de aula, por exemplo. Ao caminhar em direo sua cadeira, como se desvia de seus colegas, como seus colegas se comportam antes ou durante as aulas e, tambm, os meios pelos quais os professores tentam se fazer entender Portanto, uma sala de aula estruturada est repleta de gestos, interpretao e reinterpretao, e situaes definidas na perspectiva interacionista; voc no uma abelha operria que obrigatoriamente segue o roteiro de conduta de uma sala de aula (embora isso seja certamente relevante), porque voc est constantemente emitindo sinais e interpretando a fim de transformar e, s vezes, criar novos roteiros para a interao. Dessa forma, o interacionismo contrrio s tendncias que tomam a estrutura e

a cultura como exteriores aos atores sociais, tratando-os como robs.

Teorias UtilitaristasEsse conjunto final de teorias fornece hipteses para a compreenso dos homens da moderna economia, que, por sua vez, adotavam as idias centrais dos filsofos escoceses, tais como Adam Smith (1776) durante a Era da Razo (Camic, 1979). Aos olhos dos tericos utilitaristas, os homens so racionais at o ponto em que eles tm objetivos e finalidades; eles calculam os custos de vrias alternativas para atingir esses objetivos e escolher a alternativa que maximize seus benefcios (ou o que os economistas chamam de utilidade) e minimizar seus custos. Dessa forma, ns somos seres que tentam tirar algum proveito de uma situao, ao reduzirmos nossos custos (Ilechter, 1987; Coleman, 1991). Por exemplo, voc pode calcular quanto trabalho voc est disposto a dispender (seu custo) a fim de receber determinada nota (seu benefcio) neste curso ou, se eu posso ser idealista por um momento, conhecimentos que voc pode usar durante toda a

sua vida (a longo prazo, um benefcio muito mais compensador). Assim, todas as situaes envolvem uma troca de recursos: voc abre mo de alguns recursos (seu custo) a fim de receber algo que voc percebe ser mais valioso (sua utilidade). Assim, para os tericos do utilitarismo, todas as relaes sociais so, em ltima anlise, trocas entre atores que incluem custos a fim de obter benefcios uns dos outros, ou seja, que calculam a relao custo-benefcio. Seu professor incorre num custo (energia e tempo para preparar as aulas, conversar com os alunos, correo de provas etc.) a fim de receber um salrio (da universidade) e, talvez, sua lealdade e admirao. Da mesma forma, voc vai as aulas, l, pensa e se submete s pmvas (seus custos) para receber notas, conhecimento, e talvez uma mesada de algum como seus pais (seus benefcios ou utilidades). Ns no fazemos os clculos conscientemente, na maioria das vezes eles esto implcitos. Apenas quando no temos certeza do que fazer numa determinada situao que tomamos conscincia dos clculos flexveis de custo-benefcio. Mas, finalmente, os utilitaristas argumentam que em instituies escolares voc troca tempo, energia e dinheiro por notas, diplomas e conhecimento, que voc calcula serem

ainda mais valiosos do que vias alternatixas para dispender seu tempo, energia e dinheiro. Para os tericos do utilitarismo, a interao, a sociedade e a cultura so finalmente criadas e sustentadas porque elas oferecem bons resultados para indivduos racionais. Esses resultados raramente so monetrios; em geral, eles so posses menos tangveis sentimentos pessoais, afeio, orgulho, estima, poder, controle e outras moedas suaves que estruturam a sociedade. Pode-se ver isso simplesmente observando uma situao em que voc ficou zangado ou feriu seus sentimentos; em tal situao, uma recompensa (freqentemente no monetria) no foi recebida proporcionalmente ao seu custo e investimento; esse fato indica que, sob a superfcie de seus sentimentos, esto implcitos clculos sobre custos e recompensas.

A Situao Atual da Teoria SociolgicaH muitas variantes especficas dessas perspectivas tericas. Encontraremos algumas delas medida que avanarmos na questo da sociologia. Do ponto de vista da cincia, seria bom ter teorias mais centradas e precisas que tenham

sido sistematicamente testadas e que agora organizariam essa introduo sociologia. Mas isso no vem ao caso. Muitos socilogos no acreditam que isso possa ou deveria ser o caso (Seidman e Wagner, 1992). Ao contrrio, as teorias sociolgicas atuais podem apenas nos ajudar a interpretar aspectos especficos do mundo social, e ento para o presente nossas teorias no so como aquelas das hard sciences (Giddens, 1971, 1976, 1984). A sociologia tem muitas partes de teoria, tipicamente inspiradas pelos fundadores, mas a maioria no foi sistematicamente testada e aceita como a melhor explicao do mundo social. Para alguns, os objetivos da cincia na sociologia so ilusrios, e o sonho de Comte de uma cincia da sociedade apenas um sonho. Para muitos outros, a sociologia ainda no se tornou uma cincia madura, mas seu potencial est presente nas idias tericas que foram elaboradas atravs destas quatro perspectivas: funcionalista, de conflito, interacionista e utilitarista. Alm disso, h muitas teorias menores ligadas a essas quatro e outras propostas mais genricas, que nos ajudam a entender muitos processos sociais, como veremos.

A sociologia, como as demais cincias, passa hoje por uma crise provocada pelas transformaes que esto atingindo o contexto social da vida humana. E uma realidade de mudanas confusas e, s vezes, incontrolveis, que provocam a alterao do papel social da mulher, modificam as relaes de trabalho, fortalecem o sistema capitalista e aumentam a flexibilidade no gerenciamento. A globalizao une os espaos e varre as distncias, modificando o papel do Estado-Nao e o comportamento das classes sociais. Essa nova ordem social exige o repensar das categorias sociolgicas. Diz lanni (1997:14): Diante das metamorfoses do objeto da sociologia, a teoria logo se v desafiada, posta em causa no que se refere a conceitos e interpretaes. No se trata apenas de acomodar e reformular conceitos e interpretaes. Trata-se de repensar alguns fundamentos da prpria reflexao sociolgica. H metamorfoses do objeto da sociologia que desafiam as categorias de tempo e espao, micro e macro, holismo e individualismo, sincronia e diacronia, continuidade e descontinuidade, ruptura e transformaes. Nesse contexto, algumas categorias bsicas da reflexo sociolgica abalamse, parecem declinar ou emergem, desafiando a imaginao. Para Ianni, talvez um dos maiores

expoentes da Sociologia brasileira, a crise dos paradigmas provocada pela metamorfose das relaes sociais fora um repensar das anlises e categorias sociolgicas.

MTODOS NA SOCIOLOGIANa cincia, os dados no mundo real precisam ser sistemtica e cuidadosamente coletados para que os procedimentos possam ser confirmados por algum. Fois, se ns simplesmente descrevemos alguns dados sem dizer aos outros conto e por quc esses dados foram coletados, ningum pode nos checar para ver se os nossos fatos so realmente verdadeiros. Assim, na ciencia uma proposta de procedimento comum o n11tl)llo ctuttWco direciona a pesquisa, ou a coleta e anlise de informaes sobre o mundo. O mtodo cientfico freqentemente percebido quando h etapas ou passos, mas no deveramos nos deixar influenciar demais passando a ver a cincia como uma marcha para a Verdade e o conhecimento. Melhor, a prtica da cincia, ou a pesquisa, cientfica depende simplesmente da conformidade a algumas regras (Babbie, 1992).

O primeiro passo a formulao de problemas, a problemtica da pesquisa, ou o que se est tentando descobrir Isso pode soar bvio, mas fundamental porque preciso delimitar o foco da pesquisa. Caso contrrio, andaremos em crculo durante a coleta de dados. Na cincia, as problemticas de pesquisa so freqentemente ditadas por uma teoria e um desejo de ver se a teoria aceitvel. Na sociologia bem como nas cienctas mais avanadas, as razes de uma pesquisa vo alm da simples verificao de teorias. Uma razo para comear uma pesquisa simplesmente a curiosidade sobre algum aspecto do mundo. Outra o desejo de um cliente uma agncia governamental, uma corporao, uma instituio de caridade de obter informaes sobre determinado tema. Ainda outra que uma pesquisa de carter exploratrio revela lacunas em nosso conhecimento, ou estimula novas questes. Assim, enquanto a viso idealizada da cincia veria toda a pesquisa como guiada pela teoria, a realidade bem diferente. H muitas outras razes para se desenvolver uma pesquisa, e o mtodo cientfico pode ser facilmente adaptado a elas. Um outro tpico importante no desenvolvimento da pesquisa a questo do que o pesquisador

espera encontrar E sempre conveniente formular uma hiptese, a qual pode ser criada a partir de uma teoria, mas no obrigatoriamente sobre os resultados esperados. Dessa forma, os pesquisadores tm um critrio ou padro com o qual confrontar suas descobertas. Sem uma hiptese para orientar a coleta e anlise de dados, ou pelo menos uma vaga idia sobre o que provvel de ser encontrado, fica mais difcil centralizar esforos; de fato, reuniramos informaes desnecessrias, ou at mesmo irrelevantes em relao problemtica da pesquisa. Finalmente, depois de expor um problema e suas expectativas em relao a ele, um plano de pesquisa construdo. Esse plano rene o conjunto de procedimentos ou tcnicas para a coleta de informaes visto que se relaciona com a problemtica de pesquisa e hipteses de algum. H muitos tipos bsicos de tcnicas, mas todas elas tentam expor claramente como a informao deve ser coletada. A escolha de uma tcnica depende de muitos fatores a natureza da problemtica, a verba disponvel e as preferncias do pesquisador. Na sociologia, h quatro tipos bsicos de tcnicas ou procedimentos empregados na pesquisa: (1) experimentos, (2) levantamentos,

(3) observaes; e (4) histrias. Cada um brevemente resumido a seguir.

Experimentos A idia por trs de um experimento testar o efeito de um fenmeno particular em algum aspecto do mundo social, tipicamente as respostas das pessoas aos estmulos ou situao especficos. O ingrediente-chave de um experimento o controle das influncias externas que contaminariam a avaliao dos pesquisadores dos efeitos dos estmulos centrais de uma situaao. No clssico procedimento experimental, isso conseguido com dois grupos: (1)0 grupo experimental, o qual recebe o estmulo ou exposto a uma situao de interesse; e (2) o grupo de controle, o qual no recebe o estmulo ou no exposto situao. As diferenas entre os dois grupos permitem que o investigador determine quanto o estmulo ou a situao afetou os indivduos. Esse esquema clssico raramente usado na sociologia, mas o objetivo de controlar as influncias externas ainda orienta a pesquisa. Um procedimento experimental mais tpico na sociologia isola os indivduos do mundo externo, e

ento observa suas respostas a um estmulo ou a uma situao particular de interesse para os investigadores. Isolando temporariamente os indivduos, algum controle sobre as influncias externas conseguido e torna-se possvel registrar as respostas das pessoas a um estmulo ou situao. Por exemplo, digamos que queremos examinar os efeitos de colocar indivduos numa situao de poder Ns isolaramos um grupo de indivduos num laboratrio, planejaramos uma tarefa para eles executarem, e criaramos uma situao em que um indivduo tivesse poder Observando e relatando as respostas, poderamos examinar os efeitos de ter poder Assim a natureza dos experimentos na sociologia.

Levantamento A tcnica de pesquisa mais usual na sociologia so os levantamentos, em que as pessoas so indagadas sobre um tema de interesse do pesquisador (Rossi et ai., 1985). Essas perguntas podem ser feitas por um entrevistador que se senta com o entrevistado ou, mais tipicamente, por um questionrio que o entrevistado simplesmente preenche. A validade dessa tcnica depende de

alguns fatores. Primeiro, os entrevistados so a populao inteira de interesse ou, mais habitualmente, uma amostra representativa desta populao? Segundo, todos os entrevistados concordam em responder as perguntas? Terceiro, os entrevistados respondem precisamente s mesmas perguntas? Porm, na prtica, esses trs aspectos so geralmente difceis de ser congregados. Pode ser impossvel de perguntar a toda a populao, ou ela pode ser de difcil acesso. Pode ser difcil de conseguir que todos respondam, porque esto ocupados, desinteressados, esquecidos, ou at mesmo adversos a intromisses em suas vidas. Pode ser que itens de um questionrio sejam interpretados diferentemente pelos vrios entrevistados, ou, em se tratando de entrevistas, os entrevistadores faam as perguntas num tqm diferente ou a qumica da interao entre o entrevistador e o entrevistado produza respostas diferentes. Se as amostras so suficientemente grandes, muitos desses problemas so eliminados, ou se neutralizam. Contudo, ao ser usada extensivamente, essa tcnica revela outros prohlemas (Cicourel, 1964): ela revela apenas o que as pessoasdizem, no o que elas podem realmente pensar e fazer; estrutura as respostas dos entrevistados em vez de deixar que

eles se comuniquem sua maneira; fica facilmente sujeita a mentiras e deturpaes; no examina facilmente os fenmenos que no podem ser confrontados com perguntas. Os socilogos, entretanto, empreendem essa tcnica, porque rapidamente administrada e favorvel aplicao de estatstica (Collins, 1984; Lieberson, 1985, 1992). Alm disso, os socilogos esto freqentemente interessados no que as pessoas pensam, sentem e acreditam; e uma entrevista ou questionrio uma maneira relativamente fcil de conseguir conhecimentos, percepes, sentimentos e emoes superficialmente.

Observaes s vezes o melhor deixar os limites do laboratrio experimental, desprezar o questionrio, e sair entre as pessoas em situaes da vida real e observar o que elas esto realmente fazendo. A tcnica das observaes faz exatamente isso (Whyte e Whyte, 1984; Whyte, 1989): ela coloca o pesquisador numa situao natural, na qual ele observa e toma nota do que v. Nesse caso, nuanas, contexto, interaes, histrias e relaes entre os acontecimentos

podem ser descobertos. Uma das tcnicas de observao a observao participante, em que o pesquisador realmente se torna um membro do grupo, organizao ou comunidade que est sendo estudada. Como tal, o observador, alm de estar mais intimamente envolvido, pode realmente perceber o mundo de uma maneira semelhante quela que observa. Outro tipo de tcnica de observao a observao discreta, em que o pesquisador nao participa diretamente como um membro, limitando-se a observar o que est acontecendo. Esse tipo de procedimento perde um pouco da intimidade e percepo possveis na observao participante, mas, em contrapartida, diminui a possibilidade de influncias que pode causar a presena do pesquisador no desenrolar dos acontecimentos e, conseqentemente, nos dados coletados para a pesquisa. Freqentemente, a observao antecede os levantamentos, porque ela possibilita a formulao de questes que sejam compreensveis para os entrevistados. A grande vantagem da tcnica da observao que se est investigando o mundo real, no as construes artificiais dos procedimentos experimentais, ou as perguntas de questionarios e entrevistas (Whyte, 1989). A grande desvantagem, entretanto, que os pesquisadores podem ver coisas distintas

segundo suas subjetividades. Alm disso, estudos por observao dificultam a confirmao de que ocorre efetivamente o que o pesquisador diz que ocorre, porque o grupo pode se extinguir, ou porque diferentes pesquisadores observam ou estimulam respostas de formas diferentes.

Levantamento Histrico As vezes queremos saber o que aconteceu no passado. Pode-se, claro, perguntar s pessoas nas entrevistas sobre seu passado, mas geralmente queremos observar a longos alcances da histria. nesse ponto que a histria e a sociologia convergem. Todos os fundadores da sociologia Spencer, Marx e Weber, em particular usaram a Histria para desenvolver ou ilustrar suas idias; e em dcadas recentes ressurgiu o interesse pelo levantamento historico para verificar e ilustrar teorias, ou para descrever o encadeamento dos acontecimentos nas sociedades passadas. A pesquisa histrica pode extrair seus dados da pesquisa prvia de historiadores que investigaram arquivos empoeirados, ou dos dados dos arquelogos que escavaram o passado; e, em outras pocas, os

socilogos vo eles prprios aos registros ou ao stio arqueolgico. A diferena principal entre a histria e a sociologia histrica que, na maioria dos casos, a pesquisa sociolgica est interessada em usar a historia para verificar ou ilustrar uma teoria mais genrica, ao passo que o historiador busca apenas descrever os fatos de uma poca especfica no passado. Embora isso seja uma distino vaga, captura o sentido das diferenas entre a histria e a sociologia. O grande problema em usar os registros histricos que eles sempre esto incompletos e sujeitos a diferentes interpretaes (as quais, claro, garantem empregos aos historiadores); e, como conseqncia, a histria raramente pode fornecer uma prova definitiva e conclusiva de uma idia teoruca. Uma vez que os dados so coletados por uma dessas tcnicas de pesquisa, eles so submetidos anlise. O tipo de anlise depende da tcnica de pesquisa e da natureza dos dados, mas o objetivo ser meticuloso, sistemtico e imparcial. Da anlise viro nossas concluses sobre o que descobrimos; e, portanto, seria melhor estarmos atentos, pois outros nos tomaro como ponto de partida e, conseqentemente, verificaro nossas concluses.

E um passo final no mtodo cientfico avaliar a aceitabilidade da hiptese ou, se hipteses no foram oferecidas, indicar o que os dados nos informam sobre os fenmenos estudados.

avaliar a aceitabilidade de:Ir Teoria nova ou existente

\ Formular uma Interesses dos clientes ~ problemtica . de pesquisa Conjunto de / dados tornecidos pela pesquisa

Figura 2.1 Elementos do mtodo cientfico. Esses passos podem parecer simples bom senso, mas sao muito mais: eles nos obrigam a ser sistemticos, permanecer imparciais (ou pelo menos reduzir nossos preconceitos) e deixar outros saberem o que descobrimos e como descobrimos. Sem as diretrizes do mtodo cientfico, no poderamos acreditar nas descobertas um do outro e no saberamos como

xerific-las e reavali-las. Disso resultaria um conhecimento por puro acaso e geralmente inexato; e no acumularamos conhecimentos vlidos sobre o mundo.

A cINcIA EXCLUI O HUMANISMO?Meus colegas socilogos geralmente proclamam que a sociologia uma forma de arte A idia genrica que os socilogos deveriam parar de aplicar questionrios impessoais e, em vez disso, entrarem contato com os trabalhos reais das pessoas. Outrossim, deveramos usar nossa intuio tanto quanto nosso intelecto para extrair informao sobre o mundo. O dever da sociologia de usar idias conceituais genricas defendido, mas s quando essas idias so influenciadas pela nossa participao ativa com pessoas em situaes da vida real. Sabendo de antemo os interesses, dilemas, problemas e frustraes dos indivduos na sociedade, podemos usar nosso conhecimento terico para ajud-los e tornar suas vidas melhores e mais satisfatrias. Os socilogos que defendem essa opinio acreditam que sua misso diagnosticar as fontes de tenso entre os indivduos que prejudicam a

organizao social e ento sugerir possveis solues. Muitos socilogos profissionais dedicaram-se primeiramente sociologia por razes humanitrias. Eles sentiam que certas condies sociais estavam erradas discriminao sexual e tnica, a riqueza confrontada com a misria, infelicidade e alienao, e outros males sociais e queriam minimizar esses males. Afinal, essa foi certamente a motivao de Karl Marx e muitos outros socilogos. Eles queriam ajudar as pessoas e fazer um mundo melhor. Do tcnico mais meticuloso ao terico mais criativo e conceituado, encontramos motivaes humanistas. E claro, esse fato significa que h sempre uma ideologia rondando o pensamento de um socilogo. s vezes esta ideologia explicitamente defendida, mas implcita ou explcita, a maioria dos socilogos realmente defende opinies sobre o que est errado com a sociedade e uma proposta genrica para o que deveria ser feito a fim de resolver esses problemas. E verdade que ao mesmo tempo que somos realistas reconhecemos que impossvel moldar a sociedade nossa vontade e ardor. Alm disso, reconhecemos as tendncias de nosso pensamento, e tentamos evit-las ao fazer

cincia. De fato, algo geralmente acontece aos socilogos durante o percurso acadmico, especialmente quando esto a caminho de um doutoramento. De alguma forma, as motivaes humanistas e o fervor ideolgico recuam cedendo lugar s habilidades tcnicas e ao profissionalismo acadmico. Uma conseqncia disso que os estudiosos que permanecem abertamente humanistas e partidrios tendem a ver os experimentos, estatsticas, mtodos cientficos imparciais e teoria genrica como o inimigo nmero um dos seus conceitos mais prticos. Eles tendem a ver a teoria e os mtodos como uma negao tanto das suas intuies nas situaes estudadas quanto de seu desejo em ajudar as pessoas. Esse abismo aparentemente intransponvel entre a intuio, por um lado, e a pesquisa, por outro, desnecessrio. Nossas idias, sentimentos e intuies so fontes maravilhosas de dados sociolgicos. Embora geralmente enfatizemos os problemas metodolgicos de tais dados preconceitos e julgamentos pessoais, impossibilidade de verificao emprica, por exemplo, deveramos tambm reconhecer a grande vantagem que eles nos do sobre os cientistas naturais. Visto que somos homens

estudando homens e suas estruturas de organizao social, podemos usar nossa intuio para obter informao. Ns geralmente temos profunda intimidade com a nossa matria numa medida que um gelogo ou um tisico nunca pode ter. Em resumo, nossa intuio e nosso sentimento podem nos dar uma verdadeira percepo sobre o que est acontecendo. Contudo, no deveramos ir fundo nessa questo, como muitos socilogos fazem. Nossa intuio pode estar errada, ou apenas parcialmente certa. E se propomos solues baseadas em informaes incorretas ou partidrias (isto , naquilo que pensamos que dtzcrio ocorrer), podemos, potencialmente, fazer mais mal do que bem. De fato, podemos machucar as pessoas e criar situaes sociais ainda mais difceis para aqueles que estamos tentando ajudar. Assim, precisamos qualificar o nosso entusiasmo pela intuio e pela informao, reunidas e interpretadas luz de nossas experincias reais na esfera social. Ns no deveramos desprezar essa vantagem intuitiva ou suprimi-la, tampouco deveramos reprimir nossos interesses humanistas e desejos de ajudar as pessoas e fazer um mundo melhor Mas precisamos complementar isso. Essa complementao surge

com o reconhecimento de que a cincia o que pode mobilizar e canalizar a intuio e os preconceitos ideolgicos com finalidades construtivas. Se queremos exercitar nosso humanismo e esse motivo o que faz a maioria de ns se iniciarem sociologia, precisamos ser hbeis ao reunirmos e interpretarmos informao sobre as situaes que queremos mudar e sobre as pessoas que queremos ajudar. Ns tambm precisamos entender por que e conto as situaes funcionam. E precisamos ser capazes de antecipar as conseqncias de quaisquer mudanas que iniciamos e coletar informao precisa dessas mudanas. Ns no podemos confiar na intuio e em nossas ideologias pessoais nessas questes. Ns precisamos de teoria que tenha contrariado esforos para contest-la para nos dizer como e por que as coisas funcionam, e precisamos usar essa teoria determinando o que precisa ser feito para melhorar uma situao. Ns tambm precisaremos coletar informao precisa e analisla cuidadosamente para saber exatamente o que existe numa situao e exatamente quais so as conseqncias de nossas aes teoricamente concebidas.

Se no temos teoria, no temos estrutura para entender e interpretar o mundo social. Da, no sabemos o que fizemos ou o que esperar. Se no temos mtodos, no podemos ter confiana em nossas teorias, visto que elas no foram verificadas empiricamente, e no podemos saber exatamente o que precisa ser mudado numa dada situao. Ns podemos usar nossa familiaridade com uma situao e nossa intuio criativa para fazer valer teorias importantes e desenvolver formas sistemticas de coletar informao. Mas nossa intuio no pode substituir a teoria, mtodos meticulosamente construdos e anlise detalhada. Por isso a cincia uma importante ferramenta para aproximar as questes sociais e os problemas de interesse dos humanistas.

SOCIOLOGIA CIENTFICA E ENGENHARIA SOCIALComo mencionei no Captulo 1, o fundador da sociologia, Auguste Comte, acreditava que uma cincia da sociedade pudesse servir para melhorar uma sociedade. Ele observou que, se a sociologia podia desenvolver e provar leis tericas como aquelas nas cincias fsicas e biolgicas, seria

possvel alcanar um nvel de entendimento sobre a organizao humana que facilitaria a construo de novas formas sociais. Assim, Comte viu que a cincia e o humanismo no so opostos: uma vez que haja entendimento de como e por que o mundo social funciona, esse conhecimento pode ser usado para construir um mundo melhor. Em estilos inteiramente diferentes, Karl Marx e mile Durkheim sentiam da mesma forma. Eles desejavam usar seus conhecimentos conceituais de como o mundo funciona para coustruir unta

sociedade melhor.

Palavras como construir fazem pensar em engenharia social, em controle social, em um mundo orwelliano do Big Brother, em uma sociedade tecnocrata estpida e sem vida. A engenharia boa, muitos argumentariam, contanto que a utilizemos para construir pontes e estradas. Mas a engenharia livre do conhecimento terico cria coisas como bombas nucleares e outros artifcios potencialmente prejudiciais. Esses medos da engenharia sao, claro, bem fundamentados. Mas poderia ser argumentado que os usos nocivos da engenharia so o resultado da organizao em formas societrias que os encorajam e sustentam. Se soubssemos mais a respeito do universo social, seramos mais bem capacitados para limitar o mau

uso do conhecimento. Por outro lado, entretanto, usaramos mal o conhecimento da organizao social para criar coisas ainda mais monstruosas. Essa questo discutvel. O desenvolvimento da teoria e do uso de mtodos de pesquisa vai produzir mais conhecimento sobre o funcionamento do mundo social. Esse conhecimento at mesmo em seu atual estado bruto vai ser usado para a engenharia social (Hunt, 1985). Ns chamamos a engenharia social por outros nomes na sociologia as vezes de prtica sociolgica, em outras ocasies de sociologia clnica e de sociologia aplicada visto que o ttulo engenharia social tem conotaes negativas. Mas deveramos saber o que esses ttulos mais positivos significam: so esforos para se construir certos tipos de relaes sociais que usam idias tericas e descobertas de pesquisa. Como toda engenharia, ela pode ser usada para fins bons e maus devendo bom~~ e mau, claro, ser definidos. Assim, no deveramos ver a sociologia cientfica como uma atividade misteriosa e secreta, pois na realidade est sendo usada para mudar nossas vidas dirias; e provvel que seja usada ainda mais no futuro.

RESUMO1. A cincia o esforo sistemtico para compreen~er o universo, partindo de idias tericas que receberam slido apoio com pesquisas meticulosamente desenvolvidas. 2. A teoria , definitivamente, o veculo para se entender o universo, e revela duas caractersticas distintas: (a) abstrao e generalidade; e (b) experimentao/empirismo. Acumula-se conhecimento quando as teorias abstratas so verificadas e confirmadas. 3. A teoria na sociologia no to bem desenvolvida como nas cincias naturais. Atualmente, quatro perspectivas tericas genricas orientam a teoria na sociologia: (a) o funcionalismo, em que o interesse compreender como os fenmenos sociais funcionam a fim de atenderas necessidades do todo social no qual eles esto inseridos; (b) teorias do conflito, em que a nfase est nos efeitos de desigualdades que produzem conflito; (c) o interacionismo, em que a ateno est voltada para o uso de gestos na comunicao face a face e adaptaes de indivduos um para com o outro; e (d) o utilitarismo, em que a

nfase est no clculo de custos-benefcios na busca dos objetivos. 4. os dados no mundo emprico so coletados sistematicamente de acordo com os dogmas do mtodo cientfico. Esses dogmas incluem: (a) estabelecer uma problemtica de pesquisa; (b) formular uma hiptese; (c) coletar dados ou promover experimentos, entrevistas e questionrios, observaes ou levantamento histrico; (d) analisar os dados; e (e) tirar concluses com respeito validade da teoria, pesquisa exploratria, ou interesses particulares de um cliente. 3. Os julgamentos preconcebidos quando os homens estudam os homens tambm permitem cincia social uma vantagem: temos uma familiaridade intuitiva com nossos objetos de estudo. 6. O acmulo de conhecimento sociolgico ser usado para construir e reconstruir as relaes sociais. Tais esforos no so obrigatoriamente anti-humanistas; na verdade, eles podem ser feitos em nome do humanismo. Da, a cincia e o humanismo no serem, por definio, contradi trios.

UM MUNDO DE SMBOLOS

Os homens, assim como outros animais, podem fazer algo surpreendente: podem representar facetas do mundo, suas experincias e praticamente qualquer coisa com sinais arbitrrios. Ns chamamos esses sinais de smbolos quando as pessoas chegam a um consenso quanto ao que um sinal significa e o que representa. As palavras que voc est agora lendo so sinais (marcas pretas numa pgina) com cujo significado ns concordamos; e da cada palavra um smbolo. Essas palavras so organizadas em sentenas, pargrafos e captulos. Elas so parte de umsistema organizado de smbolos. O que verdadeiro no caso da lngua verdadeiro para quase tudo o que podemos pensar. Bandeiras, cruzes, punhos fechados, franzir as sobrancelhas, livros, bblias e programas de computador, todos so sinais que carregam significados combinados. Em geral, eles pertencem a sistemas de smbolos, pois eles invocam outros smbolos e significados relacionados. atravs de tais sistemas de smbolos que lembramos do passado, tomamos conhecimento do presente e prevemos o futuro. Sem essa capacidade surpreendente, nosso mundo seria feito de impresses banais e irrelevantes. Ns seramos

escravizados no aqui e agora. No teramos a msica, a arte, a matemtica, a piada, o juramento, a leitura, a adorao, ou quaisquer outras coisas que ns, como homens, aceitamos como verdade. Nossa vida seria chata e rotineira, mas no saberamos isso, visto que seramos incapazes de representla com smbolos. Podemos perceber o significado dos sistemas de smbolos observando as formigas e outros insetos sociais, como cupins e abelhas. Ns os chamamos de social porque eles sao organizados, mas eles o so segundo informaes muito diferentes daquelas dos nossos sistemas de smbolos. As informaes que orientam esses insetos e sua conduta esto codificadas nos genes de seus cromossomos. Dessa forma seu lugar e funo na sociedade sao predeterminados e geneticamente organizados (embora todos os organismos se adaptem s peculiaridades de seu meio ambiente). Os sistemas de smbolos humanos no so geneticamente programados. Eles so criados no imaginrio, usados e transformados medida que nos defrontamos uns com os outros e com as condies de nosso meio ambiente. Mas, na prtica, eles equivalem aos cdigos genticos dos insetos sociais, pois eles moldam nossas aes e, sobretudo, nossos padres de organizao social.

O conjunto desses sistemas de smbolos de uma populao humana geralmente denominado pelos socilogos de cultura (Kroeber e Kluckhohn, 1973; Parsons, 1951). No dia-a-dia, freqentemente usamos o termo cultura para nos referirmos a outras coisas, como um bom vinho, um bom whisky, um tempero gostoso ou uma cerveja especial, mas isso em si no cultura, e sim produtos materiais cuja existncia decorrente da cultura. Trata-se de coisas criadas simbolicamente a fim de organizar as pessoas para produzirem novas coisas. Todavia esses produtos tambm podem ser smbolos culturais em si mesmos se eles dizem algo sobre ns aos outros. Ento, servir uma cerveja especial e no uma marca qualquer pode significar algo, ainda que de maneira sutil, em sua relao com os outros, assim como dirigir um automvel Mercedes-Benz, Lexus ou BMW. Dessa forma, os produtos culturais (que resultam de smbolos culturais, quando eles organizam a produo) podem se tornar smbolos e influenciar o comportamento, a interao e a organizao entre as pessoas.

Eu devo, agora, acrescentar uma observao de advertncia e qualificao: essa nfase na cultura

como sistemas de simbolos no universalmente aceita. H muitas definies diversas de cultura (Kroeber e Kluckhohn, 1973), e alguns querem ver a cultura como a soma total de todas as criaes humanas (Singer, 1968): smbolos, artefatos materiais e formas de organizao. Quando essa definio mais global usada, ento uma distino entre a cultura material (artefatos fsicos) e a cultura no-material (sistemas de smbolos e modos de comportamento) s vezes formulada. Entretanto, empregarei um uso mais restrito, mas importante estar consciente de que no h uma definio nca da cultura nas cincias sociais (Gilmore, 1992). Assim, o ponto de vista enfatizado aqui salienta o fato de que nosso mundo construdo e mediado por smbolos. Praticamente tudo o que experimentamos, fazemos, desejamos e vemos est preso a smbolos. Assim, entender a ns mesmos e o mundo social mais amplo requer um conhecimento maior da cultura. Ns precisamos reconhecer que os simbolos estruturam nosso mundo, embora em menor medida do que no caso das formigas, das abelhas e dos cupins geneticamente pr-programados. Em resumo, no deveramos subestimar o poder dos simbolos culturais para ditar nossas percepes, nossos

conhecimentos e nossos comportamentos, tampouco deveramos superestimar seu poder Os homens os criam e podem recri-los medida que transformam suas relaes uns com os outros quando reorganizam seus mundos sociais ou quando lidam com novas condies ambientais. Essa perspectiva pode oferecer subsdios para uma certa compreenso da cultura brasileira. Se analisarmos a sociedade brasileira, podemos perceber as transformaes dos ltimos cinqenta anos. Entretanto, ainda estamos saindo da cultura de favores marcada por traos autoritrios, em que predominam o coronelismo e o populismo, para uma cultura de direitos, com nfase nos valores da cidade e da democracia. Souza Neto (1993) destaca a trajetria dessas mudanas sociais nas conquistas das crianas e dos adolescentes no Brasil e no mundo.

SMBOLOS E SOCIEDADEDe certo modo, a cultura e seus produtos so simples recursos que nos possibilitam fazer as coisas. Sem a linguagem, nossa comunicao limitada. Sem a tecnologia (informao sobre como manipular o meio ambiente) no poderamos comer

e nos abrigar. Os simbolos, ento, intermedeiam nossa adaptao ao meio ambiente, nossa interao com os outros, nossa interpretao de vivncias e nossa prpria organizao em grupos. Entretanto, os simbolos so mais que uma intermediao conveniente. Tambm nos dizem o que fazer, pensar e perceber Parafraseando Marshall McCluhan, nossa mediao simblica tambm carrega uma mensagem, ou um conjunto de instrues. Como vimos, eles no nos acorrentam da mesma forma que a informao nos genes das formigas, abelhas e cupins, mas realmente limitam nossas opes. At mesmo um recurso simblico aparentemente neutro como a lngua carrega uma mensagem escondida (Hall, 1959). Por exemplo, a lngua dos norte-americanos nativos Hopi difere do ingls no sentido em que trata a noo de tempo (Carroll, 1956). Em ingls, tempo um substantivo, que significa que pode ser modificado morto, economizado, gasto, perdido, desperdiado. (Por exemplo, voc pode estar passando tempos difceis lendo meu livro, ou voc pode considerar tudo isso um desperdcio de tempo. Mas para os Hopi, tempo um verbo e como tal no pode ser modificado ou manipulado como um substantivo; o tempo simplesmente flui e os homens seguem esse caminho. (Um Hopi

provavelmente reclamaria menos deste livro.) Assim, as respectivas opinies da pessoa que fala hopi ou ingls variaro, assim como seus comportamentos e estruturas da organizao social. No caso brasileiro temos a palavra saudade, que no encontra uma traduo perfeita em outras lnguas. A cultura, ento, raramente um recurso neutro. A cultura uma restrio, e esse aspecto coercitivo da cultura que mais interessa aos socilogos. Os socilogos estudam a cultura examinando como os sistemas simblicos limitam a interao e a organizao humana, e, por sua vez, como os modos de organizao social funcionam para criar, sustentar ou transformar a cultura (Kroeber e Parsons, 1958). Ns no nos interessamos por todos os sistemas simblicos, apenas por aqueles que so relevantes aos interesses da sociologia. Ou seja, estamos interessados nos simbolos que influenciam nossa viso das coisas, nossas aes no mundo, nossas interaes com os outros e coordenam nossas aes e comportamentos sociais.

SISTEMAS DE SMBOLOS

Os simbolos so organizados dentro de sistemas que os tornam bastante complexos. Embora haja uma enorme diversidade nos sistemas de simbolos e entre as populaes humanas, estes sistemas so de diversos tipos bsicos.

Sistemas de LinguagemUm primeiro tipo o sistema de cdigos de linguagem que pode classificar desde palavras faladas e as palavras escritas nesta pgina at complexas representaes matemticas e algoritmos de computador. Os tipos bsicos de cdigos de linguagem de uma populao influenciam amplamente sua organizao. Por exemplo, se uma populao tem apenas a lngua falada, seus modos de organizao sero limitados, ao passo que, se essa populao pode desenvolver tambm uma lngua escrita, pode armazenar informao de forma eficaz, conseqentemente, elaborar outros modos de organizao social. E, se novas linguagens matemtica, lgica, algoritmos de computador e outros cdigos simblicos podem ser desenvolvidas, as possibilidades de adaptao dessa populao ao seu meio ambiente podem aumentar, e a natureza das relaes sociais de

seus membros e seus modos de organizao social sero fortemente alterados. Pense, por exemplo, no que a linguagem de informtica tem feito para a velocidade, proporo e distncia das relaes do mundo moderno, e voc pode ver o poder da linguagem para transformar a sociedade.

Sistemas de TecnologiaOutro sistema cultural bsico a tecnologia, ou a organizao de informao e conhecimento sobre como controlar e transformar o meio ambiente. Se colher frutos e caar animais e o armazenamente bsico de informao de uma populao como foi durante 30.00(1 dos 411.000 anos de nossa espcie , a organizao social e a adaptao ao meio ambiente sero limitadas (embora devesse ser enfatizado que as sociedades de caa e coleta poderiam ter sido menos estressadas e mais contentes com suas vidas do que as sociedades modernas). Como a tecnologia se expande, expandem-se as propores das sociedades: podemos produzir mais, ficar maiores e mais complexos. Assim, a tecnologia uma das foras motrizes da organizao humana, age como uma jamanta cultural, transformando nossos modos de

vida, nossos relacionamentos com os outros e nossas formas de organizao social (Lenski, 1966; Lenski, Lenski, e Nolan, 1991). De fato, quase todo aspecto de sua vida diria sua roupa, seu transporte, seus planos de vida, suas percepes, suas aspiraes, seus modos de comunicao est circunscrito pelos produtos oriundos de novos conhecimentos ou tecnologia. De fato, nem podemos imaginar a vida sem telefone, televiso, carro, apartamento, roupas fceis de passar, redes de informtica, conversa por e-mail, CDs, e assim por diante. Se as relaes pessoais se perdem nessa dana tecnolgica, no deveramos nos surpreender.

Sistemas de ValoresOs homens sempre defendem idias do que bom ou ruim, adequado ou inadequado, e indispensvel ou dispensvel. Essas idias so valores; e quando elas so organizadas dentro de um sistema de padres ou critrios para avaliar o valor moral e adequao do comportamento, elas constituem um sistema de valores(Willians, 1970; Rokeach, 1973, 1979).

Os valores possuem um aspecto especial: eles so abstratos dentro de sua generalidade de aplicaes. Eles podem servir a muitas situaes diversas (Kluckhohn, 1951). Sem esta qualidade abstrata, que nos permite adequar os valores a situaes especficas, as pessoas teriam dificuldade de se comunicar e relacionar-se, porque elas no teriam qualquer padro moral comum para avaliar as aes dos outros bem como suas prprias. Imagine uma conversa entre dois indivduos que defendem conjuntos de valores bem diferentes. Eles no concordariam no que deveria ocorrer, o que seria justo, e o que seria um comportamento adequado. O que notvel na maioria das populaes humanas o fato de terem, no mnimo, algum consenso sobre os valores. Esse consenso raramente perfeito, devo advertir, pois uma das mais interessantes dinmicas de uma sociedade o conflito sobre os valores. Mas uma sociedade sem um mnimo de consenso de valor seria caracterizada pelo conflito e tenso. impressionante que numa sociedade to grande como a brasileira ou a dos Estados Unidos, espalhada sobre uma imensa rea geogrfica, haja algum acordo sobre o que bom, ruim, adequado e inadequado. Em grande parte, esse consenso geral sobre os valores o que nos faz tipicamente

brasileiros, e o que nos possibilita como indivduos nos adaptarmos dentro e fora de novas situaes sem grande tenso. Quando partilhamos valores bsicos, podemos interagir, embora possamos discordar em muitas coisas. Quais so alguns dos valores comuns (Williams, 1970)? No Brasil ou na Amrica, concordamos com valores como xito (fazer bem, tentar fazer bem), atuao (tentar dominar e controlar situaes), liberdade (no ter limites na busca de nossos sonhos), progresso (aprimorar ns mesmos e o mundo ao nosso redor), materialismo (adquirir objetos materiais, criteriosamente, claro) e eficincia (fazer as coisas de maneira racional e prtica).

Essas idias, assim como outras, ns partilhamos e

elas nos servem como padres morais para avaliar ns mesmos e os outros nas situaes mais concretas. Ns no concordamos com todos esses valores; de fato, algumas pessoas rejeitam todos eles. Mas h um grau surpreendente de consenso sobre eles dentre a maioria das pessoas. Enquanto voc e eu poderamos, por exemplo, atribuir a esses valores prioridades diferentes, ns provavelmente concordamos sobre eles de maneira

geral. Como conseqncia, podemos interagir sem grandes dificuldades. Com a mesma relevncia, o todo social e seus elementos economia, sistema poltico, sistema educacional, padres de coletividade, e assim por diante so influenciados por esses valores. Dessa forma, h alguma cola para manter a sociedade junta e lhe dar algum grau de coeso. Os valores operam, claro, nos indivduos quando eles tomam decises de se comportar de certas maneiras. Por exemplo, um aluno norteamericano ao ler este livro orientado pelos valores centrais de sua sociedade: atuao (dominarei este livro), xito (terei xito em compreend-lo), progresso e materialismo (tenho de conseguir um diploma que me certifique como qualificado para um bom emprego) e eficincia (no vou desperdiar tempo relendo). Todos esses valores orientam a conduta do aluno num sistema educacionalorganizado em torno dessas premissas morais. Alm disso, o ingresso na escola marcou uma aceitao implcita desses valores pelos alunos e desejo de perpetuar o sistema educacional organizado em torno da atuao, do xito, do individualismo e do materialismo. O que vale para a escola tambm vale para quase todas as situaes. Uma das facetas dos valores de um sistema de

valores orientar as percepes e a conduta dos indivduos na sociedade. Uma perspectiva funcionalista enfatiza as ampliaes de um sistema de valores nas aes e motivaes das pessoas na sociedade. Se pensarmos na anlise de mile Durkheim sobre a conscincia coletiva e sua funo integrantes para a sociedade, podemos ver que o consenso sobre os valores crucial. H um grande mrito em analisar as funes dos valores, como Durkheim fez h muito tempo e como fiz aqui, mas no devemos nos esquecer de que os valores podem ser uma fonte de desintegrao numa sociedade. Quando segmentos de uma populao defendem valores distintos, ou, como discutirei brevemente, crenas diferentes, a cena est pronta para o conflito. As pessoas discordaro sobre seus padres morais, sem contudo abandon-los, pois eles so muito estimados. A teoria do conflito enfatizaria esse aspecto da vida social e, ainda, realaria que os valores so instrumentos para os mais privilegiados que tm poder para definir quais valores as pessoas deveriam defender. Eu voltarei a esse ponto mais tarde, mas importante t-lo em mente.

Sistemas de CrenasAinda outro tipo de sistema de smbolo gira em torno das crenas, que so as cognies e as idias das pessoas em determinadas situaes educao, trabalho, famlia, amizades, poltica, religio, vizinhana, esporte, lazer e todos os tipos bsicos de situaes sociais numa sociedade (Turner e Starnes, 1976). Algumas crenas representam a aplicao de valores bsicos de situaes especficas. Numa faculdade ou universidade, por exemplo, os alunos deveriam obter boas notas (xito), trabalhar arduamente (atuao, eficincia), evoluir nos conhecimentos (progresso). Quase todas as situaes trabalho, diverso, amizades, esporte etc. envolvem crenas que nascem da aplicao desses e outros valores comuns. At mesmo num relacionamento pessoal imaginamos quo bem estamos fazendo (xito), se estamos progredindo no relacionamento (progresso) e o que precisamos fazer para melhor-lo (atuao). Dependendo do tipo de relacionamento namoro, relacionamento filial, coleguismo, amizade aplicam-se crenas bastante diferentes, mas todas elas invocam as mesmas premissas de valor

Fazendo isso, elas nos orientam e nos deixam confiantes de que estamos fazendo a coisa certa. Outras crenas so, aparentemente, mais concretas. Elas so idias que defendemos sobre o que e o que existe numa situao. Sabendo o que existe nos sentimos confiantes para enfrentar determinada situao e agir nela. Tambm defendemos crenas sobre situaes que no vivemos, que ainda temos que viver, ou que jamais vivemos trabalho, casamento, velhice, pobreza, e outras situaes distantes. Membros de uma populao podem ser vistos como ligados nos mundos sociais uns dos outros dessa forma. Possuindo as crenas de outros cenrios e contextos sociais, ns vicarialmente sabemos sobre esses cenrios e podemos potencialmente agir neles. Por esta razo, novas situaes no so totalmente desconhecidas. Temos valores comuns e algumas crenas para nos orientar quando inicialmente nos atrapalhamos. Entretanto, nossas crenas concretas no so sempre precisas. Elas so muito influenciadas por valores e outras crenas sobre o que deveria ocorrer ou existir numa determinada situao. Mas estamos convencidos de que realmente conhecemos outros contextos sociais, sentimos um companheirismo vicrio com os outros

e a sensao de que poderiamos operar nesses outros contextos. Por exemplo, a maioria dos norte-americanos acredita que h oportunidades de emprego para qualquer um que realmente queira trabalhar e que muitos beneficirios da previdncia social so preguiosos e deturpam sua necessidade (Kluegen e Smith, 1986; Smith, 1985). Essa crena invoca valores como atuao, xito, progresso e eficincia para o mundo do trabalho e do bem-estar Tambm contm alguns dados supostamente neutros: h muitos empregos l fora e muitas pessoas demasiadamente preguiosas para peg-los. E carrega uma presuno: se eu estivesse pobre e sem trabalho, eu pegaria qualquer emprego e preservaria minha dignidade. Assim, sentimo-nos conhecedores de um mundo que, na realidade, provvel que no vivamos. Mas os dados nessas crenas podem estar errados: a maioria das pessoas inscritas na previdncia social no podem trabalhar elas so velhas demais, incapazes demais e doentes demais, e praticamente metade delas trabalham perodo integral ou foram despedidas (1. Tumer, 1993b); assim, os dados mais precisos so que a economia no tem empregos suficientes para todos os cidados e que os salrios para muitos empregos no so suficientemente altos para manter as

pessoas fora da pobreza (Beeghley, 1983; Ropers, 1991). Portanto, nossas crenas sobre o que realmente existe e ocorre podem ser influenciadas pelos nossos julgamentos de valor. Isso no ruim; inevitvel em questes humanas. De fato surgiu, na sociedade moderna, uma verdadeira indstria para apurar as aes e as ?pinies pblicas que so, na essncia, expresses de crenas. A indstria da opinio publica vai alem das apuraes de eleio e levantamentos de opinio gerais, como fazem os institutos Gallup e Harris; ela tambm envolve as pesquisas de mercado. A percepo de que o comportamento das pessoas desde a hora de votar para presidente at comprar um produto influenciado por suas atitudes, que, por sua vez, so moldadas por seus valores e crenas comuns, mudou amplamente a maneira de os polticos concorrerem eleio, assim como a maneira de as empresas negociarem. No Brasil, at h pouco tempo, a classe dominante brasileira e mesmo a classe dominada acreditava que a pobreza era de responsabilidade exclusiva do indivduo. O pobre era naturalmente um vadio. Essa crena fez com que a pobreza no Brasil fosse tratada como uma questo de policia e no de polticas sociais.

Sistemas NormativosValores e crenas so genricos demais para regular e orientar o comportamento de maneira precisa; eles nos do apenas uma viso e perspectiva comuns, habilitando-nos aos comportamentos gerais (Blake e Davis, 1964). Mas eles no nos dizem precisamente o que fazer. As normas compensam essa deficincia dos outros sistemas, informando-nos o que esperado e apropriado numa situao especifica. Imagine-se vir aula sem conhecer as regras e as expectativas para o comportamento de um aluno. Voc mobilizado a alcanar sua metas com xito, a ser ativo e progredir intelectualmente, mas voc no sabe o que fazer onde sentar, como agir, o que fazer com suas mos, pemas, boca e intelecto. Isso pode ser dificil de imaginar se voc no conhece bem as regras gerais do comportamento escolar Na realidade, se nunca esteve numa sala de aula, se nunca teve seus prprios livros e se nunca assistiu a uma aula de faculdade, essa nova situao pode lhe parecer desconfortvel. De fato, voc pode se encontrar observando como os outros se sentam na sala de aula e como tomam

notas. Assim, pode-se conhecer as normas gerais elementares de determinadas situaes o que alguns socilogos chamam de normas institucionais , mas cada pessoa deve aprender normas complementares para adequar o comportamento num ambiente especial. Do ponto de vista do interacionismo, esse processo de descoberta muito complexo e sutil. Se no conhecemos os aspectos relevantes da cultura que se aplicam a determinada situao, tornamo-nos intensamente desafinados s aes e gestos dos outros. Ns lemos esses gestos, buscando nos conectar aos mecanismos intelectuais que os produzem num esforo de aprender como nos comportar. Geralmente j possumos valores, crenas e normas importantes, mas nosso conhecimento deficiente no que concerne proeminncia de cada uma delas, e podemos at ser ignorantes em relao a normas e crenas relevantes. Nossos erros nos entregam, e experimentamos as sanes e desaprovao dos outros; conseqentemente nos tornamos desafinados com os gestos dos outros. Ou ento, sabendo de antemo da nossa ignorncia, podemos agir experimentalmente prestando ateno a movimentos, palavras e gestos de outros, evitando os erros. Uma vez que damos um sentido aos

simbolos culturais relevantes, os processos de interao sustentam esses simbolos ao mesmo tempo que os reafirmam, reforando-os. Cada um de ns se comporta de modo adequado; tais comportamentos reforam os valores, crenas e normas; e, quando estes so reforados, eles ganham poder para limitar o comportamento. Atos de desvio realmente ocorrem e quebram esse ciclo de reforo, ou de afirmao, mas geralmente tentamos trazer o desviante de volta ao ciclo, sustentando-o. Dessa forma que a cultura sustentada pelas microaes interpessoais dos indivduos. As normas variam desde as institucionais, que so concepes gerais para o comportamento nas esferas sociais bsicas (trabalho, escola, amizades, casa etc.) s mais especificas, que nos dizem precisamente como atuar num ambiente concreto. Todos temos conhecimento das normas institucionais mais importantes, e conseqentemente podemos entrar em novas situaes com alguma orientao. Uma vez l, podemos aprender as normas complementares, atravs da leitura de gestos dos outros. Ns devemos tambm aprender como criar novas normas em algumas situaes quando interagimos com os outros, e esse processo pode tornar-se

muito difcil, especialmente se as pessoas defendem diferentes crenas e invocam variaes de normas que se contradizem. Quando as pessoas se casam, por exemplo, elas geralmente precisam negociar novos acordos sobre como elas vo comportar-se, porque as opinies sobre o papel dos homens e das mulheres esto sofrendo transformaes e as normas sobre as atividades da esposa e do marido podem diferir enormemente. luz desse fato, no surpreendente que a taxa de divrcio nos Estados Unidos seja mais alta no primeiro ano de casamento (Collins e Coltrane, 1991). A maioria dos recm-casados possuem crenas extremamente romnticas, conhecem apenas as normas institucionais gerais sobre o casamento, e se apiam no exemplo dos casamentos de seus pais e de seus amigos para orientar suas relaes. Porm, para sua realizao, o casamento exige outras normas, sem as quais fracassa. Dessa forma, em sociedades modernas algumas situaes exigem de ns o improviso e o desenvolvimento de acordos normativos medida que avanamos. Outras, tal como um emprego de linha de montagem, so altamente limitadas, mas mesmo aqui as pessoas desenvolvem acordos normativos sobre como devem trabalhar no

emprego. Muito de nossa vida social consiste de nosso aprendizado, harmonizao, criao e renegociao de normas. Isso particularmente verdade nas sociedades moderna5, onde a mudana social constante nos fora a viver situaes sempre novas.

Estoques de CouhecimentoAo lado da linguagem, da tecnologia, valores, crenas e sistemas normativos, as pessoas possuem, de forma mais livre e implcita, estoques de informao. O socilogo alemo, Alfred Schultz (1932), criou a frase estoques de conhecimento disposio para descrever os catlogos de informao que 05 indivduos podem dispor para se adaptar s situaes. Por exemplo, um aluno que entra na taculdade possui estoques de conhecimento intil sobre as escolas, salas de aula, hierarquias, ocasies formais e informais, aulas e discursos ambientes e maneiras apropriadas para conversas. Estes estoques de conhecimento so usados para guiar a conduta de um aluno nas primeiras aulas e encontros, enquanto as normas mais indicadas para cada situao nova so aprendidas.

Assim, cada um de ns tem um estoque de conhecimento, moldado pelas experiencias vividas. Usamos esses estoques para nos guiar nas situaes; e, quando as pessoas partilham estoques semelhantes de informao, elas podem construir uma viso comum de uma situao. At mesmo quando no falamos a mesma lngua isso possvel; algum que viajou para um pas estrangeiro pode comprovar como, pelos gestos, podemos freqentemente consegui ir que os estrangeiros tirem de seus estoques de conheci mcii ti) informaes p rox~ mas s nossas, especialmente com respeito s situaes comuns. Essa capacidade de usar esses sistemas implcitos de smbolos d aos homens uma enorme flexibilidade em sua adaptao a novas situaes. Parte da cultura, ento, uma inteligibilidade silenciosa que extrada constantemente, quando nos adaptamos um ao outro, s normas e a outros aspectos das situaes. Se pudssemos catalogar os valores, crenas e normas, seramos inflexveis, como robs; e se algo novo surgisse fora da nossa programao no saberamos o que fazer Mas podemos nos adaptar s nuana porque todos ns possumos vastos armazns ou estoques de conhecimento que podem ser utilizados.

Para sintetizar, podemos afirmar que a organizao da sociedade humana e extremamente facilitada por simbolos culturais. Opostamente, os smbolos culturais so criados, sustentados ou transformados pela interao social. De fato, os tericos do funcionalismo argumentam (Parsons, 1951, Alexander, 1985) que a integrao da sociedade no pode ocorrer sem sistemas de smbolos comuns. A cultura assim preenche uma necessidade bsica da sociedade. E, como os interacionistas enfatizam, esses sistemas de simbolos so sustentados pela leitura detalhada dos gestos uns dos outros. Os simbolos mais importantes para entender nossas aes e modos de organizao so os sistemas de linguagem, de tecnologia, de valores, de crenas, de normas e de armazenagem de conhecimento. Esses so os equivalentes funcionais dos cdigos genticos dos insetos sociais, mas com uma grande diferena: eles podem ser transformados e usados para criar novas formas sociais. Se todos ns no participssemos de uma cultura comum, estaramos nos chocando uns com os outros, insultando nossos amigos e, contrariamente, fazendo a coisa errada. Na realidade, no somos insetos, e, visto que nosso comportamento no est geneticamente codificado, h muito espao

para a m informao, informao inadequada, informao conflitante e informao mutante. Assim, a sociedade no como uma colmeia bem organizada ou uni monte de formiga porque ns nos organizamos com cdigos culturais, opostos aos genticos. E nos simbolos culturais h um grande potencial para a ambigidade, divergncia e conflito.

VARIAES CULTURAISOs homens criam sistemas de smbolos culturais porque precisam deles. Eles sao desenvolvidos para facilitar a interao e a organizao, como argumentam os tericos do funcionalismo. E, porque as pessoas vivem e agem em diverso meio ambiente, a cultura naturalmente tambm se diferenciar. E, como enfatizaria a teoria do conflito, as variaes culturais so uma fonte de constantes contradies e tenso numa sociedade. Exatamente como as lnguas, outros sistemas culturais tambm diferem, tais como a tecnologia, os valores, as crenas, as normas e os repertrios de conhecimento. Esse fato tem enormes implicaes. Deixe-me revisar algumas delas.

Cultura ou os sistemas de smbolos que os homens usam para orientar seu comportamento

Interaes ou adaptaes em micro-nvel que as pessoas produzem nos contatos face a face Figura 3.1 As inter-relaes entre estrutura social e cultura. Estrutura social ou os padres relativamente estveis de relaes de que os homens dispem para organizar a vida social Os smbolos regulam a interao e estrutura social, mas o contrrio no verdadeiro: as pessoas vivem em um sociedade dinmica e criam cultura em suas inter-relaes dirias; e modos de relaes sociais nas estruturas de sociedade (tais como economia, poltica, desigualdade, famlia etc.) podem gerar presses para o surgimento de novos sistemas de simbolos. Sem este ciclo de reforo mtuo, a sociedade humana no se sustentaria, e teramos muita dificuldade de saber como se comportar e como interagir um com o outro.

Conflito CulturalOs sistemas culturais como os valores e crenas so um conjunto de lentes ou um prisma colorido atravs do qual vemos o mundo. Nossas percepes so to influenciadas pela cultura, que percebemos algumas coisas mas ficamos inconscientes quanto a outras. E por isso que a cincia foi criada como um esforo consciente para a reduo dos preconceitos inerentes de cada cultura. A cincia um tipo de sistema de crena e, como outros aspectos da cultura, surgiu para lidar com os problemas humanos. No caso da cincia, o desejo de coletar informao precisa e verificar as idias empiricamente levou ao desenvolvimento da crena de que o conhecimento gerado por teorias que so constantemente verificadas com dados sistematicamente coletados. lnicialmente, as crenas sobre a cincia, e mais tarde o desenvolvimento de normas de comportamento para os cientistas, encontraram grande resistncia por parte de outros tipos de sistemas de crenas religio, filosofia e ideologia, para citar apenas as mais importantes. E alguns destes ainda vem a cincia com grande antipatia. Tal antipatia pode

criar conflitos culturais entre indivduos que concomitantemente mantm um nmero de crenas diferentes, assim como conflitos maiores entre grupos de indivduos que aderem a diferentes crenas. Os fundamentalistas religiosos questionam a cincia quando suas concluses violam seus dogmas. Marxistas, de direita ou de centro, geralmente se recusam a aceitar o conhecimento cientificamente fundamentado. At mesmo nos Estados Unidos, onde a cincia uma crena cultural dominante, o conflito vem tona quando questes com forte fator emocional, como o ensinamento da evoluo darwiniana no lugar da Criao divina, so debatidas. Quando as diferenas nas crenas culturais se tornam a base da organizao poltica e da ao, conflitos culturais tornam-se mais intensos. Por exemplo, o conflito atual sobre o aborto envolve no apenas o desacordo entre as crenas sobre maternidade, vida e concepo mas um verdadeiro combate entre vrios grupos organizados (Luker, 1984). Tais conflitos so difceis de resolver porque as crenas dos combatentes so muito diferentes e energicamente defendidas. Conflitos semelhantes ocorreram inmeras vezes nos Estados Unidos e em todas as sociedades complexas em que o

consenso absoluto sobre simplesmente impossvel.

os

simbolos

SubculturasDiferentes subgrupos no interior de uma sociedade geralmente possuem crenas de alguma forma diferentes e s vezes at mesmo valores diferentes. Esses mundos culturais diferentes so construdos e sustentados pela interao face a face, como diriam os tericos do interacionismo; pois pessoas em interao freqente desenvolvem sistemas de smholos comuns para dar significado a suas experincias. E assim, atravs da interao, as pessoas de diferentes subculturas desenvolvem diferentes normas, padres de discurso, gestos e expresses corporais. Por exemplo, trabalhadores com contratos temporrios existem num mundo cultural de alguma forma diferente do que os trabalhadores com garantia de emprego, assim como os negros e brancos, os hispnicos e anglosaxnicos, ricos e pobres, executivos e operrios, professores e alunos. Esses subgrupos podem ser denominados de subculturas porque seus membros veem o mundo atravs de lentes simblicas de alguma forma diferente, e de alguma forma se

comportam diferentemente; e geralmente essas diferenas causam conflito, especialmente quando a elas se aliam diferenas de poder, riqueza, bemestar e outros recursos valorizados numa sociedade. Na realidade, todos nos nos relacionamos porque partilhamos minimamente da mesma cultura. Mas nossas relaes so geralmente limitadas porque reconhecemos nossas diferenas e tentamos minimizalas atravs de interaes padronizadas e ritualizadas. E, claro, s vezes essas diferenas nas crencas e normas vm tona quando o conflito j est declarado e ento nenhum esforo pode nos salvar de enfrentarmos nossas diferenas. Como a teoria marxista e outros estudiosos do conflito demonstraram, algumas suhculturas possuem mais poder e recursos materiais do que outras. C)s ricos, os detentores de poder poltico, e osgrandes empresrios, por exemplo, esto mais aptos para impor suas crenas e definir as normas para aquelas suhculturas sem riqueza, poder poltico ou poder econmico (Mills, 1959). Saber o quanto eles podem influenciar um assunto de intenso debate (Alford e Friedland, 1985), mas quase no h dvida de que os valores bsicos, as crenas elementares e varias normas institucionais tenham sido mais influenciados por aqueles com

riqueza e poder, do que por aqueles sem riqueza e poder (l3ourdieu, 1984). s vezes, essa influncia desproporcional ressentida pelos mais fracos, e surge o conflito. Por exemplo, as mulheres, os negros norte-americanos, os homossexuais, e outras subculturas na Amrica do Norte, pressionaram pela redefinio de crenas e normas sobre papis na sociedade, cultura branca anglo-saxnica e sexualidade, respectivamente. De fato, muito da campanha presidencial de 1992 girou em torno de uma defesa das antigas tradies culturais por aqueles que esto satisfeitos com o status quo de um lado, e a introduo de novos sistemas de smbolos por aqueles que, por outro lado, esto cansados de ser culturalmente dominados. Tais conflitos so inevitveis numa sociedade com muitas subculturas distintas. A cultura hegemnica brasileira concebe a cultura das classes populares ou subalternas como inferior. Essa tica ganha visibilidade quando observamos as relaes cotidianas das chamadas minorias, como o caso da mulher, da criana, do idoso, do nordestino, do ndio, do homem que vive na rua, que so tratados como coisas. Isso contraria o pressuposto de que a cultura a forma de ser de um povo, de um

grupo, e que sua desvalorizao desvalorizao da prpria pessoa.

a

No apenas os subgrupos podem possuir crenas culturais diferentes e outros smbolos, mas os componentes culturais podem eles prprios ser de alguma forma incoerentes e contraditrios. Ns em geral possumos valores, crenas e normas incoerentes; e como conseqncia experimentamos as contradies culturais. Felizmente, a inteligncia humana permite apaziguar, ainda que receosamente, muito dessa incoerncia. Assim, os bilogos podem aderir ao darwinismo quando pesquisam e podem acreditar na Criao em seu dia-a-dia; os brancos podem acreditar na igualdade e liberdade enquanto possuem esteretipos discriminatrios sobre os negros; os alunos podem acreditar no aprendizado e ainda colar nas provas; e os professores podem acreditar numa busca imparcial pela verdade e odiar aqueies cuja pesquisa contradiz a sua prpria. Mas h limites para essas ginsticas da inteligncia. Incoerncia demais pode criar um problema para o indivduo e, se muitas pessoas numa sociedade

Contradies Culturais

enfrentam contradies culturais, patologias pessoais surgem e se espalham pela sociedade. Ou contradies culturais podem levar as pessoas a mudar a sociedade, como foi o caso nos dias que precederam guerra civil norteamericana, quando os abolicionistas reagiram contra as crenas das pessoas que afirmavam tanto que todos os homens so iguais (as mulheres tambm, esperemos) quanto que a escravido era aceitvel. Assim, importantes contradies nos valores, crenas e normas geralmente criam distrbio tanto pessoal como social. Eles san a essncia da mudana e reorganizao numa sociedade.

Etnocen trism o

Finalmente, todos os sistemas culturais fazem com que as pessoas vivam numa sociedade etnocntrica isto , os indivduos tendem a ver seu sistema de \alores, crenas e normas como melhores do que os dos outros. Esse etnocentrismo leva intolerncia, e a intolerancia leva, por sua vez, ao conflito e as tensoes.

Assim a crenca dos Estados Unidos em sua superioridade moral pode lev-los a interferir nas questes das outras naes cujos caminhos so, sob uma viso etnocntrica, inferiores. Vrias outras sociedades fizeram isso, e portanto nz~o deveramos nos punir. O etnocentrismo tambm existe no interior de uma sociedade: membros de certas suhculturas podem ver como interiores os de outras .suhculturas, e isso tambm pode levar ao conflito. Observando praticamente qualquer campus universitrio nos Estados Unidos, o etnocentrismo imediatamente evidente. O esforo para aumentar o intercmbio cultural, a convivncia, a mistura tnica entre alunos, trouxe aos indivduos, de uma forma ou de outra, normas e crenas diferentes e com diferenas de comportamentos. Cada subcultura afro-americanos, hispano-americanos, de origem anglo-saxnica, americanos brancos e naturalizados, americanos de origem asitica, de classe mdia, da classe trabalhadora e assim por diante v a outra com desconfiana e aplica os padres de sua subcultura ao avaliar os outros. Esse etnocentrismo claro, agravado pelo domnio dos brancos de classe mdia e valores anglosaxnicos, suas crenas e normas, na maioria das

faculdades norte-americanas, pois membros de outras subculturas devem constantemente se confrontar com o domnio de muitos smbolos culturais diferentes de seus prprios. Um dos desafios da era da globalizao aprender a viver com as diferenas culturais e utiliz-las como formas de humanizao. Nesse sentido, a educao deve contribuir para formar o projeto na tica da tolerncia.

RESUMO1. A informao que orienta grande parte da atividade humana simblica e no gentica. Ao contrrio dos insetos sociais, os homens criam os cdigos que orientam seus comportamentos, interaes e modos de organizao social. 2. A cultura o sistema de smbolos que uma populao cria e usa para organizar-se, facilitar a interao e para regular o comportamento. 3. H muitos sistemas de simbolos dentre uma populao, mas entre os mais importantes esto: (a) sistemas de linguagem que as pessoas usam na comunicao; (b) sistemas de tecnologia que incorporam o conhecimento sobre como dominar o meio ambiente; (c) sistemas de valores que

dizem respeito aos princpios de bom e mau, de certo e errado; (d) sistemas de crena que organizam as cognies das pessoas sobre o que deveria existir e realmente existe em situaes e espaos especficos; (e) sistemas normativos que do expectativas gerais e especficas sobre como as pessoas devem se comportar em diversas situaes; e (f) estoques de conhecimento, que dispem de informao implcita que as pessoas inconscientemente usam para compreender as situaes. 4. A cultura varia dentro e entre as sociedades, e essa situao geralmente leva ao conflito entre aqueles que possuem valores, crenas ou normas diferentes. Alguns conflitos permanecem no nvel simblico, mas o conflito geralmente surge do combate aberto entre partes com crenas diferentes. 5. As subculturas surgem e persistem em sociedades complexas, cada uma revelando alguns sistemas de simbolos distintos. As vezes, o conflito evidente entre as subculturas, especialmente quando algumas subculturas so capazes de impor seus smbolos s outras. 6. Sistemas de simbolos geralmente revelam contradies e incoerncias, uma situao que

pode colocar os indivduos em conflito pessoal, e s vezes grupal. 7. O etnocentrismo um subproduto inevitvel das diferenas culturais, com indivduos que vem como inferiores aqueles smbolos culturais distintos dos seus. O etnocentrismo produz preconceitos que geralmente vm tona em conflitos declarados.

ATORES E INTERAOShakespeare uma vez escreveu: O mundo um palco, e todos os homens e as mulheres sao apenas atores: eles tm suas entradas e sadas; e desempenham muitos papis de cada vez. Muito da vida humana de fato realizado num palco, mas, ao contrrio da vida teatral, nosso palco montado pelos simbolos culturais e estrutura social. Num sentido real, todos ns somos atores num palco e atuamos diante de uma platia formada pelos presentes e por aqueles que podemos imaginar Ao mesmo tempo que tentamos interpretar comportamentos culturais, estamos num palco construdo pela estrutura social. A vida social envolve cada um de ns como atores que, ao