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Produto: ESTADO - _BRASIL - 13 - 30/12/00 Preto A13 Produto: ESTADO - _BRASIL - 13 - 30/12/00 Preto A13 2% 5% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 95% 98% 100% PB 2% 5% 10% 15% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 85% 90% 95% 98% 100% COR SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000 A13 Reuters Daniel Garcia/AE Desejo realizado Tempo fechado Polêmica sobre alimentos geneticamente modificados vai prosseguir em 2001 Há hoje no planeta 36,1 milhões de pessoas infecta- das pelas aids. Quase 70% delas sobrevivem a duras pe- nas na África subsaariana, onde está África do Sul, país em que um em cada cin- co adultos tem a doença, sem contar com nenhum re- médio. Se a África do presidente Thebo Mbeki, que teima em dizer que a doença não é cau- sada por vírus e que o AZT pode fazer mal a grávidas com aids, foi a nota negati- va do ano, o destaque ficou por conta do Brasil. Por cau- sa de seu programa de distri- buição gratuita do coquetel de anti-retrovirais para os doentes, o País foi elogiadís- simo em todas os congressos internacionais e tema de re- portagens de redes como BBC e CNN, sempre citado como exemplo. Mais do que nunca, a pan- demia de aids devasta paí- ses pobres, que já sentem o impacto da perda da popula- ção economicamente ativa, mas é bem administrada nas nações desenvolvidas, com drogas cada vez mais eficientes, que garantem vi- da e qualidade de vida para os portadores do HIV. Só na Rússia, os casos de ai- ds aumentaram 305% em 2000. Os chineses finalmente deixa- ram de lado a tese oficial de que aids é “doença de estrangeiro” e reconhecem que há, pelo me- nos, 500 mil infectados. Na Ín- dia existem 3,7 milhões de doen- tes. E o fechado Irã dos aiatolás está iniciando campanha de prevenção. No novo milênio, a síndrome pode explodir na Ásia, Leste europeu e alguns países do Oriente Médio, obri- gando culturas tradicionais a re- ver tabus. Os doentes brasileiros termi- nam o século com 57 genéricos diferentes, à sua disposição nas farmácias e preços, em média, 40% menores que os dos remé- dios de marca. De início, o go- verno anunciou que eram 89 re- médios, quando, na prática, eram 26 – a lista traz o mesmo medicamento várias vezes ou porque há mais de um fabrican- te ou mais de uma apresenta- ção e inclui os de uso hospita- lar. Quem foi à farmácia atrás de genérico e ouviu um “não tem”, foi logo alimentando uma tese da conspiratória, unin- do indústrias, médicos e donos de farmácia. Hoje, porém, os balconistas logo oferecem o ge- nérico – quando existe – para quem pede remédio de marca. Ponto para o ministro Serra, que fez um acordo para conter altas de preços dos medicamen- tos e conseguiu emplacar a lei que isenta 1.200 remédios do pagamento de alguns impostos. Com a nova lei e o acordo de preços, a expectativa é que os re- médios se tornem mais acessí- veis para o brasileiro. Mas ain- da é pouco. O ideal, e o minis- tro é o primeiro a reconhecer, se- ria que a população de baixa renda tivesse remédios de gra- ça. A discussão sobre o preço de medicamentos não ferveu só no Brasil, mas já toma conta dos EUA, da África e da Ásia. Q uem passou em brancas nuvens pelas aulas de bio- logia e esqueceu qual é a diferença entre mitose e meio- se, gene e cromossomo, DNA e RNA, vai ter problemas para se manter a par do que ocorre nos laboratórios do planeta. Segun- do especialistas americanos, sem conhecimentos básicos de biologia, dentro de pouco tem- po vai ser difícil até votar. Afi- nal, sem essas noções, como po- sicionar-se diante de questões como manipulação genética, acesso às informações contidas no genoma de cada um, libera- ção de alimentos transgênicos e uso de tecido fetal no tratamen- to de doenças? Na virada do ano 2000, o físi- co britânico Stephen Hawking declarou que, se pudesse voltar atrás, estudaria genética. Porta- dor de esclerose lateral amiotró- fica, doença neurológica dege- nerativa que pouco a pouco pa- ralisa a vítima, Hawking pode- ria ser um dos beneficiados pe- los avanços da era pós-genômi- ca, a era iniciada oficialmente no dia 26 de junho, com o anún- cio da conclusão do seqüencia- mento do genoma humano, for- malmente uma empreitada con- junta do Projeto Genoma Hu- mano e da Celera Genomics, uma empresa privada. Do livro da vida, escrito pe- los 23 pares de cromossomos humanos, os cientistas dispõem de uma série de As (adenina), Ts (timina), Cs (citosina) e Gs (guanina), que se combinam nu- ma seqüência de 3 bilhões de le- tras. Aos poucos, comparando DNAs de pessoas saudáveis com os de quem apresenta de- terminado problema de saúde, eles vão descobrindo onde co- meça e onde termina cada gene (cada palavra desse texto). Até o fim de 2001, todos os ge- nes deverão identificados, ou se- ja, vai ser possível saber o que realmente determina a síntese de proteína e o que é “lixo evolu- tivo”. O próximo passo é deter- minar o significado, a função de cada gene. Em junho, previa-se que essa última etapa levaria anos. Mas quem acompanhou o noticiário científico em 2000 percebeu que raras vezes se passou uma semana sem que cientistas anunciassem a identificação de algum gene. E, felizmente, desta vez, o Brasil não ficou para trás. No ano do genoma humano, o País entrou para o fechado clube das nações que concluíram o se- qüenciamento genético de um ser vivo, no caso, a Xylella fasti- diosa, num trabalho que foi ca- pa da Nature. E, no fim do ano, o Instituto Ludwig, de São Pau- lo, completou o seqüenciamen- to de um milhão de fragmentos de genes dentro do Projeto Ge- noma Câncer, um volume que só fica abaixo da produção do Instituto Nacional do Câncer dos EUA. A grande expectativa agora é a chegada ao mercado das primeiras drogas produzidas via genética, o que pode ocor- rer ainda este ano. Pelo menos três estão em fase avançada de estudo. Mais de 11 mil genes já foram identificados e sabe- se a função de pelo menos me- tade deles. Também deve crescer consi- deravelmente o conhecimento acerca da função de cada gene, até porque, em genética, o co- nhecimento não se soma, mas se multiplica. O novo milênio testemunha também os primei- ros passos da farmacogenômi- ca, a ciência que usa a genética para produzir drogas, via com- putador, para cada indivíduo. O s transgênicos já invadi- ram a mesa dos brasilei- ros: quem come choco- lates ou salgadinhos de milho dos EUA ingere a soja Roun- dup Ready, da Monsanto, ou o milho StarLink, da Aventis, proibido para consumo huma- no, mas que contaminou safra americana deste ano. O governo brasileiro prome- teu seguidas vezes divulgar normas de segurança para transgênicos, alimentos em que um ou mais genes foram introduzidos para aumentar sua resistência ou teor nutricio- nal. Mas, o ano acabou e nada das normas. Por isso, é bem provável que novas “novelas”, como a que marcou o desem- barque de milho transgênico no Recife, se repitam, com de- cisões sendo aprovadas e revo- gadas pelas várias instâncias da Justiça. 2000 foi o ano em que cientis- tas mexicanos ganharam o Prê- mio Mundial de Alimentação por terem desenvolvido um mi- lho transgênico com o dobro de proteínas do normal. E a Monsanto, numa tentativa de melhorar sua imagem, abriu mão da patente do arroz doura- do, espécie transgênica rica em betacaroteno e que pode pôr fim à cegueira causada por fal- ta de vitamina A. Uma eventual liberação dos transgênicos no Brasil seria um alívio para a Em- brapa, que vem trabalhando na produção de mamão, mandioca, batata, eucalip- to, feijão e algodão herbá- ceo geneticamente modifica- dos para terem maior resis- tência a pragas e à deteriora- ção. A Europa e o Japão são hoje os mercados mais resis- tentes aos transgênicos, mas isso também pode mudar. A polêmica dos transgênicos deve esquentar ainda mais no Brasil e em outros países, com debates envolvendo os prós e os contras da rotula- gem de produtos. João Paulo II concretizou seu sonho e festejou ano jubilar à frente da Igreja. Pág. 14 Depois de dez anos de estudos, cientistas concluem seqüência do código da vida 2001 2001 Cromossomos humanos – Palavras como genes, genética e genoma passaram a fazer parte das conversas cotidianas, num reflexo de uma revolução científica que vai mergulhar fundo nas bases da vida e até alterá-las, se necessário Genoma foi a grande notícia do ano Transgênico na mesa do brasileiro 2001 2001 Brasil vira exemplo no combate à aids Associated Press Milho premiado – Pesquisadores mexicanos levaram décadas para produzir uma espécie geneticamente modificada com o dobro do teor de proteínas da normal, para enfrentar a desnutrição em países pobres Mário Covas enfrentou professores em greve e não atendeu reivindicações. Pág. 14 O ESTADO DE S. PAULO Genéricos, novidade a preço baixo Reuters CIÊNCIA E SAÚDE

Retrospectiva Estadão - 2000

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

A13

ReutersDaniel Garcia/AE

Desejorealizado

Tempofechado

Polêmica sobrealimentos geneticamente

modificados vaiprosseguir em 2001

Há hoje no planeta 36,1milhões de pessoas infecta-das pelas aids. Quase 70%delas sobrevivem a duras pe-nas na África subsaariana,onde está África do Sul,país em que um em cada cin-co adultos tem a doença,sem contar com nenhum re-médio.

Se a África do presidenteThebo Mbeki, que teima emdizer que a doença não é cau-sada por vírus e que o AZTpode fazer mal a grávidascom aids, foi a nota negati-va do ano, o destaque ficoupor conta do Brasil. Por cau-sa de seu programa de distri-buição gratuita do coquetelde anti-retrovirais para osdoentes, o País foi elogiadís-simo em todas os congressosinternacionais e tema de re-portagens de redes comoBBC e CNN, sempre citadocomo exemplo.

Mais do que nunca, a pan-demia de aids devasta paí-ses pobres, que já sentem oimpacto da perda da popula-ção economicamente ativa,mas é bem administradanas nações desenvolvidas,com drogas cada vez maiseficientes, que garantem vi-da e qualidade de vida paraos portadores do HIV.

Só na Rússia, os casos de ai-ds aumentaram 305% em 2000.Os chineses finalmente deixa-ram de lado a tese oficial de queaids é “doença de estrangeiro”e reconhecem que há, pelo me-nos, 500 mil infectados. Na Ín-dia existem 3,7 milhões de doen-tes. E o fechado Irã dos aiatolásestá iniciando campanha deprevenção. No novo milênio, asíndrome pode explodir naÁsia, Leste europeu e algunspaíses do Oriente Médio, obri-gando culturas tradicionais a re-ver tabus.

Os doentes brasileiros termi-nam o século com 57 genéricosdiferentes, à sua disposição nasfarmácias e preços, em média,40% menores que os dos remé-dios de marca. De início, o go-verno anunciou que eram 89 re-médios, quando, na prática,eram 26 – a lista traz o mesmomedicamento várias vezes ouporque há mais de um fabrican-te ou mais de uma apresenta-ção e inclui os de uso hospita-lar. Quem foi à farmácia atrásde genérico e ouviu um “nãotem”, foi logo alimentandouma tese da conspiratória, unin-do indústrias, médicos e donosde farmácia. Hoje, porém, osbalconistas logo oferecem o ge-nérico – quando existe – paraquem pede remédio de marca.

Ponto para o ministro Serra,que fez um acordo para conteraltas de preços dos medicamen-tos e conseguiu emplacar a leique isenta 1.200 remédios dopagamento de alguns impostos.

Com a nova lei e o acordo depreços, a expectativa é que os re-médios se tornem mais acessí-veis para o brasileiro. Mas ain-da é pouco. O ideal, e o minis-tro é o primeiro a reconhecer, se-ria que a população de baixarenda tivesse remédios de gra-ça. A discussão sobre o preço demedicamentos não ferveu só noBrasil, mas já toma conta dosEUA, da África e da Ásia.

Quem passou em brancasnuvens pelas aulas de bio-logia e esqueceu qual é a

diferença entre mitose e meio-se, gene e cromossomo, DNA eRNA, vai ter problemas para semanter a par do que ocorre noslaboratórios do planeta. Segun-do especialistas americanos,sem conhecimentos básicos debiologia, dentro de pouco tem-po vai ser difícil até votar. Afi-nal, sem essas noções, como po-sicionar-se diante de questõescomo manipulação genética,acesso às informações contidasno genoma de cada um, libera-ção de alimentos transgênicos euso de tecido fetal no tratamen-to de doenças?

Na virada do ano 2000, o físi-co britânico Stephen Hawkingdeclarou que, se pudesse voltaratrás, estudaria genética. Porta-dor de esclerose lateral amiotró-fica, doença neurológica dege-nerativa que pouco a pouco pa-ralisa a vítima, Hawking pode-ria ser um dos beneficiados pe-los avanços da era pós-genômi-ca, a era iniciada oficialmenteno dia 26 de junho, com o anún-cio da conclusão do seqüencia-mento do genoma humano, for-malmente uma empreitada con-junta do Projeto Genoma Hu-mano e da Celera Genomics,uma empresa privada.

Do livro da vida, escrito pe-los 23 pares de cromossomoshumanos, os cientistas dispõemde uma série de As (adenina),Ts (timina), Cs (citosina) e Gs(guanina), que se combinam nu-ma seqüência de 3 bilhões de le-tras. Aos poucos, comparandoDNAs de pessoas saudáveiscom os de quem apresenta de-terminado problema de saúde,eles vão descobrindo onde co-meça e onde termina cada gene(cada palavra desse texto).

Até o fim de 2001, todos os ge-nes deverão identificados, ou se-ja, vai ser possível saber o querealmente determina a síntesede proteína e o que é “lixo evolu-tivo”. O próximo passo é deter-minar o significado, a funçãode cada gene.

Em junho, previa-se que essaúltima etapa levaria anos. Masquem acompanhou o noticiáriocientífico em 2000 percebeuque raras vezes se passou umasemana sem que cientistasanunciassem a identificação dealgum gene.

E, felizmente, desta vez, oBrasil não ficou para trás. Noano do genoma humano, o Paísentrou para o fechado clubedas nações que concluíram o se-qüenciamento genético de umser vivo, no caso, a Xylella fasti-diosa, num trabalho que foi ca-pa da Nature. E, no fim do ano,o Instituto Ludwig, de São Pau-lo, completou o seqüenciamen-to de um milhão de fragmentosde genes dentro do Projeto Ge-noma Câncer, um volume quesó fica abaixo da produção doInstituto Nacional do Câncerdos EUA.

A grande expectativa agoraé a chegada ao mercado dasprimeiras drogas produzidasvia genética, o que pode ocor-rer ainda este ano. Pelo menostrês estão em fase avançada deestudo. Mais de 11 mil genesjá foram identificados e sabe-se a função de pelo menos me-tade deles.

Também deve crescer consi-deravelmente o conhecimentoacerca da função de cada gene,até porque, em genética, o co-nhecimento não se soma, masse multiplica. O novo milêniotestemunha também os primei-ros passos da farmacogenômi-ca, a ciência que usa a genéticapara produzir drogas, via com-putador, para cada indivíduo.

Os transgênicos já invadi-ram a mesa dos brasilei-ros: quem come choco-

lates ou salgadinhos de milhodos EUA ingere a soja Roun-dup Ready, da Monsanto, ou omilho StarLink, da Aventis,proibido para consumo huma-no, mas que contaminou safraamericana deste ano.

O governo brasileiro prome-

teu seguidas vezes divulgarnormas de segurança paratransgênicos, alimentos emque um ou mais genes foramintroduzidos para aumentarsua resistência ou teor nutricio-nal. Mas, o ano acabou e nadadas normas. Por isso, é bemprovável que novas “novelas”,como a que marcou o desem-barque de milho transgênicono Recife, se repitam, com de-cisões sendo aprovadas e revo-gadas pelas várias instânciasda Justiça.

2000 foi o ano em que cientis-tas mexicanos ganharam o Prê-

mio Mundial de Alimentaçãopor terem desenvolvido um mi-lho transgênico com o dobrode proteínas do normal. E aMonsanto, numa tentativa demelhorar sua imagem, abriumão da patente do arroz doura-do, espécie transgênica rica embetacaroteno e que pode pôrfim à cegueira causada por fal-ta de vitamina A.

Uma eventual liberaçãodos transgênicos no Brasilseria um alívio para a Em-

brapa, que vem trabalhandona produção de mamão,mandioca, batata, eucalip-to, feijão e algodão herbá-ceo geneticamente modifica-dos para terem maior resis-tência a pragas e à deteriora-ção. A Europa e o Japão sãohoje os mercados mais resis-tentes aos transgênicos, masisso também pode mudar. Apolêmica dos transgênicosdeve esquentar ainda maisno Brasil e em outros países,com debates envolvendo osprós e os contras da rotula-gem de produtos.

João Paulo IIconcretizou

seu sonhoe festejou

ano jubilar àfrente da

Igreja. Pág. 14

Depois de dez anos deestudos, cientistas

concluem seqüênciado código da vida

2001

2001

Cromossomos humanos – Palavras como genes, genética e genoma passaram a fazer parte das conversas cotidianas,num reflexo de uma revolução científica que vai mergulhar fundo nas bases da vida e até alterá-las, se necessário

Genoma foi a grande notícia do ano

Transgênico na mesa do brasileiro

2001

2001

Brasil viraexemplo nocombate à aids

Associated Press

Milho premiado – Pesquisadores mexicanos levaram décadas para produzir uma espécie geneticamentemodificada com o dobro do teor de proteínas da normal, para enfrentar a desnutrição em países pobres

Mário Covasenfrentouprofessores emgreve e nãoatendeureivindicações.Pág. 14

O ESTADO DE S. PAULO

Genéricos,novidade apreço baixo

Reuters

CIÊNCIA E SAÚDE

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A14 - O ESTADO DE S.PAULO GERAL SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

Exames mostraramqueda no nível do

ensino e desencadearampolêmicas

2001

Na escola, chega a vez da qualidade

Aúltima década regis-trou um crescimentovertiginoso do sistema

de ensino, do ciclo fundamen-tal à universidade. No decorrerdeste ano, o ritmo de expansãocontinuou alto, mas o que maischamou a atenção na área deeducação foi o debate sobre ou-tro assunto: a qualidade do ensi-no ministrado às crianças e aosjovens. Aos poucos, o Paísaprende a segunda parte da li-ção, na qual se ensina que quan-tidade não basta.

Um dos sinais de alerta sobrea urgência desse debate foi o re-sultado do Sistema Nacional deAvaliação da Educação Básica(Saeb), divulgado em novem-bro. Feito entre estudantes dosciclos fundamental e médio, elemostrou queda no seu desempe-nho. Em outras palavras, escan-carou uma piora na qualidadedo ensino.

O resultado suscitou acusa-ções e debates. Inicialmente res-ponsabilizou-se a expansão dosistema. O ingresso de centenasde milhares de alunos na redepública teria provocado seu de-clínio. Mas o argumento naufra-gou quando se percebeu que asescolas privadas, cujo total dealunos decresceu, também pio-raram.

No Estado de São Paulo, o ei-xo do debate foi o sistema deprogressão continuada, no quala criança só pode ser reprovadaao fim dos ciclos do fundamen-tal – na 4.ª e na 8.ª séries. Em vi-gor desde 1998, esse sistema te-ve sua eficácia discutida princi-palmente a partir da greve deprofessores por melhores salá-rios, que afetou a rede pública,entre os meses maio e junho.

Após 43 dias de greve, marca-dos por cenas de violência, co-mo o confronto com policiaismilitares na Avenida Paulista,os professores voltaram às salasde aula sem ver suas reivindica-ções atendidas. O movimentoteve o mérito, porém, de trazerà tona o descontentamento dosprofessores e ampliar a discus-são sobre o sistema de ciclos.

No plano universitário ga-nhou destaque a ameaça de cas-sação de licença para funciona-mento de cursos. Por meio doProvão e do Sistema de Avalia-ção de Condições de Oferta, oMinistério da Educação detec-tou graves problemas curricula-res e de falta de infra-estruturanas escolas. Em vários lugares,os especialistas que faziam ava-liações encontraram cursos dejornalismo funcionando semcomputadores. “Isso é inconce-bível”, desabafou o ministroPaulo Renato de Souza, apóster lido os relatórios.

Num período de dois anos,131 cursos ficaram ameaçadosde perder a licença. Mas esse sis-tema ainda é precário, em ter-mos de melhoria da qualidade.Dos processos abertos, apenascinco chegaram à fase final,quando se fazem exigências cla-ras de mudança, e até agora ne-nhum curso foi fechado.

Robson Martins/Coperphoto

O debate sobre qualidade de-verá aprofundar-se em 2001.Um dos seus motes será a refor-ma do ensino médio, que deuos primeiros passos neste ano,com a liberação de US$ 250 mi-lhões do Banco Mundial.

A meta é aproximar a escolado mercado de trabalho, domundo contemporâneo. Comodiz a presidente do InstitutoNacional de Estudos e Pesqui-sas Educacionais (Inep), Ma-ria Helena de Castro, “o mun-do muda, a escola tem de mu-dar”.

O problema é saber para quelado devem ir as mudanças. Asdecisões são difíceis e parecemarrastar-se, mas é inegável queaos poucos o País avança. Oque se vê hoje resulta de mu-danças que o governo vem su-gerindo e realizando há pelomenos cinco anos. Também foidecisiva a criação da Lei de Di-retrizes e Bases da Educação, aLDB, de 1996. Ela abriu jane-las que arejaram o sistema e fa-cilitaram o debate de agora.

Agliberto Lima/AE

Os preparativos foram lon-gos, caros e comentados. O re-sultado final, porém, decepcio-nou. A festa dos 500 anos doDescobrimento do Brasil, nodia 22 de abril, terminou comuma batalha campal, envolven-do índios, sem-terra e a Tropade Choque da Polícia Militarda Bahia. Tornou-se impossí-vel recordar os acontecimentosde Porto Seguro, sem associá-los às imagens daquele conflito.

Para piorar, houve o fracas-so da réplica da nau capitânia,que conduziu a frota de PedroÁlvares Cabral. Idealizada pa-ra ser uma espécie de abre-alasdos festejos no cenário do des-cobrimento, ao custo de R$ 4milhões, a réplica não navegoue faltou pouco para naufragar.

Os índios haviam a ido à re-gião de Porto Seguro para umamanifestação, na qual relem-brariam os cinco de séculos deproblemas que tiveram, desdea chegada dos brancos à terraonde eles reinavam sozinhos.Os sem-terra queriam protes-tar – mais uma vez – contra ogoverno. A eles juntaram-se lí-deres estudantis, do movimen-to negro, dos punks e de outrosgrupos, que formavam o movi-mento Outros 500.

No dia 22, quando tentavamse reunir em Santa Cruz Cabrá-lia e dali marchar até Porto Se-guro, onde o presidente realiza-va as celebrações oficiais, a PMinterveio. Eram quase mil poli-ciais, que usaram bombas degás lacrimogêneo e balas deborracha. No comando encon-trava-se o coronel Miller, des-crito nos dias seguintes comoum truculento, que não se dei-xava fotografar em ação, dizen-do: “Só quem tira foto minha éminha mulher e minha filha.”

Passados quatro dias, um no-vo incidente. Foi durante a amissa celebrada pelo enviadodo papa, o cardeal Angelo So-dano, no mesmo local onde ofrei Henrique Soares de Coim-bra a celebrou a primeira mis-sa em terra brasileira, em 26 deabril de 1500.

Um descendente dos índiospataxós, um jovem de pele ne-gra, quebrou o cerimonial damissa e fez um longo e iradodiscurso, no qual disse: “São500 anos de sofrimentos, mas-sacres, exclusão, extermínio denossos parentes.”

No tiroteio de acusações re-gistrado nos dias seguintes, aoposição acusou o governo deanti-democrático. Os defenso-res do governo disseram queeram os manifestantes que nãoestavam preparados para a de-mocracia. E assim passaram-se os 500 anos.

SOCIEDADE

Associated Press

Fracasso – Índio xavante é impedido pela tropa de choque da PM baiana de participar de ato de protesto nacelebração dos 500 anos, em Porto Seguro. A festa será lembrada pelo conflito e pelo fiasco da nau Capitânea

Pancadaria efiasco na festados 500 anos

Confronto – Durante a greve de professores, nos meses de maio e junho, o governador Covas participou debate-bocas e confrontos físicos. De um deles, na Praça da República, saiu com a boca sangrando e um galo na cabeça

Sonho – Durante sua peregrinação de seis dias pela Terra Santa, em março, o papa João Paulo II orou diante doMuro das Lamentações e relembrou Abrãao, patriarca que deu origem às três grandes religiões monoteístas do planeta

Papa obteveas graças quepediu ao céu

Os sonhos do persistenteKarol Wojtyla para o ano2000 tornaram-se realidade.

Desde que aceitou a tarefade dirigir a Igreja Católica,em 1978, o papa polonês nãoescondia o desejo de estar àfrente das celebrações dos 2mil anos do nascimento de Je-sus Cristo. Outro de seus dese-jos era visitar a Terra Santa,onde o Messias nasceu, viveue morreu, crucificado.

E assim foi feito. Com umadisposição incomum para osseus 78 anos e os problemas desaúde que enfrenta, o papa atra-vessou o ano 2000 participandodas cerimônias do grande jubi-leu do cristianismo. Reuniu-secom jovens, sacerdotes, velhos,enfermos, gente de todas as par-tes do mundo que foram a Ro-ma rezar com ele.

Ele também conseguiu viajarpara o Oriente Médio. Lá relem-brou Abrãao, patriarca que deuorigem às três grandes religiõesmonoteístas do planeta – o cris-tianismo, o judaísmo e o islamis-mo. Não visitou todos os luga-res que queria, mas parecia reju-venescido quando retornou aoVaticano.

Produto: ESTADO - _BRASIL - 17 - 30/12/00 P`GINA PBA17-TR A-RED.

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

A17

Reuters – 12/12/2000Reuters

Reação àsdrogas

PAULO SOTEROCorrespondente

WASHINGTON – Amente mais criativa econspiratória de Hol-

lywood não poderia ter imagi-nado o enredo da grande nove-la política que os Estados Uni-dos viveram no ano 2000. Noauge de seu poder político, eco-nômico e militar, a nação quese autodefine pelo conceito daprópria excepcionalidade e secomporta freqüentemente, emsuas relações com o resto domundo, como se detivesse o mo-nopólio das virtudes, produziuum espetáculo excepcionalmen-te grotesco e embaraçoso parauma democracia madura ao es-colher seu primeiro presidentedo século 21.

Forçados a escolher entre asfiguras insossas de herdeiros deduas dinastias políticas, quemais os aborrecia do que empol-gava, os americanos dividiram-se como nunca antes nas urnas.O resultado é que acabaramsubmetendo o sistema políticodo país ao teste mais severo naera do sufrágio universal e reve-laram a si mesmos e ao mundodeficiências e vulnerabilidadesinsuspeitadas em sua democra-cia: máquinas de votar obsole-tas, cédulas mal desenhadas,eleitores despreparados, funcio-nários eleitorais partidários,um número desproporcionalde votos nulos nas áreas demaioria negra e juízes que to-mam decisões transcendentaispara vida do país movidos porsuas preferências políticas.

Depois de 36 dias de guerrapós-eleitoral, o país sentiu-sealiviado pela resolução do im-passe e consolou-se no fato deque a confusão da contagem erecontagem de votos na Flóri-da não gerou episódios de vio-lência que circunstâncias seme-lhantes alimentariam em ou-tras latitudes. Mas, no final,poucos insistiam na tese segun-do a qual o sistema funcionouou de que a crise foi uma “liçãode civismo”.

A impressão mais forte queficou foi a de que o sistema fun-cionou mal, pois produziu umpresidente fraco, com um óbvioproblema de legitimidade, esco-lhido no final em função nãodos votos depositados nas ur-nas, mas de um veredicto politi-camente motivado de cinco ma-gistrados conservadores da Su-prema Corte, numa decisãoque provocou o estrago adicio-nal de diminuir a credibilidadeda mais respeitada instituiçãoda democracia americana.

O historiador Arthur Schle-singer Jr. não usou meias tintasao descrever o significado políti-co maior da ascenção ao poderdo republicano George W.Bush, o quarto dos 43 presiden-tes americanos que chega à Ca-sa Branca tendo perdido a vota-ção popular nacional para seurival, o vice-presidente AlbertGore.

“Isso coloca a república nu-ma situação intolerável”, escre-veu Schlesinger. “É uma situa-ção intolerável porque é antide-mocrática (...) e porque impõeum fardo fatal sobre os ombrosdo presidente minoritário.”

Schlesinger advoga uma mu-dança no critério usado paratransformar sufrágios popula-res em votos no Colégio Eleito-ral – que deu a vitória a Bushpor uma margem de apenas 1voto num total de 538 –, de mo-do a assegurar que o mesmocandidato vença sempre osdois pleitos, com maiorias refor-çadas.

O debate entre políticos, jor-nalistas e acadêmicos sobre es-ta e outras implicações do fias-co eleitoral do ano 2000 mil es-tá apenas começando.

As análises incluem a buscade explicações racionais para oinsucesso de Gore. De acordocom quase todos os modelos deprevisão eleitoral usados peloscientistas políticos, o vice-presi-dente e herdeiro político de BillClinton deveria ter ganho facil-mente o pleito de 7 de novem-bro.

É que o costuma acontecerquando a economia vai bem e opresidente em exercício de al-tas taxas de aprovação popularque Clinton exibe, apesar dosescândalos que marcaram suapresidência e do processo de im-peachment a que sobreviveu.

O rumo da discussão sobre ofuturo dependerá, em parte, dacapacidade de Bush de ganharlegitimidade nos primeiros me-ses de seu mandato mostrandoque é um líder competente, ca-paz de forjar coalizões e de ne-gociar compromissos que lhepermitam executar um progra-ma de governo.

As chances de isso acontecernão parecem das melhores.“Bush chega à Casa Brancanas circunstâncias menos aus-piciosas possíveis”, afirma Tho-mas E. Mann, um cientista polí-tico da Fundação Brookings,de Washington, especializadoem estudos governamentais.Não apenas o novo presidentetomará posse no próximo dia20 sob a nuvem de suspeiçãodeixada pelas circunstância desua eleição (segundo as pesqui-sas, cerca de 30% dos america-nos o consideram um presiden-te ilegítimo), como terá de tra-tar com uma oposição que sefortaleceu no Congresso, estábem colocada para reconquis-tar o controle da Câmara dosRepresentantes e do Senadonas eleições gerais de novem-bro de 2002 e atuará motivadapor esse objetivo, bem como pe-la convicção de que Bush usur-pou o poder. A recontagem dosvotos que jornais e universida-des estão fazendo na Flóridapodem aumentar o problemade legitimidade de Bush na fa-se de decolagem de sua admi-nistração.

A montagem do gabinete deministros não resolveu nenhu-ma das dúvidas sobre a apetên-cia para o novo presidente paratrabalho de governar nem so-bre seu talento ou preparo parafazê-lo.

Os jornais e revistas já estãorepletos de reportagens sugerin-do que Bush exercerá o podercomo uma espécie de “chair-man”, ou seja, o presidente doconselho de administração de

um grande empresa. E deixaráo serviço mais pesado da imple-mentação das políticas do go-verno para seu vice-presidente,Dick Chenney, um experienteex-deputado e ex-ministro daDefesa que fará as vezes do exe-cutivo-chefe ou, como prefe-rem alguns, de primeiro-minis-tro, no comando de um grupode operadores oriundo em boaparte da administração deGeorge H. Bush, o pai do presi-dente eleito.

Nada disso teria maior conse-qüência se houvesse garantiade continuidade da excepcio-nal prosperidade que a econo-mia americana conheceu du-

rante os oito anos do governoClinton. Com os EUA crescen-do a 5% ao ano (ou o equivalen-te a mais do que a metade doPIB do Brasil), como ocorreuno último triênio, os america-nos podiam, de fato, seguir exi-bindo a atitude politicamente“blasé” que mostraram nos últi-mos anos.

Mas o colapso das ações dasempresas high tech nas bolsas ea magnitude da desaceleraçãoda economia constatada nasduas últimas semanas sur-preendeu o próprio Federal Re-serve, o banco central dosEUA, e já leva Bush e Chenneya falar em recessão.

Embora a hipótese do pousosuave da economia numa taxade crescimento mais baixa con-tinue a dominar as previsõesdos analistas, o fato é que umrecuo da taxa de expansão doPIB de 5% para 2,5% ao ano de-pois de anos de um período re-corde de vacas gordas pode tero efeito psicológico de uma re-cessão e é um dado novo quecomplica o panorama no qualnovo presidente será testado.

O que fará uma superpotên-cia que subitamente se desco-bre portadora de defeitos quecostuma ver apenas nos outrose perde uma parte do dinamis-mo econômico do qual derivaseu poder no mundo globali-zado?

O ano danova intifada

WASHINGTON – Ainstalação do pri-meiro presidente de

um partido de oposição no po-der no México, no início de de-zembro, abriu um período re-pleto de oportunidades e deriscos para os 100 milhões dehabitantes da segunda maiornação da América Latina.

Administrar um país ondea máquina burocrática do go-verno federal e da maioria dosEstados nasceu e criou raízesnos maus costumes do cliente-lismo, do compadrio e da cor-rupção fomentados durantesetes décadas de regime doPartido Revolucionário Insti-tucional (PRI) será apenasum dos desafios de VicenteFox nos próximos seis anos.

Mas o historiador que exa-minar os grandes eventos polí-ticos do ano 2000 não terá co-mo ignorar a magnitude daproeza realizada por este ca-rismático ex-executivo da Co-ca-Cola e ex-governador doEstado de Guanajuato, à fren-te de uma das mais heterogê-neas alianças de forças políti-cas que já se viu na região. Aovencer no dia 2 de julho, Foxvirou uma página da históriado México.

A dimensão do triunfo e odesejo de mudança que ele tra-duziu supreendeu o próprioFox e os principais assessoresde sua campanha. Quatrodias antes do pleito, JorgeCastañeda, atualmente ochanceler mexicano, apostavanuma vitória apertada de Foxe especulava publicamente so-bre como o PRI fraudaria o re-sultado.

Antes de completar seu pri-mero mês no poder, Fox confir-mou que sua prioridade núme-ro 1, anunciando o lançamentonas próximas semanas de umagrande ofensiva contra o narco-tráfico e o crime organizado.“Haverá alguns golpes espeta-culares”, avisou um assessor.

Acabar com o crime organiza-do, que contou com a compla-cência e cumplicidade oficial naera do PRI, é a única tarefa detransformação do México queFox acha que pode iniciar e con-cluir em seu sexênio, segundoafirmou em entrevista exclusi-va que deu ao Estado no dia se-guinte à sua histórica eleição.

Um ataque à corrupção cen-trado na luta contra o narcotrá-fico facilitará a relação do Méxi-co com os Estados Unidos, on-de existe uma disposição franca-mente favorável do presidenteeleito George W. Bush a intensi-ficar as relações com o país vizi-nho elevando-as ao mesmo sta-tus especial de Inglaterra, Cana-dá e Israel.

Mas é incerto se os america-nos acolherão o ambicioso proje-to de Fox de discutir uma aber-tura da imigração para osEUA, a fim de resolver o dramados cerca de 250 mil trabalhado-res mexicanos que cruzam afronteira todos os anos.

Com um presidente no poderque não tem o problema de legi-timidade de seus antecessores evê na promoção da democraciae dos direitos humanos um ins-trumento de ação diplomática,o México deverá abandonar aatitude defensiva que sempreexibiu em relação ao tema e ga-nhar projeção como líder regio-nal, numa disputa de espaço fa-da a gerar tensões com o Brasil.

Soldados doExército

colombianotreinam para

combatertraficantes.

Pág. 18

Resultado é o 43.ºpresidente americano

com legitimidadeduvidosa

2001

Bush à prova – Republicano terá de mostrar que é um líder competente, capaz de forjarcoalizões para governar já no início de seu mandato, a fim de ganhar autoridade

2001

Gore resignado – Boa partedo eleitorado contesta derrota

Eleição expõe fendas da democracia

Uma parte dessa resposta é oexercício coletivo de sublimaçãodo rancor da batalha eleitoral aque os políticos dos dois partidosdedicaram-se desde que Goreconcedeu a vitória a Bush – um ri-tual certamente democrático, se-guidoem nome da busca da conci-liação e do entendimento biparti-dário, mas no qual nenhum dosatores participa com sinceridade.

O líder da oposição democratana Câmara de Representantes,Dick Gephardt, já resistiu publi-camente a reconhecer a legitimi-dade de Bush e só o fez de manei-ra indireta e quando não lhe resta-va outra alternativa. É o senti-mento comum entre os democra-tas. Outra parte da resposta podeser encontrada na declaração queBush fez ao tentar descrever suapolítica externa. “Será uma políti-ca externa humilde”, disse ele, re-tomando frase dos debates comGore que assume nova conotaçãoà luz do processo jurídico-eleito-ral que lhe deu a presidência.

“Isso significa que nós não de-vemos estar adivinhando prescri-ções para os males dos (outros)povos. Se eles quiserem trabalharconosco, tudo bem. Mas nossopaís não pode impor nossas recei-tas a (outras) nações.”

O que isso quer dizer é um mis-tério para os próprios assessores

de Bush. A declaração sugere ati-tude menos missionária por partede Washington. Mas deixa váriasincógnitas depois de um supreen-dente ano eleitoral, que colocouos EUA diante do espelho.

A explicação não esclarece,por exemplo, se Washington con-tinuará a insistir que o Japão ado-te medidas para tentar reativarsua estagnada economia, comofez nos últimos dez anos ou se aCasa Branca censurará o presi-dente Hugo Chávez, da Venezue-la, por suas tentativas de restrin-gir a ação dos sindicatos, ou ain-da, se o Departamento do Tesou-ro se empenhará para que o Fun-do Monetário Internacionalapoie economias emergentes emapuros, como fez há dois anoscom o Brasil e acaba de fazer coma Argentina. A declaração deixainterrogações interessantes no artambém sobre o projeto de libera-lização comercial das Américas,a viga mestra da política de Bushpara o hemisfério. É uma propos-ta que, embora faça todo o senti-do do ponto de vista do interesseeconômico dos EUA e possa ser-vir de base para um dos acordosbipartidários que Bush persegui-rá, deverá sofrer resistências noCongresso num quadro de umaeconomia em processo de desace-leração. (P.S.)

Violênciaexplode nosterritóriosocupados porIsrael. E a paz,mais distante.Página 18

O ESTADO DE S. PAULO

AMÉRICA DO NORTE

Oposicionista chega aopoder liderando uma

das mais heterogêneasalianças da região

Foxabre era deoportunidade erisconoMéxico

Reuters

Reuters

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A18 - O ESTADO DE S.PAULO INTERNACIONAL SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

ISSA GORAIEBEspecial para o Estado

BEIRUTE – No OrienteMédio, o ano terminaem clima extremamen-

te sombrio, depois das lufadasde esperança suscitadas nosúltimos dias por um projetode compromisso proposto pe-lo presidente americano, BillClinton, com o intuito de pôrfim ao conflito palestino-israe-lense. Uma reunião de cúpulaentre o presidente do Egito,Hosni Mubarak, o primeiro-ministro israelense, Ehud Ba-rak, e o chefe da AutoridadePalestina, Yasser Arafat, nobalneário egípcio de Sharm el-Sheikh, foi cancelada na últi-ma hora, por causa das pro-fundas divergências existen-tes entre israelenses e palesti-nos.

Ao mesmo tempo, conti-nuou a onda de violência,que, no espaço de três meses,já apresenta um saldo de 346mortos, sendo 303 palestinos:em Gaza, um atentado à bom-ba contra uma patrulha mili-tar israelense deixou 1 mortoe 3 feridos. Pouco antes, umabomba de fabricação caseiraexplodiu junto a um ônibusem pleno coração de Tel-Aviv, deixando 13 pessoas fe-ridas, 2 delas gravemente.

Contudo, apesar destesacontecimentos negativos, se-ria prematuro acreditar queos protagonistas da crise disse-ram sua última palavra e a re-gião está prestes a lançar-sede maneira irreversível numnovo século de confronto. OPlano Clinton prevê a restitui-ção aos palestinos de mais de90% da Cisjordânia ocupada,incluindo os bairros árabes dosetor leste de Jerusalém, parti-cularmente a Esplanada dasMesquitas, onde estão situa-dos os lugares santos muçul-manos.

Por outro lado, pela primei-ra vez, Israel mostra-se dispos-to a aceitar, no contexto deuma paz com os palestinos,mecanismos internacionaisde controle que comporta-riam o envio de uma força in-ternacional ao longo da fron-teira com a Jordânia. Mas,em troca da maior parte dosterritórios, o plano pede queos palestinos renunciem defi-nitivamente, uma vez por to-das, ao que eles consideramum direito imprescritível, ouseja, o direito de cada um dosrefugiados que deixaram seuslares por ocasião da criaçãodo Estado de Israel, em 1948,e de seus descendentes (numtotal de cerca de 3,7 milhõesde pessoas ) de voltar à sua pá-tria de origem.

Israel começou aceitandoeste projeto, vinculado, po-rém, a algumas condições:que ele seja aceito também pe-los palestinos, sirva de “basede discussão” para a negocia-ção futura de um acordo gerale, enfim, Washington respon-da favoravelmente aos seuspedidos de “esclarecimen-tos”. Mas, depois, o Estado ju-deu endureceu o tom, excluin-do, pela boca do assessor deBarak, Danny Yatom, qual-quer devolução da Esplanadadas Mesquitas aos palestinos.

Por sua parte, vários res-ponsáveis palestinos descarta-ram com indignação qualquerhipótese de abandono do “di-reito de retorno” e, ao mesmotempo, qualquer engajamentonum processo de contornosnão precisamente definidos, oque conduziria uma vez mais“a negociações interminá-veis”. Quem definiu a posiçãopalestina foi o próprio YasserArafat, após um encontrocom Mubarak na quinta-feiraem Sharm el-Sheikh, afirman-do que as propostas america-nas continuavam sendo exa-minadas “em profundidade”pelos representantes políticospalestinos, ao mesmo tempoem que estão sendo analisa-das em conjunto com os paí-ses árabes.

Esta prudência do líder daOLP explica-se facilmente:

embora esteja aquém das aspi-rações palestinas, o projeto deBill Clinton vai nitidamentealém de todas as idéias apre-sentadas pelas diversas admi-nistrações americanas no pas-sado. Mais ainda, desde a con-quista destes territórios por Is-rael, em 1967, jamais foi apre-sentada aos palestinos umaoferta assim tão ampla. E, aci-ma de tudo, os palestinos nãopodem dar-se ao luxo de cho-car-se frontalmente com a úni-ca superpotência mundial: pa-ra fazer evoluir num sentidomais favorável o compromis-so dos Estados Unidos, elespreferem, portanto, manter ocontato, jogando com um fa-tor capital que atormenta tan-to Clinton quanto Barak: o fa-tor tempo.

Clinton efetivamente temum prazo curto, ou seja, somen-te até 20 de janeiro, para en-trar na história – como o dese-ja ardentemente – como o ho-mem que conseguiu reconci-liar definitivamente Israel e Is-mael, arrancando-lhes, na “li-nha de chegada”, um acordoglobal a respeito da questão daPalestina. Quanto a Barak, suaúnica chance de sobrevivênciapolítica consiste em transfor-mar em plebiscito a respeito dapaz a eleição de 6 de fevereiro,durante a qual terá de enfren-tar Ariel Sharon.

Aí estão portanto duas boasrazões para que Arafat não semostre muito apressado e, aocontrário, deixe seus parceiros“cozinhando o molho”, na es-perança de concessões maissubstanciais.

Entretanto, o próprio líderda OLP não está imune dapressão do tempo. A partidade Clinton não deixará os ára-bes e os palestinos inconsolá-veis: não apenas eles estão re-signados há muito tempo à re-gra segundo a qual qualqueradministração americana deveprovar sua parcialidade em fa-vor de Israel, mas muitos delesrecordam que, pelo menosduas vezes (sob Dwight Eise-nhower, em 1956, e sob GeorgeH. Bush, em 1990), os republi-canos se mostraram mais fir-mes que os democratas diantedo Estado judeu. Por outro la-do, na falta de um acordo comBarak, os palestinos deverãotratar com o candidato do Li-kud, um homem detestado pe-los palestinos, que o conside-ram o responsável supremo pe-los massacres perpetrados emsetembro de 1982 nos acampa-mentos de refugiados de Sabrae Chatila, na periferia de Beiru-te.

Apesar dessa perspectivatão desagradável, Arafat nãopode, entretanto, a esta alturados acontecimentos, decididirrenunciar a este famoso “direi-to de retorno” porque neste ca-so se exporia a riscos muitomais graves, incluindo o de serdesautorizado pelo próprio po-vo e pelo conjunto do mundoárabe.

Com toda a certeza, o realis-mo obriga a constatar que emcaso algum Israel aceitará re-patriar mais do que alguns mi-lhares de refugiados, além dis-so minuciosamente seleciona-dos. É provável também que ja-mais o minúsculo território au-tônomo palestino poderá absor-ver – particularmente no planoeconômico – essa massa palesti-na de quase 4 milhões de refu-giados que hoje vive miseravel-mente nos países do exílio.

A solução mais comumentecogitada no seio da comunida-de internacional (e que espan-ta um pequeno país acolhedorcomo o Líbano, de textura de-mográfica delicada) consistiriaem abrigar na Cisjordânia eem Gaza uma parte destes refu-giados e em pagar indeniza-ções financeiras a todos os ou-tros, que deveriam continuarvivendo nos locais onde atual-mente residem. Mesmo queArafat aderisse oficialmenteum dia a estas opiniões “realis-tas”, só o faria no último está-gio da negociação de paz e estaconcessão suprema só seria fei-ta depois de garantida a resti-tuição integral dos territórios,incluindo Jerusalém Oriental.

2001

Reuters

Duas eleições, denún-cias de fraude, escân-dalos com detalhes bi-

zarros e o fim de um regimeautoritário de dez anos marca-ram o ano no Peru.

Depois do triunfo suspeitonos dois turnos da eleição pe-ruana, quando conquistouum polêmico terceiro manda-to, Alberto Fujimori, acaboucaindo em desgraça com seuex-assessor de inteligênciaVladimiro Monteisnos – a emi-nência parda do regime fuji-morista. Os dois têm o créditopela vitória contra a hiperin-flação e a guerrilha SenderoLuminoso. Mas atribui-se tam-bém à dupla um gigantesco es-quema de corrupção, baseadoem operações de contrabandode armas e vínculos com o nar-cotráfico. Em setembro, umafita de vídeo mostrou Montesi-

nos subornando um deputado.Fujimori fugiu para o Japão

em novembro e enviou uma car-ta de renúncia, rejeitada peloCongresso – que o destituiu porincapacidade moral. O presi-dente do Congresso, ValentínPaniagua, assumiu o poder inte-rinamente. Montesinos segueforagido, provavelmente forado Peru.

Oano termina na Colôm-bia sem que o governoconseguisse avançar

nas negociações de paz com asguerrilhas esquerdistas ForçasArmadas Revolucionárias daColômbia (Farc) e Exército deLibertação Nacional (ELN). Osdois maiores grupos guerrilhei-ros do país exigem do governoações contra os esquadrões pa-ramilitares de direita – que com-batem os rebeldes esquerdistasno interior colombiano.

O Plano Colômbia, embala-do por uma ajuda financeira deUS$ 1,3 bilhão dos EUA, é ou-tro ponto de atrito entre as guer-rilhas e o governo. O presidenteamericano, Bill Clinton, visitouo país em junho para confirmara intenção de Washington deaportar o dinheiro no esforçocontra as drogas.

O plano também é visto com

desconfiança pelos países vizi-nhos da Colômbia, como Bra-sil, Panamá, Venezuela, Perue Equador. Além da preocupa-ção ambiental – a pulveriza-ção dos cultivos de coca comesfoliantes pode causar danosà vegetação dos países limítro-fes –, os vizinhos da Colômbiatemem que seu território sejainvadido por cartéis em fuga.

Plano Clinton não afasta clima sombrio

2001A ajuda financeira ameri-

cana ao Plano Colômbia con-ta com o apoio do presidenteeleito dos EUA, George W.Bush e os primeiros efeitos daestratégia de combate ao nar-cotráfico devem ser sentidosjá nos primeiros meses doano. Em sua mensagem defim de ano, porém, as Farc jáanunciaram que sabotar o pla-no será seu principal objetivoem 2001. Em 31 de janeiro,vence o mandato concedido àguerrilha sobre a zona desmi-litarizada no sul do país.

Reuters – 8/12/2000

Guerra às drogas – Soldados da Brigada Antidrogasdo Exército fazem exercícios no interior da Colômbia

Guerrilhas e governo nãose entendem na Colômbia

Ajuda financeira dosEUA a plano antidrogacomplica ainda mais o

processo de paz

Três meses violentos – Mulher palestina chora durante funeral de um parente, tendo atrás a foto do garoto de 12anos Mohammed Al-Durra, cuja morte virou símbolo da violência que explodiu nos territórios ocupados por Israel

Oriente Médio terminao ano mergulhado emviolência e a paz corre

contra o tempo

Eleições legislativas e presi-denciais se realizarão entreabril e maio. A data de 8 deabril, fixada inicialmente parao primeiro turno deve ser modi-ficada em razão de problemastécnicos. A saída de Fujimorida cena política modificou to-da a correlação de forças dopaís e uma união dos partidosantifujimoristas, que pareciaviável há poucos meses, hoje éimprovável. Partidos tradicio-nais que quase desapareceramna era Fujimori, começam adar sinais de recuperação.

Reuters – 12/10/2000

Fim de reinado – Manifestantes pedem a renúncia deFujimori depois de reveladas as provas contra Montesinos

Fujimori perde o poder noPeru e Montesinos escapaDupla que comandouo país por dez anos é

acusada de armaresquema de corrupção

2001

ORIENTE MÉDIO/AMÉRICA LATINA

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

A7

José Paulo Lacerda/AE–9/11/2000Ed Ferreira/AE–1/5/1999

Freio nagastança

BRASÍLIA – O presiden-te Fernando HenriqueCardoso entra no novo

milênio com uma suave recupe-ração de popularidade. Embo-ra tímido, o saldo é positivo emum ano em que sua habilidadefoi testada em várias frentes: aolongo de 2000, teve de enfren-tar não só os últimos efeitos dadesvalorização do real e do ajus-te fiscal, como uma avalanchede denúncias contra seu gover-no e o confronto permanente en-tre os partidos da base no Con-gresso e com seus adversários.

Depois de amargar os maisbaixos índices de seus seis anosde mandato, Fernando Henri-que fecha dezembro com 26%de aprovação, 5 pontos a maisdo que no mesmo mês de 1999,segundo pesquisas da MCI. Pa-ra aliados, o resultado ainda re-flete a reação da sociedade àsmedidas impopulares que o go-verno tomou em 99 para garan-tir a retomada do crescimentoeconômico pós-desvalorização.

Para setores da oposição, osnúmeros mostram recuperaçãoresidual na popularidade deFernando Henrique, que nãosignificará a reconquista dos ín-dices do primeiro mandato. “Apopularidade até melhora, masele perdeu a credibilidade como

político e isso não se recupera”,analisa o líder do PT na Câma-ra, Aloizio Mercadante (SP).

O secretário de Comunica-ção, Andrea Matarazzo, avaliaque a reação de Fernando Hen-rique nas pesquisas deve-se àpercepção, pela sociedade, da

recuperação da economia e àmanutenção das bases da políti-ca econômica. Ele destaca ain-da o fato de o presidente ter sededicado a outros temas de go-verno, como segurança pública.

A popularidade foi influen-ciada também, para bem e para

mal, pelo de-bate do reajus-te do saláriomínimo, ante-cipado pelosaliados. Emmarço, Fer-nando Henri-que tinha omais baixo ín-dice de ótimo/bom, 16%. OCongresso ,por iniciativado presidentedo Senado,Antonio Car-los Magalhães(PFL-BA), de-batia a possibi-lidade de au-mentaro míni-mo para valorequivalente aUS$ 100, pro-

posta rejeitada pela equipe eco-nômica. No fim do ano, a mes-ma discussão, incluída no Orça-mento, tem o apoio do governo.

Mas a recuperação da econo-mia, a boa reação do Brasil àsturbulências internacionais e aspesquisas não garantiram a Fer-nando Henrique um 2000 tran-qüilo. Ele atravessou o ano ten-tando, sem muito sucesso, man-ter coesa sua base. Desde o pri-meiro embate entre os maiorescaciques da aliança – ACM e opresidente nacional e líder doPMDB no Senado, Jader Bar-balho (PA) – foram 264 dias detroca de acusações, ultimatos eameaças de rompimento, acir-rados pela disputa pelos postosde comando do Congresso.

Na briga, quem acabou atin-gido foi o governo e a figura dopresidente. Boa parte das de-núncias de ACM contra Jaderenvolveram órgãos da adminis-tração pública federal coman-dados por pessoas ligadas aoPMDB. O líder peemedebistadeu o troco na mesma moeda:devolveu as acusações de enri-quecimento ilícito e corrupção,implicando correligionários,

amigos e até parentes de ACM.Além do espetáculo depri-

mente das brigas entre os doispolíticos e as acusações indire-tas a seu governo, o presidentefoi atacado diretamente porACM. Um dos lances mais gra-ves da disputa foi uma entrevis-ta concedida a jornalistas es-

trangeiros, em que o senadordisse que Fernando Henrique étolerante com a corrupção.

O drama do governo é que adisputa pelos postos de coman-do do Congresso deve terminarpor volta de 15 de fevereiro,mas a guerra entre Jader eACM não tem data para aca-bar. E pode continuar respin-gando na administração.

Apesar disso, Matarazzoaposta que a tendência de me-lhora nos índices de popularida-de do presidente deve se man-ter em 2001. “Pode ser que nãochegue aos níveis do início degoverno, mas raramente vocêvê alguém, com mais de cincoanos de governo com a mesmapopularidade do início.”

Crime ecastigo

Com a vitória em 187 ci-dades, o PT vai adminis-trar orçamentos que so-

mam R$ 20 bilhões e influen-ciam a vida de 28,8 milhões dehabitantes. Não são apenas nú-meros. Nas eleições de 2000, opartido de Luiz Inácio Lula daSilva engordou o balaio de vo-tos e consolidou-se como amaior sigla de oposição doPaís. Elegeu prefeitos de seis ca-pitais – São Paulo, Recife, Por-to Alegre, Goiânia, Belém eAracaju – e 2.485 vereadores.Agora, de olho na sucessão dopresidente Fernando HenriqueCardoso, dirigentes petistas ad-vertem: o sucesso em 2002 de-pende do bom desempenho dasnovas administrações.

O maior desafio é a capitalpaulista – vitrine para o bemou para o mal. Vencedora dedisputa acirrada com PauloMaluf (PPB), Marta Suplicy re-ceberá de herança dívidas deR$ 18 bilhões, sem contar res-tos a pagar e pencas de proble-mas da gestão de Celso Pitta(PTN). “Não me intimido”, avi-sa Marta, com o entusiasmo dequem conquistou 58,51% dosvotos válidos. “Quero fazer deSão Paulo uma cidade moder-na e ousada, que entre no sécu-lo 21 com idéias novas.”

O PT sabe, porém, que vai vi-rar vidraça e precisa mostrarserviço. “Se vocês forem mausprefeitos, nosso projeto de 2002vai para o buraco”, apostou Lu-la, no mês passado, para umaplatéia lotada de recém-eleitos.

Na campanha, discursos in-flamados contra o FMI foramsubstituídos por propostas con-cretas. Cor-de-rosa ou não, oPT, desta vez, foi pragmático.“Passamos a exibir com maisênfase nossa capacidade de ges-tão”, diz o prefeito eleito de Por-to Alegre, Tarso Genro.

Além disso, o partido mon-tou grupo de trabalho queorientou a nova safra de candi-datos com pesquisas, vídeos ecartilhas contendo dicas de co-municação. Com a estratégia, onúmero de prefeitos petistas pu-lou de 105 para 187 – embora47% não tenham sido reeleitos.Ainda no primeiro turno, a le-genda saiu das urnas com 11,9milhões de votos – crescimentode 51,2% em relação a 1996,quando obteve 7,9 milhões.

Das 16 cidades que o PT dis-putou no segundo turno, ga-nhou 13. Quebrou jejum eleito-ral de 15 anos no Nordeste, em-placando João Paulo Lima noRecife e Marcelo Déda em Ara-caju. Mas não conquistou ne-nhuma prefeitura em Alagoase no Espírito Santo e amargoua derrota no Rio de Janeiro.“Perdemos onde saímos dividi-dos”, constatou o deputado Jo-sé Genoíno (SP), pré-candidatoao governo paulista em 2002.

Até junho de 2001, Lula deveanunciar se quer concorrer àPresidência. O PT completará21 anos em fevereiro e, pela pri-meira vez, haverá prévia para aescolha do candidato. O sena-dor Eduardo Suplicy (SP) jáavisou que está no páreo. O ex-governador Cristovam Buar-que (DF) ameaça entrar.

Na tentativa de identificarantecipadamente de onde vema rejeição ao PT e a Lula, acúpula do partido vai preparar,em 2001, um plano de ação elei-toral. “Precisamos de um traba-lho de organização nos Estadose de ajuste dos programas emtorno de um projeto para o Bra-sil”, afirma o presidente do PT,deputado José Dirceu (SP). Oano de 2001 trará outra novida-de: a primeira eleição direta noPT para a renovação de suas di-reções, em 16 de setembro.

PT ganha corpo e encara seu maior desafio

2001Joédson Alves/AE–5/4/2000

FHC patina e só recupera popularidade no final

Lei Fiscal limitaos gastos e leva

governantes,como Zeca do

PT (MS), apromover cortese ajustes. Pág. 8

Partido se renova econquista seis capitais,

mas ainda espera adefinição de Lula

2001

Joédson Alves/AE–24/11/2000

Guerra – A disputa entre ACM (esq.) e Jader é um dos principais problemas deFHC, já que a troca de acusações divide os aliados e atinge sua administração

Turbulência – Fernando Henrique teve um 2000 difícil, em que as boas novas sobre a recuperação econômica e o ajuste fiscalnão foram suficientes para amenizar quedas de popularidade, denúncias contra seu governo e crises na base de sustentação

Presidente termina anocom saldo positivo, mas

‘fantasma’ da briga entrealiados ainda atrapalha

O escândalo doTRT provoca ainédita cassaçãode um senador,a prisão do juizNicolau e açõesjudiciais. Pág. 8

O ESTADO DE S. PAULO

Ed Ferreira/AE–12/12/2000 Ed Ferreira/AE–26/4/2000

Dida Sampaio/AE–28/11/2000Wilson Pedrosa/AE–14/12/2000

Festa – Os petistas apostam na administração de Marta, que comemorou a vitória na Avenida Paulista, para garantir o bom desempenho da legenda em 2002

JOGO DO PODER

Robson Fernandjes/AE–29/10/2000

Produto: ESTADO - _BRASIL - 8 - 30/12/00 PretoA8

Produto: ESTADO - _BRASIL - 8 - 30/12/00 PretoA8

2% 5% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 95% 98% 100% PB 2% 5% 10% 15% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 85% 90% 95% 98% 100% COR

%HermesFileInfo:A-8:20001230:

A8 - O ESTADO DE S.PAULO POLÍTICA SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

Novas regras definemlimites para gastos e

maus administradorespodem até ser presos

Austeridade vira lei no ano do ajuste

Oano termina com um se-nador cassado, um juizpreso e diversos políti-

cos e administradores públicossofrendo processos na Justiça.2000 foi um ano inesquecívelpara os suspeitos de mau usoda verba pública.

A “saga” do juiz Nicolau dosSantos Neto, ex-presidente doTribunal Regional do Trabalhode São Paulo, virou assunto na-cional, com direito a horário no-bre na TV. Acusado de ser omentor do desvio de recursosda obra do Fórum Trabalhista,Nicolau teve prisão preventivadecretada em 25 de abril pelojuiz Casem Mazloum, da 1.ª Va-ra Criminal Federal, e sumiu.

A Polícia Federal montouuma grande operação para en-contrá-lo e mobilizou a Interpol(Polícia Internacional). Carta-zes de “procura-se” com a fotode Nicolau foram distribuídosem aeroportos e postos de fron-teira e a PF abriu com ele a pági-na de Procurados de seu site naInternet. Depois de quase 8 me-ses de caçada, o juiz acabou seentregando dia 8, após negocia-ções entre seu advogado, Alber-to Zacharias Toron, e a PF.

O mesmo caso fez Luiz Este-vão entrar para a história comoo primeiro senador cassado porseus pares no País. Em 28 de ju-nho, o Senado cassou Estevão etornou-o inelegível até 2016. Asuspeita de envolvimento como desvio agravara-se em maiocom a descoberta de documen-tos que dão conta da participa-ção do grupo OK, de Estevão,em 90% das ações da Incal In-corporações, responsável pelaobra. Ele chegou a ser preso em30 de junho por decisão judicial

num caso sobre gestão fraudu-lenta de um consórcio em Brasí-lia. Foi solto no dia seguinte.

Em novembro foram divulga-dos documentos que provam aremessa de US$ 1,05 milhão decontas abertas por Estevão emMiami, sob os nomes de JamesTower e Leo Green, para a con-ta de Nicolau na Suíça. O Minis-tério Público denunciou o ex-se-nador por formação de quadri-lha, peculato, estelionato, cor-rupção ativa, falsidade ideológi-ca e uso de documento falso.

O presidente da Incal, FábioMonteiro de Barros Filho, e o vi-ce-presidente, José EduardoTeixeira Ferraz, foram presosem maio. Monteiro de Barros fi-cou na cadeia por quase 50 diase Ferraz, por três semanas. Elessão réus na mesma ação abertacontra Estevão e Nicolau.

CPI – Em São Paulo, a CPIdos Fiscais da Câmara levouà cassação dos vereadores Vi-cente Viscome e Maeli Verg-niano e do deputado estadualHanna Garib. Viscome cum-pre 16 anos de prisão por che-fiar a máfia dos fiscais da Ad-ministração Regional da Pe-nha. Garib, sob suspeita dechefiar a máfia de fiscais daAR-Sé, foi preso em novem-bro, acusado de tentar subor-nar testemunhas para quemudassem seus depoimentos.

As investigações da CPI tam-bém atingiram vereadores dabase governista de outra forma:a perda de votos. Vários nãoconseguiram reeleger-se, comoMiguel Colasuonno (PMDB) eo mais antigo parlamentar pau-listano, Brasil Vita (PPB), quesó ficou com a segunda suplên-cia do PPB. Dos 55 vereadores,23 foram reprovados nas ur-nas. A renovação foi de 50,9%.

Em 2000, o Ministério Públi-co continuou às voltas com aoperação de socorro do Banco

Central aos Bancos Marka eFonteCindam na desvaloriza-ção do real, em janeiro de 1999.O ex-dono do Marka, SalvatoreCacciola, acusado de crimescontra o sistema financeiro, foidetido em junho. A prisão pre-ventiva foi revogada em 14 dejulho e restabelecida dias de-pois, mas ele já havia fugido.

Cacciola apareceu em Ro-ma, onde espera em liberdade oresultado de processo de extra-dição, pedida pelo Brasil. A ex-pectativa é que o processo se re-solva em 2001, mas há um com-plicador: o banqueiro é italianoe, embora a legislação do paíspermita extraditar um cidadãoque tenha cometido crimes noexterior, o processo é lento.

Quanto ao desvio do fórum,o juiz Mazloum diz que existe apossiblidade de julgar os doisprocessos que estão sob seu co-mando até meados de março.Mas ressalvou que esse prazopode ser estendido, caso a com-plexidade do processo o exija.

FINANÇAS PÚBLICAS

2001

São Paulo não merecia umprefeito como Celso Pitta. Eleentrou para a história como oprimeiro governante da cidadea ter o mandato julgado no ple-nário da Câmara Municipal. Oprocesso de impeachment foi ar-quivado em julho, mas, antesdisso, ele já havia sido afastadodo cargo por 19 dias.

Afilhado político e sucessorde Paulo Maluf, Pitta foi acusa-do pela ex-mulher, Nicéa, de co-mandar gigantesco esquemade corrupção na Prefeitura,além de subornar vereadores.As denúncias de Nicéa foramfeitas em 10 de março. No dia24, uma ordem judicial deter-minou o afastamento do prefei-to, mas ele conseguiu reverter adecisão e voltou nos braços dosperueiros.

O filho de Pitta, Victor, com-plicou a vida do pai em depoi-mentos ao Ministério Público.Disse, com todas as letras, queo empréstimo do malufista Jor-ge Yunes ao prefeito, no valorde R$ 800 mil, era apenas fa-chada. Já acusado de enriqueci-mento ilícito, Pitta foi novamen-te afastado por improbidade ad-ministrativa. A decisão, do Tri-bunal de Justiça, durou exatos19 dias, período em que o vice-prefeito Régis de Oliveira(PMN) assumiu o cargo e tro-cou todos os secretários.

O vaivém de prefeitos tumul-tuou a cidade. Pitta ganhou aparada. Voltou para ficar nodia 13 de junho, amparado porsentença do Superior Tribunalde Justiça. Um mês depois, foiabsolvido das 11 denúncias fei-tas pela seção paulista da OAB.

Em outubro, Maluf foi conde-nado, em primeira instância, adevolver R$ 1,2 bilhão aos co-fres públicos, por causa de des-pesas realizadas em seu últimoano na Prefeitura. Pitta foi con-denado solidariamente no mes-mo processo, pois era secretáriode Finanças.

Político com fama de es-tóico, o governador MárioCovas enfrentou o câncercom uma transparência ca-paz de comover até os adver-sários. Durante o períodoem que ficou internado noInstituto do Coração (In-cor), ele chegou a convocaruma entrevista coletiva echorou diante dos jornalis-tas. “Tive dor, tive medo. Ti-ve tudo aquilo que um ho-mem normal tem”, desaba-fou. “Se o homem não sabechorar, qual é a outra formamais digna de mostrar seussentimentos?”

O governador foi submeti-do a uma cirurgia para a re-tirada de dois tumores no in-testino e a uma colostomia,em 21 de novembro. A imu-noterapia foi a alternativasugerida pelos médicos doIncor e do Memorial SloanKettering Cancer Center,de Nova York, para comba-ter a doença por ser menosnociva à saúde. Mas a defini-ção do tratamento, de acor-do com o infectologista Da-vid Uip, será discutida comCovas após o ano-novo.

A reincidência do câncer,que afeta o governador des-de 1998, tirou da disputa de2002 um dos principais can-didatos do PSDB à sucessãodo presidente FernandoHenrique. Mas Covas mos-trou disposição de interferirna corrida eleitoral. Antesde recuperar-se da última ci-rurgia, ele agitou o PSDBcom uma entrevista ao Esta-do na qual defendeu a candi-datura do governador doCeará, Tasso Jereissati.

Luta de Covascontra o câncercomove o País

SOB SUSPEITA

Acusados de corrupçãovivem dias de pesadelo

Pitta balança,mas escapa doimpeachment

DRAMAHélvio Romero/AE–30/11/2000

Emoção – Covas chora durante a entrevista que convocou no Incor para falar da cirurgiade retirada dos tumores: ‘Tive dor, tive medo. Tive tudo aquilo que um homem normal tem’

Fuga – A PF fez cartazesde “procura-se” de Nicolau,que se entregou no dia 8

Inédito – Luiz Estevão tornou-se o primeiro senador a sercassado por seus pares, mas nega ligação com o caso do TRT

Balanço do escândalodo TRT de

São Paulo registrapunições históricas

Aaprovação de leis im-pondo austeridade naadministração pública

fez de 2000 o ano do ajuste. Asnovas leis incluem mudançasradicais na forma de gerir osgastos públicos, responsabili-zam criminalmente autorida-des que descumprirem limitesde endividamento e permitemreduzir a sonegação e ampliar aarrecadação tributária. Agora,o fato de um prefeito transferirdívidas para seus sucessores po-de ser motivo de prisão, penaantes prevista apenas para ca-sos de corrupção e desvio de re-cursos públicos.

As medidas começaram coma votação da emenda que proí-be as câmaras de comprometermais de 70% doorçamento coma folha de pes-soal. Logo de-pois, em maio,foi aprovada pe-lo Congresso aLei de Responsa-bilidade Fiscal –complementadapela Lei dos Cri-mes Fiscais, quedefiniu as punições criminaispara administradores públicosque não cumpram as novas re-gras. O pacote da austeridadeculminou com a votação, em de-zembro, dos três projetos quedão instrumentos à Receita pa-ra combater a sonegação.

A Lei Fiscal impôs um “códi-go de conduta” para governan-tes de União, Estados e municí-pios. A idéia é conter o endivi-damento do setor público, ade-quando gastos à capacidade definanciamento por meio da ar-recadação de tributos. A lei visaainda a alterar uma característi-ca do federalismo brasileiro: da-qui para a frente a União estáproibida de dar socorro finan-ceiro aos Estados e municípios.

Uma das exigências da LeiFiscal que já surte efeito é a obri-gatoriedade de identificar recei-tas permanentes para financiarnovos gastos. Ela está por trásde toda a discussão no Congres-so sobre como arranjar os recur-sos para o mínimo de R$ 180.

Essa regra facilitou a aprova-ção pelo Congresso de três pro-jetos polêmicos de combate à so-negação. As medidas facilitama quebra do sigilo bancário pelaReceita – que não precisa maisde autorização judicial –, elimi-nam brechas legais que permi-tem pagar menos impostos epermitem o uso dos dados daContribuição Provisória sobreMovimentação Financeira(CPMF) para fiscalização. O te-mor de que a farra de fim demandato fosse mais acentuadacom a possibilidade de reelei-ção dos prefeitos facilitou aaprovação da Lei Fiscal e daLei dos Crimes Fiscais.

A preocupa-ção de se ade-quar à Lei Fiscalfez com que go-verno e oposiçãose igualassemnos cortes de gas-tos. Os governa-dores aplicaramàs suas adminis-trações fórmulasque a esquerda

antes combatia, como demis-sões, enxugamento de quadrose extinção de empresas. O go-vernador do Mato Grosso doSul, José Orcírio Miranda dosSantos, o Zeca do PT, foi o quemais surpreendeu. Em novem-bro, lançou pacote de enxuga-mento da máquina, que incluiucorte de vantagens do funciona-lismo, redução de 26 para 20 nonúmero de empresas públicas,fixação do teto salarial em R$11.720 e um programa de de-missões incentivadas. Tambémforam extintas três das 13 secre-tarias e 11 das 23 empresas, fun-dações e autarquias. Os 2,9 milcargos de confiança foram redu-zidos à metade. Objetivo: econo-mizar R$ 74 milhões anuais.

Joédson Alves/AE–18/8/2000

Dida Sampaio/AE–14/6/2000

Captura de tela/Rede Globo

PACOTE

INCLUI AÇÕES

CONTRA

SONEGAÇÃO

Produto: ESTADO - _BRASIL - 42 - 30/12/00 PretoB10

Produto: ESTADO - _BRASIL - 42 - 30/12/00 PretoB10

2% 5% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 95% 98% 100% PB 2% 5% 10% 15% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 85% 90% 95% 98% 100% COR

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B10 - O ESTADO DE S.PAULO ECONOMIA SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

A arte – ou ciência – de predi-zer o futuro da economia está sen-do exercida com dificuldade naArgentina. Motivos não faltam.Os analistas tanto sustentam queo país pode deslanchar, como po-

de afundar mais no poço que ca-va sem parar há mais de doisanos. Tudo dependerá de como oadormecido governo do presiden-te De la Rúa vai reagir à necessi-dade de reativar a economia.

O governo espera crescer2,5%, com um déficit fiscal deUS$ 6,5 bilhões, com pequena al-ta no desemprego em 2001.

O economista Alemann afir-ma: “Não teremos muito cresci-mento.” Redrado diz que a blin-dagem trará tranqüilidade à Ar-gentina, mas “não implicará cres-cimento econômico”. Para ele, oPIB aumentará 1,6%. Os setoresbeneficiados serão os de entreteni-mentos, reflorestamento, minera-ção e Internet. Os mais atingidos:têxtil, metalúrgico e calçados.Cálculos da Fundação Capital in-dicam que a média do desempre-go será de 15%. As exportaçõescrescerão 4%.

Pesquisa realizada pelo jornalEl Cronista indica relativo otimis-mo entre o empresariado: 29%acham que a recessão terminaráem março. Outros 27%, no segun-do trimestre. Os empresários atri-buem a recessão ao aumento dosimpostos (24%) ou à incerteza dapolítica econômica (23%). Alémdisso, 94% dos empresários acre-ditam que a paridade entre o dó-lar e o peso vai continuar.■ Mercosul – Será um ano dereativação para o bloco, afir-mam economistas e empresá-rios. Há tarefas pendentes a se-rem executadas. Redrado consi-dera positiva a recente reuniãode cúpula. “Mas, temos deapressar a criação de tribunaisde solução de controvérsias”.Ele adverte que o Mercosul teráde enfrentar o desafio da inte-gração com a Alca.■ Exportações – O presidenteda Câmara de Exportadores , En-rique Mantilla, afirma que as ven-das argentinas para o exteriorcrescerão 10%. “Dependem davalorização do euro em cerca de

11% e da quedanas taxas de jurosnos EUA”. Asvendas ao Brasil,para ele, depen-dem do setor auto-motivo e do preçodo petróleo.■ Eleições – Seráum ano difícil napolítica: o gover-no enfrentará elei-ções parlamenta-res em outubro,quando será reno-vada metade dasvagas do Congres-so. As pesquisasindicam que o go-verno tem gran-des chances depassar por umaderrota humilhan-te, que deixarianas mãos do Parti-do Justicialista(mais conhecidocomo “Peronis-ta”), da oposição,o controle absolu-to do Senado e daCâmara dos De-putados, colocan-do o governo emxeque.Em março come-çarão as primei-ras movimenta-

ções eleitorais, o que significa quea partir desse mês espera-se umaoposição mais dura dos peronis-tas, que já não estão fazendo fácila vida para De la Rúa.A falta de possibilidade de rever-ter o alto desemprego de formaimediata também instaura umpanorama social exaltado, noqual seriam freqüentes as grevesgerais e os piquetes nas estradas.Além disso, o próprio governonão consegue manter a aura dehonestidade que tinha até há pou-co, já que os casos de corrupçãocomeçam a atingir membros dafamília do presidente.De la Rúa tenta fazer o possívelpara não naufragar em 2001, en-quanto que seu ministro da Eco-nomia, Jose Luis Machinea, rezapara conseguir remover a econo-mia da recessão que assola o paíshá dois anos e meio.Analistas próximos a Machineasustentam que sonha com o deno-minado “efeito Malan”: comoseu colega brasileiro em 1999, oministro argentino pretende recu-perar o país com a ajuda recebidado FMI e rapidamente crescer.

ARIEL PALACIOSEspecial para o Estado

BUENOS AIRES – O prin-cipal instrumento para aArgentina sair da crise é

o prestígio do país por ter conse-guido ajuda financeira do FundoMonetário Internacional (FMI) ede outros órgãos internacionais,no total de US$ 39,7 bilhões, co-nhecida como “blindagem finan-ceira”. Mas ter o instrumento esaber como usá-lo não bastará:outra variável desta complexaequação será a reação dos descon-fiados mercados internacionaissobre o país nos próximos meses.

O primeiro ano do governo dopresidente Fernando de la Rúafoi marcado por forte instabilida-

de política e econômica. Ne-nhum presidente na história daArgentina sofreu três greves ge-rais no primeiro ano de governo.As paralisações tiveram comomotivos principais os ajustes eco-nômicos do governo, o desempre-go, o arrocho salarial e o cresci-mento da pobreza no país.

Ao longo do ano, ficou no ca-minho um aumento no desem-prego, de 13,8% para 14,7%. Ogoverno reduziu o déficit de US$10 bilhões, herdado do governoMenem, para US$ 7 bilhões.

Mas a redução foi relativa, jáque este mesmo déficit ultrapas-sou a meta, prevista com o FMIno início do ano 2000, em US$2,7 bilhões. O crescimento do Pro-duto Interno Bruto (PIB) no ano2000 teria sido de 0,2% e não sedescarta que tenha sido negati-vo.

Para grande parte dos econo-mistas, um dos principais “prós”deste ano foi a manutenção da es-

tabilidade cambial. “A Argenti-na mudou seu governo, e sempreque isso ocorria, havia uma modi-ficação total da política econômi-ca. E, no entanto, desta vez man-teve-se o respeito às privatiza-ções e à estabilidade financeira.”

Entre os “contras”, os econo-mistas contabilizam “o enfoquegradualista da equipe econômi-ca, que sempre esteve mais lentoque os acontecimentos e muitoaquém das necessidades”. Segun-do eles, “faltou uma estratégia in-tegral para melhorar o desempe-nho fiscal”. Além disso, criticam-se os aumentos de impostos, quebloquearam a reativação do con-sumo. O descalabro fiscal foi aquestão central do ano e a fraseque melhor o ilustrou foi a do ex-integrante do FMI Vito Tanzi,que disse que a Argentina “arre-cada como o Haiti e gasta comoa Europa”.

Fazendo um balanço de 2000,o veterano economista Roberto

Alemann sustenta que o ano foi“de crescimento 0% e de um hor-rível déficit de US$ 10 bilhões”.

O jovem economista-chefe daFundação Capital, Martín Re-drado, afirmou ao Estado queno ano 2000 a Argentina “nãoteve um cenário de caos. E, ape-sar do que diziam nossos cole-gas economistas brasileiros, nãohouve desvalorização nem sus-pensão de pagamentos. Isto foigarantido pela blindagem, queteve forte componente local. Osistema financeiro argentino co-locou quase US$ 20 bilhões, al-go que não é costumeiro nos ou-tros mercados emergentes”.

Barril atingiu recorde dealta em outubro; em

2001, cartel quer conter aatual tendência de queda

EUGÊNIO MELLONI

Em 2000, os membros dapoderosa Organizaçãodos Países Exportado-

res de Petróleo (Opep) vive-ram o apogeu e o fracasso deuma política de contenção daprodução, adotada desde1999, focada na valorizaçãoda commodity. O petróleoWTI, negociado em NovaYork, começou o ano a US$ 25o barril, chegou a US$ 38 emoutubro e despencou paraUS$ 24, em dezembro.

O ano foi marcado tambémpela intensa especulação nasbolsas, com a frenética presen-ça dos fundos de investimen-tos por trás da rota ascendentedos preços. A Opep e os gran-des consumidores industriais,por sua vez, envolveram-se emum severo embate sobre o ní-vel ideal da oferta – os primei-ros com os olhos nos petrodóla-res, que se tornaram fartos de-pois de anos de proventos min-guados; os segundos, preocu-pados com o impacto inflacio-nário e com o potencial de de-saceleração do crescimento desuas economias pela alta doóleo bruto.

O ano já iniciou com as cota-ções aquecidas: o barril doWTI oscilava em torno deUS$ 25 em meados de janeiro,US$ 12 acima dos níveis de fe-vereiro do ano anterior, quan-do atingiu o fundo do poço. Oforte inverno nos Estados Uni-dos, o principal consumidorde óleo de calefação, e umaoferta mundial inferior à de-manda em 2 milhões de barris/dia, no último trimestre de1999, deram o primeiro empur-rão para a tendência de alta,que perdurou até meados deoutubro – quando o WTI atin-giu a marca de US$ 38 o barril,cotação observada somentenos momentos críticos daGuerra do Golfo.

Nesse meio tempo, estabele-ceu-se um cabo-de-guerra en-tre produtores e consumido-res. Pressionada principalmen-te pelos Estados Unidos, aOpep, em três reuniões trimes-trais sucessivas, promoveutrês ajustes no seu teto de pro-dução, elevando-o de 29,3 mi-lhões de barris/dia, no primei-ro trimestre, para 32,4 milhõesno quarto trimestre. Tiverampapéis decisivos na pressão pe-lo aumento da oferta do cartelArábia Saudita e Kuwait, prin-cipais aliados do governo ame-ricano no Oriente Médio.

Mas, apesar dos aumentos,as cotações demoraram a ce-der. Dados da Agência Inter-nacional de Energia (EIA, pe-las iniciais em inglês) mostramque as cotações tiveram, namaior parte do ano, pouca rela-ção direta com o nível da ofer-ta. Segundo a EIA, somenteno primeiro trimestre houveum real déficit na oferta dacommodity, de 200 mil barris/dia. No segundo e terceiro tri-mestres, houve excedentes de2,4 milhões e 1,8 milhão de bar-ris/dia, respectivamente.

Em Londres e Nova York,as altas foram justificadas, emmomentos distintos, por confli-tos no Oriente Médio ou peladificuldade das refinadorasacompanharem o ritmo da de-manda. A saída dos fundos deinvestimentos desse mercado,em outubro, e a imediata que-da livre das cotações deixarama impressão, contudo, de que aespeculação nas bolsas foi, emboa parte, responsável pelamanutenção da alta registradaaté então.

Os países membros da Opepvão realizar sua primeira reu-nião em 2001, prevista para 17de janeiro, em Viena, sob umaconjuntura totalmente diversada que predominou em 2000.Vários ministros do petróleoda Opep já anunciaram – e osanalistas acreditam que não setrata de bravata – que o cartel,que elevou a produção em

mais de 3 milhões barris pordia em 2000 para conter a altadas cotações e evitar uma der-rocada da economia mundial,agora deverá reduzir sua ofer-ta entre 500 mil e 1 milhão debarris por dia para evitar o co-lapso dos preços e de suas pró-prias economias.

“Se as cotações continua-rem próximas dos US$ 22 obarril, o corte realmente ocor-rerá”, prevê o analista FábioSilveira, da Tendências Con-sultoria Integrada.

Razões para o corte não fal-tam. Os preços do barril do pe-tróleo apresentaram, em Lon-dres e Nova York, uma desva-lorização superior a US$ 12 en-tre meados de outubro e a ter-ceira semana de dezembro. Osmotivos foram a recuperaçãoparcial dos estoques america-nos de petróleo e derivados e asaída estratégica dos fundosde investimentos.

Com a baixa, o preço da ces-ta de petróleo da Opep, que ser-ve de referência para o cartel,atingiu o piso de US$ 21,64 obarril na terceira semana de de-zembro, perdendo US$ 4,11em apenas 15 dias. Com essenível, a cesta ficou abaixo dabanda de US$ 22 a US$ 28 es-tabelecida pela Opep como fai-xa de flutuação ideal das cota-ções. Analistas internacionaisnão têm dúvida de que, se o“gatilho” criado pela própriaOpep para manter os preçosdentro da banda não funcio-nou quando os preços estavamacima de US$ 28 o barril, nãofalhará para mantê-los abaixodo piso de US$ 22.

Silveira lembra ainda que sepersistir o teto de produçãoatual do cartel, de 32,4 mi-lhões de barris por dia, a ofertamundial deverá superar a de-manda em 3,2 milhões de bar-ris por dia no segundo trimes-tre de 2001.

2001

Crise põe em xeque política da Opep

2001

Em milhões de barris/dia

OFERTA X DEMANDA MUNDIAL

Fonte: Agência Internacional de Energia e Tendências Consultoria Integrada * projeção

1º 2º 3º 4º * 1º * 2º *Trimestre de 2000 Trimestre de 2001

75,1

76,2

77,3

78,9 79,178,8

75,3 75,6

77,977,9

75,5

73,8

Demanda

Oferta

Reuters

Socorro ajuda Argentina a recuperar prestígioBlindagem financeiradá instrumento para

que governo De la Rúaajuste economia do país

INTERNACIONAL

Reuters

Turbulência – Fernando de la Rúa (E) enfrentou forte instabilidade naeconomia, dirigida por Jose Luis Machinea, no primeiro ano de mandato

Insatisfação – Nenhum outro governo enfrentou tantasgreves gerais, provocadas pelo alto índice de desemprego

Reuters

Gatilho – Instrumento criado pela Opep para manter preços do petróleo dentro da banda deUS$ 22 a US$ 28 o barril só será eficiente se for para elevar as cotações, dizem os analistas

Produto: ESTADO - _BRASIL - 41 - 30/12/00 P`GINA PBB9-TR A-RED.

Produto: ESTADO - _BRASIL - 41 - 30/12/00 P`GINA PBB9-TR A-RED.

2% 5% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 95% 98% 100% PB 2% 5% 10% 15% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 85% 90% 95% 98% 100% COR

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

B9

Depois da disparada doinício do ano, turbulências

externas ditam orumo dos mercados

CLEIDE SÁNCHEZ RODRÍGUEZe NEUSA RAMOS

As bolsas de valores ter-minam o ano distan-tes da euforia dos pri-

meiros meses de 2000, quan-do a Nasdaq, a nervosa bolsaeletrônica dos Estados Uni-dos, superou a incrível marcados 5 mil pontos, e o ÍndiceBovespa atingiu nível recor-de de 18.951 pontos. Nos últi-mos pregões do ano, a bolsaamericana oscilava em tornodos 2,5 mil pontos, e a bolsabrasileira, na esteira da Nas-daq – um comportamentoque predominou durante to-do o ano – registrava 15 milpontos.

De fato, entre esses doismomentos, as bolsas vivencia-ram momentos de extremavolatilidade. Um vaivém pro-vocado pela disparada do pre-ço do petróleo, pelas incerte-zas em relação ao grau de de-saceleração da economiaamericana e pela tão espera-da correção da Nasdaq. E acrise da vizinha Argentinacontaminou a bolsa domésti-ca.

“A euforia inicial vinha deuma expectativa de cresci-mento da economia america-na num ritmo de 8% ao ano eda possibilidade de retornoelevado e rápido dos papéisdas empresas da nova econo-mia”, afirmou o diretor daárea de Renda Variável doBankBoston Asset Manage-ment, Júlio Ziegelmann. Adúvida agora é se as altas su-cessivas das taxas de jurospromovidas pelo Federal Re-serve, o banco central ameri-

cano, para frear o crescimen-to e evitar a inflação vão desa-quecer a economia america-na além da conta.

Os mercados sofreram comessas incertezas que aindavão permanecer no início de2001. A Nasdaq, ainda maispelas dificuldades de se ava-liar o retorno dos papéis dasempresas da nova economia.Como são companhias de ris-co elevado, as bolsas acaba-ram extrapolando os movi-mentos, de alta ou de baixa,que se tornaram constantesdurante o ano.

No último trimestre de2000, os resultados decepcio-nantes dessas empresas e oproblema do crédito acaba-ram afetando a Nasdaq e asbolsas em geral. “A inadim-plência nunca atingiu níveistão elevados, devendo fecharo ano em torno dos 5%, dian-te de uma média de 2% ”, afir-mou Ziegelmann.

No balanço geral, no entan-to, a Bovespa mostrou certaresistência às influências daNasdaq e acabou fechando oano com melhor desempenhoem relação à própria bolsaeletrônica e boa parte dosemergentes. Não fosse pelacrise argentina, acredita oexecutivo do BankBoston, aBovespa fecharia com umavariação próxima a zero, emvez de negativa em quase11%. Para se ter uma idéia, aNasdaq acumulava uma des-valorização de 38,3% no anoaté dia 27; a Coréia, 51%; Tai-lândia, 44%; a Argentina,24%; e o México 22%.

Reuters

2.000

2.500

3.000

3.500

4.000

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5.000

5.500

Nasdaq alcança 5 mil pontos, mas termina o ano em torno de 2,5 mil pontos

A QUEDA DO MITO

Fonte: Estado

Turbulências impedem o bom desempenho do mercado doméstico

CONTÁGIO EXTERNO

ArtE

stado12.000

13.000

14.000

15.000

16.000

17.000

18.000

19.000

JANEIRO FEVEREIRO MARÇO ABRIL MAIO JUNHO JULHO AGOSTO SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO

Influenciada peloNasdaq, bolsa fechaabaixo dos 15 mil pontos

14/4

Ibovespa atingenível recorde

27/3

Novo pico debaixa

23/5

Alta no preçodo petróleo

7/7

JANEIRO FEVEREIRO MARÇO ABRIL MAIO JUNHO JULHO AGOSTO SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO

Seguindo aNasdaq

22/11

Pico da euforia

10/3

Divisão da Microsoftderruba bolsa

4/4 4.148,89

Nasdaq chega acair 13,5%; pâniconos mercados

5/4

Divisão da Microsoftderruba bolsa

4/4 4.148,89Justiça americana decidepela divisão da Microsoft

4/4

Inflação em alta faz bolsacair 9,67%

14/4

Crise Argentina

12/9

Sinais dedesaquecimento da economia

1/9

Alta do petróleo atingeníveis recordes

12/10

Balanço ruim dasempresas

22/11

Fonte: Estado

ArtE

stado

Reuters

A redução do volume decrédito no mercado financei-ro internacional é o principalponto de preocupação de eco-nomistas para 2001. A aver-são ao risco começou a serdissiminada em setembro,quando houve percepção quea economia norte-americanaestava realmente se desacele-rando e as empresas, princi-palmente as do setor de tec-nologia, haviam aumentadoseu endividamento. Segundoanalistas, há expectativa deque a restrição do crédito sópossa ser reduzida no segun-do semestre do ano, quandoo afrouxamento da políticamonetária americana, indica-da na reunião do dia 19 de de-zembro, começará a surtirefeito. Atualmente, empresasde grande porte dos EstadosUnidos sem recomendaçãode investimento, como GE,pagam juros semelhantes aosoferecidos pelos papéis depaíses emergentes, entre eleso Brasil.

Esta restrição de crédito,segundo economistas, podereduzir o fluxo de recursospara mercados emergentespor longo período de tempo,pressionando o câmbio e opreços dos papéis da dívidasoberana brasileiros. Isso, emum ano em que a previsão éde queda de investimentos di-retos e desempenho ainda pí-fio da balança comercial bra-sileira. “Por esses motivos, a

taxa de câmbio deve mudarde nível, sem tendência de re-torno, pressionando a infla-

ção e, portanto, segurando astaxas de juros”, afirmou oeconomista-chefe do Uniban-

co, Eduardo de Freitas.Perspectiva semelhante

tem o economista-chefe do

banco BBV, Octávio de Bar-ros. Segundo ele, a bruscaperda do mercado acionárioamericano – que reverteu asensação de riqueza – e o en-fraquecimento do euro – quereduz o cacife das empresasda região em investir ememergentes – irão fazer comque o investimento diretomingüe em relação a esteano, quando atingiu US$ 30bilhões.

Para a MCM, no cenárioem que não ocorrem choquesexternos extremos, mas noqual o nível de liquidez éapertado, como prevê Frei-tas, a queda da taxa de jurointerna fica limitada pelo ní-vel do risco Brasil. A estimati-va é chegar ao fim do ano em14%, ante os atuais 15,75%.

Um corte mais rápido dosjuros não ocorre apesar deeconomistas avaliarem que ocenário mais provável para2001 é de desaceleração daeconomia dos Estados Uni-dos – sem queda brusca. Mastambém não será nenhummar de rosas. Mesmo que obanco central americano re-duza os juros já em janeiro, amedida vai demorar algunsmeses para surtir efeito.

Além desse fator de inquie-tação, o preço do barril do pe-tróleo no mercado internacio-nal continuará centrando ofoco do mercado financeiro,mas a queda deste ano, já fezinstituições financeiras, co-mo BBV Banco a rever suaprojeção de crescimento doPIB para 2001 para cima. Amaioria dos economistasaposta em crescimento doPIB por volta de 4%, mas ob-servam que o número poderáser maior. A balança comer-cial, no entanto, deve conti-nuar com desempenho pífio.

Prestígioresgatado

2001

2001

Cartelem xeque

NEUSA RAMOSe JOSÉ ANTÔNIO RODRIGUES

Depois de três anos conse-cutivos de crises, a bolade cristal de economis-

tas mostrou-se menos turva eos grandes fiascos nas proje-ções econômicas para 2000 fo-ram a balança comercial e opreço do dólar. A previsão pa-ra a balança era de uma saldopositivo de US$ 4 bilhões, masaté o dia 24 deste mês, o resulta-do era negativo em US$ 667 mi-lhões. Para analistas, as apos-tas foram minadas pelo aumen-to do preço do petróleo, preocu-pação quanto ao ritmo do desa-quecimento dos EUA e turbu-lência na Argentina.

No caso da balança comer-cial, além da alta petróleo, ain-da houve o enfraquecimentodo euro – que reduziu a deman-da européia pelos nossos produ-tos. A substituição das importa-ções em setores importantes daeconomia foi menor que a pre-vista e houve queda do preçode produtos agrícolas com for-te peso na pauta de exporta-ções. A desconfiança em rela-ção ao crescimento dos EUA ea crise argentina foram as des-culpas para o erro das previ-sões do dólar, que ficaria emR$ 1,80.

Fora esses dois pontos, a eco-nomia brasileira mostrou-se só-lida. Houve manutenção da dis-ciplina fiscal e monetária, quesomado ao câmbio flutuante,permitiu que o País enfrentasseo cenário adverso e seguisse fir-me o caminho do crescimentoeconômico, acima do esperado,

com inflação declinante. Ocumprimento das metas de su-perávit primário em torno de3% do PIB, aliado a um déficitnominal estável, reduzirão a dí-vida líquida do setor público.

Socorrodo FMI ajuda

Argentina arecuperar

imagem noexterior.

Página 10

BOLA DECRISTALPARA 2001

Crescimento do PIB (%)

IPCA (%)

Déficit nominal (% do PIB)

Resultado primário (% do PIB)

Dívida líquida do setorpúblico (% do PIB)

Selic média (% A.A.)

Selic final de 2001 (% A.A.)

Balança comercial (US$ bi)

Déficit de transaçõescorrentes (US$ bi)

Investimentos diretos (US$ bi)

Câmbio (R$ em dezembro)

BBVBanco

3,8

4,4

3,5

3

49,5

15,25

14,75

0,5

27

23

2,10

CSFBGarantia

3,9

4,1

3,2

3,2

50,1

14,6

13

(1,5)

28,2

22

1,95

JPMorgan

4

4

3

2,7

48,5

13,9

12,5

0,6

26,5

25

2,00

Andima

4

4,4

3,2

3

48,5

14,9

13,6

0,3

26,3

22,7

2,01

Inter AmericanExpress

4,1

4,3

3,5

3

49

15

-

1

25,5

-

2,03

Citibank

4

4

3,1

3

48,2

14,6

-

(1,69)

29,3

28

2,00

LloydsBank

4

4,3

3,2

3

48,5

15

14

0

25,5

23

2,02* média Fonte: bancos

Quem quiser lançar bônus terá de correr. No1º bimestre, deve haver melhora da classificação

de risco do Brasil. Depois, a situaçãocomplica e, mesmo com otimismo, ocenário externo não é benigno

Octávio de Barros, economista-chefe doBBV Banco

O Nasdaq ainda vai cair mais e o mercado localdeve ficar um pouco mais independente, apesar de

o cenário externo ser adverso e daperspectiva de redução dos recursos

Pedro Tomazoni, diretor de renda variável doLloyds Bank

Um dos grandes desafios do governo e daeconomia é reduzir os juros para as empresas,

determinante para manter osinvestimentos daquelas sem acesso aomercado internacional

Antonio Delfim Netto, economista eex-ministro da Fazenda

Não é tão determinística a relação entrecrescimento mundial e exportações. Entre 1984 e

1999, enquanto o mundo cresceu a7% ao ano, países como Coréia eMéxico cresceram mais que isso

Antonio Corrêa de Lacerda,presidente da Sobeet

ArtEstado/Gisele

A história praticamente serepete. Depois do fiasco dasprevisões para 2000, poucosanalistas se arriscam a apos-tar em alguma tendência pa-

ra a Bolsa de Valores de SãoPaulo (Bovespa) em 2001 e amaioria mantém as projeçõesfeitas para este ano – a avalia-ção é que o índice feche entre20 mil e 24 mil pontos. “Per-demos o ano, mas dá para re-cuperar”, disse o diretor deRenda Variável do LloydsBank, Pedro Tomazoni.

Da mesma forma, é quaseconsenso que o 1.º trimestredo ano será decisivo. Nessaépoca os investidores já pode-rão saber se a desaceleraçãoda maior economia do mun-do estará ocorrendo de formabrusca ou suave. Uma boa no-tícia esperada para o Brasil éa melhora da classificação derisco do País, no início doano.

Tomazoni avalia que os pa-péis listados na Bovespa va-lem mais do que estão sendocotados. Marcelo Audi, doMerril Lynch, fincou sua pro-jeção para o ano que vem em24 mil pontos, a mesma de2000. “A economia vai cres-cer e com ela os lucros das em-presas, mas a redução dos ju-ros é crucial para a formaçãodo preço”, avalia.

Para Tomazoni, os bonsfundamentos internos deve le-var ao descolamento do Ibo-vespa do índice Nasdaq. “Opreço das ações de tecnologiaainda é elevado”, afirrmou,depois de o valor de mercadodessas empresas perder qua-se 50% e fechar o ano em tor-no de US$ 4 trilhões – emmarço, eram US$ 6,711 tri-lhões. Mesmo apostando naalta, Audi está apreensivocom a restrição do créditonos EUA, já que isso podecausar impacto negativo so-bre as empresas com necessi-dade de investimentos, comoteles e elétricas, e as empre-sas de telecomunicaçoes têmpeso expressivo no Ibovespa.

Escassez de crédito é o que mais preocupa

Bolsas encerram 2000 sem euforia

Depois doapogeu, Opepnão conseguesustentarpreços dopetróleo.Página 10

O ESTADO DE S. PAULO

Equilíbrio fiscal deuvigor à economia neste

ano, mas analistas aindatemem cenário mundial

MERCADO FINANCEIRO

CONJUNTURA

Produto: ESTADO - _BRASIL - 22 - 30/12/00 PretoC4

Produto: ESTADO - _BRASIL - 22 - 30/12/00 PretoC4

2% 5% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 95% 98% 100% PB 2% 5% 10% 15% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 85% 90% 95% 98% 100% COR

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

C4

Marco Boreli/AE – 8/11/2000

Dia dos Namorados, 12de junho. O ônibus da li-nha 174 fazia a rota

Central-Gávea quando foi se-qüestrado pelo ladrão San-dro do Nascimento no Jar-dim Botânico, Rio. Onzepessoas foram feitas refénse viveram quatro horas detensão e terror. Os brasilei-ros acompanharam pelaTV cada passo do drama,até o desenlace, com a mor-te da professora Geisa Fir-mo Gonçalves, de 20 anos,e do ladrão, asfixiado numcarro da Polícia Militar.

Usada como escudo,Sandra foi assassinada porNascimento a tiros, dispa-rados, segundo a perícia,

depois de o soldado do Bata-lhão de Operações Especiais(Bope) Marcelo Oliveira dosSantos ter atirado duas vezesno assaltante, numa tentativafrustrada de detê-lo. A PM ino-centou o soldado, mas a famíliade Geisa quer processá-lo. Estápedindo R$ 900 mil de indeniza-ção por danos morais e mate-riais ao Estado.

Até hoje ninguém foi punido.A ação desastrada dos policiaiscausou duas exonerações nacúpula da PM – dos então co-mandantes da corporação, coro-nel Sérgio Cruz, e do Bope, co-ronel Sérgio Penteado.

Mongaguá – Páscoa, 23 deabril. Dois estudantes universi-tários e um secundarista, todosde 17 anos, eram esperados pa-ra o almoço em família. Nãochegaram. Foram mortos vio-lentamente numa casa de praiade Mongaguá, litoral de SãoPaulo, onde tinham ido passaro feriado. Danilo Ramos Ribei-ro, Bruno de Paula AndradeRuggeri e Ariel Lagatta de Sou-za, jovens de classe média, mo-ravam em São Paulo. Daniloera filho de um oficial da Aero-náutica reformado e Ariel, deum investigador.

Os jovens tiveram pés e bra-ços amarrados com cordas denáilon e apresentavam sinaisde tortura. Bruno levou uma fa-cada no pescoço, que atingiu aartéria carótida. Daniel e Arielforam executados com espetosde churrasco enfiados no pesco-ço e nas costas. Os assassinosainda atiraram um colchonetesobre Ariel e atearam fogo. Se-gundo o pai de Ariel, o investi-gador Juadir José Ramos deSouza, os meninos foram assas-sinados com “crueldade”. “Jávi muitos crimes, mas nada co-mo este”, disse, desesperado.

A polícia de Mongaguá pren-deu dois rapazes pelo triplo as-sassinato. Cristiano FondelloDomingues, de 20 anos, foi deti-do no mesmo dia do crime, aopraticar um assalto, e delatou ocúmplice Luciano de Almeida,de 23 anos. Almeida afirmouter assassinado os garotos paranão ser reconhecido depois deassaltá-los, já que morava, como avô, bem próximo da casa on-de os estudantes passavam o fe-riado. Disse que não queria cor-rer o risco de ser preso nova-mente, porque tinha anteceden-tes criminais por roubo, furto ehomicídio. A mochila e as rou-pas roubadas dos garotos fo-ram localizadas num terrenobaldio nos fundos da casa doavô de Domingues.

Paulo Pinto/AE

Golde Letra

Cuidandoda cidade

A estudante de publicidadeLuanna Belmont, de 20 anos,vê com otimismo a chegada de2001. Um dos 11 reféns do se-qüestro do ônibus no Rio, Luan-na acredita que a violência noEstado está diminuindo e casoscomo o dela não vão se repetir.Após a tragédia, ela integrou-seà ONG Viva Rio. “Acho impor-tante participar de campanhascomo a pelo fim da venda dasarmas. E apóio projetos como aNova Polícia (integração dasPolícias Civil e Militar)”, dizLuanna, que garante não ter fi-cado traumatizada.

A morte do filho Ariel emMongaguá transformou a vidada família. “Mudamos de casa.Estamos diferentes. Com medode tudo”, admite o pai, JuadirJosé Ramos de Souza. “Prende-ram dois. Mas o caso não che-gou ao fim. Quero a verdade.Saber o motivo de tanta cruel-dade.” Juadir espera em 2001que a Secretaria da Segurançatrabalhe mais com a realidade emenos com dados. Segundo ele,isso banaliza a violência.

Aousadia de criminosos,com resgates de presosem distritos, toques de

recolher e a ação de facções empresídios, atingiu níveis inédi-tos em 2000. O ano foi marcadoainda pelo número recorde dechacinas na Grande São Paulo.

O Estado iniciou a contagemde chacinas em 1995. O recordeficou estabelecido em pleno diade Natal, com a localização doscorpos de quatro adolescentes.Foi a 90.ª matança de 2000,com 312 vítimas. Em 1998, re-corde anterior, tinha havido 89ocorrências e 308 mortos.

A maior chacina de 2000 dei-xou dez mortos em Jacareí, Va-le do Paraíba. No Brasil, o casode maior impacto foi o do apo-sentado Otávio Rodrigues deOliveira, que matou cinco pa-rentes em Arcos (MG), em ju-lho. Oliveira foi achado mortonuma cela de DP em agosto. Se-gundo a polícia, ele se suicidou.

Em 2000, o tráfico desafiouas autoridades paulistas com adecretação, em novembro, detoques de recolher na zona sulda capital, em São Bernardo eCampinas. Mas o caso mais ru-moroso ocorreu em fevereiro,quando traficantes da FavelaHeliópolis deram um ultimato,exigindo a desocupação da Fa-vela Paraguai, na zona leste.

A ameaça, no rastro de umadisputa de quadrilhas que pro-vocara 23 mortes, fez debandar90% das famílias que residiamno local. A ocupação pela Polí-cia Militar marcou, em meadosde março, o retorno dos mora-dores. A pressão da sociedadefez a maioria dos casos de to-ques de recolher ser esclareci-da, com a prisão dos bandidos.

O ano também revelou o po-der das facções criminosas nosistema carcerário paulista. Aqueda de braço entre a mais po-derosa delas, o Primeiro Co-mando da Capital (PCC), e ogoverno teve seu ápice nomaior motim registrado desde1961 na Casa de Custódia deTaubaté. Presídio de segurançamáxima, ele tinha sido escolhi-do para confinar os cabeças doPCC. A rebelião acabou em 18de dezembro, após mais de 30horas de terror, nas quais osamotinados mataram 9 presos.Obrigado a transferir os líderesdo motim, o governo criou ou-tra penitenciária de segurançamáxima, na cidade de Iaras.

A falta de vagas nas peniten-ciárias contribuiu para a super-lotação dos distritos policiais,combustível da indústria de res-gate de presos. São Paulo teve21 resgates em DPs até 22 de de-zembro. Em 1999, tinham sido37, mas com menos violência.

Uma das ações mais espeta-culares aconteceu em março,quando uma quadrilha lançouum carro contra a porta de vi-dro do 59.º DP, zona leste, parainvadi-lo. Entre 17 e 18 de se-tembro, ocorreram três resga-tes, em Sumaré (Campinas) ena Grande São Paulo. Nadamenos do que 185 presos fugi-ram. Em outubro, bandidos li-bertaram 95 detentos no 45.ºDP, na zona norte, executandoum policial militar na fuga.

Um resgate à luz do dia ser-viu para expor ainda mais as de-ficiências da Fundação Esta-dual do Bem-Estar do Menor(Febem). Em 4 de dezembro,cúmplices libertaram F.P., de17 anos, o Batoré, acusado de15 assassinatos, tirando-o deuma Kombi da fundação naAvenida Salim Farah Maluf.

A polícia recapturou Batoréno dia 14. Descobriu que ele tra-mara a fuga na Febem e instruí-ra os comparsas pelo telefone.Seis dias depois, 163 menoresescaparam da Unidade de Pare-lheiros, usando duas armas.

Em 2000, nem aviões escapa-

ram dos bandidos. Em junho ejulho houve assaltos cinemato-gráficos nas pistas dos Aeropor-tos de Congonhas e Brasília.Em 16 de agosto, ladrões se-qüestraram um Boeing daVasp na rota Foz do Iguaçu-Curitiba. Obrigaram o piloto apousar em Porecatu (PR) e rou-baram R$ 5 milhões.

2001

Motivo fútil e crueldadeda execução de garotosem Mongaguá também

chocaram sociedade

Os números da violência as-sustam, mas o secretário da Se-gurança Pública de São Paulo,Marco Vinicio Petrelluzzi, vêpelo menos um dado positivoem 2000. “Pela primeira vezem anos houve inversão na ten-dência de crescimento da crimi-nalidade em quase todos os índi-ces. Em especial nos crimesmais violentos.” Segundo ele,na média a queda foi de 3% a4%. “Parece pouco, mas é signi-ficativo, se antes crescia 10% aoano.” Ele acredita que em 2001a tendência de queda deve semanter. “Vai haver mudançana Prefeitura e, por mais dife-renças que haja, vão ser possí-veis parcerias na cidade que po-dem ter reflexo na segurança.Isso não ocorria na gestão Pit-ta.” Outra medida prometida,que deve aliviar a tensão nosDPs, é a remoção dos presos pa-ra Centros de Detenção Provi-sória. Devem ser erguidos dezno ano que vem, sete deles nacapital. Ele confirmou a transfe-rência da secretaria para o cen-tro em 2001, num prédio queabrigará a cúpula da polícia.

Abre-alas – quadrilha invadiu saguão do 59.º Distrito,na zona leste, com carro para resgatar presos em março

Raí deixou oscampos

parapersonificar

força doterceiro setor

no País. Pág. 5

Traficantes decretamtoque de recolher equadrilhas invadem

DPs para soltar presos

Pânico no Jardim Botânico – soldado precipita fim trágico doseqüestro de ônibus; no destaque, Luanna sob a mira de revólver

O Plano Nacional de Segu-rança Pública estava em gesta-ção havia alguns meses quandoo presidente Fernando Henri-que Cardoso antecipou seu lan-çamento para 20 de junho, pres-sionado pela repercussão do se-qüestro do ônibus no Rio. Foi di-vulgado que o programa recebe-ria R$ 2,9 bilhões até 2002 parapromover ações de combate àviolência nos Estados, R$ 701milhões só este ano. Na quinta-feira, o ministro da Justiça, Jo-sé Gregori, admitiu ter repassa-do só metade desse valor.

A verba destinada à constru-ção de penitenciárias em SãoPaulo é um bom exemplo dessadiferença entre promessa e rea-

lidade. Estimada em R$ 60 mi-lhões, ela chegou a ser elevadapara R$ 80 milhões por FHCem outubro, auge da onda deresgate de presos em DPs. Masficou em R$ 31 milhões.

O governo sofreu outro revéscom a proibição do registro dearmas de fogo. Segundo o Mi-nistério da Justiça, deixaramde ser vendidas 6 mil armas noPaís desde 29 de junho, data daproibição, mas o Supremo Tri-bunal Federal restabeleceu o di-reito ao registro.

Cobrado por resultados doplano, o ministro cita medidascomo a instalação de 18 delega-cias da Polícia Federal, a con-tratação de 300 agentes e a

apreensão de 5 toneladas de co-caína e outras 159 de maconhae haxixe. Ele sustenta que estãoem curso 72 operações contra otráfico e o crime organizado.

Outra frente do governo nocombate à violência é a reformada legislação. A proposta de re-formulação da Parte Geral doCódigo Penal, que trata da pro-gressão do regime de cumpri-mento de pena, já foi enviadaao Congresso. O mesmo deveocorrer com o projeto de refor-ma do Código de Processo Pe-nal, destinado a tornar maiságil o andamento de processos,também já concluído.

2001

O ministro José Gregorianunciou que o governo repas-sará aos Estados R$ 500 mi-lhões para a adoção de itens pre-vistos no Plano de Segurança.O secretário Marco Vinicio Pe-trelluzzi diz que São Paulo deveficar com R$ 50 milhões. “Elesserão usados, a princípio, emmudanças no sistema de comu-nicação da polícia.”

Para o especialista José Vi-cente da Silva, do Instituto Fer-nand Braudel, o ministério pre-cisa ter maior controle da apli-cação de verbas. “Ele deveriater um padrão de referência pa-ra Estados em termos de equi-pamentos e cobrar desempe-nho”, sugere. “Vamos fiscali-zar centavo por centavo”, ga-rante Gregori. “Quem não fez oque devia ou desviou recursosnão vai receber nada.”

País parou para acompanharseqüestro de ônibus no Rio

Favela Paraguai – garoto espia, pela fresta da porta de barraco, policial militar armado na operação realizadapara restabelecer controle das autoridades sobre favela da zona leste sitiada pelas ameaças de traficantes

Chacinas e crimes ousados marcam 2000

Pressão da sociedadefez FHC antecipar plano

2001

Epitácio Pessoa/AE–9/3/2000

AntonioErmírio deMoraesbancouremodelaçãoda PraçaRamos. Pág. 5

Del

fimV

ieira

/AE

–12

/6/2

000

Marcelo Alves/Futura Press – 6/3/2000

O ESTADO DE S. PAULO

Tasso Marcelo/AE – 12/6/2000

VIOLÊNCIA

Produto: ESTADO - _BRASIL - 23 - 30/12/00 PretoC5

Produto: ESTADO - _BRASIL - 23 - 30/12/00 PretoC5

2% 5% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 95% 98% 100% PB 2% 5% 10% 15% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 85% 90% 95% 98% 100% COR

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000 CIDADES O ESTADO DE S.PAULO - C5

2001

2001

Terceiro setor jámovimenta

R$ 11 bilhões porano no Brasil

Movimento social mostra a sua força

Algumas áreas públicasda cidade já servem

como laboratório paratrabalho conjunto

2001

Heliópolis éterreno paravoluntáriosEm 2000, o Brasil desco-

briu o terceiro setor, nãosó como fonte de resgate

da dívida social, mas como for-ça econômica em si. Só numade suas facetas, a filantrópica,ele movimenta por ano R$ 11 bi-lhões, cerca de 1% do ProdutoInterno Bruto (PIB), e emprega1,2 milhão de pessoas. Noapoio a doentes e carentes, nadefesa do ambiente ou da me-lhoria da qualidade de vida nascidades, o terceiro setor tam-bém ajuda empresas a cumprirsua função social e revela-seum poderoso instrumento demarketing. Uma tendência quevai se acentuar em 2001, AnoInternacional do Voluntário.

Os dados sobre o peso do ter-ceiro setor no PIB constam deum estudo publicado em agos-to, segundo o qual há pelo me-nos 200 mil entidades filantró-picas no País. O trabalho foirealizado pelo Instituto Supe-rior de Estudos da Religião(Iser) no âmbito de uma pesqui-sa sobre o terceiro setor em 22países, coordenado pela Uni-versidade John Hopkins, dosEstados Unidos.

Divulgado em março, um es-tudo do Instituto de PesquisaEconômica Aplicada (Ipea)mostrou que em 1998 as empre-sas do Sudeste investiram cercade R$ 3,5 bilhões em ações so-ciais comunitárias. Isso equiva-le a quase 30% dos gastos so-ciais do governo federal naque-le ano. A pesquisa revelou ain-da que 70% das empresas de co-mércio e 68% das indústrias fi-zeram algum tipo de ação so-cial em 1998.

Duas Silvias – Os recursos fi-nanceiros e até humanos paraessas atividades muitas vezesvêm do exterior. Em março,por exemplo, a rainha Silvia,da Suécia, nascida no Brasil, es-teve em São Paulo para lançaro braço nacional da sua institui-ção, a World Childhood Foun-dation (WCF). Em agosto, a re-portagem do Estado mostrououtra Silvia, anônima, traba-lhando numa comunidade ca-rente da cidade. Silvia Wester-mann deixou a placidez da Suí-ça para morar com a filha Mia-na, de 9 anos, no Jardim Araca-ti, perto do violento Jardim Ân-gela, na zona sul, e ensinar mo-radores da Favela da Muriçocaa produzir pão.

Há vários prêmios para in-centivar a atuação do terceirosetor, como o Voluntários doAno, concedido pela consulto-ria Kanitz & Associados. Umdos agraciados este ano foi ocraque Raí, que deixou os cam-pos de futebol para vestir exclu-sivamente a camisa da Funda-ção Gol de Letra, criada porele. Na categoria empresa, novi-dade de 2000 do prêmio, ga-nhou a indústria farmacêuticaSchering-Plough, pelo projetoCriança é Vida, por meio doqual 80 funcionários transmi-tem conhecimentos de sáude acrianças de creches da periferiae suas famílias.

O aspecto educativo da atua-ção espontânea das organiza-ções não-governamentais rom-peu a barreira da filantropia. Asociedade também se organi-

zou para exigir paz em 2000. Oápice dessa luta ocorreu em ju-lho. No dia 7, após uma sema-na de mobilização, atos contraa violência levaram milharesde pessoas às ruas de todo oPaís, principalmente nas 16maiores capitais. Em São Pau-lo, o símbolo das manifestaçõesforam as 53 cruzes, alusão aonúmero de mortes registradana região metropolitana no fimde semana anterior, “planta-das” no dia 3 por integrantesdo Movimento Basta, Eu Que-ro Paz em frente do Monumen-to a Pedro Álvares Cabral, noParque do Ibirapuera.

Disputas com rivais da vizi-nha Favela Paraguai que causa-ram sucessivas chacinas puse-ram no noticiário policial, noinício do ano, a maior favela doEstado, a Heliópolis. Mas foimuitas vezes mais notícia obem que o trabalho voluntário(de diversas religiões, de empre-sários e de profissionais libe-rais), associado a uma comuni-dade organizada, pode trazer aum local como Heliópolis, ondemoram 80 mil pessoas.

A mais recente conquistaocorreu em 1.º de dezembro,com a inauguração do CentroCultural e Esportivo. Primeiropólo de lazer da favela, ele foierguido por moradores, comrecursos da Companhia Side-rúrgica Nacional (CSN), numinvestimento de R$ 300 mil.Voluntários cederam luminá-rias, divisórias e material hi-dráulico.

O presidente da União deNúcleos, Associações e Socieda-des de Moradores de Heliópolise São João Clímaco (Unas),João Miranda, disse que estãosendo feitos contatos com ex-atletas para dar aulas de espor-tes. “Estamos buscando parcei-ros para manter atividades.”

São justamente as parceriasque fazem de Heliópolis umexemplo do que pode ser feitopara melhorar a qualidade devida das comunidades caren-tes. Várias iniciativas forammostradas em uma série espe-cial de reportagens publicadapelo Estado em março. Comoa do maestro Sílvio Bacarellique, com apoio da Volkswagendo Brasil, ensina música e can-to a menores de 7 a 14 anos.

Nos vários projetos tocadospela comunidade são atendi-dos mil menores. Há atividadespara o período em que eles es-tão fora da escola, um grupo deadolescentes que dá orientaçãosexual e incentiva a leitura, deznúcleos de alfabetização deadultos, mantidos por várias en-tidades, consultas de acupuntu-ra, massagem e sessões de tera-pia oferecidas por voluntários.

A Igreja Renascer tem proje-tos lá, como padaria comunitá-ria e reciclagem de papel, e aCatólica mantém creches, aten-dimento a portadores do vírusda aids e a gestantes e criançasdesnutridas. ONGs do exterior,como a Actionaid do Brasil,também apóiam projetos de es-truturação da comunidade.

Itamar Miranda/AE – 3/7/2000

CIDADANIA

Voluntários e a iniciativa pri-vada também preocupam-secom o estado de degradação so-cial e urbana de São Paulo. Aprefeita eleita Marta Suplicy(PT) já disse várias vezes quequer contar com parcerias paradesenvolver projetos, de revitali-zação de bairros a cursos profis-sionalizantes. Mas muitos cida-dãos e empresas já estão traba-lhando por conta própria.

Vinte empresas e entidadespreocupadas com a recupera-ção do centro assinaram convê-nio com a Prefeitura em 13 de

dezembro para melhorar o quebatizaram de Quartier CulturaArtística. Trata-se de uma áreade 92 mil metros quadradoscompreendida pelas Ruas Mar-tins Fontes, Avanhandava,Consolação e João GuimarãesRosa, incluindo a Nestor Pesta-na e a Martinho Prado, onde es-tão o Teatro Cultura Artística,restaurantes e casas de shows.Todo o dinheiro para resgatar aregião da decadência sairá dainiciativa privada. A remodela-ção inclui melhorias das calça-das, paisagismo – até com va-sos suspensos em postes –, des-poluição visual e a pintura degrandes painéis em fachadas efaces sem janelas de edifícios.

No primeiro semestre, o Gru-po Votorantim, do empresário

Antonio Ermírio de Moraes, jámostrara como uma interferên-cia simples pode fazer a diferen-ça ao bancar a recuperação e ainstalação da nova iluminaçãoda Praça Ramos de Azevedo,ao lado do Teatro Municipal.Antes abandonado e fétido, o lo-cal transformou-se em área delazer, com jardins floridos e se-gurança mantida pela Votoran-tim. O BankBoston também ga-rante a segurança no Vale doAnhangabaú, onde até as fon-tes enfim funcionam e os cantei-ros estão floridos.

Outra carência, a falta de es-paços de lazer, que acaba resva-lando na violência, encontraapoio em voluntários da iniciati-va privada para sua solução.Como foi mostrado em janeiro,

o projeto Vida 2000, formadopor entidades assistenciais, jáatua em oito bairros carentes.Em parceria com moradores,as entidades promovem muti-rões e, graças a doações, cons-troem praças e locais de entrete-nimento em áreas pertencentesà Prefeitura. “Como a própriacomunidade ajuda, ninguémdestrói”, diz o idealizador doprojeto, Vanderlei Coelho.

Milton Michida/AE – 26/10/2000

Marta aposta em parceria para erguer SP

A tendência do terceiro setorem 2001 é de crescimento, diz ocoordenador do Centro de Estu-dos do Terceiro Setor da Funda-ção Getúlio Vargas (FGV),Luiz Carlos Merege. E não sópor conta do Ano Internacionaldo Voluntariado. “A média departicipação é de 1,5% do PIBno Brasil. Nos países desenvol-vidos é de 4%, então há muitocampo ainda.”

O filão também é promissorno quesito empregos: respondepor 2,2% do mercado no País,ante 6% no exterior. “O segmen-to não vive só do voluntariado ea oferta tem aumentado, ao con-trário do setor privado.” ParaMerege, o problema do terceirosetor é a sua falta de organiza-ção. “Ele ainda é disperso.”

É justamente para otimizaratividades que foi criada a Re-de Brasileira de Entidades Fi-lantrópicas (Rebrat), com 300entidades. “Estamos pondo emfuncionamento um portal na In-ternet (www.terceirosetor.org.br), como meio de mobiliza-ção”, afirma o empresário Ro-gério Amato, presidente da Re-brat. No portal, pessoas físicasou jurídicas vão poder ter infor-mações de experiências que de-ram certo e trocar dados. “Noano que vem ela deve estar fun-cionando a plena capacidade.”

O superintendente do GrupoVotorantim, Antonio Ermíriode Moraes, acredita que, paraavançar na recuperação do cen-tro da cidade em 2001, é neces-sária uma ação conjunta de em-

presários e governo. “Se cadaum fizer o que estiver ao seu al-cance, a situação vai melhorar,sem dúvida. Muita gente querajudar. É preciso apenas umempurrãozinho”, disse.

Ermírio mandou limpar es-te ano a Praça Ramos. O Gru-po Votorantim também inves-tiu na mudança da iluminaçãode sua sede, o antigo Hotel Es-planada, situado no local. “Foium ato pessoal nosso. Estamosconservando a Praça Ramos ecom isto a cidade ganha maisuma área de lazer”, explicou oempresário. “Do jeito que esta-va, não poderia continuar. APraça Ramos estava completa-mente abandonada. Sei que háoutros empresários que podemfazer o mesmo.”

A construção de 3 mil mo-radias num terreno do Depar-tamento Estadual de Trânsi-to (Detran), na Avenida Pre-sidente Wilson, é uma dasprioridades da União de Nú-cleos, Associações e Socieda-des de Moradores de Heliópo-lis e São João Clímaco(Unas). A primeira luta,quando a prefeita eleita Mar-ta Súplicy (PT) assumir, vaiser pela desapropriação daárea.

“Temos ainda a propostade fazer uma vila olímpicano estacionamento do Hospi-tal Heliópolis”, diz o secretá-rio-geral da Unas, José Geral-do de Paula Pinto. “Mas nos-so papel não é só cobrar dosvários níveis de governo quefaçam algo pela Favela Helió-polis – queremos ser parcei-ros, fazendo casas em muti-rão, por exemplo”, afirma.Outra proposta: em vez deconstruir creches, que exi-gem grandes investimentos,a Unas recomenda que sejamalugadas casas. “A Prefeitu-ra pode prover os recursos fir-mando convênios com a asso-ciação; a comunidade se en-carrega de administrar.”

Já faz isso com outra cre-che na Rua da Mina, que de-ve ser reformada em outraparceria com a iniciativa pri-vada. Com isso, o número decrianças atendidas passariade mil para dois mil. Segun-do o secretário, várias dessaspropostas já foram entreguesà equipe da prefeita eleita.

Paz – 53 cruzes foram fincadas pelo Movimento Basta, Eu Quero Paz no Ibirapuera paralembrar as mortes ocorridas na região metropolitana no primeiro fim de semana de julho

Marcelo Ximenez/AE – 22/11/2000

Ensaio de orquestra – maestro Baccarelli ensina canto e música clássica a crianças e jovens carentes em Heliópolis;iniciativa, mantida com recursos da Volkswagen do Brasil, ajuda a mudar imagem da maior favela de São Paulo

Revitalização – com apoio de empresários como Antônio Ermírio deMoraes, o centro de SP, sobretudo a Praça Ramos, ganhou novo visual

Produto: ESTADO - _C2_SP - 5 - 30/12/00 P`GINA PBD5-ED.BR/SP

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000 CADERNO 2 O ESTADO DE S.PAULO - D5

Revitalização vem com

companhias de todo o

País, mas há sempre

carência de recursos

A consciência coletiva

aspirando à

representação é dado

novo no fim do século

HELENA KATZEspecial

Adança não pode ir tãobem quanto devia e podianum país que não lhe des-

tinarecursosetampoucoumpro-jeto de política cultural. Aqui, umfestival da importância do Pano-rama RioArte de Dança Contem-porâneacorreoriscodeser inter-rompido porque o Ministério daCultura informa, depois dele ini-ciado, que a irrisória verba de R$60 mil que havia sido verbalmen-te acordada não mais lhe serádestinada. Talvez esse seja o me-lhor exemplo do tratamento des-respeitoso que a dança brasileiravem recebendo do Minc e a elepodem ser acoplados vários ou-tros, como o da destinação damesma quantia de R$ 60 mil doFundo Nacional de Cultura paraa parte infantil do Festival deJoinville (qual o critério? Quemdecideque esta é a prioridade pa-raestetipodeverba?)ouarepeti-çãoda nãorealizaçãoda promes-sadeumProjetoCenaAbertame-nos equivocado que o de 1998.

Como disse José Celso Marti-nez Corrêa, em entrevista à revis-ta Caros Amigos de setembro:“Esse é um ministério de repassecontábil de dinheiro público paraempresas.Elesimplesmenteapro-vaosprojetos.Quemdecidenãoéquemfazacultura.”Hoje, jáhávo-lume suficiente de dados paradiagnosticarumapolíticacultural

reduzida às Leis de Incentivo co-moimpeditivadodesenvolvimen-to saudável das artes brasileiras.

Apesar da torcida contra do go-verno e de seus instrumentos dedistorção,adançabrasileiraconti-nuouflorescendo,graçasaoesfor-ço individual dos envolvidos nasua produção – situação da qualnão devemos nos ufanar, pois seapóia exclusivamente em sacrifí-ciospessoais.Seráquecontinuare-mos a contar com algo da impor-tânciadoTerçasdeDança,ativida-de realizada pelo Estúdio NovaDança, que há cinco anos escoa eirrigaaproduçãode pontaemSãoPaulo? Ou será que o modelo queprevalecerá é o que o mercadoaplica ao Ballet Stagium que, ini-ciandooseu30.ºanodeatividadespermanentes com a melhor cria-ção de Décio Otero em tempos re-centes (À Margem dos Trilhos), edepoisdehavermodificadoadan-ça deste país, continua sem patro-cíniointegral,aopassoqueseuva-lorosotrabalhosocialcontacomanecessáriagarantiadesobrevivên-cia? Estaria ocorrendo, por partedas empresas, uma alarmante mi-gração de interesse do marketingculturalparaosocial?AatitudedaShell poderia ser entendida comoum sintoma, quando anunciouqueatrocadoseupioneiropatrocí-niodoGrupo Corpopelode proje-tos sociais se devia a uma mudan-çade objetivos?

Embora o tamanho do nossopaís continue funcionando maiscomo impedimento do que comoo estímulo que deveria ser para acirculação da informação e con-seqüente consolidação de ummercado, há traços, aqui e ali, deuma auspiciosa regionalização.

Basta conferir a trajetória decompanhias como o VilaDança(Salvador), Verve (Campo Mou-rão), Gestus (Araraquara), Cia.de Dança Balé de Rua (Uberlân-dia) ou o pólo de Fortaleza, como Alpendre, a Bienal de Dança, oAndanças e o Colégio de Dançado Ceará. O futuro de tudo isso,contudo, pode ser antevisto nasdificuldadesque acometem o Ce-na 11 (Florianópolis) e o Quasar(Goiânia),doisexemplosdecom-petência e talento injustamenteameaçados por uma continuadaausência de recursos. Em CaxiasdoSul,sobadireçãodeSigridNo-ra, a Cia. Munici-pal se expande econsolida, ates-tando que gruposoficiais podemburlarovelhomo-delão e dar certo.

Agestão de He-lena Severo dian-te da SecretariaMunicipal de Cul-tura do Rio de Ja-neiro,queinstalouumapoioconti-nuado a companhias de dança,que hoje somam 11, infelizmentenão contaminou outros secretá-rios. O resultado pode ser aferidonovigordaproduçãocarioca,quevoltou a ocupar uma posição dedestaquenoPaís.Companhiasco-mo as de Lia Rodrigues, ReginaMiranda (que completou 20anos), João Saldanha, Marcia Mi-lhazes, Carlota Portela, RubensBarbot, Paula Nestorov, PauloCaldas, João Carlos Ramos, An-drea Maciel e Renato Vieira, des-frutam de um pequeno mas indis-pensávelapoio. Infelizmente,adeMarciaRubin,porexemplo,ainda

não foi acolhida, o que salienta ainjustiça sempre presente emqualquer escolha.

Em São Paulo, o trabalho doCentro Cultural São Paulo me-rece ser destacado. Em épocade encolhimento de oportunida-des, a sua programação vemfuncionando como um oxigê-nio indispensável.

Nesse sentido é que a suspen-são do Movimentos de Dança doSesc precisa ser lamentada. E asquartas-feiras do Sesc Pinheiros,que já conquistaram estabilidadepela pertinência da sua curado-ria, devem ser estimuladas, bem

como o novíssi-moespaçodasse-gundas, abertona Casa das Ro-sas, com coorde-nação de LeniraRangel. Quantoao eixo em tornodo Estúdio NovaDança, com suastrês companhias,merece muito

maisdoquetêmrecebidosuasdi-retoras Tica Lemos, ChristianePaoli-QuitoeAdrianaGrecchi, in-cansáveis no papel de produto-ras e difusoras de conhecimento.

O desamparo também vitimaartistas como Vera Sala, HelenaBastos e Raul Rachou, João An-dreazzi, Marta Soares (recém-contemplada com uma prestigio-sa bolsa Gugghenheim), SandroBorelli, Claudia de Souza, Maria-na Muniz, Mario Nascimento, LuGontijo e Margô de Assis, Adria-na Banana, Eva Schul, FredericoParedes e outros aqui nomeadoscomo representantes de tantosoutros na mesma situação. Mes-

mo assim, todos continuam acriar, domesticando o futurocom a sua teimosia em resistir.

Quantoa2001,parecetrazeral-gumaspoucasmudanças.Osdoismais importantes festivais profis-sionais, o FID, de Belo Horizonte,e o Panorama RioArte, do Rio deJaneiro, aproximarão as suas da-tas para formar um eixo distribui-dor, esforço ao qual também sereuniráaMostraInternacionaldoSesc São Paulo. Assim, atraçõescomo Boris Charmatz, este prati-camenteconfirmado,poderãocir-cular pelas três capitais. O KirovBallet e o Nederlands Dans Thea-tre devem voltar ao Brasil, além

de Pina Bausch, que aqui estréia,em agosto, a nova produção quefaz de nós o seu tema.

A grande novidade talvez este-ja no convite recebido pela LiaRodriguesCia. deDança, que, emsetembro, será acolhida pela deMaguy Marin para uma residên-cia em Lyon, França. Se aqui nãoacontece, outros percebem e in-vestem na nossa dança, como é ocasodogovernofrancês,quedes-tinou 100 mil francos para esseprojeto. Se a validade dos pedi-dospara PapaiNoel nãovencenamanhã seguinte, que o novo anoinaugure novos pensamentos nocomando da cultura brasileira.

Competência – ‘Coreografia para Ouvir’, do Quasar, deGoiânia: qualidade ameaçada pela falta de incentivo

MARIANGELA ALVES DE LIMAEspecial

Ascolunasdohaveredode-verdaartefechamquandobem entendem. Assim na

arte como na vida. Daqui a algumtempo – e um tempo impreciso –poderemos olhar a distância esteúltimo ano do século e reconhe-cerasementedealgumacoisano-vaou aúltima floraçãodeuma de-terminada idéia do teatro. Alémdisso,pensarumteatroemexpan-são incontrolável por esta gigan-tesca malha urbana é tarefa im-possível para um único observa-dor. Ainda assim, formulamos hi-póteses. Penso que quem quisercompreender a função dessa anti-quíssimaartenestefinaldeséculodeverásomaraoqueocorrenocir-cuito profissional milhares de ou-tros empreendimentos teatraisque ocorrem neste exato momen-to nas áreas mais pobres da cida-deealémdafronteiraurbana,esti-mulados pelas instituições liga-dasà IgrejaCatólica,pelasorgani-zações não governamentais de di-versos matizes ideológicos e poralguns projetos chapa branca co-mooComunidadeSolidária.Infor-mações que circulam por meio deinstituições ligadas à área socialpermitem concluir que nunca sefez tanto teatro em comunidadespobres. Há um nível de pobrezaque torna o cinema impossível, oacesso à culturaletrada um so-nho. Para quemtem nada ou pou-co,asimplicidadede meios do tea-troéoúnicocami-nho expressivo.Fazerteatronãoéuma escolha, masuma necessida-de. Só um esforçocultural proporcionalmente gran-dioso, talvez com a contribuiçãodas universidades (que por en-quanto têm se ocupado mais dateoria do que da pesquisa de cam-ponaáreadacultura),poderáava-liarafeiçãoestéticaeafunçãoínti-ma desse teatro.

Mas é uma das coisas novas ediferentes deste final de século,porque não se trata, desta vez, deideólogos “conscientizando o po-

vo”, mas, antes, de uma consciên-cia coletiva aspirando à represen-tação. Há aí muito pano para amanga do século vindouro.

Também o teatro profissionalcomeça a articular-se como umsetorsocial,oqueémuitodiferen-tedeumameraassociaçãocorpo-rativista. Em 1990 ouviu-se, par-tindo do posto mais alto do poderpúblico o sinistro mote: “Virem-se.” A renúncia fiscal resumiria o

vínculo entre oEstado e a produ-ção artística pro-fissional. Não erapreciso muitaimaginação paraadivinhar quaisseriam os proje-tos artísticos pri-vilegiados pelosdepartamentosde marketing: os

maisbobos, os que tivessem maislantejoulas, os que mais se asse-melhassem, em tradução tupini-quim, aos comerciais da Broa-dway.Sempresecundadosporce-nários espalhafatosos, progra-masescandalosamentecoloridose alojados em casas de espetácu-lo“confortáveis”.Acontra-ofensi-va começa a firmar-se como ummovimento denominado Arte

contra a Barbárie, um grupo de

reflexão e projetos para uma no-va política cultural capitaneadopelos grupos artísticos mais sóli-dos da cidade e expandindo-seagora para outros centros de pro-dução cultural. É um duro traba-lho conceitual porque o primeiropasso não é o da criaçãode meca-nismos de estímulo a um teatrorealmenteimportante,masarein-trodução do conceito de polis nacabeça dura de um Estado que seacredita um modesto gerente daárea comercial do País.

Sem subvenção, com um apoiofinanceiro suficiente apenas para

colocarobloconarua,osbonses-petáculos produzidos este anonão conseguiram ficar em cartaztemposuficientepara queo públi-co pudesse apreciá-los devida-mente. O Teatro Oficina, porexemplo, encenou um comoven-te Boca de Ouro, acolheu uma di-reção de Cibele Forjaz de Toda

NudezSeráCastigada e uma bre-ve temporada de Os Sete Gati-

nhos, dirigida por Vadim Nikitin.Enquanto isso o Tapa encenava A

Serpente, em um espetáculo nadamenos do que perfeito, e no Tea-tro de Arena o grupo dirigido por

Marco Antonio Braz dava conti-nuidade a um projeto a longo pra-zodetrabalhosobreaobradeNél-sonRodrigues.Enfim,vistapordi-ferentes ângulos, a obra do maisimportantedramaturgobrasileirovaleparanósomesmoquevalepa-ra os ingleses uma temporadashakespeariana em Stratford onAvon. São informações estéticasfundamentais para os brasileiros.As instituições de ensino talveznão saibam disso.

E há também, está claro, obraspontuais cujo sentido singularserve não a uma tendência, mas à

compreensão da natureza multi-facetada da linguagem cênica.Entre as muitas coisas boas doano estão aqui referidas trêsobras sinalizando a diversidade.O grupo Teatro da Vertigem re-pensou o texto sagrado em Apo-

calipse 1,11 como um pungentee agressivo manifesto artísticocontra as idealizações da realida-de e a panacéia salvacionista. A

Máquina, um espetáculo meiocarioca e meio pernambucano(de dupla nacionalidade porqueestamos tão afastados de outrosEstados que nos parecem paísesestrangeiros) foi uma surpreen-dente e atualíssima formalizaçãodas dicotomias rural-urbano e ar-caico-moderno, que inspiraramboapartedadramaturgiabrasilei-ra dos anos sessenta. Rei Lear,produção dirigida por Ron Da-niels e capitaneada por Raul Cor-tez,proporcionouaopúblicoaex-periência de uma obra clássicarealizada por meio da compreen-são do texto, sem precisar recor-reraosenfeitesquedisfarçam,pe-la originalidade, o medo reveren-te do encenador diante de Sha-kespeare. A vida cultural, não sóo teatro, precisa ser atravessadapelo rio corrente da história. Dolodo depositado na margem, bro-ta o que nunca se viu antes.

TEATRO

Reprodução

Artes cênicas articulam-se como um setor social

Regionalização pode ser salvação

FESTIVAIS

VÃO FORMAR

EIXO

DISTRIBUIDOR

J.F. Diório/AE

Lenise Pinheiro/Reprodução

MarceloDrummondem ‘Boca deOuro’: obrade NélsonRodrigues éfundamentalpara nóscomoShakespearepara osingleses

Peça‘Apocalipse’

foi encenadaem presídio:

projetosteatrais

saem doscenários

luxuosos edos espaços

‘confortáveis’É PRECISO

CONSIDERAR

AS ONGS

E A IGREJA

DANÇA

Produto: ESTADO - _C2_SP - 6 - 30/12/00 P`GINA PBD6-ED.BR/SP

Produto: ESTADO - _C2_SP - 6 - 30/12/00 P`GINA PBD6-ED.BR/SP

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D6 - O ESTADO DE S.PAULO CADERNO 2 SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

Essa perspectiva, com

seus acertos e erros,

deve ser repetida no

próximo ano

LEILA REISEspecial

Porcaminhostransversos,oano2000naTV,anunciada-mente morno por causa

dasefemérides–olimpíadaseelei-ções – ficou quente, nos últimosmeses. E não foi pela inovação,mas pela intervenção desastradade um juiz carioca que jogou a no-veladas8paraas9eproibiuaapa-rição de atores menores de idadeem Laços de Família, por causadas cenas com excesso de pimen-ta.

A confusão provocada pelasmedidas judiciais e sua repercus-são – notícias indignadas no Jor-

nal Nacional, protestos dos artis-tas e da entidade que representaas emissoras – deu uma chacoa-lhada na massa telespectadoraque, pela primeira vez, passou adiscutir a qualidade da programa-çãoqueentraemsuacasa,porquesentiuefeitosnovídeo:umanove-la sem crianças e a discussão doveto nos canais concorrentes,aliás,emvários. Afinal,em2000,ocolunismodeTVpassouaserape-ça de resistência dos programasfemininos.

A espectadora, tratada comorainha do lar por todos os canaisque investemno universodas mu-lheres, além de aprofundar-se nas

prendas domésticas pôde douto-rar-se na bisbilhotice da vida dosfamosos. As fofocas, antes restri-tas a publicações impressas, ga-nharam uma importância tãogrande que passaram a disputartempo com a preparação de tor-tasedocinhosnosprogramasves-pertinos.

Nesse quesito, a movimenta-ção cresceu devido a denúnciascontra pagodeiros resistentes emassumir a paternidade de crian-ças e a pagar pensão para as ex,que decidiram lavar a roupa sujaem público. De certa maneira, ospedidos de exame de DNA gera-dosnobate-bocanoturnodosdes-

camisados no Programa do Rati-

nho apresentaram-se como umaalternativaparale-vantar o Ibope datarde. E as revis-tas foram fundo:

NoteAnote(Re-cord), Mulheres

(Gazeta) , A Casa

é Sua (Rede TV!)tesouraramavidade Deus e o mun-do do showbiz.Leão Lobo, alémdepartnerdiáriodeMárciaGolds-midt,ganhou mais uma sessão se-manal na Gazeta – Arroz,Feijão e

Fofoca, aos sábados.

Com exceção da novela de Ma-noel Carlos (que avançou o sinal

do bom compor-tamento nas alco-vas e estreba-rias), poucas ou-sadias foram co-metidas pela TV.Entre as raras, es-tá o investimentoda TV Cultura emum jornalismomais dinâmico e,do ponto de vista

formal, menos engessado do queos telejornais exibidos pelas ou-tras redes – Diário Paulista, porexemplo.

O SBT apostou no humor maisfamíliadeGoreteMilagres–ÔCoi-

tado –, mas não conseguiu segu-raraondaquandoosíndicesdeau-diência não responderam à altu-ra.Oresultadofoi queo bomelen-co ganhou o olho da rua antes dofimdoano,deixandocomúnicaal-ternativaparaopúblicodoSBTaspiadashardcoredoAPraçaéNos-

sa.A Globo começou bem o ano

comapremiadaAMuralha,minis-série escrita por Maria AdelaideAmaraledirigidaporDeniseSara-ceni, que junto com A Invenção

do Brasil, de Guel Arraes e JorgeFurtado,comemorouos500Anos

do Descobrimento. Além deacharumlugaradequado(Fantás-

tico) para o talento cômico de De-niseFraga, estouroucomorealityshow No Limite. Com isso, aca-bou aprendendo uma lição: quan-dooespectadormédiosevêrepre-sentado de uma maneira heróica–comoforamossobreviventesdaPraiadosAnjos–elegostaepresti-gia. O sucesso de No Limite, cla-ro,acabouestimulandooutrosca-nais, como a Bandeirantes, comdesalinhavado Território Livre.Mas isso é comum na TV, em queas experiências bem sucedidasno Ibope são inevitavelmente clo-nadas na vizinhança.

Com exceção de talentos isola-dos–como ode AdrianeGalisteu,MarcosMioneJoãoGordo,queserevelaram bons apresentadores –este ano a TV não produziu qual-quer fenômeno capaz de abalar oreinado de ninguém.

Mesmoassim épossível ser oti-mista com relação ao futuro. Paranão errar, a Globo começa o anocomo os anteriores: pondo no artalvezasuaproduçãomaissofisti-cadadosúltimostempos.Aminis-série Os Maias, uma adaptaçãodeMariaAdelaideAmaraldoclás-sicodeEça deQueiroz. Comelen-co de 52 componentes, inúmeraslocações em Portugal, direção deLuiz Fernando Carvalho e atoresdoprimeiroescalão,OsMaiasen-tra no ar no dia 9 de janeiro, ani-mando um pouco o marasmo dereprisesquetomacontadaprogra-mação nos meses que antecedemo carnaval.

LITERATURA

Pico – A Globo acertou em cheio com ‘No Limite’, que fezcom que o espectador médio se visse representado na tela

Revelações – Adriane Galisteu, Marcos Mion e JoãoGordo mostraram talento na apresentação de programas

JOSÉ CASTELLO

Adiversificação, que muitasvezes se transformou embanalização, foi a grande

idéia fixa do mercado editorialbrasileiro no ano 2000, perspecti-va que, com suas qualidades e de-feitos,servedepistaparao quevi-rá no próximo milênio. Vendeu-se muito gato por lebre, é verda-de, e o leitor se viu afogado mui-tas vezes num circuito de lança-mentos desordenados que nemmesmo os mais atentos puderamdigerir.

Porisso,sedestacaram,empri-meiro lugar, as coleções, que têma vantagem de oferecer ao leitorumacertaordem.SejaaLiteratu-

ra e Morte, da Companhia das Le-tras, com os excelentes livros deMoacir Scliar sobre Kafka e deBernardo Carvalho sobre Sade;seja a coleção Metrópoles, que aRecord começou a lançar no fim

do ano, com estudos sobre PortoAlegreeoRio deJaneiro; sejaain-da, e sobretudo, o filão dos bestsellers em série, como os três vo-lumes de A Pedra da Luz, deChristianJacques,daBertrand.Is-so sem falar nos três volumes dasérieHarryPotterassinados pelainglesa J. K. Rowling, da Rocco,quevenderamemoitomeses, jun-tos, 500 mil exemplares no Brasil,e ao todo, perto de 67 milhões deexemplares em todo o mundo.Destacaram-se, também, as anto-logias,sendoamaiscelebradade-las, sem dúvida, a estupendaCem

Melhores Contos Brasileiros do

Século,organizadapelocríticoÍta-lo Moriconi para a Objetiva.

Naárea da ficção, o grande lan-çamento nacional foi, sem dúvi-da, o magnífico romance Dois Ir-

mãos, de Milton Hatoum, pelaCompanhia das Letras, editoraresponsável também pelo princi-pal título de ficção estrangeira, A

Caverna,deJoséSaramago.Tive-mosboasrevelações,comooapa-recimento dos gaúchos AltairMartins,autordeComoseMoesse

Ferro, da WS Editor, e Max Mall-mann,autordeSíndromedeQui-

mera, Rocco. Houve a afirmaçãonacional do paranaense WilsonBueno,comMeutioRosenoaCa-

valo, Editora 34, e do suíço, radi-cado em Londres, Alain de Bot-ton, com Nos Mínimos Detalhes,Rocco. E ainda o lançamento deFogo nas Entranhas, a novela dopremiado cineasta espanhol Pe-dro Almodóvar, com o selo da pe-quena Dantes. ACivilização Brasi-leira prosseguiuemseuesforçoderecuperação daobradeLúcioCar-doso, com O Des-

conhecido, e tam-bémfoi responsá-vel pelo grandelançamento doano no campo dapoesia, Ensaios Fotográficos, deManoel de Barros; sendo obriga-tóriocitarainda,nessaárea,aedi-ção de Toda a Poesia, de FerreiraGullar,pelaJoséOlympio.Inevitá-vel registrar também a reediçãoda obra de Frans Kafka, que vemsendo traduzida por Modesto Ca-rone para a Companhia das Le-tras, que nos brindou, esse ano,

com uma edição impecável de O

Castelo.No campo dos ensaios e da re-

flexão crítica literária, o destaqueficou para Inútil Poesia, de LeylaPerrone-Moisés, Companhia dasLetras. Um grande livro de entre-vista, Quatro Autores em Busca

doBrasil, de José Geraldo Couto,daRocco,reúneestupendasrefle-

xões sobre o paísna fala de Juran-dir Freire Costa,José Murilo deCarvalho, RenatoJanine Ribeiro eRoberto Damat-ta, quatro de nos-sos mais destaca-dos pensadores.Outro importan-te ensaio lançado

em2000foiFreud:Conflito eCul-

tura,coletâneadeestudosorgani-zada por Michael S. Roth, reunin-do ensaios, entre outros, de PeterGay, Harold Bloom e Oliver Sa-chs, acompanhado por uma gran-de exposição sobre o criador dapsicanálise em São Paulo que, em2001, chega ao Rio.

Entre as grandes biografias se

destacou a de Glenn Gould, Uma

VidaeVariações,assinadaporOt-to Friedrich, da Record. Uma ree-dição importante, com o selo damesmaeditora,foiadoensaioDe-

vassos no Paraíso, de João Silvé-rio Trevisan. O livro de referênciamais ambicioso talvez tenha sidooDicionárioMulheresdoBrasil,organizadoporShumaShumahereÉricoVitalBrazil, JorgeZahar.Éobrigatório citar ainda o novo li-vro de Fernando Moraes, Cora-

ções Sujos, Companhia das Le-tras, e o estudo de John Cor-mwell, O Papa de Hitler, sobre opolêmico pontificado de Pio XII,Imago. Mais ainda lembrar do no-volivrodePauloCoelho,ODemô-

nio e a Srta. Prym, Objetiva, con-siderado mesmo por seus desafe-tos como seu melhor romance eque já bateu a casa dos 250 milexemplares vendidos. Mas asgrandesvitoriosasnoano2000fo-ram, provavelmente, as editorasuniversitárias,à frente delasas daUSP e da Unesp, que se expandi-ram, sofisticaram seus produtose, assim, saltaram os muros daacademia, conquistando o gran-depúblicocomensaiosdegrande

qualidade.No 2001, teremos finalmente o

lançamentodoesperadoDicioná-

rio Houaiss, pela Objetiva, pro-gramado para agosto, com duasmil páginas e 220 mil verbetes,duas vezes as dimensões do con-sagrado Aurélio. A violência ínti-maseráotemadedoisensaiospo-lêmicoscomoSexoeNegócios,deShere Hite, e Assédio Moral, deMarie-France Hirigoyen, ambosprometidospelaBertrand.Vemaítambém o primeiro romance deRubens Figueiredo, BarcoaSeco,pela Companhia das Letras, quetambém lançará A Carta Histéri-

ca, de Arturo Perez Reverti. Naárea das biografias, a grande pro-messa é O Arquiteto do Impossí-

vel, relato da vida do presidenteJuscelino Kubitscheki, assinadapor Cláudio Bojunga para a Obje-tiva. A Jorge Zahar anuncia aindaO Circo Eletrônico, o esperado li-vro sobre a televisão brasileira deDaniel Filho. No que diz respeitoaos clássicos brasileiros, a Ar-tium promete para 2001 a Obra

ReunidadeLimaBarreto,organi-zada por Beatriz Resende e Ra-chel Valença.

Diversificar foi a idéia fixa do mercado editorial

Medidas para conter

‘abusos’ têm o mérito

de discutir a qualidade

da programação

Rita Morais/Divulgação

Surpresa – O cineasta Pedro Almodóvar lançou o livro ‘Fogo nas Entranhas’, editoraDante, num ano em que, na poesia, destacaram-se Manoel de Barros e Ferreira Gullar

Viagem – Fernando Moraes continuou ajudando a entender o Brasil com o livro‘Corações Sujos’, sobre os japoneses de São Paulo que não acreditavam no fim da Guerra

FOFOCAS

GANHARAM

LUGAR DE

DESTAQUE

NO ANO

QUE VEM SAI

O ‘DICIONÁRIO

HOUAISS’

Divulgação Divulgação

Dias melhores poderão vir para a TV em 2001TELEVISÃO

J.F. Diório/AE

Produto: ESTADO - _C2_SP - 7 - 30/12/00 P`GINA PBD7-ED.BR/SP

Produto: ESTADO - _C2_SP - 7 - 30/12/00 P`GINA PBD7-ED.BR/SP

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000 CADERNO 2 O ESTADO DE S.PAULO - D7

LAURO MACHADO COELHOEspecial

Anunciada desde o final de1999 e realizada quasesem falhas, a programa-

ção da Osesp foi o ponto alto navida musical da cidade em 2000.Além de obras de grande porte –a Missa Solemnis, de Beetho-ven, as Estações, de Haydn, oWar Requiem, de Britten – e dorelevo dado à música nacional,passada em revista na série Cria-doresdo Brasil, aOrquestraEsta-dual ofereceu concertos sempreestimulantes do ponto de vistado ineditismo do repertório e daqualidade dos intérpretes. Sinfo-

nias de Mahler e Shostakovitch,poemas sinfônicos e ciclos decançõesdeStrausseWagnerpro-varam que é no grande acervo damúsica instrumental dos séculos19 e 20 que está a vocação dosmúsicos que se apresentam naSala São Paulo. E o recém-anun-ciado programa para 2001 de-monstra que a Estadual não pre-tende deixar a peteca cair.

A Osesp destacou-se até mes-mo num ano de grandes atra-ções internacionais, em que a ci-dade viu a Filarmônica de Ber-lim,o QuartetoAlban Berg,os be-líssimosrecitais de lieder deMat-thias Görner, dose dupla de Ba-renboimao piano e regendo aOr-questra de Chicago, além debons concertos com as sinfôni-casdePraga eColônia.OAno Ba-ch foi comemorado condigna-mente, com boas interpretaçõesda Missa em Si Menor e da Pai-

xão Segundo São João, recitaiscomo os do cravista Ilton Wjus-nik e lançamentos de discos co-mo Um Cravo Bem Variado, deRegina Schlochauer, que incluiuexcelentes interpretações doConcerto Italia-

no e da Partita

BWV 831.Quanto à músi-

ca lírica, o pontomaisaltofoiaLu-

cia di Lammer-

moor, no Munici-pal, comJune An-derson e FrankLopardo; o quemais deixou a de-sejar foiOGuarani,doTeatroAl-fa, irregular do ponto de vista damontagem e do elenco. Monta-gens discutíveis, como a das Bo-

das de Fígaro, no Teatro São Pe-dro, ou a da Cavalleria/Pagliac-

ci, no Alfa, ofereceram compen-

sações: boas regências e, noselencos, interpretações gratifi-cantes:o Cherubino deDenise deFreitas; a Santuzza de Céline Im-bert; a Mamma Lucia de DeniseSartori; o Sílvio de Paulo Szott; o

PrólogodeSebas-tião Teixeira.

Entre as ópe-ras, também, al-gumas boas sur-presas:duasmon-tagens corretasde Valter Neiva:Pedro Malazar-

te, de CamargoGuarnieri, noSão Pedro, e O

Barbeiro de Sevilha trazido deSanto André. E principalmenteDomitila,óperade câmaradoca-rioca João Guilherme Ripper,cantada por Ruth Staerke e mon-tada por André Heller. Infeliz-mente, essa peça de música ex-

tremamente bem escrita não foivista por um público tão amploquanto merecia. Mas o prêmioque recebeu da APCA foi o reco-nhecimento de sua qualidade.

Importante foi também a es-tréia, em julho, do Concerto pa-

ra Computador e Orquestra, deRodolfo Coelho de Souza. Obrapioneira, pois se tem notícia depeças escritas para computadore conjunto de câmara, mas nãocom acompanhamento de gran-de orquestra, esse concerto foiexecutado pelo autor, com a Or-questra Experimental de Reper-tório, cujo regente, Jamil Maluf,sempre mantém seus músicosabertos a todo tipo de experi-mentação (uma delas foi, nestefinal de ano, ter tocado lado a la-docomWyntonMarsalis esua or-questra de jazz).

Enãonosesqueçamosdemen-cionar a festa que foi a transmis-

são ao vivo, pela Rádio Cultura,todatardedesábado,datempora-dadoMetropolitan OperaHouse,sempre com os comentários deconvidados. O resultado foi tãopositivo que a emissora já está re-petindo a dose: no dia 9, iniciou,com O Cavaleiro da Rosa, de Ri-chard Strauss, a empreitada detrazerparaseusouvintesosespe-táculosdoprincipal teatrodeópe-ra de Nova York. Quem ouviu, re-centemente, o magnífico Navio

Fantasma regido pelo russo Va-liery Guerguiev, teve uma idéiado que pode esperar em 2001.

Além disso, a presença de or-questras como as Filarmônicasde Israel e Nova York, de maes-tros como Riccardo Muti, a mon-tagemdeóperasdeGiuseppeVer-di no ano em que se lembram oscem anos de sua morte, dão indí-cios de que, em 2001, a qualidadedeve, pelo menos, manter-se.

OUSADIA

MARCOU O

TRABALHO DE

JAMIL MALUF

MPB

Exibição da‘Cavalleria/Pagliacci’,no TeatroAlfa (E),compensouosespetáculosirregularesdo ponto devista damontagem,como ‘OGuarani’

O maestroJohn

Neschlingrege a Osespàs vésperas

dainauguração

da Sala SãoPaulo,

construídana antigaestação detrens Júlio

Prestes

Projetos de resgate e

atuação de gravadoras

independentes fogem

dos vícios do mercado

Raridades – As primeiras gravações das músicas de Noel Rosa foram recuperadas pelo biólogo Omar Jubran, que trabalhou15 anos para recolher os discos de 78 rotações; as músicas de Caymmi, em sua voz, estão reunidas em caixa de sete CDs

Orquestra Estadual

deu relevo à música

nacional e mostrou

repertório inédito

MAURO DIAS

Os resgates, de obras e gê-neros, marcaram o anoque acaba. Algumas ini-

ciativas são espantosas: nummercadofonográficocomoonos-so, orientado exclusivamente pe-las leis de um mercado viciado,conduzido pelo poder econômi-co, quem poderia pensar na cria-ção de uma gravadora exclusiva-mente dedicada ao choro?

Pois aconteceu. Foi fundada,no Rio, berço do gênero, a AcariRecords, gerenciada pelo violo-nista Maurício Carrilho e pela ca-vaquinhista Luciana Rabello. Emseus poucos meses de existên-cia, a Acari editou preciosidades– como os solos de Luciana eMaurício (esse, com o CD que le-va seu nome, fez o melhor discoinstrumental da década), promo-vendo solos de estréia de vetera-nos tão geniais quanto desconhe-cidos, como Índio do Cavaqui-nho – e assim por diante.

Paraospróximosmeses,aAca-ri promete, entre raridades, umCD com canções inéditas de Ra-fael Rabello, com letras de PauloCésar Pinheiro, gravadas ao vivo,ao longo de vários anos, em mui-tos shows em que o violonistaacompanhava a irmã cantora,Amélia.

Firmou-senomercadoalterna-tivo – entenda-se, aquele que nãoleva em contra os parâmetros co-merciais imediatistas – como amaisimportantegravadoranacio-nal a CPC-Umes, de São Paulo,de compromisso assinado unica-mente com a qualidade e linha deação diversificada, atuando nosamba, no choro, no forró, na tra-dição popular de partes diversasdo País, na música instrumental,no resgate de memória.

Outros selos de igual valor vãoaumentando seu poder de fogo: aJam Music, com um olhar para opop articulado (vide de Bena Lo-bo) e outro no samba tradicionaldo Rio (caso do disco de Christi-naBuarque deHolandacantandoWilson Batista). A Lua Discos,

que funciona entre o Rio e SãoPaulo, prepara solos de Guilher-me de Brito e Casquinha, para fa-lar só em dois dos maiores com-positores da história do samba.

Da grande indústria, pouco sepode falar de bom. Os nomes no-vos que ela pôs na praça são clo-nes dos nomes que pôs na praçanos anos anteriores. E, natural-mente, os nomes que já estavamna praça nos anos anteriores clo-naram-se, eles mesmos, em dis-cos ditos novos. Novos?

Mas, ainda assim, a indústriaprestou bons serviços, enquadra-dos,estes,nocapítulodos“proje-tos especiais”. É o caso da caixa(comtrêsCDs)deJacódoBando-lim, lançadaagora,nofim doano,

pela BMG. Ou a edição, pela EMI,daobraquasecompletadeCaym-mi, na voz do autor.

Este é um caso mesmo espe-cial. O compositorDorival Caymmisempre foi seumaior intérprete.Para a EMI, gravou12 elepês, a partirde 1954, poucos de-les reeditados, ne-nhum hoje em catá-logo. Pois bem, os12 discos foramagrupados em seisCDs e reunidos na caixa Caym-

mi Amor e Mar, que traz aindaum sétimo disco, colecionandooutras músicas do compositor

em gravações de estréia (como O

QueÉQueaBaianaTem?,emre-gistro de 1939, na voz de de Car-mem Miranda, em dueto com o

autor).A Abril Mu-

sic, selo novomas poderoso,editouopacoteMúsicadoBra-

sil – quatro dis-cos,umlivro lu-xuoso, uma sé-rie de TV. É ummapeamentodasmúsicaspo-

pulares das diversas regiões doPaís, trabalho de vulto e impor-tância, sem dúvida, embora comequívocosconceituais(principal-

mentenaanáliseteóricadomate-rial coligido).

Bem melhor do que esse traba-lho é o que está sendo realizadopelo Instituto de RadiodifusãoEducativa da Bahia (Irdeb), sobo título de Bahia,Singular ePlu-

ral. Equipes viajaram por todosos municípios baianos, registran-doemáudioevídeoasmanifesta-ções locais da cultura popular.Os programas já foram mostra-das nas televisões educativas daBahia e de São Paulo. O plano daobra prevê a edição de seis CDs.Quatro já foram lançados.

Em Alagoas teve início outroprojeto importante – Das Lagoas

– de registro da cultura popular,bancado pela iniciativa privada,

sem apelo à lei de renúncia fiscal.Há outros inúmeros e valiososprojetos individuais, como o dovioleiroRobertoCorrêa,quevemrealizandoolevantamentodamú-sica do entorno do Distrito Fede-ral.

Esforçosolitário foiodobiólo-go Omar Jubran, que, ao longo de15anos, colecionou os discos(de78 rotações por minuto) com asprimeiras gravações das músicasde Noel Rosa. Com o auxílio fi-nanceiro de outros apaixonados,muniu-se de computador e fil-trou digitalmente as gravações,eliminandoos estalos ebarulhos,melhorando o som. A Funarte e agravadora Velas encarregaram-sedepôrnaslojasacaixaNoelPe-

la Primeira Vez, com os 229 pri-meiros registros da noeliana.

O Itaú Cultural e a gravadoraAtração resgataram o acervo fo-nográfico da Funarte, títulos ra-ríssimosdeumacoleçãoqueesta-va fadada a desaparecer; por ini-ciativa dos herdeiros de IrineuGarcia, estão chegando ao CD osdiscos da gravadora Festa, seloindependente dos anos 50, de pé-rolas como as primeiras grava-ções das canções camerísticasde Tom Jobim e Vinícius de Mo-rais, poesia de Drummond, Ban-deira e Cabral, entre outros, ditapelos autores...

O Itaú Cultural lançou seu pró-prio projeto de mapeamento dasmúsicas regionais, nomeandoequipes de curadores com atua-çãonasáreasespecíficasegaran-tindo a edição de discos, progra-mas de rádio, um site na Internete assim por diante.

EoSescSãoPaulo,cuja impor-tância para cultura nunca é de-mais exaltar, promove a transcri-ção para CD e livro dos progra-mas Ensaio, da TV Cultura – en-trevistas e musicais com os no-mes que fizeram e fazem a histó-ria da música brasileira.

Iniciativas assim parecemapontar para o momento em quepassaremosa termemória. Falta,noentanto,resolverquestõesgra-víssimas, como as da divulgaçãoedistribuiçãodessetipodetraba-lho. A Internet, as rádios comuni-tárias e outros canais que estãosurgindo parecemser asaída. Es-sa é uma questão para o próximoséculo.

Música brasileira chegou à idade da memória

MÚSICA CLÁSSICA

Osesp foi o melhor da temporada erudita

Reprodução Reprodução

Heloísa Bortz/DivulgaçãoMarcos Mendes/AE

BAHIA

RECOLHE

FALAS DE SEU

INTERIOR

Produto: ESTADO - _C2_SP - 8 - 30/12/00 PretoD8-ED.BR/SP

Produto: ESTADO - _C2_SP - 8 - 30/12/00 PretoD8-ED.BR/SP

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D8 - O ESTADO DE S.PAULO CADERNO 2 SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

Leiturashistóricas

erevalorizaçãoda

gravurabrasileira

deramotomdaagenda

MARIA HIRSZMAN

Este foi um ano que olhoupara trás, investigando opassadonatentativadees-

tabelecer um perfil, mesmo quemultifacetado, da arte no Brasil.As comemorações em torno dos500 anos de descobrimento doBrasil pautaram em grande medi-daasatividadesligadasàsartesvi-suais, consumindo boa parte dosrecursos e atraindo a atenção dasinstituições, produtores culturaise, porque não, de uma parcela sig-nificativa do público.

Indiscutivelmente, a polêmicaMostra do Redescobrimento,com suas cifras astronômicas(um custo de US$ 24,5 milhões eum público de 1,9milhão de pes-soas) ocupou ocentro das aten-ções. Essa novamaneira de admi-nistrar a culturateve seus efeitossobreaFundaçãoBienaldeSãoPau-lo, que sofreuuma de suas pio-res crises. Sob a sombra da Mos-tra dos 500 anos, a direção da fun-dação adiou a Bienal para 2002sem consultar o curador Ivo Mes-quita, abrindo uma longa criseque culminou com a demissão deMesquita e a renúncia do presi-dente do Conselho, Luiz Seraphi-co, e de vários conselheiros quediscordaram da forma como ascoisas foram encaminhadas pelopresidente da Fundação, CarlosBratke.

Deixando de lado as críticasquesepoderiafazeraomodelodomegaevento,queprivilegiaogran-dioso e o espetacular – em detri-mentodapequena,masimportan-te contribuição de artistas, cura-dores e fornecedores –, o evento

trouxe à baila uma série de ques-tões relevantes, que deverão in-fluir por algum tempo na maneirade se pensar o passado e o futurodas artes plásticas no País.

Para retirar as lições positivasdo megaevento, é necessário pa-rar de pensá-lo como um blocoúnico e coeso – o que só faz au-mentar a megalomania daquelesque confundem quantidade comqualidade – para destacar dois as-pectos importantes desse proje-to: a relevância indiscutível da ar-te marginalizada dos negros, ín-dios e loucos e a reafirmação deuma visão histórica mais ampla,que recoloca a importância do sé-culo 19 na definição da identida-de nacional.

Com efoques absolutamenteparticulares, as exposições queconstituíram o corpo da Mostra

do Redescobrimento merecemser vistas de maneira individuali-zada. Se algumas exposições ga-

nham ainda maisrelevosobesteen-foque (é o caso,por exemplo, domódulo indígena,do núcleo de artepopular e da mos-traImagensdoIn-

consciente), ou-tras perdem bri-lho. Coincidente-mente, os nú-

cleos dedicados à arte barroca(que se destacou na mídia e juntoao grande público em decorrên-cia de uma sedutora cenografia,que ofuscou o que poderia haverde relevante na leitura curatorialproposta) ou às produções mo-derna e contemporânea sairamperdendo.

Comaexcessãodealgumasini-ciativasvoltadasparaofuturo,co-mo o bem-sucedido projeto Ru-mos Visuais, do Itaú Cultural, quedivulgou o que vem sendo produ-zido de novo e de relevante nosquatro cantos do País, ou da Tem-porada de Projetos do Paço dasArtes, pode-se dizer que os princi-pais destaques da agenda foramretrospectivos. Ao longo do ano

foram apresentados resumos daobra de artistas de grande impor-tância, quer histórica quer con-temporânea. Entre os que foramagraciadoscombelasretrospecti-vas estão Ismael Nery, Di Caval-canti (arte sobre papel), Guig-nard, José Pancetti (que chega aSão Paulo no próximo ano, pro-metendoser umdosdestaques de2001), Abraham Palatnik, CildoMeireles e até Arthur Barrio.

Outro viés importante da pro-gramaçãodesse últimoano do sé-culo foi a importância indiscutí-vel dada à gravura. Nos últimosmeses do ano, grandes institui-ções culturais de São Paulo se de-bruçaram sobre o tema, trazendoà tona a qualidade surpreendenteda produção gráfica nacional, deontem e hoje: o Museu de ArteContemporânea realizou a mos-tra O Papel da Arte, o Itaú Cultu-ral exibe Investigações:A Gravu-

ra Brasileira e o Museu de ArteModerna expôs uma seleção im-pressionante de obras dos trêsgrandesmestres dagravurabrasi-leira, Goeldi, Lívio Abramo, e La-sar Segall.

Esta última tinha relação comumdosmelhoreseventos interna-cionais do ano no campo das ar-

tes plásticas, a exposição deobrasexpressionistascedidaspe-lomuseudeWuppertal,naAlema-nha. Após um longo período emque as atrações internacionais seconstituiamnograndechamativoda programação, o circuito pare-ce estar dando cada vez mais va-lor à produção nacional, o quetambém se faz sentir tanto no im-pressionante aumento no núme-rodetítulosdedicadosaestudaredivulgaraartebrasileira(comdes-taqueparaotrabalhoquevemsen-do desenvolvido pela editora Co-sac&Naifiy),quantopelacrescen-te participação de artistas con-temporâneos brasileiros no bada-ladocircuitointer-nacional. Artistasainda jovens, co-mo Sandra Cinto,ErnestoNeto,Ro-chelleCostie Irando Espírito Santovêm conquistadoespaço nos Esta-dosUnidose,prin-cipalmente, naEuropa.

No segmento histórico as coi-sastambémestãomelhorandopa-ra os brasileiros. A venda de umquadro de Di Cavalcanti pelo va-

lor recorde de US$ 800 mil em lei-lão realizado no final de novem-bro na Christie’s– preço que sur-preendeu muitos especialistas já

que se trata deuma obra menordo pintor moder-nista – é apenasumsinaldequesemantémoproces-so de valorizaçãocrescente dosgrandes nomesdaartebrasileira.

Ainda é cedopara que se tenha

uma visão clara de como será aagenda do próximo ano. Além daBienaldeVeneza,nocenáriointer-nacional, há poucos eventos já

confirmados para 2001, como acontinuação da itinerância da re-trospectiva de Pancetti, da mos-tra organizada para comemoraros 50 anos da Bienal de São Pauloprevista para maio e de algumasexposições internacionais já pro-gramadas (como as exposiçõesde arte egípcia e da mostra Ouro

da Colômbia, programadas peloMasp), não está prevista a realiza-ção de nenhum grande evento. Oque talvez seja uma grande vanta-gemeumsinaldeamadurecimen-to. Sem uma força centrífuga quetrague interesses dos mais distin-tos planos, talvez haja uma me-lhor distribuição dos recursosqueprivilegieumaamplagamadeinstituições e eventos.

Excluídos – Retrato de baiana, um dos destaques da Bienaldos 500 anos que mostrou a arte dos negros, índios e loucos

Eminem, Kid Rock,

Napster, Britney,

Marky, Sonic Youth e

Madonna no altar

VISUAIS

POP

Mestre – Obra de Goeldi, um dos papas da gravura nacionalexibida no MAM, que mostrou o expressionismo alemão

JOTABÊ MEDEIROS

Numa medição estrita-mente estatística, lógi-ca, matemática, o ano

2000 não deixa grande saldo pa-ra o mundo pop. O esgotamen-to de fórmulas e as repetiçõesmarcaram a temporada. Da sé-rie “por que o ano 2000 não vaideixar saudade”, segue uma pe-quena lista de argumentos:

★1.NoBrasil,o pop rockfoimar-

cado pela volta dos que não fo-ram:CapitalInicial,KikoZambian-chi, Ira! eoutros fantasmas;

2. No mundo, viveu-se a explo-são das teen-bands e dos rappersfarsescos, como Five, ‘N Sync,Christina Aguilera, Westqualquercoisa, Eminem e Kid Rock; deles,acantoraBritneySpears,entrevir-ginaleapimentada,parecesobres-sair-secom mais destaque;

3. Em junho, um dos maioresfestivais de rock da Europa termi-na em tragédia, o Roskilde Festi-val,naDinamarca,comnovemor-tes (relatório concluído na sema-na passada mostra que uma dascausas foi a parca qualidade dosom,quecausouosprimeirospro-testos e o conseqüente tumulto);

4.Em julho,o maior revés jáso-frido pela onipotente indústria fo-nográfica (o sistema Napster derastreioetrocademúsicaspelaIn-ternet) é tirado da rede por deci-são judicial.

5. O estádio de Wembley, cená-rio de partidas memoráveis de fu-tebol e de shows históricos, viveseu derradeiro jogo em outubro esai de cena para sempre; oportu-nistas como sempre, os irmãosGallagher, do Oasis, registram láuma das últimas boas apresenta-ções de rock no álbum Familiar

toMillions, recém-lançado;6. Os Beatles ainda não con-

tam tudo. Sai a megabiografia

BeatlesAnthology, escritapresu-mivelmente para contar “a histó-ria dos quatro fantásticos emsuas próprias palavras”, e quenão conta nada além do já sabi-do; no fim do ano, porém, no re-lançamento de seu disco All

ThingsMustPass, George Harri-son vai um pouco adiante e quei-xa-se de ter sido pouco valoriza-do no auge do quarteto.

7. No final de outubro, o Naps-ter trai seu princípio libertário ealia-se à empresa alemã Bertesl-mann, gestora da gravadora BMGque, em seguida, associa-se comoutra gigante, EMI. O que era degraça passaráa ser cobrado.

8. Morre nos Estados Unidos oveterano desenhista de quadri-

nhos Carl Barks, de 99 anos, quedeu vida aos personagens PatoDonalde Tio Patinhas, deDisney.

9. E o ano culmina com o anti-climático casa-mentode Madon-na e Guy Ritchie:nãoqueremos vo-cês por perto,mas também nãoos queremos lon-ge, dizem os as-tros-pombinhosà “asquerosa” mí-dia que os perse-gue. A ex-mate-rial girl agora é uma zelosa mãede família.

Agora, numa mediçãonem um

pouco criteriosa, baseada emprincípios meramente subjeti-vos, conheça outra pequena sé-rie de motivos que fizeram o últi-

mo ano do sécu-lo valer a pena:

1. No Brasil, afebre revisitado-ra trouxe de voltaà pauta do dia amaravilhosa ban-da dos anos 80Fellini,que,redes-coberta, tocou noAbril Pro-Rock eteve seu disco

AmorLouco relançado;2. O mundo teen acordou de

suahistóricaletargiaeignorouso-lenemente o novo disco das insu-

portáveisSpiceGirls;noBrasil,ospagodeiros de laboratório atin-gem a saturação e vêem suas ven-das de discos caírem vertiginosa-mente;

3. O Instituto Moreira Salles re-lança, em abril, o livro Paranóia,de Roberto Piva, editado original-mente em 1963 e um elo entre apoesia brasileira e a beat genera-tion, um livro que recupera a pri-meira ambição de descrever a“paisagem de morfina” de SãoPaulo e que conecta a linguagemda metrópole com o som do jazzdeColtrane e Miles Davis;

4. O Free Jazz Festival enfimtrouxe ao Brasil o patrimônio dorock alternativo, a banda nova-iorquina Sonic Youth, que fez

shows memoráveis no Rio e emSãoPaulo;

5. O guitarrista Carlos Santanaganha nove prêmios GrammycomobomálbumSupernaturale– 30 anos depois de sua célebreapresentação em Woodstock –torna-seo primeiroartista latinoaalcançar destaque ímpar dentrodo fechado mercado da músicanorte-americana;

6. O filme X-Men, baseado nomaisvendidogibidoplaneta,mos-tra como se pode fazer com talen-to e imaginação uma boa adapta-çãodoscomics,algoquehámuitonãose conseguia;

7. As peças A Vida É Cheia de

Som e Fúria, de Felipe Hirsh (ba-seada no livro Alta Ansiedade, deNick Hornby) e A Vida não Vale

um Chevrolet, de Mário Bortolot-to,saldamumavelhadívidadotea-troparacomaculturapopeossig-nos da contemporaneidade;

8. O paulistano Marco Antonioda Silva, o Marky Mark, de 27anos,quecomeçouanimandofes-tas nas danceterias Sound Fac-tory e Toco, na zona leste, torna-se o mais badalado DJ brasileironacenadosclubes europeus,e to-ca até na República Checa;

9. São lançadas três caixas dediscos que valem um inventáriodo rock no século inteiro. A pri-meira é Box of Pearls – The Janis

Joplin Collection, que reúne to-dos os CDs da cantora texana Ja-nis Joplin, mas o CD-bônus RarePearls.AsegundaéTheJimiHen-

drix Experience, contendo qua-tro CDs de Jimi Hendrix(1942-1970),omaiordosguitarris-tas, morto há 30 anos. E a terceirafoi Bowie at the Beeb, lançada naInglaterra pela Virgin Records equereúne gravaçõesdo camaleãoBowie realizadas entre maio de1968 e maiode 1972.

10.OcartunistapaulistanoLou-renço Mutarelli lança o álbum O

Rei do Ponto, segunda parte desua trilogia sobre o detetive Dio-medes, e põe os quadrinhos brasi-leirosnum nível jamaisalcançadoemrelaçãoàproduçãointernacio-nal.

Motivos pelos quais o ano valeu e não valeu a pena

Uma arte em busca de suas raízes

Divulgação

SÉCULO19

ESTÁ

SENDO

REDESCOBERTO

Reprodução

Divulgação

Entrevirginal eapimentada,a cantoraBritneySpearsdestacou-senaenxurradade atraçõesteen datemporada

PAGODE

SATURA E VÊ

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EM 2001,

A BIENAL

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000 CADERNO 2 O ESTADO DE S.PAULO - D9

Houvebons filmes dos

EUA, mas o melhor do

cinema mundial veio de

outras partes do mundo

Foram lançados 23

longas e a participação

na bilheteria cresceu em

relação ao ano passado

LUIZ CARLOS MERTEN

Há vida inteligente em Hol-lywood, mas não adiantaprocurá-la em Beleza

Americana. O grande vencedordo Oscar 2000 apenas banaliza osuperior Felicidade, de Todd So-londz, realmente tão bom que foiesquecido pelaacademia no anoanterior. Os me-lhoresfilmesame-ricanosdoanofo-ram Magnólia,de Paul ThomasAnderson, O In-

formante, de Mi-chael Mann, e O

Mundo de Andy,de Milos Forman.A esse trio pode-se acrescentartambém Gladiador, o épico so-bre a queda do império romanode Ridley Scott que estabeleceuRussell Crowe, já admirável nopapel do informante, como omaior ator do ano.

Hollywood pode dominar mas-sivamente o mercado brasileiro(e mundial), mas alguns dos me-lhoresfilmesdoano, talvezosme-lhores,vieramdecinematografiasperiféricas e até alternativas emrelação ao mainstream. O Irã, Tai-wan,oesfaceladoimpériosoviéti-

co, o Brasil, que este ano apresen-touumasafracomosmelhoresfil-mesdesdearetomadaeissoépou-codiante do que ainda estápor virem 2001 – é só esperar por Bicho

de Sete Cabeças, de Laís Bodan-zky. O que seria do cinéfilo brasi-leiro–edopaulistano,emparticu-lar – se não houvesse o EspaçoUnibancode Cinema,a Mostra In-ternacionaldeSãoPauloeadistri-buidora Mais Filmes? Estaríamosentregues às majors.

Hollywood gosta de fazer fil-mes para os olhos, cheios de efei-

tos e explosões.Em geral, não sãofeitos para umolhar mais demo-rado,capazde de-tectar densidadese sutilezas. Muitagente se queixade que o cinemairaniano é chato.Não é verdade,Abbas Kiarosta-

mi, o magnífico, mostra quase na-da em O Vento nos Levará, um fil-me que paradoxalmente conse-gue dizer tudo sobre a condiçãohumana. Tsai Ming-liang, o Ro-bert Bresson da Ásia, prosseguiu,em O Buraco, com seu discursoque estabelece a incomunicabili-dade como a única forma de co-munhão entre os homens. E o quedizer de Luna Papa, do cineastado Tadjiquistão Bakhtiar Khudoj-nazarov, senão que é um filme ra-ro, possuidor de extraordináriaimaginaçãovisual.

Russell Crowe foi o melhorator do ano e ela – quem foi a me-lhor atriz? Poderia ser a francesaNathalie Baye, nunca menos doque comovente na sua sincerida-de em Uma Relação Pornográfi-

ca, de Frédéric Fonteyne. Mas po-deria ser também Björk em Dan-

çandonoEscuro.Omusicaldodi-namarquês LarsVon Trier vem ra-chandooscríticoseopúblicodes-de que recebeu a Palma de Ouro,em Cannes, em maio passado. Éum filme divisor de águas.

Hoje, o grande debate refere-seàs novas tecnologias que estãomudando a face do cinema. Dan-

çando no Escuro já entrou para ahistória pelo marketing – as cemcâmerasdevídeousadaspelodire-tornascenasdedança.Omusical,gênero ilusionista por excelência,é tratado de forma antiilusionista.Umblefe–namedidaemqueatec-nologia do futuro é usada para ce-lebrar o que não deixa de ser umaondaretrô,ummelodramabastan-te tradicional. Björk é maravilho-sa, Catherine Deneuve, num pe-queno papel, talvez seja melhorainda, mas Von Trier precisavaapelar tanto em cenas como a docrime?Ouadaexecução?Odeba-teagitouoanode2000.Devepros-seguir no próximo ano, que é tam-bém o próximo século e o próxi-momilênio.Ocinemaestámudan-do. Para onde vai o cinema? Nãoimporta.Oimportanteéqueconti-nue sendo essa janela mágica quenos permite entender os outros eanós mesmos.

O astro TomCruise em‘Magnólia’,queconfirmou ainportânciado diretorAndersonapós o forte‘BoogieNights –Prazer semLimites’sobrepornografia

Cena doiraniano

‘O Vento nosLevará’, de

AbbasKiarostami,

um filme quemostra quase

nada, masconsegue

dizer tudosobre a

condiçãohumana

CINEMA

Filmes nacionais voltam ao sucesso de público

LUIZZANINORICCHIO

Tudo somado, não foi umanoruimparaocinemabra-sileiro.Emtermosquantita-

tivos: com 23 longas-metragenslançados no mercado interno, te-ve 42% a mais de público do quee m 1 9 9 9 –5.806.144 ingres-sos vendidos con-tra 4.088.870 doano anterior (ci-fras da publica-ção Filme B, dePaulo Sérgio Al-meida). Claro,boa parte dessesnúmeros se de-vem a filmes co-moXuxaPopstarou AnjoTrapa-

lhão.Masmesmoocinemadequa-lidade emplacou boas bilheterias,como foram os casos de Auto da

Compadecida, de Guel Arraes, eEu Tu Eles, de Andrucha Wa-ddington. Comparado com o qua-dro geral, no entanto, o panoramaé preocupante: com todo essecrescimento, os filmes brasileirosnãochegarama6%domercadoin-terno, uma fatia ainda muito pe-quena.

Não há fórmulas em cinema e

cada caso é um caso. Mas filmescomoAutodaCompadecidaeEu

TuElespodemsugeriralgumasre-flexões. Entre elas, a de que nemsempre sucesso de bilheteria estáassociado a baixo nível. Certo,são exceções à regra, mas indi-cam caminhos para que o cinemabrasileiropossaatingiroseupúbli-co, como já o fez no passado e fazagora,àsvezes.Seguemafórmulado tom farsesco, indicam modosespertos e irônicos de contornarproblemas.Estãopróximosdaqui-

lo que acontecena vida real dosbrasileiros, comsua tendência aacomodações deconflitos–o“jeiti-nho”, em suma,tão nacional e po-pular quanto o ca-fé, o carnaval e oprogramadoRati-nho.

Nem só de espírito cordial, pa-rausarasurradaexpressãodeSér-gio Buarque de Hollanda, viveu ocinema nacional no ano 2000. Pe-lo contrário. Alguns dos seus me-lhores filmes vieram do trabalhocom o contraditório, com a fric-ção, com aquilo que há de incon-sistente e trágico na sociedadebrasileira. São os casos de filmescomoAmélia,Estorvo,QuaseNa-

da, Rap do Pequeno Príncipe,

AtravésdaJanelaeCronicamen-

te Inviável.

Foram filmes que fizeram seuscaminhos, de uma maneira ou deoutra.Amélia trouxedevoltaAnaCarolina, diretora havia muito au-sente das telas, com um trabalhoinspirado sobre o choque culturalesuafunçãonagênesedasocieda-de brasileira. Estorvo, de RuyGuerra,outroveteranoquenãofil-mava há vários anos, foi, para al-guns críticos (entre eles, este queescreve)ofilmedemaior impactodo ano. Adaptando o romance deChico Buarque, Ruy inova e radi-caliza nessa radiografia impiedo-sa do Brasil dos anos 90. Filmacom a liberdade e sentido de in-venção de um jovem de 20 anos,somados à experiência de quemjádirigiuclássicoscomoOsFuzis

eOsCafajestes.

Igualmente impiedoso, talvezmais, ainda que não tão inventivoem termos formais quanto Estor-

vo, é Cronicamente Inviável, deSérgio Bianchi. Talvez tenha sidoo filme brasileiro mais polêmicodo ano, pelo menos em alguns cír-culos.Houvequemoachassecíni-co por não apontar saídas para oimpasse nacional – como se estafosse uma obrigação de artistas.Na história contada, ninguémpresta, e poucas vezes se traçouum retrato tão cru da sociedadebrasileira. Da elite aos sem-terra,passando pela classe média, to-dostêmsuaculpanocartório.Tra-balho de moralista, no bom senti-do,queexacerbadefeitoseexage-

ra na caricatura para expressarsua indignaçãodiante deumarea-lidade social pouquíssimo edifi-cante.

Rapdo Pequeno Príncipe Con-

tra as Almas Sebosas, de PauloCaldas e Marcelo Luna, tambémapontaparaoladoescurodaorga-nização social brasileira. No caso,aviolênciadaperiferia(doRecife,mas extensiva a qualquer perife-ria) contada em dois casos exem-plares, e complementares, um ra-ppereummatadorquenascemdeum mesmo local e uma mesmacondiçãosocial.

Boa surpresa foi Quase Nada,

produção pequena, artesanal, deSérgio Rezende, que vinha de tra-balhos muito mais caros e volta-dosparaomercadocomoGuerra

deCanudoseMauá,oImperador

e o Rei. Desta vez, em iniciativaquase doméstica, Rezende inves-tenotexto,nosatoresenumapro-posta original: o mal-estar, em ge-ral associado à cidade, agora é lo-calizadono campo.

Para o ano que vem, já há pelomenos uma bela estréia garanti-da, para março ou abril: Bicho de

Sete Cabeças, de Laís Bodanzky,vencedora do Festival de Brasília.Umfilmeraçudo,deimpactoede-núncia do repressivo sistema psi-quiátrico ainda em vigência noPaís. Levantou a galera durante ofestival. Tomara repita a dose emsua estréia comercial. Merece to-daa atenção.

Fotos: Divulgação

BOAS

SURPRESAS

VIERAM DO IRÃ

E DE TAIWAN

Periféricos e alternativosna contramão de Hollywood

Fotos Divulgação

MAS A

BILHETERIA NÃO

CHEGA A 6%

DO MERCADO

Promessa – ‘Bicho de Sete Cabeças’, de Laís Bodanzky,ganhou o festival de Brasília e deve fazer sucesso em 2001

Soco no estômago – O filme mais forte do ano, uma adaptação de Ruy Guerra sobre oromance de Chico Buarque, ‘Estorvo’ expõe uma visão radical da sociedade brasileira

Ponto alto – Apostando no tom farsesco e no jeitinho brasileiro de contornar problemas,‘Eu Tu Eles’ mostrou que uma produção não precisa ser ruim para fazer sucesso

Produto: ESTADO - _BRASIL - 30 - 30/12/00 PretoE4

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

E4

J.F.Diorio/AE - 27/9/2000Reuters - 11/6/2000

Garimpeirade ouro

Simplesmenteo melhor

ROSA COSTA

BRASÍLIA – A primeira ins-piração para o deputado AldoRebelo (PCdoB-SP) propor acriação da CPI da Nike veio deum menino que aguardava a se-leção brasileira no aeroporto doRio, após a Copa de 1998. Eleviu a cena pela televisão e nãogostou quando seguranças daConfederação Brasileira de Fu-tebol (CBF) tomaram das mãosdesse torcedor e rasgaram o car-taz em que a bandeira brasilei-ra aparecia com a inscrição “Ni-ke” em vez de “Ordem e Pro-gresso”, numa alusão à possívelintromissão da empresa na es-calação da seleção. Rebelo dis-se que começou aí o trabalho deconvencer seus colegas a investi-garem o que estaria por trás des-se patrocínio.

Inicialmente, a tarefa pareciafácil e já em fevereiro de 1999ele contava com 200 assinatu-ras – 29 além das necessárias –para propor a criação da comis-são. “Foi aí que começaram aspressões”, recorda. Segundoele, quando o requerimento che-gou à Mesa da Câmara, 35 de-putados retiraram a assinatura.

Aldo Rebelo disse que reco-meçou a tarefa de convencerseus colegas a apoiarem suaidéia. Conseguiu o apoio de 207deputados. O que ele não sabiaera a reação que haveria contraa investigação. “Ministros, diri-gentes de estatais, dirigentes declubes, todos resolveram atuarpara impedir a CPI”, contou.

Além do desarquivamentode CPIs já esquecidas, para obs-truir o espaço das investigaçõesparlamentares, houve ainda adecisão da Comissão de Consti-tuição e Justiça da Câmara dejulgar a iniciativa inconstitucio-nal. De acordo com o deputa-do, o presidente da CBF, Ricar-do Teixeira, se instalou em Bra-sília para comandar a obstru-ção. “Até o então técnico da se-leção Wanderley Luxemburgoagiu para impedir a CPI.”

CPI do Senado – Entretanto,uma nova estratégia para inves-tigar irregularidades no futebolestava sendo desenvolvida noSenado. A inspiração do sena-dor Álvaro Dias (PSDB-PR) foio catastrófico desempenho doBrasil na Olímpiada de Sydneye a sugestão de repórteres espor-tivos. Dias disse que começou acoletar as assinaturas de seuscolegas “em surdina, sem alar-de”. Somente depois de ter oapoio de 39 deles para a criaçãoda CPI é que resolveu comuni-car sua decisão.

O desempenho do presidentedo Senado, Antonio Carlos Ma-galhães (PFL-BA), de defendera iniciativa, terminou por calaros líderes contrários à proposta.

Foi aí que o deputado EuricoMiranda (PPB-RJ) e outros de-putados dirigentes de clubes,que eram contra a investigaçãona Câmara, resolveram agir,passando a defender que basta-va a CPI da qual eles mesmoparticipariam e não a do Sena-do. Como se viu, não forambem-sucedidos.

Eliminatórias para a Copado Mundo, Copa América,Mundial Sub-20, Mundial deClubes da Fifa, Taça Liberta-dores da América. Competi-ções não faltarão para que ofutebol brasileiro recupere pe-lo menos parte de seu prestí-gio em 2001, tanto pelos clu-bes como pela seleção brasilei-ra. As maiores expectativastêm endereço: a seleção deEmerson Leão e o CongressoNacional, palco de duas CPIsque investigam o futebol.

ROBERTO BASCCHERA

Oano 2000 vai ficar mar-cado com destaque nahistória do esporte bra-

sileiro. Para o bem e para omal. O país do futebol bri-lhou em diversas modalida-des, menos no futebol. O me-lhor tenista do mundo na tem-porada foi um brasileiro, Gus-tavo Kuerten. Carismático, ocampeão de Roland Garros edo Masters de Lisboa ganhouainda mais fama, dinheiro eprestígio. Gil de Ferran revi-veu os bons tempos de Émer-son Fittipaldi nas pistas dosEstados Unidos e levou o títu-lo da Fórmula Indy. RubensBarrichello, enfim, venceusua primeira corrida na Fór-mula 1 e, no melhor estilo, aovolante de uma Ferrari. O me-lhor cavaleiro do mundo ematividade, Rodrigo Pessoa,para quem não acredita, tam-bém é brasileiro. Mesmo semter conquistado uma meda-lha individual em Sydney, bri-lhou nas competições euro-péias e termina o ano comoprimeiro do ranking.

O futebol? Bem, o futebolvirou caso de polícia. Assun-to para deputados e senado-res, em duas Comissões Par-lamentares de Inquérito(CPIs) instaladas no Con-gresso Nacional – uma na Câ-mara e outra no Senado –,que investigam desde o con-trato da CBF com a Nike atéa indústria de passaportesfalsos para facilitar transfe-rência de jogadores. A sele-ção olímpica, uma das favori-tas à medalha de ouro emSydney, naufragou diantedos alegres e vibrantes cama-roneses. A seleção femininafoi contaminada pelo climade vaidades e desentendi-mentos entre comissão técni-ca e dirigentes. Perdeu obronze para a Alemanha.

O problemático joelho di-reito de Ronaldo, o Fenôme-no, ainda é tema de debate epreocupação. Nem no futebolde salão os brasileiros conse-guiram honrar a tradição. Aesperança do hexacampeona-to na Guatemala desfez-se naderrota por 4 a 3 para a Espa-nha, na final do Mundial.

Abatida pelos escândalos,desmandos e desorganização,a seleção brasileira ganhoutécnico novo, Emerson Leão.Seu antecessor, WanderleyLuxemburgo, festejado em1999 como o melhor treina-dor do País, termina 2000 ten-tando livrar-se do emaranha-do de fatos e suspeitas quepairam sobre sua reputação.

O Campeonato Brasileiroaté o nome original perdeu.Virou Copa João Havelange,o torneio do bom, do barato ede algumas surpresas, comoo Palmeiras “operário” dotécnico Marco Aurélio Morei-ra e o “Azulão” São Caetano.Os dirigentes preocuparam-se em marcar o modesto Ga-ma, de Brasília, e quem esca-pou para marcar um gol deplaca foi o São Caetano, do-no de um futebol empolgan-te, alegre e ofensivo.

Na olimpíada mais organi-zada de todos os tempos, oBrasil contou com 205 atletase conquistou 12 medalhas, ne-nhuma delas de ouro. Rodri-go Pessoa, Guga, RobertScheidt, Torben Grael e as du-plas do vôlei de praia ficarampelo caminho. A seleção de fu-tebol, eliminada nas quartas-de-final, deu vexame. Sobres-saiu, porém, o valor e a forçade vontade dos anônimos atle-tas paraolímpicos do País.

O ano em que o veteranoRomário brilhou foi pródigo

em datas festivas para o es-porte brasileiro. O Estádio doMaracanã fez 50 anos, Émer-son Fittipaldi festejou três dé-cadas de sua primeira vitóriana Fórmula 1, o tricampeona-to mundial de futebol no Mé-xico também completou 30anos e o Rei Pelé, o heróimaior do tri, chegou aos 60.Um de seus grandes desafe-

tos, Diego Armando Marado-na, virou quarentão, mais po-lêmico do que nunca. Esses20 anos de diferença na idadeentre os dois gênios da bolapesaram a favor do argentinonuma desastrada votação pro-movida pela Fifa na Internetpara eleger o maior futebolis-ta do século. Mais entrosadocom os internautas, Marado-

na levou o prêmio. A Fifa, noentanto, rendeu-se à majesta-de de Pelé e entregou-lhe o de-vido troféu.

No País do futebol, poucosse arriscam a prever o que vaiacontecer em 2001 na modali-dade esportiva preferida dosbrasileiros. O campeonato na-cional ainda é uma incógnita.A nova Lei do Passe, que dá

aos atletas o direito de trans-ferência para o clube que es-colherem, poderá entrar emvigor em março. Os clubes detimes baratos, e nem semprebons, deverão prevalecer so-bre as equipes de estrelas e sa-lários milionários. As dúvi-das são muitas. Talvez, a úni-ca certeza: Pelé continuarásendo majestade.

Marion Jonesganhou trêsmedalhas de

ouro noatletismo em

Sydney. E duasde prata. Pág. 2

O Brasil brilhou emvários esportes, mas, no

futebol, só fracassose escândalos

2001

Brilho da estrela – Romário teve, aos 34 anos, uma dasmelhores temporadas na carreira e fez o que mais sabe: gols

Outro ano de agonia – Ronaldo sofreu novamente gravecontusão no joelho e agora luta para voltar aos gramados

A paixão nacional fica de cabeça para baixo

Bicampeão emRoland Garros,campeão doMasters,número 1 domundo. ÉGuga. Pág 3

Reuters-30/7/2000

Beto Issa/AE - 28/10/2000 Joedson Alves/AE - 6/12/2000

Fim de uma longa espera – após muita luta, iniciada em 1993,Rubens Barrichello consegue, no GP da Alemanha, aprimeira vitória na F-1, também o primeiro triunfo de um brasileiro na categoria depois de Ayrton Senna

Talento e sorte – Gil de Ferran aproveitou a chance emum time de ponta, a Penske, e conquistou o título da F-Indy

Luz no fim do túnel – Aldo Rebelo e Álvaro Dias: presidentesde CPIs que se propõem a passar o futebol brasileiro a limpo

Tasso Marcelo/AE - 20/12/2000

CPIs tentam pôrum pouco deordem na casa

O ESTADO DE S. PAULO

FUTEBOL

Sebastião Moreira/AE - 14/10/2000

Produto: ESTADO - _BRASIL - 31 - 30/12/00 PretoE5

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SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000 ESPORTES O ESTADO DE S.PAULO - E5

Planejamentominucioso e dedicaçãocontribuíram para o

grande sucesso

As perspectivas eramboas, mas o Brasil não

ganhou uma medalha deouro sequer nos Jogos

Os organizadores da Olim-píada de Sydney deramum verdadeiro show.

Conseguiram fazer a maior fes-ta do esporte mundial no ano2000, aproveitando o máximodas possibilidades de seu povo.Com cortesia, esbanjaram preo-cupações com a ecologia e, aomesmo tempo em que colheramsucessos nos mínimos detalhes,colocaram a Grécia contra a pa-rede. Dificilmente os gregos vãoconseguir organizar, em 2004,um evento como o feito pelaAustrália.

A competição australiana co-meçou a ter sucesso na antecipa-ção da construção das sedes es-portivas. O último estádio a serentregue – e testado – foi o de vô-lei de praia, construído em Bon-di, uma espécie da carioca Co-pacabana. O protesto dos usuá-rios banhistas atrapalhou aindamais a obra, que ficou pronta,

assim mesmo, com a antecedên-cia necessária.

O Comitê Organizador, bati-zado com a sigla de Socog, cui-dou com cuidado dos meios detransportes, o grande vilão deAtlanta, em 1996, e soube tirarvantagem do fato de a Austrá-lia ser um país de apenas 19 mi-lhões de habitantes.

A festa olímpica contou tam-bém com outras iniciativas. Nacerimônia de abertura do even-to, por exemplo, em que os orga-nizadores aproveitaram para fa-zer uma homenagem aos aborí-genes e à mulher, o momento degrande emoção do desfile foi aentrada conjunta das duas Co-réias no Estádio Austrália. Osatletas foram aplaudidos de pépor cerca de 100 mil pessoas. Odesfile das delegações da Croá-cia e de Timor Leste, que compe-tiu sob a bandeira do ComitêOlímpico Internacional (COI),também emocionaram.

A presidente do Comitê Or-ganizador da Olimpíada deAtenas, Gianna Angelopoulos-Daskalaki, esteve em Sydneyacompanhando as competi-

ções e disse que aprendeu umagrande lição. Ela contou que te-ve 130 observadores nos Jogose nenhum deles encontrou na-da que pudesse criticar.

Os organizadores dos Jogosde 2004 sofreram pressão doComitê Olímpico Internacio-

nal (COI) por causa do atrasodas obras. Mas na última visi-ta da comissão do COI a Ate-nas, porém, o delegado belgaJacques Rogge ficou satisfeitocom a evolução nos trabalhose nas garantias dadas pelo go-verno. (J.P.N.)

Em Sydney, da esperança à decepção

Austrália destaca-se peloespetáculo e organização

Reuters - 18/9/2000

Reuters - 15/9/2000

OLIMPÍADA

Reuters - 16/9/2000

JOÃO PEDRO NUNES

Este ano, em Sydney, pe-la primeira vez desde aOlimpíada de Montreal,

disputada em 1976, o Brasilnão ganhou uma medalha deouro. A sensação de frustraçãofoi enorme, principalmente por-que a delegação nacional haviaquebrado todos os recordes emAtlanta, em 96, com a conquis-ta de 15 medalhas (3 de ouro) ehavia feito uma grande campa-nha no Pan-Americano de Win-nipeg, em 99. Em Sydney, de15 de setembro e 1.º de outu-bro, o Brasil ganhou 12 meda-lhas (6 de prata e 6 de bronze).

A expectativa de boa partici-pação brasileira ganhou aindamais fôlego com os resultadosde vários atletas em competi-ções internacionais antes dosJogos e com a montagem daOperação Sydney, pelo ComitêOlímpico Brasileiro (COB).

Os números traduzem a de-cepção brasileira. Em Atlanta,o Brasil terminou em 25.º lugarno quadro geral de medalhas –que classifica o país de acordocom o número de ouros obtidos– e em 17.º pelo número absolu-to em medalhas. Na Austrália,o Brasil terminou em 52.º no ge-ral e em 22.º no absoluto.

Em Sydney, o País obtevemedalhas em oito esportes –foram nove em Atlanta. Ogrande vilão, neste caso, foi ofutebol masculino, bronze em96, desta vez, eliminado nasquartas-de-final.

Na lista das decepções brasi-leiras na Austrália, a seleçãode futebol, de Wanderley Lu-xemburgo, ganhou ouro – foieliminada no mata-mata porCamarões. Foi difícil entendertambém os motivos que impe-diram o Brasil de comemorartítulos olímpicos no vôlei depraia, na vela e hipismo.

Alguns pódios, porém, foramcomemorados como ouro, co-mo o revezamento 4x100 me-tros do atletismo, comandadopelo velocista Claudinei Quiri-no, que ganhou a medalha deprata, ficando atrás apenas dosEstados Unidos. Outra meda-lha com sabor especial foi obronze da seleção feminina debasquete, triunfo importante dageração pós-Paula e Hortência.

Na natação, a medalha debronze conquistada por Gus-tavo Borges, Fernando Sche-rer, Edvaldo Valério e CarlosJayme no revezamento 4 x100 metros, livre, deixou umclima de decepção.

Tiago Camilo e Carlos Ho-norato brilharam no judô,com medalhas de prata emque poucos acreditavam.

Cavalo falha – No hipismo, ocavaleiro Rodrigo Pessoa, tri-campeão da Copa do Mundo,sofreu com a indisposição deseu cavalo, Baloubet duRouet, que não esteve bem nafinal individual. A modalida-de, bronze por equipe, obteveum bom resultado com o quar-to lugar conquistado por An-dré Johannpeter, que igualouo feito de Eloy Menezes nos Jo-gos de Helsinque, em 1952.

No vôlei, a seleção masculinanão perdeu nenhum jogo na fa-se classificatória, mas foi humi-lhada pela Argentina nas quar-tas-de-final. A feminina perdeupara Cuba nas semifinais, masconseguiu o bronze mesmocom atletas novatas no grupodirigido por Bernardinho.

No vôlei de praia, a decepçãofoi enorme. Adriana Behar eShelda, donas dos principais tí-tulos do esporte, perderam o ou-ro para as australianas Cook ePottharst. Sandra e Adriana ga-nharam bronze. No masculino,os campeões mundiais Loyola eEmanuel pararam nas quartas-de-final. Zé Marco e Ricardoperderam, na decisão, paraBlanton/Fonoimoana (EUA).

Na vela, Robert Scheidt, naclasse Laser, e Torben Grael eMarcelo Ferreira, na Star, per-deram a medalha de ouro na úl-tima regata. Scheidt ficou coma prata, enquanto Torben e Mar-celo conquistaram o bronze.

A Olimpíada de Sydneybem que poderia ser chamadade Jogos da natação ou daságuas. O esporte, que arrancada torcida australiana umapaixão semelhante à que a bra-sileira tem em relação ao fute-bol, surpreendeu as expectati-vas mais otimistas ao registrarno moderníssimo CentroAquático de Sydney as incrí-veis marcas de 39 novos recor-des olímpicos e 15 recordesmundiais. Com tantos resulta-dos espetaculares, sobraramperguntas e insinuações sobredoping não confirmadas.

O espanto tem uma explica-ção simples. Em Atlanta, em1996, o torneio de natação tevetrês recordes mundiais. EmSydney, só no primeiro dia, cin-co marcas foram superadas.Nunca um esporte foi tão avas-salador. Só para comparação,o atletismo passou pela Olim-píada sem o registro de novosrecordes mundiais.

A competição, dominada pe-lo confronto entre Estados Uni-dos e Austrália, teve o brilho dedois holandeses – o nadador denome difícil Peter van den Hoo-genband e Inge de Brujin, co-roados os reis da piscina. Hog-gie venceu duelos espetacula-res. Derrotou o bicampeãoolímpico Alecksandr Popov,nos 100 m, livre, com recorde.E ainda calou os 17 mil torce-dores, ao superar o favoritoaustraliano Ian Thorpe, o“Thorpedo”, nos 200 m, livre.Ele ganhou ainda bronze nos50 m, livre, que teve uma deci-são raríssima no esporte. A me-dalha de ouro foi dividida pe-los norte-americanos AnthonyErvin e Gary Hall Jr.

Inge de Brujin conquistoutrês ouros, com três novos re-cordes mundiais nos 50 e 100m, livre, e nos 100 m, borboletae foi o principal alvo nas insi-nuações sobre doping. (J.P.N.)

Glória, tensão edrama marcama competição

A norte-americana MarionJones, a supermulher, terminoua Olimpíada de Sydney com cin-co medalhas: três de ouro eduas de bronze. Se não foi o su-cesso esperado – o objetivo era aconquista de cinco ouros –, acampanha comprovou sua com-petência e a condição de umadas maiores estrelas do esportemundial. As medalhas de ouroforam ganhas nos 100, 200 e norevezamento 4x400 m. O bron-ze veio no salto em distância eno revezamento 4x100 m.

Apesar do sucesso, Marionnão teve um ambiente tranqüiloem Sydney com o anúncio dodoping do marido, o campeãomundial do arremesso do pesoC. J. Hunter.

O atletismo mostrou força aoquebrar o recorde de público:112.524 pessoas estiveram noEstádio Olímpico para ver aaustraliana de origem aborígineCathy Freeman. Nunca umevento olímpico, em 104 anos,reuniu tanta gente. Ela ganhoua medalha de ouro nos 400 m.

Cathy transformou-se numadas estrelas dos Jogos antes mes-mo do início do torneio de atle-tismo ao acender a pira olímpi-ca na cerimônia de abertura.

A Olimpíada não foi só festa.Registrou dramas, como o da gi-nasta romena Andreea Radu-can, que perdeu a medalha deouro individual geral depoisque seu exame antidoping deupositivo para pseudoefedrina.Recorreu à Corte Arbitral de Es-porte (CAS), em Sydney, que ne-gou a apelação.

Raducan foi a primeira ginas-ta na história olímpica a perdera medalha e a tornar-se campeãindividual geral, pela Romênia,desde que Nadia Comaneci en-cantou o mundo nos Jogos deMontreal (1976). Perdeu a me-dalha por causa de dois compri-midos para febre dados pelo mé-dico Loachim Oana uma horaantes da competição. (J.P.N.)

CAMPANHA VERDE-AMARELA

Bronze Prata

Judô

Tiago Camilo

Carlos Honorato

Vôlei de praia

Adriana Behar/Shelda

Zé Marco/Ricardo

Vela

Robert Scheidt

Atletismo

Revezamento 4 x 100 rasos

Natação

Revezamento 4 x 100 livre

Hipismo

Equipe de saltos

Vôlei

Seleção feminina

Basquete

SeleSandra/Adriana

Seleção feminina

Torben Grael/Marcelo Ferreira

Para a história – Cathy Freeman, na cerimônia de abertura:emoção e beleza marcaram o espetáculo no Estádio Olímpico

AS MEDALHAS DE SYDNEY

Países Ouro Prata Bronze Total

1º Estados Unidos

2º Rússia

3º China

4º Austrália

5º Alemanha

6º França

7º Itália

8º Holanda

9º Cuba

10º Grã-Bretanha

52º BRASIL

39

32

28

16

14

13

13

12

11

11

0

25

28

16

25

17

14

8

9

11

10

6

33

28

15

17

26

11

13

4

7

7

6

97

88

59

58

57

38

34

25

29

28

12

Dupla dinâmica – Peter van der Hoogenband (E) e Ian Thorpe, na decisão do ouro nos 200 m, livre; na Olimpíada daságuas, o holandês ousou vencer o “Thorpedo’’ em Sydney, calando 17 mil pessoas que estavam no Centro Aquático

Afirmação – Alessandra foi uma das principais jogadorasda seleção feminina de basquete: bronze com jeito de ouro

Na natação, umshow de beleza emuitos recordes

Produto: ESTADO - _BRASIL - 32 - 30/12/00 PretoE6

Produto: ESTADO - _BRASIL - 32 - 30/12/00 PretoE6

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E6 - O ESTADO DE S.PAULO ESPORTES SÁBADO, 30 DE DEZEMBRO DE 2000

Tenista torna-se omelhor do mundo,

consolida a carreirae populariza o esporte

Guga, retrato perfeito de um campeãoCélio Jr./AE – 3/12/2000

2001

TÊNIS

CHIQUINHO LEITE MOREIRAEspecial para o Estado

Oano de 2000 vai ficarmarcado como o anodo tênis no Brasil. Ja-

mais, em toda a história, amodalidade alcançou tantodestaque como com a brilhan-te temporada do tenista nú-mero 1 do mundo, GustavoKuerten. Até para a impren-sa internacional o futebol dei-xou de reinar como assuntode interesse e ela já põe oPaís no mapa do tênis mun-dial. Entre os brasileiros, Gu-ga transformou-se em umdos principais ídolos nacio-nais. Uma história de suces-so de um garotão com jeitosimples, descontraído, estilosurfista, que venceu à custade sacrifício e dedicaçãonum esporte até então consi-derado elitista.

O sucesso não vai dar des-canso a Guga. Como novo nú-mero 1 do mundo, ele já co-meça 2001 tendo a posiçãoameaçada por rivais esper-tos, que aproveitarão o fatode o brasileiro estar ausentedas quadras no início do anopara acumular pontos e dimi-nuir sua diferença para o lí-der. O sueco Magnus Nor-man, por exemplo, que due-lou com Guga em 2000, já es-tará jogando no dia 1.º, noTorneio de Chennai, na dis-tante Índia, só para não per-der a chance de marcar pon-tos desde o comecinho datemporada. Em Auckland,na Nova Zelândia, jogadorescomo o inglês Tim Henman eo francês Sebastien Grosjeantambém estarão em quadraatrás de pontos preciosos.

O maior desafio de Gugajá é manter a liderança doranking num circuito exigen-te, com competições impor-tantes a cada semana e dian-te de rivais perigosos e dispos-tos a tudo para roubar do bra-sileiro a condição de número1 do mundo.

Mesmo que não mantenhaa posição por muito tempo,Guga, com certeza, fez mui-to pela popularização do tê-nis no Brasil. Suas conquis-tas na quadra o levaram auma posição jamais sonhadapelos brasileiros, superandoastros como Pete Sampras eAndre Agassi. O tênis pas-sou a fazer parte da torcida,já conhecedora de detalhestécnicos, como as várias su-perfícies de jogo e sofistica-ções das regras.

O momento mais marcantede 2000 veio mesmo no fimda temporada. Justamenteno último torneio, o MastersCup de Lisboa, em Portugal,Guga mostrou ao mundo queé o novo rei do tênis e assu-miu a coroa, superando ver-dadeiros monstros sagradosnuma superfície, o carpete,em que jamais havia conquis-tado um título sequer.

A transformação de Gugaem um tenista mais completofoi, provavelmente, a maiorconquista do brasileiro em2000. Ninguém discutia seutalento, mas ainda se duvida-va de que poderia ir longe emcompetições fora de seu terre-no preferido, o saibro. A preo-cupação tinha fundamento.

Logo no primeiro GrandSlam do ano, o Aberto daAustrália, em janeiro, o brasi-leiro decepcionou ao perderna primeira rodada para o es-panhol Albert Portas, depoisde desperdiçar vários matchpoints. Já tinha perdido tam-bém na estréia no Torneio deSydney, também disputadoem quadras de rebound ace,um piso sintético relativa-mente rápido.

A boa fase começou logodepois. Guga ajudou o Brasila superar a França pela pri-meira rodada da Copa Da-vis, numa campanha em queos brasileiros acabaram porrepetir o feito de 1992, alcan-çando as semifinais. No cami-nho, Guga, Fernando Melige-ni e Jaime Oncins passaram

também pela Eslováquia, noRio. Só perderam na traiçoei-ra grama de Brisbane, para aforte equipe da Austrália.

O verdadeiro impulso veiocom o título do ATP Tour deSantiago – na competição,Guga ergueu os troféus desimples e duplas (ao lado deAntônio Prieto) e conquistoua confiança necessária paraalmejar uma temporada desucesso.

Outro ponto determinan-te na campanha de Gugaem 2000 foi o Masters Seriesde Miami, o Ericsson Cup.O brasileiro não levou o títu-lo, mas, para muitos, mere-ceu vencer. Chegou à finaldiante de Pete Sampras eperdeu num jogo que deixoumuitas dúvidas sobre asmarcações dos juízes. Gugasaiu da quadra decepciona-do, mas com a certeza deque poderia, enfim, sonharcom conquistas também emsuperfícies rápidas.

Por força do calendário daAssociação dos Tenistas Pro-fissionais (ATP), Guga vol-tou para o saibro. A tempora-da da primavera européia ésempre um dos mais fascinan-

tes períodos do ano. O brasi-leiro brilhou como nunca,mas deu um susto na torcida.Logo no primeiro torneio, emMontecarlo, em que defendiao título conquistado em 99,caiu na primeira rodada. Epior: sentiu uma lesão nascostas que poderia ser grave.

Preocupado, Guga voltouao Brasil para três semanasde tratamento e recupera-ção. Retornou à Europa esurpreendeu a todos ao al-cançar a final do Masters Se-ries de Roma. Perdeu o títulopara o sueco Magnus Nor-man, mas ganhou a certezade que poderia jogar nova-mente num nível competiti-vo. Na semana seguinte, ga-nhou o título do Masters Se-ries de Hamburgo, numa de-cisão memorável com o rus-so Marat Safin.

Entusiasmado, Guga che-gou a Roland Garros cheiode confiança. Ergueu o tro-féu do bicampeonato – ven-ceu Norman na final depoisde disputar 11 match points– e alcançou a marca de 13 vi-tórias consecutivas, o que lherendeu o título de novo reido saibro.

Fora de seus domínios, Gu-ga não foi muito longe emWimbledon. Passou na pri-meira rodada – com relativadificuldade – pelo norte-ame-ricano Chris Woodruff. Omais importante foi que co-meçou a se impor como umdos líderes do tênis – não seconformou com certas marca-ções do juiz e exigiu respeito,denunciou discriminação efavorecimento a jogadoresdos Estados Unidos e Euro-pa. O brasileiro perdeu na ter-ceira rodada para o desconhe-cido alemão Alexander Po-pp, que, depois disso, foi con-vidado a defender a Inglater-ra por ser filho de ingleses.

Nos EUA – Apesar do bicam-peonato de Roland Garros,dos títulos de Santiago e deHamburgo e de já ter conquis-tado a liderança da corridados campeões, Guga aindanão parecia satisfeito. Sonha-va com novos horizontes equeria ampliar seus domí-nios para as quadras rápidas– diz que só alcançará a reali-zação profissional se conquis-tar pelo menos um título emtodas as superfícies.

Em 97, por pouco não ga-nhou o Torneio de Montreal,Canadá, em quadra rápida, enão se conformava com isso.

Motivado pela campanhaem Miami no início do ano,Guga chegou mais confiantepara a temporada norte-ame-ricana que culmina com o USOpen, o quarto e últimoGrand Slam do ano. No Mas-ters Series de Cincinnati, te-ve uma semana importante.Não levou o sonhado título,mas superou obstáculos difí-ceis, como a tensa e nervosavitória sobre o norte-america-no Todd Martin. Chegou àssemifinais e acabou perden-do do inglês Tim Henmannum jogo em que esteve per-to da vitória sobre um adver-sário cujo estilo não gosta deenfrentar: o saque e voleio.Jogos assim não dão o ritmode que o brasileiro precisa pa-ra aplicar seus golpes comperfeição.

Finalmente, o tão sonhadotítulo em uma quadra rápidaveio no ATP Tour de Indianá-polis. Guga superou adversá-rios como Todd Woodbrigde,Taylor Dent, Wayne Ferrei-ra, Lleyton Hewitt e, na final,

mais uma vez o russo MaratSafin. O brasileiro venceu eparece ter sentido um alíviomuito grande por ter afasta-do um fantasma que já o inco-modava bastante.

Com o troféu de Indianápo-lis, Guga chegou a NovaYork apontado, pela primei-ra vez, como um dos favori-tos ao título do US Open.Mas, de repente, viu-se dian-te de um adversário complica-do, o australiano Wayne Ar-thurs – adepto do saque e vo-leio –, na primeira rodada deum torneio importante: Gu-ga disse adeus à competiçãomuito antes do que esperava.

A frustração pela elimina-ção prematura no US Openajudou a piorar sua incômo-da situação com a participa-ção na Olimpíada de Sydney.Uma briga entre seus patroci-nadores e o Comitê OlímpicoBrasileiro (COB) por pouconão impediu que o principaltenista brasileiro participas-se dos Jogos.

Em Sydney, Guga chegouàs quartas-de-final – per-deu para o medalha de ou-ro, o russo Yevgeny Kafelni-kov. Aproveitou a atmosfe-ra dos Jogos para ver os me-lhores atletas do mundo emação e torcer pelos outrosbrasileiros.

Guga continuou nas qua-dras rápidas pelo restante datemporada, jogando emHong Kong e Tóquio – foi àsquartas-de-final nos dois tor-neios. Seguiu depois para aEuropa e para a fase mais te-mida do ano: a temporada in-door de torneios em piso decarpete. Esteve razoável emStuttgart, caindo nas oitavas-de-final diante de SebastienGrosjean, e chegou às quar-tas-de-final em Lyon, perden-do para Patrick Rafter.

Em Paris, sua cidade prefe-rida depois de Florianópolis,Guga voltou a brilhar. Cur-tiu seus endereços favoritos ejogou como nunca numa qua-dra de carpete. Chegou às se-mifinais depois de passar porChris Woodruff, Patrick Raf-ter e Albert Costa – perdeupara o saque canhão do aus-traliano Mark Philippoussis.

A consagração veio em se-guida, com a conquista me-morável no Masters Cup deLisboa. Guga começou no tor-neio de forma preocupante.Perdeu de Andre Agassi naprimeira rodada e sentiuuma lesão na coxa, mas recu-perou-se a tempo de vencer,em seqüência, Magnus Nor-man, Yevgeny Kafelnikov,Pete Sampras e Andre Agas-si, na final, para comemoraro título da Copa do Mundode Tênis. Sua estrela brilhouintensamente, a ponto de seumaior rival, o russo Marat Sa-fin, cair nas semifinais, tiran-do de seu caminho o últimoobstáculo que o separava tam-bém, da liderança do rankingmundial.

Em 2000, Guga foi o tenis-ta que por mais tempo lide-rou a corrida dos campeões.Teve 65 vitórias, diante de 21derrotas. Ganhou seu primei-ro título em quadras rápidas,levantando o troféu de cam-peão em Santiago, Hambur-go, Roland Garros, Indianá-polis e Lisboa.

Em 2001, Gustavo Kurtenvai investir nos grandes tor-neios, em que estão em jogo osmelhores prêmios e, principal-mente, o maior número de pon-tos. Com isso, espera manter-seentre os dez primeiros do ran-king durante toda a temporadae classificar-se para o MastersCup, marcado para Sydney.

Se seus planos derem certo,Guga acredita que poderá, ou-tra vez, terminar uma tempora-da como o número 1 do mundo.Mas já avisou: se cair para ter-ceiro ou quarto lugar, não vaisignificar, necessariamente, quetenha feito um ano ruim.

Guga terá uma temporadamovimentada. Jogará os quatroGrand Slams – Austrália, Ro-land Garros, Wimbledon e USOpen – e os nove Masters Se-ries. Fora isso, disputará cincotorneios da série ATP Tour, ape-nas dois em quadras de saibro.

A imagem de um vencedor – Depois de ganhar o Masters de Lisboa com uma fantástica vitória sobre Andre Agassi,Guga, bandeira brasileira às costas, ajoelha-se na quadra, atrás dos troféus que simbolizaram sua conquista