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O povo de Messias Cultura de descendentes de escravos está desaparecendo Ano I Edição nº 2 agosto - novembro 2014 Dialogar REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEXTA REGIÃO Entrevista Memorial: história da Justiça do Trabalho preservada Aposentado sim, descansando não Isa Maria de Oliveira 1 REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014

Revista Dialogar N 02 TRT6

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Ano I Edição n.º 2 agosto - novembro 2014.

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O povo de MessiasCultura de descendentes de escravos está desaparecendo

Ano IEdição nº 2agosto - novembro 2014

DialogarREVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEXTA REGIÃO

Entrevista

Memorial: história da Justiça do Trabalho preservada

Aposentado sim, descansando não

Isa Maria de Oliveira

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CARTA AOS LEITORES

Chefe do Núcleo de Comunicação Social do TRT6

Eugenio Jerônimo

Após a boa repercussão do lançamento, estamos publicando o número dois da nossa dialogar. Nesta edição (capa) mostramos os descendentes de escravos do sítio Leitão da Carapuça, uma peculiar e rica cultura que está desaparecendo, suplantada pela cultura pop.

Na Entrevista, a secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradica-ção do Trabalho Infantil, socióloga Isa Oliveira, aborda as relações entre pobreza e trabalho precoce, analisa as normas de proteção à criança e ao adolescente e critica a concepção de que o trabalho é a saída para livrar a criança da marginalidade. O tema da criança e do adolescente submetidos ao trabalho ganha mais espaço com a matéria “Trabalho infantil: tolerância e falso dilema”.

Eleito como categoria a ser destacada pelo programa Trabalho Seguro em 2014, o trabalhador rural aparece em “Trabalhadores rurais mais próximos dos urbanos”. Dentro desse mesmo tema, “Feira de produtos orgânicos” revela como uma expe-riência bem sucedida vem ajudando a manter o homem no campo e oferecendo alimentação mais saudável.

Para muitos brasileiros, a aposentadoria é apenas o ingresso numa nova atividade profissional. O assunto é tratado em “De volta à ativa”.

Em tempos de e-comércio a venda porta a porta, sobretudo de produtos de beleza, é crescente e conquista importante fatia do mercado, como mostra a matéria “O produto vai aonde o cliente está”.

Testemunha de mais de sete décadas de desenvolvimento das relações de trabalho no Brasil, o trt-pe reúne muito de sua história no Memorial da Justiça do Trabalho em Pernambuco, o que mostra “Para ficar na história”.

Em “Por que escolhi Direito”, os dirigentes do trt-pe revelam como ocorreu o processo de escolha do curso em que se graduaram.

A implantação do PJe no Regional pernambucano, que desde junho dispõe da ferramenta em todas as suas unidades, aparece em “trt-pe já funciona 100% com o pje-jt”.

Outra novidade que a dialogar traz são três ensaios fotográficos, assinados por Stela Maris (Outro lado do trabalhador rural), Elysangela Freitas (Bordando o maracatu) e Danilo Galvão (Trabalhadores da vida eterna).

Boa leitura.

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Expediente

Memorial preserva momentos marcantes da Justiça

TRT da 6ª RegiãoCais do Apolo, 739 Bairro do Recife50.030-902 Recife PE Imprensa: 81 3225 3216 [email protected]

PRESIDENTEIvanildo da Cunha Andrade

VICE-PRESIDENTEPedro Paulo Pereira Nóbrega

CORREGEDORA Virgínia Malta Canavarro

DESEMBARGADORES FEDERAIS DO TRABALHOEneida Melo Correia de AraújoAndré Genn de Assunção BarrosIvanildo da Cunha AndradeGisane Barbosa de AraújoPedro Paulo Pereira NóbregaVirgínia Malta CanavarroValéria Gondim SampaioIvan de Souza Valença AlvesValdir José Silva de CarvalhoAcácio Júlio Kezen CaldeiraDione Nunes Furtado da SilvaDinah Figueirêdo BernardoMaria Clara Saboya Albuquerque BernardinoNise Pedroso Lins de SousaRuy Salathiel de Albuquerque e Mello VenturaMaria do Socorro Silva EmerencianoSergio Torres TeixeiraFábio André de FariasPaulo Alcantara

SECRETÁRIO-GERAL DA PRESIDÊNCIAAyrton Carlos Porto Júnior

DIRETOR-GERALWlademir de Souza Rolim

SECRETÁRIA DO TRIBUNAL PLENONyédja Menezes Soares de Azevedo

EDIÇÃO Núcleo de Comunicação Social do TRT-PE (NCS)

REDATORESNCS: Eugenio Pacelli · Mariana MesquitaHelen Falcão · Fábio Nunes · Estagiários de jornalismo: Jaqueline Fraga e Marcos Carvalho | Signo Comunicação: Iúri Moreira · Francisco Shimada

REVISÃOEugenio Pacelli

FOTOGRAFIANCS: Stela Maris · Elysangela Freitas | Signo Comunicação: Danilo Galvão

PROJETO GRÁFICO e DIAGRAMAÇÃONCS: Simone Freire · Gilmar Rodrigues | Signo Comunicação: Micaele Freitas

IMPRESSÃO Gráfica e Editora Liceu (Tiragem: 1.000 exemplares)

Tradição cultural de descendentes de escravos sob ameaça

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Venda porta a porta se expande no Brasil

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20 Instituições se unem contra trabalho infantil

43 Segurança pelo Brasil

17 Na prateleira

18 A tradição do maracatu rural

36 Confeccionando vestimentas dos brincantes

44 Profissão: sepultador

Isa Maria de OliveiraSocióloga e Secretária Executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil

Entrevista

Opinião

Colunas

Ensaio fotográficoJustiça do Trabalho em Pernambuco: 73 anos de Memória e HistóriaMarcília Gama da Silva

Planejamento Estratégico 2015-2020Kátia do Rego Barros

Preparação para Aposentadoria na Justiça do TrabalhoRenatto Marcello de Araújo Pinto

A Mitologia e o DireitoPaulo Alcantara

24 A melhoria das condições de trabalho no campo

28 Vida na roça transformada pela produção de orgânicos

Aposentados que precisam continuar trabalhando

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Dirigentes do TRT-PE: a escolha pelo Direito

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Adeus ao papel: desde junho todas as unidades do TRT-PE funcionam com o PJe

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Entrevista

Qual é a trajetória da legislação quanto à proibição do trabalho

infantil desde o início da discussão sobre o tema até os dias de hoje no Brasil?

Um marco importante foi a apro-vação da Emenda Constitucional 20 (1998), que elevou a idade mínima de 14 para 16 anos. O artigo 227 da

Constituição é outro, pois afirma que o trabalho infantil é uma violação dos direitos humanos de crianças e adolescentes. Nesse artigo são decli-nados seus direitos fundamentais, a proteção integral e o princípio da prioridade absoluta.

Na sequência, em 2000, o Brasil se torna signatário da Convenção

Isa Maria de Oliveira

Há mais de 15 anos atuando na área de proteção à infância, a socióloga Isa Maria de Oliveira é membro titular da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (conaeti), assumindo, em 2002, a secretaria executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (fnpeti).

Na entrevista a seguir, a estudiosa fala sobre a relação entre a pobreza no Brasil e o trabalho precoce, a má qualidade da educação, as normas de proteção à criança e ao adolescente, a influência de programas assistenciais do governo.

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182 da Organização Internacional do Trabalho (oit), que dispõe sobre as piores formas de trabalho infantil. Em 2001, o Brasil ratifica a Convenção 138, que dispõe sobre a idade míni-ma, apesar de já ter uma superior à proposta pela norma, que é de 15 anos ou uma compatível com a conclusão da escolarização obrigatória.

Por Mariana Mesquita

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“O fato de o Brasil ser signatário das convenções da oit fortalece e promove as ações de articulação das campanhas contra o trabalho infantil.”

A seu ver, muita coisa mudou na esfera do trabalho infantil no país após a adesão a esses diplomas?

Da ratificação da convenção 138, que recomenda a elaboração de um plano pelo país signatário, decorre o surgimento do Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente, em 2003. Em seguida, para cumprir a Convenção 182, o Bra-sil estabelece as atividades perigosas e insalubres. Nesse sentido, o marco mais importante foi a aprovação do decreto 648, em 12/06/2008, que es-tabelece a lista das piores formas.

O fato de o Brasil ser signatário das convenções fortalece e promove as ações de articulação. Nesse contex-to é instituída no Brasil a conaeti, também em 2003, que é coordenada pelo Ministério do Trabalho e Em-prego (mte) e tem uma composição plural: ali estão representados vários ministérios federais, centrais sin-dicais, confederações patronais, o Ministério do Trabalho e Emprego (mte), a oit e a unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) como observadores, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adoles-cente (conanda) e o fnpeti.

Quais os objetivos da conaeti? A conaeti é um órgão consultivo

do mte, sem caráter deliberativo ou executivo, e foi criada com objetivos de elaborar, monitorar e implemen-tar o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e

Proteção ao Trabalhador. Outro ob-jetivo era a elaboração e revisão da lista das piores formas. Além disso, a Comissão busca adequar a legislação brasileira para o melhor cumprimen-to das convenções da oit.

Quais as principais ações da cam-panha da fnpeti e oit “Todos juntos contra o trabalho infantil”, lançada no dia 12/6? O que se espera da iniciativa?

A campanha atual, como todas as outras, busca atingir toda a popula-ção brasileira, e introduzir o tema na pauta política dos governos federal, estaduais e municipais, com o fim de sensibilizar, informar e fortale-cer o tema, tornando-o prioridade nas decisões políticas dos gestores públicos. Outro objetivo é fazer com que a sociedade seja cada vez mais informada de que a prática traz inúmeros prejuízos, para contribuir, assim, para desmistificar aquelas percepções que ainda vigoram na sociedade de que o trabalho é bom, de que para a criança pobre ele é uma solução – todos os dados estatísticos mostram exatamente o contrário.

É considerado trabalho infantil, no Brasil, o realizado por crianças ou adolescentes com idade inferior a 16 anos, exceto aqueles que o fazem na condição de aprendiz, cuja ida-de mínima permitida é de 14 anos. Mas esses limites não se aplicam ao trabalho doméstico. Qual o motivo para só se poder trabalhar no âmbito doméstico a partir dos 18 anos?

A lista das piores formas de

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trabalho infantil, aprovada pelo de-creto 648, estabelece os 18 anos para o trabalho doméstico e para todas as atividades que comprometem o desenvolvimento físico, psicológico, moral e cognitivo, ou seja, que com-promete o pleno desenvolvimento da criança e do adolescente. Den-tre essas piores formas, quer pela natureza, quer pelas condições por meio das quais essas atividades são realizadas, está a exploração sexual comercial, prevista na Convenção 182. Esse foi também um marco im-portante do Brasil, quando foram incluídas na lista atividades proi-bidas a menores de 18 anos.

Quais são as principais implica-ções na vida adulta para quem tra-balhou durante a infância?

Pessoas que trabalham na casa de amigos, parentes, que afirmam haverem começado a trabalhar aos 10, 12 anos, muito frequentemen-te apresentam tendinites, bursites,

consequências da atividade doméstica precoce. O grave é que os desdobra-mentos para a saúde muitas vezes só aparecem tardiamente, comprome-tendo o desempenho profissional.

Um estudo realizado recente-mente pela unicef que buscou im-plementar ações para inclusão esco-lar até 2015 revelou que o abandono da escola tem duas causas determi-nantes no Brasil: o atraso escolar e o trabalho infantil – que compromete a escolarização. Mesmo quando a criança continua estudando, o ren-dimento é sempre 10, 12% abaixo daquelas que só estudam. Nos casos do trabalho doméstico, esse número chega a 20%.

Olhando sob a vertente dos di-reitos humanos, a prática retira da pessoa o direito a se desenvolver plenamente. Não é sem razão que não só o Brasil, mas todos os pa-íses estabelecem uma faixa etária em que a escolarização é obrigatória

– é nesse momento em que se deve investir no desenvolvimento cog-nitivo.

A questão da pobreza no Brasil é fator determinante para que crian-ças e adolescentes permaneçam tra-balhando...

A pobreza contribui muito porque o rendimento médio das famílias no Brasil é baixo. Mas não é só isso: temos também a questão cultural. Ainda não conseguimos fazer com que educadores, famí-lias, gestores públicos, a mídia en-tendam que a escola é o locus mais importante para formar o caráter e que o trabalho infantil acelera o processo de “adultizar” a criança, que tem comprometido seu direito ao repouso, à brincadeira, ao tem-po de estudo e é exposta a outros riscos. Existe também o caso do trabalho infantil informal, que é uma porta aberta para o alicia-mento das redes criminosas, tanto

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“Olhando sob a vertente dos direitos humanos, a prática retira da pessoa o direito a se desenvolver plenamente. Não é sem razão que não só o Brasil, mas todos os países estabelecem uma faixa etária em que a escolarização é obrigatória.”

da exploração sexual como do trá-fico de drogas.

Outro elemento causal impor-tante é a educação no Brasil, que ainda não é de qualidade. Isso leva muitos adolescentes, pela sucessiva repetência e recorrente mal desem-penho, ao abandono da escola, que não encanta o estudante nem motiva sua família, cujos membros, que não tiveram uma educação de qualidade, não conseguem percebê -la como um meio de construir um projeto de vida para seus filhos.

O trabalho realizado pelo menor de 16 anos, quando este tem economia própria decorrente de estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, é devidamente autorizado pelo Código Civil de 2002. Como o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil se posiciona em relação a isso?

Esse trabalho não é autorizado, a lei maior é a Constituição Fede-ral, que proíbe qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo como aprendiz, a partir dos 14. O traba-lho infantil artístico, no entanto, é tema controverso. No artigo 8º da convenção 138 há uma excepciona-lidade ao trabalho artístico: tem que ser autorizado judicialmente, caso a caso e por tempo determinado, e em consulta com as entidades de trabalhadores e empregadores. Além disso, devem ser respeitados os interesses maiores da criança.

Como não há regulamentação, fica a cargo dos juízes autorizar ou não, e isso tem acontecido de forma indevida. Mais graves ainda são as autorizações para que menores tra-balhem na rua, em lixões, na cons-trução civil, atividades definidas pelo decreto 6.481 da presidência da Re-pública como atividades perigosas e não permitidas a menores.

A problemática do labor infantil não pode ser responsabilidade apenas do governo. A sociedade tem papel importante para a erradicação dessa prática...

A própria constituição do fnpeti e de todos os espaços onde se discutem e se propõem estraté-gias para enfrentar o trabalho in-fantil têm composição plural, pois o Brasil tem uma compreensão de que deve haver uma articulação for-te entre governo e sociedade civil. A maior incumbência, no entanto, é do poder público, pois é responsável pela elaboração, implementação e eficácia das políticas públicas, por meio das quais os direitos são uni-versalizados. Como se vê, na socie-dade civil temos várias ongs que desempenham atividades extrema-mente importantes, mas é um papel complementar. O que buscamos é a universalização de direitos, tais como uma escola de qualidade, pro-teção integral, acesso a uma saúde de qualidade, ao lazer, à cultura. Só assim é que teremos uma prevenção

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efetiva contra o trabalho infantil e contra toda e qualquer violência contra a criança e o adolescente.

Qual a situação do Brasil em comparação a outros países de nível econômico similar com relação à er-radicação do trabalho infantil?

Temos muita dificuldade em fazer essa comparação, porque a própria coleta de dados não parte dos mesmos patamares. Segundo a oit, que apresentou um estudo em 2012 sobre a situação nas grandes regiões, subdivididas em América Latina e Caribe, Ásia e Pacífico, e África, a situação mais grave é na África: uma em cada cinco crianças trabalha. O mesmo relatório revela uma redução na Ásia. Já na América Latina, onde está inserido o Brasil, houve uma redução muito tímida, o que causa grande impacto, já que o Brasil representa 28% do trabalho infantil da região.

Como a senhora relaciona alguns programas assistenciais do governo, a exemplo do Bolsa Escola e do Bolsa Família, com o combate ao trabalho infantil? Esses programas funcionam como uma ferramenta que auxilia na erradicação do trabalho precoce?

Como prevenção, qualquer pro-grama que visa a fortalecer a inclusão escolar é muito importante. O Bolsa Família, sucessor do Bolsa Escola, ao ser integrado ao peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), perdeu o foco no trabalho infantil,

pois a lei que o institui estabelece apenas duas condições: a frequência à escola e o atendimento à saúde.

O programa alcançou 18,5 mi-lhões de crianças e adolescentes, mas tanto o gestor municipal quan-to as famílias não foram motivados a priorizar o combate ao labor pre-coce. É frequente encontrar crianças atendidas pelo programa trabalhan-do. Então a frequência à escola é bom para atacar o trabalho infantil, mas o serviço socioassistencial não se estabeleceu nem à altura da qua-lidade da escola, que já não é boa, nem tampouco na mesma extensão.

O que vence, portanto, é a in-terferência dos fatores culturais: já que a criança está indo para a esco-la, não há problema em continuar trabalhando, como se o trabalho complementasse essa situação de direito. Ao contrário, ele nega.

Até onde deve ir a ação educati-va e quando deve começar a punitiva quanto à responsabilização das famí-lias que têm suas crianças e adoles-centes no mercado de trabalho?

O Fórum Nacional defende e compreende que a família não pode ser punida. Estamos falando de adultos que não tiveram oportu-nidade, não têm escolaridade e não são atendidos adequadamente e com eficiência pela política de assistência social. Então essa responsabilização só deve acontecer quando se assegu-rarem todas as oportunidades que

lhes foram negadas, para que a família possa cumprir o papel constitucional de proteger a criança e o adolescente.

Então outra política que precisa avançar é a de assistência social, porque o objetivo dos programas não é apenas de transferir renda; a transferência de renda implica em dar à família inclusão em pro-gramas de formação profissional, inclusão produtiva, para que ela saia desse patamar para, então, po-der ser orientada e cobrada a dar a proteção à criança e ao adolescen-te. Isso não é dado geneticamente, é construído cultural, histórica e socialmente.

“A pobreza contribui muito porque o rendimento médio das famílias no Brasil é baixo. Mas não é só isso: temos também a questão cultural. Ainda não conseguimos fazer com que educadores, famílias, gestores públicos, a mídia entendam que a escola é o lócus mais importante para formar o caráter e que o trabalho infantil acelera o processo de “adultizar” a criança.”

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“É melhor estar trabalhando do que roubando”. Esta é uma afirmação que encontra eco na sociedade. A isso se resumem as opções dadas às crian-ças e adolescentes brasileiros? Quais são os direitos a eles assegurados?

Esse mito, essa inverdade é cons-truída e faz parte da ideologia do país e vem sendo repetida. Essas não são opções. É proibido o trabalho infantil, e o roubo é um ato ilícito. O Estado, a sociedade e as famílias têm que trabalhar juntos para que as crianças sejam protegidas e não se envolvam ou sejam aliciadas por essas redes criminosas. Do ponto de vista ético, de direitos humanos

e da proteção ideal, as opções são estudar, brincar, ter acesso a uma educação de qualidade na proteção da sociedade, da família e do Es-tado. É essa a opção legal, não há outra. Além de equivocado, esse posicionamento tem um caráter discriminatório, uma vez que quan-do se fala em trabalhar ou roubar, está-se falando na criança pobre e excluída. Isso é muito perverso.

Há algum aspecto que a senhora acharia importante frisar?

O nosso país tem tudo muito gran-de: o maior programa de transferência de renda, uma redução expressiva no trabalho infantil de 56% em 20 anos.

Esse número é expressivo, mas o re-sultado veio depois de duas décadas, então é preciso analisá-lo inserido em todo esse contexto: em quanto tempo conseguiremos erradicar a prática?

Evidentemente que temos bons planos, estratégias e propostas, mas ter um universo de 3,4 milhões de crianças e adolescentes trabalhando é muito grave. Precisamos ultrapas-sar as propostas para uma eficácia na prática. Esse esforço tem que partir de todos os setores sociais e do go-verno, a fim de reverter a situação e eliminar, em 2016, todas as piores formas de trabalho e, em 2020, todas as formas de trabalho infantil.

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Passados 126 anos da abolição da escravatura, descendentes de es-

cravos que vivem no Leitão da Cara-puça, sítio do município de Afoga-dos da Ingazeira (380 km do Recife), Sertão do Pajeú, encontram-se no geral integrados à sociedade da re-gião. Mas eles ainda enfrentam uma dissimulada discriminação e, com os últimos praticantes, está acabando um rico conjunto de manifestações culturais que ainda mantém viva a arte de seus ancestrais.

Esses descendentes de escravos, que formam 45 famílias, levam uma vida semelhante à dos demais habi-tantes do entorno. Economicamente,

Uma cultura que se vaiA contínua migração do campo para a cidade, o predomínio dos valores urbanos e a força da cultura de massa ameaçam a rica tradição cultural dos descendentes quilombolas do sítio Leitão da Carapuça

Fotos: elysangela Freitas eles se situam no mesmo patamar da maioria dos pequenos sitiantes do Sertão. Ao longo do tempo de-penderam dos anos bons de chuva para terem colheita com fartura, para “lucrarem”, como se diz na variante linguística dos sertões nordestinos.

Os integrantes das 45 famílias sempre sobreviveram da agricultura de subsistência, principalmente do cultivo de feijão, milho, macaxeira, mandioca, castanha de caju e de ou-tras culturas em menor proporção. A criação, em pequena escala, de gado, porco, bode e galinha é ou-tra atividade que remonta a hábitos muito antigos.

texto: eugenio JerôniMo

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Mas seu modo de vida está mu-dando. Embora permaneçam ligados à agricultura e à pequena criação, co-meçam a diminuir os rebanhos e as roças. A casa de farinha, na frente da qual os moradores faziam fila na dis-puta por um espaço para a transfor-mação da mandioca, está desativada. O preço da farinha já não compensa o trabalho e as instalações foram alu-gadas a uma igreja evangélica.

Fonte importante de incremento do cardápio e, ao mesmo tempo de divertimento, a caça de aves, tatus e veados deixou de ser praticada porque quase já não se encontram algumas espécies e porque a legis-lação nacional de proteção à fauna tornou-se mais rigorosa, com vigi-lância constante do Ibama.

Novidade é o beneficiamento de castanha de caju para comercia-lização, com orientação técnica da Prefeitura Municipal de Afogados da Ingazeira sob o selo “Mãos crioulas”, criado pela comunidade. Organiza-da em cooperativa, a atividade com-plementa a renda de 20 famílias, que vendem por ano até 3 mil quilos do produto, o que gera uma renda de r$ 96 mil. Um problema que se avizi-nha é a praga conhecida como mosca branca, que destrói os cajueiros, po-rém “professores da Universidade Fe-deral Rural de Pernambuco já estão dando orientação para combater a mosca, com o uso de defensivos natu-rais”, adianta o líder da comunidade, Sebastião [Veneranda] José da Silva.

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A venda de castanha de maneira profissional e com o valor agrega-do da marca é o índice de um novo período. Com uma organização marcada pela solidariedade de seus membros, sempre prontos para um mutirão, seja para fazer farinha, seja para limpar uma roça de milho, seja para rebocar uma casa de taipa, o povo do Leitão passou a articular-se politicamente e começou a reivin-dicar do poder público a oferta de serviços básicos. Criou em 1995 a Associação Rural do Umbuzeiro e Leitão – arul –, com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Ru-rais de Afogados da Ingazeira, que já atuava na região.

A partir das reivindicações im-pulsionadas pela Associação, os moradores receberam energia solar, em 1995, substituída pela energia elétrica em 1998. Outras conquis-tas foram a edificação de banheiros, a construção de 20 cisternas para

armazenamento de água da chuva e a construção de uma barragem de médio porte, com capacidade para 150 mil metros cúbicos, recém--concluída e que aguarda as chu-vas para garantir o abastecimento. A pequena vila não tem posto de saúde nem escola, serviços que são encontrados na Carapuça, a 6km da localidade. Para os estudantes a Pre-feitura de Afogados da Ingazeira ga-rante o transporte à escola vizinha, que oferece o Ensino Fundamental.

De acordo com o líder comu-nitário e sindical Sebastião José da Silva, “A criação da arul foi um importante passo dado pela comu-nidade, pois o povo teve mais for-ça para exigir seus direitos, como a manutenção da estrada de terra, que liga o Leitão a Afogados, agora sempre ajeitada pela máquina”. É também a Associação que orienta e organiza os habitantes a terem aces-so aos programas instituídos pelo

Governo Federal, como o Pronaf, que apoia a agricultura familiar, e o bolsa-família.

Sebastião também integra a di-retoria do Sindicato dos Trabalha-dores Rurais de Afogados da Inga-zeira, exercendo pela terceira vez o cargo de diretor de política agrária, agrícola e de meio ambiente, eleito para o período de 2012 a 2016. Ele avalia que a organização do povo do Leitão vai se intensificar e será mantida porque vê “novas pessoas se preparando para continuar a luta em busca de projetos de geração de ren-da”. Embora vivam na terra há muito tempo, os moradores ainda não têm o título, para isso aguardam um novo cadastro do Governo Federal.

Apesar da integração com os de-mais grupos da sociedade em volta, um fenômeno demonstra um tipo de silenciosa discriminação. Ao longo da história da comunidade, os ca-samentos se deram sempre entre os

Liderança. Sebastião Veneranda encaminha os pleitos da comunidade

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membros do grupo de descendentes de escravos. Esta regra tácita, conse-quência de uma segregação velada, permanece em vigor nos dias atuais, mesmo depois de um mais intenso relacionamento do povo do Leitão com a sociedade e de sua inserção na arena da luta política, mas já se re-gistram casamentos e relacionamen-tos fora dos limites do grupo social. Isso mostra que, apesar de séculos de existência, e de convivência harmô-nica com outros grupos sociais da área, este grupo de afrodescendentes não pode transitar livremente por todos os espaços sociais. Etnias de outras origens que não dos escravos vindos da África mantêm deles uma discreta distância quando o assunto é união matrimonial.

É verdade que com a descoberta do talento artístico de muitos integrantes

da comunidade e a valorização de ex-pressões como o coco e o pífano, o preconceito vem diminuindo. “O pre-conceito era maior”, afirma Sebastião. “Não chamavam a gente nem pelo nome, só diziam ‘os nego do leitão’ ou os ‘neguim do Leitão’”, lembra.

Chama a atenção o talento para a música de muitos integrantes da comunidade. A banda de pífano tor-nou-se célebre e nos anos 70, uma época em que os remanescentes quilombolas eram quase invisíveis, conquistou por duas vezes o prê-mio de melhor banda da categoria de Pernambuco, em concurso rea-lizado pela Fundarpe. Redescoberta pelos meios oficiais nos anos dois mil, a banda, ao lado do Coco do Leitão, teve um cd gravado com a produção do Quinteto Violado. Mas parece que a exibição de ambos os

grupos até em capitais como o Re-cife e Brasília gerou mais admiração que reconhecimento e recompensa financeira. Com os últimos artistas, estas duas manifestações culturais da comunidade estão morrendo. O “batalhão” de bacamarte também está ameaçado de acabar porque seus integrantes, a exemplo de Zé de Zul-mira, 88 anos, têm idade avançada, embora a tradição possa ter continu-adores uma vez que não depende do desenvolvimento de um talento tão específico como no caso do coco e do pífano.

A banda de pífano acabou sem deixar sucessores. Único remanes-cente da famosa formação que ti-nha Luís de Dona Branda (pife), Zé João (zabumba), Mané Pedro (caixa), Gonzaga de Dona Branda já não toca

Ao longo da história da comunidade, os

casamentos se deram sempre entre os membros do grupo de descendentes

de escravos. Casados, Gonzaga e Neuza

são primos.

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seu pife, a saúde não o permite. De-sintegrado, o grupo não atrai mais o interesse de alguns talentos novos, como Francisco Venerando, 42 anos, que foi fazer parte do quarteto de outra comunidade.

“A gente não se preocupou de ensinar [a tocar pífano], e os mais moços também nunca ligaram mui-to”, lamenta Gonzaga.

Também sem deixar continu-adores, está acabando o Coco do Leitão. Aos 68 anos, Inácio Pedro é o último representante que ainda

puxa as toadas. Herdeiro musical de seus parentes Joaquim Gonçalo, Luís Gonçalo e Zé Júlio, Inácio Pedro está desanimado. “Perdi meu pareia em 2012”, fala com saudade. “Sozinho não dá pra cantar, um tem de cantar e o outro responder”, explica, refe-rindo-se à morte do outro mestre, Aguinaldo Gonçalo. Mesmo assim, nas festas de São João a comunidade se reúne para “mazurcar”, na dança do “miudinho”, adiando o fim, que parece inevitável, de uma bela forma musical, poética e de dança.

Perseguidos pelos senhores e abafados por séculos de pressão da Igreja Católica, perderam-se nas noites do tempo os cultos a outros deuses que os ancestrais africanos trouxeram quando chegaram ao Brasil, como mão de obra servil. O povo do Leitão professa – com en-tusiasmo – a fé católica e, mais que isso, organiza e patrocina novenas, como no mês de Maria, em maio, que ocorre no Lajedo, sítio no mu-nicípio de Custódia, onde moram descendentes do grupo.

A igreja do Quitimbu (360 km do Recife), distrito de Custódia-PE, abriga uma imagem de Nossa Senho-ra do Rosário, doada pela comunida-de de descendentes de escravos. “Os cativos prometeram que, se ganhas-sem a liberdade, davam a imagem da santa à igreja”, conta Dona Messias, neta de escravos.

Certamente alguns elementos afros se amalgamaram aos rituais que praticam nas liturgias católicas, mas não é fácil identificá-los.

Os primeiros escravos podem ter chegado ao Leitão da Carapu-ça cerca de três séculos atrás, para construir uma comunidade livre. O núcleo principal dos pioneiros veio do sítio São José, de Custódia, onde havia uma fazenda de criação de gado e plantação de algodão com amplo uso de mão de obra cativa.

Os registros escritos são escassos e, apesar das visitas recebidas, feitas por estudantes da região e de locais

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Palco de uma história significati-va para compreensão da sociedade brasileira em suas múltiplas faces, o Leitão tem um vizinho de histó-ria ainda muito mais antiga: o “Le-treiro”, furna que guarda inscrições

mais distantes e até de interessados estrangeiros, o povo do Leitão ain-da aguarda o registro escrito de sua história. Um trabalho inicial foi re-alizado pelo professor e Mestre em Extensão Rural e Desenvolvimento Local pela Universidade Federal Ru-ral de Pernambuco, Alfredo Sotero (Unicap). “A pesquisa centra-se em compreender as reconversões cul-turais que a população quilombola procede em seu trabalho e em sua vida, face às propostas das políticas

públicas para a construção do de-senvolvimento na Comunidade”, afir-ma o professor.

Mesmo na tradição oral circulam poucas histórias sobre a formação da comunidade do Leitão da Carapuça. Também os integrantes das famílias são econômicos em transmitir aos novos membros a história dos seus antepassados. Invisíveis durante muito tempo, depois de “descobertos” os descendentes quilombolas correm o risco de terem sua história apagada.

O Leitão reunia as condições ide-ais para a formação de um quilombo. Situado na Bacia Sedimentar de Betâ-nia, a área é um mesoclima, por isso apresenta índice de chuvas maior que a média do semiárido, tem lençóis freáticos mais generosos e um solo fértil, o que propiciava a plantação de roças para sobrevivência. Além disso, remoto, cercado de montanhas, de muito difícil acesso, o local deixava a salvo da perseguição dos senhores os negros rebelados.

A pré-história mora ao lado

rupestres feitas há muitos séculos. Segundo o arqueólogo do Iphan Onésimo Jerônimo, “O local era pródigo em frutos e rico em ani-mais”, por isso atraía os homens primitivos.

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Mais velha representante da comuni-dade do Leitão da Carapuça, aos 94 anos, Dona Messias conserva plena lucidez, e caminha, mesmo com cer-tas limitações. É uma “rezadeira” de novenas e “cantadeira” de antigos e longos “benditos” nas missas e outras cerimônias religiosas.

É ela a personagem principal na cerimônia em que velam os mortos, as sentinelas, em que desfia extensos e pesarosos cantos. “Hoje em dia o povo não quer mais, acha muito pe-noso, mas quando é parente da gente eu canto”, afirma Dona Messias. Ela é a última da comunidade que domina este ritual.

Durante a entrevista, soltou a voz firme e grave para demonstrar um dos cantos que entoa nas sentine-las, O pranto de Nossa Senhora. “Tão contrita e tão aflita/Estava a Virgem bendita/Mãe do nosso redentor,/O qual chorava e gemia/Suas penas cruéis e via/De Jesus meu doce amor. /Vós nem sentis nem chorava/De ver a mãe de Deus preclara/De dores tão trespassada/Vós nem se entristecia/Nem se compadecia/De ver mãe tão penalizada./Tem de misericórdia, ai Senhor/Tem de misericórdia, ai de nós.”

“Eu não tenho leitura”, diz, “mas aprendi tudo [orações e hinos] com meu pai”.

No sítio Lajedo, onde mora,

dedica todo mês de maio uma no-vena a Maria, que era feita em casa, mas agora a comunidade construiu uma capela, que passou a receber a novena e outras obrigações católicas.

Ela trabalhou a vida inteira na roça e fala das secas que enfrentou. “Eu me alembro da de 28 e da de 32, as pior”, diz em alusão às estiagens de 1928 e 1932 no Sertão. Afirma: “meu pai não, mas meu avô foi cativo”.

Boa contadora de histórias, narra a demanda que sua família teve com a Igreja Católica porque um padre reti-rou da igreja do Quitimbu a imagem de Nossa Senhora do Rosário, doada como agradecimento pela Abolição da Escravatura, e à qual devotam uma novena todo mês de dezembro.

Faz uma cara séria e um pouco enfurecida quando conta a passa-gem em que a santa é subtraída e ri quando narra o desfecho feliz da história: a volta da santa à igreja.

A grande mãe

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A renúncia à aposentadoria recebida para pleitear outra mais vantajosa vem sendo uma prática recorrente nos últimos anos. Este livro apresenta um seguro instrumento para todos aqueles que desejam esclarecer as complexas questões envolvendo o tema, além de um capítulo de perguntas e respostas e modelos de peças processuais. Os autores são especialistas em Direito Tributário e Previdenciário e atuam como professores universitários.

A mais nova edição da Série Carreiras Federais proporciona um estudo sistemático, analítico e crítico do Direito Eleitoral. A obra, que traz as últimas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para as eleições de 2014 e a jurisprudência mais recente sobre o tema, destina-se tanto àqueles que desejam ingressar nas carreiras jurídicas federais como a agentes políticos, servidores, advogados, professores e demais profissionais da área jurídica.

AutorRui de Figueiredo Marcos, Carlos Fernando Mathias e Ibsen NoronhaEditora Forense Universi-tária (Grupo GEN) Autor

Vinícius Pacheco FluminhanEditora Juruá

História do Direito Brasileiro

AutorRodrigo TenórioEditora Método (Grupo GEN)

Direito Eleitoral

Autor Camila de Jesus Mello GonçalvesEditora Juruá

Transexualidade e Direitos Humanos - O Reconhecimento da Identidade de Gênero entre os Direitos da Personalidade

SUS versus Tribunais - Limites e Possibilidades para uma Intervenção Judicial Legítima

O tema da transexualidade é atual e desafia a compreensão de profissionais de diversas áreas. No meio jurídico surgem questões como a alteração no registro civil do nome e do sexo do transexual. Este livro aprofunda o assunto de maneira interdisciplinar sob a vertente do princípio da dignidade da pessoa humana. A autora é magistrada, especialista em Direitos Humanos pela USP e professora universitária.

A obra propõe uma tipologia das demandas judiciais surgidas contra o SUS, que vem crescendo nos últimos anos, numa abordagem voltada para o Estado como prestador de serviço. O advogado e professor universitário Vinícius Pacheco Fluminhan discute o tema relevante e atual propondo a utilização de tutelas coletivas às tutelas individuais como forma de melhor preservar o princípio democrático e igualitário.

Desaposentação

Autor Dávio Antonio Prado Zarzana e Dávio Antonio Prado Zarzana JúniorEditora Elsevier

Direito Constitucional do Trabalho – da análise dogmática à concretização de questões polêmicas

Autor Tereza Aparecida Asta Germignani e Daniel GemignanEditora LTr

Na prateleira

Lançado pela desembargadora e vice-diretora da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP), Tereza Aparecida Asta Gemignani com o auditor fiscal do trabalho Daniel Gemignani, o livro analisa a constitucionalização do Direito do Trabalho e seus efeitos nas questões trabalhistas. Os temas e questões propostos são discutidos com base na doutrina e no estudo de casos concretos.

O livro trata da história do Direto no Brasil desde a época colonial até o século XXI. Em 21 capítulos, os autores refletem o ponto de vista doutrinal e o modo histórico de pensar o direito. Assinam a obra o magistrado e professor aposentado da UnB ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça, Carlos Fernando Mathias, o professor da Faculdade de Coimbra, Rui de Figueiredo Marcos e o doutorando Ibsen Noronha.

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Abrir valetas, plantar, limpar, adubar, tom-bar, cortar cana. São tarefas que fazem do

cotidiano dos canavieiros uma atividade peno-sa. Mas esta vida extenuante não os impede de sonhar a festa, a dança, o simbolismo, a arte. Talvez até os inspire.

Os moradores do engenho Cumbi, em Na-zaré da Mata (50 km do Recife), vestem-se de cores e animação no Maracatu Rural, criando uma alegre realidade que contrasta com o árduo dia a dia. O maracatu é uma tradição que faz parte do acervo cultural de Pernambuco.

Outro lado do trabalhador rural

stela Maris

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Trabalho infantil: tolerância e falso dilema“É melhor a criança estar trabalhando ou estar roubando?”. Essa é uma pergunta que muitas pessoas fazem, optando pela resposta óbvia: “É melhor estar trabalhando.” O problema é que a questão está mal colocada. O melhor é a criança estar estudando e brincando. Trabalhar ou roubar não devem ser as alternativas

A exploração da mão de obra de crianças e adolescentes ainda

é praticada em muitos países, como no Brasil, em geral nas regiões eco-nomicamente menos favorecidas, por causa da necessidade de renda familiar, principalmente na camada mais pobre da população, onde se registra maior índice de natalidade.

Mesmo com muitas normas e re-gulamentações proibindo o trabalho infantil, essa exploração ainda é alta nos municípios brasileiros, seja nos centros urbanos, seja em áreas rurais. O governo do Brasil se comprometeu a erradicar, até 2016, as piores for-mas de trabalho infantil e, até 2020, todas as formas dessa exploração. Mas, segundo o Instituto Brasilei-ro de Geografia e Estatística (ibge), ainda há muitos jovens em situação de trabalho irregular no país.

De acordo com o Instituto, dados de 2012, há no país 42.139.454 crian-ças e adolescentes, sendo 3.517.540 em situação de trabalho. Em Per-nambuco, são 2.076.781 crianças e adolescentes, com 137.593 em situação de exploração.

Ainda segundo o ibge, no Brasil, 258 mil crianças e jovens realizam trabalho doméstico nas casas de ou-tras pessoas e a grande maioria (94%) é de meninas. O Trabalho Infantil nos centros urbanos envolve crianças que trabalham nas feiras livres, em lixões e que vendem produtos nas avenidas e semáforos, além das que são aliciadas pelo narcotráfico. No

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texto: Fábio nunes

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O trabalho em canaviais, em minas de carvão, em funilarias, em cutelarias (locais onde se fabricam instrumentos de corte), na metalurgia e junto a fornos quentes são formas nocivas de trabalho infantil registradas no Brasil.

campo, trabalham 450 mil meninos e meninas, segundo o ibge, sendo que quase 75% dessas crianças estão na agricultura familiar, sem receber pelos serviços realizados.

Estatísticas de 2012 da Organiza-ção Internacional do Trabalho (oit) mostram um panorama mundial em que 168 milhões de crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, es-tão em situação de trabalho infantil, cerca de 11% da totalidade da popu-lação infantil e mais da metade (85 milhões) está envolvida com traba-lhos perigosos. De 2000 a 2012, o trabalho precoce vem apresentando uma redução, com 78 milhões de crianças a menos, representando uma queda de 33%.

Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (eca), a pessoa é considerada criança até os 12 doze anos incompletos e adolescente, dos 12 completos aos 18 anos incom-pletos. O eca conceitua Trabalho Infantil como aquele realizado por crianças ou adolescentes com idade inferior a 16 anos, a não ser na con-dição de aprendiz, quando a idade mínima permitida passa a ser de 14 anos. No Brasil, a Constituição Federal (cf) admite o trabalho, a partir dos 16 anos, exceto nos ca-sos de trabalho noturno, perigoso ou insalubre, para os quais a idade mínima é 18 anos. A Consolidação das Leis do Trabalho (clt) garante ao trabalhador adolescente entre 14 e 18 anos a proibição do trabalho

em locais prejudiciais à sua forma-ção, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, e em ho-rários e locais que não permitam a frequência à escola.

A oit considera as “piores formas de trabalho infantil” certas as ativi-dades mais nocivas e cruéis aos jo-vens, como o trabalho escravo, o uso de crianças em conflitos armados, a prostituição de menores e o uso de jo-vens na produção e tráfico de drogas.

Em um recente relatório, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (unicef) afirma que uma aborda-gem integrada envolvendo governos, organizações internacionais, socie-dade civil, setor privado, os próprios jovens e suas famílias é a chave para a eliminação do trabalho infantil. Isso envolve o apoio às famílias, a melhoria da qualidade da educação, a prevenção da violência nos lares e nas escolas, o enfrentamento da pobreza e das desigualdades e a mudança na cultura que trata o trabalho infantil como algo natural.

Contribuindo para erradicar o problema social, o Programa Inter-nacional da oit para a Eliminação do Trabalho Infantil (ipec), imple-mentado no Brasil desde 1992, tem mais de 100 ações de combate ao trabalho infantil, em todo o territó-rio nacional. Em 12 anos de atuação, o ipec conseguiu retirar do trabalho mais de 800 mil crianças.

A Justiça do Trabalho também vem agindo em busca da erradicação

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Fruto de uma parceria entre o tst, o csjt e o trt da 2ª Região (sp), a revista em quadrinhos “Trabalho Infantil, nem de brincadeira”, desenhada pelo cartunista Maurício de Sousa, foi lançada em outubro de 2013, com os personagens da Turma da Mônica. O gibi traz situações que explicam o que é o trabalho infantil, além de direitos e deveres dos menores, mostrando que todas as histórias com crianças e adolescentes devem ter um final feliz.

do trabalho infantil no país. Em 2013, uma iniciativa do Tribunal Superior do Trabalho (tst) e do Conselho Su-perior da Justiça do Trabalho (csjt) instituiu o Programa de Combate ao Trabalho Infantil, cujo objetivo é elaborar ações em prol da erradi-cação dessa prática e da formação profissional do adolescente.

O Tribunal Regional do Traba-lho da 6ª Região (trt-pe) indicou ao csjt dois magistrados: o de-sembargador Fábio Farias e a juí-za ouvidora Patrícia Brandão para atuarem como gestores regionais do Programa no âmbito da respectiva área de jurisdição. O desembarga-dor Fábio Farias destaca que existe a ideia equivocada de que o mundo

se divide em duas porções antagôni-cas: ou o jovem está trabalhando ou está roubando quando na verdade pôr uma criança para trabalhar é privá-la do seu desenvolvimento.

“Eu acredito em muitas das pes-soas que estão envolvidas na exe-cução da política de erradicação do trabalho infantil, gerando uma união de esforços nesse combate. Cada vez mais procuramos ampliar o conjunto de órgãos públicos e privados e pessoas físicas, além da associação com outros parceiros, em campanhas, debates, palestras para a execução de movimentos de esclarecimentos junto a nossa comunidade”, comentou o magis-trado.

A juíza ouvidora, Patrícia Bran-dão, considera que muitos são os desafios, sobretudo se considera-do o grande número de crianças e adolescentes atuando no mercado informal. Para a magistrada, a erra-dicação depende de investimentos na área de educação e intensificação das fiscalizações, em uma conjun-ção de esforços. Ela lembra que a proteção da criança e do adoles-cente não é dever apenas do Estado, mas também da família e de toda sociedade.

“É um equívoco imaginar que o ingresso precoce no mercado de trabalho afaste o jovem da criminali-dade. As crianças e adolescentes que começam a trabalhar desde cedo, a exemplo daquelas que atuam nas ruas e feiras livres, estão muito mais vulneráveis à violência”. Para a magis-trada do trt-pe, é preciso combater a cultura de que o trabalho infantil é normal e positivo para a formação do caráter. Ela ainda destaca que a Ouvidoria do trt-pe também está engajada na defesa desta causa, recepcionando e direcionando as denúncias aos órgãos competentes.

Em Pernambuco, instituições ligadas à erradicação do Traba-lho Infantil lançaram a campanha “Trabalho Infantil não é legal. Não compre”. A articulação da campa-nha envolve o trt-pe, o Ministé-rio do Trabalho e Emprego (mte), o Ministério Público do Trabalho (mpt), o Ministério Público de

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Mar

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Ban

jaPernambuco (mppe), o Tribunal de Justiça de Pernambuco (tjpe) e o Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Fepetipe).

A campanha procura conscien-tizar a população a não comprar bens e serviços oferecidos por crian-ças e adolescentes e pretende mobi-lizar as pessoas a usarem o Disque Denúncia, que vai contribuir para a fiscalização e ação dos órgãos pú-blicos por meio de ligações para o número 100.

Para a auditora fiscal da Supe-rintendência Regional do Trabalho e Emprego (srte/pe), Paula Neves, o trabalho infantil é um problema multicausal, que demanda uma atu-ação concentrada e sinérgica dos órgãos governamentais, sociedade civil, famílias e população em ge-ral. A srte/pe realizou, entre 2011 e 2013, 1.414 fiscalizações de combate ao trabalho infantil em 91 municí-pios pernambucanos, sendo encon-tradas 3.328 crianças e adolescentes trabalhando. Somente de janeiro a maio de 2014, foram 350 fiscaliza-ções, sendo identificados 320 jovens nessa situação.

“Desde 2012, iniciamos o Pro-grama de Erradicação do Trabalho Infantil e Incentivo à Aprendizagem Profissional em Pernambuco, através do qual os jovens resgatados, com idade a partir de 14 anos, são enca-minhados para programas de apren-dizagem, com o acompanhamento

de assistentes sociais e psicólogos de instituições formadoras parceiras do programa”, destacou a auditora.

De acordo com o procurador do mpt Leonardo Osório Mendonça, a aquisição de produtos e serviços oferecidos por crianças, a princípio, pode parecer uma boa ação para minimizar a condição de pobre-za do menor, mas é, na verdade, a perpetuação da miséria. “É preciso desmistificar o pensamento de que o trabalho infantil é algo bom. Cul-turalmente, o brasileiro é tolerante a essa ideia, por considerar o trabalho uma opção para manter a criança e o adolescente longe da criminalida-de e do ócio”.

Segundo o procurador, erradi-car o trabalho infantil é uma meta difícil e ousada e a luta contra esse problema é de toda a sociedade, sendo necessário um maior envol-vimento de instituições públicas e

privadas. “Se todos se engajarem e cada um fizer seu papel dentro de suas possibilidades e de acordo com suas obrigações, é possível que den-tro de um espaço razoável de tempo possamos erradicar o problema”.

Ele defende que a única opção para a criança é estudar. “Só existe criança na rua vendendo produtos porque há alguém comprando dela. É preciso que os governos implemen-tem políticas públicas voltadas a com-bater o trabalho infantil. Não basta apenas afastar a criança dessa prática, deve-se oferecer condições adequadas a sua idade, para que ela possa sonhar com um futuro melhor”.

“É preciso desmistificar o pensamento de que o trabalho infantil é algo bom”

Procurador do Trabalho Leonardo Osório

leonardo osório

Procurador do trabalho

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Fotos: stela Maris

Trabalhadores rurais mais próximos dos urbanosA agricultura brasileira evoluiu de extensas monoculturas para a diversificação da produção nos dias atuais, tanto para subsistência quanto para comércio e exportação. Segundo previsão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (ibge), a produção para 2014 está estimada em 184,2 milhões de toneladas, um aumento de 1,8% em relação a 2013. Tema do Programa Trabalho Seguro do Tribunal Superior do Trabalho (tst) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (csJt) em 2014 e parte fundamental do setor primário da economia, era de se esperar que as condições do trabalhador no campo compartilhassem o avanço das tecnologias de plantio e colheita. A equipe da Revista Dialogar viajou para São Lourenço da Mata, município-sede da Copa de Mundo, para conferir de perto a situação dos trabalhadores rurais.

texto: iúri Moreira

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A constatação é de que a situa-ção melhorou. “Hoje a gente

se encontra numa situação melhor, com mais proteção e conhecimento do produto que estamos trabalhan-do”, conta o aplicador de herbicida da Usina São José, Edinaldo Luiz de Souza. No entanto, ainda falta muito para que as condições sejam ideais. “Nós trabalhamos com produtos de alta periculosidade e não recebemos a insalubridade, por exemplo. Apesar de contar com Equipamentos e Pro-teção Individual (epi), como botas, chapéu, avental, luvas e perneira, o respirador fornecido é de má quali-dade, o que faz com que a gente te-nha dificuldades para respirar. Nossa atividade também não é registrada

na carteira de trabalho e a maioria nem sabe os seus direitos”, reclama.

Presidente do sindicato dos tra-balhadores rurais de São Lourenço da Mata, Antônio Ferreira Nóbrega, engrossa o coro: “Somente em áreas de assentamento são mais de três mil famílias, além de seis mil pequenos agricultores aqui em São Lourenço. Mesmo assim nós não temos uma secretaria de agricultura.” Antônio Nóbrega relata, ainda, que os agri-cultores não contam com assistência técnica nem maquinário e os empre-gadores não cumprem as convenções coletivas. “Para se ter uma ideia, os trabalhadores das usinas têm que tombar três, quatro toneladas de cana nas costas, o que é um absurdo.

Os exames médicos periódicos, que deveriam ser feitos a cada três meses, são ignorados”, avisa.

O advogado do Sindaçúcar, Marcelo Brandão Lopes, discorda. “Não é verdade que não existe o pagamento de adicional de insa-lubridade. Ele existe em todas as hipóteses em que há um laudo pe-ricial informando que o ambiente é insalubre. Também há, inclusive, uma comissão paritária, que está analisando e fazendo experiências de campo sobre a questão em todo o setor no Estado”, comenta. Ainda de acordo com ele, os respiradores atendem ao “Compromisso Nacio-nal” e possuem Certificado de Apro-vação de Equipamento de Proteção

Sindicalista Antônio Ferreira Nóbrega aponta dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores

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Individual (caepi), expedido pela secretaria de inspeção do trabalho do Ministério do Trabalho e Em-prego. Brandão também revela que a Usina São José contesta as afirma-ções do Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, reafirmando que cumpre religiosamente a tabe-la de tarefas que regula o trabalho por produção no setor, assim como cumpre rigorosamente as determi-nações da Norma Regulamentadora (nr 31) que disciplina a segurança e medicina do trabalho rural, razão pela qual realiza todos os exames médicos previstos.

Para a Procuradora do Minis-tério Público do Trabalho (mpt) Débora Tito, os homens do campo tinham, historicamente, um déficit em relação aos operários urbanos, corrigido apenas no Artigo 7º da Constituição Federal de 1988. “Até então, eles não tinham os mesmos direitos e eram regidos por uma norma específica (Lei 5.889/73) até hoje em vigor, mas com as amplia-ções determinadas com a equipara-ção constante na carta magna. Na prática, entretanto, o trabalho rural ainda precisa de muitos avanços e efetiva implementação da legislação

vigente, com destaque para a Norma Regulamentadora 31 do Ministério do Trabalho e Emprego (mte), que enuncia basilares regras norteado-ras para a salvaguarda da dignidade dos trabalhadores rurais”, pondera.

A Procuradora lembra ainda que, apesar de previstos na Cons-tituição, as dificuldades de fiscali-zação nas localidades isoladas geo-graficamente e fronteiras agrícolas, o distanciamento dos trabalhadores rurais dos sindicatos em algumas localidades, a complexidade de acesso a alguns setores mais con-servadores e o traço de cunho ainda

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Principais diferenças entre trabalhadores urbanos e rurais

URBANO RURAL

Aviso prévio 30 dias, com redução de 2h da jornada diárias ou descanso durante sete dias no decorrer do aviso

30 dias, com um dia de folga por semana

Horário noturno

22h às 5h 20h às 4h para o trabalhador rural da pecuária e das 21h às 5h para o trabalhador da lavoura

Adicional noturno

20% 25%

escravocrata que permeia a hierar-quia em algumas culturas agrícolas constituem os maiores obstáculos ao pleno gozo dos direitos desses trabalhadores. “Esses entraves vêm sendo enfrentados principalmente pelo Ministério Público do Traba-lho e pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Deixando claro que ainda há muito a ser feito, vale ao menos destacar a redução paulatina nos números de trabalho semelhante ao de escravo no setor, na última década, e o incremento de proje-tos preventivos relacionados à área agrícola”, comemora.

Complementando a renda - Ain-da segundo o ibge, aproximadamente 84,4% dos estabelecimentos agrope-cuários do país são da agricultura familiar, correspondendo a apenas 24,3% da área total ocupada por es-tabelecimentos rurais. “Boa parte desses produtores acaba tendo que trabalhar também no corte da cana, pois o tamanho de suas propriedades não permite o sustento. Em média, cada família tem três hectares de terra, quando seriam precisos no mínimo sete para gerar lucro”, revela Nóbrega.

É o caso do agricultor Rober-to Martins da Silva, que começou a trabalhar no corte da cana em abril. “Saio de casa às 4h e traba-lho na cana das 6h às 11h. Depois do almoço, ajudo minha esposa na nossa plantação. Nós cultivamos feijão, coco, inhame, caju, maca-xeira, jambo, banana e manga, que

vendemos nas feiras de Tiúma e São Lourenço. Mas só a feira não sustenta”, conta, revelando a im-portância do salário de r$ 736,00 oriundo da cana.

Para completar o orçamento, vale até tapar buraco das estradas: “A gente conta com a boa vontade dos agricultores que utilizam a estrada para escoar a produção. Eles ajudam com r$ 5,00 ou r$ 10,00, pois sabem que, sem a via, fica complicado le-var as mercadorias para a cidade”, revela o menor j.s., que divide seu tempo entre os estudos e a lavoura da família. “Falta ajuda dos gover-nos municipal, estadual e federal, as estradas vicinais são um caos e a maioria dos agricultores familiares perde parte de suas produções, pois no inverno os carros não chegam até

a lavoura”, completa Nóbrega.Mesmo quem já está estabele-

cido enfrenta dificuldades. “Faz 57 anos que sou agricultor e mesmo assim não tenho direito à aposen-tadoria”, conta José Cândido Caval-cante. No caso dele, a falta de do-cumentação é o problema. “Nasci e me criei em João Alfredo, onde trabalhei no roçado por 40 anos. Daí passei mais 10 anos na enxada e há sete cultivo minha própria terra. Infelizmente só consegui compro-var 20 anos junto ao inss” lamenta. Mesmo assim, José Cândido acorda todos os dias para cultivar macaxei-ra, mandioca, feijão e milho, entre outros, e não esconde o orgulho: “Possuo 900 pés de plantas. Quan-do cheguei aqui não tinha 30, e tudo morrendo”.  

*Todos os direitos básicos já estão equiparados, de acordo com o art. 7º da CF (salários, férias, proteção ao trabalho, décimo terceiro salário etc). Nenhuma diferença que denote uma diminuição ou discriminação do trabalhador rural poderá ser admitida.

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Há quatro anos, todas as quartas-feiras, o Tribunal

Regional do Trabalho da 6ª Re-gião (trt-pe) recebe a feirinha de produtos orgânicos da Associação dos Produtores Rurais de Palmeira (Aprup), de Glória de Goitá, Zona da Mata pernambucana, a 45 km do Recife. Parceria entre o trt-pe e o Serviço de Tecnologia Alternativa (Serta), a feira teve início na Semana do Meio Ambiente de 2009, numa ação da Comissão Socioambiental com o objetivo de beneficiar famí-lias produtoras e trazer produtos de boa qualidade para os servidores e magistrados do Regional. 

 O Serta é uma Organização Não Governamental que trabalha com

Feira de produtos orgânicos: mais saúde na mesa e melhor vida no campo

agricultores orgânicos na região de Glória de Goitá e na cidade de Ibimirim (316 km do Recife) Sertão do Moxotó. “Eu já conhecia o traba-lho deles e tinha muita vontade de desenvolver alguma parceria. Daí calhou que um dos projetos estraté-gicos da Comissão Socioambiental era estruturar essa feira. Fizemos a primeira edição num dia da Se-mana do Meio Ambiente de 2009 e depois fizemos outra experiência na Semana da Saúde. Nos dois ca-sos, a procura foi muito grande e os servidores perguntavam por que ela não poderia ser periódica. Depois de várias conversas com a Admi-nistração, ela passou a acontecer semanalmente, primeiramente nas

varas do Recife, na sudene, no final de 2009, e a partir da Semana do Meio Ambiente de 2010 na sede do trt-pe, sempre às quartas-feiras”, informa o presidente da Comissão Socioambiental e assistente social do trt, Renatto Pinto.

Desde então, são sempre de cin-co a seis bancos atendendo os ser-vidores do Regional, além de atrair funcionários de empresas e orga-nizações instaladas no entorno do trt-pe. E o sucesso foi tamanho que outros órgãos passaram a organizá- la. “Depois da nossa experiência, ou-tros tribunais nos procuraram para implantar ações semelhantes, como o Tribunal de Contas, tj-pe, tce e o tre”, revela. Detalhe importante é

Fotos: danilo galvão

texto: iúri Moreira

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que a feira do Tribunal já foi inspe-cionada e aprovada pela Agência de Defesa Agropecuária de Pernambu-co (Adagro) que faz os exames pe-riodicamente. “Uma vez por ano, eles vêm e coletam amostras para serem analisadas nos laboratórios do Ins-tituto de Tecnologia de Pernambuco (Itep), no intuito de comprovar se os produtos são mesmo orgânicos. Nas vezes em que isto aconteceu, tanto aqui quanto na Sudene, as amostras passaram sem nenhum problema”, conclui Renatto.

Em suas primeiras edições, a feirinha era mantida por um gru-po de produtores de Pombos e Chã Grande. No entanto, o custo de pro-dução e do frete era muito alto. “Foi quando nos juntamos a eles, o que gerou um impulso maior, com mais

divulgação e maior variedade de produtos. Hoje praticamente somos só nós da Aprup, ficaram apenas duas pessoas de Pombos”, lembra o produtor e presidente da associação, Severino Arruda, conhecido por “Biu da Boia”. De acordo com ele, a Aprup é composta por 62 famílias de agricultores, num total de 42 pro-dutores, todos de lavoura orgânica.

“Nós produzimos chuchu, ma-mão, couve, salsinha, salsão, couve--flor, beterraba, cenoura, pimenta, brócolis, milho, alho-poró, rúcula, coentro, tomate, feijão, quatro varie-dades de alface... e tudo orgânico! Usamos apenas adubos naturais, como esterco e sobras de produção e defensivos agrícolas também na-turais como calda bordalesa – fei-ta a partir da folha da mamona e

também conhecida como Casca de Azeite –, e a folha do Nim, árvore de origem indiana utilizada como inseticida natural no controle das pragas agrícolas”, revela o produtor Edílson Bonfim de Arruda.

Trabalho e consumidor não faltam: “Nossa produção semanal média é de 52 toneladas e as perdas são mínimas, pois o que sobra acaba virando adubo natural. Atualmente promovemos feiras quase todos os dias. Além do trt, também esta-mos no Tribunal de Contas; tre; Secretaria de Educação; Shopping Recife; Canal do Cavouco (no bair-ro recifense da Iputinga); Fortim de Olinda; Ceasa e Cordeiro, em vários horários”, enumera Biu. 

Com a procura dos consumido-res pelos orgânicos, a vida na roça

“Depois da nossa experiência, outros tribunais nos procuraram para implantar ações semelhantes, como o Tribunal de Contas, de Justiça, de Contas do Estado e o Regional Eleitoral.”

renatto Pinto

assistente social do trt-Pe

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se transformou: “Depois que mon-tamos a associação e começamos a trabalhar com os orgânicos, a vida de todo mundo melhorou. Antiga-mente a gente trabalhava para os ou-tros. Hoje isso acabou: não temos intermediários, trabalhamos para nós mesmos e somos os donos da produção e dos lucros. Cada vez in-vestimos mais, cada vez tem mais feira e o resultado é que todo mundo vive tranquilo. Eu, por exemplo, já estou até contratando mão de obra fora”, comemora Edílson, um dos integrantes da Aprup.

Quem ganha com isso são os

servidores do Tribunal: “Frequen-to a feirinha desde o início e acho-a uma maravilha, pois a gente usufrui de produtos naturais, sem agrotó-xicos e ainda agiliza a vida, pois já fazemos a feira no próprio trabalho”, elogia a servidora do Setor de Ma-lote, Jaqueline Albuquerque. Carlos Fernandes, servidor do gabinete da desembargadora Dinah Figueirêdo Bernardo, é outro que bate ponto na feira desde o seu início. “Sempre fiz questão de participar, é uma gran-de iniciativa e os produtos são de excelente qualidade. A avaliação é positivíssima”, atesta.

Severino Arruda (Biu da Boia), presidente da Aprup

Feirinha acontece há mais de quatro anos, toda quarta-feira

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Muita gente mora em casas com jardins, quintais ou outras áreas verdades disponíveis e não sabe que pode cultivar hortaliças e temperos dentro de casa. Além de uma volta às origens, a horta doméstica pode se transformar num belo hobby. Basta um pouco de sol, adubo natural e cuidado na irrigação. “É importante que a área não seja compartilhada com cães e gatos, pois eles podem acabar tudo. Ela deve receber sol e ser regada de uma a duas vezes por dia, dependendo da quantidade de luz solar. O ideal é que seja logo pela manhã e no fim da tarde”, avisa Biu.

O canteiro deve ser de terra fofa com 20cm de altura. “Basta fazer um buraquinho com 5cm de profundidade e 10cm de distância entre as sementes e cobrir de esterco que as hortaliças vão crescer sensacionais. Pode-se plantar feijão, alface, coentro, cebolinha, tomate, mamão... Qualquer coisa dá!”, conclui. Mesmo quem mora em apartamento e sofre com limitação de espaço pode montar uma horta caseira suspensa, escolhendo espécies de pequeno porte e reutilizando garrafas pet. Numa só tacada, a horta suspensa reaproveita materiais que iriam para o lixo, é decorativa e deixa um aroma agradável no ambiente.

Faça sua horta orgânica em casa

Elys

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Jogar dominó, passar a tarde numa praça ou simplesmente descansar

após anos de dedicação ao emprego. Essa visão que se tem do trabalhador aposentado, no Brasil, aparenta não mais condizer com a realidade atual. De acordo com pesquisa do Instituto Somatório, com dados referentes ao ano de 2013, 25% dos 14 milhões de aposentados voltaram ao mercado de trabalho ou decidiram manter-se nos postos de emprego. Em 2009, esse número era de 20%.

O avanço de pessoas mais velhas na ativa também é constatado nos dados da Pesquisa Mensal de Em-prego do Instituto Brasileiro de Ge-ografia e Estatística (ibge). No ano passado, se comparado a 2012, a faixa etária que mais cresceu na População Economicamente Ativa (pea) foi a do grupo com mais de 50 anos de idade. Um aumento de 5,5% .

Os dados obtidos possibilitam contextualizar a situação do traba-lhador aposentado no País. O advo-gado Paulo Perazzo acompanha essa

recente mudança de postura de em-pregados e empregadores. “A gente se arraigou a uma legislação protetiva, mas que está desatualizada. Aqui, no Brasil, a média é conseguir se apo-sentar aos 50 anos de idade. Então, a gente se aposenta relativamente cedo. Isso faz com que pessoas com plena capacidade laboral não quei-ram deixar o mercado de trabalho naquele momento”, afirma.

A pesquisa do ibge ainda con-firma uma das razões pelas quais os aposentados e pensionistas decidem voltar ao trabalho. Esse grupo, mui-tas vezes, assume mais da metade da renda familiar. Essa participa-ção é maior à medida que o estrato social fica menor. Na classe A, por exemplo, as finanças de aposentados respondem por 55% da renda da fa-mília; na classe D, por 88%.

O desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (trt-pe), Ruy Salathiel de Albu-querque e Mello Ventura, aponta três razões para a ocorrência desse

De volta à ativa

Fenômeno recente no Brasil, um quarto dos mais de 14 milhões de aposentados decidiu retornar ao trabalho nos últimos anos. A jornaleira Ivone de Lima e o professor Genno Silva integram esse grupo

Dados: Instituto Somatório / 2013

Mercado de trabalho

14 milhões de aposentandos no Brasil

25% na ativa

fenômeno. “O retorno do aposenta-do ao labor decorre da melhoria nas condições de saúde da população; da possibilidade da complementação da renda, combinada com o crescimen-to da oferta de emprego; e da opor-tunidade de obter uma mudança no patamar da aposentadoria através de um pedido de ‘desaposentação’, uma renúncia da aposentadoria. Esta última situação é polêmica, do ponto de vista jurídico, mas que, na realidade, vem contribuindo para a volta do aposentado ao mercado de trabalho”, pontua.

Dan

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texto: Francisco shiMada

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Emprego e diversão

Um exemplo de disposição para o trabalho e que se encaixa nas infor-mações apresentadas vem da jor-naleira Ivone Fernandes de Lima, ou dona Ivone, como prefere ser chamada. Aos 67 anos de idade, ela acorda às 3h30, de segunda a sábado, realiza afazeres domésticos e sai para vender jornais no cruza-mento da rua Antônio Falcão com a avenida Engenheiro Domingos Ferreira, no bairro de Boa Viagem, no Recife (pe).

Mineira, dona Ivone vive em Pernambuco há mais de 60 anos. Ela mora só numa casa alugada, em Brasília Formosa (Teimosa) e recebe ajuda dos parentes nas varia-das despesas, com destaque para a compra de medicamentos. “Já fiz ci-rurgia de vesícula e cisto no ovário. Agora estou cuidando da tireóide. Também gasto muito com remédios de pressão”, explica. A jornaleira, que já trabalhou de carteira assina-da, recebe meio salário mínimo de pensão pela morte do marido.

Dona Ivone vive a rotina da co-mercialização de jornais há mais de uma década. Ela recebe de trinta a sessenta centavos de real por cada exemplar vendido, o que ajuda a complementar a renda. Num bom dia, chega a vender 40. “As notí-cias policiais vendem muito mais, mas isso vem mudando. Quando a matéria é boa, vendo tudo”, diz a

jornaleira, que tem preferência por uma notícia específica, independente das vendas: “Eu só gosto de ver quan-do meu Santinha ganha. Para mim, é a melhor manchete”, completa a fanática torcedora do Santa Cruz.

Figura bastante conhecida, du-rante a entrevista, dona Ivone ace-nou, tirou fotos e recebeu o carinho de outras pessoas. Ela ressalta que a venda de jornais complementa a renda, mas funciona mais como uma terapia. “Sou muito querida aqui. Você viu os meninos que pas-saram no carro falando comigo? Eu conheço todo mundo. Para mim, isso é uma terapia, uma diversão. É uma alegria estar aqui.”

O semblante descontraído da jornaleira apenas é interrompido ao lembrar-se de quando ela foi dis-criminada, no trabalho, por conta da idade. “Um jornal disse que era muito velha para ficar no shopping vendendo jornal; eu fui para a rua. Eles diziam ‘a senhora tá muito ve-lha, vai voltar pro sinal’. Conheci uma advogada, cliente minha, que me ajudou. Já precisei da Justiça dessa forma, porque eles me dis-criminaram”, revelou a vendedora, que entrou com uma ação contra a empresa e foi indenizada.

ivone Fernandes de liMa

67 anos, Jornaleira

Foto

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Voltar a viver

Quem também decidiu retornar ao mercado de trabalho após a apo-sentadoria foi o professor de inglês Genival Antonio da Silva, que pre-fere não revelar a idade por conta de marketing pessoal. “Pode escre-ver na matéria que eu tenho mais de cem anos”, brinca. Genno Silva, como é conhecido, mora e trabalha no bairro de Maranguape II, loca-lizado na cidade do Paulista (pe).

O professor começou a lecionar na segunda metade da década de 1970 e escolheu a área de Letras

por questão vocacional. “Naquela época, além dos conteúdos peda-gógicos, nós aprendíamos até como segurar os objetos em sala de aula: apagador na mão esquerda; giz, na direita. Questões de ética e postura profissional”, relembra, com saudo-sismo sadio, antes de falar sobre a saída das salas de aula. “Eu estava cansado da vida educacional. Parei em junho de 2005, mas voltei, no começo de 2006, por arrependi-mento. Voltei para não me sentir uma pessoa inativa, mas tive de me adaptar às mudanças e a conviver em parceria com professores mais jovens”, destaca Genno Silva.

Os seis meses longe da sala de aula fizeram mal ao professor, que não se via mais útil para a sociedade. “Eu tinha depressão por estar em casa. Eu me sentia como uma pessoa sem vida, que teria uma morte rápida, sem fazer nada. Foi minha mulher quem percebeu que eu não queria mais viver, que eu não me cuidava mais. Precisava agir”, declara. A mudança de postura trouxe novo ânimo.

A exemplo da jornaleira, o pro-fessor Genno Silva acorda cedo. Às 5h, de segunda a sábado, ele inicia as atividades que seguirão, duran-te todo o dia, entre alunos, notas, livros e cadernetas. O professor se divide entre duas escolas particu-lares, além de manter um curso de inglês e estar prestes a lançar um livro didático. Com especialização nos Estados Unidos em fonética in-ternacional e sistema educacional, apenas de experiência em sala de aula, ele tem mais de 35 anos: “Ainda posso contribuir, ajudar as pessoas”.

Ele também passou por situa-ções de incômodo relacionadas à discriminação, dentro e fora do ambiente de trabalho, por conta da idade. “As pessoas me viam como um velho caduco, que não servia mais para nada. Isso me fez muito mal. Agora, muita gente me vê ape-nas como um caduco, mas com um degrau a mais, com mais experiên-cia e qualificação”, revelou.

Stela Maris

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Francisco Shimada

genival antonio da silva

idade não revelada, ProFessor

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Questão de Justiça

Casos de discriminação, a exem-plo dos sofridos pela jornaleira e pelo professor, são acompanhados pelo Ministério Público do Trabalho (mpt). A procuradora Lorena Bravo acredita que é preciso ter uma aten-ção diferenciada, não excludente, sobre esse trabalhador no ambiente de trabalho. “O mpt não tem uma atuação específica em relação aos aposentados. A gente observa se, no contexto desse retorno, esse aposen-tado, na condição especial de idoso, está sofrendo alguma espécie de dis-criminação e violação do contrato de trabalho dele”, explica.

A procuradora ressalta a atuação

do Ministério ao tratar da condição do trabalhador aposentado e idoso. “Vamos agir em qualquer caso de descumprimento de normas traba-lhista e também na situação especí-fica do idoso aposentado, que voltou ao mercado de trabalho. Infelizmen-te a gente vê que, no caso do assédio moral, existem alguns grupos que es-tão mais propensos à discriminação no ambiente de trabalho. Colocar o idoso dentro desse grupo é realmen-te devido”, diz a procuradora.

Cientes do papel exercido para a sociedade e o bem-estar adquirido com o emprego, tanto a jornaleira Ivone de Lima quanto o professor

Genno Silva ainda pretendem conti-nuar por muito tempo no mercado de trabalho. “Eu já disse ao chape-leiro, o rapaz que entrega o jornal: quando eu não aguentar mais, eu largo a bata e entrego o cargo. Mas, enquanto eu aguentar, eu não paro, não. Eu gosto tanto daqui. Eu ado-ro tá aqui no pedaço”, declara dona Ivone. “Não quero me sentir um inativo. Só paro na morte. Além da família, o trabalho é a existência do viver”, afirma Genno Silva. Tempo, qualificação, experiência e boa von-tade, pelo que se pôde observar, não faltam a eles e a tantos outros apo-sentados brasileiros.

“Nesta reinserção no mundo corporativo, a gente tem de ver se o idoso está tendo a garantia dos direitos especiais dele, enquanto cidadão idoso; e, se na qualidade de trabalhador, genericamente falando, ele tem os direitos garantidos.”

Procuradora Lorena Bravo

“Na contratação laboral, o aposentado volta a contribuir para a Previdência Social, sem que isso signifique algum acréscimo no valor da aposentadoria, e tem a carteira profissional devidamente registrada; também haverá recolhimento do fgts.”

Desembargador Ruy Salatiel

“A volta ao mercado de trabalho tem de ser encarada com muita seriedade, com muita sabedoria, para que essa renda extra, que é tão boa hoje, não venha a se transformar num problema futuro, quando a pessoa vier a se jubilar de fato e de direito.”

Advogado Paulo Perazzo

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Para que a brincadeira do Ma-racatu de Baque Solto aconteça

é necessário riscar, cortar, bordar e trançar, práticas milenares na his-tória da humanidade. Com linhas e agulhas; tecidos, tesouras e lante-joulas; fitas e cordões, os brincantes tecem e entretecem, confeccionan-do suas vestimentas e adornos.

A crescente profissionalização do brinquedo vem exigindo a contrata-ção de mais e mais pessoas para esta tarefa, o que não diminui seu caráter lúdico e criativo. Ao contrário, a arte, além de ser uma forma de trabalho, é um meio de expressão e comuni-cação, cujo desenvolvimento supõe a construção coletiva de cultura e, con-sequentemente, a interação entre os indivíduos numa dimensão comum de produção de vida socializada, o que é bem representado pelo Mara-catu de Baque Solto.

Bordando o maracatu

elysangela Freitas

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Quem nunca comprou um pro-duto de beleza ou de higiene

através de um catálogo? Hoje, as famosas revistinhas tradicionais ou eletrônicas estão em todos os lugares, no trabalho, faculdade, academia, cabeleireiro, Facebook etc. O revendedor sabe quando o produto que você usa está em pro-moção ou quando um lançamento pode atraí-lo. O prazo de entrega das empresas diminuiu, e muitos vendedores já fazem estoque pró-prio para atender de imediato aos pedidos dos clientes.

A larga presença dos catálogos se reflete em números na economia: o Brasil é o quarto maior mercado de

vendas diretas no mundo, ficando atrás apenas nos Estados Unidos, Japão e China, conforme estudos do World Federation of Direct Selling Associations (wfdsa). Estima-se que 4,5 milhões de pessoas atuem como revendedores no país, sendo 75% delas mulheres, segundo infor-ma a Associação Brasileira de Em-presas de Vendas Diretas (abevd). Nesse cenário, o consumo de pro-dutos de higiene e beleza é destaque.

Veteranas do setor, as marcas Avon e Natura viram, nos últimos anos, diversas empresas com a mes-ma proposta surgirem ou se expan-direm, a exemplo das nacionais Jequiti e Racco e da estadunidense

Estima-se que 4,5 milhões de pessoas atuem com revendedores no país, sendo 75% delas mulheres.

Danilo Galvão

texto: helen Falcão

O produto vai aonde o cliente estáMesmo em tempos de proliferação de shoppings e comércio eletrônico, as vendas porta a porta representam fatia significativa do mercado

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Mary Kay. Além disso, a gigante O Boticário, que possui cerca de 900 franqueados pelo país e 175 unida-des próprias (dentre lojas e quios-ques), entrou para as vendas diretas em 2011. O grupo também lançou a marca Eudora, concebida para atin-gir essa área de consumo.

Nesse segmento de vendas, a presença feminina é ainda maior. Em algumas empresas, as mulhe-res correspondem a mais de 90% do total de vendedores. O perfil delas, contudo, é diversificado, tanto no aspecto de idade, como no de ocu-pação, formação acadêmica e classe econômica. Em geral, as únicas re-gras para se tornar uma revende-dora são: ter mais de 18 anos e não ter restrições em órgãos de proteção ao crédito.

Cumpridos os requisitos, a in-teressada recebe orientações sobre os produtos e adquire um kit de amostras para iniciar as vendas. Em atividade, é preciso arregimentar e administrar clientes; receber e en-viar pedidos; distribuir produtos e fazer cobranças.

Juridicamente os consultores não possuem vínculo empregatício com o fabricante, pois conforme expli-ca a desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (trt-pe) Maria Clara Saboya Albu-querque Bernardino, não atendem aos três elementos essenciais que caracterizam o contrato individual de trabalho: prestação de serviços de

“Não há exigência de metas a cumprir nem obrigatoriedade de comparecimento à empresa, ou seja, a habitualidade na prestação de serviços não é inerente à atividade de consultora de vendas, mais um óbice para o reconhecimento de vínculo de emprego.”

natureza não eventual, subordinação jurídica e percepção salarial, como contraprestação pelo serviço pres-tado. Os requisitos estão previstos no artigo 3º da clt (Consolidação das Leis do Trabalho).

A desembargadora aponta que, com a subordinação jurídica, o empre-gado fica sujeito ao controle do patrão, que dá ordens e estipula normas de trabalho, como obrigações, horário de serviço e local onde desempenhar as tarefas. “Há de se observar que é de conhecimento geral a forma como se processa a comercialização do material produzido por empre-sas revendedoras de produtos, com vendas porta a porta, alcançando os clientes, até nos locais de trabalho desses. Essas condições, justamente, revelam ser de natureza meramente comercial a relação jurídica mantida entre os consultores de vendas e as empresas correspondentes, onde os produtos são cedidos em consignação,

clara saboya

DESEMBARGADORA DO TRT6

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Investimento inicial – O kit, com amostras e produtos para revender, varia entre R$ 75,00 e R$ 149,00, a depender da instituição. Segundo as empresas, o valor investido é recuperado com a revenda dos itens do kit.

Como funciona

Dan

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o

com revenda a clientes, inclusive, assumindo os riscos da atividade, na medida em que pagam pelo produto não revendido”, pontuou.

Além da ausência de subordina-ção jurídica, a magistrada sinaliza fragilidade no atributo da não even-tualidade: “Não há exigência de me-tas a cumprir nem obrigatoriedade de comparecimento à empresa, ou seja, a habitualidade na prestação de serviços não é inerente à ativi-dade de consultora de vendas, mais

um óbice para o reconhecimento de vínculo de emprego nos moldes previstos no art. 3º da clt”.

Apesar do grande número de profissionais que se dedicam a essa atividade e do volume de capital que o setor mobiliza, o trabalho de con-sultor de vendas rende, normalmen-te, menos de um salário mínimo por mês. A Natura estima que cada re-vendedor ganhe por ano uma mé-dia de r$ 2.047,00, as outras em-presas indagadas nesta matéria não

responderam à pergunta. Quanto às consultoras entrevistas, a maior parte delas calcula receber menos que r$ 725,00 por mês.

Em sua tese de doutorado, (Uni-versidade Estadual de Campinas) intitulada O Make up do trabalho: uma empresa e um milhão de reven-dedoras de cosméticos, a socióloga Ludmila Costhek Abílio trouxe os aspectos da baixa remuneração e au-sência de vínculo empregatício para analisar a questão da informalidade e precarização do trabalho no setor. Além desses pontos, abordou a im-bricada relação de venda /consumo entre as consultoras: “Na maioria dos 30 relatos, as mulheres afirmam que revertem parte de sua comissão em consumo dos produtos, e even-tualmente gastam com ele mais do que recebem com as vendas”, obser-vou a socióloga que entrevistou 30 revendedoras de cosméticos para construir o documento científico.

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Pedido mínimo (para empresa enviar o pedido ou para a consultora obter lucro) – Varia entre R$ 55,00 e R$ 580,00, a depender da empresa e do sistema de pontuação dos produtos.

Lucro – Em média 30% do valor do produto, mas há promoções como “compre 1 e leve 2”.

Outras bonificações – Viagens, descontos em plano de saúde, brindes, cursos e, até, carros.

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Coutinho, 84 anos, 20 deles como representante de venda direta. Já Bernadete Pedroso, a “Betinha”, conta que consegue aumentar seu lucro adquirindo produtos em um mês de promoção e revendendo-o em outro período. Ela avalia que a

provisão também facilita quan-do o cliente quer comprar um

presente de última hora.

O risco do calote foi men-

cionado, se ele acontecer, a consultora

deve cobrir a compra, sob pena de não poder fazer novos pedidos. Por outro lado, caso o produto venha com problemas ou cause alergia ao consumidor, é a empresa que realiza a troca e faz outras ações de pós-venda.

Quanto à relação venda consu-mo próprio, todas as entrevistadas afirmaram adquirir artigos da mar-ca que revendem. A possibilidade de comprar com desconto é tida, in-clusive, como o gatilho para o início da representação. Edvânia da Silva, consultora há aproximadamente sete anos, vai além, e alega ser essa a maior vantagem da ocupação.

No que tange à remuneração, ela é sempre tratada como uma pro-porção direta do esforço e tempo dedicado à atividade de revenda. “Pode-se afirmar que os ganhos va-riam de acordo com o tempo que os revendedores se dedicam à ativida-de e com a rede de relacionamento

Todas as entrevistadas afirmaram adquirir artigos da marca que revendem. A possibilidade de comprar com desconto é tida, inclusive, como o gatilho para o início da representação.

Danilo Galvão

Segundo Ludmila, híbrido tam-bém é o tempo de trabalho e o de descanso. “As indistinções entre tempo de trabalho e de não traba-lho são bastante reconhecíveis: todo tempo torna-se potencial tempo de trabalho”, analisou.

Na tese, também foi levantado o aspecto da transferência dos riscos empresa-riais. Em caso de calote, por exem-plo, o ônus fica para a consultora. Concomitantemente, foi explorada a questão dos estoques pessoais – situ-ação na qual a revendedora mantém um acervo de produtos, para atender de pronto o cliente. Assim, a empresa se pouparia do capital imobilizado da estocagem.

Identificaram-se situações como essas junto às entrevistadas desta matéria, contudo os episódios não eram descritos de forma negativa. “Quando se é vendedora, você apro-veita oportunidades. Quando se trata de maquiagem, às vezes o momento de lazer é a oportunidade perfeita. Já fiz vendas em jantares com amigas, na praia, enfim...”, argumentou a con-sultora Patrícia Porto. “Você tem que saber o que pedir e como manter o seu estoque, isso é uma questão de experiência” falou Elisa de Oliveira

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“Essa expectativa de fazer minha agenda e ter flexibilidade de dar assistência aos meus filhos foi o que, a princípio, me encantou. Mas o retorno financeiro também é muito positivo.”

Fernanda Misael liMa

Danilo Galvão

que eles têm”, considerou a dire-tora executiva da abevd, Roberta Kuruzu. A afirmação faz eco com o dito por consultoras: “Se eu vi-vesse disso, com certeza ganharia mais”, considerou Betinha, que, com emprego fixo em um salão, faz da atividade de revendedora uma se-gunda fonte de renda.

Os ganhos tendem a ficar maiores quando a revendedora é promovi-da e passa a gerenciar uma equipe. Após um ano no ramo das vendas diretas, Fernanda Misael Lima pediu exoneração da Prefeitura do Recife para se dedicar exclusivamente à atividade, hoje, coordena 58 pesso-as e, além de receber pelas vendas que faz, também ganha percentuais pelo que é comercializado pelas ge-renciadas. “Essa expectativa de fazer minha agenda e ter flexibilidade de dar assistência aos meus filhos foi o que, a princípio, me encantou. Mas o retorno financeiro também é muito positivo”, expressou.

O reforço no rendimento é se-guido por mais responsabilidades, a gerente (diretora, promotora, executiva de vendas, a depender da nomenclatura adotada pela ins-tituição) possui metas a cumprir e precisa dar assistência às vende-doras de seu grupo. Há institui-ções, inclusive, que exigem que a profissional se vincule a um cnpj (Cadastro Nacional da Pessoa Jurí-dica). “Para ser promotora tem que ter tempo integral”, considera Elisa

Coutinho, que, assim como outras entrevistadas, recusou a promoção em razão da maior liberdade como revendedora.

No que tange à relação jurídica formada nessa ascensão, há decisões de Tribunais Regionais do Trabalho, bem como do Tribunal Superior do Trabalho (tst) , que reconhecem o contrato de emprego. “Com relação às consultoras, a jurisprudência é pacífica quanto à inexistência de vínculo de emprego. Todavia, com relação às executivas de vendas, de fato, podemos encontrar posi-cionamento diferenciados, sempre dependendo das provas produzidas nos respectivos processos” destaca a desembargadora Maria Clara Saboya. Ela justifica que, comprovados os qualificadores da relação de emprego - aqueles do artigo 3º da clt – será admitida a existência do vínculo.

Isso pode acontecer inclusive quando a promotora atua por in-termédio de uma empresa própria, cujo cnpj é utilizado para crédito das comissões. Nessa situação, a de-sembargadora do trt-pe alega que a Justiça do Trabalho é competente para declarar a fraude no contrato e reconhecer a natureza trabalhista da relação. “Vai depender, sempre, das provas produzidas pelas partes”, sintetizou.

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Segurança pelo Brasil

SUL Medicina legal e perícia médica

De 03 a 06 de setembro acontece, em Florianópolis-sc, o 2º Congres-so Brasileiro de Medicina Legal e Perícia Médica. Dentre as ativi-dades previstas, estão os cursos de

“Perícias de marcas de mordida” e “Psiquiatria Forense”; a mesa- redonda com o tema “Perícia Ju-dicial X Perícia previdenciária” e a conferência “Perícia Médica en-quanto peça processual: limites e possibilidades”. Durante o evento também acontece a prova de título

de Especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas.

Estima-se que o Congresso irá atrair cerca de 1.200 profissionais das áreas de Saúde e Direito (espe-cialmente Previdenciário e Traba-lhista). Mais informações no site: http://www.abmlpm2014.com.br/

SUDESTE Ergonomia é tema de congresso

A Associação Brasileira de Er-gonomia realiza, entre 15 e 19 de setembro, o 17º Congresso Brasi-leiro de Ergonomia. Neste ano, o encontro acontece em São Paulo/

sp e inclui, também, uma feira com produtos e serviços voltados para a área. Com palestrantes de sete di-ferentes nacionalidades, o evento busca apresentar novidades e pro-mover o debate sobre a temática “Transversalidade da Ergonomia e Competitividade”.

O Congresso tem como público- alvo acadêmicos, profissionais das áreas de Saúde e de Segurança do Trabalho.

Veja mais detalhes em: http://www.protecaoeventos.com.br/eventos/content/evento/?id_even-topai=522

NORDESTE Segurança para quem trabalha em postos de gasolina

O benzeno é uma substância quí-mica tóxica, inflamável e explo-siva, comum na exploração de materiais orgânicos como petró-leo e carvão mineral. A gasolina

também concentra esse elemento (em menores proporções do que o petróleo), de forma que a frequente exposição a esse combustível pode trazer danos como inflamação e intoxicação em graus variados de gravidade. Nesse cenário, a Fun-dacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medi-cina do Trabalho) desenvolveu o

curso “Benzeno – riscos, efeitos sobre a saúde e estratégias de pre-venção”, para orientar frentistas e outros profissionais envolvidos. As aulas acontecem de 23 a 25 de setembro, no Recife.

Mais informações pelo telefone (81) 3427-4566/4775 ou pelo e-mail [email protected]

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A frieza de espírito e a fé na vida são as fer-ramentas mais eficientes no trato dos se-

pultadores com as famílias dos falecidos. Gilvan dos Santos Nascimento é sepultador desde 1965 e crê na vida após a morte. Jorge Carneiro da Costa dedicou, até o momento, 26 anos da sua vida ao trabalho e afirma que cabe aos homens nascer e morrer; a Deus, julgar os vivos e os mortos. Natanael da Paz Filho é o mais jovem dos coveiros fotografados, mas, não por isso, o menos experiente. Durante seus 27 anos de profissão, enterrou o pai e outros familiares, e suaviza: “é melhor, que eu enterro com carinho”. Os três trabalhadores dividem o ofício no Ce-mitério de Santo Amaro, no Recife (pe).

Trabalhadores da vida eterna

danilo galvão

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PARA FICAR NA HISTÓRIAPersonagens históricos precisam viver além das memórias; devem estar vivos e imortalizados nos documentos, nas fotos e nas ações por eles realizadas. Um povo só pode se (re)conhecer, se conhecer a própria história. Há cinco anos, o Memorial da Justiça do Trabalho em Pernambuco tem como principal objetivo resgatar a memória do Judiciário Trabalhista no Estado.

Do desejo pela criação das leis trabalhistas no Brasil, até a completa instalação do Processo Judicial Eletrônico no TRT de Pernambuco. A reportagem e a linha do tempo, a seguir, relembram alguns dos momentos marcantes para o País e para o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, preservados no Memorial da Justiça.

Congresso Operário, no Rio de Janeiro, propõe criação de leis trabalhistas. (Jornal da época)

1912

1939

1932 1940Criação das carteiras profissionais e regulamentação do trabalho infantil.

Justiça do Trabalho instalada pelo presidente Getúlio Vargas.

Lei do Salário Mínimo anunciada em 1º de maio. (Máquina contábil)

MEMÓRIA SECULAR

texto: Francisco shiMada

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1941 1946

1943 1964

Em 1º de maio, criado o Conselho Regional do Trabalho da 6ª Região, que tem Joaquim Amazonas Filho como primeiro presidente. (Ata da primeira audiência trabalhista no Recife)

Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

Implantação do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, integrado pelos estados de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e de Alagoas. (Inauguração da Vara em Penedo / AL)

Reação dos trabalhadores ao Governo Militar apoiado por setores da sociedade civil.

Com o intuito de preservar o acervo histórico do Judici-

ário Trabalhista do estado, o Me-morial da Justiça do Trabalho em Pernambuco foi fundado em maio de 2009, durante a gestão da desem-bargadora Josélia Morais da Costa à frente da Presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (trt-pe). Com pouco mais de cinco anos de existência, o Memorial pos-sui rico patrimônio disponível para

estudantes, pesquisadores e público em geral.

De processos históricos a mo-biliário cinquentenário, o museu já conquistou o reconhecimento de importantes instituições, como a Organização das Nações Uni-das para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o Ministério da Justiça e o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). O modelo de gestão processual desenvolvido em

Pernambuco também é exemplo para outros tribunais e museus de todo o Brasil. Além da conquista de prêmios, a realização de eventos e as pesquisas acadêmicas marcam a história recente do Tribunal e do próprio Memorial.

A atual gestora do museu, a pro-fessora doutora Marcília Gama da Silva, da Universidade Federal Rural de Pernambuco (ufrpe), recorda o começo dessa história. “O primeiro

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1972 1996

1987 2001

Inauguração da sede do TRT6, no Cais do Apolo, no Recife (PE), o Fórum Agamemnom Magalhães.

Posse da primeira mulher a assumir a Presidência da 6ª Região, a desembargadora Irene de Barros Queiroz. No mesmo ano, o Tribunal ingressa na internet.

Instituição da Medalha Conselheiro João Alfredo Correia de Oliveira. Comenda instituída pelo então presidente do TRT-PE, desembargador José Gondim, para marcar os 100 anos da abolição da escravatura.

Criação da Ouvidoria do Tribunal, para receber críticas, denúncias e sugestões.

Memorial da Justiça do Trabalho foi o Pontes de Miranda, em Maceió (al), há mais de 20 anos. O fato motivador que levou à criação do Memorial, em Pernambuco, deve -se à perspicácia e sensibilidade da então presidente, a doutora Josélia Morais, que teve a iniciativa de criar um espaço que pudesse guardar a memória e a história dos feitos da 6ª Região”, lembra Gama.

Entusiasta da preservação his-tórica do Judiciário Trabalhista

pernambucano, a desembargadora Eneida Melo Correia de Araújo, presidente do trt-pe entre 2009 e 2011, deu continuidade ao trabalho iniciado por sua antecessora. “Mi-nha ligação com o Memorial co-meçou quando a desembargadora Josélia pediu que eu coordenasse o Fórum Nacional de Memória. A partir desse momento, ficou real-çada a importância de se conservar documentos, emblemas, mobiliá-rios e todas as marcas capazes de

revelar uma época. A memória não se esconde tão somente nos docu-mentos, mas também em outros ele-mentos”, afirma a desembargadora.

A magistrada reforça a neces-sidade de preservação da história construída por juízes, advogados, servidores, trabalhadores e sin-dicalistas para que o Judiciário pernambucano possa manter um forte marco de memória. “Muito material foi preservado por conta da prudência e do bom senso de

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20062009

2008 2010

Início da cooperação técnica entre UFPE e Tribunal, com surgimento do Projeto Memória e História TRT6. Destacam-se processos de causas agrárias e sindicais.

Inauguração do Memorial da Justiça do Trabalho. No mesmo ano, acervo passa a integrar base de dados do Ministério da Justiça – Projeto Memórias Reveladas, que cataloga processos do Período Militar (1964-1985).

Criação do Selo da Memória. Impresso com o qual processos históricos são identificados.

Inclusão do Memorial no Cadastro Geral de Sistemas de Informação Museal do Ibram.

quem trabalhava com os arquivos na época. Tínhamos funcionários excelentes, a exemplo de seu Cézar Ramos e Marcos Antônio Gomes e, agora, Marcília. Esse esforço per-mitiu que os documentos fossem reconhecidos como ‘Patrimônio da Humanidade’. Tal fato serviu de modelo para que outros tribunais recebessem premiações, a exemplo do Regional do Rio Grande do Sul, que já tem o reconhecimento da Unesco”, ressalta Melo.

Com o intuito de divulgar o acer-vo do Tribunal, a equipe do Memo-rial organiza diversos eventos. Den-tre os realizados nos últimos anos, destacam-se: o I Fórum de Memória do Judiciário do Norte -Nordeste, em 2014; o I Fórum Regional de Arquivos Judiciais, realizado, em 2009, com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Pernambu-co (Facepe); a Semana Nacional de Museus e a Primavera dos Museus, realizados em parceria com o Ibram

anualmente; e o projeto Cultura e Memória, com a ufpe.

O próximo passo da Coordena-ção do Memorial, com o apoio do Núcleo de Comunicação Social do trt-pe, é realizar um projeto junto aos servidores. “Pretendemos im-pulsionar a questão da memória, fazendo uma iniciativa que envolva os servidores, como forma de tra-zer à tona esse passado que ficou esquecido na memória dos que o vivenciaram”, revela Marcília Gama.

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20122014

2012

Início da implantação do Processo Judicial eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT), em 18 de setembro, na Vara do Trabalho de Igarassu.

TRT-PE dá adeus ao papel com a implantação do PJe-JT em todas as unidades de Pernambuco. Em 5 de junho, o último processo físico (papel) foi ajuizado em Serra Talhada.

Acervo do TRT-PE recebe da Unesco o certificado de inscrição documental no Registro Nacional do Brasil no Programa Memória do Mundo. Primeiro Tribunal do Brasil a receber essa certificação internacional.

“Severino e João Barbosa da Sil-va, analfabetos, trabalhadores rurais, contam que o dono do engenho man-dou destelhar suas casas, no inverno. Eles passaram uma semana moran-do nas casas destelhadas. O fato con-figurou danos físicos e morais.”

A situação vivida pelos dois traba-lhadores, em 1970, integra o processo 0679/63 da Junta de Conciliação de Jaboatão (pe). A exemplo dele, mais de 200 mil estão sob os cuidados da Universidade Federal de Pernambuco (ufpe). Desse total, 21 mil histórias

relacionadas à busca pelos direitos trabalhistas foram conhecidas através do Projeto Memória e História.

A preservação da história da Justiça do Trabalho iniciou-se antes do Memorial. Em 2003, o professor doutor Antônio Montenegro, da ufpe, e outros acadêmicos soube-ram do descarte de processos arqui-vados no Arquivo-Geral do trt-pe. Diante disso, uma negociação entre a Comissão de Documentação do Re-gional e o Departamento de História da Federal permitiu o repasse dos documentos à academia, em 2006.

Dentre os processos já analisa-dos, destacam-se os das questões agrárias e sindicais. A professora Vera Acioli, também da ufpe e a convite do professor Montenegro, organizou o acervo. “Este lugar de memória vem se consolidando como um veículo de contínua apren-dizagem do sujeito do trabalho e de suas lutas, resistências e conquistas, possibilitando, assim, a recuperação da informação e a recomposição da História do trabalho neste Estado”, explica Acioli. Alunos da ufrpe também auxiliam a pesquisa.

ANTES DO MEMORIAL

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Ele existe

Nem só de processos é formado o acervo do Memorial da Jus-

tiça do Trabalho em Pernambuco. Entre os objetos da coleção, há um “telefone vermelho”. Sim, aquela peça histórica tão presente em fil-mes sobre a Guerra Fria e que, na verdade, se tratava de uma máquina de escrever eletromecânica ligada a uma linha telefônica, chamada de teletipo.

A cor vermelha do teletipo, ou telefone, foi “atribuída” pela im-prensa da época, para destacar a importância desse aparelho de co-municação durante o período da Guerra Fria. Ele permitia o conta-to direto entre a Casa Branca, nos Estados Unidos, e o Kremlin, na Rússia, e surgiu após a Crise dos Mísseis Cubanos, em 1962. O apare-lho telefônico vermelho só passou a ser utilizado no ano seguinte e, com o tempo, foi substituído por formas mais modernas de comunicação.

A versão pernambucana do

telefone vermelho realmente exis-tiu e funcionou como uma linha de emergência entre o Executivo e o Ju-diciário, durante as décadas de 1960 e 1980, como lembra a curadora do Memorial. “Esse telefone era utili-zado para um contato direto entre o governador e o presidente do Tribu-nal, quando as greves e os conflitos, por exemplo, aparentavam não ter mais solução”, explica a professora Marcília Gama.

Além do telefone vermelho, o Memorial possui outras peças que chamam atenção: móveis de aço e madeira ergonômicos, produzidos na Alemanha e na Itália, na pri-meira metade do século passado; máquinas de escrever; globo de bingo, utilizado para o sorteio de distribuição dos processos; relógio de corda; placas alusivas à inaugura-ção de fóruns durante o período da Ditadura Militar, entre 1964 e 1985; togas e demais objetos utilizados por magistrados; entre outras peças.

Endereço: Avenida Engenheiro

Domingos Ferreira, 3510, bairro

de Boa Viagem, Recife (pe).

Agendamento de visitas:

Telefone (81) 3326-8136

E-mail [email protected]

MEMORIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO EM PERNAMBUCO

Dias e horários para visitação:

terça a quinta-feira, das 8h às 14h.

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A escolha profissional é uma de-cisão difícil na vida de muitos

jovens. Algo compreensível, de fato, tendo em vista que se trata do mo-mento em que eles mesmos, seus familiares e amigos, esperam que definam seu futuro. São adolescentes na faixa dos 17 anos que estão prestes a completar a maioridade e se torna-rem adultos. E adultos têm responsa-bilidades e obrigações que não eram cobradas na época ainda recente da escola. Adultos trabalham. Adultos têm uma profissão.

Esses fatores são velhos conheci-dos por profissionais que atuam na orientação vocacional de jovens que

indagam, por exemplo, se é melhor trabalhar no que se gosta ou naquilo que traz mais retorno financeiro. É possível equilibrar essa equação?

A psicóloga Ana Karolina Ma-cedo, especialista em orientação vo-cacional, explica que tais questões podem, de fato, dificultar a identi-ficação da carreira que se pretende seguir. “Muitos jovens costumam lidar com esta escolha de forma conflituosa e angustiante por so-frerem interferência da família nas suas decisões, por se verem com a responsabilidade em acertar e obter o sucesso profissional e por se de-frontarem com alguns deveres que

caracterizam sua passagem para a vida adulta”, avalia.

Para auxiliar na tomada de de-cisão, uma das opções adotadas pelos jovens é a realização de testes vocacionais. Como explica Ana Ma-cedo, os testes são utilizados como recurso para o autoconhecimento e, juntamente com outras ferramentas, como textos, dinâmicas e diálogos analíticos, integram o processo de orientação vocacional.

“A escolha da profissão se dá pelo próprio sujeito. Somos ape-nas o facilitador deste processo. Vamos auxiliá-lo a identificar suas habilidades, seus interesses, seu

Por que escolhi Direito texto: Jaqueline Fraga

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comportamento em determinadas situações, seus gostos e preferências, sua análise da realidade e mercado de trabalho para traçarmos, juntos, o seu perfil”, esclarece a psicóloga.

Entre Direito, Sociologia e Jornalismo

Presidente do Tribunal Re-gional do Trabalho da 6ª Região (trt-pe), o desembargador Ivanil-do da Cunha Andrade revela que os testes vocacionais o auxiliaram quando da escolha do curso que iria seguir. “Logo cedo defini-me pela área de humanas. Mas não foi fácil a escolha do curso. Durante algum tempo vacilei entre Sociologia, Di-reito e Jornalismo. Inclusive, recorri ao teste vocacional que a minha ge-ração costumava fazer para auxiliar a escolha”, conta. Foram três testes e

o mesmo resultado: Sociologia em primeiro lugar, Direito em segundo e Jornalismo em terceiro.

A decisão final, explica o desem-bargador, foi fortemente influencia-da pelo fato de a área jurídica abran-ger características dos dois outros cursos e também pela expectativa financeira. “O fenômeno social sempre foi objeto de preocupação, de divagações, e desde cedo me in-teressei por aspectos políticos, eco-nômicos. O Direito modula em boa parte todas essas questões”, avalia.

Formado em 1973 pela Facul-dade de Direito do Recife, da Uni-versidade Federal de Pernambuco

Ivanildo Andrade durante a época de estudante da Faculdade de Direito do Recife (foto à esquerda). Pedro Paulo Nóbrega, agachado (segundo à esquerda), junto aos colegas do terceiro ano da Faculdade. Virgínia Canavarro ao lado do seu pai, Pedro Malta Filho, durante o baile de formatura em 1971

“Os estudantes que optam pelo curso de Direito geralmente apresentam como perfil gosto pela organização, iniciativa para tomada de decisão e aceitação de responsabilidade. ”

ana Karolina Macêdo

Psicóloga

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(ufpe), o então graduado não estava certo de que desejava ingressar na magistratura. A decisão aconteceu após a conclusão do curso de Ciên-cias Criminológicas pela Universi-dade Livre de Bruxelas, na Bélgica, em 1977. No ano seguinte, tornou-se mestre em Gestão Financeira Públi-ca pela Universidade da Antuérpia, no norte do país.

“Ao terminar o curso de Direito, não tinha clareza sobre a atividade que iria exercer. Mas quando retor-nei da Bélgica, onde estudei durante pouco mais de três anos, já havia definido que seria magistrado e que a atividade judicial me traria não só a profissionalização como também um terreno fértil para afirmação pessoal e política”, lembra.

Foi no ano de 1981 que Ivanildo Andrade tornou-se juiz do traba-lho. Na época, havia sido também aprovado no concurso para juiz de Direito do estado de Pernambuco. “A nomeação do trt6 antecedeu em alguns meses a de juiz de Direito. E eu encontrei na Justiça do Trabalho um bom ambiente e condições ade-quados para o exercício da magis-tratura”, conta.

Promovido ao cargo de desem-bargador do Regional pernambuca-no em 2001 pelo critério de antigui-dade, o magistrado vê como natural a sua chegada à 2ª instância, tendo em vista que escolheu se dedicar à Justiça Trabalhista. E aconselha aos bacharéis recém-formados em

Direito: “Tenham sempre em mente que a liberdade é o pressuposto para a afirmação da dignidade humana e de todos os direitos, buscando sem-pre se nortear pela ética e alimen-tando a responsabilidade social e política que fazem do profissional de Direito construtor da democracia”.

Da advocacia para a magistratura

O vice-presidente do trt-pe, de-sembargador Pedro Paulo Pereira Nóbrega, ingressou na 2ª instância da Justiça do Trabalho em Pernam-buco, no ano de 2001, em vaga do quinto constitucional reservado à advocacia, conforme prevê a Cons-tituição Federal de 1988.

Ao tomar posse como desem-bargador, Pedro Paulo já possuía 33 anos de advocacia trabalhista. “Minha vocação, toda ela, sempre foi para advocacia. Mas eu posso

Dica do presidente

dizer que também me realizei no Tribunal. A única diferença do ofí-cio é que antes eu postulava e aqui eu examino as postulações, mas a matéria é a mesma, a matéria é Di-reito do Trabalho”, avalia.

Pedro Paulo graduou-se em Di-reito pela Universidade Federal de Pernambuco em 1968. Possui tam-bém pós-graduação em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Universidade Cató-lica de Pernambuco (Unicap). A escolha pela área jurídica, revela, foi imediata: “Nunca tive dúvidas quanto ao curso”.

O seu interesse pelo curso, em especial pelo Direito do Trabalho, teve grande influência do jurista José Inojosa de Andrade, um dos precursores da advocacia trabalhis-ta em Pernambuco e amigo de seu pai. Foi trabalhando no escritório de Inojosa, que era totalmente voltado à Justiça do Trabalho, que definiu o

“Eu diria para os jovens que estão na fase de escolha da profissão que devem avaliar suas aptidões naturais para que a carreira escolhida atenda às suas motivações e habilidades, sem descuidar da dimensão financeira, mas sem nunca colocar esta dimensão acima dos outros pressupostos. O homem nasceu para ser feliz”.

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ramo em que iria atuar. “Dedicar-me à área trabalhista é a

consequência disso tudo. E a Justiça do Trabalho sempre foi caracterizada pela celeridade, o que permitia que todos os meus processos tivessem início e fim. Isso é fundamental para a sociedade: ter a solução dos seus processos o mais rápido possível”, analisa o desembargador.

Como advogado, participou de importantes causas trabalhistas, re-presentando, inclusive, organismos da Prefeitura do Recife, do Go-verno de Pernambuco e da União. “Nos anos 1980, eu me tornei um advogado muito requisitado para acompanhar as negociações coleti-vas. Participei de muitos dissídios e muitos acordos coletivos, o que me fez ver algo muito importan-te: os ajustes coletivos, quando são realmente celebrados em razão do interesse das partes, dificilmente são

a doutrina jurídica. Estejam mais presentes nos tribunais, sustentando oralmente as teses que desenvolve-ram em defesa de seus constituintes, não se esquecendo de que a conduta moral é fato imprescindível para a advocacia, como esta é uma peça importantíssima para a Justiça”.

Voz feminina

De acordo com o Censo Nacio-nal do Poder Judiciário, realizado no segundo semestre de 2013 pelo Conselho Nacional de Justiça (cnj), 36% da magistratura do país é com-posta por mulheres. No Pleno do trt-pe, esse percentual é supera-do: dos 19 membros que compõem a Casa, nove são mulheres (48%). Entre elas, a atual corregedora

descumpridos”, avalia. Com a experiência de quem

advogou por mais de três décadas, o desembargador recomenda aos jovens advogados: “Não deixem de estudar. Não se limitem aos casos que estão em suas mesas. Procu-rem se reciclar. Colaborem com

Palavra do professor

Titular da disciplina Legislação Social, da Faculdade de Ciências da Administração da Universidade de Pernambuco, Pedro Paulo vê uma mudança de perfil e atitude dos alunos: “Os estudantes cada vez mais não se conformam com a mera interpretação da norma jurídica, exigindo do professor um esforço para trabalhar com o Direito ideal e não só com o Direito posto como De lege ferenda (A lei a ser feita)”.

Topo da carreira. Os desembargadores Pedro Paulo, Ivanildo Andrade e Virgínia Canavarro - vice, presidente e corregedora - dirigem o TRT-PE até 2015

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regional, desembargadora Virgínia Malta Canavarro.

Formada em Direito pela ufpe no ano de 1971 e pós-graduada em Direito do Trabalho pela Unicap, a desembargadora relembra que a sua opção pela área de humanas foi influenciada pelo seu intenso gosto pela leitura. No entanto, o interesse pelo ramo jurídico concorria com dois outros cursos: Jornalismo e Filosofia. A decisão, conta, deu-se após participar de um júri simula-do sobre Alexandre Magno (rei da Macedônia em 338 a.C.) quando cursava o primeiro ano do ensino médio. “Eu me encantei com a dia-lética jurídica”, relembra, e acres-centa: “Pesou também na escolha o leque de opções que o curso de Direito oferece”.

Ao concluir a graduação, quando já trabalhava na Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), abriu, juntamente com al-guns colegas recém-formados, um escritório de advocacia no centro do Recife. Mas, avalia a desembargado-ra, não possuía habilidade para o exercício da atividade. Com o dese-jo de seguir carreira nas instituições públicas, prestou concursos para alguns órgãos, incluindo o trt6, cuja inscrição para o certame foi efetuada por seu pai, Pedro Malta Filho, antigo juiz classista.

Em 1973, após ter sido aprova-da no concurso para servidores do Sexto Regional, Virgínia Canavarro

tomou posse no cargo de Oficial de Administração. Seis anos mais tar-de, quando era assessora do desem-bargador José Ajuricaba da Costa e Silva, foi aprovada para o concurso de juiz do trabalho. “Tomei posse no último dia do prazo por ter dúvidas se devia ou não exercer a magistra-tura. Tinha uma filha de um ano de idade, além de gostar de ser asses-sora”, conta.

Mas, a juíza logo teve a convicção de que a escolha fora acertada: “Não me arrependi da opção, apesar do difícil caminho trilhado por um ma-gistrado. Os pesados encargos são recompensados pelo sentimento de que, ao prestarmos justiça, estamos atendendo um anseio primordial e

Escolha pessoal

fundamental do ser humano”. Relembrando que chegou à 2ª

instância do trt6 em 2002 pel0 cri-tério da antiguidade, a desembarga-dora revela o imenso orgulho pelo Judiciário Trabalhista, em especial pela atuação feminina. “A Justiça do Trabalho nasceu moderna, tanto que possibilitou o acesso das mulheres à magistratura. Sempre foi mais ágil, informal e acessível ao jurisdiciona-do, servindo de modelo às reformas de normas processuais civis. Esse é um legado que precisa ser preserva-do pela nova geração de juízes, que devem ter em mente a relevância do seu cargo e o compromisso com a nossa carente sociedade”.

A corregedora Virgínia Canavarro teve de convencer a família sobre a sua vocação: “No meu núcleo familiar não havia ninguém da área jurídica. Todos foram contrários, inicialmente, a minha opção, o que foi revertido quando ficou clara a profunda identificação e o meu entusiasmo com o curso de Direito”.

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Há menos de dois anos começa-va a maior mudança de para-

digma já vivenciada pela Justiça do Trabalho da 6ª Região. Os processos físicos, com seus pesados e empo-eirados volumes, começavam a dar espaço a um novo modelo processu-al: o Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (pje-jt). O novo padrão processual colocava em foco os princípios constitucionais da Razoável Duração do Processo e da Celeridade – os mais represen-tativos da esfera trabalhista. Além disso, era fortíssimo o argumento da necessidade de informatização do processo como condição de me-lhoria da prestação jurisdicional.

Foi em setembro de 2012, sob a gestão do desembargador André Genn de Assunção Barros, que o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (trt-pe) deu o pontapé inicial à substituição do modelo

físico pelo eletrônico. O dia 18 da-quele mês seria um marco para a história da justiça especializada do estado – a segunda instância do Tri-bunal e as duas Varas do Trabalho (vt) de Igarassu passariam a fun-cionar de maneira inovadora. Dar entrada em ações e petições remo-tamente, consultar processos sem a necessidade do uso de papel ou do deslocamento às unidades judiciais já não mais fariam parte do imagi-nário, passando a ser uma excelente, porém desafiadora, realidade.

Na solenidade de implantação, o então presidente do Tribunal Superior do Trabalho (tst) e do csjt, ministro João Oreste Dalazen, descreveu o pje como uma “revolu-ção silenciosa, apta a concretizar a promessa democrática de acesso à Justiça”. Naquele momento, o trt- pe ingressou numa nova era, a digi-tal, “mais ágil e sintonizada com as

políticas públicas de sustentabilida-de socioambiental”, como acentuou o juiz Fernando Cabral Filho, titular da 2ª vt de Igarassu, que presidiu a primeira audiência nos moldes eletrônicos.

Com a preocupação de criar maior empatia com os usuários e fazendo frente à resistência natural que acontece em qualquer mudan-ça de padrão, o trt promoveu, ao longo dos anos que vieram, pales-tras, apresentações, treinamentos e várias ações visando ao adequado funcionamento e uso do pje. Na me-dida em que o sistema avança, os magistrados e servidores vão sendo capacitados. No final de 2012, o Re-gional já instalara a nova platafor-ma em 14 unidades – o equivalente a 20% das suas vts – o dobro dos 10% determinados na Meta 16 do Conselho Nacional de Justiça (cnj) para aquele ano.

TRT-PE já funciona 100% com o PJe-JT

texto: Mariana Mesquita

Danilo Galvão

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quadro da evolução do PJe eM quantitativo de varas e Percentual de alcance

Para o desembargador André Genn, o êxito das operações pela via eletrônica não teria sido possí-vel sem a renovação do parque de informática, a ampliação de links de internet e o aumento significativo do quadro de pessoal de Tecnologia da Informação (ti). No começo, conta o ex-presidente, o Regional tinha apenas 11 servidores com formação

superior específica no setor. No último trimestre do ano, com a publicação da lei que autorizava a criação de 57 cargos de analista, e o diálogo constante com o csjt, que resultou na transferência de recursos que possibilitou todas as nomeações ainda em 2012, ficou consolidada a equipe que, a partir dali, contribuiria expressivamente para a superação das metas do cnj de forma virtuo-sa: “Sem a extensão do quadro, não poderíamos jamais ter dado o passo de duplicar esses números”, revela.

A transformação do padrão pro-cessual começou a tomar forma e se aproximar mais da sociedade no primeiro dia de 2013, quando passou a vigorar ato que determinava que a 2ª instância do Tribunal atuaria exclusivamente pelo PJe nos casos de sua competência originária. No final de janeiro, com a inclusão das cidades de Petrolina, Palmares e Cabo de Santo Agostinho, o sistema já funcionava em 21 vts.

Conhecido como engajado na promoção do uso de novas tecnolo-gias, o desembargador André Genn

se despediu da Presidência salien-tando a acessibilidade, economia e celeridade proporcionadas pelo pje-jt: “Encerrando o ultrapassa-do modelo em que cada Tribunal representava uma ilha, isolado na repetição de tarefas, chegamos ao salutar sentimento de unidade”, co-memorou.

Em fevereiro de 2013 assumiu a Presidência o desembargador Ivanil-do Andrade. “O pje é irreversível”, posicionou-se, em seu discurso de posse, lembrando também que o trt-pe vinha realizando todas as ações necessárias a facilitar o do-mínio da ferramenta. No mesmo mês, reforçando a política de treina-mento, a Escola Judicial do Regional (ejtrt6) lançou o “ambiente virtual de aprendizagem”, que permanece no site do trt até hoje e disponibi-liza manuais, vídeos, versões atua-lizadas do pje-jt, além de espaços de treinamento livre em Educação à Distância.

Enquanto o Tribunal se esforçava para familiarizar seu quadro de pes-soal, órgãos relacionados à Justiça

“Encerrando o ultrapassado modelo em que cada

tribunal representava uma ilha, isolado na repetição de tarefas, chegamos ao salutar

sentimento de unidade.”

ANDRÉ GENN DESEMBARGADOR EX-PRESIDENTE DO TRT-PE

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2012 2013nov dez abr

Igarassu e Jaboatão Ribeirão, Paulista e Ipojuca Petrolina, Palmares, Cabo, Vitória de Santo Antão, Nazaré da Mata, São Lourenço da Mata e Olinda

Alcançou antecipadamente a meta estabelecida pelo CNJ

[ 7 VTs ] [ 14 VTs ] [ 27 VTs ]10% 21% 40%

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do Trabalho tomavam iniciativas para sensibilizar o público usuário externo. A ej6 promoveu curso de formação de multiplicadores em pje voltado a servidores do Ministério Público do Trabalho (mpt6). Na mesma época, o tst lançava cur-so de capacitação para advogados, transmitido ao vivo da sede da tv tst pelo Youtube.

Em abril de 2013, com a chegada do sistema ao Fórum de Olinda, o Tribunal atingiu antecipadamente a meta do cnj para aquele ano, que era de implantar a plataforma em 40% das suas varas. Na solenidade que oficializou a chegada àquelas unida-des, o presidente Ivanildo Andrade não deixou de alertar que o sistema era uma ferramenta “em aperfeiço-amento”, e que seu êxito dependia de todos os envolvidos com a justiça especializada.

Em setembro, o trt6 se subme-teu à Correição Ordinária da Justiça do Trabalho, realizada pelo tst. No relatório final, o pje foi apontado pelo então corregedor geral, Mi-nistro Ives Gandra Martins Filho,

como um dos exemplos mais bem sucedidos do país e atribuiu parte desse sucesso ao modelo misto de capacitação elaborado pela Esco-la Judicial. O corregedor elogiou, ainda, a contribuição do Regional para o desenvolvimento do sistema nacionalmente, já que tem cedidos, desde 2012, 11 analistas da área de ti ao tst/csjt.

Modelo Inovador – Em maio de 2013, a ej6 concluiu um projeto-pi-loto inovador para a capacitação dos servidores lotados nas três Varas do Trabalho de Caruaru, maior muni-cípio do interior pernambucano. A nova sistemática trazia um formato misto, utilizando tanto as tradicio-nais aulas presenciais quanto aquelas na modalidade a distância, em for-ma de videoconferências. Diante da grande repercussão, em outubro do mesmo ano, o projeto foi convidado para ser apresentado no 5º Fórum de Educação a Distância do Poder Judiciário. Dois meses depois, a Es-cola colhia novos louros, receben-do o Prêmio Nacional de Educação Corporativa do Judiciário (pecjus

2013), na categoria de Educação a Distância. Para o juiz Agenor Mar-tins, um dos gestores responsáveis pelo projeto e coordenador-geral da ej6, a experiência foi positiva, pois “possibilitou que os servidores tives-sem um contato prévio com as fun-cionalidades do pje, gerando maior segurança no uso da ferramenta”.

Mas o alcance da meta do Con-selho não freou as implantações pre-vistas para 2013. Entre setembro e outubro foi concluída a capacitação dos juízes e servidores que atuavam nas 23 varas da capital, as próximas que receberiam a plataforma. Foi com a chegada ao Recife, em outu-bro, que houve a conclusão do cro-nograma de 2013, sendo alcançada a marca de 56 das 67 vts do trt -pe, o correspondente a 83,6%, ou seja, mais do que o dobro da meta de 40% traçada pelo cnj, superada em 109%.

Em maio passado, foi retomado o calendário de instalações, com a chegada à Vara de Catende. No início de junho, com a implantação em Serra Talhada, o trt começou a operar 100% eletronicamente,

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2014out mai jun

Mais do que o dobro da meta estabelecida pelo CNJ (de 40%)

Caruaru, Barreiros, Escada e Recife Catende, Garanhuns, Pesqueira, Belo Jardim, Goiana e Timbaúba

Limoeiro, Araripina, Salgueiro e Serra Talhada

[ 56 VTs ] [ 63 VTs ] [ 67 VTs ]84% 89% 100%

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Antecipando-se à mudança cultural e à extinção de setores

prioritariamente burocráticos – decorrentes da transição de modelo processual –, o

desembargador presidente Ivanildo Andrade lançou

programa de capacitação permanente, a fim de preencher as lacunas

verificadas nas habilidades dos servidores e treiná-los a

desenvolver tarefas voltadas à atividade fim do Regional.

suplantando de novo a meta – de 80% – estabelecida pelo cnj para 2014. A nova realidade advinda da totalidade das vts do estado fun-cionando com o sistema também acentuou o cuidado da gestão do Regional com a atualização de ser-vidores que sempre trabalharam com rotinas burocráticas, como carimbar e numerar as páginas dos autos físicos.

Com a extinção de alguns seto-res, consequência da mudança, e a exigência de um maior conheci-mento jurídico e tecnológico, o trt se antecipou à mudança cultural que viria gradativamente. Para en-frentar os obstáculos trazidos pela nova situação, o desembargador presidente, Ivanildo Andrade, lan-çou um programa de qualificação profissional para serventuários que se encaixavam no perfil. Segundo a diretora da Secretaria de Gestão de Pessoas (sgep), Eliane Remígio, a capacitação é permanente e consiste

Números No primeiro ano de funcionamento, a 1ª instância do Regional recebeu 31.070 processos eletrônicos, e a 2ª, 877. Em dezembro de 2013, o Tribunal já contabilizava, desde a inauguração, quase 45 mil processos ajuizados pelo PJe no primeiro grau, e 1.500 no se-gundo. No final de abril deste ano,

na análise das avaliações por com-petência, “a partir da qual se iden-tificam lacunas nas habilidades dos servidores, o que possibilita uma formação voltada ao preenchimento delas”, esclarece.

Dificuldades surgem em todo processo de mudança. Foi assim quando da troca das máquinas de datilografar pelos modernos computadores na Justiça Traba-lhista; não seria diferente com o pje-jt. Apesar dos desafios que vêm a reboque com a transição do processo físico para o eletrônico, o novo modelo traz benefícios ir-refutáveis. Mais celeridade, trans-parência, qualidade da prestação jurisdicional e maior segurança das informações são apenas algumas dessas vantagens. Além disso, com o uso da plataforma eletrônica pela Justiça Trabalhista, deixarão de ser desmatadas cerca de 50 mil árvo-res por ano. No fim das contas, é a sociedade quem sai ganhando.

esse número era de aproximadamente 76 mil. Durante o ano que precedeu o início do funcionamento eletrônico, o Regional recebeu cerca de 102 mil processos físicos.

Segundo o diretor da Secretaria de Informática, João Adriano Pinheiro, o êxito na implantação do Processo

Judicial eletrônico em todas as unida-des do Tribunal refletiu na quantidade de chamados por parte dos usuários, recebidos na si. Para ele, apesar dos atuais 15 mil usuários externos e 1.700 internos, o número de pedidos de aju-da e chamados para tirar dúvidas sobre o sistema é insignificante.

IVANILDO ANDRADEDESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRT-PE

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Justiça do Trabalho em Pernambuco: 73 anos de memória e históriaMARCíLIA GAMA DA SILVA

A Justiça do Trabalho surgiu em decorrência da necessidade de

se estabelecer outro tratamento às relações conflituosas do mundo do trabalho, constituindo como instru-mento de cidadania consagrado no artigo 766, do texto da Consolidação das Leis do Trabalho (clt).

Os registros que se formam des-sa trajetória de luta da classe tra-balhadora representam a memória de um passado às vezes esquecido, silenciado, marcado por histórias de conflitos, manifestações e greves, associadas à ideia de perigo a uma dada ordem, sempre desigual e injusta imposta pelos interesses do capital.

O acervo do Tribunal Regional de Pernambuco por meio de uma atividade historiadora e arquivís-tica proporciona o conhecimento de nossa história, eternizada nos interstícios, na busca por melhores condições de vida e trabalho, tendo sido reconhecida sua importância, por meio da conquista do pioneiro título de patrimônio da Humani-dade pela unesco para seu acervo.

Esse reconhecimento é fruto de um árduo e longo processo em

defesa da preservação da memória, levada a cabo pelo convênio de co-operação técnica assinado entre o trt6 e o Programa de Pós-Gradu-ação em História da Universidade Federal de Pernambuco (ufpe), que possibilitou o tratamento do acervo destinado à eliminação. A partir daí, atividades de pesquisa e preserva-ção vêm sendo desenvolvidas, tendo como um dos produtos um farto material de estudo resultante das pesquisas, aos níveis de bacharela-do, mestrado e doutorado.

Observa-se em todo o Brasil a necessidade de preservar. Grupos e Comitês pela preservação se multi-plicam a partir de 2004. A necessi-dade de preservação dos autos como forma de salvaguardar essa memória se materializa nos seus documen-tos, ao longo de mais de 70 anos de história. Nessa senda foram criados os selos da Memória, destinados a identificar os processos relevantes para a história em cada Regional. Criou-se o Fórum Permanente pela Preservação da Justiça do Trabalho (Memojutra), o Comitê Gestor do Programa Nacional de Resgate da

Memória da Justiça do Trabalho (cgmnac-jt) e o Programa Nacional de Gestão Documental e Memória do Poder Judiciário (Proname), sem falar nas Recomendações 37 do Con-selho Nacional de Justiça (cnj), que dedica alguns itens específicos ao trato da Memória do Judiciário.

Nesse viés, registram-se alguns eventos no âmbito da Justiça do Trabalho de Pernambuco, que, já em 2009, promove o I Fórum Re-gional de Arquivos Judiciais, em parceria com entes do Judiciário local e nacional de diferentes esfe-ras. Em 2014, é realizado, no Recife, o I Fórum de Memória do Judiciário do Norte-Nordeste, que se reuniu para criar uma rede de memória do Judiciário, com o objetivo de sistematizar ações e competências, promover a troca de experiências, informações e rotinas por meio da internet, a fim de que fosse conso-lidado um protocolo de intenções a ser entregue ao cnj, para subsidiar uma Política Nacional de Memória para o Judiciário, garantindo, assim, às atuais e futuras gerações, o direito à história e à memória.

Coordenadora do Núcleo de Gestão Documental e Memória do TRT6, Profª Dra. do Departamento de História –UFRPE e Pesquisadora do CNPq/PROEXT-MECSt

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O Tribunal do Trabalho da 6ª Região, alinhado às diretrizes

traçadas pelo Conselho Nacional de Justiça, à tendência da adminis-tração pública de modernizar seus processos de gestão, à adoção de uma postura mais proativa e dinâmica em relação aos problemas enfrentados, e também aos resultados a serem alcançados, iniciou o processo de elaboração de seu Planejamento Estratégico Institucional, que terá vigência entre 2015 e 2020.

Durante o vii Encontro Nacional do Judiciário realizado pelo cnj em novembro de 2013, em Belém -pa, foram definidos os macrodesafios do Poder Judiciário Nacional, que são os objetivos gerais que a Justiça perseguirá até 2020. Entre os prin-cipais tópicos estão o de “Assegurar a efetividade na prestação jurisdi-cional, ”Promover a melhoria da gestão de pessoas e da qualidade de vida”, “Aperfeiçoar a gestão de custos”, “Fortalecer os processos de governança administrativa e judi-ciária”, “Melhorar a infraestrutura e governança de tic”, “Impulsionar

Planejamento Estratégico 2015-2020

as execuções fiscais, cíveis e traba-lhistas”, “Assegurar a celeridade e produtividade na prestação juris-dicional”, “Gerir as demandas re-petitivas e dos grandes litigantes” e “Garantir os direitos da cidadania”.

Com o intuito de garantir o en-volvimento de todos os integrantes da organização na construção de um Planejamento Estratégico Participati-vo para o trt6, como primeira etapa foram solicitadas sugestões para to-das as varas, magistrados, gabinetes, unidades administrativas, sindicato e associações de classes partícipes da prestação jurisdicional. Também foi promovido um Workshop sobre Pla-nejamento Estratégico em conjunto com o Núcleo de Desenvolvimento de Pessoal no dia 27 de maio, com a participação de todos os diretores de varas, para discutir as opiniões e ideias colhidas nas unidades.

Durante o Módulo Concentra-do de Aperfeiçoamento de Magis-trados (mcam), foi realizada uma apresentação sobre a formulação do novo Planejamento Estratégico 2015-2020, com espaço aberto para

coleta de propostas consolidadas e apreciadas durante o Fórum de Gestão Estratégica, ocorrido nos dias 13, 14 e 15 de agosto. O intuito é propiciar o amplo debate para definição das prioridades que se-rão definidas para o Planejamento Estratégico 2015-2020.

Com a finalidade de estender ainda mais a participação de todos nesse processo, foi criado um e-mail ([email protected]) para receber sugestões, aberto ao público externo e interno. O objetivo prin-cipal é proporcionar o engajamento de todos os integrantes do trt6 na construção do novo Planejamento Estratégico e no desenvolvimento da estratégia a ser adotada.

Assim, é fundamental o envol-vimento de todos que fazem o trt6 para que se construa um planeja-mento que traduza as expectativas dos cenários prospectivos e que seja alinhado às diretrizes e políticas de governança do Poder Judiciário Nacional e dos objetivos, projetos e metas do segmento da Justiça do Trabalho.

KATIA DO REGO BARROSAssessora de Gestão Estratégica do trt6Ac

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Preparação para aposentadoria na Justiça do Trabalho

Após anos de trabalho, chega enfim o momento da aposenta-

doria. Para uns, o tão sonhado tempo de descansar, de cuidar melhor de si mesmo, de se dedicar à família, ao bem-estar e à qualidade de vida.

Para outros, no entanto, essa fase da vida também poderá trazer algu-mas perdas e apresentar vários desa-fios. A saída do mundo do trabalho e, consequentemente, a mudança de status profissional, o distanciamento do círculo de amizades, a diminui-ção nos rendimentos, a alteração na rotina, nos hábitos e nas relações familiares.

Não por acaso, especialistas na área chamam a atenção para os casos de adoecimento, separações e até mesmo de morte de trabalhadores pouco tempo após a aposentadoria.

Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ibge), a população brasileira acima de 65 anos irá quadruplicar até o ano de 2060, passando dos atuais 14,9 milhões (7,4% do total) para 58,4 milhões (26,7% do total). Essa transformação etária vem exigindo

RENATTO MARCELLO DE ARAúJO PINTOChefe da Seção de Serviço Social do trt6 e especialista em planejamento e gestão pública

que, cada vez mais, as organizações públicas e privadas desenvolvam políticas que apoiem e facilitem ao trabalhador a planejar adequada-mente o seu futuro.

O trt6 possuía em maio deste ano 137 pessoas com os requisitos necessários à aposentadoria e outras 103 (34 homens e 69 mulheres) com idade igual ou superior a 60 e 55 anos, respectivamente. Isto quer dizer que nada menos que 240 magistrados e servidores estão próximos de se aposentarem, aproximadamente 11,5% do seu corpo funcional.

Na perspectiva de estimular e orientar o planejamento destas pes-soas para essa importante fase da vida, surgiu em 2008 o Programa de Preparação para Aposentadoria, instituído pelo Ato trt nº 094/2008, proposto e coordenado pela Seção de Serviço Social do Núcleo de Saúde. De lá para cá, 60 servidores e magis-trados participaram dos três ciclos realizados (2008 – 2010 – 2012).

No final de 2013, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (csjt) aprovou a Resolução nº 132,

que regulamenta o Programa de Preparação para Aposentadoria no âmbito da Justiça do Trabalho de 1º e 2º graus, proposta de autoria do De-sembargador André Genn de Barros em seu mandato naquele Conselho. Um importante reconhecimento do trabalho que já era desenvolvido em vários trts.

Embalado por essa nova con-juntura, em 2014 o Programa de Preparação para Aposentadoria do trt6 foi reestruturado, passando a se chamar “Programa Novo Tempo: Preparação para Aposentadoria”, ga-nhou uma identidade visual própria e ampliou sua programação.

A implantação de programas de preparação para aposentadoria na Justiça do Trabalho constitui-se num avanço da gestão de pessoas trazendo benefícios tais como: diminuição do impacto da aposentadoria; perspecti-va positiva de vida; aumento da satis-fação e motivação dos funcionários; sensibilização sobre a necessidade de pensar na “Carreira do Futuro”; estímulo à integração e fortaleci-mento da responsabilidade social.

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PAULO ALCANTARAEspecialista e mestre em Educação e desembargador do TRT6

Quando criança, fui apresenta-do à Mitologia e desde então

não parei de pesquisar sobre o tema. Sempre achei interessante a maneira como os antigos procuravam expli-car aquilo que não entendiam por meio das figuras mitológicas. Mas por que nos importar com os mi-tos? O Mitólogo Joseph Campbell diz o seguinte: “Vá em frente, viva a sua vida, é uma boa vida – você não precisa de Mitologia. Não acre-dito que se possa ter interesse por um assunto só porque alguém diz que é importante. Mas você poderá descobrir que, com uma introdu-ção apropriada, o mito é capaz de capturá-lo. Um de nossos proble-mas, hoje em dia, é que não estamos familiarizados com a literatura do espírito. Estamos interessados nas notícias do dia e nos problemas do momento. Antigamente, o campus de uma universidade era uma espé-cie de área hermeticamente fecha-da, onde as notícias do dia não se chocavam com a atenção que você dedicava à vida interior, nem com a magnífica herança humana que recebemos de nossa grande tradição

– Platão, Confúcio, o Buda, Goethe e outros, que falam dos valores eter-nos, que têm a ver com o centro de nossas vidas. Quando um dia você ficar velho e, tendo as necessidades imediatas todas atendidas, então se voltar para a vida interior, aí bem, se você não souber onde está ou o que é esse centro, você vai sofrer”.

Esse pequeno ensaio pretende estimular uma investigação sobre a origem do Direito, sob o prisma mitológico. Para a Mitologia Grega, o início era o Caos absoluto, donde surge Gaia, uma deusa imponente e bela. Gaia é a matriz da vida, das plantas, dos animais e dos deuses que habitariam o Olimpo. Caos e Gaia são imensamente contraditórios e imprescindíveis um ao outro. Porém, sem algo que os harmonize, não bas-tam ao mundo. É Eros, com seu amor e energia, quem vai fazer explodir a vida nas entranhas de Gaia e dar algum sentido ao Caos. Já Cronos, filho de Gaia e Urano, revoltado com o pai, que não permite que os filhos nasçam, corta-lhe o órgão e atira ao mar. Das gotas de sangue sobre a ter-ra nascerão outras divindades, e do

órgão de Urano nascerá Afrodite. O mesmo Cronos, temendo a sorte do pai, depois de ter casado com a titã Reia, engole os próprios filhos após o nascimento. Reia, com a ajuda de Gaia, engana Cronos e esconde um dos filhos, Zeus, o maior de todos os deuses do Olimpo. Zeus, antes de se casar com Hera, ainda se casará com Metis (filha da titã Tetis), e com Têmis, filha de Gaia e Urano, com quem terá muitos filhos.

A correspondente na Mitologia Romana da deusa Têmis era a deusa Iustitia (Justiça). Atribuía-se a Deus, aos deuses e depois ao homem a função de julgar, o que demonstra uma nítida influência da Mitologia no surgimento e na aplicação do Di-reito. Na atualidade, nos confronta-mos com questionamentos como o papel do Judiciário, os limites de atuação e o ativismo do juiz, talvez sem saber bem o que seja isso. O estudo do Direito não deve ficar res-trito aos códigos e leis, até porque as mudanças na sociedade impõem uma revisão e atualização legislativa ou uma nova interpretação por par-te do aplicador do Direito.

A Mitologia e o DireitoD

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