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Universidade Eduardo Mondlane Faculdade de Letras e Ciências Sociais Departamento de Ciência Política e Administração Pública 3º Ano, II Semestre, Administração Pública, Laboral. Cadeira: Direitos Humanos e Cidadania TEXTO RESUMO: Direitos Humanos e sua relação com a questão de Cidadania Licenciandos: Docentes: Gerson Zandamela Agostinho Dr. Nobre J. V. Canhanga Hermínio Artur Muchanga Prof. Rafaela Andrade Leila Cacilda Dombo Nilza Rabeca Matos Maputo, Agosto de 2015

Texto-Resumo, DHC, Grupo III, Laboral, 2015, AP

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Direitos Humanos

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Universidade Eduardo Mondlane

Faculdade de Letras e Ciências Sociais

Departamento de Ciência Política e Administração Pública

3º Ano, II Semestre, Administração Pública, Laboral.

Cadeira: Direitos Humanos e Cidadania

TEXTO RESUMO:

Direitos Humanos e sua relação com a questão de Cidadania

Licenciandos: Docentes:

Gerson Zandamela Agostinho Dr. Nobre J. V. Canhanga

Hermínio Artur Muchanga Prof. Rafaela Andrade

Leila Cacilda Dombo

Nilza Rabeca Matos

Simão Francisco Alberto

Vera Taimo Guitiche

Maputo, Agosto de 2015

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Breve Contextualização

Quando as organizações não-governamentais e os movimentos populares querem criar condições

visíveis para pessoas necessitadas, fazem algumas reivindicações sociais, económicas e políticas

básicas, nas quais eles usam regularmente o termo direitos humanos (Alexander, 2004)1. Este é

um termo que podemos encontrar em Cartas e Declarações Internacionais e nas constituições de

vários países, também enaltecido por Organizações como as Nações Unidas, o Conselho da

Europa, a Organização de Unidade Africana, a Organização da Conferência Islâmica, etc (Berti,

2011)2, todavia, surge a questão: o que são Direitos Humanos? Conforme referido por Dembour

(2010)3, uma leitura profunda da literatura académica revela que nem todos entendem os direitos

humanos da mesma forma. Em seu artigo "O que são os Direitos Humanos? a autora propõe a

existência de quatro escolas de pensamento sobre os direitos humanos: "Escola Naturalista" que

entende os direitos humanos como algo atribuído; "Escola deliberativa" como acordados;

"Escola Protestante" como resultantes de uma luta; e "Escola discursiva" como discurso falado.

Diferentes Escolas de Pensamento sobre a Concepção de Direitos Humanos

Escola Naturalista

A escola naturalista abraça a definição mais comum e bem conhecida dos direitos humanos: a

definição que identifica os direitos humanos como o direito que se possui simplesmente por ser

um ser humano. (Dembour, 2010)

Exemplo de definição: Os direitos humanos são um elemento essencial de um "humanismo

integral e solidário" que liga todas as pessoas juntas em responsabilidade mútua (Hollenbach,

2011)4.

Escola Deliberativa

Para a escola de pensamento deliberativo, os direitos humanos são valores políticos que as

sociedades liberais optam por adoptar. Para eles, os direitos humanos passam a existir através de

1 ALEXANDER, Jonh. (2004). Capability, Human Rights and Moral Pluralism.Catholic University of Leuven. Belguim.2 BERTI, Enrico. (2011). Philosophy and Human rights.Departamento de Filosofia. Padova.3DEMBOUR, Marie-Bénédicte (2010). “What Are Human Rights? Four Schools of Thought”. Human Rights Quarterly, Volume 32, Number 1, February, pp. 1-20 (Article).4 HOLLENBACH, David (2011). “Human Rights in a Pluralist, Unequal Globe: Contributions of Jesuit Universities”. Published in Catholic Education, vol. 14, no. 3, pp. 338-345, March.

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um acordo social. Estudiosos deliberativos muitas vezes, mantém o direito constitucional como

uma das principais maneiras de expressar os valores de direitos humanos que foram acordados.

(Dembour, 2010)

Exemplo: Um direito humano é frequentemente entendido como uma reivindicação legítima

contra ou em relação a alguém a abster-se de ou executar uma determinada acção. É

essencialmente uma ligação normativa entre as pessoas. (Anónimo, s/d)

Escola Protestante

A escola protestante está preocupada, em primeiro lugar com a reparação da injustiça. Para os

estudiosos protestantes, os direitos humanos articulam reivindicações legítimas feitas por ou em

nome dos pobres, dos sem privilégios, e os oprimidos. (Dembour, 2010)

Exemplo: Direitos humanos, para Moraes (2006, p. 21)5, é o conjunto institucionalizado de

direitos e garantias do ser humano que visam preservar sua dignidade, estabelecer condições

mínimas de vida e permitir o desenvolvimento da personalidade humana, protegendo os

indivíduos contra o arbítrio estatal.

Escola Discursiva

A escola discursiva é caracterizada pela sua falta de reverência para com os direitos humanos. Na

sua perspectiva, os direitos humanos existem somente porque as pessoas falam sobre eles.

Estudiosos desta escola estão convencidos de que os direitos humanos não são atribuídos nem

que eles constituem a resposta certa para os males do mundo, mas eles reconhecem que a língua

em torno dos direitos humanos tornou-se uma poderosa linguagem com a qual se expressam

reivindicações políticas. (Dembour, 2010)

Em geral, podemos definir Direitos Humanos, segundo Sarmento (s/d), como faculdades de agir

ou poderes de exigir atribuições ao indivíduo para assegurar a dignidade humana nas dimensões

da liberdade, igualdade e solidariedade. Nascem na ordem jurídica supra estatal e são

recepcionados nos países que se comprometem a assegura-la e garanti-los em suas Constituições.

5MORAES, Alexandre de (2006). Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º à 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 7ª ed. São Paulo: Atlas.

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Características dos Direitos Humanos

Moraes (2006, p. 23) apresenta oito características dos direitos humanos, a saber: (1)

imprescritibilidade; (2) inalienabilidade; (3) irrenunciabilidade; (4) inviolabilidade; (5)

universalidade; (6) efectividade; (7) interdependência; (8) complementaridade. Silva (2003, p.

181)6, além destas características, cita a historicidade como outra característica dos direitos

humanos, a qual significa que os direitos humanos surgiram, modificaram-se e evoluíram em

razão de condições históricas.

Cidadania

Segundo Queiroz (2011), o conceito de cidadania que hoje conhecemos é o resultado da

evolução de ideias que surgiram desde que o homem passou a se agrupar e viver em

comunidades.

Cidadania é o exercício dos direitos e deveres civis,  políticos e sociais estabelecidos na

constituição.  Os direitos e deveres de um cidadão devem andar sempre juntos, uma vez que ao

cumprirmos nossas obrigações permitimos que o outro exerça também seus direitos. (Anónimo,

s/d)

2. Cidadania em suas várias dimensões

No século XVI: A cidadania fazia parte do Estado absoluto, na medida em que o cidadão estava

numa esfera jurídica própria na qual detinha direitos em relação ao seu soberano. Todavia, não

eram considerados cidadãos os escravos, estrangeiros, mulheres e crianças, pois estavam

subordinadas ao chefe da família. Assim, considerava-se cidadão, o súbdito livre, pois possuía

direitos em face da soberania do outro. O critério para a caracterização do cidadão natural era a

nacionalidade (Campello & Oliveira da Silveira, s/d).

A partir do século XVII e século XVIII: com o combate ao Estado absoluto pelo movimento

iluminista, passou-se a defender a liberdade do indivíduo frente ao soberano. A cidadania estava

voltada para a formação da comunidade política e a participação da sociedade nesta comunidade.

Na verdade, a transformação na concepção de cidadania ocorreu com a mudança na natureza do

contrato que dava origem ao Estado.

6SILVA, José Afonso da (2003). Curso de Direito Constitucional Positivo. 22a ed. São Paulo: Malheiros.

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Com a força das revoluções burguesas (Inglesa – final do século XVII; Americana e Francesa já

no século XVIII), presenciamos uma profunda modificação na concepção de cidadania, devido

ao próprio contexto histórico da transição do capitalismo comercial para o industrial que

desencadeou a dominação económica da classe burguesa. Importa enfatizar que a Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão (26 de Agosto de 1798) atribuiu uma conotação jurídico-

política à “cidadania liberal”, ao afirmar que os indivíduos nascem livres e iguais em direitos e

assim permanecem no que tange à liberdade, propriedade, segurança e resistência à opressão,

(idem), foi nesse momento que nasceu a moderna concepção de cidadania, que surgiu para

afirmar a eliminação de privilégios, mas que, pouco depois, foi utilizada exactamente para

garantir a superioridade de novos privilegiados. A cidadania no Estado Liberal entrou em crise,

pois, embora tenha servido para o reconhecimento de direitos, era permanentemente negada, do

ponto de vista político, aos pobres, mulheres e analfabetos, ao se instituírem o voto censitário.

Sem falar do convívio com o regime de escravidão por um grande período. (Campello & Oliveira

da Silveira, s/d)7

No século XIX: a cidadania era conferida na forma de status, pelo Estado aos seus membros,

que por sua vez passavam a ter benefícios/direitos políticos, por exemplo, votar e ser votado.

Mas, por outro lado, naquela época não se levava em conta os valores sociais. Tratava-se de um

modelo individualista profundamente criticado por Marx, visto que pela consequente disparidade

na separação de bens, precisava ser superado, concebendo-se direitos não ao indivíduo isolado,

mas ao indivíduo considerado concidadão. Na visão marxista todos os indivíduos são cidadãos e

vice-versa, portanto, todos deveriam ser vistos como iguais e pertencentes à mesma comunidade

política (Campello & Oliveira da Silveira, idem).

No século XX: Tomas Humphrey Marshall enunciou seus elementos articuladores, que seriam

os direitos civis (século XVIII), políticos (século XIX) e sociais (século XX), conquistados nesta

ordem. Nesse sentido, a interpretação de Marshall aproximava-se muito da ideia de progressiva

ampliação dos direitos mediante as necessidades. Com efeito, após a Primeira Guerra, os

direitos humanos, não se refeririam apenas aos direitos individuais (civis ou políticos) mas

também aos direitos sociais, económicos e culturais. Nesse passo, superava-se definitivamente o

conceito liberal de cidadania para entendê-la como conjunto de direitos civis, políticos e sociais.

No momento actual, agregaram-se novas variáveis ao processo da cidadania, tornando-se

7 CAMPELLO, Lívia Gaigher Bosio; OLIVEIRA da SILVEIRA, Valdimir (s/d). “Dignidade, Cidadania e Direitos Humanos”.

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indispensável o retorno à reflexão sobre o seu fundamento, titularidade e conteúdo. Temos como

ponto de partida a decadência da concepção liberal de cidadania e os novos desafios do século

XX, sejam sociais (pobreza, exclusão e imigração), sejam económicos (globalização), sejam

culturais (pluralismo e diversidade). Desse modo, a dimensão actual da cidadania deve ser vista

de maneira horizontal, com o envolvimento de concidadãos em pé de igualdade no acesso a

todos estes direitos e no cumprimento dos seus deveres, implicando uma relação de

intersubjectividade e de solidariedade (Campello & Oliveira da Silveira, idem).

As convergências entre a cidadania e os direitos humanos

Percebemos que entre estes dois conceitos, há convergências e divergências. As convergências

dizem respeito às relações de complementaridade e interdependência, baseando-se no

pressuposto de que os direitos humanos são figuras normativas e que a cidadania é um dos

valores mais fortes na sociedade, podemos apontar a relação entre estes dois conceitos

observando que no preceito maior dos direitos humanos, o qual está presente o princípio da

dignidade da pessoa humana, este pode ser posto em prática através do exercício da cidadania,

ou seja, a cidadania é um meio de objectivar, praticar, exteriorizar os direitos humanos. A

Complementaridade e Interdependência, para Arendt (1997), citado por Queiroz (2011) residem

no facto de que os direitos humanos para serem exigidos necessitam do vínculo a cidadania. A

Declaração dos direitos humanos apresenta os direitos mais relevantes já conquistados, pois se

preocupam com a preservação da espécie humana, mas carrega em si um paradoxo que necessita

de reparo: o facto de os direitos humanos, não poderem ser exigidos senão pelo vínculo da

cidadania e aqueles que não a possuem ficarem desprotegidos.

As divergências entre a cidadania e os direitos humanos

Os direitos humanos, conforme argumenta Benevides (2009), são universais, naturais e

históricos; ligam-se directamente à natureza humana; e superam fronteiras jurídicas e a soberania

dos Estados. A autora explica que a cidadania diz respeito a determinada ordem jurídico-política

vigente em um Estado ou país, que também define e garante quem é cidadão. Assim, não se

configuram como direitos universais, já que estão inseridos na Constituição de cada nação. A

ideia de cidadania é eminentemente política e não se liga a valores universais, mas a decisões

políticas.

Referências Bibliográficas

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CENCI, Jessé (2010). “A Hierarquia dos Tratados de Direitos Humanos”. Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó, UNOCHAPECÓ, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

DEMBOUR, Marie-Bénédicte (2010). “What Are Human Rights? Four Schools of Thought”. Human Rights Quarterly, Volume 32, Number 1, February, pp. 1-20 (Article).

HOLLENBACH, David (2011). “Human Rights in a Pluralist, Unequal Globe: Contributions of Jesuit Universities”. Published in Catholic Education, vol. 14, no. 3, pp. 338-345, March.

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SARMENTO, George (s/d). “As gerações dos Direitos Humanos e os desafios da efectividade.”

SILVA, José Afonso da (2003). “Curso de Direito Constitucional Positivo”.22ª. ed. São Paulo: Malheiros.

CAMPELLO, Lívia Gaigher Bosio; OLIVEIRA DA SILVEIRA, Valdimir (s/d). “Dignidade, Cidadania e Direitos Humanos”.

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