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Trabalho da disciplina de Teoria e Análise Linguística II

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JLIO DE MESQUITA FILHO

    FACULDADE DE CINCIAS E LETRAS DE ASSIS

    CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS

    DISCIPLINA: TEORIAS E ANLISE LINGUSTICA II

    PROFESSOR: MATHEUS NOGUEIRA SCHWARTZMANN

    ALUNO: DANIEL VIEIRA DOS SANTOS

    DATA: 14/01/2016

    TRABALHO FINAL DA DISCIPLINA

    Neste trabalho, pretende-se fazer uma espcie de panorama do ensino de lngua materna no

    Brasil, centrando-se na dialogia fala/escrita e nas transies entre as duas, enfocando principalmente

    no processo de alfabetizao que, no Brasil, ocorre em ambiente escolar na maioria das vezes.

    O processo de alfabetizao, de certa forma, o segundo processo de aquisio de

    linguagem pelo qual uma criana passa. O primeiro processo de aquisio de linguagem o da fala

    que, diferentemente da alfabetizao, acontece naturalmente. De acordo com Luiz Carlos Cagliari

    em Algumas Questes de Lingustica na Alfabetizao (2005),

    Toda criana aprende a falar. A criana aprende a falar porque convive com outras pessoas que falam e porque tem uma faculdade da linguagem, tambm chamada de pensamento ou

    de mente humana. Aprender a falar depende, pois, da racionalidade humana que dada a

    todo o ser humano pela natureza e da interao com outras pessoas (2005, p. 72-73).

    Basicamente, este mesmo processo ocorre na alfabetizao. No entanto, diferentemente do

    processo de aquisio da fala, a alfabetizao um processo artificial, induzido para que a criana,

    usando de sua racionalidade, faa as devidas conexes entre as palavras escritas e faladas ou, como

    Saussure afirma no Curso de Lingustica Geral, significante e significado. Para isto, preciso que

    a criana saiba ler e escrever tais palavras. E, para isto, o professor que est alfabetizando uma

    turma precisa incentivar os alunos a, segundo Cagliari, decifrar. Por exemplo, uma criana no

    saber como se escreve mesa sem antes relacion-la com o objeto mesa e a palavra falada

    mesa.

    No entanto, tal processo de alfabetizao nem sempre ocorre da forma proposta por Cagliari.

    Isto se deve, na maioria dos casos, ao fato do aluno j possuir uma bagagem como falante, formada

    atravs da convivncia com outros falantes mais velhos seus pais, irmos, tios, avs, primos,

    vizinhos, etc. Ao entrar numa escola para ser alfabetizado, o aluno se v obrigado a deixar tal

  • bagagem, pois, no processo de alfabetizao, se usa e a criana acaba sendo impelida a tambm

    usar a norma padro da Lngua Portuguesa. Logo, o aluno passa a acreditar que a variante falada

    por ele est errada e passar a ter dvidas sobre o significado do que ouve e do que diz.

    No vdeo Norma culta e oralidade (2011), o gramtico Evanildo Bechara e a professora

    da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ludmila Thom de Andrade, analisam esta

    questo, enquanto so mostrados alguns trechos de aulas para crianas que esto passando pelo

    processo de alfabetizao, alm de entrevistas com professoras que lecionavam para essas crianas

    em processo de alfabetizao. Resumidamente, o vdeo mostra uma oposio entre o que dito por

    Cagliari e que reforado por Bechara e Andrade em alguns trechos e o que feito em sala de

    aula, no caso das professoras entrevistadas. Ao se ler o texto de Cagliari e levando em considerao

    as observaes de Bechara e Andrade no vdeo, pode-se dizer que h dois tipos de professores, no

    aspecto da alfabetizao: os que levam em considerao a linguagem trazida pelo aluno e os que

    foram o aluno a aprender a norma culta.

    Esses dois tipos de professores, na prtica, representam uma dicotomia entre oralidade e

    escrita. Enquanto o primeiro, que considera a bagagem da criana como falante, preza a fala como

    meio para se conseguir melhores efeitos na alfabetizao, o segundo professor, que fora o

    aprendizado da norma padro, pretere a oralidade e toma como base a escrita e, a partir dela, o uso

    da norma culta na fala. Apesar disso, fala e escrita, ao contrrio do que se acredita, no se opem e,

    sim, se complementam. Conforme Maria Lcia da Cunha Victrio de Oliveira Andrade diz em

    Lngua: Modalidade Oral/Escrita,

    Essas modalidades no devem ser vistas de forma dicotmica, mas fazendo parte de um continuum tipolgico que vai do texto mais formal ao mais informal, tendo como

    perspectiva o gnero discursivo (conversao, carta familiar, entrevista de televiso,

    relatrio, conferncia artigo de divulgao, artigo cientfico) que est sendo observado. A

    oralidade e a escrita so, portanto, prticas e usos da lngua com caractersticas especficas,

    pois apresentam condies de produo distintas (2011, p. 50).

    Ou seja, embora aparentem se opor, fala e escrita fazem parte do conjunto da lngua, ainda

    que suas manifestaes ocorram de formas variadas. E nisto est a base do que foi dito por Cagliari,

    Bechara e Andrade anteriormente. Um professor que no leva em considerao a bagagem do aluno

    como falante e o fora a falar na norma padro, acaba por preferir a escrita em vez da fala, uma vez

    que a criana est sendo alfabetizada em tal norma e, a partir da, se pressupe que a escrita tenha

    uma superioridade em relao fala. No obstante, todos os povos do mundo, principalmente os

    grafos, possuem uma tradio oral e apenas os que desenvolveram a escrita a contento possuem

    uma tradio escrita.

  • Luiz Antnio Marcuschi, em Oralidade e Letramento, discorre bem sobre como a fala e a

    escrita possuem, sim, suas diferenas, embora no se oponham e, sim, se complementem. Num

    dado trecho, Marcuschi afirma que:

    [...] as diferenas entre fala e escrita se do dentro do continuum tipolgico das prticas sociais de produo textual e no na relao dicotmica de dois plos opostos. Em

    consequncia, temos a ver com correlaes em vrios planos, surgindo da um conjunto de

    variaes e no uma simples variao linear. (2011, p. 37).

    Assim sendo, a lngua se manifesta em vrios graus, alguns pendendo mais para a escrita,

    outros pendendo mais para a fala. Alm disso, o meio de produo tambm pode variar. Uma

    conversa rpida, por exemplo, estritamente sonora e oral, no possuindo nenhuma relao com a

    escrita. J uma notcia de jornal ou uma redao dissertativa o completo oposto, pois o meio de

    produo grfico. Portanto, em maior e menor grau, a lngua se manifesta, ora pela fala, ora pela

    escrita, de diversas formas.

    Neste trecho, mais do que necessrio falar da importncia da norma padro. Embora no

    seja muito recomendvel tom-la como base na alfabetizao, menosprezando a bagagem como

    falante do aluno, ela indispensvel na leitura. E isto se deve justamente pela fala, ou seja, por

    conta de um fenmeno da fala, a escrita viu a necessidade de se padronizar.

    Um bom exemplo disso so as variantes lingusticas existentes no Portugus. Tais variaes

    podem ser de natureza diatpica (regional), diastrtica (grupos sociais), diafsica (formalidade) ou

    diacrnica (tempo). Diante de tais variaes, viu-se a necessidade de uma padronizao da lngua, a

    fim de que a compreenso entre pessoas de variantes diferentes se tornasse possvel. A maior prova

    disto que possvel ler livros do alagoano Graciliano Ramos, da cearense Rachel de Queiroz, do

    gacho rico Verssimo, do portugus Jos Saramago e do moambicano Mia Couto sem menores

    problemas, embora tais problemas viessem a aparecer na compreenso da variante de cada um.

    Desta forma, a fala e a escrita no podem ser separadas, j que fazem parte do mesmo

    processo, embora apaream e tenham funes diferentes. Assim como a norma padro tem sua

    importncia no processo de alfabetizao, embora no deva ser a base de um processo de

    alfabetizao, principalmente quando se a toma como nica base de manifestao da lngua,

    ignorando as variaes lingusticas em prol de uma norma que no faz parte do vocabulrio de

    grande parte da populao.

    Em suma, enquanto o ensino de lngua materna no Brasil ainda se basear apenas na norma

    culta, tornando irrelevantes as variaes lingusticas no campo da fala e da escrita e nisto se

    inserem as variaes que surgiram com a popularizao da internet e do WhatsApp (internets,

  • emoticons, emojis, etc.) -, o aluno acabar por no absorver a contento a norma padro ou, caso

    absorva, tomar como erradas todas as variaes que venham a diferir da norma culta da lngua

    portuguesa.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ANDRADE, M. L. C. V. de O. Lngua: modalidade oral/escrita. In: UNIVERSIDADE

    ESTADUAL PAULISTA. Prograd. Caderno de formao: formao de professores didtica geral.

    So Paulo: Cultura Acadmica, 2011, p. 50-67, v. 11.

    CAGLIARI, L. C. Algumas questes de lingustica na alfabetizao. Caderno do Professor (Belo

    Horizonte), Belo Horizonte, MG, v. 1, n.12, p. 12-20, 2005.

    MARCUSCHI, Luiz Antnio. Oralidade e letramento. In: ______. Da fala para a escrita:

    atividades de retextualizao. 10a ed. So Paulo: Cortez, 2011, p. 15-43.

    NORMA culta e oralidade. TV Cultura, 6 dez. 2011. Disponvel em

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