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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA MONOGRAFIA DE BACHARELADO Avaliação do Impacto dos Veículos Flex na Elasticidade-Preço da Demanda por Etanol no Estado do Rio de Janeiro entre 2001 e 2007 Renan Pinheiro Silvério Matrícula: 104015896 E-mail: [email protected] Orientador: Prof. Edmar Almeida E-mail: [email protected] Novembro 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROINSTITUTO DE ECONOMIA

MONOGRAFIA DE BACHARELADO

Avaliação do Impacto dos Veículos Flex na Elasticidade-Preço da Demanda por Etanol no

Estado do Rio de Janeiro entre 2001 e 2007

Renan Pinheiro SilvérioMatrícula: 104015896

E-mail: [email protected]

Orientador: Prof. Edmar AlmeidaE-mail: [email protected]

Novembro 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROINSTITUTO DE ECONOMIA

MONOGRAFIA DE BACHARELADO

Avaliação do Impacto dos Veículos Flex na Elasticidade-Preço da Demanda por Etanol no

Estado do Rio de Janeiro entre 2001 e 2007

____________________________________________________Renan Pinheiro SilvérioMatrícula: 104015896

E-mail: [email protected]

Orientador: Prof. Edmar AlmeidaE-mail: [email protected]

Novembro 2007

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As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor

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Dedico este trabalho a minha famíliae a todos aqueles que, de alguma forma,me levaram a acreditar que era possível

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AGRADECIMENTOS

Começo os agradecimentos pela minha família. Em primeiro lugar aos meus pais, Antonio

e Vera, sem os quais nada disso seria possível. Obrigado por todo o cuidado que vocês tiveram

comigo ao longo da minha vida. Esforço-me e continuarei esforçando-me, todos os dias de minha

vida, para jamais decepcioná-los. Além deles gostaria de agradecer aos meus dois irmãos Vitor e

Pierre pelo constante incentivo e pelo carinho dedicado a mim ao longo de todos esses anos de

vida. Amo todos vocês. Muito.

Agradeço ao professor Edmar Almeida, pela ajuda com a escolha do tema deste trabalho e

pelas orientações precisas que me guiaram até este momento de conclusão da monografia.

Agradeço à professora Mariana Iootty pela paciência com que me guiou pelos caminhos tortuosos

da econometria e me auxiliou (bastante!) na árdua tarefa de extrair idéias e conclusões dos dados

utilizados.

Na Petrobras, a lista de “obrigados” é um pouco mais extensa. Em primeiríssimo lugar

agradeço a Renata Nascimento (minha gerente nestes últimos meses de jornada) por toda a

atenção dedicada ao meu crescimento profissional e por não medir esforços no sentido de me

ajudar a “correr atrás” dos meus objetivos. Não tenho palavras para descrever a sua valorosa

contribuição em todas as conquistas (dentre as quais este trabalho) que obtive ao longo deste

árduo ano.

Obrigado ao Eduardo Correia que (em uma parcela pequena de seu valioso tempo) foi

capaz de transmitir com precisão e riqueza de detalhes uma série de conceitos e idéias que

contribuíram enormemente para este trabalho.

Agradeço ainda a todos os companheiros da Estratégia da Petrobras que de inúmeras

formas contribuíram para o meu crescimento pessoal e profissional. Conselhos, palavras de

incentivo, conhecimento, carinho, bom humor, elogios, críticas... A convivência com vocês foi

inesquecível.

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Agradeço aos companheiros de faculdade, que sempre buscaram me incentivar ao longo

de toda essa jornada. A todos vocês que ajudaram a tornar as dificuldades da luta diária menores.

Deixo registrado um agradecimento especial pelas incontáveis caronas, que encurtaram distâncias

e aprofundaram laços de amizade. Obrigado por todos os bons momentos que passamos juntos.

Desejo que todos vocês consigam o sucesso que merecem em suas empreitadas.

Obrigado aos amigos, pela amizade incondicional, tanto nos bons como nos maus

momentos. É muito importante saber que sempre posso contar com vocês.

Agradeço à minha namorada Mariana por seus incontáveis gestos de carinho, sua

companhia, sua cumplicidade, seus sorrisos... Sua presença foi muito importante para mim neste

último ano.

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RESUMO

Este estudo tem por objetivo avaliar o impacto que a introdução dos veículos flex teve

sobre as elasticidades preço e renda das vendas de álcool. A partir de dados de vendas de álcool e

preços ao consumidor no Estado do Rio de Janeiro, utiliza-se a técnica de co-integração para a

estimação das elasticidades em questão e de uma variável binária de inclinação associada à

introdução dos veículos flex para avaliar o impacto que esses tiverem sobre a elasticidade-preço.

Foram encontrados os valores de 8,623 para a elasticidade-renda, de 0,699 para a elasticidade-

preço e de -0,295 para o coeficiente da variável binária de inclinação. Levanta-se a hipótese de

que o crescimento explosivo da frota de veículos com o potencial de tornar-se consumidora de

álcool seja o fator responsável por alterar o sinal da elasticidade-preço e potencializar a

elasticidade-renda. Tal hipótese é corroborada pelo crescimento explosivo das vendas de álcool

descolado do movimento dos preços, o rápido crescimento da frota de veículos flex em face da

frota existente movida a álcool e a relação de preços álcool/gasolina favorável em quase todo o

período de análise que levam os proprietários de veículos flex a optar pelo álcool. Apenas o sinal

do coeficiente da variável binária comporta-se como esperado na teoria e na literatura, indicando

que os veículos flex exercem efeito capaz de aumentar a elasticidade-preço das vendas de álcool

da mesma forma que estudos anteriores mostraram que ocorre com a gasolina.

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ÍNDICE

AGRADECIMENTOS....................................................................................................................................................5

RESUMO........................................................................................................................................................................7

ÍNDICE...........................................................................................................................................................................8

INTRODUÇÃO...............................................................................................................................................................9

CAPÍTULO I- O Mercado Brasileiro de Combustíveis...............................................................................................11

I.1 BREVE HISTÓRICO DO MERCADO BRASILEIRO..............................................................................................................12I.2 O SURGIMENTO DOS CARROS FLEX E SUA INSERÇÃO NO MERCADO BRASILEIRO..................................................................21I.3 AS IMPLICAÇÕES MICROECONÔMICAS DA TECNOLOGIA FLEX.............................................................................................23

CAPÍTULO II- Modelando a Demanda por Alcool combustível...............................................................................28

II.1 REVISÃO DOS MODELOS DE DEMANDA.......................................................................................................................28II.2 FORMULAÇÃO DE MODELO ECONOMÉTRICO PARA A DEMANDA DE ÁLCOOL HIDRATADO NO MERCADO BRASILEIRO DE COMBUSTÍVEIS..............................................................................................................................................................34

II.2.2.1 Fontes de Dados..................................................................................................................................................37II.2.2.2 Especificação do Modelo....................................................................................................................................41

CAPÍTULO III - Resultados da Análise......................................................................................................................44

III.1 OS RESULTADOS...................................................................................................................................................44III.2 ANÁLISE DO RESULTADO........................................................................................................................................47

CONCLUSÃO...............................................................................................................................................................50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................................................................................52

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INTRODUÇÃO

A preocupação com as questões ligadas ao clima e ao aquecimento global está cada vez

mais forte na opinião pública mundial. O cerne da questão está na idéia de que as emissões de

certos gases poluentes contribuem para o agravamento do “efeito estufa” trazendo conseqüências

como: o aquecimento global, o derretimento das calotas polares, a inundação de áreas litorâneas e

uma série de outros transtornos amplamente discutidos na bibliografia e na mídia.

Segundo estudos realizados por universidades e centros de pesquisa, dentre os quais

figura o Intergovernamental Panel on Climate Change (IPCC)1 (2006), a principal fonte de

emissão desses gases é a queima de combustíveis fósseis, necessária ao processo predominante

de geração de energia da atualidade. Baseadas nestes fatos, empresas, governos, organizações não

governamentais e a sociedade de uma forma geral estão buscando formas de substituir (ou ao

menos reduzir) o uso desse tipo de combustível.

É nesse ponto que a questão penetra os mercados de gasolina e outros combustíveis para

veículos automotores. Uma das iniciativas de redução de emissões de gases está calcada na

redução/substituição do consumo de gasolina e diesel. Países como os EUA e os membros da

União Européia estão introduzindo biocombustíveis em suas matrizes energéticas e investindo em

pesquisa com o intuito de desenvolver novas fontes energéticas. Os biocombustíveis estão se

inserindo no mercado através de mistura à gasolina e/ou através da plena substituição. No

primeiro caso, tanto o biodiesel quanto o etanol são utilizados como combustível alternativo. Já

na segunda opção, propiciada pelos veículos flex, o etanol é predominante.

No caso brasileiro, a especificidade histórica produzida pelo desenvolvimento do

Proálcool nas décadas de 1970 e 1980 conferiu ao país certo grau de experiência na utilização do

álcool como combustível automotor. Após período de crise na década de 1990, observa-se uma

retomada do uso de álcool no início do novo milênio, fato que, dentre outros fatores, foi

favorecido pela introdução dos veículos flex.

O objetivo do presente estudo é investigar como a introdução dessa nova modalidade de

veículo altera a dinâmica do mercado brasileiro de combustíveis no que tange à forma como a

1 Em outubro de 2007 os cientistas que contribuem com o IPCC foram agraciados com prêmio Nobel da Paz.

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demanda responde a variações de preço nos combustíveis. Os principais parâmetros a serem

analisados são as elasticidades preço e renda da demanda por álcool antes e depois da introdução

dos veículos flex.

Para atingir tal objetivo o trabalho está repartido em três capítulos. No primeiro deles será

traçada uma evolução histórica do mercado brasileiro de combustíveis, com ênfase na utilização

do álcool como combustível e um breve histórico da introdução dos veículos flex, com foco nas

principais conseqüências teóricas que tal fato pode trazer para análise do mercado.

No segundo capítulo será realizada uma revisão bibliográfica dos principais modelos

econométricos desenvolvidos para o estudo da demanda por combustíveis no mundo. Contém

também, a apresentação do ferramental analítico que fundamenta o modelo a ser estimado, as

fontes de dados utilizadas e a própria especificação do modelo.

Por último, o terceiro capítulo traz a análise dos principais resultados da estimação do

modelo, e as principais implicações econômicas que eles trazem para o entendimento do mercado

brasileiro de combustíveis, em especial da demanda por álcool.

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CAPÍTULO I- O MERCADO BRASILEIRO DE COMBUSTÍVEIS

Este capítulo tem por objetivo justificar a implementação deste trabalho, ou seja, validá-lo

enquanto produção científica de relevância por meio da apresentação dos pilares que compõem

este estudo. Portanto, faz-se necessário apresentar o objeto de análise da perspectiva de sua

evolução histórica e das suas características no presente, com ênfase nas recentes transformações

que justificam o estudo.

A meta é discorrer brevemente sobre o histórico recente do mercado brasileiro de

combustíveis, com ênfase nos papeis desempenhados pelo ProÁlcool e pelas mudanças

institucionais ocorridas nos anos 1990. Após isso o estudo apresentará os principais

determinantes do ressurgimento do etanol como fonte alternativa viável de combustível

automotivo. Por último será analisada a inserção dos carros flex na frota de veículos brasileira

após 2003, com destaque para as alterações que ele pode provocar na dinâmica do mercado de

combustíveis.

A primeira seção tratará da evolução histórica da inserção do etanol no mercado brasileiro

de combustíveis. A criação e as características mais relevantes do Programa Nacional do Álcool

(ProÁlcool) em 1975, que será considerado como marco inicial, serão analisadas na primeira

parte, que se encerra com a crise iniciada no final dos anos 1980. A segunda parte tratará das

mudanças institucionais ocorridas na década de 1990 e das influências que a desregulamentação

de 2002 possui sobre a atual configuração do mercado.

A segunda seção destacará o crescente papel dos veículos flex no mercado brasileiro de

combustíveis. Tem como objetivos principais descrever a tecnologia por trás desse tipo de

veículo, descrever sua recente (porém de rápida expansão) trajetória nesse mercado.

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A terceira seção tem o objetivo de mostrar as principais considerações teóricas a respeito

do que a tecnologia flex representa para o mercado de combustíveis. Realiza também, a luz das

considerações mencionadas, uma análise dos possíveis impactos que a introdução dos veículos

flex pode ocasionar no mercado em estudo.

I.1 Breve Histórico do Mercado Brasileiro

I.1.1 O ProÁlcool

Ao início da década de 1970, a economia brasileira experimentou um forte crescimento

econômico em um momento que ficou conhecido como “milagre econômico”. Por causa disso, a

demanda por energia também passou por elevação acentuada. O gráfico abaixo evidencia a

expansão ocorrida nos anos finais do “milagre”, época em que o Brasil importava cerca de 80%2

do petróleo demandado internamente.

Gráfico 1: Importações Líquidas de Petróleo (1970-1980) 3.

0

10,000

20,000

30,000

40,000

50,000

60,000

1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980

10³

Tep

Importações Líquidas de Petróleo

Fonte: BEN 2006 – Gráfico elaborado pelo Autor

2 Fonte: MME, citado em Benitez (2006) p. 283 Tep = Tonelada Equivalente de Petróleo, que representa potencial energético de 10.800 kcal/kg

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No ano de 1973, tensões geopolíticas no Oriente Médio culminaram na Guerra Árabe-

Israelense. O principal reflexo desse conflito no mundo ocidental foi a alta súbita dos preços do

petróleo, conhecida como o primeiro “Choque do Petróleo”. Os preços, que estavam na faixa de

US$ 2,59/barril em janeiro de 1973, atingiram a cifra de US$ 10,95/barril em janeiro de 1974

configurando uma alta de 322%.

Esse evento demandou das economias ocidentais uma atitude no sentido de reduzir a

dependência do petróleo importado. É para atender a essa demanda que o governo Geisel

implementa o Programa Nacional do Álcool (ProÁlcool) em 1975 em conjunto com uma série de

outras medidas de política energética4. Conforme Vieira (1999)5, a meta do programa consistia na

economia de divisas provocada pela redução da dependência das importações de petróleo. Em

paralelo, o incentivo ao álcool teve como objetivo fomentar uma forma de utilização alternativa

da cana-de-açúcar, dado que os seus preços internacionais estavam em declínio na época.

Nessa primeira fase, que se estende até 1979, a penetração do etanol no mercado

brasileiro de combustíveis se dá através do aumento do percentual de álcool anidro misturado à

gasolina, que sobe de 15% para 22%. Já nesse período, faz-se necessário um esforço de pesquisa

e desenvolvimento das montadoras de automóveis no sentido de adaptar os motores dos veículos

à nova mistura de combustível, de natureza mais corrosiva.

O governo atuou incentivando a produção de duas formas principais: I) a fixação de

preços remuneradores via decretos e II) o amplo financiamento à construção de usinas e

destilarias. Os preços remuneradores foram obtidos a partir da criação de uma paridade entre o

preço de uma saca de 60Kg de açúcar e 44 litros de álcool. Já em relação ao financiamento, Farid

(1994)6 mostra que o montante de investimentos chegou à cerca de US$ 2,1 Bilhões, dos quais

75% foram provenientes de gastos públicos.

Os resultados disso ficam claros a partir da observação do gráfico 2. A produção de álcool

sofre um impulso a partir do ano de início do plano, puxada pelo álcool anidro utilizado em

misturas à gasolina. O volume produzido, que era de 580 milhões de litros em 1975, saltou para

2854 milhões em 1979, com a produtividade elevando-se em 8,5% (CASELLI, 2004).

4 Para maiores detalhes, ver Pinto Jr. (2007)5 Citado em Marjota-Maistro (2002) p. 46 Citado em Benitez (2006) p. 30

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Gráfico 2: Produção Nacional de Álcool: 1975-1979 (Milhões de litros)

Fonte: Anuário Estatístico CNP, extraído de Caselli (2004, p.25)

No ano de 1979, novas tensões geopolíticas no Oriente Médio provocam outro “choque”

do petróleo. Dentre os efeitos da Guerra Irã-Iraque, está uma nova elevação dos preços

internacionais do petróleo, que saltou de US$ 14,00/barril para US$ 30,00/barril. Neste contexto,

o governo brasileiro optou por continuar e intensificar o ProÁlcool.

A linha de ação do programa nesta segunda fase contava com duas frentes principais: I)

incentivar a produção de álcool, agora com o objetivo de substituir parte do consumo de gasolina

e, II) fomentar a construção de um mercado de carros a álcool capaz de absorver a nova

produção.

Do lado da oferta, o governo prosseguiu com as políticas de financiamento ao setor. Entre

1980 e 1984 o montante de recursos concedidos pelo estado atingiu cerca de US$ 4,5 bilhões

(FARID, 1994)7. Essa fase marca também o surgimento de destilarias autônomas, totalmente

dedicadas à produção de álcool. Os efeitos dessa política ficam evidentes na análise do gráfico 3,

onde a produção de álcool sofre forte elevação, motivada agora pelo álcool hidratado usado como

combustível.

7 Citado em BENITEZ (2006) p.27

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Gráfico 3: Produção Nacional de Álcool: 1980-1988 (MM litros)

Fonte: Anuário Estatístico CNP, extraído de CASELLI (2004, p. 28)

Do lado da demanda, a produção e a venda de carros a álcool foram estimuladas por

incentivos fiscais de diversas naturezas. Benitez (2006) destaca que, a redução da alíquota do IPI,

o IPVA 3% menor e a isenção do ICMS resultavam em um montante de impostos 5% menor e,

conforme Correia (2007), em um preço final consideravelmente mais baixo para os veículos a

álcool.

Visando garantir a viabilidade econômica8 do álcool como combustível para o

consumidor, o governo fixou um preço de venda inicialmente 35% menor em relação à gasolina.

Ao longo da década o diferencial de preços esteve flutuando com álcool de 40 a 45% mais barato

que a gasolina (NAPPO, 2006).

O Gráfico 4 evidencia o sucesso da política de incentivo à produção e venda de carros a

álcool. A proporção desse tipo de veículo no total das vendas passou de 0,46% em 1979 para

24,7% em 1980 e atingiu o teto de 76,1% em 1986 (NAPPO, 2006). O gráfico 5, em seguida,

mostra os efeitos disso no mercado de combustíveis, onde o consumo de gasolina sofre uma

queda durante o período.

8 Acredita-se que, por conta do seu menor poder calorífico, o álcool hidratado é uma alternativa economicamente viável à gasolina quando o seu preço é pelo menos 30% menor que o da gasolina.

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Gráfico 4: Produção (%) de veículos por Tipo de Combustível: 1980 – 1989

Fonte: Anfavea, extraído de CASELLI (2004, p. 29)

Gráfico 5: Consumo de Gasolina e Álcool (bilhões m³)

2

4

6

8

10

12

14

16

1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989

Bilh

ões

Gasolina Total de Álcool Álcool Hidratado

Fonte: BEN 2006, elaboração do Autor

16

Total de Álcool

Álcool Hidratado

Gasolina

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Uma conjunção de eventos nacionais e internacionais no setor de petróleo contribui para

provocar uma crise no ProÁlcool. Do ponto de vista nacional, os sucessos em exploração de

águas profundas da Petrobras e a finalização das hidroelétricas iniciadas ainda no II PND9

reduziram a dependência externa de petróleo. Do ponto de vista internacional a estabilização10

dos preços do hidrocarboneto em queda reduziu os custos dessa dependência externa.

Com a redução da necessidade de uma política de substituição de derivados, o governo

federal reduziu grande parte dos estímulos e subsídios do ProÁlcool (CASELLI, 2004). No final

dos anos 1980, o governo brasileiro passava por problemas quanto à disponibilidade de recursos

para continuar subsidiando programas de substituição de fontes de energia. Piacente (2006) diz

que uma revisão da política de incentivos resultou na inclusão do setor sucroalcooleiro na

legislação agrícola de 198011, reduzindo a sua rentabilidade. Houve também uma forte redução12

no investimento de recursos públicos no ProÁlcool.

Ocorreu, no período, um descompasso entre a produção e a demanda por álcool. A

redução nos estímulos à produção não foi acompanhada por uma redução na demanda. O

diferencial de preços continuou viável para o consumidor final e os incentivos fiscais

continuaram tornando os carros a álcool mais competitivos do que os seus pares movidos à

gasolina no mercado automotivo (NAPPO, 2006).

A redução na produção de álcool culmina com uma crise de abastecimento no ano de

1989, que tem impactos diretos sobre o mercado brasileiro de combustíveis. Segundo Roppa

(2005)13, ocorre uma queda no diferencial de preços entre álcool e gasolina, que retorna ao

patamar de 35% em 1987, 30% em 1988 e chega a 25% em 1989. O álcool hidratado torna-se

então uma opção menos atraente que a gasolina. A perda da credibilidade do programa provoca

queda nas vendas, tanto de automóveis a álcool quanto do combustível em si.

9 O 2º. Plano Nacional de Desenvolvimento foi elaborado pelo governo Geisel (1973-1978) e previa investimentos maciços na indústria de bens intermediários e de infra-estrutura. Os investimentos em energia incluíram a construção de hidrelétricas, usinas nucleares e o próprio ProÁlcool, dentre outras fontes.10 Também chamado de “contrachoque” do petróleo, essa queda nos preços é provocada pela maior oferta de petróleo Saudita no mercado internacional. Para maiores detalhes ver Pinto Jr. (2007)11 O setor sucroalcooleiro passou a ser tratado como os outros produtos agrícolas, fato que segundo Piacente (2006) resultou na remoção de incentivos e, consequentemente, na redução da rentabilidade média da produção.12 O estado participou com apenas 3% dos investimentos totais no programa de 1987 em diante. (Piacente, 2006)13 Citada em Benitez (2006)

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I.1.2 A década de 1990 e a Desregulamentação

No início da década de 1990 é possível afirmar que o país está se orientando

economicamente no sentido de abrir a economia, e reduzir a intervenção do estado. Em paralelo

com essa tendência, o mercado brasileiro de combustíveis também observará uma

desregulamentação ao longo de toda a década de 1990. A crise do ProÁlcool se acentua e o

álcool hidratado perde competitividade frente à gasolina, retomando sua posição apenas ao fim da

década.

A crise de abastecimento de álcool iniciada em 1989, força o país a recorrer à importação

de etanol para atender a escassez do mercado. Segundo Nappo (2006), foi necessária a introdução

da mistura MEG14 no mercado brasileiro para satisfazer a demanda, fato que levou o país a

importar mais de 1 bilhão de litros de etanol e metanol no período que vai de 1989-1995.

O gráfico 6 mostra como o diferencial de preços entre gasolina e álcool hidratado esteve

desfavorável para o consumidor proprietário de carro a álcool. O que ocorre então é uma

retomada do consumo de gasolina. Os problemas de abastecimento de álcool, a queda dos preços

internacionais do petróleo (e seu conseqüente impacto sobre os preços da gasolina) e o processo

de conversão de veículos a álcool para gasolina podem ser apontados como a principal causa

disso no início da década.15

14 A mistura MEG é composta por uma proporção de 60% de álcool hidratado, 30% de metanol e 6% de gasolina. Tal mistura é capaz de substituir o álcool hidratado com desempenho semelhante. (NAPPO, 2006)15 Roppa (2005, p.34) aponta que o processo de conversão possuía um custo muito alto. Entretanto, vender o carro a álcool e comprar um novo carro a gasolina era inviável pela ausência de demanda pelos primeiros.

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Gráfico 6: Diferencial de preços entre gasolina e álcool hidratado (US$/m³)16

0,00

0,10

0,20

0,30

0,40

0,50

0,60

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Diferencial Álcool Gasolina

Fonte: BEN 2006, elaboração do Autor

A abertura econômica ocorrida durante o primeiro governo Fernando Henrique

(1994-1998) impulsionou ainda mais o consumo de gasolina. Alves e Bueno (2003) afirmam que

a taxa de crescimento do consumo de gasolina foi da ordem de 10% ao ano entre 1994 e 1999,

enquanto os outros combustíveis cresceram em média 3,2% ao ano. A abertura do mercado, que

facilitou a penetração de carros importados (geralmente movidos à gasolina) e o programa de

estabilização promovido pelo governo podem ser apontados como fatores favoráveis a essa

expansão. Cabe ressaltar que, nesse período a participação da venda de veículos a álcool torna-se

praticamente desprezível em relação ao total da venda de veículos.

Entre 1994 e 1999, ocorre também o processo de liberalização dos mercados de álcool

anidro e hidratado, que se tornam completamente competitivos em todas as suas fases de

produção a partir de 1999. O quadro de mudanças institucionais inclui a criação da Agência

16 Valor calculado da seguinte forma: PgasolinaPálcool−1

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Nacional do Petróleo (ANP)17 em 1997, a extinção do Departamento Nacional de Combustíveis

(DNC) 18 e a criação do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (CIMA)19. Em 1998,

todos os subsídios existentes antes da desregulamentação foram removidos e substituídos pela

Parcela de Preço Específica - PPE, que dentre outros objetivos visava garantir que o diferencial

de preços entre a gasolina e o álcool fosse de pelo menos 25%. Em dezembro de 2001 a PPE foi

substituída pela Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE, imposto sobre a

gasolina cuja receita seria revertida para investimentos em infra-estrutura na área de transportes.

A partir de 1999 entretanto, o consumo de gasolina volta a cair. Nappo (2006) e Marjotta-

Maistro (2002) possuem argumentos que ajudam a explicar o fenômeno:

a) Do ponto de vista regulatório, os preços da gasolina estavam de certa forma

vinculados20 aos preços do barril de petróleo, que experimentaram alta no período.

b) A crescente adulteração da gasolina por parte dos postos de “bandeira branca”21. Em

um contexto de alta dos preços internacionais, a adição de uma mistura maior de álcool anidro ou

solventes mantinha os preços de venda, de forma ilegal, mais baixos em relação àqueles

praticados pelos postos concorrentes.

c) A liberação do uso do Gás Natural Veicular – GNV a partir de 1997 em veículos

particulares. De 1997 a 2003, o consumo de GNV no país sobe de 50 mil m³ para 1,2 milhões de

m³ (NAPPO, 2006). Cada metro cúbico de GNV possui poder calorífico cerca de 20% maior que

o litro de gasolina (OLIVEIRA, 2004).

Estes eventos acima enunciados explicam a explosão do diferencial de preços entre

gasolina e álcool em 1999 e a sua manutenção acima do nível mínimo de 30%, que garante a

competitividade do álcool. O que cabe ressaltar é que o álcool voltou a tornar-se competitivo com

um nível de intervenção governamental consideravelmente menor em relação á década de 1980.

17 Órgão responsável pela regulação do setor de petróleo, gás, biocombustíveis e derivados.18 Órgão que era responsável pela formulação de políticas voltadas para o mercado brasileiro de combustíveis.19 Órgão do governo com a função de centralizar a tomada de decisões sobre política no setor sucroalcoeiro, envolvendo diversos ministérios: Agricultura, Fazenda, Orçamento, Energia, Ciência e Tecnologia entre outros.20 Conforme Marjotta-Maistro (2002), as variações não eram completamente repassadas ao mercado com o intuito de suavizar flutuações de preços, porém no período em análise os preços da gasolina acompanham as variações internacionais de forma mais acentuada com o intuito de reduzir os déficits na conta Petróleo.21 De acordo com Nappo (2006), são postos revendedores que compram combustíveis de várias distribuidoras diferentes.

20

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Em 2003 a introdução dos carros flex terá um forte potencial de aumento na demanda por álcool e

alterará substancialmente a estrutura do mercado brasileiro de combustíveis.

I.2 O Surgimento dos Carros Flex e sua inserção no mercado brasileiro

A principal inovação tecnológica é a possibilidade de abastecer um carro com álcool

hidratado, gasolina ou qualquer mistura dos dois combustíveis. Através de um sensor eletrônico

que mede o teor de álcool na mistura de combustível, a unidade de comando do sistema de

injeção eletrônica é capaz de adaptar as funções do motor e otimizar a queima de combustível.

Dentre os desafios tecnológicos vencidos, está a necessidade de adaptação de diversos

componentes do motor à natureza mais corrosiva do álcool. Grande parte da tecnologia

necessária já estava disponível no Brasil desde a segunda fase do ProÁlcool. Um dos itens

necessários aos veículos flex é o sistema de partida a frio. Pelo fato do álcool hidratado não ser

capaz de iniciar o motor a temperaturas muito baixas é preciso que o veículo venha equipado com

um pequeno tanque adicional de gasolina. Um sensor no motor detecta a quantidade de álcool na

mistura de combustível, verifica a temperatura ambiente e automaticamente injeta gasolina do

tanque adicional na mistura para facilitar a partida do motor caso seja necessário.

A introdução dos veículos flex no mercado brasileiro de combustíveis se deu em março de

2003. Em 2002, eles foram enquadrados na mesma categoria fiscal e tributária dos veículos a

álcool. Segundo Carvalho (2006) a redução de IPI provocada pela medida foi o principal

incentivo que as montadoras precisavam para investir na tecnologia flex, que vinha sendo

pesquisada por empresas como Bosch e Magnetti Marelli desde o final dos anos 1980.

21

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Tabela 1: Incidência Fiscal sobre os Automóveis no Brasil

Fonte: Joseph Jr. (2005), elaboração do Autor

A conjugação desses incentivos fiscais com o ressurgimento do álcool hidratado como

alternativa viável22 de combustível impulsionou as vendas de veículos flex a partir de seu

lançamento. Ainda no ano de 2003 as vendas chegaram à casa dos 48 mil veículos, saltando para

328 mil em 2004. Segundo a Anfavea23, em maio de 2005 a venda de veículos flex ultrapassou a

venda de veículos a gasolina e a frota já tinha atingido a marca dos 600 mil veículos.

Já é possível observar impactos visíveis no consumo de combustíveis. Segundo dados do

Ministério de Minas e Energia24, o consumo de álcool hidratado subiu do nível de 4,5 milhões de

metros cúbicos em 2003 para 6,2 milhões de metros cúbicos em 2005, representando alta de

aproximadamente 37% no período. O consumo de gasolina, no mesmo horizonte de tempo, subiu

apenas 3%, passando de 17 milhões de metros cúbicos em 2003, para 17,7 milhões de metros

cúbicos em 2005.

Segundo Nappo (2006), as perspectivas de mercado para os veículos flex são bastante

favoráveis. Espera-se que nos próximos anos, as vendas ultrapassem a cifra de 1 milhão de

unidades/ano. Em termos de market-share do mercado automotivo essas vendas representariam

algo em torno de 70% das vendas totais de automóveis já em 2006. O mesmo autor ainda cita

22 Vale destacar o gráfico 6 na seção anterior, que mostra o diferencial de preços gasolina-álcool favorável ao álcool em todo o período.23 Joseph Jr. (2005)24 Dados do BEN 2006

-- Até 1.000 cc:Até 1.000 cc: gasolina / álcool / gasolina / álcool / flexflex - 27,1% - 27,1%- De 1.000 cc até 2.000 cc:- De 1.000 cc até 2.000 cc: gasolinagasolina - 30,4% - 30,4% álcool / álcool / flexflex - 29,2% - 29,2%- Acima de 2.000 cc:- Acima de 2.000 cc: gasolinagasolina - 36,4% - 36,4% álcool / álcool / flexflex - 33,1% - 33,1%

22

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estudo da Petrobras que prevê que a quantidade de carros flex em circulação responda por metade

da frota de automóveis em 2015.

I.3 As implicações microeconômicas da tecnologia flex

Do ponto de vista da análise a ser realizada neste estudo a tecnologia flex trás uma

inovação fundamental: a possibilidade de o consumidor optar livremente entre o álcool hidratado

e a gasolina na hora de abastecer o seu automóvel. Esse fato possui desdobramentos capazes de

alterar a dinâmica do mercado de combustíveis de forma significativa, no que tange a

comportamento dos consumidores, formação de preços decisões de oferta e etc..

Microeconomicamente, a análise do comportamento dos consumidores requer a utilização

do ferramental da teoria do consumidor. De acordo com tal arcabouço teórico e de forma bem

simplificada, cada indivíduo tem suas preferências descritas por uma função utilidade e está

sujeito a uma restrição orçamentária. Seu problema, pode ser matematicamente interpretado

como a maximização da função utilidade sujeita a restrição orçamentária.

Sustentam esta teoria alguns pressupostos básicos sobre as preferências dos

consumidores, enunciados em Varian (2003):

a) Pelo fato das preferências serem completas, é sempre possível realizar a

comparação entre duas cestas quaisquer.

b) Pela propriedade reflexiva, é possível afirmar que qualquer cesta é pelo menos

tão boa quanto ela mesma.

c) Pela propriedade da transitividade, se uma cesta X é tida como fracamente

preferida à cesta Y e esta por sua vez é tida como fracamente preferida a uma

terceira cesta Z, então a cesta X é tida como fracamente preferida à cesta Z.

d) As preferências são monotônicas, ou seja, uma quantidade superior de pelo

menos um bem enquanto a quantidade de todos os outros permanece constante

sempre representa uma utilidade maior.

23

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Imagem 1: Gráfico de Curva de Indiferença “bem comportada”25

Fonte: Varian (2003) p. 38

Imagem 2: Gráfico de Curvas de Indiferença de Bens Substitutos Perfeitos

Fonte: Varian (2003) p. 41

25 O adjetivo “bem comportada” é atribuído por Varian (2003) a todas as curvas de indiferença que são decrescentes e estritamente convexas.

24

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De forma geral as curvas de indiferença apresentam o formato mostrado na imagem 1.

Para a representação das preferências entre álcool hidratado e gasolina, entretanto, é mais

razoável utilizar as curvas de indiferença próximas dos bens substitutos perfeitos (Imagem 2). As

curvas são lineares pelo fato de a taxa marginal de substituição26 entre os dois bens ser constante.

A afirmativa realizada por Souza e Silva (2006), de que álcool hidratado e gasolina são

bens substitutos perfeitos, traz implícita a idéia de que os consumidores ignoram todas as

diferenças existentes entre os combustíveis, considerando apenas o seu preço e o seu poder

calorífico.

Entretanto, é possível enumerar algumas considerações que podem influenciar no

processo de escolha, reduzindo o grau de substituição:

a) Utilizando álcool hidratado, ainda que o preço compense a menor taxa de quilômetros

rodados por litro, o veículo possui menor autonomia e o consumidor pode preferir a

gasolina por conta disso. Um tanque cheio de gasolina permite que o motorista

percorra uma distancia 30% maior do que percorria com um tanque cheio de álcool

hidratado, reduzindo o número de paradas para abastecimento.

b) Anderson (2006) traz a possibilidade de que os consumidores estejam conscientes das

externalidades ambientais negativas do uso da gasolina e prefiram utilizar o álcool

hidratado dadas as suas características menos poluentes e sua origem renovável.

c) Anderson (2006) traz também a idéia de que existam no mercado consumidores que,

por serem menos sensíveis a variações relativamente pequenas nos preços relativos,

por hábito, não substituirão o combustível utilizado de forma imediata.

No escopo do presente estudo, as alterações na dinâmica do mercado consumidor de

álcool se constituem um aspecto fundamental. E por isso, as elasticidades preço e renda da

demanda serão os principais parâmetros estudados. Além dos argumentos microeconômicos

apresentados até agora Correia (2005) afirma que a introdução do veículo flex, de forma geral,

26 Geometricamente representada pela inclinação da curva de indiferença, esta taxa descreve a relação em que o consumidor está disposto a substituir um bem pelo outro. Pode ser interpretada também como a razão entre as utilidades marginais dos dois bens.

25

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aumenta as elasticidades-preço dos combustíveis, reduz a previsibilidade do mercado e aumenta a

volatilidade.

O mesmo autor ressalta, entretanto, que certos aspectos não podem ser abandonados no

momento da análise dos resultados. O mercado brasileiro de combustíveis é formado por uma

massa de consumidores bastante heterogênea em relação à sua relação com o combustível. E tal

fato implica na necessidade de atenção na interpretação das elasticidades preço da demanda por

combustíveis.

As diferentes faixas de renda a que pertencem os indivíduos e o perfil da frota de veículos

em circulação são as principais fontes da heterogeneidade. Em relação às faixas de renda, a

distinção está no grau de essencialidade que o combustível possui na cesta de consumo da pessoa.

No que tange ao perfil da frota, a motorizarão do veículo e o seu tempo de uso são os fatores mais

importantes. Por último, as inter-relações entre estes dois aspectos também possui participação

fundamental.

O papel desempenhado pelo perfil da frota é o mais visível entre os dois. Uma frota

formada por um percentual de veículos flex elevado amplia o leque de opções do consumidor e

faz com que a demanda, tanto por gasolina quanto por álcool, seja mais elástica a preço. Cabe

ressaltar entretanto, que no caso brasileiro, a transformação não foi imediata. O veículo flex ainda

está ganhando espaço no mercado e o seu efeito sobre a elasticidade preço da demanda da massa

de consumidores é, apesar de perceptível, provavelmente pequeno.

No que tange ao rendimento do consumidor, os motoristas de renda mais alta, tendem a

responder menos a variações no preço do combustível, uma vez que este representa parcela

pequena do seu orçamento total e se encaixa como um item de alto grau de essencialidade em sua

cesta de consumo. Por outro lado, motoristas de renda mais baixa respondem mais rapidamente a

variações no preço pelo fato de que o combustível, ainda sendo um bem essencial, é menos

importante que produtos alimentícios, vestuário e outros itens mais básicos.

Correia (2005) ressalta a inter-relação entre estes dois aspectos quando aponta para o fato

de que populações de renda mais alta, em geral, possuem os carros mais “jovens”. Em face do

26

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alto market-share das vendas de veículos flex no mercado automotivo recente, é possível

observar que são as classes mais altas que estão comprando veículos com essa nova tecnologia.

Portanto, dos fatos acima mencionados é possível concluir que a introdução dos veículos

flex produz efeitos ambíguos sobre o mercado de combustíveis. De um lado, a possibilidade de

escolha do consumidor entre álcool e gasolina faz com que a elasticidade preço da demanda por

álcool e gasolina aumente. Entretanto, o perfil do consumidor que está adquirindo esse tipo de

veículo pode mitigar esse efeito na medida em que possui elasticidade preço da demanda abaixo

da média da população.

O modelo econométrico que será proposto no próximo capítulo é insuficiente para captar

todas essas nuances da demanda por álcool hidratado combustível. Entretanto, os resultados de

um teste que trata os consumidores como homogêneos ainda é capaz de contribuir ao indicar qual

(ou quais) destes fatores prevalecem no período analisado. Um teste mais sofisticado, apesar de

possível, fica impossibilitado pela carência de dados disponíveis no nível de detalhamento

necessário.

As limitações e nuances do tema, entretanto, não impedem a formulação de um modelo

econométrico capaz de auxiliar no propósito de investigar se os veículos flex possuem o potencial

de aumentar a elasticidade-preço das vendas de álcool. E é esta linha de ação que o presente

estudo percorrerá até o seu objetivo final.

27

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CAPÍTULO II- MODELANDO A DEMANDA POR ALCOOL COMBUSTÍVEL

De forma sucinta, este capítulo tem por objetivo apresentar as bases teóricas e

bibliográficas que embasarão o teste econométrico que será realizado neste trabalho.

Na primeira seção, o texto fará uma rápida descrição dos modelos utilizados para a

estimação das elasticidades preço e renda da demanda por combustíveis. O objetivo é mostrar as

principais características tais quais a periodicidade e a especificação da função. O foco será em

trabalhos que utilizam dados de séries temporais e modelos de co-integração, os mesmos que

serão utilizados no presente estudo.

Na segunda seção será apresentada uma breve descrição teórica da econometria por trás

da análise de séries temporais com ênfase em modelos de co-integração, mostrando suas

principais características. Na terceira seção será realizada a descrição das séries de dados

utilizadas e da especificação do teste econométrico utilizado no presente estudo.

II.1 Revisão dos Modelos de Demanda

II.1.1 Histórico dos Modelos de Demanda por Gasolina

O estudo da demanda por combustíveis automotivos figura como tema central de diversos

estudos acadêmicos em todo o mundo. A principal utilidade desses estudos está na produção de

insumos técnicos capazes de auxiliar na formulação e na avaliação de políticas econômicas e na

produção de previsões. Para tanto, as elasticidades preço e renda da demanda por combustíveis,

28

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que contém as informações básicas para os objetivos mencionados, são as principais variáveis

estudadas.

A gasolina e o diesel são os dois principais derivados do petróleo utilizados como

combustíveis no mundo. Tal fato explica por que grande parte dos estudos realizados até a década

de 1990 está centrada em aspectos associados à demanda por gasolina ou por diesel. A gasolina,

em especial, é de fundamental importância para o presente estudo por ter papel predominante em

relação ao diesel no que tange à utilização no mercado brasileiro de combustíveis para veículos

de passeio.

Nesse sentido, Dahl & Sterner (1991) realizaram amplo estudo com aproximadamente

300 artigos acadêmicos que estimaram elasticidades preço e renda da demanda por gasolina até o

final dos anos 1980. O objetivo do trabalho consiste na identificação e na classificação das mais

diversas especificações de modelos econométricos para o estudo da demanda por gasolina.

A análise dos autores inicia-se com modelos estáticos que utilizam apenas variáveis de

preço e renda. Segundo eles, especificações que não incluem pelo menos uma dessas duas

variáveis podem ser consideradas incorretas. Na equação abaixo, a demanda por gasolina (C) é

função do preço real da gasolina (P) e da renda real (M).

),( MPfC = (1)

A observação de que o ajuste dos consumidores em relação ao preço dos combustíveis

não é imediato incentivou a formulação de especificações de função em que a demanda do

período atual depende de alguma forma dos preços e da renda em períodos anteriores. Na

equação (2) essa consideração é feita através da introdução da variável dependente defasada entre

as explicativas.

),,( 1−= tCMPfC (2)

A consideração do estoque de veículos (V) na análise também é prática comum no estudo

da demanda por gasolina através de duas formulações. A primeira, mais simples, envolve apenas

a inclusão do estoque de veículos e está representada na equação (3). A segunda, representada na

29

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equação (4) é mais sofisticada e considera não só o estoque de veículos, mas também as

características da frota (CF) tais quais: eficiência, idade, tamanho, peso e distancia média

percorrida, por exemplo. No caso brasileiro, a indisponibilidade de dados de frota de veículos de

passeio torna a inclusão dessa variável bastante difícil.

),,( VMPfC = (3)

),,,( CFVMPfC = (4)

Com menor freqüência entre os estudos analisados, foram utilizados modelos mais

sofisticados. A especificação destes modelos tende a ser mais diversificada, contando com a

inclusão de estruturas complexas de defasagens ou de novas variáveis tais quais os preços de

meios alternativos de transporte ou estimativas do consumo de combustível por veículo, por

exemplo. O grande problema associado à sofisticação de modelos reside na qualidade e na

disponibilidade dos dados.

Como exemplo de trabalhos realizados ao longo da década de 1990 é possível citar os

estudos de Bentzen (1994), Ramanathan (1999) e Eltony & Al-Mutairi (1995). Estes trabalhos

têm em comum o fato de utilizarem técnicas de co-integração para a estimação das elasticidades

preço e renda da demanda por gasolina tanto no curto prazo como no longo prazo. A tabela 2

abaixo mostra as especificações utilizadas e os mercados analisados pelos autores citados:

30

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Tabela 2: Especificações de Modelos de Demanda por Gasolina usando Co-Integração

Autor Especificação País

Bentzen (1994) Dinamarca

Eltony & Al-Mutairi (1995) Kuwait

Ramanathan (1999) Índia

Burnquist & Bacchi (2002) Brasil

Fonte: Elaboração própria a partir de Nappo (2006) e Roppa (2005)

II.1.2 A introdução do Etanol (Álcool Hidratado) na análise

Os modelos anteriormente citados em sua variedade de formulações, não consideram uma

especificidade essencial do mercado brasileiro de combustíveis, que é a presença não desprezível

do Álcool Hidratado. Além das elasticidades preço e renda da demanda por gasolina, a

elasticidade preço cruzada entre álcool e gasolina surge como parâmetro relevante de análise a

ser considerada nas previsões, na formulação e na avaliação de políticas econômicas.

Alves & Bueno (2003) estão entre os primeiros autores a trazer esta inovação ao estudo da

demanda por gasolina no Brasil. Foram utilizados dados anuais de preços e renda na forma de

séries de índices base 100 iniciadas em 1984 e finalizadas em 1999. A equação utilizada traz o

preço do Álcool Hidratado entre as variáveis independentes e tem a forma expressa abaixo:

ePbPbMbbC ag ++++= lnlnlnln 3210 (5)

31

),,( VMPfC =

),( MPfC =

),,( 1−= tCMPfC

),,( 1−= tCMPfC

),,( 2−= tMMPfC

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Onde:

C = Consumo de Gasolina per Capita

M = Renda per Capita;

Pg = Preço da Gasolina;

Pa = Preço do Álcool;

e = Resíduo

Como principal resultado a destacar, os autores identificaram estatisticamente uma relação

de substituição entre o álcool e a gasolina. A substituição, entretanto, não pode ser caracterizada

como perfeita no curto prazo pois o coeficiente de -0,4803 é considerado baixo em termos

absolutos.

Roppa (2005) tinha o objetivo específico de investigar as influências do mercado de

álcool sobre o de gasolina. Em suas palavras: “a presente monografia tem por objetivo realizar

um trabalho acerca das possibilidades e da sustentabilidade de o álcool se firmar como substituto

da gasolina”. (Roppa, 2005, pág.10)

Em seu trabalho, a autora realiza um teste econométrico com dados anuais que vão de

1979 até 2000. Os resultados também mostram uma relação de substituição entre o álcool e

gasolina, ainda que parcial. A especificação de seu modelo é semelhante à equação (5) já

mencionada para o modelo de Alves & Bueno (2003).

Nappo (2006) é um dos primeiros autores a investigar o impacto da introdução de

veículos flex no mercado brasileiro. Partindo da premissa de que o veículo flex torna o álcool um

substituto menos imperfeito da gasolina27 ele deseja testar econometricamente se houve uma

alteração significativa na elasticidade preço da demanda por gasolina após a introdução desta

inovação no mercado.

27 Como apontado no Capítulo 1 deste trabalho, a grande inovação do veículo flex está em permitir ao consumidor optar pelo tipo de combustível que deseja utilizar a baixo custo.

32

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O autor inova ao utilizar séries de dados mensais e testa duas especificações de função em

seu trabalho. Na primeira, ele utiliza as mesmas variáveis utilizadas por Roppa (2005) e Alves &

Bueno (2003), resultando na equação (5). Na segunda, que é a que mais interessa neste estudo,

ele substitui o componente associado ao preço do álcool por uma dummy de inclinação

relacionada ao preço da gasolina. A nova variável assume valor 0 para o período que vai de

agosto de 1994 a fevereiro de 2003 e 1 para o período que vai de março de 2003 até setembro de

2006. A nova função assume a forma da equação (6), abaixo:

ePbinbMbPbbC gg ++++= lnlnlnln 3210 (6)

Onde28:

ln C = Consumo mensal nacional de gasolina

ln Pg = Preço real mensal da gasolina

ln M = Renda real mensal per capita

bin ln Pg = Variável binária de inclinação associada ao preço da gasolina

e = Resíduo

Cabe ressaltar que a idéia implícita na utilização de variáveis dummy busca representar

uma relação dicotômica do tipo “sim ou não”, que rigorosamente não representa a evolução

recente do mercado brasileiro de combustíveis, onde os veículos flex ganharam seu espaço de

forma gradual, ainda que rapidamente. Apesar da ressalva, os resultados do trabalho citado

mostraram que o uso de variáveis dummy pode ser utilizado como boa aproximação do

fenômeno.

A idéia do presente estudo é fazer um estudo da demanda por álcool hidratado no mercado

brasileiro de combustíveis utilizando técnicas análogas àquelas dos diversos estudos até aqui

28 O termo ln X significa Logaritmo Neperiano de X

33

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apresentados. Especificamente, este estudo estará centrado no impacto da introdução de veículos

flex sobre as elasticidades preço e renda da demanda por álcool no mercado brasileiro.

II.2 Formulação de Modelo Econométrico para a Demanda de Álcool Hidratado no

mercado Brasileiro de Combustíveis

II.2.1 A análise de Co-Integração

Os dados de séries temporais são utilizados em grande parte dos estudos sobre variáveis

econômicas, em particular aqueles relacionados à demanda por combustíveis. É necessário

utilizar as técnicas de análise adequadas para evitar conclusões errôneas como as que ocorrem a

partir da interpretação de uma “Regressão Espúria”.

O problema citado surge quando se tenta investigar a existência de alguma relação entre

séries temporais não estacionárias29. Mesmo que duas variáveis não possuam uma relação na

prática, o fato de ambas possuírem uma tendência de alta ou de baixa em comum pode fazer com

que as estatísticas t, F e R² da regressão indiquem alguma correlação. Tal evento,

invariavelmente, leva a afirmações equivocadas a respeito das variáveis analisadas.

O relacionamento entre séries temporais é corretamente analisado em duas condições

principais:

a) Quando todas as séries são estacionárias: Nesse caso as estatísticas t, F e R² expressam

apenas a relação entre as variáveis em questão, não havendo uma tendência comum capaz de

distorcer os seus valores.

b) Quando as séries são co-integradas: Duas ou mais séries são ditas co-integradas quando

elas são integradas de mesma ordem e existe pelo menos uma combinação linear delas que é

29 Uma série de tempo é considerada estacionária quando atende as seguintes condições:a) A série possui média constante em todos os períodos;b) A série possui variância constante em todos os períodos; ec) A covariância entre dois pontos depende apenas da distância entre eles na série. Por exemplo, a covariância

entre 1º. e o 3º. valor da série é igual à covariância entre o 8º. e o 10º. valor da série.O não atendimento dessas condições faz com que a série apresente algum tipo de tendência.

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estacionária. A combinação linear estacionária faz com que exista um vetor de co-integração que

descreve as relações entre as variáveis. Segundo Johansen (2002), assim como em uma regressão

linear, os coeficientes desse vetor também podem ser interpretados como elasticidades.

O ponto de partida, será a verificação da estacionariedade ou da ordem de integração das

séries envolvidas no trabalho. Segundo Gujarati (2004), uma série temporal é estacionária quando

sua média e sua variância são constantes e a covariância entre dois períodos depende apenas da

distância entre esses dois períodos e não do ponto onde a covariância é calculada. Em termos

rigorosos, o autor apresenta as 3 propriedades abaixo:

),()(

)(

tntn

t

t

YYCovYVar

YE

+

2

==

=

γσ

µ

A metodologia para a verificação da estacionariedade envolverá a utilização do teste de

Dickey Fuller Aumentado (ADF). Como mostra Enders (2004), o teste tem o objetivo de verificar

a presença de raízes unitárias na série, fato que indica a não estacionariedade. A estatística do

teste é calculada a partir da equação abaixo:

tit

p

iitt yytaay εβγ +∆+++=∆ +−

=− ∑ 1

2120 (6)

Onde:

ity −∆ : é a primeira diferença da série analisada defasada em i períodos;

0a : intercepto utilizado sempre que a série analisada não possui média nula;

ta2 : componente de tendência utilizado quando a série analisada possui tendência

determinística;

35

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12

+−=

∆∑ it

p

ii yβ : componente que representa o número de defasagens da série integrada;

1−tyγ : componente que determina ou não a presença de raiz unitária na série

tε : ruído branco

O teste ADF testará a hipótese nula de que γ =0, caso em que a série possuirá raiz unitária

e será integrada, contra a hipótese alternativa de que γ ≠0, caso em que a série será estacionária.

A estatística do teste é calculada da mesma forma que a estatística t usual, com a ressalva de que

a tabela de referência utilizada para análise, desenvolvida por Dickey e Fuller, é diferente. A

ordem de integração i será definida quando a i-ésima diferenciação da série for considerada

estacionária. Por exemplo, uma série I(1) tem a sua primeira diferença estacionária. Segundo

Gujarati (2004), a maior parte dos dados econômicos é descrita por séries temporais integradas de

ordem 1.

Após verificar que todas as séries em análise são I(1), o próximo passo está na verificação

da estacionariedade dos resíduos da equação de equilíbrio de longo prazo entre as séries. A

equação a ser estimada na realização do teste é semelhante àquela utilizada no teste ADF:

ttt êaê ε+=∆ − 11 (7)

Onde:

tê∆ : é a primeira diferença da série construída com os resíduos estimados;

11 −têa : componente que determina ou não a presença de raiz unitária na série;

tε : ruído branco

Rejeitar a hipótese nula de que 1a =0 significa que a série dos resíduos estimados na

equação de equilíbrio de longo prazo é considerada estacionária e, portanto, as séries são co-

36

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integradas. A estatística do teste, assim como no teste de raiz unitária, é calculada como a

estatística t usual. Enders (2004) afirma que, como os coeficientes da equação que rege o

relacionamento de longo prazo entre as variáveis não são conhecidos, não é possível utilizar a

tabela desenvolvida por Dickey e Fuller para o teste de hipótese. O autor indica que a tabela

adequada é a de Engle e Granger.

II.2.2 O modelo de demanda por álcool hidratado

II.2.2.1 Fontes de Dados

Os dados mensais de venda e preços de combustíveis foram fornecidos pela Agência

Nacional do Petróleo (ANP). O preço de álcool hidratado ao consumidor (em R$/litro) para o

Estado do Rio de Janeiro foi extraído do Levantamento de Preços da ANP. Para deflacionar a

série de preços, foi utilizado o item correspondente à variação do preço do álcool na região

metropolitana do Rio de Janeiro dentro do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que

foi fornecido pelo IBGE. Os números que indicam as vendas de álcool hidratado (em m³) no

estado do Rio de Janeiro também foram obtidos a partir da ANP. Como proxy dos dados de renda

per capita para o estado são utilizados os números referentes ao Brasil como um todo. Estes

foram fornecidos pelo IBGE e deflacionados pelo INPC. Todas as séries possuem periodicidade

de 68 meses, indo de julho de 2001 até fevereiro de 2007.

O período observado mostra uma explosão das vendas de álcool hidratado no mercado do

Rio de Janeiro. A análise da série mostra um movimento de queda até 2003 e logo após, um

movimento persistente de alta, que fica evidente no gráfico 7. Uma das prováveis causas desse

movimento é o aumento explosivo da frota de potenciais consumidores com a chegada dos

veículos flex. Esse movimento é ainda mais provável se a relação de preços álcool/gasolina

estiver favorável ao álcool no período analisado.

37

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Gráfico 7: Vendas de Álcool no Atacado no Estado do Rio de Janeiro (jul/2001 –

fev/2007)

-

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

jul/0

1

out/0

1

jan/

02

abr/0

2jul/0

2

out/0

2

jan/

03

abr/0

3ju

l/03

out/0

3

jan/

04

abr/0

4ju

l/04

out/0

4

jan/

05

abr/0

5jul/0

5

out/0

5

jan/

06

abr/0

6jul/0

6

out/0

6

jan/

07

Fonte: ANP

A condição mencionada no parágrafo anterior se confirma quando é realizada a

observação da relação de preços. Os preços do álcool mantiveram-se mais de 30% abaixo dos

preços da gasolina em grande parte do período, estimulando os proprietários de veículos flex a

optar pelo álcool na hora de encher o tanque. O gráfico 8, mostra esse fato.

38

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Gráfico 8: Razão de preços Álcool/Gasolina30 no Rio de Janeiro (jul/2001 – fev/2007)

0,50

0,55

0,60

0,65

0,70

0,75

0,80

0,85

jul/0

1

out/0

1

jan/

02

abr/0

2

jul/0

2

out/0

2

jan/

03

abr/0

3

jul/0

3

out/0

3

jan/

04

abr/0

4

jul/0

4

out/0

4

jan/

05

abr/0

5

jul/0

5

out/0

5

jan/

06

abr/0

6

jul/0

6

out/0

6

jan/

07

abr/0

7

jul/0

7

Fonte: ANP

Analisando comparativamente, as vendas de álcool guardam relação positiva com os seus

preços. Esse movimento ocorre pelo aumento explosivo das vendas de álcool que, pela forte alta

de 152% entre março de 2003 e dezembro de 2006, torna difícil a observação dos efeitos do

movimento de preços. É provável que esse comportamento produza um valor positivo para a

elasticidade-preço das vendas de álcool no estudo econométrico.

30 A razão de preços é calculada da seguinte forma: Razão de Preços = PgasolinaPálcool

39

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Gráfico 9: Análise comparativa dos preços31 e das vendas de álcool entre jul/2001 e

fev/2007 (jul/2001 = 100)

0.00

20.00

40.00

60.00

80.00

100.00

120.00

140.00

160.00

180.00

200.00

jul/01

set/0

1

nov/0

1

jan/02

mar/02

mai/02

jul/02

set/0

2

nov/0

2

jan/03

mar/03

mai/03

jul/03

set/0

3

nov/0

3

jan/04

mar/04

mai/04

jul/04

set/0

4

nov/0

4

jan/05

mar/05

mai/05

jul/05

set/0

5

nov/0

5

jan/06

mar/06

mai/06

jul/06

set/0

6

nov/0

6

jan/07

Bas

e Ju

l/200

1 =

100

p_alcool v_alcool

Fonte: ANP

Dentro daquilo que é esperado teoricamente, há uma relação positiva entre as séries de

PIB per capita e de vendas de álcool. Apesar de seguir na mesma direção do PIB per capita, as

vendas de álcool cresceram em um ritmo muito mais acelerado, como mostra o gráfico 10. Esse

fato representa outra evidência da existência de um fator influenciando fortemente as vendas de

álcool hidratado. Provavelmente, o resultado econométrico apontará uma elasticidade-renda

acima da observada normalmente na literatura.

31 Os preços de álcool já aparecem deflacionados pelo INPC referente aos preços de álcool.

40

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Gráfico 10: Análise comparativa do PIB per capita32 e das vendas de álcool entre jul/2001

e fev/2007 (jul/2001 = 100)

0.00

20.00

40.00

60.00

80.00

100.00

120.00

140.00

160.00

180.00

200.00

jul/01

set/0

1

nov/0

1jan

/02

mar/02

mai/02

jul/02

set/0

2

nov/0

2jan

/03

mar/03

mai/03

jul/03

set/0

3

nov/0

3jan

/04

mar/04

mai/04

jul/04

set/0

4

nov/0

4jan

/05

mar/05

mai/05

jul/05

set/0

5

nov/0

5jan

/06

mar/06

mai/06

jul/06

set/0

6

nov/0

6jan

/07

Bas

e Ju

l/200

1 =

100

v_alcool pib_pc

Fonte: ANP

A análise preliminar dos dados ainda é pouco conclusiva quanto ao impacto da introdução

dos veículos flex. O teste econométrico terá o papel de investigar este impacto em especial, e

também a relevância estatística das conclusões oriundas dessa primeira análise dos dados. Para

isso será formulado um modelo que busque representar o relacionamento entre as variáveis

estudadas e auxilie na realização do objetivo do presente estudo.

II.2.2.2 Especificação do Modelo

Com o intuito de atender o objetivo de verificar o impacto dos veículos flex sobre a

elasticidade preço das vendas de álcool hidratado, será formulado um modelo de demanda por 32 O PIB per capita foi deflacionado pelo INPC.

41

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álcool hidratado. A idéia principal é aplicar as mesmas premissas teóricas que embasam os

modelos de demanda por gasolina apresentados até aqui para estudar a demanda por álcool

hidratado.

A introdução dos veículos flex, como evidenciado no trabalho de Nappo (2006), causou

um aumento na elasticidade-preço da demanda por gasolina. Este é um resultado previsível

teoricamente, dado que a introdução de um bem substituto aumenta o leque de opções disponíveis

ao consumidor, e este é um dos principais fatores capazes de aumentar a elasticidade-preço da

demanda por um bem.

Visando representar de forma aproximada a introdução dos veículos flex no mercado

brasileiro utilizaremos o mesmo artifício de Nappo (2006), que foi a introdução de uma dummy

de inclinação associada ao preço do combustível analisado. Além disso, de forma coerente com

os inúmeros modelos de demanda por gasolina até aqui apresentados, trataremos a demanda por

álcool como função do seu preço e da renda per capita da população. A especificação utilizada é

apresentada abaixo:

ttttt pbinmpD εββββ ++++= lnlnlnln 3210 (8)

Onde:

tD = demanda por álcool hidratado;

tp = preço do álcool hidratado;

tm = renda per capita da população;

bin = variável binária que assume o valor 0 nos períodos anteriores a março de 2003 e 1

nos períodos posteriores;

tε = termo de erro.

42

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Todas as variáveis estão expressas na forma logarítmica para facilitar a interpretação dos

coeficientes. Neste caso, os coeficientes representarão as elasticidades-preço e renda da demanda

em cada caso.

43

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CAPÍTULO III - RESULTADOS DA ANÁLISE

Este último capítulo tem o objetivo de descrever e analisar os resultados do teste

econométrico proposto no capítulo a luz das considerações teóricas realizadas no Capítulo I.

Na primeira seção será exposto o resultado de todas as análises econométricas realizadas

no presente estudo. Serão apresentados os resultados dos testes de estacionariedade, co-

integração e a estimativa do modelo que representa a relação de longo prazo entre as variáveis.

A segunda seção trará uma análise dos resultados obtidos. O objetivo principal é a

interpretação econômica das elasticidades preço e renda das vendas de álcool. Buscará também,

caso necessário, levantar hipóteses a respeito das razões econômicas por trás de possíveis

divergências entre os resultados e as expectativas teóricas.

III.1 Os Resultados

III.1.1 Testes de estacionariedade e co-integração

A análise de estacionariedade das variáveis incluídas na equação mostrou que todas as

séries podem ser consideradas como integradas de ordem 1. Tal resultado é o primeiro passo na

afirmação de que existe co-integração entre as séries de tempo envolvidas. Foram realizados

testes de raiz unitários nas séries, tanto em nível, quanto em primeira diferença, com o objetivo

de identificar a ordem de integração.

Em relação às séries expressas em nível, a Tabela 3 abaixo mostra o resultado dos testes

ADF para cada uma delas. Os resultados mostram que a hipótese nula da existência de raiz

unitária para as variáveis não pode ser rejeitada ao nível de 5%. O número de defasagens

utilizado foi selecionado através do critério de informação de Schwarz33.

33 Para maiores informações, ver Bierens (2006b)

44

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Tabela 3: Resultado do Teste ADF para as variáveis em nível34.

Variável p valor35 Defasagens ObservaçõesBIN_FLEX*LOG(P_ALCOOL)* 0.6792 1 66LOG(P_GAS) 0.0014 0 67LOG(PIB_PC)* 0.9916 10 57LOG(V_ALCOOL)* 0.4074 0 67LOG(P_ALCOOL)* 0.1746 1 66

* Variáveis em que a hipótese de raiz unitária não pode ser rejeitada ao nível de 5%

Como esperado, todas as variáveis apresentaram raiz unitária, com exceção dos preços da

gasolina. A verificação da ordem de integração foi feita através da realização do mesmo teste

para as séries em 1ª diferença. A tabela 4, abaixo, mostra os resultados obtidos. Todas as

variáveis analisadas, com exceção dos preços da gasolina, podem ser consideradas integradas de

ordem 1.

Tabela 4: Resultado do Teste ADF para as variáveis em 1ª diferença36

Variável p valor37 Defasagens ObservaçõesD(BIN_FLEX*LOG(P_ALCOOL))* 0.0000 0 66D(LOG(P_GAS))* 0.0000 0 66D(LOG(PIB_PC))* 0.0000 9 57D(LOG(V_ALCOOL))* 0.0000 0 66D(LOG(P_ALCOOL))* 0.0001 0 66

* Variáveis em que a hipótese de raiz unitária pode ser rejeitada ao nível de 5%

34 Legenda das variáveis:BIN_FLEX*LOG(P_ALCOOL) = Variável Binária de inclinação associada ao preço do álcoolLOG(P_GAS) = Preços da GasolinaLOG(PIB_PC) = PIB per CapitaLOG(V_ALCOOL) = Vendas de ÁlcoolLOG(P_ALCOOL) = Preços do Álcool35 Os valores críticos utilizados correspondem à hipótese alternativa de estacionariedade ao redor de um valor constante.36 D(“variável”) significa a aplicação da primeira diferença na “variável” em questão.37 Os valores críticos utilizados correspondem à hipótese alternativa de estacionariedade ao redor de um valor constante.

45

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O próximo procedimento adotado na verificação da co-integração entre as variáveis foi o

teste de Engle-Granger. A tabela 5, abaixo, mostra que a série dos resíduos obtidos a partir de

uma regressão linear simples entre as variáveis é estacionária, fato que confirma a existência de

co-integração.

Tabela 5: Resultado do Teste Engle Granger38

VariávelEstatística do Teste

Valor Crítico 5%

Valor Crítico 10%

Resíduos Estimados* -3,83 -3,82 -3,51

* Os resíduos são estacionários ao nível de significância de 5%

II.1.2 A equação estimada

Confirmada a hipótese de que as séries são co-integradas, o ultimo passo a ser realizado é

a estimação do vetor de co-integração. Dado que as séries estão em escala logarítmica os

coeficientes obtidos representam elasticidades. Um sumário dos resultados pode ser visualizado

na tabela 6.

Tabela 6: Coeficientes do Vetor de Co-integração

Variável Coeficiente Estatística t Valor Crítico 10%Constante* -50,51 6,04 1,671LOG(PIB_PC)* 8,62 7,11 1,671LOG(P_ALCOOL)* 0,69 3,61 1,671BIN_FLEX*LOG(P_ALCOOL) -0,29 1,85 1,671

* Com exceção da variável “binflex*LOG(P_ALCOOL)” todas as outras variáveis são significativas ao

nível de 5%.

Os coeficientes mostram que existe uma forte relação positiva entre as vendas de álcool e

a renda per capita da população.Além disso, surpreendentemente, foi verificado que os preços do

álcool também possuem relação positiva com as vendas. Essa relação, aparentemente estranha, é

38 Para maiores informações a respeito dos valores críticos ver Enders (2004)

46

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atenuada no período posterior à introdução dos veículos flex por conta do coeficiente negativo

que acompanha a variável binária de inclinação.

O coeficiente da variável binária faz com que haja duas elasticidades preço, uma

associada ao período anterior à introdução dos veículos flex e outra associada ao período

posterior. A primeira é representada apenas pelo coeficiente logaritmo dos preços. A segunda é

representada pela soma entre o coeficiente do logaritmo dos preços e o coeficiente da variável

binária. Nesse caso, a elasticidade-preço anterior à introdução dos veículos flex é de 0,699. A

partir de março de 2003, esse coeficiente passa a ter o valor de 0,404 [0,699 + (-0,295)].

III.2 Análise do Resultado

Como advertido no capítulo I, a elasticidade-preço das vendas de álcool representa um

valor médio, que pondera o impacto de diversos fatores, tanto positivos quanto negativos. Pela

indisponibilidade de dados mais detalhados, fatores como a heterogeneidade dos consumidores

em termos de faixa de renda, o perfil e o volume da frota de veículos em circulação não puderam

ser isolados no exercício econométrico.

De acordo com a teoria econômica e com a experiência dos trabalhos anteriores, seria

esperado um sinal positivo para a elasticidade-renda das vendas de álcool e um sinal negativo,

tanto para a elasticidade-preço quanto para o coeficiente da variável binária. A análise preliminar

dos dados no segundo capítulo abriu a possibilidade de resultados diferentes do previsto e os

resultados dos testes econométricos confirmaram essa possibilidade.

A ocorrência de uma elevada elasticidade-renda e de uma elasticidade-preço positiva nas

vendas de álcool sugere a existência de algum fator não incluído na especificação da função que

está provocando forte influência positiva nas vendas de álcool. O mais razoável dos fatores é o

aumento explosivo no número de consumidores potenciais de álcool.

Correia (2007) estima que a frota de veículos flex, já no final de 2006 representava cerca

de 12,2% de um total de 21,7 milhões de veículos. Observa-se, portanto, que a participação desse

tipo de veículo experimenta um incremento muito forte no período. Esse fato, em conjunto com a

47

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pouca extensão da série de dados anterior à introdução dos veículos flex pode ter levado a

contaminação dos resultados do modelo.

Um fato que ajuda a corroborar a hipótese levantada no parágrafo anterior é o

comportamento da série de vendas de álcool, que mostra um rápido e consistente crescimento,

independente das movimentações de preços. As vendas de álcool por atacado no estado do Rio de

Janeiro cresceram 152%, entre março de 2003 e dezembro de 2006. O gráfico 7, no capítulo II

evidencia esse comportamento.

O comportamento do diferencial de preços entre álcool e gasolina também é importante

no sentido de validar a hipótese levantada. Como foi possível observar no gráfico 8, a nova massa

de carros flex encontrou uma relação de preços favorável na maior parte do período, fato que

incentiva a escolha do álcool como opção de combustível e impacta nas vendas.

O resultado da variável binária representa peça chave na realização do objetivo do estudo.

Assim como no estudo de Nappo (2006), é possível concluir que, a introdução dos veículos flex

também atua no sentido de aumentar a elasticidade-preço das vendas de álcool. É razoável

esperar que o efeito de aumento da elasticidade-preço das vendas de álcool se intensifique nos

próximos anos por conta do crescimento do share dos veículos flex na frota. Segundo previsões

de Correia (2005) há uma forte tendência de aumento da frota desse tipo de veículo, que

representará mais de 50% do total em circulação no ano de 2015.

O resultado do estudo, apesar de divergente das suposições teóricas apresenta consistência

estatística. A hipótese levantada a respeito do perfil e do tamanho da frota de veículos é

consistente economicamente e faz-se necessária a sua investigação em estudos posteriores.

Essa investigação pode ser realizada através da observação do mesmo fenômeno em

algum estado onde a relação de preços não tenha sido tão favorável ao álcool. Um possível

resultado seria um aumento menos expressivo nas vendas de álcool pelo fato dos proprietários de

veículos flex optarem pelo abastecimento do carro com gasolina. Dessa forma o modelo

econométrico não sofreria a mesma distorção.

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Outra forma possível consiste na estimação da frota de veículos em circulação para a sua

inclusão como variável do modelo econométrico. A estimação das vendas de álcool por veículo

no lugar das vendas agregadas ajudaria a remover os efeitos provocados por variações não

desprezíveis na frota de veículos.

Comparando os resultados do presente estudo à tabela formulada por Nappo (2006),

temos o resumo expresso na tabela 7.

Tabela 7: Resultados de estimativas recentes das elasticidades preço, renda das vendas de

combustíveis.

Estudo Combustível Periodicidade Região Geográfica Preço Renda Cruzada Binária

Presente Estudo Álcool 2001 - 2007 (mensal) Rio de Janeiro 0,699 8,623 ** -0,295

Nappo (2006) Gasolina 1994 - 2006 (mensal) Brasil -0,197 0,685 ** -0,137

Roppa (2005) Gasolina 1979 - 2000 (anual) Brasil -0,634 0,164 0,402 **

Alves & Bueno (2003 Gasolina 1974 - 1999 (anual) Brasil -0,465 0,122 0,48 **

Burnquist & Bacchi (2002) Gasolina 1973 - 1998 (anual) Brasil -0,227 0,959 ** **

Elasticidades de Longo Prazo

Fonte: Elaboração própria a partir de Nappo (2006)

49

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CONCLUSÃO

O presente estudo teve como principal objetivo o entendimento de como a introdução dos

veículos flex impactou a elasticidade-preço das vendas de álcool no mercado do Rio de Janeiro.

Em meio a uma vasta gama de estudos voltados para as vendas de gasolina, o presente estudo

busca trazer uma contribuição à literatura olhando o tema dessa nova perspectiva.

O mercado de combustíveis brasileiro guarda a especificidade de ter o álcool hidratado

com um papel de destaque na movimentação da frota de veículos automotores. Tal fato foi

possibilitado pelo contexto histórico em que o mercado se desenvolveu, ressaltando-se

principalmente as conseqüências da experiência do Proálcool.

Através da técnica de co-integração, instrumento amplamente utilizado na literatura,

buscou-se estimar as elasticidades preço e renda das vendas de álcool, bem como os efeitos na

elasticidade-preço causados pela introdução dos veículos flex no mercado. Com clara inspiração

no trabalho de Nappo (2006), foi utilizada uma variável dummy de inclinação para esse último

objetivo.

Uma inovação do trabalho foi em relação às séries de dados. Buscou-se utilizar dados para

o estado do Rio de Janeiro com o intuito de não contaminar o teste econométrico com diferenças

regionais em relação ao diferencial de preços álcool – gasolina.

Quanto aos resultados obtidos, entretanto, houve uma contradição com as previsões

teóricas e a literatura recente a respeito das vendas de gasolina. As vendas de álcool mostraram

uma fortíssima elasticidade-renda de 8,62 e uma elasticidade-preço positiva de 0,699. Apenas a

variável binária atingiu um valor dentro das expectativas teóricas de -0,295.

Em face dos resultados teoricamente contraditórios levantou-se a hipótese de que o forte

aumento da frota de potenciais consumidores tenha contaminado o resultado dos testes

econométricos. Tal fator foi apontado como a provável causa do expressivo aumento das vendas

de álcool, superando qualquer efeito associado ao preço e potencializando o efeito positivo de

elevações na renda. Dado o acelerado crescimento da frota de veículos flex associado a uma

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relação de preços álcool/gasolina favorável ao álcool, é razoável supor que a quantidade de carros

efetivamente abastecidos com álcool tenha aumentado rapidamente, exercendo pressão na direção

de uma considerável elevação da demanda por álcool.

Como sugestão para estudos posteriores, fica a tarefa de verificar se a hipótese levantada é

de fato relevante para explicar as distorções encontradas no trabalho. Isso pode ser feito através

da inclusão de uma estimativa de frota de veículos no modelo econométrico ou através do estudo

de regiões do país onde há maior variabilidade na relação de preços álcool/gasolina.

Assumindo a hipótese de que a elasticidade preço positiva seja um efeito decorrente

apenas do aumento da frota e considerando uma elasticidade-preço negativa para as vendas de

álcool, o coeficiente negativo da variável binária faz com que a elasticidade-preço aumente. Isso

indica um resultado semelhante ao encontrado por Nappo (2006), que conclui que a introdução

dos veículos flex aumenta a elasticidade-preço da demanda por gasolina. Nesse caso é possível

afirmar que a introdução dos veículos flex também aumenta a elasticidade-preço da demanda por

álcool.

Previsões realizadas por Correia (2005) e outras entidades da indústria automotiva

indicam que a frota de veículos flex continuará aumentando sua participação nos próximos anos.

Com isso, o resultado do presente estudo também permite concluir que esse movimento de

aumento da elasticidade-preço das vendas de álcool tende a se intensificar.

51

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Referências Bibliográficas

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