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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM PSICOPEDAGOGIA Luciane Carlin Cazzaroto APRESSAMENTO COGNITIVO X O INGRESSO DAS CRIANÇAS COM CINCO ANOS NO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL CURITIBA 2011

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM

PSICOPEDAGOGIA

Luciane Carlin Cazzaroto

APRESSAMENTO COGNITIVO X O INGRESSO DAS CRIANÇAS

COM CINCO ANOS NO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

CURITIBA

2011

Luciane Carlin Cazzaroto

APRESSAMENTO COGNITIVO X O INGRESSO DAS CRIANÇAS

COM CINCO ANOS NO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Projeto de Pesquisa apresentado no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Orientadora: Márcia Maria Loss de Carvalho

CURITIBA

2011

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................05

2. DESENVOLVIMENTO INFANTIL..........................................................................08

3. RESULTADO DA PESQUISA NUMA ESCOLA DA REDE MUNICIPAL DE

ENSINO EM CURITIBA.........................................................................................21

4. CONCLUSÃO........................................................................................................27

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................29

RESUMO

Esta investigação tem por objetivo verificar qual a relevância prática do apressamento cognitivo na aprendizagem de crianças, dos cinco aos seis anos de idade que estão cursando o ciclo de nove anos na rede municipal de ensino na cidade de Curitiba. A pesquisa foi realizada com quatro professores e com a pedagoga da escola, sendo realizado um levantamento através de questionário que abordou os seguintes assuntos: o número de alunos por turma, o tempo de atuação dos professores, as dificuldades encontradas pelas crianças durante o ano letivo, se os objetivos propostos para o primeiro ano foram atingidos e caso contrário o que foi proposto a essas crianças em relação as dificuldades apresentadas. Foram pesquisados teóricos que investigaram o desenvolvimento infantil, bem como os autores que se preocuparam com os problemas que as crianças apresentam nos anos iniciais da fase escolar. Os resultados obtidos, no presente estudo, demonstraram que 19,17% das crianças não atingiram os objetivos propostos para o primeiro ano do ensino fundamental. Observa-se que a imaturidade, apresentada por elas, é o fator que se configura com uma maior incidência para o não cumprimento dos objetivos propostos e consequentemente o apressamento cognitivo tem relevância prática na aprendizagem de crianças de cinco aos seis anos que estão cursando o ensino de nove anos.

Palavras-chave: apressamento cognitivo, desenvolvimento infantil, problemas de aprendizagem.

1. INTRODUÇÃO

Desde o princípio de sua vida o ser humano está aprendendo. Passa por

processos de amadurecendo e desenvolvimento em sua estrutura física e psíquica.

Em alguns momentos, observam-se maiores transformações que ocorrem em

períodos distintos da sua evolução. O desenvolvimento infantil, a adolescência, a

idade adulta e a maturidade, partem do pressuposto de que estamos em constante

mudança e contínuo desenvolvimento. No entanto, estaremos direcionando nossos

estudos na fase infantil, dos cinco aos seis anos de idade, por ser o foco desta

pesquisa.

As mudanças que os seres humanos passarão em seu processo existencial,

receberão influências externas e internas, que contribuirão para determinar as

diferentes vivências e experiências próprias de cada pessoa em seu curso de vida.

Entretanto, cabe salientar que diante das possíveis experiências, que

estamos subordinados ao longo de nossas vidas, podemos nos deparar com certas

dificuldades, onde muitas vezes, podem retardar ou mesmo bloquear nosso

desenvolvimento cognitivo, emocional, social e por que não dizer na construção do

conhecimento.

Entre as ciências que estudam o desenvolvimento humano e suas

particularidades a Psicopedagogia é uma área direcionada aos problemas de

aprendizagem, que trabalha na prevenção, juntamente com o diagnóstico e a

intervenção destas dificuldades, visando identificar os problemas e a recuperação da

criança ao seu desenvolvimento natural.

A cada dia nos deparamos com novos fatores e questionamentos a respeito

do tema da dificuldade de aprendizagem, do não conseguir ler, escrever, organizar,

planejar, resolver, solucionar, enfim, em apreender o conhecimento ―aceitável‖ para

a idade e experiência da criança em fase escolar. Encontram-se dúvidas entre pais,

educadores e demais profissionais que atuam com crianças que apresentam

dificuldade no ensino-aprendizagem, em relação ao que estas deveriam saber ou

mesmo ter construído, para que possam obter um desempenho acadêmico dentro

do esperado e/ou sugerido pela instituição de ensino e até mesmo pela sociedade

ao qual esta inserida.

Não temos a pretensão, aqui neste estudo, de encontrar o que é certo ou

errado para a criança em sua busca pelo conhecimento, mas ilustrar através da

literatura o que é saudável e possível de acordo com sua maturidade e capacidade

para encontrar estratégias adequadas a sua aprendizagem.

Algumas observações são necessárias para o entendimento natural da

aprendizagem que implicam em observar as etapas do desenvolvimento cognitivo,

motor, afetivo e social, segundo a visão de alguns autores que estruturaram seus

estudos nas fases do desenvolvimento infantil.

Cabe ressaltar ainda, que o apressamento cognitivo, tema do estudo em

questão, é um dos fatores que pode interferir na aquisição do conhecimento. E como

possível consequência impedir a criança de se desenvolver naturalmente.

Diante das considerações apresentadas e da problemática exposta,

configura-se o problema-alvo deste estudo no seguinte questionamento: Qual é a

relevância prática do apressamento cognitivo na aprendizagem de crianças de cinco

aos seis anos que estão cursando o ensino de nove anos?

A temática do presente trabalho aborda o desenvolvimento infantil como um

todo, dando ênfase ao apressamento cognitivo e suas possíveis consequências.

Tem por objetivo geral apresentar um estudo bibliográfico e de campo sobre

o apressamento cognitivo e as possíveis consequências que podem interferir na

aprendizagem de crianças de cinco aos seis anos em fase escolar. Por objetivos

específicos, elenca-se: (1) constatar in loco, a quantidade de crianças que estão

cursando o primeiro ano do ensino de nove anos e que estão com idade inferior a

seis anos; (2) quais são as dificuldades apresentadas por essas crianças.

O enfoque metodológico adotado para a realização do presente trabalho é

do tipo exploratório-descritivo, com abordagem qualitativa, realizado por meio de

literatura pertinente ao tema e pesquisa de campo na Escola Municipal Julia Amaral

di Lenna na cidade de Curitiba.

Para discorrer sobre o assunto, este trabalho foi estruturado em dois

capítulos distintos. O primeiro apresenta o desenvolvimento infantil e o segundo

aborda o tema do presente trabalho, o apressamento cognitivo e suas possíveis

consequências na aprendizagem infantil.

2. DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Desde o nascimento a criança precisa de cuidados humanos para sua

sobrevivência e socialização. Ao longo de seu desenvolvimento estará sujeita a

transformações e aquisições nas quais se desenvolve o aprender.

De acordo com Almeida e Cunha (2003) ―ao desenvolvimento humano foi

associada à ideia de que todo indivíduo passa por um processo dividido em etapas

que se distinguem, sobretudo, pelo acúmulo de capacidades e habilidades, que

atingem seu apogeu na idade adulta‖.

As autoras comentam, ainda, sobre a representação social do

desenvolvimento humano:

―A cientificização do desenvolvimento humano, ao longo da vida, é acompanhada de um estatuto para cada uma das diferentes etapas que o compõem, o qual define normas, comportamentos e expectativas em relação a cada etapa, em consonância com os valores da sociedade, dos grupos sociais e das relações inter-grupais‖. (ALMEIDA & CUNHA, 2003).

Ao buscarmos o reconhecimento da criança como ser histórico e social

retrocedemos aos séculos XVI e XVII, num contexto marcado por uma economia

mercantil ainda em fase de expansão. Ariès (1981):

―Entre o fim da Idade Média e os séculos XVI e XVII, a criança havia conquistado um lugar junto de seus pais, lugar este a que não poderia ter aspirado no tempo em que o costume mandava que fosse confiada a estranhos. (...) A criança tornou-se um elemento indispensável da vida cotidiana, e os adultos passaram a se preocupar com sua educação, carreira e futuro‖. (ARIÈS, 1981, p. 69).

Em relação à transmissão do conhecimento Ariès (1981) diz que ―de modo

geral, a transmissão do conhecimento de uma geração a outra era garantida pela

participação familiar das crianças na vida dos adultos‖.

O surgimento das escolas se deu de forma gradativa, inicialmente reservada

aos clérigos, e com o surgimento da necessidade de impor o rigor moral por parte

dos educadores, a preocupação de isolar a juventude do mundo sujo dos adultos e a

vigília dos pais mais de perto dos filhos deu-se a substituição da aprendizagem das

crianças pelo ambiente familiar pelas escolas. Ariès (1981, p. 232) em seus estudos

diz que ―a substituição da aprendizagem pela escola exprime também uma

aproximação da família e das crianças, do sentimento de família e do sentimento da

infância, outrora separados. A família concentrou-se em torno da criança‖.

Segundo Varela e Uria (1992, citado por SILVA et all, 2009):

―Ao esboçarem as condições sociais do aparecimento de várias instâncias, que são fundamentais para entender o surgimento das escolas no princípio do século XIX, relatam que para as crianças das classes mais poderosas estava resguardada a tutela através da família e do colégio, já para os pobres bastava uma: a das instituições de caridade, que os mantinham afastados de suas famílias, apenas com atendimento esporádico. A descrição que fazem os referidos autores, da maneira que era imposto o ensino na época para as classes mais pobres, revela hábitos e costumes que se propagavam como um ensino rudimentar, para gente rude e ignorante, sem a finalidade de acesso à cultura, senão inculcar estereótipos e valores morais em oposição aberta às formas de vida das classes populares. Sobretudo impor-lhes hábitos de limpeza, regularidade, compostura, obediência, respeito à autoridade, etc‖. (SILVA et all, 2009)

1.

Três teorias sobre o desenvolvimento humano e a aprendizagem merecem

destaque, cada qual apoiada em diferentes concepções de homem e com uma visão

de mundo existente em uma determinada situação histórica: a Inatista, a

Ambientalista e a Interacionista.

A concepção Inatista parte do pressuposto de que o desenvolvimento

humano seria determinado basicamente por fatores biológicos, ou seja, tudo que

constitui a pessoa humana, até mesmo sua conduta social, estaria predeterminado

geneticamente.

A concepção Ambientalista atribui um imenso poder ao ambiente no

desenvolvimento humano. O homem é extremamente plástico como uma massa de

argila a ser modelada, estimulada e corrigida pelo meio.

1 Varela, J. & Uria-Alvarez, F. (1992). A maquinaria escolar. Revista Teoria e Educação, 6, 68-96.

A concepção Interacionista, diferente das outras duas, considera no

desenvolvimento humano tanto os aspectos biológicos como os sociais, os quais

não podem ser dissociados e exerce ação recíproca, um influencia o outro e essa

interação acarreta mudanças sobre o indivíduo. Entre as teorias interacionistas

citamos a de Jean Piaget, com o Construtivismo, Lev Semenovich Vigotski, com a

Teoria Sócio-Histórica e Henri Paul Hyacinthe Wallon com a Teoria da Psicogênese.

Para Piaget (1978, apud CARVALHO, 2005, p.12), o conhecimento é

construído de uma forma aberta e gradativa, de maneira que exista sempre uma

abertura em que um conhecimento propicie outro. Isso se dá por meio de fases

hierárquicas caracterizadas pela presença de estruturas bem definidas.

O desenvolvimento é um processo contínuo de sucessivas equilibrações,

definido em quatro estágios distintos:

a) Sensório-motor (do nascimento aos 2 anos): ―é uma inteligência que se

determina na presença do objeto, das pessoas, das situações, baseia-se

exclusivamente em percepções sensoriais e em esquemas motores para resolver

seus problemas‖. (GOLSE, 1998, p.159). Durante o período sensório-motor, a

criança vai começar a associar objetos e atos, agindo de modo intencional. Seus

esquemas são construídos a partir de reflexos inatos que vão se modificando a partir

da experiência.

b) Pré-operatório (2 aos 7 anos): inicia-se com o desenvolvimento da linguagem,

esquemas simbólicos. Fase dos por quês, onde as respostas dadas à criança são

consideradas como verdades absolutas. ―É a função simbólica no seu conjunto que

vai desprender o pensamento da ação a representação, mas neste processo

formador, a linguagem vai ter o papel particularmente importante, já que,

contrariamente aos outros instrumentos semióticos, (...) a linguagem já é toda

elaborada socialmente e contém, previamente, um conjunto de instrumentos

cognitivos a serviço do pensamento‖. (GOLSE, 1998, p.164).

c) Operatório-concreto (7 aos 11/12): ―ocorre com a aquisição da reversibilidade do

pensamento, o que permite a elaboração das operações de classificação e seriação,

ao mesmo tempo em que se constituem os invariantes de substancia, peso e

volume‖. (GOLSE, 1998, p.164). Seu raciocínio e lógica são ainda usados de forma

elementar, aplicados na manipulação de objetos concretos, os termos abstratos são

ainda de difícil compreensão.

d) Operatório-formal (13 anos em diante): é capaz de formar esquemas conceituais

abstratos. É o raciocínio hipotético-dedutivo. Torna-se consciente de seu próprio

pensamento.

Segundo Pulaski (1980), que cita Piaget ―a cada nível do desenvolvimento

cognitivo, as conquistas do período anterior são incorporadas e reestruturadas como

a base para uma forma de funcionamento caracteristicamente diferente, mais

avançada e complexa‖.

De acordo com a Teoria de Piaget o sujeito vai construindo o seu

conhecimento, age sobre o mundo para desenvolver-se. Precisa de um nível de

desenvolvimento para que haja aprendizagem. E esta aprendizagem está

subordinada ao desenvolvimento.

Para Piaget há quatro fatores básicos responsáveis pela passagem de um

estágio de desenvolvimento para o seguinte: a maturidade do sistema nervoso, a

interação (que se dá através da linguagem e da educação), a experiência física com

os objetos e, principalmente a equilibração.

Segundo Piaget, (citado por FARIA, 1998, p.12), a maturidade do sistema

nervoso está presente em todas as transformações ocorridas durante o

desenvolvimento. A influência do fator maturação sobre o desenvolvimento mental

das crianças é maior durante os primeiros anos de vida. À medida que cresce, a

força deste fator diminui gradualmente para ceder espaços aos fatores ambientais.

Faria (1998) fala sobre outro fator responsável pelo desenvolvimento

segundo Piaget, o da experiência física e lógico-matemática. Sendo a experiência

física produto de ações como tocar, jogar, cheirar, saborear, do sujeito sobre os

objetos. Descobre ou extrai desta maneira o conhecimento de qualidades e

propriedades como cor, forma, energias, etc. Já o fator lógico-matemático resulta de

uma coordenação de ações que o individuo exerce sobre os objetos e da tomada de

consciência desta coordenação. Levando esta experiência a aquisição da estrutura

de série, de classe, de número.

Na interação social a criança pequena ou pré-escolar aprende o que pode e

ignora o que ultrapassa as possibilidades ditadas pelo seu desenvolvimento. (FARIA,

1998). A autora traz ainda o fator equilibração onde o indivíduo deve se equilibrar

com outras descobertas para levá-lo a uma adaptação ao seu ambiente. Alcançado

o equilíbrio no plano motor, inicia-se a busca de equilíbrio no plano representativo.

A criança vai gradativamente construindo o seu próprio saber, a partir dos

fatos que a ela se apresentam, de acordo com a sua capacidade de assimilação e

integração do conhecimento.

Pulaski (1980, p.46) diz que Piaget ―admite, no entanto, que a criança

dotada de boa herança mental e de um meio que estimule a experimentação criativa

pode desenvolver as estruturas lógicas numa idade inferior‖.

Piaget fala sobre as trocas sociais e o alcance da personalidade na criança

(citado por LA TAILLE, 1992, p.16):

―A personalidade não é o ―eu‖ enquanto diferente dos outros ―eus‖ e refratário à socialização, mas é o indivíduo se submetendo voluntariamente as normas de reciprocidade e de universalidade. Como tal, longe de estar à margem da sociedade, a personalidade constitui o produto mais refinado da socialização. Com efeito, é na medida em que o ―eu‖ renuncia a si mesmo para inserir seu ponto de vista próprio entre os outros e se curvar assim as regras da reciprocidade que o individuo torna-se personalidade (...) Em oposição ao egocentrismo inicial, o qual consiste em tomar o ponto de vista próprio como absoluto, por falta de poder perceber seu caráter particular, a personalidade consiste em tomar consciência desta relatividade da perspectiva individual e a colocá-la em relação com o conjunto das outras perspectivas possíveis: a personalidade é, pois, uma coordenação da individualidade com o universal‖. (LA TAILLE, OLIVEIRA & DANTAS, 1992, p. 16).

Ainda sobre a socialização da criança La Taille (1992, p.17) comenta que

―Piaget definiu diversos graus de socialização, partindo do ―grau zero‖ (recém-

nascido) para o grau máximo representado pelo conceito de personalidade‖.

O desenvolvimento do ser humano, para Vigotski (1999), começa, a partir do

inicio da vida, com a socialização. ―É esta aprendizagem das relações sociais que

constrói os conhecimentos que criarão o sustentáculo do desenvolvimento mental do

indivíduo. Através da linguagem surge o simbolismo que se torna o mediador entre o

sujeito e o objeto – o outro - gerador do intercambio social e do pensamento, fatores

preponderantes na abstração e generalização‖.

O sujeito se constrói através da interação com o outro, o outro que

apresenta o mundo ao sujeito. O sujeito não conhece, mais com o outro, como

mediador, ele tem o conhecimento.

Segundo Vigotski (citado por OLIVEIRA, 1992, p. 24) o desenvolvimento

humano, ―tem como um de seus pressupostos básicos a ideia de que o ser humano

constitui-se enquanto tal na sua relação com o outro social. A cultura torna-se parte

da natureza humana num processo histórico que, ao longo do desenvolvimento da

espécie e do indivíduo, molda o funcionamento psicológico do homem‖.

Para Vigotski o homem se produz na e pela linguagem, através da interação

com o outro, formas de pensar são construídas por meio da apropriação do saber

através de elementos de mediação, constituído por signos e instrumentos, que

auxiliam na assimilação do conhecimento.

A mente humana é descrita por um sistema complexo de processos mentais

superiores que através da cognição, o homem torna-se consciente de sua

existência. A cognição é o ato ou processo de conhecer estes processos, através da

memória, imaginação, atenção, percepção, pensamento, raciocínio, juízo e

linguagem.

Flavell et al (1999) falam sobre a cognição:

―A necessidade de uma concepção ampla da cognição também reside na complexa inter-relação entre vários aspectos da cognição no tecido do funcionamento cognitivo efetivo em tempo real. Cada processo tem um papel vital na operação e no desenvolvimento dos outros, afetando-os e sendo afetado por eles. (...) O que sabemos afeta e é afetado como percebemos; o modo como conceitualizamos ou classificamos as coisas influencia nossa maneira de raciocinar sobre ela, e vice-versa e assim sucessivamente‖. (FLAVELL, MILLER & MILLER, 1999, p.10).

Os signos, para Vigotski (1999) são meios que auxiliam uma função

psicológica superior (atenção voluntária, memória lógica, formação de conceitos,

etc.), sendo capazes de transformar o funcionamento mental. Desta maneira, as

formas de mediação permitem ao sujeito realizar operações cada vez mais

complexas sobre os objetos.

Entretanto para Vigotski (citado por OLIVEIRA, 1992, p. 28) ―é o grupo

cultural onde o indivíduo se desenvolve que vai lhe oferecer, pois, o universo de

significados que ordena o real em categorias (conceitos), nomeadas por palavras da

língua de grupo‖. Ao relatar a importância do uso da linguagem pela criança Vigotski

diz:

―Antes de controlar o próprio comportamento, a criança começa a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Isso produz novas relações com o ambiente, além de uma nova organização do próprio comportamento. A criação dessas formas caracteristicamente humana de comportamento produz, mais tarde, o intelecto, e constitui a base do trabalho produtivo: a forma especificamente humana do uso de instrumentos‖. (VIGOTSKI, 1999, p. 33).

O autor traz ainda sobre a linguagem:

―Usando palavras (uma classe desses estímulos) para criar um plano de ação especifico, a criança realiza uma variedade muito maior de atividades, usando como instrumentos não somente aqueles objetos a mão, mas procurando e preparando tais estímulos de forma a torna-los úteis para a solução da questão e para o planejamento de ações futuras‖. (VIGOTSKI, 1999, p. 35).

Vigotski (1996, p. 5) relata sobre a comunicação ―que um estudo mais

profundo do desenvolvimento da compreensão e da comunicação na infância levou

à conclusão de que a verdadeira comunicação requer significado – isto é,

generalização -, tanto quanto signos‖. De acordo com este estudo o autor traz que a

verdadeira comunicação humana pressupõe uma atitude generalizante, que constitui

um estágio avançado do desenvolvimento do significado da palavra. Vigotski (1996)

comenta ainda:

―As formas mais elevadas da comunicação humana somente são possíveis porque o pensamento do homem reflete uma realidade conceitualizada. É por isso que certos pensamentos não podem ser comunicados às crianças, mesmo que elas estejam familiarizadas com as palavras necessárias. Pode ainda estar faltando o conceito adequadamente generalizado que, por si só, assegura o pleno entendimento‖. (VIGOTSKI, 1996, p.5).

Vigotski (1999) comenta que ―embora a inteligência prática e o uso de signos

possam operar independentemente em crianças pequenas, a unidade dialética

desses sistemas no adulto humano constitui a verdadeira essência no

comportamento humano complexo‖. Este atribui à atividade simbólica uma função

organizadora especifica, intervindo no processo do uso de instrumentos levando a

produção de novas formas de comportamento.

O autor participa os resultados encontrados em seus experimentos sobre a

fala:

―(1) A fala da criança é tão importante quanto à ação para atingir um objetivo. As crianças não ficam simplesmente falando o que elas estão fazendo; sua fala e ação fazem parte de uma mesma função psicológica complexa, dirigida para a solução do problema em questão. (2) Quanto mais complexa a ação exigida pela situação e menos direta a solução, maior a importância que a fala adquire na operação como um todo. Às vezes a fala adquire uma importância tão vital que se não for permitido seu uso, as crianças pequenas não são capazes de resolver a situação‖. (VIGOTISKI, 1999, p. 34).

Vigotski (1999, p. 41) diz que ―a relação entre o uso de instrumentos e a fala

afeta várias funções psicológicas, em particular a percepção, as operações sensório-

motoras e a atenção, cada uma das quais é parte de um sistema dinâmico de

comportamento‖.

Para o autor o movimento da criança não se separa da percepção, onde os

processos coincidem quase que exatamente, ou seja, a criança não escolhe o

estímulo como ponto de partida para o movimento consequente, mas seleciona o

movimento, comparando o resultado com a instrução dada. (VIGOTSKI, 1999, p.

46). Sobre a percepção discorre:

―O sistema de signos reestrutura a totalidade do processo psicológico, tornando a criança capaz de dominar seu movimento. Ela reconstrói o processo de escolha em bases totalmente novas. O movimento desloca-se, assim, da percepção direta, submetendo-se ao controle das funções simbólicas incluídas na resposta de escolha‖. (VIGOTSKI, 1999, p. 46).

Vigotski (1999) descreve a função da atenção nas crianças, onde através

das palavras a criança começa a dominar sua atenção, novos centros estruturais

são criados dentro da situação percebida. O autor nos elucida sobre a função da

atenção na criança:

―Além de reorganizar o campo visual-espacial, a criança, com o auxilio da fala, cria um campo temporal que lhe é tão perceptivo e real quanto o visual. A criança que fala tem, dessa forma, a capacidade de dirigir sua atenção de uma maneira dinâmica. Ela pode perceber mudanças na sua situação imediata do ponto de vista de suas atividades passadas, e pode agir no presente com a perspectiva do futuro‖. (VIGOTSKI, 1999, p. 47).

Vigotski em seus estudos observou que outras operações que não estavam

relacionadas ao intelecto prático poderiam mostrar as mesmas leis do

desenvolvimento. Discorre em seus estudos que as operações com signos na

criança aparecem como o resultado de um processo, que está sujeito a todas as leis

básicas da evolução psicológica. Vigotski diz:

―Isso significa que a atividade de utilização de signos nas crianças não é inventada e tampouco ensinada pelos adultos; ao invés disso, ela surge de algo que originalmente não é uma operação com signos, tornando-se uma operação desse tipo somente após uma série de transformações qualitativas. Cada uma dessas transformações cria as condições para o próximo estágio e é, em si mesma, condicionada pelo estágio precedente; dessa forma, as transformações estão ligadas como estágios de um mesmo processo e são, quanto à sua natureza, históricas‖. (VIGOTSKI, 1999, p.60).

Estudando a psicogênese do indivíduo, Wallon (1975) assevera que é a

partir da linguagem que se desenvolve o pensamento e conclui haver cinco etapas

de desenvolvimento. 1) Impulsivo-emocional, durante o primeiro ano de vida, onde

dirige as reações do bebê. 2) Sensório-motor e projetivo, até os três anos de vida,

organiza a locomoção, manipulação e exploração de espaços. Desenvolve a

linguagem e inicia o processo de simbolização. 3) Personalismo que abrange o

período entre os três e seis anos, constrói a consciência através das relações

sociais. 4) Categorial, durante os sete aos doze anos, onde explora o mundo exterior

e amplia a socialização fora do ambiente familiar. 5) Funcional depois dos doze

anos, na adolescência, período de grandes transformações fisiológicas e psíquicas

em que aparecem as relações afetivo-sexuais através de amplificação de relações

sociais aos quais ele se condiciona.

De acordo com Galvão (2000):

―Para Wallon as trocas relacionais da criança com os outros são fundamentais para o desenvolvimento da pessoa. As crianças nascem imersas em um mundo cultural e simbólico, no qual ficarão envolvidas em um "sincretismo subjetivo", por pelo menos três anos. Durante esse período, de completa indiferenciação entre a criança e o ambiente humano, sua compreensão das coisas dependerá dos outros, que darão às suas ações e movimentos formato e expressão‖. (GALVÃO, 2000, p. 25).

A criança, para Wallon, é um ser emocional que se constitui gradualmente

em um ser sócio cognitivo. Através da linguagem falada se comunica, pelo meio da

ação e interpretação do meio entre humanos constrói suas próprias emoções, sendo

este o primeiro sistema de comunicação expressiva.

Para Wallon (1934, citado por VOKOY & PEDROZA, 2005), ―a criança deve

ser estudada na sucessão das etapas de desenvolvimento caracterizadas pelos

domínios funcionais da afetividade, do ato motor e do conhecimento, entendidos

como sendo desenvolvido primordialmente pelo meio social‖.

Em seus estudos Wallon propõe estágios de desenvolvimento, onde durante

esses períodos do desenvolvimento humano encontram-se momentos de crise, isto

é, uma criança ou um adulto não são capazes de se desenvolver sem conflitos. A

criança se desenvolve com seus conflitos internos e, para ele, cada estágio

estabelece uma forma específica de interação com o outro, é um desenvolvimento

conflituoso.

De acordo com Wallon (1934, citado por VOKOY & PEDROZA, 2005), ―os

estágios do desenvolvimento na criança tem inicio na vida intra-uterina, sendo

caracterizado por uma simbiose orgânica‖. Após seu nascimento a criança encontra-

se no estágio impulsivo-emocional no qual prevalece à emoção, sendo caracterizado

como o período simbiose-afetiva. A criança inicia o processo de estabelecimento de

sistemas de relação entre ela e o ambiente que confere aos seus movimentos uma

nova significação, pois passam de movimentos para instrumentos ou sinais. Dantas

(1983) fala sobre esse período:

―O ato por eles suscitado só será eficaz por intermédio de outrem, consistindo o sinal num arremedo da situação desejada ou temida; esse sinal representa um substituto provisório; é mais uma participação que um símbolo‖. (DANTAS, 1983, p. 200).

O período seguinte que vai até os dois anos de idade, a criança encontra-se

no estágio sensório-motor e projetivo, voltando-se para a exploração do mundo

físico. Gradualmente, com a aquisição da marcha e da linguagem, a criança

apresenta modificações no seu padrão de interação com o mundo.

Sobre este período Wallon (1934, citado por VOKOY & PEDROZA, 2005)

nos elucida:

―O estágio do personalismo divide-se em três períodos distintos, todos com o objetivo de tornar o eu mais independente e diversificado. São eles: período da negação, idade da graça e período da imitação. No primeiro, o da negação, surge na criança à necessidade de se auto afirmar, de impor sua visão pessoal e lutar para fazer prevalecer sua opinião. No período seguinte, o da idade da graça, por volta dos quatro anos de idade, a criança desenvolve maneiras de ser admirada e chamar a atenção para si através da sedução, com uma necessidade de agradar cujo objetivo é obter a aprovação dos demais. A criança passa a se considerar em função da admiração que acredita poder despertar nas pessoas‖. (VOKOY & PEDROZA, 2005, p. 96).

No estágio do personalismo, aparece a imitação inteligente, a qual constrói

os significados diferenciados que a criança dá para a própria ação. Nessa fase, a

criança está voltada novamente para si própria. Para isso, a criança coloca-se em

oposição ao outro num mecanismo de diferenciar-se.

Sobre a linguagem Wallon fala que esta constitui um fator decisivo no

desenvolvimento da criança. ―A linguagem acrescenta um ‗além‘ ao universo

primitivo da criança. (...) A linguagem permitirá uma outra exploração do mundo,

aquela que, usando símbolos, poderá prolongar a lembrança no presente e substituir

o presente pela antecipação, pela combinação, pelo cálculo ou somente pela

imaginação ou sonho‖. (Dantas, 1983, p. 207).

Segundo Wallon aos seis anos a criança passa ao estágio categorial

trazendo avanços na inteligência. É neste estágio que a criança inicia a

diferenciação mais nítida entre o eu e o outro dá condições mais estáveis para a

exploração mental do mundo externo, físico, mediante atividades cognitivas de

agrupamento, classificação, categorização em vários níveis de abstração até chegar

ao pensamento categorial. Dantas (1983, p. 212) que cita Wallon, sobre este estágio

―o pensamento categorial é o que consegue reunir sob a mesma rubrica os objetos

possuidores de um mesmo traço característico. Esse poder não é mais simples e

primitivo‖.

Para Wallon (1941, citado por MAHONEY & ALMEIDA, 2005):

―Nesse estágio, que coincide com o início do período escolar, aprendizagem se faz predominantemente pela descoberta de diferenças e semelhanças entre objetos, imagens, ideias. O predomínio é da razão. Esse predomínio vai se expressar em representações claras, precisas, que se transformarão, com o tempo — é um processo longo —, em conceitos e princípios. Levar ou não em consideração o que o aluno já sabe, o que precisa saber para dominar certas ideias, os exercícios necessários, formas de avaliação, revelam sentimentos e valores e favorecem ou não essa descoberta do mundo‖. (MAHONEY & ALMEIDA, 2005).

Sobre o desenvolvimento infantil Wallon nos traz que ―no decurso de toda

essa evolução podemos constatar a simultaneidade dos progressos intelectuais e

mudanças operadas no domínio da personalidade. Daí o estudar-se, em cada

período, todo o comportamento da criança‖. (Dantas, 1983, p. 213).

Neste capítulo foi abordada a teoria do desenvolvimento infantil, sobre a

ótica de alguns autores, e podemos observar que a criança passa por estágios

necessários ao seu desenvolvimento. Diante dessa teoria passamos para o próximo

capítulo que abordará o resultado da presente pesquisa.

3. RESULTADO DA PESQUISA NUMA ESCOLA DA REDE MUNICIPAL DE

ENSINO EM CURITIBA

A presente pesquisa foi realizada na Escola Municipal Julia Amaral Di Lenna

na cidade de Curitiba. A escola atende em dois períodos, manhã e tarde, sendo

composta por 596 alunos no período da manhã e 554 alunos que estudam no turno

da tarde.

A Escola Municipal Julia Amaral Di Lenna tem como prioridade efetivar uma

proposta de educação de qualidade, compromissada com a formação humana numa

perspectiva de totalidade, garantindo ao aluno condições para o seu

desenvolvimento enquanto sujeito crítico, criativo, participativo, ético, autônomo,

responsável, capaz de enfrentar os desafios e as incertezas do mundo em que se

vive e que ajuda a construir.

O publico alvo, do presente estudo, foram os alunos de primeiro ano com

idade entre cinco anos e que completariam seis anos em 2011. Estes estavam

distribuídos em quatros turmas no período da tarde, distribuídos em média com trinta

alunos em cada sala, totalizando uma população de cento e vinte crianças.

Foi realizada uma entrevista individual com as professora, das quatro

turmas, e com a pedagoga da escola. Foi utilizado um roteiro composto de

perguntas referentes às dificuldades das crianças, encontradas durante o ano letivo,

bem como se os objetivos propostos a estas crianças foram atingidos no referido

período escolar.

Em entrevista com a pedagoga da escola, pode-se elaborar o gráfico abaixo,

que incidia em levantar a partir da data de nascimento a idade cronológica das

crianças que estavam cursando, no ano de 2011, o primeiro ano do ensino

fundamental:

Fonte: Prefeitura Municipal de Curitiba / Secretaria Municipal da Educação / Escola Municipal Julia

Amaral Di Lenna, 2011.

Em relação ao gráfico acima, pode-se observar que durante o primeiro

semestre, das 120 crianças investigadas, 50% se encontravam com idade inferior a

seis anos de idade, sendo que 5% fizeram aniversário em janeiro, 6,67%

completaram seis anos no mês de fevereiro, 9,17% no mês de março, 8,33% no mês

de abril, 11,66% no mês de maio, 9,17% no mês de junho e a partir do segundo

semestre é que as crianças que passaram a ter seis anos completos, sendo que

destas 9,17% fizeram aniversário no mês de julho, 9,17% no mês de agosto, 5% no

mês de setembro, 5% no mês outubro, 11,66% no mês de novembro e 10% no mês

de dezembro. Totalizando 100% das crianças que iniciaram o primeiro ano em 2011.

De acordo com Poppovic (1972), (citado por CARVALHO, 2005, p. 37)

―indica que se deve adotar o critério ―idade mental‖ ao se falar em idade de início de

alfabetização, que engloba a potencialidade de cada criança, a motivação para

aprender, o grau de estimulação das habilidades básicas necessárias à

alfabetização e as experiências adquiridas pela criança na interação com o seu meio

ambiente‖. Sobre este assunto Santana, Roazzi e Dias (2006) mencionam que:

―A inteligência, na concepção piagetiana, organiza-se através de estruturas que atuam como mediadoras entre as funções invariantes e os diversos conteúdos comportamentais. Estes últimos variam de acordo com a idade e são caracterizados pelos dados comportamentais brutos, enquanto que as funções definem a própria essência, as características amplas da atividade inteligente, e que não variam em função da idade‖. (SANTANA, ROAZZI & DIAS, 2006, p.72).

No entanto, nem todas as crianças têm o mesmo padrão de

desenvolvimento, pois estarão sujeitas as variações, de acordo com as suas

vivências, sendo elas familiares, sociais e emocionais.

Para Bossa (2000) o termo aprendizagem remete a uma visão de que ―as

possibilidades de aprender referem-se às condições físicas e psíquicas da criança,

e, neste sentido, (...) um número reduzido de crianças não dispõe do equipamento

neurofisiológico básico necessário a uma boa aprendizagem‖.

Bassedas e cols. (1996, citado por DUSI, NEVES & ANTONY, 2006, p.153)

ressaltam a importância de ―se encarar o aluno em sua totalidade, considerando os

diversos sistemas nos quais está inserido, especialmente família e escola, visando

harmonização dos fatores que interferem no seu processo de aprendizagem‖.

Cabe salientar que a criança precisa ser preparada para aprender, pois em

seu desenvolvimento, constrói diferentes esquemas que tendem a formar

combinações, dando origem às estruturas cognitivas, que traduzem uma forma

particular de equilíbrio na interação do indivíduo com o ambiente.

Ao analisarmos os questionários, nos deparamos com as seguintes

questões: O número médio de alunos por turma é de 30 crianças, sendo distribuídas

em quatro turmas no período da tarde. O tempo médio de atuação das professoras

no ensino fundamental é de 16 anos e meio, conforme a população investigada.

Entre as maiores dificuldades encontradas pelos alunos durante o ano letivo,

a pesquisa apontou a imaturidade como fator de maior incidência, seguida pelo não

desenvolvimento dos pré-requisitos, o pouco tempo para dar os conteúdos às

crianças que apresentavam dificuldades e o número de alunos por turma.

Conforme cita Carvalho (2005) ―verifica-se assim, que a aprendizagem é

iniciada antes da criança entrar na escola, pois ela detém conceitos próprios a

respeito do mundo. A criança aprende com a família, com os meios de comunicação,

com as pessoas do seu convívio e com a escola‖. No ambiente escolar ela irá entrar

em contato com novas experiências, com um jeito novo de aprender, através de

sistemas de concepções cientificas.

Diante dos resultados observou-se que os pré-requisitos são fundamentais

para o aprendizado da criança, pois assessoram no desenvolvimento das estruturas

que a criança traz ao nascer e ajudam a minimizar a ocorrência de falhas no

processo. Morais (1996, citado por CARVALHO, 2005), ―denomina tais pré-requisitos

de conceitos, que a criança deve adquirir durante o período anterior à alfabetização‖.

A autora elenca como pré-requisitos para a aprendizagem o desenvolvimento e a

percepção do esquema corporal, a coordenação motora global, a coordenação

motora fina, a lateralidade, a orientação espacial e a orientação temporal.

Outro questionamento realizado no estudo foi ―se a turma atingiu os

objetivos propostos do 1º ano‖, sendo que 80,83%, do total das 120 crianças,

atingiram os objetivos propostos e 19,17%, não conseguiram atingir. Estes objetivos

são determinados pela Secretaria Municipal da Educação, através das Diretrizes

Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental.

Entre os objetivos que o sistema educacional espera que o aluno atinja ao

final do 1º ano estão: conhecimento do alfabeto, escrever e ler frases simples,

noções de grandeza, etc. De acordo com os dados apurados, o que se pode

levantar é que dos objetivos que não foram atingidos a imaturidade das crianças foi

o fator que mais contribuiu para um resultado não satisfatório ao final do ano. Outro

fator foi o comportamento, com uma incidência menor, porém significativa. As

dificuldades relacionadas ao quadro dos transtornos do desenvolvimento infantil,

também foram observados na coleta de dados, estes em uma proporcionalidade

menor que os acima citados.

Os Transtornos Globais do Desenvolvimento estão relacionados aos

distúrbios nas interações sociais recíprocas que costumam manifestar-se nos

primeiros anos de vida. A criança em fase escolar, que possa vir a apresentar

transtorno, poderá ter maior dificuldade na aprendizagem, principalmente se o

diagnóstico não for observado e tratado de acordo com a patologia manifestada.

Para Zorzi e Ciasca (2008):

―a aprendizagem depende de condições estruturais e funcionais do sistema nervoso central. Disfunções que ocorram nas etapas de desenvolvimento das unidades funcionais cerebrais podem acarretar alterações na linguagem e na aprendizagem. Problemas de atenção e concentração são derivados de disfunções nas zonas primárias. Dificuldades na aprendizagem envolvendo a leitura, a escrita e a matemática podem ser derivadas de disfunções nas zonas secundárias. Por sua vez, o baixo rendimento cognitivo, falhas na compreensão da linguagem falada, limitações em termos de leitura escrita e matemática, estão relacionadas a disfunções nas áreas terciárias‖. (ZORZI & CIASCA, 2008).

Entre as crianças que não conseguiram atingir o objetivo proposto, ao final

do ano apresentaram: leitura aleatória do alfabeto, alguns conseguiam fazer a leitura

de palavras com o auxilio da professora, certa dificuldade para reconhecer os

números de 0 a 9, leitura de palavras simples e junção de sílabas.

Conforme cita Vigotski (1999) quando traz o desenvolvimento real da criança

que ―a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não

amadureceram, mas que estão em processo de maturação, (...). O nível de

desenvolvimento real caracteriza o desenvolvimento mental retrospectivamente,

enquanto a zona de desenvolvimento proximal caracteriza o desenvolvimento mental

prospectivamente‖.

Quando questionadas em relação ao que foi proposto aos alunos diante das

dificuldades apresentadas, estas responderam que foram elaboradas atividades

diversificadas dentro da sala de aula, reforço dos conteúdos que encontraram maior

dificuldade para assimilar, apoio extraclasse com professora co-regente e

encaminhamento a profissional competente.

Segundo Vigotski (1999), ―a aprendizagem tem um papel fundamental para o

desenvolvimento do saber, do conhecimento. Todo e qualquer processo de

aprendizagem é ensino-aprendizagem, incluindo aquele que aprende, aquele que

ensina e a relação entre eles‖.

Assim podemos dizer que o apressamento da aprendizagem é algo

vivenciado no dia-a-dia da escola de ensino fundamental, porém como citado acima,

os professores tem procurado minimizar as dificuldades apresentadas pelas crianças

em sala de aula, mas enquanto ela não estiver pronta para a aquisição, assimilação

do conhecimento, respeitando o seu tempo, sua capacidade e maturidade para

encontrar as estratégias adequadas a sua aprendizagem os problemas continuarão

a existir e quem sabe até aumentar, senão tratados adequadamente.

4. CONCLUSÃO

Desde sua origem, o indivíduo inicia o seu processo de desenvolvimento em

busca de sua totalidade. Em seu caminho, passa por diferentes fases que

caracterizam o seu aprendizado. Nesse processo, como cita Piaget, Vigotski e

Wallon, a criança buscará de acordo com a sua maturidade o conhecimento.

O processo de aprender implica, por sua vez, descobrir, mudar, criar, sentir,

pensar e realizar, na medida em que o sujeito caminha ao encontro do

conhecimento, representado pelas formações elementares do pensamento, da

linguagem, pelos movimentos e escrita, ações concretas e abstrações lógicas, enfim,

por inúmeros conteúdos e formas que, independente da fase de desenvolvimento

em que o indivíduo se encontre, estão em constante reconfiguração, reconstrução.

Ao analisarmos os dados obtidos com a pesquisa nos deparamos com a

questão que inicialmente nos levou a formular este estudo, que se configura através

da pergunta inicial ―qual é a relevância pratica do apressamento cognitivo na

aprendizagem de crianças de cinco aos seis anos que estão cursando o ensino de

nove anos‖. E podemos alertar para a situação que se mostra com o apressamento

cognitivo, onde na população pesquisada 19,17% não conseguiram atingir os

objetos propostos para a etapa inicial do aprendizado em crianças com cinco anos.

Ao levantarmos os autores que trazem o desenvolvimento infantil e suas

fases, estes alertam para respeitarem as fases do desenvolvimento natural da

criança, pois o apressamento cognitivo pode trazer conseqüências em áreas do

processo que se configura na aprendizagem.

A Psicopedagogia busca uma compreensão mais integradora do fenômeno

da aprendizagem e uma atuação de natureza mais preventiva.

Assim, cabe ao psicopedagogo orientar a pais, escola e profissionais

envolvidos com a criança que apresenta dificuldade no processo ensino-

aprendizagem, ressaltando a importância de respeitar as etapas do desenvolvimento

de acordo com a necessidade que cada um apresenta e muitas vezes não são

observadas em sua totalidade.

Sendo assim Perls (1977):

―Qualquer desequilíbrio é experienciado como uma necessidade de ser corrigido. Agora, temos dentro de nós situações inacabadas. (...) A situação mais urgente torna-se a controladora, a que dirige e a que se encarrega. A situação mais urgente emerge, e em qualquer caso de emergência, você percebe que ela prevalece sobre qualquer outra atividade‖. (PERLS, 1977, p. 34).

Embora não se tenha esgotado o assunto, e diante do exposto neste estudo,

espera-se ter contribuído de alguma forma com as questões que estão relacionadas

ao apressamento cognitivo e de como ele pode interferir no desenvolvimento natural

da criança em fase escolar.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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