REVISTA SEMANAL 116
DE 20-01-2014 A 26-01-2014
BRIEFING INTELI|CEIIA » TRANSPARÊNCIA || 2014
Revista de Imprensa27-01-2014
1. (PT) - Correio do Minho, 26/01/2014, A nossa crise resulta da corrupção 1
2. (PT) - Diário de Notícias, 26/01/2014, Autarca julgado por corrupção 2
3. (PT) - Expresso, 25/01/2014, A riqueza oculta das elites vermelhas 3
4. (PT) - i, 25/01/2014, Colégios GPS suspeitos de inflacionarem gastos com professores 4
5. (PT) - Jornal da Madeira, 25/01/2014, Investigação à elite chinesa bloqueada 6
6. (PT) - Jornal de Notícias, 24/01/2014, Violou estatuto do gestor público 7
7. (PT) - Público, 24/01/2014, Casa de ex-secretário de Estado da Educação alvo de buscas pela PJ 8
8. (PT) - Sol, 24/01/2014, GNR quer acelerar inquérito de corrupção 10
9. (PT) - Sol, 24/01/2014, PJ faz buscas a colégios da GPS 11
10. (PT) - Diário de Notícias, 23/01/2014, Tribunal de Sintra decretou falência de Vale e Azevedo 12
11. (PT) - Jornal de Notícias, 23/01/2014, Narciso acusado de se apoderar de dinheiro do Estado 14
12. (PT) - Público, 23/01/2014, Conselho contra a corrupção pede nomeação atempada das comissões deacompanhamento de privatizações
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13. (PT) - Público, 23/01/2014, Elite política da China oculta milhões em paraísos fiscais 16
14. (PT) - Correio da Manhã, 22/01/2014, Pena reduzida a ex-deputado 18
15. (PT) - Correio da Manhã, 22/01/2014, Sindicato avança com queixa à PGR 19
16. (PT) - Diário de Notícias, 22/01/2014, Milhões em contratos de associação sob suspeita 20
17. (PT) - i, 22/01/2014, Buscas. Colégios GPS suspeitos de corrupção e lavagem de dinheiro 22
18. (PT) - Jornal de Negócios, 22/01/2014, Branqueamento de capitais num olhar "descomplicado" 25
19. (PT) - Jornal de Notícias, 22/01/2014, Buscas a colégios por uso ilícito de dinheiros públicos 26
20. (PT) - Jornal de Notícias, 22/01/2014, Ex-funcionário do Vaticano preso por corrupção 29
21. (PT) - Público, 22/01/2014, Polícia Judiciária investiga suspeitas de corrupção no grupo de ensino GPS 30
22. (PT) - i, 21/01/2014, Câmara de Odivelas. Ajustes directos pouco éticos que não chegam a ser crime 31
23. (PT) - Jornal de Notícias, 21/01/2014, MP pede dez anos de cadeia para patrão da Conforlimpa 33
24. (PT) - Público, 21/01/2014, IGF inspecciona Câmara de Portimão por causa do projecto da Cidade doCinema
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25. (PT) - Público, 20/01/2014, Secretário de Estado fez lobbying durante dois anos para conseguir abrirhospital privado
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CONFERÊNCIA| Miguel Viana |
“Uma das preocupações dos Ca-pitães de Abril era a corrupção.O programa do Movimento dasForças Armadas (MFA) tinhamedidas para combater a corrup-ção. O grave foi que passou-seda ditadura para a democraciasem que o problema da corrup-ção tenha sido resolvido.” Foidesta forma que Paulo Morais,professor da Universidade Lusó-fona do Porto e vice-presidenteda Transparência e Integridade -Associação Cívica (TIAC) abriua conferência ‘Corrupção: Causaou Consequência da Crise?’, quedecorreu anteontem à noite naBiblioteca Lúcio Craveiro daSilva (BLCS).
O encontro foi organizado pelaBiblioteca da Escola EB 2/3 FreiCaetano Brandão - Agrupamen-to de Escolas de Maximinos, emcolaboração com a BLCS.
Paulo Morais afirmou que nosúltimos 40 anos praticamentenada foi feito para combater acorrupção em Portugal, o quetem prejudicado a imagem ex-terna do país: “Há um conjuntode entidades internacionais queindicam que Portugal é dos paí-ses onde existe mais corrupção.Em termos de espaço europeu,Portugal integra a lista dos paí-ses com mais corrupção, alem daItália, da Grécia e da Espanha. Oque está a evitar o investimentoestrangeiro no nosso país é a
corrupção. Isto é demolidor paraa nossa economia.”
Ao nivel mundial, em 2013, onosso país ocupava a 33.ª posi-ção em termos de corrupção.Ainda assim, apontou o profes-sor universitário, “Portugal foi opaís que perdeu mais lugares emtermos de corrupção. Em 2000ocupava a 21.ª posição.”
Paulo Morais apontou comopricipais casos de corrupção emPortugal, os processos relacio-nados com o BPN (Banco Portu-
guês de Negócios) e as PPP(Parcerias Público-Privadas).
“Só o caso BPN custou ao paíssete mil milhões de euros. Issodá para pagar os salários da Fun-ção Pública durante um ano”,disse o também vice-presidenteda TIAC, que acrescentou: “Háadministradores de empresas li-gadas ao BPN que foram contra-tados para inventarem prejuí-zos.”
As PPP custaram ao país doismil milhões de euros por ano.
devido à existência de contratosirregulares. “Têm anexos secre-tos que não pode haver, falta umcomparador público (que avaliese a parceria é vantajosa ou nãopara o Estado) e revelam incum-primento da Lei de Enquadra-mento Orçamental”, considerouPaulo Morais.
Tudo isto só foi permitido peloEstado português, porque, de-nunciou o docente, “o Parlamen-to tem cerca de 60 deputadosque são também consultores e
administradores de empresasque têm negócios com o Esta-do”.
A solução passa por aplicarquatro tipos de intervenção: au-mento da transparência, funcio-namento da Justiça, apreensãode bens de quem lesou o Estadoe simplificação legislativa.
A propósito da transparência,Paulo Morais aconselhou os or-ganismos do Estado a disponibi-lizarem mais informação aos ci-dadãos: “É fundamental que, porexemplo, os cidadãos de Bragasaibam qual é o maior fornece-dor da Câmara Municipal deBraga”, defendeu Paulo Morais.
Na área da Justiça, o ex-verea-dor do Urbanismo da CâmaraMunicipal do Porto, disse ser ne-cessária a “criação de tribunaisespecializados” em burlas e cor-rupção.
Paulo Morais lançou, ainda, odesafio de que “todos devemoslutar contra a corrupção. Se dei-xarmos. por exemplo, que o co-lega de trabalho meta baixa semestar doente, isso contribui paraa corrupção. Se não fizermos na-da contra isso nunca mais saire-mos da crise. A crise resulta dacorrupção”. rematou Paulo Mo-rais.
Na abertura da conferência, opresidente do Agrupamento deEscolas de Maximinos, AntónioPereira, “é um dever da cidada-nia podermos combatê-lo (ao fe-nómeno da corrupção) à nossamaneira.”
MIGUEL VIANA
Paulo Morais falou sobre a relação entre a corrupção e a crise dem Portugal
“A nossa crise resulta da corrupção”PROFESSOR universitário Paulo Morais foi o principal orador da conferência “Corrupção: Causa ou Consequência da Crise ?’,organizada pela Biblioteca da Escola EB 2/3 Frei Caetano Brandão e pela Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva.
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Investigação à elitechinesa bloqueadaAChina está a bloquear os sites dos órgãos
de comunicação social que revelaram a in-vestigação à elite chinesa. De acordo com oJornal de Negócios, o “El País”, “The Guar-dian”, “BBC”, “LeMonde”, “Süddeutsche Zei-tung” e “Asahi Shimbun” aliaram-se numa in-vestigação aos elementos mais importantesda sociedade chinesa, que apurou quegrande parte da elite do país tem ocultadoempresas em paraísos fiscais.«O Governo da China bloqueou a edição
digital do “El País” no seu território para evitara divulgação da investigação que revela que,familiares directos dos dirigentes máximos[chineses], entre eles o cunhado do presi-dente, assim como magnatas, membros daAssembleia Popular e de empresas estataismantêm sociedades opacas em paraísos fis-cais». É desta forma que começa a notícia,presente no site desta publicação espanhola,sobre o bloqueio que o seu site está a seralvo na China.Já fontes próximas do governo chinês, cita-
das pelosmesmosmeios, garantemque estemovimento nada tem que ver com corrup-ção, mas sim com uma prática empresarialcomum, comvista a competir comempresasestrangeiras que estão a investir na China eque o Governo favorece com isenções e im-postos, relata o “El País.
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FERNANDO VELUDO/NFACTOS
Casa de ex-secretário de Estado da Educação alvo de buscas pela PJ
Unidade de Combate à Corrupção da PJ teve mais de 100 inspectores envolvidos na investigação à GPS
A casa do ex-secretário de Estado
adjunto e da Administração Educa-
tiva de Santana Lopes, José Manuel
Canavarro, actual deputado do PSD
pelo círculo de Coimbra, foi ontem
alvo de buscas realizadas pela Polícia
Judiciária (PJ) no âmbito da investi-
gação ao grupo GPS. Em causa estão
suspeitas do crime de corrupção.
Contactado pelo PÚBLICO, José
Manuel Canavarro afi rmou que não
queria “comentar nada sobre esse as-
sunto” e adiantou que irá “constituir
advogado, se for caso disso”. Con-
fi rmou ainda uma informação que
consta do seu registo de interesses
entregue na Assembleia da Repúbli-
ca: não trabalha desde Junho de 2011
para o grupo GPS, onde foi consultor
mais de seis anos e para o qual entrou
poucos meses após deixar o Governo.
O nome de José Manuel Canavarro
tem sido várias vezes associado ao
crescimento do grupo GPS (Gestão
e Participações Sociais), actualmen-
te detentor de 26 colégios, entre os
quais 14 que recebem fi nanciamento
do Ministério da Educação. O ex-se-
cretário de Estado adjunto e da Ad-
ministração Educativa de Santana
Lopes é apontado, a par de José Al-
meida que era então director regio-
nal de Educação de Lisboa, como
tendo um papel determinante na
aprovação, em 2005, de contratos
de fi nanciamento público a quatro
colégios do grupo GPS (Rainha Dona
Leonor e Frei Cristóvão, no concelho
das Caldas da Rainha, e Miramar e
Santo André, em Mafra).
O despacho que autoriza a celebra-
ção de contratos de associação, com
base numa proposta de José Almei-
da, foi assinado pelo então secretário
de Estado a 15 de Fevereiro de 2005,
cinco dias antes das eleições legisla-
tivas que levaram ao afastamento da
coligação PSD-CDS do poder.
A Unidade Nacional de Combate à
Corrupção da PJ realizou na terça-fei-
ra passada uma operação que envol-
veu mais de cem inspectores dirigida
ao GPS, tendo realizado buscas à sede
do grupo, no Louriçal, Pombal, e em
cinco colégios do grupo, nas Caldas
da Rainha, em Mafra e na Batalha. O
inquérito está a ser dirigido pela 9.ª
Secção do Departamento de Investi-
gação e Acção Penal de Lisboa, dirigi-
do pela procuradora Teresa Almeida.
Catorze das 26 escolas que são pro-
priedade do grupo GPS têm contra-
tos de associação com o Estado. Atra-
vés destes acordos, o Ministério da
Educação paga aos colégios as des-
pesas de frequência dos seus alunos,
garantindo-lhes assim as mesmas
condições de gratituidade de que be-
nefi ciariam no ensino público. Estes
contratos só podem ser celebrados
quando não existe na zona oferta
pública ou esta esteja saturada. Se-
gundo o Sindicato dos Professores
da Zona Centro, algumas escolas do
grupo GPS benefi ciam destes con-
tratos, apesar de não estar cumprida
nenhuma daquelas condições.
Há um ano um grupo de professo-
res reunidos no Movimento Escola
Pública apresentou uma queixa-cri-
me, na qual sustentava que tinham
sido encaminhados para estes colé-
gios turmas que têm lugar nas esco-
las da rede pública, verifi cando-se
um subaproveitamento de recursos
públicos. Nos últimos anos, a Fede-
ração Nacional dos Professores re-
cebeu denúncias de professores que
leccionavam em colégios deste grupo
e que se queixavam de trabalhar mais
horas do que as permitidas por lei;
de serem sujeitos a alterações de ho-
rário e a transferências entre escolas
do grupo. Há um ano, em Janeiro de
2013, na sequência dessas queixas, o
Ministério da Educação e Ciência en-
viou para a Autoridade para as Con-
dições do Trabalho um relatório de
uma auditoria feita ao grupo, que foi
mais tarde remetido às autoridades
que estão a investigar este caso.
O presidente do grupo GPS é Antó-
nio Calvete, ex-deputado socialista,
que chamou para a instituição ex-
secretários de Estado e ex-directo-
res regionais de Educação quer do
seu partido, quer do PSD. Entre os
colaboradores e funcionários fi gu-
ram, além de José Manuel Canavarro,
Paulo Pereira Coelho, também ex-
secretário de Estado do Governo de
Santana Lopes. E também os directo-
res regionais de Educação de Lisboa
e do Centro, respectivamente José
Almeida e Linhares de Castro.
O GPS é uma sociedade anónima
constituída em 2003 a partir de um
grupo de educação que já detinha se-
te escolas, no centro do país. Em dez
anos acrescentou mais 19 estabeleci-
mentos a este património, contando
agora com 26 escolas.
José Manuel Canavarro, antigo membro do Governo de Santana Lopes, actual deputado do PSD e antigo consultor do grupo de educação GPS, está a ser investigado por alegada corrupção
Investigação ao grupo GPSMariana Oliveira
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José Manuel Canavarro está a ser investigado pela PJ por alegada corrupção p8
Casa de ex-secretário de Estado alvo de buscas no caso GPS
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O Conselho de Prevenção da Corrup-
ção (CPC) foi ontem ao Parlamento
apresentar o seu caderno de encar-
gos para este ano. Entre as activi-
dades planeadas para 2014 está o
“acompanhamento dos processos
de privatizações”, conforme admi-
tiu o secretário-geral José Tavares,
tendo mesmo destacado os “alertas”
feitos pela CPC, ao longo do tempo,
sobre o assunto. Em causa estão as
condições dadas às comissões de
acompanhamento.
José Tavares afi rmou ao PÚBLICO
que o CPC dera já nota da necessida-
Conselho contra a corrupção pede “nomeação atempada” das comissões de acompanhamento de privatizações
de da “nomeação atempada” dessas
comissões, por forma a permitir uma
“análise mais rigorosa” das decisões.
A atenção às privatizações não é
uma preocupação de agora na CPC.
A entidade tinha já produzido, em
Setembro de 2011, um conjunto de
recomendações defendendo a cria-
ção dessas comissões de acompanha-
mento. Agora, depois de um conjun-
to de consultas com personalidades
que fi zeram parte dessas estruturas,
assinala a necessidade de serem da-
das condições para que as comissões
cumpram a sua missão.
Na audição com os deputados, o
presidente e o secretário-geral do
CPC apresentaram as “acções espe-
cífi cas” que aquela entidade tenciona
desenvolver nos próximos meses. O
CPC tem um orçamento de 161 mil
euros, quase totalmente destinado
a cobrir as despesas com o pessoal,
que é composto por dois técnicos su-
periores e um assistente técnico.
ParlamentoNuno Sá Lourenço
CPC quer investigar as áreas em que o actual Governo se tem mostrado mais activo
fi nanciamento dos partidos”. “As
campanhas internas [partidárias]
não estão sujeitas a qualquer contro-
lo”, alertou. Mas foi por sua inicia-
tiva que abordou o polémico tema
do enriquecimentio ilícito.
Depois de frisar que a sua inter-
venção não tinha qualquer intenção
de pressionar o Parlamento, Oliveira
Martins apresentou uma solução:
lembrou a legislação de Hong Kong,
onde o “destinatário” da “fi gura ju-
rídica” estava limitado aos titulares
de cargos políticos e funcionários
públicos.
A audição permitiu ainda ao ex-
ministro das Finanças confi rmar
que a austeridade tem impacto no
fenómeno da corrupção. Citando
estudos académicos, Guilherme
d’Oliveira Martins falou de um au-
mento, de “20 para 25%, da econo-
mia paralela”. “Temos mais notas de
500 euros a circular em Portugal”,
concluiu.
No plano de actividades para 2014,
a CPC assume também o objectivo
de se virar para o sector privado,
“nomeadamente nas áreas em que
as entidades privadas asseguram,
por concessão, a prestação de algu-
mas funções tradicionalmente de-
senvolvidas pelo Estado”. Propõe-se
também fazer o “estudo sobre as ge-
minações na administração local”,
bem como aprofundar as “especifi -
cidades dos riscos em sectores que
se têm revelado mais problemáticos
na área da saúde”.
Mas, durante a audição, o presi-
dente da CPC, Guilherme d’Oliveira
Martins, aproveitou para “meter a
foice em seara alheia”. Convidado
pelo socialista José Magalhães a
apontar lacunas no plano legislativo,
o também presidente do Tribunal de
Contas aconselhou os deputados a
“dar resposta” às recomendações
do grupo internacional GRECO,
lembrando as “carências na lei de
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WANG ZHAO/AFP
Elite política da China oculta milhões em paraísos fi scais
135 dos multimilionários são membros da Assembleia Nacional
Na China há uma “nobreza de ouro”
que enriqueceu graças aos cargos
políticos que ocupou e à corrup-
ção. Familiares de pelo menos 13
dirigentes comunistas (actuais ou
passados e entre eles do Presidente
Xi Jinping) foram ontem acusados
de terem reunido grandes fortunas
e de terem ocultado parte delas em
contas off shore, nas Ilhas Virgem
britânicas.
As revelações estão contidas nos
dados obtidos pelo Consórcio In-
ternacional de Jornalistas de Inves-
tigação, que juntou 2,5 milhões de
documentos sobre cerca de 22 mil
clientes de off shores com moradas
na China continental e em Hong
Kong e 16 mil em Taiwan. Desse
grupo, há pelo menos 13 famílias
de líderes chineses.
“A China tornou-se no maior mer-
cado para os paraísos fi scais”, diz o
relatório do Consórcio, que passou
as suas conclusões e muitos dados
a um grupo de jornais que ontem
fi zeram manchete com a notícia —
El País, Le Monde, The Guardian,
Süddeutsche Zeitung e o japonês
Asahi Shimbun. “Todos os sectores
da economia chinesa, do petróleo
à energia renovável, da mineração
ao comércio de armas, surgem na
documentação”.
Ontem foi dia de conferência de
imprensa no Ministério dos Negó-
cios Estrangeiros em Pequim e os
jornalistas questionaram o porta-
voz, Qin Gang, que desvalorizou a
notícia: “Do ponto de vista do leitor
este artigo não é pertinente. O que
nos faz questionar se não terá outros
motivos”. Sobre a presença do nome
de Xi Jinping nos documentos, Qin
disse que o Presidente “é inocente”.
Se não fosse, se houvesse qualquer
ilegalidade, explicou o porta-voz,
isso já teria sido descoberto.
Na China as contas em paraísos
fi scais não preconizam um crime
por si só. E fontes do Governo chi-
nês ouvidas pelo El País — depois
de um contacto ofi cial sem respos-
ta — explicam isso mesmo, que não
há ilegalidade e que não se tratam
de empresas ou contas dos líderes,
mas de familiares seus. Mas o rela-
tório diz que há provas que permi-
tem concluir que “muitos chineses e
Jinping e Wen Jiabao (antigo primei-
ro-ministro) a empresas com negó-
cios obscuros e milionários em pa-
raísos fi scais. Num texto chamado
O parente de ouro, o El País explica
que o cunhado de Xi, Deng Jiagui,
se tornou um magnata do imobili-
ário em Hong Kong e a sua princi-
pal empresa foi registada nas Ilhas
Virgens quando Xi ainda era vice-
presidente. Já a imobiliária nasceu
nas vésperas de ser nomeado Pre-
sidente, em Março do 2013.
Fenómeno em crescimentoAnalistas ouvidos pelo South China
Morning Post tentaram explicar o fe-
nómeno das off shores do ponto de
vista económico. Dali Yang, da Uni-
versidade de Chicago (EUA), disse
que a fuga do capital que foi parar
às mãos das famílias politicamente
infl uentes se pode dever ao receio
de que a economia não seja susten-
tável e que possa haver uma erosão
(desvalorização) dos bens. “A guerra
contra a corrupção que está em cur-
so na China também pode ter ace-
lerado este fenómeno”, disse Dali.
Do ponto de vista dos negócios,
explicam outros, o off shore apareceu
como recurso para pagar menos im-
postos na China: as empresas com
sede no estrangeiro são vistas pela
China como estrangeiras e, por is-
so, têm grandes benefícios fi scais.
A mulher mais rica da China, Yang
Huiyan, o homem mais rico do mun-
do, Pony Ma Huateng, e o empre-
sário do ramo imobiliário Zhang
Xin têm todos registos em paraísos
fi scais. Assim como Li Xiaolin (fi lha
de Li Peng, o primeiro-ministro da
repressão em Tiananmen), que é co-
nhecida por “Rainha da Energia” e é
uma das empresárias mais infl uen-
tes no mundo; Wu Jianchang (neto
de Deng Xiaoping, o Presidente que
encerrou o capítulo da planifi cação
da economia e começou a cami-
nhar para o sistema de mercado);
e os Wang (os três fi lhos do general
Wang Zhen, vice-presidente entre
1988 e 1993).
Não se sabe quem passou os do-
cumentos que revelam como são
ricas as famílias dos homens mais
importantes do aparelho comunista
chinês. O site do Consórcio de Jor-
nalistas fi cou inacessível na China,
assim como as edições online dos
jornais que divulgaram o trabalho
de investigação.
Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação revela que familiares de dirigentes máximos do regime guardam fortunas nas Ilhas Virgens britânicas. Pequim diz que dados não são pertinentes
Corrupção Ana Gomes Ferreira
empresas usaram entidades off shore
para se envolverem em comporta-
mentos ilícitos ou ilegais”.
A guerra de XiEstes dados surgem num momento
crucial do debate em curso na Chi-
na sobre o combate à corrupção no
aparelho comunista e o regresso à
ética. Xi Jinping apresentou-se como
o grande paladino dessa guerra e as
revelações de que a sua família acu-
mulou uma grande fortuna enquan-
to foi vice-presidente (2008-13) man-
cham a sua reputação e levantam
dúvidas sobre o tratamento igual
que prometeu para os infractores.
Compromete também a credibili-
dade da sua grande proposta social
— a construção de uma nova China
com mais igualdade e ancorada nu-
ma classe média sólida. Uma parcela
signifi cativa dos chineses saiu da po-
breza na última década, mas a China
tornou-se no mesmo período num
dos países do mundo com maior de-
sigualdade. Enriquecimentos ilícitos
e fugas de capital só ajudam a piorar
esse cenário, disse ao South China
Morning Post, jornal independente
de Hong Kong, Clark Gascoigne, do
Think Tank Global Financial Integri-
ty: “Através da evasão fi scal os ricos
estão a fi car cada vez mais ricos e a
classe média, a trabalhadora, é que
sofre os efeitos”.
Em dez anos, o número de multi-
milionários chineses passou de zero
para 315 e destes 135 são membros
da Assembleia Nacional — 20 mem-
bros desta assembleia tinham, em
2012, um património avaliado em
48.500 milhões de dólares, 46 ve-
zes mais do que os 20 congressistas
americanos mais ricos, segundo um
centro de informação de Washing-
ton citado pelo El País.
Para agravar o embaraço de Xi Jin-
ping, as revelações coincidem com
o início do julgamento, em Pequim,
de Xu Zhiyong, o fundador do Movi-
mento dos Novos Cidadãos, grupo
que denunciava precisamente cri-
mes de corrupção e esquemas de
enriquecimento dentro do aparelho
do partido único chinês. Xu foi acu-
sado de “incitamento à perturbação
da ordem pública” e pode ser con-
denado a uma pena de prisão.
Investigações anteriores do jornal
The New York Times e da Bloomberg
já tinham começado a desvendar a
teia de ligações de familiares de Xi
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Tiragem: 37425
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Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação revela que familiares de dirigentes máximos do regime guardam fortunas nas Ilhas Virgens p29
Elite política da China oculta milhões em paraísos fiscais
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NELSON GARRIDO
O grupo de educação GPS dispõe de 26 escolas
A Polícia Judiciária (PJ) realizou on-
tem uma operação que envolveu
mais de 100 inspectores que visou
ao grupo de ensino GPS (Gestão e
Participações Sociais), detentor de
26 colégios, entre os quais 14 que re-
cebem apoio do Ministério da Educa-
ção. Em investigação, apurou o PÚ-
BLICO, estão crimes de corrupção e
branqueamentos de capitais.
Além da sede, no Louriçal (Pom-
bal) foram realizadas buscas em
cinco colégios do grupo, Caldas da
Rainha (Colégio Rainha D. Leonor e
Colégio de Frei S. Cristóvão), de Ma-
fra (Colégio de Santo André e Colégio
de Miramar) e da Batalha (Colégio
de S. Mamede). A PJ esteve ainda
em sociedades e domicílios de res-
ponsáveis do grupo, num conjunto
de 24 diligências, que se estendem
a vários concelhos do país, refere o
site da Procuradoria-Geral Distrital
de Lisboa do Ministério Público.
A Unidade Nacional de Combate à
Corrupção da PJ esteve à frente desta
operação, que contou ainda com a
colaboração da Directoria do Centro
e do Departamento de Leiria. As bus-
cas foram realizadas no âmbito de
um processo-crime aberto pelo De-
partamento de Investigação e Acção
Penal (DIAP) de Lisboa.A busca en-
volve a participação de magistrados,
inspectores da PJ, peritos fi nanceiros
e informáticos.
Queixas de professoresCatorze das 26 escolas que são pro-
priedade do grupo GPS têm contra-
tos de associação com o Estado. Atra-
vés destes acordos, o Ministério da
Educação paga aos colégios as des-
pesas de frequência dos seus alunos,
garantindo assim a estes as mesmas
condições de gratituidade de que be-
nefi ciariam no ensino público. Estes
contratos só podem ser celebrados
quando não existe na zona oferta
pública ou esta esteja saturada. Se-
gundo o Sindicato dos Professores
da Zona Centro, algumas escolas do
grupo GPS benefi ciam destes con-
tratos apesar de não estar cumprida
nenhuma daquelas condições.
Há um ano um grupo de professo-
res reunidos no Movimento Escola
Polícia Judiciária investiga suspeitas de corrupção no grupo de ensino GPS
no que diz respeito ao fi nanciamento
recebido do Estado.
GPS disponível a colaborarO grupo GPS confi rmou em comuni-
cado, ao início da tarde, a realização
de buscas pela PJ à sua sede, no Lou-
riçal, Pombal, e “a algumas entidades
a ele ligadas”, mas resguardou-se no
segredo de justiça para não adiantar
“qualquer informação adicional”. No
texto, o grupo informa que “prestou
e continuará a prestar total colabora-
ção às entidades competentes”.
O presidente do grupo GPS é Antó-
nio Calvete, ex-deputado socialista,
que chamou para a instituição ex-se-
cretários de Estado e ex-directores
regionais de Educação quer do seu
partido, quer do PSD. Entre os cola-
boradores e funcionários fi guram Jo-
sé Canavarro e Paulo Pereira Coelho,
ex-secretários de Estado no Governo
de Santana Lopes. E também os di-
rectores regionais de Educação de
Lisboa e do Centro, respectivamente,
José Almeida e Linhares de Castro.
Em 2007, o Tribunal de Contas de-
tectou, num relatório da auditoria
fi nanceira realizada à Direcção Re-
gional de Educação do Centro, que
entre 2003 e 2005 a IGEC instaurara
12 processos devido a irregularidades
no âmbito dos contratos de associa-
ção. Destas, quatro eram escolas do
grupo GPS: por pagamentos a mais
ou adiantamentos considerados in-
devidos deveriam então ao Estado
quase três milhões de euros.
O GPS é uma sociedade anónima
constituída em 2003 a partir de um
grupo de educação que já detinha se-
te escolas, no Centro do país. Em dez
anos acrescentou mais 19 estabeleci-
mentos a este património, contando
agora com um total de 26 escolas.
Pública apresentou uma queixa ao
Departamento Central de Investiga-
ção e Acção Penal, onde sustentava
que tinham sido encaminhados para
estes colégios turmas que tinham lu-
gar nas escolas da rede pública, veri-
fi cando-se um subaproveitamento de
recursos públicos. O PÚBLICO sabe,
contudo, que não foi esta denúncia
que deu origem a esta investigação,
que corre no DIAP de Lisboa.
Recorde-se que, nos últimos anos,
a Federação Nacional dos Professo-
res (Fenprof ) recebeu denúncias de
professores que leccionavam em
colégios deste grupo e que se quei-
xavam de trabalhar mais horas do
que as permitidas por lei e de serem
sujeitos a alterações de horário e a
transferências entre escolas do gru-
po. Há um ano, em Janeiro de 2013,
na sequência dessas queixas, o Minis-
tério da Educação e Ciência enviou
para a Autoridade para as Condições
do Trabalho um relatório de uma au-
ditoria feita ao grupo.
O relatório do inquérito da Ins-
pecção-Geral de Educação e Ciên-
cia (IGEC) sobre os colégios do grupo
GPS foi ainda enviado para o Minis-
tério Público, em Outubro passado.
“Posteriormente foram solicitadas
pela Polícia Judiciária as auditorias
realizadas pela IGEC, que foram re-
metidas com despacho de concor-
dância do secretário de Estado do
Ensino e Administração Escolar”,
João Casanova de Almeida, referiu
fonte do Ministério da Educação.
De acordo com a tutela, as primei-
ras auditorias aos colégios do grupo
GPS foram solicitadas pelo secretário
de Estado “ainda durante o Verão de
2012”, antes de a TVI ter iniciado a
emissão de reportagens em que se
denunciam alegadas irregularidades
Investigação Bárbara Wong, Mariana Oliveira e Orlando CardosoCatorze das 26 escolas são financiadas pelo Estado. PJ esteve na sede do grupo e em mais cinco colégios
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Âmbito: Informação Geral
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Corte: 1 de 1ID: 51908644 21-01-2014
los Alexandre, do Tribunal Central de
Instrução Criminal de Lisboa, aplicou
ao arguido a medida de coacção mais
gravosa, até que estivessem reunidas
as condições legais e técnicas para
que pudesse passar a prisão domi-
ciliária, com pulseira electrónica, o
que aconteceu 5 de Julho.
Além de Luís Carito — que segundo
foi noticiado na altura engoliu um do-
cumento de prova na presença dos
inspectores da Polícia Judiciária —,
o vereador da Câmara de Portimão
Jorge Campos, o administrador da
empresa municipal Portimão Urbis
A Câmara de Portimão anunciou on-
tem que está a ser alvo de uma ins-
pecção extraordinária da Inspecção-
Geral de Finanças (IGF), que incide
também sobre a empresa municipal
Portimão Urbis.
Num curto comunicado, a autar-
quia algarvia refere que “os objec-
tivos gerais desta inspecção con-
sistem na verifi cação da actuação
dos órgãos municipais nas suas
relações com a referida empresa
e na análise das respectivas con-
IGF inspecciona Câmara de Portimão por causa do projecto da Cidade do Cinema
tas entre os anos de 2009 e 2013”.
A Câmara de Portimão, citada pe-
la agência Lusa, adianta ainda que,
“para além das deliberações camará-
rias ou despachos relacionados com
a Portimão Urbis, será disponibili-
zada aos inspectores a relação dis-
criminativa dos contratos-programa
celebrados durante aquele período
entre as duas entidades e respectiva
execução fi nanceira, entre outra do-
cumentação”.
O nome da empresa municipal Por-
timão Urbis esteve em foco em Junho
de 2013, quando o então vice-presi-
dente da Câmara de Portimão, Luís
Carito (PS), e outras quatro pessoas
foram detidas no âmbito da investi-
gação que levou a Polícia Judiciária a
realizar buscas na autarquia, no fi nal
do mandato do executivo liderado
pelo socialista Manuel da Luz.
Luís Carito fi cou em prisão preven-
tiva a 21 Junho, dia em que o juiz Car-
Auditoria
Portimão Urbis está também a ser investigada pelo MP no âmbito do processo que levou à detenção de Luís Carito, ex-vice-presidente da autarquia
Lélio Branca e os administradores
Artur Curado e Luís Marreiros, da
empresa Pictures Portugal, também
foram detidos por suspeitas de cor-
rupção, administração danosa, bran-
queamento de capitais e participação
económica em negócio.
Os factos em investigação estão re-
lacionados com a actividade e gestão
da Portimão Urbis, nomeadamente
no que toca ao seu envolvimento,
com a empresa Pictures Portugal,
no fracassado projecto da Cidade do
Cinema. Luís Carito e Jorge Campos
faziam parte, à data dos factos (2011),
do seu conselho de administração.
Na mira dos investigadores têm
estado vários contratos de consul-
toria e de formação profi ssional ce-
lebrados por ajuste directo, no valor
de centenas de milhares de euros,
entre a Portimão Urbis e empresas
dos sócios da Pictures Portugal e da
companheira de Luís Carito.
Luís Carito, ex-vice da Câmara de Portimão, está sob prisão domiciliária desde Julho do ano passado
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País: Portugal
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Âmbito: Informação Geral
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Faz agora seis anos, um depu-
tado do PSD reuniu-se, a seu
pedido, com o presidente da
Administração Regional de
Saúde do Norte (ARSN). O
motivo do encontro não se
prendia com as suas funções par-
lamentares, nem com o funciona-
mento do Serviço Nacional de Saúde
(SNS) na região. Tratava-se de fazer
o ponto de situação do processo de
instalação de um hospital privado.
Mas esse também não foi o tema
central da conversa. O deputado tra-
tou, sobretudo, de denunciar um
alegado caso de corrupção que en-
volveria dois funcionários da ARSN.
Com ele encontrava-se alguém que,
em reuniões anteriores, apresentara
como seu amigo e que era o rosto
da empresa proprietária do hospital
que esperava licença para abrir.
Surpreendentemente, esse ami-
go era um dos alegados corrupto-
res dos funcionários denunciados.
E o deputado queixava-se de que o
amigo passara a ser prejudicado pe-
los corruptos, porque deixara de os
corromper dois anos antes.
A aparente incongruência da ini-
ciativa podia, porém, ter uma expli-
cação e um objectivo estratégico:
estreitar laços com a direcção da
ARSN, através da denúncia, e faci-
litar o licenciamento do hospital,
que acabara de ser formalmente
requerido.
Os nomesO amigo do deputado chama-se Joa-
quim Ribeiro Teixeira e era – e con-
tinua a ser – o administrador único
da empresa proprietária do Hospital
de S. Martinho (HSM), em Valongo,
perto do Porto. Devido aos factos
denunciados ao presidente da ARSN
foi ele próprio pronunciado por cor-
rupção activa este Verão, por um juiz
de instrução criminal, aguardando a
marcação do julgamento, conforme
o PÚBLICO noticiou em Agosto.
O deputado chama-se Agosti-
nho Branquinho e é, desde Julho,
secretário de Estado da Segurança
Social.
SAÚDE
Secretário de Estado fez lobbying durante dois anos para conseguir abrir hospital privadoO secretário de Estado da Segurança Social, Agostinho Branquinho, quando era deputado, foi uma peça chave no licenciamento de um hospital privado em que uma denúncia de corrupção foi usada como instrumento de pressão
José António CerejoO HSM pertence a uma sociedade
anónima – a PMV, cujos donos são
desconhecidos – e foi ofi cialmente
inaugurado em Maio de 2008.
Logo após a reunião com o então
presidente da ARSN, o médico Ma-
ciel Barbosa, Agostinho Branqui-
nho desenvolveu uma fortíssima
campanha de promoção do futuro
hospital através das televisões e dos
jornais. Falando em nome da PMV,
aproveitou sempre para se queixar
da demora do Ministério da Saúde
na emissão da licença do HSM, em-
bora a mesma tivesse sido requerida
apenas duas semanas antes.
Nessas intervenções apresentou-
se invariavelmente como consul-
tor da empresa. Mas essa activida-
de privada, ao contrário de outras
que então exercia, nunca foi de-
clarada no registo de interesses da
Assembleia da República, nem no
Tribunal Constitucional, como a lei
impunha.
Num texto escrito em que respon-
deu sumariamente a uma pequena
parte das perguntas que o PÚBLICO
lhe dirigiu, Branquinho afi rma que
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País: Portugal
Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
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ponsável político ou da própria ARS,
poder estar presente numa cerimó-
nia de inauguração [do HSM] numa
data a agendar que fi que próxima do
fi m do ano”.
A denúnciaMeses depois, a 22 de Janeiro de
2008, Maciel Barbosa recebe Bran-
quinho e Teixeira para falarem do
licenciamento do HSM e de outros
problemas da PMV, mas a conversa
centra-se na denúncia dos dois fun-
cionários da ARSN. Alegadamente,
os denunciados prestavam serviços
remunerados a empresas privadas
da área da saúde, utilizando infor-
mação privilegiada e agilizando ou
retendo os processos, conforme os
interesses de quem lhes pagava.
Branquinho exibiu mesmo alguns
documentos, que, supostamente,
provavam que o seu cliente e as suas
empresas estavam a ser prejudica-
dos por aqueles funcionários.
Na documentação consultada
pelo PÚBLICO na ARSN não é claro
que os denunciantes tenham então
revelado que o próprio Teixeira lhes
pagara durante vários anos, mas Ma-
ciel Barbosa disse ao PÚBLICO que
sim. “O senhor Teixeira disse que se
cansou do negócio e que se sentia
com medo de révanches”, recordou
o médico no mês passado.
Depois de ouvir o que ouviu, o
presidente da ARSN ordenou de
imediato a abertura de um pro-
cesso de averiguações, através de
um despacho em que não refere a
presença do deputado na reunião.
E logo no fi m de Março participou
as conclusões dos seus auditores à
Polícia Judiciária.
No primeiro encontro com Joa-
quim Teixeira e a sua secretária, os
auditores da ARSN fi caram a conhe-
cer os pormenores. O empresário
explicou que pagara durante vários
anos os serviços dos denunciados
com “honorários mensais e bens
materiais”, como um automóvel e
telemóveis. Em 2006, afi rmou, pu-
sera fi m a essa situação, por achar
que “não era saudável manter qual-
quer ligação às pessoas em causa”
– devido ao facto de elas estarem a
ser investigadas pelo Ministério Pú-
blico, a propósito das suas relações
com outras empresas de serviços
médicos.
Na reunião seguinte, nas instala-
ções do HSM, o empresário, depois
de lhe terem sido dadas a ler as de-
clarações feitas no primeiro encon-
tro, confi rmou o que estava escrito
no auto. No entanto, lê-se na acta
redigida pelos auditores, “viu-se no
dever de deixar à consideração do
dr. Agostinho Branquinho, deputado
na Assembleia da República, a de-
sempenhar funções de assessoria no
HSM”, se devia assiná-lo ou não.
“Joaquim Teixeira solicitou licen-
ça para dar a conhecer o conteúdo
do auto de declarações ao dr. Agos-
tino Branquinho, na sala ao lado da
nossa reunião, uma vez que estaria
em causa a imagem política do mes-
mo, que era necessário preservar”,
prossegue o documento.
Quem manda?De acordo com os auditores, “após
uma rápida leitura”, Branquinho
“tomou a iniciativa de integrar a
reunião, vindo esclarecer quais os
motivos que o levaram a não con-
cordar com o facto de os declaran-
tes Joaquim Ribeiro Teixeira e Zaida
Cunha [a sua secretária] assinarem
os autos de declarações”.
A acta relata depois que, segundo
o deputado, “fi cou acordado” com
o presidente da ARSN, na reunião
em que foi feita a denúncia, que Jo-
aquim Teixeira colaboraria na ob-
tenção da verdade. “No entanto, fri-
sou [fi cou também acordado] que as
[suas] declarações não passariam
para além do fornecimento de pis-
tas orais, de forma a orientar-nos na
investigação.”
Neste contexto, acrescenta o do-
cumento, “o dr. Agostinho Branqui-
nho decidiu que os declarantes em
questão não assinariam os aludidos
autos (...) porque poderiam com-
prometer, em termos judiciais, as
pessoas que os assinassem e as ins-
Hospital de S. Martinho com os três andares a mais, licenciados devido a um centro de noite que nunca existiu
A denúncia de um caso de corrupção, numa reunião onde estiveram Agostinho Branquinho e o presidente da ARS Norte, precedeu uma campanha para acelerar a aprovação do Hospital de S. Martinho, em Valongo
começou a trabalhar no lançamento
do HSM durante o Verão de 2006,
como consultor de Joaquim Teixeira
e da PMV – empresa que já explorava
duas policlínicas na região.
Nessa altura, o pedido de licen-
ciamento do hospital estava mui-
to longe ser formalizado, algo que
só veio a acontecer a 17 Janeiro de
2008, precisamente cinco dias an-
tes da reunião em que o deputado e
o empresário denunciaram os dois
funcionários da ARSN.
O consultorApesar disso, quando se iniciou a
colaboração de Branquinho com
Teixeira, de quem era amigo desde a
época em que ambos foram funcio-
nários do Hospital de Gaia, nos anos
de 1970, o então deputado tinha
muito trabalho pela frente. Além
de preparar o “plano estratégico”
do hospital, tinha de desenvolver
o que ele próprio defi ne como “um
programa de acções para promoção
e desenvolvimento institucional” da
futura unidade hospitalar.
Além disso, o edifício do HSM es-
tava em construção, mas as obras
estavam a ser feitas à margem da
lei, ainda que com o beneplácito da
Câmara de Valongo (ver pág. 8). E
era preciso resolver problemas re-
lacionados com as convenções com
o SNS e com as licenças de algumas
actividades clínicas que começaram
a ser desenvolvidas logo em 2006,
sem autorização da ARSN, nos dois
primeiros pisos do prédio.
Ainda nesse ano, Teixeira e Bran-
quinho reúnem-se com o presidente
da ARSN e os contactos prosseguem
em 2007. Em Setembro, Teixeira –
que se recusou a falar ao PÚBLICO
– escreve a Maciel Barbosa manifes-
tando o desejo de “alargar a parce-
ria” da PMV com o SNS. E transmite-
lhe um outro desejo: abrir logo em
Dezembro a totalidade do hospital
– já com a zona de internamento e
o bloco operatórios nos pisos supe-
riores –, “caso seja possível obter a
autorização das entidades compe-
tentes”. Nessa altura, contudo, não
só não tinha sido ainda requerido o
licenciamento do hospital junto do
Ministério da Saúde, como o projecto
das obras dos pisos superiores, ape-
sar de estas estarem a chegar ao fi m,
nem sequer tinha sido entregue na
Câmara de Valongo.
Na carta de Setembro de 2007,
Teixeira pede também uma audiên-
cia para fazer o ponto de situação
dos projectos da PMV e para “acer-
tar a possibilidade de o Governo [de
José Sócrates], através de um res-
ADRIANO MIRANDA
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tituições que representam, fi cando
com uma cópia do auto declarações
preliminares do dr. Joaquim Ribeiro
Teixeira”.
Face aos esclarecimentos dados
pelos auditores sobre a natureza dos
autos, Branquinho “acordou pensar
sobre o assunto” e sobre “a even-
tualidade de elaboração de uma
declaração comprovativa” de que
os denunciados tinham desempe-
nhado funções “nas entidades que
representa, conforme descrito nos
autos”.
Na mesma reunião, os auditores
confrontaram Joaquim Teixeira com
vários documentos, concluindo que
a intervenção daqueles funcionários
colocara as suas empresas “numa
posição privilegiada, em termos de
concorrência com as demais”. Pas-
sada uma semana, a secretária do
empresário telefonou aos auditores
informando que, “após conversa”
com Agostinho Branquinho, fora de-
cidido “não emitir qualquer declara-
ção escrita” pelos motivos aponta-
dos pelo deputado na reunião.
Dois meses depois, a PJ começou
a investigar o caso. Joaquim Teixeira
acabou por colaborar, entregando
mesmo a prova dos pagamentos fei-
tos aos denunciados.
Mas não conseguiu convencer
o Ministério Público nem o juiz de
instrução de que tais pagamentos
retribuíam apenas serviços conta-
bilísticos – conforme alegou o seu
advogado, Francisco Pimentel. Tal
como os denunciados, que entretan-
to foram suspensos e demitidos das
suas funções (um dos casos ainda es-
tá pendente em tribunal), Joaquim
Teixeira foi este Verão, passados mais
de cinco anos da denúncia, pronun-
ciado por corrupção activa.
Lobbyista ou sócio?O que parece claro é que Branqui-
nho e Teixeira optaram por denun-
ciar os funcionários sem contar com
este desfecho, numa altura em que
precisavam de ter boas relações com
a direcção da ARSN. Maciel Barbosa
não hesita em afi rmar que o papel
de Branquinho neste caso não foi o
de um vulgar lobbyista que se quei-
xa das difi culdades do seu cliente
junto da administração pública.
“Fiquei sempre com a ideia de
que o dr. Agostinho Branquinho ti-
nha uma quota ou um qualquer in-
teresse no hospital, qual não sei. Ele
não era apenas um lobbyista, um de-
putado que queria meter uma cunha
para um amigo.” O então responsá-
vel dos serviços de saúde na região
garante, contudo, que “não foi por o
dr. Branquinho lá ter interesses que
as regras não foram cumpridas com
rigor e parcimónia”.
E acrescenta: “O que eu lhe dizia
era que os processos entram nos ser-
viços e que a ordem de entrada é
rigorosamente respeitada. Ninguém
passa à frente de ninguém.”
Os arquivos da ARSN sugerem de
facto que a estratégia do deputado
não terá sido muito bem sucedida.
Não só não surtiram efeito os pedi-
dos para que o HSM fosse inaugu-
rado antes do fi m de 2007, como a
cerimónia teve de esperar pelo mês
de Maio do ano seguinte.
A ideia de abrir ainda em 2007
– que chegou a ser referida no con-
vite dirigido por Teixeira ao então
ministro da Saúde Correia de Cam-
pos para presidir à inauguração - as-
sentava no pressuposto de que tudo
era possível: até abrir o hospital sem
ele estar licenciado. Como isso não
aconteceu, Branquinho recorreu à
comunicação social para facilitar a
emissão da licença do ministério,
dizendo repetidamente que ela es-
tava iminente, embora tivesse sido
requerida duas semanas antes.
Ao que tudo indica, não o fora
mais cedo porque a PMV ainda não
obtivera a licença de utilização do
edifício do hospital. Os documen-
tos entregues com o requerimento
dirigido ao director-geral de Saúde
no início de Janeiro de 2008 eviden-
ciam que Câmara de Valongo auto-
rizou a utilização do edifício apenas
a 21 de Dezembro do ano anterior.
E fê-lo 11 dias depois de ter emiti-
do a licença para a construção dos
seus três pisos superiores, que aliás
já estavam completamente prontos
havia vários meses (ver pág. 8).
Consultoria gratuita?Uma vez requerida a autorização
de abertura do hospital, os factos
confi rmam que a ajuda do deputado
continuou a não ter efeitos imedia-
tos, embora os problemas surgidos
se tenham resolvido rapidamente.
Em Fevereiro, a Administração
Central do Sistema de Saúde (ACSS)
procedeu à vistoria das instalações
em Valongo, concluindo que as mes-
mas não reuniam “as condições mí-
nimas exigíveis para a emissão de
parecer favorável” ao licenciamen-
to. O bloco operatório, por exemplo,
apresentava-se “sem condições” pa-
ra ser usado, designadamente por-
que nenhuma das três salas de ope-
ração possuía a “dimensão mínima
regulamentar”.
No início de Março, Maciel Barbo-
sa reuniu-se com Agostinho Bran-
quinho, Joaquim Teixeira e repre-
sentantes da ACSS para analisar a
situação. Nas semanas seguintes
foram feitas algumas correcções re-
comendadas pela ACSS. Em meados
de Abril foi feita uma nova vistoria,
agora na presença de Branquinho e
Teixeira. Desta vez, os técnicos do
Ministério da Saúde concluíram que
o hospital já reunia as “condições
essenciais” para funcionar com 47
camas de internamento, bloco ope-
ratório e consultas externas – em-
bora com algumas condicionantes.
A 28 de Abril, o conselho directivo
da ARSN aprovou a emissão de uma
“autorização provisória de funcio-
namento”, fi cando a licença defi -
nitiva dependente da observância
das condicionantes estabelecidas.
No fi nal do mês seguinte, porém,
a ACSS deu como cumpridas essas
condicionantes e a ARSN aprovou a
licença defi nitiva.
Nas suas respostas ao PÚBLICO,
Agostinho Branquinho afi rma que
desenvolveu “uma actividade de
consultadoria para a PMV”, a qual
cessou “no segundo semestre de
2008 com a inauguração formal das
instalações”. Quanto ao facto de não
ter declarado essa actividade à AR e
ao TC escreveu apenas: “Cumpri, no
plano ético e legal, todas as obriga-
ções a que estava obrigado.”
Questionado sobre se tinha tra-
balhado gratuitamente para a PMV
durante dois anos – uma vez que
na declaração de rendimentos de
2008 que entregou ao Tribunal
Constitucional apenas fez constar
o seu vencimento como deputado
(55.239 euros) –, o actual secretário
de Estado respondeu que a PMV lhe
pagou adiantado: “Essa minha cola-
boração obedeceu a um orçamento
apresentado e foi liquidada em qua-
tro prestações em 2006.”
Denúncia ou arma?Para o advogado dos funcionários
da ARSN que foram denunciados
por Branquinho e Teixeira, o ob-
jectivo de tal denúncia não oferece
muitas dúvidas. “Tudo parece ligar-
se ao licenciamento do Hospital de
S. Martinho”, afi rma Pedro Ribeiro
no pedido de abertura de instrução
do processo que entregou no tribu-
nal em 2012.
“A referida denúncia parece ter
servido apenas como ‘arma’ no jogo
do processo de licenciamento” do
HSM e foi feita numa reunião reali-
zada “a pedido” do então deputado,
lê-se no documento. Mais concreta-
mente, o advogado escreve que esse
processo indicia “uma envolvente
de pressão política e de eventual
tráfi co de infl uências”, sustentan-
do que “é crucial” apurar quais os
interesses que Branquinho tem ou
tinha naquele hospital.
“A verdade”, acrescenta, é que
“toda a gente tentou tornar invisí-
vel” a sua intervenção neste caso, a
começar por ele próprio. O advoga-
do refere também que foi o deputa-
do “quem sempre e mais proxima-
mente tratou [com a ARSN], pessoal
e telefonicamente” do processo de
licenciamento do HSM.
Por julgar “essencial” o esclareci-
mento do seu papel, o mandatário
dos dois arguidos requereu ao tri-
bunal a inquirição do próprio Bran-
quinho e de Maciel Barbosa – que
nunca foram ouvidos durante a in-
vestigação –, bem como a junção aos
autos do processo de licenciamento
do HSM. O juiz de instrução, porém,
ignorou este pedido, pronunciando
em Julho, sem mais diligências, os
dois ex-funcionários por corrupção
passiva e Joaquim Teixeira por cor-
rupção activa.
SAÚDE
ADRIANO MIRANDA
Maciel Barbosa, presidente da ARSN, disse ao PÚBLICO que o director do hospital tinha medo de révanches dos denunciados
Funcionários denunciados por corrupção usariam informação privilegiada para agilizar ou atrasar processos. Advogado diz que a denúncia visou lienciamento do hospital
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Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
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T rês dos sete pisos do Hospital
de S. Martinho (HSM) foram
construídos ilegalmente,
violando a licença emitida
pela Câmara de Valongo
em 2004, que apenas
permitia a construção dos quatro
primeiros. A legalização do edifício
e a redução para metade do valor
das taxas devidas à autarquia foram
conseguidas no fi nal de 2007. Motivo:
a declaração do interesse público
municipal do hospital, com base em
pressupostos que a empresa de que
Agostinho Branquinho era consultor
nunca cumpriu.
Para ultrapassar as restrições
impostas pelo Plano Director Mu-
nicipal (PDM), que não autorizava
a construção de mais do que qua-
tro pisos naquele local da freguesia
de São Martinho do Campo, a PMV,
empresa proprietária do HSM, re-
quereu à câmara, ainda em 2004,
a declaração do interesse público
municipal do hospital que já estava
a construir com sete pisos.
A fundamentação do requerimen-
to residia no destino a dar aos pisos
superiores: a instalação de um cen-
tro de noite para idosos carencia-
dos, que seria gerido pela paróquia
de São Martinho do Campo, con-
forme protocolo alegadamente já
celebrado. A câmara, que até dois
anos antes tinha tido como vice-
presidente o actual porta-voz e co-
ordenador nacional do PSD, Marco
António Costa, aprovou o pedido
em Maio de 2005.
O Centro de Noite para idosos, po-
rém, nunca foi criado. E o pároco de
São Martinho do Campo garantiu ao
PÚBLICO que nunca assinou qual-
quer protocolo com os promotores
do hospital.
A licença de obras inicial, emitida
em Janeiro de 2004, previa a adap-
tação de um antigo edifício indus-
trial, com quatro pisos, por forma
a poder receber uma policlínica no
rés-do-chão e no primeiro andar. Os
dois pisos de cima fi cariam em open
space para escritórios ou ampliação
da policlínica. O imóvel acabou por
ser integralmente demolido e a nova
construção, em vez dos quatro pisos
que tinham sido autorizados, fi cou
praticamente pronta em Outubro de
2006 com os sete que hoje possui.
Câmara fechou os olhosOs dirigentes dos serviços de Urba-
nismo e vereadores da Câmara de
Valongo é que não deram por nada.
A tal ponto que no dia 9 de Novem-
bro os engenheiros e outros técni-
cos que fi zeram a vistoria à obra, na
sequência do pedido de licença de
utilização apresentado pela PMV na
véspera, concluíram que estava tudo
conforme com as normas legais e os
José António Cerejo
Obras feitas sem licença foram legalizadasdevido a centro de noite que nunca existiu
O licenciamento municipal do Hospital de S. Martinho só previa quatro pisos. Declaração de interesse público permitiu reduzir taxas para metade e aumentar o número de pisos do edifício
RAQUEL ESPERANÇA
Agostinho Branquinho era consultor da PMV e colaborou no lançamento do hospital
projectos aprovados. Além de não
repararem que o imóvel tinha três
pisos que não estavam no projecto,
nem sequer lhes chamou a atenção
o facto de ele ter o dobro da altura
dos prédios vizinhos.
Nesse mesmo dia, contudo, um
outro técnico camarário que não
participara na vistoria subscreveu
uma informação relativa ao pedido
da licença, frisando que até essa da-
ta não tinham sido cumpridas vá-
rias condicionantes impostas pelo
município. Apesar disso, e omitindo
tal facto, alguém que não assinou
o que escreveu propôs no mesmo
dia, logo por baixo da informação
citada, a concessão da licença, in-
vocando as conclusões dos peritos
que tinham acabado de vistoriar o
edifício. Antes do fi nal desse dia, o
director do serviço concordou com
a proposta, sendo a licença passada
no dia seguinte.
Antecipando-se a esta corrida
contra-relógio, o administrador da
PMV, Joaquim Teixeira, tinha dado
dois anos antes o primeiro passo pa-
ra que os sete pisos então em cons-
trução viessem a ser susceptíveis de
legalização.
Em Setembro de 2004 escreveu
uma carta ao presidente da autar-
quia, o social-democrata Fernando
Melo, requerendo a declaração do
interesse público municipal do imó-
vel que estava em obras. Conforme
o PDM admite, a título excepcional,
essa declaração permitir-lhe-ia au-
mentar o índice de construção qua-
se para o dobro.
A justifi car o pedido, Teixeira de-
clarou que pretendia criar um cen-
tro de noite nas instalações da futu-
ra policlínica – era uma policlínica
e não um hospital que o projecto
aprovado previa. Este centro foi de-
fi nido pelo empresário como “um
serviço social e comunitário” que
seria prestado “à população idosa
mais desprotegida e socialmente
desfavorecida” do concelho.
O futuro serviço, explicou na
carta, asseguraria “acolhimento e
alojamento durante a noite, propor-
cionando condições que permitam
a higiene pessoal e assegurem ceia
e o pequeno-almoço, em regra para
cerca de 20 pessoas”. Além disso,
garantiu, seria gerido pelo Centro
Paroquial e Social de São Martinho
do Campo, nos termos de uma par-
ceria “já estabelecida”.
O interesse públicoEm resposta a um pedido de pare-
cer de Fernando Melo sobre o as-
sunto, a vereadora Trindade Vale
– que substituíra Marco António Cos-
ta quando este foi ocupar o lugar
de deputado – remeteu o assunto
para apreciação no Departamento
de Acção Social. Mas no despacho
que então proferiu declarou, des-
de logo, que “esta policlínica será
Fundamentação para o aumento de pisos do edifício referia protocolo com a paróquia de São Martinho do Campo, que nunca foi assinado, garantiu o pároco ao PÚBLICO
SAÚDE
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SAÚDE
Ligação de Branquinho ao sector da saúde vem de longe
Trinta anos antes de assumir as funções de consultor da PMV (Hospital de S. Martinho), o actual secretário
de Estado da Segurança Social, Agostinho Branquinho, já tinha ligações ao universo da saúde. Segundo disse ao PÚBLICO, trabalhou no Hospital de Gaia (como funcionário administrativo) entre 1976 e 1980. Foi aí que conheceu, como colega, Joaquim Teixeira, actual administrador único da PMV.
Agostinho Branquinho garante que até se tornar seu consultor, em 2006, nunca teve com ele “qualquer relação comercial ou empresarial”. No final do ano seguinte, Joaquim Teixeira tornou-se administrador único de uma empresa de publicidade, a NTM, que passou a funcionar nas instalações da PMV. Branquinho tinha sido o seu único proprietário até 2003 e manteve-se ligado a ela até à sua falência em 2012.
Ainda a propósito destas duas empresas, registe-se que o cargo de “fiscal único” de ambas passou a ser desempenhado em 2007 por Virgílio Macedo, actual deputado na Assembleia da República e líder do PSD no distrito do Porto. Nessa altura, e
até entrar para o actual Governo, o presidente da assembleia geral da NTM era o advogado José Pedro Aguiar-Branco, agora ministro da Defesa.
Pouco mais de uma década depois de ter deixado o Hospital de Gaia, Branquinho, que se licenciara em História, em 1981, voltou ao sector da saúde, em 1993, mas já como administrador não executivo do Hospital da Prelada. A gestão desta unidade de saúde pública tinha sido entregue pelo primeiro Governo de Cavaco Silva à Misericórdia do Porto cinco anos antes. Nesse mesmo período, 1993-1995, foi também administrador não executivo e secretário-geral da Misericórdia do Porto.
O interesse do ex-deputado pelo negócio da saúde aparece depois documentado no Diário da República, que dá conta, em Outubro de 2000, da criação da Nortevital, uma empresa que abriu várias clínicas dentárias na zona do Porto. Os sócios fundadores foram Agostinho Branquinho, que ficou como gerente, Rui Rio (ex-presidente da Câmara do Porto), José Pedro Aguiar-Branco e Diogo Gandra. A sociedade desfez-se ao fim de três anos, com Diogo Gandra
e outros sócios a comprarem as quotas de Branquinho, Rio e Aguiar-Branco.
O regresso de Branquinho à saúde, em termos profissionais, acontece em 2006, ano em que, segundo ele, começou a trabalhar como consultor da PMV – ao mesmo tempo que cumpria, desde 2005, o seu segundo mandato de deputado.
Após o seu abandono da Assembleia da República, em 2010, para ocupar o lugar de administrador da empresa Ongoing no Brasil, Branquinho voltou a Portugal em 2012 e foi nomeado administrador da Misericórdia do Porto. A sua passagem por este lugar executivo durou apenas oito meses e em Julho do ano passado tomou posse como secretário de Estado da Segurança Social, substituindo Marco António Costa.
Nessa altura soube-se que o Governo tinha decidido entregar, sem concurso público, a gestão do Centro de Reabilitação do Norte à Misericórdia do Porto (foto). A nova unidade de saúde de Vila Nova de Gaia tinha custado ao Estado 32 milhões e estava pronta para abrir desde Julho de 2012.
NEL
SON
GA
RRID
O
uma óptima resposta” aos “casos
urgentes”. O parecer depois emitido
pela Acção Social considera que o
Centro de Noite prometido “resulta
do estabelecimento de uma parceria
com o Centro Paroquial e Social de
São Martinho do Campo” e “pode-
rá ser uma resposta aos problemas
concelhios” no apoio a idosos. E foi
com base nele que Fernando Me-
lo fez aprovar, em Maio de 2005,
com as abstenções dos vereadores
socialistas, a declaração de utilida-
de pública municipal do empreen-
dimento.
No termo do ano seguinte, o es-
sencial das obras fi cou concluído.
Não com os quatro pisos aprovados,
mas com sete, sendo emitida como
já se viu a respectiva licença de uti-
lização. Graças a ela foi transferida
para os dois pisos inferiores, ainda
que sem autorização da Adminis-
tração Regional de Saúde, uma das
policlínicas que a empresa tinha a
funcionar noutro local.
A declaração de utilidade públi-
ca municipal acabou por servir, já
no fi m de Setembro de 2007, para
fundamentar o pedido de licencia-
mento das “obras de ampliação” de
quatro para sete pisos – na realidade
já feitas sem licença.
O projecto de arquitectura da
obra já concluído – contemplava
pela primeira vez um hospital e foi
apresentado como um “projecto de
ampliação” – não previa quaisquer
espaços para o Centro de Noite e foi
aprovado a 9 de Outubro. Justifi ca-
ção: o artigo do PDM que permite a
quase duplicação do índice de cons-
trução em obras declaradas de utili-
dade pública municipal.
O padre e o deputadoNo início de Novembro, Joaquim
Teixeira, mais uma vez com base
na utilidade pública da obra, soli-
citou a redução das taxas devidas
à câmara. Deferido o pedido, a em-
presa conseguiu pagar 36.855 euros
em vez de 73.711.
Durante esse mês foram ainda en-
tregues os projectos de especialida-
de. E o alvará de obras de ampliação,
sem o qual os três pisos superiores
não podiam ter sido construídos, foi
emitido por Fernando Melo a 10 de
Dezembro, com um prazo de con-
clusão até 11 de Junho de 2008.
De acordo com o que o director
técnico da obra fez constar no regis-
to arquivado na autarquia, os traba-
lhos começaran no dia 10 e termina-
ram a 19. Nesse dia, a PMV requereu
a licença de utilização e a 21 de De-
zembro, foi efectuada a vistoria. Os
peritos camarários concluíram que
estavam reunidas as condições para
a emissão da licença. Ainda a 21, a
proposta recebeu a concordância
do director de departamento. Fi-
nalmente, no termo de mais um
contra-relógio e sem esperar pelo
dia seguinte, o presidente da câmara
assinou a licença sem a qual a PMV
não podia requerer ao Ministério da
Saúde o licenciamento da actividade
hospitalar.
O actual presidente da Câmara de
Valongo, o socialista José Manuel Ri-
beiro, eleito em Setembro, não se
quis pronunciar sobre os procedi-
mentos camarários neste caso por
não se recordar dele. Mas afi rmou
que “nessa altura era normal utilizar
todos os artifícios para contornar os
índices máximos do PDM”.
No fi nal de Maio de 2008 o hos-
pital foi ofi cialmente inaugurado. O
Centro de Noite, porém, tinha caído
no esquecimento.
Contactado pelo PÚBLICO, o pá-
roco e responsável pelo Centro Pa-
roquial e Social de São Martinho do
Campo, José Macedo, afi rmou que
a criação dessa valência “foi aven-
tada, mas não se concretizou”. De
acordo com o sacerdote, houve ape-
nas “conversas” entre ele e Joaquim
Teixeira, sem que alguma vez tenha
sido assinado qualquer acordo.
“O meu interlocutor era o senhor
Teixeira, mas depois entraram ou-
tras pessoas, nomeadamente o sr.
deputado Branquinho, e eu colo-
quei-me à margem, porque as coi-
sas tomaram logo outra orientação”,
afi rma o pároco. Sem esclarecer que
orientação foi essa e sem saber pre-
cisar a data em que o então deputa-
do entrou no processo, José Macedo
atribui-lhe abertamente o abandono
da ideia do Centro de Noite.
Confrontado com o facto de o
nome do centro paroquial ter sido
usado para conseguir a quase du-
plicação da área de construção do
hospital e a redução das taxas para
metade, o pároco respondeu: “Es-
tou a ouvir falar nisso pela primeira
vez.” Agostinho Branquinho não res-
pondeu às perguntas do PÚBLICO
sobre o licenciamento da obra.
Quando o hospital foi inaugurado, em Maio de 2008, o Centro de Noite tinha caído no esquecimento
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Agostinho Branquinho, actual secretário de Estado da Segurança Social, foi a peça chave no lançamento de um hospital privado em Valongo p4 a 10
Deputado fez lobbying para abrir hospital privado
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