r UNIFESP BIBUOTECACMiPUS GUA,RijLHOS LCY"...AillAÇÃO .-J 1 '-U'll,;;L;L TOMBO qq-=Jq PR'1:r=i::.tJ: = PREÇO I) 1 !>ATA DE ENTRI>DA.2,IOI/D'- TRaMAS ROBBES Leviatã OU MATÉRIA, FORMA E PODER DE UMA REPÚBLICA ECLESIÁSTICA E CIVIL Organizado por RICHARD TUCK Professor de Governo, Harvard University Edição brasileira supervisionada por EUNICE OSTRENSKY Tradução JOÃO PAULO MONTEIRO MARIA BEATRIZ NIZZA DA SILVA Tradução do aparelho critico CLAUDIA BERLINER Revisão da tradução EUNICE OSTRENSKY Martins Fontes São Paulo 2003 I , UNIFESP I BBmECA CMIfUS GlJAAUIj(JS
1. r UNIFESPBIBUOTECACMiPUS GUA,RijLHOSLCY"...AillAO .-J 1
-Ull,;;L;LTOMBO qq-=Jq TRaMAS ROBBESPR1:r=i::.tJ: = PREO I) 1
!>ATA DE ENTRI>DA.2,IOI/D- Leviat OU MATRIA, FORMA E PODER DE
UMA REPBLICA ECLESISTICA E CIVIL Organizado por RICHARD TUCK
Professor de Governo, Harvard University Edio brasileira
supervisionada por EUNICE OSTRENSKY Traduo JOO PAULO MONTEIRO MARIA
BEATRIZ NIZZA DA SILVA Traduo do aparelho critico CLAUDIA BERLINER
Reviso da traduo EUNICE OSTRENSKY Martins Fontes So Paulo 2003 ,
UNIFESP I I BBmECA CMIfUS GlJAAUIj(JS
2. .... Ttulo do original ingls: LEVIATHAN Esta traduo
baseia-se na edio de u,viathan publicado na coleo Cambridge Texts
in the History of Political Thought, por Press Syndicate of the
University of Cambridge. Copyright @ Cambridge University Press,
1996, para a traduo e a edio. Copyright @ 2003, Livraria Martins
Fontes Editora Ltda., So Paulo, para a presente edio. l edio
novembro de 2003 Traduo JOO PAULO MONTEIRO MARIA BEATRIZ NIZZA DA
SILVA CLAUDIA BERUNER Reviso da traduo Eunice Ostrensky ndice
Acompanhamento editorial Luzia Aparecida dos Santos Revises grficas
Lilian Jenkino Agradecimentos VII Leticia Braun Dinarte Zorzanelli
da Introduo IX Silva Produo grfica Geraldo Alves PagiuaolFotolilos
Studio 3 Nota sobre o texto LV Desenvolvimento Editorial Principais
fatos da vida de Hobbes LXIX Leituras adicionais LXXIII Notas
biogrficas e referncias LXXIX Dados lnternacionais de Catalogao na
Puhlicao (ClP) Leviat 1 (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Hobbes, Thomas, 1588-1679. Ao meu mui estimado amigo 5 Leviat 1
Thomas Hobbes ; organizado por Richard Tuck ; traduo Joo ndice dos
captulos Introduo 7 Paulo Monteiro, Maria Beatriz Nizza da Silva,
Claudia Berliner ; reviso da traduo Eunice Ostrensky. - Ed.
brasileira supervisionada por Eunice Ostrensky. O texto: Captulos
l-XLVII 11 - So Paulo: Marlins Fontes, 2003. - (Clssicos Cambridge
de filosofia poltica) Reviso e concluso 15 582 Ttulo original:
u,viathan Bibliografia. ISBN 85-336-1930-8 1. ndice remissivo de
assuntos 2, 593 1. O Estado 2. Filosofia inglesa 3. Hobbes, Thomas,
1588-1679 4. Poder ndice de nomes prprios 609 (Cincias sociais) 5.
Poltica I. Tuck, Richard. 11. Ostrensky, Eunice. m. Ttulo. IV.
Srie. 03-6386 CDD-320.1 ndices para catlogo sistemtico: 1. Estado:
Poder poltico 320.1 2. Poder poltico do Estado 320.1Todos os
direitos desta edio para o Brasil reservados Livraria Martins
FontesEditora Lida, Rua Conselheiro Ramalho, 3301340 01325-000 So
Paulo SP Brasil Tel. (11) 3241.3677 Fax (11) 3105.6867 e-mail:
[email protected] http://www.martinsfontes.com.br
3. Agradecimentos Como expliquei na nota sobre o texto, esta
edio foi extrada de duas fontes: uma uma cpia especial do
Leviatexistente na Biblioteca da Cambridge University (onde faz
parte da Royal Library adquirida de John Moore, bispo de Ely, e
doada universidade por Jorge I em 1715), e a outra o manuscrito de
Leviat da British Library. Gostaria de agradecer aos bibliotecrios
das duas instituies por sua ajuda e pela autorizao para reproduzir
material sob sua responsabilidade; tenho uma dvida particular com
BrianJenkins, bibliotecrio assistente, encarregado da Sala de
Livros Raros da Biblioteca da Universidade. Gostaria tambm de
agradecer a David McKitterick, bibliotecrio do Trinity College, por
sua ajuda e orientao no que se refere biblioteca de Moore; a Peter
Jones, bibliotecrio do Kings College, por me deixar consultar a
fantstica coleo de obras de Hobbes da faculdade (legada por lorde
Keynes) e por me ajudar de outras maneiras tambm; e a Peter Day,
encarregado das Obras de Arte em Chatsworth, que me ajudou a
descobrir o curioso fato de que aparentemente no havia nenhuma cpia
de Leviat em Hardwick ou Chatsworth at o sculo XIX. Outros
acadmicos deram- me muitos conselhos, sobretudo Noel Malcolm,
Quentin Skinner, Maurice Goldsmith, Ian Harris (ver p. LXXIX) e
Lucien J aume. VII.
4. .... Introduo I Leviat de Hobbes sempre despertou fortes
sentimentos em seus leitores. Atualmente, considerado a obra-prima
do pensamento poltico ingls, e uma obra que, mais que qualquer
outra, definiu o carter da poltica moderna: de finais do sculo XVII
a principias do sculo XX, todos os grandes escritores de teoria
poltica tomaram esse texto como referncia. No entanto, quando ele
apareceu pela primeira vez nas livrarias da Inglaterra, em finais
de abril ou incios de maio de 1651, muitos de seus leitores
consideraram-no profundamente chocante e ofensivo, tanto por sua
descrio desapaixonada do poder poltico como por sua viso
extraordinariamente heterodoxa do papel da religio na sociedade
humana. Mesmo antigos admiradores de Hobbes e de seus escritos
filosficos consideraram o livro uma afronta; um dos velhos I Ver a
carta de Robert Payne para Gilbert Sheldon, de 6 de maio de 1651:
"Ox. me comunicou que o livro do Sr. Hobbes foi impresso e vem
vindo: ele o intitula Leviat. Boa parte de seu De Cive ali se
encontra: parece apoiar o atual governo, e recomenda que seu livro
seja lido nas universidades, apesar de todas as censuras que possa
sofrer. um flio e custa 8s.6d., mas ainda no o vi." [Anon],
"Illustrations of the State of the Church during the Great
Rebellion", The Theologian and Ecclesiastic 6 (1848), p. 223.
IX
5. ... Leviat Introduoconhecidos de Hobbes, o telogo anglicano
Henry Hammond, vezes" para Hobbes implorando-Ihe que moderasse suas
opinies,descreveu-o um pouco depois, naquele mesmo ano, como "uma
embora sem sucess03. Leviat tem quarenta e sete captulos e
nofarragem de atesmo cristo", descrio que (como veremos) estava
cinqenta, mas o projeto de Hobbes de maio de 1650 obviamente
semuito perto da verdade2. realizou, embora aquela traduo francesa
nunca tenha sido publicada, Esses velhos amigos estavam
particularmente zangados com o e talvez no tenha sido
completada.livro pois este lhes parecia um ato de traio. Haviam
conhecido Alis, o fato de Hobbes ter querido uma traduo nos
dizHobbes como defensor entusiasta da causa realista na guerra
civil que para ele o livro era to relevante para os distrbios
poltiinglesa entre rei e Parlamento - com efeito, encontrava-se
exilado em cos franceses da poca como para os da Inglaterra. Os
anos deParis desde 1640 devido ao seu apoio a essa causa, e Leviat
foi 1649-52 foram aqueles em que a "Fronda", a confusa revolta
contra oescrito na Frana. Quando o livro foi publicado, contudo,
parecia governo absolutista da Frana, estava no auge, e at Paris
fora tomadadefender a submisso nova repblica instituda aps a execuo
do pelos rebeldes no incio de 1649: no s os ingleses precisavam de
instruo quanto aos deveres dos sditos. No sabemos quanto temporei
em janeiro de 1649, e o abandono da Igreja Anglicana pela qual
Hobbes levou para escrever os trinta e sete captulos que j
estavammuitos dos realistas tinham lutado. O espanto de seus amigos
diante terminados por volta de maio de 1650 (aproximadamente 60% de
todadessa voltaface influenciou as reaes dos contemporneos de
Hobbes, a obra), mas, se os escreveu na mesma velocidade dos ltimos
deze afetou sua reputao at os dias de hoje. No entanto, algumas das
captulos,intenes de Hobbes ao escrever Leviat talvez tenham sido
mal deve ter comeado a compor o livro em princpios de 1649 data
que,interpretadas. vale notar, coincide com a poca em que o rei
Carlos estava sendo A primeira tarefa na tentativa de avaliar quais
eram essas condenado morte.intenes, e uma questo bsica a ser feita
diante de qualquer texto, verdade que existem muitas passagens do
Leviat que falam daindagar quando o livro foi escrito. Nossa
primeira informao sobre a guerra civil como ainda em andamento
(sobretudo uma na p. 381), ecomposio da obra que viria a se tornar
Leviat aparece numa carta que somente bem no fim (numa famosa
passagem do ltimo captulode maio de 1650. Nela, um daqueles antigos
amigos realstas escreveu sobre o novo regime eclesistico na
Inglaterra, e na Reviso ea Hobbes pedindo-lhe que traduzisse para o
ingls um de seus Concluso) Hobbes se expressa como se houvesse
novamente umprimeiros textos em latim sobre poltica, para que
pudesse nfluenciar a governo estvel na Inglaterra. J que se
convencionou datar o fim dacena poltica inglesa daquele momento.
Aparentemente, Hobbes guerra civil emrespondeu que "ele tinha outra
coisinha mo, que um tratado 1649, pode-se deduzir que Hobbes
escreveu boa parte do livro bempoltico em ingls, do qual j conclura
trinta e sete captulos (num antes da execuo. Houve quem tomasse
passagens semelhantes nototal pretendido de cinqenta), que vo sendo
traduzidos para o francs Leviat em latim de 1668 (ver abaixo), que
nem sempre so traduespor um erudito francs muito capaz medida que
os termina". Essa diretas do texto ingls, para dar a entender que a
verso latina baseia-"coisinha" viria a ser Leviat, e quando o amgo
tomou conhecimento se num esboo anterior verso inglesa, embora nada
justifique talde seu contedo escreveu "vras e vras idia4. 3 [Anon],
"illustrations of the State of the Church during the Great
Rebellion", The Theologian and Ecclesia.stic 6 (1848), pp. 172-3. ,
Por exemplo, num determinado ponto, o texto em latim fala "da
guerra que2 [Anon], "illustrations of the State of the Church
during the Great Rebellion", agora est sendo travada na
Inglaterra", ao passo que na verso inglesa The Theologian and
Ecc/esiastic 9 (1850), pp. 294-5. consta "the late troubles" (p.
170). (Levio1luzn, trad. e ed. F. Tricaud [Paris, 1971], x XI
6. ............... Leviat Introduo Tendemos a esquecer, no
entanto, que a execuo do rei e a 11 declarao da repblica na
Inglaterra no foram vistas pelos contemporneos como o fim da
guerra, pois ainda restava um forte A prxima indagao a fazer que
tipo de vida, tanto intelectual exrcito na Esccia que se opunha s
aes dos republicanos na como prtica, Hobbes levava por volta de
1649? Jera um pensador Inglaterra. Esse exrcito acabou sendo
derrotado por Cromwell em de certo destaque, mas de menos
notoriedade; na verdade, na sua Dunbar, em setembro de 1650, e o
grande historiador da guerra civil, idade muitos homens de seu
tempo jteriam terminado sua carreira de Edward, conde de Clarendon
(ele mesmo um realista), registra que esta escritores, pois ele
tinha 61 anos em abril de 1649. Dois anos antes, vitria que "foi
considerada, em toda parte, como a conquista final de sobrevivera a
uma sria doena que quase o matou, mas viveria mais todo o reino".
Embora os realistas ainda tenham sido capazes de trinta anos morreu
em dezembro de 1679. Nasceu no ano da organizar uma resistncia
baseada na Esccia, que comeou na Invencvel Armada, 1588, em
Malmesbury (Wiltshire). De famlia primavera* de 1651 e acabou de
modo ignominioso na batalha de relativamente pobre, era filho de um
clrigo semiletrado Worcester, em setembro de 1651, Leviat foi
obviamente concludo no (provavelmente nem tinha grau universitrio)
que se tornou alcolatra clima poltico que se seguiu a Dunbar,
quando a guerra parecia enfim e abandonou a famlia; a educao de
Hobbes na escola primria em terminada. Foi especificamente nessa
poca que Hobbes escreveu a Malmesbury e posteriormente num hall em
Oxford (isto , uma verso Reviso e Concluso, com seu apelo explcito
submisso ao novo mais barata e menos prestigiosa de uma faculdade)
foi custeada por regime. Todavia, a princi seu tio. Hobbes foi sem
dvida reconhecido como alunopal parte do livro fora escrita numa
poca em que a vitria ainda no extremamente brilhante, sobretudo no
tema central do currculoestava decidida, e em que um exrcito escocs
devo renascentista, o estudo das letras. Sua facilidade com as
lnguas setado ao rei ainda poderia ter imposto sua vontade sobre os
dois reinos. manteve por toda a vida, e ele passou muito tempo
realizandoPortanto, ao ler Leviat no devemos esquecer a incerteza
de Hobbes tradues: a primeira obra publicada com seu nome (em 1629)
foi umaquanto ao desfecho das guerras civis tanto na Inglaterra
como na traduo de Tucdides, e uma das ltimas (em 1674), uma traduo
deFrana, e sua esperana de que os argumentos de seu livro pudessem
Homero. Era escritor fluente tanto em latim como em ingls, eexercer
algum efeito sobre o desenlace; temos de lembrar, em tambm lia
italiano, francs e grego. A essas habilidades aliava-separticular,
que Hobbes o escreveu quando ainda freqentava a corte do uma
sofisticao de estilo, representada por sua capacidade deexilado rei
Carlos lI, e que, provavelmente, era a ele que o livro seria
escrever poesia em duas lnguas bem como prosa elegante.
Comodedicado (ver a "Nota sobre o texto"). A obra era, em parte,
uma todos os escritores renascentistas, sua educao foi antes de
mais nadacontribuio para uma discusso entre os exilados6. literria.
Homens com essas aptides eram muito cobiados na Europa
renascentista, pois podiam ser de grande valia para pp. XXV-XXVI.)
Mas "Iate" em ingls do sculo XVII no significa necessariamente "j
terminado"; tambm pode significar "recente".5 Edward Hyde, conde de
Clarendon, The History ofthe Rebellon and Civil Wars srie de
argumentos a seu favor. Ver seu artigo, "Contexts for the Writing
and in England,... also his Life... (Oxford, 1843), p. 752. * Do
hemisfrio norte. [N. da T.] 6 Quando a Publication of Hobbess
Leviathan", History of Poltical Thought II (1990), pp.
675-702.primeira edio Cambridge do Leviat estava na grfica, o Dr.
7O que segue baseia-se em grande medida nos meus livros Hobbes
(Oxford, Glenn Burgess chegou, por outras vias, mesma concluso,
arrolando uma 1989) e Philosophy and Government 1572-1651
(Cambridge, 1993). XII XIII
7. ..... ~ Leviat Introduo II I algum envolvido na vida pblica.
Podiam escrever cartas e discursos, tas, o objetivo do conhecimento
dos clssicos (sobretudo os escritores I111I II responder a
correspondentes estrangeiros, educar as crianas mais romanos) era
equipar um homem para o tipo de servio pblico que velhas de uma
casa nas tcnicas da vida pblica, e atuar, de forma heris como Ccero
tinham desempenhado: o melhor modo de vida geral, de maneira
bastante semelhante aos modernos assessores de (acreditavam eles)
era o de um cidado ativo e comprometido, lutando I~ senadores nos
Estados Unidos. pela liberdade de sua respublica ou usando suas
habilidades oratrias Com efeito, esta viria a ser a carreira de
Hobbes ao longo de para convencer os outros cidados a lutar com
ele. Para eles, 1II sua vida, pois, depois de se formar em Oxford
em 1608, foi indicado "liberdade" significava libertar-se tanto da
opresso externa exercida para o cargo de secretrio e preceptor na
residncia de por uma fora estrangeira como da dominao interna
exercida por um William Cavendish, que pouco depois viria a ser o
primeiro Csar ou qualquer outra figura que reduzisse os cidados
republicanos Ili conde de Devonshire e um dos homens mais ricos da
Inglaterra. Dali a meros sditos. At mesmo Maquiavel, geralmente
associado pela.." em diante, Hobbes (enquanto esteve na Inglaterra)
posteridade a tcnicas de dominao pelo prncipe, exaltava esses morou
nas casas do conde, em Hardwick Hall em Derbyshire ou na valores em
seus Discursos sobre os primeiros dez livros de Tito Lvio, e
Devonshire House em Londres, e ao morrer, em Hardwick, ainda era
mesmo O prncipe no os evitava por completo; ele contm, por um
honrado servidor da famlia, ou "domsti exemplo, notveis apelos para
que o governante confie na massa do co", como ele certa vez
denominou a si mesmo. Nem sempre povo, que nunca o decepcionars, e
para que governe por meio de um esteve diretamente empregado pelos
condes de Devonshire, pois em exrcito de cidados, a instituio
central do republicanismo vrios momentos no havia ningum da famlia
desempenhando renascentista. alguma funo na vida pblica; nessas
pocas trabalhava para seus No entanto, ao trmino do sculo XVI,
muitos intelectuais vizinhos em Derbyshire, e, em particular,
europeus tinham se afastado desses valores, embora ainda para seus
sobrinhos, os condes de Newcastle que viviam em Welbeck.
conservassem o compromisso de compreender seu prprio tempo em Uma
de suas tarefas era levar os herdeiros dos con termos das idias da
antiguidade e a hostilidade para com as teorias dados para um
grande giro pela Europa e, entre 1610 e 1640, passou escolsticas
prvias ao Renascimento. No lugar de Ccero, liam (e quatro anos no
continente. Pelo fato de viajar com um escreviam como) Tcito, o
historiador dos primrdios do Imprio jovem de alta posio social, ele
e seu senhor tinham acesso s mais Romano; e nos escritos de Tcito
encontravam uma verso da poltica importantes personalidades
politicas e intelectuais da Europa, como domnio da corrupo e da
traio, no qual prncipes encontrando (por exemplo) os lderes de
Veneza em sua luta com o manipulavam populaes instveis e perigosas,
e homens sbios ou papado, cardeais em Roma, personalidades de
destaque em Genebra, e bem se retiravam do terreno pblico ou eram
destrudos por ele. Tcito Galileu. Seu conhecimento prtico e pessoal
da poltica europia no descreveu em detalhes as tcnicas de manipulao
que (supunha ele) encontrava rival em nenhum pensador ingls de sua
gerao (e, poder- todos os prncipes usariam, e seus leitores do
Renascimento estavam se-ia dizer, em apenas um no continente, o
holands Hugo Grcio). igualmente fascinados por elas; o estudo e a
anlise dessas tcnicas Desde o comeo do Renascimento, carreiras
deste tipo (embora deu lugar vasta literatura sobre a "razo no to
internacionais) no eram incomuns na Europa ocidental, mas os
interesses intelectuais singulares que Hobbes parece ter nutrido
mais profundamente eram estra nhos aos primeiros renascentistas.
Aos olhos destes humanis 8 Ver The Prince, ed. Quentin Skinner e
Russell Price (Cambridge, 1988), p. 37. (Trad. bras. O prncipe, So
Paulo, Martins Fontes, 2~ ed., 1996.) XIV xv
8. ... Leviat Introdu~ o de Estado" que invadiu as livrarias da
Europa entre 1590 e 1630. para modificar sua situao -, os cpticos
tambm queriam Quando o sculo XVI se aproximava de seu fim, depois
de dcadas de libertar o sbio do peso do compromisso com teorias
cientificaso guerras civis e religiosas, e a correspondente
construo de poderosas Afirmavam, portanto, que todas as cincias
fisicas existentes eram monarquias para tornar incuas as ameaas de
guerras civis, essa incoerentes e no podiam explicar coisas como a
literatura poltica ganhou muito sentido na vida do dia-a-dia.
prevalncia das iluses pticas; at mesmo a matemtica pura Junto com
essa literatura, e compartindo com ela vrios estava viciada por
(por exemplo) notrias dificuldades em dar sentido interessantes
pontos em comum, havia outra, na qual os temas do s definies
fundamentais de Euclides (uma linha sem profundidade antigo
estoicismo e cepticismo eram amplamente explorados. Os etc.).
Lipsius e Montaigne simpatizavam com essa extenso do conselhos dos
filsofos esticos contemporneos de Tcito eram de programa estico
original, e Montaigne que o homem sbio deveria se afastar do foro e
evitar envolver-se em particular tornou-se famoso pela riqueza e
fora de seus emocionalmente com quaisquer princpios que pudessem
lev-Io a se argumentos cpticoslO. aventurar na luta poltica.
Encontramos esses conselhos reiterados por As obrigaes de Hobbes na
residncia dos Cavendish inclua escritores de finais do sculo XVI
como Justus Lipsius nos Pases estudar essa nova literatura, e
mostrar para os seus Baixos e Michel de Montaigne na Frana, no
contexto (em geral) de pupilos como contribuir para seu
desenvolvimento. Todos ti uma verso explicitamente tacitista da
poltica. Para muitos autores nham um interesse particular pelas
obras de seu contemporneo, antigos que debateram essas questes, no
entanto, o mero afastamento um velho amigo da famlia Cavendish, Sir
Francis Bacon; nos anos de emocional no era suficiente: como
insistiam os cpticos, seguidores 1650, sabia-se que Hobbes prezava
muito as obras de Bacon, e que de Pirro e Carnades, era impossvel
afastar-se por completo e, ao durante um certo tempo tinha
inclusive servido de amanuense de mesmo tempo, continuar a
acreditar que os princpios morais ou Bacon (foi provavelmente
cedido a Bacon pelo conde de Devonshire polticos em questo eram
verdadeiro!. Os cpticos argumentavam, pouco antes de 1620)11. Bacon
portanto, que o sbio se protegeria melhor renunciando no apenas foi
uma das primeiras e mais importantes personalidades da Inglaterra a
emoo, mas tambm crena; a reflexo, particularmente sobre a importar
esse novo tipo de humanismo: ele mesmo escreveu histria ao
multiplicidade de crenas e prticas conflitivas encontradas no
mundo, estilo de Tcito, e tambm publicou o primeiro volume de
"ensaios" em logo o persuadiria de que suas crenas na verdade no
tinham ingls, modelados segundo fundamentao suficiente. Como as
idias sobre o mundo natural na os essais de Montaigne. Mas havia
certo grau de ambigidade na Antiguidade estavam intimamente ligadas
a idias sobre a ao e a abordagem de Bacon, o que, em muitos
sentidos, tambm se manteve moraldade humanas - os esticos, por
exemplo, acreditavam que os como trao caracterstico na perspectiva
de Hobbes. Bacon certamente homens estavam enredados num mundo de
causas fsicas acreditava que, em geral, a politica era uma arena
para a manipulao deterministas, e por isso no tinham liberdade
principesca, e que os cpticos tinham razo quando ressaltavam a
inadequao da cincia conven 10 Para um relato mais detalhado desse
movimento, ver minha obra Philosophy and Government 1572-1651,
cit., pp. 31-64. 11 Quanto opinio de Hobbes sobre Bacon, ver a
carta de Du Verdus para Hobbes, , Pirro foi, no sculo IV a.C., o
fundador do cepticismo; Carnades viveu 150 anos depois, agosto de
1654, em Hobbes, Correspondence, ed. Noel Malcolm (Oxford, 1994),
pp. e desenvolveu a tradio cptica sob a gide da "Nova Academia" -
por isso sua verso 194-6. Quanto sua associao com Bacon, ver ibid.,
pp. 628-9. do cepticismo costuma ser denominada de "acadmica" em
contraposio ao cepticismo "pirroniano". XVI XVII
9. ........ Leviat Introduocional; alm disso, como os outros
filsofos desse gnero, acreditava temas familiares ao Leviat. Entre
eles o comentrio de que umna necessidade da automanipulao
psicolgica para se adequar "Estado popular... para as provncias no
como um, mas comomentalmente ao mundo modernoI2. Mas ele tambm
continuava a muitos tiranos"1S (compare com Leviat, pp. 165-6) e a
observao deacreditar, como um homem do comeo do Renascimento, que
cada que todos os homens so "dessa condio, que o desejo e esperana
docidado deveria se envolver na vida pblica, e que deveria se
preparar bem os afeta mais que a fruio: pois esta induz saciedade;
mas apsicologicamente para tanto. Ademais, dizia Bacon (claramente
contra esperana um estmulo para os desejos dos homens, e no os
farMontaigne), a busca das cincias era til para os cidados ativos,
desde enlanguescer"I6(Leviat, pp. 57-8). Revela tambm uma das razes
doque as cincias partissem de fundamentos novos e apropriados.
interesse que Hobbes teve a vida toda pela idia de liberdade; a
claro que Hobbes estava educando jovens destinados a cargos
primeira frase dos Anais diz: "No princpio, reis governavam a
cidadepolticos, portanto, para ele e seus pupilos o tacitismo e o
compromisso de Roma. Lcio Bruto fundou a liberdade e o
consulado"17, e foicvico de Bacon devem ter sido bastante
atraentes: escreveram juntos muitas vezes usada na tradio de Tcito
como bom pretexto para aimitaes dos ensaios e discursos de Bacon, e
o prprio Hobbes (fato discusso sobre o verdadeiro sentido da
liberdade. Em seu discurso,recentemente comprovado de maneira
convincente) comps seu Hobbes comenta que Bruto no tinha
propriamente jusprimeiro longo tratado de poltica na forma de um
discurso sobre os tificativas para derrubar a monarquia romana, mas
que os crimes deprimeiros quatro pargrafos dos Anais de Tcito, em
que este faz um Tarquiniorelato sucinto da carreira do imperador
August013. Foi publicado juntocom alguns dos ensaios de seus
pupilos num livro annimo de 1620,por um editor que pretendia lucrar
com a febre pelos ensaios deram a cor para sua expulso, e para a
alterao do governo. E isso quebaconianos1" e nele se encontram
muitos o autor intitula Liberdade, no porque a servido esteja
sempre vinculada Monarquia; mas quando os reis abusam de seus
cargos, tiranizam os sditos [etc.]... tal usurpao dos estados e
natureza dos homens muitas vezes provoca esforos pela liberdade e
mal suportada pela natureza e paixo do homem, embora a razo e a
religio nos ensinem a tolerar o12 Ver, por exemplo, sua longa
discusso sobre as tcnicas apropriadas em seu The jugo. Portanto, no
o governo, mas o abuso que faz a alterao ser Advaru:ement of
Learning, Df the proficience and advancement of learning, divine
and chamada de liberdade. Ia humane (Londres, 1605); U1orks,
ed.James Spedding, Robert Leslie Ellis e Douglas Deron Heath V
(Londres, 1858), pp. 23-30.13 As evidncias tcnicas estatsticas da
autoria de Hobbes no que concerne a esse discurso, junto com uma
pea mais curta, "Of Lawes", e um interessante guia da Roma de seu
tempo podem ser encontrados no artigo de N. B. Reynolds e J. L.
Hilton, "Thomas Hobbes and Authorship of the Horae Subsecivae",
History of Poltical Thought 14 15 Horae Subsecivae, p. 269. (1993),
pp. 361-80. As evidncias textuais internas, algumas das quais cito
a seguir, 16 Ibid., p. 291. Outro exemplo o ferrenho ataque a
qualquer oponente polti tambm me parecem convincentes, pelo menos
naquilo que se refere aos discursos sobre co que faa uso do suborno
- "cumular de benefcios homens soturnos e hostis Tcito e Roma.
esperando com isso ganhar sua afeio injusto e prejudicial" (Horae
Subsecivae, p. 266;l< O ttulo do livro Horae Subsecivae,
Observations and Discourses (Londres, 1620). compare com Leviat,
pp. 241-2). Uma discusso aprofundada sobre sua complicada gnese
pode ser encontrada no artigo 17 Urbem Romam a principio reges
habuere. Libertatem, & Consulatum L. Brutus ins. de Noel
Malcolm, "Hobbes, Sandys and the Vrgnia Company",
HistoricalJournal24 tituit. (1981), pp. 297-321. 18 Horae
Subsecivae, pp. 228-9. O termo "cor", a propsito, era um termo tcni
co da retrica muito apreciado tanto por Bacon como por Hobbes.
XVIII XIX
10. ... Leviat Introdu o Augusto, por outro lado, louvado ao
longo de todo o mesmo justificava a agresso j era um Jugar-comum
nos crculos que discurso por sua habilidade para manipular seus
cidados, e, Hobbes freqentava2!. Oito anos depois, Hobbes tambm
publicou em particular, por ocultar a verdadeira face de seu
mando!9. (anonim~:Tlente) "ma verso radicalmente alterada da
Retrica de No entanto, uma certa nostalgia da repblica aparece
constan Aristteles em que dava rdea larga ao interesse que ele j
temente no discurso, como tambm em Tcito: Hobbes con demonstrara
pelo uso da persuaso e da retrica para adquirir poder*. cordava com
tacitistas contemporneos seus de que repblicas Expunha, em
particular, uma assero supreendentemente livres tinham de cair nas
mos de prncipes manipulativos, ~implificada sobre o carter da
retrica. Os antigos retricos particularmente (como ele diz na p.
239) aps um perodo de costumavam supor que no havia conflito
fundamental entre guerra civil, mas descrevia a supresso dos
antigos costumes habilidades oratrias e a busca da verdade, mas
Hobbes nega isso: os republicanos com certo pesar. Os cidados
princpios da retrica agora no estudam mais a Arte de comandar, que
no passado era so as opinies comuns que os homens tm no que se
refere ao proveitoso e no necessria para qualquer cavalheiro
romano, quando o mando do proveitoso; ao justo e injusto; honroso e
desonroso... Pois assim como em lgica, em que o conjunto podia ser
atribudo a cada um sucessvamente; mas conhecimento certo e infalvel
o objetivo de nossa demonstrao, todos os principios tm dedicam-se
por completo s Artes de servir, de modo que a de ser verdades
infalveis: portanto, em retrica os principios tm de ser opinies
comuns, obsequiosidade predomina, e passa a ser louvvel desde que
se como as que o juiz j possui: porque a finalidade da retrica a
vitria; que consiste em distinga obter a crena." da bajulao, e
proveitosa, enquanto no se converta em tdio.20 A esse discurso
seguiu-se a primeira obra de Hobbes pu blicada com seu nome, uma
traduo do historiador grego Segundo Hobbes, o retrica empregaria
algumas das mesmas Tucdides (1629), em que aparece uma ambivalncia
semelhan tcnicas que o prncipe manipulador usa para garantir a
vitria sobre te. Tucdides tambm lamentava a queda de uma repblica,
em seu povo. Aqui, a funo das "opinies comuns" importante: quando
termos notavelmente semelhantes aos que Tcito viria a usar, Hobbes
d conselhos morais aos seus pupilos, sua preocupao mas ao mesmo
tempo punha na boca de alguns de seus personagens garantir que suas
condutas se adequem ao "que o mundo chama" de uma nobre defesa dos
valores republicanos e democrticos. Tucdides virtude23. Como
veremos mais afirmava igualmente que a verdadeira causa da guerra
do Peloponeso era o medo dos espartanos diante do crescimento do
poder de Atenas; numa nota marginal, Hobbes 21 Quanto a essa traduo
de Tucidides, ver Hobbess T7zucydides, ed. Richard Schlatter (New
Brunswick, Nj, 1975). A passagem a que me refiro est na p. enfatiza
esse ponto, algo que tambm chamara a ateno de 42, e a nota de
Hobbes na p. 577. O uso que Bacon faz de Tucidides est em Bacon
quando instava o governo ingls a romper seus tratados
Considerations Touching a War with Spain que ele esboou para o
prncipe Carlos em e declarar guerra Espanha. A idia de que o medo
em si 1624 como parte de sua campanha para reiniciar a guerra com a
Espanha. WOrks, ed.james Spedding et al., XN (Londres, 1874), p.
474. * Como em breve mostrar Karl Schuhmann, em sua edio das obras
de Hobbes, A Briefe Por exemplo, "no sbio por parte daquele que
quer converter um Estado livre numa19 01 the Art 01 Rlzetorique,
verso inglesa da parfrase escrita originalmente por Hobbes
Monarquia retirar-Ihes todas as manifestaes de liberdade de em
latim, contm inmeros erros e no pode,uma s vez, e faz-Ios de
repente sentir a servido, sem primeiro introduzir em seus por isso,
ser atribuda a Hobbes. (N. da R. T.) espritos algumas previae
dispositioms, ou preparativos por meio dos quais possam 22 T7ze
English WOrks VI, ed. W. Molesworth (Londres, 1840), p. 426.
suport-Ia melhor" (p. 261). 23 Ver sua notvel carta a Charles
Cavendish (agosto de 1638) em20 Horae Subsecivae, p. 307.
Correspondence, ed. Malcolm, pp. 52-3. xx XXI
11. ....II 1I IntroduoII I1 LeviatI1 I1 1647, quando a grande
empresa holandesa de Elzevirs publi adiante, uma das caractersticas
permanentes de toda a filosofia moral cou um verso revisada do De
Cive e Hobbes ganhou notoriedade I de Hobbes sempre foi tomar como
ponto de partida uma descrio comumente aceita de algum estado de
coisas24. em toda a Europa. Uma verso da primeira seo, intitu
Contudo, na poca em que publicou A Briefe of the Art of lada Da
matria (De Cor pore), foi finalmente enviada aos edito Rhetorique j
comeara a ampliar seus interesses para alm dessa res em 1655,
depois de Hobbes ter voltado para a Inglaterra, e literatura
humanista. Em 1634 visitara Paris com o filho do conde de a segunda
seo, Do homem (De Homine), em 1658. As trs se Devonshire, e tomara
conhecimento da crtica a esse tipo de humanismo, que vinha sendo
desenvolvida sobretudo por escritores es foram finalmente
publicadas juntas e com o ttulo origi ligados ao monge francs Marn
Mersenne, entre os quais se destacava nal em 1668, como parte das
obras completas em latim de Ren Descartes. Sob a influncia deles
comeou a escrever filosofia Hobbes, publicadas naquele an026. Elas
vinham acompanha propramente dita pela primeira vez, e logo
produziu a primeira das das de uma traduo para o latim do Leviat,
evidncia clara grandes obras que formaram sua reputao. Por volta de
1641 esboara (em latim) uma longa obra intitulada The Elements of
Philosophy de que Hobbes continuava a acreditar que The Elements of
Phi (Elementa Philosophiae), dividida em trs "sees" relativamente
losophy e Leviat eram expresses compatveis e igualmente
independentes, a primeira das quais dedicada fsica e metafsica, a
importantes de sua filosofia. Ao mesmo tempo que estava es segunda,
ao humana, sensao e moralidade (compreendida como crevendo a
primeira verso de The Elements of Philosophy em um relato dos mores
humanos ou hbitos e costumes), e a ltima tratava de poltica25. Um
fato importante sobre Hobbes que, depois latim, Hobbes comps um
resumo em ingls (e, pode-se con de produzir muito rapidamente esse
esboo, passou quase vinte anos jeturar, a traduo de algumas
passagens) das ltimas duas mexendo nele, e que durante todo o
perodo em que estava escrevendo sees, que ele denominou Elements of
Law, Natural and Politic. Leviat tambm estava rescrevendo e
pensando sobre The Elements of Fez este texto circular bastante
entre seus amigos ingleses por Philosophy, que ele acreditava ser
sua principal obra. volta de maio de 1640, e ele continua sendo a
melhor introdu Conseguiu que cpias da terceira seo fossem mpressas
em lU 1642 em Paris, com o titulo de Do cidado (De Cive), e
distribuiu-as o breve s idias de Hobbes, realizada no mesmo perodo
Comentadores de Hobbes costumam discutir entre si so entre os
amigos, mas no conseguiram persuadi-lo a publicar em que acabavam
de ser geradas. bre as relaes entre seus interesses humanistas
iniciais e suas (propriamente falando) nada de sua filosofia at
preocupaes cientficas e filosficas posteriores, e, em parti cular,
eles indagam se as idias polticas do De Cive e do Le viat derivam
de suas teorias cientficas; afinal de contas, a po sio do De Cive
em The Elements of Philosophy sugere que era " Para uma exposio
inteligente do papel da retrica e da hostilidade em relao ao orador
nas primeiras obras de Hobbes, ver Quentin Skinner, para ele ser
lido como extenso das teorias apresentadas nas "Scientia civilis in
Classic Rhetoric and in the Early Hobbes" em Nicholas primeiras
duas sees. Uma das grandes contribuies de Leo Phillipson e Quentin
Skinner, eds., Political Discourse in Early Modero Britain
(Cambridge, 1993), pp. 67-93. Strauss foi levantar essa questo, e
insistir em que a prpria ver 25 No que se refere s evidncias desta
afirmao, ver meu artigo "Hobbes and 26 Uma edio completa de The
Elements parece ter sido planejada em 1656; Descartes" em G. A.].
Rogers e Alan Ryan, eds., Perspectives on Thomas Hobbes (Oxford,
ver Hobbes, Correspondence, ed. Malcolm, p. 325. 1988), pp. 11-41,
e Correspondence, ed. Malcolm, pp.liii-lv. XXIII XXII
12. ..... -.,I!I Leviat Introduo so de Hobbes sobre o assunto,
na qual sua filosofia civil coerentemente apresentada como
decorrncia de sua filoso meiro humanismo persistissem nesse novo
contexto. Em particular,11/ dada a proximidade inicial de Hobbes
com Bacon, no deveriaI fia natural, pode ser enganosa; Strauss
achava que, na essncia, a teoria11 surpreender que ele acolhesse
com agrado a possibilidade do queII poltica de Hobbes continuaria
sendo humanista, poderamos denominar de cincia "ps-cptica" - isto ,
uma cincia e, quando muito, viu-se distorcida por sua apresentao nu
natural e uma filosofia moral que de alguma maneira respondessem s
ma forma dedutiva e cientifica27. No entanto, como observei, objees
cpticas sem negar a sensatez dos argumentos cpticos. a dicotomia
entre "humanismo" e "cincia" falsa: aos olhos No mago do projeto
cientifico, tanto de Hobbes como de dos humanistas do final do
sculo XVI, a posio das cin Descartes, est a questo da sensao
humana. Ambos aceitam o argumento cptico de que no se pode ter uma
experincia direta e cias naturais estava vinculada filosofia moral.
Os cpticos confivel do mundo externo, e que tudo o que podemos
perceber a eram contrrios busca v de verdades cientificas porque
atividade interna de nosso crebro; este o tema central do captulo I
acreditavam que levava as pessoas a compromissos epistemo do
Leviat, em que Hobbes exprime (entre outras coisas) os lgicos e
portanto morais que as colocavam em perigo; Ba argumentos cpticos
habituais contra o realismo ingnuo dos con, por outro lado, acolhia
de bom grado pelo menos um aristotlicos. Numa famosa passagem de
seu Discurso do mtodo (junho de 1637; Hobbes j o estava lendo em
outubro daquele mesmo novo tipo de cincia, precisamente porque
permitiria que as ano)29, Descartes afirma que isso poderia
implicar que o mundo pessoas levassem uma vida melhor como cidados
ativos e externo no existe e que todos ns poderamos estar sonhando;
era esta eficientes. a famosa "dvida hiperblica" que Descartes se
disps a responder com O mesmo pode ser dito (embora isso seja em
geral des sua igualmente famosa demonstrao a priori da existncia de
Deus, e a conseqente afirmao de que um Deus benevolente no iludiria
sua considerado) sobre Descartes; em seu Discurso do mtodo ele
criao. Hobbes ficou evidentemente muito impressionado com a toma o
cuidado de apresentar uma imagem de si como um tpico dvida
hiperblica, e uma verso dela aparece em todos os esboos de
humanista, "formado em letras" e levando uma vida ativa e, claro,
The Elements of Philosophy, na forma da conjectura de que todo o
militar, alm de explicitar o tema de todo o seu universo externo
pode ter sido recentemente aniquilado sem que projeto nos seguintes
termos: "Sempre tive o extremo desejo tenhamos tomado conscincia de
seu desaparecimento, j que nossa de aprender a distinguir o
verdadeiro do falso a fim de com vida mental interna poderia
simplesmente continuar como antes. preender profundamente minhas
prprias aes e avanar Em seus primeiros esboos, ele parece ter
adotado a firme com confiana [marcher avec aJ:furance] nesta
vida."28 Portanto, convico de que no existe critrio plenamente
adequado para era umaStrauss, The Political Philosophytodas as
preocupaesStrauss distinguir entre viglia e sonho, e que isso no
importa, porque em Ver Leo conseqncia natural de of Hobbes (Oxford,
1936). ini TI ambos os casos podemos supor que nossa vida queria
usarHobbes tambm indagar das primeiras convices polticas ciais de
Horae Subsecivae como prova sobre os fundamentos das de Hobbes,
embora tenha desistido disto ao ficar sabendo que os ensaios pri
cincias, e no deveria surpreender que os temas de seu eram
atribuidos a outros autores; vemos agora que sua intuio talvez esti
vesse correta. Pode-se encontrar alguns comentrios teis sobre
Strauss em J. w. N. Watkins, Hobbess System of ldeas (Londres,
1973), pp. 14-7. 28 Ren Descartes, The Philosophic Writings I,
trad. John Cottingham, Robert 29 Jbid., p. 109; Hobbes,
CO"espondence, ed. Malcolm, p. 51. Stoothoff e Dugald Murdoch
(Cambridge, 1985), p. 115. XXN xxv
13. ...I1 Leviat Introdu o mental tem como causa foras
materiais externas a ns30; ao tivesse causado o universo, e essa
admirao podia adotar a~I escrever Leviat, mudara de postura, e
passara a acreditar que forma de atribuio a Ele de qualidades
humanas desejveis como a (como ele diz no captulo II): "contento-me
com saber que, benevolncia; mas devamos compreender que (como ele
mesmo diz estando desperto, no sonho, muito embora, quando sonho,
me em uma de suas melhores expresses de suas crenas religiosas)
tais julgue acordado". Ele sempre dera razes pouco elaboradas e
atribuies so mais "oblaes" que "proposies", ou seja, so imperfeitas
para distinguir sonhos de pensamentos despertos, maneiras de
honrar, comparveis a se prostrar ou fazer um sacrifcio, mas no
contm nenhuma verdade genuna32. Portanto, a tais como a maior
incoerncia dos sonhos, mas a nfase que benevolncia de Deus no
poderia ser usada para resolver nenhum agora punha na capacidade de
distinguir entre eles estava dilema filosfico, e essa determinao a
excluir uma noo relacionada com a proeminncia que deu no Leviat ao
papel convencional de Deus de sua filosofia persistiu em toda a
obra dos fantasmas e outros seres incorpreos na vida imaginativa
posterior de Hobbes, inclusive em Leviat33. O fenmeno da religio,
do homem, questo de que tratarei mais adiante. Por volta de 1650,
contudo, continuou sendo de grande importncia para ele, e mais
Hobbes pensava que a crena em fantasmas era conse adiante
discutirei suas opinies sobre isso. qncia de um equvoco quanto ao
status dos sonhos, e que para Embora o prprio Hobbes dissesse em
Leviat que suas opinies eliminar tal crena era preciso fornecer uma
distino mais sobre a relao entre percepo e mundo externo "no so
muito clara do que as que dera at ento entre sonhar e despertar31.
necessrias para o que agora nos ocupa; e escrevi largamente sobre o
Muito embora Hobbes tenha ficado impressionado pela assunto em
outro lugar" (p. 15)3 ainda assim sentiu-se obrigado a dvida
hiperblica, ele nunca simpatizou com a resposta de iniciar sua obra
com um breve resumo de sua teoria. Infelizmente, Descartes a ela.
Em todas as suas obras, Hobbes negou firme to curto que muitas
vezes ilude os leitores. Fica claro a partir de suas mente a
relevncia do conceito convencional de um Deus obras mais longas
sobre o fundamento das cincias que o que benevolente para qualquer
indagao filosfica. Apenas a caracteriza sua reflexo sobre a
natureza do universo - acreditava ele - pode ria levar os homens a
uma concepo de seu criador - o ser ou evento que deu incio aos
processos mecnicos que desde ento 32 Essa distino encontra-se em
Thomas Whites De Mundo ExamiTUld, trad. Jones, p. persistem. Mas
nenhuma reflexo racional poderia nos 434. A mesma obra contm uma
notvel aplicao dessa teoria ao problema do mal: descrever Deus como
Todo-Poderoso conceder-Lhe a mais alta dizer algo sobre o carter
desse ser. Era natural que os seres honraria, ao passo que
descrev-Lo como autor do mal seria desonr-Lo. Ambas as humanos
honrassem e admirassem o poder do que quer que descries no so
conflitivas porque, em termos estritos, nenhuma delas uma proposio.
30 Para uma exposio mais completa de por que Hobbes pensava isso,
ver meu 33 Quanto ao uso explcito que ele faz dessa questo como
resposta a Descartes, ver seu artigo "Hobbes and Descartes" em G.
A. J. Rogers e AIan Ryan, OOs., Pers artigo "Objections to
Descartess Meditations", publcado juntamente com o texto de
pectives on ThOTlUlf Hobbes (Oxford, 1988), pp. 11-41; um exemplo
de suas pri Descartes em 1641, em decorrncia de um convite de
Mersenne para contribuir com o meiras idias encontra-se em Elements
of Law 1.3.8-10. volume. Descartes, The Philosophical Wrilings lI,
trad. Cottingham, Stoothoff e " Sua crtica a Thomas White (1643) j
contm a afirmao de que "os pagos" Murdoch, pp. 121-37 (ver,
especialmente, pp. 131-2). 34 Esta ltima observao uma indicao
interessante de que ele supunha que The produziram a idia de
demnios e outras substncias incorpreas a partir Elements of
Philosophy logo estaria, de alguma forma, disponivel para o pblco.
de seus sonhos, mas acrescenta cautelosamente que "como no se pode
saber a partir da razo natural se uma substncia incorprea, o que
foi revelado sobrenaturalmente por Deus deve ser verdadeiro".
Tlwmas Whit De Mundo ExamiTUld, trad. H. W. Jones (Bradford, 1976),
p. 54. XXVI XXVII
14. ... Leviat Introdu o teoria que nossos pensamentos e vida
mental esto constitudos de pessoa queremos ser e como deveramos
viver. O que temos objetos materiais. Coisas como imagens mentais e
outras "idias", que de compreender que esse sentido subjetivo de
liberdade para para Descartes eram imateriais e que, portanto,
tinham uma relao escolher como viver baseia-se to pouco na
liberdade real quanto problemtica com um possvel mundo material,
para Hobbes eram nossO senso subjetivo de cor se baseia na cor
real. A confian simplesmente parte desse mundo. Como os objetos
materiais no a de Hobbes de que deliberao e persuaso tm uma efic
podem se mover, nossa vida mental movedia deve ser o resultado de
cia causal est relacionada com seu duradouro interesse huma uma
cadeia de causalidade material que se estende retroativamente at
nista pela retrica e manipulao politica: a idia que a tradi uma
distncia indefinida, e envolve (pode-se supor) tanto processos o de
Tcito tinha dos agentes humanos era precisamente a de que corporais
internos como a circulao do sangue, como eventos externos eles
estavam abertos para a manipulao causal de um como o impacto da luz
sobre nossos olhos. No entanto, s podemos tipo mais ou menos
fidedigno, e a filosofia de Hobbes em rela confiar na verdade de
proposies relacionadas com as percepes o a esta rea (bem como em
relao a todas as outras) incorporou as finais, pois s delas temos
conhecimento direto; o restante de uma idias dessa tradio. cincia
natural tem de permanecer hipottico. Disso decorrem duas A segunda
implicao era que uma tica realista seria implicaes importantes no
que tange s suas teorias moral e poltica. praticamente impossvel.
Novamente, seria um erro supor que A primeira que a noo tradicional
de livre-arbtrio situaes ou agentes fora de nossas mentes tivessem
quaisquer absurda, pois todas as intenes e aes tm de ser causadas
qualidades morais independentes de nosso prprio juzo: despor
processos materiais prvios. Hobbes escreveu longamente a esse cries
como "bom" ou "mau" eram projees de nossasrespeito, que o tema de
uma significativa passagem em Leviat (pp. sensaes internas sobre o
mundo externo, assim como "vermelho" ou179-81); importante
compreender, contudo, o que ele entende por "verde". Como Hobbes
disse (p. 48), "seja qual for o objeto do apetitesua negao do
livre-arbtrio. No quer dizer que no devemos ou desejo de qualquer
homem, esse objeto aquele a que cada umdeliberar intencionalmente
sobre nossas aes e fazer escolhas, e, na chama bom; ao objeto de
seu dio e averso, chama mau". Se fosseverdade, ficou
particularmente irritado quando um de seus oponentes possvel fazer
os seres humanos refez essa suposio; como ele mesmo respondeu,
"quando est conhecerem o carter inerentemente subjetivo dessas
descries morais,determinado que uma coisa deve ser escolhida [por
um agente] antes claro que no haveria discordncia entre elesde
outra, tambm est determinado por que causa isso deve ser sobre
questes morais, assim como no h discordncia sobre questesescolhido
assim, causa esta que, em geral, deliberao ou consulta, e
reconhecidamente subjetivas como o gosto por diferentes
comidas.portanto a consulta no em vo"35.J que, por causa disso, a
Hobbes parece ter acreditado que os filsofos poderiam vir a
conceberdeliberao no era em vo, tampouco o era a deliberao sobre
como uma linguagem moral desse tipo, o mesmo se dando com todos
osdeliberar: a filosofia moral de Hobbes pressupe a aptido para
fazer homens quando tivessem momentos de tranqila reflex036;
masraciocnios complicados sobre que tipo de tambm parece ter
pressuposto que isso no se manteria de modo permanente. A linguagem
moral, como a linguagem das cores, constantemente incitaria seus
"usurios a atribuir ao mundo externo um conjunto de atributos
imaginrios, e, em conseqncia, a debater35 Ver seus comentrios
contra Bramhall em Of Liberty and Necessity em English U70rks, ed.
Molesworth IV (1840), p. 255. 36 Ver De Cive 111.26. XXVIII
XXIX
15. ......... Leviat Introduoentre si sobre o mundo. Ademais,
tal debate no se restringia apenas medida que a populao cresce)
improvvel que tivessem deao que poderiamos considerar assuntos
"morais": os homens tambm lutar novamente. (Epistola Dedicatria
6)debateriam sobre questes de interesses e lucro (e, claro,
sobreassuntos que vo da prpria definio A mesma ambio utpica
manifestada em Leviat (porde um homem at questes triviais como
pesos e medidas)37. A anlise exemplo, pp. 310-11), e, na verdade,
nesta obra ela (como veredesse conflito e uma exposio de sua
resoluo constituem a filosofia civil mos) ainda mais extravagante
do que nas obras anteriores38.madura de Hobbes. Como, ento, segundo
Hobbes, poderia a filosofia supe Em primeiro lugar importante
compreender o objetivo da rar o conflito debilitante, at aquele
momento inerente vidafilosofia aos olhos de Hobbes. Os filsofos
polticos modernos humana, dada a ausncia de qualquer padro objetivo
paracostumam pensar que, de certa maneira, sua tarefa consiste
emfornecer um fundamento lgico para as atitudes ou prticas polticas
avaliar o que certo ou errado, ou at mesmo o que benficoncretas de
sua sociedade, e para tal empresa sempre trataram co ou danoso para
um ser humano? O primeiro passo seriaHobbes como um aliado; suas
hipteses "realistas" ou "pessimistas" reconhecer a verdadeira
natureza do conflito, ou seja, que na verdadesobre a natureza
humana parecem fazer dele um recruta plausvel. Mas se trata de um
conflito de crenas. Mais uma vez tenHobbes acha que a correta
compreenso e aplicao de sua filosofia tador supor que Hobbes
pensava que colises do estado depoderia transformar a vida humana.
Desde o comeo de seu projeto, natureza eram colises entre os
diferentes interesses das pessoasproclama os beneficios que estava
oferecendo humanidade: j em envolvidas, mas, como ele explica
cuidadosamente noElements 01 Law descreve suas concluses como "de
natureza tal, que, captulo VI de Leviat, mesmo as paixes que
aparentementepor falta delas, governo e paz nada mais foram at este
dia seno medo nos movem tm na maioria dos casos um componente
cognitireciproco" - um bom lembrete para o fato de que (ao contrrio
do que vo fundamental - de modo que, por exemplo, a alegria provm
damuitos pensam) Hobbes deseja libertar o povo do medo. Reiterou
suas "imaginao do prprio poder e capacidade de um hoesperanas em De
Cive: se a filosofia moral pudesse estar to bem mem", ao passo que
a tristeza se deve "convico da falta defundamentada quanto a
geometria, ento poder" (p. 53). O nico desejo destituido de contedo
cogniti vo o desejo fundamental de se preservar da morte; todas as
outras paixes e desejos envolvem alguma crena sobre a posi o que
ocupamos no mundo e as ameaas que podemos vir a Desconheo outra
maior contribuio da indstria humana enfrentar. Se os recursos de um
gnero bsico fossem de fato felicidade humana. Pois, caso se
conhecessem os padres da ao parcos, poderia haver um conflito de
interesses irredutvel; humana com a mesma certeza com que se
conhecem as relaes mas Hobbes acreditava que no mundo, tal como
ento estava de magnitude das figuras, ento a ambio e a ganncia,
cujo poder se apia nas falsas opinies do povo sobre o certo e o
constitudo, tal escassez no existia. O Novo Mundo criava a errado,
ficariam desarmadas, e a humanidade poderia desfrutar expectativa
de um enorme aumento da produo: de uma paz to segura que (afora
conflitos por espao 38 Talvez fosse relevante comparar as ambies de
Hobbes a esse respeito com as ambies igualmente utpicas de Bacon -
que, afinal de contas, o autor da obra politica37 Ver em particular
Elements o[ Law Il.lO.8, reproduzido em (ou baseado em)
declaradamente utpica, New Atlantis. De Cive VI.9 e XVII.12. xxx
XXXI
16. ..I~ I I Leviat Introduo Caso houver o aumento constante da
multido de pessoas pobres desde que ela se baseie num conjunto de
princpios morais mais mas vigorosas, elas devero ser removidas para
regies ainda no circunscrito do que aquele usado na tradio
aristotlica. Segundo suficientemente habitadas, onde no devero
exterminar aqueles que l Grcio, a lei fundamental da natureza o
reconhecimento mtuo dos encontrarem, mas obrig-Ios a habitar mais
perto uns dos outros e a no direitos bsicos dos seres humanos, e,
em particular, o direito de se explorar uma grande extenso de solo
para colher o que encontram, e sim defender de agresses e o direito
de adquirir o necessrio para viver. tratar cada pequeno pedao de
terra com arte e cuidado a fim de este Ihes dar o sustento na
devida poca. E quando toda a terra estiver No existe nem pode ser
imaginada nenhuma sociedade, diz Grcio, superpovoada, ento o ltimo
remdio a guerra, que trar aos homens que no inclua entre suas leis
e costumes o respeito pelo direito ou a vitria ou a morte.
autoconservao e a condenao do esbanjamento ou do dano desnecessrio.
Selden, em dois livros escritos nos anos de 1630 e de (p. 293)39
certa maneira dirigidos a Grcio, concorda em linhas gerais com essa
teoria, mas afirma que as implicaes do direito autoconservao
Segundo Hobbes, o sbio deveria portanto reconhecer que todo podem
ser muito mais amplas do que Grcio pensa, e podem (por conflito ,
no fundo, um conflito de crenas, e tambm deveria exemplo) incluir o
direito muito geral a fazer a guerra com outros reconhecer que
todas as crenas que so matria de conflito esto mal povos para
alcanar os prprios objetivos. fundamentadas. Hobbes reconhece a
compatibilidade entre esse tipo de teoria dos Para analisar esse
conflito e sua resoluo, Hobbes voltou-se para direitos naturais e
sua prpria filosofia moral, e passa a interpretar os o que deveria
nos parecer uma linguagem bastante surpreendente, a conflitos
fundamentais de crenas em termos de um "estado de linguagem dos
direitos e das leis naturais. Nem o humanismo tardio no natureza"
em que cada indivduo tece seus prprios juzos sobre tudo, qual se
formou, nem a nova filosofia do crculo de Mersenne tinham inclusive
os meios desejveis para garantir sua prpria conservao, particular
simpatia por essa linguagem, tradicionalmente associada sendo
reconhecido por todos como tendo o "direito" de faz-Io40. Tal com a
filosofia escolstica; e, na verdade, muitas das preocupaes
reconhecimento mtuo do direito autoconservao provm (segundo
centrais de Hobbes continuaram a ser discutidas na Frana (por
Hobbes) da compreenso que todos tm da proeminncia em sua escritores
como Pascal) sem fazer grande uso desses termos. Mas essa prpria
conduta do desejo de autoconservao; deve-se destacar, no linguagem
vinha sendo usada naqueles tempos por dois autores para entanto,
que a teoria de Hobbes no exige que as pessoas sempre ajam
descrever teorias morais "ps-cpticas". O mais importante deles era
o com base no princpio de autoconservao. Sabe holands Hugo Grcio,
embora Hobbes provavelmente tambm tenha perfeitamente que s vezes
as pessoas podem se sacrificar pelos pais, sido influenciado pelo
outro (que mais tarde tornou-se seu amigo), o ou por sua religi04!.
Mas sempre parece justificvel inglsJohn Selden. Em seu De Jure
Belli ac Pacis de 1625, Grcio afirma (expressamente contra os
cpticos) ser possvel uma teoria da lei natural, 40 Vale notar que a
expresso "estado de natureza", da forma como usada nesse contexto,
parece ter sido uma inveno de Hobbes - nem Grcio nem Selden usavam
essa 39 tambm esta a justificao que Locke d da anexao das terras
dos abargines: ver o expresso, embora cada um deles certamente
usasse o conceito. artigo de J. H. Tully "Redscoverng Amerca: The
Two Treatises and Aboriginal 41 Ele mais claro sobre isso em De
Cive, onde observa (VI.13) que nenhum Rights" em seu lvro An
Approach to Political Philosophy: Locke in Contexts homem pode ser
obrigado pelo soberano "a matar o pai, seja ele inocente (Cambrdge,
1993), pp. 137-76. XXXII XXXIII
17. ............... Leviat Introduoagir com base nisso: o
auto-sacrifcio no pode ser obrigatrio, e a mento mental, ou se ele
supe que poderia ser ou tinha sido umaautoconservao sempre
compreensvel. Como, em princpio, possibilidade prtica. Em
diferentes momentos de suas obras, Hobbesqualquer coisa pode ser
necessria para a preservao do indivduo, deu exemplos do estado de
natureza: os mais comuns eram as relaesesse direito natural de usar
o prprio juzo tambm pode ser internacionais entre Estados e a
condio dos povos aborgines daconsiderado, de modo um tanto
dramtico, como "direito a todas as Amrica do Norte e dos povos
primitivos da Europa. Tambmcoisas", embora algumas coisas (como a
crueldade sem motivo) sempre acrescentou o exemplo de Caim e Abel
no Leviat em latim, (talvez)sejam vistas por Hobbes como difceis de
serem justificadas em termos suscitado por uma discusso sobre o
tema com um jovem admiradorda conservao de um agente. francs nos
anos de 1650. No dispomos das cartas de Hobbes sobre o Uma comparao
entre Grcio e Hobbes nessa rea instrutiva. assunto, mas em 1657 o
francs expressava ter recebido uma carta dePor um lado, Hobbes
aceita o argumento de Grcio de que, nesse Hobbes explicitando
aquilo que poderiam se