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TCC Educação Ambiental - A EA como recurso pedagógico para o ensino da Ética

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Artigo científico - Trabalho de conclusão de curso - Especialização em Educação Ambiental

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MAURICIO FERREIRA SANTOS JUNIOR

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO RECURSO PEDAGÓGICO

PARA O ENSINO DA ÉTICA

CURITIBA

2010

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MAURICIO FERREIRA SANTOS JUNIOR

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO RECURSO PEDAGÓGICO

PARA O ENSINO DA ÉTICA

Artigo apresentado a UNICID como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Educação Ambiental.

Orientadora: Profa. Siderly do Carmo Dahle de Almeida

CURITIBA

2010

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RESUMO

A relação do homem com o Meio Ambiente está condicionada pelo seu grau de consciência sobre esta relação: A qualidade do Meio Ambiente, que implica na qualidade da vida humana, depende da ação do homem sobre o seu habitat. Sendo assim, é presumível que se atue sobre os princípios que orientam a conduta humana, ou seja, sobre a Ética, para que se possa garantir o equilíbrio desta relação. Neste sentido, o presente artigo busca identificar elementos conceituais, que fundamentam as idéias de preservação ambiental e o sentido da ética, procurando estabelecer uma relação de interdependência entre ambos. Para tanto, recorremos à pesquisa qualitativa, por se tratar de recurso mais adequado à abordagem de temas sócio-ambientais, a partir de investigações bibliográficas, prioritariamente filosóficas. Os resultados obtidos constituem a soma de reflexões sobre alguns aspectos envolvidos no assunto, tais como conceitos de ética e Educação Ambiental e o enfoque pedagógico da sua relação. Finalizando, inferimos sobre a necessidade da Educação Ambiental como recurso pedagógico para o ensino da Ética.

Palavras-chave: Educação ambiental, Ética, Pedagogia.

1 INTRODUÇÃO

O homem e o Meio Ambiente possuem uma relação de interdependência,

sem a qual não seria viável a existência humana. As conseqüências desta relação

são mediadas pelo grau de consciência ética sobre os conceitos de Humanidade e

Ecologia. Por este motivo, são envidados os mais diversos esforços no sentido de

sensibilizar a sociedade para as questões ambientais, a partir do ensino da Ética.

Nesta direção, dispomos da Educação Ambiental, que pressupõe um conjunto de

fatores pedagógicos, dentre os quais, a Ética desempenha um papel fundamental.

Ocorre, no entanto, que o empenho para a assimilação de valores éticos tem

constituído um enorme e difícil desafio para os promotores da conscientização

ecológica social. Assim, buscando contribuir com recursos teóricos para uma

reflexão sobre as demandas da Ética, o presente estudo consiste em identificar, no

universo pedagógico da Educação Ambiental, elementos conceituais que favoreçam

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a compreensão e sensibilização para as questões éticas, invertendo o sentido

habitual que busca, no ensino da Ética, elementos para a Educação Ambiental.

Muito se tem dito a respeito dos princípios éticos que fundamentam a

consciência ambiental. Sabe-se que a Ética constitui uma fonte de orientação e

motivação do comportamento humano, cujo efeito é de fundamental importância ao

relacionamento do homem com o meio ambiente, no entanto, são escassas as

abordagens a respeito das implicações da Educação Ambiental sobre a consciência

ética como um todo, ou seja, a contribuição da Educação Ambiental na formação

ética da sociedade.

É fato que disseminar valores como Moral, Ética, Cidadania, não é tarefa

simples de ser executada, sobretudo na sociedade atual em que o utilitarismo

assumiu profundas dimensões paradigmáticas. Portanto, diante do comportamento

consumista e da insensibilidade social para tais questões de ordem filosófica, não

seria o exercício pragmático da Educação Ambiental, cuja metodologia se apropria

de elementos utilitários, um recurso pedagógico para o ensino da Ética? A busca

pelo conhecimento do Meio Ambiente e dos elementos que com ele interagem, não

poderiam promover o desenvolvimento da consciência ética?

Procurando responder a tais indagações buscamos, neste artigo, enfocar as

relações entre a Educação Ambiental e o ensino da Ética no sentido de definir que

elementos constitutivos do primeiro se prestam ao fomento do segundo. Assim,

esboçamos determinados fundamentos pedagógicos e filosóficos que orientam a

prática da Educação Ambiental, bem como os mesmos princípios relativos ao ensino

da Ética, procurando estabelecer as relações entre estes e aqueles.

Dado o caráter filosófico desta abordagem, assim como a natureza dos

elementos investigados, a pesquisa segue a orientação do modelo de exame

qualitativo, tendo como matéria de exploração determinado referencial bibliográfico,

citado ao final deste trabalho, sobre o qual aplicamos a respectiva metodologia.

Desse modo, as teorias sobre a Ética e suas formas de abordagem, assim como a

metodologia da Educação Ambiental e seus conceitos, constituem o ponto de partida

das investigações, bem como o referencial balizador para a condução das reflexões.

2 CONCEITOS DE ÉTICA

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O termo ‘conceito’, que tem por definição o significado de ‘entendimento’,

‘opinião’, implica uma condição de ponto de vista, ou seja, de relatividade a um

determinado juízo de valor. Sendo assim, é necessário que a compreensão das

premissas, aqui mencionadas, esteja permeada por um senso de ponderação

relacional.

Partindo deste princípio, abordamos o sentido da Ética, cujos conceitos

variam de filósofo para filósofo, e que, mesmo guardando alguma definição em

comum, concebê-la, na essência, exige reflexão sobre a sua natureza ideológica.

Por outro lado, quando falamos de Ética nos referimos ao sentido filosófico que

transcende o próprio significado da palavra, nos referimos ao mundo das idéias,

“que nasce quando se passa a indagar o que são, de onde vêm e o que valem os

costumes” (CHAUI, 2005, p.310).

A Ética reúne em si a soma dessas idéias, provocando a necessidade de um

código de valores que harmonize as relações humanas, cuja “valoração é o próprio

esforço do homem em transformar o que é naquilo que deve ser” (SAVIANI, 1985,

p.41)

Dito isto, e para conduzir o nosso raciocínio, tomemos como ponto de partida

o significado etimológico do vocábulo: Ética, do grego Ethos, exprime o sentido de

comportamento, associado à idéia de valor, ou seja, expressa a idéia de caráter.

Desse modo, podemos afirmar que a Ética traduz um valor inerente à maneira de

ser do homem, “que constantemente avalia e julga suas ações para saber se são

boas ou más, certas ou erradas, justas ou injustas” (SOUZA, 1995, p.179).

Por outro lado, é fundamental ressaltar que o caráter humano é também

resultante de sua cultura, segundo afirmam os teóricos do Relativismo Cultural,

cujo bem e o mal, o certo e o errado constituem valores inerentes à identidade de

cada cultura. Tal conceito encontra apoio no pensamento do antropólogo Franz

Boas, que destaca a importância da singularidade cultural construída a partir da

história única de uma sociedade, quando afirma que:

As noções metafísicas do homem podem ser reduzidas a poucos tipos que têm distribuição universal; o mesmo ocorre com relação às formas da sociedade, leis e invenções. Alem disso, as idéias mais complicadas e aparentemente ilógicas e os costumes mais curiosos e complexos aparecem entre algumas poucas tribos aqui e ali, de tal maneira que fica excluída a suposição de uma origem histórica comum. (BOAS, 2004, p.26)

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Assim, é importante perceber a extensão do universo permeado pela Ética

para que se possa compreender as suas implicações sobre a conduta humana e o

que desta se origina no sentido de condicionar a primeira.

Vejamos agora uma abordagem filosófica sobre o tema a fim de nos

situarmos na dimensão de sua essência, nos deixando envolver pela construção

lógica traçada por Aristóteles:

Estou falando da excelência moral, pois é esta que se relaciona com as emoções e ações, e nestas há excesso, falta e meio termo. Por exemplo, pode-se sentir medo, confiança, desejos, cólera, piedade, e, de um modo geral, prazer e sofrimento, demais ou muito pouco, e, em ambos os casos, isto não é bom: mas experimentar estes sentimentos no momento certo, em relação aos objetos certos e às pessoas certas, e de maneira certa, é o meio termo e o melhor, e isto é característico da excelência. Há também, da mesma forma, excesso, falta e meio termo em relação às ações. Ora, a excelência moral se relaciona com as emoções e as ações, nas quais o excesso é uma forma de erro, tanto quanto a falta, enquanto o meio termo é louvado como um acerto; ser louvado e estar certo são características da excelência moral. A excelência moral, portanto, é algo como eqüidistância, pois, como já vimos, seu alvo é o meio termo. Ademais é possível errar de várias maneiras, ao passo que só é possível acertar de uma maneira (também por esta razão é fácil errar e difícil acertar – fácil errar o alvo, e difícil acertar nele); também é por isto que o excesso e a falta são características da deficiência moral, e o meio termo é uma característica da excelência moral, pois a bondade é uma só, mas a maldade é múltipla. (ARISTÓTELES, 2001, p.42)

A excelência moral aristotélica exprime um sentido de equilíbrio, de justa

postura mediada pela razão, e não é difícil perceber o seu caráter absolutista,

quando afirma que só há uma possibilidade de acerto, enquanto as possibilidades

de erro são inúmeras. Porém, como entender o sentido de excesso ou falta, que

qualificam os modos de ser correto? Qual a medida, usada pelo filósofo, para

identificar este ponto de equilíbrio?

Poderíamos buscar a resposta em afirmativas como: “a idéia de que alguma

coisa é errada depende do impacto que ela tem, não apenas sobre aqueles que a

praticam, mas também sobre outras pessoas” (NAGEL, 2007, p.64), ou de que

“todos têm uma razão para fazer o que é certo e evitar o que é errado” (Idem, p.74).

Estas poderiam ser boas justificativas, se não fossem incapazes de assegurar o

sentido do absoluto, ou seja, que “o argumento moral tenta apelar para a capacidade

de motivação imparcial que se supõe existir em todos nós” (Idem, p.80).

Neste sentido, partimos para uma outra perspectiva conceitual da Ética, desta

vez formulada por Espinosa, que tem como pressuposto a singularidade de cada

indivíduo e para o qual, “o conhecimento do bem ou do mal não é outra coisa senão

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a afecção de alegria ou de tristeza, na medida em que temos consciência dela”

(ESPINOSA, 2004. p.349) . O filósofo afirma que:

Chamamos bem ou mal àquilo que nos é útil ou prejudicial à conservação de nosso ser (...), isto é (...), o que aumenta ou diminui, favorece ou entrava a nossa potência de agir. E assim, na medida em que (...) percebemos que uma coisa qualquer nos afeta de alegria ou de tristeza, chamamo-la “boa” ou “má”; e por conseguinte, o conhecimento do bem ou do mal não é outra coisa senão a idéia da alegria ou da tristeza, que se segue necessariamente da afecção de alegra ou de tristeza (...), mas essa idéia está unida à afecção da mesma maneira que a alma está unida ao corpo (...); isto é (...), esta idéia não se distingue, de fato, da própria afecção, ou seja (...), da idéia de afecção do corpo, a não ser tão somente pelo conceito; logo, este conhecimento do bem e do mal, não é outra coisa senão a própria afecção, na medida que dela temos consciência. (ESPINOSA, 2004, p.349)

Ora, se o sentido do bem e do mal se encontra intimamente relacionado ao

respectivo sentimento de alegria e tristeza, obviamente se opõe ao conceito

aristotélico, cuja razão refuta o princípio dos afetos, e ratifica a hipótese de que o

sentido da Ética deriva de um entendimento holístico sobre os mais variados fatores

humanos.

Diante do que vimos até aqui concluímos que, apesar de suas multifaces

conceituais e aspectos diversos, a essência da Ética nos parece falar de algo

totalizante, absoluto, e é desta essência que se ocupa o ensino da mesma. Ora,

como tratar de um tema, que toca nossas verdades mais essenciais e, portanto,

absolutas, quando os meios para tanto nos parecem tão relativos e diversos? Como

explorar a abstração desse conteúdo, e dela elaborar um material tangível capaz de

estimular os mais diversos modos da percepção humana?

2.1 REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DA ÉTICA

Procurando respostas para esta questão encontramos, no contexto das

teorias pedagógicas, alguns elementos para a orientação de nossas reflexões, na

medida em que buscamos um corpo utilitário que abrigue nossas abstrações.

Tomando como referência a metodologia adotada pelo sistema educacional

que, em observação às diretrizes dos Parâmetros Curriculares Nacionais, tenta,

através de (pseudo)dinâmicas interdisciplinares, ou por (pseudo)abordagens de

temas transversais, ou ainda, pela velha e tradicional aula expositiva (recurso usado

pela maioria), explorar os conceitos e aplicações da Ética no sentido de sensibilizar

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a massa de aprendizes para as questões da cidadania, a partir do conhecimento da

justiça, do respeito mútuo, da solidariedade e do diálogo (PCN, 1998, p.45),

deduzimos que a práxis de tais métodos, em verdade, tem se mostrado estéril, dado

os resultados obtidos.

O princípio da educação bancária é totalmente conflitante com a natureza da

disciplina, visto que a estrutura curricular, que contempla essa metodologia, parece

ser incapaz de dar conta das demandas de ordem pragmática, exigidas na

aprendizagem. O currículo não pode ser interpretado apenas como uma reunião de

conteúdos inscritos nas disciplinas, mas, como um conjunto dos vários modos

de aprendizagem, que observe não somente as estabelecidas pelo processo de

formal de escolarização, entendido como currículo real, mas também por novas

formas de abordagem de valores adquiridos nas vivências comunitárias, das quais

integram todo o contingente escolar, e que estão subtendidas por um

“currículo oculto”. (LIBÂNEO, 2004, p.173)

No entanto, o conjunto dos elementos contemplados pelo “currículo oculto”,

do qual, em parte, integra o exercício da Ética, na prática, são tratados a partir de

abordagens casuais, o que não garante a efetividade da aprendizagem, pois, carece

de elaborações. É necessário, portanto, perceber a dimensão orgânica do processo

educacional, e suas implicações, para entender as exigências da

interdisciplinaridade como elemento fundamental ao exercício do ato comprometido,

que resulta da capacidade de atuar e refletir, obtida pela aprendizagem

interdisciplinar, tão bem concebida por Paulo Freire (1983, p.77).

“O elemento decisivo na opção interdisciplinar de Freire, entretanto, é a

centralidade que atribui ao sujeito da educação e sua compreensão do caráter

complexo desse sujeito” (PUIGGRÓS, 1999, p.110), o que justifica uma proposição

exploradora dos conteúdos abstratos da Ética que deles retire elementos concretos,

capazes de serem assimilados pelos mais diversos padrões de percepção humana.

Freire, assim, nos abre caminho para uma abordagem empírica do universo

complexo da Ética, a partir de dinâmicas interdisciplinares, que elegem o aprendiz

como sujeito central da aprendizagem, considerando sua complexidade e replicando

esta ação em cada participante deste processo.

Ainda, segundo Freire (1996, p.41), o conceito de ética é função de uma

relação onde o eu é reconhecido no outro e, para tanto, se faz necessário descobrir

o outro em toda a sua dimensão, completa Ruscheinky (2002, p.81).

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Na reflexão oriunda da contribuição freireana, fica evidenciado que são as relações que envolvem o ser humano no desenvolvimento de sua existência (...) A educação ambiental que defendemos tem como principal tarefa a de desvendar essas relações, tornando-as o quanto mais claras possíveis, para que as ações e decisões dos sujeitos sejam o mais corretas possíveis. O espaço primordial onde isso tende a suceder-se será justamente o espaço da ética. (RUSCHEINSKY, 2002, p.81)

Por este motivo é imprescindível a definição de um ambiente relacional a fim

de tornar possível a prática e a reflexão sobre ética. Neste sentido, a escola constitui

o fórum, por excelência, de tais atividades, como o Ministério da Educação, em seu

documento de Introdução aos Parâmetros Curriculares, destaca a necessidade de

caracterizar a escola como um espaço de vivência construtiva e não uma mera

instituição informativa:

A necessidade de que a educação trabalhe a formação ética dos alunos está cada vez mais evidente. A escola deve assumir-se como um espaço de vivência e de discussão dos referenciais éticos, não uma instância normativa e normatizadora, mas um local social privilegiado de construção dos significados éticos necessários e constitutivos de toda equalquer ação de cidadania, promovendo discussões sobre a dignidade do ser humano, igualdade de direitos, recusa categórica de formas de discriminação, importância da solidariedade e observância das leis. (PCN, 1998, p.16)

Observamos, porém, que a teoria se encontra muito longe da prática, de onde

se deduz haver uma inaptidão ética da própria estrutura educacional.

O que fazer, então, para que a escola se aproprie de uma pedagogia

vivificante, com práticas eficientes de ensino da Ética?

2.2 ÉTICA E CONSCIÊNCIA AMBIENTAL

Na busca de um argumento que atenda à questão anterior, identificamos

alguns tópicos que estão intimamente relacionados ao tema, dentre eles, a

Consciência Ambiental.

Podemos nos arriscar numa definição de consciência ambiental dizendo que

se trata do conhecimento ético adquirido no exercício de interação com o meio

ambiente. O estabelecimento desta relação pressupõe a existência de fatores

condicionantes dos mútuos objetivos, como troca, sustentabilidade e

desenvolvimento.

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A consciência ambiental é, pois, uma percepção de valores derivada de um

processo orgânico, denominado vivência, do qual se absorve uma compreensão

sistêmica, e não fragmentada, da realidade vivenciada. Portanto, o modelo estrutural

deste processo de aprendizagem está montado nos princípios da

multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transversalidade da abordagem do

conhecimento.

O ensino, inclusive o ensino formal, a consciência pública e o treinamento devem ser reconhecidos como um processo pelo qual os seres humanos e as sociedades podem desenvolver plenamente suas potencialidades. O ensino tem fundamental importância na promoção do desenvolvimento sustentável e para aumentar a capacidade do povo para abordar questões de meio ambiente e desenvolvimento. Ainda que o ensino básico sirva de fundamento para o ensino em matéria de ambiente e desenvolvimento, este último deve ser incorporado como parte essencial do aprendizado (ONU/CNUMAD, 2001, p.239)

Ora, isto nos faz lembrar de tudo o que já dissemos a respeito da Ética, e nos

faz concluir que há uma enorme similaridade conceitual entre o sentido desta e o da

Consciência Ambiental. Se tomarmos, por exemplo, o conceito de Ecologia Profunda

(CAPRA, 1997, p.25) observaremos que a definição de ética, formulada por Freire

(1996), se ajusta perfeitamente, ressaltando o caráter relacional de ambos.

Portanto, é evidente que a idéia da consciência ambiental só é concebível

como um processo de ética aplicada, assim como o conceito de visão só faz sentido

diante da aplicação da luz. Esta íntima e indissolúvel relação nos desperta para as

possibilidades de manejo sobre um elemento, intencionando obter resultados no

outro, como, analogamente, interferimos no universo microscópico a partir da

manipulação de elementos macroscópicos. Deste modo, podemos tratar das

questões ambientais a partir do ensino da Ética, pois sabemos que, para o

desenvolvimento da consciência ambiental, o entendimento ético é essencial, mas,

poderíamos, percorrendo o caminho inverso, despertar a percepção ética a partir da

educação ambiental?

2.3 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL E O ENSINO DA ÉTICA

“Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o

indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades,

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atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de

uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.”

(Lei 9.795 - Art.1º)

A conservação do meio ambiente é, portanto, seu objetivo primeiro, mas, o

recurso para tanto consiste da conscientização ambiental. Ora, se uma sociedade

possui formação ética, obviamente dispensa qualquer esforço de preservação do

meio ambiente. Salientamos, ainda, que qualquer desenvolvimento obtido no campo

da Ética, implica, não só em ganhos ambientais, mas de todo um contexto social.

Isto nos conduz a uma mudança de foco, entendendo se tratar de uma questão

interpretativa de tais conceitos, ou seja, de identificação epistemológica da

hierarquia dos respectivos valores.

Não existe uma saída fácil para o problema ético da educação ambiental. Muito menos uma saída unilateral ou unidirecional. Mas existem caminhos capazes de apontar perspectivas para pensarmos a dimensão ética da educação ambiental (...) A hermenêutica apresenta-se como uma abordagem privilegiada para tratar esse “limiar epistemológico” da educação ambiental. (GRÜN, 1996, p.101)

Diante disto, entendemos ser a Ética, a grande meta da humanidade, cuja

conscientização ambiental, além de garantir a qualidade do nosso bem natural,

constitui um fator importantíssimo para a formação da consciência ética. Assim, aqui

invertemos o sentido habitual da abordagem sobre conscientização ambiental em

função de uma consciência ética, entendendo que esta última se faz a partir do

exercício da primeira.

Dito isto, nos resta identificar o modo de transferência de uma consciência

para outra e, neste sentido, o processo de abordagem interdisciplinar parece atender

à necessidade:

Um trabalho de conscientização ambiental perpassa obrigatoriamente pela visão holística de Homem. Nesta visão, a interdisciplinaridade faz-se necessária. Torna-se fundamental a contribuição da Filosofia, melhor dizendo, do filosofar, enquanto modo de refletir a respeito de sim próprio e do mundo; das Artes, como representações do mundo humano; das Ciências Biológicas e Ambientais, estudo da própria vida e das relações entre seres; da Educação Física, como consciência do corpo no mundo; das Ciências Sociais, como permanência e dinâmica do homem na vida, a sociedade. Todas têm um peso extraordinário nesse trabalho de conscientização, pois só assim pode-se perceber de que forma o homem constrói sua história, sua vida e sua morte. (BRANCO, 2003, p.12)

Mais uma vez observamos a similaridade entre os mecanismos de

abordagem do ensino da Ética e da Educação Ambiental, o que ratifica a nossa

posição anterior. A concepção pedagógica de exploração destes temas tende a

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obedecer ao mesmo princípio holístico de interpretação dos fenômenos humanos e,

portanto, a traçar diretrizes metodológicas semelhantes que, por vezes, se

confundem:

Como a realidade funciona de um modo sistêmico em que todos os fatores interagem, o ambiente humano deve ser compreendido com todos os seus inúmeros problemas. Tratar a questão ambiental, portanto, abrange toda a complexidade da ação humana: se quanto às disciplinas do conhecimento ela é um tema transversal, interdisciplinar, nos setores de atuação da esfera pública ela só se consolida numa atuação do sistema como um todo, sendo afetada e afetando todos os setores: educação, saúde, saneamento, transportes, obras, alimentação, agricultura, etc. (PCN, 1998, p.23)

Uma metodologia que observe tais similaridades conceituais e uma

orientação hierárquica dos valores socioambientais, se utilizando, para tanto, de

uma abordagem interdisciplinar, surge com o nome de Ecopedagogia, que, tendo

como fundamento a viabilização de uma consciência ética planetária, vem

desenvolvendo procedimentos sintonizados com o ideal preconizado pela Ecologia

Profunda.

Essa nova pedagogia reforça a idéia de que o planeta Terra é um organismo vivo. De acordo com ela, é através do ensino de que os seres vivos e o planeta dependem um do outro para co-evoluirem e continuarem a existir que o ser humano conseguirá desenvolver uma sociedade planetária, que tenha responsabilidade e comprometimento perante todas as formas de vida. (SILVA, 2009, p.149)

A Ecopedagogia não se limita, portanto, a um conjunto de métodos voltados

para o exercício de uma educação ambiental, mas, constitui uma ferramenta de

“utilidade ética”, cujo objetivo maior é a construção de uma sociedade consciente de

sua integração com um planeta vivo que, como tal, exige uma relação ética entre

cultura e natureza (Carta da Terra, Cacique Seatle, 1854).

O ensino da Ética dispõe aqui dos mais consistentes recursos pedagógicos

para uma efetiva aprendizagem dos seus conceitos e, sobretudo, de sua

aplicabilidade, de tal modo que a Ecopedagogia poderia ser intitulada de

Eticopedagogia, sem que exigisse maiores adequações estruturais para atender à

demanda curricular.

Portanto, não se trata de “reinventar a roda”, dada a existência de eficientes

recursos pedagógicos, mas, de esclarecimento epistemológico sobre as

consciências ética e ambiental e suas respectivas dimensões e valores. A partir

desta perspectiva, entendemos ser possível reunir elementos para a formação

efetiva de uma sociedade mais consciente, mais equilibrada, mais comprometida;

promotora de inter-relacionamentos éticos que se traduzem em produções auto-

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sustentáveis para a própria sociedade e para o meio ambiente como um todo

indissolúvel.

3 CONCLUSÃO

As reflexões registradas neste artigo perpassam por distintos campos do

conhecimento, tais como a Filosofia, a Pedagogia e o Meio Ambiente, na intenção

de alinhavar um trajeto que conduza nossos propósitos de ensino da Ética a um

âmbito de efetiva aprendizagem.

Neste sentido, acreditamos que as incursões por estes universos nos

trouxeram boas referências para exercícios junto às dinâmicas pedagógicas de

ensino da Ética, além de nos proporcionar maior esclarecimento sobre as

possibilidades de uma Filosofia aplicada.

Por fim, entendemos que a Educação Ambiental constitui um recurso

inesgotável de apoio à aprendizagem de diversos conhecimentos, visto que sua

metodologia de abordagem interdisciplinar favorece o exercício da reflexão sobre os

procedimentos, fundamental à efetividade do ato responsável.

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