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Sistemas de Produção A Produtividade no Chão de Fábrica ATENÇÃO: Em função do término do contrato de edição do livro, estou disponibilizando o material do mesmo. Este material é o original do livro editado pela Bookman, alguns trechos podem ter sido modificados em função das correções e/ou alterações na edição final do livro. Prof. Dalvio Ferrari Tubino, Dr. [email protected]

A produtividade-no-chao-de-fabrica

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Sistemas de Produção

A Produtividade

no Chão de Fábrica

ATENÇÃO: Em função do término do contrato de edição do livro, estou

disponibilizando o material do mesmo. Este material é o original do livro

editado pela Bookman, alguns trechos podem ter sido modificados em

função das correções e/ou alterações na edição final do livro.

Prof. Dalvio Ferrari Tubino, Dr. [email protected]

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

ii

Sumário

Abreviaturas e siglas empregadas iv

Prefácio

1 Os sistemas de produção

1.1 Introdução

1.2 Planejamento estratégico e estratégia produtiva

1.2.1 Critérios estratégicos da produção

1.2.2 Áreas de decisão na produção

1.3 A filosofia JIT/TQC

1.4 Classificação dos sistemas de produção

1.5 Um modelo genérico para os sistemas de produção

2 Produção focalizada

2.1 Introdução

2.2 Focalização nos processos de fabricação repetitiva em lotes

2.2.1 Configuração das células de fabricação

2.3 Focalização nos processos de montagem

2.4 Focalização na armazenagem e movimentação

3 Planejamento e controle da produção JIT

3.1 Introdução

3.2 Características gerais do PCP na produção JIT

3.3 Plano-mestre na produção JIT

3.4 Nivelamento do plano-mestre à demanda

4 Sistema kanban

4.1 Introdução

4.2 Tipos de cartões kanban

4.2.1 Cartão kanban de produção

4.2.2 Cartão kanban de requisição interna

4.2.3 Cartão kanban de fornecedor

4.2.4 Painel porta-kanban

4.2.5 Outros tipos de kanbans

4.3 Funcionamento do sistema kanban

4.3.1 Sistema kanban com dois cartões

4.3.2 Sistema kanban com um cartão

4.3.3 Sistema kanban com fornecedores

4.4 Cálculo do número de cartões kanban

4.5 Funções executadas pelo sistema kanban

4.6 Pré-requisitos para o funcionamento do sistema kanban

5 Redução dos lead times produtivos

5.1 Introdução

5.2 Melhoria nos tempos de espera

5.2.1 Melhoria no tempo de programação da produção

5.2.2 Melhoria no tempo de espera na fila

5.2.3 Melhoria no tempo de espera no lote

5.3 Troca rápida de ferramentas

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

iii

5.3.1 Identificar e separar o setup interno do externo

5.3.2 Converter o setup interno em externo

5.3.3 Simplificar e melhorar os pontos relevantes

5.3.4 Eliminar o setup

5.4 Melhoria nos tempos de processamento

5.5 Melhoria nos tempos de inspeção

5.6 Melhoria nos tempos de transporte

6 Padronização das operações e polivalência

6.1 Introdução

6.2 Tempo de ciclo

6.3 Operações padrões

6.4 Rotina de operações padrão

6.5 Quantidade padrão de materiais

6.6 Polivalência

7 A cadeia logística JIT

7.1 Introdução

7.2 Desenvolvimento de fornecedores JIT

7.3 Diminuição da base de fornecedores

7.4 Integração da produção com o fornecedor

7.4.1 Planejamento e programação da produção conjuntos

7.4.2 kanban com fornecedores

7.4.3 Troca eletrônica de documentos (EDI)

7.4.4 Pedidos em aberto

7.4.5 Redução das funções de expedição/recepção

7.4.6 Contabilidade simplificada

7.4.7 Engenharia simultânea

7.5 Participação dos transportadores no processo de parcerias

Referências Bibliográficas

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

iv

ABREVIATURAS E SIGLAS EMPREGADAS

5S – Organização, arrumação, limpeza, padronização e disciplina

AGVs – Veículos Auto Guiáveis

Andons – Dispositivos sinalizadores

Autonomação – Controle autônomo de defeitos

Buffers – Estoques protetores

CAD – Desenho ajudado pelo computador

CAE – Engenharia ajudada pelo computador

CAM – Manufatura ajudada pelo computador

CAPP – Planejamento do processo ajudado pelo computador

CCQ – Círculos de Controle de Qualidade

CEP – Controle estatístico do Processo

CIM – Manufatura integrada pelo computador

CNC – Controle por comando numérico

EDI – Troca eletrônica de documentos (Eletronic Data Interchange)

ERP – Planejamento dos recursos do negócio (Enterprise Resource Planning)

Extranets – Redes de caracter fechado entre empresas

Gargalos – Limitações do sistema produtivo

GPS – Sistema de localização via satélite (Global Positioning System)

ISO – International Standardization Organization

Jidoka – Autonomação ou controle autônomo dos defeitos

JIT – Justo no tempo (Just in Time)

Kaizen - Melhoramento contínuo

Kanban – Sistema puxado de programação e acompanhamento da produção

Layout – Instalações industriais

Lead time – Tempo de passagem ou atravessamento

Linha stop-and-go – linha de velocidade controlada

Mix – Variedades

MOD – Mão de obra direta

MP – Matérias primas

MRP – Planejamento das necessidades de materiais (Material Requirements Planning)

MRP II – Planejamento dos recursos de manufatura (Manufacturing Resource Planning)

NQA – Nível de Qualidade Aceitável

OC – Ordens de compra

OJT – Treinamento no chão de fábrica (on-the-job-treining)

OM – Ordens de montagem

OTED – Troca de ferramentas em um toque (One Touch Exchange of Die)

P&D – Pesquisa e Desenvolvimento

PA – Produtos Acabados

PC – Peças componentes

PCP – Planejamento e Controle da Produção

PFA – Análise do fluxo de produção

PMP – Plano-mestre de Produção

Poka-yoke – Dispositivos à prova de erros

RM – Requisição de materiais

Setup – Troca de ferramentas ou preparação

Sistema on line – Sistema em tempo real

SMED – Troca de ferramentas em minutos (Single Minute Exchange of Die)

Software – Programa computacional

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

v

Staff – Pessoal de apoio

Supermercados – Estoques focalizados de kanbans

TC – Tempo de ciclo

TG – Tecnologia de grupo

TP – Tempo disponível para a produção diária

TQC – Controle Total da Qualidade

TRF – Troca rápida de ferramentas

TX – Taxa de produção

WIP – Materiais em processo (Work in process)

Yo-I-Don – pronto-colocado-adiante

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

vi

Dedico esse trabalho as pessoas que conseguem

Enxergar em um copo meio vazio

O potencial de enchê-lo

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

vii

PREFÁCIO

A capacidade humana de criar é impressionante. Sem dúvida ela é a mola precursora do

desenvolvimento da humanidade. Dentro da engenharia de produção o surgimento de novos

“paradigmas” para enfrentar os “mercados globalizados” é tema de discussão constante nos

congressos quando se trata de sistemas de produção. Tenho visto muitos trabalhos de pós-graduação

tratarem desse tema e livros sendo editados. O único problema é que antes de gerar os “novos”

devemos entender muito bem o que são os “velhos paradigmas”, até para evitar que palavras de

efeito com “reengenharia” ou “automação” tirem o sono de alguém.

Nesse sentido, como o título sugere, esse livro tem por objetivo discutir as técnicas de

produtividade no chão de fábrica, tratando dos bons e velhos paradigmas relacionados com a

filosofia JIT/TQC. Nem todas as empresas podem (e devem) destruir seus sistemas produtivos

atuais e montar outros totalmente novos, principalmente as de médio e pequeno porte. A prática tem

mostrado que as técnicas de produção Just In Time (JIT) e as ferramentas da Qualidade Total

(TQC) são de ampla aplicação e fazem com que os sistemas produtivos evoluam continuamente em

termos de qualidade, flexibilidade, redução de custos e desempenho de entrega.

Visando evitar a criação de novos termos, procurei manter o nome histórico de sistemas de

produção JIT, até porque o termo Just In Time diz muito do que se espera de um sistema de

produção eficiente. Dentro dele é fácil identificar as ferramentas gerenciais desenvolvidas pelos

mestres japoneses Taiichi Ohno e Shigeo Shingo, que compõem o conhecido Sistema Toyota de

Produção e que deu origem a vários termos como: produção enxuta, fabricação classe universal,

sistema de produção sem estoques, etc. Apesar de ser mais comum tratar a questão de modo

inverso, busquei durante todo o texto apresentar as técnicas de produção JIT como catalisadoras

para a efetiva implantação do TQC. Por não ser o objetivo desse livro, não entrei em detalhes sobre

as ferramentas da qualidade total.

No sentido de facilitar o entendimento da lógica de funcionamento do sistema de produção

JIT, o livro está estruturado em sete capítulos interrelacionados. No primeiro capítulo procuro

apresentar as questões que dão forma aos sistemas de produção, como o planejamento estratégico e

a estratégia produtiva, os princípios da filosofia JIT/TQC e as diferentes formas de classificá-los.

Ao final do primeiro capítulo proponho um modelo genérico para os sistemas de produção JIT.

O capítulo 2 trata da estrutura física do sistema de produção JIT, aqui chamada de produção

focalizada. A produção focalizada é a forma mais racional de dividir um sistema produtivo através

da criação de unidades de negócios com foco em uma gama restrita de produtos. Procuro descrever

a produção focalizada segundo a ótica dos processos de fabricação repetitiva em lotes com a

configuração de células de fabricação, e segundo a ótica dos processos de montagem com a

configuração de linhas de montagem celulares. Comento também a focalização na armazenagem e

movimentação dos materiais.

No capítulo 3 discuto as particularidades do planejamento e controle da produção segundo a

ótica do JIT. Essa discussão é importante para se entender como o sistema de produção JIT, ao

desenvolver sua funções de longo, médio e curto prazos, trata as variáveis estruturais da produção

(demanda, capacidade produtiva, tempo de ciclo, estoques, etc.) no sentido de buscar a flexibilidade

no atendimento das necessidades dos clientes. Dentro desse contexto apresento as diferenças entre

puxar e empurrar um programa de produção. Complementando esse terceiro capítulo, procuro

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

viii

descrever a importância do plano-mestre de produção no contexto do JIT e seu nivelamento com a

demanda como forma de estabilizar os programas de curto prazo.

Dedico o capítulo 4 totalmente ao sistema kanban de programação e acompanhamento da

produção JIT. Por ser extremamente simples e fácil de implantar, o sistema kanban de puxar a

produção é a ferramenta mais difundida do sistema de produção JIT, contudo nem sempre ela é

entendida e aplicada corretamente. Apresento nesse capítulo os tipos de cartões, as regras de

funcionamento, o cálculo do número de cartões, as funções executadas pelo sistema e os pré-

requisitos necessários para seu funcionamento.

No capítulo 5 tenho por intento descrever como os sistemas de produção JIT agem no

sentido de reduzir os lead times produtivos. Para que um sistema seja justo no tempo ele deve

converter rapidamente as matérias primas em produtos acabados. Nesse sentido, procuro discutir

como o sistema de produção JIT se propõem a acelerar essa conversão dividindo a análise dos

tempos produtivos em tempos gastos com esperas (na programação da produção, nas filas, no lote),

com processamento, com inspeção e com transporte. Para dar sustentação à redução dos lead times,

introduzo dentro desse capítulo os conceitos de troca rápida de ferramentas para a produção

econômica de pequenos lotes, e de autonomação e dispositivos a prova de erros para a inspeção

100%.

Reservo para o capítulo 6 a discussão de como deve ser realizada a distribuição dos

trabalhos pelos operadores dentro de um sistema de produção JIT. Sem entrar em questões que

devem ser aprofundadas pela área de recursos humanos das empresas, procuro mostrar a

importância da polivalência e da distribuição de rotinas de operações padrões pelos operadores na

lógica de flexibilidade da produção JIT. Dessa forma, defino e exemplifico os pontos que irão

compor a folha de operações padronizadas, como o tempo de ciclo, as operações padrões, a rotina

de operações padrão e a quantidade padrão de materiais.

No último capítulo busco expandir os conceitos de sistemas de produção JIT para a cadeia

produtiva como um todo, gerando o que chamo de uma cadeia logística JIT. Apesar a área de

logística ter suas ferramentas próprias, procuro associar o desenvolvimento e a diminuição da base

de fornecedores, a integração da produção do cliente com o fornecedor e a participação dos

transportadores nos processos de parcerias com uma visão otimizada de cadeia produtiva JIT.

Sem esgotar todos os assuntos na esfera de ação da filosofia JIT/TQC, busco com esses sete

capítulos fornecer uma visão ampla e coordenada sobre esse importante tema da administração da

produção. Como professor universitário meu objetivo foi também de limitar o conteúdo para que

possa ser ministrado durante uma disciplina. Para aprofundar mais os assuntos aqui apresentados

listo ao final do meu livro uma gama de outros livros, muitos deles dos próprios idealizadores das

ferramentas aqui apresentadas, utilizados como importante fonte de referência.

Assim como procedi no meu livro anterior sobre planejamento e controle da produção,

coloco à disposição dos colegas professores dispostos a adotar esse livro como texto de auxílio para

suas aulas um arquivo contendo um conjunto de transparências de cada capítulo. Para tanto, solicito

que o colega professor entre em contato comigo por telefone (048-331-7052) ou e-mail

([email protected]) para proceder ao download do arquivo.

Finalizando, como coloca o mestre Shingo, mais importante do que ter o “know-how” (saber

como) para implementar um novo sistema de produção, é ter o “know-why” (saber o porquê) desse

sistema. Com isso as adaptações, e evoluções, necessárias nas aplicações práticas ficam mais fáceis

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

ix

de serem feitas. Espero que ao final da leitura desse livro, eu tenha contribuído para aumentar o

entendimento não só de como implantar um sistema JIT mas, principalmente, do porquê implantá-

lo. Por último, agradeço a todas as pessoas que de forma direta, ou indireta, contribuíram para sua

realização, e, convicto do princípio de melhoramento contínuo, me coloco a disposição para corrigir

inevitáveis erros que essa obra ainda contenha.

Prof. Dalvio Ferrari Tubino, Dr. [email protected]

Departamento de Engenharia de Produção

Universidade Federal de Santa Catarina

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Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

1 OS SISTEMAS DE PRODUÇÃO

O capítulo 1 tem por finalidade apresentar os conceitos gerais associados aos sistemas de

produção. Inicialmente, discorre-se sobre a influência da globalização na competitividade

industrial das empresas que atuam no Brasil. Em seguida, apresenta-se a estrutura do

planejamento estratégico e sua relação com a estratégia de produção, dando-se ênfase aos

critérios estratégicos da produção e as áreas de decisões dentro dos sistemas de produção.

Essas questões servem de base para a apresentação da filosofia JIT/TQC e seus princípios

gerais de ação. No sentido de entender as diferentes formas de aplicação dessa filosofia, os

sistemas de produção são classificados segundo várias óticas, que permitem, ao final do

capítulo, a montagem de modelos genéricos dos sistemas de produção convencional e Just In

Time. Esses modelos genéricos serão empregados com referência para apresentação das

diversas técnicas de produção durante os demais capítulos de livro.

1.1 INTRODUÇÃO

À semelhança dos seres vivos, pode-se dizer que as empresas são organismos com vida

própria (possuem até uma "cultura interna"), em constante transformação (evolução das espécies),

sujeitos as leis do mercado (da natureza). Quanto mais livre e dinâmico esse mercado for, mais forte

e resistente essas empresas serão, pois terão que conviver diariamente com oportunidades e ameaças

ao seu desempenho produtivo.

Conforme o passado demonstra, as empresas, uma vez criadas, possuem um tempo de vida

relativamente curto, principalmente em mercados competitivos. Nos EUA a vida média de empresas

de capital aberto é de 45 anos, e a das empresas familiares é de 24 anos. Somente duas das 25

maiores empresas que atuavam no início desse século na economia americana sobrevivem até hoje

(a GE e a US Steel).

Na economia brasileira, apesar do protecionismo nacionalista que imperou durante muito

tempo, a situação não é diferente. Conforme dados anuais da publicação das "Melhores e Maiores"

da Revista Exame (KANITZ, 1993 : 43), das 500 maiores empresas que operavam no Brasil em

1973, quando foi publicado pela primeira vez esse anuário, apenas 223 empresas (44,6%)

sobreviveram na lista 20 anos, ou seja, até o ano de 1992. Além disso, das que sobreviveram, apenas

95 delas (19%) melhoraram de posição entre as 500 empresas.

A pergunta que fica no ar é: o que levou essas empresas a desaparecerem? Com certeza a

resposta a esse dilema é complexa. Uma parte dessa resposta pode estar associada à fatores externos

a empresa, como por exemplo, o acontecido recentemente com fabricantes de implementos

agrícolas no Brasil, onde dois anos de condições climáticas adversas, associados à redução do

crédito agrícola governamental, fez com que a demanda por seus produtos caíssem a níveis

insuportáveis.

Porém, um outro lado dessa resposta está relacionado a como as empresas administram seus

recursos financeiros, tecnológicos e de gestão para fazer frente as ameaças do mercado. É dentro

desse campo que esse trabalho pretende atuar. Serão discutidos aqui que princípios e técnicas os

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Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

2

sistemas produtivos devem valorizar para administrar de forma lucrativa seus recursos e conter

essas ameaças.

Um ponto importante para o início dessa discussão está associado com a questão da

administração, ou não, dos preços dos produtos ofertados ao mercado. Em economias fechadas à

concorrência externa, como a brasileira foi até início dos anos noventa, as empresas estabeleciam

seus preços a partir da colocação de uma margem de lucro sobre seus custos, conforme pode-se ver

na Equação (1.1) abaixo.

Preço = Custo + Lucro (1.1)

Dessa forma, quando ocorriam aumentos de custos, como, por exemplo, um aumento salarial

reivindicado pelo sindicato da indústria metalúrgica, os representantes da indústria automobilística

nacional se reuniam com representantes do governo e justificavam o aumento de preço no produto,

pelo aumento de seus custos. Geralmente, essas reivindicações eram aceitas e apresentadas como

justas pelo governo, sobrando para os consumidores pagarem a conta. É lógico que dentro dessa

sistemática de preços administrados, as empresas não eram estimuladas à reduzirem seus custos

produtivos, muito menos a melhorarem a qualidade, e, caso isso fosse obtido, apenas serviria para

incrementar seus lucros.

Com a "globalização" da economia, as empresas se viram diante de uma nova situação: não

é mais possível administrar os preços. Na mesa de negociação não cabem todas as empresas que

participam do mercado, fazendo com que o preço dos produtos sejam estabelecidos pela lei da

oferta e procura. Dessa forma, a equação de formação de preços (1.1), apesar de manter as mesmas

variáveis, transformou-se na Equação (1.2) de formação do lucro.

Lucro = Preço - Custo (1.2)

Para a empresa obter lucros com esta nova equação, dado que o preço é fixado pelo

mercado, seu sistema produtivo deve, obrigatoriamente, trabalhar com custos abaixo do preço de

venda. Caso seus custos sejam tão altos que não permitam a remuneração através do lucro para o

capital investido, a empresa está fora desse mercado globalizado.

Dentro dessa nova ótica de concorrência é importante notar duas mudanças radicais

ocorridas no comportamento do mercado brasileiro: a redução das margens de lucro, e as fusões

estratégicas entre empresas.

Foi comprovada na prática a teoria de que as margens de lucro são menores num mercado

onde impera a livre concorrência. Dados levantados pelo BNDES (NETZ, 1997 : 24), de 1990 a

1995, identificaram que dos 38 setores mais importantes da economia nacional, 29 deles

apresentaram reduções nas suas margens de lucro nesse período, que coincide com a abertura da

economia brasileira. Além disso, nos setores onde essa competição foi maior (eletroeletrônico,

têxtil, vidro, motores e autopeças) as margens caíram de 30% a 50%.

É lógico que com essas quedas nas margens de lucro, muitas empresas que não tinham

sistemas de produção eficientes tiveram que mudar de ramo. No setor calçadista e têxtil, devido a

grande defasagem tecnológica, muitas empresas fecharam. Até mesmo empresas como a Metal

Leve, considerada como "ilha de excelência" em qualidade e tecnologia, operando no ramo de

autopeças, não foi capaz de acompanhar a redução dos preços pela concorrência (Mahle) em 30%

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Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

3

no período de 1993 a 1996, e acabou sendo comprada pela própria Mahle, associada ao Bradesco e

a Cofap. Em 1997 até a Cofap acabou trocando de dono.

A segunda mudança no panorama industrial brasileiro a partir da globalização da economia

está relacionada com o grande número de fusões e aquisições entre empresas nacionais e grandes

grupos multinacionais no sentido de obter recursos financeiros, tecnológicos e de gestão para fazer

frente a concorrência. Em 1996 ocorreram 329 fusões e aquisições entre empresas no Brasil. Por

exemplo, a Dako, tradicional fabricante de fogões populares, com 35% do mercado brasileiro,

vendo-se ameaçada pela entrada no mercado de novos concorrentes de peso, como Electrolux e

Bosch-Siemens, associou-se com a GE americana na busca de tecnologia de ponta para continuar

competitiva.

Segundo Corrêa e Gianesi (CORRÊA, 1993 : 16-21), a perda do poder de competitividade

das empresas nacionais deve-se em grande parte a obsolescência das práticas gerenciais e

tecnológicas aplicadas aos seus sistemas produtivos, tendo sua origem atribuída a cinco pontos

básicos, quais sejam: deficiência nas medidas de desempenho; negligência com considerações

tecnológicas; especialização excessiva das funções de produção sem a devida integração; perda de

foco dos negócios; resistência e demora em assumir novas posturas produtivas.

Conforme pesquisa sobre qualidade e produtividade realizada pelo IMAM (MOURA, 1996)

a cada três anos, confirmou-se novamente, na sua versão de 1996, que a indústria brasileira ainda

deixa muito a desejar em termos de desempenho produtivo quando comparada às empresas ditas

"classe mundial". Conforme pode ser visto na Tabela 1.1 (adaptada da referida pesquisa) os diversos

índices de desempenho produtivos deixam claro os temores da nossa indústria pela liberalização do

comércio internacional.

Tabela 1.1 Indicadores de desempenho da indústria (fonte: MOURA 1996).

Indicadores Brasil Média Mundial Japão

Valor Agregado 88 vezes 240 vezes 335 vezes

% investimentos em P&D 1,45% 3 a 5% 8 a 12%

Índice de Rejeição 20.380 ppm 200 ppm 10 ppm

Retrabalho Interno 3,7% 2% 0,001%

Setup de Fábrica 100 min. 10 min. 5 min.

Tamanho Médio dos Lotes 2900 peças 20 a 50 peças 1 a 10 peças

Lead time Médio 19 dias 2 a 4 dias 2 dias

Rotatividade dos Estoques 13 vezes/ano 60 a 70 vezes/ano 150 a 200 vezes/ano

Fatores relacionados com a sobrevivência das empresas em mercados altamente

competitivos estão ligados a forma como as organizações planejam estrategicamente seus negócios.

Infelizmente, no Brasil as empresas não contemplavam em seus planejamentos estratégicos as

questões associadas aos sistemas de produção, direcionando-os para as áreas de marketing e/ou

finanças, onde potencialmente, em mercados carterizados, os ganhos são rápidos e maiores.

A partir de agora as empresas se vêem forçadas a rever esta postura, e repensar em como

seus sistemas produtivos devem se posicionar estrategicamente para garantir vantagens em relação à

concorrência. Nesse sentido, esse capítulo buscará inicialmente ressaltar como deve ser realizado o

processo de planejamento estratégico e como as decisões no âmbito da produção devem ser

equacionadas para que as empresas atinjam os critérios de desempenho valorizados pelo mercado

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Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

4

consumidor onde deseja-se atuar. Em seguida, serão tratadas as questões relativas a montagem de

um sistema produtivo que busque operacionalizar essas decisões estratégicas dentro de um conceito

amplo de filosofia JIT/TQC.

1.2 PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO E ESTRATÉGIA PRODUTIVA

O planejamento estratégico busca maximizar os resultados das operações e minimizar os

riscos nas tomadas de decisões das empresas. O impacto de suas decisões são de longo prazo e

afetam a natureza e as características das empresas no sentido de garantir o atendimento de sua

missão. Para efetuar um planejamento estratégico, a empresa deve entender os limites de suas forças

e habilidades no relacionamento com o meio ambiente, de maneira a criar vantagens competitivas

em relação à concorrência, aproveitando-se de todas as situações que lhe trouxerem ganhos. Em

outras palavras, planejar estrategicamente consiste em gerar condições para que as empresas possam

decidir rapidamente perante oportunidades e ameaças, otimizando suas vantagens competitivas em

relação ao ambiente concorrencial onde atuam, garantindo sua perpetuação no tempo (TUBINO,

1997 : 33-43).

A partir da definição da missão corporativa, existem três níveis hierárquicos dentro de uma

empresa onde encontram-se estratégias de planejamento: o nível corporativo, o nível da unidade de

negócios e o nível funcional. O nível corporativo define estratégias globais, a estratégia

corporativa, apontando as áreas de negócios nas quais a empresa irá participar, e a organização e

distribuição dos recursos para cada uma dessas áreas ao longo do tempo, com decisões que não

podem ser descentralizadas. O nível da unidade de negócios é uma subdivisão do nível corporativo,

no caso da empresa atuar com unidades de negócios semi-autônomas. Cada unidade de negócios

teria uma estratégia de negócios, também chamada de estratégia competitiva, definindo como o seu

negócio compete no mercado, o desempenho esperado, e as estratégias que deverão ser conduzidas

pelas áreas operacionais para sustentar tal posição. O terceiro nível é o da estratégia funcional.

Nesse nível estão associadas as políticas de operação das diversas áreas funcionais da empresa,

consolidando as estratégias corporativa e competitiva. Esta relação de dependência pode ser

visualizada na Figura 1.1.

Como resultado da definição de uma estratégia funcional, são gerados os planos de ação

dentro das três áreas básicas da empresa: o plano financeiro, o plano de marketing e o plano de

produção. Esses planos serão detalhados e desmembrados a nível tático no sentido de fornecer os

métodos e a direção que os vários setores da empresa necessitarão para por em prática tal estratégia.

No âmbito do sistema de produção é montada uma estratégia produtiva, cuja função consiste

em definir um conjunto de políticas que dê sustento à posição competitiva da unidade de negócios

da empresa. A estratégia produtiva deve especificar como o sistema produtivo irá suportar uma

vantagem competitiva, e como ele irá complementar e apoiar as demais estratégias funcionais.

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Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

5

Estratégia Funcional

Finanças

Plano Financeiro

Marketing

Plano de Marketing

Produção

Plano de Produção

Missão

Estratégia Corporativa

Estratégia Competitiva

Táticas

Sistema Financeiro Sistema de Marketing Sistema de Produção

Figura 1.1 Visão geral do Planejamento Estratégico (TUBINO, 1987 : 34).

A definição de uma estratégia produtiva baseia-se em dois pontos chaves: as prioridades

relativas dos critérios de desempenho, e a política para as diferentes áreas de decisões da produção.

Nesse sentido, conforme visto na Figura 1.2, uma estratégia de produção consiste em estabelecer o

grau de importância relativa entre os critérios de desempenho, e formular políticas consistentes com

esta priorização para as diversas áreas de decisão.

Prioridades dosCritérios deDesempenho

Áreasde Decisão

Políticasda

Produção

Estratégiade

Produção

Figura 1.2 Definição de uma estratégia produtiva (TUBINO, 1997 : 39).

A seguir apresenta-se os principais critérios de desempenho empregados na produção, e,

posteriormente, as áreas de decisão onde a estratégia de produção deverá se posicionar.

1.2.1 Critérios estratégicos da produção

O objetivo da estratégia de produção é fornecer à empresa um conjunto de características

produtivas que dêem suporte à obtenção de vantagens competitivas de longo prazo. O ponto de

partida para isso consiste em estabelecer quais critérios, ou parâmetros, de desempenho são

relevantes para a empresa e que prioridades relativas devem ser dadas aos mesmos. Esses critérios

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Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

6

deverão refletir as necessidades dos clientes que se buscam atingir para um determinado produto de

maneira a mantê-los fieis à empresa.

De uma forma geral, os principais critérios de desempenho nos quais a produção deve agir

podem ser colocados em quatro grupos: custo, qualidade, desempenho de entregas e flexibilidade.

Na Tabela 1.2 é dada uma rápida descrição sobre cada um deles.

Atualmente, estão sendo considerados como critérios de desempenho desejáveis nos

sistemas de produção, além dos quatro básicos citados acima, a inovatividade e a não agressão ao

meio ambiente. A inovatividade corresponde a capacidade do sistema produtivo introduzir de forma

rápida em seu processo produtivo nova gama de bens e/ou serviços. A não agressão ao meio

ambiente, como o próprio nome já indica, consiste em se ter um sistema de produção integrado ao

meio ambiente. Já existem ações concretas da sociedade como um todo nesse sentido, visando

informar aos consumidores quais empresas são “amigas do meio ambiente”, com objetivo de

pressiona-las nessa direção.

Tabela 1.2 Descrição dos critérios de desempenho (TUBINO, 1997 : 40).

Critérios Descrição

Custo Produzir bens/serviços a um custo mais baixo do que a

concorrência.

Qualidade Produzir bens/serviços com desempenho de qualidade melhor

que a concorrência.

Desempenho de Entrega Ter confiabilidade e velocidade nos prazos de entrega dos

bens/serviços melhores que a concorrência.

Flexibilidade Ser capaz de reagir de forma rápida a eventos repentinos e

inesperados.

Como todo sistema de produção possui uma atuação de desempenho limitada pelas forças

estruturais que emprega, há necessidade de se priorizar e quantificar o grau de intensidade que se

buscará atingir em cada um dos critérios de desempenho citados. Em sistemas de produção

convencionais trabalha-se com a curva de troca (trade offs), ou seja, para aumentar o desempenho

de um critério, perde-se em outro. Um exemplo simplificado dessa situação é a troca entre a

qualidade e o custo, conforme ilustrado na Figura 1.3, onde para aumentar o nível de qualidade (de

A para B) de um sistema produtivo, acaba-se aumentando também o custo.

Atualmente porém, com os modernos conceitos de produtividade associados à filosofia

JIT/TQC, é possível incrementar um critério competitivo sem deteriorar os outros, como por

exemplo aumentar a qualidade e a flexibilidade sem perder em custos. Nesse sentido, parece ser

mais coerente tratar a questão de priorização dos critérios dentro da ótica de quais são qualificadores

e quais são ganhadores de pedidos. Os critérios qualificadores são aqueles que qualificam a empresa

à participar do mercado que pretende-se atingir, como por exemplo possuir o certificado ISO 9000

para exportar para a Europa. Já os critérios ganhadores de pedidos são aqueles que irão definir a

escolha do cliente pela empresa, uma vez que ela esteja qualificada. Nesse sentido, sempre que

atingido o nível mínimo exigido pelo mercado nos critérios qualificadores, a empresa deve trabalhar

na busca pela excelência nos critérios ganhadores.

Page 16: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

7

Qualidade

C

u

s

t

oA

B

Figura 1.3 Curva de troca entre critérios (TUBINO, 1997 : 41).

Segundo a nova ótica de mercados globalizados, os critérios custo e qualidade são requisitos

mínimos para que os sistemas produtivos participem desse mercado, sendo portanto qualificadores,

enquanto que os critérios desempenho de entrega e flexibilidade passam a ser o grande diferencial

entre os concorrentes, sendo portanto mais valorizados na definição de uma estratégia produtiva.

Uma vez definidos os critérios competitivos e priorizados, o passo seguinte dentro da

estratégia de produção consiste em definir as políticas de ação em cada uma das áreas de decisão do

sistema produtivo. A seguir serão apresentadas as principais áreas dentro de um sistema produtivo

onde o planejamento estratégico da produção deve agir.

1.2.2 Áreas de decisão na produção

Resumindo o exposto até agora, pode-se considerar a estratégia competitiva como a posição

competitiva da empresa em um ambiente concorrencial, e a estratégia de produção como um

conjunto coeso de políticas nas diversas áreas de decisão relativas ao sistema de produção que

sustentem esta posição competitiva. Na Tabela 1.3 estão apresentadas as principais áreas de decisão

nos sistemas de produção, bem como uma descrição das decisões que devem ser tomadas.

As políticas definidas para cada área do sistema de produção orientam a operação e evolução

desse sistema, portanto a formulação e implementação de uma estratégia de produção deve dar

consistência e coerência ao conjunto das decisões. Por exemplo, ao se priorizar o critério de

flexibilidade, as políticas de instalações, capacidade de produção e tecnologia devem privilegiar o

setup rápido e os pequenos lotes, com focalização da produção, e a política de recursos humanos

privilegiar a polivalência.

Na realidade, como existe uma relação intensa entre os sistemas de produção e o meio

ambiente onde ele está inserido, as decisões estratégicas devem ser entendidas como um processo

dinâmico, sofrendo alterações conforme o mercado e a concorrência forem se posicionando. A

Figura 1.4 procura ilustrar esta característica das decisões estratégicas. Conforme pode-se ver, cada

decisão estratégica num determinado momento é resultado da visão atual e futura da posição

Page 17: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

8

competitiva que a empresa deve seguir. A melhor alternativa é aquela que trouxer um bom resultado

para o momento, prejudicando o mínimo possível as alternativas futuras.

Tabela 1.3 Descrição das áreas de decisão (TUBINO, 1997 : 42).

Áreas de decisão Descrição

Instalações Qual a localização geográfica, tamanho, volume e mix de

produção, que grau de especialização, arranjo físico e forma

de manutenção.

Capacidade de Produção Que nível, como obtê-la e como incrementá-la.

Tecnologia Quais equipamentos e sistemas, com que grau de automação

e flexibilidade, como atualizá-la e disseminá-la.

Integração Vertical O que a empresa irá produzir internamente, o que irá comprar

de terceiros, e qual política implementar com fornecedores

Organização Qual a estrutura organizacional, nível de centralização,

formas de comunicação e controles das atividades.

Recursos Humanos Como recrutar, selecionar, contratar, desenvolver, avaliar,

motivar e remunerar a mão-de-obra.

Qualidade Atribuição de responsabilidades, que controles, normas e

ferramentas de decisões empregar, quais os padrões e formas

de comparação.

Planejamento e Controle

da Produção

Que sistema de PCP empregar, que política de compras e

estoques, que nível de informatização das informações, que

ritmo de produção manter e formas de controles.

Novos Produtos Com que freqüência lançar, como desenvolver e qual a

relação entre produtos e processos.

Posição Competitiva

Prioridades entre os critérios

de desempenho e políticas

de produção desejáveis

Estratégia de Produção atual

Alternativas de

Posições Competitivas

F

u

t

u

r

o

E

v

o

l

u

ç

ã

o

Figura 1.4 A dinâmica da estratégia de produção (TUBINO, 1997 : 43).

Page 18: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

9

A seguir serão tratadas as questões relativas a montagem de um sistema produtivo que

busque operacionalizar essas decisões estratégicas dentro de um conceito amplo de filosofia

JIT/TQC. Para tanto, inicialmente serão apresentados os princípios por trás dessa filosofia e, no

decorrer do trabalho, serão descritas as principais características técnicas de um sistema de produção

JIT moldado segundo esses princípios.

1.3 A FILOSOFIA JIT/TQC

A filosofia JIT/TQC surgiu no Japão na década de 60, sendo aplicada inicialmente na

indústria automobilística, em particular na Toyota Motors Company. Aos poucos os princípios

gerais dessa filosofia foram se consolidando, e seus conceitos difundidos para o ramo de autopeças

e eletrônica, onde o Japão passou a ser reconhecido como padrão de excelência. Nos anos 80, com o

avanço da economia japonesa, a filosofia JIT/TQC passou a receber maior atenção dos estudiosos

em sistemas de produção e a filosofia foi universalizada e implantada com sucesso no mundo

ocidental (TUBINO, 1997 : 44-46).

Alguns autores costumam apresentar separadamente os conceitos de JIT (just in time) e TQC

(controle total da qualidade). O JIT seria uma filosofia voltada para a otimização da produção,

enquanto o TQC seria uma filosofia voltada para a identificação, análise e solução de problemas

(considerando que qualquer problema é perda de qualidade). Porém, não parece conveniente separar

as questões de forma tão imediata, pois o JIT e o TQC possuem uma interface comum muito

grande, e a sua aplicação conjunta, proveniente de sua origem japonesa, parece ser a melhor

alternativa e será seguida nesse livro.

Como o assunto a ser tratado nesse trabalho está centrado no direcionamento dos sistemas

produtivos para a obtenção simultânea de aumento de desempenho nos critérios competitivos, nesse

momento serão apresentados apenas os principais conceitos estratégicos que estão por trás da

filosofia JIT/TQC, que na sua forma operacional são desmembrados em técnicas específicas,

resumidas na Tabela 1.4. No decorrer do livro as técnicas que compõem o sistema de produção JIT

serão detalhadas.

Satisfazer as necessidades dos clientes: satisfazer as necessidades dos clientes significa

entender e responder aos anseios dos clientes, fornecendo produtos de qualidade no momento em

que for solicitado. Entenda-se como clientes, tanto os participantes da cadeia produtiva interna

como os da cadeia externa à empresa. Existem várias maneiras de melhorar o relacionamento com

os clientes, pode-se citar algumas:

reduzir os custos internos dos clientes;

produzir pequenos lotes com qualidade;

ser flexível;

reduzir os estoques do cliente;

projetar em conjunto com o cliente etc.

Page 19: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

10

Tabela 1.4 Conceitos e técnicas da filosofia JIT/TQC (TUBINO, 1997 : 44).

Filosofia JIT/TQC

Satisfazer as necessidades do cliente

Eliminar desperdícios

Melhorar continuamente

Envolver totalmente as pessoas

Organização e visibilidade

JIT TQC

Produção focalizada;

Produção puxada;

Nivelamento da produção;

Redução de lead times;

Fabricação de pequenos lotes;

Redução de setups;

Manutenção preventiva;

Polivalência;

Integração interna e externa etc.

Produção orientada pelo cliente;

Lucro pelo domínio da qualidade;

Priorizar as ações;

Agir com base em fatos;

Controle do processo;

Responsabilidade na fonte;

Controle a montante;

Operações a prova de falha;

Padronização etc.

Eliminar desperdícios: eliminar desperdícios significa analisar todas as atividades

realizadas no sistema de produção e eliminar aquelas que não agregam valor ao produto. A

eliminação de tudo que não agrega valor ao produto implica em, inicialmente, identificar o que

acrescenta valor para o cliente do produto (informações úteis para melhorar o projeto e produção

dos bens/serviços), e em seguida o que não acrescenta valor. Uma classificação de desperdícios

bastante usada é a que os identifica em sete categorias:

desperdício de superprodução;

desperdício de espera;

desperdício de movimentação e transporte;

desperdício da função processamento;

desperdício de estoques;

desperdícios de movimentos improdutivos;

desperdícios de produtos defeituosos.

Melhorar continuamente: o princípio de melhoria contínua, conhecido como “Kaizen”

(IMAI, 1989), significa que nenhum dia deve se passar sem que a empresa melhore sua posição

competitiva. Todos dentro da empresa são responsáveis por isso, e devem trabalhar nesse sentido.

Dessa forma um problema, ou um erro, acontecido dentro do sistema deve ser visto como uma

oportunidade de melhoramento. É importante, sob a ótica do melhoramento contínuo, estabelecer

metas bastante otimistas, mesmo que inatingíveis, como forma de direcionar o incremento de

produtividade. As metas da filosofia JIT/TQC são:

zero de defeitos;

zero de estoques;

zero de movimentações;

zero de lead time;

zero de tempos de setups;

lotes unitários etc.

Page 20: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

11

Envolver totalmente as pessoas: praticamente todos os aspectos relacionados à filosofia

JIT/TQC requerem um envolvimento total das pessoas. Mudanças de atitude a nível humano são

solicitadas por toda a empresa, principalmente nos níveis gerenciais. A gerência deve travar um

compromisso pela participação das pessoas, desenvolvendo treinamentos contínuos em atividades

de equipes de trabalho, com o devido aporte financeiro. É importante deixar claro que as pessoas, e

não a tecnologia, são a prioridade número um da empresa.

Organização e visibilidade: a organização e a visibilidade do ambiente de trabalho é um

requisito fundamental da filosofia JIT/TQC. É o início da luta contra os desperdícios e a base para a

motivação das pessoas. A organização do ambiente de trabalho passa pela reformulação dos layouts

convencionais, pela definição de locais específicos para armazenagem de materiais em processo e

ferramentas, e pela própria postura dos funcionários ao seguirem os padrões de higiene e segurança.

A organização leva ao benefício da visibilidade dos problemas, de forma que qualquer situação

anormal seja óbvia.

Os princípios expostos acima, que no seu conjunto dão forma a filosofia JIT/TQC, não são

fáceis de serem implementados. Se o fossem, não dariam uma vantagem competitiva as empresas

que os alcançassem. Além do mais, a própria questão da busca pelo melhoramento contínuo

diferenciará as empresas que chegarem a soluções mais satisfatórias para seus problemas. O

importante é que nos dias de hoje a dicotomia entre o capital e o trabalho não é tão intensa, e está

perdendo espaço para a cooperação e divisão de resultados, o que tem levado as empresas a

aumentar sensivelmente sua produtividade, com conseqüente ganho para a humanidade como um

todo.

Antes de ser proposto um modelo de sistema produtivo baseado nesses princípios aqui

discutidos, convém abrir um parêntese para descrever as diferentes alternativas de composição dos

sistemas de produção, que irão influenciar a forma como os mesmos poderão se adequar à esta

filosofia.

1.4 CLASSIFICAÇÃO DOS SISTEMAS DE PRODUÇÃO

Existem várias formas de classificar os sistemas de produção, sendo que as mais conhecidas

são a classificação pelo grau de padronização dos produtos, pelo tipo de operação que sofrem os

produtos e pela natureza do produto. A classificação dos sistemas produtivos tem por finalidade

facilitar o entendimento das características inerentes a cada sistema de produção e sua relação com a

complexidade do planejamento e execução das atividades produtivas (TUBINO, 1997 : 27-31).

Segundo a ótica do grau de padronização dos produtos fabricados pelos sistemas produtivos

pode-se classificá-los como sistemas que produzem produtos padronizados, e sistemas que

produzem produtos sob medida. Produtos padronizados são aqueles bens ou serviços que

apresentam alto grau de uniformidade, são produzidos em grande escala, os clientes esperam

encontrá-los a sua disposição no mercado, seus sistemas produtivos podem ser organizados de

forma a padronizar mais facilmente os recursos produtivos (máquinas, homens e materiais) e os

métodos de trabalho e controles, contribuindo para uma maior eficiência do sistema, com

conseqüente redução dos custos. Dentro desse grupo estão incluídas a fabricação de bens como:

eletrodomésticos, combustíveis, automóveis, roupas, alimentos industrializados etc., e a prestação

de serviços como: linhas aéreas, serviços bancários, fastfoods etc.

Page 21: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

12

Os produtos sob medida são bens ou serviços desenvolvidos para um cliente em específico.

Como o sistema produtivo espera a manifestação dos clientes para definir os produtos, esses não são

produzidos para estoque e os lotes normalmente são unitários. Devido ao fato do prazo de entrega

ser um fator determinante no atendimento ao cliente, os sistemas que trabalham sob encomenda

possuem normalmente grande capacidade ociosa, e dificuldade em padronizar os métodos de

trabalho e os recursos produtivos, gerando produtos mais caros do que os padronizados. A

automação dos processos é menos aplicável visto que a quantidade produzida não justifica os

investimentos. Dentro da produção sob medida pode-se citar a fabricação de máquinas-ferramentas,

construção civil, alta costura, estaleiros etc., e a produção de serviços como restaurantes, taxis,

projetos arquitetônicos, clínicas médicas etc.

Os sistemas de produção podem ser classificados também segundo seu tipo de operação em

dois grandes grupos: processos contínuos e processos discretos. Esta classificação está associada ao

grau de padronização dos produtos e ao volume de produção demandada. Os processos contínuos

envolvem a produção de bens ou serviços que não podem ser identificados individualmente, e os

processos discretos envolvem a produção de bens ou serviços que podem ser isolados, em lotes ou

unidades, particularizando-os uns dos outros. Por sua vez, os processos discretos podem ser

subdivididos em processos repetitivos em massa, processos repetitivos em lotes, e processos por

projeto.

Os processos contínuos são empregados quando existe uma alta uniformidade na produção e

demanda de bens ou serviços, fazendo com que os produtos e os processos produtivos sejam

totalmente interdependentes, favorecendo a automatização, não existindo flexibilidade no sistema.

São necessários altos investimentos em equipamentos e instalações, a mão-de-obra é empregada

apenas para a condução e manutenção das instalações, sendo seu custo insignificante em relação aos

outros fatores produtivos. Estão classificadas dentro desse grupo a produção de bens de base, como

energia elétrica, petróleo e derivados, produtos químicos de uma forma geral etc. Alguns serviços

também podem ser produzidos dentro dessa ótica com o emprego de máquinas, como serviços de

aquecimento e ar condicionado, de limpeza contínua, sistemas de monitoramento por radar etc.

Os processos repetitivos em massa são aqueles empregados na produção em grande escala

de produtos altamente padronizados. Normalmente, a demanda pelos produtos são estáveis fazendo

com que seus projetos tenham poucas alterações no curto prazo, possibilitando a montagem de uma

estrutura produtiva altamente especializada e pouco flexível, onde os altos investimentos possam ser

amortizados durante um longo prazo. Nesse sistema produtivo a variação entre os produtos

acabados se dá geralmente apenas a nível de montagem final, sendo seus componentes padronizados

de forma a permitir a produção em grande escala. Convencionalmente, a “produção em massa”

emprega mão-de-obra pouco qualificada e pouco polivalente, porém com a implantação de sistemas

baseados na filosofia JIT/TQC esse quadro vem se modificando, devolvendo ao empregado funções

de gerenciamento do processo, como por exemplo a garantia da qualidade e a programação da

produção, que lhes foram retiradas com a especialização decorrente da revolução industrial. São

classificadas dentro desse grupo a fabricação de bens padronizados como automóveis,

eletrodomésticos, produtos têxteis, produtos cerâmicos, abate e beneficiamento de aves, suínos,

gado etc., e a prestação de serviços em grande escala como transporte aéreo, editoração de jornais e

revistas etc.

Os processos repetitivos em lote caracterizam-se pela produção de um volume médio de

bens ou serviços padronizados em lotes, sendo que cada lote segue uma série de operações que

Page 22: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

13

necessita ser programada a medida que as operações anteriores forem realizadas. O sistema

produtivo deve ser relativamente flexível, empregando equipamentos pouco especializados e mão-

de-obra polivalente, visando atender diferentes pedidos dos clientes e flutuações da demanda. Os

processos repetitivos em lote situam-se entre os dois extremos, a produção em massa e a produção

sob projeto, onde a quantidade solicitada de bens ou serviços é insuficiente para justificar a

massificação da produção e especialização das instalações, porém justifica a produção de lotes no

sentido de absorver os custos de preparação do processo. Como exemplo dos processos repetitivos

em lote pode-se citar a fabricação de produtos têxteis em pequena escala, sapatos, alimentos

industrializados, ferragens etc. e a prestação de serviços como oficinas de reparo para automóveis e

aparelhos eletrônicos, laboratórios de análise químicas, restaurantes etc.

Os processos por projeto têm como finalidade o atendimento de uma necessidade específica

dos cliente, com todas as suas atividades voltadas para esta meta. O produto tem uma data

específica para ser concluído e, uma vez concluído, o sistema produtivo se volta para um novo

projeto. Os produtos são concebidos em estreita ligação com os clientes, de modo que suas

especificações impõem uma organização dedicada ao projeto. Exige-se alta flexibilidade dos

recursos produtivos, normalmente a custa de certa ociosidade enquanto a demanda por bens ou

serviços não ocorrer. Exemplos de processos por projeto estão na fabricação de bens como navios,

aviões, usinas hidroelétricas etc., e na prestação de serviços específicos como agências de

propaganda, escritórios de advocacia, arquitetura etc.

Na Tabela 1.5 estão resumidas as principais características da classificação dos sistemas de

produção por tipos de operação.

Outra classificação para os sistemas de produção leva em conta a natureza do produto. Os

sistemas de produção podem estar voltados para a geração de bens ou de serviços. Quando o

produto fabricado é algo tangível, como um carro, uma geladeira ou uma bola, podendo ser tocado e

visto, diz-se que o sistema de produção é uma manufatura de bens. Por outro lado, quando o

produto gerado é intangível, podendo apenas ser sentido, como uma consulta médica, um filme ou

transporte de pessoas, diz-se que o sistema de produção é um prestador de serviços.

Tabela 1.5 Características dos sistemas de produção (TUBINO, 1997 : 29).

Contínuo Rep. em Massa Rep. em Lotes Projeto

Volume de produção Alto Alto Médio Baixo

Variedade de

produtos

Pequena Média Grande Pequena

Flexibilidade Baixa Média Alta Alta

Qualificação da MOD Baixa Média Alta Alta

Layout Por produto Por produto Por processo Por processo

Capacidade ociosa Baixa Baixa Média Alta

Leadtimes Baixo Baixo Médio Alto

Fluxo de informações Baixo Médio Alto Alto

Produtos Contínuos Em lotes Em lotes Unitário

Tanto a manufatura de bens como a prestação de serviços são similares sob o aspecto de

transformar insumos em produtos úteis aos clientes através da aplicação de um sistema de produção.

Ambas devem projetar seus produtos, prever sua demanda, balancear seu sistema produtivo, treinar

sua mão-de-obra, vender seus produtos, alocar seus recursos e planejar e controlar suas operações.

Page 23: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

14

Porém, existem grandes diferenças em como essas atividades são executadas. Uma diferença

básica reside no fato da manufatura de bens ser orientada para o produto enquanto a prestação de

serviços é orientada para a ação. Nesse sentido, pode-se listar a seguir algumas características que se

diferenciam conforme a abordagem dada ao sistema de produção:

orientação do produto: os serviços são intangíveis, ou seja são experiências vivenciadas

pelos clientes, enquanto os bens são tangíveis, ou seja, são coisas que podem ser

possuídas pelos clientes. Em conseqüência, os serviços não podem ser previamente

executados e estocados como os bens, há necessidade da presença do cliente para ocorrer

a ação, pois a produção e o consumo ocorrem simultaneamente;

contato com o cliente: os serviços envolvem um maior contato do cliente, ou um bem de

sua propriedade, com o sistema produtivo, enquanto a manufatura de bens separa

claramente a produção do consumo, ocorrendo a fabricação dos bens longe dos olhos dos

clientes. Nesse sentido, o planejamento da prestação dos serviços deve levar em conta o

tempo que os clientes estão dispostos a esperar nessa operação, bem como a qualificação

da mão-de-obra prestadora do serviço, pois é ela que terá contato direto com o cliente,

sendo por ele avaliada;

uniformidade dos fatores produtivos: os serviços estão sujeitos a uma maior

variabilidade de entrada do que a manufatura, onde as matérias primas e peças

componentes são padronizadas. Por exemplo, um carro quebrado que chega à uma

oficina ou um paciente que é atendido em uma consulta médica, podem ter uma gama

muito variável de problemas a serem tratados, enquanto que as peças de um

eletrodoméstico que será montado são padronizadas. Nesse sentido, o processo produtivo

na prestação de serviços também é variável e pouco propenso a automação, tornando sua

gestão mais complexa, enquanto a manufatura de bens, devido a sua uniformidade de

tratamento, apresenta facilidade na mecanização e controle dos trabalhos. Em

conseqüência, as saídas resultantes da manufatura são mais estáveis e padronizadas do

que o resultado de uma prestação de serviços;

avaliação do sistema: em decorrência dos itens anteriores, na prestação de serviços é

mais complexo avaliar o desempenho do sistema, pois as entradas, o processamento e as

saídas são variáveis, enquanto na manufatura de bens esses fatores podem ser

predeterminados e avaliados, com base nos padrões, uma vez concluída a operação.

Devido à dificuldade em avaliar o resultado dos serviços, bem como senti-los antes da

compra, os consumidores tendem a ser mais instáveis e basearem-se em opiniões (outros

clientes ou a reputação da empresa) do que em dados reais para sua escolha.

Apesar de existirem diferenças claras entre prestação de serviços e manufatura de bens, na

prática a maioria das empresas estão situadas entre esses dois extremos, produzindo

simultaneamente bens e serviços. Por exemplo, um restaurante que é considerado um prestador de

serviços, ao “produzir” a refeição atua como se fosse uma manufatura, assim como a manutenção e

reparo dos equipamentos vendidos por uma fábrica podem ser considerados como prestação de

serviços. A tendência mundial é de considerar os sistemas produtivos como geradores de um pacote

composto de bens e serviços, tendo predominância maior de um ou de outro fator.

As diferentes formas de classificação dos sistemas produtivos ajudam a entender o nível de

complexidade necessário para o projeto e posterior operação das atividades produtivas. O grau de

padronização dos produtos, o tipo de operações necessárias e a natureza dos produtos são fatores

determinantes para a definição dessas atividades.

Page 24: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

15

Projetar e operar as atividades de uma empresa que produz produtos padronizados para

estoque é bastante diferente de projetar e operar um sistema para produtos sob encomenda. Por

exemplo, no primeiro caso, pode-se iniciar a produção em cima de uma previsão de vendas e ir

equilibrando-se as vendas realizadas com o nível de estoque, enquanto que no processo sob

encomenda o sistema espera a manifestação dos clientes para agir. Além disso, os produtos

padronizados por se repetirem, assim como os processos necessários a produção desses bens ou

serviços, são mais passíveis de controle e acompanhamento, podendo-se prever e acompanhar seus

desempenhos de forma mais eficiente do que para aqueles produtos que serão produzidos apenas

uma vez.

Da mesma forma, o tipo de processo produtivo define a complexidade do projeto,

planejamento e controle das atividades. De uma forma geral, essas atividades são simplificadas a

medida que se reduz a variedade de produtos concorrentes por uma mesma gama de recursos. Nesse

sentido, os processos contínuos e os processos intermitentes em massa são mais fáceis de serem

projetados e administrados do que os processos repetitivos em lote e sob encomenda, pois a

variedade de produtos é pequena e o fluxo produtivo uniforme. Ocorrendo uma variação na

demanda em um processo contínuo ou de produção em massa, basta regular o fluxo de produção

para esse novo nível, enquanto que nos processos intermitentes em lote e sob encomenda, uma

alteração na composição da demanda exige o replanejamento de todos os recursos produtivos.

Finalmente, o fato do produto ser um bem ou um serviço também tem seu reflexo na

complexidade do sistema de produção. Bens são tangíveis, em grande parte fabricados por máquinas

que recebem matérias primas e as transformam em produtos acabados, dentro de padrões

previsíveis, em conseqüência o seu planejamento e controle é mais consistente. Já a produção de

serviços envolve uma maior participação das pessoas, por natureza mais difíceis de serem

padronizadas, e a necessidade da presença dos clientes no momento da produção, tornando a

colocação de estoques amortecedores entre os processos uma tarefa complicada e de difícil

administração.

Mesmo considerando essa diversidade de sistemas produtivos, a seguir será feita uma

tentativa de desenvolver um modelo genérico de sistema produtivo no sentido de abrir a

possibilidade para discutir as diversas técnicas de produção dos sistemas JIT que formalizam uma

estratégia de produção dentro da visão da filosofia JIT/TQC.

1.5 UM MODELO GENÉRICO PARA OS SISTEMAS DE PRODUÇÃO

Logicamente, conforme foi colocado no tópico anterior, existe uma gama muito grande de

alternativas para compor um sistema de produção, tornando impossível montar e descrever um

sistema genérico que abranja todas essas composições de "produtos-processos" diferentes. Nesse

sentido, será escolhido como sistema de produção genérico, aproveitando-se a classificação dos

sistemas por tipo de operação, um sistema que produza de forma repetitiva itens padronizados em

lotes para posterior montagem em uma linha contínua.

Esse tipo de sistema de produção é o mais encontrado na prática. Apresenta características

de processo intermitente na fabricação de itens, e características de processo contínuo na montagem

dos produtos acabados, o que permite expandir suas soluções para as demais variedades de sistemas

Page 25: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

16

produtivos. Nas situações limites com sistemas de produção puramente contínuo ou totalmente

sobre encomenda, geram-se simplificações no modelo, no caso do contínuo, ou impossibilidade de

aplicação de determinadas técnicas, no caso do sistema sob encomenda, que serão discutidas no

decorrer do livro.

A Figura 1.5 ilustra de forma simplificada a operação de um sistema de produção

convencional. Essa figura será usada para apoiar a descrição das principais características que em

geral compõem um sistema convencional de produção.

Figura 1.5 O sistema de produção convencional.

Inicialmente, pode-se ver que o layout na fabricação dos itens é do tipo departamental. As

máquinas são agrupadas segundo suas funções específicas (tornos, prensas, fresas etc.). Os diversos

itens fabricados, geralmente em grandes lotes, seguem seus roteiros de fabricação indo de encontro

Page 26: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

17

às máquinas nesses departamentos, exigindo equipamentos de movimentação. Devido a falta de

balanceamento das capacidades produtivas dos recursos e a grande variedade de itens processados,

há muita formação de estoques entre as operações, os chamados work-in-process (WIP). Os

trabalhadores são especializados em determinadas funções, podendo, eventualmente, acionar várias

máquinas idênticas. A ênfase no trabalho, e na avaliação do mesmo, é individual, existindo pouca

cooperação entre eles.

A linha de montagem é projetada de forma a garantir um fluxo linear de trabalho nos

produtos. Para evitar eventuais paradas na linha, colocam-se estoques protetores (buffers) entre os

postos de trabalho. Esses postos retiram os produtos da linha para executar suas funções,

recolocando-os na linha após concluídas. A capacidade de produção da linha é controlada pela

adição, ou subtração, de pessoas em cada posto de trabalho.

Notam-se grandes áreas de armazenagem tanto no início, para matérias-primas e peças

componentes, como no fim do processo produtivo para produtos acabados. Esses estoques são

decorrentes da falta de confiabilidade nas funções internas de produção e nas funções externas de

relacionamento com clientes e fornecedores da cadeia produtiva. Há necessidade de se montar uma

estrutura formal de administração de materiais, com vários níveis de segurança, para administrar

essas funções.

O fluxo de informações e de materiais para a produção é do tipo "empurrado". O setor de

Planejamento e Controle da Produção (PCP) periodicamente, a partir de uma previsão de vendas

pouco precisa devido ao baixo nível do relacionamento com os clientes, monta um plano-mestre de

produção (PMP) para os produtos acabados considerando a existência de estoques em mãos. Esse

PMP é a base para o cálculo das ordens de montagem (OM), ordens de fabricação (OF), requisições

de materiais (RM) e ordens de compra (OC) que irão acionar o sistema produtivo da empresa.

Geralmente empregam-se softwares sofisticados para executar essas funções, quando então são

avaliadas as ordens em andamento, emitidas no período anterior, e os diversos estoques do sistema.

Uma vez emitidas, essas novas ordens são "empurradas" para os vários elos da cadeia produtiva que

passam a trabalhar em cima das mesmas. No próximo período de planejamento o processo se repete.

Além desses pontos citados, outros fatores caracterizam os sistemas convencionais de

produção. A ênfase na qualidade é dada à inspeção final dos produtos. A manutenção dos

equipamentos e instalações é basicamente corretiva. Os lotes de fabricação e movimentação são

grandes devido ao alto tempo de setup das máquinas. O sistema de custos emprega o conceito de

"valor adicionado" fazendo com que recursos parados sejam vistos como perda de oportunidade

para agregar valor aos itens. Existe alta rotatividade da mão-de-obra como forma de adaptar a

capacidade produtiva a demanda, gerando baixo envolvimento dos funcionários no atendimento dos

objetivos globais da organização. Também é baixa a sinergia entre os diversos departamentos de

apoio à produção, entre outros fatores. No decorrer do livro mais alguns pontos relevantes serão

apresentados.

Olhando agora para a Figura 1.6, pode-se ver um modelo genérico de um sistema de

produção montado segundo os princípios da filosofia JIT/TQC. Algumas diferenças fundamentais

em relação ao sistema convencional já descrito podem ser salientadas.

A primeira grande diferença encontra-se na forma como estão dispostos os recursos

produtivos. No sistema de produção JIT os recursos produtivos estão focalizados para a produção de

uma gama limitada de produtos. A fábrica é dividida em "mini-fábricas" responsáveis por famílias

Page 27: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

18

de produtos. A Figura 1.6 representa uma delas. O layout dentro da mini-fábrica é do tipo celular,

onde as máquinas são dispostas segundo o roteiro de fabricação dos itens, buscando-se o fluxo

contínuo de produção. O objetivo é de que o processo de produção dentro das células de fabricação

e montagem obtenham as vantagens da produção contínua em lotes unitários, acelerando a

conversão de insumos em produtos acabados e eliminando a necessidade dos estoques em processo

(WIP).

Kanban

Kanban

PCPDemanda ?

PMP

No K. TC.

TC

Kanban

Kan

ban

Kan

ban

TCTC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

TC

!

Figura 1.6 O sistema de produção JIT.

Para operar as células de fabricação há necessidade de empregar operadores "polivalentes"

que possam, dentro de um determinado tempo de ciclo (TC), executar um conjunto de operações em

sincronia com os demais companheiros, de forma que ao final de cada tempo de ciclo uma unidade

de produto acabado seja completada. A capacidade de produção é administrada pela inclusão, ou

exclusão, desses operadores polivalentes dentro das células de fabricação e montagem. Nesse

Page 28: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 1

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

19

sistema produtivo a ênfase é do trabalho em grupo, onde cada operador é cliente do operador

anterior e fornecedor do operador subseqüente. Qualquer problema que surja, como não se projetam

estoques protetores internos, leva a interrupção do fluxo produtivo e a necessidade de imediata

solução, com a participação de todos os envolvidos no processo.

Com a focalização da produção, os estoques, antes centralizados em grandes almoxarifados,

são distribuídos em "supermercados" colocados estrategicamente entre dois pontos (geralmente

células) que compõem o fluxo produtivo. O fluxo de informações e de materiais para a produção é

do tipo "puxado", ou seja, só se produz ou movimenta-se materiais quando houver efetivo consumo

dos mesmos. O sistema kanban é o mais empregado para gerenciar esta lógica de funcionamento.

Quando cliente e fornecedor estiverem fisicamente próximos, apenas um supermercado de kanban é

necessário, porém quando a distância física entre eles for grande há necessidade de se colocar um

supermercado junto ao cliente e outro junto ao fornecedor. Nesse caso, um movimentador (interno

ou externo) faz a conexão entre os dois supermercados.

Outra grande diferença entre os dois sistemas de produção está na forma de atuação do setor

de Planejamento e Controle da Produção (PCP). No sistema convencional o PCP, a partir da

montagem do programa-mestre de produção (PMP), empurra um conjunto de ordens para o sistema

produtivo. Nesse caso, a diferença de tempo entre a programação do sistema produtivo e o real

consumo dos clientes é grande, com alto potencial de erro entre o planejado e o executado. No

sistema JIT, dentro do conceito de produção puxada, o PCP elabora o PMP com o objetivo de

dimensionar os estoques, em termos de número de kanbans, e os ritmos de trabalho, traduzidos em

termos de tempo de ciclo (TC), de forma que o sistema produtivo no curto prazo, ou seja, quando os

clientes forem confirmando seus pedidos, tenha condições de responder a essa demanda real sem a

necessidade de contar com grandes estoques de produtos. O único ponto do sistema que necessita de

informações prévias para a produção é a linha de montagem.

Para que o sistema de puxar se torne uma ferramenta efetiva no atendimento das

necessidades dos clientes externos e internos, é imperativo que o PCP ao montar o PMP utilize o

conceito de nivelamento da produção. Nivelar a produção significa programar para a montagem

final pequenos lotes em sincronia com o mix de produtos demandados pelos clientes. Isso garante a

rápida resposta às variações de curto prazo nas necessidades dos clientes, e, internamente, um ritmo

ordenado ao sistema kanban. Como pré-requisito ao nivelamento da produção dois pontos são

fundamentais no sistema JIT: a produção econômica de pequenos lotes e a estabilidade na demanda.

A produção econômica de pequenos lotes é viável dentro do sistema JIT, por um lado,

através da busca contínua pela redução dos tempos de setup dos equipamentos com a aplicação das

técnicas de troca rápida de ferramentas (TRF), e por outro, pela própria focalização da produção

com a montagem de células balanceadas à demanda de poucos itens.

A estabilidade na demanda é obtida pela revisão dos antigos paradigmas que norteiam as

relações entre empresas. Dentro da filosofia JIT/TQC busca-se estabilizar a base de clientes e

fornecedores, compondo uma cadeia logística de produção e distribuição que privilegie a confiança

e o relacionamento de longo prazo em detrimento da convencional concorrência entre os atores

dessa cadeia. A concorrência, dentro dessa nova ótica, dar-se-á entre cadeias produtivas e não mais

dentro das mesmas. Dessa forma, os planejamentos de longo e médio prazos podem ser repassados

aos fornecedores, reduzindo-se as atividades especulativas.

Page 29: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Os Sistemas de Produção

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

20

Além desses pontos divergentes, que serão explorados no decorrer do livro, outros fatores

diferenciam o sistema de produção convencional do sistema JIT. Na busca pela qualidade total,

todas as atividades da fábrica devem ser padronizadas e operadas dentro desse padrão. Os padrões

de trabalho devem ser os mais simples possíveis, evitando-se erros de regulagens e operação.

Investimentos em treinamento da mão-de-obra para identificação, análise e correção dos problemas

devem ser prioritários. A ênfase na qualidade deve ser dada a prevenção dos potenciais problemas.

Logo, a manutenção dos equipamentos e instalações deve ser preventiva e a qualidade deve ser

garantida para todos os itens. Com a focalização da produção os custos passam a ser diretos e o

sistema de custos por atividades pode ser implementado. A visão de cadeia produtiva, direcionando

os relacionamentos entre clientes e fornecedores, permitirá o uso efetivo de técnicas como análise

de valor e engenharia simultânea.

Como forma de aprofundar os diferentes conceitos e técnicas que caracterizam os sistemas

de produção JIT, os próximos capítulos propõem-se a tratar desses temas. No capítulo 2 será

discutida a focalização da produção com células de fabricação, no capítulo 3 será apresentado

planejamento e controle da produção JIT, para em seguida, no capítulo 4, detalhar-se o sistema

kanban de programação e controle de estoques. Para o capítulo 5 está reservada a discussão da

redução dos tempos que compõem os lead times de produção, incluindo-se as questões relativas a

troca rápida de ferramentas e o conceito de “autonomação”. No capítulo 6 a padronização dos

trabalhos e a distribuição dos operadores polivalentes dentro do tempo de ciclo é tratado.

Finalmente, no capítulo 7 as questões referentes a montagem de um sistema logístico JIT, com a

inclusão de fornecedores e transportadores ao sistema de produção, é proposto.

Page 30: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

2 PRODUÇÃO FOCALIZADA

O capítulo 2 pretende apresentar os principais conceitos associados à focalização dos

sistemas produtivos em unidades de negócios. Inicialmente questionam-se as formas

convencionais de organização da produção, apresentando suas desvantagens perante à

produção focalizada. Uma estrutura organizacional focalizada é então proposta. Como forma

de desenvolver a apresentação do tema, divide-se o processo de focalização em três tópicos

interrelacionados: a focalização nos processos de fabricação repetitiva em lotes e a

configuração das células de fabricação, a focalização nos processos de montagem, e a

focalização na armazenagem e movimentação de materiais.

2.1 INTRODUÇÃO

Projetar e produzir bens não tem se mostrado uma tarefa muito difícil para as empresas. A

dificuldade está em projetar e produzir bens de forma organizada e eficiente, atendendo as

necessidades dos clientes. Veja-se o exemplo da indústria automobilística. Até a década de 80, para

se obter um carro de aceitação popular a baixo custo, como o famoso Fusca, as empresas

projetavam seus produtos e processos, e administravam suas fábricas, de maneira a obter uma

produção em grande escala desses bens. A ênfase era na redução dos custos fixos pelo aumento

cada vez maior dos lotes produtivos. Por outro lado, se o objetivo estratégico da empresa era atingir

um mercado automobilístico mais sofisticado para carros de luxo, procurava-se projetar e instalar

fábricas quase artezanais onde, com mão-de-obra super qualificada e inspeção 100%, buscava-se

produtos de qualidade em pequena escala.

Essas duas alternativas são pontos extremos para uma gama de soluções de projeto e

fabricação de automóveis. Tanto a busca pela redução dos custos fixos aumentando a capacidade

instalada, como a ênfase na qualidade pela produção artezanal, são soluções que se mostraram

ineficientes frente a concorrência globalizada desse final de século. Capitaneadas pela Toyota

Motors, as montadoras de automóveis reprojetaram suas fábricas, reduzindo a complexidade dos

processos e dando ênfase a prevenção da qualidade, de forma a redirecionar seu foco para o

atendimento simultâneo dos critérios competitivos atuais (qualidade, custo, flexibilidade e

desempenho de entrega) conforme proposto pela filosofia JIT/TQC.

Nos processos de produção em massa, como o das montadoras de automóveis, talvez essa

questão de perda de foco não fique bem clara, porém quando se desce um nível nessa cadeia

produtiva, olhando para os fornecedores de autopeças, com processos intermitentes em lotes, a

situação encontrada no final dos anos 80 era caótica. Fábricas de grande porte, centralizadas em

determinada região, buscavam atender a todos os seus clientes simultaneamente, produzindo de

forma antecipada as potenciais necessidades desses clientes. A medida em que novos clientes iam

aparecendo, procurava-se adicionar ao sistema atual mais capacidade produtiva para atendê-los.

Dessa forma, os administradores pensavam estar reduzindo seus custos fixos com o crescimento das

fábricas, porém na realidade, problemas de várias ordens afloravam agindo no sentido contrário,

como por exemplo:

excessivos níveis hierárquicos, com baixo entrosamento e motivação entre as equipes de

trabalho, aumentando os custos de supervisão;

Page 31: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

22

dificuldades em exercer o planejamento e controle do processo produtivo, mesmo

empregando softwares complexos, aumentando os estoques e projetando operações

múltiplas em paralelo como forma de proteger o sistema;

gerenciamento a distância com base em relatórios periódicos, aumentando a burocracia e

dificultando a identificação e correção rápida dos problemas;

busca pelo incremento da produtividade individual dos funcionários retirando-lhes

funções de apoio a produção (manutenção, inspeção da qualidade, movimentação etc.),

delegadas à especialistas melhor remunerados e em pequeno número.

Em resumo, o crescimento desorganizado das empresas levou-as a perder o foco de seus

negócios. A proposta de hierarquizar o planejamento estratégico em estratégia corporativa e

estratégia competitiva, conforme apresentado no capítulo inicial, não fica claro em sistemas de

produção muito complexos. A estratégia corporativa que deveria estar definindo as áreas de

negócios nas quais a empresa pretende participar, organizando e distribuindo os recursos

corporativos para cada uma destas áreas, se perde no gigantismo do sistema. E a estratégia

competitiva que deveria estar focalizada em cada unidade de negócios, estabelecendo como cada

negócio da empresa compete no mercado, direcionando as áreas produtivas para dar sustentação à

posição escolhida, fica impraticável.

O que se pretende com a produção focalizada é reverter esse crescimento excessivo, fazendo

com que cada produto, ou família de produtos, possa ser tratado como um negócio específico, com

suas características produtivas e mercadológicas próprias, segundo a definição de uma estratégia

competitiva adequada para cada produto. Desta forma, as empresas dividiriam fisicamente seus

recursos, montando fábricas focalizadas em produtos, ou famílias, específicos. O crescimento não

se daria mais pelo aumento dos antigos departamentos e linhas de montagem, mas sim pela criação

de novas unidades de negócios focalizadas.

Seguindo o exemplo dos fornecedores de autopeças, o que se vê hoje em dia com a

globalização da economia é a montagem de pequenas fábricas focalizadas para uma determinada

montadora, instaladas fisicamente próximas da mesma, de maneira a tirar vantagens tanto em

termos organizacionais internos, como em ternos de logística de fornecimento externo para o

cliente. Segundo Harmon e Peterson (HARMON, 1991 : 16-17) uma fábrica focalizada possui as

seguintes vantagens na busca pelos princípios da filosofia JIT/TQC:

domínio do processo produtivo: por ser uma fábrica pequena as comunicações fluem

mais facilmente, permitindo que cada gerente, supervisor e funcionário conheça todos os

aspectos importantes da fabricação dos produtos. Dessa forma, aumenta-se a

identificação e solução de problemas;

gerência junto à produção: com o enxugamento dos níveis hierárquicos pela redução da

complexidade dos processos, a gerência pode ficar localizada próxima ao chão-de-

fábrica, aumentando a velocidade de resposta na tomada de decisões. O gerenciamento

pode ser mais centrado nos aspectos visuais do que em cima de relatórios periódicos;

staff reduzido e exclusivo: o pessoal de apoio pode ficar junto ao local onde presta o

serviço, especializando-se em suas tarefas. A focalização do staff facilita a programação

dos serviços de apoio aos clientes internos, reduzindo as paradas de produção e

acelerando a solução dos problemas;

estímulo à polivalência de funções: em fábricas pequenas tanto as funções produtivas

como as de apoio são executadas por um número menor de pessoas, induzindo ao

conceito de funcionário polivalente. As responsabilidades pela produção, qualidade,

manutenção, movimentação etc. são compartilhadas por todos e podem ser melhor

Page 32: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

23

distribuídas. Permite o uso efetivo do conceito de Círculos de Controle de Qualidade

(CCQ) e de remuneração variável pelo desempenho do grupo;

uso limitado dos recursos: em fábricas pequenas os recursos colocados a disposição da

produção são limitados, o que facilita a identificação e eliminação de atividades que não

agregam valor aos produtos e estimula a disseminação do princípio do melhoramento

contínuo. Estoques excessivos e equipamentos ociosos prontamente aparecem.

Ao transformar a grande fábrica convencional em uma série de estruturas mais ágeis

focalizadas em cada unidade de negócios da empresa, há necessidade de se repensar a sua estrutura

organizacional no sentido de suportar esta nova forma de fabricação. A Figura 2.1 apresenta um

modelo genérico de estrutura organizacional dentro desse conceito de produção focalizada. Nessa

figura pode-se ver uma estrutura onde cada unidade de negócios está focalizada em um gerente

específico, capitaneadas por um gerente geral da fábrica que mantêm centralizadas as funções de

finanças, marketing e pessoal a nível corporativo. De acordo com Harmon e Peterson (HARMON,

1991 : 19-20) cada unidade de negócio, chamada por eles de subfábrica, pode comportar de 30 a

300 pessoas, sendo que acima desse número seria mais interessante dividir a estrutura

organizacional em unidades menores, como, por exemplo, uma subfábrica para a produção das

peças componentes e outra para a montagem do produto acabado.

Figura 2.1 Organograma para a produção focalizada.

Atrelado ao gerente das diversas subfábricas, focalizam-se as funções de apoio a produção

como o planejamento e controle da produção, engenharia, manutenção etc. Como coordenador dos

grupos de trabalho na fabricação e montagem dos itens ter-se-ia tantos supervisores quantos fossem

necessários. Geralmente, um supervisor pode se encarregar de até 30 pessoas sob sua

responsabilidade. Desta forma com a focalização da produção, o número de níveis hierárquicos

entre os funcionários do chão-de-fábrica e a direção da empresa se reduziria para apenas quatro,

agilizando as decisões.

Um ponto importante na focalização da produção diz respeito a quanto do processo

produtivo pode ser efetivamente organizado por produto dentro de uma estrutura verticalizada. Esta

questão está ligada ao balanceamento entre a capacidade produtiva dos recursos e a demanda

esperada pelos produtos que utilizam esses recursos. Em fábricas novas esse balanceamento pode

ser alcançado com um projeto voltado para o equilíbrio dos recursos produtivos com a demanda

negociada com clientes que busquem um relacionamento estável de longo prazo calcado na filosofia

Finanças

Marketing

Recursos Humanos

Engenharia Manutenção

Células de Fabricação Linha de Montagem

Supervisor da

Subfábrica 1

PCP/Materiais Ferramentaria

Gerente da Subfábrica 1Gerente da Subfábrica 2

Gerente da Subfábrica 3

Gerente da Subfábrica N

Gerente Geral da Fábrica

Page 33: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

24

JIT/TQC. Em fábricas já instaladas muitas vezes esse balanceamento é dificultado pela

característica instável da demanda ou pelo superdimensionamento de determinados grupos de

recursos, como por exemplo um forno de tratamento térmico, ou uma cabina de pintura, que tem

condições de atender a todos os produtos da fábrica. Apesar destas limitações, a focalização da

produção deve ser tentada.

Por exemplo, uma indústria metal-mecânica que tem sua produção centrada em

compressores de grande porte, fabrica paralelamente outros produtos, como elevadores hidráulicos,

morsas, pistolas manuais de pintura, entre mais de dez produtos diferentes. O roteiro de fabricação

desses produtos tem início em um processo de fundição, que atende a fábrica como um todo. Uma

vez fundido, cada lote de peças segue para um ponto específico da fábrica onde existe uma estrutura

produtiva focalizada que se encarrega de completar a fabricação e montagem de cada produto. Ao

visitar suas instalações, tem-se uma visão global de todas as subfábricas ali instaladas (sem paredes

entre elas), ficando bastante evidente o senso de organização e controle que se obtêm ao optar por

essa forma avançada de organização industrial.

Muitas vezes soluções não convencionais devem ser tentadas no sentido de balancear a

capacidade com a demanda. Shingo (SHINGO, 1996 : 171) apresenta o exemplo de uma indústria

metalúrgica que, no sentido de buscar um balanceamento em fluxo unitário de produção para as

peças, substituiu as convencionais cabinas de pintura de grande porte, por pequenas caixas de um

metro cúbico de volume com dispositivos de pintura em spray, posicionadas dentro da linha

imediatamente após a furação e o rosqueamento das peças. Ganhos significativos foram alcançados

não só em termos de eliminação do transporte e armazenagem intermediária das peças como,

principalmente, pela eliminação da insalubridade existente dentro da antiga cabina de pintura.

Conforme tratado no capítulo inicial, existe uma gama grande de tipos de sistemas de

produção. Várias formas de classificação foram propostas. Geralmente as empresas apresentam

sistemas de produção com uma composição de processos repetitivos em lotes na fabricação de

peças e processos repetitivos em massa na montagem de produtos acabados. Nos dois extremos

tem-se por um lado os processos contínuos, por princípio totalmente focalizados, e, por outro os

processos sob encomenda, impossíveis de serem focalizados a priori. No sentido de buscar um

modelo teórico para as alternativas viáveis de focalização, serão abordadas soluções para a

focalização nos processos de fabricação repetitiva em lotes, a focalização nos processos de

montagem e a focalização na armazenagem e movimentação dos materiais. Assim, espera-se

simplificar a apresentação do tema e, ao mesmo tempo, abranger um número maior de alternativas

de sistemas produtivos.

2.2 FOCALIZAÇÃO NOS PROCESSOS DE FABRICAÇÃO REPETITIVA EM LOTES

O crescimento desorganizado (desfocado) das empresas que trabalham com processos de

fabricação repetitiva em lotes, produzindo peças para as linhas de montagem ou vendendo-as como

produtos acabados, fez com que as mesmas desenvolvessem seus layouts produtivos de forma

departamental ou por processo. O layout por processo consiste em centralizar em um mesmo local

todas as máquinas destinadas a um tipo específico de operação, criando os conhecidos

departamentos: usinagem, extrusão, corte, pintura, tornearia etc. Na medida em que o roteiro de

fabricação de determinado lote de peças exige uma operação de usinagem, o mesmo é movimentado

até o respectivo departamento para ser processado. Após a operação de usinagem, o lote segue para

o próximo departamento estabelecido no roteiro, até sua total conclusão. A Figura 2.2 ilustra esse

Page 34: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

25

tipo de arranjo físico. Nessa figura pode-se ver quatro departamentos distintos, com funções

específicas de extrusar, serrar, tornear e soldar.

Tornos

Extrusoras

Serras

Soldas

Figura 2.2 Layout departamental.

Esse tipo de arranjo físico foi a solução encontrada pelas empresas para permitir um

crescimento de produção pelo emprego do tempo ocioso das máquinas. A capacidade de produção

de determinado departamento seria a soma das capacidades individuais das máquinas, não se

admitindo que qualquer uma delas possa ficar parada. Pode-se dizer que o maior incentivador dos

layouts departamentais foi o conceito contábil, amplamente aceito pelas empresas convencionais, de

valor agregado. Segundo esse conceito, cada vez que uma máquina é acionada para beneficiar uma

matéria-prima ou uma peça em processo, está se adicionando valor a essa matéria-prima ou peça,

mesmo que elas fiquem durante um longo tempo em estoques intermediários (WIP) ou de produtos

acabados a espera de clientes para consumi-las. A ênfase é de aumentar a produtividade individual

dos recursos, e não em acelerar o fluxo de conversão de matérias-primas em produtos acabados

segundo as necessidades dos clientes.

Além desse forte motivo de ordem contábil, outros fatores ajudaram a justificar a escolha

por layouts departamentais, como:

facilidade em elaborar o layout: máquinas do mesmo tipo possuem tamanhos e formatos

semelhantes, o que facilita a disposição das mesmas em áreas padronizadas (geralmente

retangulares), simplificando as decisões quanto ao dimensionamento dos espaços e

equipamentos necessários à movimentação e armazenagem dos materiais em processo;

instabilidade na demanda: o baixo relacionamento com clientes leva a instabilidade na

demanda, difundindo o falso conceito de que o layout departamental é a melhor

alternativa para se obter flexibilidade para aceitar qualquer tipo de pedido no curto

prazo;

facilidade no trato com os funcionários: o treinamento, a forma de remuneração e a

busca pela eficiência individual das operações ficam mais fáceis de serem administradas

quando o layout é departamental;

equipamentos de difícil integração: equipamentos de grande porte como fornos, cabinas

de pintura, prensas pesadas etc., ou então máquinas que já transformam matérias-primas

Page 35: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

26

em produtos acabados, como extrusoras para produtos plásticos, são mais fáceis de

serem dispostas em departamentos do que deslocadas para células.

Infelizmente, a escolha indiscriminada pelo layout departamental levou a uma série de

desperdícios que durante muitos anos ajudaram a deteriorar o desempenho dos sistemas produtivos

com fabricação em lotes, fazendo com que os lead times e os custos dos produtos se ampliassem,

quais sejam:

desperdício de superprodução: quando as máquinas estão agrupadas em departamentos

há dificuldade em sincronizar os setups das máquinas, não se dando ênfase as técnicas de

troca rápida de ferramentas, levando o PCP a programar grandes lotes de fabricação para

diluir esses custos. Com isso gera-se descompasso de quantidade e tempo entre a

produção e a demanda dos itens fabricados;

desperdício de espera: com a produção de grandes lotes e o baixo sincronismo entre os

vários pontos de trabalho, ocorre a formação de filas de esperas antes de cada máquina,

aumentando os lead times dos itens e os estoques do sistema. O gerenciamento dessas

filas pelo PCP, conhecido como seqüenciamento, faz parte das atividades que não

agregam valor aos produtos;

desperdício de movimentação e transporte: no layout departamental as distâncias a

serem percorridas entre cada operação do roteiro de fabricação de um lote de itens é

grande, gerando a necessidade de carregamento, transporte e descarregamento dos itens

de máquina para máquina. Essas funções aumentam de complexidade e custos

proporcionalmente ao tamanho dos lotes;

desperdício de processamento: como no layout departamental a ênfase está na utilização

das máquinas, é comum ocorrer desperdício de tempo por parte dos operadores que

ficam ociosos aguardando que o processamento do lote se complete. O trabalho

especializado repetitivo e de baixa mobilidade (monofuncional) diminui a satisfação dos

operadores e dificulta a implantação de técnicas associadas ao TQC;

desperdício de estoques: a formação de estoques nos próprios departamentos ou em

almoxarifados centralizadores é uma característica marcante do projeto de layouts

departamentais para conviver com os grandes lotes de fabricação e filas de espera nas

máquinas. A ênfase é em atender aos clientes (internos ou externos) com os itens já

existentes nos estoques;

desperdícios de produtos defeituosos: quando um problema ocorre na fabricação de um

lote de itens em uma máquina de um departamento, só é identificado após a inspeção do

lote, geralmente na última etapa do processo. Isso faz com que dentro do sistema

produtivo, potencialmente, todas os itens trabalhados a partir da máquina geradora do

problema estejam defeituosos e devam ser corrigidos. Além disso, com a baixa

comunicação entre os departamentos, é bem provável que apesar de um item

componente não estar sendo produzido em um departamento por problemas quaisquer,

os outros itens componentes continuam seguindo suas prioridades e sendo produzidos

nos demais setores.

Como forma de eliminar, ou pelo menos reduzir, esses desperdícios precisa-se repensar a

disposição das máquinas no layout fabril. Ao invés de agrupá-las por função, deve-se agrupá-las por

produto, focalizando-as a um produto ou família de produtos. A ênfase agora é de acelerar o fluxo

de conversão das matérias-primas em produtos acabados, buscando-se a formação de células que

disponham as máquinas na seqüência necessária a fabricação desses itens. A Figura 2.3 exemplifica

esse tipo de layout celular.

Page 36: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

27

Família 1

Família 3 e 4

Família 2

Família 5

Figura 2.3 Layout celular.

Conforme pode-se ver nessa figura, as máquinas antes agrupadas por departamentos com

funções afins agora são distribuídas em células encarregadas de processar completamente uma

família de produtos. Por exemplo, para produzir os itens da família 2 uma serra, dois tornos e uma

máquina de solda são colocadas em seqüência para atender ao roteiro de fabricação dessa família.

Com isso, o fluxo de produção (lead time) dessa família é acelerado. Pode-se empregar o conceito

de produção em fluxo unitário, utilizado originalmente em linhas de montagem contínuas, fazendo

com que os tempos de fabricação sejam reduzidos a praticamente a soma dos tempos das operações

individuais das máquinas. Todos os desperdícios de tempo associados à superprodução, espera,

movimentação e transporte, processamento, estoques e fabricação de produtos defeituosos podem

ser eliminados.

Os tempos que compõem o lead time de um item fabricado de forma intermitente em lotes

podem ser divididos em: tempo de tramitação da ordem de fabricação, tempo de espera na fila do

recurso, tempo de setup, tempo de processamento e tempo de movimentação. Com exceção do

tempo de tramitação da ordem de fabricação, reduzido pela aplicação de um sistema JIT de puxar a

produção, os demais tempos são drasticamente reduzidos, ou até eliminados, com a implantação do

layout celular (a redução dos lead times produtivos será tratada em detalhe no capítulo 5). Ou seja:

tempo de espera na fila: é eliminado pela disposição adequada das máquinas segundo o

roteiro de fabricação do item e pela produção em fluxo unitário. Dessa forma evita-se a

formação de estoques internos à célula, eliminam-se as filas de espera nas máquinas e o

conseqüente seqüenciamento das ordens nas filas, que acarretam tempos e custos

indesejáveis;

tempo de setup: o simples fato de organizar o fluxo de produção por item, ou famílias de

itens, já faz com que as máquinas fiquem alocadas prioritariamente ao item, evitando-se

os setups para o processamento de itens diferentes. Contudo, a própria mudança de

filosofia e a adoção do layout celular estimula e facilita a implantação de técnicas de

redução de setups, que serão discutidas mais adiante no capítulo 5;

tempo de processamento: com a redução dos tempos de setups estimulada pelo layout

celular, pode-se diminuir economicamente o tamanho dos lotes de fabricação, fazendo

com que o tempo médio de processamento dos itens em cada máquina necessária a sua

seqüência de fabricação se reduza, acelerando seu fluxo de conversão em produto

Page 37: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

28

acabado. O ideal é implantar o conceito de produção em fluxo unitário, onde a cada

tempo de ciclo um item acabado é retirado da célula;

tempo de movimentação: a aproximação das máquinas com o layout celular faz com que

as distâncias entre elas sejam mínimas, reduzindo a necessidade de movimentação dos

itens. Por outro lado, a produção em fluxo unitário ou em pequenos lotes permite que a

movimentação dos itens possa ser feita pelo próprio operador manualmente, evitando-se

o uso de equipamentos dispendiosos e espaços físicos para a movimentação e

posicionamento desses equipamentos.

Como conseqüência direta da redução dos lead times de fabricação dos itens, a adoção do

layout celular aumenta a flexibilidade do sistema produtivo e diminui a necessidade de estoques em

processo (WIP) entre células, pois há uma conversão mais rápida dos itens em produtos acabados,

podendo-se atender diretamente a demanda com a produção. Por outro lado internamente nas

células, empregando-se a produção em fluxo unitário, o item trabalhado em uma máquina é

imediatamente transferido para a próxima máquina da célula após o tempo de ciclo, não permitindo

a formação de WIP interno, a não ser em casos onde haja necessidade de conectar operadores ou

introduzir um tempo para inspeção ou cura dos itens.

Um bom exemplo desse potencial de ganhos é a fábrica da Azaléia em Parobé (RS) que

produz tênis esportivos da marca Olympikus (CAETANO, 1997 : 44). Após a implantação de

células de produção baseada nos conceitos da filosofia JIT/TQC, a Azaléia reduziu o lead time de

fabricação dos seus tênis de cinco dias para três horas e meia, fazendo com que os pedidos dos

clientes que antes eram atendidos dentro de um prazo médio de três meses caíssem para apenas dez

dias. A partir dessa melhora na velocidade e flexibilidade da produção, os lojistas ganharam a

liberdade de fazerem seus pedidos em grades abertas, só repondo os tamanhos que tenham mais

saída. Em virtude do tênis ser um produto com ciclo de vida curto (alguns não ultrapassam três

semanas no mercado, e os melhores ficam por seis messes), esse aumento de flexibilidade permitiu

que a Azaleia obtivesse uma grande vantagem competitiva em relação à concorrência ao atender sua

demanda (12.000 varejistas) de forma diferenciada, adaptando-se às variações da demanda a baixo

custo (seus tênis, com o mesmo desempenho e nível de qualidade, são oferecidos a preços 25%

inferiores dos importados).

Outra questão importante, com a possibilidade de empregar o conceito de produção em

fluxo unitário, eliminando-se os estoques em processo entre máquinas, é que as células contribuem

para a inspeção imediata da qualidade pelo próprio operador que, ao manusear a peça, pode pegar

imediatamente o defeito, evitando sua multiplicação. A auto inspeção, as inspeções sucessivas e a

inspeção na fonte fazem parte das técnicas de inspeção 100% dentro do conceito de “autonomação”

(MONDEN, 1984 : 81-91), ou controle autônomo dos defeitos. A autonomação procura incorporar

ao processo produtivo dispositivos à prova de erros para permitir a liberação do operador da atenção

constante à máquina, possibilitando a polivalência de forma mais ampla. Esses assuntos serão

ampliados nos capítulos cinco e seis.

2.2.1 Configuração das células de fabricação

Um ponto fundamental para implantar o layout celular em processos de fabricação repetitiva

em lotes consiste na escolha das máquinas que irão compor as células. Dentro desse aspecto dois

pontos devem ser levantados. O primeiro diz respeito a definição de grupos de itens passíveis de

Page 38: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

29

serem trabalhados em uma célula. O segundo refere-se ao balanceamento da capacidade produtiva

das máquinas com a demanda dos itens nela processados.

Como forma de resolver a primeira questão, desde a década de 50 quando o engenheiro

russo Mitrofanov desenvolveu a idéia de agrupar peças com similaridade geométrica em famílias

para serem processadas em uma única máquina, o termo “Tecnologia de Grupo” tem sido

empregado como referencial nessa área. Segundo a visão de especialistas na área de projeto

(LORINI, 1993 : 17) a Tecnologia de Grupo é considerada como “uma filosofia que define a

solução de problemas explorando semelhanças para se obter vantagens operacionais e econômicas

mediante um tratamento de grupo”. A Tecnologia de Grupo pode empregar diferentes metodologias

para agrupar famílias de itens passíveis de serem fabricados em células de manufatura através da

exploração de características comuns de projeto ou de processo desses itens.

Segundo Lorini (LORINI, 1993 : 20-28), os métodos empregados pela Tecnologia de Grupo

para a definição das famílias de itens a serem processados em uma célula podem ser divididos em

quatro grupos básicos:

inspeção visual: busca identificar famílias de itens pela análise visual de suas

características. É um método simples e rápido recomendado para soluções iniciais de

focalização, ficando limitado à experiência do analista e ao número de itens que

fisicamente podem ser manuseados;

análise do fluxo de produção (PFA): procura agrupar os itens levando em consideração

os seus roteiros de fabricação, ou fluxos de produção, através das máquinas. Os itens são

agrupados pela similaridade de roteiros, independente de suas características

dimensionais. Nesse método emprega-se uma matriz de incidência peça/máquina

preenchida com os índices 0 ou 1 (1 se a peça passa pela máquina da respectiva linha e 0

se a peça não passa pela máquina) onde são permutadas linhas e colunas, pelo emprego

de algoritmos de formação de grupos (clustering), com o objetivo de diagonalizar a

matriz e encontrar os itens que podem ser processados em grupos de máquinas. A Figura

2.4 apresenta um exemplo de matriz de incidência onde a partir de uma situação inicial

(a) se obtêm, através de trocas de posições nas linhas e colunas, uma situação idealizada

(b) que deixa claro a formação de duas células para os grupos de itens;

classificação por código: tem por objetivo desenvolver um sistema de código que

permita codificar os itens por atributos de projeto, processo ou ambos de maneira que, ao

se analisar os códigos dos itens, possa-se formar famílias com semelhanças de atributos.

A classificação por código é fundamental quando se busca uma visão integrada de

manufatura por computador (CIM) no sentido de permitir um fluxo rápido e lógico das

informações entre as etapas de engenharia (CAE), projeto (CAD), planejamento do

processo (CAPP) e manufatura (CAM);

reconhecimento de padrões: busca estabelecer algumas características geométricas ou

tecnológicas padrões para serem comparadas com as características dos itens que se

pretende agrupar de forma a obter certa similaridade entre esses itens. Empregam-se

funções analíticas para quantificar o grau de semelhança entre a característica do item e

o respectivo padrão, podendo inclusive ser utilizada ponderações diferentes conforme se

queira dar maior importância a determinada característica no agrupamento.

Dos métodos disponíveis para compor células dentro da Tecnologia de Grupo, o mais

adequado segundo os princípios de focalização da produção aqui tratados é o da análise do fluxo de

produção, pois pode ser empregado de forma rápida sem a necessidade de compor códigos

complexos que demandam tempo e retardam a implantação do JIT. Segundo Harmon e Peterson

Page 39: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

30

(HARMON, 1991 : 157) “... a experiência da Andersen Consulting em mais de 400 fábricas em

todo o mundo mostrou não ser preciso codificar peças de modo a identificar possíveis células”.

Schonberger (SCHONBERGER, 1988 : 120) coloca que só o processo de codificação das

características dos itens pode levar alguns anos e que isso tende a atrapalhar o ritmo do progresso

em focalizar a produção.

Peça1 Peça2 Peça3 Peça4 Peça5

Máquina1 0 1 0 1 0Máquina2 1 0 1 0 0Máquina3 1 0 0 0 0Máquina4 0 1 0 1 1Máquina5 0 0 0 1 1Máquina6 1 0 1 0 0

Peça1 Peça3 Peça2 Peça4 Peça5

Máquina2 1 1 0 0 0Máquina3 1 0 0 0 0Máquina6 1 1 0 0 0Máquina1 0 0 1 1 0Máquina4 0 0 1 1 1Máquina5 0 0 0 1 1

a - matriz de incidência inicial

b - matriz de incidência final

Célula 1

Célula 2

Figura 2.4 Matriz de incidência peça/máquina.

Dentro dessa ótica, não se deve confundir a informatização das informações visando a

automação industrial com o conceito gerencial de produção focalizada. A produção focalizada pode

ser implementada com máquinas convencionais de operação manual ou com robôs e modernos

centros de usinagem CNC. O importante é que ao se focalizar a produção com os equipamentos

disponíveis no momento, os desperdícios serão potencializados e poderão ser mais facilmente

identificados e eliminados, fazendo com que a futura implantação de novas tecnologias de produção

possa ser feita de forma racional e produtiva. Um estudo desenvolvido pelo Massachusetts Institute

of Tecnology durante cinco anos dentro da cadeia produtiva automobilística (WOMACK, 1992 : 85)

concluiu que fábricas de alta tecnologia mal organizadas acabam adicionando tantos técnicos

indiretos e pessoal de manutenção extra que suplantam os ganhos obtidos pela remoção via

automação dos trabalhadores diretos.

Uma vez agrupados os itens por famílias com características afins, a questão seguinte na

montagem de células visando a focalização da produção nos sistemas de produção em lotes refere-

se ao balanceamento da capacidade produtiva das máquinas com a demanda dos itens nela

processados. Inicialmente, o formato das células tem um fator determinante nesse balanceamento da

demanda com a capacidade. O desenho ideal para a montagem de células é o com formato em “U”,

podendo-se empregar também os formatos de “V” ou “L”, ou combinações desses formando uma

serpentina. Existe algumas vantagens importantes em se empregar o layout celular com formato em

“U” (MONDEN, 1984 : 57-59), quais sejam:

Page 40: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

31

manutenção de um ritmo de produção: como os postos de entrada e de saída da célula

estão dispostos próximos, pode-se delegar essas operações a um único operador, fazendo

com que o mesmo ao colocar um item para operar na primeira máquina opere e retire,

em seqüência, um item pronto da última máquina. Dessa forma, desde que não seja

permitido formar estoques internamente, esse operador dará o ritmo de produção para a

célula como um todo, garantindo um padrão para o tempo de ciclo da célula;

flexibilidade na capacidade de produção: as células em forma de “U” permitem que as

tarefas sejam distribuídas por um número variável de operadores visando adequar sua

capacidade produtiva à demanda. Conforme a demanda cresça, diminuindo o tempo de

ciclo necessário para seu atendimento, pode-se alocar mais operadores na célula para

redistribuir as atividades pelos mesmos dentro desse novo tempo de ciclo. A Figura 2.5

ajuda a ilustrar essa característica. Essa figura apresenta uma célula com sete máquinas

onde, por exemplo, para uma demanda de 240 peças por turno de 8 horas (tempo de

ciclo = 2,0 minutos/unidade), pode-se trabalhar com dois operadores: o primeiro

executando as operações nas máquinas 1, 6 e 7, e o segundo nas máquinas 2, 3, 4, e 5 a

intervalos de 2 minutos. Com a mudança da demanda, por exemplo, para 320 unidades

por turno (tempo de ciclo = 1,5 minutos/unidade), adiciona-se mais um operador e se

redistribui as funções de maneira que cada operador cumpra um ciclo de 1,5 minutos: o

primeiro operador se encarrega das máquinas 1 e 7, o segundo das máquinas 2 e 6, e o

terceiro das máquinas 3, 4 e 5;

Três operadores

Tempo de Ciclo

de 1,5 min./unidade

Dois operadores

Tempo de Ciclo

de 2,0 min./unidade

Figura 2.5 Flexibilidade na capacidade de produção.

manutenção do padrão individual da operação: um dos pontos cruciais para se produzir

produtos com qualidade assegurada dentro da visão estratégica do TQC é a manutenção

de um padrão operacional e o constante monitoramento desse padrão. As células em

forma de “U” permitem que se altere a capacidade de produção, pela adição ou redução

do número de operadores, sem contudo alterar o padrão de trabalho individual em cada

máquina, ou seja, a alteração na capacidade de produção se dará pela redução ou

aumento do número de operações padrões que cada operador executará dentro de um

dado tempo de ciclo, e não pela aceleração, ou redução, dos ritmos individuais de

trabalho em cada máquina como no processo convencional de produção. Além disso, o

Page 41: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

32

trabalho em grupo com tempos de ciclo predeterminados e o layout celular fazem com

que cada operador seja obrigado a manter o padrão individual do trabalho para atender a

demanda do seu “cliente” interno. Caso algum ponto do sistema tenha problemas e não

consiga completar as operações padrões dentro do tempo de ciclo, isso se tornará

evidente e prontamente poderá ser resolvido pela aplicação do conceito de “ajuda

mútua” entre os operadores;

facilidade em adequar o layout as instalações: o formato em “U”, ou em serpentina,

permite que as células possam ser comprimidas ou expandidas para se enquadrarem

dentro das dimensões atuais das fábricas, evitando gastos com novas instalações.

Levando-se em conta que novos produtos possam vir a ser fabricados, e que alguns dos

atuais deixem de ser fabricados no futuro, o potencial de reorganização das células é um

fator importante a ser considerado.

Essas vantagens advindas do balanceamento entre velocidade de produção (tempo de ciclo)

e demanda a partir da polivalência dos operadores, está baseada no conceito de que não é uma tarefa

fácil em processos de fabricação repetitiva em lotes balancear precisamente as capacidades das

máquinas com a demanda esperada. A ênfase deve ser dada em cima da necessidade em se acelerar

o fluxo produtivo, mesmo que para isso ocorra um certo nível de ociosidade nas máquinas. Harmon

e Peterson (HARMON, 1991 : 167-171) consideram uma falácia certos mitos sobre utilização de

recursos e capacidade que tendem a postergar a decisão de transformar o layout convencional em

celular, quais sejam: os tempos de processamento e as capacidades das máquinas nas células devem

ser equilibrados; a capacidade das máquinas pode ser plenamente utilizada; e as demandas de longo

prazo das máquinas podem ser precisamente previstas. A demora no reconhecimento de que esses

fatores são de difícil obtenção em processos repetitivos em lotes acaba retardando a implantação da

focalização da produção.

É comum nas fábricas com processos repetitivos em lotes a utilização das máquinas estar

bem abaixo da sua capacidade plena pois sempre existirá um ponto gargalo interno ou externo que

limitará a necessidade de acionamento dos recursos. Quando o gargalo for o mercado, a produção

plena estará apenas adicionando estoques ao almoxarifado. Esse desbalanceamento se deve a lógica

convencional de repor equipamentos a medida em que a demanda cresce. Schonberger

(SCHONBERGER, 1988 : 84) chama a isso de o “ciclo da supermáquina”, que é geralmente o

seguinte:

1. a demanda aumenta e é decidido adicionar capacidade produtiva;

2. a engenharia pesquisa os equipamentos disponíveis no mercado de máquinas-operatrizes e

seleciona uma com capacidade para atender a demanda projetada para os próximos três a

cinco anos;

3. a máquina escolhida é instalada, após algumas semanas ou meses de ajuste, e opera de

forma subtilizada nos dois ou três anos seguintes;

4. finalmente, após alguns anos a demanda atinge a capacidade da máquina e ela é operada

plenamente, o que permite pouco tempo para sua manutenção;

5. com a capacidade produtiva estourada e a baixa confiabilidade operacional, a empresa

decide por substituir a máquina por outra nova e repete o ciclo da supermáquina.

Um ponto importante nessa discussão sobre o balanceamento da capacidade produtiva da

célula é a questão contábil da absorção dos custos de depreciação dos equipamentos pelos itens

produzidos. Convencionalmente, as empresas tentam tirar o máximo de produção das máquinas em

um curto espaço de tempo, balanceando os processos pela capacidade máxima de operação das

máquinas e não pela demanda dos clientes. Nesse aspecto a Toyota (SHINGO, 1996 : 107)

Page 42: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

33

considera que em situações onde a capacidade de produção dos recursos está acima da capacidade

de absorção pela demanda, é preferível manter baixa a taxa de utilização das máquinas à manter

ociosa a mão-de-obra. Esse raciocínio deriva de dois pontos de vista peculiares. Primeiro, o de que

máquinas e equipamentos bem utilizados com manutenções eficientes, mesmo após serem

contabilmente depreciados, continuarão a ser empregados gerando lucro. Segundo, o custo por hora

do operador é geralmente maior do que o custo de depreciação da máquina e continuará a ocorrer

mesmo que o operador fique parado, enquanto que uma máquina parada não está se depreciando

“fisicamente”. O emprego de células com operadores polivalentes fez com que a Toyota obtivesse

uma produtividade por trabalhador de 20 a 30% superior as outras empresas concorrentes.

Em decorrência dessa lógica de raciocínio, procura-se evitar o emprego das

“supermáquinas” pois capacidade produtiva em excesso dificulta o nivelamento da produção com a

demanda. Dessa forma, quando se têm muita variedade de itens com demandas médias ou baixas,

característica comum nos processos repetitivos em lotes, é mais conveniente montar células com

equipamentos de baixa velocidade, mais baratos e fáceis de comprar e manter em operação. Além

disso, equipamentos simples podem ser mais facilmente adaptados na célula a um tipo específico de

operação em uma família de itens, implantando o conceito de “sistemas de construção para

colocações finitas”, que irá acelerar ainda mais a conversão dos itens em produtos acabados e

eliminar os ajustes nas operações de setup.

Uma vantagem adicional com o emprego de máquinas mais simples é a possibilidade de

planejar o crescimento da capacidade produtiva da fábrica através da montagem de células em

duplicatas. Com isso, por um lado consegue-se manter uma certa segurança caso algum dos

equipamentos da célula principal venha a quebrar, e, por outro, consegue-se manter o

balanceamento das células mais próximo da demanda com a possibilidade de se acionar as diversas

células em ritmos (tempos de ciclo) ou turnos diferentes.

Por exemplo, uma família de itens pode ser produzida em duas células semelhantes. Quando

a demanda desses itens está alta, ambas as células operam em dois turnos produzindo os mesmos

itens. Porém, quando a demanda baixa, uma célula pode continuar operando em dois turnos e a

outra pode passar a operar um turno com essa família e o outro com outra família de itens. Caso a

demanda venha efetivamente a se reduzir pela metade, pode-se deixar apenas uma célula

trabalhando com esses itens e a outra, por ter máquinas mais simples, pode ser convertida para a

produção de outros itens.

2.3 FOCALIZAÇÃO NOS PROCESSOS DE MONTAGEM

Os processos de montagem, diferentemente dos processos de fabricação repetitiva em lotes,

são processos de fabricação com características de produção repetitiva em massa onde ficam mais

fáceis as aplicações dos conceitos de focalizar a produção à linhas de produtos padronizados.

Conforme foi caracterizado no capítulo inicial, os processos de produção repetitivos em massa são

empregados na fabricação em grande escala de produtos altamente padronizados, onde a demanda

pelos produtos são estáveis fazendo com que seus projetos tenham poucas alterações no curto prazo,

possibilitando a estruturação de linhas cativas para a montagem dos mesmos. Quando há

necessidade de grandes investimentos em tecnologia, pode-se amortizá-los durante um longo

período de produção com altos volumes.

Page 43: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

34

Aparentemente os processos, ou linhas, convencionais de montagem já estão de acordo com

as questões tratadas nesse capítulo. Seu layout procura facilitar o fluxo, os produtos possuem linhas

focalizadas, os operadores seguem tempos de ciclo padrões para garantir o ritmo, os estoques de

itens são colocados próximos ao local de uso etc. No entanto, o projeto de processos de montagem

com desempenho superior em qualidade e produtividade proposto pela filosofia JIT/TQC apresenta

diferenças em relação ao convencional quanto ao seu formato, tamanho, número de produtos por

linha, distribuição de tarefas e sinalizações de auxílio à produção. Essas questões serão discutidas a

seguir.

Inicialmente cabe salientar duas características associadas aos processos de montagem que

fazem com que os processos convencionais possam ser remodelados de forma simples e com

ganhos significativos. Primeiro, a grande maioria dos processos de montagem fazem uso intensivo

de mão-de-obra permitindo que técnicas motivacionais de trabalho em equipe possam ser

implantadas. Os investimentos nesse caso são muito inferiores aos investimentos em tecnologia, e

os ganhos potenciais de qualidade e produtividade dos montadores maiores. Segundo, os processos

de montagem são na sua grande maioria os geradores dos estoques por toda a fábrica. O tamanho da

linha está associado ao uso intensivo de estoques amortecedores (buffers) de componentes dentro da

mesma. Uma melhora no desempenho da linha fará com que não só os estoques diretos na linha se

reduzam, mas também que os estoques por toda a fábrica sejam solicitados de forma organizada e

previsível. Reduzindo a necessidade de buffers haverá redução de espaços físicos, de tamanhos de

lotes e contenedores, e aproximará os operadores simplificando a burocracia para administrá-los.

Nos processos convencionais de montagem costuma-se dedicar cada linha a um produto

específico, bem como procura-se concentrar toda a montagem do produto em uma única linha.

Essas decisões são tomadas com base em que uma linha cativa reduz o tempo de ciclo de conversão

dos estoques em produtos acabados, permitindo que operações paralelas simples e menores possam

ser projetadas e que a mão-de-obra alocada para essas operações possa ser treinada mais

rapidamente. Dentro dessa visão, o baixo envolvimento dos operadores com os produtos montados

é estimulado pela excessiva subdivisão das tarefas. O aumento de produção se dá pela adição de

mais operadores na linha executando a mesma tarefa. Dessa forma o tamanho das linhas

convencionais tende a ser grande, visto que o tamanho de uma linha é proporcional ao número de

postos de trabalho e aos estoques de materiais dentro da mesma.

Contudo, em determinadas situações, pode ser vantajoso repensar esse paradigma,

desenhando linhas para montar dois, três, ou até quatro produtos simultaneamente trazendo algumas

vantagens significativas, quais sejam:

redução de espaço físico: quando dois ou mais produtos tiverem componentes comuns

pode-se juntar as linhas individuais em uma linha mista com necessidade menor de

espaço físico pois os buffers dos componentes comuns serão reduzidos;

ritmo regular de produção: a combinação das demandas dos produtos é mais estável do

que as demandas individuais dos mesmos, tendendo a um valor médio que dará o ritmo

da linha mista. Pode-se empregar mais facilmente o conceito de nivelamento do

programa-mestre de produção com a composição da demanda, passando também para os

processos fornecedores demandas niveladas, evitando-se a formação excessiva de

estoques em processo;

redução de defeitos: o trabalho em uma linha mista exige um grau de atenção maior dos

montadores, fazendo com que se erre menos devido a redução do tédio pela repetição

exagerada de operações únicas. Os montadores se sentem mais motivados com o

emprego da polivalência e da ajuda mútua;

Page 44: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

35

segurança e flexibilidade: com a montagem de linhas mistas a possibilidade de transferir

produtos de uma linha para outra caso ocorra algum problema é maior. Nesse sentido,

pode-se também projetar mais de uma linha para um mesmo produto, ao invés de linhas

únicas com atividades em paralelo executadas por vários operadores. Dessa forma se tem

mais flexibilidade para solucionar problemas de paradas de linha e alocações de

demandas.

Assim como nos processos de fabricação repetitivos em lotes, o layout das linhas de

montagem tem um significado próprio no atendimento das metas de redução dos desperdícios e

aumento da qualidade da filosofia JIT/TQC. Convencionalmente, as linhas de montagem são

modeladas de forma retilínea. Esse formato, quando as linhas são muito grandes, dificulta as

comunicações entre os postos e a supervisão das tarefas, limitando a movimentação dos operadores

e o potencial de ajuda mútua entre eles. Como as distâncias são grandes, tende-se a implementar

equipamentos caros e automatizados para movimentação das plataformas onde serão montados os

itens. Talvez o principal problema seja o baixo envolvimento dos operadores com o resultado global

da linha, pois cada um deles ficará restrito a sua área de atuação sendo pressionado a manter um

ritmo de produção acelerado.

A proposta da produção JIT, conforme foi visto nos tópicos anteriores, é fazer com que o

layout da fábrica favoreça as ações de trabalho em grupo voltadas para a garantia da qualidade.

Nesse sentido as linhas de montagem devem dar prioridade ao formato em “L” ou “U” para as

pequenas linhas (de dois a oito posições), e ao formato em serpentina para linhas maiores. A Figura

2.6 ilustra uma linha em serpentina.

Armazenagem Focalizada

Armazenagem Focalizada

Arm

azenag

em F

ocalizad

a

Figura 2.6 Linha em serpentina.

As vantagens do formato em “U”, ou em serpentina (uma extensão do formato em “U”), já

foram citadas anteriormente na análise dos processos intermitentes em lotes, e também se aplicam

às linhas de montagem, quais sejam: manutenção de um ritmo de produção pelo sincronismo dos

Page 45: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

36

tempos de ciclo dos operadores; flexibilidade na capacidade de produção pela adição/remoção de

operadores; manutenção do padrão individual de operação independente dos tempos de ciclo; e

facilidade em adequar o layout as instalações pela compressão ou expansão da linha. Além dessas

vantagens já citadas, os layouts para linhas de montagem baseados no formato em “U” reduzem as

distâncias e os custos de retorno dos contenedores e plataformas de montagem vazias para o início

da linha, e favorecem a distribuição e movimentação dos estoques em processo, que podem ser

focalizados ao redor da área de montagem, acelerando o fluxo e reduzindo os espaços físicos

necessários.

Outra vantagem que pode ser obtida com as linhas de montagem em forma de “U” é a

possibilidade de desenvolver um layout global focalizado, integrando linhas de submontagens e

células de fabricação de peças componentes ao redor da linha de montagem final.

Um ponto importante relacionado com o layout das linhas de montagem diz respeito à forma

de acionamento da linha entre os postos de trabalho. Pode-se empregar linhas de acionamento

contínuo ou linhas com velocidade controlada pelo próprio montador, também chamadas de linhas

“stop-and-go”. A Figura 2.7 ilustra o funcionamento dessas duas alternativas.

Linha de velocidade controlada

Linha de acionamento contínuo

Figura 2.7 Forma de acionamento das linhas de montagem.

As linhas de montagem convencionais empregam o acionamento contínuo como forma de

buscar um incremento de produtividade pelo isolamento e multiplicação da ação individual dos

montadores. Ou seja, conforme pode ser visto na Figura 2.7, os montadores são dispostos “fora” da

linha de montagem que, por sua vez, segue um ritmo contínuo de acordo com o tempo de ciclo

necessário para atender a demanda do produto que está sendo montado. Cada montador possui um

estoque amortecedor (buffer) junto ao seu posto de trabalho e exerce um conjunto fixo de operações

de montagem. Sempre que ele completa suas operações, coloca o produto que está sendo montado

na linha e busca novo produto junto ao seu buffer para executar suas operações. Os buffers são

Page 46: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

37

projetados para absorver diferenças de ritmos de trabalho e problemas de forma geral. Caso a

demanda pelo produto montado se altere, acelera-se, ou reduz-se, a velocidade da linha para se

adequar ao novo tempo de ciclo exigido, e colocam-se, ou retiram-se, postos de trabalho com

funções idênticas de forma a manter a linha abastecida.

Nas linhas de acionamento contínuo é mais fácil fazer o balanceamento das atividades em

função das mudanças de demanda pela adição, ou subtração, dos montadores. Também é mais fácil

manter a linha operando pelo emprego dos buffers, mesmo que algum problema venha a acontecer

com algum montador. Linhas convencionais de montagem desse tipo estão mais preocupadas em

manter o nível de produção final de acordo com o previsto, do que buscar alternativas para uma

montagem eficiente, não só em termos de quantidade, mas principalmente quanto à qualidade e

custo do produto. Por outro lado, as linhas de montagem de sistemas de produção JIT procuram

atingir um nível superior de eficiência global com o uso de velocidades controláveis pelos próprios

montadores, dentro da lógica de puxar a produção.

A linha de velocidade controlada, como pode ser visto na Figura 2.7, posiciona os

montadores dentro da linha, obrigando-os a trabalharem em sincronia com o tempo de ciclo da

linha. Cada montador deve receber um número específico de tarefas que possa ser executado dentro

do tempo de ciclo definido pela demanda dos produtos. Caso a demanda, e consequentemente o

tempo de ciclo, pelo produto montado se altere, acelera-se, ou reduz-se, a velocidade da linha pela

adição, ou redução, do número de montadores que passarão a executar um novo conjunto de tarefas

dentro do novo tempo de ciclo estabelecido. A capacidade de produção da linha com velocidade

controlada é administrada pela mudança no conjunto de operações distribuída entre os montadores,

limitando dessa forma o tamanho viável que a linha pode atingir. Por outro lado, a linha

convencional de acionamento contínuo pode crescer teoricamente de forma ilimitada pois sempre

pode-se adicionar novos operadores e duplicar as tarefas para se obter tempos de ciclos mais

rápidos.

O ideal em uma linha de velocidade controlada é não manter buffers entre os montadores, de

forma que cada montador, ao completar seu conjunto de operações dentro do tempo de ciclo, passe

o produto que está sendo montado diretamente ao próximo montador. Isso garante a produção

puxada, fazendo com que só se exerçam atividades em cima de produtos que realmente estejam

sendo solicitados pelos clientes. O funcionamento da linha dessa forma obriga a eliminação de

desbalanceamento entre os postos, torna mais visível os problemas e garante taxas de produção

mais altas. Contudo, essa forma ideal de trabalho em linhas de montagem não é fácil de ser atingida

e necessita da aplicação conjunta de duas técnicas japonesas, características da filosofia JIT/TQC,

que são a ajuda mútua e os painéis de aviso (andon).

Conforme coloca Taiichi Ohno (OHNO, 1997 : 44), criador do Sistema Toyota de Produção,

os locais de trabalho dentro da empresa devem ser vistos como uma corrida de revezamento. Cada

operador deve passar o produto de sua operação diretamente ao próximo posto de trabalho. Essa é a

síntese da técnica de ajuda mútua. Caso ocorra algum problema com um dos postos adjacentes ao

seu, o operador deverá ajudá-lo a resolver o problema e, só então, retornar ao seu trabalho. O

objetivo do sistema produtivo deve ser sempre o de acelerar o fluxo de conversão dos produtos, e

não o de acelerar o ritmo das atividades individuais dos operadores, principalmente em linhas de

montagem onde o trabalho manual pode ser indiscriminadamente acelerado.

Com montadores polivalentes e a ajuda mútua entre eles, as linhas de montagem podem ser

balanceadas sem a necessidade do levantamento de padrões teóricos de trabalho muito detalhados,

pois deve-se buscar a velocidade natural de cada operador. A distribuição das tarefas passa a ser

Page 47: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

38

uma função do grupo de montadores, administrada pelo supervisor da linha. Indiretamente o

trabalho em grupo faz com que os montadores sejam disciplinados pelo grupo a manter o tempo de

ciclo preestabelecido, reduzindo a necessidade de ajudas mútuas.

A ajuda mútua é uma alternativa mais inteligente de manter a linha operando sem a

necessidade de buffers. Contudo, em algumas situações os estoques protetores ainda são

necessários. Por exemplo, se os tempos de ciclo forem muito curtos, ou se a atividade de montagem

não permitir que mais de um montador participe simultaneamente do processo, os buffers ainda

terão que ser usados. Uma alternativa para garantir inicialmente a segurança de uma linha pode ser

a de colocar buffers apenas entre grupos, ou equipes, de montadores, de forma que dentro das

equipes se empregue a ajuda mútua, evitando-se os estoques.

Em conjunto com a ajuda mútua há necessidade de se colocar dispositivos de sinalizações,

conhecidos como andons, para indicar que um problema ocorreu e que necessita ser corrigido. Um

exemplo clássico do emprego de andons na linha de montagem da Toyota, apresentado por Monden

(MONDEN, 1984 : 87), consiste em equipar a linha com lâmpadas de chamada e quadros

luminosos. As lâmpadas de chamada, em diferentes cores, são utilizadas pelo montador para

solicitar a ajuda do supervisor, ferramenteiro, mecânico da manutenção ou outro montador que

possa solucionar o problema. São afixadas suspensas no alto da linha, em conjunto com um quadro

luminoso que acende uma de suas células para indicar em qual posto de trabalho está ocorrendo o

problema. Com esse sistema o montador solicita ajuda e, caso o problema não seja solucionado a

tempo, pode inclusive acionar um interruptor para parar toda a linha. Dessa forma, nenhum

problema passa despercebido pelo grupo e o princípio de melhoramento contínuo pode ser colocado

em prática.

Outra forma de aplicar o andon para manter o ritmo de linhas de montagem, consiste em

estabelecer um tempo de movimentação para a esteira transportadora associado ao tempo de ciclo

que se espera da linha. Ao final de cada tempo de ciclo, o montador que concluiu suas tarefas

aciona um interruptor dando autorização individual para que a esteira se movimente.

Simultaneamente sua luz de sinalização troca da cor amarela (operando) para verde (livre). Quando

todos os montadores acionam seus interruptores, a esteira transporta os produtos para os postos

seguinte. Caso algum montador não consiga terminar suas operações a tempo, a esteira não se

movimenta e a luz amarela sinaliza quem está com problemas.

2.4 FOCALIZAÇÃO NA ARMAZENAGEM E MOVIMENTAÇÃO

Para completar esse capítulo sobre as questões relativas à focalização da produção está

faltando apresentar algumas considerações a respeito do que ocorre com a armazenagem e a

movimentação dos materiais em uma fábrica focalizada, já que em fábricas convencionais a rotina

em torno dos materiais é bem conhecida. Essa rotina tem sua origem na própria lógica de

funcionamento dos sistemas convencionais que admitem como indispensáveis os estoques para

resolver uma série de problemas (TUBINO, 1997 : 106-107) estruturais de funcionamento interno,

ou externo, do sistema, quais sejam:

garantir a independência entre etapas produtivas: a colocação de estoques

amortecedores entre etapas de produção ou distribuição da cadeia produtiva permite que

essas etapas possam ser encaradas como independentes das demais. Qualquer problema

que uma dessas etapas tenha não será transferido para as demais;

Page 48: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Produção Focalizada

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

39

permitir uma produção constante: sistemas produtivos que possuem variações sazonais

na sua demanda ou nas suas matérias-primas, estocam produtos acabados ou matérias-

primas para evitar que o ritmo de produção sofra grandes saltos nesses períodos;

possibilitar o uso de lotes econômicos: algumas etapas do sistema produtivo só permitem

a produção ou a movimentação econômica de lotes maiores do que a necessidade de

consumo imediata, gerando um excedente que precisa ser administrado;

reduzir os lead times produtivos: a manutenção de estoques intermediários dentro dos

sistemas produtivos permitem que os prazos de entrega dos produtos possam ser

reduzidos, pois ao invés de esperar-se pela produção ou compra de um item, pode-se

retirá-lo do estoque e usá-lo imediatamente;

como fator de segurança: variações aleatórias na demanda são administradas pela

colocação de estoques de segurança baseados no erro do modelo de previsão. Outros

problemas como a quebra de máquinas, o absenteísmo, a má qualidade do que é

produzido, uma programação da produção ineficiente, entregas de fornecedores fora do

prazo etc. também são administrados com a colocação de estoques protetores;

para obter vantagens de preço: algumas empresas incrementam seus níveis de estoques

para se prevenir de possíveis aumentos de preços, normalmente dos materiais comprados,

ou ainda, compram em quantidades superiores as necessárias visando obter desconto no

preço unitário. Por outro lado, as empresas também aumentam os níveis de estoques dos

produtos acabados quando sentem que seus preços no mercado irão subir.

Em conseqüência desses fatores a armazenagem e movimentação dos materiais nos sistemas

convencionais sempre foram vistas como funções operacionais indispensáveis, que deveriam ser

administradas com as melhores e mais modernas técnicas de gestão de estoques. Nesse sentido, as

empresas centralizaram a administração dos materiais em grandes almoxarifados que permitissem, e

justificassem economicamente, investimentos em sistemas de armazenagem e acesso automatizados

visando aumentar a produtividade dessas funções. Como os materiais representam algo em torno de

60% dos custos produtivos, facilmente se justificam investimentos nesses almoxarifados centrais

que trouxessem reduções de estoques da ordem de 5% ou menos.

Com a focalização da produção em unidades bem definidas de negócios e a aplicação de

técnicas de produção JIT que elevam os níveis de confiabilidade e produtividade dos sistemas

produtivos, os estoques deixaram de ter essa importância estratégica e passaram a ser tratados como

apenas mais um fator de produção que deve ser racionalizado. Dessa forma, na busca pela

agilização do fluxo de materiais dentro do sistema produtivo, a produção focalizada se propôs a

descentralizar os almoxarifados centrais e distribuir os estoques do sistema o mais perto possível do

ponto de uso. Com isso, busca-se delegar mais autoridade e responsabilidade gerencial pelos

estoques aos próprios operadores da produção, e reduzir todos os custos associados as funções de

armazenagem e movimentação dos materiais. Os investimentos em automação para acelerar o fluxo

de materiais acabam sendo desnecessários.

A Figura 2.8 ajuda a ilustrar a configuração descentralizada dos estoques em um sistema de

produção focalizado. Nesse sistema cada subfábrica se encarrega de administrar suas próprias

necessidades de materiais internas ou externas. No âmbito externo, os fornecedores de matérias-

primas e peças componentes fazem suas entregas diretamente à subfábrica correspondente, sem

passar por toda a burocracia convencional de recepção e inspeção de cargas e documentação. O

ideal é que ao melhorar o relacionamento com os fornecedores e transportadores, as entregas sejam

feitas em pequenos lotes, em contenedores padronizados, em um ritmo compassado com a

demanda. Mais adiante no capítulo sete essas questões de relacionamento JIT dentro da cadeia

produtiva serão tratadas em detalhe.

Page 49: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 2

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

40

No âmbito interno, cada célula de fabricação ou linha de montagem administra seus próprios

estoques dentro da lógica de puxar a produção, ou seja, cada processo fornecedor só produz e

repõem os estoques dos seus clientes na medida em que os mesmos são solicitados. Geralmente

emprega-se para isso o sistema de programação e controle de estoques conhecido como kanban, que

devido a sua importância para a produção JIT será detalhado em capítulo próprio. No sistema

kanban os estoques são distribuídos pela fábrica em pequenos almoxarifados de acesso livre aos

usuários, chamados de supermercados, devido a sua semelhança de operação com a lógica de

reposição dos produtos nas prateleiras dos supermercados.

Subfábrica 3 Subfábrica 4

Subfábrica 1 Subfábrica 2

Figura 2.8 Armazenagem focalizada.

Dessa forma, com a focalização dos estoques junto aos seus pontos de fabricação e uso, a

armazenagem e movimentação dos mesmos passa a ser mais uma função dos operadores

polivalentes, simplificando toda a burocracia associada à grandes almoxarifados centrais e

reduzindo drasticamente a mão-de-obra envolvida pela eliminação do pessoal de recepção,

contagem, inspeção, apontamento, movimentação, etc. Como os estoques estão próximos ao local

de uso os tempos de busca e acesso aos materiais se reduzem e as movimentações podem ser feitas

manualmente em pequenos lotes padronizados, reduzindo ainda mais a necessidade de capital de

giro e espaços físicos.

Concluindo esse capítulo, cabe ressaltar que os ganhos de produtividade oriundos da

focalização da produção se refletem em reduções superiores a 50% dos investimentos e espaços

físicos antes ocupados por estoques em processo e almoxarifados de matérias-primas, componentes

e produtos acabados. Harmon (HARMON, 1993 : 445-458) apresenta ao final de seu livro

Reinventando a Fábrica II uma lista com algumas das mais de 800 fábricas que implementaram

essas técnicas com apoio da Andersen Consulting e obtiveram ganhos dessa ordem e até superiores.

Page 50: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

3 PLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUÇÃO JIT

O capítulo 3 detalha as funções de planejamento e controle da produção dentro da ótica dos

sistemas de produção JIT. Inicialmente, é apresentada a estrutura hierárquica das funções de

planejamento e controle da produção no sentido de traçar um paralelo entre a forma como

essas funções são desenvolvidas dentro dos sistemas convencionais de empurrar a produção,

e dentro dos sistemas JIT de puxar a produção. Questões referentes aos horizontes de

planejamento e a consistência hierárquica dos planos são discutidas. Na seqüência do

capítulo, o plano-mestre de produção para os produtos acabados e seu emprego para o

cálculo do tempo de ciclo e quantidade de cartões kanbans é apresentado em destaque. Ao

final do capítulo 3, o nivelamento do plano-mestre à demanda média diária através da

programação mista de pequenos lotes é explicado, deixando-se para apresentar no capítulo 4

o sistema kanban de programação e controle da produção.

3.1 INTRODUÇÃO

No capítulo anterior foram discutidas as questões relacionadas à focalização da produção. A

distribuição dos recursos produtivos em unidades de negócios focalizadas a uma gama restrita de

produtos trás uma série de vantagens em termos de incremento da qualidade e produtividade, já

discutidas, para o sistema produtivo. Nesse terceiro capítulo pretende-se explorar as funções de

planejamento e controle da produção (PCP) dentro do contexto da filosofia JIT/TQC, mostrando

quais as diferenças e quais as vantagens que um processo produtivo JIT apresenta quanto ao

desenvolvimento dessas funções.

Inicialmente, cabe ressaltar os objetivos e funções do planejamento e controle da produção

em um sistema produtivo genérico. Via de regra, as atividades de PCP são desenvolvidas por um

departamento de apoio a produção, dentro da gerência industrial, que leva seu nome. Como

departamento de apoio, o PCP está encarregado da coordenação e aplicação dos recursos produtivos

de forma a atender da melhor maneira possível aos planos estabelecidos em níveis estratégico,

tático e operacional (TUBINO, 1997 : 23). A Figura 3.1 apresenta uma visão geral das funções do

PCP em sistemas de produção.

No nível estratégico, onde são definidas as políticas estratégicas de longo prazo da empresa,

o PCP participa da formulação do planejamento estratégico da produção, gerando um plano de

produção para determinado período (longo prazo) segundo as estimativas de vendas e a

disponibilidade de recursos financeiros e produtivos. A estimativa de vendas serve para prever os

tipos e quantidades de produtos que espera-se vender no horizonte de planejamento estabelecido. A

capacidade de produção é o fator físico que restringe o processo produtivo, e pode ser incrementada

ou reduzida, desde que planejada a tempo, pela adição de recursos financeiros. No planejamento

estratégico da produção o plano de produção gerado é pouco detalhado, normalmente trabalhando

com famílias de produtos, tendo como finalidade possibilitar a adequação dos recursos produtivos à

demanda esperada dos mesmos.

No nível tático, onde são estabelecidos os planos de médio prazo para a produção, o PCP

desenvolve o planejamento-mestre da produção, obtendo o plano-mestre de produção (PMP) de

produtos finais, detalhado no médio prazo, período a período, a partir do plano de produção, com

base nas previsões de vendas de médio prazo ou nos pedidos em carteira já confirmados. Onde o

Page 51: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

42

plano de produção considera famílias de produtos, o PMP especifica itens finais que fazem parte

dessas famílias. Ao executar o planejamento-mestre da produção e gerar um PMP inicial, o PCP

deve analisá-lo quanto as necessidades de recursos produtivos com a finalidade de identificar

possíveis gargalos que possam inviabilizar esse plano quando da sua execução no curto prazo.

Identificado os potenciais problemas, e tomadas as medidas preventivas necessárias, o PMP pode

ser implementado. Apesar de ser um plano de médio prazo, já a partir do estabelecimento do PMP o

sistema produtivo passa a assumir compromissos de fabricação e montagem dos produtos.

Planejamento Estratégicoda Produção

Plano de Produção

Planejamento-mestreda Produção

Plano-mestre de Produção

Programação da Produção•Administração dos Estoques•Seqüenciamento•Emissão e Liberação de Ordens

Ordens de

Montagem

Ordens de

Fabricação

Ordens de

Compras

Fabricação e Montagem

Departamento de Compras

Pedido de Compras

EstoquesFornecedores

Departamento de Marketing

Previsão de Vendas

Pedidos em Carteira

Aco

mp

an

ha

me

nto

e C

on

tro

le

da

P

rod

uçã

o

Ava

liaçã

o d

e D

ese

mp

en

ho

Clientes

Figura 3.1 Visão geral das atividades do PCP (TUBINO, 1997 : 25).

No nível operacional são preparados os programas de curto prazo de produção e realizado o

acompanhamento dos mesmos. O PCP desenvolve a programação da produção administrando

estoques, seqüenciando, emitindo e liberando as ordens de compras, fabricação e montagem, bem

como executa o acompanhamento e controle da produção.

A programação da produção estabelece no curto prazo quanto e quando comprar, fabricar ou

montar de cada item necessário à composição dos produtos finais com base no PMP e nos registros

de controle de estoques. Para tanto, são dimensionadas e emitidas ordens de compra para os itens

comprados, ordens de fabricação para os itens fabricados internamente, e ordens de montagem para

as submontagens intermediárias e montagem final dos produtos definidos no PMP. Em função da

disponibilidade dos recursos produtivos, a programação da produção se encarrega de fazer o

Page 52: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Planejamento e Controle da Produção JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

43

seqüenciamento das ordens emitidas, de forma a otimizar a utilização dos recursos. Se o plano de

produção providenciou os recursos necessários, e o PMP equacionou os gargalos, não deverá

ocorrer problemas na execução do programa de produção seqüenciado. Dependendo do sistema de

produção empregado pela empresa, a programação da produção enviará as ordens a todos os setores

responsáveis (sistema empurrado) ou apenas à linha de montagem final dos produtos (sistema

puxado).

O acompanhamento e controle da produção, através da coleta e análise dos dados, busca

garantir que o programa de produção emitido seja executado a contento. Quanto mais rápido os

problemas forem identificados, mais efetivas serão as medidas corretivas visando o cumprimento do

programa de produção. Já estão disponíveis, tecnológica e economicamente falando, coletores de

dados automatizados, que aceleram as comunicações entre a Produção e o PCP. Além das

informações de produção úteis ao PCP, o acompanhamento e controle da produção normalmente

está encarregado de coletar dados (índices de defeitos, horas/máquinas e horas/homens consumidas,

consumo de materiais, índices de quebras de máquinas, etc.) para outros setores do sistema

produtivo.

Um dos objetivos básicos do PCP consiste em estruturar e dar consistência as informações

dentro destes três níveis, ou seja, o plano-mestre de produção gerado pelo planejamento-mestre da

produção só será viável se estiver compatível com as decisões tomadas a longo prazo previstas no

planejamento estratégico da produção, como a aquisição de equipamentos, negociação com

fornecedores, etc. Da mesma forma, a programação de fabricação de determinado componente será

efetivada de forma eficiente se a capacidade produtiva do setor responsável pela mesma tiver sido

equacionada no planejamento-mestre da produção, com a definição do número de turnos, recursos

humanos e materiais alocados, etc.

Essa visão geral das atividades desenvolvidas no âmbito do PCP está contida dentro de

qualquer sistema produtivo. Contudo, a forma como essas funções são implementadas e os

resultados efetivos alcançados estão intimamente relacionados com a filosofia de produção. Nos

sistemas convencionais, apesar do PCP desenvolver suas funções de planejamento,

acompanhamento e controle da produção, os resultados alcançados pelos setores produtivos ficam

muito aquém dos planejados, gerando um ciclo de replanejamentos intensos e metas não atendidas.

O reflexo disso pode ser medido pela volume de estoques em processo e os elevados lead times

produtivos. Como alternativa, muitas empresas buscam através da informatização do fluxo de

informações via softwares conhecidos como MRP II (Manufacturing Resource Planning),

atualmente evoluindo para ERP (Enterprise Resource Planning), a solução para seus problemas.

Infelizmente problemas estruturais dos sistemas de produção, como baixa confiabilidade dos

padrões de trabalho, lead times excessivos, grandes lotes de fabricação, quebras de máquinas,

atrasos de fornecedores etc., não podem ser solucionados pela simples aplicação de softwares.

Já os sistemas de produção JIT apresentam soluções particulares para resolver os problemas

de coordenação entre os vários pontos do processo produtivo e os planos e programas de produção.

Essas soluções inovadoras abrangem desde a forma de como planejar o uso dos recursos produtivos

(homens, máquinas e materiais) dentro de um determinado tempo de ciclo (TC) atrelado à demanda,

até a dinâmica de acionar esse sistema para efetivar a produção. A seguir essas características serão

descritas.

Page 53: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

44

3.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO PCP NA PRODUÇÃO JIT

Inicialmente, uma questão importante no desenvolvimento das atividades do PCP diz

respeito aos horizontes de planejamento e programação da produção. Qual o período de abrangência

do longo, médio e curto prazo? Não existe um padrão, porém pode-se afirmar que os horizontes

dependerão da flexibilidade do sistema produtivo, ou seja, do tempo de resposta (lead time) aos

pedidos de compra, fabricação e montagem. Para aquelas empresas que conseguirem resolver

melhor seus problemas de coordenação entre demanda e produção, os períodos serão menores, já

para as empresas com baixa flexibilidade de resposta às variações da demanda, os horizontes de

planejamento serão mais longos e as decisões serão tomadas com maior antecedência, aumentando

a probabilidade de ocorrerem problemas entre os quantitativos planejados e os realmente

executados e entregues aos clientes.

Os sistemas de produção JIT buscam continuamente o aumento de flexibilidade, seja pela

forma estrutural de distribuição dos recursos em unidades de negócios focalizadas, com células de

fabricação e montagem operadas por funcionários polivalentes, seja pela diminuição dos lotes de

produção a partir da redução dos tempos de setups e eliminação das atividades que não agregam

valor aos produtos, ou ainda, pela estabilização e sincronização das demandas dentro da cadeia

produtiva em que a empresa está inserida. Esses pontos são os objetos de discussão desse livro.

A Toyota Motors, precursora da produção JIT, trabalha como qualquer empresa baseada nos

três horizontes de planejamento e programação já descritos. Faz um plano de produção estratégico

com períodos anuais, um plano-mestre de produção com periodicidade mensal, e uma programação

de montagem diária. Contudo, como ela possui alta flexibilidade em seu sistema produtivo, o plano-

mestre de produção é subdividido em três planos com períodos de dez dias, sendo que cada um

deles é passado à Toyota Motors pelos revendedores, com base em seus estoques, com antecedência

de sete dias. A Figura 3.2 ilustra essa seqüência de etapas.

10 - 9 - 8 - 7 - 6 - 4 - 3 - 2 - 1Dia

da

Montagem17

Entrega dos

pedidos de

dez dias

Entrega

dos

pedidos

diários

Consolidação

dos pedidos

diários

Programa

de

montagem

Figura 3.2 Horizontes de planejamento e programação da Toyota Motors.

A Toyota Motors emprega as informações desse plano de dez dias para revisar seu plano-

mestre mensal. A cada dia, com antecedência de quatro dias da data de montagem dos carros, os

revendedores enviam um pedido diário incluindo as especificações exigidas pelos clientes que não

fizeram parte dos carros solicitados anteriormente no plano de dez dias. Três dias antes da

montagem dos carros, o setor de vendas classifica e consolida os diversos pedidos dos revendedores

Page 54: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Planejamento e Controle da Produção JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

45

segundo os tipos de carroçarias, motores, transmissões e cores, passando essas informações à

fábrica. Com dois dias de antecedência, a fábrica finalmente estabelece a seqüência do programa de

montagem para a linha (MONDEN, 1984 : 34-35). O mais impressionante é que a Toyota Motors

emprega esse escalonamento de planos desde o início dos anos oitenta, quando o padrão do setor

automobilístico era o de produção em massa de um único modelo de automóvel.

O que se observa com esse exemplo é que quanto maiores forem os horizontes dos planos e

programações de produção, maiores serão as chances de que a produção real não se nivele com a

demanda efetiva dos produtos. A flexibilidade do sistema produtivos da Toyota Motors permite que

apenas quatro dias antes da montagem final do produto, algumas modificações sejam feitas para

adequar à produção com a demanda real. Contudo, quando se fala em flexibilidade de um sistema

de produção JIT, ela deve ser entendida dentro de uma estrutura hierárquica de planejamento. Ou

seja, como qualquer sistema produtivo, a medida em que o momento de se efetivar a produção for

chegando, o nível de flexibilização do programa de produção vai se reduzindo. A Figura 3.3 procura

apresentar esse escalonamento da flexibilidade dentro do sistema de produção JIT, relacionando-o

com os diversos planos de planejamento e controle da produção.

Plano

de

Produção

Longo

Prazo

Flexibilidade Total

Balanceamento entre

Capacidade e Demanda

Plano Mestre

de

Produção

Médio

Prazo

Flexibilidade de Volume

e Mix

Definição do Tempo de

Ciclo e Kanbans

Sistema

de

Puxar

Curto

Prazo

Flexibilidade de Mix

Produção via

Kanban

Figura 3.3 Flexibilidade e PCP no sistema de produção JIT.

No longo prazo, quando se elaboram os planos estratégicos de produção pode-se dizer que a

flexibilidade é total, pois tem-se tempo suficiente para alterar a forma e a capacidade produtiva do

sistema de maneira a atender à demanda agregada prevista. O sistema de produção JIT, conforme

apresentado no capítulo anterior, procura através da produção focalizada desenvolver uma estrutura

que permita de forma simples alterações em sua capacidade de produção, tanto em volume como

em variedade (mix) de produtos. É evidente que a flexibilidade total, da qual está se falando, não

significa a transformação de um sistema de produção de geladeiras em uma fábrica de fogões, por

exemplo, mas sim em recompor essa fábrica de geladeiras para a uma nova previsão de demanda

agregada por seus produtos.

Page 55: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

46

No médio prazo, uma vez estabelecida sua estrutura produtiva, os sistemas de produção

partem para a montagem de um plano-mestre de produção de produtos acabados baseado nas

previsões de médio prazo da demanda. Convencionalmente, as informações contidas no PMP são

usadas como ponto de partida para o início das atividades de montagem, fabricação e compras do

sistema produtivo, limitando a partir daí a flexibilidade do sistema. Nesse caso, o sistema produtivo

convencional está sendo acionado para atender as previsões de médio prazo, e a falsa flexibilidade

atribuída a esses sistemas são obtidas com base em grandes estoques de segurança. Nos sistemas de

produção JIT as informações do PMP não são empregadas para gerar um programa de produção,

mas sim, para organizar as variáveis estruturais do sistema produtivo JIT, quais sejam, os tempos de

ciclo e os níveis de estoques necessários para atender essa previsão de demanda. Dessa forma,

preserva-se no médio prazo a flexibilidade de se alterar o volume e o mix do programa de produção,

pois as ordens que autorizariam a montagem, fabricação e compras ainda não foram expedidas.

No curto prazo o sistema produtivo irá efetivar a produção a partir das ordens emitidas.

Nesse ponto existe uma grande diferença entre como isso é feito nos sistemas convencionais

(empurrando) e nos sistemas JIT (puxando), influenciando de forma direta a flexibilidade do

sistema. A Figura 3.4 ilustra essa diferença. Conforme pode ser visto nessa figura, empurrar a

produção significa elaborar periodicamente com base no PMP um programa de produção completo,

com ordens de montagem, fabricação e compras, e transmiti-lo aos setores responsáveis para que

iniciem suas funções. No próximo período de programação, em função dos estoques remanescentes,

programam-se novas ordens para atender a um novo PMP.

Processo Processo Processo PAMP

Programação da Produção

Empurrar a produção

Processo Processo Processo PAMP

Programação da Produção

Puxar a produção

OC OF OF OM

OM

Figura 3.4 Empurrar e puxar a produção (TUBINO, 1997 : 105).

No sistema de produção puxado proposto pelo JIT, a programação da produção usa as

informações contidas no PMP, preferencialmente tão próximo da data limite quanto possível, para

emitir ordens apenas para o último estágio do processo produtivo, geralmente uma montagem. Os

demais estágios do processo produtivo não estão autorizados a trabalhar, a não ser que os processos

“clientes” venham até seus estoques (dimensionados no médio prazo em função do PMP) e

consumam determinada quantidade de itens. A partir daí esse processo fornecedor estará autorizado

Page 56: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Planejamento e Controle da Produção JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

47

a repor especificamente os lotes consumidos. Esse forma de puxar a produção é operacionalizada

pelo sistema de programação kanban que será detalhado no próximo capítulo.

Sendo assim, o sistema JIT de puxar a produção fornece de uma forma simples, no curto

prazo, flexibilidade de mix ao processo produtivo, pois os recursos só serão acionados na medida

em que a demanda por itens realmente se efetivar. Dessa forma, com o sistema produtivo

balanceado com tempos de ciclo e estoques em processo adequados, seria indiferente a uma célula

produzir uma peça do tipo “A” ou do tipo “B”, enquanto que nos sistemas convencionais estaria se

produzindo peças tipo “A” mesmo que a demanda de curto prazo fosse por peças do tipo “B”, pois

o programa foi elaborado no médio prazo quando a demanda prevista era por peças do tipo “A”. A

Figura 3.5 dá uma visão geral das atividades de PCP quando inseridas no sistema de produção JIT.

Planejamento Estratégico

da Produção

Plano de Produção

Planejamento-mestre

da Produção

Plano-mestre de Produção

Programação da Produção

•Programa de montagem final

•Cálculo do número de kanbans

•Emissão e Liberação de kanbans

Programa de

Montagem

Kanbans

de

Produção

Kanbansde

Movimentação

FabricaçãoFornecedores

Departamento

de Marketing

Previsão de Vendas

Pedidos em Carteira

Acom

panham

ento

e C

ontr

ole

da

Pro

dução

Avalia

ção d

e D

esem

penho

Clientes

Montagem

Kanbansde

Fornecedores

K K

Figura 3.5 Visão geral das atividades do PCP no sistema JIT (TUBINO, 1997 : 196).

Alguns críticos do sistema de produção JIT, até por não entenderem o inter-relacionamento

entre as diversas ferramentas operacionais do sistema, colocam que a flexibilidade do sistema de

puxar a produção fica bastante limitada quando as demandas são variáveis, e que nesse caso

sistemas de PCP baseados na lógica computacional do MRPII seriam mais eficientes. É obvio que

nenhum sistema produtivo está preparado para atender de forma eficiente demandas muito

variáveis, pois sempre haverá um período onde o programa de produção será emitido e “congelado”

para autorizar a produção (no caso dos sistemas empurrados), ou onde os estoques em processo

serão dimensionados para suportar a demanda futura (no caso dos sistemas puxados). O que os

sistemas convencionais fazem para administrar demandas variáveis é trabalhar com estoques altos,

Page 57: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

48

de forma a não necessitar produzir de imediato o que esta sendo consumido, fazendo com que seus

clientes, internos ou externos, sejam abastecidos a partir dos estoques.

Já em sistemas onde o fluxo de informações da produção é totalmente automatizado, com

coletores de dados on line ligados à um software de PCP, o sistema não é nem empurrado, pois o

software tem condições de emitir ordens conforme as necessidades, nem é puxado, pois procura-se

não formar estoques previamente. É um sistema ideal on line! O problema de sistemas de PCP

baseados em automação é a complexidade e o custo dos softwares para esse gerenciamento

instantâneo do processo produtivo, além do que as decisões são tomadas longe do chão-de-fábrica,

prejudicando o comprometimento dos operadores com o programa de produção a ser atendido.

Deve-se considerar ainda, como já foi falado, que ter informações rápidas de processos produtivos

ineficientes não resolve o problema do fluxo de informações do PCP.

Outro ponto muito importante relacionado com a variabilidade da demanda consiste em

analisar como se dá o relacionamento entre as empresas de uma cadeia produtiva. Na maioria das

vezes os clientes são outras empresas que possuem seus próprios sistemas de PCP, e a demanda é o

resultado das ordens de compra emitidas por seus sistemas. A Figura 3.6 ilustra essa inter-relação.

Em uma cadeia produtiva convencional o relacionamento entre as empresas está baseado na

concorrência, fazendo com que fornecedores e clientes se vejam como “ameaças” à suas posições

no mercado. Nesse caso, há um baixo relacionamento entre as empresas, que escondem suas

intenções de produção, fazendo com que as demandas sejam instáveis e conhecidas apenas no curto

prazo, ou seja quando da programação da produção.

?

Plano de Produção ?

Plano-mestre de Produção ?

ProgramaçãoProgramação

Plano de Produção ?

Plano-mestre de Produção ?

Plano de Produção ?

Plano-mestre de Produção ?

?ProgramaçãoProgramação

Cadeia produtiva convencional

Cadeia produtiva JIT

Plano de Produção !

Plano-mestre de Produção!

Plano de Produção !

Plano-mestre de Produção!

Plano de Produção !

Plano-mestre de Produção!

Figura 3.6 O PCP nas cadeias produtivas.

Já no relacionamento externo na cadeia produtiva JIT, as empresas buscam formar parcerias

estratégicas com seus clientes e fornecedores no sentido de aumentar a competitividade final da

cadeia. Conforme coloca Lubben (LUBBEN, 1989 : 35), a melhor forma de desenvolver esse

relacionamento estratégico em uma cadeia produtiva consiste em operar sistemas e procedimentos

operacionais em conjunto com os parceiros dessa cadeia. É a chamada política do “quimono

aberto”. No âmbito das funções do PCP, conforme pode ser visto na Figura 3.6, o relacionamento

entre as empresas de uma cadeia produtiva JIT se dá de forma intensa nos três níveis hierárquicos.

Page 58: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Planejamento e Controle da Produção JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

49

No longo prazo, dentro de um planejamento estratégico para a cadeia produtiva, cada

empresa estrutura suas unidades de negócio para suprir a demanda agregada do plano de produção

dos clientes dessas unidades. Assim, quando projeta-se um aumento, ou redução, da capacidade

produtiva para atender ao mercado futuro, cada empresa participante dessa cadeia pode se

reorganizar adequadamente dentro de um tempo hábil. No médio prazo cada empresa da cadeia

produtiva compõem o seu plano-mestre de produção para suas unidades de negócio a partir das

necessidades de itens previstas por seus clientes, não usando essa informação para autorizar a

produção, mas sim para fazer seus ajustes de médio prazo no balanceamento da produção para um

dado tempo de ciclo e nos níveis de estoques em processo (kanbans). No curto prazo o sistema de

puxar a produção se encarrega de acionar toda a cadeia produtiva buscando nos fornecedores apenas

os itens necessários, no momento e quantidade necessária (just-in-time) para atender ao cliente final

dessa cadeia. Dessa forma, as incertezas quanto ao que esperar de demanda por seus produtos é

reduzida apenas ao nível do cliente final. O relacionamento entre empresas na cadeia produtiva JIT

será tratado em detalhe no capítulo 7.

Após essas considerações gerais sobre as funções de planejamento e controle da produção

em sistemas JIT de manufatura, pretende-se complementar esse capítulo descrevendo algumas

características associadas ao plano-mestre de produção que facilitam a implementação da produção

puxada de curto prazo. O sistema kanban de programação e acompanhamento da produção será

tratado no capítulo seguinte.

3.3 PLANO-MESTRE NA PRODUÇÃO JIT

O plano-mestre de produção (PMP) tem por função desmembrar o plano estratégico de

longo prazo em planos específicos de produtos acabados no sentido de direcionar as etapas de

programação da produção. A partir da montagem do PMP a empresa passa a assumir compromissos

de montagem dos seus produtos acabados, fabricação das partes manufaturadas internamente, e da

compra dos itens e matérias primas produzidos pelos fornecedores externos. Como forma de

escalonar seus compromissos, o PMP é dividido em dois níveis de horizontes de tempo com

objetivos diferentes: um nível firme de curto prazo e um nível sujeito a alterações com horizonte

mais longo. A Figura 3.7 ilustra essa dinâmica.

Tempo

Dem

an

da

Demanda Real

Demanda Prevista

PMP Firme PMP Flexível

Figura 3.7 Dinâmica do PMP (TUBINO, 1997 : 95).

No nível firme, o PMP serve de base para a programação da produção (puxada ou

empurrada) e a ocupação dos recursos produtivos, direcionando as prioridades. No nível sujeito a

Page 59: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

50

alterações, o PMP serve para o planejamento da capacidade de produção e as negociações com os

diversos setores envolvidos na elaboração do plano. Mudanças no nível firme são caras e

indesejáveis, à medida que avança-se no tempo elas são permitidas. A parte firme do PMP está

associada as certezas da demanda e ao lead time do produto, enquanto que ao entrar-se na faixa de

previsões, mantêm-se um PMP flexível. Com o passar do tempo, e uma definição melhor da

demanda, a dinâmica do planejamento-mestre da produção faz com que o PMP flexível vá

assumindo compromissos e se transforme em PMP firme.

O princípio geral do sistema de produção JIT, como já foi colocado, é por um lado trabalhar

junto aos clientes externos no sentido de reduzir as incertezas da demanda (aumentando a área

correspondente à demanda real na Figura 3.7), e, por outro, aumentar a flexibilidade de seu sistema

produtivo, reduzindo os lead times, de forma que o período usado para compor o PMP fixo seja o

menor possível e sempre possa ser sobreposto à área firme da demanda. Agindo dessa maneira, o

sistema de produção JIT só autoriza a montagem de produtos que realmente estejam sendo

consumidos pelos clientes, evitando a formação de estoques excessivos de produtos acabados.

Por outro lado, nos sistemas convencionais de produção a parte firme do PMP precisa ser

emitida com uma antecedência muito grande para suportar os altos lead times internos e externos do

processo produtivo, fazendo com que a demanda usada para compor o PMP tenha forte influência

da parte prevista. Com isso, o sistema acaba planejando e autorizando a montagem de produtos que

não necessariamente serão consumidos pelos clientes. O excesso de produção causado pelo erro de

previsão acaba indo compor os estoques de produtos acabados. A longo prazo essa dinâmica faz

com que os responsáveis pelo PCP achem normal atender a demanda a partir dos estoques,

direcionando a produção do período apenas para recompor os estoques do sistema.

Um exemplo de como são longos os períodos em sistemas convencionais ocorreu no início

da década de noventa. Quando o governo Collor lançou seu plano de estabilização econômica,

houve uma grande mudança na composição da demanda por automóveis. Com a redução do

dinheiro em circulação na economia, os consumidores passaram a procurar carros populares,

gerando a falta desses modelos no mercado e o aparecimento do ágio. A população acabou

acusando as empresas automobilísticas aqui instaladas de estarem “escondendo” os modelos básicos

de automóveis para aumentarem seus preços. Como forma de defesa, o presidente de uma dessas

empresas foi a televisão dizer que estava fazendo todo o possível para alterar seus planos de

produção, e que, em função da logística de sua cadeia produtiva, só teria efeito a partir de cinqüenta

e dois dias à frente. Esse era o período fixo usado no seu PMP que estava acionando toda a cadeia

produtiva, e qualquer mudança de plano exigiria essa carência. Comparando essa dinâmica

convencional com a flexibilidade aplicada pela Toyota Motors nos seus planos de produção,

exemplificada anteriormente, pode-se entender porque os japoneses dominaram a indústria

automobilística na década de oitenta.

Tendo o PMP firme direcionado para atender a demanda real por seus produtos, o PCP nos

sistemas de produção JIT aciona apenas a linha de montagem final, fazendo com que os demais

processos produtivos do sistema de produção respondam em cadeia as solicitações de seus clientes,

dentro da lógica de programação puxada, já explicada anteriormente. Dessa forma, o PCP nos

sistemas de produção JIT emprega a parte variável do PMP apenas para organizar os recursos

produtivos em termos de ritmos de trabalho (tempo de ciclo) e estoques entre processos (kanbans)

que serão exigidos quando da implementação da parte fixa do PMP. Esses dois pontos serão

explicados a seguir.

Page 60: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Planejamento e Controle da Produção JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

51

O tempo de ciclo (TC) é o ritmo que deve ser dado ao sistema de produção para a obtenção

de determinada demanda dentro de um período de tempo, geralmente um dia. Para o cálculo do

tempo de ciclo emprega-se a Fórmula (3.1). Conforme pode ser visto nessa fórmula, a demanda

esperada por dia obtida do PMP entra no denominador dividindo o tempo disponível para a

produção diária. Convencionalmente, o conceito de tempo de ciclo é usado apenas nas linhas de

montagem, dado que nos processos repetitivos em lotes com layouts departamentais não há

condições de se manter um ritmo de trabalho homogêneo em todos os recursos. Já nos sistemas de

produção focalizada JIT, com o layout celular, é possível manter cada célula de fabricação

balanceada com o tempo de ciclo da montagem final. Conforme foi explicado no capítulo anterior, a

focalização da produção com células procura transformar processos intermitentes em um conjunto

de pequenos processos de fluxo contínuo, ligados entre si por estoques reguladores (kanbans).

Quanto melhor balanceados os processos entre si, menores os estoques reguladores do sistema.

TC = TP D (3.1)

TX = D TP (3.2)

Onde: TC = Tempo de ciclo em minutos por unidade;

TP = Tempo disponível para a produção por dia;

D = Demanda esperada por dia;

TX = Taxa de produção em unidades por dia.

Apesar do tempo de ciclo ser obtido de forma similar à taxa de produção (3.2), nos sistemas

JIT dá-se preferência ao emprego do conceito de tempo de ciclo, visto que a taxa de produção, por

ser expressa em unidades por dia, não limita o acionamento dos recursos produtivos, enquanto que

o tempo de ciclo obriga os operadores a manter um ritmo de trabalho homogêneo preestabelecido

pelo PMP. Por exemplo, uma taxa de produção de 15 peças por hora pode ser obtida produzindo-se

um lote de 15 peças a cada hora ou um lote de 60 peças a cada 4 horas. Contudo, um tempo de ciclo

equivalente de 2 minutos por unidade dá a medida do tempo preciso que cada operador dispõem

para a produção. Além disso, o emprego de operadores polivalentes nas células requer sua

distribuição com base no atendimento de determinado tempo de ciclo.

Com essa informação em mãos pode-se prever com tempo hábil qual serão os ritmos de

trabalho esperados para os próximos períodos. Caso a distribuição atual das tarefas não suportem

esse tempo de ciclo projetado algumas alternativas podem ser implementadas, por exemplo:

horas extras: em situações onde a previsão seja de um aumento de demanda durante um

curto espaço de tempo o recurso de horas extras é o mais empregado. Nesse sentido

pode-se deixar um intervalo de tempo entre os turnos de trabalho para ser usado como

capacidade de produção adicional;

realocação da mão-de-obra: operadores polivalentes podem ser transferidos entre

células, ou mesmo entre subfábricas, para rebalancear os tempos de ciclo;

atendimento antecipado da demanda: pode-se optar por produzir um pouco acima da

demanda atual para garantir um atendimento futuro;

uso de mão-de-obra temporária: contratar operadores temporários para ajudar durante

períodos de alta. Para minimizar o tempo gasto com o treinamento dos operadores

temporários, essa solução exige que as tarefas sejam de simples entendimento e os

equipamentos fáceis de operar.

Page 61: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

52

Os estoques entre processos também são dimensionados com base na demanda esperada do

PMP. Dessa forma, os sistemas de produção JIT buscam um balanceamento integrado entre ritmos

de produção (tempo de ciclo) e estoques no sistema (número de kanbans). A Fórmula (3.3) é

empregada para dimensionar o número de cartões kanbans necessários para cada item do sistema

produtivo. No próximo capítulo o sistema kanban será detalhado. Nesse momento pretende-se

discutir apenas a relação entre os estoques e o PMP.

ND

QT S

D

QT Sprod mov

1 1 (3.3)

Onde: N = número total de cartões kanban no sistema;

D = demanda média diária do item;

Q = tamanho do lote por contenedor ou cartão;

Tprod = tempo total para um cartão kanban de produção completar um ciclo

produtivo, em percentual do dia, na estação de trabalho;

Tmov = tempo total para um cartão kanban de movimentação completar um circuito,

em percentual do dia, entre os supermercados do produtor e do consumidor;

S = fator de segurança, em percentual do dia.

Conforme pode ser visto na Fórmula (3.3), a demanda esperada por determinado item,

obtida pela “explosão” da demanda do produto acabado constante do PMP, entra no numerador para

o cálculo dos estoques totais necessários ao sistema de puxar a produção. Um dos erros mais

comuns cometidos por empresas que estão implantando o sistema de produção JIT consiste em não

redimensionar os seus níveis de estoques quando ocorrem mudanças nos patamares da demanda do

PMP. Nesse caso, se a demanda diminuir estoques ficarão ociosos, enquanto que se a demanda

aumentar, problemas de conexão entre os postos ocorrerão. Tendo em vista que a quebra de ritmos

de trabalho aparece de forma mais imediata do que estoques em excesso, essas empresas tendem a

superdimensionar seus níveis de estoques como forma de resolver o problema.

Um ponto muito importante dentro da elaboração do PMP em um ambiente JIT diz respeito

a forma como os produtos acabados são distribuídos nesse programa-mestre para atender a demanda

de produtos acabados. Isso é conhecido como produção nivelada (MONDEN, 1984 : 31) e será

discutido em particular a seguir.

3.4 NIVELAMENTO DO PLANO-MESTRE À DEMANDA

Todo sistema de produção busca nivelar sua produção com a demanda de forma a acionar

seus recursos apenas na medida em que os clientes forem solicitando os produtos. Nesse aspecto, o

sistema de produção ideal é o processo contínuo, no qual consegue-se dar um ritmo de trabalho para

todo o sistema regulando o fluxo de materiais de acordo com a demanda. Infelizmente, a montagem

de processos contínuos tem seu campo de atuação restrito a produção em grande escala de produtos

homogêneos (refinarias, produtos químicos, energia elétrica etc.).

Nos demais sistemas de produção convencionais a baixa flexibilidade dos recursos

produtivos faz com que o nivelamento da produção à demanda seja visto dentro de um horizonte de

planejamento de médio prazo, geralmente mensal. Dessa forma, ao elaborar o PMP de seus

produtos acabados, o PCP dimensiona lotes mensais de montagem desses produtos. Essa decisão

Page 62: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Planejamento e Controle da Produção JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

53

está baseada em duas das premissas básicas dos sistemas convencionais: custa caro a mudança de

modelos nas linhas de montagem convencionais, e os clientes são atendidos basicamente pelos

estoques de produtos acabados.

Por exemplo, admitindo-se um sistema de produção que trabalha 20 dias por mês, oito horas

por dia, com uma linha de montagem que produz três modelos de tamanhos diferentes (pequeno,

médio e grande), cujas demandas esperadas são de 1000 unidades do modelo pequeno, 800

unidades do modelo médio e 200 unidades do modelo grande. Para atender a demanda, a linha

necessita montar 100 produtos por dia (2000 unidades 20 dias) com um tempo de ciclo médio de

4,8 minutos por unidade (480 minutos 100 unidades). As ordens de montagem do PMP emitidas

pelo PCP muito provavelmente seriam de 1000 unidades do modelo pequeno, 800 do médio e 200

do grande. Dessa forma a linha de montagem passaria os primeiros dez dias montando o modelo

pequeno, os próximos oito dias montando o modelo médio e os últimos dois dias do mês montando

o modelo grande. Essa programação nivelada pela demanda mensal trás, pelo menos, dois grandes

problemas à eficiência do sistema.

O primeiro deles está relacionado com o efeito multiplicador que um PMP possui em um

sistema de empurrar a programação, visto ser ele o acionador dos demais processos internos e

externos ao sistema. No exemplo acima, quando o PMP projeta lotes de montagem de 100 unidades

dia do modelo pequeno durante dez dias, os demais processos ligados à montagem (submontagens,

fabricação de componentes e fornecedores externos) são programados para atender a essa demanda

em lotes iguais ao do produto acabado ou até maiores, levando-se em conta os altos custos de

preparação. A Figura 3.8 ajuda a ilustrar essa situação. Nessa figura pode-se ver que a montagem de

100 unidades do modelo pequeno no dia três do mês obrigou a programação de um lote de 200

unidades do subconjunto pequeno no dia dois, que, por sua vez, gerou a programação de lotes

econômicos de 500 unidades do componente X no dia um. E assim os estoques e os ritmos de

trabalho acabam sendo totalmente desvinculados da real demanda dos produtos acabados, gerando

muito estoque no sistema e baixa flexibilidade de resposta.

O segundo problema decorrente do nivelamento da produção à demanda dentro de um

horizonte de planejamento de médio prazo está na impossibilidade de atender as necessidades dos

clientes com a produção programada quando a demanda prevista não se confirmar. Devido ao baixo

relacionamento dos sistemas convencionais com seus clientes e à política de vendas agressiva de

aceitar pedidos de curto prazo, mudanças na demanda prevista nesses sistemas é um fato comum.

No exemplo acima, o que aconteceria se no décimo quinto dia útil do mês o cliente resolve-se

mudar seu pedido para 500 unidades do modelo pequeno, 500 do médio e 1000 do grande. Apesar

do volume total se manter em 2000 unidades, o sistema produtivo não teria como atendê-lo sem

recorrer aos estoques, por duas razões: primeiro, não haveria tempo hábil para montar mais 800

modelos grandes nos últimos cinco dias úteis do mês, e segundo, os recursos produtivos (homens,

máquinas e materiais) que já foram alocados aos modelos errados, não poderiam ser desalocados

para atenderem as novas necessidades.

Para evitar a ocorrência desses problemas, os sistemas de produção JIT buscam nivelar a

produção com a demanda média diária, elaborando um PMP com lotes diários mistos. Como pré-

requisito é indispensável que a troca de modelos na linha de montagem e de ferramentas nas

máquinas seja feita de forma rápida e econômica. Esse ponto dos sistemas de produção JIT será

tratado em detalhe mais adiante. Logo, o PMP diário para o exemplo anterior seria de 50 unidades

do modelo pequeno (1000 20), 40 unidades do modelo médio (800 20), e 10 unidades do

modelo grande (200 20). A produção diária seria mantida em 100 unidades (50 + 40 + 10) como

no caso anterior. Quanto maior a flexibilidade da linha de montagem, menores poderão ser os lotes

Page 63: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 3

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

54

do PMP. Por exemplo, poderia ser planejado um ritmo de meio dia com lotes de 25/20/5 repetidos

duas vezes, ou ainda, ritmos de 48 minutos com lotes de 5/4/1 repetidos dez vezes ao dia.

Montagem modelo pequeno Q: 100 unidades Qs : 0 unid. Leadtime: 1 dia

Período em dias úteis 1 2 3 4 5 6 7 8

Necessidades Brutas 100 100 100 100 100 100 100 100

Recebimentos Programados 100 0 0 0 0 0 0 0

Estoques Projetados 0 0 -100 -200 -300 -400 -500 -600 -700

Necessidades Líquidas 0 100 100 100 100 100 100 100

Liberação Planejada de Ordens 100 100 100 100 100 100 100 100

Submontagem modelo pequeno Q: 200 unidades Qs : 0 unid. Leadtime: 1 dia

Período em dias úteis 1 2 3 4 5 6 7 8

Necessidades Brutas 100 100 100 100 100 100 100 100

Recebimentos Programados 200 0 0 0 0 0 0 0

Estoques Projetados 0 100 0 -100 -200 -300 -400 -500 -600

Necessidades Líquidas 0 0 100 100 100 100 100 100

Liberação Planejada de Ordens 0 200 0 200 0 200 0 0

Componente X Q: 500 unidades Qs : 50 unid. Leadtime: 1 dia

Período em dias úteis 1 2 3 4 5 6 7 8

Necessidades Brutas 0 200 0 200 0 200 0 0

Recebimentos Programados 0 0 0 0 0 0 0 0

Estoques Projetados 200 200 0 0 -200 -200 -400 -400 -400

Necessidades Líquidas 0 50 0 200 0 200 0 0

Liberação Planejada de Ordens 500 0 0 0 0 0 0 0

Figura 3.8 Efeito multiplicador do PMP.

Dessa forma, todos os dias estariam saindo da linha de montagem modelos pequenos,

médios e grandes que poderiam compor um pedido a ser entregue diretamente aos clientes (just-in-

time) sem a necessidade de recorrer aos estoques. Caso em determinada situação o cliente

resolvesse alterar seu mix de demanda mensal para, por exemplo, 500 unidades do modelo pequeno,

500 unidades do modelo médio, e 1000 unidades do modelo grande, o PCP nivelaria o PMP para

um ritmo diário de 25 unidades do modelo pequeno (500 20), 25 unidades do modelo médio (500

20), e 50 unidades do modelo grande (1000 20) de forma a acompanhar as necessidades atuais

do cliente. Caso os modelos tenham tempos de montagem muito distintos, uma mudança no mix do

PMP carretará falta, ou excesso, de tempo para os montadores poderem manter um tempo de ciclo

de 4,8 minutos por unidade. Nesse caso deve-se proceder a um novo balanceamento da linha com a

inclusão, ou exclusão, de montadores polivalentes.

Com a elaboração de um PMP com pequenos lotes diários mistos, todos as demais etapas do

sistema produtivo (submontagens, fabricação de componentes e fornecedores externos) seriam

acionadas, de acordo com a lógica de puxar a produção, segundo esse programa misto. Dessa forma

as etapas internas do sistema de produção e os fornecedores da cadeia produtiva também estarão

nivelados com as necessidades reais do cliente, evitando a formação de estoques. No próximo

capítulo será dado seguimento a esse assunto, apresentando o sistema de puxar de programação da

produção, conhecido como sistema kanban.

Page 64: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

4 SISTEMA KANBAN

O capítulo 4 destina-se a apresentar o sistema kanban de programação e acompanhamento

da produção JIT. A princípio, ressalta-se a visão geral do sistema kanban dentro da ótica de

puxar o processo de produção, característica própria do PCP nos sistemas de produção JIT.

Na seqüência apresenta-se os diferentes tipos de cartões usados pelo sistema kanban e

descrevem-se suas regras básicas de funcionamento e formas de operacionalização para

atingir a produção JIT. Em seguida, apresenta-se a sistemática de cálculo do número de

cartões kanban e comenta-se as funções que o sistema kanban cumpre dentro da produção

JIT, complementando-se o capítulo com uma lista de pré-requisitos exigidos para o

funcionamento adequado desse sistema.

4.1 INTRODUÇÃO

O sistema kanban foi desenvolvido na década de 60 pelos engenheiros da Toyota Motors,

com objetivo de tornar simples e rápidas as atividades de programação, controle e acompanhamento

de sistemas de produção em lotes. Essa idéia surgiu a partir da análise da forma como os

supermercados americanos, incipientes na época, tratavam seus estoques (OHNO, 1997 :44-45). O

sistema kanban foi projetado para ser usado dentro do contexto da filosofia JIT/TQC, e busca

movimentar e fornecer os itens dentro da produção apenas nas quantidades necessárias e no

momento necessário, daí a origem do termo “just in time” para caracterizar esse tipo de sistema de

produção.

Conforme foi apresentado no capítulo 3, o sistema kanban é um dos elementos que

diferenciam o planejamento e controle da produção JIT dos sistemas convencionais, caracterizando-

se por no curto prazo “puxar” os lotes dentro do processo produtivo, enquanto que os métodos

tradicionais de programação da produção “empurram” um conjunto de ordens para serem feitas no

período. A Figura 4.1, já apresentada anteriormente, ilustra esses dois sistemas.

Nos sistemas convencionais de empurrar a produção, elabora-se periodicamente, para

atender ao programa-mestre de produção (PMP), um programa de produção completo, da compra

da matéria-prima à montagem do produto acabado, transmitindo-o aos setores responsáveis através

da emissão de ordens de compra, fabricação e montagem, não sem antes passá-lo por uma etapa de

seqüenciamento, para adequá-lo as restrições de capacidade física do processo produtivo. No

próximo período de programação, em função dos estoques remanescentes, programam-se novas

ordens para atender a um novo PMP.

No sistema kanban de puxar a produção não se produz nada até que o cliente (interno ou

externo) de seu processo solicite a produção de determinado item. Nesse caso, a programação da

produção usa as informações do PMP para emitir ordens apenas para o último estágio do processo

produtivo, normalmente a montagem final, assim como para dimensionar as quantidades de

kanbans dos estoques em processo para os demais setores. A medida em que o cliente de um

processo necessita de itens, ele recorre aos kanbans em estoque nesse processo, acionando

diretamente o processo para que os kanbans dos itens consumidos sejam fabricados e repostos aos

estoques.

Page 65: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

56

Processo Processo Processo PAMP

Programação da Produção

Empurrar a produção

Processo Processo Processo PAMP

Programação da Produção

Puxar a produção

OC OF OF OM

OM

Figura 4.1 Empurrar e puxar a produção (TUBINO, 1997 : 105).

Desse modo, o sistema kanban de puxar a produção distribui por todas as subfábricas

quantidades previamente calculadas de estoques para fazer a conexão entre dois pontos de trabalho

relacionados. Seja entre células, entre células e a linha de montagem, ou entre os fornecedores

externos e os usuários internos. A Figura 4.2 apresenta essa forma de focalizar os estoques junto aos

pontos de uso. O sistema kanban se propõem a eliminar os almoxarifados centralizadores. Cabe

ressaltar que internamente nas células e nas linhas de montagem não se empregam kanbans visto

que nesses casos busca-se fluxo de produção unitário.

O sistema kanban na sua forma de agir simplifica em muito as atividades de curto prazo

desempenhadas pelo PCP dos sistemas de produção JIT, delegando-as aos próprios funcionários do

chão-de-fábrica. Uma vez dimensionado o sistema kanban, está embutido em sua sistemática de

funcionamento, as atividades de administração de estoques, seqüenciamento, emissão, liberação e

acompanhamento e controle das ordens referentes a um do programa de produção.

Na seqüência desse capítulo serão inicialmente apresentados os diferentes tipos de cartões

usados pelo sistema kanban. Em seguida, serão descritas suas regras básicas de funcionamento e

formas de operacionalização para atingir a produção JIT. Ao final será apresentada a sistemática de

cálculo do número de cartões kanban e descritas as funções que o sistema kanban cumpre dentro da

produção JIT, complementando com uma lista de pré-requisitos exigidos para o funcionamento

adequado do mesmo.

4.2 TIPOS DE CARTÕES KANBAN

O sistema kanban funciona baseado no uso de sinalizações para ativar a produção e

movimentação dos itens pela fábrica. Essas sinalizações são convencionalmente feitas com base nos

cartões kanban e nos painéis porta-kanbans, porém pode utilizar-se de outros meios, que não

Page 66: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

57

cartões, para passar essas informações. Os cartões kanban convencionais são confeccionados de

material durável para suportar o manuseio decorrente do giro constante entre os estoques do cliente

e do fornecedor do item. Cada empresa, ao implantar seu sistema kanban, confecciona seus próprios

cartões de acordo com suas necessidades de informações.

Subfábrica 3 Subfábrica 4

Subfábrica 1 Subfábrica 2

Figura 4.2 Armazenagem focalizada com o sistema kanban.

De acordo com a função que exercem, os cartões kanban dividem-se em dois grupos: os

cartões kanban de produção e os cartões kanban de requisição ou movimentação. Os cartões kanban

de produção autorizam a fabricação ou montagem de determinado lote de itens. Os cartões kanban

de requisição autorizam a movimentação de lotes entre o cliente e o fornecedor de determinado

item, podendo, por sua vez, serem cartões kanban de requisição interna ou serem cartões kanban de

requisição externa à empresa ou de fornecedores. A Figura 4.3 esquematiza essa subdivisão dos

cartões kanban.

Kanban

Kanban de

produção

Kanban de

requisição

Kanban de

req. interna

Kanban de

fornecedor

Figura 43 Subdivisões dos cartões kanban (TUBINO, 1997 : 197).

Page 67: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

58

4.2.1 Cartão kanban de produção

O cartão kanban de produção, também chamado de kanban em processo, é empregado para

autorizar a fabricação ou montagem de determinado lote de itens, tendo sua área de atuação restrita

ao centro de trabalho ou célula que executa a atividade produtiva nos itens.

O cartão kanban de produção exerce as funções das ordens de fabricação e montagem

emitidas pelos sistemas convencionais de PCP, porém, devido as características da filosofia JIT de

produção, na qual se insere o sistema kanban, o nível de informações contida nos cartões kanban é

bastante reduzido. Por exemplo, em uma ordem de fabricação convencional o PCP deve informar

qual a prioridade dada a mesma e qual o roteiro de fabricação que essa ordem deve seguir no seu

processamento. Já em um cartão kanban de produção essas informações são desnecessárias, visto

que o layout celular e os painéis de controle simplificam essas funções. Na descrição do

funcionamento do sistema kanban isso ficará claro.

A Figura 4.4 apresenta uma ilustração de um cartão kanban de produção com as

informações básicas que esse tipo de cartão kanban normalmente necessita para operar, quais

sejam:

especificação do processo e do centro de trabalho ou célula onde esse item é produzido;

descrição do item, com o código e especificação do mesmo;

local onde o lote deve ser armazenado após a produção;

capacidade do contenedor ou tamanho do lote que será fabricado;

tipo de contenedor para esse item;

número de emissão desse cartão em relação ao número total de cartões de produção para

esse item;

relação dos materiais necessários para a produção desse item e local onde se deve buscá-

los.

Em sistemas automatizados esses dados podem estar representados por um código de barras

que, ao ser lido, agilizará o fluxo de informações do PCP com os demais setores da empresa.

No. prateleira

estocagem

Processo Centro de trabalho

No. de item

Nome do item

capacidade do

contenedor

No. de

emissão

Tipo de

contenedor

Materiais necessários

codigo locação

Figura 4.4 Cartão kanban de produção (TUBINO, 1997 : 198).

Page 68: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

59

4.2.2 Cartão kanban de requisição interna

O cartão kanban de requisição interna, também chamado de cartão kanban de transporte,

retirada ou movimentação, ou simplesmente cartão kanban de requisição, funciona como uma

requisição de materiais, autorizando o fluxo de itens entre a célula ou centro de trabalho produtor e

a célula ou centro de trabalho consumidor dos itens.

Os cartões kanban de requisição são utilizados quando as células ou centros de trabalho

consumidor e produtor estão distantes um do outro, funcionando como uma autorização permanente

de transporte de itens para reposição no estoque da célula ou centro consumidor, desde que o

mesmo empregue o referido lote de itens no seu processo produtivo. Dessa forma, o fluxo de

informações é agilizado e a movimentação se dá sem a interferência do pessoal do PCP, reduzindo

as funções indiretas da fábrica.

Assim como no cartão kanban de produção, no cartão kanban de requisição, visto na Figura

4.5, devem constar apenas as informações indispensáveis para a movimentação dos itens entre os

dois postos de trabalho ou células, quais sejam:

descrição do item, com o código e especificação do mesmo;

especificação do centro de trabalho ou célula onde o item é produzido, também chamado

de centro de trabalho precedente, e local onde encontra-se armazenado o lote;

especificação do centro de trabalho ou célula onde o item é consumido, também

chamado de centro de trabalho subseqüente, e local onde deve-se depositar o lote

requisitado;

capacidade do contenedor ou tamanho do lote que será movimentado;

tipo de contenedor para esse item;

número de emissão desse cartão em relação ao número total de cartões de requisição

para esse item.

Essas informações também podem estar sintetizadas por um código de barras visando

acelerar o fluxo de informações do PCP com os demais setores da empresa.

Centro de trabalhoNo. de item

Nome do item

capacidade do

contenedor

No. de

emissão

Tipo de

contenedor

precedente

subseqüente

Centro de trabalho

Locação no

estoque

Locação no

estoque

Figura 4.5 Cartão kanban de requisição (TUBINO, 1997 : 199).

Page 69: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

60

4.2.3 Cartão kanban de fornecedor

O cartão kanban de fornecedor executa as funções de uma ordem de compra convencional,

ou seja, autoriza o fornecedor externo da empresa a fazer uma entrega de um lote de itens,

especificado no cartão, diretamente ao seu usuário interno, desde que o mesmo tenha consumido o

lote de itens correspondente ao cartão.

O uso do sistema kanban com fornecedores, a partir do relacionamento de parceria proposto

pela filosofia JIT/TQC, simplifica e racionaliza as atividades de reposição de estoques de curto

prazo por parte dos fornecedores, pois os mesmos ficam previamente autorizados a reporem os itens

consumidos por seus clientes internos, a partir da sinalização de um cartão kanban de fornecedor.

Dessa forma, além das informações usuais a um cartão kanban de requisição, o cartão

kanban de fornecedor, exemplificado na Figura 4.6, possui informações detalhadas quanto a forma

e o momento em que o fornecedor terá acesso as instalações do cliente para promover a entrega do

lote. As informações básicas de um cartão kanban de fornecedor são as seguintes:

nome e código do fornecedor autorizado a fazer a entrega;

descrição do item a ser entregue, com o código e especificação do mesmo;

especificação do centro de trabalho ou célula onde o lote do item deve ser entregue, e

local onde deve-se depositar o lote requisitado;

lista de horários em que se deve fazer as entregas dos lotes e ciclo em número de vezes

por período, normalmente diário;

capacidade do contenedor ou tamanho do lote que será entregue;

tipo de contenedor para esse item;

número de emissão desse cartão em relação ao número total de cartões de fornecedor

para esse item.

No caso do sistema kanban com fornecedores, o uso do código de barras no cartão kanban é

bastante recomendável para acelerar o fluxo de informações sobre a entrega de materiais,

principalmente com os setores de compras e financeiro, haja vista que o sistema kanban com

fornecedores dispensa a emissão de qualquer outra documentação, como a nota de entrada de

materiais por exemplo, por parte da portaria ou do almoxarifado central.

No. de item

Nome do item

capacidade do

contenedor

No. de

emissão

Tipo de

contenedor

Nome e código

do fornecedor

Centro de trabalho

para entrega

Local estocagem

Horários de

entregas

Ciclo de

entregas

Figura 4.6 Cartão kanban de fornecedor (TUBINO, 1997 : 200).

Page 70: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

61

4.2.4 Painel porta-kanban

O sistema kanban tradicional emprega painéis ou quadros de sinalização, chamados de

painéis porta-kanban, junto aos pontos de armazenagem espalhados pela produção, com a

finalidade de sinalizar o fluxo de movimentação e consumo dos itens a partir da fixação dos cartões

kanban nesses quadros. Esses painéis fazem parte do conceito mais amplo de gerenciamento visual

da fábrica JIT com a colocação de dispositivos de sinalizações (andons) por todo o processo

produtivo, já comentados anteriormente no capítulo 2.

Esses pontos de armazenagem são chamados de “supermercados” de itens, em decorrência

da origem histórica do sistema kanban estar associada a adaptação japonesa do sistema de reposição

de produtos existentes, na época de sua criação, nos supermercados americanos.

Cada supermercado de itens espalhado pelo sistema produtivo da empresa possui um painel

porta-kanban correspondente. Olhando para uma estação de trabalho ou célula isoladamente, a

mesma está atrelada a dois supermercados (Figura 4.7). Um deles é o supermercado de entrada,

onde estão as matérias-primas e peças necessárias à execução de suas atividades produtivas, com

seu respectivo painel porta-kanban de requisição e/ou fornecedor. O outro é o supermercado de

saída, onde estão os itens acabados executados por essa estação de trabalho ou célula, com seu

respectivo painel porta-kanban de produção.

O painel porta-kanban de requisição ou de fornecedor é empregado para sinalizar as

necessidades de reposição dos itens por parte dos fornecedores, internos ou externos, dessa estação

de trabalho ou célula. Enquanto que o painel porta-kanban de produção sinaliza para essa estação

de trabalho ou célula que itens estão sendo consumidos por seus clientes e que prioridades ele deve

dar à sua reposição.

Supermercado

de

itens acabados

Supermercado

de

matérias-primas

Figura 4.7 Célula e seus supermercados.

Nos painéis porta-kanban existe uma coluna para cada item armazenado no respectivo

supermercado, essas colunas são subdivididas em tantas linhas quanto forem o número de kanbans

projetados no sistema. A Figura 4.8 apresenta uma ilustração desse painel. Geralmente, como o

dimensionamento do número de kanbans no sistema é um processo dinâmico, algumas dessas linhas

Page 71: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

62

podem no momento não estarem sendo usadas. Conforme os clientes desse supermercado forem

retirando os contenedores com os lotes de itens, o cartão kanban correspondente, que está junto ao

lote no contenedor, é afixado, geralmente de baixo para cima, na primeira linha vazia da coluna

correspondente desse item, e o movimentador, ou o produtor, estão autorizados a requisitar ou

fabricar o lote de itens referentes ao cartão kanban afixado.

peça 1 peça 2 peça 3 peça 4 peça n

Condições normais

de operação

Atenção

Urgência

Figura 4.8 Painel porta-kanban (TUBINO, 1997 : 201).

Cada linha das colunas desses painéis porta-kanban é pintada com uma cor para facilitar a

visualização da urgência em se requisitar ou produzir esse item. Normalmente, emprega-se a cor

verde para indicar condições normais de requisição ou produção, a cor amarela para indicar

“atenção” com esse item, e a cor vermelha para sinalizar urgência na requisição ou produção do

item. Quanto mais perto da faixa vermelha, maior a prioridade para repor o item. Isso permite que

os postos de trabalho ou células façam seus próprios seqüenciamentos de forma simples e racional

dentro do conceito de gerenciamento visual da fábrica. O somatório das linhas verdes, amarelas e

vermelhas de cada coluna corresponde ao número total de cartões kanban, bem como contenedores

e lotes de itens, projetados para a operação do sistema.

4.2.5 Outros tipos de kanbans

Como já foi afirmado, o sistema kanban funciona baseado no uso de sinalizações para ativar

a produção e movimentação dos itens pela fábrica. Essas sinalizações são convencionalmente feitas

com base nos cartões kanban e nos painéis porta-kanbans, porém pode utilizar-se de outros meios

para passar essas informações e promover o sistema de puxar a produção, entre os quais o kanban

contenedor, o quadrado kanban, o painel eletrônico e o kanban informatizado. A seguir, será feita

uma breve descrição desses métodos alternativos de sinalização.

Kanban contenedor: em situações onde existem contenedores específicos para cada tipo de

item, pode-se substituir o cartão kanban por um cartão afixado diretamente no contenedor

com todas as informações necessárias a sua movimentação ou produção. Ao serem

requisitados os itens constantes desse contenedor pelo cliente, o contenedor ficará vazio e,

de imediato, autorizará a sua reposição. Uma variante do kanban contenedor consiste em

empregar um carrinho como sinal de kanban, visando facilitar a movimentação das peças,

particularmente útil para peças de grande porte.

Page 72: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

63

Quadrado kanban: esse sistema consiste em identificar no chão da fábrica um espaço

predefinido, ao lado da célula ou centro de trabalho, geralmente linhas de montagem, com

capacidade para um número predeterminado de itens. A reposição se dará no momento em

que esse quadrado kanban ficar vazio, sendo, então, preenchido todo o espaço do quadrado

kanban com novos itens. Essa sistemática é útil para peças grandes com formatos

irregulares, como, por exemplo, um quadro de motocicleta, de difícil colocação em um

contenedor.

Painel eletrônico: o uso de painéis eletrônicos com lâmpadas coloridas (verde, amarela e

verde) para cada tipo de item, junto à célula ou centro de trabalho produtor, pode ser

empregado para acelerar o fluxo de informações em relação ao método de cartões kanban

convencional. Nesse método, sempre que o usuário consumir um lote de itens, ele aciona

eletronicamente o painel de seu fornecedor, que estará autorizado a produzir o item. A

medida em que as solicitações de um item forem se acumulando, as lâmpadas

correspondentes ao nível de urgência se acenderão. Quando o centro de trabalho fornecedor

concluir um lote, ele acionará o painel para desativar a lâmpada correspondente.

Kanban informatizado: o kanban pode ser informatizado através do emprego de

computadores, dispositivos de entrada e saída de dados, e de uma rede de comunicações para

interligar diferentes pontos produtivos entre si, inclusive fornecedores externos. Com a

informatização do fluxo de informações, ganha-se o tempo gasto para se fazer a

movimentação dos cartões kanban entre os pontos consumidor e produtor, podendo-se

reduzir ainda mais os níveis de estoques nesses supermercados. Uma aplicação desse

sistema em uma fábrica de componentes de PVC é feita da seguinte maneira: no

almoxarifado de produtos acabados, ao se expedir um lote de produtos, o código de barras

do cartão kanban é lido e o cartão destruído, a informação então é processada por um

computador que autoriza a impressão de um novo cartão kanban, semelhante ao anterior,

junto ao centro produtor responsável pela produção do item expedido.

Como pode ser visto, as opções para implantação do sistema kanban são múltiplas,

dependerá da criatividade e dos recursos disponíveis na empresa, respeitando sempre os princípios

básicos de funcionamento do sistema, que serão expostos a seguir.

4.3 FUNCIONAMENTO DO SISTEMA KANBAN

O sistema kanban pode ser adaptado para trabalhar em diferentes situações, porém existem

algumas condições básicas simples que devem ser respeitadas e seguidas no sentido de tirar o

máximo proveito desse sistema de programação, controle e acompanhamento da produção. Essas

condições são conhecidas como “regras” de funcionamento do sistema kanban propostas por Ohno

(MONDEN, 1984 : 11-14), e serão apresentadas e comentadas a seguir.

Regra 1: o processo subseqüente (cliente) deve retirar no processo precedente (fornecedor)

os itens de sua necessidade apenas nas quantidades e no tempo necessário.

Essa primeira regra do sistema kanban é a chave do sistema de puxar a produção,

diferenciando-o dos sistemas tradicionais de empurrar. O atendimento da mesma implica em que os

clientes estão desde já autorizados a buscar em seus fornecedores os itens de sua necessidade,

Page 73: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

64

porém apenas nas quantidades e no momento em que ocorrer o seu consumo, ou seja, de posse de

um cartão kanban.

Como conseqüência direta dessa regra tem-se que qualquer requisição de itens sem um

cartão kanban autorizando-a é proibida, bem como, qualquer requisição de itens em quantidades

diferentes da autorizada no cartão kanban também é proibida.

Regra 2: o processo precedente (fornecedor) deve produzir seus itens apenas nas

quantidades requisitadas pelo processo subseqüente (cliente).

Essa regra tem como objetivo limitar os estoques em processo nas células ou postos de

trabalho à quantidade projetada para o sistema kanban, evitando a superprodução. Dessa forma os

fornecedores estarão produzindo apenas os itens imediatamente requisitados pelos clientes,

nivelando os ritmos de produção e garantindo uma reposição uniforme dos itens, no momento e nas

quantidades necessárias.

Em decorrência dessa regra, pode-se afirmar que qualquer produção diferente da autorizada

pelo cartão kanban está proibida.

Regra 3: produtos com defeito não devem ser liberados para os clientes.

Essa regra ressalta a importância da qualidade total dentro do sistema produtivo, via

padronização das operações, permitindo um fluxo contínuo de itens sem defeitos. Por outro lado, a

filosofia JIT/TQC na busca da flexibilidade no atendimento das necessidades dos clientes (internos

e externos), se propõem a trabalhar com pequenos lotes de produção, o que, em conseqüência, não

dá margem a existência de itens defeituosos nesses lotes.

Regra 4: o número de kanbans no sistema deve ser minimizado.

Como o sistema kanban tem por base o ambiente da filosofia JIT/TQC, deve-se seguir o

princípio do “melhoramento contínuo”, ou seja, todos os envolvidos no processo produtivo devem

buscar alternativas para trabalhar sempre com a mínima quantidade de estoques em processo.

Regra 5: o sistema kanban deve adaptar-se a pequenas flutuações na demanda.

Essa última regra diz respeito a capacidade do sistema kanban absorver pequenas alterações

de curto prazo na demanda sem a necessidade de intervenção do PCP no sentido de alterar o

número de kanbans no sistema. É a flexibilidade de mix comentada no capítulo anterior. Enquanto

que no sistema tradicional de emissão de ordens não existe a possibilidade de responder

rapidamente às variações de curto prazo na demanda, no sistema kanban, projetado para trabalhar

com pequenos lotes e tempos de ciclo operacionais balanceados, essa adaptação se dá de forma

simples e natural dentro da lógica de “puxar” a produção pela demanda do momento.

Uma vez apresentadas as regras básicas que devem ser seguidas no funcionamento do

sistema kanban, serão discutidas agora as três alternativas de operacionalização desse sistema mais

encontradas na prática, quais sejam: o sistema kanban com dois cartões, o sistema kanban com um

cartão, e o sistema kanban com fornecedores.

Page 74: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

65

4.3.1 Sistema kanban com dois cartões

O sistema kanban com dois cartões, um de produção e outro de requisição ou

movimentação, é empregado em situações onde o fornecedor (posto precedente) está situado longe

de seu cliente (posto subseqüente), obrigando-os a se comunicarem com o cartão de movimentação,

geralmente operacionalizado por uma terceira pessoa, aqui chamada de movimentador. A Figura 4.9

auxilia no entendimento do seu funcionamento.

M

M

M

P

P

M

Painel kanban Produção

P P P

P1 P2 P3 Pn

Painel kanban Produção

P P P

P1 P2 P3 Pn

Painel kanban Requisição

P1 P2 P3 Pn

M M M

Painel kanban Requisição

P1 P2 P3 Pn

M M M

M

M

PEstação de Trabalho

Posto Precedente

P P P

Estação de Trabalho

Posto Subsequente

P P P P

MM

PP

Figura 4.9 Sistema kanban com dois cartões (TUBINO, 1997 :205).

Conforme pode-se ver na Figura 4.9, existem duas estações de trabalho: o posto precedente

(fornecedor) e o posto subseqüente (cliente). Cada uma delas possui dois supermercados de itens

com seus respectivos painéis porta-kanban, um supermercado de matérias-primas, ou itens a serem

processados, com um painel kanban de requisição, onde são colocados os cartões kanban de

requisição ou movimentação, simbolizados pela letra “M”, e um supermercado de itens prontos com

um painel kanban de produção, onde são colocados os cartões kanban de produção, simbolizados

pela letra “P”.

Como o sistema kanban é de puxar a produção, inicia-se a explicação pelo posto

subseqüente que dará partida ao processo, sendo que as mesmas atividades serão executadas pelo

posto precedente, no momento oportuno.

Quando um cliente do posto subseqüente retira no supermercado de itens prontos um

contenedor com um lote de itens, ele coloca o cartão kanban de produção, que se encontrava junto

aos itens, no painel kanban de produção desse posto, na coluna correspondente ao item. Dessa

forma, o operador do posto subseqüente está autorizado a recolher o cartão do painel, seguindo a

regra de prioridade exposta quando apresentado o painel porta-kanban, e iniciar a produção do lote.

Em algumas aplicações, o operador está autorizado a recolher de uma só vez todos os cartões de um

mesmo item visando aproveitar o setup da máquina.

Para iniciar a produção do lote, o operador recorre ao seu supermercado de matérias-primas,

retirando os itens necessários para o seu trabalho. Nesse momento, ele retira o cartão kanban de

movimentação que estava junto às suas matérias-primas, e coloca-o no painel kanban de requisição,

Page 75: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

66

na coluna correspondente ao item, para informar da necessidade de reposição do lote de matérias-

primas consumido. Deixa junto o contenedor vazio. Em seguida, o operador produz seus itens,

coloca-os dentro do contenedor de itens prontos, com o respectivo cartão kanban de produção e

deposita-os no seu supermercado de itens prontos. Terminado esse ciclo, o operador recorre

novamente ao seu painel kanban de produção para reiniciar suas atividades.

Agora será detalhado o que ocorre com o cartão kanban de movimentação. Um operário

com a função de abastecedor dos supermercados espalhados pelo sistema produtivo, aqui chamado

de movimentador (equivalente ao almoxarife dos sistemas convencionais), periodicamente visita os

supermercados de matérias-primas dos postos produtivos, e recolhe os cartões kanban de

movimentação presentes no painel kanban de requisição. De posse dos cartões kanban de

movimentação e dos contenedores vazios, o movimentador está autorizado a ir até o supermercado

de itens prontos do posto precedente, para reabastecer os contenedores com os itens equivalentes.

Lá chegando, o movimentador identifica os itens que veio buscar com o cartão kanban de

movimentação, retira do contenedor identificado o cartão kanban de produção, fixando-o na coluna

correspondente ao item no painel kanban de produção desse posto, e coloca o cartão kanban de

movimentação dentro do contenedor cheio. Deixa, ainda, o contenedor vazio no local apropriado,

para que o operador desse posto o utilize. Realizadas todas as trocas necessárias, o movimentador

retorna ao posto subseqüente onde repõem, no supermercado de matérias-primas desse posto, os

contenedores com os itens e os cartões kanban de movimentação. Encerrando assim seu ciclo de

reabastecimento.

Olhando agora para o posto de trabalho precedente, esse está autorizado, pelos cartões

kanban de produção, afixados em seu painel kanban de produção, a iniciar um ciclo de trabalho

equivalente ao descrito para o operador do posto subseqüente. Dessa forma, quando todos os postos

de trabalho do sistema produtivo seguem essas regras, o sistema de puxar a produção na quantidade,

momento e tempo certo está ocorrendo, ou seja, a produção JIT.

4.3.2 Sistema kanban com um cartão

Diferentemente do sistema kanban com dois cartões, o sistema kanban com um cartão, o

cartão de produção, é empregado em situações onde o fornecedor (posto precedente) está situado

perto do seu cliente (posto subseqüente), não havendo necessidade de se comunicarem com um

cartão kanban de movimentação, fazendo eles mesmos a tarefa antes delegada ao movimentador de

cartões. A Figura 4.10 explica o funcionamento desse sistema mais simples.

Conforme pode-se ver nessa figura, existem duas estações de trabalho: o posto precedente

(fornecedor) e o posto subseqüente (cliente). Cada uma delas possui dois supermercados de itens,

um supermercado de matérias-primas, ou itens a serem processados, e um supermercado de itens

prontos, com seus respectivos painéis porta-kanban. Porém, como as duas estações estão

fisicamente próximas, as duas dividem um mesmo supermercado colocado entre elas, pois o que é

item pronto para o posto precedente, é matéria-prima para o posto subseqüente. Nesse caso, os

cartões kanban que circulam pelo sistema são apenas os cartões de produção, simbolizados pela

letra “P”.

Page 76: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

67

Estação de Trabalho

Posto Precedente

P P P

Estação de Trabalho

Posto Subsequente

P P P P

PP

P

Painel kanban Produção

P P P

P1 P2 P3 Pn

Painel kanban Produção

P P P

P1 P2 P3 Pn

P

P

Painel kanban Produção

P P P

P1 P2 P3 Pn

PP

Figura 4.10 Sistema kanban com um cartão (TUBINO, 1997 : 207).

Inicia-se a explicação de funcionamento do sistema pelo posto subseqüente. Quando um

cliente do posto subseqüente retira no supermercado de itens prontos um contenedor com um lote

de itens, ele coloca o cartão kanban de produção, que se encontrava junto aos itens, no painel

kanban de produção desse posto, na coluna correspondente ao item. Dessa forma, o operador do

posto subseqüente está autorizado a recolher o cartão do painel, seguindo a regra de prioridade

exposta quando apresentado o painel porta-kanban, e iniciar a produção do lote. Da mesma forma

aqui, o operador poderá estar autorizado a recolher de uma só vez todos os cartões de um mesmo

item visando aproveitar o setup da máquina.

Para iniciar a produção do lote, o operador recorre ao seu supermercado de matérias-primas,

que é o mesmo compartilhado com o posto precedente, retirando os itens necessários para o seu

trabalho. Nesse momento, ele retira o cartão kanban de produção que estava junto as suas matérias-

primas, e coloca-o no painel kanban de produção desse supermercado, na coluna correspondente ao

item, para informar da necessidade de reposição do lote de matérias-primas consumido. Deixa junto

o contenedor vazio. Em seguida, o operador produz seus itens, coloca-os dentro do contenedor de

itens prontos, com o respectivo cartão kanban de produção e deposita-os no seu supermercado de

itens prontos. Terminado esse ciclo, o operador recorre novamente ao seu painel kanban de

produção para reiniciar suas atividades.

Olhando agora para o posto de trabalho precedente, esse está autorizado, pelos cartões

kanban de produção, afixados em seu painel kanban de produção pelo operador do posto

subseqüente, a iniciar um ciclo de trabalho equivalente ao descrito para o operador do posto

subseqüente. Dessa forma se dá seqüência ao sistema de puxar a produção.

4.3.3 Sistema kanban com fornecedores

O sistema kanban com fornecedores deve ser entendido na sua forma mais ampla, ou seja,

para que o sistema seja realmente eficiente, tanto para o cliente como para o fornecedor, não basta

que o fornecedor faça suas entregas freqüentes em pequenos lotes na fábrica do cliente, mas sim,

que ele sincronize seu processo produtivo a essa freqüência de entregas, reduzindo os custos totais

Page 77: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

68

da cadeia produtiva. As questões sobre o relacionamento externo da empresa com fornecedores e

clientes da cadeia produtiva será tratada no detalhe mais adiante no capítulo7.

Dessa forma, como foi exposto no capítulo anterior, deve haver um entrelaçamento de

informações entre os setores de PCP das duas empresas, em dois níveis:

em nível de planejamento, o plano-mestre de produção do cliente deve servir de base

para a elaboração do plano-mestre de produção do fornecedor, permitindo que o mesmo

organize sua estrutura produtiva e dimensione seus kanbans internos, preparando-se para

a demanda que virá;

em nível de programação diária, a comunicação é feita por meio do sistema kanban,

especificando o que realmente o cliente está necessitando naquele momento. Essa

comunicação pode ser feita de duas formas: convencionalmente, via cartão kanban de

fornecedor, ou de forma avançada, via envio diário de uma tabela com as necessidades

de itens a serem entregues naquele dia.

Como a maioria das aplicações do sistema kanban com fornecedores se dá no modo

convencional, com a circulação de cartões, esta lógica de funcionamento será explicada com a ajuda

da Figura 4.11, considerando apenas a visão do que acontece dentro das instalações do cliente. Nos

sistemas que empregam redes computacionais para as comunicações, ao invés de circularem cartões

kanbans, os fornecedores recebem periodicamente uma listagem de necessidades de itens para

entrega no cliente de forma a repor os estoques consumidos.

Conforme pode-se ver na Figura 4.11, tem-se uma estação de trabalho com seus dois

supermercados: um supermercado de itens prontos com seu respectivo painel kanban de produção,

que serve para acionar a produção de itens nesse posto, e um supermercado de matérias-primas com

seu painel de kanban de fornecedores, abastecido por um fornecedor externo. Os cartões kanban de

fornecedor estão simbolizados pela letra “F”.

Estação de Trabalho

P P P

Painel kanban Produção

P P P

P1 P2 P3 Pn

P

P

Painel kanban Fornecedores

F F F

P1 P2 P3 Pn

F

F

F

Supermercado

de

Matérias-primas

F

FF

Figura 4.11 Sistema kanban com fornecedores (TUBINO, 1997 : 208).

O sistema de funcionamento é bastante simples. Quando o operador da estação de trabalho

necessita repor seu supermercado de itens prontos, dentro da sistemática já explicada anteriormente,

ele recorre ao seu supermercado de matérias-primas, retirando os itens necessários para o seu

trabalho. Nesse momento, ele retira o cartão kanban de fornecedor que estava junto as suas

Page 78: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

69

matérias-primas, e coloca-o no painel kanban de fornecedores desse supermercado, na coluna

correspondente ao item, para informar da necessidade de reposição do lote de matérias-primas

consumido. Deixa junto o contenedor vazio.

Nesse exemplo, está se considerando apenas um supermercado de matérias-primas, junto à

estação de trabalho. Em algumas aplicações iniciais do sistema kanban com fornecedores, ou

devido à limitações físicas da fábrica, não é permitido que o fornecedor entregue diretamente a

estação de trabalho os seus itens, existindo então dois supermercados de matérias-primas, um junto

a estação de trabalho e outro junto a recepção. O fluxo de cartões e de itens entre esses dois

supermercados, nesse caso, se dá com a intervenção do movimentador, já explicada no sistema

kanban com dois cartões.

Periodicamente, um transportador do fornecedor, próprio ou terceirizado, entra na empresa

trazendo as matérias-primas solicitadas na viajem anterior, dirigindo-se para o supermercado de

matérias-primas (na recepção ou na estação de trabalho correspondente). Nesse momento ele

deposita os contenedores cheios que trouxe, com seus respectivos cartões kanban de fornecedores,

no supermercado, e recolhe do painel kanban de fornecedores os cartões kanban de fornecedores ali

afixados, levando junto os contenedores vazios. Esses cartões kanban de fornecedores autorizam o

transportador a trazer na próxima viagem as matérias-primas equivalentes. Fechando assim o ciclo

de comunicação entre as empresas dentro da ótica de puxar a produção.

4.4 CÁLCULO DO NÚMERO DE CARTÕES KANBAN

A determinação do número de cartões kanban para os itens que circularão entre os

supermercados distribuídos pelo sistema produtivo pode ser encarada sob dois aspectos: o tamanho

do lote do item para cada contenedor e cartão, e o número total de contenedores e cartões por item,

definindo o nível total de estoques do item no sistema.

Inicialmente, há necessidade de se estabelecer o tamanho do lote para cada item, pois com

base nele é que se definirá o número total de cartões que circulam no sistema. A definição do

tamanho ideal dos lotes produtivos será tratada em detalhe no próximo capítulo, onde será visto que

a filosofia JIT/TQC considera que lotes unitários são os ideais. Na prática, apesar de a busca pelo

lote unitário ser contínua, normalmente define-se o tamanho do lote em função de dois fatores. O

número de setups, ou de reposições, que se pretende fazer por dia, e o tamanho do contenedor onde

serão colocados os itens.

Quanto maior for o tempo de setup, maior o tamanho do lote para diluir seus custos e menor

a sua freqüência de produção diária. Uma alternativa para se trabalhar com lotes menores por

cartão, já citada, consiste em estabelecer, como regra de funcionamento do sistema kanban, que o

operador espere ser afixado um determinado número de cartões kanban no painel de seu

supermercado para, então, iniciar a produção e diluir os custos de setup. Técnicas de troca rápida de

ferramentas (TRF), para reduzir o tempo de setup, serão apresentadas no próximo capítulo.

O segundo fator diz respeito a variedade de tipos e tamanhos de contenedores circulando no

sistema. Deve-se procurar reduzi-los ao máximo, no sentido de simplificar e padronizar as funções

de armazenagem e movimentação dentro do sistema produtivo. Sendo assim, o tamanho do lote de

cada item deverá se adaptar aos tamanhos predefinidos de contenedores.

Page 79: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

70

Outro ponto a ser lembrado na determinação do tamanho do lote está relacionado à

dependência dos itens componentes a demanda do produto acabado. Em processos focalizados em

uma gama restrita de produtos, sempre que um produto acabado é montado, pela sistemática de

puxar a produção, acaba ocorrendo a necessidade de repor os componentes empregados nessa

montagem dentro de quantidades preestabelecidas. Por exemplo, cada automóvel montado na linha

emprega um lote de cinco rodas, logo o tamanho do lote de rodas deve ser proporcional a cinco

unidades, pois seu consumo puxado se dará nessa proporção.

Estabelecido para cada item o tamanho do lote por contenedor, pode-se projetar o número

total de lotes no sistema. A determinação do número de cartões kanban é função da demanda

prevista no PMP, do tempo gasto para a produção e movimentação dos lotes no sistema produtivo,

bem como, da segurança projetada. A Fórmula 4.1, já comentada no capítulo anterior, apresenta a

expressão básica usada para esse cálculo.

ND

QT S

D

QT Sprod mov

1 1 (4.1)

Onde:

N = número total de cartões kanban no sistema;

D = demanda média diária do item (itens/dia);

Q = tamanho do lote por contenedor ou cartão (itens/cartão);

Tprod = tempo total para um cartão kanban de produção completar um ciclo produtivo, em

percentual do dia, na estação de trabalho (%);

Tmov = tempo total para um cartão kanban de movimentação completar um circuito, em

percentual do dia, entre os supermercados do produtor e do consumidor (%);

S = fator de segurança, em percentual do dia (%).

A primeira parte da expressão (4.1) determina o número de cartões kanban de produção, e a

segunda o número de cartões kanban de movimentação. Obviamente, quando trabalha-se com o

sistema kanban de um cartão, emprega-se apenas a primeira parte da expressão. Para projetar o

sistema kanban com fornecedores, emprega-se apenas a segunda parte da expressão.

Conforme foi explicado no capítulo anterior, a demanda média diária do item é obtida a

partir da demanda esperada dos produtos acabados incluídos no plano-mestre de produção (PMP)

que utilizam esse item na sua composição. Pequenas variações ocasionais de demandas no PMP, em

torno de 10%, podem ser administradas pela própria lógica de puxar a produção do sistema kanban,

contudo, quando a demanda prevista no PMP alterar seu patamar, há necessidade de utilizar essa

informação para recalcular, não só o número de kanbans, como também os tempos de ciclo do

sistema produtivo. A seguir apresenta-se três exemplos de cálculo do número de kanbans.

Exemplo 4.1 - sistema com dois cartões: supondo que um item possui uma demanda média

diária de 1000 itens/dia, e que ele é acondicionado em contenedores padrões em lotes de 30

itens/cartão, e que, em função dos custos de setup da máquina, pretende-se fazer em média oito

preparações por dia para esse item, ou seja, um cartão kanban de produção irá circular em sua

estação de trabalho na velocidade de 0,125 do dia (1/8 do dia). Por outro lado, o funcionário

responsável pela movimentação dos lotes entre o produtor e o consumidor está encarregado de fazer

10 viagens por dia, ou seja, um cartão kanban de movimentação colocado no painel imediatamente

após a passagem do movimentador, gastará uma dessas viagens do movimentador, de 0,1 do dia

(1/10 do dia), esperando para ser recolhido, e outra dessas viagens, de 0,1 do dia (1/10 do dia), para

Page 80: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

71

ir até o produtor e retornar com os itens, fechando um ciclo de movimentação total de 0,2 do dia.

Complementando, admita-se uma segurança inicial para o sistema de 15%, ou seja 0,15 do dia.

Logo:

D = 1000 itens/dia;

Q = 30 itens/cartão;

Tprod = 0,125 do dia;

Tmov = 0,2 do dia;

S = 0,15 do dia.

N

1000

300 125 1 0 15

1000

300 2 1 0 15, , , ,

N = 4,79 + 7,66

Como não existem números de cartões kanban fracionados, fica-se com cinco cartões

kanban de produção e oito cartões kanban de movimentação.

O número total de cartões kanban e contenedores no sistema será de 13, ou seja um estoque

total de 390 itens (13 cartões x 30 itens/cartão), sendo que cinco contenedores, com seus cartões

kanban de produção, ficarão na supermercado de itens prontos do produtor, e oito contenedores,

com seus cartões kanban de movimentação, em circulação entre o supermercado de itens prontos do

produtor e o supermercado de matérias-primas do consumidor.

Exemplo 4.2 - sistema com um cartão: nesse segundo exemplo, admite-se que o posto

consumidor está junto ao posto produtor, existindo apenas um supermercado de itens entre eles,

com cartões kanban de produção. O consumidor demanda 2000 itens/dia, em contenedores padrões

com lotes de 20 itens/cartão, e o produtor emprega entre preparação da máquina e produção de um

lote de 20 itens, 48 minutos de um dia de 480 minutos, ou seja, 0,1 do dia (pode fazer 10 lotes em

um dia). Dimensionando uma segurança de 5%, ou 0,05 do dia, pode-se determinar o número de

cartões no sistema, pela fórmula (4.1).

Logo:

D = 2000 itens/dia;

Q = 20 itens/cartão;

Tprod = 0,1 do dia;

Tmov = 0;

S = 0,05 do dia.

N

2000

200 1 1 0 05 10 5 11, , , Kanbans

Ou seja, com apenas 11 contenedores com cartões kanban de produção é possível

sincronizar o ritmo de consumo do posto subseqüente com o ritmo de produção do posto

precedente, e atender a demanda diária de 2000 itens.

Exemplo 4.3 - kanban com fornecedores: admitindo-se um sistema para um item cuja

demanda diária é de 1500 itens/dia, com um contenedor padrão, movimentado pelo fornecedor, para

lotes de 50 itens/cartão. Supondo que o fornecedor realize quatro viagens a ao cliente por dia, duas

Page 81: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

72

pela manhã e duas a tarde, definindo um ciclo de movimentação dos contenedores, entre as duas

empresas, de 0,5 dia, ou seja, se um cartão kanban é colocado no painel do fornecedor pela manhã

logo após a primeira visita, ele será recolhido apenas na visita seguinte (consumindo 0,25 do dia)

quando será encaminhado ao fornecedor, que retornará com os itens na terceira viagem do dia

(consumindo mais 0,5 do dia). Como as estradas não estão em boas condições de tráfego, admite-se

uma segurança de 10%, ou de 0,1 do dia. Pela fórmula (4.1) pode-se calcular o número de

contenedores e cartões kanban de fornecedor no sistema.

Logo:

D = 1500 itens/dia;

Q = 50 itens/cartão;

Tprod = 0;

Tmov = 0,5 dia;

S = 0,1 do dia.

N kanbans

1500

500 5 1 0 1 16 5 17, , ,

Há necessidade de operar o sistema com 17 cartões de fornecedor, sendo que normalmente

em cada ciclo de reposição oito (ou nove) cartões estarão no supermercado de matérias-primas do

posto consumidor, com 400 itens, a disposição do operador, enquanto os outros nove (ou oito)

cartões estarão de posse do fornecedor para reposição.

Concluindo a questão sobre o número de cartões kanban e contenedores circulando pelo

sistema produtivo, cabe ressaltar a facilidade com que, dado ao caráter prático e simples de

operacionalização do sistema de cartões, pode-se redimensionar esse número pela verificação visual

da efetiva operação do sistema. Por exemplo, inicialmente pode-se projetar uma segurança maior no

sistema, e, a medida em que os padrões operacionais se estabilizarem, ir retirando-se essa segurança

até atingir o ponto ideal, ou ainda, no cálculo dos kanbans de movimentação empregou-se a pior

situação para o tempo de movimentação de um cartão, supondo que ele entraria no painel logo após

a passagem do movimentador, gerando um tempo duplo de circulação. Caso na prática isso não

aconteça com tanta freqüência, pode-se reduzir visualmente o número de kanbans projetado.

4.5 FUNÇÕES EXECUTADAS PELO SISTEMA KANBAN

O sistema kanban, conforme definido inicialmente, é um sistema de controle do fluxo de

informações e produção de processos repetitivos em lotes, garantindo uma produção puxada em um

ambiente JIT. Contudo, essa definição é muito simplista e não expõem todas as funções executadas

e as vantagens decorrentes da implantação adequada do sistema kanban. A lista abaixo detalha

quais as funções que são executadas pelo sistema kanban, e seus benefícios em relação aos sistemas

convencionais de produção em lotes, não só na esfera de interesse do planejamento e controle da

produção, mas também dentro do sistema produtivo em geral.

O sistema kanban atua dentro das funções de planejamento e controle da produção no nível

operacional de curto prazo, ou seja, executa as atividades de programação, acompanhamento e

controle da produção, de forma simples e direta, da seguinte forma:

Page 82: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 4

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

73

as funções de administração dos estoques estão contidas dentro do próprio sistema de

funcionamento do kanban, ou seja, a definição de quanto produzir, quando produzir e

que segurança empregar são inerentes ao sistema;

seqüenciamento do programa de produção segue as regras de prioridades estabelecidas

nos painéis porta-kanban, sem a interferência do PCP, refletindo mais rapidamente as

variações na demanda do posto cliente. Dessa forma, ao utilizar os recursos produtivos

apenas para demandas reais, reduz os estoques especulativos e acelera os lead times

produtivos;

a emissão das ordens pelo PCP se dá em um único momento, quando da confecção dos

cartões kanban, sendo os mesmos reaproveitados dentro do ciclo de reposição dos itens.

Conjugado a produção focalizada, os cartões kanban possuem um conjunto mínimo de

informações, suficientes para a produção e movimentação dos itens no sistema,

contribuindo para a simplicidade operacional;

assim como para o seqüenciamento, a liberação das ordens aos postos de trabalho se dá a

nível de chão-de-fábrica, sem interferência do pessoal do PCP. Os cartões kanban de

produção e movimentação são ordens de produção e movimentação de itens,

administradas pelos próprios operários e liberadas aos mesmos sempre que forem

afixadas nos painéis porta kanban dos supermercados;

sistema kanban permite, de forma simples, o acompanhamento e controle visual e

automático do programa de produção. O atendimento das regras de funcionamento do

sistema kanban garante que não serão formados estoques superiores, ou inferiores, aos

projetados para atender à um programa de produção. A gerência, recorrendo visualmente

aos painéis porta kanban, sabe de imediato quanto de trabalho é necessário para atender

ao programa predeterminado.

Além das vantagens obtidas nas atividades do PCP, o sistema kanban desempenha uma série

de funções adicionais, não menos importantes, que fazem dele um sistema catalisador do

incremento contínuo da produtividade e da qualidade. Essas funções podem ser descritas como:

por ser conduzido pelos próprios operários, o sistema kanban estimula a iniciativa e o

sentido de propriedade nos mesmos. Os operários agem como, e sentem-se como, donos

do processo em que trabalham, seguindo suas próprias decisões;

ao estabelecer uma cadeia clara entre o cliente e o fornecedor dos itens, facilita os

trabalhos dos grupos de melhorias, como os Círculos de Controle da Qualidade, na

identificação e eliminação de problemas;

permite a identificação imediata de problemas que inibam o incremento da

produtividade, pela redução planejada do número de cartões kanban em circulação no

sistema. Esses problemas serão os temas a serem tratados pelos grupos de melhoria;

ao estimular o uso de pequenos lotes, reduz a necessidade de equipamentos de

movimentação e acusa imediatamente problemas de qualidade nos itens;

implementa efetivamente os conceitos de organização, simplicidade, padronização e

limpeza nos estoques do sistema produtivo;

dispensa a necessidade de inventários periódicos nos estoques; a quantidade de cada item

é definida por seu número de cartões kanban em circulação no sistema;

estimula o emprego do conceito de operador polivalente, pois fomenta nos operadores

atividades de programação e controle da produção, antes de responsabilidade do pessoal

do PCP;

por meio dos cartões kanban, fornece informações precisas e simples aos operadores

para execução de suas atividades, facilitando o cumprimento dos padrões de trabalho.

Page 83: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistema Kanban

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

74

4.6 PRÉ-REQUISITOS PARA O FUNCIONAMENTO DO SISTEMA KANBAN

A lista de vantagens atribuídas ao sistema kanban, conforme vista anteriormente, é bastante

grande, porém ela só é plenamente alcançada quando o sistema produtivo está projetado para operar

dentro da filosofia JIT/TQC. Dessa forma, pode-se dizer que os pré-requisitos de funcionamento do

sistema kanban são as próprias ferramentas que compõem essa filosofia, e que determinam quão

eficiente o sistema produtivo é, quais sejam:

estabilidade de projeto de produtos, evitando-se mudanças bruscas de curto prazo,

portanto não planejadas, no roteiro de produção;

estabilidade no programa-mestre de produção empregado para projetar o sistema

kanban, obtida a partir do relacionamento de longo prazo com clientes, evitando-se

mudanças inesperadas de curto prazo nas quantidades a serem produzidas;

índices de qualidade altos, visto que lotes com defeitos causarão sérios danos ao fluxo

produtivo sob a ótica de puxar empregada no sistema kanban;

fluxos produtivos bem definidos, de preferência produção focalizada com layout celular,

permitindo roteiros claros de circulação dos cartões kanban;

lotes pequenos, viáveis com a implantação do setup rápido (TRF), possibilitando

resposta imediata às solicitações do cliente, sem a necessidade de estoques excessivos;

operários treinados e motivados com os objetivos do melhoramento contínuo, cumprindo

rigorosamente as regras de funcionamento do sistema kanban;

equipamentos em perfeito estado de conservação, com ênfase na manutenção preventiva,

evitando-se paradas inesperadas não suportadas pelo nível mínimo de estoques no

sistema.

Logicamente, as empresas não esperam atingir plenamente todos esses pré-requisitos para só

então iniciar a implantação do sistema kanban. O sistema kanban, devido a sua simplicidade, deve

ser implantado já no início, em conjunto com as demais técnicas da filosofia JIT/TQC, em setores

onde seu potencial de sucesso seja maior. Toda empresa possui algum setor onde o fornecedor e o

cliente de uma gama restrita de itens estejam próximos e as demandas sejam regulares. A medida

em que os fluxos produtivos forem se organizando pela focalização da produção, a implantação

inicial do sistema kanban pode se expandir com segurança.

O sistema kanban, conforme apresentado, é um sistema idealizado para trabalhar em

processos repetitivos em lotes, porém empresas que trabalham com produção sob encomenda, ou

com processos de produção em massa de fluxo contínuo, podem fazer uso dos seus princípios para

tratar itens, dentro de seus sistemas produtivos, que tenham características de repetitividade.

Também, internamente nos setores de apoio ao processo produtivo, como manutenção,

ferramentaria, etc., pode-se fazer uso desse sistema para administrar seus estoques de peças

componentes.

Page 84: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

5 REDUÇÃO DOS LEAD TIMES PRODUTIVOS

Procura-se nesse quinto capítulo apresentar a forma como os sistemas de produção JIT

tratam a questão da redução dos diversos tempos componentes do lead time produtivo na

busca pela flexibilidade. Inicialmente, define-se o lead time produtivo como o somatório dos

tempos de espera, processamento, inspeção e transporte, sendo que o tempo de espera pode

ser decomposto em espera para a programação da produção, espera na fila do recurso e

espera no lote de produção. Cada um desses tempos componentes do lead time produtivo é

descrito segundo a ótica dos sistemas convencional para, posteriormente, ser apresentada a

proposta dos sistemas de produção JIT para reduzi-los. As técnicas de troca rápida de

ferramentas (TRF), necessárias para a produção econômica de pequenos lotes, fundamentais

para a redução de vários dos tempos componentes do lead time produtivo, são também

descritas, assim como os conceitos de autonomação e dispositivos à prova de erro.

5.1 INTRODUÇÃO

Lead time, ou tempo de atravessamento ou fluxo, é uma medida do tempo gasto pelo sistema

produtivo para transformar matérias-primas em produtos acabados. Pode-se tanto considerar esse

tempo de forma ampla, denominando-o como lead time do cliente, quando pretende-se medir o

tempo desde a solicitação do produto pelo cliente até sua efetiva entrega ao mesmo, como pode-se

considerar esse tempo de forma restrita, lead time de produção, levando-se em conta apenas as

atividades internas ao sistema de manufatura. Nesse capítulo serão analisadas as atividades internas

ao sistema de manufatura, considerando-se o desdobramento dos tempos que compõem os lead

times produtivos. As questões referentes ao relacionamento entre fornecedores e clientes serão

tratadas no capítulo onde se discutirá a proposta da filosofia JIT/TQC para a logística da cadeia

produtiva.

Sendo o lead time uma medida de tempo, ele está relacionado à flexibilidade do sistema

produtivo em responder à uma solicitação do cliente, ou seja, quanto menor o tempo de conversão

de matérias-primas em produtos acabados, menores serão os custos do sistema produtivo no

atendimento das necessidades dos clientes. O objetivo do conjunto das técnicas JIT para o chão de

fábrica é o de buscar, dentro do princípio de melhoramentos contínuos, a meta de lead time “zero”,

ou seja, entrega imediata sem formação de estoques.

Logicamente, é impossível a produção imediata de qualquer produto. Sempre existirá um

prazo de entrega para as solicitações dos clientes. O que a filosofia JIT/TQC busca através da

implementação de suas técnicas é a redução contínua dos lead times produtivos para atender as

solicitações dos clientes com prazos de entregas cada vez menores sem a formação exagerada de

estoques. Como foi visto no capítulo sobre planejamento e controle da produção no JIT, o sistema

de puxar a produção procura não produzir sem que haja demanda efetiva, evitando a formação de

estoques desnecessários. Essa lógica de PCP só funciona com lead times curtos.

Nos sistemas convencionais, como a velocidade de resposta aos pedidos dos clientes é baixa,

o sincronismo entre lead times e prazos de entregas é obtido através da formação prévia de estoques,

tanto de produtos acabados como de componentes e matérias-primas. Essa solução tem se mostrado

Page 85: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

76

inadequada devido à uma série de razões já citadas em capítulos anteriores, entre as quais nesse

momento cabe destacar:

estoques não agregam valor aos produtos, constituindo-se em uma das principais perdas

dos sistemas produtivos;

estoques encobertam problemas de qualidade, retardando a identificação e correção dos

mesmos;

estoques impedem a comunicação imediata na cadeia “fornecedor-cliente”, dificultando

para os fornecedores, internos ou externos, o entendimento de quais são as reais

necessidades dos clientes;

estoques são formados com base em previsões de demanda, que podem não se confirmar

etc.

Não se deve confundir lead time com tempo de ciclo. Lead time é o tempo necessário para

transformar as matérias-primas em produtos acabados, enquanto tempo de ciclo é o intervalo de

tempo entre a saída de produtos acabados. Pode-se ter tempos de ciclo curtos com lead times

longos, desde que se produza com base em estoques.

Ao se acompanhar o fluxo produtivo de um item, pode-se identificar quatro grupos distintos

de tempos que compõem o lead time desse item, conforme esquematizado na Figura 5.1: o tempo de

espera, o tempo de processamento, o tempo de inspeção e o tempo de transporte. O tempo de espera

para o processamento do item compreende o somatório dos tempos consumidos com a programação

da produção, com a espera na fila do recurso e com a espera para completar o lote. O tempo de

processamento é o tempo gasto com a transformação da matéria-prima em produto acabado (é o

único que agrega valor). O tempo de inspeção é o tempo despendido para verificar se o item

produzido está de acordo com as especificações exigidas. O tempo de transporte é o tempo

empregado para movimentar o item, segundo seu roteiro de fabricação, entre os recursos produtivos.

Lead Time Produtivo

Esperas Processamento Inspeção Transporte

Programação da Produção Espera na Fila Espera no Lote

Figura 5.1 Composição do lead time produtivo.

Para se reduzir os lead times produtivos deve-se melhorar a performance do sistema quanto

aos tempos de espera, processamento, inspeção e transporte simultaneamente. Nos sistemas

convencionais, fica a cargo da automação industrial a tarefa de melhorar esses tempos, seja através

da compra de equipamentos automatizados para produção, seja através da implantação de softwares

integrados para o gerenciamento da fábrica. Contudo, a filosofia JIT/TQC apresenta soluções

simples para tratar o problema da redução dos lead times, as quais deveriam ser implementadas

antes de se recorrer a investimentos vultuosos em automação. Na seqüência, serão descritas como as

técnicas JIT buscam reduzir cada um dos tempos componentes do lead time produtivo.

Page 86: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

77

5.2 MELHORIA NOS TEMPOS DE ESPERA

Shingo (SHINGO, 1996 : 281) define a espera como um estado na qual o tempo passa sem

que haja ocorrência de processo, inspeção ou transporte no item. Dentro dessa ótica, pode-se

considerar como tempo de espera o tempo necessário para a programação da produção do item, o

tempo perdido pelo item aguardando na fila para que o recurso se libere, e o tempo necessário para

o processamento do lote do qual o item faz parte. Os tempos gastos com espera não agregam valores

aos produtos, e devem, por principio, serem eliminados. O tempo de espera é proporcional ao

número de etapas pela qual o item passa, pois para cada uma delas ele sofrerá essa espera. Em

processos convencionais intermitentes em lotes, os tempos de espera podem chegar a 80% do lead

time do item. Por isso, as técnicas JIT buscam privilegiar a lógica dos processos contínuos de

fabricação em pequenos lotes, de preferência em fluxo unitário.

5.2.1 Melhoria no tempo de programação da produção

A programação da produção foi discutida nos capítulos 3 e 4, dando-se ênfase a diferença

entre os sistemas de empurrar um programa de produção e os sistemas de puxar um programa de

produção. Nos sistemas empurrados, a partir de uma previsão da demanda, monta-se o plano-mestre

de produção (PMP) para os produtos que pretende-se vender. Esse PMP serve de base para a

emissão de um programa com ordens de montagem, fabricação e compras de itens que acionarão o

sistema produtivo durante a abrangência desse PMP.

Toda essa dinâmica operacional de empurrar um programa de produção é feita com auxílio

de softwares especializados, baseados na lógica operacional do MRP (Material Requirements

Planning), que demandam certo tempo para rodar e chegar a um programa com alguma viabilidade

de ser cumprido pelo sistema produtivo. É comum o PCP das empresas passar o fim de semana

envolvido com a coleta de dados e preparação do programa de produção para a próxima semana. O

que faz com que o tempo entre um programa e outro seja de sete dias (ou uma semana). Além disso,

como na segunda feira o programa deve estar disponível para acionar o sistema produtivo, o PCP

não detalha esse programa devidamente, apesar dos softwares possuírem módulos de cálculo de

análise da capacidade, dificultando ainda mais o atendimento de suas metas.

Outra atividade que consome algum tempo adicional na montagem de um programa de

produção para ser liberado diz respeito ao seqüenciamento (TUBINO, 1997 : 146-177) das ordens

segundo regras de prioridades. Como existe um conjunto de ordens solicitando recursos idênticos

(os chamados departamentos), há necessidade de priorizar a seqüência na qual essas ordens devem

passar por esses recursos. Dependendo da sofisticação da heurística e do software empregado isso

pode adicionar algumas horas a mais no tempo de programação da produção.

Dentro desse ciclo semanal de programação da produção, um pedido específico de um

cliente para ser adicionado ao programa da fábrica, só será considerado na programação da próxima

semana. Como já foi colocado, isso não acontece e o cliente acaba sendo atendido pelos estoques de

produtos acabados que a princípio foram formados a partir de uma estimativa de demanda.

Page 87: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

78

Resumindo a questão da programação da produção, nos sistemas de PCP convencionais o tempo de

programação da produção é longo e os clientes são atendidos basicamente pelos estoques.

Por outro lado, o sistema de puxar a produção proposto pelo JIT faz com que o período de

tempo entre a chegada de um pedido e o início da produção seja praticamente imediato. Com o

dimensionamento e a montagem de estoques intermediários (supermercados) entre clientes e

fornecedores, as ordens de montagem, fabricação e compras fluem de forma simples pelo sistema

produtivo focalizado pela ação dos próprios envolvidos no processo produtivo, sem a interferência

de curto prazo do pessoal do PCP. Essa lógica de puxar já foi devidamente detalhada no capítulo

anterior. O que se salienta aqui é o seu efeito acelerador na composição do lead time produtivo, pelo

fato da ação de programação e seqüenciamento da produção estar junto ao chão-de-fábrica, onde o

processo produtivo se desenvolve.

5.2.2 Melhoria no tempo de espera na fila

O tempo de espera de um item na fila de um recurso para ser trabalhado é, sem dúvida, o

componente de maior peso nos tempos de espera que compõem o lead time produtivo. As filas de

espera na frente dos recursos ocorrem devido a três fatores principais: desbalanceamento entre carga

de trabalho e capacidade produtiva, esperas para setup e processamento dos lotes com prioridade no

recurso, e problemas de qualidade no sistema produtivo. As técnicas JIT para o chão de fábrica

buscam continuamente a solução para, se não eliminar, pelo menos minimizar a influência desses

fatores críticos na composição do lead time produtivo.

Desbalanceamento entre carga e capacidade: todo sistema produtivo possui algum

recurso que limita sua capacidade de produção, chamado de “gargalo”. A existência de gargalos

leva ao desbalanceamento entre a carga solicitada pela programação e a capacidade dos recursos,

visto que nos sistemas convencionais tende-se a não permitir que os recursos produtivos fiquem

parados, dentro do conceito de valor agregado já comentado anteriormente. Como conseqüência da

existência dos gargalos, é inevitável a formação de filas tanto na frente dos recursos gargalos devido

a sua limitação de capacidade, como na frente dos demais recursos que estão dependentes de itens

provenientes de gargalos. A identificação clara dos gargalos é o primeiro passo para evitar a

formação de filas no sistema. O segundo passo consiste em não se programar, ou carregar, os

demais recursos acima da capacidade do recurso gargalo.

Nos processos contínuos os gargalos são de fácil identificação, pois o sistema produtivo está

focalizado em uma gama restrita de produtos, muitas vezes um único produto, com os recursos

dispostos segundo o fluxo de produção. Nesses sistemas fica claro para a programação da produção

qual a capacidade que o sistema possui, e até quanto o mesmo pode ser carregado. Já nos processos

intermitentes em lotes, a variedade de itens e roteiros produtivos dificulta a identificação dos pontos

gargalos, ainda mais que, dependendo do mix de produção, esses gargalos podem mudar de posição.

Como conseqüência, a programação da produção carrega os recursos, gargalos ou não, sempre a

plena carga e considera os estoques resultantes como inevitáveis. A formação descontrolada de filas

na frente dos recursos leva a um aumento exagerado do lead time.

A filosofia JIT/TQC e as técnicas apresentadas nesse livro buscam em seu conjunto atuar

nos dois pontos básicos para limitar a formação de filas decorrentes do desbalanceamento entre

Page 88: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

79

carga e capacidade produtiva. Por um lado facilitam a identificação dos gargalos, e, por outro,

evitam o carregamento do sistema produtivo acima dessa cota, dando atenção aos seguintes pontos:

produção focalizada com layout celular visando “linearizar” o fluxo produtivo,

facilitando a identificação dos pontos gargalos;

balanceamento dos recursos com base em um tempo de ciclo projetado a partir da

demanda do PMP, evitando por um lado que os mesmos sejam acionados em ritmos de

produção diferentes, e, por outro, que a capacidade produtiva seja usada para formar

estoques de consumo duvidoso;

emprego do sistema de puxar a produção a partir das necessidades dos recursos clientes,

evitando que se produzam itens desnecessários naquele momento;

permitindo que recursos com capacidades excedentes sejam acionados apenas para

atender aos clientes, tanto pela redução de sua velocidade de operação (desde que não

acarrete problemas mecânicos), como pela paralisação do mesmo quando a cota de

produção for alcançada.

Esperas para setup e processamento dos lotes com prioridade no recurso: quando um

lote de um item está na fila de espera para ser trabalhado em um recurso, ele ficará nessa fila tanto

tempo quanto for necessário para que todos os lotes com prioridades superiores a sua sejam

preparados (setup) para entrar no recurso e processados. Um componente importante do tempo de

espera na fila já foi tratado no tópico acima, e refere-se ao desbalanceamento entre carga e

capacidade do recurso. Contudo, além do número de lotes na fila, outro fator muito importante para

definir o tempo de espera é o tamanho dos lotes que estão nessa fila.

Convencionalmente, trata-se o tempo gasto com a preparação dos recursos, ou setup, como

algo indesejável porém, intrinsecamente, necessário ao processo produtivo. Os altos tempos (e

custos) de setups são então diluídos pelo tamanho do lote, dentro do conceito convencional de lote

econômico, gerando tamanhos grandes de lotes. Por exemplo, para uma prensa com setup de duas

horas, o lote mínimo de produção acabará sendo de 3000 itens. Dessa forma, caso existam cinco

lotes na fila de espera da prensa, o último lote terá que esperar oito horas (4 x 2 horas) pelas

preparações mais o tempo de processamento dos 12000 itens (4 x 3000 itens), para avançar na fila e

ter prioridade de processamento.

Para se reduzir esse tempo de espera na fila ações devem ser feitas para se baixar os tempos

de setup de forma a tornar econômico o uso de lotes pequenos. Com lotes pequenos e tempos de

setups na casa de minutos, ou até segundos, as filas de espera nos recursos andarão de forma rápida

e permitirão a produção just-in-time. A troca rápida de ferramentas é um dos pilares básicos da

filosofia JIT/TQC, e será tratada com o devido destaque, mais adiante, dentro desse capítulo.

Problemas de qualidade no sistema produtivo: um terceiro ponto, não menos importante

que os dois anteriores já citados, na formação de filas de espera na frente de recursos são aqueles

decorrentes da baixa qualidade de operação do sistema produtivo. Não existe produção JIT sem

Qualidade Total. Como os estoques são projetados para amortecer problemas, as filas serão tanto

maiores quanto forem os fatos geradores desses problemas, ou seja:

quebras de equipamentos, com manutenções apenas corretivas;

treinamento inadequado da mão-de-obra, não atendendo aos padrões de trabalho;

geração de itens defeituosos, com identificação apenas ao final do processo;

Page 89: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

80

baixo relacionamento com fornecedores, recebendo itens antes, ou depois, do

preestabelecido com qualidade duvidosa.

As técnicas relacionadas com o Controle Total da Qualidade buscam através do

envolvimento da mão-de-obra identificar e tratar de forma sistêmica esses pontos falhos do processo

produtivo, permitindo a redução do tamanho dos estoques, e filas, decorrentes de problemas de

qualidade.

5.2.3 Melhoria no tempo de espera no lote

O terceiro componente do lead time de um item dentro do grupo dos tempos de espera, além

do tempo de programação do lote e do tempo de espera na fila, é o tempo gasto para esse item ser

processado no recurso e aguardar que os demais itens do lote também o sejam. Infelizmente, nos

sistemas de produção convencionais não é dada atenção a esse ponto que está relacionado com o

fato do lead time médio de um item dentro de um lote ser sempre o lead time do último item

processado, ou seja, o lead time máximo dentro dos itens do lote. A Figura 5.2 ilustra esse ponto.

3000 1

Esperando processamento

3000 1

Esperando

processamento

Esperando

lote

3000 1

Lote processado

Figura 5.2 Tempo de espera do lote.

Nessa figura procura-se mostrar que um item dentro de um lote de produção, por exemplo de

3000 itens, pode estar em três estágios distintos: esperando para ser processado, esperando para que

os demais itens do lote sejam processados, e liberado para seguir em frente o seu roteiro de

fabricação. Caso o tempo de produção na máquina seja de um minuto por item, mesmo que o

primeiro item fique pronto em um minuto, ele e os demais 2998 itens terão que esperar 3000

minutos para que o último item do lote seja processado e libere o lote para seguir seu roteiro. Sendo

assim, o lead time de todos os itens do lote será de 3000 minutos, mesmo que ele fique pronto em

um minuto.

Ideologicamente, a solução para eliminar o tempo de espera no lote consiste em buscar a

produção em fluxo unitário. Ou seja, produzir e movimentar cada item como se o mesmo fosse um

Page 90: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

81

lote de um único item. Na prática, a produção focalizada com células de fabricação por famílias de

itens busca trabalhar nesse sentido, fazendo com que internamente nas células os itens sejam

tratados individualmente. Contudo, a ação que leva a produção econômica de lotes tão pequenos

quanto possíveis é a aplicação das técnicas de troca rápida de ferramentas.

Um ponto importante a ser notado, é o de que sempre que se conseguir reduções nos tempos

de preparação dos lotes, esses podem ser reduzidos na mesma proporção, baixando o lead time

médio dos itens nesse lote, sem afetar a carga total de trabalho da máquina. Por exemplo, caso o lote

de 3000 itens citado anteriormente tenha um setup de duas horas, a máquina estará ocupada durante

52 horas, das quais duas horas de setup e 50 horas de produção (3000 minutos 60 minutos/hora).

Admitindo-se que o tempo gasto com o setup seja reduzido para 12 minutos (1/10 do setup

anterior), o tamanho do lote pode ser reduzido para 300 unidades ( 3000 itens 10) sem alterar a

carga de trabalho da máquina, ou seja, produzindo-se 3000 itens em 10 lotes de 300 unidades gasta-

se as mesmas 52 horas [10 x (12 minutos + 300 x 1 minuto)]. Em decorrência disso, o lead time

médio dos itens no lote cai de 3000 minutos para 300 minutos, além de reduzir de uma forma geral

os estoques médios do sistema.

5.3 TROCA RÁPIDA DE FERRAMENTAS

A troca rápida de ferramentas (TRF) é um dos conceitos básicos da produção JIT. Ela foi

desenvolvida por Shingo na década de 70 após vários anos de experiências em empresas japonesas,

em especial na Toyota Motors, onde conseguiu transformar setups de prensas que consumiam duas

horas em três minutos. Toda sua experiência em TRF está descrita em um livro específico sobre

esse assunto, entitulado “A Revolution in Manufacturing: the S.M.E.D. System” (SHINGO, 1985).

Dentro do objetivo de caracterizar a TRF no contexto da filosofia JIT/TQC, em especial na redução

dos lead times produtivos, será apresentado a seguir um resumo adaptado desses conceitos

propostos por Shingo. Antes contudo, cabe fazer uma introdução para entender como os custos de

preparação, ou setup, influenciam na definição do tamanho do lote de produção, através da chamada

teoria do lote econômico, e como a filosofia JIT/TQC se posiciona dentro dessa conhecida teoria.

Pela teoria do lote econômico (TUBINO, 1997 : 111-124) existem três componentes de

custos associados ao processo de reposição e armazenagem dos itens: os custos diretos, os custos de

manutenção de estoques e os custos de preparação para reposição. O comportamento destes custos

irá definir qual o tamanho de lote econômico adequado ao processo de reposição e armazenagem do

item. Pode-se equacionar cada um destes custos para um dado período de planejamento da seguinte

maneira:

Custo Direto: é aquele incorrido diretamente com a compra ou fabricação do item. É

proporcional a demanda para o período e aos custos unitários do item (de fabricação ou de

compra).

CD D C (5.1)

Onde: CD = Custo direto do período;

D = Demanda do item para o período;

C = Custo unitário de compra ou fabricação do item.

Page 91: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

82

Custo de Preparação: são todos aqueles custos referentes ao processo de reposição do

item pela compra ou fabricação do lote de itens. Fazem parte destes custos os seguintes

elementos: mão-de-obra para emissão e processamento das ordens de compra ou de

fabricação, materiais e equipamentos utilizados para a confecção das ordens, custos indiretos

dos departamentos de Compras ou do PCP para a confecção das ordens, como luz, telefone,

aluguéis, etc., e, quando for o caso de fabricação dos itens, os custos de preparação, ou

setup, dos equipamentos produtivos. O custo de preparação é proporcional ao custo de uma

preparação de compra ou de fabricação do item e ao número de vezes em que este item foi

requerido durante o período de planejamento.

CP N A (5.2)

Como ND

Q (5.3)

Tem-se que: CPD

QA (5.4)

Onde: CP = Custo de preparação do período;

N = Número de pedidos de compra ou fabricação durante o período;

Q = Tamanho do lote de reposição;

A = Custo unitário de preparação.

Custo de manutenção de estoques: são aqueles custos decorrentes do fato do sistema

produtivo necessitar manter itens em estoques para o seu funcionamento. Isso implica numa

série de custos, tais como: mão-de-obra para armazenagem e movimentação dos itens,

aluguel, luz, seguro, telefone, sistemas computacionais e equipamentos do almoxarifado,

custos de deterioração e obsolescência dos estoques, e, principalmente, o custo do capital

investido. O custo de manutenção dos estoques é proporcional à quantidade de estoques

médio no período de planejamento, ao custo unitário do item, e à taxa de encargos

financeiros que incidem sobre os estoques.

CM Q C Im (5.5)

Onde: CM = Custo de manutenção de estoques do período;

Qm = Estoque médio durante o período;

I = Taxa de encargos financeiros sobre os estoques.

A partir da definição desses três custos, pode-se obter uma equação para o custo total do

sistema:

CT CD CP CM

CT D CD

QA Q C Im (5.6)

Page 92: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

83

Como forma de ilustrar o comportamento desses custos em relação ao tamanho dos lotes, ou

ao número de reposições dado que ND

Q , é apresentado o exemplo a seguir.

Um item é fabricado em uma prensa que consome o equivalente a $ 1.300,00 em custos de

setup cada vez que a máquina é preparada. A demanda anual por esse item é de 600 unidades, seu

custo unitário é de $ 50,00, e a taxa de encargos financeiros sobre o capital empatado em estoque é

de 78% ao ano. Qual o tamanho do lote a ser fabricado, ou quantas preparações devem ser feitas por

ano?

Quando o item é fabricado apenas uma vez por ano, o tamanho do lote é de 600 unidades e

os estoques médios do sistema, admitindo-se que o lote seja entregue de forma total, são de 300

itens (Q/2). Nessa primeira alternativa os custos envolvidos no processo são:

CD D C 600 50 30000.

CPD

QA

600

6001300 1300.

CM Q C Im 600

250 0 78 11700, .

CT D CD

QA Q C Im 600 50

600

6001300

600

250 0,78 43 000.

Pode-se, de forma análoga, desenvolver os custos para todas as demais alternativas de

número de setups por ano, porém até quatro setups, ou lotes de 150 unidades, já é suficiente para

visualizar o comportamento dos custos. Esses dados encontram-se na Tabela 5.1, e a Figura 5.3

ilustra o comportamento apresentado pelos custos.

Tabela 5.1 Dados do exemplo de lote econômico.

Setups Lotes CD CP CM CT

1 600 30.000 1.300 11.700 43.000

2 300 30.000 2.600 5.850 38.450

3 200 30.000 3.900 3.900 37.800

4 150 30.000 5.200 2.925 38.125

Conforme pode-se ver nos dados da Tabela 5.1 e no gráfico da Figura 5.3, o número de

preparações que minimiza o custo total é de três setups por ano, equivalente a um lote de 200

unidades por setup. Esse tamanho de lote é conhecido como “lote econômico” (Q*).

No gráfico da Figura 5.3 pode-se observar também o comportamento das curvas de custo

com relação à variações no tamanho do lote ou no número de preparações. Os custos diretos,

quando o preço do item é fixo, não se alteram com a mudança do tamanho do lote ou do número de

preparações. Os custos de preparação diminuem a medida em que o tamanho do lote aumenta ou a

periodicidade diminui. Considerando apenas esses custos, o lote ideal seria o maior possível. Já os

custos de manutenção de estoques diminuem a medida em que o tamanho do lote diminui ou a

periodicidade aumenta. Considerando apenas esses custos, o lote ideal seria o menor possível.

Somando esses três custos, tem-se a curva de custo total que apresenta um ponto de mínimo que

procura equilibrar as forças antagônicas dos custos de preparação e manutenção dos estoques.

Page 93: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

84

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

35000

40000

45000

50000

150 200 300 600

Tamanho do lote

$

Custo Total

Custo Direto

Custo de Manutenção de Estoques

Custo de Preparação

Figura 5.3 Gráfico do exemplo de lote econômico.

O ponto mínimo da curva de custo total pode ser obtido diretamente através da derivação da

equação dessa curva em relação à quantidade, igualando-se a zero e isolando-se essa variável.

Existem várias fórmulas para se obter o lote econômico, dependendo do comportamento dos custos.

Nesse exemplo simples, o lote econômico é obtido da seguinte forma:

QD A

C I

*

,

2 2 600 1300

50 0 78200unidades por preparação

A teoria do lote econômico apresentada de forma resumida acima, desenvolvida ainda no

início desse século, foi a melhor solução encontrada pelas empresas para dimensionar seus lotes de

reposição. Por estar baseada em uma lógica matemática associada a minimização de custos, ela é

incontestável. O que a filosofia JIT/TQC veio introduzir nesse processo de determinação dos

tamanhos de lotes foi uma nova leitura das variáveis que entram nesse cálculo. A Figura 5.4 ilustra

essa mudança.

As empresas eficientes têm demonstrado que associados aos custos convencionas de

manutenção de estoques, existem uma gama muito importante de custos, ditos da “má qualidade”

(os famosos desperdícios), que estão diretamente relacionados com a quantidade de estoques

disponíveis no sistema produtivo. A motivação da mão-de-obra que se perde ao produzir-se para

estocar, ao invés de diretamente para um cliente (interno ou externo), a não identificação imediata

dos problemas que ficam encobertos pelos estoques, a falta de ritmo entre setores produtivos que se

isolam com os estoques em processo, etc. Dessa forma a variável “I”, que entra no denominador da

equação do lote econômico, tende para infinito ou para um número bastante grande.

Paralelamente a isso, as modernas técnicas de gestão da produção JIT dão ênfase à

necessidade de se reduzir os custos de preparação. Seja o setup das máquinas através do emprego de

troca rápidas de ferramentas, transformando horas em minutos ou até segundos, seja o custo da

ordem de compra através da melhora no relacionamento com os fornecedores. Dessa maneira a

variável “A”, que entra no numerador da equação do lote econômico, tende para zero ou para um

número pequeno.

Page 94: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

85

QD A

C I

*

21

Q*convencional Lote

$

Q*JIT/TQC

CPconvencional

CMconvencionalCMJIT/TQC

CPJIT/TQC

grande

pequeno

Figura 5.4 O lote econômico e a filosofia JIT/TQC.

Com isso tem-se, por um lado, um valor pequeno no numerador, e por outro, um valor

grande no denominador, fazendo com que o lote econômico, dentro dessa nova filosofia de

gerenciamento da produção, tenda para a unidade. Essas são as razões que estão por trás da busca

constante pela produção em fluxo unitário através da aplicação das técnicas de TRF que serão

descritas.

Shingo, ao tratar o problema dos setups convencionais demorados, identificou quatro grupo

de funções tipicamente desenvolvidas durante esses setups de máquinas (SHINGO, 1996 : 82),

distribuídas proporcionalmente no tempo de acordo com a Figura 5.5. Conforme pode-se ver,

apenas 5% do tempo gasto nesses setups eram referentes à remoção e fixação das matrizes e

ferramentas. O restante do tempo era consumido com funções que podiam ser melhoradas, ou até

eliminadas, desde que tratadas adequadamente.

Figura 5.5 Distribuição dos tempos durante os setups.

Como resultado de seu trabalho na busca por setups rápidos, Shingo chegou a formulação da

teoria para a TRF, que pode ser resumida em quatro estágios seqüenciais, cada um contendo um

conjunto de técnicas específicas, apresentados na Figura 5.6. Por ser simples e de fácil aplicação, a

50%

5%

15%

30%

Preparação da matéria-prima, dispositivos de montagem, acessórios etc.

Fixação e remoção de matrizes e ferramentas.

Centragem e determinação das dimensões das ferramentas.

Procesamentos iniciais e ajustes.

Page 95: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

86

TRF deve ser implementada a partir do processo de TQC com a participação dos operadores das

máquinas envolvidas, dentro dos grupos de CCQ ou equivalentes, apoiados pelas das áreas técnicas

de Engenharia Industrial e Ferramentaria na função de disseminar os conhecimentos e implementar

as soluções encontradas. Dado que serão os operadores que irão executar os setups, é importante

que eles entendam o porquê e sintam-se responsáveis pelas soluções encontradas.

Identificar e

separar o

setup interno

do externo.

Converter o

setup interno

em externo.

Simplificar e

melhorar os

pontos

restantes.

Eliminar o

setup.

Figura 5.6 Os quatro estágios da TRF.

5.3.1 Identificar e separar o setup interno do externo

O primeiro passo para a TRF consiste em identificar como as atividades de setup estão

sendo feitas atualmente, buscando detalhar dentro dos conceitos de tempos e movimentos cada uma

dessas atividades. A melhor forma de se fazer isso consiste em filmar várias trocas de ferramentas

para serem discutidas com o grupo de melhoria. Nesse processo de obtenção de dados, deve-se usar

uma planilha onde as atividades de setup serão classificadas como internas, externas e

desnecessárias, com seus referidos tempos.

Uma atividade de setup interna é aquela executada enquanto a máquina está parada. Uma

atividade de setup externa é aquela executada enquanto a máquina está operando. Já uma atividade

desnecessária, como o próprio nome indica, é uma atividade que não faz parte das atividades

necessárias para a realização do setup da máquina e que erroneamente está sendo realizada, como

por exemplo, aguardar que uma talha, ou uma empilhadeira, fique livre e venha auxiliar na

movimentação do ferramental, ou esperar que um ferramenteiro venha ajudar na troca e regulagem

da matriz.

O primeiro passo nesse estágio inicial da TRF consiste em eliminar as atividades

desnecessárias. Um exemplo prático largamente utilizado para evitar esperas e dependências de

equipamentos de movimentação, consiste em empregar carrinhos de movimentação manual de

baixo custo para armazenar e movimentar as matrizes durante o processo de setup. Conforme pode

ser visto na Figura 5.7, esse carrinho possui roletes em uma mesa giratória que permite a um único

operador deslizar facilmente as matrizes antiga e nova para sua troca. Evita-se assim a atividade de

espera no processo de setup. De uma maneira geral, a aplicação do conceito de focalização da

produção discutido no capítulo 2 deve ser feita também no contexto da TRF, aproximando e

focalizando o ferramental e equipamentos de apoio junto às células ou linhas as quais servem.

Harmon e Peterson (HARMON, 1991 : 245 – 247) citam um exemplo de focalização dos

dispositivos de setup implementado nas linhas de fabricação usadas na estampagem, moldagem e

montagem de contatores elétricos da Siemens, na Alemanha, onde pela simples focalização dos

dispositivos às linhas conseguiu-se reduzir o tempo de troca das duas prensas perfuradoras de cada

linha, que consumia de 15 a 30 minutos, para meros um a dois minutos.

Page 96: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

87

Matriz Antiga Matriz Nova

Prensa

Carrinho Rotativo

Figura 5.7 Carrinho com roletes para a troca de matrizes.

Eliminadas as atividades desnecessárias, deve-se proceder a separação criteriosa das

atividades internas das externas. Quando a máquina estiver parada para a troca da matriz ou

ferramenta o operador deve executar apenas as operações do setup interno, ou seja, a remoção da

matriz ou ferramenta antiga e a fixação da nova. Todas as atividades referentes ao setup externo,

como preparação e transporte das matrizes, gabaritos, ferramentas e dispositivos de fixação, devem

ser feitas enquanto a máquina ainda estiver operando. Shingo (SHINGO, 1996 : 82) argumenta, com

base em sua grande experiência prática, que a simples separação e organização das operações

internas e externas podem reduzir o tempo de parada de máquina entre 30 a 50%.

5.3.2 Converter o setup interno em externo

Organizadas as atividades internas e externas do setup e eliminadas as desnecessárias, para

se chegar a uma redução maior do tempo de máquina parada deve-se proceder a uma análise

criteriosa das atividades inicialmente classificadas como internas, no sentido de verificar se

realmente essa é uma atividade que só pode ser executada com a máquina parada, bem como, se não

existe uma outra alternativa melhor que permita transferi-la, total ou parcialmente, para atividade

externa.

Um exemplo simples da aplicação desse conceito consiste em rever a atividade interna de

aquecimento de matrizes nos processos de fundição e forjamento. Deve-se utilizar o calor perdido

pelo forno nessas operações para pré-aquecer as matrizes que irão entrar em operação, evitando-se

assim, além da perda de tempo interno, custos decorrentes da produção de itens defeituosos no

início da produção.

Outra atividade considerada convencionalmente como interna que pode ser transferida, pelo

menos parcialmente, para externa é o ajuste do ferramental, empregando-se dispositivos

intermediários que padronizem a forma de fixação. Os ajustes são demorados (de 50 a 70% do

tempo total de setup interno) e requerem a habilidade de um ferramenteiro. Como seria muito

dispendioso a curto prazo padronizar todas as matrizes, deve-se inicialmente promover a

Page 97: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

88

uniformização apenas das partes necessárias ao setup. Por exemplo, a altura das matrizes pode ser

padronizada pela utilização de placas espaçadoras (Figura 5.8), de forma a evitar que a prensa

necessite regular sua abertura a cada mudança de matriz. Outro exemplo clássico consiste em

padronizar a altura dos cabeçotes fixadores de estampos (Figura 5.9), acelerando sua forma de

fixação e eliminando ajustes.

Espaçador para

padronizar a altura

Altura

Padrão

Figura 5.8 Espaçadores para a padronização da altura de matrizes (MONDEN, 1984 : 44).

Fixador com

altura padrão

Fixador com

rebaixo usinado

Fixador com

espaçador soldado

Figura 5.9 Padronização da altura dos cabeçotes fixadores de estampos (MONDEN, 1984 : 46)

O emprego de uma ferramenta de fixação suplementar padronizada para todas as matrizes é

uma outra técnica usada para passar as atividades internas de ajuste para externa. Apesar de cada

matriz ter sua regulagem diferente conforme o item para a qual se destina, projeta-se um dispositivo

padrão de fixação intermediária onde essa matriz é regulada e fixada como uma atividade externa de

setup, ou seja, com a máquina operando o item anterior. Quando a máquina para, é realizada a troca

do conjunto “matriz-dispositivo auxiliar” de forma rápida. Empregando-se ainda sistemas de guias

para direcionar o posicionamento do conjunto, semelhante ao de um vídeo cassete, chega-se ao

chamado setup em um toque (OTED – One Touch Exchange of Die).

5.3.3 Simplificar e melhorar os pontos relevantes

Uma vez separadas as atividades internas das externas, e transferidas, tanto quanto possível,

as atividades internas para externas, o terceiro estágio da TRF consiste em analisar detalhadamente

essas atividades buscando simplificar e melhorar ainda mais alguns pontos relevantes do setup.

Nesse sentido, algumas soluções propostas por Shingo podem ser exploradas, como usar operações

Page 98: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

89

paralelas, usar sistemas de colocações finitas (ou do mínimo múltiplo comum), empregar fixadores

rápidos e eliminar a tentativa e erro.

Usar operações paralelas: máquinas de grande porte envolvem posições de fixação de

matrizes em todo o seu perímetro. Com apenas um operador executando o setup, invariavelmente

muito dos seus movimentos são realizados somente para se deslocar de um ponto a outro. Porém, se

um segundo operador é convocado para ajudá-lo, o tempo total despendido por cada operador tende

a ser menor do que 50%, em função da eliminação das atividades desnecessárias. Por exemplo, se

uma troca leva 15 minutos para ser feita por um operador, pode ser realizada em 5 minutos por dois

operadores. Com a simplificação e padronização das ações necessárias ao setup, a polivalência dos

operadores pode ser estendida no sentido da ajuda mútua durante o setup.

Usar sistemas de colocações finitas: apesar de uma máquina ao ser projetada pelo

fabricante ser capaz de assumir posições em uma escala contínua, quando colocada em operação

apenas algumas dessas posições serão empregadas, principalmente quando se focaliza a produção

numa gama restrita de itens. Por exemplo, a Figura 5.10 mostra a instalação de cinco limitadores de

curso, nas cinco posições necessárias, com objetivo de eliminar o ajuste em escala contínua que era

realizado quando existia apenas um limitador. O setup passa a ser executado com um toque apenas.

Outra aplicação desse conceito pode ser vista na Figura 5.11, onde regulagens universais para o

ajuste interno e externo das proteções de uma linha de limpeza de recipientes, foram substituídos

por uma proteção fixa na parte externa e gabaritos padrões de proteção interna, conforme o tipo de

vasilhame, afixados por guias em posições fixas.

Quadro móvel

Quadro fixo

Limitadores de curso

para controlar os

golpes das batidasBatente

de curso

Figura 5.10 Sistema de colocações finitas (MONDEN, 1984 : 45).

Page 99: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

90

Dispositivos de ajuste

Dispositivos de ajuste

Proteção externa fixa

Proteção interna substituível

Figura 5.11 Setup na proteção da correia transportadora (HARMON, 1993 :395).

Empregar fixadores rápidos: parafusos são os elementos mais comuns de fixação de

ferramentas, contudo eles só fixam a ferramenta quando a porca é acionada até o último fio de sua

rosca, e só liberam a ferramenta quando a porca é totalmente desenroscada. Entre esses dois pontos

existe um desperdício de tempo onde o operador está apenas desenroscando a porca. Quando

diferentes tipos de parafusos são utilizados (phillips, allen, quadrados ou hexagonais) a situação se

complica ainda mais pela troca de chaves necessárias ao setup. No caso de equipamentos onde os

pontos de fixação são numerosos, ou em regulagens de linhas de montagens, o desperdício pode ser

multiplicado por dez, ou mesmo cem. A solução para evitar que isso ocorra passa por três ações:

rever o projeto do ferramental através de uma análise estrutural, buscando reduzir o

número de dispositivos de fixação à quantidade correta;

padronizar os dispositivos de fixação, reduzindo a sua altura à mínima necessária para

dar o aperto e desaperto da ferramenta;

substituir os parafusos convencionais por dispositivos de fixação rápida, como por

exemplo os apresentados na Figura 5.12:

a) parafusos com a cabeça em forma de T ou L eliminam a necessidade de ferramenta

suplementar;

b) diâmetro interno do furo da base da matriz maior do que o diâmetro externo da

porca, sustentada por uma arruela em forma de U que é sacada fora com apenas um

giro da porca, liberando a matriz;

c) parafuso e porca com roscas parciais complementares, permitindo sacar ou introduzir

a porca no parafuso até o final de seu curso e fixá-la com um giro;

d) grampos acionados por molas, hidráulica ou pneumaticamente, permitem o encaixe

da matriz com um toque.

Page 100: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

91

a) dispositivos com cabeça em L e T b) arruela em forma de U

c) parafuso e porca com rosca parcial d) grampos acionados por molas

Figura 5.12 Dispositivos de fixação rápida.

Eliminar a tentativa e erro: o processo de setup só é completado efetivamente quando se

consegue produzir a primeira peça dentro das especificações exigidas. O período compreendido

entre a fixação da ferramenta nova e a produção da primeira peça boa, com retirada de amostras,

medições e novas regulagens, é um desperdício de tempo e dinheiro, e como tal deve ser eliminado.

O objetivo da TRF é de que uma vez realizada a troca do ferramental, a primeira peça já esteja

dentro das especificações, partindo do princípio de que deve existir um padrão de regulagem a ser

seguido. A Figura 5.13 apresenta essa dinâmica. A razão para o emprego do método de tentativa e

erro tem sua origem, segundo Harmon e Peterson (HARMON, 1991 : 237), em três fatores:

1) como a TRF não faz parte da filosofia da empresa, padrões de setup não são seguidos;

2) com a falta de focalização da produção existente em estruturas departamentais, várias

máquinas podem executar a mesma operação em um item, tendo cada uma delas

regulagens diferentes. Isso torna dispendioso e pouco operacional a existência de padrões

atualizados;

3) com o passar do tempo, e sem manutenções preventivas e aplicação dos “5S”

(organização, arrumação, limpeza, padronização e disciplina), o desgaste e sujeira dos

componentes das máquinas tornam inúteis as regulagens padrões.

Page 101: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

92

SetupRetirar

amostraInspecionar Regular

Retirar

amostraProduzirTempo

Desperdícios

Usar

padrões

Setup Produzir

Figura 5.13 Eliminar a tentativa e erro.

5.3.4 Eliminar o setup

Eliminar a atividade de setup é o objetivo final da TRF. O melhor setup é aquele que não

existe, ou seja, ao invés de se supor que os setups são inevitáveis deve-se responder a seguinte

pergunta: como produzir itens diferentes sem promover setups? A resposta a essa pergunta pode ser

uma simples modificação no projeto do produto, a produção focalizada em células, ou a produção

de peças em grupos.

Projeto do produto: os produtos devem ser projetados de forma que seus itens

componentes sejam padronizados. Reduzindo-se a variedade de itens, reduz-se a necessidade de

trocas de ferramentas. Um exemplo simples desse ponto, apresentado por Harmon (HARMON,

1993 : 238), diz respeito ao projeto de dois virabrequins onde os orifícios para a entrada de óleo

tinham sido projetados com ângulos diferentes, resultando em um tempo de setup na usinagem

desses orifícios de quase duas horas. Uma análise mais criteriosa identificou que a diferença nos

ângulos provinha apenas do fato dos projetos das peças terem sido feitos por engenheiros diferentes,

portanto poderia se padronizar o ângulo e eliminar o setup.

Produção focalizada: a focalização da produção com células de fabricação permite uma

visão mais clara do fluxo produtivo. De nada adianta produzir itens em grandes lotes em máquinas

potentes, se o fluxo produtivo desse item está ligado ao seu tempo de ciclo, que é limitado pela

demanda. Por exemplo, ao invés de se utilizar uma prensa com múltiplas funções para furar um

item, pode-se introduzir dentro de uma célula uma máquina mais simples com a função específica

de furação, acionada pelo operador, sempre que necessário, dentro do fluxo de produção unitário.

Produção em grupos: a produção de itens diferentes agrupados na mesma operação é uma

forma de eliminar ou diluir o setup da máquina pelo grupo produzido. Os grupos podem ser

formados por itens utilizados em um mesmo produto, como por exemplo estampar os paralamas

direto e esquerdo de um automóvel simultaneamente, ou por itens diferentes empregados em

produtos diferentes. Shingo (SHINGO, 1996 : 238) cita um exemplo de dois tipos de botões para

televisão, A e B, produzidos a partir de resinas diferentes em uma máquina injetora de plástico. A

solução encontrada para evitar o setup, apresentada na Figura 5.14, foi desenvolver um molde com

cavidades para os dois tipos de botões formando ângulos retos. Conforme o tipo de botão

necessário, o molde é girado em 90 graus e a respectiva resina é injetada.

Page 102: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

93

A

A

B B

Canal de

injeção

Figura 5.14 Produção em grupo de itens (SHINGO, 1996 : 238).

5.4 MELHORIA NOS TEMPOS DE PROCESSAMENTO

O tempo de processamento é o tempo gasto com a transformação da matéria-prima em

produto acabado. Considera-se por princípio que o tempo gasto com o processamento dos itens é o

único que agrega valor ao produto, e pelo qual os clientes estão dispostos a pagar. Como o tempo de

processamento de um item é decorrente do esforço conjunto de homens e máquinas, para melhorá-lo

tem-se três alternativas: melhorar os movimentos humanos, melhorar os movimentos das máquinas,

ou ainda, substituir o movimento humano por automações. Convencionalmente delega-se a

Engenharia Industrial a função de promover melhorias nesse tempo, contudo, dentro da filosofia

JIT/TQC, a responsabilidade pela melhoria nos tempos de processamento pode ser atribuída tanto a

quem projeta o produto e sua forma de fabricação, como a quem executa essas operações.

Melhorar os tempos de processamento a nível de projeto significa planejar produtos e

processos de produção que possam ser implementados de forma simples e eficientes. Atualmente o

projeto de produtos e processos passa pelos conceitos de Engenharia Simultânea e Análise de Valor.

A Engenharia Simultânea busca desenvolver projetos interativos onde os fornecedores e clientes da

cadeia produtiva possam expor suas necessidades e potencialidades de trabalho para gerar produtos

que garantam a sobrevivência dessa cadeia em relação as demais cadeias concorrentes. A Análise de

Valor fornece as técnicas necessárias para que os engenheiros envolvidos no projeto possam

analisar e melhorar cada uma das funções que se espera que o produto execute.

Melhorar os tempos de processamento a nível de execução das operações significa não só

cumprir os padrões de trabalho dentro dos tempos de ciclo preestabelecidos, como também buscar o

melhoramento contínuo, o chamado kaizen, nas funções de operação. A filosofia JIT/TQC abre

espaço dentro dos Círculos de Controle de Qualidade, ou grupos de estudos equivalentes, para que o

nível operacional possa também contribuir com alternativas que visem facilitar a execução das

atividades produtivas. Os padrões de trabalho e a distribuição de funções operacionais dentro do

conceito de polivalência serão discutidos no próximo capítulo.

5.5 MELHORIA NOS TEMPOS DE INSPEÇÃO

Uma vez processados, os itens passam em algum ponto do sistema pela inspeção para

verificação da sua qualidade. A inspeção por amostragem, baseada no chamado NQA (nível de

qualidade aceitável), tem sido a solução utilizada pelos sistemas de produção convencionais para

Page 103: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

94

reduzir o tempo e os custos desse procedimento. Contudo, esse tipo de inspeção apresenta dois

problemas fundamentais: um certo nível de defeitos pode ser aceito, ou seja, clientes receberão itens

defeituosos, e sua atuação se restringe aos efeitos do processo. Não atuando-se em cima das causas,

os defeitos tenderão a se repetir. Uma alternativa mais recente da inspeção por amostragem é o

controle estatístico do processo (CEP), onde cartas de controle são usadas para acompanhar a média

e a variabilidade do processo, buscando evitar que esse processo saia da faixa de controle e produza

itens defeituosos. Infelizmente, com a demora na tomada de decisões inerentes aos sistemas

convencionais de produção, o CEP resulta apenas na identificação de problemas a posteriori, e não

na sua prevenção.

A filosofia JIT/TQC tem por princípio a produção sem defeitos. Para que isso ocorra há

necessidade de se trocar a inspeção por amostragem pela inspeção 100%, bem como, atuar em cima

das causas geradoras dos defeitos para que não se repitam. Várias ferramentas voltadas para a

qualidade total foram desenvolvidas e estão disponíveis na literatura específica de TQC, como

Diagrama de Ishikawa, Classificação ABC, Ciclo PDCA, Técnicas de Taguchi, 5W1H, o próprio

CEP empregado em todo o seu potencial, entre outras. Dentro da proposta desse livro há interesse

em descrever apenas a lógica da inspeção 100% e sua dinâmica para o sistema de produção JIT,

segundo o conceito de “controle autônomo de defeitos”, chamado de autonomação ou jidoka, e o de

dispositivos à prova de erros, conhecidos como poka-yoke.

A autonomação (não confundir com automação) é uma técnica de produção JIT que objetiva

de forma automática detectar e corrigir problemas no fluxo de produção. Caso algum problema

ocorra, quanto à qualidade ou quantidade dos itens, a autonomação promove a parada do processo e

direciona a atenção dos operadores ao problema. Vale lembrar que o sistema de produção JIT é do

tipo puxado, só produz após o consumo, e que uma parada em um ponto do sistema leva a parada de

todo o sistema. Sendo assim, a autonomação garante a qualidade total, exercendo a inspeção em

100% dos itens produzidos e direcionando as ações de melhorias. Outro ponto fundamental ao

sistema JIT é que a autonomação possibilita que os operadores possam operar várias máquinas

(polivalência) simultaneamente, dentro do seu tempo de ciclo, através da separação das operações

manuais das mecânicas, liberando-os da atenção constante às operações da máquina. A Figura 5.15

apresenta a dinâmica da autonomação para obtenção da produção JIT.

Segundo Shingo (SHINGO, 1996 : 52-55) o processo de inspeção autônoma da produção em

quantidade e qualidade pode ser realizado de três maneiras diferentes: auto inspeção, inspeções

sucessivas e inspeção na fonte. A auto inspeção e as inspeções sucessivas são inspeções realizadas

após a produção do item, enquanto a inspeção na fonte é realizada durante a produção do item.

Auto inspeção: a auto inspeção consiste em o próprio operador verificar se o item

produzido por ele naquele momento está em perfeitas condições. Nesse caso, a velocidade de

resposta ao problema é a mais alta possível pois quem executa a operação pode imediatamente parar

o processo e corrigir problema. Para evitar que erros por mau julgamento ou desatenção passem, a

auto inspeção deve ser reforçada pela inclusão de dispositivos à prova de erros.

Inspeções sucessivas: em processos onde vários operadores manuseiam o item que está

sendo produzido, como células de fabricação ou linhas de montagem, pode-se evitar a parcialidade

na detecção dos erros promovendo inspeções sucessivas onde cada operador inspeciona os itens

provenientes da operação anterior. Dispositivos à prova de erros também podem ser projetados para

auxiliar os operadores nessa inspeção.

Page 104: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

95

Produção JIT

Para o processo quando

a operação é completada

Para o processo quando

um defeito é detectado

Autonomação• separa operações manuais das operações à máquina

• garante a qualidade(zero defeitos)

Auto inspeção Inspeções sucessivas Inspeção na fonte

Dispositivos à prova de erros• advertência

• parada

Método do conjunto Método das etapasMétodo do contato

Figura 5.15 Dinâmica da autonomação para a produção JIT.

Inspeção na fonte: a inspeção na fonte previne a ocorrência de defeitos atuando sobre a

causa do defeito, controlando o processo antes que os itens fiquem prontos. A inspeção na fonte que

detecta o erro dentro da própria operação é chamada de inspeção horizontal, enquanto que a

inspeção na fonte para rastear as condições externas à operação, evitando que se produzam itens

defeituosos, é chamada de inspeção vertical. Para a inspeção na fonte dispositivos à prova de erros

devem ser usados.

Conforme apresentado na Figura 5.15, a auto inspeção, as inspeções sucessivas e a inspeção

na fonte podem ser implementadas através de dispositivos à prova de erros, ou poka-yoke. Os

dispositivos à prova de erros podem ter a função de parar o processo ou de apenas advertir o

operador quanto a existência de um problema. A parada do processo é utilizada no caso de defeitos

que se tornem permanentes, por exemplo o desgaste de uma ferramenta que deve ser substituída,

enquanto que a advertência funciona bem quando os defeitos são ocasionais e o item defeituoso

pode ser facilmente separado dos demais sem interferir no andamento do processo, como por

exemplo um defeito em parte da matéria prima utilizada.

De uma maneira geral, os dispositivos à prova de erros possuem um instrumento para

detectar o problema, uma ferramenta para restringir a operação ou isolar o item defeituoso, e um

sistema de sinalização (andon) para chamar a atenção do operador. Conforme o método de detecção

Page 105: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Redução dos Lead Times Produtivos

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

96

empregado, os sistemas à prova de erros classificam-se em método do conjunto, do contato e das

etapas.

Método do conjunto: esse método visa assegurar que um conjunto de operações projetadas

foram executadas de forma correta. Por exemplo, em uma linha de montagem de circuitos impressos

cada operador, dentro de seu tempo de ciclo, tem que afixar um determinado número de dispositivos

na placa que está montando. Para assegurar que a operação foi realizada de forma correta, alarmes

são instalados na frente das caixas que contêm os dispositivos, de forma que se algum deles não for

retirado, o respectivo alarme dispara (ou uma luz acende) e o processo é interrompido até que o

operador corrija seu erro. Outro exemplo clássico desse método consiste no emprego de um

contador para detectar se o número de pontos de solda realizado está de acordo com o projetado,

caso contrário o processo é interrompido e o operador avisado.

Método do contato: esse método busca detectar o problema através da utilização de

dispositivos que permitam verificar a existência, ou não, de alguma característica associada à forma

ou dimensão do item. Por exemplo, na saída de um torno pode-se introduzir um dispositivo por

gravidade que obrigue as peças torneadas a passarem por um gabarito que verifica suas dimensões.

Caso um defeito ocorra, o processo para e o operador é acionado para corrigi-lo. Em processos de

montagem pode-se introduzir intencionalmente características nos componentes de forma que sua

montagem incorreta seja impossível de ocorrer. Por exemplo, duas peças que necessitam ser

soldadas podem receber no projeto guias e rasgos com a função específica de promover o encaixe

corretamente. Pode-se incluir ainda dentro do método do contato o emprego de diferentes códigos

cromáticos para evitar erros nas operações.

Método das etapas: esse método exige que o operador execute uma etapa que não faz parte

do roteiro de produção do item para garantir que o mesmo seja produzido sem erros. Por exemplo,

um fornecedor da Toyota Motors (SHINGO, 1996 :58) estava apresentando erros de montagem nos

acessórios de metal fixados nos oito tipos diferentes de acentos de automóveis fornecidos. Para

eliminar tal problema, foi projetado um sistema à prova de erros que consistia em anexar ao kanban

que autorizava a montagem dos acessórios, um pequeno disco de metal com formato diferente para

cada acento. Quando o acento chega para ser montado, o disco é introduzido em um dispositivo que

lê seu formato e acende uma lâmpada e abre a tampa da caixa de peças que contém os acessórios

para aquele modelo de acento. Como as demais caixas permanecem fechadas, a montagem certa é

garantida.

5.6 MELHORIA NOS TEMPOS DE TRANSPORTE

Uma vez produzidos e inspecionados, os itens necessitam ser transportados para as etapas

posteriores do processo produtivo, até chegarem aos estoques de produtos acabados. Nos sistemas

convencionais com produção em grandes lotes a melhoria nos tempos de transporte é obtida pela

automatização dos meios de transporte, transferindo simplesmente os custos de operações manuais

para custos de máquinas. Nos sistemas de produção JIT a atividade de transporte é uma das

primeiras na lista das atividades que não agregam valores aos produtos. Sendo assim, deve-se

inicialmente buscar todas as formas possíveis de eliminá-la, para só então melhorá-la. A eliminação

das atividades de transporte se dá pela introdução da produção focalizada, enquanto que a melhoria

na função de transporte ocorre com a introdução do conceito de produção em fluxo unitário dentro

das células, e da adoção de lotes pequenos entre etapas de processos celulares.

Page 106: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 5

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

97

A produção focalizada, discutida no capítulo 2, é a chave para a eliminação das atividades

improdutivas de movimentação e armazenagem intermediárias dos itens em produção. Por exemplo,

um lote de itens que passe por cinco operações em máquinas diferentes, distribuídas de forma

departamental, necessita ao final de cada operação solicitar, e geralmente esperar durante algum

tempo, a liberação de um equipamento de transporte para movimentá-lo até a próxima máquina que

está a dezenas, até centenas, de metros de distância. Muito freqüentemente esse lote de itens acaba

indo ao almoxarifado, ao invés do próxima máquina, duplicando as movimentações.

Já no sistema produtivo JIT, ao se focalizar a produção montando uma célula com essas

cinco máquinas, ocorrem apenas dois movimentos com o lote de itens. Um para se trazer as

matérias-primas para a primeira máquina da célula, e outro para levar o lote de itens prontos para

seguir seu roteiro. Aproximando-se células subseqüentes de forma que a saída de uma fique perto da

entrada de outra, pode-se eliminar ainda mais as movimentações dos itens.

Internamente na célula a movimentação dos itens ocorre segundo um fluxo unitário, com

roteiros predefinidos, facilitando a colocação de dispositivos baratos e rápidos de movimentação,

como esteiras e deslizadores por gravidade, entre as máquinas. Como os operadores, dependendo do

tempo de ciclo, podem operar várias máquinas da célula, nada impede que os mesmos se

encarreguem de transportar manualmente o item de uma máquina para outra, aproveitando seu

próprio deslocamento, com custo zero.

Nas movimentações entre estoques intermediários (supermercados), com a aplicação da TRF

e do sistema kanban, a racionalização se dá pelo uso de pequenos lotes colocados em contenedores

padrões. Como os supermercados são predefinidos e dispostos em locais fixos, a movimentação dos

contenedores pode ser facilmente acelerada pela automação. Algumas empresas investem em

veículos auto guiáveis (AGVs) para abastecer as linhas de forma rápida a partir desses

supermercados, contudo a movimentação mais simples e barata consiste em utilizar carrinhos

manuais acionados por operadores encarregados da movimentação, que podem transportar vários

contenedores simultaneamente.

Page 107: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

6 PADRONIZAÇÃO DAS OPERAÇÕES E POLIVALÊNCIA

O sexto capítulo pretende apresentar como deve ser realizada a distribuição da mão-de-obra

dentro do sistema de produção JIT de forma a fornecer flexibilidade e rapidez de resposta à

demanda. O emprego de operadores polivalentes e do trabalho em equipe com ajuda mútua é

ressaltado. Inicia-se o capítulo detalhando, dentro de um fluxo lógico de informações, como

os sistemas de produção JIT obtêm o balanceamento entre processos e estoques protetores.

Em seguida, cada uma das etapas dessa sistemática de balanceamento dos processos é

apresentada. O tempo de ciclo (TC), as operações padrões, a rotina de operações padrão e a

quantidade padrão de materiais em processo, necessárias à montagem da folha de operações

padronizadas, são definidas e apresentadas através de um exemplo ilustrativo. Completando

o capítulo, são feitas algumas considerações importantes sobre a necessidade de operadores

polivalentes para a lógica de funcionamento dos sistemas JIT.

6.1 INTRODUÇÃO

Os sistemas de produção JIT estão voltados para o atendimento “justo a tempo” das

necessidades dos clientes, ou seja, procuram produzir os produtos necessários, na quantidade

necessária, no momento necessário. Para que isso ocorra, os sistemas de produção JIT têm que

privilegiar a flexibilidade dos fatores de produção. Essa flexibilidade está baseada em planejar um

sistema que disponha de recursos que possam ser adaptados na medida em que pequenas variações

da demanda ocorram, sem a formação de estoques excessivos. Conforme já foi discutido

anteriormente, na visão do sistema de produção JIT é mais importante ajustar a capacidade dos

recursos humanos à demanda do que manter alta a taxa de utilização das máquinas. Nesse sentido

foram desenvolvidos os conceitos de células de fabricação para produção em fluxo unitário,

polivalência dos operadores, TRF, autonomação para liberar os operadores das máquinas, e os

sistemas de puxar a produção.

No capítulo 3 foi discutido como o planejamento e controle da produção deve ser

estruturado para obter essa flexibilidade, levando-se em consideração os três horizontes de

planejamento. A regra geral de qualquer sistema de produção é de que a flexibilidade se reduz na

medida em que o sistema tem que tomar as decisões para implementar a fabricação de um produto.

A Figura 6.1, já apresentada no capítulo 3, fornece uma visão da solução encontrada pelos sistemas

de produção JIT para manter certa flexibilidade a medida em que os horizontes vão se estreitando.

No longo prazo a flexibilidade é total no sentido que a partir do plano de produção

estratégico, pode-se alterar a forma e a capacidade do sistema de produção de maneira a atender a

demanda agregada prevista. A produção focalizada facilita essa tarefa. No médio prazo, em função

da não implementação imediata do plano-mestre de produção, tem-se flexibilidade dentro dos

limites da estrutura produtiva, tanto de mix como de volume. A parte variável do PMP é empregada

apenas para o cálculo do tempo de ciclo e do número de kanbans no sistema, e não para a emissão

de ordens. O tempo de ciclo ditará a quantidade de trabalho a ser distribuída, e o número de kanbans

os estoques de comunicação entre os processos. No curto prazo, como o sistema é de puxar, existe

ainda flexibilidade de mix pois a produção só se efetivará quando o cliente solicitar ao fornecedor

Page 108: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

100

determinada quantidade de itens. O sistema kanban de produção puxada, já detalhado no capítulo 4,

se encarrega de administrar a demanda de curto prazo.

Plano

de

Produção

Longo

Prazo

Flexibilidade Total

Balanceamento entre

Capacidade e Demanda

Plano Mestre

de

Produção

Médio

Prazo

Flexibilidade de Volume

e Mix

Definição do Tempo de

Ciclo e Kanbans

Sistema

de

Puxar

Curto

Prazo

Flexibilidade de Mix

Produção via

Kanban

Figura 6.1 Flexibilidade e PCP no sistema de produção JIT.

Nesse capítulo as atenções estão voltadas para a flexibilidade do sistema de produção JIT no

médio prazo, a partir da distribuição de operadores polivalentes pelos processos de acordo com o

tempo de ciclo esperado. A Figura 6.2, já apresentada, ilustra o potencial de mudança na capacidade

de produção a partir da distribuição de diferentes rotinas de operações padrão entre os operadores de

uma célula segundo o tempo de ciclo exigido para atender justo a tempo a demanda. Nesse

exemplo, a célula pode ser operada por dois operadores, obtendo-se tempos de ciclo de 2,0 minutos

por unidade, ou por três operadores, acelerando o processo para ciclos de 1,5 minutos por unidade.

Enquanto que nos sistemas de produção convencionais a mudança na capacidade de

produção passa pela compra de novos equipamentos que devem ser trabalhados no seu limite de

capacidade para reduzir custos unitários, mesmo que apenas formando estoques, a alternativa de

compor os ritmos de trabalho de acordo com a demanda, dá aos sistemas de produção JIT o

potencial de alterar sua capacidade produtiva em um horizonte de tempo de médio prazo sem a

necessidade de manter estoques excessivos. Logicamente, conforme já foi comentado, essa

alternativa JIT de trabalhar com capacidade de máquina excedente para ser usada em momentos de

pico, leva em consideração que os investimentos em equipamentos serão absorvidos pelos produtos

durante toda a vida operacional dos equipamentos, e não apenas no período contábil de sua

depreciação, enquanto que os custos com a mão-de-obra são custos de curto prazo e devem ser

minimizados pela distribuição adequada das operações.

A Figura 6.3 apresenta quais os pontos básicos que um sistema de produção JIT deve

desenvolver para obter um processo produtivo equilibrado. O equilíbrio entre ritmos de trabalho e

estoques é a chave para a flexibilidade do sistema JIT. Como pode-se ver nessa figura, um sistema

de produção JIT possui estoques reguladores, ou supermercados, entre os processos e processos

Page 109: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

101

produtivos balanceados. Os supermercados são dimensionados a partir do cálculo do número de

kanbans necessários para a produção e movimentação dos itens entre os processos. Já o

balanceamento de cada processo decorre da distribuição da rotina de operações padrão para cada

operador e da quantidade de material padrão necessária à manutenção do fluxo interno de produção

no processo. A rotina de operações padrão para cada operador em cada processo é obtida pela

distribuição de um certo número de operações padrões dentro do tempo de ciclo.

Três operadores

Tempo de Ciclo

de 1,5 min./unidade

Dois operadores

Tempo de Ciclo

de 2,0 min./unidade

Figura 6.2 Flexibilidade na capacidade de produção.

Olhando ainda a Figura 6.3, nota-se que para obter um sistema de produção JIT equilibrado,

tanto os estoques de comunicação entre os processos (supermercados) como o balanceamento dos

processos devem ter sua origem na demanda dos itens para o qual se destinam. Sempre que a

previsão de demanda por produtos acabados constante do PMP sofrer alterações significativas, o

número de kanbans e o tempo de ciclo devem ser revistos e adequados à esse novo patamar. Daí a

importância em se manter uma base de clientes estável, com negociações de longo prazo que visem

o ganho global da cadeia produtiva. Da mesma forma, com a aplicação do princípio de

melhoramentos contínuos, a eliminação de desperdícios no processo produtivo irá alterar os padrões

das operações, e, consequentemente, a distribuição dessas operações pelos operadores. Cada um

desses passos para se chegar ao balanceamento dos processos, com exceção do sistema kanban que

já foi visto, será detalhado nesse capítulo.

6.2 TEMPO DE CICLO

O tempo de ciclo (TC), conforme já foi definido no capítulo 3, é o ritmo que deve ser dado

ao sistema de produção para a obtenção de determinada demanda dentro de um período de tempo,

geralmente um dia. O TC é obtido pela divisão do tempo disponível para a produção por dia pela

demanda esperada por dia, conforme a Fórmula (6.1).

TC = TP D (6.1)

Page 110: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

102

TX = D TP (6.2)

Onde:

TC = Tempo de ciclo em minutos por unidade;

TP = Tempo disponível para a produção por dia;

D = Demanda esperada por dia;

TX = Taxa de produção em unidades por dia.

Sistema de Produção

JIT

Estoques entre

processos

(supermercados)

Balanceamento

dos

processos

Cálculo do

número de

kanbans

Quantidade de

material padrão

dentro do processo

Rotina de

operações

padrão

Tempo de Ciclo

(TC)

Operações

padrões

MelhoriasDemanda

Demanda

Figura 6.3 O equilíbrio nos sistemas de produção JIT.

O TC é um conceito convencionalmente empregado apenas para balancear linhas de

montagem, onde cada montador possui um determinado período de tempo para executar suas

tarefas. Ao final desse tempo o produto em processo é passado para o montador da frente.

Internamente no sistema produtivo, os processos repetitivos em lotes com layouts departamentais

não podem aplicar o TC porque cada operador trabalha em ritmo diferente conforme a velocidade

de sua máquina, que não pode ficar parada. Nesse caso aplica-se a taxa de produção (TX), conforme

a Fórmula (6.2). Nos sistemas de produção JIT focalizados com ênfase no layout celular, a produção

dos itens em fluxo unitário permite que o TC possa ser usado como o regulador dos ritmos de

trabalho, tanto nas linhas de montagem como nos processos repetitivos em lotes, garantindo um

balanceamento global do sistema pela demanda esperada. Cada operador dentro do sistema de

produção JIT deve receber um conjunto de operações padrões que garanta o mesmo ritmo de

trabalho dos demais.

Page 111: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

103

No cálculo do TC o tempo disponível para a produção por dia não deve ser reduzido devido

a problemas de fadiga, quebras de máquina, falta de matérias-primas etc. Essas perdas de tempo

devem ser tratadas como problemas que realmente são, e não encobertas por uma redução no tempo

disponível de produção. Por exemplo, a quebra de máquinas é eliminada pela manutenção

preventiva, a fadiga é eliminada pelo dimensionamento correto das operações padrões e pela

rotatividade entre operadores polivalentes, a falta de matérias-primas é evitada pelo

dimensionamento correto dos supermercados, etc. Pelo mesmo motivo, também a demanda

esperada por dia, proveniente do PMP, não deve ser aumentada em função da produção de itens

defeituosos. Caso algum defeito ocorra, o dimensionamento correto do TC fará com que ele

imediatamente seja notado. Dessa forma, o TC nos sistemas de produção JIT são maiores do que os

projetados para os sistemas convencionais que aplicam fatores de correção para tratar esses

problemas. Com TC maiores, o número de operações padrões que pode-se alocar aos operadores

também é maior, exigindo-se menos mão-de-obra no processo. É importante frisar que nos sistemas

de produção JIT a maior produtividade ocorre não pela aceleração das atividades individuais dos

operadores, mas sim pelo sincronismo entre o conjunto de atividades padrões de cada operador ao

TC. Isso por um lado garante o mínimo de desperdício no sistema, e por outro a identificação

imediata de problemas.

Apesar do TC ser obtido de forma similar à taxa de produção, eles estão baseados em

princípios diferentes. A taxa de produção se refere à quantidade de unidades por dia, e desde que o

operador cumpra essa quantidade ele estará dentro do padrão previsto. Já o TC definido em

minutos, ou segundos, por unidade obriga o operador a manter um ritmo padrão de operação

preestabelecido pelo PMP, independente da quantidade que produza. Por exemplo, caso um

departamento exija uma taxa de produção de 20 peças por hora para atender ao PMP, o operador

pode produzir um lote de 20 peças a cada hora ou um lote de 100 peças a cada cinco horas,

possivelmente com padrões de desempenho diferentes. Contudo, quando se estabelece um tempo de

ciclo equivalente de 3 minutos por unidade, e se distribui um conjunto de operações padrões para o

operador executar e repetir a cada 3 minutos, o controle do sistema é muito mais preciso e eficiente.

Com a evolução da legislação trabalhista no Brasil, regulando questões como o contrato

temporário de trabalho e o banco de horas, torna-se uma realidade a obtenção da flexibilidade na

capacidade de produção a partir de mudanças no tempo de ciclo dos postos de trabalho. O que antes

era apenas um exercício teórico, com exemplos de aplicações em indústrias japonesas, agora é uma

questão de investimentos em educação da mão-de-obra e técnicas JIT para o chão de fábrica.

Está claro que mudanças significativas na demanda exigem decisões infra-estruturais de

longo prazo, contudo a flexibilidade de médio prazo a partir da reorganização dos ritmos de trabalho

(TC) para pequenas alterações na demanda, é uma técnica JIT que não pode ser descartada pelas

empresas que buscam permanentemente a eficiência produtiva. A princípio essa flexibilidade pode

ser alcançada de duas maneiras: alterando-se o número de operadores ou alterando-se o tempo de

trabalho. A alteração da capacidade produtiva, e do tempo de ciclo, pela inclusão ou exclusão de

operadores temporários nos postos de trabalho em um sistema de produção celular já foi ilustrado

na Figura 6.2.

Já a alteração no tempo disponível de trabalho, criando-se o banco de horas, é útil para

manter-se um mesmo tempo de ciclo, e rotinas regulares de trabalho, apesar de mudanças na

demanda. Por exemplo, uma empresa que em períodos normais de 8 horas por dia (480 minutos)

trabalha com tempos de ciclo de 2 minutos por unidade para atender a uma demanda de 240

unidades, pode no período de baixa estação, quando sua demanda cair para 210 unidades dia,

Page 112: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

104

reduzir sua jornada de trabalho para sete horas (420 minutos) por dia no sentido de manter as rotinas

de trabalho com o mesmo tempo de ciclo em 2 minutos. Durante esse período os operários ficam

“devendo” uma hora por dia para a empresa. Já em períodos de alta estação, quando sua demanda

subir para 270 unidades por dia, a empresa pode aumentar sua jornada de trabalho para nove horas

por dia (540 minutos), mantendo sua rotina de trabalho com tempos de ciclo de 2 minutos. Durante

esse período a empresa dica “devendo” para os operadores uma hora por dia. No final do ano é

realizado um balanço para equilibrar esse banco de horas. O importante nesse caso é que a empresa

estará produzindo demandas de 210 a 270 unidades por dia com eficiência e qualidade a partir de

rotinas regulares de produção.

6.3 OPERAÇÕES PADRÕES

A segunda informação básica para se obter uma rotina de operações padrão, além do tempo

de ciclo, é o conjunto de operações padrões dentro de cada etapa do processo produtivo que

necessitam ser executadas durante a transformação das matérias primas em produtos acabados.

Essas informações compõem o roteiro de fabricação e montagem de cada produto. O roteiro de

fabricação e montagem deve ser obtido através de cronometragem, com a utilização de técnicas de

tempos e movimentos para determinar o tempo gasto para executar cada operação padrão em uma

unidade do produto. Geralmente com treinamento adequado pela Engenharia Industrial, o próprio

mestre do setor pode fazer esse levantamento de tempos. A Figura 6.4 apresenta um exemplo de

roteiro de fabricação de um item.

Nos sistemas convencionais os tempos padrões levantados para a elaboração dos roteiros de

fabricação e montagem são obtidos em cima de uma quantidade de itens equivalentes ao tamanho

do lote. Nos sistemas de produção JIT, como busca-se a produção em fluxo unitário, os tempos

padrões são obtidos para cada unidade do item. Caso alguma operação resulte na produção de dois,

ou mais, itens deve-se dividir seu tempo pelo número de itens produzidos. No exemplo da Figura

6.4, cada engrenagem consome 19 segundos para ser estampada, sendo quatro segundos com o

operador junto à máquina e 15 segundos para a máquina operar sozinha, bem como 0,30 segundos

em média para trocar a ferramenta da máquina, dado que a cada 1000 unidades estampadas gasta-se

300 segundos para o setup.

Roteiro de Fabricação no 17 Atualizado em: 20/02/98 Responsável:

Código do item: 1025 Especificação do item: engrenagem Código da MP: 1024 Consumo padrão: 1pç.

Ordem Descrição

das

operações

Máquina Tempos de processamento

(seg.)

Troca de ferramentas Capacidade

de produção

por turno

(28800 seg.) Manual Máquina Total Vida

útil

(unid.)

Tempo

Total

(seg.)

Tempo

unitário

(seg.)

1 Fresar FR-18 5 30 35 500 180 0,36 814

2 Estampar PR-25 4 15 19 1000 300 0,30 1492

3 Rosquear TO-08 2 10 12 800 180 0,23 2354

4 Balancear FR-05 5 22 27 250 120 0,48 1048

5 Limpar Bancada 8 - 8 - - - 3600

6 Inspecionar Bancada 16 - 16 - - - 1800

Figura 6.4 Roteiro de fabricação de um item.

Page 113: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

105

Com a soma desses tempos, ou seja 19,3 segundos por engrenagem, pode-se calcular qual a

capacidade de produção da célula para essa operação. Admitindo-se nesse exemplo um turno de

trabalho de oito horas (28800 segundos), obtêm-se uma capacidade de estampar 1492 unidades por

turno. Contudo, como pode-se ver na coluna de capacidade de produção, a operação padrão que

limita a capacidade da célula é a de fresar com 814 unidades por turno. Isso significa que a demanda

por essa peça, e consequentemente o TC atrelado a ela, não pode ser superior a essa quantidade, a

não ser que melhorias sejam desenvolvidas nessa operação para aumentar sua capacidade.

Um segundo ponto que diferencia o roteiro de fabricação do sistema JIT dos convencionais é

a separação do tempo padrão de operação em tempo manual e tempo de máquina. O tempo manual

é o tempo em que o operador necessita estar junto à máquina para retirar a peça anterior e colocar a

nova, ou fazer uma inspeção na peça, enquanto que o tempo de máquina se refere ao tempo em que

a máquina está mecanicamente operando a peça sem a necessidade da presença do operador. Não

deve ser considerado como tempo manual o tempo do operador se deslocando entre as máquinas

pois esse tempo dependerá da distribuição das tarefas na célula, o que será feito quando da definição

da rotina de operações padrão para cada operador. A separação entre tempos manual e de máquina

tem sua origem na aplicação do conceito de polivalência, onde espera-se que os operadores após

colocarem a peça na máquina possam se dirigir até a próxima máquina para operá-la, sem se

preocuparem com a operação mecânica da máquina anterior. A autonomação, discutida no capítulo

anterior, garante que a máquina pare sempre que a operação estiver concluída ou algum defeito

detectado, permitindo ao operador afastar-se da máquina.

É importante colocar que o objetivo da obtenção de tempos padrões no sistema de produção

JIT é o de manter uma distribuição homogênea de atividades entre os operadores dentro do tempo

de ciclo, e não o de fazer com que o operador tenha o máximo de velocidade em cada uma das

operações. Sendo assim, os tempos padrões podem ser obtidos de forma mais simples, associados à

velocidade normal de trabalho dos operadores, sem entrar em detalhes difíceis de serem avaliados e

cumpridos na prática. Quando as operações forem executadas por grupos de operadores, como em

uma montagem por exemplo, a ajuda mútua entre eles permitirá um equilíbrio melhor na

distribuição das tarefas.

6.4 ROTINA DE OPERAÇÕES PADRÃO

Estabelecido o ritmo de trabalho necessário para atender determinada demanda, em termos

de tempo de ciclo, e o roteiro de fabricação ou montagem para cada produto com as operações

padrões, o passo seguinte consiste em distribuir um conjunto de operações padrões para cada posto

de trabalho dentro desse tempo de ciclo. Agindo assim, a rotina de operações padrão resultante

fornece a seqüência de operações padrões que cada operador deve executar em seu posto de trabalho

para que o sistema de produção JIT como um todo atenda as necessidades do cliente, expressa em

termos de PMP, justo a tempo. Isso se dá com o auxílio da folha de rotina de operações padrão,

exemplificada na Figura 6.5.

O primeiro passo para montar a rotina de operações padrão consiste em identificar na folha o

tempo de ciclo. Em seguida deve-se, com auxílio do roteiro de fabricação ou montagem do item,

alocar tantas atividades quanto possíveis para esse posto de trabalho, incluindo-se agora o tempo de

deslocamento do operador, de forma que o conjunto de operações padrões e deslocamentos termine

o mais próximo possível do tempo de ciclo marcado na folha, permitindo que o operador ao final da

Page 114: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

106

rotina retorne para a primeira atividade e recomece seu ciclo de trabalho. Na contagem para o tempo

de ciclo deve-se considerar apenas os tempos que envolvem o operador, ou seja, as operações

padrões manuais e os deslocamentos, visto que as máquinas ficarão executando os tempos padrões

mecânicos automaticamente. Os tempos de deslocamento serão proporcionais ao layout escolhido

para o processo e devem ser minimizados com o formato em “U”.

Rotina de Operações Padrão No 78 Demanda diária:

480 unidades

Atualizado em:

20/02/98

Simbologia:

Op. Manual

Op. Mecânica

Andando Código do item: 1025 Processo: usinagem

da engrenagem

Tempo de ciclo:

60 segundos

Responsável:

Ordem Descrição

da operação

Tempo (seg.) Tempo de operação (seg.)

Manual Máquina 0

2

0

4

0

6

0

8

1

0

1

2

1

4

1

6

1

8

2

0

2

2

2

4

2

6

2

8

3

0

3

2

3

4

3

6

3

8

4

0

4

2

4

4

4

6

4

8

5

0

5

2

5

4

5

6

5

8

6

0

6

2

6

4

1 Apanhar item

no contenedor 2 -

2 Fresar

5 30

3 Estamapar

4 15

Rosquear

2 10

5 Balancear

5 22

6 Limpar

8 -

7 Inspecionar

16 -

8 Colocar item

no contenedor 2

Figura 6.5 Folha de rotina de operações padrão.

Por exemplo, a folha de rotina de operações padrão da Figura 6.5 é montada a partir do

roteiro de fabricação da Figura 6.4 da seguinte maneira. Aponta-se o tempo de ciclo de 60 segundos

na escala de tempos de forma a limitar o conjunto de operações padrões a ser distribuído. A

primeira operação consiste em apanhar a matéria prima no contenedor, que consome dois segundo.

Em seguida o operador desloca-se para a fresa, gastando mais dois segundos, onde retira a peça

pronta do ciclo anterior e coloca a nova, consumindo cinco segundos. Ao ser acionada, a fresa ficará

operando a nova peça sem auxílio do operador por mais 30 segundos. Enquanto isso, o operador

desloca-se para a prensa, gastando mais dois segundos, onde retira a peça pronta do ciclo anterior e

coloca uma nova, consumindo quatro segundos. Aciona a prensa que ficará operando a nova peça

sem auxílio do operador por mais 15 segundos. O operador segue nessa rotina de deslocamentos e

operações manuais até a última operação de colocar a engrenagem pronta no contenedor, quando

desloca-se para apanhar nova matéria prima e reiniciar seu ciclo. Note que não existe tempo de

deslocamento entre a limpeza e a inspeção, pois ambas são executadas na mesma bancada. O tempo

total líquido dessa rotina é de 58 segundos, compatível com o tempo de ciclo previsto.

No exemplo da Figura 6.5 a rotina de operações padrão está de acordo com o roteiro de

fabricação da peça, ou seja, o operador em sua rotina segue o curso normal de fabricação da

engrenagem. Contudo, nem sempre essa solução mais simples é viável pois o tempo de ciclo pode

ser menor ou maior do que a soma dos tempos padrões. Quando o tempo de ciclo for mais longo do

que o roteiro de operações padrões de um item, outras atividades devem ser incluídas na rotina do

operador para completar seu tempo de ciclo. Um layout celular adequado permitirá que os

operadores possam executar atividades em itens diferentes simultaneamente, operando tanto na

parte interna das células como na parte externa das mesmas, facilitando assim a distribuição do

tempo de ciclo entre os mesmos.

Page 115: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

107

Por outro lado, quando o tempo de ciclo for muito curto para que um único operador execute

todas as operações padrões de um item em uma célula, o roteiro de fabricação do item deve ser

distribuído por mais operadores, cada um deles operando dentro do tempo de ciclo projetado. Nesse

caso a rotina de operações padrão de cada operador não segue de forma imediata o roteiro de

fabricação da peça.

Por exemplo, na Figura 6.6 tem-se uma célula que produz um item cujo roteiro de fabricação

envolve 10 operações padrões. Em função do tempo de ciclo exigido pela demanda atual do item ser

menor do que a soma dos tempos padrões de fabricação do item, necessita-se de três operadores

para completar um item no tempo de ciclo. O primeiro operador executa as operações um, dois e

dez em 1,5 minutos. O segundo operador está encarregado das operações três, quatro, oito e nove

também em 1,5 minutos. E o terceiro operador trabalha nas operações cinco, seis e sete no mesmo

tempo de ciclo. Dessa forma, apesar do roteiro de fabricação exigir 4,5 minutos para produzir-se um

item, a cada tempo de ciclo de 1,5 minutos um item fica pronto.

Uma outra solução para distribuir as atividades quando o tempo de ciclo for curto em

relação ao roteiro de fabricação do item consiste em fazer com que os operadores executem todas as

operações, seguindo um atrás do outro, com intervalos equivalentes ao tempo de ciclo. No caso do

exemplo anterior cada um dos três operadores, separados por intervalos de 1,5 minutos, teria como

rotina as dez operações sendo repetidas a cada 4,5 minutos, o que daria um tempo de ciclo por item

de 1,5 minutos. Essa situação reduz a necessidade de WIP entre os operadores, que será tratada no

próximo tópico, sendo mais fácil de ser empregada em linhas de montagem, onde o tempo da

operação está mais centrado em funções manuais.

1

1

2 2

3

1,5

1

2

10

OperaçãoRotina Tempo de operação

1

2

3

1,5

5

6

7

OperaçãoRotina Tempo de operação

1

2

3

1,5

3

4

8

OperaçãoRotina Tempo de operação

1

2

3

4 9

2

3

4

5

10

9

8

7

6

1

3

Figura 6.6 Tempo de ciclo menor do que o roteiro de fabricação.

A necessidade de realizar setups nas máquinas para a produção de itens diferentes é outra

questão que deve ser tratada quando da elaboração da rotina de operações. Em células que

Page 116: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

108

produzem um único tipo de item, há necessidade de se trocar a ferramenta apenas quando ocorre o

desgaste da mesma, contudo, em células mistas, sempre que um lote (kanban) de um item for

completado, um lote (kanban) de outro item entrará na célula. Tendo em vista que internamente na

célula busca-se a produção em fluxo unitário, o setup das máquinas deve seguir o mesmo fluxo, ou

seja, a medida em que o novo item for passando de máquina para máquina, dentro de um tempo de

ciclo, a troca de ferramenta vai se realizando também dentro de um tempo de ciclo. Logicamente,

para se obter esse estágio de sincronismo entre setups e tempos de ciclo, é indispensável a redução

dos tempos de preparação pela aplicação das técnicas de troca rápida de ferramentas (TRF), já

apresentadas.

6.5 QUANTIDADE PADRÃO DE MATERIAIS

Definidas as rotinas de operações padrões para cada posto de trabalho, o último passo para

se obter o balanceamento dos processos produtivos consiste em analisar qual a quantidade de

material padrão que deve-se colocar dentro dos processos, os chamados work-in-process (WIP), de

forma a permitir que os operadores cumpram a sua rotina padrão. É importante salientar que os

materiais em processo não devem ser projetados para absorver problemas de qualidade ou de falta

de tempo para seguir a rotina de operações.

2

3 4

9 8

5

7

63

1 2

10

1

WIP WIP

WIPWIPSupermercado

de

PA

Supermercado

de

MP

Figura 6.7 Posição dos itens em processo (WIP).

Com a produção em fluxo unitário dentro do processo cada operador na sua rotina padrão se

encarrega de retirar o item já processado e, dentro do tempo de ciclo, colocá-lo na próxima

máquina, contudo, além dos materiais que estão em processamento nas máquinas há necessidade de

se manter uma quantidade padrão de materiais nas seguintes situações:

conectar dois operadores: nos pontos dentro do roteiro de fabricação do item onde dois

operadores se comunicam, há necessidade de deixar um item na saída da máquina do

primeiro operador para que o segundo, ao chegar nesse ponto, tenha um item disponível

para processar na próxima máquina. A Figura 6.7 mostra os pontos onde deve-se manter

itens em processo (WIP) para a comunicação dos operadores dentro da célula

apresentada na Figura 6.6. Nesse caso, quatro pontos de estoques devem ser projetados

na célula para que cada um dos três operadores possa seguir sua rotina de operações

padrão dentro do tempo de ciclo previsto.

Page 117: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

109

esperas técnicas do processo: alguns processos não permitem que o item trabalhado

possa ser imediatamente manuseado para ser transferido para a próxima máquina.

Situações onde a temperatura de saída da peça é alta, ou onde deve ocorrer um processo

de “cura” ou secagem, são exemplos que exigem a colocação de um item adicional entre

as máquinas.

Como resultado final do trabalho de balanceamento dos processos à uma demanda esperada,

um documento chamado de folha de operações padronizadas para cada item, em cada posto de

trabalho do sistema de produção, deve ser montado. Esse documento, exemplificado na Figura 6.8,

deve ficar afixado junto ao processo produtivo que representa e servir de fonte de informações

visual (andon) e de fácil acesso para os operadores. A folha de operações padronizadas de um item

deve fornecer ao operador informações sobre a rotina de operações padrão a ser seguida, o tempo de

ciclo projetado, o tempo líquido de operação, os estoques em processo, os pontos de inspeção e os

cuidados com a segurança devem ser seguidos.

Tempo

Líquido

58”

Roteiro

78

20/02/98

Tempo de

ciclo

60”

Item

engrenagem

Código

1025

WIP Pontos de

segurança

Inspeção

FR-18

Fresar

PR-25

Estampar

TO-08

Rosquear

FR-05

Balancear

Bancada

Limpar Inspecionar

Supermercado

de

PA

Supermercado

de

MP

123

4

5 6 7 8

Figura 6.8 Folha de operações padronizadas.

Segundo Monden (MONDEN, 1984 :56), quando a folha de operações padronizadas é

colocada junto à cada posto de trabalho ela é útil para o controle visual nos três níveis hierárquicos

dos sistemas de produção, quais sejam:

fornece o roteiro padrão para cada operador manter sua rotina de operações;

ajuda o supervisor a verificar se cada operador está seguindo sua rotina de operações

padrão;

permite que a gerência avalie a habilidade do supervisor em melhorar o padrão de

operação pela constante revisão e atualização das rotinas.

Page 118: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

110

6.6 POLIVALÊNCIA

A flexibilidade do sistema de produção JIT tem por base a distribuição dos trabalhos entre

operadores polivalentes ou multifuncionais. A função dos operadores polivalentes é a de absorver

no médio prazo as variações na demanda, expressas em termos de diferentes tempos de ciclos, pela

mudança de sua rotina de operações padrão. Ou seja, um operador polivalente é aquele que tem

condições técnicas de cumprir diferentes rotinas de operações padrões em seu ambiente de trabalho.

A obtenção desses operadores polivalentes passa por um processo de treinamento contínuo, com

rotação de postos de trabalho, e pela montagem de um sistema de produção com layout celular e

processos autônomos de detecção de problemas que favoreçam o desenvolvimento da

multifuncionalidade.

Além de permitir maior flexibilidade ao sistema produtivo, a polivalência dos operadores

possibilita uma série de vantagens adicionais quando comparado ao sistema tradicional de trabalho

monofuncional, quais sejam:

compromisso com os objetivos globais: exercendo várias funções no seu ambiente de

trabalho, as quais podem ser alteradas através da rotação entre os postos, os operadores

têm a oportunidade de hora serem clientes, hora serem fornecedores, de cada uma das

etapas do processo produtivo. Isso facilita o entendimento de quais são as reais

necessidades de seus clientes internos e estimula o senso de propriedade dos operários,

comprometendo-os com os objetivos globais do sistema produtivo;

reduz a fadiga e o stress: com a diversificação das ações físicas e o deslocamento do

operador entre os equipamentos da célula, quebra-se a excessiva repetição dos

movimentos da operação monofuncional, tornando a rotina de trabalho menos monótona

e eliminando o potencial de ocorrer doenças devido à esforços repetitivos. Nesse sentido,

os operadores ficam mais atentos ao cumprimento dos padrões das operações, evitando-

se defeitos e acidentes de trabalho;

dissemina os conhecimentos: com a rotatividade entre os postos de trabalho, os

operadores mais experientes são estimulados a passar seus conhecimentos e habilidades

para os mais novos, dado que a avaliação de desempenho do processo produtivo é feita

em cima do resultado do trabalho em grupo. As folhas de operações padronizadas,

colocadas junto aos postos de trabalho, formalizam essa disseminação dos

conhecimentos;

facilita a aplicação das técnicas de TQC: o enfoque da “qualidade total” exige que os

operadores tenham um conhecimento amplo do seu ambiente de trabalho e a noção da

dinâmica de trabalho em grupo para que a aplicação de técnicas de identificação, análise

e solução de problemas sejam efetivas. Os grupos de CCQ podem ser formados

naturalmente e todos podem contribuir de forma efetiva. A polivalência dos operadores e

a rotatividade nos postos de trabalho dá essa qualificação básica para a implementação

das técnicas de TQC, que operadores monofuncionais não dispõem;

permite uma remuneração mais justa: a polivalência e o trabalho em grupo possibilita a

implantação de um sistema de remuneração mais justo, de acordo com o desempenho e

habilidades do grupo. A remuneração deixa de ser em função apenas do tempo de

trabalho do operador e passa a considerar principalmente o nível de habilidade, ou

polivalência, do mesmo. Também a política de estímulo através da distribuição de lucros

pode ser devidamente aplicada ao grupo de trabalho que realmente gerou determinado

lucro.

Page 119: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

111

A obtenção de operadores polivalentes não é uma tarefa simples, ela está inserida dentro do

princípio da filosofia JIT/TQC de melhoramentos contínuos. Para se preparar uma equipe de

operadores polivalentes a área de recursos humanos deve traçar um plano de ação de longo prazo,

dentro do sistema conhecido como OJT (on-the-job-treining), ou treinamento dentro do local de

trabalho, baseado em três etapas seqüenciais:

treinamento e rotação dos supervisores: como serão os supervisores que iram

desenvolver e implementar as rotinas de operações padrões em suas áreas de

responsabilidade, é indispensável que os mesmos conheçam em detalhe cada operação

padrão do roteiro de fabricação dos itens. O treinamento e a rotatividade dos

supervisores dentro das mini-fábricas darão maior segurança na elaboração das rotinas e

consistência entre as várias áreas do sistema produtivo;

treinamento dos operadores polivalentes: cada um dos operadores deve possuir um

plano de ação para desenvolver suas habilidades em todas as operações padrões de sua

área de trabalho. Os supervisores serão os responsáveis pela implementação desse plano

de treinamento dentro de sua equipe;

rotação dos operadores: uma vez que os operadores dominem determinada gama de

operações padrões, o supervisor deve ficar encarregado de planejar a troca de rotinas de

operações padrões entre os operadores, uma ou mais vezes ao dia, para manter o nível de

habilidade adquirida.

É importante para o desenvolvimento da polivalência o conceito de ajuda mútua. Conforme

já foi apresentado no capítulo 2, esse conceito estabelece que os pontos de contato entre as rotinas

de operações padrões de dois, ou mais, operadores não sejam fixos, mas sim uma área onde tanto

um operador, como o outro, possa atuar caso haja necessidade. Ohno (OHNO, 1997 : 44) faz uma

analogia do local de trabalho à uma corrida de revezamento, onde o item trabalhado é passado de

operador para operador como se fosse o bastão levado pelo corredor em uma pista de atletismo.

Diferentemente de uma corrida de revezamento na natação, onde um nadador tem que esperar que o

outro toque na borda da piscina para dar sua largada, em uma pista de atletismo existe uma área de

alguns metros onde é permitida a passagem do bastão. Ou seja, caso um operador termine sua rotina

antes do tempo de ciclo previsto ele está autorizado a entrar na rotina de operações de seu colega e

auxiliá-lo na sua conclusão. Ou ainda, dentro da lógica dos sistemas de produção puxados, caso

algum problema ocorra com um de seus colegas o auxílio deve ser imediato.

Além de fortalecer o espírito de trabalho em equipe, a ajuda mútua possibilita que a

velocidade natural de cada operador possa ser utilizada sem prejuízo do atendimento da rotina de

operações padrão, equilibrando as tarefas dentro do grupo. Nesse aspecto, a busca por padrões de

tempo teóricos muito detalhados e dispendiosos de se obter, não tem tanto sentido. Basta ao

supervisor, quando da rotação das rotinas entre os operadores, designar as tarefas de acordo com as

habilidades pessoais de cada um. A longo prazo, com o treinamento contínuo e o espírito de

competição inerente ao trabalho em grupo, essas diferenças tendem a diminuir.

Como forma de melhor operacionalizar o processo de ajuda mútua, deve-se colocar

dispositivos de sinalizações ou quadros de avisos, chamados de andons, junto aos postos de trabalho

para facilitar a identificação da ocorrência de problemas. Quando um operador está com dificuldade

em cumprir sua rotina de operações padrões dentro do tempo de ciclo, ele aciona o dispositivo para

avisar aos demais companheiros e ao supervisor que necessita de ajuda.

Page 120: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Padronização das Operações e Polivalência

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

112

Um desses dispositivos empregado para direcionar a ação de ajuda mútua, conhecido como

Yo-I-Don ou “pronto-colocado-adiante”, consiste em associar ao quadro de avisos (andon) um

temporizador com o objetivo de sincronizar o tempo de ciclo entre processos adjacentes, garantindo

que os operadores só iniciarão um novo tempo de ciclo após todos os demais operadores terem

completado a sua rotina de operações padrão. Nesse sentido, busca-se a produção em fluxo unitário

tanto dentro das células como entre as mesmas.

Um exemplo desse sistema pode ser visto na Figura 6.9 (MONDEN, 1984 : 54). Nesse caso,

uma fábrica de carroçarias, associada da Toyota Motors, possui três processos interligados: um

processo encarregado da estrutura do assoalho com seis postos (U1 até U6), um processo para a

produção das laterais da carroçaria com seis postos, sendo três (S1, S2 e S3) para fabricar a lateral

direita e três (S4, S5 e S6) para a esquerda, e um processo principal com quatro postos (M1 até M4)

que une o assoalho, as duas laterais e um teto. Essa fábrica se propõem a produzir em fluxo unitário

as carroçarias dentro do tempo de ciclo projetado, ou seja, cada um dos 16 postos de trabalho deve

completar sua rotina de operações padrões dentro desse tempo de ciclo e passar seu material

completado para o posto seguinte.

U1

U2

U3

U4 U5 U6 M1 M2 M3 M4

S1 S2

S3 S4

S5 S6

Processo do assoalho

da carroçaria

Processo principal

da carroçaria

Processo da lateral

da carroçaria

1/3 2/3 3/3

U1 U2 U3 U4 U5 U6

S1 S2 S3 S4 S5 S6

M1 M2 M3 M4

Andon para a fábrica de carroçaria

Figura 6.9 Sistema Yo-I-Don (MONDEN, 1984 : 54)

Como forma de coordenar esse processo, um quadro de avisos é pendurado no alto da

fábrica de maneira que todos possam vê-lo. Esse quadro possui um painel com uma lâmpada

vermelha para cada posto de trabalho, e um painel superior dividido em três partes iguais que

representa a passagem do tempo dentro do tempo de ciclo projetado. Os operadores da estrutura do

Page 121: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 6

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

113

assoalho, das laterais e do processo principal ao completarem sua rotina de operações padrão

acionam um botão que informa ao painel que seu posto de trabalho está dentro do tempo de ciclo.

Ao final de cada tempo de ciclo, a lâmpada vermelha se acende automaticamente naqueles postos

que não acionaram seus botões. Caso alguma das lâmpadas vermelhas se acenda, ou seja algum

operador esteja com problemas, todos os postos param e esse operador é imediatamente ajudado

pelo supervisor, ou pelos operadores mais próximos, a terminar sua rotina e acionar seu botão. Só

então, ao apagarem-se todas as luzes vermelhas, os demais operadores estão autorizados a iniciar

novo tempo de ciclo.

Uma aplicação mais simples desse sistema pode ser vista nas trocas de pneus das corridas de

“Fórmula 1”. Enquanto cada um dos quatro mecânicos responsáveis pela troca de cada um dos

pneus do carro não terminar sua tarefa e levantar os braços como forma de aviso, o mecânico

coordenador geral da troca que fica com uma placa de sinalização na frente do rosto do piloto, não

libera o piloto para prosseguir sua corrida. Caso algum problema ocorra e o mecânico não levante os

braços, os demais correm, literalmente, para ajudá-lo a completar seu ciclo.

Page 122: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

7 A CADEIA LOGÍSTICA JIT

O sétimo capítulo tem como objetivo apresentar a visão da filosofia JIT/TQC para as

questões referentes ao relacionamento entre empresas participantes de uma cadeia produtiva.

Em uma cadeia produtiva participam empresas clientes, fornecedoras e transportadoras.

Como base para início das discussões é feita uma descrição de cadeia produtiva e dos

problemas encontrados nos relacionamentos convencionais entre empresas. Em seguida são

apresentados os três fatores chaves para que fornecedores e clientes operem uma cadeia

logística eficiente: o desenvolvimento de fornecedores JIT, a diminuição da base de

fornecedores, e a integração da produção com o fornecedor. Dentro desse último tópico são

vistos vários sistemas mutuamente benéficos, como o planejamento e programação da

produção conjuntos, o kanban com fornecedores, a troca eletrônica de documentos, os

pedidos em aberto, etc. Completando o capítulo, a participação do transportador nesse

processo de parceria é analisada.

7.1 INTRODUÇÃO

A adoção da filosofia JIT/TQC pelas empresas foi o caminho encontrado para sobreviver e

prosperar num mercado globalizado, cada vez mais competitivo. Essas empresas procuram ser mais

eficientes do que a concorrência em custo, qualidade, desempenho de entrega e flexibilidade, e com

isto, atender as necessidades dos clientes em um nível superior. Para tanto, há necessidade de buscar

a eliminação de atividades que não agregam valor aos produtos, envolvendo não só todos os

participantes do sistema produtivo interno, no sentido de melhorar continuamente o seu

desempenho, como também buscar a simplificação e flexibilidade nas interações entre os diversos

sistemas externos envolvidos na manufatura, organizando-os e facilitando suas atribuições e

controles.

Nesse aspecto, pode-se dizer que a filosofia JIT/TQC tem sua aplicação em dois níveis

distintos: o nível interno aos sistemas produtivos das empresas e o nível de relacionamento externo

entre empresas de uma cadeia produtiva. As diversas técnicas descritas até agora nesse trabalho

tiveram como objetivo o sistema produtivo interno das empresas, podendo-se chamar a isso de JIT

interno. Já o JIT externo pode ser entendido como a extensão da aplicação dessas técnicas para

melhorar o relacionamento do sistema produtivo interno com clientes e fornecedores externos à

empresa, formando uma cadeia logística JIT, conforme ilustrado na Figura 7.1.

Olhando-se uma cadeia produtiva do ponto de vista da empresa produtora, como na Figura

7.1, pode-se identificar de uma forma genérica quatro sistemas interligados: o sistema fornecedor, o

sistema transportador, o sistema produtor e o sistema cliente. A princípio cada um desses sistemas é

ao mesmo tempo fornecedor, produtor e cliente de alguém, fazendo com que a interface entre duas

empresas contenha todos os elementos necessários ao entendimento da logística JIT. Dessa forma,

no capítulo 7 as questões sobre a cadeia logística JIT serão tratadas dentro de uma relação genérica

entre fornecedor e cliente, ou seja, serão analisados os conceitos e ferramentas da filosofia JIT/TQC

para um elo dessa cadeia produtiva. Num primeiro momento será considerado o transportador como

um fornecedor de serviços para a empresa, sendo que mais adiante será aberto um tópico específico

com questões relativas aos transportadores.

Page 123: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

115

Fornecedor Produtor ClienteTransportador Transportador

JIT Interno JIT Interno JIT Interno

JIT Externo JIT Externo

Figura 7.1 A cadeia logística JIT.

Segundo a proposição da cadeia logística JIT a união entre as empresas e seus fornecedores

deve ser forte e duradoura. Com o crescente uso de subcontratados e fornecedores no lugar da

produção vertical integrada, se faz necessário um aumento de responsabilidades entre ambas as

partes no projeto, manufatura e transporte dos produtos para o atendimento das metas

preestabelecidas. Nesse sentido mais trabalhos devem ser subcontratados de fornecedores

especialistas, as relações devem ser de longo prazo envolvendo uma pequena quantidade de

fornecedores por item, muitas vezes apenas um, o envolvimento deve iniciar-se já a partir do projeto

do produto e uma monitoração constante sobre a qualidade e pontualidade das entregas deve

acompanhar a produção, permitindo o trabalho eficiente com mínimos estoques e custos. A ênfase

no aspecto "preço cotado" na escolha dos participantes dessa cadeia deve ser substituída pela

garantia na qualidade e pontualidade das entregas em pequenos lotes.

Como a filosofia JIT/TQC apregoa o sistema de puxar a produção, sua implementação deve

ser iniciada com a estabilização de um programa de produção baseado nas necessidades dos

clientes, deve estender-se por dentro do sistema produtivo flexível (JIT interno), e só então, atingir o

fornecimento de peças componentes e matérias-primas (JIT externo), equacionando o

relacionamento com fornecedores. A Figura 7.2 ilustra essa dinâmica de implantação. A conjugação

de um sistema produtivo eficiente, buscando o melhoramento contínuo no atendimento das

necessidades dos clientes (JIT interno), com um sistema de relacionamento efetivo

fornecedor/transportador/empresa (JIT externo), onde todos ganhem através da eliminação de

atividades improdutivas (estoques, movimentações, inspeções, etc.) é o que pode-se chamar de um

sistema de produção JIT completo.

Neste sentido, uma vez obtido sucesso na implantação da filosofia JIT/TQC internamente, as

empresas passam a incluir seus fornecedores dentro desse programa. No Brasil, a grande maioria

das empresas ainda não está preparada para assumir essas novas funções, porém alguns resultados

positivos já se fazem sentir, principalmente na indústria automobilística nacional e outras empresas

de ponta, onde a concorrência globalizada fez com que as suas exigências internas de qualidade e

produtividade fossem estendidas para os fornecedores, chamando-os e treinando-os dentro destes

novos conceitos. Como os custos dos materiais e componentes adquiridos representam de 60 a 70%,

em média, do custo dos produtos fabricados, fica claro o potencial de ganho a ser obtido com o

estreitamento das relações com fornecedores numa cadeia logística otimizada.

Page 124: A produtividade-no-chao-de-fabrica

A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

116

ProduçãoFornecedores

Transportadores

Implantação da Filosofia JIT/TQC

JIT Externo JIT Interno Clientes

Figura 7.2 A dinâmica de implantação da filosofia JIT/TQC.

Convencionalmente pode-se dizer que os relacionamentos externos das empresas têm sido

um jogo de “soma zero”, ou seja, para que um dos participantes da cadeia produtiva ganhe “x”,

algum outro participante tem que perder “x”. Sendo assim, o relacionamento convencional entre as

empresas está baseado em se obter a máxima vantagem no curto prazo, sem benefícios para a cadeia

produtiva como um todo e, em especial, para os clientes finais que em última análise são os que

pagam os custos de toda a cadeia. As principais características desse relacionamento onde não existe

confiança mútua e cooperação na solução de problemas são:

múltiplos fornecedores: o uso de várias fontes de fornecimento como forma de prevenir-

se contra problemas futuros de desempenho de entregas (quantidade e prazo), má

qualidade, greves, aumentos abusivos de preços etc. Essa política leva ao baixo

envolvimento do fornecedor no processo do cliente e a incerteza quanto à demanda

futura, dificultando a aplicação de técnicas para a otimização interna do sistema

produtivo do fornecedor;

emprego do processo de concorrência: a escolha do fornecedor é feita em cima de

táticas adversárias de negociação com ênfase no preço cotado, estimulando o atrito entre

as partes. Como decorrência existe pouca cooperação com os fornecedores, fazendo com

que os mesmos obtenham uma baixa margem de lucro e não possam investir em

melhoramentos de seus sistemas produtivos, deteriorando a longo prazo a qualidade e o

desempenho do serviço oferecido, quando então são substituídos por outro concorrente;

excessivas atividades de controle nas operações de fornecimento: como não existe

confiança nos fornecedores, uma entrega convencional de materiais passa por mais de

dez atividades de recepção e inspeção da documentação e da carga antes de chegar até o

usuário final, encarecendo e dificultando o processo de reposição;

uso de estoques altos: em decorrência do mal relacionamento, tanto no fornecedor como

no cliente, são colocados altos estoques de segurança para garantir as deficiências de

qualidade, pontualidade e quantidade dos lotes entregues pelos fornecedores;

não compartilhamento de informações: as informações sobre planos de produção e

previsões de demanda não são repassadas para a cadeia produtiva, impossibilitando o

planejamento conjunto e o sincronismo de fabricação e transporte entre as partes;

variabilidade dos itens: com múltiplos fornecedores, cada lote de itens adquirido provem

de um sistema de produção diferente que, apesar de estar dentro dos limites de controle,

pode fornecer itens com diferentes padrões, vindo a causar problemas de variabilidade

entre lotes, principalmente em linhas de montagem.

Page 125: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

117

Todos esses fatores, durante muito tempo, levaram os fabricantes convencionais a

integrarem verticalmente as fontes de fornecimento e os sistemas de distribuição e transporte no

sentido de evitar a ocorrência de problemas que afetassem internamente a empresa, tal como fez

Henry Ford, no início do século, ao montar um sistema de extração de borracha na selva amazônica

para fabricação de seus próprios pneus. Até algumas décadas atrás isso ainda era possível porque os

níveis de tecnologia envolvidos eram tais que as empresas podiam incluir uma nova máquina ou

processos quando necessários, visto que os ciclos de vida dos produtos eram maiores e davam ao

fabricante tempo para recuperar o investimento.

Atualmente, a complexidade e sofisticação dos produtos estão conduzindo os sistemas

produtivos da integração vertical para a descentralização da tecnologia de manufatura, dentro do

enfoque da focalização da produção. O crescimento desordenado dos sistemas produtivos e a

conseqüente perda de foco nos negócios da empresa já foi tratado no capítulo 2, dentro do contexto

de produção focalizada. Assim, por exemplo, uma lavadora de roupas antiga, ou um automóvel, que

podia ser totalmente fabricada por uma única empresa, hoje em dia é produzida com peças de

precisão, motores, eletrônica e controles computadorizados, com um esforço combinado entre

muitos fornecedores e a empresa montadora, cada uma das quais focalizada em seu negócio

principal.

Um ponto que deve ser ressaltado dentro da logística JIT para a diminuição da complexidade

dos sistemas produtivos, consiste na terceirização de suas atividades com hierarquização dos níveis

de fornecimento de forma piramidal. Dentro do conceito de redução do tamanho do sistema

produtivo via focalização da produção, as empresas buscam dividir o seu sistema produtivo em

vários sistemas menores e mais controláveis. Nada impede que esses sistemas estejam a cargo dos

antigos fornecedores, individualmente ou em grupos, fazendo com que os mesmos agreguem mais

valor aos seus produtos e, pela melhor organização da cadeia produtiva, reduzam os custos totais da

mesma. Nessa estrutura de fornecimento a empresa lida apenas com o primeiro nível de

fornecedores dessa pirâmide, que por sua vez lida com os de segundo nível, e assim por diante,

conforme pode-se ver na Figura 7.3.

Por exemplo, na indústria automobilística convencional um pára-choque e seus componentes

como faróis, sinaleiras, lâmpadas, fios etc., eram comprados de vários fornecedores diferentes. Isso

gerava, por um lado, muita confusão durante a montagem desses itens no automóvel e, por outro,

setores de compras gigantescos com mais de 500 compradores para lidar com algo em torno de

2000 itens, cada um com vários fornecedores. Já nos modernos sistemas JIT, desenvolve-se um

fornecedor focalizado de primeiro nível que entrega direto na linha de montagem um “kit” completo

de pára-choque com todos os seus componentes embutidos. Não é difícil entender que a montagem

do pára-choque no automóvel fica simplificada, e que o setor de compras, ao lidar com poucos

fornecedores de primeira linha, algo como 100 a 150 deles, pode reduzir sua estrutura, e custos, para

50 compradores focalizados nesses fornecedores. Um exemplo avançado desse tipo de proposta, que

está sendo chamado de consórcio modular, é o empregado pela nova fábrica de caminhões da VW

em Resende (RJ), onde os fornecedores dos subconjuntos do caminhão estão dentro da própria

fábrica integrados ao processo de montagem.

Page 126: A produtividade-no-chao-de-fabrica

A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

118

F 1 F 2 F 3 F 4 F 5 F 6 F n

Produtor

F 111 F 112 F113

F 11 F 12 F 13

F 1 F 2 F 3 F 4 F 5

Produtor

Estrutura em linha convencional

Estrutura piramidal JIT

Figura 7.3 Hierarquia de fornecimento.

Nesse novo contexto de logística industrial, as empresas que buscam soluções dentro da

filosofia JIT/TQC para a cadeia produtiva têm certeza de que um bom relacionamento com seus

fornecedores promoverá altos níveis de qualidade e eficiência para todos. Esse trabalho deve ser

visto como um esforço de longo prazo pela eliminação de todas as atividades que não agregam valor

dentro da cadeia produtiva. Para tanto, alguns fatores chaves, que serão detalhados a seguir, são

básicos para se atingir um nível elevado de relacionamento, quais sejam:

desenvolvimento de fornecedores JIT;

diminuição da base de fornecedores;

integração da produção com o fornecedor.

7.2 DESENVOLVIMENTO DE FORNECEDORES JIT

Normalmente, a implantação da filosofia JIT/TQC se dá a partir da maior empresa da cadeia

produtiva, e só então ela é estendida aos fornecedores desta cadeia. Aí então, a fábrica maior trata de

prepará-los para o cumprimento de prazos, qualidade, preço e quantidade, repassando-lhes as

técnicas JIT necessárias e monitorando seu progresso. Sendo assim é essencial desenvolver vínculos

entre as organizações para assegurar uma relação comercial de longo prazo. A formação desses

vínculos é estrategicamente tão significativa, que as relações entre os participantes da cadeia

produtiva devem envolver a diretoria das empresas, e não apenas o nível tático e operacional como

no sistema convencional.

Page 127: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

119

No Japão é comum as empresas possuírem, além de interesses comerciais, participação

acionária nos fornecedores. Isso formaliza os vínculos de longo prazo entre as empresas e garante

que tanto cliente como fornecedor farão o máximo para que os negócios mútuos prosperem. O apoio

financeiro para transferência de tecnologia e treinamento dos fornecedores pode ser uma boa

oportunidade de formalizar o interesse mútuo através de uma pequena participação acionária. No

relacionamento convencional, esse tipo de vínculo acionário não é estimulado pois, nas relações de

compra de curto prazo, busca-se tirar o máximo de vantagens no processo e, uma vez esgotado seu

potencial, passar para uma nova relação semelhante com outro fornecedor.

Independente da questão acionária, o envolvimento das empresas à nível de diretoria é a

única forma de tornar clara decisões que irão afetar o futuro de ambas as organizações. As relações

convencionais de suprimento entre os departamentos de compras, de um lado, e o de vendas, de

outro, limitam as comunicações ao nível operacional das empresas. A participação do fornecedor no

desenvolvimento de novos produtos através da engenharia simultânea, a focalização da fábrica do

fornecedor junto ao cliente, a definição de contratos de longo prazo comprometendo a capacidade

produtiva do fornecedor, a transferência de tecnologia e treinamento para o fornecedor, etc. são

questões de caracter estratégico que só podem ser decididas pelas diretorias das duas empresas.

Dentro desse aspecto, muitos dos problemas resultantes de ineficiências operacionais podem

ser solucionados com o desenvolvimento de relações confiáveis com fornecedores, assegurando

contratos justos e eqüitativos. A estabilização do esquema de fornecimento baseado em

comprometimentos de longo prazo está relacionada com fatores como confiança, compromissos,

boas comunicações, redução de ciclos de entrega e otimização de custos. Além disso, enquanto os

fornecedores se mostrarem competitivos, eles terão segurança no futuro de seus negócios e lucro

garantido.

Com certeza a negociação de contratos JIT é uma tarefa extremamente complexa, pois

envolve não apenas duas empresas, mas três atores da cadeia logística: o fornecedor, o cliente e o

transportador. Eles devem buscar a melhor maneira de atingir a confiabilidade no sistema, sem

contudo aumentar os níveis de estoques e os custos do processo. É importante que estes atores

entendam o “porquê” da movimentação de pequenos lotes e da garantia do fluxo contínuo de

materiais no sistema de produção JIT.

Um aspecto a se considerar na elaboração de contratos JIT de suprimento é que, por

princípio, dentro da filosofia JIT/TQC, os problemas devem ser facilmente identificados e

prontamente resolvidos sempre que apareçam, evitando-se sua repetição. Sendo assim, os contratos

formais apenas respaldam uma situação que deve se confirmar na prática do dia a dia. Os contratos,

por si só, não garantem o desempenho do relacionamento entre as partes. Servirão somente para,

uma vez ocorrido o problema, solucionar uma disputa judicial. O espírito da filosofia JIT, aplicado à

cadeia logística, consiste em tomar ações preventivas, e não pró-ativas através de contratos formais,

que eliminem os problemas potenciais que possam surgir dentro dessa cadeia produtiva.

Outro ponto importante é de que os negócios são operados por pessoas, e as pessoas

trabalham em termos de confiança. Os contratos formais são meros instrumentos que registram os

detalhes e mantêm a honestidade das pessoas. A confiança, entretanto, pode ser alcançada mas

acarreta envolvimento e comprometimento pessoal. Ela funciona em duas direções: o cliente espera

que o fornecedor garanta as suas necessidades e, reciprocamente, o fornecedor espera o mesmo do

cliente. É nesta base que deve ser desenvolvida a confiança mútua, permitindo que as empresas

operem com uma eficiência conjunta melhor do que separadas. Neste caso as comunicações entre

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A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

120

clientes e fornecedores, mantendo canais contínuos e abertos, apresentam-se como críticas para

operar um sistema JIT.

Convencionalmente, apenas o setor de compras está autorizado a entrar em contado com o

representante do fornecedor. Caso algum problema surja na produção em relação aos itens entregues

por um fornecedor, vários níveis hierárquicos são envolvidos na tentativa de solucionar o problema,

fazendo com que a solução, caso encontrada, seja tomada tarde de mais para trazer benefícios ao

sistema. Esse processo inicia-se com o operador da linha identificando o problema, passa pela ação

do supervisor em acionar o departamento de qualidade, que, por sua vez, preenche uma série de

documentos necessários para que o departamento de compras possa exigir uma ação por parte do

fornecedor. No lado do fornecedor todas essas etapas são repassadas de forma inversa, até chegar

tarde demais ao operador que gerou o problema.

Em uma cadeia logística JIT para agilizar a solução dos problema todos os canais possíveis

de comunicação entre as empresas devem ser estimulados, desde a troca de informações entre as

equipes de engenharia das duas empresas, com visitas periódicas, até o contato direto entre os

encarregados das duas produções visando resolver de forma imediata problemas operacionais. A

justificativa de que somente o setor de compras possui a técnica e a experiência para entrar em

contato com os fornecedores não é mais válida.

7.3 DIMINUIÇÃO DA BASE DE FORNECEDORES

As razões que levam as empresas a terem vários fornecedores por item são bem conhecidas e

estão relacionadas a dois pontos básicos dentro da área de administração de materiais, que são a

segurança e a redução de custos. A segurança da reposição dos estoques quando se negocia com

fornecedores que possuem sistemas produtivos convencionais, com baixo desempenho, é feita na

base da duplicação das fontes de fornecimento, buscando-se garantir que caso algo dê errado, os

outros fornecedores possam suprir essa lacuna. A segunda razão está ligada ao fato de considerar o

custo direto do material comprado como o fator primordial na escolha do fornecedor nos processos

de concorrência, o que leva à necessidade de se ter vários fornecedores por item competindo entre

si, de forma a oferecerem o menor custo direto.

A filosofia JIT/TQC revê esses pontos e questiona sua efetiva validade. Nesse novo

relacionamento, fornecedores com sistemas de produção JIT garantem a segurança das entregas na

origem do processo de fornecimento, ou seja, dentro de sua própria empresa. Eles sabem que os

clientes dependem exclusivamente de suas entregas, e que um problema para o cliente é um

problema para eles próprios. Antes que um problema interno do fornecedor venha a atrapalhar o

cronograma de recebimento do cliente, ele deve ser identificado e solucionado a tempo. A

explicação de que deve-se manter mais de um fornecedor para absorver eventuais catástrofes, é

apenas mais uma desculpa para não se promover um sistema logístico eficiente. Hutchins

(HUTCHINS, 1993 : 26), ao relatar uma visita a fábrica da Toyota Motors no Japão (país sujeito a

inúmeras catástrofes climáticas), descreve que apesar do uso de fornecedores exclusivos num

período de nove anos ocorreram apenas duas paralisações, de pouca importância, na linha de

montagem da fábrica.

Por outro lado, analisando-se todas as atividades envolvidas no processo de reposição, pode-

se ver que o custo unitário dos itens comprados é apenas um dos componentes do custo total do

Page 129: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

121

processo, e que na maioria das vezes uma pequena redução no seu valor, via processo de

concorrência, não justifica a política de múltiplas fontes de fornecimento. Dessa forma os sistemas

de produção JIT buscam reduzir aquelas atividades especulativas que não agregam valor aos

produtos, trocando-as pela garantia do serviço de poucos e bons fornecedores. Quando as empresas

reduzem sua base de fornecedores, as relações tornam-se de longo prazo e os seguintes resultados

podem ser atingidos:

ganho de escala: fornecedores exclusivos venderão volumes maiores, e os

transportadores movimentarão volumes maiores, para um número menor de clientes, o

que reduzirá seus custos internos de ferramental, fabricação, movimentação e controle;

retorno dos investimentos: tendo a certeza de que o relacionamento com os clientes

será de longo prazo em substituição às eventuais ordens de compra de curto prazo, os

fornecedores se sentirão mais seguros e poderão investir eles próprios em um sistema de

produção JIT, de maneira a torná-lo mais confiável;

difusão dos conhecimentos e transferência de tecnologias: com o fortalecimento das

relações de longo prazo os fornecedores exclusivos poderão receber treinamento

específicos nas técnicas JIT, informações antecipadas para planejamento da produção, e,

se necessário, até ajuda financeira para investimentos produtivos. Pode-se implementar de

forma efetiva o conceito de engenharia simultânea, com a participação do fornecedor nas

etapas de projeto de novos produtos. Por exemplo, algumas empresas, como a Moto

Honda, possuem escolas específicas para o treinamento e a formação de fornecedores JIT;

processos focalizados: com uma visão de longo prazo, os fornecedores poderão

deslocar suas fábricas, ou parte delas, para perto dos clientes, estabelecendo pequenas

fábricas focalizadas de acordo com as necessidades específicas de cada um deles. Isso

permitirá a implementação de um ritmo regular diário, ou menor, de entregas fazendo

com que os encargos de transporte e embalagens sejam mínimos e as soluções de

problemas mais imediatas, reagindo melhor a emergências;

coordenação de entregas: os fretes poderão ser melhor coordenado pelos clientes,

gerando roteiros envolvendo vários fornecedores, de forma a viabilizar a entrega

econômica de pequenos lotes pelos transportadores, mesmo não existindo a proximidade

física entre os fornecedores.

Um exemplo dessa relação avançada de longo prazo com redução do número de

fornecedores foi o implementado pela Fiat Automóveis, que desde 1992 tornou exclusivo o seu

fornecedor de sistemas de comando de câmbio, negociando a sua transferência da cidade de São

Bernardo do Campo (SP) para Contagem (MG), cidade vizinha a montadora. Com essa estratégia, o

fornecedor passou a despachar as 107 peças que compõem o comando de câmbio já montadas, em

duas ou até três entregas diárias, e, em contra partida, a receber também pagamentos diários. O

mesmo ocorreu com a Santa Marina que tornou-se o principal fabricante dos vidros dos carros da

FIAT, localizando-se junto à montadora e abastecendo-a diariamente com pequenos lotes,

transportados em camionetas Fiorino onde lê-se “Entregas JIT” pintado nas laterais.

7.4 INTEGRAÇÃO DA PRODUÇÃO DO CLIENTE COM O FORNECEDOR

A implantação de um sistema logístico JIT integrando a produção do cliente com a produção

do fornecedor traz ganhos significativos na redução daquelas atividades que, convencionalmente, se

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A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

122

sobrepõem entre os dois sistemas, fazendo com que a cadeia produtiva consiga um retorno sobre

seus investimentos maior do que conseguiria cada empresa individualmente. Esse processo resulta

numa sinergia entre as empresas, reforçando ainda mais as suas relações. Dentre os vários sistemas

que podem ser implantados nesse sentido, cabe destacar os seguintes: planejamento e programação

da produção conjuntos, kanban com fornecedores, troca eletrônica de documentos (EDI), pedidos

em aberto, redução das funções de expedição/recepção, contabilidade simplificada e engenharia

simultânea.

7.4.1 Planejamento e programação da produção conjuntos

No capítulo 3 foram discutidas as questões relacionadas com as funções de planejamento e

controle da produção dentro da ótica dos sistemas de produção JIT. Conforme foi visto, essas

funções estão escalonadas no tempo em longo, médio e curto prazo. As informações de longo prazo

são empregadas para equacionar estrategicamente a capacidade produtiva do sistema com a

demanda esperada para esse período. As informações de médio prazo são utilizadas para compor um

plano-mestre de produtos acabados que, na sua parte fixa, dá partida à montagem dos produtos, e,

na sua parte flexível, permite o cálculo dos tempos de ciclo e dos estoques do sistema. As

informações de curto prazo, dentro da ótica de puxar a produção, permitem que os vários postos

produtivos se comuniquem entre si, e tornem operacional o sistema de produção just-in-time.

Um dos pontos cruciais para que o planejamento e controle da produção JIT possa atuar

dentro dessa estrutura de forma efetiva, está baseado na estabilidade da demanda do cliente desse

sistema produtivo. Contudo, quando olha-se para uma cadeia produtiva JIT, pode-se afirmar que o

único ponto da cadeia onde existem incertezas quanto a demanda, está a nível de cliente final dessa

cadeia. A partir da definição dos planos estratégicos, táticos e operacional da empresa que lida com

esse cliente final, todas as demais empresas da cadeia podem receber informações confiáveis de

longo, médio e curto prazo de seus clientes, de forma a realizarem um planejamento e programação

da produção coordenado.

?

Plano de Produção ?

Plano-mestre de Produção ?

ProgramaçãoProgramação

Plano de Produção ?

Plano-mestre de Produção ?

Plano de Produção ?

Plano-mestre de Produção ?

?ProgramaçãoProgramação

Cadeia produtiva convencional

Cadeia produtiva JIT

Plano de Produção !

Plano-mestre de Produção!

Plano de Produção !

Plano-mestre de Produção!

Plano de Produção !

Plano-mestre de Produção!

Page 131: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

123

Figura 7.4 O PCP nas cadeias produtivas.

Assim, como ilustra a Figura 7.4, ao invés de cada empresa dentro de uma cadeia produtiva

convencional fazer seus próprios planos e programações em cima do que ela prevê que seu cliente

vá necessitar, na cadeia JIT os planos de produção estratégicos, os planos-mestres de produção e a

programação puxada da produção são compartilhados entre todos os participantes, evitando-se

atividades especulativas que não agregam valor ao cliente final. Dessa forma, quando uma empresa

projeta um aumento, ou uma redução, de capacidade produtiva imediatamente os fornecedores

seguirão na mesma direção.

7.4.2 Kanban com Fornecedores

No relacionamento de curto prazo entre clientes e fornecedores o emprego do sistema

kanban de puxar as compras irá desburocratizar e simplificar em muito toda a lógica de reposição

externa de materiais. Conforme foi explicado no capítulo 4, o sistema kanban atua como o

organizador do sistema de produção JIT, direcionando os materiais justo a tempo para as estações

de trabalho no processo de fabricação e passando informações sobre o que e quanto produzir e

movimentar. Ao contrário do sistema convencional, a produção JIT utiliza o sistema de puxar.

Puxar significa não processar ou movimentar até a solicitação, isto é sob pedido. O sistema de puxar

consiste em retirar e movimentar as peças necessárias do processo precedente, iniciando o ciclo na

linha de montagem final, pois é aqui que chegam com exatidão as informações de tempo e

quantidades de peças para satisfazer às demandas reais. O processo anterior, então, produz somente

as peças retiradas pelo processo subseqüente, e assim, cada estágio de fabricação retira as peças

necessárias dos processos anteriores ao longo do sistema de produção. Desse modo não é necessária

a emissão da programação simultânea para todos os processos, incluindo os fornecedores externos.

Em seu lugar é suficiente que a linha de montagem final seja informada das alterações na

programação da produção para que todo o sistema responda adequadamente.

O kanban externo com fornecedores é um tipo especial de kanban de movimentação usado

para trazer peças e materiais dos fornecedores de forma simples e eficiente. Para que o sistema

kanban com fornecedores atinja sua eficiência plena, é indispensável que o fornecedor sincronize

seu sistema produtivo com o do cliente. Nesse sentido, a operacionalização do kanban com

fornecedores necessita que o sistema produtivo do cliente passe dois tipos de informações ao

sistema produtivo do fornecedor, quais sejam:

plano-mestre de produção: com as informações constantes do plano-mestre de produção

do cliente é possível ao fornecedor elaborar seu próprio plano-mestre de produção de

forma a organizar sua estrutura produtiva (tempo de ciclo) e dimensionar seu sistema

interno de puxar a produção (kanbans), preparando-se para a demanda que virá;

solicitação diária: dentro da ótica de puxar a produção, diariamente o cliente faz suas

solicitações ao fornecedor, especificando exatamente os itens necessários naquele

momento. Esse processo de solicitação diária pode ser executado via cartões kanbans de

fornecedores, também chamado de sistema de reabastecimento posterior, já descrito em

detalhes no capítulo 4, ou via envio diário de uma tabela contendo as necessidades de

itens a serem entregues naquele dia, chamado de sistema de retirada seqüencial.

Page 132: A produtividade-no-chao-de-fabrica

A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

124

O sistema de retirada seqüencial, exemplificado na Figura 7.5, representa um estágio

avançado de implantação do JIT entre clientes e fornecedores. No sistema de retirada seqüencial o

cliente utiliza o computador para comunicar ao fornecedor a seqüência e as quantidades de peças

que são necessárias para sua linha de produção diária. Essa seqüência de informação ingressa em

um banco de dados e é impressa em etiquetas kanbans que especificam os detalhes necessários para

sua produção na fábrica fornecedora e seu posterior envio para o cliente. Nesse sistema, a empresa

envia diariamente a programação seqüencial da sua produção ao computador da fábrica fornecedora

para alimentar o sistema de programação da produção de componentes que serão enviados à linha

de montagem. O sistema calcula o programa de montagem final, fornece os relatórios necessários e

imprime as etiquetas kanbans que serão entregues à linha de produção do fornecedor. O objetivo

final é a sincronização das atividades entre as operações nas linhas de montagem do fornecedor e do

cliente, de tal maneira que a comunicação e o transporte dos itens seja efetivamente em tempo e

conteúdo reais, na freqüência necessária.

Tipo de informação Cliente Fornecedor

Programa-mestre

de Produção

Programa

Montagem Final

Programa-mestre

de Produção

Programa de Montagem

Final ( Seqüencial )

Programa de Vendas

Computador

Programação da

produção

Linha de montagem Linha de montagem

Tabela de

programação

montagem final

Informação Mensal

para o planejamento

da produção mensal

Informação Diária

para o envio da

produção diária

fluxo da informação

fluxo dos produtos

Figura 7.5 Sistema de retirada seqüencial.

A Wolkswagem do Brasil, na planta de Taubaté (SP), utiliza esses dois sistemas de puxar as

reposições dos fornecedores. Para fornecedores situados a mais de 20 quilômetros da empresa é

empregado um sistema de reabastecimento posterior, informando diariamente via fax quais itens

foram consumidos e necessitam de reposição. Os fornecedores então preparam a carga, vão até a

empresa, onde têm acesso livre, descarregam o material no depósito ou diretamente no ponto de uso

Page 133: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

125

trocando uma embalagem cheia por outra vazia. Já os fornecedores situados a menos de 20

quilômetros da empresa estão conectados ao sistema computacional de programação de veículos,

permitindo que os mesmos acompanhem a fabricação de cada carro na funilaria, e fiquem sabendo

exatamente o tipo de carro que está sendo fabricado, o seu acabamento, cor e do que mais ele vai

precisar. Com essas informações os fornecedores podem preparar sua carga para ser entregue

diretamente ao ponto de uso dentro da montadora. A freqüência média de entregas nesse sistema é

de 20 minutos. Tanto os fornecedores distantes como os próximos, recebem um pedido mensal para

planejamento.

7.4.3 Troca eletrônica de documentos (EDI)

Dentro de um relacionamento JIT há necessidade de melhorar o fluxo de informações entre

os participantes da cadeia produtiva, tanto a nível de velocidade como de confiabilidade dos dados

trocados. Nesse sentido, a troca eletrônica de documentos, ou EDI (electronic data interchange),

apresenta-se como uma ferramenta fundamental para conectar eficientemente os elos dessa cadeia.

O EDI é uma tecnologia baseada em plataformas de hardware e software que permite a troca de

documentos de negócios (faturas, duplicatas, pedidos de compras, avisos de despacho, kanbans etc.)

eletronicamente e de forma padronizada entre duas empresas distintas, situadas em diferentes locais.

O EDI reduz o fluxo de papéis, diminui a necessidade de conferências e manipulações de

documentos, simplifica os controles e padroniza os processos de entrada e saída de documentos,

garantindo a integridade dos dados. Com o EDI o fornecedor programa a entrega dos itens, enviando

ao transportador os dados da nota fiscal, e esse, por sua vez, emite o conhecimento da carga e a

fatura de cobrança pelo serviço. Na outra ponta do processo, o cliente receberá via EDI as

informações dos itens a serem entregues, acelerando em até seis horas o tempo parado de um

caminhão no pátio da empresa à espera de que seja elaborada a documentação fiscal.

Além da agilização da documentação necessária à transação de cargas entre empresas, o EDI

pode ser empregado para ligar diretamente o programa de produção do cliente aos programas de

embarque dos fornecedores e transportadores, permitindo a entrega de materiais seqüenciados de

acordo com as necessidades atuais do cliente, conforme exposto no tópico anterior.

Outra vantagem que pode-se obter com o emprego dessa tecnologia de comunicação,

agregando-a à um sistema de localização via satélite GPS (global positioning system), é permitir o

uso do conceito de “estoques sobre rodas”, onde cada caminhão que se movimenta entre o cliente e

o fornecedor é inventariado como estoques em mãos, pois seus dados, tanto de conhecimento da

carga como de previsão de partida e chegada, são precisos e monitorados a cada momento.

Com o avanço dos serviços oferecidos pela Internet, melhorando as condições de acesso ao

sistema, e, através da criptografia, a privacidade e segurança dos dados, será possível formar as

chamadas Extranets, ou redes de caracter fechado para uma cadeia produtiva, conectando

fornecedores e clientes em um ambiente mais interativo e amigável do que os atuais sistemas EDI.

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A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

126

7.4.4 Pedidos em aberto

Quando o cliente passa a trabalhar com fornecedores exclusivos com contratos de longo

prazo e fábricas focalizadas junto a sua, o antigo sistema de emissão de pedidos de compras para

cada reposição de itens deverá ser abandonado em prol da compra de determinada capacidade

produtiva do fornecedor. Na verdade, ao olhar-se para a quantidade de trabalho do setor de compras

que envolve a elaboração de pedidos de compra, com especificações enviadas aos diversos

fornecedores, tomada de preços, análises de desempenho etc., além, é claro, da papelada gerada,

nota-se que esse processo já deveria estar erradicado a mais tempo.

Com contratos de longo prazo garantindo a parceria e estabelecendo critérios para a cotação

do preço dos itens negociados (pode-se empregar a técnica de análise de valor para isso), o cliente

necessita definir no contrato apenas a compra de uma determinada capacidade de produção da

fábrica (focalizada) do fornecedor. Até porque ele não sabe exatamente ainda quais os itens que irá

consumir daqui a um ou dois anos. Nesse sentido, o bom senso manda reservar uma capacidade do

fornecedor e deixar os pedidos em aberto, para serem estabelecidos a medida em que a demanda for

se tornando mais clara para o cliente.

A estrutura conjunta de planejamento e programação da produção cliente/fornecedor,

discutida anteriormente, trabalha nesse sentido. As informações são escalonadas em horizontes de

tempo, sendo que as de longo prazo servem para se fechar os contratos de parcerias, sincronizando-

se as capacidades de produção das duas fábricas. No curto prazo, com a definição de quais os

produtos que serão efetivamente montados no sistema produtivo do cliente, os fornecedores

receberão automaticamente o pedido de compra, via sistema kanban.

7.4.5 Redução das funções de expedição/recepção

Com a implantação de sistemas logísticos de reposição em pequenos lotes, o fluxo de

movimentações de materiais entre as instalações do fornecedor e do cliente será bem maior. Isso irá

gerar a necessidade de agilizar as funções de expedição por parte do fornecedor, e a recepção por

parte do cliente. Perdas de oito horas para a carga e descarga dos caminhões inviabilizarão essa

forma avançada de relacionamento JIT. Na Toyota Motors de Nagóia, no Japão, a distância média

dos fornecedores é de 27 quilômetros, com um fluxo de entregas de 7,4 vezes por dia, sendo que

30% dessas entregas são de hora em hora. Para se chegar a esse patamar de excelência, um esforço

conjunto entre fornecedor e cliente deve ser feito na redução das funções de expedição e recepção

dos lotes de entrega.

Analisando-se essas funções desenvolvidas pelos setores de expedição e recepção de

empresas convencionais pode-se entender melhor a quantidade de atividades, e custos,

desnecessários sujeitos à simplificações ou até eliminações. Na realidade o desperdício inicia-se na

fábrica do fornecedor com a própria operação de produção dos itens. O operador da máquina, ao ir

fabricando os itens de um lote, coloca-os, um a um, dentro de um enorme contenedor, com

sucessivos esforços para inclinar-se para dentro do contenedor e levantar-se de volta, sem contar a

eventual inclusão de folhas de papelão entre as várias camadas de itens no contenedor. Terminado o

preenchimento do contenedor, há necessidade de esperar que uma empilhadeira venha até ele e,

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Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

127

transportando o contenedor para o distante almoxarifado de produtos acabados, libere o espaço para

a colocação de outro grande contenedor vazio.

A partir desse ponto o setor de expedição, que atua dentro do almoxarifado de produtos

acabados, assume o controle sobre esse contenedor. Os itens são então retirados do contenedor

interno da fábrica, contados, inspecionados e preparados junto com a documentação para a entrega

em embalagens de papelão. É comum essas embalagens de papelão conterem divisórias protetoras

que necessitam ser montadas antes da colocação dos itens. Finalizando o processo da expedição,

uma empilhadeira se encarrega de colocar as caixas prontas nos caminhões para o transporte até o

cliente. Não é raro nesse fluxo de atividades convencionais o caminhão ainda ser retido na portaria

da empresa para conferência da documentação e da carga.

Na outra ponta, todas as atividades que foram realizadas para a expedição dos itens na

fábrica do fornecedor são repetidas pelo setor de recepção na fábrica do cliente. Inicia-se pela

retenção do caminhão na portaria da fábrica para a conferência superficial da carga e da

documentação enviada. Autorizado, o caminhão encosta na doca de recepção e, com o auxílio de

empilhadeiras, é descarregado. A função do setor de recepção consiste em desfazer as embalagens,

contar, inspecionar e preparar os itens, junto com a documentação, para serem armazenados no

almoxarifado em grandes contenedores de uso interno da fábrica. Empilhadeiras se encarregam de

deslocar esses contenedores cheios para o local de armazenagem, onde ficam aguardando sua

solicitação, via PCP, para consumo na produção. Os desperdícios só terminam quando, dentro do

sistema produtivo do cliente, uma empilhadeira movimenta para junto do posto de trabalho esse

grande lote de materiais, que exigirá do operador muito esforço indevido com a coleta dos itens no

interior do contenedor.

Conforme pode-se ver, nesse processo de reposição convencional muitas atividades são

executas sem adicionar valor para o cliente final. Movimentos perdidos, dupla conferência,

contagem e inspeção, embalagens desperdiçadas, empilhadeiras e seus operadores acionados etc.

Todos esses pontos falhos decorrem de duas características dos sistemas de produção

convencionais, quais sejam, a desconfiança mútua devido ao baixo nível de relacionamento

cliente/fornecedor, e grandes lotes de fabricação e movimentação em função dos altos custos de

preparação dos operações. Com a mudança de mentalidade para relações de longo prazo entre

clientes e fornecedores, baseada no comprometimento e confiança mútua, e com a implantação de

técnicas JIT que favoreçam a produção em pequenos lotes, é possível simplificar toda a lógica de

expedição e recepção de itens entre as duas empresas, eliminando-se uma série de atividades.

A simplificação começa dentro do sistema produtivo do fornecedor, com o operador

produzindo apenas as necessidades imediatas do cliente e colocando-as em pequenos contenedores

padronizados para os dois sistemas, de onde os itens sairão apenas quando estiverem no sistema

produtivo do cliente. Como os contenedores são pequenos, pode-se empilhá-los em carrinhos e

deslocá-los facilmente para a expedição, sem a necessidade de empilhadeiras. Na expedição os

pequenos lotes padrões são conferidos de forma simples e rapidamente despachados para o cliente.

A documentação pode estar restrita aos cartões kanbans. Com relações de longo prazo, tanto a

portaria do fornecedor como a do cliente estão autorizadas a deixar passar livremente os

transportadores que fazem parte das entregas JIT. As empresas pintam seus caminhões com

indicações do tipo “Entregas JIT” para facilitar a identificação. Chegando a doca do cliente, a

recepção se encarrega simplesmente de retirar a carga do caminhão e deslocá-la imediatamente para

o seu ponto de uso dentro do sistema produtivo, onde os itens são então retirados para produção.

Page 136: A produtividade-no-chao-de-fabrica

A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

128

7.4.6 Contabilidade simplificada

Assim como nas atividades de expedição e recepção dos itens transacionados entre

fornecedores e clientes, a aplicação da filosofia JIT/TQC proporciona também a oportunidade de

rever as atividades contábeis dos setores de contas a receber (fornecedor) e contas a pagar (cliente).

O esquema tradicional contábil envolvendo a conciliação de faturas, notas fiscais, pedidos de

compras e relatórios de recebimento para autorizar o pagamento dos fornecedores não se tornará

viável quando os ritmos de entrega passarem de mensais para diários. Essa teoria tradicional de

contabilidade está baseada no fato de que apenas parte dos itens comprados serão utilizados

imediatamente, ficando o restante deles no almoxarifado. Dessa forma é necessário que o setor de

contas a pagar do cliente verifique se efetivamente o fornecedor entregou os itens constantes da

fatura remetida pelo setor de contas a receber do fornecedor, e se esse fato está de acordo com o

pedido de compras enviado e a nota fiscal recebida. O fluxo de informações fica ainda mais moroso

levando-se em conta o nível de desconfiança entre as partes evolvidas, fazendo com que o cheque

para pagamento seja retardado ao máximo.

Com lead times curtos e níveis mínimos de estoques padronizados nos supermercados

internos, no sistema produtivo JIT os itens comprados são imediatamente transformados em

produtos acabados. Sendo assim, a contabilidade dos itens comprados pode ser feita considerando-

se que o sistema produtivo JIT é uma “caixa preta”, na qual foi adicionado um número “x” de itens

comprados para cada produto acabado completado. Ou seja se um automóvel ficou pronto é lógico

que cinco pneus, uma bateria, dois pára-choques etc. foram comprados e devem ser pagos aos seus

fornecedores. Dessa forma, os fornecedores exclusivos podem ser pagos conforme a produção for se

desenvolvendo. A conferência e conciliação dos documentos, senão eliminadas, serão reduzidas a

simples comparação entre o que foi produzido e o que está sendo solicitado (fatura) pelo fornecedor,

providenciando-se um fluxo rápido, talvez semanal, de pagamentos.

Uma vantagem adicional do uso do conceito de pagamento conforme a produção, por só

autorizar o pagamento dos fornecedores quando os itens entregues forem efetivamente utilizados,

está no fato dele limitar a entrada de itens em estoques e impor mais responsabilidade sobre os

setores de compra do cliente, e vendas do fornecedor, no sentido de somente pedir e entregar os

itens no ritmo da demanda.

Nas situações onde pretende-se manter os controles de pagamento de acordo com as

entregas, o emprego de códigos de barras nos cartões kanbans agilizará o processo de conferência e

pagamento. Ao chegarem os itens comprados na recepção, o cartão kanban será lido

eletronicamente e suas informações atualizarão o recebimento dos itens nos registros físicos e

financeiros do sistema de informações. Atualizado, o sistema computacional do setor financeiro

poderá então checar o recebimento com as informações vindas do fornecedor, que também poderão

ser eletrônicas, e providenciar a transferência do dinheiro no banco, diretamente da sua conta para a

do fornecedor. Os extratos de movimentação das contas do cliente e do fornecedor servirão como

comprovação da transação.

Page 137: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

129

7.4.7 Engenharia simultânea

A engenharia simultânea consiste em desenvolver o projeto de novos produtos com a

participação de todos os interessados nesse projeto, incluindo-se os fornecedores. Essa idéia surgiu

da constatação de que além dos projetistas habituais do departamento de engenharia, os

fornecedores, produtores e clientes devem ser ouvidos simultaneamente à etapa de projeto para

contribuírem com sugestões que irão aperfeiçoar o fornecimento de itens, a técnica de produção e o

uso do produto.

Nos sistemas convencionais o projeto de novos produtos é feito segundo etapas distintas,

separadas por “muros”, onde em cada uma delas a responsabilidade pela definição dos parâmetros

do projeto fica restrita a determinada área da empresa. Por exemplo, quando a engenharia do

produto conclui o desenho e define as características técnicas do produto, ela passa seus planos para

a engenharia do processo que, a partir daí, está encarregada de estabelecer, dentre as várias

alternativas, a forma como esse produto será fabricado, especificando o ferramental, as seqüências

de fabricação, as folhas de processo etc. Nesse esquema, o baixo relacionamento entre as partes

envolvidas faz com que inevitavelmente problemas ocorram na implantação do projeto.

Com a introdução de novas tecnologias computacionais, do tipo CAE (engenharia auxiliada

por computador), CAD (projeto auxiliado por computador) e CAPP (planejamento do processo

auxiliado por computador), é possível padronizar e agilizar o fluxo de informações no projeto de

produtos de forma a romper essas barreiras departamentais. Os projetos podem agora ser tratados de

forma global, compartilhando-se informações. Nesse aspecto, os fornecedores JIT devem ser

chamados a participar da discussão, principalmente no que se refere a gerar idéias que venham a

trazer ganhos de produtividade em suas próprios fábricas, que serão repassados ao cliente final da

cadeia produtiva.

Fica difícil para um fornecedor melhorar seu sistema produtivo quando os seus clientes lhe

passam projetos prontos, sem margem para discussão. Com a engenharia simultânea, os

fornecedores podem atuar em cima de um produto em desenvolvimento, questionando os tipos de

matérias-primas propostas, as diferentes formas de fabricação, ou ainda, como e onde seu produto

entra no produto do cliente e que características são fundamentais para sua atuação correta. Na

maioria das vezes é mais fácil adaptar o projeto do cliente as condições de fabricabilidade do

fornecedor, do que exigir que um fornecedor altere seu processo produtivo para atender determinado

projeto.

7.5 PARTICIPAÇÃO DOS TRANSPORTADORES NO PROCESSO DE PARCERIAS

Até o momento tratou-se de questões do relacionamento genérico JIT entre fornecedores e

clientes. Agora nesse tópico serão tratadas algumas questões específicas relacionadas com as

empresas transportadoras, considerando-as como fornecedoras de serviço de transporte dentro da

cadeia produtiva. Conforme já foi colocado para os fornecedores, também no caso dos

transportadores a busca pela confiabilidade no relacionamento de longo prazo se dá através da

redução do seu número. Com a exclusividade do fornecimento, espera-se que os transportadores

assumam novas responsabilidades, entre as quais:

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A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

130

aumento da freqüência das entregas;

redução de tamanhos e padronização dos lotes transportados;

compromisso pela qualidade;

garantia e confiabilidade de prazos;

envolvimento em atividades internas do cliente (por exemplo: kanban e armazenagem

temporária); entre outras.

Com a redução dos estoques nas empresas, pela fabricação e movimentação de pequenos

lotes, há necessidade de deslocá-los rapidamente entre os vários pontos da cadeia produtiva. Espera-

se que os transportadores agilizem seus meios de transporte, garantindo este fluxo contínuo entre as

empresas. Com o aumento das freqüências de entrega de pequenos lotes padronizados, novos

veículos serão necessários para agilizar o embarque e desembarque das cargas, e novos

procedimentos de recepção e inspeção das cargas terão que ser desenvolvidos. Por exemplo, os

caminhões com carregamento lateral e as docas com altura de piso equivalente ao caminhão

permitem acesso rápido à carga.

A responsabilidade pela qualidade da carga transportada, que convencionalmente era

mínima, passa a ter um fator determinante dado à eliminação dos estoques de segurança dentro da

logística de reabastecimento. Logo, desde o momento em que a transportadora é chamada a intervir

no processo de suprimentos, até a entrega dos produtos ao consumidor final, a responsabilidade pela

qualidade das cargas movimentadas é do transportador. A carga pode inclusive passar por um

processo de armazenagem temporária, em um entreposto do transportador, aumentando ainda mais

sua responsabilidade.

Não só a qualidade em si pela integridade física da carga é solicitada pelo cliente. Ele espera

muito mais do serviço do transportador. Espera ênfase na “qualidade total” do transporte, ou seja,

que a carga chegue ao local de destino dentro do cronograma de prazos e quantidades estabelecidos.

A eficiência produtiva do cliente depende do compromisso do transportador em atender aos

requisitos de um transporte e entrega eficientes.

Ao se relacionar em bases que estimulam a confiança mútua entre as partes, os clientes

delegarão uma grande gama de atividades, que antes eram exclusividade do pessoal interno, para os

transportadores. O sistema de puxar a programação da produção e estoques via kanban exige que o

transportador execute atividades internas dos clientes e fornecedores, envolvendo-se na

programação e controle dos estoques. O emprego de tecnologia de troca eletrônica de documentos

(EDI) faz com que o transportador tenha conhecimento, e lide no seu dia a dia, com padrões de

informações e decisões que antes eram exclusivas do cliente. A própria armazenagem temporária

das cargas pode ser delegada aos transportadores, no sentido de racionalizar e agilizar a logística da

cadeia produtiva. Sendo assim, o perfil exigido das empresas transportadoras envolvidas no

processo de reabastecimento produtivo mudou radicalmente.

A melhora no relacionamento entre transportadores e clientes trás como conseqüência direta

um incremento de produtividade na cadeia como um todo, vindo a beneficiar o consumidor final,

que ao ser bem atendido nas suas necessidades, não só retorna para novas compras, como divulga a

outros clientes em potencial sua experiência. Isto faz com que as vendas se sustentem e se

expandam, garantindo a sobrevivência dos participantes da cadeia.

Além dessas questões globais, o relacionamento JIT com seus clientes trás para os

transportadores algumas vantagens específicas, que podem ser agrupadas segundos três tópicos:

Page 139: A produtividade-no-chao-de-fabrica

Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

131

vantagens associadas à redução das incertezas;

vantagens associadas à exclusividade de transporte;

vantagens relacionadas à padronização das cargas.

Vantagens associadas à redução das incertezas: em um relacionamento JIT entre clientes

e transportadores procuram-se relações duradouras, com contratos de parceria de longo prazo. Isto

trás um grau maior de confiança e expectativas quanto ao futuro das empresas. O crescimento do

cliente corresponde a um aumento do fluxo de materiais, e consequentemente, ao aumento dos

negócios da transportadora. Dessa forma a transportadora tem condições, até com a ajuda financeira

do cliente, de investir melhor em seu sistema de transporte com base em previsões realísticas sobre

o futuro de seu negócio, e o retorno sobre os investimentos pode ser equacionado para um período

maior.

Olhando para o dia a dia da empresa transportadora, a redução das incertezas com o

estabelecimento de um programa firme de movimentações de itens, menos sujeito à cancelamentos

de última hora, acarretará em melhores dimensionamentos de cargas e veículos, aumentando a

eficiência do sistema de transporte e reduzindo seus custos diretos. Outra vantagem importante para

o transportador no relacionamento de longo prazo, diz respeito a possibilidade de planejar com

diferentes clientes um esquema de fretamento coletivo, dentro do qual o transporte de pequenas

cargas se torne economicamente viável, podendo esse fato representar um diferencial importante

para que um cliente decida pela escolha da transportadora em relação à concorrência.

Resumidamente, pode-se dizer que a redução das incertezas no relacionamento com clientes JIT

permite:

maior segurança nos investimentos futuros;

melhor desempenho atual da frota;

coordenação para o fretamento coletivo.

Vantagens associadas à exclusividade de transporte: quando os contratos são firmados

em bases JIT, o transportador terá exclusividade no transporte de determinada carga de itens entre

fornecedor e cliente. Junto com a exclusividade vem o aumento nos volumes movimentados. Onde

antes três, ou quatro, transportadoras dividiam as movimentações, agora apenas uma empresa

assume a responsabilidade total pela carga. O aumento da quantidade transportada permite a

redução dos custos diretos de transporte. Além de reduções de custo, o simples fato de existirem

menos contratos a serem negociados com os clientes, numa freqüência menor, faz com que os

custos indiretos de administração (não agregam valor aos produtos) sejam bastante otimizados.

Também, com a exclusividade de fornecimento, a papelada necessária e as conferências de cargas,

tanto na busca como na entrega dos materiais, podem ser reduzidas, ou até eliminadas.

A exclusividade de fornecimento dos serviços com o aumento dos volumes transportados

permite que o transportador tenha um lucro maior e duradouro, facilitando o investimento em

melhorias para a prestação do serviço como um todo. Por exemplo, sob esta perspectiva, fica

interessante ao transportador investir em sistemas de acompanhamento de carga (GPS), ou em EDI,

ou ainda em automatizar o embarque e desembarque das mercadorias. A aquisição de novas

tecnologias também exige o treinamento da mão-de-obra envolvida no sistema, o que deve ser visto

como um investimento de longo prazo.

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A Cadeia Logística JIT

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

132

Outra vantagem para o transportador advinda da exclusividade é a possibilidade de receber

apoio técnico do cliente que está interessado em aumentar a eficiência de sua cadeia produtiva.

Todo o conhecimento do cliente em armazenar e movimentar determinado item pode ser transferido

para o transportador, fazendo com que o transportador se torne um especialista no assunto, e possa,

por sua vez, utilizar essa experiência para ampliar seu mercado com outros clientes. Além disso,

com a exclusividade para o transporte e o desenvolvimento de excelência nas operações, é bem

provável que o cliente ao expandir os seus negócios considere a possibilidade de ampliar os itens

sob responsabilidade da transportadora, dando-lhe prioridade nos novos contratos de movimentação

de cargas.

Uma vantagem adicional, que pode ser explorada pelo transportador, consiste em propor

sugestões que visem um ganho de produtividade comum, reduzindo custos conjuntos. Por exemplo,

o transportador pode sugerir uma forma mais eficiente de desembarque de mercadorias para o

cliente. Ganha o cliente na agilidade do serviço e ganha o transportador com a liberação do

caminhão em curto espaço de tempo. Isto só é possível quando existem objetivos JIT de longo prazo

comuns entre clientes e transportadores. Sintetizando, pode-se dizer que os ganhos do transportador

por ter exclusividade de transporte no relacionamento JIT com clientes, reduzindo os custos totais

do sistema, são:

aumento dos volumes contratados;

poucos contratos a negociar, com baixa freqüência;

redução da quantidade de papéis e conferências;

lucro consistente no longo prazo;

transferência de conhecimento do cliente;

prioridade em conquistar novos contratos;

possibilidade de sugerir melhoramentos.

Vantagens relacionadas à padronização das cargas: existe ainda um terceiro grupo de

vantagens que podem ser obtidas pelos transportadores relacionadas à padronização das cargas. O

princípio da organização e simplicidade apregoado pela filosofia JIT/TQC faz com que os materiais

movimentados e armazenados pela cadeia produtiva estejam acondicionados em embalagens, ou

contenedores, padrões. O sistema kanban é o exemplo mais conhecido. Olhando sob o ponto de

vista dos transportes de cargas entre empresas, o fato de ter-se cargas padronizadas para transportar

permite um melhor arranjo físico da carga no meio de transporte escolhido, aumentando sua

eficiência e permitindo, em algumas situações, o compartilhamento dos espaços disponíveis para

transporte entre cargas distintas.

Outra conseqüência direta da padronização das cargas é o aumento da velocidade de

carregamento e descarregamento das mesmas nos pontos de coleta e entrega dos itens. Como a

carga é movimentada em blocos padrões, pode-se acelerar o processo pelo emprego de automação

industrial. Também a contagem e conferência da carga, necessária nesses momentos, é simplificada.

Dentro do princípio de que sempre existe uma quantidade padrão dentro do contenedor, conta-se e

confere-se apenas o contenedor, e não sua carga individual. Admite-se dentro do JIT, que se cada

operador executou sua atividade corretamente, não tem porquê incorrer em custos desnecessários

repetindo-a. Logo, se o fornecedor colocou a quantidade certa, na qualidade certa, dentro do

contenedor certo, e, por sua vez, o transportador movimentou a carga corretamente, não há

necessidade dessas atividades serem repetidas nas instalações do cliente quando a entrega chega. É

o conceito de qualidade total assegurada na fonte.

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Capítulo 7

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

133

Finalmente, a padronização das cargas e a redução dos níveis de estoques dentro do sistema,

permitirão uma contabilização mais simples e rápida dos volumes movimentados, podendo o

transportador se beneficiar com a agilização dos pagamentos devidos pelas cargas movimentadas.

Resumindo, as seguintes oportunidades podem ser conquistadas pelas empresas transportadoras em

função do manuseio e transporte de cargas padronizadas:

melhor aproveitamento do meio de transporte;

aumento da eficiência no carregamento e descarregamento das cargas;

garantia da qualidade com menores custos;

eliminação de contagens e conferências individuais;

contabilização mais simples baseada em cargas padronizadas.

A implementação de uma cadeia logística JIT traz benefícios para todos os participantes

dessa cadeia. Com a eliminação das ineficiências internas de cada sistema produtivo e externas no

relacionamento entre as empresas, ganham os fornecedores, os clientes e os transportadores. Porém,

a maior vantagem que uma empresa pode tirar desse relacionamento é a busca pelo melhoramento

contínuo, que leva a fixação de uma imagem de empresa empreendedora e eficiente. Essa imagem

positiva é a chave para a conquista de novos clientes e a liderança do mercado.

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Referências Bibliográficas

Sistemas de Produção

A Produtividade no Chão de Fábrica

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