As narrativas sobre as origens da crise e suas implicações - Ricardo Paes Mamede

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As narrativas sobre as origens da crise e suas implicações (ontem, 24 de julho de 2014, em Loulé)

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Os desafios estruturais da economia portuguesa

Ricardo Paes Mamede ISCTE-IUL

Quatro narrativas sobre as origens crise

1. “Andámos a viver acima das nossas possibilidades”

2. “Não nos preparámos devidamente para viver sob o euro”

3. “Portugal foi a n-ésima vítima da liberalização financeira”

4. “A estrutura da economia portuguesa revelou-se demasiado frágil para viver com as regras da UEM”

1. “Andámos a viver acima das nossas possibilidades”

Fonte: AMECO

E no entanto…

A dívida pública portuguesa até à crise era próxima da média da UE

Fonte: AMECO

Dívida pública (em % do PIB)

A procura interna em Portugal foi das que menos cresceu na UE nos anos que precederam a crise

Fonte: AMECO

Taxa de crescimento médio anual da procura interna: 2000-2008

• Em 2010, cerca de 63% das famílias não tinha qualquer dívida aos bancos ou a outras instituições financeiras.

A taxa de incumprimento no pagamento de empréstimos manteve-se baixa até 2008

Fonte: Banco Mundial

Crédito malparado em percentagem dos empréstimos a empresas e famílias

Ou seja, os comportamentos dos portugueses não parecem

assim tão excêntricos.

Ainda assim…

O endividamento externo não parou de aumentar desde a década

de 1990

Fonte: AMECO

Passivo externo líquido (em % do PIB)

Porquê?

Quatro narrativas sobre as origens crise

1. “Andámos a viver acima das nossas possibilidades”

2. “Não nos preparámos devidamente para viver sob o euro”

3. “Portugal foi a n-ésima vítima da liberalização financeira”

4. “A estrutura da economia portuguesa revelou-se demasiado frágil para viver com as regras da UEM”

2. “Não nos preparámos devidamente para viver sob o euro”

• Com a participação na UE e na UEM, Portugal perdeu o controlo sobre importantes instrumentos de política económica (taxa de juro, taxa de câmbio, política comercial) e viu limitado o controlo sobre outros (regulação financeira, política orçamental, auxílios de Estado).

• Neste contexto, o ajustamento económico tem de ser feito por via da ‘flexibilidade’ de:

– salários– preços – impostos

Domínios de ‘reformas estruturais’ para uma economia ‘mais flexível’

• Leis laborais• Mercado de arrendamento• Fiscalidade• Concorrência e regulação• Sistema de justiça• Administração e serviços públicos• Processo orçamental• Sistema de pensões• Privatizações• …

• O mercado de trabalho em Portugal tem revelado grande capacidade de se ajustar aos ciclos económicos (mesmo antes das sucessivas revisões das leis laborais).

• A reforma da segurança social de 2006 foi considerada das mais ambiciosas da OCDE.

• Portugal foi dos países da UE onde o número de funcionários públicos e a massa salarial no Estado mais diminuíram na década de 2000 (principalmente a partir de 2005).

E no entanto…

Ou seja, Portugal não parece ter uma economia particularmente

‘inflexível’ ou ser particularmente avesso a ‘reformas’.

Quatro narrativas sobre as origens crise

1. “Andámos a viver acima das nossas possibilidades”

2. “Não nos preparámos devidamente para viver sob o euro”

3. “Portugal foi a n-ésima vítima da liberalização financeira”

4. “A estrutura da economia portuguesa revelou-se demasiado frágil para viver com as regras da UEM”

3. “Portugal foi a n-ésima vítima da liberalização financeira”

Fonte: Carmen M. Reinhart & Kenneth S. Rogoff (2009). This Time Is Different: Eight Centuries of Financial Folly.

O círculo vicioso da liberalização financeira

Afluxo de capitais

Expansão do crédito

↑ mercado interno

Inflação de

produtos e activos

Perda de competiti-

vidade

Endivida-mento

Liberalização financeira

• Privatização do setor financeiro

• Desregulamentação• Movimento de

capitais

• O círculo vicioso da liberalização financeira dura mais tempo quando o compromisso dos Estados com a estabilidade cambial é mais credível.

Em regime de câmbios flexíveis: (i) o risco de desvalorização cambial atenua o afluxo de capitais e (ii) o endividamento externo conduz à desvalorização e à melhoria da competitividade.

• Quando o círculo é rompido, deixa atrás de si um lastro de endividamento - que é assumido, em larga medida, pelo Estado.

O círculo vicioso, a participação no euro, a crise internacional e a dívida pública

No entanto, nem todos os países da UE foram igualmente afectados pela

liberalização financeira.

Porquê?

Quatro narrativas sobre as origens crise

1. “Andámos a viver acima das nossas possibilidades”

2. “Não nos preparámos devidamente para viver sob o euro”

3. “Portugal foi a n-ésima vítima da liberalização financeira”

4. “A estrutura da economia portuguesa revelou-se demasiado frágil para viver com as regras da UEM”

Os países mais afetados pela crise são os que têm, desde há muito, estruturas produtivas mais frágeis.

Fonte: CE (2011), The Economic Adjustment Programme for Portugal

Vantagens comparativas reveladas, por grupos de intensidade de crescimento das exportações mundiais de bens, 2005-2009

São economias com fracas perspectivas de crescimento e muito expostas à globalização

O que está relacionado com os baixos níveis de educação dos países em causa

Fonte: Eurostat

Fonte: AMECO

Variação anual do peso da indústria transformadora entre 2000 e 2007

Em Portugal isto conduziu a uma quebra muito acentuada do peso da indústria transformadora…

Fonte: Mamede (2014)

Variação do número de trabalhadores entre 2000 e

2006 (milhares)

… determinada pelo recuo dos sectores tradicionais, não compensado por outros.

As quatro narrativas sobre a crise e a resolução dos problemas da economia portuguesa

“Andámos a viver acima das nossas

possibilidades”

Nacional Austeridade

“Não nos preparámos devidamente para o euro”

Nacional Reformas estruturais

“Portugal foi vítima da

liberalização financeira”

Partilhada ‘Repressão financeira’

“Economia demasiado frágil para as regras da

UEM”

Partilhada Reforma da UEM ou saída do euro

Narrativa Responsabilidade Resposta

As quatro narrativas sobre a crise e o papel de uma eventual reestruturação da dívida pública

“Andámos a viver acima das nossas

possibilidades”

Nacional Austeridade

“Não nos preparámos devidamente para o euro”

Nacional Reformas estruturais

“Portugal foi vítima da

liberalização financeira”

Partilhada ‘Repressão financeira’

“Economia demasiado frágil para as regras da

UEM”

Partilhada Reforma da UEM ou saída do euro

Narrativa RespostaPapel da reestruturação da dívida

Reestruturação desnecessária e/ou contraproducente: constitui um

incentivo a ‘comportamentos errados’ e ao adiamento das ‘reformas

estruturais’

Reestruturação necessária e suficiente (com maior regulação financeira)

Reestruturação necessária e urgente, mas insuficiente

Os desafios estruturais da economia portuguesa

Ricardo Paes Mamede ISCTE-IUL

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