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A ANÁLISE DO PROCESSO DE INOVAÇÃO NA INDÚSTRIA DE CALÇADOS ALFA Paulo Eugenio Warken (Feevale) [email protected] dusan schreiber (Feevale) [email protected] Vanessa Theis (Feevale) [email protected] Com a evolução das tecnologias, se tem assistido um aumento de oferta de bens, superior à demanda, o que tem provocado uma comoditização cada vez mais rápida dos mesmos. Para assegurar a sua permanência no mercado, diversos estudos evidenciam que as empresas buscam, cada vez mais, adotar uma estratégia orientada à inovação. Baseando-se neste cenário, o presente estudo analisou o processo de inovação da empresa Alfa, à luz de vertentes teóricas que versam sobre o referido tema, com abordagem qualitativa, entrevistas semiestruturadas e análise de conteúdo. Os resultados evidenciaram a necessidade de aprimoramento do processo de inovação, com a mudança de rotinas e de práticas organizacionais. Palavras-chave: Processo de inovação, práticas organizacionais, indústria de calçados XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

A ANÁLISE DO PROCESSO DE INOVAÇÃO NA INDÚSTRIA DE ...abepro.org.br/biblioteca/TN_STO_213_261_26703.pdf · a mudança de rotinas e de práticas organizacionais. ... de novas práticas

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A ANÁLISE DO PROCESSO DE INOVAÇÃO NA

INDÚSTRIA DE CALÇADOS ALFA

Paulo Eugenio Warken (Feevale)

[email protected]

dusan schreiber (Feevale)

[email protected]

Vanessa Theis (Feevale)

[email protected]

Com a evolução das tecnologias, se tem assistido um aumento de oferta de

bens, superior à demanda, o que tem provocado uma comoditização cada vez

mais rápida dos mesmos. Para assegurar a sua permanência no mercado,

diversos estudos evidenciam que as empresas buscam, cada vez mais, adotar

uma estratégia orientada à inovação. Baseando-se neste cenário, o presente

estudo analisou o processo de inovação da empresa Alfa, à luz de vertentes

teóricas que versam sobre o referido tema, com abordagem qualitativa,

entrevistas semiestruturadas e análise de conteúdo. Os resultados

evidenciaram a necessidade de aprimoramento do processo de inovação, com

a mudança de rotinas e de práticas organizacionais.

Palavras-chave: Processo de inovação, práticas organizacionais, indústria de

calçados

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1. Introdução

A dinâmica do ambiente competitivo tem colocado renovados desafios à sobrevivência de

empresas. Na medida em que surgem novos produtos, processos, serviços e modelos de

negócio, as empresas necessitam de novas práticas gerenciais, estruturas e ferramentas.

Apenas assim elas poderão se adaptar às novas realidades e paralelamente antecipar-se às

tendências de mercado. Entre os elementos para alcançar tal posição inclui-se a geração de

inovações.

As empresas brasileiras procuram combinar suas vantagens comparativas tradicionais com as

vantagens competitivas, mais duradouras e sustentáveis. Neste sentido, um aspecto essencial,

para os países, é o papel central dado à inovação para a competitividade sustentável

(COUTINHO; FERRAZ, 1994) que contrasta, segundo Fajnzylber (1988), com a usual

prioridade dada à exploração das vantagens competitivas tradicionais como baixos custos de

mão-de-obra, de exploração de recursos naturais e manipulação da taxa de câmbio, sem uma

perspectiva de longo prazo.

Segundo o estudo de Souza, Paula e Fuck (2012), a concorrência com produtos importados,

especialmente asiáticos, impulsiona a adoção de estratégias que proporcionam a configuração

de uma nova forma de inserção no mercado internacional. Dentre as estratégias destacam-se a

diversificação de mercados, descentralização e internacionalização da produção,

inovação de produto e processo, diferenciação de produtos com maior valor agregado e

investimentos em marketing, design, conceitos de moda, além da produção com melhor

qualidade. Nesse sentido, o principal desafio é a construção de uma nova imagem do calçado

brasileiro, onde se requer estratégias que vão além do preço.

Considerando que a inovação representa um caminho para proporcionar as condições de

permanência das empresas no mercado, bem como fonte para a concepção do diferencial

competitivo, o presente trabalho tem como objetivo geral evidenciar, por meio de um estudo

caso, os elementos mais relevantes do processo de inovação organizacional. Pela exigência da

empresa estudada, a mesma será denominada, neste trabalho, a empresa Alfa. Para alcançar o

objetivo geral, foram definidos os seguintes objetivos específicos: (a) Descrever a evolução da

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empresa Alfa no seu mercado; (b) Apresentar as práticas de inovação conhecidas no mercado

de calçados e (c) Pesquisar e descrever os modelos de inovação.

Na parte inicial do trabalho foram apresentadas as bases teóricas que nortearam a análise das

evidências, bem como embasaram a construção do instrumento de pesquisa. Na sequência

está detalhado o delineamento metodológico. Na seção seguinte são analisados os resultados

da pesquisa, à luz da revisão teórica. Considerações finais e referências encerram o presente

trabalho.

2. Indústria Calçadista

Devido a alteração do contexto, tanto global, como local, a indústria calçadista brasileira vem

passando, nos últimos anos, por um processo de reestruturação. A abertura econômica

implementada pelo governo brasileiro, ocorrida a partir dos anos noventa ampliou a

competição no mercado interno e externo, o que impôs a necessidade de um novo conjunto de

estratégias frente a produtores de outros países, notadamente a China. A conclusão é que

estratégias baseadas somente na redução de custos e na ampliação das escalas de produção

não se mostram sustentáveis (SOUZA; PAULA; FUCK, 2012).

Sem apresentar um diferencial competitivo, a indústria foi pressionada entre produtos de

qualidade similar asiáticos, mais econômicos, assim como pelos produtos italianos de preço

mais elevado, mas com uma melhor imagem no mercado internacional (COSTA, 2011). Na

busca de mão-de-obra mais econômica e obtenção de benefícios fiscais, algumas empresas

passaram a se deslocar do Rio Grande do Sul para regiões de maior oferta de mão-de-obra,

principalmente para o Nordeste bem como frequentemente afastadas das capitais e sem

tradição na produção de calçados (SOUZA; PAULA; FUCK, 2012). Este processo se

caracterizou pela transferência especialmente de unidades de produção, predominantemente

de artigos mais econômicos, ficando na sede das empresas a produção de artigos mais

elaborados, assim como as áreas estratégicas.

A indústria calçadista brasileira é constituída por clusters, dentre os quais se destacam o do

Vale dos Sinos e Paranhana, no Rio Grande do Sul, Jaú, Birigui e Franca em São Paulo e

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Nova Serrana em Minas Gerais. Muitas empresas que se instalam em clusters, tem a

finalidade de imitar as já existentes, reduzindo os ganhos de apropriabilidade das pioneiras,

caracterizando assim perfil de estratégia imitativa, ocorrendo a cópia de tecnologias e

produtos inovadores, com a busca em paralelo de oferta destes em menores preços

(FREEMAN; SOETE, 1997). Esta atitude acaba por desestimular estratégias de investimento

em inovação por parte de empresas inovadoras.

Apesar disso os estudos demonstram que o foco em inovação na indústria de calçados, é uma

estratégia cada vez mais valorizada e adotada (SOUZA; PAULA; FUCK, 2012). Todavia,

observações demonstram que muitas destas empresas não atingem uma maior sobrevivência a

longo prazo, assim como não utilizam um modelo estruturado e sistematizado de inovação. A

inovação ainda se focaliza na maioria das vezes em base tecnológica, sem uma visão

sistêmica.

3. Inovação

Segundo Schumpeter (1961), considerado o precursor teórico sobre o tema, a inovação leva

ao desenvolvimento econômico e pode ditar o ritmo de crescimento de um país. Também para

Drucker (1974), a inovação passou a ser reconhecida como fator essencial para a

competitividade e foi incluída na agenda estratégica de muitas empresas. Corroborando,

Kotler (1997) afirma que a inovação representa um importante recurso para a sobrevivência

das organizações e elemento chave para o sucesso de uma empresa num mercado competitivo.

Dentro desta perspectiva é possível afirmar que as empresas de sucesso são aquelas que de

forma consistente criam novos conhecimentos (NONAKA, 2001), tecnologias e produtos,

caracterizando um negócio de inovação contínua (TIDD; BESSANT; PAVIT, 2008).

O Manual de Oslo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

(OCDE, 2005), apresenta quatro definições para a inovação: (i) inovação de produto; (ii)

inovação de processo; (iii) inovação de marketing e (iv) inovação organizacional. Novos

produtos são bens que apresentam uma diferenciação significativa em suas características ou

usos em relação aos produtos produzidos pela empresa. Em se tratando da inovação em

processo, estes devem apresentar mudanças significativas nos processos de produção dos

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produtos ou serviços. A inovação em marketing se refere a introdução de novos métodos de

promoção do produto, design do produto que não altere as suas características funcionais,

embalagem e precificação. Na inovação organizacional, o Manual de Oslo se refere à

mudanças relacionadas à estrutura de gestão (OCDE, 2005).

Conforme Daft e Marcic (2004), a inovação é proporcionada pela adoção de uma estrutura em

rede, com colaboração além dos limites da organização, ou seja, a empresa sub-contrata

muitas de suas funções de outras empresas. Isso pode ser viabilizado por meio da cocriação,

que representa uma forma de inovação que envolve fornecedores, colaboradores e clientes

para agregar valor através da inovação (PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004). Também a

inovação aberta, para Chesbrough (2012), se apresenta como uma forma eficaz de as

empresas atualmente realizarem suas inovações.

A inovação é fundamentalmente um produto do conhecimento e da criatividade, exigindo

planos estratégicos flexíveis, controles financeiros não restritivos e sistemas de

reconhecimento das inovações implementadas (GRANT, 1988). Os recursos imateriais ou

intangíveis, presentes nas redes sociais, quando direcionados para um esforço conjunto de

desenvolvimento, convergem no que Schmitz (2000) chamou de "eficiência coletiva",

envolvendo um complexo de interações sociais que propiciam a produção e reprodução de

conhecimento, promovendo processos de inovação e difusão.

Para atingir este objetivo, segundo Galbraith e Lawler (1995), a empresa deve estimular a

inovação através de recursos de conexão, tais como, integração, comitês permanentes, grupos

de trabalho, estrutura horizontal, redes de contato interdepartamentais, contatos frequentes

com grupos externos e com reduzido controle hierárquico. Cabe aos gerentes, conforme

Prahalad e Hamel (1990), criar um clima propício à inovação, desenvolvendo habilidades

capazes de gerar competências que permitam à organização utilizar seu potencial inovador

para o aproveitamento das melhores oportunidades do mercado.

Para apoiar as organizações no processo de inovação, foram concebidas diversas técnicas

(SCALETZKY, 2008). O Workshop é uma técnica onde se pode promover o desenvolvimento

da inovação, sendo um momento de imersão criativa e visa apontar caminhos para a inovação

através de técnicas variadas. A prática do brainstorming pode ser empregada nestes

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momentos, sendo uma técnica para auxiliar a equipe a gerenciar diversas ideias no menor

espaço de tempo (RODRIGUES, 2010). O processo stage-gate é uma prática de geração de

inovação que permite em cada fase de um projeto, tomar decisões para continuar ou finalizar,

com o objetivo de maximizar as probabilidades de sucesso e lucro das inovações (KOTLER,

2013).

No entanto, não se pode todavia confundir o processo stage-gate com gerenciamento de

projetos (COOPER, 2001). O stage-gate se preocupa com o macro processo decisório, já o

gerenciamento de projeto se encarrega do micro processo, sendo que dentro do processo de

desenvolvimento de novos produtos ambos são utilizados conjuntamente, devendo ser

considerado que a prototipagem, incorporada no processo stage-gate, é um processo de

construção e avaliação de funcionamento de um sistema para auxiliar na aprendizagem de

alguns de seus aspectos e sua eventuais soluções (LOPES, 2003).

Figura 1 - Modelo stage-gate para inovação

Fonte - Adaptado de Cooper ( 2001)

As inovações incrementais são geradas através do aprendizado interno e da capacitação

acumulada, ao passo que inovações radicais podem trazer modificações substanciais para a

sociedade (TIGRE, 2006). Podem ser de âmbito apenas interno da empresa, tendo já sido

implementada por outra empresa, para o mercado, neste caso sendo colocada no mercado

antes dos concorrentes ou para o mundo, caracterizando-se a empresa, neste caso, por ser a

primeira em introduzir uma inovação nos mercados nacionais e internacionais. Cabe destacar,

que o desconhecimento e a não difusão das estratégias de uma empresa aos mais diversos

níveis hierárquicos, caracteriza uma barreira à inovação (BES; KOTLER, 2011).

4. Metodologia

Triagem de ideias Geração de ideias Prototipagem Elaboração e

implementação da

estratégia de

marketing

Comercialização

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Em alinhamento com os objetivos, os autores optaram pelo estudo de caso único, abordagem

qualitativa e coleta de evidências por meio de três entrevistas semiestruturadas. A opção pela a

técnica de pesquisa qualitativa se justifica na medida em que a mesma permite conhecer

melhor a natureza do problema pesquisado, considerando-se que as principais características

deste método são a imersão do pesquisador no contexto e a perspectiva interpretativa de

encaminhamento da mesma (KAPLAN; DUCHON, 1988).

Em relação aos objetivos, o trabalho realizado pode ser considerado como exploratório, pois

objetiva oferecer maior conhecimento do problema, para torná-lo mais explícito, através de

levantamento bibliográfico e entrevista com pessoa de bom conhecimento e experiência no

problema pesquisado.

A empresa será denominada, neste estudo, Alfa, em virtude da solicitação de manutenção do

anonimato, comunicada aos pesquisadores. A escolha da empresa se deu em função de fazer

parte da mesma, forte orientação para a inovação, o que fica evidenciado pelas premiações

que recebeu. Através da participação na feira para segmento hospitalar e

gastronômico, foi ganhadora em 2010, do prêmio da Federação das Indústrias do Estado de

São Paulo (FISP) em melhores produtos na categoria EPI.

As entrevistas foram realizadas com o diretor-presidente, gerente de marketing e gerente de

vendas. A coleta de dados foi feita através de procedimentos que procuraram desenvolver a

combinação de diversas fontes ou seja realizar a triangulação de dados coletados através da

fundamentação teórica, entrevista, questionário e estudos.

As entrevistas foram realizadas presencialmente e podem ser consideradas parcialmente

estruturadas (GIL, 1988), já que possibilitaram também ao entrevistado, expor experiências e

dados, o que permitiu seu enriquecimento, já que não ficaram focalizadas exclusivamente nas

perguntas do questionário, podendo ser caracterizado assim a mesma como semiaberta (YIN,

2005). Utilizou-se como base um questionário, composto por perguntas elaboradas com base

na literatura revisada.

O conteúdo das entrevistas, gravadas e transcritas, foram submetidas à técnica de análise de

conteúdo, a qual, segundo Bardin (2006), considera a avaliação de dados coletados na

pesquisa. Para tanto, se efetivou uma pré-análise para definição dos documentos a serem

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utilizados para a pesquisa. Seguiu-se a exploração do conteúdo para finalmente se realizar a

interpretação e tratamento dos resultados, que foi feito através da condensação e destaque das

informações para análise (BARDIN, 2006).

5. Análise dos resultados

As evidências facultaram a percepção de que a empresa apresenta-se como organização

focada estrategicamente em inovação, por atribuir às questões de inovação a obtenção de

vantagem competitiva (DRUCKER, 1974) o que pode ser comprovado também pelo

reconhecimento através das premiações recebidas. Ao mesmo tempo, tem buscado trilhar um

caminho de aprimoramento contínuo e crescimento lucrativo.

É uma empresa que na sua história tem apresentado um crescimento consistente de dois

dígitos ao ano. Os focos mais recentes da empresa tem sido incorporar atributos de conforto

ao calçado e em qualificar sua área de marketing e vendas. Seu proprietário e diretor lidera o

processo de inovação.

No entanto foi possível constatar que a empresa não faz emprego de algumas técnicas de

inovação que poderiam contribuir, de forma relevante para aumento de sua produtividade,

como, por exemplo, o programa de gestão de ideias, o qual, uma vez combinado com as

práticas de workshop (SKALETZKY, 2008) e braistorming ( RODRIGUES, 2010), poderia

promover o desenvolvimento da inovação, bem como contribuir para a consolidação do

modelo de análise do stage-gates (COOPER, 2001). Também ficou evidenciado que a

prototipagem, uma das etapas para triagem e refinamento de ideias, não envolve todos os

stakeholders e nem está baseada no processo stage-gate.

Como ponto positivo pode ser mencionado o fato de que portfolio de produtos reduzido

permite focalizar e otimizar os projetos e benefícios oferecidos. Desta forma os ganhos de

produtividade e escala tem possibilitado reduções de custo com a maturidade dos produtos,

fazendo com que a empresa repasse parte destes ganhos aos clientes e parte interne, elevando

assim sua rentabilidade (PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004).

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A inovação na empresa está centrada nas competências de seu diretor-presidente, a partir de

suas experiências decorrentes da carreira profissional, bem como o domínio de determinadas

tecnologias (GRANT, 1988). Desta forma a empresa tem pautado sua estratégia em identificar

lacunas não atendidas no segmento de calçados profissionais e industriais, dando preferência

às inovações radicais, que criam modificações substanciais na vida dos consumidores

(TIGRE, 2006), algumas ocorrendo inclusive a nível mundial, o que tem permitido à empresa

alcançar uma boa posição competitiva. No entanto, apesar da preferência por inovações

radicais, também são realizadas diversas de natureza incremental, com o objetivo de

proporcionar melhorias contínuas nos produtos e processos.

A empresa apresenta uma estratégia ofensiva de inovação, pois busca o pioneirismo nos

calçados desenvolvidos (FREEMAN; SOETE, 1997), o que lhe permite atingir monopólio

temporário (SCHUMPETER, 1961). Diferencia-se pela tecnologia de produção e matérias-

primas utilizadas, patenteando uma grande parte das mesmas.

As inovações têm sido basicamente focadas em produtos e, paralelamente, ao foco em

inovações radicais, investindo em desenvolvimento de produtos com características novas

para o mercado de atuação, ou seja, que não estão limitadas somente ao âmbito interno da

indústria. A cocriação é praticada e ocorre com a participação de consultorias e entidades de

pesquisa e desenvolvimento do setor de calçados (PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004). No

entanto a utilização de plataforma de inovação aberta (CHESBROUGH, 2012) não é

explorada pela empresa.

A empresa não executa planejamento estratégico formal. O conhecimento e disseminação das

estratégias da empresa ocorre somente de maneira informal, compartilhado com as pessoas de

responsabilidade estratégica e tática, não havendo uma maior participação e engajamento dos

níveis operacionais. As áreas de marketing e vendas da empresa não exploram os perfis de

consumo, que poderiam contribuir, de forma relevante para a inovação de produtos

(ROGERS, 2003).

A empresa opta pela contratação de serviços de consultorias, tanto em áreas operacionais,

como pesquisa aplicada, bem como na área de gestão, para o desenvolvimento de soluções

diferenciadas e que possam agregar valor aos consumidores finais (KOTLER; KELLER,

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2006). Paralelamente ao aumento de seu portfolio de produtos inovadores, que atualmente se

restringe a dois produtos, tem focalizado ações tanto na eficiência produtiva, assim como para

qualificar a gestão comercial. Estas ações tem proporcionado um importante crescimento de

vendas e participação de mercado, bem como ganhos de rentabilidade. O investimento na

gestão do marketing e vendas objetiva o reconhecimento de valor de toda cadeia

influenciadora do consumo (atacadistas, distribuidores, revendedores, industrias e

consumidores finais), conforme já destacou Kotler (1997).

A segunda geração tem sido preparada para poder gradativamente participar mais ativamente

dos processos de inovação, o que ocorre através do investimento em sua formação acadêmica,

participação em cursos e programas de treinamento e envolvimento crescente nos processos

decisórios da empresa. Todavia este processo não se estende aos níveis operacionais, não

existindo um modelo de gestão de pessoas sistematizado, o que representa uma fragilidade,

apontada pela literatura revisada (BETZ, 1997; NONAKA, 2001; ROGERS, 2003).

A empresa não tem utilizado linhas de fomento à inovação disponibilizadas pelo governo

federal, por entender que as possibilidades de acesso são muito complexas e burocráticas.

Todavia desenvolve ações de pesquisa aplicada junto ao IBTeC, especialmente para avaliação

de atendimento à normas da ABNT nas áreas de segurança e conforto.

Com base no diagnóstico realizado foram sintetizadas, na tabela 3, as propostas de práticas e

processos de inovação a serem implementados na empresa Alfa. A base é o referencial teórico,

as práticas utilizadas no setor de calçados, bem como o dados coletados da referida empresa.

Tabela 3 - Proposta de práticas de Inovação para a empresa Alfa.

Etapa Ação Práticas de Inovação

Modelo atual

Práticas de Inovação

Modelo proposto

1 Identificação de

oportunidades de

inovação

(GALBRAITH;LA

WLER, 1995)

Liderado e executado

pelo líder da empresa.

Foco exclusivo em

clientes-alvo.

Implementar planejamento estratégico

(GRANT, 1988).

Aprimorar modelo de gestão de pessoas

(CHIAVENATO, 2004).

Considerar as megatendências

(GALBRAITH; LAWLER, 1995)

Desenvolver programa de gestão de ideias

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(GALBRAITH; LAWLER, 1995).

Realizar workshops de inovação

(SKALETZKY, 1995) com brainstorming

(RODRIGUES, 2010).

Aumentar o portfolio de produtos

(KOTLER; KELLER, 2006).

2 Pesquisa de campo.

(GALBRAITH;

LAWLER, 1995)

Liderado e executado

pelo líder da empresa.

Utilizar linhas de fomento à inovação

(GALBRAITH; LAWLER, 1995).

Envolver nível tático e stakeholders

(GALBRAITH; LAWLER, 1995).

3 Prototipagem.

(COOPER, 2001)

Execução de protótipos

em número reduzido.

Utilizar sistema stage-gate (COOPER,

2001)

4 Validação

(COOPER, 2001).

Liderado e executado

pelo líder da empresa.

Utilizar sistema stage-gate.

5 Marketing e vendas

(COOPER, 2001).

Mesmo modelo para

todo portfolio de

produtos.

Estabelecer estratégias de marketing e

vendas orientadas à modelo de perfis de

consumo (ROGERS, 2003).

Fonte : Elaborada pelo autor

Em complementação, na tabela 4 abaixo, segue proposta do processo de inovação

para a empresa Alfa.

Tabela 4 - Proposta de processo de inovação na empresa Alfa

Etapa Processo Justificativas

1 Analisar sistematicamente o contexto da inovação

(GALBRAITH; LAWLER, 1995).

Busca elementos como análise de

tendências, novas tecnologias, processos

e modelos de negócios como "insights"

para a gestão de inovação.

2 Analisar as práticas de inovação na empresa Alfa

e realizar benchmark de boas práticas utilizadas

no segmento de calçados (GALBRAITH;

LAWLER, 1995).

Permanente análise das práticas e

ferramentas de inovação, permite

estabelecer ações para qualificar o

processo de inovação na empresa.

3 Refinar, definir e implementar diretrizes, práticas

e ferramentas de inovação na empresa Alfa

Adequação e implementação das

mesmas, buscando crescimento da

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(GALBRAITH; LAWLER, 1995). produtividade na inovação.

4 Gerenciar o processo de inovação (GALBRAITH;

LAWLER, 1995).

Objetivo de exercer controle de qualidade

e implementação de melhorias contínuas

no processo de inovação.

Fonte: Elaborada pelo autor

Entende-se que uma vez implementado o modelo proposto, a organização em análise poderá

ter aumento relevante na sua capacidade de competir no mercado.

5. Conclusões

Com base no referencial teórico que serviu para embasamento às análises realizadas, constata-

se que a empresa Alfa não apresenta um modelo de inovação com visão sistêmica. Focaliza

sua estratégia de inovação em produtos, tanto através da identificação de novos nichos de

mercado, bem como em inovações incrementais orientadas aos processos de produção e

ergonomia dos produtos.

Além disso, o seu mix está atualmente limitado a apenas dois produtos o que pode

comprometer a sustentabilidade da empresa, considerando cada vez mais curto o ciclo de vida

dos produtos. Dentre as fragilidades destaca-se, também, a forma de gestão, não condizente

com o foco em inovação.

No que se refere às limitações do estudo, não foram abordados aspectos referentes a cenários

e tendências, que poderiam ser elementos direcionadores de inovação. Para o direcionamento

da organização à implementação da gestão para inovação, sugere-se realização de um

diagnóstico organizacional, com base nos quais seriam selecionados indicadores que,

relacionados à ações específicas de gestão da inovação, facultaria a disseminação da cultura

de inovação e mudanças estruturantes subjacentes ao modelo de gestão atual.

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