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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO UNIDADE ACADÊMICA DE GARANHUNS CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA Gerciane Ramos Dias A GENTE CANSA DE NÃO SABER NADA”: Representações Sociais de escola dos estudantes da EJA Garanhuns 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADÊMICA DE GARANHUNS

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Gerciane Ramos Dias

“A GENTE CANSA DE NÃO SABER NADA”:

Representações Sociais de escola dos estudantes da EJA

Garanhuns

2015

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Gerciane Ramos Dias

“A GENTE CANSA DE NÃO SABER NADA”:

Representações Sociais de escola dos estudantes da EJA

Garanhuns

2015

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

como requisito parcial para a obtenção do título

de Licenciado em Pedagogia pelo Curso de

Licenciatura em Pedagogia da Universidade

Federal Rural de Pernambuco, Unidade

Acadêmica de Garanhuns

Orientadora: Profa. Ma. Taynah de Brito Barra

Nova

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Ficha Catalográfica

Setor de Processos Técnicos da Biblioteca Setorial UFRPE/UAG

CDD: 374.981

1. Educação do adolescente

2. Representação social

3. Educação de adultos

4. Prática docente

I. Nova, Taynah de Brito Barra

II. Título

D541g Dias, Gerciane Ramos

A gente cansa de não saber nada: representações

sociais de escolas dos estudantes da EJA / Gerciane

Ramos Dias. – Garanhuns, 2015.

85 f.

Orientadora: Taynah de Brito Barra Nova

Monografia (Curso Licenciatura em Pedagogia) –

Universidade Federal Rural de Pernambuco - Unidade

Acadêmica de Garanhuns, 2015.

Inclui bibliografias

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Dedico este trabalho a minha mãe Raquel, sinônimo de luta e força.

A minha avó Augusta (in memoriam) pela dedicação quando eu ainda estava

aprendendo a ler e escrever as primeiras palavras.

A todos que de alguma maneira contribuíram para sua construção com ações,

palavras ou orações.

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AGRADECIMENTOS

Porque para Deus nada é impossível.

(Lc. 1.37)

São muitos agradecimentos a fazer pela conclusão deste trabalho. Ao longo de quatro

anos convivi com muitas pessoas que contribuíram de maneira singular para que chegasse até

aqui. É impossível lembrar ou citar o nome de todas, mas vou registrar aqui as que estiveram

mais próximas e que mesmo sem saber me ajudaram e estimularam meu caminhar.

Primeiramente agradeço a Deus que me formou. Aquele que tem poder para fazer

infinitamente mais, além do que pedi e do que sonhei. Um Deus grande que sempre cuida de

mim com muito amor. Sem Ele, não teria a fé e a coragem para realizar este trabalho. Meu

maior amigo, pai, companheiro e ajudador.

A minha mãe por ter permitido que eu viesse ao mundo, por nunca ter desistido de mim,

pelos ensinamentos, paciência e a força de sempre.

A todos da minha família, ao meu irmão, aos de perto, aos de longe, que sempre torcem

por mim.

Ao sorriso lindo do meu sobrinho Guilherme.

A todos os amigos, que não citarei os nomes; pessoas que sempre me encorajam a

continuar, sintam-se todos abraçados com imensa gratidão.

Ao Curso de Licenciatura em Pedagogia da UAG e ao corpo docente que integra o

curso, foram quatro anos de muito aprendizado e amizade. Agradeço imensamente aos que

estiveram mais perto, me ajudando no processo de formação, com seu incentivo, respondendo

todas as mensagens que enviei quando precisei de ajuda, de documentações, orientações, entre

outros; em especial aos professores Gustavo Lima e Heloísa Bastos pelas contribuições.

Aos funcionários em geral, pessoas disponíveis e acessíveis, sempre prontas a ajudar.

Ao professor Valdir Eduardo que me proporcionou o primeiro contato com a história da

EJA e a Teoria das Representações Sociais, através de suas enriquecedoras aulas.

A professora Marlene Maria Ogliari que na disciplina de PEPE II, nos incentivou a

realizar a pesquisa na EJA. Através daquele contato foi possível perceber a importância de

estudar esta modalidade de ensino.

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Ao professor Robson Santos que proporcionou aulas significativas, cooperando para

realização deste trabalho, além de ser um docente incentivador.

Ao professor Robson Eugênio, que não hesitou em cooperar conosco, nas pesquisas no

âmbito da EJA, meu carinho e admiração pelo professor que és.

Aos graduandos da turma 2015.1, agradeço pela partilha de todos os dias, foram quatro

anos construídos aos poucos, com muito aprendizado e crescimento.

Aos amigos que Deus marcou o ano de 2011 para nos encontrarmos, Arlam Pontes e

Mylena Tenório, meninos lindos que levarei comigo para sempre, nossos lanches, nossas

risadas, nossas reclamações, nosso comprometimento e responsabilidade, agradeço o carinho

e a compreensão, e estou certa que Deus tem algo lindo e especial preparado para vocês, pois

são merecedores. Um muito obrigado à Elânia Mendes que principalmente na reta final do

curso esteve presente compreendendo nossas ansiedades e preocupações e partilhando

conosco dos trabalhos acadêmicos.

Aos amigos de curso que constituí durante a caminhada na UAG, Charliel Couto, Kelly

Lima, entre outros, muito obrigada!

Um obrigado especial pela amizade ao amigo Alex Lima, uma pessoa especial, que

aprendi a admirar pela sua simplicidade e sensatez, seus conselhos são sempre válidos e bem-

vindos.

Não poderia deixar de agradecer a Edilene Vilaça, que em 2011, enquanto secretária de

educação do município de Garanhuns, não hesitou em organizar meu horário e local de

trabalho para que facilitasse os meus estudos.

Agradeço à Escola Municipal Artur Brasiliense Maia que sempre me acolheu seja como

funcionária ou como pesquisadora.

Agradeço imensamente à Escola Dom Expedito Lopes, na pessoa de d. Valdecy Lyra,

educadora admirável, que esteve à frente do seu tempo provando que um sonho pode se tornar

realidade, basta persistir naquilo que almejamos; agradeço pelas contribuições para a minha

formação acadêmica, seja nos trabalhos diários ou nas liberações para participações em

eventos acadêmicos. Os agradecimentos se estendem à Ana Claudia Lyra pela confiança em

mim como profissional e pessoa e a todos os funcionários da escola, amo todos. Meus

sinceros agradecimentos.

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Meus agradecimentos à Escola Municipal Padre Dehon, pela acolhida em um momento

crucial do curso.

A todas as escolas que nos serviram como campo de estágio, minha gratidão e

reconhecimento pela participação em minha formação.

Pensou que eu iria te esquecer? Não. Chegou a hora de agradecer a minha orientadora,

professora Taynah de Brito Barra Nova, Pedagoga elegante, que me recebeu tão bem como

sua orientanda. Meus sinceros agradecimentos por aulas tão inspiradoras durante a caminhada

na UAG e pelo apoio e orientações para o desenvolvimento e conclusão deste trabalho mesmo

às vezes eu estando tão distante devido aos compromissos diários, mas nossos encontros

sempre foram recheados de muito aprendizado. Não conseguiria realizar este trabalho sem as

suas orientações, ajuda e compreensão. Minha admiração, carinho, e amizade. Quando eu

crescer quero ser Pedagoga como você.

Agradeço a disposição da banca, professores Valdir Eduardo, Lucas Castro e Robson

Santos que não hesitaram em contribuir com este estudo.

Encerro meus agradecimentos com o sentimento que muito ainda falta agradecer,

sobretudo a Deus, pela sua soberania, pois em minha vida foi sobrenatural, mas, com a certeza

de que este é apenas um passo dado, um passo que em muitos momentos devido às atividades

diárias, foi árduo e doloroso, mas hoje chego ao topo dessa etapa com o mesmo sentimento

poético de Cecília Meireles, quando diz que “No último andar é mais bonito, no último andar

se vê o mar. É lá que eu quero morar. O último andar é muito longe, custa-se muito a chegar.

Mas é lá que eu quero morar”. Hoje, o meu sentimento é este, de ter chegado ao último andar

deste edifício chamado graduação e bem mais do que ter um diploma em mãos, eu serei

Pedagoga e poderei contribuir de alguma forma para uma melhor educação no meu país.

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A Escola

Escola é...

o lugar em que se faz amigos.

Não se trata só de prédios, salas, quadros,

Programas, horários, conceitos...

Escola é sobretudo, gente.

Gente que trabalha, que estuda

Que alegra, se conhece, se estima.

O Diretor é gente,

O coordenador é gente,

O professor é gente,

O aluno é gente,

Cada funcionário é gente.

E a escola será cada vez melhor

Na medida em que cada um se comporte

Como colega, amigo, irmão.

Nada de “ilha cercada de gente por todos os lados”.

Nada de conviver com as pessoas e depois,

Descobrir que não tem amizade a ninguém.

Nada de ser como tijolo que forma a parede, Indiferente,

frio, só.

Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar.

É também criar laços de amizade, É criar ambiente de

camaradagem,

É conviver, é se “amarrar nela”!

Ora é lógico...

Numa escola assim vai ser fácil! Estudar, trabalhar, crescer,

fazer amigos, educar-se, ser feliz.

É por aqui que podemos começar a melhorar o mundo.

(Paulo Freire)

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RESUMO

Este trabalho propõe cercar os saberes partilhados socialmente entre estudantes da Educação

de Jovens e Adultos. O objetivo do estudo é analisar as Representações Sociais de escola,

partilhadas entre estudantes da EJA, no município de Garanhuns/PE. O estudo apresenta um

passeio pelos caminhos históricos percorridos pela Educação de Jovens e Adultos,

apresentando um recorte a partir da década de 1930. Seguindo a fundamentação teórica

necessária para dar base ao estudo, buscamos discutir sobre a importância de ouvir os

estudantes da EJA e a função da escola enquanto nosso objeto de estudo. Em seguida,

apresentamos a Teoria das Representações Sociais através de um breve histórico, definições e

abordagens. A pesquisa foi realizada na cidade de Garanhuns/PE, com 14 estudantes da

Educação de Jovens e Adultos, em duas escolas distintas. Para cercarmos os sentidos

atribuídos pelos estudantes à escola, utilizamos a observação, o questionário e a entrevista

enquanto instrumentos de coleta de dados, e a Análise de Conteúdo guiou nossa interpretação

dos dados. Sabendo que as Representações Sociais se constituem como um conhecimento

elaborado socialmente que contribui para a construção de uma realidade comum a um

conjunto social, os resultados deste estudo nos revelam que a escola está representada por

estudantes da EJA, como local para aquisição da leitura e da escrita, privilegiado para

alcançar melhor qualidade de vida e lugar de interação social. Nesse sentido, a escola é

legitimada nas respostas dos sujeitos investigados como sendo um lugar com aspectos

positivados.

Palavras – chave: Educação de Jovens e Adultos, Escola, Representação Social.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11

CAPÍTULO I - UM PASSEIO PELA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O

ENCONTRO ENTRE SUJEITOS E ESCOLA ................................................................... 16

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL: CAMINHOS HISTÓRICOS E

POLÍTICOS ............................................................................................................................ 17

OUVIR PARA COMPREENDER: A IMPORTÂNCIA DE DAR ECO A VOZ DOS

ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ......................................... 24

A ESCOLA COMO OBJETO DE ESTUDO ....................................................................... 29

CAPÍTULO II - A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ................................. 32

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: BREVE HISTÓRICO, DEFINIÇÕES E

ABORDAGENS ...................................................................................................................... 32

CAPÍTULO III - METODOLOGIA DA PESQUISA ......................................................... 36

TIPO DE PESQUISA ............................................................................................................. 36

SUJEITOS DE PESQUISA ................................................................................................... 39

INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS .................................................................... 44

CAPÍTULO IV - ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .................................. 46

OS MOTIVOS QUE LEVAM OS ESTUDANTES AO ABANDONO ESCOLAR E AS

NECESSIDADES QUE OS FAZEM RETORNAR ............................................................ 47

A INSTITUIÇÃO ESCOLAR: O QUE É, E PARA QUÊ SERVE? ................................. 52

ENTRE DESEJOS E EXPECTATIVAS: OS ANSEIOS NO RETORNO À ESCOLA .. 55

CAPÍTULO V - CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... 58

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 61

APÊNDICE A – FICHA DE IDENTIFICAÇÃO DA ESCOLA ........................................ 66

APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ........... 68

APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DE IDENTIFICAÇÃO DOS ESTUDANTES ........ 69

APÊNDICE D – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA ....................... 70

APÊNDICE E – TRANSCRIÇÕES DAS ENTREVISTAS ................................................ 71

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INTRODUÇÃO

Continuo buscando, reprocurando. Ensino porque

busco, porque indaguei, porque indago e me indago.

Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e

comunicar e anunciar a novidade.

(FREIRE, 1996, p. 32)

A Educação de Jovens e Adultos apresentada na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional nº. 9394/96 (LDBN) como uma modalidade de ensino destinada aos que

não tiveram a oportunidade de concluir seus estudos na idade adequada, visando a

continuidade de estudos no Ensino Fundamental e Médio. A referida lei garante condições de

acesso e permanência na escola, para estudantes maiores de quinze anos que ainda não

concluíram o Ensino Fundamental e maiores de dezoito que não concluíram o Ensino Médio.

Como objetivo, Soek; Haracemiv e Stoltz (2009) apontam que a EJA deve “formar

cidadãos capazes de lutar por seus direitos e de se apropriar dos conhecimentos mediados pela

escola para se aprimorar no mundo do trabalho e na prática social” (p. 29), uma vez que o

público da EJA é formado por pessoas atuantes na sociedade que partilham do senso comum

e se apropriam de conhecimentos adquiridos através de suas vivências.

Esses sujeitos possuem uma bagagem de conhecimentos adquiridos

em outras instâncias sociais, visto que a escola não é o único espaço

de produção e socialização dos saberes. Essas experiências de vida são

significativas para o processo educacional e devem ser consideradas

(p.22).

Nesse sentido, a escola deve propiciar aos estudantes um espaço de encontro entre os

saberes advindos das vivências e o saber escolar, fazendo com que os estudantes vejam

significado em frequentá-la e sintam a importância da escola para sua vida social. Nessa

perspectiva a escola se constitui além de um espaço de aquisição de conhecimento, um lugar

onde se estabelecem relações, assim como aponta Sacristán e Goméz (2000):

a escola deve prover os indivíduos não só, nem principalmente, de

conhecimentos, ideias, habilidades e capacidades formais, mas

também, de disposições, atitudes, interesses e pautas de

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comportamento. Assim, tem como objetivo básico a socialização dos

alunos (p. 19).

Acredita-se ser esta uma proposta mais condizente com as necessidades do público

que retorna à escola na EJA. A alfabetização deve ter um significado mais abrangente, indo

além do domínio código escrito e possibilitando uma leitura crítica do mundo em que está

inserido. Nesse sentido, deve-se refletir sobre a variedade de experiências, saberes e interesses

encontrados entre os estudantes da EJA. Esses valores fazem da instituição um local de

transmissão de cultura e de estímulo à interação dos alunos, contribuindo para a formação do

cidadão consciente, educando-o para participação social, sem se submeter facilmente às

injustiças e desigualdades existentes.

Entendendo que esses estudantes retornam à escola, cheios de expectativas e se sentem

desafiados diante da heterogeneidade da turma e da organização escolar encontrada diferente

da que frequentaram quando ainda eram crianças, surgiu a curiosidade de compreender como

esses estudantes representam socialmente a escola.

Esta pesquisa buscou iniciar uma aproximação com a Teoria das Representações

Sociais, proposta por Moscovici em 1961 através do estudo da Psicanálise. Moscovici, em

seus estudos, propôs estudar como um conhecimento científico passa a ser partilhado pelos

vários estratos sociais da sociedade parisiense, no caso, como a Psicanálise era compreendida

pelos diferentes grupos sociais e como esses conhecimentos orientavam as práticas dos

sujeitos. Essa teoria vem sendo adotada por pesquisadores em diversas áreas e ganha

relevância na área educacional por proporcionar novas formas de compreender os objetos do

campo da educação sob o olhar da subjetividade. Ela propõe tratar dos saberes do senso

comum, elaborados de forma coletiva, com o objetivo de interpretar o que acontece no

cotidiano. Para Moscovici (2003) o senso comum está continuamente sendo criado e recriado

na sociedade. A Representação Social busca compreender melhor um grupo social, por meio

daquilo que os homens propagam, mediante o uso de expressões e gestos, tornando o que é

ignorado em notório. Assim, como argumenta Andrade (2003):

os elementos das representações sociais não só expressam as relações

sociais, mas também na sua construção, conferem-lhe um valor funcional na

compreensão de nós mesmos e dos outros, transformando o núcleo figurativo

em guia de leitura, generalizando padrões que criam referências para a

compreensão da realidade. Esse sistema interpretativo serve de mediação

entre os sujeitos e o seu meio, e entre os componentes de um mesmo grupo,

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possibilitando a resolução das situações com as quais se deparará,

transformando-se em uma linguagem comum, servindo tanto para

compreender e classificar acontecimentos e indivíduos de um mesmo grupo,

como para fazê-lo em relação a acontecimentos e grupos estranhos, dando ao

processo de ancoragem mais uma função, a de instrumentalização do saber.

A ancoragem enraíza a novidade num sistema de pensamento (p. 86).

Seguindo este pensamento, de acordo com Jodelet (2001a), uma das representantes do

pensamento de Moscovici, as representações sociais devem ser encaradas como uma forma de

conhecimento socialmente elaborado e partilhado, tendo em vista um objetivo prático e

concorrendo para a construção de uma realidade comum a um conjunto social (p. 36). O

homem é um ser social que tem suas próprias características, porém, relaciona-se com outras

pessoas e partilha suas experiências. Essa interação social faz com que haja uma mudança de

ações, constituindo representações que orientam o comportamento, permitindo uma

comunicação e compreensão entre os indivíduos na construção de uma identidade social, “[...]

elas são impostas sobre nós, transmitidas e são o produto de uma sequência completa de

elaborações e mudanças que ocorrem no decurso do tempo e ao resultado de sucessivas

gerações” (MOSCOVICI, 2003, p. 37).

Desta forma a pesquisa em Representações Sociais nos permite entender qual a gênese

dos sentidos que os estudantes atribuem à experiência escolar do ponto de vista deles, através

das suas falas e das suas atribuições.

O interesse por este objeto de estudo, nasceu do convívio diário no ambiente de

trabalho com jovens e adultos, além do interesse em ampliar os estudos acerca do contexto

histórico e das individualidades dessa modalidade de ensino no Brasil e da necessidade de dar

voz a esses sujeitos, que retornam a escola, cheios de expectativas e anseios. Na

universidade, o primeiro contato com a EJA foi através da pesquisa realizada como critério

avaliativo da disciplina Prática Educacional Pesquisa e Extensão II e nos aproximamos da

Teoria das Representações Sociais através da disciplina Identidade Cultura e Sociedade. No

sexto período tivemos a disciplina Educação de Jovens e Adultos que contribuiu para

cercarmos de maneira mais precisa o desenrolar histórico da EJA.

Através dos contatos estabelecidos, foi possível notar que os estudantes da EJA

chegam à escola com uma carga de conhecimentos prévios e com uma representação formada,

decorrente da sua situação anterior, de exclusão, rejeição ou abandono escolar. A escola passa

a ser fator principal na vida dos estudantes e, aos poucos, passa do estranhamento para algo

necessário. Portanto, nossa proposta é nos aproximarmos dessas representações.

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Para investigar, compreender e apreender os saberes comuns que são partilhados

diariamente entre estudantes da Educação de Jovens e Adultos, o presente estudo busca

responder: como os estudantes da Educação de Jovens e Adultos representam a escola no

Município de Garanhuns/PE? Desenvolvemos este estudo com fins a alcançar os seguintes

objetivos:

OBJETIVO GERAL

Analisar as Representações Sociais de escola, partilhadas entre estudantes da

Educação de Jovens e Adultos, no município de Garanhuns/PE.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Identificar o conteúdo das Representações Sociais de Escola;

Compreender como essas representações, influenciam a relação dos estudantes com a

Instituição Escolar.

Consideramos que este estudo pode contribuir para nos aproximarmos da importância da

escola na vida desses estudantes, considerando o valor do discurso dos participantes e suas

concepções acerca do objeto representado com a finalidade de promover projetos e políticas

que atendam às suas necessidades. Os estudantes carregam consigo saberes, vivências,

culturas e valores; a escola deve proporcionar a estes, enquanto sujeitos, a oportunidade de

construir o cenário da Educação voltado ao estudante trabalhador que retorna à escola para

concluir seus estudos. Nossa proposta é contribuir enquanto pesquisadora, para uma tomada

de atitude frente a esta modalidade de ensino que é vista de forma preconceituosa e

frequentemente esquecida pelos órgãos públicos educacionais. Para tal finalidade, o trabalho

foi dividido em capítulos organizados da seguinte forma:

Capítulo I: propomos um breve passeio pela Educação de Jovens e Adultos, discutindo

inicialmente os aspectos históricos e políticos da referida modalidade de ensino, com o

objetivo de situar o leitor no contexto em que a Educação de Jovens e Adultos está inserida.

Em seguida refletiremos sobre a importância de ouvir os sujeitos que compõem a referida

modalidade de ensino, no intuito de compreender como eles pensam à escola, como a

representam e o que esperam dela. Também apresentaremos um panorama dos trabalhos de

conclusão de curso (TCC) realizados entre os anos de 2009 a 2015 no curso de Licenciatura

em Pedagogia da UFRPE/UAG, nossa intenção será nos aproximarmos dos trabalhos que

tenham a temática voltada para Educação de Jovens e Adultos, sobretudo, que se propuseram

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a ouvir os estudantes da referida modalidade de ensino. Finalizamos este primeiro momento

discutindo sobre os objetivos e funções da EJA, e que tipo de escola é necessário para

alcançá-los.

Capítulo II: a discussão volta-se para a Teoria das Representações Sociais apontando

suas contribuições para o campo educacional e para as pesquisas realizadas na Educação de

Jovens e Adultos.

Capítulo III: apresentamos nosso percurso metodológico a fim de que o leitor

compreenda o caminho percorrido para a realização deste estudo, como, o tipo de pesquisa, os

cenários da pesquisa, os sujeitos de pesquisa e os instrumentos de coleta de dados.

Capítulo IV: apresentamos as análises dos resultados a partir das informações

coletadas pelos instrumentos utilizados, tendo por base os aportes teóricos das Representações

Sociais e da Educação de Jovens e Adultos, identificando as representações sociais dos

estudantes da EJA sobre a escola.

Capítulo V: Estão expostas as considerações finais acerca do estudo realizado e as

hipóteses para estudos futuros.

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CAPÍTULO I - UM PASSEIO PELA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O

ENCONTRO ENTRE SUJEITOS E ESCOLA

O campo da EJA está se firmando de maneira

muito intensa com sua especificidade, com suas

dificuldades próprias e também com suas

deficiências que precisam ser vencidas. Quem

trabalha com Educação de jovens e adultos não

atende pessoas “desencantadas” com a educação,

mas sujeitos que chegam à escola carregando

saberes, vivências, culturas, valores, visões de

mundo e de trabalho.

(CORTADA, 2013, p. 21)

Neste capítulo buscamos refletir sobre os rumos e políticas para a Educação de Jovens

e Adultos no cenário nacional, considerando que os movimentos e campanhas voltadas para

esta modalidade de ensino, se inspiraram no paradigma da educação popular. Buscamos voltar

o olhar para EJA, enquanto modalidade de ensino garantida dentro das políticas públicas, de

modo a atender às demandas dos jovens e adultos, estudantes, que procuram a escola para

concluir os estudos, como sujeitos de direitos, que buscam sua participação efetiva nas

estruturas sociais, se aproximando da condição de sujeitos pensantes ao invés de sujeitos

pensados, conforme Abdalla (2004). Assim, acreditamos oportunizar aos estudantes expressão

de seus conhecimentos e suas expectativas, quebrando o silenciamento, muitas vezes

enfrentado por eles, e dar voz a esses sujeitos.

Este capítulo está organizado da seguinte maneira: primeiro é realizada uma discussão

sobre os rumos históricos e políticos da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, mostrando as

lutas pela alfabetização como instrumento de inclusão e emancipação dos jovens e adultos em

busca da apropriação da leitura e da escrita e, sobretudo a possibilidade de compreensão e

transformação de uma realidade. No segundo sub tópico, é abordada a importância de dar voz

ao público da Educação de Jovens e Adultos, que retorna à escola em busca de novas

oportunidades e descobertas, necessitando de um olhar diferenciado diante das suas

especificidades. Dentro desse contexto, é apresentado um panorama das pesquisas realizadas no

âmbito do Curso de Licenciatura em Pedagogia da Universidade Federal Rural de Pernambuco,

Unidade Acadêmica de Garanhuns entre os anos de 2009 a 2015. No terceiro subtópico, a

escola é abordada como objeto de representação do nosso estudo e apresentamos seus objetivos

e funções diante do contexto da EJA.

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EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL: CAMINHOS HISTÓRICOS E

POLÍTICOS

Eu acho que a leitura é uma coisa que não se compra com dinheiro.

(E9C2T3)1

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) se enquadra no contexto histórico da educação

no Brasil de modo geral, e das diversas transformações sociais, econômicas e políticas,

ocorridas a partir da década de 1930. De acordo com Soek; Haracemiv; Stoltz (2009) a

Revolução desta década, deu origem ao processo de reformulação da sociedade brasileira,

desencadeando transformações decorrentes do processo de industrialização e impulsionando as

autoridades a implementação de ensino supletivo para adultos sem escolarização.

Como afirma Soek (2010), a educação no Brasil, durante um longo período, foi

destinada às classes sociais mais abastadas, favorecendo apenas uma pequena parcela da

população. Esse quadro proporcionou o aumento no índice de pessoas não alfabetizadas,

tornando cada vez mais necessárias, iniciativas no combate nacional ao analfabetismo.

Em 1932 o analfabetismo no Brasil se apresenta como principal problema da nação,

sendo este, considerado pelas forças políticas nacionais, como a causa das dificuldades

enfrentadas. Com a finalidade de combater o analfabetismo, funda-se em 1932 a Cruzada

Nacional de Educação, (CORTADA, 2013; PAIVA, 2003), com objetivo de apagar o índice de

analfabetismo que degradava o Brasil. A Cruzada era reconhecida pelo governo como entidade

de utilidade pública, através do decreto nº 21.713 de 1932, e seus principais colaboradores eram

encontrados nas forças armadas, na indústria, comércio e classes conservadoras, que afirmavam

formar uma união contra a ignorância popular e consideravam que a alfabetização se constituía

no elemento básico para a solução de todos os problemas políticos e sociais enfrentados,

Constatou-se na Cruzada Nacional de Educação uma retomada do criticado

“Entusiasmo pela Educação”, movimento desvelado nos anos de 1920, que

priorizava a expansão quantitativa das escolas justificando a necessidade de

alfabetizar os brasileiros, aumentar as riquezas, bem como “apagar” a

mancha vergonhosa de 80% de pessoas analfabetas, posto que um país como

essa quantidade de pessoas sem instrução não poderia ser considerado

desenvolvido. Verificou-se ainda que na expansão de escolas primárias não

havia preocupação com a qualidade do ensino, era focalizada apenas a

alfabetização (RIBEIRO, 2011, p. 228).

1 Os sujeitos foram codificados da seguinte forma: Todos os estudantes receberam uma numeração de 1 a 14,

seguidos da indicação da instituição (cenário), e da turma em que estava matriculado. Desta forma, E9C2T3

significa estudante 9 do Cenário 2 matriculado na turma 3.

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Nesta conjuntura política, o Plano Nacional de Educação, previsto na Constituição de

1934, reconheceu a educação como direito de todos, pondo o ensino primário extensivo ao

adulto, gratuito, como dever do Estado e direito do cidadão. Neste período, um sistema

público de educação elementar no país, começa a se consolidar, dando direito aos estudantes

de receberem Livro Didático e Dicionário de Língua Portuguesa, é nesta Constituição que se

apresenta a necessidade de oferecer educação básica para jovens e adultos que não puderam

concluir seus estudos. Nesta perspectiva, se começou romper o paradigma que a escola era

imprescindível apenas para as crianças.

Mas, é, sobretudo na década de 1940, com o fortalecimento dos princípios

democráticos, que iniciativas políticas e pedagógicas começaram a tomar corpo no cenário

nacional. O quadro de analfabetismo no Brasil configurava uma situação crítica no que se

refere ao número de pessoas não escolarizadas, desencadeando inúmeras iniciativas políticas

que passaram a deter maior atenção para este público. Os estudos de Soek (2010) apontam

que em 1940 no recenseamento geral, foi divulgado que 55% dos brasileiros com mais de 18

anos ainda não eram alfabetizados. Esse resultado fez com que o país mobilizasse campanhas

para combater o analfabetismo.

Em 1945, com o fim da era Vargas, o país vivia uma redemocratização política, sendo

necessário oferecer uma instrução mínima a população. Com a criação da UNESCO

(Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) os países integrantes,

inclusive o Brasil, começaram a solicitar a educação de pessoas adultas analfabetas. Gadotti

(2008) faz menção a esta iniciativa, afirmando que, entre os anos de 1946 a 1958, campanhas

e congressos de erradicação do analfabetismo, começaram a surgir, devido a uma pressão

internacional, sendo a educação, um meio de atuar no desenvolvimento de nações atrasadas.

Entre eles, em 1947 ganha destaque o I Congresso Nacional de Educação de Adultos,

que trouxe em seu bojo o slogan "ser brasileiro é ser alfabetizado". Nessa conjuntura, o

governo brasileiro, lançou a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos – CEAA. A

referida Campanha consistiu em uma alfabetização intensiva com a finalidade de “alfabetizar

e reintegrar”, conscientizando o cidadão a fim de que este conheça os seus direitos

fundamentais, demonstrando assim, uma maior preocupação com a quantidade de pessoas

formadas e não com a qualidade. Considerando o momento de democratização que o país

vivenciava, era plausível que os adultos estivessem em condições de exercer o direito do voto.

A Campanha alcançou resultados significativos e se estendeu a diversas regiões

brasileiras, com a criação de escolas e a diminuição no índice de analfabetos. Entretanto,

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como afirma Soek, Haracemiv e Stoltz (2009), o movimento começou a perder forças no final

da década de 1950:

A avaliação da Campanha de Educação de Adultos mostrou-se vitoriosa na

sua primeira década, pois além da ampliação das classes e escolas,

possibilitou a elevação da taxa de alfabetização. No entanto, a execução da

campanha foi sendo cada vez mais descentralizada e, com a mudança de

governo, foram se extinguindo as verbas, ficando as ações da campanha cada

vez mais dependentes de doações e dos trabalhos de voluntários da base

popular (p. 11).

Com o insucesso da referida campanha, em 1952 o Ministério da Educação e Cultura

organizou a Campanha Nacional de Educação Rural e em 1958 a Campanha Nacional de

Erradicação do Analfabetismo, no entanto, as duas campanhas tiveram vida curta (HADADD

E PIERRO, 2000; SOEK; HARACEMIV E STOLTZ, 2009). Ambas se preocupavam mais

com índices quantitativos do que qualitativos, isto é, priorizavam a elevação do índice de

alfabetizados em função da qualidade da educação, como forma de promover uma

emancipação política e cultural da população (PAIVA, 2003).

As críticas referentes às campanhas de Educação de Adultos convergiram para uma

nova postura diante das necessidades educativas. Cunha e Góes (1994) ressalta que um grande

número de educadores começou a enxergar além da sala de aula, isto é, começaram a olhar e

estudar o mundo. Segundo os autores, os educadores começaram a perceber que era

necessário compreender a realidade em que se estavam inseridos e promover a discussão de

ideias, isto consistia em um novo paradigma pedagógico para a educação de adultos, cuja

referência principal, foi o educador Paulo Freire2.

Em 1958, entre o declínio das campanhas de alfabetização de adultos, ocorreu o II

Congresso Nacional de Educação de Adultos, realizado no Rio de Janeiro, com o objetivo de

orientar a educação para o desenvolvimento. Paiva (2003) cita que:

A convocação do Congresso resultou da convicção de que as condições do

país tinham mudado, que as novas condições exigiam providências no

terreno da educação dos adultos e que os programas existentes não poderiam

oferecer diretrizes válidas ao governo nessa tarefa. Cabia aos congressistas,

diante das atuais condições sociais, econômicas e culturais do país, rever os

2 Paulo Freire (1921-1997) reconhecido pelas contribuições à educação brasileira, com atuação e reconhecimento

internacionais. Conhecido principalmente pelo método de alfabetização de adultos que leva seu nome, ele

desenvolveu um pensamento pedagógico assumidamente político. Para Freire, o objetivo maior da educação é

conscientizar o aluno. Isso significa, em relação às parcelas desfavorecidas da sociedade, levá-las a entender sua

situação de oprimidas e agir em favor da própria libertação.

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objetivos da educação dos adultos e fixar novas diretrizes, tendo em vista o

empenho do atual governo no sentido de orientar a educação em todos os

níveis e grau de desenvolvimento (p. 235).

Apesar dos esforços para instaurar uma reflexão pedagógica em torno do

analfabetismo, as campanhas de educação de adultos ocorridas nesse período, não

conseguiram dar conta de produzir uma proposta metodológica específica para este público.

Experiências educativas organizadas por diversos atores e com aparato governamental, com o

objetivo de contribuir na construção de uma sociedade mais justa e democrática, começaram a

surgir na década de 1960, através da organização de grupos populares, sindicatos e

movimentos sociais (VIEIRA, 2006).

Neste contexto, começaram a surgir no território nacional, em especial no Nordeste,

expressivos movimentos de educação e cultura popular, entre os anos de 1961 e 1963, com

base nas ideias de Paulo Freire que tinha uma preocupação em oferecer uma educação de

adultos politizadora, voltada para a transformação social, conscientizando os indivíduos da

realidade que os cerca. Este período, denominado por Haddad e Di Pierro (2000, p. 111) como

“período de luzes”; começou a considerar as peculiaridades dessa modalidade, que até então,

era desenvolvida através de recursos transplantados do ensino com crianças.

Na conjuntura política e econômica, o país passava por uma efervescência que

possibilitou a emergência de movimentos populares voltados para a educação de adultos. Para

Vieira (2006):

Tais movimentos são representativos das condições sociais e econômicas do

país e das lutas e mobilizações do período, operando um salto qualitativo em

relação às campanhas desenvolvidas pela União. O que os tornava

radicalmente diferentes das propostas anteriores era o compromisso político

explícito, assumido com os grupos oprimidos da sociedade e sua orientação

direcionada à transformação das estruturas sociais. Grande parte dessas

experiências era desenvolvida por instituições da sociedade civil com o

apoio do Estado, em suas diferentes estâncias (p. 111).

Dentre estas campanhas, se sobressaíram o Movimento de Educação de Base (MEB)3

que foi organizado pela Conferência Nacional dos Bispos, e patrocinado pelo governo federal

em 1961; o Movimento de Cultura Popular da Prefeitura de Recife4 (MCP); os Centros

3 Para maiores informações sobre o MEB, indicamos http://www.meb.org.br/index.php/quem-somos

4 Para maiores informações sobre as Campanhas, indicamos: http://forumeja.org.br/edupopular

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Populares de Cultura, órgãos culturais da União Nacional dos Estudantes; a Campanha de Pé

no Chão Também se Aprende a Ler, da Secretaria Municipal de Natal; a Campanha Nacional

da Educação Rural (CNER), que funcionou de 1952 a 1963; o Programa Nacional de

Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, que contou com a participação do

professor Paulo Freire (Rocha, 2010).

Sobre estes projetos, Rocha (2010) menciona que a nova forma de pensar a Educação

de Adultos, propunha um tratamento didático e pedagógico específico. Assim a Educação de

Adultos se torna um forte instrumento de valorização da cultura popular e de ação política.

Em consonância com este pensamento, Paulo Freire contrapunha a educação bancária com a

problematizadora; para ele, o homem não é um ser passivo, ignorante e vazio, mas, sujeito da

aprendizagem. Nesta perspectiva, a educação deve estabelecer uma relação dialética, partindo

do contexto real do educando, valorizando seus saberes e sua cultura. Segundo Freire (1987)

“Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si,

mediatizados pelo mundo” (p. 39). Sobre isto o autor ainda cita que “para o educador-

educando, dialógico, problematizador, o conteúdo programático da educação não é [...] um

conjunto de informes a ser depositado nos educandos, mas a revolução organizada,

sistematizada e acrescentada ao povo, daqueles elementos que este lhe entregou de forma

desestruturada” (p.47).

Dentro desta perspectiva, Paulo Freire, como responsável do projeto de educação

MCP, sentiu a necessidade de organizar materiais de alfabetização, que contemplavam os

aspectos da realidade dos alunos com a intenção de problematizar tal realidade. Os educandos

eram concebidos como sujeitos da ação desenvolvida. O projeto Angicos por ele desenvolvido

em 1963, diante do seu êxito ganha projeção nacional e influencia em 1964 o Plano Nacional

de Alfabetização (PNA) decreto nº 53.465, favorável a utilização de cartilhas e aceitação do

método Paulo Freire como instrumento do PNA (PAIVA, 2003).

Os primeiros meses de 1964 foram constantemente ameaçados pela nova conjuntura

política, e os movimentos que visavam a politização dos estudantes foram abandonados,

resultando na extinção prematura do Plano Nacional de Alfabetização (PNA), como explica

Soek (2010):

Com o reordenamento político para proporcionar condições de

desenvolvimento do modelo capitalista, a educação básica para jovens e

adultos ficou nas mãos de governos autoritários, a partir do ano de 1964,

havendo repressão direta aos trabalhos envolvidos com a Educação Popular

proposta por Paulo Freire (p. 22).

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Durante este período várias mudanças políticas e sociais, sobretudo, na educação de

adultos, se fizeram presentes: os movimentos em prol da alfabetização e que fortaleciam a

cultura popular foram proibidos e os materiais utilizados, confiscados. Esses materiais foram

vistos como uma grave ameaça à ordem e seus promotores foram duramente reprimidos,

(BRASIL, 2001, p. 26). Ainda segundo o documento, os programas de alfabetização de

adultos, continuavam acontecendo de forma assistencialista e conservadora. Em 1967, dentre

estes programas, o governo passou a desenvolver o sistema MOBRAL (Movimento Brasileiro

de Alfabetização), uma metodologia que tecnicamente se aproximava do que era proposto por

Paulo Freire, entretanto, deixava de lado a autonomia, a problematização e reflexão.

Em 1985, com a redemocratização do país, o MOBRAL foi extinto e como lembra

Gadotti (2008, p. 36), foi criada a Fundação Educar, que não possuía os recursos do

MOBRAL, mas tinha objetivos mais democráticos.

Na Constituição de 1988, em seu artigo 208, a Educação de Jovens e Adultos tem a

primeira referência, na garantia de ensino público obrigatório. De acordo com Capucho

(2012) “No Brasil pós-ditadura, esse direito alçou legalidade com a Constituição de 1988, a

qual assumiu o ensino básico obrigatório e gratuito como direito público subjetivo, estendido

para todos (as), inclusive aos que a ele não tiveram acesso na idade própria” (p. 22).

Nesse sentido, a luta pela igualdade e o enfrentamento às diversas formas de exclusão,

resultaram na garantia da Educação de Jovens e Adultos como modalidade da Educação

Básica. Os sistemas públicos de ensino ficaram responsáveis pela oferta, acessibilidade e

permanência de jovens e adultos na escola, criando ações integradas e complementares, a fim

de garantir oportunidades educacionais e qualidade no ensino (CAPUCHO, 2012, p. 22). A

autora ainda faz referência à educação de adultos como um direito humano; para ela, jovens e

adultos devem ser reconhecidos como sujeitos de direitos e a modalidade de ensino que

atende a esse público, deve ter papel prioritário dentro dos investimentos e políticas

afirmativas no campo educacional.

Isso quer dizer, situações as quais para igualização dos desiguais se faça

necessário tratamento desigual, o que sem dúvida é o caso da Educação de

Jovens e Adultos, a qual demanda um tratamento diverso ao atribuído à

educação dita regular, em virtude da dívida histórica para com a educação do

(a) estudante trabalhador (a) (CAPUCHO, 2012, p. 23).

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Nesta perspectiva foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(Lei 9.394/96), que estabeleceu no artigo II, seção V, a Educação de Jovens e Adultos,

reafirmando o direito dos trabalhadores ao ensino básico gratuito:

Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não

tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio

na idade própria. § 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos

jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular,

oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do

alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e

exames. § 2º O poder público viabilizará e estimulará o acesso e a

permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e

complementares entre si (BRASIL, 1996).

Diante das afirmações, podemos ressaltar além da oferta de vagas, o reconhecimento

das especificidades e interesses dos sujeitos envolvidos, levando em consideração suas

experiências, saberes, condições de vida e de trabalho. Entretanto, as ações em relação a EJA,

apresentadas na LDB não trouxeram melhorias com grandes significados e as políticas

educacionais para esta modalidade ainda caminham a passos lentos. Sobre isto, Rogerro

(2013), cita que:

A Educação de Jovens e Adultos tem sido uma das temáticas em educação

com menor avanço efetivo ao longo da história do sistema educacional

brasileiro. Ao público menos favorecido socioeconomicamente, tem restado

o reconhecimento do menor favorecimento, mas não têm sido direcionadas

políticas capazes de superar o problema do acesso, permanência e conclusão

de uma parcela ainda significativa da população brasileira (p. 41).

Diante do desenrolar histórico e político da Educação de Jovens e Adultos no Brasil,

percebe-se que apesar do reconhecimento como modalidade de ensino, os sujeitos que a

constitui, possuem peculiaridades que ainda precisam ser reconhecidas. De acordo com Lima

e Silva (2015), o educando da EJA está inserido no mundo do trabalho e das relações

interpessoais, desse modo deve ser considerada a sua longa história, carregada de

experiências, conhecimentos acumulados e reflexões, possibilitando aos mesmos diferentes

habilidades e capacidade de refletir sobre o conhecimento e seu processo de aprendizagem.

As escolas que recebem os estudantes da EJA, atualmente estão respondendo ao primeiro

elemento constituinte da modalidade que é o acesso à escolarização, entretanto deve ainda

prover-se de mecanismos pedagógicos e políticos que possibilitem a permanência desses

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estudantes na instituição escolar, diminuindo a evasão e proporcionando a conclusão da

educação básica.

Seguindo este pensamento, a EJA além de ser uma política educacional deve oferecer

condições sociais que elevem o índice de ensino daqueles que não tiveram acesso ou a

possibilidade de concluir seus estudos na idade certa. De acordo com o parágrafo segundo do

artigo 37 da LDB, a população deve ter acesso a essa modalidade de educação, com condições

dignas de funcionamento que favoreçam o acesso à inclusão social, melhoria na qualidade de

vida pessoal e profissional além do fortalecimento da cidadania.

A EJA é um território de encontros e desencontros devido à heterogeneidade que é

constituída. As experiências diárias são permeadas de sentidos e significados e a escola é

concebida como espaço de construção de identidade. Nessa perspectiva torna-se necessário

que o jovem e o adulto além de aprender a linguagem escrita, seja um sujeito histórico,

atuante em sua sociedade, ciente dos seus direitos e deveres. Essa formação, Ponte (2012)

chama de recolocação; é a superação da condição de marginalizados para uma recolocação

nas esferas sociais e culturais, das quais antes não participava de maneira efetiva,

constituindo-se como sujeito histórico.

Enfim, através do caminhar histórico pela trajetória da Educação de Jovens e Adultos no

Brasil, é possível perceber que o desenrolar histórico da educação está atrelado ao contexto

político e histórico vivenciado. É notório verificar que as conquistas no âmbito da educação

de adultos são realizadas a passos lentos e com entraves que impedem seu real avanço.

Atender as necessidades deste público é ter um olhar voltado a entender as especificidades

que o cerca, compreendendo os motivos que levaram os estudantes ao afastamento da

instituição escolar e quais as expectativas dos mesmos ao retornarem à instituição.

OUVIR PARA COMPREENDER: A IMPORTÂNCIA DE DAR ECO A VOZ DOS

ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Não é no silêncio que os homens se

fazem, mas na palavra, no trabalho, na

ação-reflexão.

(FREIRE, 1987, p. 78).

Buscar compreender o sujeito da Educação de Jovens e Adultos é enxergar nele a

capacidade de atuar politicamente na tentativa de circunscrever a marca da marginalização

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que recai sobre eles advinda da trajetória de abandono escolar ou até mesmo da falta de

oportunidade de frequentar a escola enquanto criança. Considera-se importante compreender

não apenas as questões estruturais, mas, numa perspectiva de totalidade do processo de

representação, busca-se interpretar as diferentes formas que o sujeito se relaciona com o

objeto de representado.

Considera-se importante para o estudo, o valor do discurso do estudante da EJA, suas

concepções e interpretações acerca do objeto representado, neste caso, a escola. Para Freire

(1987), a dialogicidade implica em um pensamento crítico que busca uma educação libertária

e conscientizadora levando os homens a terem consciência de si e do mundo.

Oportunizar a estes estudantes a inserção na instituição é um direito que deve ser

efetivado através da atuação efetiva de políticas sociais, nesse sentido, ressaltamos a

realização da 6ª Conferência Internacional de Jovens e Adultos (CONFINTEA VI) em Belém

do Pará, no ano de 2009, com o objetivo de dialogar e avaliar as políticas públicas que

favorecem a educação e o aprendizado de jovens e adultos. O documento final do evento5

aponta a diversidade encontrada no público que frequenta tal modalidade de ensino e

demonstra a necessidade de ouvir os sujeitos, saber quem eles são, o que pensam e quais seus

desejos e expectativas. Através das suas falas torna-se possível uma tomada de atitude frente a

esta modalidade, levando-a a uma educação emancipadora.

Dar voz aos educandos é uma maneira de conhecer sua cultura. Abdalla (2004), afirma

que é necessário aprender a ouvi-los se tivermos a intenção de promover projetos e políticas

que respondam às suas necessidades. Isto significa não inferiorizar os jovens e adultos que

procuram a escola em busca do direito, que outrora lhe foi negado, mas, oferecer uma

modalidade de ensino voltada para um público específico. Conhecer como jovens e adultos

pensam, possibilita ações em torno desta modalidade.

A pesquisa desenvolvida por Lima e Silva (2015) aponta que as concepções dos

educandos, podem representar seus interesses e para efetivação de práticas significativas na

EJA, sejam políticas ou pedagógicas, é necessário conhecer as expectativas dos educandos em

relação à escola e qual motivo fez com que eles retornassem a ela. Sobre isto, Abdalla (2004)

cita que “é necessário ouvir as falas para compreender o dia-a-dia da escola. Quando esses

alunos falam, é como se pintassem um quadro do cotidiano, das coisas que acontecem, dos

significados que elas assumem, do que eles vivenciam e pensam sobre o vivenciado” (p. 74).

5 Documento disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/confitea_docfinal.pdf

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Partindo desse pensamento, percebemos que o educando que retorna à escola nas

turmas de EJA, busca dominar a leitura e a escrita como forma outra forma de “ver o mundo”,

além de buscar uma ascensão social através de qualificações profissionais e autonomia em sua

vida diária. Amorim (2009) em sua pesquisa sobre as expectativas dos educandos da EJA cita

que:

Em relação às expectativas dos alunos, observamos que os mesmos já

manifestavam seus interesses de aprendizagem na escola quando

explicavam as razões pessoais pelas quais resolveram voltar a estudar.

Nesse sentido, constatamos, em seus discursos, que seus desejos de

aprender nesse espaço institucional não estão dissociados das práticas

nas quais esses indivíduos estão inseridos ou de seus interesses

particulares (p. 49).

Nesse sentido, o que os estudantes esperam da escola mostra-se, de forma subjetiva,

ligado às suas práticas e interesses pessoais, e seus anseios estão pautados em encontrar um

ambiente que atenda às suas necessidades, considerando que o público que frequenta a EJA,

são em sua maioria trabalhadores que esperam encontrar uma escola aberta para recebê-los e

professores prontos para ouvi-los. Gomes (2007) aponta a importância de reconhecermos os

estudantes da EJA enquanto grupos que possuem características próprias que devem ser

levadas em consideração em seu processo de escolarização e chama a atenção para

reconhecermos que essas características não se limitam a faixa etária, mas tratam-se de

sujeitos que retornam à escola, ou a procuram pela primeira vez, a fim de apagar as marcas da

exclusão que carregam por longos anos.

O cenário atual da EJA de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais da

Educação Básica (BRASIL, 2013), busca prover os sistemas educativos de instrumentos que

possibilitem o acesso de jovens e adultos a uma formação de qualidade, respeitando suas

condições sociais. Portanto, a Educação de Jovens e Adultos não deve ser pensada com menos

prioridade, mas, deve-se tratar em caráter contínuo o desgaste educacional advindo do

afastamento escolar ocasionado por várias razões e garantir a estes estudantes o direito básico,

permitindo uma integração produtiva na vida social e o pleno exercício da cidadania.

A partir da década de 1990, o poder público no Brasil voltado para área da educação,

passou a ter uma preocupação maior com a universalização da Educação Básica e a

erradicação do analfabetismo. Esses dois focos no desenvolvimento de políticas públicas

acabam repercutindo no desenvolvimento de um maior interesse de pesquisadores e

estudiosos da área de educação sobre os marginalizados históricos dentro desses dois

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aspectos. Desta forma, o campo de estudos na Educação de Jovens e Adultos (EJA) passou a

ter sobre si um holofote para o desenvolvimento de pesquisas.

Apesar do crescente número de estudos realizados na Educação de Jovens e Adultos,

ainda são poucos os estudos que buscam ouvir os estudantes, seus anseios, desejos e

expectativas para que sejam tomadas atitudes que venham atenuar a evasão escolar que

persiste em rodear o território da EJA. Por essa razão, buscamos em nosso estudo, avançar no

sentido de dar vez e voz aos sujeitos, apreendendo como eles pensam à escola, o que esperam

dela e como a representam socialmente.

Nesse sentido, entende-se que a universidade tem um importante papel em apresentar,

estudar e considerar a realidade da EJA, sobretudo nos cursos de Pedagogia, visando

aproximar professores em formação à complexidade desta modalidade de ensino.

Com o objetivo de conhecer as produções acadêmicas que apresentam a EJA como

objeto ou campo de estudo no âmbito do curso de Licenciatura em Pedagogia da

UFRPE/UAG, foi realizado um levantamento dos trabalhos de monografia, através de um

recorte temporal definido. Com o objetivo de sistematizar esse campo de

conhecimento, apresentam-se as pesquisas realizadas entre os anos de 2009 a 2015;

considerando todas as monografias de conclusão do Curso de Pedagogia na Unidade

Acadêmica de Garanhuns.

O levantamento foi realizado a partir das análises dos resumos das pesquisas dispostas

no acervo da biblioteca da UAG/UFRPE. Do total de cento e oitenta (180) monografias

localizamos doze (12) pesquisas cujo objeto ou campo de estudo é a Educação de Jovens e

Adultos. Duas (2) pesquisas foram realizadas em 2009 (SILVA e JUNIOR 2009; CORRÊA e

JUNIOR, 2009); quatro (4) realizadas em 2011 (COSTA e BASTOS, 2011; MARQUES e

GOMES, 2011; SILVA e GOMES, 2011a; SILVA e GOMES, 2011b); duas (2) realizadas em

2013 (SOUZA e VASCONCELOS, 2013; NUNES e BASTOS, 2013), (2) duas em 2014

(ARAÚJO e VASCONCELOS,2014; SILVA e EUGÊNIO, 2014) e duas (2) em 2015 (LIMA

e SILVA, 2015; COUTO e EUGÊNIO, 2015). Oito (8) estudos voltaram seu olhar para a

prática pedagógica, dois (2) se debruçaram sobre o estudo acerca de práticas inclusivas na

EJA e apenas dois (2) tiveram como objetivo se aproximar das concepções dos estudantes da

EJA acerca de objetos da área educacional. A pesquisa de Lima e Silva (2015) analisou as

concepções dos educandos da EJA sobre o uso de jogos de alfabetização e a pesquisa de

Couto e Eugênio (2015) propôs avaliar a utilização de jogos voltados para o ensino das

Estruturas Aditivas.

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Sobre a importância de escutar os educandos da EJA para compreender seus anseios e

concepções, corroboramos com Lima e Silva (2015) ao afirmar que as concepções deles

podem inferir e auxiliar no processo de ensino e aprendizagem e para que haja práticas

efetivas na EJA, é necessário conhecer as expectativas dos estudantes em relação à escola e o

que eles esperam dela. O autor ainda enfatiza que conhecer como e por que os estudantes

aprendem, contribui para uma reflexão sobre as necessidades e especificidades desses sujeitos

e para a elaboração de proposições sobre as concepções deles em relação às metodologias

usadas nas aulas. Portanto, conhecer as concepções pode auxiliar no processo de ensino e

aprendizagem.

Em consonância com este pensamento, Couto e Eugênio (2015) destaca que entender

o educando da EJA dentro de suas especificidades e diversas mudanças, ajuda na elaboração

de propostas que passem de fato a atender as necessidades particulares desse público. Para o

autor, a escola que se apropria da prática de escutar os anseios dos educandos, possibilita o

desenvolvimento de sua prática e alcança objetivos propostos para atender a esta modalidade,

principalmente, em relação ao respeito e a valorização desses alunos agregando esses valores

ao seu cotidiano.

Diante desses resultados, foi possível observar que as pesquisas envolvendo a

Educação de Jovens e Adultos ainda não ganham destaque na Unidade Acadêmica de

Garanhuns (UAG/UFRPE). Apontamos a necessidade de mais estudos voltados para esta

modalidade, tendo em vista que a mesma é palco de atuação do pedagogo, além de ser

garantida pela legislação educacional e necessitar de políticas afirmativas para a garantia de

respeito às suas especificidades e necessidades educativas.

Nossa pesquisa, a fim de conhecer os sentidos atribuídos à escola através de um estudo

articulado com a Teoria das Representações Sociais, avança no sentido de dar vez e voz aos

estudantes da EJA, buscando nos aproximarmos dos saberes subjetivos relacionados com o

objeto de representação. Através das comunicações dos sujeitos, compreende-se que os

processos educativos observados pela lente da Teoria das Representações Sociais, se

constituem como um campo privilegiado para compreender como as representações de um

determinado objeto, são construídas e evoluídas no meio de um grupo social.

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A ESCOLA COMO OBJETO DE ESTUDO

... Escolas que são asas não amam

pássaros engaiolados. O que elas amam

são pássaros em voo. Existem para dar

aos pássaros coragem para voar. Ensinar o

voo, isso elas não podem fazer, porque o

voo já nasce dentro dos pássaros. O voo

não pode ser ensinado. “Só pode ser

encorajado”.

Rubem Alves

Tendo a escola como objeto de representação, consideramos necessário um estudo

focado sobre a mesma a fim de identificar suas funções, mais precisamente, as funções que

ela desempenha na Educação de Jovens e Adultos. Ponte (2012) em seu estudo apresenta as

aproximações históricas da escola enquanto instituição de ensino. Considerada como lugar de

ócio, as escolas eram espaços para reflexão; apenas entre os séculos XIX e XX começaram a

surgir as escolas no padrão que temos hoje, com aulas separadas por disciplinas.

A escola é constituída como espaço único e, sendo ela instituição social, contribui para

transformação social dos indivíduos. Gadotti (2007) entende a escola não só como espaço

físico, mas acima de tudo, um modo de ser e ver, definida pelas relações sociais que

desenvolve. O autor ressalta a importância da educação para a formação da cidadania e o

preparo para o trabalho. Sacristán e Gomez (2000), em consonância com este pensamento,

citam que o objetivo básico e prioritário da socialização dos alunos na escola é prepará-los

para sua incorporação no mundo do trabalho e sua intervenção na vida pública.

Compreende-se a educação como instrumento de transformação, para isto, é

necessário que o caminho histórico percorrido seja aspirante a esta mudança, proporcionando

meios para garantir uma intervenção e possível ascensão social. Sobre isto, Paiva (2003) cita

que “a educação pode ser um instrumento importante para a conservação ou para a mudança

social: os que detêm o poder tentam fazer dela um instrumento de conservação, enquanto seus

opositores tentam utilizá-la como instrumento de mudança” (p. 46).

Nesse contexto e diante da sociedade de múltiplas oportunidades de aprendizagens,

torna-se necessário aprender a pensar de maneira autônoma e saber articular o conhecimento

com a prática de outros saberes aceitando as características de uma sociedade com inevitáveis

diferenças individuais. “A escola deve prover os indivíduos não só, nem principalmente, de

conhecimentos, ideias, habilidades e capacidades formais, mas também, de disposições,

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atitudes, interesses e pautas de comportamento. Assim, tem como objetivo básico a

socialização dos alunos” (SACRISTÁN; GOMÉZ, 2000, p. 19). Sobre isto Libâneo (2005)

também cita que “a educação de qualidade é aquela mediante a qual a escola promove, para

todos, o domínio do conhecimento e o desenvolvimento de capacidades cognitivas e afetivas

indispensáveis ao atendimento de necessidades individuais e sociais dos alunos” (p. 117).

Em relação à Educação de Jovens e Adultos, corroboramos com os autores citados

quando entendem o ambiente escolar não apenas como espaço físico ou local de transmissão

de conteúdos, mas, local de troca de aprendizagem, de socialização, interação e

subjetividades. Um lugar de vida, que recebe pessoas em busca de olhar o mundo com outros

olhos, através da transformação social que ela pode proporcionar enxergando o indivíduo

como ser inacabado, inconcluso, que está buscando novas oportunidades.

Saul (2013) se refere à escola dentro da perspectiva proposta por Paulo Freire; a escola

como lugar sério, voltado para a formação social e crítica, e apropriação do conhecimento,

sem deixar de ser um lugar alegre e estimulador. A autora faz referência a abertura da escola à

comunidade, a participação do educando e o respeito aos seus saberes, atitudes que

consideramos indispensáveis na escola que recebe estudantes da EJA; sujeitos repletos de

saberes adquiridos através das suas vivências.

Nesse sentido, a educação deve ser entendida para além das letras, é o pressuposto da

leitura do mundo e do entendimento da realidade social do indivíduo, dando sentido ao

processo de aquisição da leitura e da escrita, motivos pelos quais os estudantes, em sua

maioria, procuram a EJA. Desse modo, a educação se apresenta numa perspectiva de

mudança e ascensão social (ABRANCHES, 2013), o contrário disso ao invés de abrigar e

incluir os estudantes, podem levá-los a permanecer no quadro de exclusão que desde muito

cedo estão inseridos

Os alunos ou estudantes provenientes das famílias mais desprovidas

culturalmente têm todas as chances de obter, ao fim de uma longa

escolaridade, muitas vezes paga com pesados sacrifícios, um diploma

desvalorizado; e, se fracassam o que segue sendo seu destino mais provável,

são votados a uma exclusão, sem dúvida, mais estigmatizante e mais total do

que era no passado. (BOURDIEU,1998, p. 221)

A escola pensada para EJA deve proporcionar o diálogo dos estudantes e a sua escuta,

sendo estas características de fundamental importância para que haja a interação entre as

visões de mundo. Estes sujeitos devem ser instigados a falar, rompendo o silenciamento que

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muitas vezes carregam consigo e consigam compreender o espaço escolar como um lugar

facilitador de seus anseios, evitando assim o fracasso e a marginalização.

Ferreira (2007) cita que “a escola como ambiente educativo e espaço de formação de

pessoas, é construída por uma diversidade de atores que pensam e agem no cotidiano,

formando uma rede de relações que se define com base em uma cultura própria e repleta de

significados” (p.65). São esses significados que buscamos apreender através deste estudo,

entendemos que as práticas elaboradas no cotidiano escolar tornam cada realidade única, e

este cotidiano é um ambiente onde são formalizadas práticas sociais que sofrem influências

exteriores. De acordo com Gadotti (2007), “a escola é um espaço de relações. Neste sentido,

cada escola é única, fruto de sua história particular, de seu projeto e de seus agentes. Como

lugar de pessoas e de relações, é também um lugar de representações sociais” (p. 11), sendo

assim, a escola que recebe estudantes da EJA, deve partir dos elementos que compõem as suas

realidades, fazendo-os compreender as contribuições qualitativas que o aprendizado escolar

pode oferecer para sua vida social.

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CAPÍTULO II - A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

As representações são resultado de um contínuo

burburinho e um diálogo permanente entre

indivíduos, um diálogo que é tanto interno quando

externo, e durante o qual as representações

individuais ecoam ou são complementadas.

(MOSCOVICI, 2003, p. 31).

Este capítulo tem o objetivo de introduzir a Teoria das Representações Sociais e suas

principais definições e abordagens, além de contemplar as contribuições da teoria no campo

educacional, sobretudo nas pesquisas realizadas na Educação de Jovens e Adultos, nosso

campo de pesquisa.

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: BREVE HISTÓRICO, DEFINIÇÕES E ABORDAGENS

As representações sociais são fenômenos cognitivos

e sociais, resultantes das relações e interações

sociais estabelecidas pelos indivíduos; portanto, a

comunicação exerce papel fundamental, no processo

de sua construção.

(MACHADO, 2013, P. 18)

A noção de Representação Social surge na Europa a partir da publicação do estudo

sobre a representação social da Psicanálise, do psicólogo social francês Serge Moscovici, em

1961. O objetivo era compreender como o conhecimento do senso comum é produzido

socialmente. Segundo o autor, a representação social tem a função de elaborar

comportamentos e comunicações entre os indivíduos. Sistematizando a obra de Moscovici,

Jodelet (2001b), principal colaboradora para o aprofundamento da referida teoria, conceitua as

Representações Sociais como

uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um

objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum

a um conjunto social. Igualmente designada como saber de senso comum ou

ainda saber ingênuo, natural, esta forma de conhecimento é diferenciada,

entre outras, do conhecimento científico. Entretanto, é tida como um objeto

de estudo tão legítimo quanto este, devido à sua importância na vida social é

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à elucidação possibilitadora dos processos cognitivos e das interações sociais

(p. 22).

As Representações Sociais são formas de pensar como os fenômenos acontecem no

cotidiano e apresentar posições em relação a situações, eventos e objetos. É o sentido dado a

alguém ou a alguma coisa, ajudando a construir a realidade de maneira concreta através da

comunicação estabelecida entre os sujeitos e suas posições, em relação a eventos e objetos.

Para Moscovici (2009) citado por Sales (2012) “representar significa, a uma vez e ao

mesmo tempo, trazer presentes as coisas ausentes e apresentar coisas de tal modo que

satisfaçam as condições de uma coerência argumentativa, de uma racionalidade e da

integridade normativa do grupo” (p. 65). Desse modo, as representações emergem da vida

cotidiana e explicam o modo como os sujeitos compreendem e relacionam-se com o objeto

representado.

De acordo com Albuquerque e Machado (2011), a Teoria das Representações Sociais

têm sua contribuição voltada para a valorização do conhecimento existente entre o indivíduo e

o social. Para dar sentido à realidade que os cercam, os homens criam representações que

partem do senso comum e são coletivamente elaboradas entre sujeito-sujeito e sujeito-

instituição, colocando em evidência o que até então era desconhecido, explicando a realidade

e orientando as ações e o comportamento dos sujeitos mediante o objeto, assim como aponta

Machado (2013), segundo a autora, desse processamento de informações surgem as

representações sociais que são partilhadas e dão identidade aos sujeitos e aos grupos.

Conceituar representações sociais não constitui uma tarefa fácil, pois este fenômeno se

ajusta segundo Machado (2013) em três dimensões: informação, campo de representação e

atitude. A informação é uma dimensão indispensável para que sejam conhecidas as

representações que circulam entre um determinado grupo. O campo de representação são as

informações significativas e sistematizadas do objeto, compondo elementos que dão

significado à representação. A atitude refere-se à tomada de posição dos sujeitos em relação

ao objeto. Portanto, informação, campo de representação e atitude constituem-se de um elo

que dão forma às Representações Sociais. O pesquisador precisa conhecer os significados

atribuídos e partilhados pelos sujeitos que representam, depois deve fazer uma sistematização

das informações encontradas para compreender a tomada de posição diante das

representações.

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De acordo com Moscovici (2012) citado por Machado (2013), a representação social

tem a finalidade de tornar o que é estranho em familiar. Isto significa atribuir sentido àquilo

que ainda é desconhecido. As representações não são partilhadas de uma mesma forma por

todos, elas contêm elementos culturais que fazem com que essas informações sejam de base

comum, porém, particular a cada um. A referida autora cita que:

as representações sociais constituem significados que as pessoas

utilizam para entender o mundo, construções mentais elaboradas

mediante a atividade simbólica do sujeito no processo de comunicação

social, que servem de orientação para seus comportamentos e ações

(p. 18).

A comunicação é apresentada como importante para a construção das representações

sociais. Machado (2013) cita Abric (1994), afirmando que o autor coloca a informação com

um duplo papel, tornar o estranho familiar e o invisível perceptível. As relações que os

indivíduos estabelecem resultam em trocas e interações, que levam a instituição de um

pensamento comum, partilhado socialmente. A autora discorre sobre alguns aspectos que

evidenciam a importância da comunicação para a criação das representações sociais. Em

primeiro lugar são apresentados três níveis do processo representacional, analisado por

Jodelet (2001b): emergência das representações sociais, processos de formação e edificação

das condutas. Tentaremos explicá-los respectivamente de acordo com as contribuições de

Machado (2013). A emergência das representações sociais está focalizada nos aspectos dos

interesses e implicações dos sujeitos a partir da posição tomada frente ao objeto. Essas

posições são formadas mediante dois processos simultâneos e dinâmicos: a objetivação

(informações e ideias exteriorizadas e materializadas) e a ancoragem (atribuição de sentidos e

caracterização do objeto).

As representações sociais constituem uma ligação entre o conhecimento de senso

comum e o conhecimento científico. Essa ligação se dá, de acordo com Barra Nova (2011)

simultaneamente, através de dois mecanismos indispensáveis para a sua construção: a

ancoragem e a objetivação. A objetivação torna concreto, conhecimentos abstratos, traz à tona

o invisível, é a materialização do objeto representado. A ancoragem dá sentido às ideias, aos

conhecimentos que se tornam visíveis e conhecidos, assim como afirma a autora “A

ancoragem, por sua vez, amarra definitivamente ideias, objetos e categorias estranhas ao

pensamento de base do sujeito, trazendo-os assim para um contexto conhecido” (BARRA

NOVA, 2011, p. 20). Assim, aquilo que parecia estranho, torna-se familiar.

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Nesta perspectiva, o referencial teórico-metodológico da Teoria das Representações

Sociais em que se fundamenta a nossa pesquisa, dá suporte para compreender os aspectos

pessoais e sociais que contribuem para a construção das representações dos estudantes da

Educação de Jovens e Adultos sobre a escola. Através da comunicação mediatizada pela

linguagem, os estudantes, constituídos como seres sociais, históricos e políticos, constroem

suas representações e nos ajudam a apreender as formas de se relacionarem com o mundo e de

representar o objeto de estudo.

A abordagem das representações sociais contribui para a compreensão de processos

educativos, possibilitando conhecer os significados que são atribuídos no espaço escolar,

tornando um objeto distante, familiar. A referida teoria ainda auxilia na observação de como

as representações são construídas em determinados grupos sociais, como se dá sua evolução e

transformação.

Entende-se que a escola é um lugar de interação e de comunicação, onde há a

possibilidade de se encontrar representações.

Nesta perspectiva o referencial teórico-metodológico da Teoria das Representações

Sociais, em que se fundamenta a nossa pesquisa nos dá suporte para compreender os aspectos

pessoais e sociais que contribuem para a construção das representações dos estudantes da EJA

sobre a escola. É propício estudos através da Teoria das Representações Sociais para que

possamos conhecer os saberes compartilhados por determinados grupos sociais, diante da

complexidade das relações estabelecidas hoje em dia e compreender com mais propriedade as

relações traçadas entre os sujeitos que representam e o objeto representado. Neste estudo o

objetivo é se aproximar das representações sociais de escola dos estudantes da Educação de

Jovens e Adultos no município de Garanhuns/PE.

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CAPÍTULO III - METODOLOGIA DA PESQUISA

A metodologia é de importância significativa para a pesquisa científica, ela determina

os passos que o pesquisador irá percorrer para alcançar os objetivos estabelecidos. Lakatos e

Marconi (2001) definem método como um conjunto de atividades sistemáticas e racionais que

favorecem o alcance de objetivos, traçando o caminho a ser trilhado, detectando possíveis

erros e auxiliando na tomada de decisões do pesquisador. Portanto, definir os métodos que

serão utilizados para responder aos objetivos propostos é fator primordial na pesquisa.

Este capítulo apresenta nossa abordagem metodológica e o percurso trilhado para

alcançarmos os objetivos do nosso estudo e respondermos a problemática da nossa pesquisa.

Ele está dividido em quatro partes, inicialmente apresentamos o tipo de pesquisa utilizado, em

seguida os cenários de pesquisa. Na terceira parte apresentamos os sujeitos de pesquisa e por

último os instrumentos de coleta e análise dos dados.

TIPO DE PESQUISA

O estudo que desenvolvemos propôs apreender as representações sociais de escola

partilhadas entre estudantes da Educação de Jovens e Adultos. A Teoria das Representações

Sociais é o que dá suporte ao estudo em questão, e considera a Representação Social “um tipo

de conhecimento, socialmente elaborado e partilhado, com um objetivo prático, e que

contribui para construção de uma realidade comum a um conjunto social” (JODELET, 2001a

p.22). Para isto, este estudo se insere na perspectiva de uma pesquisa de campo, qualitativa do

tipo etnográfica que, segundo Severino (2007), “visa compreender, na sua cotidianidade, os

processos do dia-a-dia em suas diversas modalidades. Trata-se de um mergulho no

microssocial, olhado com lente de aumento” (p.119). Compreende-se que o ambiente natural

proporciona uma observação das pessoas e das circunstâncias em que ocorrem os fatos,

possibilitando uma visão além dos dados objetivos, aproximando-se das discussões com

ilustrações de elementos subjetivos. A proposta de desenvolvermos um estudo do tipo

etnográfico se justifica pelo interesse de nos aproximarmos do objeto de estudo, a escola em

sua complexidade e manifestações.

A abordagem qualitativa, segundo Minayo (1994) citada por Barra Nova (2011),

trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, valores, crenças e atitudes, o

que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que

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não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (p. 89). Assim, buscamos

compreender as Representações Sociais de escola partilhadas por estudantes da EJA e

compreender como estes se relacionam com a instituição escolar e qual a importância ela

desempenha para sua vida social.

OS CENÁRIOS DA PESQUISA

Constituíram-se como cenários da nossa pesquisa, duas (02) escolas da Rede

Municipal de ensino de Garanhuns/PE. Convém salientar que o critério utilizado para a

seleção das escolas foi o fato de oferecerem a modalidade da EJA e constituírem o

desenvolvimento de nosso estudo. Conhecer os cenários da pesquisa é importante para

compreender o objeto de representação do nosso estudo.

Como forma de facilitar o tratamento dos dados e preservar a identidade das

instituições, atribuímos às escolas, as seguintes denominações: Cenário 1 e Cenário 2

conforme descrições abaixo.

Para o desenvolvimento da pesquisa fizemos o primeiro contato com as escolas para a

apresentação da nossa proposta e assinatura da Carta de Aceite da instituição campo de

pesquisa, nas seguintes datas: 03 de março de 2015 no Cenário 1 e 16 de abril de 2015 no

Cenário 2. Nossas observações nos mostraram as peculiaridades de cada um. Sabemos que

isto influencia na forma como os alunos se posicionam e representam o objeto. Em cada

Cenário visitamos duas salas de aula, sendo uma da 1ª fase e uma da 2ª fase, totalizando

quatro turmas visitadas e quatorze estudantes entrevistados.

Para identificar os sujeitos da pesquisa nomeamos as turmas visitadas da seguinte

maneira: a turma da 1ª fase do Cenário 1, chamaremos de T1; a turma da 2ª fase do Cenário

1, chamaremos de T2. A 1ª fase do Cenário 2, chamaremos de T3 e a 2ª fase de T4. Assim,

consideramos importante apresentarmos brevemente as instituições que nos serviram de

campo de pesquisa.

O Cenário 1, está localizado no bairro da Boa Vista, um bairro que tem três escolas

municipais, que oferecem a EJA. A escola foi fundada em 1982, desde então, funciona em um

local alugado e adaptado. De início a escola funcionava apenas com duas salas de aula, hoje a

escola possui seis salas de aula construídas pela comunidade, que é bem presente na

instituição devido o local receber algumas atividades religiosas e sociais durante a semana:

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grupos de alcoólicos anônimos, grupos de orações e encontros religiosos, além de ser um

local de distribuição gratuita de leite através do Programa Social Leite para Todos. Isto faz

com que a escola seja frequentada não apenas pelos seus estudantes, mas pela comunidade

local e de bairros vizinhos.

Atendendo a 548 estudantes, o Cenário 1 possui 18 turmas distribuídas nos três

horários (manhã, tarde e noite). Nos turnos diurnos a escola atende crianças do 1º ao 5º ano do

Ensino Fundamental e no noturno atende jovens, adultos e idosos da 1ª a 4ª fase da Educação

de Jovens e Adultos. As salas são mal iluminadas, pequenas e não possuem um bom

acabamento, favorecendo um desconforto para as crianças e para os adultos.

O Cenário1 possui seis (06) salas de aula, uma (01) biblioteca, três (03) banheiros

(feminino, masculino e de funcionários), cozinha e secretaria e um salão onde acontecem as

reuniões da instituição e as realizadas pela comunidade. É importante salientar que, a Sala de

Leitura não está disponível a noite para que os estudantes da EJA façam uso, nos dias de

terça-feira, a responsável pela sala de leitura, visita as salas de aula realizando empréstimos de

livros literários. No turno da noite merenda no Cenário 1, é servida entre às 18h40min e

19h20min, isto é, na chegada dos estudantes, em seguida, eles vão para sala de aula e só saem

no final do horário. A escola não dispõe de refeitório e os estudantes se alimentam no

corredor no qual é servida a alimentação.

O Cenário 1 oferece a modalidade da EJA desde 2008, sempre no turno noturno.

Atualmente, a escola funciona com seis turmas da EJA, sendo uma da 1ª fase, uma da 2ª fase,

duas da 3ª fase e duas da 4ª fase, totalizando 170 estudantes matriculados. No total são nove

professores que lecionam nestas turmas, sendo um na 1ª fase, um na 2ª fase e sete nas 3ª e 4ª

fases, que se reversam entre as disciplinas.

De acordo com informações do secretário escolar, os professores utilizam recursos

tecnológicos (data show, notebook) e livros didáticos, que foram distribuídos aos professores

e alunos. Estes livros são escolhidos pelos professores juntamente com a Secretaria Municipal

de Educação e são obras pertencentes ao Programa Nacional do Livro Didático para Educação

de Jovens e Adultos - PNLD/EJA, distribuídos pelo Ministério da Educação para utilização

entre os anos de 2014 a 2016. Todos os alunos da EJA tem o livro didático.

Durante os dias de coleta de dados, foi possível observar que a 1ª e a 2ª fase são

constituídas por estudantes mais velhos, que não tiveram a oportunidade de estudar enquanto

crianças ou que abandonaram os estudos por um longo período, já nas 3ª e 4ª fases, estudam

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em sua maioria jovens egressos do ensino durante o dia, que devido a um histórico de

reprovações ou desistências, procuram a escola noturna após os 15 anos de idade.

O Cenário 2, está localizado no bairro de Heliópolis, a escola funciona em prédio

próprio com sete salas de aula e atualmente estão matriculados na instituição 607 estudantes,

distribuídos em 22 turmas. A escola funciona nos três horários (manhã, tarde e noite). Nos

turnos diurnos a escola recebe crianças da Educação Infantil e do 1º ao 5º ano do Ensino

Fundamental e no noturno atende estudantes da 1ª a 4ª fase da Educação de Jovens e adultos.

O Cenário 2, possui nove (09) salas de aula, uma (01) biblioteca, banheiros

(masculino, feminino e de funcionários), cozinha, secretaria e um salão. Fomos informados

que a biblioteca funciona também a noite para que os estudantes tenham acesso, porém, nas

entrevistas que fizemos os estudantes afirmaram ainda não ter ido à biblioteca durante o ano

letivo de 2015. Não existe um refeitório para que os estudantes façam a alimentação, eles se

servem nos corredores ou nas salas de aula.

O Cenário 2 começou a ofertar aos estudantes da comunidade a modalidade da EJA a

partir do ano de 2012 e atualmente funciona seis (06) turmas da EJA, sendo uma da 1ª fase,

uma da 2ª fase, duas da 3ª fase e duas da 4ª fase, totalizando 192 estudantes matriculados. No

total são nove professores que lecionam nestas turmas, sendo um na 1ª fase, um na 2ª fase e

sete nas 3ª e 4ª fases, que se reversam entre as disciplinas.

Os estudantes chegam ao Cenário 2 por volta das 19h, vão para sala de aula e depois

saem para merendar às 19h20min. Assim como no Cenário 1, foi notório que as turmas da 1ª

e 2ª fase são constituídas por estudantes que apresentam ter maior idade do que os das 3ª e 4ª

fases. Ao contrário do Cenário 1, o Cenário 2 não recebeu livro didático para turmas da EJA,

portanto, os estudantes não contam com esse recurso didático.

SUJEITOS DE PESQUISA

Nosso estudo teve como sujeitos estudantes matriculados na Educação de Jovens e

Adultos em duas (2) escolas da Rede Municipal de Ensino de Garanhuns, que constituíram os

cenários da pesquisa. Após ter recebido a autorização da gestão da escola e das professoras

das turmas, visitamos as salas de aula para a formação do grupo dos sujeitos e conversamos

com os estudantes considerando suas disponibilidades. No Cenário 1, os professores foram

bem receptivos e os estudantes demonstraram uma maior abertura para receber a

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pesquisadora, tanto na turma 1 como na turma 2. No Cenário 2, sentimos um pouco de

receio, por parte das professoras e dos estudantes, sendo necessário explicar bem a proposta

da pesquisa.

Os sujeitos foram informados sobre o objetivo da pesquisa e a metodologia adotada,

buscando a autorização dos mesmos para a utilização dos dados coletados (Apêndice B). Para

organizarmos nossos dados e preservarmos a identidade dos sujeitos, os nomeamos da

seguinte forma: E1C1T1 e assim sucessivamente, onde, E se refere a estudante, C a cenário e

T a turma.

A fim de realizar a coleta de dados, frequentamos quatro (4) salas de aula, sendo duas

(2) em cada cenário e entrevistamos sete (7) em estudantes em cada Cenário. No Cenário 1,

os sujeitos foram três (3) estudantes da 1ª fase6 (T1) e quatro (4) da 2ª

7 fase (T2). No Cenário

2, constituíram-se como sujeitos quatro (4) estudantes da 1ª fase (T3) e três (3) da 2ª fase

(T4), num total de quatorze (14) estudantes, sujeitos da pesquisa, conforme esboça o quadro

abaixo:

6 A 1ª fase da EJA é destinada a estudantes que nunca frequentaram a escola ou que a abandonaram ainda no

início do processo de escolarização. 7 A 2ª fase da EJA é destinada a estudantes que já tenham cursado a 1ª fase ou que frequentaram a escola até a 2ª

série, isto é, 3º ano do Ensino fundamental.

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QUADRO I – PERFIS DOS SUJEITOS

CE

RIO

ES

TU

DA

NT

E

TURMA IDADE GÊNERO ATÉ QUE SÉRIE

ESTUDOU QUANDO

ERA CRIANÇA

MOTIVO QUE

CAUSOU O

ABANDONO

ESCOLAR

1

E1 1ª fase 36 anos Masculino 4ª série Desistência escolar

E2 1ª fase 27 anos Feminino 4ª série Trabalho

E3 1ª fase 35 anos Feminino 4ª série Casamento

E4 2ª fase 60 anos Masculino 1ª série Trabalho

E5 2ª fase 36 anos Feminino 1ª série Trabalho

E6 2ª fase 25 anos Masculino 3ª série Trabalho

E7 2ª fase 37 anos Masculino 3ª série Falta de interesse

2

E8 1ª fase 30 anos Feminino Não lembra O pai não permitia

E9 1ª fase 27 anos Feminino 1ª série Difícil acesso à escola

E10 1ª fase 33 anos Feminino Nunca estudou -

E11 1ª fase 30 anos Feminino Não lembra -

E12 2ª fase 28 anos Feminino 4ª série Trabalho

E13 2ª fase 33 anos Masculino 4ª série Desistência escolar

E14 2ª fase 44 anos Feminino 3ª série Falta de interesse

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Bauer (2013) cita que “as Representações Sociais são representações de alguma coisa,

sustentadas por alguém. É essencial identificar o grupo que as veicula situar seu conteúdo

simbólico no espaço e no tempo, e relacioná-lo funcionalmente a um contexto intergrupal

específico” (p. 188).

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42

De acordo com as informações esboçadas no QUADRO I, podemos perceber que a

média de idade entre os participantes é de 29 anos e que há um equilíbrio entre os homens e as

mulheres. O que nos chama a atenção no quadro é a baixa escolaridade dos estudantes, tendo

em vista que a minoria chegou a cursar o quarto ano de escolarização obrigatória. Sobre os

motivos apontados como desencadeadores do abandono escolar, percebemos a predominância

da entrada precoce no trabalho. Foram constantes os depoimentos que apontavam a inserção

no trabalho ainda na infância, como percebemos nos depoimentos abaixo:

Mode a situação, pra poder ter minhas coisas. (E2C1T1)

Parei de estudar, para Trabalhar. (E12C2T4)

Outros motivos apresentados dizem respeito a falta de interesse por parte dos

participantes na continuação dos estudos, além do não estímulo da família. Uma das

participantes afirmou que abandonou os estudos após o casamento para se dedicar à família e

outra justificou o abandono pela não permissão do pai em frequentar a escola.

De acordo com os estudos que se debruçam a identificar e conceituar o público que

frequenta a Educação de Jovens e adultos é comum que os estudantes da modalidade sejam

pais e mães de família, trabalhadores que desde muito cedo precisaram ingressar no mundo do

trabalho em busca da sobrevivência, passam o dia em suas atividades de trabalho e a noite

frequentam a escola, necessitando assim, de um olhar cuidadoso sobre questões que possam

interferir na motivação desses estudantes em relação ao que eles esperam da instituição.

(SOEK; HARACEMIV E STOLTZ 2009).

Diante do QUADRO I é possível visualizar que cinco dos sujeitos da pesquisa

abandonaram a escola enquanto crianças para trabalhar e ajudar na renda da família. Através

do QUADRO II, que aborda a entrada desses sujeitos no mundo do trabalho, revela o perfil

dos sujeitos da pesquisa em relação à ocupação. Cruzando as variáveis é possível verificar

que os sujeitos começaram a trabalhar muito cedo, alguns relatam a entrada antes dos 10 anos

de idade, confirmando as informações apresentadas no QUADRO I na qual justificam a saída

da escola para o trabalho. Nos debruçando sobre as profissões em que atuam atualmente,

percebemos que elas em sua maioria independem do nível de escolaridade. Ganham destaque

as mulheres atuando como empregadas domésticas e os homens como pedreiros. Conforme os

dados coletados nas entrevistas nessas duas profissões os sujeitos atuam de maneira informal.

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QUADRO II – OCUPAÇÃO DOS SUJEITOS

SUJEITO INICIAÇÃO NO

TRABALHO PROFISSÃO

E1 C1 T1 15 anos Autônomo

E2 C1T1 14 anos Diarista

E3C1T1 Nunca trabalhou -

E4C1T2 7 anos Aposentado

E5C1T2 9 anos Doméstica

E6C1T2 10 anos Pedreiro

E7C1T2 25 anos Auxiliar de laboratório

E8C2T3 15 anos Doméstica

E9C2T3 16 anos Agricultora

E10C2T3 8 anos Doméstica

E11C2T3 15 anos Doméstica

E12C2T4 13 anos Doméstica

E13C2T4 7 anos Pedreiro

E14C2T4 10 anos Pedreiro

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

O QUADRO II evidencia que os sujeitos da pesquisa em sua maioria são

trabalhadores que procuram a escola para continuar seus estudos, que a priori foram

abandonados. É possível observar que os mesmos possuem um histórico de inserção precoce

no mercado de trabalho, sendo este, um dos motivos do afastamento escolar e instigação de

retorno à instituição. São estudantes trabalhadores que lutam pela sobrevivência durante o dia

e a noite buscam uma melhor qualidade de vida em relação a aprendizagem da leitura e da

escrita.

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É possível notar que o estudante que chega à EJA no município de Garanhuns/PE, tem

uma trajetória marcada pelo abandono escolar, em sua maioria, por motivos referentes a

entrada precoce no mercado de trabalho e quando retornam à instituição enfrentam a

dificuldade de estudar e trabalhar. Diante deste resultado, considera-se que a escola deve estar

ciente de sua função social e apta para receber esses estudantes valorizando seus saberes e

garantindo não apenas o ingresso na instituição, mas, sobretudo a sua permanência e a

aprendizagem. É necessário compreender que apesar de ser um público heterogêneo em

características e culturas, os estudantes da EJA apresentam homogeneidade em relação à

interrupção do processo de escolarização, motivo de abandono escolar e inserção precoce no

mercado de trabalho.

INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

Com o propósito de alcançarmos uma maior aproximação do objeto de pesquisa,

propomos o cruzamento das informações obtidas pelos instrumentos utilizados no estudo para

coleta de dados: o questionário, a entrevista e a observação. De acordo com Severino (2007)

“as técnicas são procedimentos operacionais que servem de mediação prática para a

realização das pesquisas” (p.124) e, portanto, devem estar em concordância com a

metodologia aplicada.

Para identificarmos o perfil dos sujeitos de pesquisa utilizamos um questionário de

identificação (Apêndice C). Nosso objetivo foi nos aproximarmos das características desses

estudantes, o que eles têm em comum, quais os motivos que os levaram a não concluírem seus

estudos quando ainda eram crianças. No Cenário 1, estes questionários foram aplicados no dia

05/03/2015, e no Cenário 2 aplicamos no dia 30 /04/2015.

Utilizamos a entrevista semiestruturada para nos aproximarmos das Representações

que os estudantes atribuem à escola. Acreditamos ter sido o melhor instrumento para nos

aproximarmos da subjetividade dos sujeitos da pesquisa e dos significados atribuídos ao

objeto de representação, a escola, pois segundo Severino (2007) a entrevista se constitui em

uma “técnica de coleta de informações sobre um determinado assunto, diretamente solicitadas

aos sujeitos pesquisados. [...] O pesquisador visa apreender o que os sujeitos pensam, sabem,

representam, fazem e argumentam” (p. 124). As entrevistas semiestruturadas (Apêndice D)

foram realizadas nos seguintes dias: dia 09/03/2015 entrevistamos os estudantes do Cenário 1;

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e no dia 05/05/2015 os estudantes do Cenário 2. As entrevistas foram realizadas

individualmente, gravadas em equipamento de áudio-gravação e depois transcritas.

Utilizamos também a observação com o intuito de nos aproximarmos das situações

cotidianas que ocorrem nas instituições, campo de pesquisa, e assim compreendermos as

representações que os sujeitos atribuem ao objeto, Severino (2007) afirma que “[...] é através

deste instrumento que é possível o acesso aos fenômenos estudados” (p. 125).

Entendemos que os instrumentos utilizados foram necessários para cercar as

representações partilhadas socialmente no ambiente escolar com o objetivo de apreender

sentidos e significados atribuídos à escola, percebendo a maneira que os sujeitos encaram as

questões focalizadas, e assim, responder aos objetivos da pesquisa.

Para analisar, caracterizar e categorizar os dados obtidos utilizamos a técnica Análise

de Conteúdo que, segundo Bardin (1977):

É um conjunto de técnicas de análise de comunicações. Não se trata de

um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor,

será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade

de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as

comunicações. (p. 31)

Esta técnica permite que o pesquisador entenda as representações que dos indivíduos,

levando em consideração os saberes partilhados e as comunicações estabelecidas durante o

processo com o objetivo de responder como a escola está representada entre os estudantes da

Educação de Jovens e Adultos no Município de Garanhuns/PE.

Desta forma, os dados foram organizados em categorias a partir das respostas dos

sujeitos, ou seja, cada categoria criada a priori envolveu diversos elementos das

representações que foram agrupados em classes de acordo com a relação entre as respostas.

Desse modo, no capítulo a seguir apresentam-se os resultados e as análises dos mesmos à luz

dos referenciais teóricos.

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CAPÍTULO IV - ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Quem não sabe ler é cego.

(E4C1T2)

O presente estudo objetivou analisar as Representações Sociais de escola, partilhadas

entre Estudantes da Educação de Jovens e Adultos, no município de Garanhuns. A teoria das

Representações Sociais nos deu o aporte teórico metodológico para apreendermos as

representações em torno da escola, ancoradas pelos sujeitos da EJA, através da comunicação

estabelecida, carregada de significados, desejos e expectativas em torno do objeto

representado. Sobre a forma de apreender as Representações Sociais de um determinado

grupo social, Mazzotti (1994) cita que

Ao estudá-las como produto, procuramos apreender seu conteúdo e sentido

através de seus elementos constitutivos: informações, crenças, imagens,

valores, expressos pelos sujeitos e obtidos por meio de questionários,

entrevistas, observações, análise de documentos, etc., entretanto, para que

constituam uma representação, esses elementos devem se apresentar como

campo estruturado (p. 70).

Diante de todo trajeto percorrido chega-se a uma fase importante da pesquisa, a análise

dos dados adquiridos ao longo do estudo. Após a leitura flutuante do material coletado por

meio das entrevistas, foi realizada a transcrição de todas elas; posteriormente, a leitura

exaustiva para definição do corpus da análise, já que optamos por uma pesquisa em que os

sujeitos entrevistados pudessem falar por si mesmo sobre o significado da escola em suas

vidas.

Sabe-se que os sentidos atribuídos pelos sujeitos à escola atravessam todo o seu

discurso, porém, a fim de facilitar a leitura, compreensão, análise dos dados coletados e

alcançar os objetivos da pesquisa, organizamos os dados em categorias, a saber: a) abandono

e retorno escolar, b) O que é a instituição d) Perspectivas futuras.

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OS MOTIVOS QUE LEVAM OS ESTUDANTES AO ABANDONO ESCOLAR E AS

NECESSIDADES QUE OS FAZEM RETORNAR

A gente vê as coisas e não sabe, e a gente quer saber.

(E5C1T2)

Os estudantes da Educação de Jovens e Adultos tem sua trajetória de vida marcada

pelo afastamento precoce do ambiente escolar. São vários os motivos que promovem o

distanciamento desses sujeitos de um processo que lhes é garantido, Amorim (2009) cita

como motivos de afastamento escolar, a dificuldade de acesso à escola; a inserção precoce no

mercado de trabalho e o fato de ser filho de trabalhador rural em sua maioria analfabeto. Em

nossa análise, identificamos esses fatores entre os sujeitos da nossa pesquisa. Quando

interrogados sobre os motivos que levaram a deixar de estudar, os sujeitos responderam:

Porque eu tinha que trabalhar pra ajudar mãe em casa, né? Ai meu pai

morreu, deixou doze filhos, era eu e outro os mais velhos, ai nós tinha que

trabalhar. (E4C1T2)

Porque meus pais era classe baixa, né? Carente, e eu tive que trabalhar pra

ajudar eles. (E6C1T2).

Não lembro. Eu repetia muito e depois eu desisti. (E11C2T3).

Eu repetia. Desisti por conta da prova de matemática, que me assusta até

hoje. (E13C2T14).

Estudei bem pequena, quase não tinha escola na cidade, só tinha a escola de

seu Juquinha perto de casa (escola particular) ai deixei de estudar.

(E9C2T3).

Os depoimentos demonstram os motivos pelos quais levaram os sujeitos da pesquisa

abandonarem a escola no município de Garanhuns/PE. O maior fator de abandono escolar se

apresenta como motivação externa à vontade dos indivíduos, o maior índice de justificativa

pelo abandono escolar foi a necessidade de trabalhar para ajudar os pais nas despesas de casa.

É importante ressaltar que a oportunidade de trabalhar representa para os sujeitos uma

possibilidade de sobrevivência e único meio de suprir as necessidades básicas da família

(ABDALLA, 2004). Em seguida apresentam-se como motivos de abandono, o fracasso

escolar e o difícil acesso à escola. Desta forma, entendemos os motivos citados pelos

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estudantes como fatores coletivos, que ascendem sobre a questão social e condições dignas de

sobrevivência. Corti e Vóvio (2007) citada por Ponte (2012) enfatizam que:

Por trás de motivos que parecem individuais, há na verdade inúmeras

barreiras de ordem social, econômica, política e educacional. Afinal

escolarizar-se não é algo que dependa simplesmente de disposição

individual, de um simples desejo ou do esforço de cada um. Trata-se de um

direito constitucional que deve ser garantido pelo poder público e que exige

uma rede de apoio social bastante ampla. (p. 10).

Nas falas dos sujeitos da pesquisa podemos encontrar de maneira clara esses aspectos,

que caracterizam o abandono escolar por fatores que vão além da vontade do indivíduo, são

depoimentos expostos que carregam consigo uma dura realidade de vida.

não tinha nem mãe nem pai não, nasci sem mãe e sem pai, foi difícil pra

mim, não teve uma pessoa pra chegar e dizer você vai fazer isso, isso, eu

tinha terminado meus estudos, eu não estava aqui hoje. Mas não tive

ninguém por mim. (E14C2T4).

O depoimento abaixo, do estudante E8C2T3 nos chamou atenção pelo fato de que ele

remete o motivo do seu afastamento do ambiente escolar ao pai, que não atribuía significados

à escola, suficientes para garantir que ele a frequentasse, no momento da entrevista o

estudante chegou a se emocionar fortemente, sendo necessário, dar uma pausa para podermos

continuar.

Meu pai era feito cigano, no meio do mundo. A gente não tinha parada. Meu

pai era morador dos fazendeiros, e a gente nunca fazia ninho. Quando

começava a melhorar ele achava que tava ruim e ia embora à procura de

melhora... Só atrapalhou a vida da gente na verdade. Ele não procurou

ajudar a gente. (emocionado o estudante responde, chorando e lamentando

por não ter estudado enquanto criança). (E8C2T3)

Assim, compreende-se que os estudantes chegam à escola em busca daquilo que lhes

foi outrora negado, o direito a escolarização ora pela entrada precoce no trabalho, ora por não

responder aos desejos de seus responsáveis; pois, apesar de estarem inseridos no mundo do

trabalho, realizarem suas atividades diárias, sentem-se excluídos da sociedade por não saber

ler e escrever, como percebemos nas análises a seguir.

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Quando interrogados sobre o motivo que pelo qual retornaram à escola, observamos

que suas falas remetem a motivos relacionados à necessidade de aprender ler e escrever para

obter maior autonomia em seu dia a dia e ascensão social. Mesmo já tendo uma longa

trajetória de vida, em seus depoimentos eles afirmam que durante os seus percursos diários

sentem dificuldades para comprar, andar sozinhos e para conseguir um emprego melhor:

Foi o interesse de eu conseguir uma carteira de motorista e se aperfeiçoar em

escrever, que eu não escrevo correto. (E1C1T1).

Pra aprender mesmo, né? Que a gente cansa de não saber nada, (grifo

nosso) e não conhecer esse lado de aprender a ler, que a gente vê as coisas e

não sabe e a gente quer saber. Você pega o endereço e não sabe pra onde

você vai, tem que ter uma pessoa pra ir com você. E serviço, né? Eu sofri

muito em serviço, porque eu não conseguia encontrar o endereço sozinha,

meu marido levava eu. (E5C1T2).

Tem vez que a gente precisa preencher um formulário desse tamanho, e paga

um mico que não sabe pra onde vai, e a gente aqui aprendendo é bom pra

nós. [...] Eu tenho habilitação, mas, de cinco em cinco anos tenho que

renovar minha carteira. Quando chega no Detran a gente recebe um papel, e

eu tremi lá. Daqui a dois anos quero chegar no Detran e preencher a ficha

sozinho. Eu levo sempre minha filha, e a mulher também fica olhando.

(E8C2T3).

Ah...O motivo foi porque eu acho que a leitura não é coisa que se compra

com dinheiro. E assim, eu mesmo tenho muita dificuldade pra pegar ônibus,

ler uma coisa, pesquisar um preço, ver uma promoção. Também meus filhos

quando for pro colégio, como eu vou ensinar a tarefa? Tudo isso me fez

voltar pro colégio. Aprender ler e escrever. (E9C2T3)

Melhorar a convivência com o mundo de hoje também né, procurar melhorar

na leitura. Eu tenho vontade de futuramente ser mestre de obra, né? Invés de

ser só o pedreiro, ser mestre. (E13C2T4)

É porque eu fui fazer um curso lá no SENAC, né? Ai eles perguntaram a

minha escolaridade e mandaram eu vim terminar os estudos. (E14C2T4).

Percebemos de início que os estudantes dão grande relevância para a escola em

relação à aquisição das habilidades de leitura e escrita. Há o reconhecimento de que esta

instituição tem de fato o papel de transmitir conhecimento, entretanto, para os sujeitos eles

são restritos ao domínio do ato de ler e escrever. Embora reconheçamos que nas sociedades

complexas a leitura e a escrita ganha relevância nas relações e comunicações sociais

compreendemos que a instituição escolar é um espaço para além da instrumentalização, e

como tal ela deveria em respeito as características do público que atende na Educação de

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Jovens e Adultos avançar em relação aos saberes das diversas áreas do conhecimento. A

escola que abriga a EJA não deve se limitar a um espaço físico para apenas a aquisição de

habilidades instrumentais, mas deve enxergar os estudantes que a procuram, dentro de suas

especificidades e necessidades; promovendo através desse olhar, novas oportunidades.

Esse tipo de escola que tem como finalidade apenas a instrumentalização foge da

perspectiva defendida por Sacristán e Goméz (2000) e Libâneo (2005), os autores

compreendem que a escola deve articular os saberes com o objetivo de levar os estudantes a

pensar de maneira autônoma, respeitando os saberes já adquiridos pelos educandos advindos

de suas vivências e ampliando este conhecimento em busca de uma melhor qualidade de vida.

Entendemos que as representações são construídas socialmente, nas relações com os

outros e com as instituições e objetos sociais, podemos inferir que a escola que oferece a EJA

pode estar deixando a desejar na garantia de um espaço que de fato devesse politizar para

além de instrumentalizar.

Outro elemento nestes depoimentos que nos salta, diz respeito à busca por alcançar

melhores condições nos trabalhos desenvolvidos através dos conhecimentos adquiridos na

escola. Foi comum nas falas a afirmação de que a escola poderia dar melhor situação em

relação ao trabalho, facilitando o cotidiano ou promovendo ascensão. De fato, a relação entre

escola e trabalho socialmente é entendida de forma direta, e os participantes do estudo

demonstram partilhar desse sentido. Eles depositam a crença de que este retorno à escola e a

aprendizagem oficial dos conhecimentos trará a garantia de melhoria nas condições de

trabalho.

Ah... Para aprender mais, e também assim, eu queria arrumar um emprego

melhor também, né? Fazer um concurso... Ai precisa dos estudos e aprender

mais também, né? (E12C2T4).

Mesmo identificando elementos de valorização da aquisição das habilidades de ler e

escrever, e da compreensão direta entre o acesso à escola e a melhoria nas condições de

trabalho, o fator que mais nos chamou a atenção nos depoimentos foi a compreensão por parte

dos sujeitos de que a escola traria o seu reconhecimento pessoal, como ilustra a fala a seguir:

Pra ser alguém mais na vida, né? Pra ser uma pessoa melhor.

(E2C1T1)

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Falas como a deste sujeito nos mostram que mesmo já constituindo famílias,

desenvolvendo suas profissões e construindo suas histórias de vida os estudantes parecem

esperar o reconhecimento de “ser alguém na vida” somente após a passagem pela escola.

Para nós esse elemento tem uma força muito grande porque exprime os desejos deste grupo

social e suas expectativas em relação a resposta da instituição escolar. Cortada (2013) acredita

que a quase totalidade do público que frequenta a EJA, habita a esfera socioeconômica da

exclusão, carrega consigo as experiências de vida e retornam à escola em busca do sonho de

uma vida melhor, no desejo de um trabalho de remuneração mais digna, autonomia na vida

diária ou em busca do simples resgate da escolaridade.

Estamos cientes de que a sociedade ainda reforça a instituição escolar como um

espaço que garante melhores condições de vida, por outro lado, também compreendemos que

essa melhoria não é alcançada por todos que frequentam a instituição escolar. A presença

desses elementos na representação dos estudantes nos leva a refletir sobre esses desejos que

são alimentados pelo social.

Para Rey (2004), “o sentido é guiado por aquilo que o sujeito sente e que nos leva a

tentar conhecer a produção social dessa forma de sentir”. Diante das falas dos sujeitos é

possível perceber que eles sentem a escolarização como algo necessário em suas vidas, e que

lhes faz falta, no sentido que serviria como ponte para a inserção social e para aquisição de

melhores condições de vida.

Nesse sentido, é possível compreender as falas dos sujeitos dentro da concepção

apresentada por Amorim (2009), que identifica as razões pelas quais os estudantes retornam à

escola diretamente associadas com os seus interesses sociais.

Os resultados nos mostram que os estudantes dos dois Cenários da pesquisa, retornam

à escola em busca de objetivos em comum, aspiram por aprender a ler e escrever, como sendo

esta a única função desenvolvida pela escola, e o aporte para uma melhor qualidade de vida.

Nesse sentido, o papel social da escola se insere na perspectiva de proporcionar a esses

educandos, através do processo de escolarização, condições propícias para que eles possam

atuar na sociedade.

Nesse sentido, Freire (1987), compreende as aspirações desses sujeitos, como a busca

pela afirmação do homem enquanto ser social, na tentativa de conquistar a liberdade, essa

busca pela libertação e humanização não se dá de maneira isolada, mas, através do esforço

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próprio e da comunhão, esse modo de educação é abordado por Freire (1987) quando cita,

“Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si,

mediatizados pelo mundo” (p. 39). Desta forma, a escola torna-se necessária no processo de

libertação, com o papel de transformar o pensamento mecânico, proporcionando a educação

problematizadora e consciente, promovendo o intercâmbio contínuo entre o saber escolar e os

saberes dos educandos. A escola que promove este diálogo, propõe uma educação pautada no

ouvir e na comunicação, consistindo esta, como lugar de interação e representação social.

A INSTITUIÇÃO ESCOLAR: O QUE É, E PARA QUÊ SERVE?

A Educação de Jovens e Adultos é um terreno de singularidades, seja na

heterogeneidade etária e cultural, como nos interesses e experiências dos estudantes. Através

do aporte da Teoria das Representações Sociais, que trata do senso comum partilhado por um

determinado grupo social, nesse caso, estudantes da EJA, é possível nos aproximarmos dos

sentidos subjetivos elaborados e reelaborados por esse grupo.

As Representações Sociais não podem ser reduzidas a meras representações, pois são

construídas através da interação entre os grupos. Segundo Sales (2012) a Teoria das

Representações Sociais parte do senso comum, buscando dar sentido aos pensamentos, falas e

atitudes das pessoas, partindo do universo consensual e do universo reificado, é possível

compreender o pensamento social em sua dinâmica e diversidade. Sobre isto a autora dialoga

com Andrade (2003) que entende as Representações Sociais como sistema de mediação entre

sujeito e objeto representado, transformando aquilo que parecia individual em linguagem

comum, levando a compreender e classificar sentidos apresentados em um mesmo grupo.

Para nos aproximarmos das representações sociais partilhadas, os estudantes foram

instigados a falar a respeito do que é a escola. Na análise destes elementos, foi possível

identificar dois grupos, um que identifica a escola como lugar para instrumentalizar

habilidades, sendo elas, ler e escrever, para aplicações em suas vidas diárias; e outro grupo

que identifica a escola como lugar também de interação social. Nossa análise se aproxima dos

achados de Ponte (2012), que, em seu estudo também identifica estes dois grupos nomeando-

os como Aspectos Educacionais e Aspectos Sociais, sendo assim, a escola é um local

eminentemente social. No primeiro grupo, os sujeitos da nossa pesquisa representam a escola

como:

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A escola é tudo. Ensina a pessoa ler, escrever, tudo de bom. (E2C1T1)

Tudo, né? Pra me ensinar e eu aprender o que eu não sei, e foi muito

importante, e... eu conhecer o mundo, né? Que eu não conhecia, era cego,

quem não sabe ler é cego. Então passa a conhecer o mundo, que nem agora

mesmo, já tou conhecendo o mundo. (E4C1T2).

Educação, muita educação, pra respeitar os amigos e aprender ler e escrever.

(E8C2T3)

Serve pra dar educação, né? Ensinar muitas coisas. Saber ler né. (E14C2T4).

A valorização da escola enquanto lugar destinado a aquisição das habilidades de

leitura e escrita ganha destaque nos depoimentos dos estudantes, o que nos permite cercar os

sentidos atribuídos à escola. Percebemos através das falas dos sujeitos, um esforço em

apresentar outros objetivos da educação, porém, a instituição é compreendida como espaço

que promove o desenvolvimento e aprendizagem dos sujeitos que a procuram depois de

adultos.

Diante das falas dos sujeitos da pesquisa foi possível cercar suas concepções acerca da

estruturação e organização da escola, os sujeitos não expõem desejos de uma escola com

estrutura física melhor, condições mais dignas para merendar ou até mesmo o acesso a todos

os ambientes escolar existentes, eles demonstram em suas falas que o importante eles já

possuem que é uma sala de aula e um bom professor pois o seu maior objetivo é aquisição da

leitura e da escrita e para isto não entendem como necessário uma boa estrutura física.

Esse elemento nos faz refletir sobre as políticas de permanência na escola,

principalmente porque foi um grupo que, em sua maioria, teve acesso, mas não conseguiu

concluir seus estudos. Se na época de abandono as instituições fossem organizadas para

garantia dessa permanência, o número de evasão não seria menor? Acreditamos que melhores

condições nas estruturas das instituições garantiriam a maior permanência dos estudantes para

a conclusão dos seus estudos, e embora os nossos sujeitos partilhem de espaços que não

garantem acesso à biblioteca, laboratórios de informática e nem mesmo materiais didáticos

adequados, como no Cenário 2, para eles a escola já se apresenta de forma satisfatória.

No segundo grupo a escola é representada pelos sujeitos como um espaço que vai lhes

conferir habilidades de interação social, saber falar melhor, trocar experiências. Para além da

compreensão da escola como um espaço que promove amizade, partilha e respeito, como

remete o pensamento de Gadotti (2007), quando compreende que “a escola não é só lugar

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para estudar, mas para se encontrar, conversar, confrontar com o outro, discutir, fazer política.

[...] A escola não é só um espaço físico. É, acima de tudo, um modo de ser, de ver. Ela se

define pelas relações sociais que desenvolve” (p. 12), os estudantes reforçam a instituição

escolar como um espaço que ensina,a se relacionar com os outros. Os depoimentos de alguns

dos estudantes, sujeitos da pesquisa, que se enquadram nesse segundo grupo, conotam com

esse sentido atribuído à escola, quando eles assim se expressam:

Cidadania, né? Somos cidadão que precisa vir à escola. Que a gente aprende

tanto a ler e escrever como a falar com as pessoas. (E1C1T1).

É um lugar que a pessoa aprende a respeitar as pessoas, os professores, os

alunos, que a gente tem que respeitar o amigo também, ne? A gente aprende

muito na escola. (E12C2T4).

A escola pra mim é uma formação, né? A gente forma caráter, conhece

pessoas e compartilha o dia a dia. A gente “vevi” trabalhando, o estresse do

dia a dia, você chega na escola vê pessoas diferentes, pessoas que dão forças,

né? Na rua a gente não encontra. (E13C2T4).

Essa forma de representar a escola é caracterizada por Capucho (2012) como a

educação plena do cidadão; a referida autora aponta que a partir do reconhecimento da

Educação de Jovens e Adultos como modalidade de educação básica, regulamentada pela Lei

de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96), a EJA passa a ter como um dos objetivos a

formação para a cidadania e o desafio de assegurar o desenvolvimento integral do cidadão.

Através dos perfis traçados, é possível verificar que os sujeitos que mais representam a

escola como lugar de interação social, são estudantes que enquanto crianças tiveram um

histórico escolar fracassado, ou seja, abandonaram a instituição por admitir não ter tido

interesse em continuar com seus estudos. Nesta perspectiva podemos citar a fala do estudante

E14C2T4 “no meu tempo quando eu estudava, levava era bolo na mão. Era um “O” eu dizia

“A”, a professora chegava e metia a palmatória na mão”. Diante desta fala, é possível notar

que antigos métodos e práticas de ensino com crianças, podem constituir-se também como

fator para o fracasso escolar, já que, de acordo com Cortada (2013) “a possibilidade de

permanência e continuidade dos estudos em um ambiente que seja prazeroso são questões a

serem consideradas” (p. 28).

Os resultados das entrevistas nos apresentam os elementos das representações de

escola construídas por estudantes da Educação de Jovens e Adultos. As referidas

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representações nos remontam a uma compreensão desta modalidade de ensino enquanto lugar

que oferece a possibilidade desses sujeitos recuperar o “tempo perdido”. Reafirmando o que

Jodelet (2001b) compreende por Representações Sociais, sendo estas, “uma forma de

conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui

para a construção de uma realidade comum a um conjunto social (p. 22)”, podemos afirmar

que a representação de escola é vista de forma positivada pelos sujeitos da pesquisa, que a

procuram em busca de ascensão e interação social encontrando nela elementos que

possibilitam a aprendizagem dos conhecimentos e habilidades necessárias que garantam uma

autonomia no dia a dia, uma melhor qualidade de trabalho e um reconhecimento social.

ENTRE DESEJOS E EXPECTATIVAS: OS ANSEIOS NO RETORNO À ESCOLA

Diante dos motivos de abandono e retorno escolar e das representações de escola

partilhadas entre os sujeitos da pesquisa, considera-se importante apresentar o que esses

sujeitos trazem à tona como anseios e perspectivas futuras para a sua vida social. Os

estudantes da Educação de Jovens e Adultos, sujeitos do nosso estudo, retornaram à escola

por vontade própria e esse elemento os torna disponíveis para uma aprendizagem

sistematizada, mesmo que essa vontade esteja diretamente ligada ao fator de sobrevivência

(Rogerro, 2013). Das entrevistas depreendemos elementos das representações sociais que

agregam fatores que evocam os anseios e expectativas em relação à escola, sendo estas, a

aquisição da leitura e da escrita como ponte para uma melhor qualidade de trabalho, além da

preocupação com o futuro dos filhos. Desse modo, os estudantes falam sobre a necessidade de

ter um emprego melhor e de proporcionar aos filhos uma melhor qualidade de vida.

Quero aprender, pra quando eu chegar em algum lugar, quando eu ver

alguma frase eu poder ver com meus próprios olhos e falar com minha

própria boca. Saber ler é o mais importante, porque a gente que não saber ler

é como um cego, não ver nada. (E6C1T2).

Eu pretendo seguir, ser mestre de obra, então tenho que ter o estudo, porque

se não tiver estudo nem de gari trabalha mais. (E13C2T4).

Eu vou arrumar um serviço melhor. Vou sair desse sofrimento de pedreiro,

né? Daqui a uns dias, né? Quem sabe? Só quem sabe é Deus. (E14C2T4).

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Como podemos observar nos trechos das entrevistas acima, há um diálogo entre os

sentidos atribuídos à escola na categoria anterior e as perspectivas futuras em relação ao

processo de escolarização. A escola que é representada como lócus para aquisição de

habilidades instrumentais, também proporciona aos educandos a expectativa de ascensão

social, vinculada primeiramente à aquisição da leitura e da escrita. Outro fator que é

representado nas falas dos sujeitos é a aspiração pela aquisição da autonomia, percebe-se que

os mesmos estão cansados de depender de outras pessoas para realizarem tarefas diárias que

demandem a necessidade da leitura. É notório o esforço que o estudante E6C1T2 faz para

deixar claro que deseja aprender a ler, quando diz: “Quero aprender, pra quando eu chegar em

algum lugar, quando eu ver alguma frase eu poder ver com meus próprios olhos e falar com

minha própria boca” ele enfatiza o fato de não querer mais ser dependente e ter que pedir para

que alguém leia algo para ele, e continua em sua fala evidenciando essa necessidade como um

anseio profundo quando diz “a gente que não saber ler é como um cego, não vê nada”.

Diante de tais depoimentos podemos contemplar a Educação de Jovens e Adultos não

apenas como uma oferta, mas, como uma necessidade emergente de uma desigualdade social

que exclui mais do que inclui e acaba deixando esses sujeitos de fora do processo de

escolarização enquanto ainda eram crianças. Sobre isto, Paiva (2006) cita que

“Especificamente na Educação de Jovens e Adultos (EJA), a história não só registra os

movimentos de negação e de exclusão que atingem esses sujeitos, mas se produz a partir de

um direito conspurcado muito antes, durante a infância, esta negada como tempo escolar e

como tempo de ser criança a milhões de brasileiros” (p. 1). Uma realidade dura e cada vez

mais presente no ambiente escolar, pois, diante do direito ao acesso a escolarização e das

demandas sociais existentes atualmente, esse público tem procurado a escola com mais

frequência.

O segundo grupo que constitui esta categoria apresenta a preocupação de pais e mães

em proporcionar um futuro melhor para os seus filhos. Em suas falas os estudantes

evidenciam aspectos analisados anteriormente no que diz respeito a aquisição da leitura e da

escrita, apontam que tais habilidades são passos para aquisição de um emprego melhor e

apresentam como objetivo da busca por melhores condições de vida, a oportunidade de

proporcionar um trajeto escolar diferente para seus filhos.

Eu tenho um desejo no meu coração, de deixar de trabalhar na casa dos

outros. Eu quero estudar, me formar em alguma coisa, ter um emprego

melhor, dar uma vida melhor aos meus filhos, por tudo isso. (E9C2T3).

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Meu objetivo é trabalhar, ter um emprego melhor para sustentar uma casa e

pra isso a gente tem que estudar. (E12C2T4).

Sim, eu tenho um incentivo na minha vida, que quando eu aprender a ler eu

vou fazer minha carta de motorista, ser alguém na vida, né? Ter outro

trabalho, outra profissão e dar o melhor pra minha filha não ter as

dificuldades que eu tenho. (E2C1T1)

Desta forma, compreende-se que a Educação de Jovens e Adultos deve se constituir

como espaço de inclusão social, que recebe um público que se encontra marginalizado pelo

fracasso ou abandono escolar e retornam à escola cheios de expectativas. Uma das

expectativas que pudemos nos aproximar é o desejo de oportunizar aos filhos uma condição

de vida mais digna. A estudante E12C2T4, apresenta em sua fala uma aspiração futura,

primeiro ela está se preparando, recuperando o tempo que ficou afastada da escola para depois

constituir uma família e assim ter a condição de oferecer melhorias em relação a sua condição

econômica, dando para seus filhos condições melhores do que a que ela teve enquanto

criança, e assim, não necessitar se afastar da instituição escolar em troca do trabalho.

A escola nesse sentido deve se contrapor a qualquer forma de exclusão ou de prática

que não atendam as especificidades do público que frequenta esta modalidade de ensino.

Sobre isto, Capucho (2012) compreende a EJA como um direito humano e local de respeito às

diferenças, estas diferenças, aqui entendidas como diversidade de objetivos, anseios e

perspectivas. A autora ainda cita que compreender a EJA dentro desta concepção “significa

desafiar governos e escolas a incluir a todos (as) independentemente de suas condições

físicas, sociais, linguísticas ou outras, garantindo o acesso, a aprendizagem, a socialização e a

permanência” (p. 72).

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CAPÍTULO V - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Gosto de ser gente porque, mesmo sabendo que as condições materiais, econômicas,

sociais e políticas, culturais e ideológicas em que nos achamos, geram quase sempre

barreias de difícil superação para o cumprimento de nossa tarefa histórica de mudar

o mundo, sei também que os obstáculos não se eternizam (FREIRE, 1987, p. 31).

Na tentativa de definir a Educação de Jovens e Adultos, apontamos aspectos

históricos, sociais e legais que colocam a EJA como um território único e singular. É uma

modalidade de ensino garantida pela lei que rege a educação nacional (Lei de Diretrizes e

Bases da Educação – 9.394/96), para atender a um público específico. Na maioria, são cursos

parciais, noturnos, destinados a estudantes trabalhadores que não tiveram a oportunidade de

estudar enquanto criança, ou que abandonaram os estudos ainda na idade adequada para a

escolarização. Nesse sentido, a referida lei tem a intenção de garantir não apenas a oferta de

vagas, mas, sobretudo, a inserção educacional pautada em compreender e atender os

estudantes dentro de suas necessidades e capacidades.

Neste estudo, a escola é concebida como espaço de significações e sentidos, assim, ela

deve estar pautada em uma perspectiva que vai além das letras, além da instrumentalização e

se enquadra em um papel de dar sentido ao processo de aquisição da leitura e da escrita, que

de acordo com as nossas análises, é o principal motivo de retorno do estudante para concluir

os estudos. Sendo a escola defendida por Gadotti (2007) como espaço relações e de

representações sociais, buscamos através de uma aproximação com a Teoria das

Representações Sociais, cercar os sentidos que os estudantes da Educação de Jovens e

Adultos atribuem à escola.

A Teoria das Representações Sociais é constituída por elementos resultantes das

relações e interações sociais, são os sentidos dados ao objetivo a partir do senso comum, que

evidenciam o desconhecido, explicando a realidade e a posição tomada pelo sujeito mediante

ao objeto. Machado (2013) apresenta o campo educacional como espaço privilegiado para

observar a construção dos elementos de representações no interior de grupos sociais.

Nesta perspectiva, este estudo foi desenvolvido com a finalidade de responder a

seguinte problemática: Como os estudantes da Educação de Jovens e Adultos representam a

escola no Município de Garanhuns/PE? O objetivo geral foi analisar as Representações

Sociais de escola, partilhadas entre estudantes da Educação de Jovens e Adultos, no município

de Garanhuns/PE e como objetivos específicos o trabalho propôs, identificar o conteúdo das

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Representações Sociais de Escola e compreender como essas representações, influenciam a

relação dos estudantes com a Instituição Escolar

A pesquisa foi realizada em duas escolas que oferecem a modalidade da Educação de

Jovens e Adultos na rede municipal de ensino em Garanhuns/PE. Os sujeitos da pesquisa

foram 14 estudantes matriculados na 1ª e 2ª fase da EJA nas escolas campo de pesquisa. Os

estudantes, sujeitos da pesquisa, abandonaram a escola ainda no início do processo de

escolarização. Vários depoimentos apontaram a necessidade de trabalhar como sendo um dos

motivos que os levaram ao abandono escolar. Estes estudantes retornaram à escola como pais

e mães de família em busca de melhores condições de vida. Outros fatores evidenciados nas

falas dos sujeitos como motivos de abandono escolar foram a falta de interesse em continuar

os estudos, a falta de incentivo da família e o difícil acesso à escola.

Através do nosso estudo, foi possível perceber, que o retorno à instituição escolar, se

dá pela necessidade que os sujeitos sentem, de aprender a ler e escrever como passaporte para

o reconhecimento social, ser alguém na vida. Os estudantes reconhecem a escola como

ambiente propício para a transmissão de conhecimento, este, restrito ao domínio do ato de ler

e escrever.

A Educação de Jovens e Adultos é marcada pela heterogeneidade na cultura, interesses

e faixa etária dos estudantes. A Teoria das Representações Sociais nos permite, através das

falas desses sujeitos, transformar o que parece individual em linguagem comum e classificar

os sentidos atribuídos ao objeto, por um mesmo grupo social.

Os elementos de representação de escola partilhados entre os sujeitos do nosso estudo

demonstram que a mesma está representada por eles, como local eminentemente social. Foi

possível localizar dois grupos, o primeiro valoriza a escola enquanto lugar para aprender a ler

e escrever e o segundo que representa a escola como lugar passível de conferir habilidades de

interação social. Sabemos que, a merenda, o transporte escolar e o material didático são

meios que garantem a permanência desses estudantes na escola, entretanto, eles não

demonstram em suas falas buscar por melhorias nesses serviços ou almejar uma estrutura

física melhor para a escola em que estão inseridos. Para eles, basta uma sala de aula e um bom

professor que lhes ensine a adquirir habilidades técnicas de leitura e escrita e de interação

social.

Desta forma, a escola está representada pelos sujeitos da pesquisa, estudantes da EJA,

com aspectos positivados em suas falas, é lugar que oferece a possibilidade de recuperar o

tempo perdido e adquirir habilidades instrumentais para uma vida mais facilitada. Diante dos

resultados das entrevistas, nos aproximamos dos anseios e expectativas dos estudantes em

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relação ao retorno à escola. A instituição que nos elementos de representação desses

estudantes apresenta-se como lócus para a aquisição de habilidades instrumentais, também é

representada por eles como ponte para adquirir autonomia para realizarem as atividades do dia

a dia que são vinculadas a aquisição da leitura. Os sujeitos demonstram aspirar por empregos

melhores ou ascensão em seu trabalho com a finalidade de proporcionar uma vida melhor

para os filhos.

Mediante esses anseios é possível perceber que a EJA é uma necessidade emergente

de uma desigualdade social e que necessita de políticas que impulsionem a esses indivíduos

chegarem a alcançar seus anseios para que haja uma mudança futura e mais crianças não

necessitem se afastar da escola, principalmente para entrada precoce no mundo do trabalho.

Nesse sentido, a escola deve ser um local que atenda as especificidades do público

que frequenta da EJA, enxergá-los como sujeitos que desenvolveram estratégias de

sobrevivência em uma cultura escrita, considerar as experiências de fracasso escolar que os

sujeitos já experimentaram proporcionando um ambiente além de acolhedor, lugar de

reflexão, de atribuição de significados à aprendizagem da leitura e da escrita; ouvir os sujeitos

a fim de conhecer seus conhecimentos, expectativas e desenvolver estratégias que ajudem a

garantira aprendizagem e a permanência desses estudantes no ambiente escolar e assim,

concluir seus estudos.

Dessa forma, consideramos que ainda há muito que penetrar no território da EJA

através de investigações que permitam saber: como esses estudantes estão chegando ao final

das turmas da EJA do Ensino Fundamental? Quais as representações de escola dos estudantes

que estão concluindo este ciclo? Quais seus anseios? Mudam, ou são os mesmos? E a prática

pedagógica, o que ela influencia na relação do estudante com a escola e suas representações?

São questionamentos que podem contribuir para pesquisas futuras no âmbito da Educação de

Jovens e Adultos, tendo o objetivo de ouvir os estudantes obtendo os resultados a partir de

suas falas.

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APÊNDICE A – FICHA DE IDENTIFICAÇÃO DA ESCOLA

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADÊMICA DE GARANHUNS

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Nome da escola: ______________________________________________________

Endereço: ____________________________________________________________

Horário de funcionamento: manhã ( ) tarde ( ) noite ( )

Níveis e Modalidades oferecidas:

( ) Educação infantil

( ) Ensino Fundamental (anos iniciais)

( ) Ensino fundamental (anos finais)

( ) Ensino médio

( ) Educação de Jovens e Adultos

( ) Outros ______________________________________________________________

Prédio próprio, alugado, adaptado? __________________________________________

________________________________________________________________________

Quantidade de salas de aula? ________________________________________________

( ) Sala de Recursos ( )Sala de Leitura ( )Laboratório de Informática

( ) Refeitório ( ) Quadra ou Salão

Horários de funcionamento: ______________________________________________________

Quantidade de turmas na escola? __________________________________________________

Quantidade de estudantes na escola? _______________________________________________

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Quantidade de turmas de EJA: ____________________________________________________

Quais turnos são oferecidos a modalidade da EJA? _______________________________

Quantidade de estudantes da EJA: ____________________________________________

A quanto tempo oferece a modalidade de EJA? _______________________________________

Quantos professores ensinam na EJA? _________________________________________

Como são as salas de aula da EJA? ___________________________________________

Quais os materiais didáticos utilizados? ________________________________________

Qual o livro didático da EJA? ________________________________________________

Como é feita a escolha do livro didático? _______________________________________

Observações: _____________________________________________________________

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68

APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Convidamos V.Sa. a participar da pesquisa: ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO DE

JOVENS E ADULTOS E A ESCOLA: UM ESTUDO DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS,

que tem por objetivo conhecer como a Escola está representada pelos estudantes da EJA, além

de compreender a importância da mesma para a sua vida social.

O motivo que nos leva a desenvolver este estudo decorre do interesse em ampliar os

estudos acerca do contexto histórico e das individualidades dessa modalidade de ensino e de

nos aproximar da Escola, através do olhar do estudante, dando voz a estes sujeitos oriundos de

uma situação de exclusão, rejeição ou abandono escolar.

Como procedimentos de coleta de dados utilizaremos: questionário, entrevista

semiestruturada e observações. Tanto o questionário respondido pelos participantes e os

depoimentos que serão gravados durante a entrevista ficarão sob responsabilidade da

pesquisadora. Destacamos ainda aos participantes os seguintes direitos: a garantia de

esclarecimento e resposta a qualquer pergunta; a garantia de privacidade à sua identidade e do

sigilo de suas informações, e a garantia do retorno dos benefícios obtidos através das

pesquisas para as pessoas e as comunidades onde as mesmas forem realizadas.

DECLARAÇÃO DO PARTICIPANTE

Eu_____________________________________________,fui informado (a) de maneira clara

dos objetivos da pesquisa acima, e esclareci minhas dúvidas. A pesquisadora GERCIANE

RAMOS DIAS, certificou-me de que os dados de identificação dos participantes desta

pesquisa serão confidenciais. Em caso de dúvida poderei localizar a devida pesquisadora no

endereço, Av. Bom Pastor, s/n, Boa Vista. Universidade Federal Rural de Pernambuco –

Unidade Acadêmica de Garanhuns e pelo e-mail [email protected]. Também

detenho a possibilidade de entrar em contato com a professora orientadora deste estudo,

Professora Taynah de Brito Barra Nova pelo e-mail: [email protected].

__________________________________________________________________________

Nome do participante Assinatura Data

__________________________________________________________________________

Nome do pesquisador Assinatura Data

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APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DE IDENTIFICAÇÃO DOS ESTUDANTES

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADÊMICA DE GARANHUNS

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Escola: _______________________________________________________________

Turma: _______________________________________________________________

Idade: _________

Sexo: ( ) feminino ( ) masculino

Estudou quando era criança? ( ) sim ( ) não

Até que série? _______________________________

Estado civil: _________________________________

Tem filhos? ( ) sim ( ) não Quantos? 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) Mais de três filhos ( )

Trabalha? ( ) sim ( ) não Profissão: ___________________________________

Com quantos anos começou a trabalhar?_____________________________________

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APÊNDICE D – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADÊMICA DE GARANHUNS

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Com quantos anos deixou de estudar?

Por que deixou de estudar?

Você estuda nesta escola há quanto tempo?

Qual motivo te fez retornar à escola?

Para você o que é a escola?

A escola poderia lhe ajudar de alguma forma?

Mudou alguma coisa depois que você voltou a estudar?

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APÊNDICE E – TRANSCRIÇÕES DAS ENTREVISTAS

ENTREVISTA 1

Com quantos anos deixou de estudar? Sempre estudava e desistia, deixei de estudar com 16

anos.

Por que foi que você deixou de estudar? Mais por falta de interesse.

Você estuda nesta escola a quanto tempo? Comecei este ano.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? Foi o interesse de eu conseguir uma

carteira de motorista e se aperfeiçoar em escrever que eu não escrevo correto.

Pra você, o que é a escola? Uma mudança de vida.

Você acha que a escola pode te ajudar de alguma forma? Pode, com certeza.

De que forma a escola pode estar te ajudando? Arrumar um trabalho melhor e tirar a

carteira de motorista.

Mudou algo na sua vida depois que você retornou à escola? Mudou meu... Meu

autoestima, foi, mudou. Meus interesses também.

Você já sabe ler? Já, já sei ler, agora que eu não tou escrevendo correto sabe, e eu retornei

pra ver se eu desenrola isso.

ENTREVISTA 2

Com quantos anos deixou de estudar? 14 anos

Então você deixou de estudar quando começou a trabalhar? Foi

Por que foi que você deixou de estudar? Mode a situação, pra poder ter minhas coisas.

Você estuda nesta escola a quanto tempo? Comecei este ano.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? Pra ser alguém mais na vida néh, pra ser

uma pessoa melhor.

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E pra ser alguém na vida em que área, em que você acha que a educação influencia?

Acho que em tudo viss, eu só voltei mais pra escola, porque pra ta ensinando as coisas a

minha menina é tão ruim sem a pessoa saber ler. E a pessoa perde muita oportunidade de

trabalho, tudo.

O que é a escola pra você? A escola é tudo. Ensina a pessoa ler, escrever, tudo de bom.

Você acha que a escola pode te ajudar de alguma forma? Pode, e muito.

Em que a escola pode estar ajudando? Assim, começando me ensinar a ler, estudar e

depois eu ser alguém na vida.

E você acha que aprender a ler faz com que a pessoa seja alguém na vida, seja uma

pessoa melhor? Sim, com certeza, porque agente pode ter um bom emprego, aprende a ser

uma boa pessoa.

E será que uma pessoa que não sabe ler tem dificuldades para arrumar um bom

emprego? Smi, bastante. Eu perdi muitos trabalhos.

Mudou alguma coisa depois que você voltou a estudar? Sim, eu tenho um incentivo na

minha vida, que quando eu aprender a ler eu fazer minha carta de motorista, ser alguém na

vida néh, ter outro trabalho, outra profissão e dar o melhor pra minha filha não ter as

dificuldades que eu tenho.

E como foi em casa quando você decidiu voltar a estudar? Minha mãe, não quis, porque

ela disse que não ia ficar com os meninos. Ai o marido também ficou assim... porque ele

viaja, eu vou ver se mãe fica ou se arrumo alguém pra ficar, por enquanto ta com o pai.

Você enfrentou mais alguma dificuldade? Ta muito puxado, trabalho, chegar em casa,

fazer janta, tem dia que não da pra vim, mas a gente vai levando.

ENTREVISTA 3

Com quantos anos deixou de estudar? 13 anos

Por que foi que o você deixou de estudar? Porque eu casei fui morar com meu marido e

parei de estudar ele era muito ciumento, não deixava.

Você estuda nesta escola há quanto tempo? Comecei este ano.

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Qual motivo te fez retornar à escola? Por causa do meu filho, que faltava muita aula, ai eu

resolvi estudar também e aproveite fico de olho nele.

E pra você, para que serve a escola? A escola é bom porque assim, pra mim começar todo

de novo, já desprendi algumas coisas, ai por isso que eu voltei a estudar.

Você acha que a escola pode te ajudar de alguma forma? Pode. Quais as tuas

expectativas em relação a estudar? Aprender mais um pouco, mais do que eu sei, tenho que

aprender um pouquinho a mais.

Com algum objetivo? Só pra mim aprender mesmo.

Mudou alguma coisa na tua vida depois que você voltou a estudar? Mudou, eu tou tendo

mais paciência em casa pra ensinar meus filhos.

E em casa quando você disse que iria voltar a estudar como foi, algum incentivo? Dessa

vez não teve ninguém pra me empatar não. Incentivo dos meus filhos.

ENTREVISTA 4

Com quantos anos deixou de estudar? Eu estudei quase nada néh, eu estudei quando era

pequeno de lá pra cá não estudei não, voltei a estudar agora néh.

Por que foi que o senhor deixou de estudar? Porque eu tinha que trabalhar pra ajudar mãe

em casa néh, ai meu pai morreu deixou doze... doze filhos de comer de balaio e mais era eu e

outro ai nós tinha que trabalhar.

Vocês trabalhavam para manter a casa? Era, para manter a casa se não ficava difícil.

Você estuda nesta escola há quanto tempo? Vai fazer dois anos agora.

Qual motivo te fez retornar à escola? Eu tive vontade de voltar, aqui pertinho de casa, me

deu aquela vontade e voltei.

E o senhor encontrou alguma dificuldade quando voltou a estudar? Não, não. Aff

mariaaa, tudo primeira.

Para você o que é a escola? Tudo néh, pra me ensinar e eu aprender o que eu não sei, e foi

muito importante, e... eu conhecer o mundo né, que eu não conhecia, era cego, quem não

sabe ler é cego. Então passa a conhecer o mundo, que nem agora mesmo já tou conhecendo o

mundo.

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Quando o senhor diz que passa a conhecer o mundo se refere a que? A leitura, que eu não

sabia de nada e agora eu já sei ler, fazer o nome, não me perco em nenhum canto (risos).

O senhor acha que a escola pode lhe ajudar de alguma forma? Pode, que só na leitura

mesmo já me ajudou-me demais, e logo uma professora que nós tem, que é ótima professora,

vale dez, dez não cem, ela é primeira.

Mudou alguma coisa depois que você voltou a estudar? É que nem eu falei pra você, o que

mudou na minha vida foi o conhecimento que eu não tinha néh. Ai isso muda, porque, você

não entende de nada, quando você não tem estudo, não tem nada, você não entende nada, pra

todo canto que você olha, você é um cego, você é guiado pelos outros, desde a hora que você

passa a conhecer a leitura que você já entende muitas coisas, então pra mim, já foi muito

importante.

Mais alguma coisa o senhor pode citar além da leitura, como o senhor disse, enxergar o

mundo, mais alguma coisa o senhor pode citar que a escola ajudou na sua vida?

Principalmente em casa néh (risos) que quando eu chego em casa a menina diz “eita painho

agora aprendeu ler, escrever, ta bom néh”.

E sua família incentiva? Ave Maria, e muito, tanto ela, como os meninos mesmos néh,

tudinho incentiva, que graças a Deus meus filhos têm bocadinho se formando já e graças a

Deus pra mim ta bom demais.

ENTREVISTA 5

Com quantos anos deixou de estudar? Nove anos pra dez anos

Por que foi que o você deixou de estudar? Pra trabalhar

Você estuda nesta escola há quanto tempo? Tem dois anos

Qual motivo te fez retornar à escola? Pra aprender mesmo néh, que agente cansa de não

saber nada, e não conhecer esse lado de aprender ler, que agente ver as coisas e não sabe e

agente quer saber.

E quais as dificuldades que você tinha por não saber ler? Muita coisa, principalmente

serviço, você pega o endereço e não sabe pra onde você vai tem que ter uma pessoa pra ir

com você e serviço néh, eu sofri muito em serviço porque eu não conseguia encontrar o

endereço sozinha, meu marido levava eu.

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Para você o que é a escola? Pra mim é tudo. Eu gosto muito de vim pra escola, pra mim é

tudo.

Você acha que a escola pode lhe ajudar de alguma forma? Sim, de conhecer as coisas

néh, que ta ao redor da gente, porque agente sem saber ler é cega e a escola ensina tudo que

ta acontecendo no mundo inteiro e ao redor da gente.

E você acha que a escola está contribuindo ou pode contribuir para sua vida além de

aprender ler? Sim, a gente enxergar melhor néh, porque assim, a gente sem saber ler é uma

coisa e a gente sabendo ler a mente da gente já fica mais aberta pra ser alguém néh, pra

gente aprender e ser outra pessoa, não só dentro de casa, não ficar só dentro de casa.

Quais são seus objetivos, você disse que quer aprender a ler, escrever, não ter que

depender tanto de outra pessoa, mas quais seus objetivos em voltar a estudar? Aaa

(suspiros) meu sonho é aprender muito, ficar no computador e trabalhar e fazer muita coisa.

Mudou alguma coisa na tua vida depois que você voltou a estudar? Sim, principalmente

que a professora fala um negócio que ta acontecendo e a gente já fica gravando e a gente fica

olhando as coisas como ela é néh, e a gente só em casa sem ir pra escola a gente não sabe de

nada, só sabe o dia-a-dia, lavar roupa, cuidar de criança e na escola a gente aprende muita

coisa.

ENTREVISTA 6

Com quantos anos deixou de estudar? Nove anos

Por que foi que o você deixou de estudar? Porque meus pais era classe baixa néh, carente e

eu tive que trabalhar pra ajudar eles.

Você estuda nesta escola há quanto tempo? Eu estudei aqui, na faixa de quatro anos de

idade ai sai, fui pra outra escola e com nove anos eu desisti.

E quando você retornou a estudar, voltou para esta escola? Sim, eu vim pra qui néh.

E a quanto tempo você voltou a estudar? É o primeiro ano. 16 anos que eu estou sem

estudar.

Qual motivo te fez retornar à escola? Porque, a minha profissão néh, é que permite o

necessário, que eu volte a estudar pra eu dar continuidade ao meu serviço. Voltando a escola

eu vou conseguir chegar onde eu quero chegar néh.

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E aonde você quer chegar? Eu quero conseguir alguma coisa na vida néh, ficar mais

profissional no meu trabalho, e hoje sem estudo você não vai a lugar nenhum.

Para você o que é a escola? Antigamente eu não sabia não, ta com 16 anos que eu parei de

estudar e agora com 25 anos de idade eu voltei a estudar, tou sentindo muita falta e os

trabalhos hoje é necessário que a gente tenha estudo.

E a escola pra você, ela representa o que ? Ela representa muitas coisas néh, como eu

voltei esse ano, eu não sabia néh... Representa vários entendimentos de matemática, que

agente precisa saber, ler néh, porque se a gente sair daqui para outra cidade, como é que a

gente vai ler uma placa, vai no mercado néh, sem saber ler, pode ser até que a gente compre

algum produto vencido. Ai por isso que hoje eu voltei a estudar.

E além de aprender a ler, escrever, você acha que a escola representa algo mais para

vida de um aluno? Ela é o lugar pra gente se educar mais, aprender a falar mais com o

pessoal, porque a gente analfabeto nem saber se expressar direito a gente não sabe néh. Se

expressar o que significa, saber falar direito, porque, por falta de estudo néh, da experiência.

E o que você acha dessa escola? Eu, inté no momento, primeiro ano que tou estudando néh,

eu tou achando bom néh, principalmente da professora, uma professora boa que ta

ensinando mesmo, não ta brincando néh, eu tou gostando.

Você acha que a escola pode lhe ajudar de alguma forma? Pode, pode me ajudar eu me

educar mais néh e chegar ao objetivo que eu quero néh. Aprender a ler pra quando eu chegar

em outra cidade ler uma placa, não entrar em uma rua errada, chegar no mercado, ler, saber

o que é que eu tou comprando.

Mudou alguma coisa na sua vida depois que você voltou a estudar? Mudou. Assim néh a

experiência de sobrevivência néh ( ele explica que a sobrevivência é não ser enganado e fala

sobre comprar produto vencido).

E na tua casa, na tua família, como foi a aceitação e o incentivo quando você decidiu

voltar a estudar? Minha esposa néh, graças a Deus, fica me incentivando cada vez mais néh

“ volte a estudar, porque a pessoa analfabeto é ruim”. E sem estudo a gente não somos

ninguém porque até pra ser gari de catar lixo, a gente tem que ter estudo, tem que fazer um

curso.

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ENTREVISTA 7

Com quantos anos deixou de estudar? 20 anos, sempre desistia

Por que foi que você deixou de estudar? Falta de interesse. Se juntava com quem não

queria nada.

Você estuda nesta escola a quanto tempo? Comecei este ano, estudava em outra escola.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? Concluir os estudos néh

Pra você, o que é a escola? Aprendizagem

Você acha que a escola pode te ajudar de alguma forma? Com certeza. A ser uma pessoa

mais culta.

Mudou algo na sua vida depois que você retornou à escola? Mudou.Sou uma pessoa mais

disposta, interessada em pesquisar os assuntos que os professores estão passando.

Você acha que a escola pode contribuir em outras áreas da sua vida? Fazer um concurso

néh, ter um trabalho garantido, que esses empregos hoje em dia não dá estabilidade a

pessoa.

Você considera que a escola é um lugar de outras relações? Sim, também conhecer gente

diferente, fazer novas amizades.

ENTREVISTA 8

Com quantos anos deixou de estudar? 6 anos

Por que deixou de estudar? Meu pai era feito cigano no meio do mundo, a gente não tinha

parada, meu pai era morador dos fazendeiros, e a gente nunca fazia ninho, quando começava

a melhorar ele achava que tava ruim e ia embora à procura de melhora, só atrapalhou a vida

da gente na verdade. Ele não procurou ajudar a gente (Emocionado o estudante responde,

chorando e lamentando por não ter estudado enquanto criança).

Quando a gente cresceu colocamos ele no canto da parede e fomos lutar pelo que é nosso.

Você estuda nesta escola a quanto tempo? Faz dois anos.

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Nesta mesma escola? Foi sim, voltei ano passado e estou continuando. Gostei néh, meu

objetivo é arrumar as coisas. Com meu trabalho d construção civil eu pego planta né,

rascunho de casa e entendo, nessa área eu sou bom né.

E mesmo com esses saberes o sr. acha que a escola é importante? é importante sim,

mesmo que ano passado eu faltei um pouco por conta do trabalho

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? Eu gostei, achei coisas boas, eu sabia que

ia aprender mais coisas. Tem vez que a gente precisa preencher um formulário desse

tamanho e paga um mico que não sabe pra onde vai e a gente aqui aprendendo é bom pra

nós.

Ano passado mesmo eu fui a um passei em Tamandaré, quando chegou lá tinha uma ficha pra

preencher, ai já pesa né, a gente preenche mas fica os erros né. Hoje em dia onde a gente

chega tem que preencher alguma coisa.

Eu tenho habilitação, mas de cinco em cinco anos tenho que renovar minha carteira, quando

chego no Detran a gente recebe um papel, e eu tremi lá.

Daqui a dois anos quero chegar no Detran e preencher a ficha sozinho, eu levo sempre

minha filha, e a mulher também fica olhando.

Para que serve a escola? Educação, muita educação, pra respeitar os amigos e aprender ler

e escrever.

A escola está te ajudando de alguma forma? A ler e escreve e respeitar o próximo.

Eu não acho que consigo muita coisa mais não. Quero ler e escrever durante meus últimos

dias de vida.

Mudou alguma coisa na tua vida depois que você voltou a estudar? Mudou. Eu tinha

umas dificuldades nas plantas das casas, já tou desenrolando, ler algumas coisas já.

Como foi a aceitação da sua família quando você resolveu estudar? Aaa, a mulher me

apoia muito, meus filhos. Meus três filhos são estudados, mas formado só um, o mais novo.

E a aceitação dos seus amigos? Eles dizem que não acreditam que eu voltei a estudar. Mas

dizem que é bom.

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Você acha que a escola está estruturada para lhe receber? Sim, estão sim, Temos merenda

na hora certa, tem a sala de leitura, sempre era na quarta –feira, esse ano ainda não

definiram.

ENTREVISTA 9

Com quantos anos deixou de estudar? Estudei bem pequena, quase não tinha escola na

cidade, só tinha a escola de sr. Juquinha perto de casa (escola particular) ai deixei de estudar.

Quando você retornou à escola? Comecei esse ano.

Qual motivo te fez retornar à escola? Aaa o motivo foi porque eu acho que a leitura é uma

coisa que não se compra com dinheiro. E assim eu mesmo tenho muita dificuldade, pra pegar

ônibus, ler uma coisa, pesquisar um preço, ver uma promoção, também meus filhos quando

for pro colégio, como eu vou ensinar a tarefa, tudo isso me fez voltar pro colégio. Aprender

ler e escrever

Como você acha que a escola pode te ajudar além de aprender ler e escrever? Eu acho

que o objetivo da escola é ensinar a gente ler e escrever e dar exemplo.

Como a escola pode dar exemplo? Assim, tendo paciência explicando pra gente entender

melhor.

Você acha que as suas vivências que você tem são aproveitadas na escola? Mas assim,

isso são coisas que a gente não estuda. Coisas que ta acontecendo no mundo. E eu acho que

a escola não precisa trazer o que acontece no mundo pra dentro da escola, porque o que

acontece no mundo a gente já ver na televisão, já vê tudo isso.

A escola pode te ajudar de alguma forma? Pode sim.

Mudou alguma coisa na sua vida depois que voltou a estudar? Lógico. Eu não conhecia as

letra, passei a conhecer, já consigo escrever.

Você acha que a escola pode contribuir na tua vida social? Sim. Eu vim pra escola porque é

muito importante e assim, eu tenho um desejo no meu coração de deixar de trabalhar na casa

dos outros. Eu quero estudar, me formar em alguma coisa, ter um emprego melhor, da uma

vida melhor aos meus filhos, por tudo isso.

E a tua família o que acharam quando você decidiu voltar a estudar? Aaaa... Minha mãe

achou ótimo né, minhas irmãs disseram vá em frente. É cansativo, trabalho durante o dia,

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cuido dos meus filhos a noite, tomo banho e venho pro colégio, mas vale a pena né, peço a

Deus todo dia que todo esse esforço meu né, seja recompensado com algo.

ENTREVISTA 10

Com quantos anos deixou de estudar? Nunca estudou.

Eu ajudava minha mãe, cuidava da casa mais ela.

Qual motivo te fez retornar à escola? Para aprender alguma coisa, aprender ler.

A escola pode te ajudar de alguma forma? Pode sim.

Mudou alguma coisa na sua vida depois que voltou a estudar? Mudou. Aprendi meu nome,

as letra. A pessoa sem saber ler é cego, não sabe de nada.

ENTREVISTA 11

Com quantos anos deixou de estudar? Não lembro. Eu repetia muito e depois eu desisti.

Por que deixou de estudar? Voltei a estudar, acho q ta com uns dois anos, mas eu desisti

Por que você deixou de estudar? Porque eu me peguei com o pai da minha menina, ai

deixei de estudar.

Você estuda nesta escola a quanto tempo? Eu comecei esse ano.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? As meninas me dando conselhos. Meu

padrinho também, sempre dizia, vai menina estudar.

Quem saõ as meninas? Umas que estudam aqui em cima (Se referindo a turma da 2ª fase).

Você tem alguma dificuldade por não saber ler e escrever? Tenho sim dificuldade Porque,

assim, no caso, negócio de conta né. Eu pago aluguel, dei dinheiro passando a mulher, já foi

ela que me disse.

E pra você o que é a escola? É boa, assim, eu tou vendo se eu aprendo, porque eu sou muito

ruim. Algumas coisas eu sei, ditado eu sei.

A escola está te ajudando de alguma forma? Sim, a leitura.

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E saber ler te ajuda em que? Muita coisa. Assim, você vai pra um canto não precisa ta

perguntando nada a ninguém, vai no mercado não precisa ta perguntando ao povo, as vezes

quando eu vou eu levo minha menina porque ela sabe.

Quais suas expectativas em relação à escola? Coisas boas. Eu aprender mais ler.

Mudou alguma coisa na tua vida depois que você voltou a estudar? Mudou. Eu tenho mais

paciência de ta na sala de aula, coisa que eu nunca tive.

ENTREVISTA 12

Com quantos anos deixou de estudar? 13 anos

Por que foi que você deixou de estudar? Precisei trabalhar

Você estuda nesta escola a quanto tempo?. É o primeiro ano nesta escola. Eu voltei a

estudar ano passado em outra escola, fiz a 1ª fase e agora estou fazendo a segunda.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? Aaa para aprender mais, e também assi, eu

queria arrumar um emprego melhor também né, fazer um concurso, ai precisa dos estudos e

aprender mais também né.

Pra você, o que é a escola? É um lugar que a pessoa aprende a respeitar as pessoas, os

professores, os alunos, que a gente tem que respeitar também o amigo também ne, a gente

aprende muito na escola. Porque se a gente não estudar como é que esses doutor vai ser

médico, se não aprende a ler, a escrever, a gente tem que estudar né, porque graças aos

professores que esse povo tão lá em cima.

Você acha que a escola pode te ajudar de alguma forma? Sim.

De que forma a escola pode estar te ajudando? Assim, eu ajudo também a minha mãe, a

ler a escrever porque ela também não sabe e é complicado, eu aprendendo para poder

ensinar a ela.

Mudou algo na sua vida depois que você retornou à escola? Aaa mudou (esboça sorrisos).

E o que mudou? Aa a gente conhece pessoas novas e outra coisa, você não fica em casa sem

fazer nada. Você tem que ter conhecimentos, conhecer as coisas.

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Você tinha alguma dificuldade por não estar na escola? Pronto, quando eu estudei

quando era mais nova eu já sabia ler e escrever. Quando eu parei de estudar eu comecei

a ler e escrever pra não esquecer.

Quais são os teus objetivos? Não ficar em casa sem fazer nada. E meu objetivo é

trabalhar, ter um emprego melhor para sustentar uma casa e pra isso a gente tem que

estudar.

E a escola que te recebe hoje você acredita que está preparada para te receber? Sim, são

bem preparados. Os professores, os que comandam a escola, são bem preparados.

E você acha que a escola tem outras funções além de ensinar a ler e escrever? É como eu

disse né, a educação, vem por ai... pela escola, respeitar as pessoas, o próximo, tem que ter

respeito, a gente aprende também na escola, não só em casa

E o acesso a biblioteca? Ainda não temos, porque é o começo do ano ainda né, mas vamos

ter. Temos palestras também, são muito boas as palestras, sempre vem alguém conversar com

a gente.

ENTREVISTA 13

Com quantos anos deixou de estudar? 15 anos, eu estudava e desistia.

Mas por que você desistia? Por conta da prova de matemática.

Só por conta disso? Era, a prova de matemática me assustava, até hoje.

Você estuda nesta escola a quanto tempo?. 5 meses, comecei esse ano

E desde que você parou de estudar só voltou para estudar agora? Não, eu fui pra o São

Cristóvão e lá fizeram uma ficha que eu tinha perdido o documento, ai fizeram uma ficha e eu

continuei estudando, depois eu fui pra Alagoas e voltei pra cá, me casei, minha esposa estuda

aqui e ela me convenceu estudar novamente. Ela me ajuda com a matemática.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? Melhorar a convivência com o mundo de

hoje também né, procurar melhorar na leitura. Eu tenho vontade de futuramente mestre de

obra né, invés de ser só o pedreiro, ser mestre.

Você disse que retornar a escola é melhorar a convivência com o mundo. Você acha que

o mundo hoje exige mais que você tenha escolaridade, que saiba ler e escrever? Sim. Em

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toda área, principalmente na área que eu pretendo seguir, ser mestre de obra, então tenho

que ter o estudo, porque se não tiver estudo nem de gari trabalha mais.

Pra você, o que é a escola? A escola pra mim é uma formação né, a gente forma caráter,

conhece pessoas e compartilha o dia a dia, a gente vevi trabalhando, o estresse do dia a dia,

você chega na escola vê pessoas diferentes, pessoas que dão forças né. Na rua a gente não

encontra.

Na sua fala fica clara que pra você a escola não é apenas um lugar para aprender a ler e

escrever, isso é função da escola sim, mas a escola tem outras funções, você concorda?

Sim concordo, cidadania né. Somos cidadão que precisa vir à escola, que a gente aprende

tanto a ler e escrever como a falar com as pessoas, muitas vezes a gente estressados fala

errado com o povo e na escola a gente aprende a se comportar.

Você acha que a escola está preparada para receber você, com suas vivências e

experiências? Olhe eu acho. Porque nós compartilhamos conhecimento né. Eu tenho um

conhecimento de fora dos livros, fora das escritas, então juntando esse conhecimento que eu

tenho fora com esse conhecimento dos livros e escrita, então vai aprimorar, eu vou aprender

com eles e creio que no dia a dia até o professor mesmo ele aprende com a gente.

Mudou algo na sua vida depois que você retornou à escola? Mudou. Melhorou bastante, a

minha leitura ta melhor, tou conseguindo assinar um pouco melhor. Eu não gostava do N e

sou apegado ao S, nunca uso o C, mas tou aprendendo.

E seus filhos, como foi a aceitação quando você voltou a estudar? Eu lancei um desafio

com eles, pra a gente ver qual de nós passaríamos nas provas, então eles aceitaram, todos

eles né. São quatro, dois moram num lugar, dois em outro, eu procuro ir cada mês, cada mês

eu vou duas vezes na escola de cada um pra ver como ta o desempenho deles e quando eu

tenho alguma dúvida eu ligo pra eles.

E o acesso à escola além da sala de aula? Temos, a gente já teve palestras aqui no pátio,

que são muito boas as palestras e tem pessoas igual você que vem pra trazer mais

conhecimento pra gente também. Eu creio que futuramente a gente passando nas provas né,

vamos sair da própria escola para pesquisar campo, sair, eu tou gostando de estudar denovo.

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ENTREVISTA 14

Com quantos anos deixou de estudar? 11 anos

Por que deixou de estudar? Nem sei viu, eu era moleque pequeno, falta de interesse mesmo

né..

Você estuda nesta escola a quanto tempo? Eu comecei esse ano.

E desde que você parou de estudar só voltou para estudar agora? Foi. Só voltei agora.

E qual foi o motivo que te fez voltar a estudar? É porque eu fui fazer um curso lá no

SENAC né, ai eles perguntaram a minha escolaridade e mandaram eu vim terminar os

estudos.

E sr. fez o curso? Não. Pude não, de jeito nenhum.

E o sr. pode me dizer qual foi o curso? É... Porque eu trabalho na área de pedreiro, ai fui

fazer um curso na área de desenhista, projetista, fazer projeto de casa, ai só pode com

estudo. Ai mandaram eu vim terminar os estudos pra depois voltar lá.

Para que serve a escola? Serve pra dar educação né, ensinar muitas coisas. Saber ler né,

chegar nos cantos e ter educação com as coisas.

Você teve dificuldades na sua vida por não ter terminado os estudos? Não. Eu fui

aprendendo com o tempo mesmo. Pra você ver, eu fazia terceira, já tou na quarta (se

referindo a série), fiz só uma prova ai (reclassificação, ai viu que eu tinha capacidade e

colocaram eu na quarta série.

E eu deixei também de estudar porque não tinha a oportunidade que tem hoje né. Porque

naquele meu tempo não tinha oportunidade, só os ricos que faziam faculdade, estudavam, só

os ricos mesmos, porque pobre... no meu tempo era de cartilha ainda né, era... de cartilha era

meio ruim.

A escola mudou muito, mudou muito a escola, ta bom demais.

E o que mudou? Pra dizer a você no meu tempo quando eu estudava levava era bolo na

mão. Que lembra é essa? Era um O eu dizia A, a professora chegava e metia a palmatória na

mão.

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E você acha que isso fazia com que a criança se afastasse da escola? Não. Naquele tempo

aprendia mais, era forçado a aprender.

Mas o aluno saia da escola com maior facilidade? Não. Não.

Mas porque você deixou a escola? Porque era a minha vida, não tinha nem mãe nem pai

não, nasci sem mãe e sem pai, foi difícil pra mim, não teve uma pessoa pra chegar e dizer

você vai fazer isso, isso, eu tinha terminado meus estudos, eu não estava aqui hoje. Mas não

tive ninguém por mim.

E a escola pode lhe ajudar de alguma forma? Pode e muito. Vou arrumar um serviço

melhor. A escola ensina uma parte e o mundo ensina o resto.