62
UniSALESIANO LINS CENTRO UNIVERSITÁRIO CATÓLICO SALESIANO AUXILIUM CURSO DE DIREITO ABRÃO FRANCISCO DA SILVA JUNIOR EUTANÁSIA, UM DIREITO FUNDAMENTAL OU UMA PERSPECTIVA DE DIREITO? LINS/SP 2018

ABRÃO FRANCISCO DA SILVA JUNIOR EUTANÁSIA, UM DIREITO ... · Monografia apresentada ao curso de Direito do UniSALESIANO, Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium, sob

  • Upload
    others

  • View
    6

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

UniSALESIANO LINS

CENTRO UNIVERSITÁRIO CATÓLICO SALESIANO AUXILIUM

CURSO DE DIREITO

ABRÃO FRANCISCO DA SILVA JUNIOR

EUTANÁSIA, UM DIREITO FUNDAMENTAL OU UMA PERSPECTIVA DE

DIREITO?

LINS/SP

2018

Silva Junior, Abrão Francisco da

Eutanásia, um direito fundamental ou uma perspectiva de direito? / Abrão Francisco da Silva Junior. – – Lins, 2018.

60p. 31cm. Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico

Salesiano Auxilium – UniSALESIANO, Lins-SP, para graduação em Direito, 2018.

Orientador: Raphael Hernandes Parra Filho

1. Eutanásia. 2.Dignidade da Pessoa humana. 3.Morte Digna. I Título.

CDU 34

S58e

ABRÃO FRANCISCO DA SILVA JUNIOR

EUTANÁSIA, UM DIREITO FUNDAMENTAL OU UMA PERSPECTIVA DE

DIREITO?

Monografia apresentada ao curso de Direito do

UniSALESIANO, Centro Universitário Católico

Salesiano Auxilium, sob a orientação do Professor(a)

Mestre Raphael Hernandes Parra Filho, como um

dos requisitos para obtenção do título de bacharel

em Direito.

LINS/SP

2018

ABRÃO FRANCISCO DA SILVA JUNIOR

EUTANÁSIA, UM DIREITO FUNDAMENTAL OU UMA PERSPECTIVA DE

DIREITO?

Monografia apresentada ao centro Universitário Católico Unisalesino Auxilium,

para obtenção do título de bacharel em direito

Aprovado em: 07/12/2018

Banca Examinadora;

Professor Mestre Raphael Hernandes Parra Filho (Orientador)

Assinatura:______________________________

Professor Doutor, Juliano Napoleão

Assinatura:______________________________

Professor Doutor, Osvaldo Moura Junior

Assinatura:______________________________

Dedico este trabalho de conclusão de curso, a minha família por todo incentivo que me fortaleceram até aqui e de muitas formas me ajudaram para que fosse possível a croncretização deste momento.

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por ser essencial em minha vida, do meu

destino, e o meu socorro presente nas horas de angustia e fraqueza.

Agradeço ao meu professor e orientador Raphael Hernandes Parra Filho, pelo

suporte necessário, pelas suas orientações e correções.

E a todos os professores que direta ou indiretamente contribuíram para a

minha formação, o meu muito obrigado.

“Se vale a pena viver e se a morte faz parte da vida, então, morrer também vale à pena...”

Immanuel kant

RESUMO

O presente trabalho busca analisar se a pratica da eutanásia pode ser

legalizada, e que em conseqüência a Constituição Federal adote um direito de

morrer dignamente. Para isso se analisam os princípios que regem a ética

biomédica, bem como os princípios que envolvem o direito, alem das várias formas

de eutanásia, que juntos auxiliem na busca de respostas para um novo direito. A

análise feita entre colisões de direitos fundamentais, e também por meio as várias

formas de eutanásia como meio de se por fim a vida de uma pessoa resultara a

conclusão, se seria possível o titular do direito a vida possa dela dispor, decidindo,

livremente, com base em sua concepção de dignidade sobre a intenção de continuar

a viver e o modo como pretende morrer. Ao fim se utiliza o direito comparado para

mostrar como funciona a eutanásia nos países que são adeptos a sua prática e se

seria possível utilizar-se da mesma legislação como parâmetro para a legalização no

Brasil. E assim o projeto de lei 125/96 ao qual posto em votação pelo Senado

Federal, obtivesse êxito com a devida aprovação.

Palavras-chave: EUTANÁSIA. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. MORTE

DIGNA.

ABSTRACT

This paper seeks to examine whether the practice of euthanasia can be

legalized, and that inconsequence the Constitution adopt a right to die with dignity.

For this, we examine the principles governing biomedical ethics, as well as the

principles involving the right in addition to the several forms of euthanasia, that

together help in the search for answers to a new right. The analysis between

collisions of fundamental rights, and also through the several forms of euthanasia as

a means to end a person’s life was the conclusion, if it would be possible to the

holder of the right to life could her service, deciding, freely based on your conception

of dignity about the intention of continuing to live and how you want to die. To order

using comparative law to show how euthanasia in countries they are adept at your

practice and if it would be possible to use the same legislation as parameter to the

legalization in Brazil. And so the Bill 125/96 which put to a vote by the Senate, get

success with proper approval.

Keywords: EUTHANASIA, DIGNITY OF THE HUMAN PERSON, DEATH

WITH DIGNITY.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9

2 PRINCÍPIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS.... .................................................... 10

2.1 Do Direito à vida ............................................................................................... 15

2.2 A Dignidade da Pessoa Humana ...................................................................... 20

2.2.1 A Dignidade da Pessoa Humana consagrada na Constituição Federal Brasileira .................................................................................................................. 22

2.3 Relações entre dois institutos, dignidade da Pessoa humana e os Direitos fundamentais... ........................................................................................................ 25

2.4 Eutanásia sua definição e suas formas...........................................................26

2.5 Uma vida digna ou um direito a morte... ......................................................... 31

3 DIREITO A MORTE DIGNA ................................................................................... 34

3.1 A Morte e o Direito de Morrer .......................................................................... 35

3.2 A justificativa sobre o direito de Morrer com dignidade ............................... 39

3.3 A Eutanásia Ativa e a Passiva ......................................................................... 44

3.3.1 Passiva ou Negativa ....................................................................................... 45

3.3.2 Ativa direta e indireta... .................................................................................. 48

3.4 O Direito comparado em face da Morte Digna... ............................................. 51

3.4.1 Holanda... ........................................................................................................ 52

3.4.2 Bélgica... .......................................................................................................... 54

3.5 A Eutanásia no Brasil.......................................................... ..............................54

4 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 55

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 57

9

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso surgiu através de reflexões e

discussões acerca do assunto referente ao direito de morrer com dignidade, que até

o momento ainda não se encontra uma solução propícia para essas situações.

Percebe-se que pessoas com enfermidades incuráveis, irreversíveis que se

deparam frente a um quadro diagnosticado por especialistas em sua incapacidade

total, anseiam e muitas vezes desejam pela morte e não mais pela vida. Nesse

entendimento o presente trabalho propõe se seria inconstitucional permitir a

realização da eutanásia, e em quais situações se aplicaria a mesma, fazendo uma

análise perante a colisão entre direitos fundamentais, dentre eles a vida, a liberdade

e a dignidade da pessoa humana.

Os motivos responsáveis por fomentar a escolha do referido tema, se pautam

nas divergências e polêmicas diante da sociedade jurídica quando o assunto trata-se

do direito/escolha de morrer dignamente.

A eutanásia trata se da morte digna, vista como um direito fundamental para

as pessoas que se encontram com alguma doença incurável ou irreversível em que

a medicina ainda não encontrou a cura e que por muitas vezes conseguem

expressar-se por esse desejo de abreviar sua vida e morrer dignamente, da mesma

maneira em que conduziu a mesma com dignidade.

O capítulo II consiste no estudo de princípios, fundamentais envolvendo a

ética biomédica, como aqueles privilégios voltados para os direitos fundamentais,

sobretudo, o direito a vida no seu aspecto positivo, ou seja, como direito e não como

dever. Posteriormente será analisado o principio da dignidade da pessoa humana

que dentre todos os princípios constitucionais por ora contidos na carta magna, fica

evidente ser o mais importante dentro do tema abordado, devendo demonstrar que

uma vida indigna, faz nascer á possibilidade de pleitear o direito de escolha de uma

morte digna. E nesse contexto, apresentar mesmo que superficialmente, mas de

suma importância para alimentar o raciocínio sobre o tema, as modalidades da

eutanásia.

O capítulo III contém explicações de vários argumentos, buscando defender a

morte digna por meio de uma análise entre as formas de eutanásia. Sobretudo a

acareação efetiva dos institutos, instrumentos, conceitos ou outros elementos dos

direitos consoantes em legislações de outros países.

10

Além de tratar-se de uma questão extremamente indefinida e com uma

discussão interminável, vem se deparando nos dias atuais com os seguintes fatores:

falta da cura para alguns tipos de doenças, o sofrimento de pessoas enfermas que

tem a vida prolongada sem esperança de cura, viver de forma indigna, preferir a

morte digna a viver com dores e sofrimento, a forma como são punidas as pessoas

que praticam a eutanásia ainda que ajam por motivos humanitários, o descaso do

Estado com a saúde pública que deixa morrer centenas de pessoas por ano e a

possibilidade de mais uma legislação a respeito do assunto.

Diante disso, tem-se a pretensão de verificar a proposta de um novo direito

fundamental visando se seria ou não a solução para o tema investigado, levando em

consideração o Projeto de Lei nª125/96 que tramita no Congresso Nacional, e

atualmente, tal projeto foi posto em votação, este que trata sobre a aplicação da

eutanásia nos casos de ser portador de uma doença incurável ou encontrar-se em

um estado vegetativo ou uma deformidade física permanente que impossibilite de

praticar as necessidades básicas diárias.

Findando, para a complementação do entendimento sobre o discutido tema,

tem-se o acréscimo de trechos de filmes dentre outros de situações relacionadas a

prática da eutanásia.

2. PRINCÍPIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os princípios são um conjunto de normas ou padrão de conduta seguida por

uma pessoa ou instituição, podendo estar associados às proposições ou normas

fundamentais que norteiam os estudos, sobretudo os que regem o pensamento e a

conduta. Por conseguinte direitos fundamentais são normas que estabelecem

direitos e limitações aos particulares e ao Estado visando possibilitar o convívio

social e concretizar a dignidade da pessoa humana.

Vale apresentar uma diferenciação entre direitos fundamentais de direitos

humanos para melhor compreensão dos referidos direitos.

Veja-se, pois, o que diz NOVELINO (2010, p.351).

Apesar da inexistência de um consenso acerca da diferença em relação aos direitos humanos, a distinção mais usual é no sentido de que ambos contemplam, em planos distintos, direitos relacionados à liberdade e à igualdade criados com o objetivo de proteger e promover a dignidade da pessoa humana.

11

Pode-se perceber que não existe uma diferença característica entre direitos

humanos e direitos fundamentais sendo que a principal diferença esta na ordem

jurídica em que cada um desses direitos opera, ou seja, temos aqui dois direitos que

buscam a luta pela liberdade, pela igualdade e para promover a dignidade da

pessoa humana mais em casos diferentes.

Por conseguinte os direitos fundamentais são os direitos humanos

consagrados e positivados na Constituição Federal de cada nação, ao ponto que os

direitos humanos são vistos em tratados e convenções internacionais, ou seja,

ambos pregam pela mesma coisa em plano distinto. Assim, ambos possuem

conteúdos semelhantes, e se consagram em planos diferentes.

No mesmo sentido do que acima foi exposto, NOVELINO(,2010,p.352)

explana que:

Os direitos humanos encontram se consagrados nos tratados e convenções internacionais (plano internacional), ao passo que direitos fundamentais são os direitos humanos consagrados e positivados a Constituição de cada pais (plano interno), podendo o seu conteúdo e conformação variar de Estado para Estado.

Dessa forma se observa que direitos humanos e direitos fundamentais têm o

mesmo sentido, contudo seguem em planos distintos. Assim sendo, esclarecido a

diferenciação entre direitos humanos e direitos fundamentais, passa a tratar-se os

direitos fundamentais de forma mais aprofundada.

Pode-se dizer que direitos fundamentais são os direitos básicos, individuais,

políticos, sociais e jurídicos que estão previstos na Constituição Federal de cada

nação, baseado no primórdio da dignidade da pessoa humana. No Brasil, os direitos

fundamentais percorrem de forma implícita em quase toda a Constituição Federal,

tal como se encontra de forma explícita no artigo 6°. No sentido de que:

Por possuírem um conteúdo patrimonial, os direitos fundamentais são

intransferíveis, inegociáveis e indisponíveis (inalienabilidade), não se

admitindo serem alcançados pela prescrição (imprescritibilidade).

(NOVELINO, 2010 p.354).

É importante enfatizar que essas características dos direitos fundamentais,

no decorrer do trabalho serão questionadas.

Portanto, se observa que dentre as características que abrangem os direitos

fundamentais, a irrenunciabilidade é a de maior relevância para o objeto desse

12

trabalho, devido a importância que carrega, sendo que nem o próprio detentor de um

direito muitas vezes pode se dispor dele, mesmo que sua vontade prevaleça, porque

dependendo da finalidade de sua renúncia triunfará o direito fundamental concreto

que poderá ser preservado. Esse será um dos principais pontos apresentados e

debatidos nos capítulos posteriores justamente porque o objeto desse trabalho esta

diretamente ligada à abdicação do direito fundamental mais importante, que é o

direito a vida.

Os direitos fundamentais alteram, no sentido de que eles surgem e se

desenvolvem juntamente com o passar do tempo estando presente em vários

momentos históricos. “A historicidade também é uma das qualidades dos direitos

fundamentais, porquanto surgem e se desenvolvem conforme o momento histórico”

(NOVELINO, 2010, p.354).

Visto algumas características trazidas pelo renomado autor acima citado, é

importante saber qual alcance possuem os direitos fundamentais, visto que, esse

alcance poderá servir de parâmetro para mostrar até que ponto a norma versada

sobre esses direito operam.

Acredita-se que toda norma esta limitada ao objeto jurídico destinado a

proteção ao qual justifica sua criação. Não é diferente com as normas que versam

sobre direitos fundamentais até para estas existem limites. “Os direitos

fundamentais, em grande parte, são limitáveis exatamente porque versados na

maioria dos casos por meio de fundamentos” (Dias, 2012, p.38).

É de suma importância ressaltar-se para melhor elucidação, o que traz a

respeito do assunto a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1.789, em

destaque ao direito fundamental de “liberdade”, desta forma de acordo com o artigo

4°que diz:

Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.

Assim sendo, imprescindível se torna a análise do mencionado artigo acima,

porque considerando a essência de seu texto, percebe-se, que a liberdade esta

baseada em fazer tudo àquilo que não prejudique o próximo, ou seja, o seu alcance

só esta limitado quando a liberdade de um prejudica a liberdade dos demais ou

quando a lei determinar. Do ponto de vista subjetivo, esse artigo poderia ser

13

considerado para o entendimento de que a morte digna se dá, uma vez que, a

vontade daquele que pensa em dispor de sua própria vida por considerar que se

vive de forma indigna, não prejudicará na vontade daquele que deseja viver.

Diante do artigo 4° da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de

1789 e do ponto de vista subjetivo do referido artigo, veja-se, pois o que diz o artigo

29,§ 2° da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU de 1948 que dispõe:

Art.29,§2°. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.

Por conseguinte, salienta-se que da Declaração de Direitos do Homem e do

Cidadão de 1789 para a Declaração Universal dos Direitos Humanos 1948 existe

uma interpretação diferente em relação ao direito a liberdade.

À vista disso, observa-se que o direito a liberdade de 1948, ganha uma nova

roupagem, a forma como foi imposta esta mais explicita, mostra com clareza até que

ponto a pessoa possa exercer seu direito de liberdade e respeitar a liberdade dos

demais

Em conseqüência, e antes de discorrer sobre os princípios propriamente

ditos, notável se faz destacar que nem todos os direitos fundamentais estão

previstos na Constituição Federal, vejamos o artigo 5°,§2°:

Art.5º §2º, Os direitos e garantias expressos nessa Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

De acordo com o referido artigo, arrisca-se dizer que nem todos os direitos

fundamentais estão arrolados no texto constitucional, podendo estes ser

encontrados também decorrentes de princípios e tratados em que o Brasil faça

parte.

No que tange aos princípios, pode-se dizer que funcionam como freio e

contrapesos para com as demais fontes do direito, são peças essenciais para o

ordenamento jurídico brasileiro, alicerçando e norteando o caminho a serem

percorridos pelas demais fontes, observando sempre o contexto fático no qual

necessitem a sua aplicação.

14

Conforme se observa em (SILVA, 2009, P.1090):

Princípios notadamente no plural significam as normas elementares, ou requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito. E, nesta acepção, não se compreendem somente os fundamentos jurídicos, legalmente instituídos, mais toda axioma jurídico derivado da cultura jurídica universal. Compreende, pois, os fundamentos da ciência jurídica, onde se firmariam as normas originárias ou as leis científicas do Direito, que traçam as noções em que se estrutura o próprio Direito. Assim, nem sempre os princípios se inscrevem nas leis. Mas, porque servem de base ao Direito, são tidos como preceitos fundamentais para a prática do Direito e proteção aos Direitos.

Diante deste entendimento, pode-se concluir que são os princípios que

impulsionam o direito, sendo ferramentas essenciais, tornando-o possível de ser

aplicado com eficácia, até porque muitas vezes quando um direito é questionado o

argumento de defesa a ser utilizado é o princípio que o instituiu.

Conquanto, tratando-se de princípios e correlacionando-os com os direitos

fundamentais, importante ressaltar uma consideração feita por NUCCI (2010, p.36):

Sob outro aspecto, os princípios não afrontam direitos e garantias fundamentais; com eles sintonizam-se na essência. Aliás, como regra, os princípios protegem os direitos fundamentais e servem de estrutura para as garantias fundamentais.

Conseqüentemente pode-se perceber que princípios e direitos fundamentais

estão interligados, uma vez que os direitos fundamentais são formados a base de

princípios, que por sua vez são formados a base de valores, crenças, dignidade, o

que é tudo aquilo que os direitos fundamentais reverenciam.

Diante disso, perfazendo o entendimento sobre princípios, importante se faz a

especificação de que estes se distinguem de regras uma vez que estes são

espécies do qual o gênero é a norma. “Assim, as normas constitucionais ou são

regras ou são princípios, ou seja, norma é o gênero que comportam duas espécies:

as regras e os princípios”. (Dias, 2012, p26).

Portanto, diante desse entendimento têm-se dois tipos de normas diferentes

isso não significa dizer que princípios e regras são formados pela mesma estrutura,

mas pode-se entender que são duas normas com conteúdo distinto.

Nesse seguimento, aduz Roberto Dias (Dias, 2012, p.27), ao defende que

existe uma diferenciação entre regras e princípios:

15

Não há dúvida que exista diferença entre regras e princípios. Contudo, discute-se a distinção

entre esses dois tipos de normas reside no grau de generalidade, abstração e funda mentalidade ou

seria de natureza lógica e qualitativa.

Dessa forma, pode-se, perceber, que existe uma diferença entre regras e

princípios, mas não se vale aprofundar neste assunto para não perder o foco deste

trabalho, no sentido de atentar-se nos princípios em si, fazendo só uma breve

consideração sobre o que os princípios são e o que os diferenciam das demais

regras.

Feito isso, torna-se indispensável a explanação dos princípios que

sustentarão a idéia central do presente trabalho, sendo esta “O DIREITO A MORTE

DIGNA”. O direito a vida, princípio da autonomia, princípio da não-meleficência

serão usados e assim, posteriores a isso como ponto de partida, o principal deles, o

princípio da dignidade da pessoa humana.

O princípio da dignidade da pessoa humana sem dúvidas é o mais importante

de todos os princípios que regem a Constituição Federal, encontrado tanto de forma

explícita, como de forma implícita, guardando relação de importância incalculável

com o tema do trabalho discutido.

Devido à grande importância que traz o princípio da dignidade da pessoa

humana, faz-se necessário utilizar-se de boa parte de um capítulo só para explicá-lo,

sendo este o motivo que será o alvo do segundo capítulo desse trabalho junto com

as formas de eutanásia. Desta forma, passa-se à análise aos demais princípios

utilizados

2.1 Do Direito à Vida

De todos os direitos assegurados pela Constituição Federal a vida é o direito

fundamental que guarda uma relação de importância diferente, perante os demais, é

a base, pois sem a vida os demais direitos jamais existiriam, o direito a vida é o

pressuposto para todos os outros direitos existentes.

Para melhor compreensão veja-se o que diz Paulo Gustavo Gonet Branco:

A existência humana é o pressuposto elementar de todos os demais direitos e liberdades dispostos na Constituição. Esses direitos têm nos marcos da vida de cada individuo os limites máximos de sua extensão concreta. O direito à vida é a premissa dos direitos proclamados pelo constituinte; não faria sentido declarar qualquer outro se, antes, não fosse assegurado o próprio direito de estar vivo para usufruí-lo. (MENDES;BRANCO, 2015, p.255).

16

Assim, o direito a vida, é um direito natural, nasce com o homem, é garantido

e protegido pelo ordenamento jurídico pátrio, sem a sua existência não a que se

falar em direito a morte. Para sua melhor compreensão é necessário que se observe

a dupla acepção que MARCELO NOVELINO faz sobre o direito à vida.

De acordo com Novelino (2015, p.363):

Em sua acepção negativa, consiste no direito assegurado a todo e qualquer ser humano de permanecer vivo. Trata-se, aqui, de direito de defesa que confere ao individuo status negativo (em sentido amplo), ou seja, direito à não intervenção a sua existência física por parte do Estado e de outros particulares.

Na acepção negativa conforme demonstrado, a vida é vista como um dever

de viver e não só como um direito, ou seja, para esta acepção a pessoa é obrigada a

se manter viva, pois aqui o que se prevalece é o dever de viver e não somente o

direito à vida.

Já na acepção positiva veja-se o que diz Novelino (2015, p.363)

A acepção positiva é associada ao direito à existência digna, no sentido de ser assegurado ao indivíduo acesso a bens e utilidades indispensáveis para uma vida em condições minimamente dignas. Essa, acepção, no entanto, não se limita à garantia do mínimo existencial, atuando também no sentido de assegurar ao indivíduo pretensões de caráter material e jurídico. Nesse, sentido impõe a poderes públicos o dever de adotar medidas positivas de proteção à vida, de amparo material em espécie, bens ou serviços, assim como de emissão de normas de caráter protetivo e incriminador de condutas que atentem contra à vida.

Diferentemente da acepção negativa, a acepção positiva zela mais pelo

direito de se viver dignamente que o dever de viver. Observa - se que a obrigação

do Estado não esta em manter a pessoa viva, mas sim em assegurar que esta

pessoa tenha o direito de viver, e de forma digna.

Assim sendo, diante da análise sobre as duas acepções de direito a vida,

trazidos pela doutrina, concentra-se a atenção no seu aspecto positivo uma vez que

a finalidade que justifica tal distinção é demonstrar a vida como um direito e não

como um dever, tendo como base a vida indigna faz surgir a possibilidade do direito

a morte.

No entendimento de Marcelo Novelino (2010, p.392), sobre o direito a vida no

seu aspecto positivo e a eutanásia observa-se que:

A constituição consagra o direito a uma vida com dignidade, razão pela qual não se justifica a manutenção da vida humana a qualquer custo. Isso não

17

significa um direito subjetivo à morte, mas a necessidade de se considerar, ainda que em hipóteses excepcionais, a vontade do paciente e as circunstâncias fáticas do caso concreto.

Por esse entendimento, percebe-se que a Constituição, mesmo que de forma

analógica em benefício daquele que não possui uma vida digna menciona a

necessidade de ser considerada sua vontade pessoal para que tal direito seja

aplicado a sua morte.

Assim, considerando o direito a vida no seu aspecto positivo, tendo como

base o direito de se viver dignamente, tem-se o pilar inicial para a devida

sustentação do presente trabalho.

Com relação ao princípio da autonomia da vontade, pode se dizer que ser

autônomo e a capacidade de auto governo que uma pessoa possa exercer sobre si

mesma.

Assim, segundo Tom Beauchamp e James childress (2002,p.143):

O princípio de respeito à autonomia pode ser estabelecido, em sua forma negativa, da seguinte maneira: as ações autônomas não devem ser sujeitadas a pressões controladoras de outros. O princípio exige uma obrigação ampla e abstrata que é livre de cláusulas restritivas tais como “Devemos respeitar as opiniões e os direitos dos indivíduos desde que seus pensamentos e ações não prejudiquem outras pessoas seriamente”.

Percebe-se que o princípio da autonomia visto de forma negativa estabelece

ao indivíduo que suas ações não devem ser tomadas sobre a intervenção de

terceiros, pois deve ser respeitada a vontade daquele que deseja praticar algo desde

que não haja risco a demais pessoas.

Por outro lado têm-se o princípio de respeito a autonomia em sua forma

positiva, que ao contrário da negativa aqui é possível a intervenção de terceiros na

tomada de decisões do indivíduo, de forma que este auxilie a tomar a decisão

correta sem desrespeitar a sua vontade autônoma.

E como se observa, na opinião de Tom Beauchamp; James childress

(2002,p.144):

Muitas ações autônomas não poderiam ocorrer sem a cooperação material de outros que tornem as opções acessíveis. O respeito a autonomia obriga os profissionais a revelar as informações, verificar e assegurar o esclarecimento e a voluntariedade, e encorajar a tomada de decisão

adequada.

18

Percebe se que assim como no direito a vida, o princípio da autonomia

também pode ser visto sobre dois aspectos (positivo e negativo), mas aqui tanto um

quanto o outro tem aplicação significativa na busca para resposta a problematização

do referido trabalho, pois em ambos ainda que exista certa diferença, o que continua

prevalecendo é a autonomia da vontade do indivíduo na tomada de suas próprias

decisões mesmo que ainda haja a ajuda de um terceiro. Visto o principio da

autonomia, em seus dois aspectos, percebendo que ambos estão relacionado a

vontade do indivíduo, passa-se analisar com uma parcela significativa de

importância para com o presente trabalho, o princípio da não-maleficência.

“O presente princípio perfaz sua aplicação no sentido de que não se pode

causar dano nenhum a outrem de forma intencional”. O principio de não-

maleficência determina a obrigação de não infligir dano intencionalmente”

(BEACHUMP; CHILDRESS, 2002, p.209).

Concomitante a este princípio, segue de forma paralela o princípio da

beneficência, pois enquanto no princípio da não-maleficência a obrigação é de não

prejudicar; no princípio da beneficência a obrigação é de ajudar. “alguns filósofos

unem a não-maleficência e a beneficência como um único principio”

(BEACHUMP;CHILDRESS, 2002, p.210), como por exemplo o filosofo moral

americano William Klaas Frankena, trata o princípio da beneficência decomponível

em quatro obrigações gerais, não deve-se infligir males ou danos, deve-se impedir

que ocorram males ou danos, deve-se eliminar males ou danos e devemos fazer ou

promover o bem. Dentre essas quatro obrigações gerais criado por Frankena a

primeira delas esta relacionado a não-maleficencia, por isso a idéia de um único

princípio.

Como esses dois princípios seguem de forma paralela é necessária a

compreensão de ambos para que possível seja entender qual é a necessidade da

menção destes princípios definindo a relação entre eles para com o tema em

questão.

Assim, possível foi o entendimento de que um defende a obrigação de ajudar

e o outro a obrigação de não prejudicar. Ainda que a obrigação de não prejudicar

seja tão importante, a casos em que o dano é necessário desde que pequeno para

que ao fim seja alcançado um bem maior. Estamos falando aqui de casos em que o

principio da beneficência tem prioridade sobre o principio da não maleficência.

19

Veja-se o que diz Tom Beachump e James Childress (2002,p.211) sobre isso:

Se, num caso particular, o dano causado é muito pequeno (o intumescimento causado por uma picada de agulha, digamos), mas o beneficio proporcionado pelo auxilio é grande (uma intervenção vital, por exemplo), então a obrigação de beneficência claramente tem prioridade sobre a obrigação de não-maleficência.

Pode se, perceber que ás vezes é necessário a provocação de um possível

dano ao indivíduo, porém este tem que guardar relação com a sua finalidade, que

será sempre o alcance de um bem maior e justificável.

O princípio da não-maleficência pode ser entendido por meio de dois termos:

lesar e prejudicar. “lesar envolve violar os direitos de alguém, enquanto prejudicar

não envolve necessariamente uma violação” (BEAUCHAMP; CHILDRESS,

2002,p.213).

A importância para o presente trabalho é o princípio da não-maleficência no

seu termo “prejudicar”, no sentido de que uma pessoa possa prejudicar a si mesma

por meio de suas vontades e ações ou participação de terceiros desde que essa

prejudicação não afete outras pessoas.

Desta forma, pode-se considerar este um caso em que um indivíduo passa

por uma determinada situação na qual a melhor saída para ele não seja a opção

desejada por outros, temos aqui um caso em que o princípio da autonomia da

vontade prevalece sobre o princípio da não-maleficência. Por conseguinte,

determinado principio por ora em comento tem por objetivo evitar que se cause dano

a outrem fundado este sobre a ótica de dois termos (lesar e prejudicar), e no tema a

ser apresentada, a importância pende-se para a utilização da terminologia

prejudicar, justamente porque este termo busca alcançar mais um direito e não

visando lesionar nenhum, que já existente se encontram.

Assim, resta-se concluído que este princípio tem relevância para assunto

abordado, no sentido de mostrar que um individuo possa prejudicar a si mesmo sem

causar dano aos direitos de outros. O referido principio da não-maleficência deve ser

interpretado de forma a mostrar que a pessoa que se encontra com uma

enfermidade incurável e busca por abreviar sua vida, não esta prejudicando a

outrem.

20

2.2 A Dignidade da Pessoa Humana

Dignidade da pessoa humana entende-se como atributo de todas as pessoas,

tem valor absoluto e é condição prévia para o reconhecimento de todos os demais

direitos. Sua conceituação é de um entendimento complexo, não sendo possível

conceituar, mas o que se pode, afirmar é que todo ser humano é dotado de

dignidade, e que o princípio da dignidade da pessoa humana é o principio maior da

Constituição Federal desse, como de outros países.

Tal princípio possui representatividade no artigo inaugural na constituição

Federal de 1988, em seu inciso III, sendo assim acaba por exercer a função

determinante para a interpretação dos demais direitos e garantias contidas em todo

o texto legal que esta possui.

Antes de adentrar-se ao princípio da dignidade em si é necessário fazer-se

uma menção ao filósofo Kant que em sua obra “Fundamentação da metafísica e dos

costumes e outros escritos”, traz a distinção entre pessoas e coisas.

Segundo Kant, em sua afirmação sobre os seres irracionais:

Têm um valor meramente relativo, como meios, e por isso denominam-se coisas, ao passo que os seres racionais denominam-se pessoas, porque a sua natureza os distingue já como fins em si mesmos, ou seja, como algo que não pode ser considerado como simples meio.( KANT IMMANUEL, apud DIAS, 2012, p.87).

Diante da idéia trazida pelo filósofo, seres irracionais são coisas; ao passo

que os seres racionais são tratados como pessoas.

A partir dessa acepção sobre coisas e pessoas Kant, ainda expressa que;

No reino dos fins, tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo o preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade. (KANT IMMANUEL, apud DIAS, 2012, p.87).

Diante do demonstrado entendimento do filósofo pode-se concluir que uma

pessoa deve ser sempre considerada como um fim e nunca como um meio para a

obtenção de certo resultado; fazendo esta pessoa, parte da criação de uma

legislação universal que ela mesmo se dá e obedece, devendo esta legislação

conter “ uma dignidade, um valor incondicional, incomparável, para o qual só a

palavra respeito confere a expressão conveniente as estima que um ser racional

deve lhe tributar”. (KANT IMMANUEL, apud DIAS, 2012, p.87).

21

No entendimento, a respeito da idéia de Kant diante da dignidade, DIAS

(2012, p.88), expressa que;

Portanto, o conceito Kantiano de dignidade está intrinsecamente relacionado à noção de respeito e de autonomia, não se compatibilizando com a idéia de preço e de servidão. Além disso, só é possível conceber a dignidade na medida em que as pessoas forem entendidas como fins e não como meios voltados a consecução de determinados objetivos.

A dignidade trazida pelo filósofo Kant é uma noção de respeito e de

autonomia não devendo se comparar a pessoa como idéia de preço e de servidão,

só sendo possível isso na medida em que as pessoas são entendidas como fins e

não como meios.

Isto posto, foi possível entender a diferença entre coisa e pessoa sobre o

ponto de vista Kantiano, observou-se, que as pessoas são atribuídas dignidade.

Com isso firmamos a idéia do que é dignidade do ponto de vista Kantiano, contudo

entende-se que sobre o ponto histórico mais se valorizou a dignidade da pessoa

humana.

A segunda Guerra Mundial foi um marco histórico muito importante para a

compreensão da dignidade da pessoa humana. O sistema político nazista da época

e das barbaridades que ocorreram em campos de concentrações sem contar as

experiências realizadas em seres humanos ainda com vida, foi o que impulsionou

nos anos seguintes a criação da Organização das Nações Unidas.

O autor faz uma menção a guerra, DIAS, 2012, p.89.

A ascensão do nazismo na primeira metade do século XX negou, em todos os sentidos, o ideal Kantiano acerca da dignidade da pessoa humana. Milhões de pessoas especialmente judeus, ciganos, homossexuais, comunistas e deficientes físicos, por força de um ideal autoritário baseado na Eugênia, acabaram entulhadas em campos de concentração, onde foram submetidas a experiências e a trabalhos forçados, quando não seguiram diretamente para as câmeras de gás ou executadas de outras maneiras.

Percebe-se que o autor além de relatar o quanto foi a barbaridade da guerra

ele faz uma menção a idéia Kantiana: “ As pessoas eram transformadas em coisas e

usadas como meio de tomadas e manutenção do poder”. (Dias, 2012, p.89).

Aqui o referido autor trata justamente daquilo que já fora apresentado, de que

as pessoas não são coisas devendo ser tratadas com dignidade e não como meio

de poder.

22

Após o final da Grande Guerra e do holocausto, com os acontecimentos

ocorridos, restou claro o desrespeito com o ser humano, com a vida e a dignidade

do homem, destacando nesse momento o principio da dignidade da pessoa humana

que ganhou força, e três anos depois do ocorrido, surgiu a aprovação de uma nova

Declaração Universal dos direitos do Homem.

Embora a Grande Guerra tenha sido um horror hoje se pode até dizer que ela

foi um “mal necessário”, não só pelo reconhecimento a proteção ao ser humano, ao

respeito, a dignidade, mas também, pelo fato de ter proporcionado as grandes

descobertas diante do horror que restou demonstrado pela guerra. Todo ocorrido na

Alemanha nazista tendo em vista as experiências naquele período, passou a

impulsiona grandes pesquisas para a descoberta de enumeras doenças e

posteriormente curas, dentre outras descobertas que a guerra nos trouxe.

A partir de esse momento histórico todo ser humano passa a ser respeitado

mundialmente, não somente pelo ocorrido na Grande Guerra, mais pelo fato de

agora existir um tratado em que muitos países passam a fazerem parte para que

não ocorra novamente a grande barbárie e o desrespeito ao ser humano. Assim o

principio da dignidade da pessoa humana impulsionou muitos outros países a

criarem normas de proteção às pessoas tendo como base a dignidade da pessoa

humana.

Nesse contexto, é de grande importância lembrar-se que o principio da

dignidade da pessoa humana serviu de parâmetro para muitas Constituições,

inclusive a do Brasil no qual a dignidade é o núcleo e a base da Constituição da

Republica Federativa do Brasil.

2.2.1 Dignidade da Pessoa Humana consagrada na Constituição Federal

Brasileira.

A dignidade da pessoa Humana define-se como sendo à base de toda

Constituição Federal, sendo o núcleo de todo ordenamento jurídico, quando se

demonstra toda a sua importância como o principio basilar dos direitos e garantias

fundamentais.

Neste sentido retratou NOVELINO ( 2015. p.292):

Consagrada expressamente no inciso III do artigo 1° da constituição brasileira de 1988, a dignidade da pessoa humana desempenha um papel

23

de proeminência entre os fundamentos do estado brasileiro. Núcleo axiológico do constitucionalismo contemporâneo, a dignidade é considerada o valor constitucional supremo, e enquanto tal deve servir, não apenas como razão para decisão de casos concretos, mas principalmente como diretriz para a elaboração, interpretação e aplicação das normas que compõem a ordem jurídica em geral, e o sistema de direitos fundamentais, em particular.

A dignidade da pessoa humana é tratada como sendo de um valor

constitucional Supremo, sendo expressa que considera como a base para toda

elaboração, interpretação e a aplicação das normas, assim deve ser utilizada como

um parâmetro para a resolução de todo caso concreto.

Diante do princípio da dignidade da pessoa humana ao qual vem sendo

utilizado como parâmetro para a fundamentação e organização da Constituição

Brasileira, observa-se que a figura do ser humano passa a ser fundamental ao

ordenamento jurídico, de modo que toda pessoa passa a ter um valor inalienável e

inquestionável, no qual deve ser tratada com dignidade e não como objeto passível

de troca ou substituição.

Veja-se o que se afirma em NOVELINO (2015, p.293):

A inclusão nos textos constitucionais reforça, ainda, o reconhecimento de que a pessoa não é simplesmente um reflexo da ordem Jurídica, mas, ao contrário, deve constituir o seu objetivo supremo, sendo que na relação entre o individuo e o Estado deve haver sempre uma presunção a favor do

ser humano e de sua personalidade.

Entende-se que a partir deste momento o ser humano, não é mais visto como

uma parte do texto constitucional, mais passa a ser o objetivo principal da existência

da constituição, ou seja, a constituição foi criada sobre a dignidade da pessoa

humana, com o intuito de criar uma ordem jurídica que assegurassem a todos

direitos e deveres para uma existência digna. Para isso sobre o princípio da

dignidade da pessoa humana foram criados os direitos e garantias fundamentais que

assegura a todas as pessoas o necessário para uma vida digna.

É de suma importância deixar claro que a dignidade em si não é um direito é

uma qualidade intrínseca que cabe a todo ser humano independentemente de sua

origem, raça, cor, sexo, ou qualquer outro requisito que o define. Veja-se:

A sua consagração como fundamento do Estado brasileiro não significa, portanto, a atribuição de dignidade às pessoas, mas sim a imposição dos poderes públicos dos deveres de respeito, proteção e promoção dos meios necessários a uma vida digna. (NOVELINO, 2015, p.293).

24

Ante a fundamentação apresentada, resta claro que a dignidade da pessoa

humana não é algo que o Estado atribuí as pessoas, mas sim, uma qualidade de

cada um, desse modo sua consagração é uma maneira do Estado respeitar,

proteger e promover o necessário para assegurar a todos uma vida digna.

De maneira a reforçar ainda mais o que acima foi dito, expõe o que afirma

NERY, (2012, p.179):

A proteção da dignidade humana constitui dever fundamental do Estado constitucional, mais precisamente, um dever jurídico-fundamental. A soberania popular possui na dignidade humana seu último e primeiro fundamento. [...] A dignidade humana possui uma dupla direção protetiva, isso significa que “ela é um direito público subjetivo, direito fundamental do individuo contra o Estado (e contra a sociedade) e ela é, ao mesmo tempo, um encargo constitucional endereçado ao Estado, no sentido de um dever de proteger o individuo em sua dignidade humana em face da sociedade (ou de seus grupos).

Desse modo, conclui-se que é dever fundamental do Estado, proteger,

garantir e assegurar ao indivíduo sua dignidade, sua liberdade e os seus direitos.

Assim podemos entender deve haver motivos da necessidade da aplicação das

normas, ou seja, garantir ao cidadão a utilização das ferramentas a serem utilizadas

pelo Estado justamente para proteger e assegura os direitos e garantias dos

indivíduos, fazendo-se efetiva aplicação do direito aquele que deseja morrer, sendo

expressa essa sua vontade.

Sobre a atuação do Estado para os menos favorecidos, destaca-se o que diz

NOVELINO,( 2010, p.341).

Noutro giro a falta de bens e utilidades básicas impede que o indivíduo tenha uma vida digna. A consagração da dignidade como fundamento exige não apenas uma abstenção, mas também uma atuação por parte do Estado no sentido de fornecer os meios indispensáveis para que indivíduos hipossuficientes possam viver dignamente.

Como se destaca a Constituição Federal, em seu artigo 1º, de forma

expressa, a garantia a todos os cidadãos, que são importantíssimos e não devem

ser violados, priorizando a dignidade da pessoa humana, os quais devem ser

aplicados e analisados diante do caso concreto, onde a situação do paciente em

estado terminal ou vegetativo, sem perspectiva nenhuma de viver sem depender de

ninguém, deve ser interpretado não somente como uma garantia de que o estado,

não pode ser participante de um homicídio assistido, mas, de que faça valer os

25

direitos do cidadão que assim deseja por uma morte com dignidade de continuar

vivendo uma vida de sofrimento e muitas vezes sendo para própria família um peso

o qual não expressam os verdadeiros sentimentos por medo, ou receio de serem

reprimidos pela sociedade.

O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana foi positivado na

Constituição da República de 1988, no Título I – DOS PRINCÍPIOS

FUNDAMENTAIS, artigo 1º, inciso III, no qual o constituinte assegurou a dignidade a

todos os seres humanos, devendo ser respeitados como pessoa, bem como a

dignidade em relação à vida, à saúde, ao próprio corpo, direitos estes inerentes a

toda pessoa humana.

Assim, dispõe o Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I. A soberania; II. A cidadania; III. A dignidade da pessoa humana;

A garantia que o Estado declara para todo os cidadão que se encontra em

situação de vida vegetativa e que por vontade expressa deseja tirar lhe a própria

vida, não corresponde ao que efetivamente tem se realizado, por não permitir que

sua vontade seja feita, mas impondo-lhe que viva preso em sua própria dor e em

seu próprio sofrimento, violando nesse sentido o principio que é a base da

Constituição Federal e a base para a própria vida com dignidade, a qual o estado

não pode se opor.

2.3 Relação entre dois institutos, a Dignidade da Pessoa Humana e os Direitos

Fundamentais

A dignidade da pessoa humana é um atributo que cada pessoa possui, e que

é dever do Estado assegurar que não ocorra uma violação. Portanto, são criados

direitos que assegurem aos indivíduos os seus direitos, suas garantias bem como

sua dignidade.

Verifica-se assim, que a dignidade é uma qualidade inerente ao ser humano,

que dotado de racionalidade tem a capacidade de amoldar o seu comportamento

dirigindo-o, em função dos valores mais elevados quais sejam: a moral, ética, e

honra, porém, tudo em função da sua racionalidade e da sua dignidade.

26

Existe uma relação de mútua dependência entre dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, pois, ao mesmo tempo em que estes surgiram como uma exigência da dignidade de proporcionar o pleno desenvolvimento da pessoa humana, somente por meio da existência desses direitos a dignidade poderá ser respeitada, protegida e promovida. (NOVELINO, 2015, p.295).

A Dignidade da Pessoa Humana funciona como uma energia das aspirações

sociais, as quais orientam todos os demais direitos fundamentais do homem, desde

o direito a vida, de modo que a dignidade não pode ser pensada no sentido de

atendimento exclusivo dos direitos da personalidade, esquecendo-se, portanto, dos

direitos sociais, visto que a ordem econômica deverá realizar a justiça social, a

educação, e ao desenvolvimento da pessoa humana com vistas ao exercício da

cidadania, do contrário de que serviria a vida, se não fosse possível usufruí-la com o

máximo em efetividade no que se refere à dignidade.

Portanto é importante observar que a vida em sociedade exige a ponderação

de princípios eventualmente conflitantes que impedem o exercício de tal ou qual

direito fundamental será efetivado individualmente, pois, segundo o equilíbrio

normativo no âmbito do ordenamento jurídico nacional se deve a otimização de

direitos levando-se em conta a carga valorativa em consonância com a

proporcionalidade e razoabilidade que envolve o caso concreto, fazendo se valer os

direitos individuais de cada cidadão.

Desse modo percebe-se que existe uma relação entre a dignidade da pessoa

humana e direitos fundamentais pois ocorre uma dependência mútua de um com

relação ao outro. Enquanto os direitos fundamentais surgiram por meio da exigência

da dignidade; por outro lado a dignidade para ser assegurada a todos ela depende

da criação desses direitos que farão com que ela seja respeitada, protegida e

promovida. Sendo assim reportaria a idéia de ralação mútua entre direitos

fundamentais e dignidade da pessoa humana.

Diante da idéia de direitos fundamentais podemos dizer: “A intenção

especifica da consagração de um conjunto de direitos fundamentais é explicitar uma

idéia de ser humano, manifestada juridicamente no princípio da dignidade da pessoa

humana”. NOVELINO, ( 2015, p.295).

A idéia de direitos fundamentais esta ligada a idéia de que a dignidade da

pessoa humana deve ser consagrada a ponto de que ela seja assegurada por todos.

2.4 Eutanásia, sua definição e suas formas

27

Eutanásia consiste na conduta de abreviar a vida de um paciente em estado

terminal ou que esteja sujeito a dores e intoleráveis sofrimentos físicos ou psíquicos.

A idéia base da prática da eutanásia é que todo o indivíduo tem o direito a pôr fim à

sua vida, caso esteja enfrentando alguma das situações descritas anteriormente.

Considerado um tema polêmico, mas existem países com uma legislação

definida especificamente sobre a sua prática, enquanto que outros a refutam

categoricamente por diversos motivos, principalmente religiosos e culturais,

principalmente o Brasil.

O termo eutanásia teve vários significados ao longo dos séculos. O seu

primeiro significado compreendia em “boa morte” partindo da palavra do grego

euthanatos, acreditava se nessa época que o sábio podia e devia assumir sua

própria morte quando a vida não tivesse mais sentido para ele. “Esse era o

significado do termo para o estoicismo, que aceitava que o sábio podia e devia

assumir sua própria morte quando a vida não tivesse mais sentido para ele. Essa

era a postura de Sêneca. (BARCHIFONTAINE, PESSINI, 2001, p.287).

A partir do século XVII o termo eutanásia adquire um novo significado

vejamos:

A partir de Tomás Morus e Roger Bacon, no século XVII, o termo “eutanásia“ adquire o significado que faz referência ao ato de pôr fim a vida de uma pessoa enferma. O debate sobre a eutanásia não se concentra na legitimidade de dispor da vida de qualquer pessoa, mas de a pessoa enferma, para a qual não existe mais esperança de vida em condições que possam ser qualificadas como humanas, pedir e obter a eutanásia. (BARCHIFONTAINE, PESSINI, 2001, p.287).

Percebe-se que o termo eutanásia possui significados diferentes do visto

anteriormente, sendo agora o termo eutanásia relacionado ao ato de por fim a vida

de uma pessoa enferma, ou seja, não se trata mais de qualquer pessoa, mais sim,

da própria pessoa que se encontra com alguma enfermidade, quando esta consegue

exprimir seus desejo e sua vontade de não mais viver, na situação em que se

encontra em estado de uma enfermidade de doença sem perspectiva de cura ou de

melhora em sua condição.

O significado atualmente para o termo da eutanásia esta relacionado ao ato

de por fim a vida da pessoa enferma, mais agora ela adquiri um novo significado:

O conceito de eutanásia é tirar a vida do ser humano por considerações “humanitárias” para a pessoa ou para a sociedade, no caso de deficientes, anciãos, enfermos incuráveis... Distingue – se entre eutanásia ativa (positiva

28

ou direta), de um lado, e passiva, de outro. .(BARCHIFONTAINE, PESSINI, 2001, p.287).

Observa-se que o conceito clássico de eutanásia refere-se a pessoa enferma

mas que possui uma doença incurável, diferentemente do antigo conceito em que

referia se somente a pessoa enferma. Além de o conceito clássico trazer uma nova

interpretação de eutanásia ele faz menção a duas espécies de eutanásia: ativa e

passiva. A primeira refere-se a uma ação praticada pelo médico que a pedido do

paciente enfermo ou sua revelia põe fim a sua vida; essa espécie também é

conhecida como morte piedosa ou suicídio assistido. A segunda espécie

diferentemente da primeira esta ligada a uma omissão médica e não uma ação, aqui

o médico deixa de aplicar a terapia medica necessária para prolongar a vida do

paciente enfermo.

Nesse seguimento somando-se as duas espécies acima citadas é importante

destacarmos as outras duas situações que ocorrem nos dias de hoje, sendo que

uma delas é a eutanásia neonatal e a outra a eutanásia social.

Vejamos o que diz BARCHIFONTAINE, PESSINI (2001, p.288):

Para completar o panorama das definições de eutanásia, deve-se falar não somente do doente grave terminal, mas também em outras duas situações que ocorrem nos dias de hoje. Uma é das crianças que nascem com defeitos congênitos, das quais se subtrai alimento para evitar o sofrimento da criança ou um peso para a sociedade. Fala-se aqui de eutanásia neonatal. A outra situação é a chamada eutanásia social, em que não se trata da opção da pessoa, mas da sociedade, em conseqüência do fato de se recusar investir e dar condições de saúde a maioria da população.

Diante das duas situações citadas importante darem destaque a eutanásia

social. Observa-se a parte em que o autor fala que “não se trata da opção da

pessoa, mas sim da sociedade que se recusa investir e dar condições de saúde na

maioria da população” será que a palavra correta não deveria ser do governo ao

invés da sociedade? A situação da eutanásia social pode ser interpretada como o

descaso que o governo faz com relação ao fornecimento de medicamentos de auto

custo a pessoas portadoras de doenças raras incuráveis, e que o único meio de ser

controladas é por meio de remédios que vem de fora do País, ou seja, pessoas

morrem involuntariamente devido a falta de investimento para medicamentos que as

salvariam.

29

A eutanásia admite outras formas, como a distanásia e a ortotanásia. Dentro

desses termos temos a definição e os conceitos de eutanásia, distanásia e

ortotanásia que são estudados pela ciência da bioética, ciência, relativamente nova

que por causa da evolução da ciência e tecnologia vem se desenvolvendo

efetivamente nos últimos tempos.

A eutanásia termo que significa por fim a vida de um doente terminal, não é

uma conduta licita em nosso ordenamento jurídico, estando tipificada no código

Penal. Já ortotanásia que é efetivamente o contrário da eutanásia, significa deixar

viver, apenas com cuidados paliativos, não se aceitando o prolongamento da vida

através de meios artificiais. A distanásia por seu turno é o prolongamento da vida a

qualquer custo, com todos os meios artificiais possíveis de se usar.

Assim, todos esses termos trazem entre si uma relação que é a questão da

vida ou morte que atualmente estão sendo estudados pela bioética como

mencionadas.

Em um breve conceito dado por NOVELINO (2015, p.374)

A distanásia consiste na tentativa de retardar a morte o máximo possível por meio do emprego de todos os meios médicos disponíveis, ainda que para isso seja necessário causar dores e padecimentos a uma pessoa cuja morte é inevitável e iminente.Trata-se portanto, de um prolongamento artificial da vida, ou se preferir, do processo de morte.

Diferentemente da eutanásia ativa e passiva, aqui o médico não contribui para

por fim a vida e ao sofrimento do paciente, mas tenta retardar a morte o Maximo

possível mesmo sabendo que a morte é inevitável, assim ele emprega todo o seu

conhecimento e recursos cabíveis para prolongar a vida ainda que para isso seja

necessários a utilização de técnicas desproporcionais e métodos extraordinários.

Vejamos agora sobre a ortotanásia em outro conceito dado por NOVELINO,

(2015, p.374)

A ortotanásia é definida pelos autores como a “morte em seu tempo adequado, não combatida com os métodos extraordinários e desproporcionais usados na distanásia , nem apressada por ação intencional extrema, como na eutanásia”. Trata-se de conduta sensível aos processos de aceitação e humanização da morte.

Na ortotanásia, diferentemente da eutanásia e distanásia, não há contribuição

para se por fim a vida e nem a aplicação de métodos para prolongá-la. Aqui a morte

ocorre em seu tempo certo, ou seja, o indivíduo é notificado da doença sabe que

30

não existe cura e aceita a morte não desejando antecipar e nem prolongar sua vida,

utilizando-se dos cuidados paliativos, que são aqueles cuidados oferecidos aos

pacientes com enfermidade grave, com o objetivo de garantir, na medida do

possível, melhor qualidade de vida ate que ocorra a morte, no sentido de aliviar a

dor, ajuda para dormir melhor, ajuda nos problemas de respiração, digestivos,

nutricionais, os problemas psicológicos ou emocionais, os problemas práticos, sendo

de adaptação da casa, ajuda em gestão administrativa, ajuda em domicílio, bem

como os assuntos espirituais, que acabem ajudando no processo da fé para atingir a

paz espiritual, que muitos almejam nessa dolorida fase ou etapa da vida.

Estes tipos de cuidados deixam claro que, quando aplicados, reduzem de

forma importante as decisões mais graves sobre a continuidade da vida, os cuidados

paliativos buscam constituir uma forma de ajuda, desinteressada, visando a melhor

condição de possibilidade de vida para o paciente que não pode ter seu desejo

concedido por ser considerado como uma conduta ilícita daquele que o auxiliar a ter

seu direito aplicado e efetivado como sua liberdade de autonomia de vontade.

Segundo o entendimento, quanto a ortotanásia dado por NOVELINO (2015,

p.374) entende-se que:

Indissociavelmente ligado a ortotanásia, o cuidado paliativo consiste no uso da tecnologia existente com o intuito de aplacar o sofrimento físico e psíquico do enfermo. Busca-se oferecer conforto ao paciente por meio da redução dos sintomas da dor e da depressão, ainda que o emprego de determinadas substâncias possa reduzir o seu tempo de vida.

Como na ortotanásia a morte ocorre em seu tempo adequado nada mais justo

que fazer com que o individuo sofra o menos possível até que a hora de partir

chegue. Por isso o cuidado paliativo segue no mesmo plano da ortotanásia, que

visa buscar reduzir o máximo do sofrimento, seguido com dores e depressão até que

a morte aconteça.

O suicídio assistido é considerado para alguns autores como sendo a

eutanásia ativa, como no entendimento dado por NOVELINO (2015, p.375):

O suicídio assistido consiste na “retirada da própria vida com o auxilio ou assistência de terceiros” que presta informações ou coloca a disposição do paciente os meios e condições necessárias à prática. Esta hipótese não se confunde com o induzimento ao suicídio, no qual o terceiro age sobre a vontade do sujeito passivo a fim de interferir em sua liberdade de ação.

31

A morte ou suicídio assistido há entendimento que consiste na facilitação

ao suicídio do paciente, onde o agente, normalmente parente próximo, põem ao

alcance do enfermo terminal alguma droga fatal ou outro meio congênere.

Diferentemente da eutanásia ativa, no conceito de suicídio assistido acima

citado a ação pratica para se por fim a vida pode ser praticada também pelo

individuo que possui a enfermidade, por meio de auxilio ou assistência de um

terceiro. Podemos concluir que o suicídio assistido e a eutanásia ativa podem ser

comparados, mas vamos aceitar uma idéia de que ambos seguem conceitos

distintos.

Diante dos conceitos apresentados sobre as varias formas de eutanásia

percebe-se que o ato ilícito esta ligado somente a prática da eutanásia (ativa e

passiva) e sobre o suicídio assistido; enquanto a pratica da distanásia, da

ortotanásia, configura-se ato licito.

Quando se fala de vida e morte do ser humano, há implicação de uma carga

muito de moral e ética envolvida. A bioética é uma ciência que estuda essas

relações entre a vida e a ética médica, as quais estabelecem parâmetros e limites à

atuação dos profissionais da área. A eutanásia está intimamente ligada a essa

ciência e dela faz parte porque envolve a saúde humana. O direito também se

interessa diretamente por esses institutos, uma vez que a cada fato da sociedade,

nasce uma lei que deve regular esses fatos. Ao discutir se a eutanásia deve ser

objeto de direito garantido aplicado e efetivado, não configurando como crime, sendo

ou tipificada, adentra-se no ramo do biodireito que é o ramo do direito que estuda

esses fenômenos da biologia entrelaçados. ( STOUPAL e BURNI, 2017).

2.5 Uma Vida Digna ou um Direito á Morte

A dignidade da pessoa humana é o núcleo e a base da Constituição Federal,

considerada como o principio supremo, para a criação de todos os demais direitos

fundamentais, um atributo que cada ser humano possui. Assim sendo, resta claro

demonstrar porque esses motivos, quando não considerados pelas garantias

ofertadas ao ser humano, quando este não possui uma vida digna, deve dar o direito

a que se tenha uma morte com dignidade.

Analisados, que tanto o direito a vida como o princípio da dignidade da

pessoa humana são a razão da existência de nossos direitos atualmente. O primeiro

32

porque sem a vida não há razão para existir direitos, e segundo porque, sem o

princípio da dignidade da pessoa humana não seria possível garantir uma vida

digna.

Veja-se uma consideração feita por DIAS (2012.p.122):

A expressão “inviolabilidade do direito à vida”, consagrada constitucionalmente, não indica que vida é um dever para consigo mesmo e para os outros, tampouco pode ser entendida como um direito absoluto, indisponivel e irrenunciável. Nos termos da constituição a “inviolabilidade” de tal direito significa que ele não tem conteúdo econômico-patrimonial e, mais, do que isso, ninguém pode ser privado dele arbitrariamente. Nesse sentido é que ele deve ser entendido como indisponível: ninguém pode dispor da vida de outrem.

O autor transpassa a idéia de como a constituição tem que ser entendida no

tocante da sua inviolabilidade, indisponibilidade e irrenunciabilidade, sendo tais

características garantias e fundamentos do direito a vida. Quando o assunto é a

eutanásia, para aqueles que se colocam sendo contra a sua pratica, os primeiros

argumentos utilizados para punir este ato são essas três características acima

citados, ou seja, sempre que o assunto passa a ser discutido na esfera judicial a

primeira declaração a se fazer é a de que é inconstitucional se dispor da vida porque

é o bem jurídico mais valioso que uma pessoa possa ter ainda que essa seja sua

vontade, e mais, dizem vedar-se essa pratica porque a vida é inviolável, indisponível

e irrenunciável conforme descrita na Constituição Federal.

Desta forma, deve-se entender que quando o texto constitucional descreveu

as características do direito a vida não significa que a própria pessoa que o possui

deve se sentir preso a ele, mas deve ser utilizado como uma defesa contra terceiros

que tentam violar esse direito.

Quando se demonstra que o direito a vida é inviolável significa dizer que

nenhum terceiro pode atentar contra a vida de outrem sendo este punido pelo

Estado, caso isso aconteça, ou seja, a cada individuo não pode ser privado de se

viver, assim podemos entender o porquê da indisponibilidade que em maiores

significa que ninguém possa dispor da vida de outrem; não devendo ser entendido

como a idéia do individuo ficar privado de dispor da própria vida. (DIAS, 2010,

p.160).

Dessa forma se entende que, a inviolabilidade e a indisponibilidade devem ser

entendidas como princípios constitucionais, como uma forma de se proteger a vida

contra a ação de terceiros, a irrenunciabilidade não pode ser vista como uma forma

33

de se ver preso a sua própria vida; mas sim como uma forma excepcional de dispor

de um direito quando este não estiver sendo utilizado mais para protegê-lo, mas sim

para manter preso a um mundo onde somente se vive pelo sofrimento.

A renuncia é também uma forma de exercício do direito fundamental, dado que, por um lado, a realização de um direito fundamental inclui, em alguma medida, a possibilidade de se dispor dele, inclusive no sentido de sua limitação, desde que este seja uma expressão genuína do direito de autodeterminação e livre desenvolvimento da personalidade individual. (NOVAIS, 2006, p.235).

Desse modo, entende-se, que viver uma vida sem dignidade, dar-se-á

possibilidade de renuncia ao direito a vida, desde que vista no seu aspecto positivo.

Assim sendo, sempre se terá uma visão clara de que viver ou morrer é um direito e

não um dever.

Portando, se o ser humano é livre na tomada de suas decisões, porque não

cabe a ele decidir o que fazer quando a sua vida não mais fizer sentido, quando a

dor e o sofrimento estiverem acima de sua vontade, e for o que somente lhe resta

para continuar a viver. Deixando claro que não se reporta de qualquer pessoa, mas

sim da pessoa enferma com uma doença irreversível, incurável, sem diagnóstico

previsível para cura, e que a morte não poderá ser evitada.

O Estado tem o dever de proteger a vida, e além de proteger essa vida ele

tem que garantir que ela seja digna, e ele fazem isso por meio de uma legislação

que foi criada como base a dignidade da pessoa humana. Quando uma pessoa tenta

intervir na vida da outra o Estado assume sua função de protetor e garantidor da

vida e pune toda pessoa que atenta contra a vida de outra, quando pessoas vivem

em situações indignas o Estado deve intervir dando-lhes o mínimo necessário para

que esses possam viver de forma digna. Mas quando uma pessoa esta sofrendo de

uma doença incurável que não pode ser revertida, e que não cabe ao Estado

cumprir com o seu papel de protetor, porque nessa situação ele não da ao individuo

a possibilidade de decidir o que será feito?

Concluindo, importa descrever que a dignidade da pessoa humana deve ser

sempre respeitada, sendo colocada acima do direito a vida, ao ponto que uma

pessoa que se encontra a beira da morte ou acamada sem nenhuma perpesctiva de

vida tenha a autonomia e a liberdade de decidir sobre o seu fim, se para este a vida

não tem nenhum propósito só lhe resta uma boa morte sem dor e sofrimento.

34

Nesse seguimento, existem países que aceitam a prática da Eutanásia, e por

isso que necessário se faz adentrar no contexto sobre o direito comparado

destacado como ponto principal para conclusão da idéia de um direito a morte.

A partir da Constituição Federal de 1988, os princípios são normas jurídicas

que existem para serem aplicados em situações em que o juiz profere sentenças

com base nos princípios, ocorrem atualmente muitas situações onde observa- se o

descaso do poder publico em relação a saúde de pacientes, quando necessitam de

ajuda para com medicamentos de auto custo para pessoas portadoras de doenças

raras, mas que podem ser controladas pelo controle de medicação, as quais

algumas vezes põem ser adquiridas fora do Pais.

3. DIREITO A MORTE DIGNA

Morrer é parte da vida e da existência de todo ser humano, sendo natural e

imprevisível assim como nascer. Atualmente a morte é vista como um processo, um

fenômeno progressivo e não mais um momento, de um acontecimento. Primeiro

morrem os tecidos que dependem do oxigênio, após alguns minutos de ausência de

oxigenação já são suficientes para a falência múltipla levando à morte encefálica ou,

no mínimo, ao estado permanente de coma, deixando o individuo em vida vegetativa

permanente, em estado de dependência total ou parcial para os atos da vida civil.

Conforme acima exposto, resta-se entender que se o cidadão tem o direito a

viver com dignidade, também deverá ter o direito a morrer dignamente, de modo que

é possível conciliar o direito ao tratamento da saúde com o prolongamento da vida

vegetativa, ou ajudar a encerrar a vida daquele que deseja tornar-se, coerente, lícito,

e aceitável, a busca tanto por tecnologia para manter a vida, uma vida artificial,

buscando adiar o momento natural da morte de uma pessoa, que deseja como,

daquela que ela mesma não tem mais o mínimo para viver com dignidade e

continuaria sem tê-lo, sobrevivendo na situação em que se encontra, sendo

entendido que configura uma negação as mínimas condições de viver dignamente e

que jamais haverá uma digna condição de assistência à saúde ante a situação

vivida, permitindo-se dar a esses pacientes o seu direito a terminar com sua vida.

Todo conhecimento deve ter como objetivo trazer o maior benefício possível à

pessoa humana, ou de pelo menos, não lhe causar nenhum mal. É desejo do ser

35

humano a superação da natureza, a submissão do ambiente às suas necessidades

e desejos, a busca por direitos negados e por garantias não aplicadas.

Nesse sentido, se buscou apresentar um breve resumo dos capítulos

anteriores, onde foram tratados sobre os princípios que regem o tema investigado e

buscou-se construir a base para sustentar a idéia sobre um direito a morte digna. No

segundo capitulo, buscou demonstrar sobre o principio da dignidade da pessoa

humana, eutanásia e suas formas e do direito comparado.

3.1 A morte e o Direito de Morrer

A morte e o morrer não são assuntos diariamente abordados, e nem mesmo

considerados quesito constante em debates ofertados por congressos sejam,

relacionados na área de saúde ou na área jurídica. Desde então, o ser humano

encontra-se apto a entender que, como todo ser vivo, seu ciclo vital segue uma

seqüência, que é o nascer o desenvolver e o morrer.

De outro ponto de vista aceitar a morte é uma grande dificuldade

principalmente se tratando de um familiar ou de um amigo acometido de uma

doença incurável, onde o tratamento recebido não gera efeitos suficientes para a

cura ou para um diagnóstico positivo, sendo o tratamento oferecido ao indivíduo

tendo apenas o efeito paliativo, um prolongamento do sofrimento a ser enfrentado

pelo paciente, seus familiares e entes queridos. Assim sendo, a morte, antes vista

como uma “inimiga” passa a ser desejada como a possibilidade de levar conforto

àquele que sofre, aspirando à morte através da eutanásia, ortotanásia, ou do

suicídio assistido, como solução do sofrimento, ainda que isto implique ficar à

margem de determinações legais.

Morrer tem pelo menos cinco aspectos inter-relacionados: biológicos, legais, médicos, sociais e psicológicos. A morte torna-se uma preocupação inevitável, porém é vista como um elemento integrante do ciclo da vida que compreendê-la ajuda na percepção de integridade da vida (PAPALAIA & OLDS, 2006).

A morte desperta um questionamento e traz muitas questões acerca do seu

enfrentamento, ainda que uma conseqüência natural da vida, e que faz parte do

ciclo vital que todos os seres enfrentam, não há possibilidade de não passar por

esta etapa do nosso ciclo de vida, mas para algumas pessoas o simples fato de

36

citar o questionamento já causa desconforto, uma luta ou fuga, devendo o indivíduo

assimilar entre sua real situação com um fato que ainda que lhe cause temor, medo

em seu comportamento, possa estar preparado para algo que é considerado

inevitável a todo e qualquer ser humano.

Sucumbir torna-se um ato solitário e impessoal, porque não raro é removido

de seu ambiente familiar e levado ás pressas para salas de emergência. Qualquer

um que tenha estado muito doente e necessitado de repouso e conforto se lembrará

de ter sido posto numa maca sob o som estridente da sirene e da corrida

desenfreada até de abrirem as portas do hospital, tendo muitas vezes seu estado de

saúde agravado devido a sensação de impossibilidade de se locomover ( KUBLER-

ROSS, 1996, p. 20).

Um conceito de morte trazido por Barchifontaine;Pissini (2014, p.385):

Até pouco tempo, o critério para se dizer que alguém estava morto era a cessação da respiração e a parada cárdica. Perante o fenômeno da morte, o ser humano era espectador e não ator. Acompanhava o que acontecia sem intervir. Hoje essa situação mudou completamente. O critério decisivo para se dizer que alguém esta morto é o cérebro.

O conceito explanado acima se entende, que é possível decretar a morte de

alguém quando o cérebro para de funcionar, pois num conceito atualizado de morte

este é o critério utilizado, sendo assim, para entender melhor a compreensão de

morte sobre este novo conceito, se faz sobre pesquisas realizadas pela pontifícia

academia das ciências.

Importante expressar o conceito de morte que foi extraído da pesquisa feita

pela pontifícia academia das ciências que diz: “uma pessoa esta morta quando

sofreu uma perda irreversível de toda a capacidade de integrar e de coordenar as

funções físicas e mentais do corpo.” ( BARCHIFONTAINE, PISSINI, 2014, p387).

Diante desse conceito, a morte então não estaria ligada somente com a perda

das funções mentais mais também das funções físicas. Sendo assim uma pessoa

que sofre uma lesão na coluna e por conseqüência fica paraplégico ou tetraplégico,

por meio desse conceito não poderia ser dado como uma pessoa morta? A melhor

resposta talvez não fosse a morte como um todo, mas talvez uma idéia de morte

parcial.

O Brasil é um País com alto grau em seu índice de pobreza e miséria, nesse

entendimento, importa pensar na quantidade de pessoas que morrem sem

perspectiva de vida atualmente, estando as mesmas com sua saúde perfeita, sem

37

nenhum diagnóstico de patologias que sejam consideráveis incuráveis ou as quais

não tenham ou sejam irreversíveis

Vejamos uma reflexão feita por Barchifontaine; Pissini (2014, p.382):

A morte na nossa realidade brasileira? Podemos observar no inicio dessas reflexões que os povos do terceiro mundo vivem em media 15 anos a menos que os povos dos países desenvolvidos. Não podemos deixar de assinalar que a morte no mundo dos pobres é precoce e injusta. Se o australopitéco, há 2 milhões de anos atrás, morria antes dos 20 anos, entende-se devido as terríveis condições de existência. Mas que brasileiros 2 milhões de anos depois, morram também em números considerável antes dos 20 anos por razões políticas, econômicas e sociais é realmente espantoso. Morte precoce e injusta! Já não é mais por incapacidade natural, por impossibilidade de superar os fatores naturais, mais por decisão política humana, que a morte continua ceifando milhões de pessoas em idade precoce. [...] Para o pobre a morte é uma realidade muito próxima. A criança pobre esta mais perto da morte do que o ancião. Isso contradiz toda a biologia. É um fato social. Uma criança quando nasce nessas camadas populares, tem uma previsão de anos de vida, estatisticamente inferior os anciões de 70 e 80 anos de países ou classes ricas. É normal que a criança viva mais. Esta no inicio da vida. Possui a força para viver. Eis que já nasce mais próxima da morte do que alguém que já gastou sua vida. Esta morte é precoce e injusta.

Essa reflexão trazida é uma realidade que é enfrentada ate os dias atuais,

diferente dos australoptecos vivemos em uma realidade totalmente adversa onde a

morte antes dos 20 anos deveria ser minimamente considerável, onde crianças

deveriam viver mais que anciões, mas vivem menos, onde o início da vida já esta

mais próxima do fim.

Sobre a morte precoce e injusta no Brasil, visa demonstrar que o Estado se

preocupa em intervir na vontade daqueles que esperam pela morte digna, onde não

existe mais cura ou reversão, e que a dor e o sofrimento são considerados como

um alicerce para os que vivem em situações de debilidade total, esperando para o

descanso eterno, e esquece que o problema maior não esta naqueles em que

procuram o direito a morte, mais sim aqueles que buscam o seu direito a vida, a

dignidade e ter a oportunidade de morrer de velhice e não jovem, antes mesmo de

atingirem a maturidade, esta reflexão faz uma menção a NETTO (1955), que

simboliza uma realidade vivenciada no nordeste brasileiro.

Assim, far-se-á uma menção, de que somos severinos / iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, da mesma morte, Severina / que e a morte de que se morre / de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos 20, de fome um pouco por dia / de fraqueza e de doença é que a morte Severina ataca a qualquer idade e até gente não nascida. ( NETTO , 1955).

38

Desta forma, avança-se um pouco mais sobre a morte, apresentando o que

ocorre com um paciente que esteja em estagio terminal.

Segundo entendimento do autor, BARCHIFONTAINE E PISSINI em sua obra

bioética e saúde, a um momento em que fazem menção a Elizabeth kluber-Ross

psiquiatra suíça, que em seu trabalho com pessoas em fases terminais ela descreve

5 estágios em que essas pessoas passam, sendo estes:

1ª) Negação: o paciente nega a realidade da doença. “ Não, não pode ser verdade”. “ será que não trocaram o raio X?”. São expressões tipicas desta fase. 2°) Raiva: nesta fase o paciente admite estar com a doença terminal, mas pergunta: “Por que eu?” “Por que isto acontece comigo?” Sua atitude passa a ser de raiva, sentimento que se volta contra o médico, contra a medicina, contra toda equipe de saúde que o assiste, contra os familiares e até mesmo contra Deus. 3º) Barganha (negociação): o paciente tenta superar seu mal através de promessas. “Sim, eu, mas se eu melhorar vou fazer muita caridade”... Aqui surgem as promessas de orações, obras de caridade, peregrinações, em troca da saúde perdida. Quando percebe que tais negociações não produzem também resultados, passa para outra fase , a quarta depressão. 4°) Depressão ( também interiorização): Nesta altura do processo, percebe-se um grande desinteresse em receber visitas ou acompanhar fatos. Há uma grande necessidade de isolamento e silencio que levam a pessoa a uma interiorização. Superada esta fase, vem a quinta e ultima fase. 5º) Aceitação: Não é sinônimo de passividade, pelo contrario, é uma atitude ativa, tomada pelo doente que passou a ter uma compreensão de sua vida e que sabe ser chegado seu momento.(BARCHIFONTAINE; PISSINI, 1989, p.197).

Os cinco estágios descritos por Elizabeth Kluber-Ross não significa dizer que

todos os pacientes passam por ele, mas sim uma análise feita por ela em que a

grande maioria dos casos de doenças terminais essa é a forma como as pessoas

reagem ate chegar seu fim. O que pretende se buscar com esta citação é mostra

que uma pessoa não aceita a morte facilmente. Como Kluber-Ross nos mostra as

pessoas em fases terminais elas passam por um processo no qual elas mesmas

chegam à conclusão de que não a oque se fazer e que a morte será inevitável e a

melhor forma de acabar com o sofrimento e a dor seria a sua antecipação.

O assunto sobre morte ainda que pouco abordado, tem sua importância

extrema para a humanidade. Muito se perde por fugir dos pacientes e muitas

condutas poderiam ser alternadas diante de um novo saber. É notório que a vida é

mais contagiante, vivenciada por um aspecto de continuidade, mas tão somente

estar ligado ao processo de morte, sendo significativo entender e aceitar, que ambas

são e fazem parte de toda a humanidade, como e em qualquer fase de vida.

Conclui-se, ao longo da vida, que nascemos, crescemos, desenvolvemos,

reproduzimos e morremos, mas essa última condição é esquecida.

39

Concluindo essa idéia de morte e morrer, é importante que se entenda que a

morte é um ciclo natural da vida, seja ela natural ou acidental, seja ela antecipada ou

até mesmo induzida, indiferentemente a forma que ela se dará um dia vai acontecer.

3.2 A Justificativa sobre o Direito de morrer com Dignidade.

Sobre o referido assunto, pode-se refletir que a morte faz parte da vida de

todos, e que, até aqueles que não anseiam por ela acabam sendo pegos ainda no

inicio de suas vidas. Percebe-se, que pessoas que desejam viver dignamente

morrem e pessoas que desejam morrer dignamente vivem forçados, presos a uma

legislação mal aplicada.

No entendimento do por que a prática da eutanásia não deve ser punida

quando praticada por motivos humanitários e com o consentimento da pessoa que

se encontra com uma doença incurável em estado vegetativo, encontra-se vários

argumentos que podem servir de parâmetro para defender essa pratica.

Tratando das formas de eutanásia, observamos que a distanásia, e a

ortotanásia, embora sejam formas de eutanásia não são punidas penalmente, pois a

sua prática não se configura ato ilícito. Já a eutanásia na sua espécie ativa que se

configura por uma ação, e a passiva, por uma omissão, ambas são consideradas

como crime de homicídio previsto no artigo 121 do Código Penal, sendo que para a

doutrina a ação ou a omissão medica com o intuito de abreviar a vida da pessoa

enferma configura ilícito penal, ainda que a pratica seja realizada para aliviar a dor e

o sofrimento , por considerações humanitárias ao ser humano.

Art. 121 - Homicídio simples, Matar alguém:Pena - reclusão, de seis a vinte anos.Caso de diminuição de pena 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.Homicídio qualificado 2° Se o homicídio é cometido:I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum.

O artigo 121 do Código Penal impõe sanção diante do cometimento do crime

de homicídio, a morte injusta de alguém praticada por outrem, o artigo possui o tipo

penal acima elencado: homicídio doloso simples, homicídio doloso privilegiado,

homicídio doloso qualificado, homicídio culposo, causas de aumento para homicídio

culposo e causas de aumento para homicídio doloso, perdão judicial, causa de

40

aumento de pena quando o homicídio for praticado por milícia ou grupo de

extermínio e causas exclusivas de aumento para o feminicídio.

Conforme análise do texto legal acima, busca-se entender o porquê a prática

da eutanásia ativa e passiva quando realizada por motivos humanitários não fere o

direito á vida e muito menos deve ser punida penalmente.

Há anos vem se criando e multiplicando associações em muitos outros países

que defendem o direito de morrer com dignidade. A maioria dessas associações se

iniciou em países com o nível de vida mais avançado como mostra os autores

BARCHIFONTAINE E PISSINI em sua obra bioética e saúde. Vejamos:

Surgiram inicialmente em países de vida elevado (aspectos médicos e econômicos) e de tradição protestante (aspectos religiosos e culturais ). Em 1980 surgia a federação mundial das Associações para o direito de morrer com dignidade. Na 5ª Conferência Internacional que aconteceu em Nice (França em 1984) participaram 26 associçoes representando cerca de 500 mil membros.(BARCHIFONTAINE;PISSINI,1989,p.211).

O objetivo dessas associações acima de tudo é a busca do direito a morte

digna,visto que ao mesmo tempo em que com o avanço da medicina multiplicou o

número de casos de cura e de velhice bem sucedidos, houve um grande aumento

no número de casos de sobrevivência prolongadas por condições muitas vezes

indgnas. Como, por exemplo, a distanásia onde se emprega todos os meios

possíveis a fim de prolongar á vida usando de técnicas desproporcionais e métodos

extraordinários causando mais dor e sofrimento mesmo sabendo que é inevitável a

morte.

Vale lembrar que a maioria dos membros dessas associações são pessoas

entre 50 e 60 anos e que não desejam envelhecer sobre condições que consideram

ou não intoleráveis, e também é formada boa parte por aqueles que já sofreram e

sofre muito em uma vida difícil artificial e que se recusam a passar por mais

sofrimento e degradação.

Aqueles que fazem parte das associações e defende o direito a morte digna

se baseia na seguinte ideologia:

Estes não querem mais que sua morte pertença a quaisquer autoridades, médicas ou não. Acham que lhes pertence, somente a eles, e que são responsáveis por ela como o foram por todas as outras fases da vida. Querem assumir a sua morte, como também tentaram assumir sua própria vida. [...] Não se pode esquecer que morrer com dignidade muitas vezes requer o concurso do médico, mas nem por isso o problema se torna substancialmente médico. (BARCHIFONTAINE;PISSINI, 1989, p.211).

41

Percebe-se que as pessoas que buscam a morte digna, só querem o direito

de poder conduzir a morte da mesma forma que puderam conduzir suas vidas, não

se submetendo ao encarniçamento terapêutico.

Com relação a essas associações vale lembrar que:

Muitos pensam que essas associações incitam ao suicídio ou pretendem legalizar a eutanásia, mas na verdade “ exigem o reconhecimento do direito do enfermo a uma morte digna e opõem-se ao encarniçamento terapêutico. BARCHIFONTAINE;PISSINI,1989,p.212).

A intenção de relembrarmos dessas associações é somente para demonstrar

que já se busca o direito a morte digna ha muito tempo e que até hoje não se

encontrou uma solução para este problema tão polêmico e atual.

Se, ao final, conseguirmos concluir que há possibilidade da existência de um

direito de morrer dignamente, em seqüência haverá a possibilidade que seja licita a

prática da eutanásia, pois um se interliga com o outro.

Para que uma pessoa possa ter direito a morte devera ser necessário que ela

passe por três situações que é, ser portadora de uma doença incurável, que ela

mesma chegue a conclusão sobre a sua morte e a deseja por considerar que vive

em situação indigna (conforme os cinco estágios descritos por kluber-ross), e que

ela se recuse a passar por tratamentos que prolongue sua vida em si.

Diante das três situações apresentadas acima, faz se necessário que se

analise quem tem competência para consentir.

Roberto Dias em sua obra o direito fundamental a morte digna faz uma

menção a Dworkin que menciona três situações em que as pessoas devem decidir

sobre a própria morte ou sobre a morte dos outros: “quando os pacientes estão

conscientes e competentes, quando estão inconscientes ou, apesar de conscientes,

são incompetentes”. (DWORKIN aput DIAS, 2012, p.179).

Nesse sentido DIAS (2012 ,p.179) diz:

Na medida em que a tentativa de homicídio não e crime, as pessoas competentes, que encontram se em pleno gozo de suas faculdades mentais, pode recusar ou exigir a interrupção de um tratamento médico, mesmo sabendo que isso poderá causar-lhes a morte.

Diante desse entendimento, conclui-se que as pessoas que se encontram

conscientes, tem a competência para decidir sobre a sua própria morte; ou para

42

aqueles inconscientes ou apesar de conscientes incompetentes essa competência

poderá ser delega a um de seus representantes legais.

A prática da eutanásia no Brasil configura se como um ato ilícito e esta

vedada, sendo que aquele que concorrer será penalmente punido nos termos do

artigo 121 ou 122 ambos do Código Penal.

No artigo 122, caput do código penal, este expresso que;

Art. 122, Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxilio para que o faça. Pena de reclusão, de dois anos a seis anos, se o suicídio se consuma, ou reclusão de um a três anos se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Por se tratar de artigos que compõem uma lei infraconstitucional quando

estes interpretados conforme a constituição pode ocorrer uma conclusão diversa.

Esse método de interpretação da constituição e da lei, nas palavras de Canotilho, e um “elemento fundamental na determinação do conteúdo das normas infraconstitucionais”, com base na força dos preceitos constitucionais. Trata-se de um método que busca a “prevalência normativa vertical” e a “integração hierárquica normativa”. (CANOTILHO apud DIAS,2012,p.179).

No entendimento do autor DIAS (2012, p.179 e 180) sobre a idéia de

CANOTILHO:

Nesse sentido, ao erigir a autonomia e a dignidade da pessoa humana ao patamar hierárquico mais elevado do ordenamento jurídico, impõe-se outra interpretação dos artigos 121 e 122 do Código Penal. Na medida em que a vida é um direito disponível pelo próprio titular, este pode livremente decidir, com base em sua concepção de dignidade, acerca da continuidade ou da interrupção de um tratamento médico, sem que isso implique a responsabilização do médico. Em outras palavras, a autonomia e a dignidade do paciente tem fundamental relevância na caracterização dos crimes de homicídio piedoso e auxilio ao suicídio, sendo que essas condutas não caracterização ilícito penal na hipótese em que a cessação do tratamento ocorrer por motivos humanitários e por vontade do paciente.

Do ponto de vista do autor, sobre a idéia de interpretação da constituição

trazida por canotilho, é de que existe uma hierarquia entre a constituição e as

normas infraconstitucionais ao ponto que as normas infraconstitucionais só podem

ser aplicadas após serem interpretadas conforme a constituição. Seguindo essa

linha de hierarquia se a constituição entende que a autonomia da vontade e a

dignidade da pessoa humana são mais importantes para aplicação no caso

concreto, o artigo 121 e 122 do código penal sobre a aplicação de homicídio piedoso

43

e auxilio ao suicídio se tornariam ineficazes não devendo produzir os seu efeitos

nesses casos.

Nesse seguimento deve-se atentar a outro ponto trazido por DIAS (2012,

p.180) qual diz:

Violados os interesses fundamentais ou a vontade de o paciente morrer com dignidade – seja por receio de o médico sofrer uma sanção ou por questões relativas à sua convicção ética, não se pode impedir que os direitos constitucionais à liberdade, à dignidade e à integridade física e moral sejam assegurados judicialmente, por força do disposto no art 5º, inciso XXXV, da constituição federal.

Nesse ponto percebe-se que o autor defende os interesses fundamentais do

paciente, que deseja morrer dignamente, e que acontece de o paciente optar-se por

não antecipar a morte por causa das sanções que serão aplicadas aqueles que

ficarem em vida.

Diante disso, clama-se a reflexão no sentido de que nos casos que envolvem

a eutanásia muitas vezes o direito que esta sendo violado não é o direito à vida, mas

sim o direito a liberdade e a dignidade da pessoa humana. Pois num caso concreto

pessoa que já se encontra tomada pela dor e o sofrimento, com uma enfermidade

incurável, irreversível, a vida já deixou de fazer sentido e que a pessoa busca a

morte como alivio e descanso eterno, o direito aqui violado será mesmo que é a

vida? Ou não seria a liberdade e a dignidade daquele que deseja partir?

O grande problema na maioria dos casos que leva a pessoa a desistir de

morrer não esta ligada a sua vontade, mas sim ao fato de saber que aquele que

ficara vivo será punido simplesmente por ter o mínimo de compaixão com o próximo

de querer acabar com a dor e o sofrimento de alguém. Que fique claro que isso sim

é uma violação de direitos fundamentais, pois a pressão que se é colocada à aquele

que tenta ajudar o moribundo, faz com que aquele que busca a morte deixe de

exercer seu direito de liberdade, autonomia e dignidade.

As discussões acerca sobre o assunto, tem se encontrado certa inviabilidade,

tanto pra quem é a favor como para quem não é, portanto o que se busca é priorizar

sempre a dignidade humana e que conforme o caso concreto aquele que busca a

morte digna deva ter sua vontade respeitada e o direito de se dispor da própria vida.

A defesa pela prática da eutanásia sustenta que a vida só deve ser mantida

se houver dignidade uma vida com total dignidade diante das possibilidades e das

condições mínimas de vidas. A ciência médica afirma a existência de quadros

44

clínicos irreversíveis, em que o próprio paciente sofre terríveis dores e sofrimentos,

almeja a antecipação da morte como forma de se livrar da dor e do sofrimento em

que se encontra. A eutanásia não só proporcionaria ao paciente uma morte com

dignidade, como efetivaria o princípio da autodeterminação do indivíduo em decidir a

respeito de sua própria morte. No entanto, chega-se a outro impasse, pois, o

ordenamento jurídico brasileiro deixa clara uma discrepância, onde se defende o

direito à vida como um dos principais patrimônios humanos, é um direito

fundamental na Constituição Federal de 1988, mas não se permite escolher, decidir

acabar com a dor e o sofrimento em caso de doença terminal, restando claro no

caput do art. 5.º, que a principal característica do direito à vida vem a ser sua

indisponibilidade. Uma vez que o direito à vida é consagrado como o mais

fundamental dos direitos, e regido pelos princípios constitucionais da inviolabilidade

e irrenunciabilidade, ou seja, não pode ser desrespeitado, sob pena de

responsabilização criminal, nem tampouco pode o indivíduo renunciar esse direito e

desejar sua morte, em resumo, o indivíduo tem direito à vida e não sobre a vida.

3.3 A Eutanásia Ativa e Passiva

A distinção entre eutanásia ativa e passiva é considerada relativa para a ética

médica. A idéia é que é admissível, pelo menos em alguns casos, suspender o

tratamento e deixar que o paciente morra, mas que nunca é admissível praticar um

qualquer ato direto destinado a tirar a vida do paciente em estado terminal, ou

diagnosticado com doença degenerativa permanente.

Entre os diferentes tipos de eutanásias, observa se que cada uma delas

levanta questões morais diferentes.

Na Eutanásia passiva: esse é um tipo de eutanásia em que o médico deixa o

paciente morrer. Para compreender a idéia, imagine a seguinte situação. Uma

pessoa se encontra em estado de doença terminal. Em virtude do sofrimento pelo

qual está passando, ela deseja morrer, nesse entendimento o médico deixa de fazer

uma série de procedimentos, como o uso de medicamento, aparelhos etc., e deixa

de prolongar artificialmente a vida desse paciente.

Na Eutanásia ativa, esse é um tipo de eutanásia em que, ao invés de

simplesmente deixar morrer, o médico faz alguma coisa para abreviar a vida do

paciente, para que ele deixe a vida com dignidade.

45

Entendendo que a Eutanásia consiste na conduta de abreviar a vida de um

paciente em estado terminal ou que esteja sujeito a dores e intoleráveis sofrimentos

físicos ou psíquicos.

A intenção da prática da eutanásia é que todo o indivíduo tem o direito a pôr

fim à sua vida, caso esteja enfrentando alguma das situações descritas

anteriormente, e assim o desejando.

De modo geral, a eutanásia implica numa morte suave e indolor, evitando o

prolongamento do sofrimento do paciente, e por outro lado, a eutanásia também

pode ser interpretada como o ato de matar uma pessoa ou ajudá-la a cometer o seu

suicídio, buscando assim, a efetivação de uma vontade e de um direito a ser

exercido.

3.3.1 Passiva ou negativa

Como o problema que envolve o direito de morrer esta ligada diretamente a

eutanásia (ativa e passiva) e não as suas demais formas, faz-se valer o fato de

aprofundarmos mais adiante sobre esse assunto.

Começaremos pela eutanásia passiva que como já vimos consiste em uma

omissão médica que atendendo a vontade do paciente deixa de aplicar os meios

necessários para a prolongação de sua vida.

Assim, veja-se o que diz o autor DIAS (2012, p.186) sobre a recusa do

paciente a submeter ao tratamento:

Com base no direito à autonomia, bem como na dignidade da pessoa humana e na disponibilidade da própria vida, a pessoa tem o direito de se recusar a receber tratamento medico, desde que devidamente informada pelo profissional da saúde acerca das conseqüências advindas de seu ato.

A eutanásia passiva não é o grande problema para se alcançar o direito a

morte digna, devido ao fato de que hoje o paciente já tem o direito de não querer

submeter-se no tratamento médico, ao entender que o procedimento além de violar

sua dignidade, assola seu corpo, devasta sua honra ou denigre a imagem que ela

tem dela mesma. Sendo assim o médico só seria responsabilizado se por vontade

própria dele sem o consentimento do paciente deixar de aplicar os meios

terapêuticos necessários. Vale lembrar que embora a eutanásia passiva não seja o

grande problema para alcançar o direto a morte digna, não significa dizer que seu

46

entendimento não seja essencial para alcançar tal direito, mas sua relevância para

tal não é tão grande como a eutanásia ativa.

Para que fique mais claro a respeito da omissão médica no caso de eutanásia

passiva, expõe-se o que diz na cartilha dos direitos do paciente organizado por

Ernesto Lippmann (ex professor da PUC e autor de livros como: Manual dos Direitos

do Médico e Testamento Vital: o direito de morrer com dignidade) a respeito dos

direitos do paciente:

Direito de ser informado sobre os procedimentos a serem realizados, de conhecer suas alternativas, e de recusá-los, e se desejar ter uma segunda opinião. Você tem o direito de ser informado pelo médico sobre seu diagnóstico, quais são os procedimentos que o médico pretende realizar, e sobre os efeitos colaterais e possíveis não desejados do tratamento, como dores, tempo de recuperação, possibilidades de agravamento, e se existe outra opção de tratamento etc. Se, após esta conversa, você tiver dúvidas, ou quiser uma segunda opinião de outro médico, este é um direito que lhe é assegurado pelo artigo 39 do Código de Ética. (LIPPIMANN, 2012).

Desse modo o paciente que se encontra diagnosticado com uma doença que

o levará a morte e que após ser informado pelo médico sobre os procedimentos a

serem realizados e os efeitos colaterais; poderá este optar pela recusa do

tratamento, devendo o médico omitir-se de empregá-lo, desse modo, o médico não

poderá ser responsabilizado pela morte do paciente devido ao fato de ter respeitado

um direito inerente a este, sendo totalmente licita sua conduta de omissão, típico

caso que ocorre com a religião testemunha de Jeová, que recusam-se receber

sangue de outra pessoa.

Diante da eutanásia passiva, as omissões médicas ao tratamento que já se

iniciou e que por vontade do paciente deseja interrompem-lo, a fim de acabar com

seu sofrimento, neste entendimento a omissão médica ao interromper o tratamento a

pedido do paciente recairia a responsabilidade sobre ele? Seria sua omissão

médica no caso concreto um ato licito?

Deve-se considerar que o mesmo direito que foi dado ao paciente de recusar-

se a começar com o tratamento após descobrir a doença deve ser mantido, ao ponto

que ainda que tenha optado a realizar pode ele muito bem decidir parar se entender

que o tratamento só está o matando lentamente. Sendo assim o direito do paciente

de recusa deve prevalecer e justificar o motivo da omissão médica não sendo este

responsabilizado pela eventual morte da pessoa.

47

Para melhor reforçar este argumento, em destaque a resolução nº 1805/2006

do Conselho Federal de Medicina, que diz:

Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal. § 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação. § 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e registrada no prontuário. § 3º É assegurado ao doente ou a seu representante legal o direito de solicitar uma segunda opinião médica. Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar.

Mesmo que iniciado o tratamento e por motivos relevantes, a pessoa deseja

encerrá-lo, o médico pode optar-se pela ortotanásia em deixar que o paciente morra

em seu tempo normal e fazer o uso dos cuidados paliativos (como previsto no artigo

2º da Resolução nº 1805/2006 do Conselho Federal de Medicina) para que até que a

morte ocorra o paciente tenha o mínimo de dor e sofrimento. Como já visto esses

dois métodos não são considerados como atos ilícitos. Vejamos um artigo jurídico

que fala sobre o testamento vital em face do ordenamento jurídico brasileiro e que

por ventura tratam-se da ortotanásia:

A ortotanásia é a morte natural, sem a intervenção de métodos extraordinários para prolongar a vida artificialmente, permitindo ao paciente uma morte humanizada e digna, excluindo qualquer procedimento que lhe cause sofrimento maior do que já está vivendo diante da iminência de sua morte. Cumpre ressaltar que não significa que o paciente não poderá receber medicamentos que diminuam sua dor e sofrimento, mas sim que ele terá direito de morrer com dignidade, de forma natural, sem ser obrigado a submeter-se a tratamentos inúteis, que é exatamente a morte desejada por quem elabora um testamento vital. (OLIVEIRA;JUNIOR, 2017).

Conclui-se que a prática da eutanásia passiva na maioria dos casos é um ato

médico, e poucas vezes de um terceiro, e que a licitude de tal ato encontra-se

amparado no Princípio da dignidade da pessoa humana, na autonomia da vontade,

na Resolução nº 1805/2006 do Conselho Federal de Medicina, nos direitos do

paciente e em outras formas de eutanásia (ortotanásia, cuidados paliativos)

consideradas como legais. Amparado por esses princípios, direitos e as próprias

formas de eutanásia, fica claro que não se deve punir o médico que pratica a

eutanásia passiva e que por meio dessa mesma ideologia deve-se considerar um

direito a morte digna.

48

3.3.2 Ativa direta e indireta

A eutanásia é considerada, um ato misericordioso, que procura abreviar o

sofrimento físico ou moral, e consuma-se diante do apelo daquele que está

submetido a dor insuportável proveniente de doença ou moléstia degenerativa sem

qualquer possibilidade de cura. Esse conceito não se limita mais a casos terminais e

chega a abranger situações complexas, como os recém-nascidos com má formação

congênita e pacientes em estado vegetativo permanente que não são capazes de

agirem por si mesmos.

O Código Penal brasileiro faz referência indireta a eutanásia em um de seus

dispositivos, mais precisamente no artigo 121,§1º como sendo um caso de

diminuição de pena, portanto, trata-se de um ato punível, sendo que a vida é

inviolável mesmo com o consentimento de seu detentor.

Como visto, a eutanásia ativa consiste em uma ação médica, que visa

abreviar a vida e o sofrimento do paciente que encontra-se com uma enfermidade

incurável e como mencionado acima, é punível como um crime contra a vida.

Antes de aprofundar-se nesse assunto é importante que seja posta a

eutanásia passiva da ativa.

Segundo Fernández (2000, p.86-87):

A partir dos séculos XVI e XVII, começa-se a diferenciar a eutanásia ativa da eutanásia passiva. O primeiro caso envolve a implementação de uma ação médica positiva com a qual se acelera a morte de um doente ou se põe fim a sua vida. Já no caso da eutanásia negativa, não se implementa uma ação positiva, não se aplica uma terapia ou uma ação que poderia prolongar a vida do doente. A eutanásia ativa ou negativa se distingue pela omissão, pela não-aplicação de uma terapia disponível que poderia prolongar a vida do paciente. [...] A situação, contudo, é mais complicada ainda. No caso de um canceroso que sofre fortes dores, é comum a administração de alguns calmantes, como, por exemplo, os derivados da morfina. Esses calmantes produzem no doente terminal uma depressão respiratória, um enfraquecimento de suas já escassas energias e, portanto, um previsível encurtamento de sua vida. O médico não esta pretendendo acelerar a morte do paciente, mas apenas aliviar-lhe as dores. No entanto é previsível que isso também vai provocar um encurtamento de sua vida. De maneira que estamos diante de uma ação medica - a administração de calmantes – que acarreta dois diferentes efeitos: o alivio das dores e o encurtamento da vida do doente. Essa abreviação é uma conseqüência indireta, não pretendida pelo médico. Por isso esse caso foi classificado como eutanásia ativa indireta, em relação com o principio moral do duplo efeito. E é ativa realmente porque o médico implementa uma ação positiva que pode abreviar a vida do doente; mas, ao mesmo tempo, é indireta, já que o médico não pretende objetivamente esse encurtamento, e sim que o doente pare de sofrer.

49

Ao diferenciar a eutanásia ativa da passiva o faz-se menção a uma terceira

espécie de eutanásia, a eutanásia ativa indireta. Tanto na eutanásia ativa direta

como na indireta, ambas entende-se, que consiste em uma ação médica que

concorrem para abreviar a vida do paciente, sendo esta a distinção. Já na eutanásia

ativa indireta a ação médica visa amenizar a dor e o sofrimento do paciente no meio

de um tratamento, mas que devido aos medicamentos administrados, faz com que

se abrevia a vida do paciente mesmo que a intenção era de prolongar.

Para o Estado a prática da eutanásia realizada pelo médico de abreviar a vida

do paciente poderia possivelmente ser substituída pela prática da distanásia, que

além de um ato licito utilizado, nos dias de hoje poderia prolongar a vida do paciente

ainda que a morte seja inevitável. Resta entender que embora sendo licita a prática

da distanásia, é a mais cruel para o paciente em fase terminal devido ao seu objetivo

de tentar prolongar a vida ao máximo possível, fazendo que o paciente morra

lentamente e dolorosamente utilizando se de meios que podem causar dores e

maior sofrimento.

A respeito, diz o artigo 6° Princípio fundamental do Código de Ética Médica:

VI – o medico guardará absoluto respeito pelo ser humano e atuará sempre em seu beneficio. Jamais utilizara os seus conhecimentos para causar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade.

O referido Princípio do Código de Ética Médica, ainda que de maneira indireta

ele da certa autonomia para o médico praticar a eutanásia, quando diz que, cabe ao

medico sempre respeitar o ser humano e não lhe causar sofrimento físico e moral e

o mais importante de tudo a dignidade.

É importante que seja feita uma análise do artigo 41 da resolução nº

1.931/2009 do conselho Federal de medicina, que diz:

É vedado ao medico: Art. 41. Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal. Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.

A atenção que deve ser feita em cima deste artigo é sobre o parágrafo único

que diz respeito aos casos de doenças incuráveis e terminais, que diz que o médico

deve levar sempre em consideração a vontade expressa do paciente.

50

Diante de tudo o que foi exposto a respeito da eutanásia ativa direta ou

indireta podemos dizer que uma forma de justificá-la, seria através da distanásia,

que além de poder ser praticada, fere mais princípios constitucionais que a

eutanásia, que no entanto não é considerada legal. Sendo assim, outra forma de

justificar a pratica da eutanásia englobando todas suas espécies ( passiva , ativa

direta ou indireta ) é através da mistanásia, a qual seu conceito é dado através de

um artigo jurídico que contem o seguinte tema: mistanásia: uma breve análise sobre

a dignidade humana no sistema único de saúde no Brasil.

A palavra mistanásia advém do vocábulo grego mis (infeliz) e thanatos (morte), significando, portanto, uma morte infeliz. O termo é utilizado para se referir à morte de pessoas que, excluídas socialmente, acabam morrendo sem qualquer ou apenas uma precária assistência de saúde. Assim, podemos afirmar que as vítimas da mistanásia são as pessoas que não dispõem de condições financeiras para arcar com os custos advindos dos tratamentos da própria saúde, ficando na dependência da prestação de assistência pública. (LAVOR,2018).

A idéia de mistanásia esta ligado a morte injusta e precoce que vimos no

início desse capitulo quando tratávamos de morte e morrer, estando ligada mais a

eutanásia passiva do que a ativa, visto que em ambas a causa da morte se dá por

meio de uma omissão e não uma ação. A distinção entre a mistanásia da eutanásia

é o agente causador da morte, primeiro porque o causador da morte é o Estado que

deixa de prestar à devida assistência as pessoas que são excluídas socialmente,

tendo uma situação financeira baixíssima e não podem arcar com medicamentos de

alto custo, que em conseqüência acabam morrendo em favor da precariedade da

saúde pública, segundo quando o causador sendo médico ou um terceiro deixa de

prestar os devidos cuidados com o fim de abreviar a vida da pessoa enferma.

Embora ambos contemplando o mesmo verbo “omitir” ocorre uma grande diferença

entre essas formas, enquanto na eutanásia passiva a omissão se da a pedido do

paciente, que sabe que vai morrer e aceita a morte; na mistanásia a omissão se da

por meio de um descaso com a saúde publica onde as pessoas que são vitimas não

pretendem a morte, mas acabam morrendo diante da precária assistência e as

devidas providencias que o Estado deveria tomar.

No Brasil a mistanásia ocorre com grande freqüência principalmente nas

regiões mais pobres e nas sociedades menos favorecidas. O mais revoltante é que

alem de acontecer com freqüência esse pratica o causador não é responsabilizado e

nem punido e a pouca manifestação do Estado em resolver esse problema. O que

51

se deve entender é que nos casos de mistanásia sim ocorre uma violação ao direito

a vida, ao principio da dignidade da pessoa humana, ambos assegurados na

constituição Federal.

O resultado que se busca demonstrar ao fazer menção a mistanásia é de que

essa pratica é comum de ser vista, ocorre com freqüência, fere direitos e princípios

constitucionais, mas o agente causador nem sempre é responsabilizado como

ocorre nos casos de eutanásia. Por essa razão pode se justificar a pratica da

eutanásia utilizando-se da mistanásia. E o mais importante que deve ser observado

é que a eutanásia não viola direitos fundamentais, respeita o principio da dignidade

da pessoa humana e faz jus ao principio da autonomia da vontade e da liberdade

ambos assegurados constitucionalmente.

Para melhor entender, impõe destaque no que diz Francisco Paula Ferreira

Lavor em seu artigo jurídico publicado:

A mistanásia - morte infeliz é a realidade vivenciada no Brasil pelos que recorrem ao SUS. O estado justifica sua ineficiência na reserva do possível, entretanto realiza gastos desarrazoados em atividades que não tem primazia diante da dignidade humana. .(LAVOR, 2018).

Conclui-se este ponto, dizendo que: tanto a distanásia quanto a mistanásia

são argumentos fortíssimos para mostrar que a eutanásia é a forma que mais

respeita os princípios e direitos constitucionais vigentes, mas é a única pratica que

não é aceita. Sendo que de todas mencionadas é a que mais prioriza a dignidade da

pessoa humana e visa acabar com o sofrimento e a dor.

Diante de tudo o que fora exposto, pode se dizer que a propositura de um

novo direito Fundamental garantido constitucionalmente, configuraria como uma das

possível solução para acabar com todo o debate que envolve a eutanásia. Alem

disso, passaria a especificar os casos em que seria possível dispor da vida. E o

direito a morte digna acabaria com as colisões existentes entre princípios e direitos,

e solucionaria inúmeros processos que envolvem esse assunto, possibilitando que o

poder judiciário atue para solucionar problemas mais importantes como o da

mistanásia.

3.4 O Direito comparado em face da Morte digna

O direito comparado consiste em fazer semelhanças de diferentes

ordenamentos jurídicos seja no âmbito nacional como no âmbito internacional. Seu

52

objetivo é comparar semelhanças e diferenças de objetos comuns pesquisados

sejam eles um sistema jurídico ou institutos jurídicos.

Neste sentido, Carlos Ferreira de Almeida escreve que, a princípio, “o direito

comparado (ou estudo comparativo de direitos) é a disciplina jurídica que tem por

objeto estabelecer sistematicamente semelhanças e diferenças entre ordens

jurídicas” (ALMEIDA, 1998, p.9).

É por meio desse instituto chamado de direito comparado que iremos fazer

uma analise dos países que adotam a pratica da eutanásia. E assim fechar o

raciocínio, buscando a possibilidade em adotar essa prática, assim como nos países

em que esta acontece de maneira licita.

3.4.1 Holanda

Em 1 de abril de 2002 entrou em vigor no país da Holanda a legislação que

regula a prática da eutanásia. A legislação é composta de 24 artigos dentre eles

emendas que envolve outras leis.

Para melhor compreensão, se faz necessário entender como se deu a

legalização da eutanásia na Holanda, através de uma breve citação.

Nesse sentido, destaca-se o que diz BARCHIFONTAINE;PISSINI (2014,

p.418 – 419):

A Holanda tornou-se o primeiro laboratório social mundial para o estudo da eutanásia em 1991, quando a médica holandesa Geertruda Postma abreviou a vida de sua mãe, que tinha 78 anos, ao administrar-lhe uma dose mortal de morfina. Desde então a eutanásia é abertamente debatida na Holanda. As condições exigidas para pratica da eutanásia podem ser assim resumidas: 1) o pedido para a eutanásia é feito exclusivamente pelo paciente e deve ser inteiramente livre e voluntário; 2) a situação do paciente deve ser bem avaliada, durável e persistente; 3) o paciente deve estar experimentando um sofrimento intolerável (não necessariamente físico), sem perspectiva da melhora; 4) a eutanásia deve ser o ultimo recurso. Outras alternativas para aliviar a situação do paciente devem ter sido consideradas ( por exemplo os cuidados paliativos); 5) a eutanásia deve ser pratica por um medico; 6) o medico deve ouvir um consultor medico independente que tenha experiência neste campo.

Ainda que a eutanásia na Holanda só foi legalizada em 2002, os estudos que

eram realizados em 1991 já apontavam resultados positivos acerca desse assunto.

Nesse mesmo ano dois relatórios foram feitos, um governamental e outro pela

comissão Remmelink que apontava os seguintes dados:

53

25 mil pacientes anualmente buscavam em seus médicos a certeza de que receberiam assistência caso seu sofrimento tornasse insuportável. Entre eles, 9 mil solicitavam a eutanásia; somente em 2.300 foi praticada a eutanásia, ou seja, 1,8% do total das mortes anuais.este estudo mostrou também que ocorriam 400 casos anuaís de homicídio assistido. (BARCHIFONTAINE,PISSINI, 2014, p.419).

Percebe-se que a prática da eutanásia se deu durante vários estudos

realizados desde 1991 ate 2002 quando a legislação entrou em vigor.

A autonomia da vontade tem ganhado bastante ênfase na pratica da

eutanásia na Holanda, como exposto abaixo.

A realidade da pratica da eutanásia na Holanda, contudo, esta indo em outra direção, com crescente ênfase no respeito pela autonomia do paciente. Isso pode levar a mudança para uma terceira abordagem, em que a eutanásia é vista como uma escolha. Alguns pacientes não querem viver com o sofrimento e o declínio, mesmo na assistência na possibilidade real de controle da dor. Eles desejam autonomamente decidir sobre como e quando morrer e que seus parentes guardem uma imagem bonita deles quando ainda eram saudáveis. Desejam deixar de viver antes que a fase terminal se inicie, e querem um médico para levar a cabo tal missão. (BARCHIFONTAINE,PISSINI, 2014, p.421).

Em 1993, já se aceitava a prática da eutanásia, não sendo ainda licita. Houve

a promulgação da Lei Funeral (Funeral Act) que estabelecia cinco critérios pela

Corte de Rotterdam para permitir a eutanásia: A solicitação para morrer deve ser

uma decisão voluntária feita por um paciente informado, e que tenha expressado

seu desejo pela morte, deve ser bem considerada por uma pessoa que tenha uma

compreensão clara e correta de sua condição e de outras possibilidades, deve ser

capaz de decidir estas opções, e deve ter feito tal pedido, o desejo de morrer deve

ter alguma duração, não sendo de momento espontâneo, deve haver sofrimento

físico ou mental que seja inaceitável ou insuportável, e a consultoria com um colega

é obrigatória.

Ainda que a eutanásia não fosse legalizada sua prática não acarretaria em

sanção penal.

Isto posto, percebe-se que a Holanda é um país apto a realizar a pratica da

eutanásia, aqueles que desejam morrer dignamente se amparam sobre a sua

legislação ou se baseiam nela para tentar a pratica em seu próprio país.

54

3.4.2 Bélgica

Em 16 de maio de 2002 a “Eutanásia” foi legalizada na Bélgica, porém

sua vigência se deu a partir de 22 de setembro do mesmo ano. A legislação é

composta de 16 artigos e atualmente, assim como a Holanda, faz parte do estrito

número de países a possuir a legalização da eutanásia. Tal lei foi instituída por meio

de uma diretriz criada pelo Comitê Consultivo Nacional de Bioética, após debate

sobre a sua necessidade e adequação.

A legislação em comento possui a garantia do anonimato, além da

possibilidade de menores de 18 anos solicitarem este tipo de procedimento. É

garantido também que uma pessoa que não tenha recursos possa ter a sua

disposição os meios fornecidos pelo Estado para a realização da eutanásia.

Nesse seguimento, outra característica é a possibilidade de solicitação de

eutanásia por uma pessoa que não esteja em estado terminal, porém será

necessária a participação de um terceiro médico para dar a sua opinião sobre o

caso.

Todos os procedimentos são revistos por um comitê especial que avalia se os

critérios legais foram efetivamente cumpridos.

3.5 Eutanásia no Brasil

Em 1996, foi proposto um projeto de lei no Senado Federal (projeto de lei

125/96), instituindo a possibilidade de realização de procedimentos de eutanásia no

Brasil, não sendo aprovada. Não existe no Brasil ainda uma legislação que regule a

eutanásia, de maneira especifica, sendo entendido que sua prática se enquadra

como homicídio, nos termos Código Penal, em seu artigo 121, que dispõe que

“Matar alguém”, e punido com pena de reclusão, visto que da pratica de tal ato,

resulte na morte de uma pessoa, portanto enquadrado como crimes “ contra a

pessoa”.

No entanto, no § 1º do Art.121, abre o precedente para a faculdade do juiz,

para atenuar a pena do infrator no caso da eutanásia ser enquadrada em tal

dispositivo legal. Dispor da vida de alguém fere o art. 5º da Constituição Federal,

pois a vida é um bem inviolável, um direito irrenunciável.

BARCHIFONTAINE E PISSINI em sua obra “problemas atuais de biótica” faz

menção em um trecho que diz: “existem três maneiras de se lidar com a questão da

55

eutanásia. A primeira é rejeitá-la, com base no principio de respeito à vida. Os

defensores dessa visão frente mente dizem que a eutanásia é desnecessária”.

Embora esse não seja o termo adotado para justificar a não legalização da

eutanásia no Brasil, é um meio de refletirmos.

Não existe a figura do “homicídio piedoso”, na legislação brasileira,

indiferentemente se houve ou não pedido do paciente, enfim, não importam os

motivos pelo qual se matou, irá responder e conseqüentemente responde pelos atos

praticados, sendo passível de uma sanção.

Ainda que o projeto de lei 125/96 não tenha sido aprovado, seria muito

importante voltar a sua analise, podendo prever casos possíveis de eutanásia e

começar a instigar o estudo sobre o assunto.

4. CONCLUSÃO

A abordagem do tema, cujo objetivo inicial foi indagar sobre o “direito à morte

digna”, sobre a “quantidade” de vida contraposta à “qualidade” desta, não será

possível dar respostas, mas gerar polemica e reflexão. Mas é certa que a eutanásia,

questão polêmica e complexa, está longe de encontrar um consenso. Certamente

por muitos ainda em qualquer lugar no mundo, este assunto será objeto de

discussão para que os limites da eutanásia possam ser delineados e definidos a fim

de ser ou não admitida como prática de amenizar o sofrimento.

O caminho percorrido para chegar à perspectiva de um novo direito

fundamental se deu através de princípios, mas precisamente no principio da

dignidade da pessoa humana, que dentre todos se mostra o mais favorável com

relação às pessoas que pretendem alcançar o direito de morrer. Contudo mostra-se

que só os princípios não são suficientes para justificar a vontade de dispor da vida e

amparar um direito a morte, visto que, a inviolabilidade, e a indisponibilidade se

encontram fortemente no sentido deque não se pode dispor da vida.

Ainda que o direito a vida encontra-se inviolável, utilizou-se do seu aspecto

positivo como forma de mostrar que a pessoa possa dispor-se de tal direito, o que

possibilitou analisar a vida como um direito e não como um dever. Dessa forma

encontra-se uma possibilidade para justificar a vontade que a pessoa tem de dispor-

se do direito a vida, porem não o suficiente para assegurar o direito à morte.

56

Visto que não foi possível amparar o direito a morte digna, por intermédio dos

princípios e nem pelo direito a vida no seu aspecto positivo, o que restou foi

confrontar a eutanásia com as outras formas que são aceitas, e mostrar que sua

pratica e mais humanitária e menos dolorosa, como outras praticas utilizadas para

prolongar a vida. Nesse ponto houve um êxito significativo.

Se conciliar o princípio da dignidade da pessoa humana mais os que foram

mencionados no trabalho, o direito a vida no seu aspecto positivo e as formas de

eutanásia, ainda que seja muito pouco para um assunto muito amplo, já é um

começo para questionar a expectativa de um direito a morrer dignamente.

Do objetivo proposto no inicio desse trabalho pode se perceber que não se

encontrou resultados comprobatórios ainda, devido à grande complexidade do

assunto que envolve esse tema, e também ao fato de não existir uma legislação que

verse sobre esse assunto no Brasil.

Ainda que a possibilidade de ser positivado um direito a morte digna esteja

longe do ordenamento jurídico brasileiro, a muito que se estudar em relação à

eutanásia, e um bom começo para isso seria aprofundar em um assunto que

demonstre até que ponto o Estado pode intervir na autonomia individual de cada

pessoa. Outra sugestão seria por em votação o projeto de lei 125/96 que mesmo

sendo rejeitado já instigaria a aprofundar-se no tema.

57

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, CARLOS. F.de, Introdução ao direito comparado, 2.ed., Coimbra, Almedina, 1998.

BARCHIFONTAINE, C.P. de; PESSINI, L. Bioética e Saúde. 2º Ed. Ver.,e ampl., São Paulo: Centro são Camilo de desenvolvimento em administração de saúde,1889.

BARCHIFONTAINE, C.P. de; PESSINI, L. Problemas atuais da bioética. 11º Ed. São Paulo: Centro são Camilo de desenvolvimento em administração de saúde, 2014.

BEAUCHAMP, Tom.L; CHILDRESS, James.F. Princípios de Ética Biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

BRASIL, CÓDIGO DE ÉTICA MEDICO. Brasilia: resolução CFM, nº1931, 2009. Disponível em: <http://www.cremers.org.br/pdf/codigodeetica/codigo_etica.pdf>. Acesso em: 28 nov. 2018.

BRASIL, Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. Brasilia. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 28 nov. 2018.

BRASIL, Declaração de direitos do homem e do cidadão de 1789. Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html>. Acesso em: 28 nov. 2018.

BRASIL, Declaração Universal dos direitos humanos de 1948. Disponível em: <https://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf>. Acesso em: 28 nov. 2018.

58

BRASIL, Resolução CFM nº 1805/2006. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2006/1805_2006.htm>. Acesso em: 28 nov. 2018.

BRASIL, Resolução CFM nº 1931/2009. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2009/1931_2009.htm>. Acesso em: 28 nov. 2018.

CARTILHA DOS DIREITOS DO PACIENTE. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2126638/mod_resource/content/1/Cartilha%20dos%20Direitos%20dos%20Pacientes%20OAB-SP.pdf>. Acesso em: 28 nov. 2018.

DIAS, Roberto, "Disponibilidade do direito à vida e eutanásia: uma interpretação conforme a Constituição". In IKAWA, Daniela; PIOVESAN, Flávia; FACHIN, Melina [Coords.]. Direitos humanos na ordem contemporânea: proteção nacional, regional e global. Curitiba: Juruá, 2010. Disponível em: <http://www.academia.edu/9104108/Disponibilidade_do_direito_%C3%A0_vida_e_eutan%C3%A1sia_uma_interpreta%C3%A7%C3%A3o_conforme_a_Constitui%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em 01 dez. 2018.

DIAS, Roberto. O Direito Fundamental à Morte Digna: Uma visão Constitucional da Eutanásia. Belo Horizonte: Editora Fórum,2012.

FERNÁNDEZ, Javier gafo. 10 palavras-chaves em bioética: bioética, aborto, eutanásia, pena de morte, reprodução assistida, manipulação genética, AIDS, drogas, transplante de órgãos, ecologia. Tradução: Maria Luisa Garcia Prada. São Paulo: Paulinas, 2000.

FRANCILEI,S.;CORREIA,F.C;BRITO, F.V. Psicologia Hospitalar,2013. Disponível em: <https://psicologado.com.br/atuacaopsicologi-hospitalar/sobre-a-morte-e-o-morrer>. Acesso em: 01 dez. 2018.

INICIAÇÃO A BIOÉTICA. Publicação do Conselho Federal de Medicina: Disponível em: <https://www.passeidireto.com/arquivo/5204394/iniciacao-a-bioetica---livro-inteiro>. Acesso em: 01 dez. 2018.

59

LAVOR, F.P.F. Mistanásia: uma breve analise sobre a dignidade humana no sistema único de saúde no Brasil. 2018. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/68102/mistanasia-uma-breve-analise-sobre-a-dignidade-humana-no-sistema-unico-de-saude-no-brasil>. Acesso em: 01 dez. 2018.

MENDES, GILMAR. F.;BRANCO, PAULO.G. Curso de direito Constitucional, 10ª Ed., rev. atual., São Paulo, saraiva, 2015.

NERY JUNIOR, Nelson. Constituição Federal Comentada e Legislação Constitucional.3ª Ed., revista., atualizada e ampliada., São Paulo: Revista dos Tribunais,2012.

NETO, J.C.de M. Morte e vida Severina. Editora Tuca, 1956.

NOVAIS, Jorge Reis. Direitos fundamentais: triunfos contra a maioria. Coimbra. Coimbra Ed., 2006.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª Ed. rev.,atual. e ampl., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo, Método, 2010.

NOVELINO,Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 10 ed., rev.,atual. e ampl., Salvador, editora. JusPodvim, 2015.

NUCCI,Guilherme de Souza. Princípios Constitucionais penais e Processuais Penais. São Paulo: Revista dos tribunais, 2010.

OLIVEIRA, G de; JUNIOR,J,B,A. Testamento Vital em Face do Ordenamento jurídico brasileiro.2017. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/61698/testamento-vital-em-face-do-ordenamento-juridico-brasileiro/3> Acesso em: 01 dez. 2018.

60

REVISTA BIOÉTICA. Distanásia, até quando investir sem agredir. Disponível em

<http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/394/357>

Acesso em: 01 dez. 2018.

SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: Nagib Slabi Filho e Gláucia Carvalho: 28ª Ed. Rio de janeiro: Forenses,2009.