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Antropologia Econômica Aula 6– A economia da dádiva Prof.: Rodrigo Cantu

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Antropologia Econômica

Aula 6– A economia da dádiva

Prof.: Rodrigo Cantu

• Sobrinho de Émile Durkheim

• Pai da escola antropológica francesa

• Militante socialista na França da 3ª República

• Obra difusa e não sistemática

• Temas: magia, morfologia social, noção de pessoa, técnicas do corpo, morte, dádiva

Marcel Mauss(1872-1950)

Marcel Mauss(1872-1950)

Émile Durkheim (1858-1917)

Raymond Aron(1905-1983)

Pierre Bourdieu(1930-2002)

Claude Lévi-Strauss(1908-2009)

Philippe Descola(1949-)

Escola da Regulação Economia das

Convenções

Sociologia e Antropologia (1950)

Ensaio sobre a dádiva (1923-24)

• Como funcionam economias sem contratos e sem moedas modernas?

• Evidência comparativa ampla: Melanésia, Polinésia, África e Américas

[C]hegaremos a conclusões de certo modo arqueológicas sobre a natureza das

transações humanas nas sociedades que nos cercam ou que imediatamente nos

precederam. [...]. Nelas veremos o mercado antes da instituição dos mercadores, e

antes de sua principal invenção, a moeda propriamente dita; de que maneira ele

funcionava antes de serem descobertas as formas, pode-se dizer modernas

(semítica, helénica, helenística e romana), do contrato e da venda, de um lado, e a

moeda oficial, de outro. Veremos a moral e a economia que regem essas transações.

E, como constataremos que essa moral e essa economia funcionam ainda em nossas

sociedades de forma constante e, por assim dizer, subjacente, como acreditamos ter

aqui encontrado uma das rochas humanas sobre as quais são construídas nossas

sociedades, poderemos deduzir disso algumas conclusões morais sobre alguns

problemas colocados pela crise de nosso direito e de nossa economia, e nos

deteremos aí.

Mauss, M. Ensaio sobre a dádiva, p.188-189.

Nas economias e nos direitos que precederam os nossos, nunca se constatam, por assim

dizer, simples trocas de bens, de riquezas e de produtos num mercado estabelecido entre

os indivíduos. Em primeiro lugar, não são indivíduos, são coletividades que se obrigam

mutuamente, trocam e contratam; as pessoas presentes ao contrato são pessoas morais:

clãs, tribos, famílias, que se enfrentam e se opõem seja em grupos frente a frente num

terreno, seja por intermédio de seus chefes, seja ainda dessas duas maneiras ao mesmo

tempo. Ademais, o que eles trocam não são exclusivamente bens e riquezas, bens móveis

e imóveis, coisas úteis economicamente. São, antes de tudo, amabilidades, banquetes,

ritos, serviços militares, mulheres, crianças, danças, festas, feiras, dos quais o mercado é

apenas um dos momentos, e nos quais a circulação de riquezas não é senão um dos

termos de um contrato bem mais geral e bem mais permanente. Enfim , essas prestações

e contraprestações se estabelecem de uma forma sobretudo voluntária, por meio de

regalos, presentes, embora elas sejam no fundo rigorosamente obrigatórias, sob pena de

guerra privada ou pública. Propusemos chamar tudo isso o sistema das prestações

totais.

Mauss, M. Ensaio sobre a dádiva, p.190-191.

[Nas tribos do noroeste americano] aparece uma forma típica, por certo, mas evoluída e

relativamente rara dessas prestações totais. Propusemos chamá-la potlatch. Essas tribos,

muito ricas, que vivem nas ilhas ou na costa, ou entre as Rochosas e a costa, passam o

inverno numa perpétua festa: banquetes, feiras e mercados, que são ao mesmo tempo a

assembleia solene da tribo. Esta se dispõe segundo suas confrarias hierárquicas, suas

sociedades secretas, geralmente confundidas com as primeiras e com os clãs; e tudo, clãs,

casamentos, iniciações, sessões de xamanismo e culto dos grandes deuses, dos totens ou

dos ancestrais coletivos ou individuais do clã, tudo se mistura numa trama inextricável

de ritos, de prestações jurídicas e econômicas, de determinações de cargos políticos na

sociedade dos homens, na tribo e nas confederações de tribos, e mesmo

internacionalmente. Mas o que é notável nessas tribos é o princípio da rivalidade e do

antagonismo que domina todas essas práticas. [...]. Há prestação total no sentido de que é

claramente o clã inteiro que contrata por todos, por tudo o que ele possui e por tudo o

que ele faz, mediante seu chefe. Mas essa prestação adquire, da parte do chefe, um

caráter agonístico muito marcado. Ela é essencialmente usurária e suntuária, e assiste-se

antes de tudo a uma luta dos nobres para assegurar entre eles uma hierarquia que

ulteriormente beneficiará seu clã.

Mauss, M. Ensaio sobre a dádiva, p.191-192.

Aliás, todo o Kula intertribal não é senão, a nosso ver, o caso exagerado, mais solene

e mais dramático, de um sistema mais geral. Ele tira a tribo inteira d o círculo

estreito de suas fronteiras, e mesmo de seus interesses e de seus direitos; mas

normalmente, no interior, os clãs e as aldeias estão ligados por vínculos do mesmo

gênero. Só que então são somente os grupos locais e domésticos, e seus chefes, que

saem de suas casas, visitam -se, negociam e casam-se. [...]

Enfim, ao lado ou, se quiserem, por cima, por baixo, ao redor e, em nossa opinião, no

fundo desse sistema do kula interno, o sistema das dá divas trocadas permeia toda a

vida econômica e moral dos trobriandeses. Ela está “ impregnada” dele, como disse

muito bem Malinowski. É um constante “dar e tomar” . É como que atravessada por

uma corrente contínua e em todos os sentidos, de presentes dados, recebidos,

retribuídos, obrigatoriamente e por interesse, por grandeza e por serviços, como

desafios e garantias.

Mauss, M. Ensaio sobre a dádiva, p.225-227.

Ensaio sobre a dádiva (1923-24)

[O kula] É exercido de maneira nobre, com uma aparência puramente

desinteressada e modesta. É cuidadosamente diferenciado da simples troca

econômica de mercadorias úteis, que leva o nome de gimwali. Esta, com

efeito, pratica-se, juntamente com o kula, nas grandes feiras primitivas que são

as assembleias do kula intertribal: distingue-se por uma negociação muito tenaz

das duas partes, procedimento indigno do kula. De um indivíduo que não

conduz o kula com a grandeza de alma necessária, diz-se que ele o conduz como

um gimwali. Aparentemente, pelo menos, o kula — assim como o potlatch do

noroeste americano — consiste em dar, da parte de uns, e de receber, da

parte de outros, os donatários de um dia sendo os doadores da vez seguinte.

Mauss, M. Ensaio sobre a dádiva, p.215.

Ensaio sobre a dádiva (1923-24)

“A ideia que convém fazer dessas tribos melanésias, ainda mais ricas e

comerciantes que as polinésias, é portanto muito diferente da que

costuma ser feita. Esses povos têm uma economia extra-doméstica e

um sistema de troca muito desenvolvido, com um ritmo

mais intenso e precipitado, talvez, que o que conheciam nossos

camponeses ou as aldeias de pescadores de nossas costas há menos

de cem anos. Têm uma vida econômica extensa que ultrapassa as

fronteiras das ilhas e dos dialetos, e um comércio considerável. Ora,

eles substituem com vigor, através de dádivas feitas e

retribuídas, o sistema de compra e venda”.

Mauss, M. Ensaio sobre a dádiva, p.230-231.

Ensaio sobre a dádiva (1923-24)

• Dar

• Receber

• Retribuir

Antropologia da dádiva

Circuito de dádivas e contra-dádivaspromove a recriação permanente do laço social.

Economia monetária

Economia da dádiva

vs

Antropologia da dádiva

• Economia (Bruno Théret)

• Política (Pierre Clastres, Marcos Lanna)

• Parentesco (Claude Lévi-Strauss)

• Mitologia e religião (Claude Lévi-Strauss)

Selvageria Barbárie Civilização

Evolucionismo

Funcionalismo

Estruturalismo