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Castelo Branco Científica - Ano III - Nº 05 - janeiro/junho de 2014 - www.castelobrancocientifica.com.br 1 Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255 APLICABILIDADE DA LEI 10.639/2003: UM DESAFIO PARA AS INSTITUIÇÕES EDUCACIONAIS BRASILEIRAS Monize Fiorin Goldner¹, Valeska Favoretti Serafim² Graduanda do 4º período do curso de Letras Português/Inglês da Faculdade Castelo Branco, Colatina/ES. E-mail: monizefi[email protected] Graduanda do 2º período do curso de Letras Português/Inglês da Faculdade Castelo Branco, Colatina/ES. E-mail: [email protected] RESUMO: O presente artigo apresenta resultados e discussões sobre os desafios enfrentados pelas escolas na aplicabilidade da Lei 10.639/2003. O objetivo consiste em abordar a importância do ensino da História e Cul- tura Afro-brasileira e Africana na educação básica, com foco na valoriza- ção da literatura, manifestações culturais e contribuição dos africanos na construção e na formação da sociedade brasileira. Por meio de pesquisa bibliográfica e coleta de dados em quatro escolas do estado do Espírito Santo, verificou-se que a efetividade plena da Lei 10.639/2003 ainda não foi alcançada. A reduzida disponibilidade de material didático adequado e a ausência de formação profissional sobre o tema são fatores que impedem que a herança cultural africana seja concebida como parte da memória na- cional brasileira. PALAVRAS-CHAVE: Cultura Afro-brasileira. Lei 10.639/2003. Educa- ção. História da África.

APLICABILIDADE DA LEI 10.639/2003: UM DESAFIO PARA AS ...castelobrancocientifica.com.br/img.content/artigos/artigo100.pdf · INTRODUÇÃO: A implantação da Lei 10.639, ... estudos

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APLICABILIDADE DA LEI 10.639/2003: UM DESAFIO PARA AS INSTITUIÇÕES

EDUCACIONAIS BRASILEIRAS

Monize Fiorin Goldner¹, Valeska Favoretti Serafi m²

Graduanda do 4º período do curso de Letras Português/Inglês da Faculdade Castelo Branco, Colatina/ES. E-mail: monizefi [email protected]

Graduanda do 2º período do curso de Letras Português/Inglês da Faculdade Castelo Branco, Colatina/ES. E-mail: [email protected]

RESUMO: O presente artigo apresenta resultados e discussões sobre os desafi os enfrentados pelas escolas na aplicabilidade da Lei 10.639/2003. O objetivo consiste em abordar a importância do ensino da História e Cul-tura Afro-brasileira e Africana na educação básica, com foco na valoriza-ção da literatura, manifestações culturais e contribuição dos africanos na construção e na formação da sociedade brasileira. Por meio de pesquisa bibliográfi ca e coleta de dados em quatro escolas do estado do Espírito Santo, verifi cou-se que a efetividade plena da Lei 10.639/2003 ainda não foi alcançada. A reduzida disponibilidade de material didático adequado e a ausência de formação profi ssional sobre o tema são fatores que impedem que a herança cultural africana seja concebida como parte da memória na-cional brasileira.

PALAVRAS-CHAVE: Cultura Afro-brasileira. Lei 10.639/2003. Educa-ção. História da África.

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INTRODUÇÃO: A implantação da Lei 10.639, de 09 de janeiro de 2003, obriga a inclusão do ensino da História e da Cultura Afro-brasileira e Africana nos currículos ofi ciais da rede pública, nos níveis fundamental e médio. A aplicação dessa lei pode ser considerada uma possibilidade de avanços no âmbito educacional e cultural e, portanto, uma possibilidade, também, de mudanças em práticas sociais humanas e reconhecimento que os negros proporcionaram formação do povo brasileiro (PACÍFICO, 2006). O desafi o da educação básica consiste em recontar a história africana, não pela voz do colonizador branco, mas daqueles que, por muitos anos, foram silenciados. Ao tratar da temática História e Cultura Africana, as institui-ções educacionais brasileiras transmitem, historicamente, discursos de es-cravidão, colonialismo e racismo, e esquecem que as diversas culturas que atravessaram o Atlântico e foram disseminadas por todo o Brasil tinham um passado. A importância dos anciãos na preservação da cultura, con-tos, lendas, mitos, provérbios, danças, música, estórias, e crenças africanas devem estar presentes nos currículos escolares, pois tudo isso corrobora para a afi rmação de uma identidade reconstruída neste lado do oceano, a qual ressoa memórias de africanos quando ainda estavam em sua terra natal. Por meio da Literatura e, mais especifi camente, do conhecimento da rica produção literária africana e afro-brasileira, o professor e a professora poderão encontrar alguns caminhos pedagógicos para o trato da questão africana e afro-brasileira na sala de aula. Caminhos estimulados pela Lei 10.639/2003 (AMÂNCIO; GOMES; SANTOS JORGE, 2008). Assim, os estudos da História da África e das culturas africanas e/ou afrodescenden-tes permitirão que educandos e educadores interajam com a cosmovisão do africano, sua concepção do universo, da vida e da sociedade (AMÂNCIO; GOMES; SANTOS JORGE, 2008). Os educandos brasileiros, por sua vez, saberão que também o Egito, em sua história habitada por faraônicas pirâ-mides, fi ca na África e que esta não é um país, mas um continente composto

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por grandes reinos em sua Antiguidade, por milhares de línguas em vários países, dos quais cinco falam ofi cialmente a Língua Portuguesa (AMÂN-CIO; GOMES; SANTOS JORGE, 2008). Apesar de ter sido promulgada em 2003, as instituições educacionais brasileiras ainda não alcançaram a efetividade plena da lei 10.639/2003. Dessa forma, pretende-se destacar alguns desafi os na aplicabilidade da Lei enfrentados por quatro escolas do Estado do Espírito Santo: EEEFM “Geraldo Vargas Nogueira” e EMEF “Eugênio Meneghelli”, na cidade de Colatina; EEEF “Dr. Moacir Avidos” e EEEFM “Professor Santos Pinto”, na cidade de Governador Lindenberg.

MATERIAL E MÉTODOS: Inicialmente, foi realizada uma pesquisa bi-bliográfi ca para a fundamentação do tema abordado; posteriormente, o le-vantamento das informações em quatro escolas no estado do Espírito Santo – EEEFM “Geraldo Vargas Nogueira” e EMEF “Eugênio Meneghelli” na cidade de Colatina; EEEF “Dr. Moacir Avidos” e EEEFM “Professor San-tos Pinto” na cidade de Governador Lindenberg. Para a obtenção dos dados foram entrevistados dezenove professores (quatro de Língua Portuguesa, três de Arte, quatro de História, quatro de Geografi a e quatro de Matemáti-ca) três diretores e quatro pedagogos, sendo no total vinte e seis profi ssio-nais. Todos eles são graduados, sendo dezenove pós-graduados. Os dados foram coletados a partir de um questionário contendo cinco perguntas (quatro objetivas e uma subjetiva). A primeira pergunta da entrevista objetivou buscar do entrevistado o conhecimento chave sobre a pesquisa, e, se a resposta fosse negativa, teria o entrevistador de apresentar uma breve explanação sobre o tópico. A última pergunta da entrevista foi subjetiva, solicitando dos entrevis-tados um ponto de vista a partir de suas realidades profi ssionais. Foi realizada, também, uma questão em nível de conhecimentos gerais com cento e uma pes-soas (oitenta e oito em Colatina e treze em Governador Lindenberg). No fi m da pesquisa, os dados foram elencados, analisados e convertidos em gráfi cos.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO: As quatro primeiras perguntas foram fechadas de ‘sim’ ou ‘não’. A primeira pergunta foi a seguinte: “¬O(a) senhor(a) conhece a lei 10.639 sancionada em 2003 a respeito da cultura africana?” Dos entrevistados, vinte e três possuíam algum conhecimento sobre a lei ou já tinham ouvido falar a respeito, e três não. Um deles ainda ressaltou “O ensino de literatura e cultura africana é contemplado no Currí-culo Básico Comum das Escolas Estaduais do ES”. A segunda pergunta foi a seguinte: “Já estudou Literatura Africana ou fez algum curso preparatório a respeito?” Dos entrevistados, doze responderam ‘sim’ e quatorze ‘não’. A terceira pergunta foi: “Os conteúdos desta lei são realmente trabalhados em sala de aula com interdisciplinaridade?”. Dezenove dos entrevistados disseram ‘sim’, mas sete disseram ‘não’, observando-se, assim, que isso não acontece plenamente como é previsto pela lei. Uma pedagoga afi rmou o seguinte a respeito da terceira questão: “Em algumas matérias, como, por exemplo, na área das Ciências Humanas, fi ca mais fácil de contextu-alizar e interdisciplinar o assunto”. A quarta pergunta apresentada foi: “A escola possui material didático e paradidático disponível para auxiliar, em sala de aula, o ensino da literatura e cultura africana?”. No total, seis dos entrevistados disseram ‘sim’, contra vinte que disseram ‘não’, sendo que em Governador Lindenberg, treze dos profi ssionais responderam ‘não’, so-mente um ‘sim’. A resposta positiva foi dada por um diretor, contrariando as respostas negativas de todos os professores e de um pedagogo de uma das escolas deste município. Já em Colatina, apenas cinco dos profi ssionais responderam ‘sim’ contra sete que responderam ‘não’, sendo que na EMEF “Eugênio Meneghelli”, todos os quatro profi ssionais entrevistados disse-ram que a escola carece de tais materiais e, na EEEFM “Geraldo Vargas Nogueira”, três dos profi ssionais responderam negativamente, alegando a superfi cialidade dos materiais disponíveis na escola. A quinta pergunta foi aberta, e os profi ssionais foram questionados da seguinte forma: “Quais

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são os aspectos que comprometem a efetividade plena da lei 10.639?”. Dos entrevistados, vinte responderam problemas como ausência de formação profi ssional e falta de material didático e paradidático, e seis dos profi ssio-nais disseram que não há algo que comprometa a efetividade plena da lei. Foi realizada, também, uma questão no nível de conhecimentos gerais com cento e uma pessoas (oitenta e oito em Colatina e treze em Governador Lindenberg), sendo a seguinte: “Em qual continente está localizado o Egi-to?”. Apenas trinta e cinco dos entrevistados sabiam que o Egito se localiza no Continente Africano e sessenta e seis deram respostas incorretas, dentre elas “Continente Asiático” e “Oriente Médio” que sequer é um continente.

1ª pergunta: - “O(a) senhor(a) conhece a lei 10.639 sancionada em 2003 a respeito da cultura africana?”

Figura 12ª pergunta: - “Já estudou Literatura Africana ou fez algum curso

preparatório a respeito?”

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Figura 23ª pergunta: - “Os conteúdos desta lei são realmente trabalhados

em sala de aula com interdisciplinaridade?”

Figura 34ª pergunta: - “A escola possui material didático e paradidático disponível para auxiliar, em sala de aula, no ensino da literatura e cultura africana?”

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Figura 45ª pergunta: - “Quais são os aspectos que comprometem a

efetividade plena da lei 10.639?”

Figura 56ª pergunta- “Em qual continente está localizado o Egito?”

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CONCLUSÕES: Por meio da coleta de dados realizada com profi ssionais da educação do estado do Espírito Santo, verifi cou-se que diversos desafi os ainda persistem, impedindo a efetividade plena da Lei 10.639/2003. Apesar de ter sido promulgada em 2003, alguns profi ssionais desconhecem seu conteúdo e a forma de sua aplicação, impossibilitando, portanto, sua materialização. Dois aspectos que comprometem a não inserção da referida Lei na proposta escolar merecem destaque: a reduzida disponibilidade de material didático adequado e a falta de profi ssionais capacitados para trabalhar a temática em sala de aula. Tais fatores impedem que a escola cumpra seu papel principal de construir sujeitos críticos, autônomos e conhecedores de sua herança cultural. Para que esta lei se efetive, torna-se necessário a formação inicial e continuada de pro-fi ssionais da educação. Nesse sentido, a literatura e o livro didático devem constituir as ferramentas necessárias para assegurar a formação da identidade africana e afro-brasileira, tornando esse processo contínuo.

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REFERÊNCIAS

AMÂNCIO, I. M. C.; GOMES, N. L.; SANTOS JORGE, M. L. Literaturas africanas e afro-brasileira na prática pedagógica. Belo Horizonte: Autên-tica, 2008.

PACÍFICO, Tânia Mara: Artigo A implantação da Lei nº 10.639/03, mo-difi cada pela Lei n° 11.645/08, em uma escola da rede estadual, no ensi-no fundamental, na cidade de Curitiba, Paraná. Disponível em: <www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/517-4.pdf‎ > Acessado em 10/10/2013.