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BRUNO DE SOUZA TORLAI O USO DE ENXERTOS ÓSSEOS NO TRATAMENTO DE OSTEOSSARCOMA DE MEMBRO EM CÃES São Paulo 2009

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BRUNO DE SOUZA TORLAI

O USO DE ENXERTOS ÓSSEOS NO TRATAMENTO

DE OSTEOSSARCOMA DE MEMBRO EM CÃES

São Paulo

2009

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FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS

BRUNO DE SOUZA TORLAI

O USO DE ENXERTOS ÓSSEOS NO TRATAMENTO

DE OSTEOSSARCOMA DE MEMBRO EM CÃES

São Paulo

2009

Trabalho apresentado à disciplina de Técnicas

Cirúrgicas, do curso de Medicina Veterinária,

sob orientação da Professora Aline Machado

De Zoppa

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BRUNO DE SOUZA TORLAI

O USO DE ENXERTOS ÓSSEOS NO TRATAMENTO

DE OSTEOSSARCOMA DE MEMBRO EM CÃES

Professora Aline Machado De Zoppa

FMU – Orientadora

Professora Thais Fernanda da S. Machado

FMU

M.V. André Fonseca Romaldini

Hospital Santa Inês – São Paulo

Trabalho apresentado à disciplina de Técnicas

Cirúrgicas, do curso de Medicina Veterinária, sob

orientação da Professora Aline Machado De Zoppa.

Defendido e aprovado em de Dezembro de 2009,

pela banca examinadora constituída pelos médicos

veterinários:

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Dedico este trabalho:

À minha mãe, Margarete Alves de Souza Torlai, pelo sacrifício, incentivo, confiança e apoio

incondicionais.

À memória de meu pai, Luiz Antonio Torlai, e de meu avô, Liberalino Aparecido de Souza,

que não tiveram a oportunidade de vivenciar esse momento.

À minha família, pelo apoio e incentivo.

Aos meus amigos, por todos os momentos passados juntos, mesas partilhadas e viagens feitas

em conjunto.

Obrigado, vocês não sabem o quanto significam para mim.

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À todos os professores, por todo o conhecimento transmitido ao longo de cinco anos de

formação.

À Professora Aline Machado De Zoppa, pela orientação, apoio, incentivo e oportunidades

dadas.

Aos residentes, médicos veterinários e demais profissionais do setor que de alguma forma

participaram de minha formação.

Obrigado por terem feito parte deste processo.

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“A colheita é comum, mas o capinar é sozinho.”

João Guimarães Rosa

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RESUMO

O osteossarcoma é uma das neoplasias de maior ocorrência e agressividade que

acomete cães na medicina veterinária. Afeta principalmente raças grandes e gigantes, sendo

de etiologia desconhecida, associada principalmente à características anatômicas das raças,

porém sem argumentos científicos suficientes para sua confirmação. Seu diagnóstico é feito

em geral por exames radiográficos locais e biópsias da formação, embora existam outras

técnicas, também eficazes. O tratamento de eleição atualmente utilizado consiste no

procedimento cirúrgico de amputação do membro acometido, associado à quimioterapia como

tratamento adjuvante, dado o elevado risco de metástases. Este trabalho destina-se a abordar

uma alternativa a esta forma de tratamento, através do uso de enxertos ósseos para a

manutenção do membro acometido, uma vez que, em alguns casos, sua presença pode ser

necessária à vida e bem-estar do animal, como em raças gigantes, por exemplo, ou por

oposição do proprietário, que pode mostrar-se avesso à amputação do membro de seu animal.

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ABSTRACT

Osteosarcoma is one of the most aggressive and common bone tumor that occurs in dogs in

the veterinary medicine. Affects specially large and giant breeds, having unknown etiology,

associate in special with anatomic breed attributes, however without any scientific arguments

to its confirmation. The diagnose are usually made by radiographic exams and biopsy from

the affected area, although there is another effective diagnosis techniques too. The treatment

of choice consists in the amputation of the affected limb, with associated chemotherapy, given

the elevated risk of metastasis. This article discusses the main aspects related to the clinical

signs, diagnose techniques, prognostics and alternative treatments for the maintenance of the

member, specially the use of bone grafts, once that in some cases its presence may be vital to

the patient, like in giant breeds, or by the owner's opposition to the amputation treatment.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Técnicas de Coleta de Amostra para Biópsia 17

Figura 2. Técnica de limb-sparing em cão 26

Figura 3. Uso de interlocking nail na correção de fratura em fêmur de felino 27

Figura 4. Procedimentos de obtenção de osso esponjoso 34

Figura 5. Estabilização e incorporação de enxerto esponjoso autógeno e aloenxerto

cortical 38

Figura 6. Aspecto radiográfico da incorporação após a implantação do segmento

ósseo cortical conservado em mel utilizado em cão 41

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SUMÁRIO

1. Introdução 11

2. Osteossarcoma 12

2.1. Etiologia 12

2.2. Fisiopatogenia 12

2.3. Histologia 13

2.4. Manifestações Clínicas 14

2.5. Diagnóstico 14

2.5.1. Exame Radiológico 15

2.5.2. Exame Laboratorial 15

2.5.3. Biópsia 16

2.5.4. Exame Citológico e Histopatológico 17

2.5.5. Cintilografia Óssea 18

2.5.6. Outros Meios Diagnósticos 19

2.5.7. Diagnóstico Diferencial 19

2.6. Tratamento 20

2.6.1. Quimioterapia 20

2.6.2. Radioterapia 22

2.6.3. Tratamento Cirúrgico 22

2.6.3.1. Cirurgia com Amputação de Membro 22

2.6.3.1.1. Pós-Operatório 22

2.6.3.2. Cirurgia com Preservação de Membro 23

2.6.3.2.1. Pós-Operatório 27

2.7. Prognóstico 28

3. Enxertos Ósseos 30

3.1. Definição 30

3.2. Indicações 30

3.3. Fontes 30

3.4. Funções 31

3.5. Coleta 32

3.5.1. Enxerto de Osso Esponjoso 32

3.5.2. Aloenxertos de Osso Cortical 34

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3.5.3. Enxertos Autógenos Córtico-Esponjosos 35

3.6. Implante e Transplante 36

3.6.1. Enxerto de Osso Esponjoso 36

3.6.2. Aloenxertos de Osso Cortical 36

3.6.2.1. Enxertos Incrustados 39

3.6.3. Enxertos Autógenos Córtico-Esponjosos 39

3.7. Pós-Operatório 39

3.8. Imunogenicidade 41

3.9. Estabelecimento de Banco de Ossos 43

3.9.1. Seleção do Doador 43

3.9.2. Aquisição de Tecidos 44

3.9.2.1. Coleta Estéril 44

3.9.2.2. Coleta Asséptica 46

3.9.2.2.1. Métodos Disponíveis de Esterilização 46

3.9.2.2.1.1. Autoclavagem 46

3.9.2.2.1.2. Aloimplantes Cozidos e Desproteinizados 47

3.9.2.2.1.3. Esterilização Química 47

3.9.2.2.1.4. Aloimplantes Liofilizados 47

3.9.2.2.1.5. Irradiação Gama 48

3.9.3. Meios de Conservação de Implantes Corticais 48

3.9.3.1. Osso Descalcificado (Desmineralizado) 48

3.9.3.2. Aloimplantes Congelados 49

3.9.3.3. Aloenxerto Conservado em Glicerina à 98% 49

3.9.3.4. Aloenxerto Conservado em Mel 49

3.9.4. Materiais Sintéticos Para Enxerto 49

4. Discussão 51

5. Conclusão 53

6. Referências Bibliográficas 54

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1. INTRODUÇÃO

O osteossarcoma (OSA) é a neoplasia óssea primária mais frequentemente

diagnosticada no cão, sendo responsável por mais de 85% das neoplasias com origem no

esqueleto (DALECK et al, 2002), ocorrendo em geral durante o primeiro período da meia-

idade, com uma média de incidência em animais com 7,7 anos e maior risco de ocorrência

entre 7 e 10 anos, decrescendo o risco após tal faixa. Em cães, tende a ocorrer em raças de

grande porte (aproximadamente 63% do total), com proporção de ocorrência entre os

esqueletos apendicular e axial de 3:1. Machos apresentam incidência ligeiramente maior que

fêmeas. Dentre os OSAs apendiculares, os membros torácicos são mais acometidos, dois

terços do total, por suportarem cerca de 60% do peso corporal (LIU, 1996; DALECK et al,

2002; GOMES L. et al, 2008). A região metafisária de ossos longos é o sítio primário mais

comum de ocorrência do OSA, sendo os membros torácicos mais acometidos que os pélvicos

(2:1) onde a extremidade distal do rádio e proximal do úmero são os locais de maior

ocorrência do OSA. É rara a ocorrência de OSA nas regiões ósseas adjacentes ao cotovelo. No

membro pélvico, pode desenvolver-se uniformemente na porção distal do fêmur e distal de

tíbia, porção proximal de tíbia e, menos comumente, na porção proximal de fêmur (DALECK

et al, 2002). Sua distribuição nos ossos de sustentação é a seguinte: rádio 20%, úmero 19%,

fêmur 17%, e tíbia 11% (LIU, 1996). A maioria dos OSAs origina-se no canal medular de

ossos longos, geralmente na metáfise, alguns na superfície cortical e periósteo; raramente em

sítios extra-esqueléticos, tais como nas glândulas mamárias, no fígado, no baço, no trato

gastrintestinal, nos pulmões, na pele e em outros locais sem uma lesão óssea primária

(DALECK et al, 2002; GOMES L. et al, 2008). Seu tratamento inclui diversas alternativas

que, associadas, promovem uma maior probabilidade de sucesso. Dentre elas, destacam-se o

tratamento quimioterápico, a radioterapia e o tratamento cirúrgico, que é apresentado por duas

técnicas principais, que consistem na técnica de amputação do membro acometido e no uso de

enxertos ósseos para a preservação do mesmo. Este trabalho destina-se a discutir o uso do

segundo procedimento, suas vantagens, desvantagens, e a viabilidade para sua realização, bem

como a comparação entre os resultados de cada técnica, através de uma revisão bibliográfica

que discuta as principais técnicas utilizadas nos últimos anos, bem como etiologia, patologia,

histologia, manifestações clínicas e técnicas diagnósticas para a afecção.

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2. OSTEOSSARCOMA

2.1. Etiologia

A etiologia do osteossarcoma canino ainda permanece desconhecida. Uma das teorias

é baseada na evidência de que ele tende a ocorrer nos ossos que sustentam o maior peso e em

sítios adjacentes às fises de fechamento tardio, sendo os animais de grande porte predispostos

a pequenos e múltiplos traumas nas regiões metafisárias, as quais são de maior atividade

celular. A sensibilização de células nesta região pode iniciar a doença pela indução de sinais

mitogênicos, aumentando a probabilidade de desenvolvimento de uma linhagem mutante.

Especula-se a importância viral na etiologia desta neoplasia, já que pode ocorrer em ninhadas

e pode ser induzido experimentalmente pela injeção de células tumorais em fetos caninos.

Porém ainda não se isolou nenhum vírus responsável pelo surgimento do OSA canino

(DALECK et al, 2002).

Existem relatos de OSA apendicular em fraturas não tratadas, em especial as que

passaram por processos de atraso na consolidação ou não união óssea e osteomielite crônica.

A radiação, tanto experimental como terapêutica, também tem sido relatada como causa de

OSA em cães. Alterações genéticas foram observadas em cães com OSA e relatadas como um

importante fator de risco para o desenvolvimento do tumor (OLIVEIRA, 2008).

É relatada ainda a ocorrência de OSAs associados a implantes metálicos, com maior

incidência em Pastores Alemães, machos. No estudo, foi apontada incidência tanto sobre

implantes intramedulares (10 casos), como sobre placas (7 casos). O intervalo entre a inserção

dos implantes e o desenvolvimento do OSA variou de dois anos e meio à doze anos. Todos os

dispositivos aplicados eram de aço inoxidável, em ligas diversas (LIU, 1996). Radioterapia

com radiação ionizante pode também induzir o aparecimento do tumor, em áreas que foram

submetidas ao campo de radiação após 1,7 a 5 anos (DALECK el al, 2002).

2.2. Fisiopatogenia

O OSA é um tumor mesenquimal maligno de células ósseas primitivas caracterizado

pela produção neoplásica de osteoide e pelo aprisionamento de células anaplásicas no interior

das lacunas da matriz osteoide (DALECK et al, 2002). São classificadas como simples (tecido

ósseo formado numa matriz cartilaginosa), compostos (osso e cartilagem estão presentes) ou

pleomórficos (anaplásicos, com apenas algumas ilhas de osteoide presentes). A classificação

pode também ser baseada no tipo celular e na atividade (osteoblásticos, condroblásticos ou

fibroblásticos), no aspecto radiológico (líticos, escleróticos ou mistos) e na origem (centrais,

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justacorticais ou periosteais). Uma forma incomum de osteossarcoma é o tipo telangiectásico

que, macroscopicamente, lembra um hemangiossarcoma. Microscopicamente, essas

neoplasias são compostas de osteoblastos, osteoide e grandes cavidades císticas cheias de

sangue e revestidas por células malignas (DOIGE e WEISBRODE, 1998).

Em cães, não existe diferença em relação ao comportamento biológico entre esses

subgrupos histológicos (DALECK et al, 2002). São tumores localmente invasivos e

rapidamente metastáticos, com predileção pelo pulmão (cerca de 90% dos casos). Com o uso

de quimioterapia, que provê excelentes níveis da droga no parênquima pulmonar, ossos e

outros órgãos são com mais frequência acometidos por metástases (OLIVEIRA, 2008).

A presença de tumor osteoide distingue o OSA das demais neoplasias ósseas malignas

não-osteogênicas, como o condrossarcoma e o fibrossarcoma, visto que os três produzem

estroma fibroso, o condrossarcoma e o fibrossarcoma produzem matriz cartilaginosa e

somente o OSA produz osteoide. É um tumor extremamente agressivo, tanto no local do

crescimento quanto na formação de metástases (DALECK et al, 2002).

Apesar de o pulmão ser o sítio mais comum de metástase, as células neoplásicas

podem se disseminar para ossos, linfonodos e tecidos moles com certa frequência. As

metástases ocorrem quase que exclusivamente por via hematógena. As células do OSA

provocam agregação plaquetária e liberação de tromboxano A2, facilitando a formação de

metástases e potencializando o crescimento do tumor. A agregação plaquetária promove a

implantação de agregados celulares tumorais, podendo auxiliar na formação de uma ponte

entre as células tumorais e a superfície vascular (DALECK et al, 2002).

2.3. Histologia

Histologicamente, o osteossarcoma é composto de células mesenquimatosas

anaplásicas que produzem osteoides, não sendo esta matriz óssea de caráter reativo ou

metaplásico. O aspecto histológico do osteossarcoma varia, desde células fusiformes malignas

com marcante fibrogênese e escassa formação osteoide, até componente osteoide fibroso com

abundante produção osteoide e os aspectos do estroma maligno dominante ou osteoide

neoplásico maligno. As trabéculas originais podem ser destruídas pelos tecidos tumorais em

crescimento. Ocasionalmente, pode haver depósitos de estroma sarcomatoso, osteoide

neoplásico, ou de tecido ósseo entre as trabéculas preexistentes. Em outras áreas, o estroma

maligno comumente consiste de feixes entremeados de células fusiformes, anaplásticas, com

elevada percentagem de figuras mitóticas, apresentando o padrão de fibrossarcoma. Pode

haver ainda mescla de células fusiformes com formação osteoide, e numerosas células

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gigantes multinucleadas (LIU, 1996).

O comportamento biológico do OSA canino é bem definido, caracterizando-se por

infiltração local dos tecidos subjacentes e disseminação hematogênica rápida (geralmente para

os pulmões) (NELSON, 1998). A incidência de metástases neste tipo de neoplasia foi relatada

como ficando entre 20 e 59% no cão. Em outros órgãos, distantes do local de origem, a

metástase ocorre principalmente através da circulação, sendo rara a ocorrência em linfonodos.

Os órgãos mais comumente afetados são os pulmões, rins, ossos, fígado, coração, baço e

adrenais (LIU, 1996).

2.4. Manifestações Clínicas

Cães afetados por tumores apendiculares geralmente apresentam-se claudicantes,

agudos ou crônicos. O exame físico geralmente revela tumefação dolorosa na área acometida,

com ou sem envolvimento de tecidos moles, podendo o membro apresentar-se aumentado e

firme, raramente havendo fístulas cutâneas. Após um certo período há ocorrência de obstrução

tecidual significativa, impedindo a drenagem linfática normal, levando a formação de edema

por obstrução linfática, facilmente visível devido ao inchaço do membro (FOSSUM, 2002;

OLIVEIRA, 2008). Essa tumefação se localiza geralmente na extremidade distal do rádio e da

ulna, assim como na extremidade proximal de fêmur, tíbia e úmero. A formação é geralmente

firme e dolorosa à palpação (DALECK et al, 2002; OLIVEIRA, 2008).

A dor e o edema podem apresentar início agudo, resultando em suspeita de problema

ortopédico não-neoplásico e, portanto, retardando consideravelmente o diagnóstico e a terapia

desta neoplasia (MORAES et al, 2006). A dor ocorre devido a microfraturas ou à interrupção

do periósteo induzidos pela osteólise do osso cortical pela extensão tumoral do canal medular

(DALECK et al, 2002). As manifestações sistêmicas (febre, anorexia, perda de peso) são

incomuns nos estágios agudos da doença. Podem ainda ser observadas, em alguns animais,

anormalidades respiratórias associadas à metástase pulmonar (MORAES et al, 2006;

FOSSUM, 2002). Fraturas espontâneas podem ser observadas durante o desenvolvimento da

doença (DALECK et al, 2002; GOMES L. et al, 2008).

2.5. Diagnóstico

O diagnóstico é baseado na história clínica, exame físico, achados radiológicos e

cintilográficos, sendo a confirmação feita por biópsia e exame histopatológico (GOMES L. et

al, 2008). Deve ser ressaltada a importância de um amplo exame clínico e radiológico, assim

como da biópsia excisional, para diagnóstico conclusivo, uma vez que a citologia e

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histopatologia são necessárias para confirmação do diagnóstico (OLIVEIRA, 2008).

2.5.1. Exame Radiológico

Consiste no exame diagnóstico mais utilizado, apesar de inconclusivo para OSA

apendicular canino (OLIVEIRA, 2008). As avaliações radiográficas são importantes para

analisar a extensão do envolvimento ósseo e distinguir neoplasias ósseas de outras condições

não neoplásicas tais como fraturas, osteomielites e doenças ósseas metabólicas (DALECK et

al, 2002; GOMES L. et al, 2008).

As manifestações mais sugestivas de neoplasia óssea incluem lise cortical em lesões

que não ultrapassam o espaço articular; o aspecto radiográfico pode ser variável, porém lesões

ósseas primárias tipicamente revelam proliferação óssea e lise cortical na região metafisária,

que podem ser severas o suficiente para promover áreas de descontinuidade do córtex

(DALECK et al, 2002; OLIVEIRA, 2008).

O aspecto radiográfico do osteossarcoma em ossos longos envolve lesões osteolíticas

que apresentam bordas irregulares com padrão de aspecto “comido por traça”, ou contorno

ósseo alargado ao longo de toda a parte trabecular da epífise, estendendo-se até a metáfise e

diáfise. (DALECK et al, 2002). Margens escleróticas podem estar presentes na placa óssea

sub-articular ou no componente diafisário e observa-se diferentes graus de mineralização, que

vão de densidade sólida à mal definida. As lesões variam de erosões locais à destruição

completa do membro (LIU, 1996; FOSSUM, 2002; OLIVEIRA, 2008).

Radiografias torácicas revelam menos de 10% de doença metastática em cães no

momento da consulta. Quando detectada, a lesão metastática pulmonar aparece como um

nódulo discreto, podendo apresentar um ou mais nódulos (OLIVEIRA, 2008). No entanto,

cerca de 98% apresentam micro-metástases no momento do diagnóstico, apesar de somente

5% dos animais com OSA apresentarem evidência radiográfica de metástase pulmonar

(DALECK et al, 2002).

2.5.2. Exame Laboratorial

Os parâmetros sorológicos minerais de cães com osteossarcoma tendem a se distanciar

da normalidade. Geralmente a concentração de cromo e ferro, assim como a capacidade de

ligação do ferro, encontram-se extremamente reduzidas, quando comparadas com as de cães

sadios, e o mesmo ocorre em relação ao zinco, embora com menos diferença entre as

concentrações (MORAES et al, 2006).

A dosagem da enzima fosfatase alcalina no soro, pode ser considerada uma ferramenta

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valiosa no prognóstico. Quando se apresenta elevada no momento do diagnóstico do tumor ou

após o tratamento primário do tumor, pode indicar evidência clínica de metástases (DALECK

et al., 2002; FOSSUM, 2002).

2.5.3. Biópsia

Quando as manifestações clínicas, histórico, exame físico e achados radiográficos são

condizentes com tumor ósseo primário, o oncologista pode eleger a amputação sem biópsia

pré-operatória. Nesta situação, o exame histopatológico deve ser realizado após a cirurgia. O

diagnóstico definitivo de neoplasia óssea requer biópsia do tecido tumoral (GOMES L. et al,

2008).

A presença de ossos reativos não deve ser interpretada como diagnóstico, e também

não descarta a presença de processo patológico. Os tumores ósseos primários são circundados

por uma cápsula fibrosa de tecido conjuntivo reativo; se a amostra é retirada da zona

periosteal, não será possível realizar diagnóstico preciso (DALECK et al, 2002).

A biópsia pode ser realizada pela incisão da pele, permitindo a obtenção de quantidade

ideal de tecido e maior precisão do resultado, porém essa técnica apresenta, como

desvantagens, o envolvimento de procedimento cirúrgico, risco de complicações pós-

cirúrgicas como formação de hematoma, infecção, disseminação do tumor e fratura patológica

(DALECK et al, 2002).

Para a biópsia óssea, o animal é posicionado em decúbito lateral com o membro

acometido para cima. Trépano de Michele ou agulha Jamshidi podem ser utilizados para obter

biópsia óssea. As vantagens dos trépanos de Michele são a obtenção de maior amostra óssea;

entretanto, pode existir maior risco de fratura através do local da biópsia. As agulhas de

Jamshidi asseguram menor amostra, que pode diminuir o risco de fratura patológica pós-

biópsia. Com ambas as técnicas, podem ser obtidos diagnósticos precisos em mais de 80%

dos casos (FOSSUM, 2002). A técnica de biópsia fechada que utiliza a agulha de Jamshidi

fornece precisão de 91,9% para diferenciação do tumor de outras desordens, e 82,3% de

precisão para diagnóstico específico de tumor (DALECK et al, 2002).

É feita uma incisão sobre o centro do lesão. Impulsiona-se o trépano ou agulha pelos

tecidos moles até o córtex ósseo. Remove-se o estilete e se avança o trépano ou cânula através

do osso. O trépano ou cânula é removido e a amostra empurrada para fora por meio de

inserção de sonda dentro dela. Repete-se o procedimento para obtenção de múltiplas amostras

(FOSSUM, 2002).

As amostras devem ser retiradas da zona cortical central da lesão e de uma área de

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transição. A realização da biópsia não aumenta a taxa metastática, mas pode comprometer o

controle local da doença, se a agulha não for posicionada adequadamente; a região a ser

puncionada deve ser escolhida cuidadosamente, dando-se preferência à porção central. A

incisão de pele deve ser realizada numa posição que seja completamente removida no

momento da cirurgia definitiva. Deve-se tomar cuidado para evitar nervos, vasos e espaço

articular (DALECK et al, 2002). Os cuidados pós-operatórios terminada a biópsia são

mínimos. Podem ser necessárias bandagens de pressão, se houver sangramento excessivo

(FOSSUM, 2002).

2.5.4. Exame Citológico e Histopatológico

Embora a biópsia óssea para exame histopatológico permaneça como padrão para

diagnóstico de OSA canino, a citologia aspirativa pode propiciar o diagnóstico definitivo

como meio menos invasivo e pode ser realizada rapidamente sem anestesia, mas o material

obtido pode ser utilizado apenas para o exame citológico e pode não promover informação

definitiva em todos os casos (GOMES L. et al, 2008; OLIVEIRA, 2008). Nela, os aspirados

frequentemente revelam grande quantidade de células mesenquimais imaturas que podem ter

osteoide intracitoplasmático ou extracelular. Em associação aos osteoblastos malignos,

Figura 1. Técnicas de Coleta de Amostra para Biópsia. A biópsia óssea pode ser realizada com A. Trépano de

Michele ou B. Agulha de Jamshidi (FOSSUM, 2002).

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osteoblastos benignos e osteoclastos podem, também, estar presentes (OLIVEIRA, 2008). As

células do osteossarcoma geralmente são circulares ou ovais, possuem bordas citoplasmáticas

distintas, têm citoplasma azul brilhante granular e exibem núcleos excêntricos com ou sem

nucléolos (MORAES et al, 2006). Seu aspecto pode variar de células fusiformes malignas,

com marcante fibrogênese e escassa formação osteoide, até componente osteoide fibroso com

abundante produção osteoide e aspectos de estroma maligno dominante ou osteoide

neoplásico maligno. Em alguns casos, pode-se observar a presença de células gigantes

multinucleadas, ou ainda células sanguíneas, restos celulares semi-necrosados e escassa

formação osteoide (LIU, 1996).

Nos casos de osteossarcomas, o emprego de agulha calibre 40x12 permite obter

material mais adequado para análise citopatológica, visto tratar-se de neoplasias de

consistência dura e pouco esfoliativas. Vários estudos têm apontado para acurácia no

diagnóstico do tumor com valores superiores a 85%. Embora a determinação citológica de

malignidade no osteossarcoma seja associada à alta acurácia diagnóstica, frequentemente é

difícil identificar o tipo exato de sarcoma baseado na citologia isoladamente (GOMES L. et

al, 2008).

2.5.5. Cintilografia Óssea

A cintilografia é um método eficiente e altamente sensível para a detecção das lesões

ósseas, no que se refere à precocidade das informações obtidas. Este método pode preceder

em até 6 meses a detecção destas lesões. O exame cintilográfico de animais com tumores

ósseos mediante o uso de TcMD (metileno difosfato marcado com tecnécio) é mais eficiente

que o exame radiográfico, especialmente no que se refere a precocidade de detecção de

metástases (DALECK et al., 2002; MORAES et al, 2006). É uma técnica de elevada

sensibilidade para detecção de lesões esqueléticas, porém não é específica para identificação

de sítios ósseos tumorais. Qualquer região com atividade osteoblástica será identificada pela

cintilografia óssea, incluindo osteoartrite e infecção (STRAW,1996).

O radiofármaco é administrado por via intravenosa, incorporando-se à matriz cristalina

do esqueleto, sendo dependente do aporte vascular e reação osteogênica, refletindo, em

consequência, as condições do metabolismo ósseo. (MORAES, et al, 2006).

Usa-se uma câmara gama que registra a distribuição de radioatividade por entre os

sítios do osso, o que pode ser exibido como imagem. A detecção do radionucleotídio no osso

pela câmara é indicativo de atividade metabólica esquelética, completando, assim, a

informação estrutural das radiografias (DALECK et al., 2002).

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2.5.6. Outros Meios Diagnósticos

Embora o exame radiográfico seja o método mais utilizado para o diagnóstico de OSA

canino, podem ser utilizados também outros recursos mais eficientes que o exame

radiográfico, especialmente no que se refere à precocidade de detecção de metástases, como a

cintilografia, já abordada, e a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética, as

quais permitem uma melhor avaliação da neoplasia quanto a sua característica e extensão,

além de diagnosticar mais rapidamente a presença de metástases. Ambas podem prover

informações essenciais para se estabelecer um plano cirúrgico, por promover uma

visualização desejada da extensão de tecidos moles envolvidos. A ressonância magnética

proporciona maior acurácia estimada do tumor e é reconhecida como a melhor modalidade

para avaliação pré-operatória de OSA apendicular, especialmente na cirurgia de preservação

do membro (DALECK et al 2002; OLIVEIRA, 2008).

2.5.7. Diagnóstico Diferencial

Deve ser feito o diagnóstico diferencial para outros tumores ósseos primários e

metastáticos, osteomielites e micoses sistêmicas (DALECK et al, 2002). As lesões primárias

suspeitas devem ser diferenciadas de osteomielite bacteriana, osteomielite fúngica, tumor

ósseo metastático (carcinoma prostático), extensão direta de tumores de tecido mole

(carcinomas de leito ungueal), osteopatia pulmonar hipertrófica, infartos ósseos,

hipervitaminose A, resposta periosteal a trauma e cistos ósseos aneurismáticos (FOSSUM,

2002). Fibrossarcoma, hemangiossarcoma, tumor de células gigantes, lipossarcoma, linfoma,

osteoma, mieloma múltiplo e condrossarcoma são tumores primários menos diagnosticados.

São afecções raras, mas de igual importância, pois podem originar-se nos ossos (MORAES et

al, 2006).

As metástases ósseas diferenciam-se do osteossarcoma por existir um tumor primário

detectável, localizado em qualquer parte do corpo, como em glândulas mamárias, próstata,

bexiga, ou por existir história pregressa de ressecção tumoral nessas regiões. A osteomielite

bacteriana drena conteúdo purulento, e frequentemente são observados sequestros na

radiografia. Pode estar acompanhada de febre e alterações no leucograma, exceto nos casos

crônicos (DALECK et al, 2002; GOMES L. et al, 2008).

Micoses sistêmicas com tendência a localização óssea são causadas por

coccidiomicoses ou blastomicoses, sendo os cães infectados pelo trato respiratório ou por

feridas abertas. Geralmente, os animais residem ou possuem história de viagem a áreas

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endêmicas. A aparência radiográfica é de lesões proliferativas ou blásticas, líticas, que

ocorrem em diáfise distal, metáfises, epífises ou raramente no esqueleto axial (DALECK et al,

2002; GOMES L. et al, 2008).

2.6. Tratamento

Uma vez confirmado o osteossarcoma, há muitas opções de tratamento, tanto

definitivas quanto paliativas. Se nenhum tratamento for aceito, há algumas alternativas para

providenciar controle da dor na tentativa de conseguir boa qualidade de vida (OLIVEIRA,

2008).

2.6.1. Quimioterapia

Na medicina veterinária, o objetivo da quimioterapia é prolongar a vida do paciente

enquanto minimizam-se os efeitos colaterais. A resposta individual de cães à quimioterapia é

imprevisível, podendo falhar na maioria dos casos, resultando em insucesso terapêutico. No

entanto, a administração do fármaco citotóxico é necessária em face da doença metastática

com intuito de diminuir a carga total do tumor, prolongar o intervalo livre da doença e

melhorar a qualidade de vida do paciente, fornecendo alívio das manifestações associadas à

neoplasia (DALECK, et al, 2002; GOMES L. et al, 2008).

Dois fármacos, a cisplatina e a doxorrubicina, têm proporcionado resultados

satisfatórios em aumentar a taxa de sobrevida de cães com osteossarcoma. A resposta à

quimioterapia pode ser influenciada, quanto ao seu início, em relação ao tempo de cirurgia.

Em cães, a quimioterapia frequentemente não é iniciada até 2 a 4 semanas após a cirurgia,

porque a mesma, quando iniciada precocemente, pode inibir a cicatrização da ferida e

promover a supressão da medula óssea. Evidências sugerem, entretanto, que o tempo de

sobrevida é maior quando a quimioterapia é iniciada, assim que possível, após a cirurgia.

Portanto, indica-se iniciá-la uma semana após a mesma (GOMES L. et al, 2008).

A cisplatina é a droga de escolha, tem o efeito de prolongar significativamente os

intervalos livres da doença e, consequentemente, a sobrevida do animal (MORAES et al,

2006). Pelo fato de ser nefrotóxica, recomenda-se a avaliação da função renal do paciente,

antes de se estabelecer o tratamento, e análise dos parâmetros hematológicos e renais, antes de

cada sessão de quimioterapia. Os exames hematológicos anteriores à administração da

cisplatina devem apresentar taxas superiores a 3000 neutrófilos/dl, 75000 plaquetas/dl, níveis

normais de nitrogênio ureico não-proteico sanguíneo, creatinina e densidade urinária em torno

de 1035, sem que haja sedimentos anormais. A dose recomendada de cisplatina é 70mg/m² de

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superfície corporal, sendo recomendado protocolo de diurese salina para prevenir

nefrotoxicidade. Esse protocolo deve ser repetido a cada 3 semanas num total de 4 a 6

sessões. Náuseas e vômitos são efeitos colaterais graves e são indicativos da suspensão do

tratamento (DALECK et al, 2002; MORAES et al, 2006; GOMES L. et al, 2008).

A eficácia da doxorrubicina no osteossarcoma é similar à da cisplatina. A intercalação

ao DNA inibe a replicação nucleotídica e pode desencadear a quebra do DNA, originando

distúrbios sérios à sua estrutura, RNA e síntese proteica. A principal vantagem da

doxorrubicina sobre a cisplatina é a relativa facilidade de administração, por via IV lenta e

sem necessidade de protocolo de diurese salina. Porém, deve-se assegurar que o cateter esteja

adequadamente posicionado no leito vascular evitando-se, desta forma, necrose tecidual. A

dose de doxorrubicina é de 30 mg/m², a cada 2 semanas. Pode ocorrer supressão da medula

óssea, mas na maioria dos casos o fármaco é bem tolerado (GOMES L. et al, 2008).

A efetividade da quimioterapia pode ser determinada pela percentagem de necrose

tumoral mensurada no fragmento de tumor ressecado, se a quimioterapia foi realizada anterior

à cirurgia. Se a porcentagem de necrose é baixa, a resposta à quimioterapia é considerada

inadequada, sendo recomendado protocolo mais agressivo no pós-operatório (GOMES L. et

al, 2008).

Devido à cisplatina e a doxorrubicina terem diferentes mecanismos de ação, a

administração concomitante dos dois fármacos pode melhorar o tempo de sobrevida. Nestes

casos, a doxorrubicina é administrada na dose de 20 mg/m² e a seguir, a cisplatina, na dose de

60 mg/m², é infundida. O protocolo de diurese de 4 horas pode ser utilizado. A radioterapia

combinada à cisplatina por via intra-arterial promove maior porcentagem de necrose tumoral,

enquanto mantém a integridade óssea (GOMES L. et al, 2008).

A carboplatina é um composto platina de segunda geração que é menos nefrotóxico

que a cisplatina, com efeito antineoplásico similar. A média de sobrevida após amputação e

quatro aplicações da carboplatina foi de 321 dias, e 35,4% dos cães permaneceram vivos

durante um ano (GOMES L. et al, 2008). A vantagem da carboplatina em relação à cisplatina

é que não há necessidade de diurese salina. A dose recomendada é de 300mg/m², administrada

com intervalos de 21 dias, por até quatro sessões desde que não ocorra nenhum sinal grave de

supressão de medula óssea. Antes da administração da cisplatina os cães devem ter >3000

leucócitos PMN/uL, >150000 plaquetas /uL, ureia e creatinina normais e densidade especifica

da urina de 1.030 sem proteinúria ou cilindros no sedimento urinário (MORAES et al, 2006;

GOMES L. et al, 2008).

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2.6.2. Radioterapia

A radioterapia é um método bastante útil para o tratamento de osteossarcoma

apendicular e axial, assim como de outros tipos de neoplasias. Pode ocasionar alívio ou até

remissão da dor por longos períodos e o retardo no crescimento neoplásico, sendo, portanto o

procedimento indicado em casos em que há impossibilidade de excisão cirúrgica tumoral.

Doses relativamente altas de radiação são liberadas em três frações (cada uma de 8 a 10 Gy)

por um período de três semanas (MORAES et al, 2006).

Apesar de existirem casos de osteossarcoma induzido por radiação em animais, a

combinação entre a radioterapia e a cirurgia pode prolongar significativamente a sobrevida

dos pacientes, podendo ser curativa (MORAES et al, 2006).

2.6.3. Tratamento Cirúrgico

2.6.3.1. Cirurgia com Amputação de Membro

A amputação do membro é o tratamento tradicional para cães com osteossarcoma

apendicular (GOMES L. et al, 2008). A principal vantagem da amputação do membro é que o

procedimento proporciona a ressecção completa do tumor primário e consequente alívio da

dor. A cirurgia raramente resulta em cura, e deve ser considerada tratamento paliativo, quando

realizada isoladamente (DALECK et al, 2002; OLIVEIRA, 2008). O procedimento deve ser

realizado de maneira a assegurar completa ressecção do tumor primário. Isto é alcançado

deixando margem de segurança de no mínimo três centímetros (GOMES L. et al, 2008). Cães

com OSA apendicular, sem evidência de doença metastática e tratados somente com cirurgia

de amputação do membro, apresentam tempo médio de sobrevida pequeno, variando de

quatro a sete semanas, raramente sobrevivendo até um ano (OLIVEIRA, 2008).

A amputação do membro anterior pode ser realizada por meio de remoção da escápula,

exceto nos casos de lesões localizadas na mesma, em que está indicada a escapulectomia

parcial; como alternativa, o membro pode ser removido por ressecção do úmero distal

(DALECK et al, 2002; FOSSUM, 2002). No membro posterior, a amputação por

desarticulação da articulação coxofemoral é mais utilizada (FOSSUM, 2002).

Em sua maioria, os cães toleram a amputação de modo satisfatório, apresentando

pouco ou nenhum decréscimo na atividade em geral, seguida à cirurgia (DALECK et al,

2002).

2.6.3.1.1. Pós-Operatório

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Após a amputação, o local cirúrgico deverá ser observado para detecção de edema,

rubor e/ou secreção. Se forem observadas hemorragia ou formação de seroma, pode-se

exercer pressão no local cirúrgico aplicando bandagem circunferencial ao redor do tórax e

pelve. Deverá ser encorajada a mobilidade pós-cirúrgica, para que o animal possa aprender a

andar em três pernas. O alívio da dor geralmente é evidente após amputação dos membros

com grandes lesões neoplásicas. As radiografias torácicas sequenciais são indicadas após a

cirurgia para detectar metástase. As complicações potenciais da deambulação incluem, além

de hemorragia e formação de seroma, infecção e deiscência da linha de sutura (FOSSUM,

2002).

2.6.3.2. Cirurgia com Preservação de Membro

A preservação do membro está indicada, particularmente, nos cães com tumores

ósseos nos membros torácicos apresentando desordens ortopédicas ou neurológicas

concorrentes e naqueles cujos proprietários rejeitem a possibilidade de amputação, bem como

nos animais com osteossarcoma confirmado clinicamente, cujo tumor primário esteja afetando

menos que 50% do osso ao exame radiográfico (DALECK, et al, 2002; FOSSUM, 2002;

GOMES L. et al, 2008).

A cirurgia de preservação, denominada “limb-sparing”, consiste na exerese do

segmento ósseo envolvido com a neoplasia, com uma margem de segurança de

aproximadamente 2 cm e a reconstrução da coluna óssea, com ou sem artrodese da articulação

adjacente. A seguir faz-se o implante de uma prótese óssea conservada a baixa temperatura

(-70ºF ou -57ºC) e fixada com uma placa metálica (DALECK et al, 2002; MORAES et al,

2006).

Tem sido descrita para as regiões distal do rádio, proximal do úmero, distal da tíbia, e

proximal do fêmur em cães com osteossarcoma, mas a técnica para tumores distais do rádio

tem os resultados mais favoráveis. A preservação do membro no caso de lesões umerais

proximais não tem obtido sucesso considerável e, em cães com tumores localizados na porção

distal do fêmur ou da tíbia, há elevada taxa de infecção decorrente da escassez de

recobrimento muscular. Tumores localizados na tíbia proximal ou fêmur distal representam

problemas pela impossibilidade de salvar a articulação do joelho. A função insatisfatória e as

taxas de complicação desencorajam a indicação da técnica nestes locais. A artrodese do carpo

é bem tolerada em cães, entretanto em outros locais (em geral ombro, coxofemoral, joelho e

tarso) está diretamente associada à função insatisfatória do membro. Visto que os tumores

ósseos primários ocorrem em locais metafisários, a articulação vizinha deverá ser submetida à

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artrodese após a ressecção do tumor (DALECK, et al, 2002; GOMES L. et al, 2008).

Comumente a amputação é recomendada para tumores localizados nos membros pélvicos e a

cirurgia com preservação do membro é considerada para tumores dos membros torácicos,

particularmente os localizados na porção distal do rádio (DALECK et al, 2002).

Os cães devem receber alguma forma de tratamento neoadjuvante no período pré-

operatório (cisplatina IA, cisplatina IV, radioterapia, ou combinação) ou implantação de ácido

polilático contendo cisplatina (OPLA-Pt) no momento da cirurgia. A radioterapia isolada tem

como principal desvantagem a ausência de efeitos na moléstia micrometastática e, por essa

razão, ela é geralmente associada à quimioterapia. A quimioterapia neoadjuvante produz

necrose no tumor primário, prevenindo a reatividade das micrometástases (DALECK et al,

2002).

Além disso, a quimioterapia pode exercer maior efeito sobre a moléstia metastática se

for ministrada antes da remoção do tumor primário. Aparentemente, os tumores primários

podem, de algum modo, suprimir o crescimento das micrometástases, mas a velocidade de

crescimento dessas pode aumentar subitamente após a remoção do tumor primário (DALECK

et al, 2002).

Também no período pré-operatório deverá ser procedida a determinação da margem

intramedular diafisária do tumor. A cintilografia óssea e a tomografia computadorizada são

indicadores mais confiáveis da margem intramedular do tumor do que radiografias simples,

que podem subestimar a extensão do tumor (DALECK et al, 2002).

De modo geral, a técnica baseia-se na incisão ampla de pele do membro acometido,

dissecção dos tecidos moles até a pseudocápsula do tumor e ressecção em bloco dos tecidos

ósseo e moles afetados, criando um amplo defeito cirúrgico. O tecido ósseo é seccionado com

auxilio de serra oscilatória, três a cinco centímetros proximais à margem radiográfica do

tumor. Os músculos unidos à pseudocápsula do tumor são transeccionados, mantendo-se 2 a 3

cm de margem de tecido mole com característica normais. Cuidado especial deve ser tomado

para preservar a vascularização principal, devendo a mesma ser desviada, medial ou

lateralmente. Vasos de grande calibre associados ao tumor são ligados, sendo a aplicação de

grampos cirúrgicos muito útil (GOMES L. et al, 2008). O aloenxerto cortical congelado de

tamanho apropriado deve ser descongelado em solução salina estéril que contenha antibiótico

(neomicina 1g, polimixina B 500.000UI, penicilina potássica 5.000.000UI), sendo seccionado

até o comprimento desejado e a cavidade medular escarificada para remoção de gordura e

restos celulares. Deve-se coletar osso esponjoso autógeno do úmero proximal ou crista ilíaca,

que será utilizado na compactação da cavidade medular do enxerto (DALECK et al, 2002). A

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cartilagem articular é removida da articulação adjacente desarticulada, bem como a gordura

medular e debris celulares, e o aloenxerto é fixado ao local por placa de compressão

dinâmica. Se possível será utilizada placa com 4,5mm de largura, com pelo menos quatro

parafusos proximais e quatro distais ao aloenxerto (DALECK et al, 2002; GOMES L. et al,

2008). Geralmente é realizada artrodese do carpo. O canal medular do enxerto é preenchido

com polimetilmetacrilato associado a amicacina, objetivando promover suporte ao parafuso

durante a revascularização do enxerto e atuar como reservatório para o antibiótico (GOMES

L. et al, 2008). A ferida é lavada com solução salina e pode-se utilizar implante de OPLA-Pt

(DALECK et al, 2002).

Variações da técnica têm sido descritas em osteossarcoma acometendo outros ossos

apendiculares, com exceção do rádio e/ou ulna, visando diminuir a incidência de

complicações pós-operatórias, particularmente a infecção. Estas técnicas incluem auto-

enxertos vascularizados, pasteurizados, irradiados e uso de transporte ósseo intercalado com

fixador externo circular (GOMES L. et al, 2008).

A realização de osteotomia acima e abaixo do tecido afetado e remoção dos tecidos

moles, com margens adequadas do tumor ósseo é uma das alternativas descritas. O fascículo

neurovascular é posicionado longe do osso afetado, e o tumor extraído e submetido à dose

única direcionada de radiação. O osso então é recolocado, e fixado por haste bloqueada1 (ou

interlocking nail) ou placa de compressão dinâmica. A vantagem dessa técnica é a

manutenção da função articular, o maior fator limitante da técnica em outros locais. As

principais complicações relacionadas com a doença são recorrência local do tumor, e infecção

do aloenxerto (GOMES L. et al, 2008).

Recentemente, foi descrita uma técnica que envolve a ressecção e pasteurização da

área neoplásica afetada, pela permanência do enxerto em caixa estéril impermeável em meio

de solução salina pré-aquecida a 65ºC e imersa em água por 40 minutos, a uma temperatura

de 65ºC. Obtém-se então esterilização e morte das células tumorais, propiciando a este

enxerto autólogo um comportamento similar a um enxerto verdadeiro. Com o tratamento

concomitante de cisplatina, foi apresentado nestes casos um período livre de alterações de 56

meses (KLEINER, J.A.; SILVA, E.G, 2008).1 Haste bloqueada ou interlocking nail (IN) são pinos intramedulares com furos transversais posicionados em

distâncias padronizadas, permitindo, através deles, realizar o bloqueio dos movimentos rotacionais e axiais,

por meio de parafusos. O pino de IN é colocado de forma intramedular e os parafusos são fixados proximal e

distalmente à fratura. O uso de IN é biomecanicamente vantajoso em relação às técnicas de imobilização por

placa parafusada, por atuar ao longo do eixo mecânico central do osso, além de preservar os conceitos de

padrões biológicos de osteossíntese (SCHMAEDECKE et al, 2005).

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A utilização de endopróteses de aço cirúrgico 316L é uma variação recente descrita em

cães. As principais vantagens de sua utilização para reconstrução dos defeitos ósseos na

cirurgia de “limb-sparing” incluem pronta disponibilidade do implante sem necessidade de

equipamento especial, ausência de necessidade de banco de ossos ou aparelhos de

radioterapia. Além do mais, as propriedades biomecânicas superiores dos membros

reconstituídos com endoprótese podem diminuir a taxa de falência e a implantação de

material, inerte biologicamente, diminuir a incidência e gravidade da infecção pós-operatória

comumente encontrada nestas cirurgias, evitando-se reações a corpo estranho induzidas por

material alogênico (GOMES L. et al, 2008).

Após estudo clínico prospectivo em 20 cães, não foram observadas diferenças

utilizando aloenxerto cortical ou endoprótese na cirurgia conservadora, embora a cirurgia de

reconstrução com prótese seja menos complicada. A função do membro foi considerada de

boa a excelente em 75% dos cães, taxa de infecção foi de 55%, de recorrência local de 15% e

a falência da construção ocorreu em 40%, e não houve diferenças entre os grupos (GOMES L.

et al, 2008).

O transporte ósseo segmentar, técnica que consiste em corticotomia proximal ou distal

para liberar fragmento ósseo viável que será conduzido por tração lenta, é alternativa a ser

Figura 2. Técnica de limb-sparing em cão. A. acesso cirúrgico com incisão dorsolateral no antebraço e dissecção dos

tecidos moles adjacentes. B. incisão da cápsula da articulação rádio-carpal e divulsão de tecidos moles adjacentes ao

radio e ulna. C. ostectomia de fragmento de rádio e ulna com serra manual, após secção da cartilagem da articulação

proximal do carpo. D. aspecto final do procedimento cirúrgico onde observa-se placa metálica fixada ao rádio,

articulação do carpo e terceiro metacarpiano. Realizada a artrodese da articulação do carpo (ZILIOTTO, et al, 2003).

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aplicada após a ressecção tumoral e tem apresentado sucesso na preservação do membro de

casos selecionados. Técnicas de transporte ósseo eliminam a necessidade de aloenxerto

cortical, reduzindo a incidência de infecção e eliminando preocupações sobre a falha do

enxerto. No entanto, os cuidados posteriores com o fixador circular e a tração contrária

constante são intensos e requerem dedicação dos proprietários e numerosas reavaliações para

se obter sucesso (GOMES L. et al, 2008).

2.6.3.2.1. Pós-Operatório

O cuidado pós-operatório depois de poupar o membro compreende um sistema

fechado de drenagem por sucção (se utilizado) e remoção do dreno quando a drenagem ceder

(em geral um dia após a cirurgia). O membro deverá ser apoiado com bandagem acolchoada

para controle do edema pós-operatório. A incisão deve ser protegida contra a automutilação

Figura 3. Uso de interlocking nail na correção de fratura em fêmur de felino. A. imagem radiográfica de

fratura cominutiva bilateral B. e C. redução das fraturas e colocação de enxerto cortical alógeno conservado em

glicerina 98%. D. Imagem radiográfica pós-operatória onde se visualiza a redução da fratura, presença de pino

intramedular e enxerto ósseo extra-medular (GIORDANO, ALMEIDA, 2006).

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com bandagens e/ou colar elizabetano. Recomenda-se a diminuição do exercício por 3 a 4

semanas, entretanto, exercício controlado ou fisioterapia podem ser necessários para evitar

contratura de flexura dos dedos (FOSSUM, 2002). A maioria dos cães utiliza o membro

relativamente bem após 10 dias do pós-operatório. O edema pós-operatório pode ser

considerável, no entanto, há melhora do mesmo após duas semanas. Apoio de peso precoce irá

frequentemente diminuir a ocorrência e incidência de edema pós-operatório (GOMES L. et al,

2008).

A infecção representa o maior risco após a cirurgia com preservação do membro, por

diversas razões: campo cirúrgico extenso, tempo cirúrgico prolongado, emprego de enxertos

grandes, inclusive aloenxerto não viável, e mínimo revestimento por tecidos moles,

principalmente nos tumores distais dos membros (BERG e STRAW, 1996; GOMES L. et al,

2008).

Pode haver ampla gama de manifestações clínicas associadas à infecção, por exemplo:

claudicação branda a grave, drenagem purulenta pela incisão ou trajetos fistulosos, e

lambedura persistente no local da cirurgia. Radiograficamente, pode haver reação periostal

extensa sobre o osso do hospedeiro, e reabsorção completa ou parcial do aloenxerto. Quando

há suspeita de infecção, o líquido em torno do local do aloenxerto deverá ser aspirado por

técnica cirúrgica e submetido à cultura aeróbica e anaeróbica e a testes de sensibilidade aos

antibióticos. As infecções graves poderão exigir cirurgia, para a remoção do material

purulento e necrosado, e para que seja permitida a drenagem. Poderá haver necessidade de

amputação, caso as medidas mais conservadoras fracassem (BERG e STRAW, 1996).

2.7. Prognóstico

Cães com idade inferior a quatro anos apresentam grau de malignidade, escore e índice

mitótico mais elevados que os mais velhos. O osteossarcoma apendicular difere do axial

apresentando alto índice mitótico. Animais tratados somente com amputação apresentam um

período de sobrevida médio de 5 meses, com 10% tendo um ano de sobrevida. Cães tratados

com amputação e cisplatina apresentam períodos de sobrevida médios de 9 meses e 1 ano em

38% a 43% dos casos (FOSSUM, 2002; GOMES L. et al, 2008).

A sobrevida de cães com lesões metastáticas visíveis é improvável de ser prolongada

com quimioterapia; estes apresentam prognóstico extremamente reservado. Os proprietários

geralmente requisitam eutanásia quando as metástases pulmonares promovem manifestações

clínicas de anorexia, depressão e/ou desconforto respiratório. A metástase em linfonodo

regional é rara em cães com osteossarcoma apendicular, mas tal fator interfere negativamente

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no prognóstico (FOSSUM, 2002; GOMES L. et al, 2008).

Os procedimentos de preservação do membro, em conjunto com o tratamento com

cisplatina, promovem função boa a excelente do membro, em aproximadamente 80% dos

casos. Não há diferença nas taxas de sobrevida entre os procedimentos de preservação do

membro e amputação quando os procedimentos são associados à quimioterapia. As

complicações associadas com preservação do membro incluem recorrência tumoral local

(40%), falha de implante (8%) e infecção de aloenxerto (49%). A infecção pode exigir

remoção de aloenxerto ou amputação (FOSSUM, 2002; GOMES L. et al, 2008).

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3. ENXERTOS ÓSSEOS

3.1. Definição

O termo enxerto implica na transferência de tecido vivo, enquanto que 'implante'

refere-se a material não viável aplicado ao corpo, podendo ser constituído não só de materiais

biológicos, como metal ou cerâmica, além de osso morto. Neste caso, o enxerto age

principalmente como preenchedor de espaço e suporte para o crescimento de osso novo do

hospedeiro (STEVENSON, 1998).

3.2. Indicações

De acordo com Piermattei, os enxertos ósseos são utilizados para promover a

consolidação em uniões retardadas, não uniões, osteotomias e artrodeses das articulações

através da estimulação da formação precoce dos calos em ponte; para unir os defeitos

principais em fraturas multifragmentadas através do estabelecimento da continuidade entre os

fragmentos ósseos e preenchimento dos defeitos, estimulando e promovendo dessa maneira a

formação precoce dos calos em ponte; para repor a perda total de segmentos corticais devido à

fragmentação da fratura ou excisão devido a neoplasias; e para preencher cavidades ou

defeitos parciais da espessura resultantes da excisão de cistos ou neoplasias (PIERMATTEI,

1999).

3.3. Fontes

Os enxertos são originários de quatro fontes:

Auto-enxertos (enxertos autógenos ou autogênicos) são aqueles obtidos do próprio

paciente. Os auto-enxertos possuem potencial osteogênico máximo e resposta mais precoce,

porém sua coleta aumenta o tempo operatório e riscos, e o osso disponível pode não ser

suficiente em quantidade, forma, tamanho ou pode não ser mecanicamente adequado

(PIERMATTEI, 1999).

Sinenxertos (enxertos singênicos) são obtidos entre indivíduos da mesma espécie e

geneticamente idênticos (PARKER, 1996).

Enxertos homógenos (enxertos alogênicos ou aloenxertos) são os obtidos de animais

da mesma espécie. São coletados de animal doador, e podem ser usados tanto a fresco ou

podem ser mantidos em banco ósseo para uso futuro. Possui o mesmo efeito promotor de um

osso autógeno, entretanto, não há osteogênese direta e há retardo inicial de aproximadamente

duas semanas na resposta em comparação ao auto-enxerto. Sua principal vantagem é a

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disponibilidade em quantidade, forma e tamanhos suficientes (PIERMATTEI, 1999).

Xeno-enxertos (enxertos xenogênicos) são obtidos de animais de outras espécies.

Possuem menor potencial osteogênico e apresentam maior probabilidade de causar reação do

tipo corpo estranho (PIERMATTEI, 1999). São pouco utilizados.

3.4. Funções

Os enxertos ósseos servem como fonte de osteogênese e também podem servir como

suporte mecânico. A rápida formação do calo em ponte é importante quando a fragmentação

da fratura cria situação onde o osso não pode sustentar qualquer compartilhamento de peso

com o implante. Sob tais circunstâncias, o calo pode estabilizar suficientemente a fratura para

aliviar o implante de algumas das forças e desta forma minimizar as possibilidades de falência

e frouxidão prematuras do implante. Quando posicionados em grandes falhas resultantes de

traumatismo ou ressecção de segmentos ósseos neoplásicos, os enxertos corticais podem

servir como estrutura sustentadora de peso ou como apoio que resiste às forças do peso,

poupando, assim, o implante de algumas destas cargas (PIERMATTEI, 1999).

A resposta do enxerto ósseo pode ocorrer de três diferentes modos:

Por osteogênese, onde o novo osso, formado sobre e ao redor do enxerto, pode ser de

origem do próprio enxerto, diretamente dos osteoblastos ou das células osteo-progenitoras que

sobreviveram ao transplante, sendo a sobrevivência das células do enxerto estimada em no

máximo 10% quando se utiliza auto-enxerto esponjoso e quando ele é manuseado sob

condições ótimas (PIERMATTEI, 1999). Células superficiais nos enxertos corticais e

trabeculares podem sobreviver e produzir osso novo. Esse calo inicial é frequentemente fator

crítico na formação do calo durante as primeiras quatro a oito semanas após a cirurgia. O osso

trabecular, com sua área coberta por células de revestimento quiescentes ou por osteoblastos

ativos, tem maior potencial de formação de osso novo de origem do enxerto que o osso

cortical (STEVENSON, 1998); por osteo-indução, na qual o enxerto ósseo funcionará como

fonte de osteogênese através do recrutamento na área de células mesenquimais ou de células

osteo-progenitoras pleuro-potenciais, as quais então diferenciam-se em células de formação

de cartilagem e de osso (PIERMATTEI, 1999). Estas modificações são promovidas por vários

fatores diferentes, incluindo as proteínas morfogênicas do osso (BMP) (GIORDANO,

ALMEIDA, 2006); ou por osteo-condução, processo de crescimento de capilares, tecido

perivascular e células osteo-progenitoras do leito do receptor para a estrutura do enxerto. Os

enxertos agem como suporte para a formação do novo osso, que então passa por vários graus

de reabsorção osteoclástica e substituição progressiva pelo osso hospedeiro (PIERMATTEI,

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1999).

3.5. Coleta

Os enxertos podem ser tanto esponjosos, corticais ou a combinação de ambos –

córtico-esponjosos. Os enxertos esponjosos são geralmente coletados de osso metafisário de

um hospedeiro e utilizados como auto-enxertos a fresco. Os enxertos corticais são mais

frequentemente utilizados como enxertos homógenos congelados, ao passo que os enxertos

córtico-esponjosos podem ser auto-enxertos a fresco ou enxertos homógenos a fresco ou

congelados e são geralmente coletados de costelas ou das porções dorsais das cristas ilíacas

(PIERMATTEI, 1999).

3.5.1 Enxertos de Osso Esponjoso

Os enxertos esponjosos possuem muitas vantagens, tais como a rápida estimulação da

formação óssea direta, osteo-indução precoce, e vascularização precoce. O osso esponjoso

autógeno é o único enxerto ósseo que pode ser aplicado com segurança em áreas

contaminadas. (PIERMATTEI, 1999). No entanto, deve-se lembrar que este enxerto não

proporciona nenhuma sustentação mecânica, não importando o quão densamente envolvam

um defeito cortical. A sua presença pode ser útil na formação de calo e consequentemente na

prevenção da falha do implante, mas eles não podem sustentar o peso ou manter um espaço

(STEVENSON, 1996).

O osso esponjoso pode ser colhido de qualquer metáfise de osso longo; entretanto, é

mais comum o uso do úmero proximal, tíbia e asa ilíaca por serem acessíveis e conterem

grandes quantidades de osso esponjoso. No caso de amostras autógenas, o enxerto é, em geral,

colhido após estabilização de fratura; entretanto, pode ser colhido antes do procedimento

ortopédico primário, se houver a preocupação de que o local doador possa ser contaminado

com células tumorais ou esteja presente infecção no local receptor. De modo alternativo, uma

equipe cirúrgica e instrumentação específicas podem ser utilizadas para colher o enxerto. O

local do enxerto é selecionado em decorrência do fácil acesso quando o animal é posicionado

para reparo de fratura (FOSSUM, 2002).

Segundo Fossum e Piermattei, os enxertos esponjosos devem ser colhidos do tubérculo

lateral do úmero, porção proximomedial da tíbia e porção craniodorsal da asa ilíaca

(PIERMATTEI, 1996; FOSSUM, 2002). As porções proximais do úmero e tíbia são os locais

de coleta mais comumente utilizados. A porção proximal do úmero produz mais osso do que a

tíbia, e o osso esponjoso é restaurado de maneira mais completa do que na tíbia, onde o tecido

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fibroso preenche o local de retirada do enxerto. O hematoma pós-operatório não é incomum

no local doador, porém pode ser minimizado pelo fechamento cuidadoso da região

(PIERMATTEI, 1996). De modo geral, o procedimento é o mesmo, havendo apenas

diferenças de acesso.

A área selecionada é abordada por meio de incisão de 2 a 3 cm na pele. O osso cortical

é aberto com trefina/trépano ou com pino de Steinmann com ponta em trocarte (3/16 a ¼

polegadas; 4,8 a 6,5 mm) (PIERMATTEI, 1999). Um furo redondo é feito através do córtex

para minimizar a formação de um estresse levantador que pode contribuir para a fratura

através do defeito cortical (FOSSUM, 2002).

Após penetração do córtex ósseo, insere-se uma cureta e colhe-se osso esponjoso, que

será colocado diretamente no leito receptor ou armazenado em esponja embebida em sangue

ou copo de aço inoxidável, para mantê-lo úmido. O sangue coagulará formando um composto

moldável com o enxerto, o que facilita o manuseio. Não se deve armazenar enxertos de osso

esponjoso em solução salina nem trata-los com antibióticos, pois isso pode matar as células. O

local da fratura é lavado com solução fisiológica e envolvido, sem compressão, todos os

defeitos e linhas de fratura com material de enxerto. Fecha-se os tecidos subcutâneos ao redor

do enxerto para mantê-los em posição. Os tecidos subcutâneos e a pele do local do enxerto

são suturados de maneira rotineira (FOSSUM, 2002).

No úmero proximal prepara-se o local do enxerto para a cirurgia asséptica. É feita

abordagem craniolateral ao úmero proximal, incisando-se através da pele e tecidos

subcutâneos. Retrai-se a cabeça acromial do músculo deltoide em sentido caudal e expõe-se a

face chata da metáfise cranio-lateral, exatamente distal ao tubérculo maior. É feito um furo

redondo no córtex ósseo, utilizando-se um pino intra-medular ou ponta de trépano (FOSSUM,

2002).

Quando na tíbia proximal, é feita incisão cutânea sobre a superfície medial da tíbia

proximal. A seguir, incisam-se os tecidos subcutâneos e colhido o osso esponjoso (FOSSUM,

2002).

Finalmente, o procedimento em asa ilíaca consiste em incisão cutânea sobre a espinha

ilíaca craniodorsal. Incisam-se os tecidos subcutâneos e expõe-se a superfície dorsal da asa

ilíaca. A musculatura glútea é elevada desde a superfície lateral e colhe-se osso esponjoso,

conforme descrito anteriormente. De modo alternativo, obtém-se enxerto de osso esponjoso

utilizando-se uma rugina para remover uma cunha cortical da asa ilíaca. A cunha é macerada

com a rugina e colocada no local receptor (FOSSUM, 2002).

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Há poucas complicações associadas às técnicas de enxerto autógeno de osso

esponjoso. É raro que a dor no local doador seja evidente clinicamente. A formação de seroma

ou deiscência na ferida podem ocorrer nos locais doadores. A infecção ou a disseminação de

tumor nos locais doadores ocorrem raramente e podem ser prevenidos pela sequência

adequada de coleta de enxerto ósseo. Têm sido descritas com pouca frequência as fraturas

através do local doador. São difíceis de reconhecer complicações no local receptor (falha nos

enxertos para estimular a formação óssea) (FOSSUM, 2002).

3.5.2. Aloenxertos de Osso Cortical

Com o advento de técnicas biológicas de reparo de fraturas, os aloenxertos de osso

cortical atualmente têm uso mais comum nos procedimentos para poupar o membro que no

reparo de fraturas. Os princípios do uso dos aloenxertos de osso cortical são semelhantes,

independentemente da finalidade a que se destinam (FOSSUM, 2002). A invasão de

vascularização e osteo-condução ocorrem de maneira bem mais lenta em enxertos corticais,

porém estes enxertos possuem a vantagem de promover estabilidade imediata à área

(PIERMATTEI, 1999). O osso cortical também pode funcionar como uma fonte de

osteogênese por ser osteo-indutivo. Essa atividade encontra-se presente não somente nos auto-

enxertos corticais frescos como também nos aloimplantes preservados de maneira que não se

destruam os fatores osteo-indutivos. Demonstrou-se uma atividade osteo-indutiva em

Figura 4. Procedimentos de obtenção de osso esponjoso. Na primeira imagem observa-se o acesso (A)

e coleta com cureta (B) de amostra umeral, seguida de armazenamento a curto prazo em copo de aço

inoxidável (C) e uso do enxerto ao longo da linha de fratura óssea. Na segunda imagem, obtenção de

amostra da asa ilíaca: o acesso é feito usando-se osteótomo, seguido de coleta com cureta e uso de rugina

para fragmentação do fragmento retirado, que também poderá ser usado como enxerto (FOSSUM, 2002).

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aloimplantes congelados, resfriados-ressecados e descalcificados; a autoclavagem destrói

definitivamente a atividade osteo-indutiva (STEVENSON, 1996).

Os enxertos corticais diafisários são coletados de todos os ossos longos

(PIERMATTEI, 1999). O osso cortical pode ser colhido e imediatamente transplantado ou

colhido e armazenado para proporcionar uma fonte pronta de aloimplantes corticais. A coleta

deve ser feita sob condições assépticas, a menos que o osso seja esterilizado em seguida

(FOSSUM, 2002).

Para sua colheita, é feita a eutanásia do animal doador e prepara-se o fémur, tíbia e/ou

úmero para a cirurgia asséptica. São feitas abordagens cirúrgicas para as diáfises ósseas,

levanta-se os tecidos moles e isolados os ossos. Usa-se um serrote oscilante para ossos para

ressecar as diáfises. O enxerto é cortado em um comprimento adequado, de maneira

perpendicular a seu eixo longo, a fim de permitir um contato de 360 graus do enxerto com o

osso hospedeiro. Em seguida, os canais medulares são limpos e lavados com jatos de solução

salina. Imediatamente, transplanta-se os ossos para o local da fratura ou são armazenados para

uso futuro. Para armazenamento, os ossos são embalados duas vezes e pré-esteriliza-se o

recipiente. O armazenamento é feito à temperatura de 0ºC por 6 a 12 meses (FOSSUM,

2002).

3.5.3. Enxertos Autógenos Córtico-Esponjosos

Os enxertos autógenos corticais são colhidos de áreas onde o osso cortical pode ser

removido sem afetar de modo adverso a função (costelas, asa ilíaca, ulna distal e fíbula). O

uso mais comum de um enxerto autógeno de osso cortical é o transplante de uma costela para

formar um suporte segmentar para fraturas mandibulares. A coleta de enxerto autógeno de

osso cortical é feita durante reparo de fratura, e o enxerto é incorporado ao local da fratura

como um enxerto segmentar (ele é colocado entre os segmentos da fratura) ou como um

enxerto deslizante (colocado sobre o local da fratura). Os enxertos autógenos são geralmente

mantidos em posição com o mesmo implante utilizado para estabilizar a fratura (FOSSUM,

2002).

Para sua colheita, realiza-se incisão direta sobre a costela escolhida através da pele e

do músculo. O periósteo é incisado e elevado cuidadosamente para evitar a abertura da

cavidade pleural, e a costela é retirada seccionando-se as duas extremidades, devendo ser

limpas de todos os tecidos moles e armazenadas em tubo de ensaio esterilizado ou recipiente

semelhante (PIERMATTEI, 1999).

A espinha ilíaca também é diretamente abordada por meio de incisão dorsal da pele e

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músculos. Não é necessário elevar-se o periósteo, e quantidade adequada de osso é retirada

com osteótomo ou serra óssea. O enxerto pode tanto ser justamente lateral à cortical ou um

segmento de espessura total da espinha/crista ilíaca contendo ambas as corticais

(PIERMATTEI, 1999).

3.6. Implante e Transplante

3.6.1. Enxertos de Osso Esponjoso

Este enxerto é utilizado imediatamente após a sua coleta através do envolvimento dos

fragmentos dentro da área desejada e compressão cuidadosa do material. Qualquer enxerto

deixado após o envolvimento dentro do defeito pode ser distribuído ao redor da superfície do

defeito e osso adjacente. O local do enxerto deve ser limpo de fragmentos teciduais e

coágulos sanguíneos antes da inserção do enxerto. Deve-se evitar a irrigação do enxerto antes

do fechamento dos tecidos moles, que deve ser imediatamente realizado. Os segmentos ósseos

são estabilizados por meio de placas compressivas, e os enxertos são posicionados ao redor do

local da fratura entre o periósteo elevado e a cortical (PIERMATTEI, 1999).

3.6.2. Aloenxertos de Osso Cortical

Apesar dos muitos possíveis usos para este enxerto, como a correção de fraturas,

cominutivas ou não, com ou sem ausência de segmentos ósseos, e correção e reconstrução de

certas não-uniões de fraturas, tais enxertos são atualmente utilizados principalmente para

cirurgias conservadoras dos membros portadores de neoplasias ósseas (PIERMATTEI, 1999).

O procedimento geralmente consiste em ajustar as extremidades dos segmentos de

osso viável, fixando o tamanho e comprimento adequados do enxerto homólogo cilíndrico

diafisário ao centro da placa, e imobilizando-os sob pressão em ambas as extremidades

utilizando-se placa compressiva (PIERMATTEI, 1999). Para o transplante, o paciente é

posicionado em decúbito lateral. Após a abordagem da fratura, é feita a remoção dos

fragmentos e ressecados os segmentos ósseos em sentidos próximal e distal ao osso não-

lesado. Usa-se um serrote oscilante apropriado para cortar os ossos perpendiculares a seus

eixos longos. Determina-se então o comprimento e número apropriado de parafusos para osso

cortical para o comprimento do enxerto e é fixado ao centro da placa pré-contornada. Coloca-

se o composto enxerto-placa na fenda da fratura e são reduzidos os segmentos ósseos até a

placa. Esta é fixada nos segmentos de osso hospedeiro, utilizando parafusos para osso

cortical. Para obter compressão das interfaces hospedeiro-enxerto, são inseridos no osso

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hospedeiro parafusos imediatamente proximais e distais ao enxerto, de maneira resistente. Os

parafusos restantes são inseridos em posição neutra. A fratura é lavada com jatos de solução

salina. A fixação com placa de parafuso é necessária para assegurar a estabilidade da interface

hospedeiro-enxerto por períodos de tempo prolongados, enquanto as fraturas cicatrizam e os

enxertos se remodelam. Portanto, o osso hospedeiro deve estar presente, permitindo a

colocação de quatro parafusos ósseos proximais e três parafusos ósseos distais aos enxertos

(FOSSUM, 2002). Pode haver vantagens na perfuração de pequenos orifícios no enxerto para

estimular a vascularização do canal medular (PIERMATTEI, 1999). Em seguida, é colhido

um enxerto autógeno de osso esponjoso e este é colocado nas interfaces hospedeiro-enxerto.

Obtém-se amostras para cultura microbiológica e fecha-se a pele e tecidos subcutâneos de

maneira rotineira. O posicionamento do aloenxerto e do implante do metal com radiografias

pós-operatórias deve ser documentado. São utilizadas radiografias do osso contralateral

equivalente para determinar o tamanho e o comprimento do enxerto, e servir como modelo

para pré-contornar as placas. O comprimento necessário do enxerto é determinado medindo-

se os comprimentos dos segmentos íntegros do osso fraturado, em radiografia lateral, e

subtraindo essa medida do comprimento do osso contralateral (FOSSUM, 2002).

A cicatrização da fratura com aloenxertos ou aloimplantes consiste em preencher as

interfaces hospedeiro-enxerto com osso, seguido de vascularização e substituição do enxerto

por osso hospedeiro. As interfaces hospedeiro-enxerto cicatrizam em l a 3 meses. A

remodelagem do enxerto leva meses a anos (dependendo da extensão do enxerto) e pode

nunca ser completada. O processo de remodelagem pode ser monitorado por radiografias. As

interfaces hospedeiro-enxerto inicialmente se preenchem com osso hospedeiro. Como a

reabsorção e remodelagem procedem das interface hospedeiro-enxerto em direção ao centro

do enxerto, os enxertos mudam de estruturas corticais a osso esponjoso e poroso. É muitas

vezes difícil de determinar quando deverá ser feita a remoção de uma placa, com base nas

aparências radiográficas, pois a quantidade de enxerto remodelada pode ser difícil de ser

averiguada. Como a remoção prematura da placa pode predispor os enxertos à fratura, a

remoção da placa não deve ser feita antes de se observar a evidência radiográfica definitiva da

remodelagem de todo o enxerto. Em geral, salvo em caso de complicações, não se recomenda

a remoção da placa (FOSSUM, 2002).

As complicações associadas aos aloenxertos corticais são infecção, rejeição de

enxerto, falha no reparo da fratura e fratura do enxerto. A infecção do enxerto em geral resulta

de contaminação deste e do local da fratura com instabilidade. Isso resulta em sequestro de

grande fragmento de material estranho que deve ser debridado ao se proceder a estabilização

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da fratura. Os aloenxertos de osso esponjoso podem ser utilizados para preencher as fendas de

fratura resultantes. As manifestações de rejeição do enxerto (falha do osso hospedeiro e do

enxerto em se consolidar, reabsorção do enxerto sem reposição) raramente são observadas

clinicamente. A fratura da placa pode ser observada quando a redução e a fixação das

interfaces hospedeiro-enxerto resultam em reconstrução inadequada da coluna óssea. Os

enxertos também podem se fraturar após a remoção da placa (FOSSUM, 2002).

Funcionalmente, a maioria dos animais responde da mesma maneira que o paciente

com fraturas múltiplas ou segmentares medianas estabilizadas por placa óssea. A reposição

dos enxertos homólogos pelo osso do hospedeiro é lenta e incompleta, com áreas de enxerto

morto ainda presentes após 8 anos em um paciente. O novo osso depositado na superfície do

enxerto cria união clínica e as placas podem ser removidas, caso indicado, após 18 a 25 meses

(PIERMATTEI, 1999).

Figura 5. Estabilização e incorporação de enxerto esponjoso autógeno e aloenxerto cortical A. incisão e

remoção de fragmentos ósseos para estabilização com aloenxerto cortical por uso de placa pré-contornada, fixada

e comprimida com parafusos acima e abaixo das interfaces e osso esponjoso autógeno. B. fases de incorporação

óssea: em a. interface hospedeiro-enxerto é estabilizada, em b. é preenchida por osso fibroso, enquanto as

unidades de remodelagem óssea se tornam ativas. Em c. enxerto vascularizado e parcialmente reabsorvido, sendo

substituído por osso hospedeiro (FOSSUM, 2002).

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3.6.2.1.Enxertos Incrustados

Este enxerto é mais frequentemente um osso cortical utilizado como suporte/apoio

para substituir porções da cortical que estão faltando no lado oposto da compressão exercida

pela placa óssea. Em muitos casos o seu uso é intercambiável com os enxertos tubulares. O

enxerto deve ser seguramente estabilizado, preferivelmente por parafusos ósseos posicionados

através das placas (PIERMATTEI, 1999).

3.6.3. Enxertos Autógenos Córtico-Esponjosos

Esse tipo de enxerto é geralmente preparado de osso homógeno de costela estocado.

Os fragmentos ósseos de 2 a 5 mm de diâmetro são utilizados de maneira idêntica ao osso

esponjoso puro, e são úteis para aumentar o volume dos enxertos sobre aqueles disponíveis de

ossos esponjosos autógenos puros, ou quando o local de um doador autógeno não foi

preparado. Estes fragmentos são criados pelo uso de cizalha para retirar pequenos fragmentos

ósseos (PIERMATTEI, 1999).

3.7. Pós-Operatório

As alterações inflamatórias, que ocorrem após uma implantação de um enxerto

cortical, não diferem significativamente das observadas após uma colocação de um osso

esponjoso. No entanto, a taxa de revascularização dos enxertos corticais é acentuadamente

mais lenta que a dos enxertos esponjosos. Pode-se atribuir esse retardo de revascularização à

estrutura do osso cortical: a penetração vascular do transplante é primariamente o resultado de

uma reabsorção osteoclástíca periférica e uma infiltração vascular dos canais de Volkmann e

de Havers (STEVENSON, 1996).

A primeira fase após a implantação de um enxerto é a inflamação. As alterações

inflamatórias ocorrem dentro de minutos a horas após o procedimento cirúrgico e

caracterizam-se pelo aporte de líquido e células, inicialmente neutrófílos, seguidos por células

mononucleares, linfócitos, plasmócitos e fagócitos, que "limpam" o enxerto e leito recipiente

de bactérias e restos celulares e teciduais (STEVENSON, 1996; WEIGEL, 1996). Com o

prosseguimento desta fase até sua conclusão, a fase reparativa tem início com o surgimento de

tecido de granulação, a partir do qual ocorrerá a vascularização do enxerto (WEIGEL, 1996).

A velocidade de reparo ou de incorporação de um enxerto ósseo depende da

velocidade da vascularização, sendo por esta determinada. Os fatores que afetam a

vascularização são o tipo de enxerto, a natureza do leito recipiente, e a estabilidade do enxerto

e tecido circunjacente (WEIGEL, 1996). A revascularização dos enxertos de osso esponjoso

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começa com apenas dois dias após a colocação destes, sendo geralmente concluído em duas

semanas (FOSSUM, 2002). Os vasos do hospedeiro, os osteoblastos e os precursores de

osteoblastos podem se infiltrar facilmente no enxerto a partir da periferia em direção ao

centro. À medida que a invasão vascular do enxerto prossegue, as células mesenquimais

primitivas se diferenciam em células osteogênicas (STEVENSON, 1996). As células

osteogênicas transplantadas ou mesenquimais tornam-se osteoblastos ativos, que secretam

osteóides no osso trabecular transplantado. Esse osteóide é mineralizado e forma novo osso

hospedeiro em locais de fraturas. Esse novo osso também incorpora o enxerto no osso

hospedeiro. Algumas vezes, os núcleos necróticos do osso trabecular são reabsorvidos por

osteoclastos e os enxertos são totalmente substituídos por osso hospedeiro. O novo osso

trabecular é remodelado no osso cortical em resposta ao ambiente mecânico. Essa resposta de

cicatrização pode ser monitorada por radiografias, observando-se o preenchimento do defeito

com osso esponjoso, seguido de reconstrução cortical (ocorre um aumento inicial na

radiodensidade do osso transplantado, seguido por uma redução na densidade e uma mistura

com o osso do hospedeiro adjacente) (STEVENSON, 1996; FOSSUM, 2002). No local

doador observa-se inicialmente hematoma, que será substituído com tecido conjuntivo

fibroso. Os osteoblastos migram para a área e depositam osteóide. Ocorre a mineralização

sendo formado novo osso trabecular dentro dos defeitos. Esse processo leva aproximadamente

12 semanas; o osso esponjoso adicional não deve ser colhido da mesma área antes desse

período (FOSSUM, 2002).

Na fase final de incorporação o material enxertado não-viável e não-reabsorvido

permanece e funciona de maneira mecânica, de sustentação do peso e de transmissão de

estresse. Esta fase é predominantemente uma característica de enxertos e implantes corticais.

Podem permanecer quantidades significativas de osso enxertado necrótico por anos após o

transplante. Como a matriz de osso morto é tão forte quanto a matriz de osso vivo, essa

mistura de enxerto necrótico e novos ósteons hospedeiros é tão forte quanto os segmentos de

osso normal. No entanto, o osso necrótico é incapaz de reparar os danos de fadiga que devem

ocorrer (STEVENSON, 1996).

Afetam a incorporação do enxerto a estabilidade de fixação da fratura (os enxertos

podem sobreviver, ser revascularizados e produzirem um novo osso mesmo na presença de

movimento) capaz de, quando instável, retardar a revascularização óssea (STEVENSON,

1996); a saúde do hospedeiro, que afetará diretamente a velocidade e o padrão da

incorporação do enxerto (sem um leito saudável, a osteoindução pode não ser máxima mesmo

quando as células superficiais do próprio enxerto sobreviverem e produzirem um novo osso);

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infecções pós-operatórias, que podem ter repercussão catastrófica após o implante de um osso

cortical, requerindo a remoção do enxerto ou mesmo uma amputação para a resolução do

quadro (STEVENSON, 1996).

Podem reduzir a resposta do leito hospedeiro a necrose, relativa avascularização e

fibrose dos tecidos moles adjacentes. Tratamentos anteriores, como radioterapia ou

quimioterapia, também podem afetar a incorporação do enxerto (STEVENSON, 1996).

3.8. Imunogenicidade

Todo o aloenxerto não é igualmente antigênico: o colágeno é fracamente antigênico, e

são os componentes celulares do aloenxerto que estimulam a reação. Osteócitos, condrócitos,

osteoblastos e células medulares são a principal fonte de antigenicidade, devido aos antígenos

do transplante em suas superfícies celulares. Este fenômeno é prontamente demonstrado pela

comparação das reações promovidas por aloenxertos a fresco isentos de medula e enxertos

contendo medula, e pela observação de que o enxerto com o componente celular mais

abundante promove reação maior (WEIGEL, 1996).

Aparentemente, a imunidade celular-mediada é o principal modo de reação nos

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Figura 6. Aspecto radiográfico da incorporação após a implantação do segmento ósseo cortical conservado

em mel utilizado em cão. a. pós-operatório imediato; b. após 45 dias de pós-operatório; c. após 150 dias de pós-

operatório; d. vista crânio-caudal após a remoção da placa (270 dias); e. vista médio-lateral após a remoção da

placa (270 dias) (ALIEVI, et al, 2007).

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procedimentos de aloenxerto ósseo, visto que a célula predominante na reação é o linfócito,

que surge primeiramente 2 semanas após o transplante, estando presente por cerca de 2 meses.

O grau de reação varia desde a rejeição completa até à incorporação retardada. Em muitos

casos clínicos, a lenta consolidação e incorporação dos aloenxertos corticais se devem aos

efeitos que a reação imune exerce sobre a velocidade de revascularização. Células vivas

intactas são geralmente necessárias para a promoção da reação (WEIGEL, 1996).

Visto que os osteócitos, condrócitos e células medulares exibem antígenos da

histocompatibilidade, a adequação da histocompatibilidade deverá reduzir ou eliminar o

potencial para a reação imune. De fato, a incorporação de enxertos alogênicos congelados em

cães foi favorecida por tal adequação (WEIGEL, 1996).

Os métodos de preservação dos aloenxertos podem influenciar o grau de reação

imune. O congelamento do enxerto reduz a reação, embora aloenxertos congelados ainda

possam promovê-la. Células lesionadas pela radiação e que são incapazes de se dividirem

ainda podem promover reação imune. A liofilização é associada à menor reação que o

congelamento simples, supondo-se que este processo altere os antígenos da

histocompatibilidade presentes na superfície das células. Mas, experimentalmente, certos

antígenos da histocompatibilidade liofilizados são ainda imunogênicos. O congelamento ou a

liofilização do osso reduz a gravidade da reação, mas não elimina toda a imunogenicidade

(WEIGEL, 1996).

Outros processos como a remoção física e química de todas as células, restos celulares,

gordura, proteína e água tornam os enxertos xenogênicos quase inertes imunologicamente.

Embora estes enxertos processados virtualmente não promovam reação imune, eles também

não possuem a propriedade osteoindutiva. A osteocondução pode ser favorecida pela

combinação do enxerto xenogênico e a medula do hospedeiro. Enxertos fervidos,

autoclavados e tratados por mertiolate também não possuem propriedades indutivas, e a

osteocondução é lenta. Presentemente, o osso xenogênico não é empregado com frequência,

pois a atual ênfase está aplicada à promoção da osteocondução, com o emprego de enxertos

sistêmicos (WEIGEL, 1996).

A desmineralização (descalcificação) e a liofilização do osso alogênico reduzem

significativamente a imunogenicidade, enquanto que retêm a capacidade osteoindutiva. Estes

enxertos não propiciam qualquer estabilidade mecânica, e a resposta osteogênica a tais

enxertos varia. Para a obtenção de resposta ótima, os enxertos descalcificados devem ser

aplicados num leito do hospedeiro com irrigação vascular rica e com células precursoras

viáveis (WEIGEL, 1996).

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Muitas destas técnicas de preservação resultam em perda significativa de água pela

matriz óssea. Isto compromete a integridade mecânica do enxerto ósseo: tais enxertos

preservados são quebradiços e mais suscetíveis à microfratura e à ruptura (WEIGEL, 1996).

Para a preservação da resistência mecânica e capacidade osteocondutiva e para a

aceleração da osteocondução, foram estudadas terapias imunossupressivas. Estudos a longo

prazo, comparando enxertos imunossuprimidos com enxertos não imunossuprimidos,

revelaram que os enxertos imunossuprimidos tiveram melhor desempenho, porém ainda não

tanto quanto os enxertos autógenos. Azatioprina e ciclosporina A favorecem a incorporação

dos enxertos alogênicos, mas tais agentes devem ser empregados com cuidado, devido aos

efeitos colaterais dos agentes ou medicamentos imunossupressivos. O pré-tratamento com

soro antilinfocitário também promove a aceitação dos aloenxertos frescos (WEIGEL, 1996).

3.9. Estabelecimento de Banco de Ossos

Os aloenxertos corticais têm sido tradicionalmente utilizados na reconstrução, em

especial do rádio, após a ressecção tumoral. Um pré-requisito para a cirurgia, portanto é o

banco de aloenxosertos ósseos corticais congelados e esterilizados (DALECK et al, 2002;

GOMES L. et al, 2008).

Os objetivos de qualquer técnica de armazenamento de ossos envolvem a preservação

da integridade física do implante e da proteína indutiva, através da redução da sua

imunogenicidade, e da preservação de sua esterilidade. Auto-enxertos frescos são o "padrão

áureo" pelo qual os materiais alternativos para enxerto devem ser medidos; mas, devido às

limitações na quantidade, dimensões ou forma dos auto-enxertos, os aloenxertos podem

propiciar complementos alternativos ao esqueleto (PARKER, 1996).

Há necessidade de instalações cirúrgicas apropriadas à realização de cirurgia asséptica

meticulosa. Todos os aspectos da seleção do doador, busca, processamento, armazenamento,

controle de qualidade, distribuição e manutenção de registro devem ser acompanhados por

protocolo escrito. Deverão ser registradas informações não somente sobre o doador

(identificação, histórico, causa de morte, etc.), como também sobre cada implante:

(informações sobre o receptor, cirurgião responsável, reações adversas ou complicações

cirúrgicas relacionadas ao enxerto, etc.) (PARKER, 1996).

3.9.1. Seleção do Doador

Dependendo do tipo de coleta e armazenamento empregado, certos critérios do doador

deverão ser mais restritivos que outros. Ao empregar aloenxertos a fresco ou enxertos que

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tenham que ser coletados assepticamente antes do armazenamento no banco, a seleção do

doador é consideração mais importante que os enxertos secundariamente esterilizados

subsequentemente à coleta isenta de contaminação (PARKER, 1996).

Segundo Robert Parker, é fator determinante na seleção de doadores a ausência de

indicação de infecção pelo histórico ou exame físico, sendo uma consideração fundamental a

exclusão de todo doador potencialmente infeccioso antes da busca e do implante. É cabível o

bom exame físico, acompanhado de revisão de qualquer história clínica pertinente. Febre, ou

história de moléstia hospitalar febril, poderá desqualificar o doador. Além disso, a idade torna-

se também fator importante, uma vez que os enxertos devem ser biomecanicamente

apropriados para a sua aplicação pretendida. Prefere-se empregar doadores caninos na faixa

de l a 5 anos de idade, sendo particularmente importante que o doador seja esqueleticamente

maturo, quando se coleta o aloenxerto maciço que possa envolver a metáfise, visto que estes

ossos não devem apresentar placas de crescimento abertas, que poderiam deslizar durante o

processo de incorporação. É mais difícil o estabelecimento objetivo do limite etário superior,

mas o envelhecimento é acompanhado por osteopenía fisiológica (PARKER, 1996).

3.9.2. Aquisição de Tecidos

A decisão inicial concernente à aquisição dos tecidos envolve o procedimento de

coleta asséptica ou estéril. Quase todos os relatos clínicos veterinários praticam coletas

assépticas, porém a coleta asséptica seguida de esterilização secundária pode ser técnica muito

conveniente e exequível na prática clínica veterinária. Embora não determinada, é preferível a

coleta de tecidos tão logo quanto possível, ou dentro de 12 horas. Certos bancos coletam em

até 24 horas após a morte, se o corpo tiver sido refrigerado (PARKER, 1996).

3.9.2.1. Coleta Estéril

Ao empregar a coleta estéril, é fundamental a prática de técnica meticulosa. Os

membros são tricotomizados, suspensos, preparados e recebem panos de campo pela técnica

rotineira para qualquer procedimento ortopédico. O tecido deve ser coletado em sala

cirúrgica, por meio de técnica cirúrgica. São efetuadas as abordagens de rotina aos ossos

longos. Caso se planeje o armazenamento de aloimplantes intercalares diafisários num banco,

a principal parte da diáfise será removida após a osteotomia ao nível das metáfises. Se é

antecipada a reposição osteoarticular ou metafisária para os procedimentos de salvamento do

membro, as extremidades ósseas e a cartilagem articular são cuidadosamente dissecadas e

desarticuladas das estruturas articulares de sustentação. O tecido mole nos pontos antecipados

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de reinserção deverá ser preservado. Os tecidos moles remanescentes e o periósteo são

removidos (por corte) com elevador de periósteo e bisturi. O conteúdo medular é removido

com o auxílio de curetas (PARKER, 1996).

Após a coleta, "limpeza" e dessecamento do enxerto, são obtidas culturas aeróbias e

anaeróbias. Os enxertos são envoltos em malha dupla e colocados em sacos duplos de

polietileno espesso esterilizados a gás. O material de embalagem impermeável impede a

contaminação por líquidos externos, auxiliando a retardar a evaporação da água, o que poderia

levar ao dessecamento dos tecidos e à perda da resistência biomecânica. O tecido é rotulado e

radiografado antes do congelamento final (PARKER, 1996).

Quando o objetivo é a manutenção da viabilidade dos condrócitos por meio de

enxertos osteoarticulares, a cartilagem articular é exposta a glicerol a 10% durante 15 a 30

minutos, e em seguida refrigerada a 4°C por até 18 horas, para que ocorra a penetração do

crioprotetor. Outra técnica de refrigeração após a exposição ao glicerol é o envolvimento do

enxerto numa malha dobrada, e após o processamento e embalagem final, sua colocação

imediata num congelador a -80°C. Este isolamento extra permite o congelamento mais

controlado; dimetil-sulfóxido (DMSO) também foi defendido como protetor de condrócitos

(PARKER, 1996).

O osso tem sido armazenado, refrigerado ou congelado de -5°C a -20°C em

congeladores mecânicos do tipo residencial; contudo, sob tais temperaturas as enzimas

teciduais ainda estão ativas e eventualmente diminuem as propriedades biomecânicas e

terminam por destruir o tecido. À temperaturas superiores a -28°C, a evaporação da água

poderá levar ao aumento dos cristais de gelo, o que poderá resultar em lesão estrutural. O

congelamento entre -70ºC e -80°C resulta em mínima destruição enzimática dos tecidos,

tendo sido verificado que a colagenase fica inativada. Os aloenxertos ósseos frescos são

extremamente antigênicos, mas foi demonstrado que o congelamento num estado asséptico

reduz efetivamente a imunogenicidade. O congelamento do osso reduz sua resistência tênsil e

compressiva em cerca de 10% para cada um destes fatores. Estes decréscimos provavelmente

não são clinicamente importantes na maioria das aplicações, porque as resistências tênseis e

compressivas dos enxertos diminuem em aproximadamente 50% in vivo, durante a

incorporação (PARKER, 1996).

Em sua maioria, os bancos de ossos encorajam o descarte dos aloenxertos após um ano

de armazenamento. O descarte dos enxertos antes de um ano pode ser levado em consideração

em casos de enxertos armazenados a -20ºC. Embora o congelamento a -70°C tenha vantagens

potenciais sobre o congelamento a -20°C obtido nos congeladores do tipo residencial, há

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muitos relatos bem-sucedidos com esta última técnica, mesmo com enxertos mantidos por até

3 anos. Para os propósitos do controle de qualidade, 5% das amostras são recultivadas a cada

6 meses (PARKER, 1996).

Após ter sido selecionado o aloenxerto apropriado, este é primeiramente cultivado e

em seguida descongelado em solução salina aquecida, à qual pode ser acrescentada

polimixina ou bacitracina. O encaixe e contornamento cuidadosos são medidas necessárias

para que seja obtida estabilização rígida e nível elevado de contato entre o hospedeiro e local

da osteotomia. Culturas da ferida serão obtidas por ocasião da sua oclusão; serão

administrados antibióticos profiláticos até que sejam conhecidos os resultados finais da

cultura. Se os resultados forem negativos, os antibióticos serão suspensos; se os resultados

forem positivos, os antibióticos terão continuidade durante um mês (PARKER, 1996).

3.9.2.2. Coleta Asséptica

Um método menos meticuloso de coleta óssea é a coleta asséptica acompanhada da

esterilização secundária do enxerto. Visto que o osso é esterilizado secundariamente, não são

tão críticas a seleção estrita do doador, e a coleta asséptica. Além disto, há eficiente utilização

de doadores, há disponibilidade imediata de ossos e o custo é menor que o da coleta estéril

(PARKER, 1996).

Para a coleta, podem ser empregados animais obtidos de fontes aleatórias, não

submetidos a testes. Após a remoção, os ossos são desnudados de seus tecidos moles e

periósteo. A região metafisária de cada osso é removida, e o canal medular das partes

diafisárias remanescentes é lavado com escova e água corrente. O osso é dessecado durante

12 a 24 horas, radiografado e embalado num tubo de polietileno (PARKER, 1996).

3.9.2.2.1. Métodos Disponíveis de Esterilização

3.9.2.2.1.1. Autoclavagem

O processo utiliza 127ºC de temperatura durante 15 minutos. Embora este método

remova a maior parte da imunogenicidade, provavelmente a autoclavagem, com o propósito

de esterilização leva à coagulação sangüínea e desnaturação das proteínas nos canais de

Harvers e desnaturação do colágeno ósseo. Então enquanto a coagulação impede a

revascularização, a desnaturação da matriz impede o processo normal de reparo, sendo

preciso reconhecer que é desvantajoso aos enxertos fervidos ou autoclavados não

conservarem a osteoindução. Além disso, a consolidação óssea é lenta quando comparada

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com os outros métodos de conservação (GIORDANO, ALMEIDA, 2006).

3.9.2.2.1.2. Aloimplantes Cozidos e Desproteinizados

Embora esses métodos removam a maior parte da imunogenicidade dos aloimplantes,

eles também removem a capacidade de osteoindução. O osso tratado é resistente à

revascularização e remodelagem pelo hospeiro. Embora provavelmente não seja antigênico, o

auto-implante sofre revascularização e remodelagem demasiadamente lentas, dependendo da

estabilidade absoluta durante o período muito mais longo que a fratura recente de rotina.

Devido a estas observações experimentais, bem como aos resultados clínicos extremamente

insatisfatórios, estes métodos de preservação são raramente utilizados (STEVENSON, 1998).

3.9.2.2.1.3. Esterilização Química

São esterilizantes químicos o mertiolate, beta-propriolactona, e óxido de etileno (OE).

O emprego de OE a 84%, à temperatura e pressão ambientes, durante 12 horas, seguindo-se a

aeração durante 24 horas à temperatura ambiente, protege o osso da desidratação e de

consequências biomecânicas deletérias. Para a redução da natureza quebradiça dos enxertos

tratados por OE, o armazenamento a -20°C foi preferível, em detrimento da temperatura

ambiente (PARKER, 1996).

Os aloenxertos esterilizados pelo óxido de etileno incorporam satisfatoriamente. Não

se sabe como a esterilização pelo óxido de etileno afeta a antigenicidade ou as propriedades

indutivas ósseas no enxerto. Nenhuma célula sobrevive ao processo de esterilização

(STEVENSON, 1998).

3.9.2.2.1.4. Aloimplantes Liofilizados

O custo do equipamento de liofilização limita o emprego desta técnica. Os tecidos são

inicialmente congelados a -76ºC, sendo guardados em um liofilizador comercial. Eles são

submetidos ao vácuo e a temperatura da câmara é gradualmente elevada até 20ºC, com

umidade residual aproximando-se a valores inferiores a 5%. Os tecidos são lacrados em

frascos a vácuo e guardados à temperatura ambiente (PARKER, 1996). O processo de

liofilização não prejudica a incorporação dos implantes, porque o osso autólogo liofilizado

passa por processo de reparação como o osso autólogo a fresco. O uso de aloimplantes

liofílizados, embora melhor sucedido que os aloenxertos a fresco, resulta em número

significativamente mais elevado de não-uniões, em comparação com os auto-enxertos. A

liofilização altera as propriedades mecânicas do osso, resultando em microfraturas e

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fragilidade. Os implantes devem ser cuidadosamente manipulados e protegidos com

dispositivos de fixação interna. As complicações a longo prazo dos aloimplantes liofílizados

são similares às complicações dos aloimplantes congelados: fraturas por fadiga, não-união ou

união retardada do enxerto-hospedeiro e, ocasionalmente, reabsorção completa do implante

(STEVENSON, 1998).

3.9.2.2.1.5. Irradiação Gama

O tecido ósseo é esterilizado por meio de raios gama, eliminando-se os organismos

infecciosos do mesmo. Na esterilização por irradiação gama de enxertos ósseos alogênicos

congelados, dosagens na faixa de 30 à 60 kGy (no SI a unidade de dosagem de radiação

absorvida é o gray; 1 gray = Gy; 1000 gray = 1 kGy) são utilizadas com freqüência (DINGEE,

2005).

3.9.3. Meios de Conservação de Implantes Corticais

Existem vários métodos de conservação de implantes corticais que visam preservar a

integridade física do implante e da proteína osteoindutora, reduzir sua imunogenicidade, e

preservar sua esterilidade (GIORDANO, ALMEIDA, 2006).

3.9.3.1. Osso Descalcificado (Desmineralizado)

Neste método, a matriz óssea é extraída do osso cortical por meio de uma solução de

ácido. O ácido clorídrico 0,6N promove desmineralização eficaz e mantém o potencial

osteoindutor da matriz óssea (GIORDANO, ALMEIDA, 2006). O osso descalcificado pelo

ácido clorídrico preserva sua capacidade osteoindutiva, provavelmente devido à persistência

da proteína morfogênica óssea (STEVENSON, 1998).

A desmineralização da matriz óssea expõe as proteínas osteoindutoras, podendo de

fato ativá-las. Comparações clínicas diretas do sucesso do tratamento usando enxertos

homólogos mineralizados e desmineralizados produzem resultados similares, embora o

padrão do primeiro seja osteocondutor, enquanto o desmineralizado é considerado

osteoindutor (GIORDANO, ALMEIDA, 2006).

Este osso possui pouca resistência e não pode ser utilizado como estrutura de

sustentação do peso. Os relatos sobre sua revascularização e remodelagem são conflitantes.

Embora provavelmente preferível em lugar do cozimento, autoclavagem, desproteinização, e

preservação em mertiolate, a descalcificação como meio de preservação do implante foi

amplamente substituída pelo congelamento e liofilização (STEVENSON, 1998).

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3.9.3.2. Aloimplantes Congelados

Embora a revascularização e a remodelagem sejam demoradas, a reabsorção e

osteocondução ocorrem mais rapida e completamente em implantes congelados que nos

aloenxertos a fresco. Quando estáveis, mesmo aloimplantes congelados muito grandes são

bem incorporados, tendo se mostrado clinicamente satisfatórios em gatos e seres humanos.

Resultados menos favoráveis foram observados em cães, provavelmente devido à fixação

inadequada (STEVENSON, 1998).

3.9.3.3. Aloimplante Conservado em Glicerina à 98%

A conservação em glicerina é um método acessível economicamente, não sendo

necessário o emprego da autoclavagem e congelamento, técnicas que causam danos teciduais

e prejudicam a formação de calo ósseo no pós-cirúrgico; além disso, não foi observada

diferença considerável quanto ao crescimento de microorganismos na glicerina a 98%

autoclavada e in natura, num período igual ou menor a 24 meses, tampouco rejeição do

organismo ao meio conservante na evolução pós-operatória (GIORDANO, ALMEIDA,

2006).

A glicerina 98% é um eficiente meio de preservação de ossos a temperatura ambiente,

pois mantém o material livre da contaminação. O osso deve permanecer por pelo menos 30

dias submerso em glicerina à 98% antes de ser utilizado, e deve ser hidratado com solução

fisiológica antes de sua utilização, uma vez que altera as propriedades biomecânicas dos

enxertos devido à desidratação (GIORDANO, ALMEIDA, 2006).

3.9.3.4. Aloimplante Conservado em Mel

Amendola relata a viabilidade da utilização do mel na preservação de implantes

corticais para fins de enxertia. Segundo o autor, o mel é adequado como conservante de ossos

para serem utilizados como implantes corticais, pois ele mantém o material livre de agentes

patogênicos não mostrando sinais compatíveis com rejeição, além de preservar a rigidez óssea

(AMENDOLA, 2003).

3.9.4. Materiais Sintéticos Para Enxerto

Tanto polímeros quanto cerâmicas são utilizados no reparo das deficiências ósseas.

Polímeros como o ácido polilático e o ácido poliglicólico, preparados em forma de folhetos

ou esferas, têm sido utilizados na sustentação de enxertos de osso trabecular ou de material

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cerâmico, e no preenchimento de defeitos. Os polímeros não possuem resistência mecânica, e

nem os materiais cerâmicos, nem os polímeros são osteoindutores. As cerâmicas são

quebradiças, não sendo utilizadas nas áreas de elevada pressão pela sustentação de peso, sem

que seja proporcionada sustentação suficiente. Como condutor para o agente indutor ósseo ou

para o fator quimiotáxico das células ósseas, ou como expansor ósseo em combinação com o

enxerto ósseo, tanto polímeros como materiais cerâmicos podem ter utilidade nestas

circunstâncias. Grandes defeitos do osso cortical também podem consolidar após a

implantação de osso trabecular autógeno retido por esponja de colageno e após a implantação

da matriz óssea desmineralizada em pó. Estes materiais não possuem resistência mecânica,

mas são altamente osteoindutivos (STEVENSON, 1998). Os princípios básicos do enxerto

ósseo se aplicam a estes materiais, embora, para que haja êxito, devam ser empregados com

(ou em presença de) tecido biológico viável (WEIGEL, 1996).

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4. DISCUSSÃO

As cirurgias preservadoras de membro não afetam adversamente a sobrevida em cães

selecionados portadores de osteossarcoma apendicular. Em termos gerais, o funcionamento do

membro mostrou-se satisfatório, e aproximadamente 80% dos cães são favorecidos com o

funcionamento bom a excelente do membro (STRAW e WITHROW, 1998).

A cirurgia preservadora de membro objetiva proporcionar membro funcional e isento

de dor para o paciente após a remoção da enfermidade local, sem que seja adversamente

afetada sua sobrevida. Em certas circunstâncias, a preservação do membro é a opção

preferível, por exemplo para cães extremamente grandes, cães com distúrbios ortopédicos ou

neurológicos concomitantes, ou cães com donos que se recusam a aceitar a amputação. Para

estes cães, a cirurgia preservadora de membro pode ser alternativa viável à amputação

(STRAW e WITHROW, 1998).

Comparando-se seus resultados aos obtidos pela cirurgia de amputação de membro,

observa-se um prognóstico bastante semelhante entre ambos, a menos que ocorra recidiva

local, com períodos de sobrevida parecidos quando associada quimioterapia ao tratamento pré

e pós-operatório, associados ou não.

Geralmente as recidivas locais estão intimamente associadas ao desenvolvimento da

moléstia metastática. As recidivas locais podem ocorrer em qualquer ponto em torno do sítio

de excisão. Embora em algumas circuntâncias a recidiva local possa ser tratada por nova

excisão, é mais certo que a amputação erradique o tumor primário (BERG e STRAW, 1996).

É importante ainda salientar-se o risco de infecção da cirurgia com preservação do

membro, pelas razões já abordadas. Em um estudo realizado em 1989, por LaRue, a

percentagem de ocorrências foi de 31%. Sua ocorrência pode exigir novo procedimento

cirúrgico, tanto para a retirada de material purulento e necrosado, como até mesmo para a

amputação do membro, caso tais medidas fracassem (BERG e STRAW, 1996).

Faz-se interessante o uso de terapia antineoplásica adjuvante, visando a redução das

dimensões e extensão do tumor primário, o que permite cirurgia menos extensa, esteticamente

aceitável e preservadora de função, que poderá permitir a remoção de todo o tumor local

residual viável. Visto que os cães com a radiação como parte de seus tratamentos pré-

operatórios obtiveram percentagem média mais elevada de necrose tumoral, a radiação em

combinação com a quimioterapia pode ter papel no tratamento do osteossarcoma (STRAW e

WITHROW, 1998). Tanto a cisplatina quanto a carboplatina mostraram-se boas drogas para o

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tratamento quimioterápico, sendo a segunda menos nefrotóxica do que a primeira. A

associação destas substâncias, análogas, com drogas que possuam diferente mecanismo de

ação, pode tornar mais efetivo o combate à doença.

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5. CONCLUSÃO

A cirurgia preservadora de membro encontra-se ainda em um estágio inicial no campo

da Medicina Veterinária, em especial quando relacionada ao tratamento de osteoosarcomas de

membro, mas já surge como opção viável à amputação em alguns casos. Nesse estágio inicial,

a escolha de pacientes indicados a esse tipo de procedimento deve ser feita cuidadosamente,

observando-se se a manutenção do membro não interferirá na sobrevida do paciente. A taxa de

procedimentos bem-sucedidos tem se mostrado bastante alta, equivalente à de tratamentos que

envolvam a amputação do membro acometido. No entanto, assim como o último, o uso da

técnica de preservação deve ser acompanhado de tratamentos coadjuvantes, em especial o

tratamento quimioterápico, que combaterá o crescimento do tumor e a formação de metástases

durante o tratamento pré-operatório, e poderá aumentar consideravelmente a sobrevida do

animal no pós-operatório. Cisplatina, carboplatina e doxorrubicina são algumas das drogas de

escolha para tal.

O osso alogênico fresco está sujeito ao ataque pelo sistema imune do receptor; assim,

seu curso de incorporação é menos previsível, mas certamente mais lento e menos completo

que o curso seguido pelos auto-enxertos. Os aloimplantes preservados têm utilidade quando

preservam alguma capacidade osteoindutiva, e se simultaneamente possuem mínima

imunogenicidade. Os aloimplantes preservados não são muito aceitáveis biologicamente, e

são deficientemente incorporados. Materiais cerâmicos podem ser osteocondutores

adequados, mas atualmente encontram-se em fase experimental.

O procedimento cirúrgico é complexo, exigindo equipe cirúrgica experiente e

qualificada. Mas, acima de tudo, o sucesso do tratamento dependerá de proprietário e médico

veterinário dedicados. Embora sejam associadas complicações, a cirurgia com preservação do

membro pode manter o excelente funcionamento do membro em seus pacientes.

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