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1. Introdução
O edema de úbere é um acúmulo
excessivo de líquido intersticial em
espaços extravasculares da glândula
mamária e na região ventral do ab-
dômen. Esta condição é mais comum
em novilhas do que em vacas adultas
e, geralmente, ocorre no período peri-
-parto, quando um edema leve é fisio-
logicamente normal pouco antes e/
ou depois do parto. Entretanto, quan-
do ocorre um edema excessivo, pode
haver comprometimento da ordenha
das vacas, pois esta alteração dificulta
a remoção completa do leite e aumen-
ta o risco de ocorrência de mastite.
Além disso, outra séria consequência
do edema de úbere é o risco de lesão
permanente nos ligamentos suspen-
sórios, o que causa redução da vida
produtiva do animal e da longevidade.
Na maioria dos casos clínicos, o in-
chaço do úbere diminui gradualmen-
te com a ordenha, alguns dias após
o parto. Porém, em algumas vacas,
esse distúrbio pode se tornar grave e
causar dor e desconforto. Nos casos
em que a gravidade não é atenuada,
podem ocorrer outras consequências
como a mastite. Os estudos indicam
que a ocorrência de edema de úbere
foi um fator de risco significativo para
a ocorrência de mastite clínica em
novilhas no pós-parto. Em um estu-
do que utilizou modelo multivariado,
as novilhas que apresentaram edema
de úbere moderado ou grave no peri-
-parto foram 1,7 vezes mais propensas
Clínica
Como lidar como edema de úbere?
Texto: Juliana Regina Barreiro Marcos Veiga dos Santos
O edema de úbere é uma enfermidade clínica muito comum nos rebanhos lei-teiros e, apesar de aparentemente não chamar muita atenção, pode causar pre-juízos diretos como perda de produção e custos de tratamento; e indiretos como a ocorrência de mastite e descarte pre-coce do animal.
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a apresentar um episódio de mastite
clínica, em relação aos animais sem
edema ou com apenas um leve grau
de inchaço.
A ocorrência de edema de úbere
varia, consideravelmente, entre os re-
banhos leiteiros, com incidências de
18 a 96%. Não existem informações
precisas sobre sua ocorrência em re-
banhos do Brasil, mas o aumento da
produção média e o melhoramento
genético com foco em aumento da
produção de leite são uma crescente
em nosso país. Embora o inchaço do
úbere, geralmente, diminua após o
parto, sem cuidados especiais, defici-
ências de manejo do rebanho podem
agravar a situação e causar danos per-
manentes, tornando a vaca mais vul-
nerável a traumas e lesões da glândula
mamária e das estruturas de susten-
tação do úbere, como os ligamentos
suspensores.
A intensidade da manifestação
clínica do edema de úbere em vacas
leiteiras pode ser classificada em cinco
escores: 1 = sem edema; 2= com ede-
ma leve; 3 = com edema moderado; 4
= com edema grave e 5 = edema mui-
to grave. Outro sistema de classifica-
ção utiliza uma sistemática diferente,
com uma escala de amplitude maior,
ou seja, de 0 = nenhum edema a 10 =
edema grave; ou o escore pode ainda
ser definido pela mensuração do com-
primento, altura e largura do úbere
acometido, além da inspeção visual, o
que possibilita uma avaliação mais de-
talhada do problema.
2. Causas do edema de úbere
As causas do edema de úbere não
são conhecidas com exatidão, mas é
provável que seja uma condição mul-
tifatorial, que compromete a circula-
ção sanguínea da glândula mamária.
Como o edema de úbere é mais co-
mum antes do parto, a pressão exer-
cida pelo feto na cavidade pélvica,
durante a gestação, pode dificultar e
prejudicar o fluxo sanguíneo e linfá-
tico do úbere e, consequentemente,
ocasionar o edema. Esta estase de san-
gue venoso e redução do fluxo linfáti-
co durante o final da gestação, devido
à pressão do feto na cavidade pélvica
é considerada como causa primária do
edema de úbere.
Os pesquisadores também con-
outubro de 2014 | REVISTA LEITE INTEGRAL | 65
Máxima
Máxima
Máxima
Proteção
Aderência
Resistência
0800 648 1730
ClínicaComo lidar com o edema de úbere?
sideram como possíveis causas do
edema o aumento do fluxo sanguíneo
para o úbere antes do parto, associado
com uma diminuição da quantidade
de sangue que retorna do mesmo, o
que resulta em alta pressão hidros-
tática capilar e, consequentemente,
permite o extravasamento dos fluidos
da circulação sanguínea, levando ao
acúmulo no espaço intersticial. O au-
mento na formação de linfa, devido
ao maior metabolismo tecidual, pode
resultar em uma dificuldade dos vasos
linfáticos em remove-la causando o
edema. Estima-se que, aproximada-
mente, 400 litros de sangue circulem
pela glândula mamária para produzir
1 litro de leite, algo em torno de 280
ml por segundo.
Em novilhas, considera-se como
fator predisponente ao edema de
úbere o leite retido na glândula em
razão da maior dificuldade de ejeção,
o que prejudica mais ainda a circula-
ção local. Um estudo americano, com
vacas da raça Holandesa, demonstrou
que a ocorrência de edema de úbere
é menor com o avançar da idade das
vacas. Nesse estudo, a ocorrência foi
de 37,5% durante a primeira lactação;
19,4% na segunda lactação; 16,7% na
terceira; 18,7% na quarta lactação e
6,9% na quinta ou mais lactações. Va-
cas com longos períodos secos, acima
de 70 dias, tendem a apresentar qua-
dros mais graves de edema de úbere.
Por outro lado, outro estudo ava-
liou a gravidade do edema da glân-
dula mamária de 73 vacas primíparas
e as concentrações hormonais diárias
durante o período peri-parto e os es-
cores da gravidade pela observação
visual (classificação de 1 a 10). Foi con-
cluído que o edema durante o período
peri-parto aumentou em primíparas
mais velhas e naquelas com um perí-
odo seco mais longo (Figura 1). Ainda
que alguns hormônios como proges-
terona, estradiol e prolactina estejam
envolvidos no controle do desenvol-
vimento da glândula mamária e o iní-
cio da síntese do leite, não foi possível
identificar qual deles era determinante
da gravidade do edema.
Um estudo sobre a influência ge-
nética do edema de úbere indicou que
há uma alta correlação entre produção
leiteira e a ocorrência do mesmo, sen-
do que a herdabilidade é maior para
a produção leiteira. Por essa razão, a
ocorrência do edema de úbere pode
ser uma consequência indireta de al-
terações fisiológicas em vacas de alta
produção. Por outro lado, as pesquisas
também indicam que a alimentação
com excesso de cloreto de sódio (sal)
e, principalmente, de potássio, oriun-
do de uma dieta rica em grãos ou na
forma de fertilizantes do solo que se
incorporam na matéria vegetal, são fa-
tores de risco para o edema.
A alimentação com excesso de su-
plementos energético-concentrados,
como grãos, é apontada como im-
portante fator para a manifestação
e persistência do problema. A oferta
exagerada de proteína para vacas no
período pré-parto também pode au-
Figura 1- Associação entre a idade ao primeiro parto e a ocorrência de edema de úbere.(Adaptado de MALVEN et al., 1983)
7
Esco
re d
e Ed
ema
6
5
420 22 24 26
Idade da Novilha (meses)
28 30 32
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mentar a predisposição de manifesta-
ção do edema de úbere. Um estudo
realizado em vacas e novilhas da raça
Holandesa revelou que o fornecimen-
to de dieta a base de grãos, 21 dias
antes do parto, aumentou a gravidade
do edema em novilhas, por aumentar
a pressão intramamária, impedindo a
drenagem linfática e venosa; e 30 dias
antes do parto, em vacas sadias de alta
produção, evidenciou-se aumento de
edema de úbere e, posteriormente,
mastite. Além disso, também foi ob-
servada uma maior probabilidade do
edema de úbere em vacas obesas.
3. Tratamento e Prevenção
O tratamento de eleição para casos
graves de edema de úbere é a utiliza-
ção de medicamentos diuréticos, ape-
sar de que muitas vacas apresentam
cura espontânea. As medidas de auxí-
lio incluem realizar duchas, para esti-
mular a circulação na glândula mamá-
ria, e a ordenha frequente, nas formas
pós-parto do edema de úbere.
Os casos mais simples apresen-
tam uma recuperação espontânea,
logo nos primeiros dias após o parto.
Entretanto, quando o edema persiste
por algum tempo é necessário o tra-
tamento com corticoides e diuréticos.
Nos casos em que a vaca já apresenta
um edema excessivo antes do parto, é
possível reduzi-lo com o uso de diuré-
ticos, massagens no úbere e exercício
moderado. Foi relatado que as novi-
lhas induzidas à prática de exercícios
apresentam redução do edema no
pré-parto.
Para avaliar o efeito da ordenha
antes do parto sobre a ocorrência de
edema de úbere, foi realizado um es-
tudo no qual as novilhas com proble-
ma foram ordenhadas três vezes antes
do parto. Os resultados indicaram que
houve redução do edema, aumento
da produção e diminuição na conta-
gem de células somáticas durante as
duas semanas após o parto. Os bezer-
ros nasceram sem alteração de peso
e não houve aumento de retenção
de placenta ou no índice de distocias
nos partos. No entanto, a qualidade do
colostro produzido foi inferior, sendo
necessário utilizar o banco de colostro
para a alimentação dos bezerros.
Para prevenir a ocorrência de ede-
ma de úbere é recomendado que a in-
gestão de sódio (Na) seja limitada em
outubro de 2014 | REVISTA LEITE INTEGRAL | 67
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ClínicaComo lidar com o edema de úbere?
0,15% da dieta, e a de potássio (K) a
1,4% da dieta, durante as três últimas
semanas antes do parto.
Além das demais causas descritas,
alguns pesquisadores sugerem que
um processo oxidativo pode estar
associado com a etiologia do edema
de úbere. Esta teoria indica que, com
o aumento do metabolismo no início
da lactação, ocorre maior acúmulo
de oxigênio livre no úbere, que pode
produzir substâncias pro-oxidantes,
sendo que o produto destas reações
químicas lesionaria as membranas da
célula, causando o edema de úbere.
Sendo assim, alguns nutrientes antio-
xidantes, tais como o zinco, o cobre, o
manganês, o magnésio, a Vitamina E e
o selênio, poderiam atuar para reduzir
estas reações oxidativas. Recomenda-
-se que a dieta das vacas no pré e pós-
-parto contenha 0.3 ppm de selênio,
20 ppm de cobre, 60 ppm de zinco e
manganês, 0.25% de magnésio e 1000
ppm de Vitamina E.
No Brasil, vacas de diferentes fai-
xas etárias foram incluídas em uma
pesquisa para avaliação de escore de
edema de úbere, utilizando-se a escala
de 1 a 5. Os resultados indicaram que
21% das vacas apresentaram escore 2,
53% o escore 3 e 26% o escore 4. Além
disso, foi avaliada a amplitude de va-
riação em relação ao período no qual
o edema foi observado, sendo que, an-
tes do parto, o edema foi evidente em
40% das vacas, e após o parto em 58%
dos animais avaliados. Ainda neste es-
tudo, foi descrita a preferência de tra-
tamentos nos casos que necessitaram
de intervenção clínica, sendo utiliza-
das com maior frequência as seguintes
terapias: corticoide + diurético (forma
injetável) em 52% dos casos; apenas
diuréticos em 12%; apenas linimento
(tópico) em 11%; em 5% dos casos fo-
ram utilizados duas drogas diuréticas
e corticoide (forma injetável); em 10%
foram utilizados linimentos e injeções
de dimetilsulfóxido (DMSO); em 1%
foram aplicados anti-inflamatório não-
-esteroide, e em 19% dos casos as va-
cas não receberam tratamento, apesar
da demora em desaparecer os sinto-
mas do edema.
Dentre as medidas profiláticas mais
utilizadas nas fazendas, observou-se:
• a redução da quantidade de
grãos na dieta do pré-parto;
• a utilização de dietas catiônica-
-aniônica no pré-parto;
• a suplementação com vitamina
E, sais de magnésio e cloreto de
cálcio no pré-parto.
Outras medidas adicionais são:
exercitar os animais com caminhadas
antes e depois do parto sobre terre-
nos planos, com baixa velocidade; or-
denhas frequentes e controladas no
pós-parto, para reduzir a congestão; e
disponibilizar livre acesso à água para
as vacas. Todos estes fatores de mane-
jo apresentaram efeitos positivos para
a prevenção do edema, quando bem
utilizados e associados com as medi-
das adicionais.
4. Considerações Finais
O edema de úbere é uma enfer-
midade clínica muito comum nos re-
banhos leiteiros e, apesar de aparen-
temente não chamar muita atenção,
pode causar prejuízos diretos como
perda de produção e custos de trata-
mento; e indiretos como a ocorrência
de mastite e descarte precoce do ani-
mal.
As causas específicas do edema de
úbere ainda não foram completamen-
te elucidadas, mas é provável que seja
uma manifestação decorrente de múl-
tiplos fatores.
O adequado balanceamento da
dieta das vacas durante o período
pré-parto pode ser uma ferramenta
de manejo de controle e prevenção
do edema de úbere. Sendo assim, a
implantação de medidas preventivas
e o tratamento adequado do edema
de úbere são as principais alternativas
para reduzir as lesões da glândula ma-
mária e os efeitos negativos, como a
mastite.
Marcos Veiga dos SantosProfessor Associado, FMVZ-USP, Campus de Pirassununga-SP. Laboratório Qualileite-FMVZ-USP
Juliana Regina BarreiroDoutoranda em Nutrição e Produção Animal, FMVZ, USP
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