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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015 Cultura Política participativa da juventude. Qual o papel da escola na consolidação da democracia e cidadania entre os jovens? Gabriele Padilha da Cunha RESUMO: Atualmente existem diversos estudos na área de Ciência Política que procuram problematizar e analisar a cultura política entre os jovens (BAQUERO, 2012 e SILVEIRA, 2005). Aprofundando conceitos como os de cultura política, neoinstitucionalismo, capital social e cidadania, o presente artigo tem por objetivo investigar o que os jovens pensam e entendem a respeito da democracia, das instituições políticas brasileiras, participação política e cidadania. Ainda, com base em estudos já realizados por outros pesquisadores (SILVEIRA, 2005), pretende-se analisar se as escolas possuem um papel de relevância na formação de uma cultura política participativa e de fomento a consolidação da cidadania e solidariedade entre a população jovem brasileira. Palavras-chave: Democracia; participação política; cidadania; jovens.

Cultura Política participativa da juventude. Qual o papel ... · como para consolidá-la. Tal corrente de estudo nasceu, em sua perspectiva contemporânea, na década de 1960 face

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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

Cultura Política participativa da juventude. Qual o papel da escola na consolidação da

democracia e cidadania entre os jovens?

Gabriele Padilha da Cunha

RESUMO: Atualmente existem diversos estudos na área de Ciência Política que procuram

problematizar e analisar a cultura política entre os jovens (BAQUERO, 2012 e SILVEIRA, 2005).

Aprofundando conceitos como os de cultura política, neoinstitucionalismo, capital social e cidadania,

o presente artigo tem por objetivo investigar o que os jovens pensam e entendem a respeito da

democracia, das instituições políticas brasileiras, participação política e cidadania. Ainda, com base

em estudos já realizados por outros pesquisadores (SILVEIRA, 2005), pretende-se analisar se as

escolas possuem um papel de relevância na formação de uma cultura política participativa e de

fomento a consolidação da cidadania e solidariedade entre a população jovem brasileira.

Palavras-chave: Democracia; participação política; cidadania; jovens.

I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

Introdução

Após a redemocratização do país, houve uma grande esperança de que com a volta das

instituições democráticas, a democracia no Brasil iria consolidar-se. Houve a crença de que tais

instituições e regramentos iriam moldar a conduta da população brasileira, caminhando assim, para

uma democracia de qualidade, com respeito à todos os direitos sociais, civis e principalmente

políticos.

Entretanto, com a redemocratização renovaram-se no Brasil embates entre duas correntes

vigentes na Ciência Política, a abordagem neoinstitucionalista e a abordagem da cultura política.

Os defensores da abordagem neoinstitucionalista, acreditam que fatores econômicos e

institucionais são suficientes para gerar uma explicação convincente da dinâmica das democracias

(PRZEWORSKI e LIMONGI, 2003). Ou seja, a cultura não importaria ou importaria muito pouco

para que nações se tornassem democráticas, tampouco influenciaria na consolidação e na

permanência dessas democracias. Portanto, ao passo que instituições se formassem, a democracia se

consolidaria em qualquer nação.

De forma, diametralmente oposta, para a abordagem culturalista, inaugurada por Almond e

Verba, seria necessário um determinado tipo de cultura para o surgimento de uma democracia e para

que esta se estabilize e se consolide. Ressalta-se ainda, que o conceito e a abordagem feita pela cultura

política, interage com os conceitos de confiança e principalmente de capital social.

Dito isto, em decorrência destes debates, surgiram nos últimos anos, com o foco na

abordagem da cultura política, inúmeras pesquisas que objetivavam compreender e avaliar o

engajamento cívico dos jovens, bem como a sua percepção e a aceitação da democracia como o

sistema de governo ideal para a promoção da cidadania e dos direitos da população, fatores essenciais

que conferem estabilidade e legitimidade a democracia (SILVEIRA, 2005 e CUNHA, 2011).

Ainda nesse sentido, para a compreensão da atitude e do comportamento dos jovens em

relação à democracia é necessário adentrar ao conceito de capital social, o qual sugere que sociedades

em que os cidadãos cooperam entre si e possuem relações de confiança recíproca demonstram melhor

desenvolvimento econômico e social, o que propicia um círculo virtuoso de confiança, que leva a

uma cultura cívica participativa (PUTNAM, 2001).

Portanto, o presente artigo pretende analisar, com base em estudos já realizados por outros

pesquisadores (SILVEIRA, 2005 e CUNHA, 2011), a seguinte questão: As escolas possuem um papel

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de relevância na formação de uma cultura política participativa e de fomento a consolidação da

cidadania e solidariedade entre a população jovem?

Para que se alcance tal objetivo, o artigo será divido em quatro seções: a primeira que trará

uma breve análise das abordagens neoinstitucionalista e da cultura política, presentes nos estudos em

Ciência Política. A segunda versará sobre capital social: conceito e críticas, a terceira versará sobre o

desdobramento do conceito de capital social na participação política da juventude. E por fim, a quarta

seção terá como objetivo esclarecer, com base em pesquisas já realizadas (BAQUEIRO e SILVEIRA,

2005), se a escola como instituição formal possuiu um papel relevante na formação de uma cultura

política e de fomento a cidadania entre os jovens porto-alegrenses.

Neoinstitucionalismo x Cultura Política

É sabido que existe grande embate entre as abordagens neoinstitucionalista e de cultura

política. De um lado, conforme já mencionado anteriormente, a abordagem neo-institucional afirma

que a cultura não importa, ou importa muito pouco para inaugurar e para manter um regime

democrático.

Tal argumento é sustentado pela afirmação de que, em uma sociedade onde os cidadãos não

possuam uma cultura política democrática nunca será possível existir um regime democrático, ou

seja, apenas democratas gerariam uma democracia, o que de fato não foi o que ocorreu na maioria

dos países que experimentaram mais recentemente a democracia (PRZEWORSKI, LIMONGI, 2003).

Portanto, a democracia emergiria e se manteria de modo independente da cultura, não

existindo nenhuma relação causal entre cultura política, desenvolvimento econômico e democracia.

É o que afirmam Prezeworski e Limongi:

[...] na visão não culturalista, a democracia emergeria e se manteria de modo independente

da cultura. A democracia pode ou não gerar homogeneidade cultural, mas a cultura não

teria qualquer impacto causal sobre a durabilidade de instituições democráticas.

(PREZEWORSKI, LIMONGI, 2003, pg.20).

Ademais, a abordagem não culturalista possui a vantagem de ter forte apoio empírico:

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[...] Nessa visão a democracia sobrevive porque é mais vantajoso para as forças políticas

relevantes, pautando suas ações por puro interesse próprio, obedecer o veredicto das urnas

do que fazer qualquer outra coisa. Os perdedores numa competição democrática podem

ter incentivos no curto prazo para rebelarse, não aceitando os resultados do turno atual.

No entanto, se existir uma possibilidade de ganhar as eleições futuras e os benefícios

esperados destas vitórias forem grandes o suficiente, perdedores preferirão aceitar os

veredictos das urnas. (PREZEWORSKI, 1991, pg.21).

De outro lado, contrapondo a vertente neoinstitucionalista, a abordagem da cultura política

defende que fatores econômicos e institucionais não são suficientes para gerar uma democracia bem

como para consolidá-la.

Tal corrente de estudo nasceu, em sua perspectiva contemporânea, na década de 1960 face

a desilusão com as expectativas iluministas e liberais e mediante o crescente avanço de técnicas de

pesquisa e abordagens metodológicas que permitiam tratar questões dessa natureza com maior

objetividade. (RENNÓ, 1998).

Almond e Verba, em sua obra, considerada um marco para a abordagem da cultura política,

acreditavam que era preciso muito mais que instituições e desenvolvimento econômico para que uma

democracia fosse consolidada. A cultura fornece a base psicológica da democracia, citando o exemplo

dos Estados Unidos da América, os autores afirmaram que um tipo particular de cultura política, a

cultura cívica, é necessária para a legitimação e a estabilidade de um regime democrático (ALMOND

e VERBA, 1963).

Cultura política para Almond e Verba (apud Rennó, 1998), é definida como:

[...] o conjunto de orientações subjetivas de determinada população (1990, p. 144). Inclui

conhecimentos, crenças, sentimentos e compromissos com valores políticos e com a

realidade política. O seu conteúdo é resultado da socialização na infância, da educação,

da exposição aos meios de comunicação, de experiências adultas com o governo, com a

sociedade e com o desempenho econômico do país (RENNÓ, 1998, pg.71).

Nesse mesmo sentido, também afirma José Álvaro Moisés (Moisés, 2008) que a cultura

política é atrelada a uma série de atitudes, crenças e valores políticos tais como orgulho nacional,

respeito pela lei, participação e interesse por política, tolerância, confiança interpessoal e

institucional, que afeta o envolvimento das pessoas com a vida pública. A teoria ainda postula que

essas orientações exercem ao longo do tempo uma influência sobre os cidadãos com relação a

legitimidade do sistema democrático.

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Capital social: conceito e críticas

Demonstradas as abordagens neoinstitucionalista e da cultura política, temos que utilizando-

se do aporte teórico da segunda corrente, a cultura política estaria intimamente ligada com o conceito

de capital social.

O conceito de capital social, relaciona-se a instituições, atitudes, debates, comportamentos,

valores e formas de relações interpessoais (Silveira, 2005).

Tal conceito foi fruto de pesquisas de diversos autores, como Pierre Bourdieu (1986), Glenn

Loury (1981), James Coleman (1988, 1990) e Robert Putnam (1993,1995,1998). Tais autores definem

capital social, em linhas gerais, segundo Lima (2001), por sua função, incorporando uma variedade

de relações presentes na estrutura social que facilitam ações destes indivíduos na sociedade.

Segundo Pontes (1998), a primeira análise referente ao capital social foi realizada por Pierre

Bourdieu (1986), para o autor o capital social está relacionado às dimensões sociais e simbólicas

sendo constituído por recursos as redes sociais.

Entretanto, em sua definição, o conceito de capital social para Bourdieu consistia em um

nível individual onde os indivíduos se identificam em redes sociais para que pudessem obter com

mais facilidade bens e recursos econômicos.

[...] o conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede

durável de relações mais ou menos institucionalizadas de inter-reconhecimento ou, em

outros termos, à vinculação a um grupo, como conjunto de agentes que não somente são

dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos

outros ou por eles mesmos), mas também são unidos por ligações permanentes e úteis.

(BOURDIEU, 1986, pg.67)

Ainda, segundo Lima (2001), outro autor a abordar o conceito de capital social foi o

economista Glenn Loury (1981), que utilizou o conceito a partir da teoria das desigualdades raciais

praticadas nos EUA. O autor constatou que as ações do Estado na discriminação da população negra

acabaram por limitar seu acesso aos bens e serviços públicos, de modo que, o acesso diferenciado

dessa parcela da população aos bens materiais e simbólicos decorria das limitadas redes sociais e

consequentemente do baixo capital social dessa população.

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James Coleman (1998), também realizou abordagens sobre o tema afirmando que o ponto

de partida da teoria do capital social seria a teoria da escolha racional, embora o autor rejeitasse o

individualismo presente na mesma.

Na concepção de Coleman capital social é um recurso presente na ação introduzindo a

estrutura social no paradigma da ação racional (LIMA, 2001).

Em contrapartida, ingressando na esfera social, para Putnam (2001), o conceito de capital

social pode ser entendido como um acúmulo de confiança, reciprocidade e a um associativismo

horizontal que é fruto da confiança interpessoal em redes de solidariedade, redes estas capazes de

produzir relações cívicas virtuosas.

Através de estudo realizado na Itália, Putnam concluiu que o avanço político obtido no norte

do país deu-se em virtude do estoque de capital social e a renúncia ao associativismo vertical, levando

esta região a uma estabilidade democrática e ao desenvolvimento econômico, ao contrário da região

sul que, em que pese mantivesse as mesmas instituições formais democráticas não obteve o mesmo

êxito.

Segundo, Lima (2001), Putnam amplia o conceito de capital social ao afirmar que as

associações horizontais constituem um tipo de substrato para uma maior participação política, nesse

sentido:

[...] Para ele (Putnam), o conceito incorporaria a constatação tocqueviliana da propensão

americana ao associativismo em suas mais diversas formas. Ideias sobre associações

horizontais estariam na base das relações entre democracia e sociedade civil, assim como

o envolvimento pessoal em atividades – voluntárias e filantrópicas e esportivas – que

teriam um efeito no comportamento dos cidadãos americanos nas esferas política,

econômica e social. Destaca que normas de reciprocidade generalizadas são componente

altamente produtivo de capital social. Essas normas estariam relacionadas a densas redes

sociais e reduziriam o oportunismo potencialmente presente na ação coletiva (LIMA,

2001,pg. 52).

Dessa forma, para a teoria cultural de Putnam a cultura política e a história particular

determinam a existência deste associativismo horizontal, baseado no engajamento cívico, que

garantem o desenvolvimento econômico, a estabilidade do regime democrático e o bem estar da

população.

Ainda, o autor defende que a cooperação sugere uma forma de pressão e constrangimento

sendo um meio de controle social que redefine uma ordem interna de participações nas ações

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coletivas, o que sugere um sentimento de responsabilidade coletiva em uma comunidade (SILVEIRA,

2005).

Outro aspecto, muito importante sobre o capital social é a questão da confiança

interpessoal, segundo Silveira (2005):

[...] Um dos indicadores mais utilizados de Capital Social é a confiança interpessoal

(aspecto cognitivo). Este indicador é base para outro dimensão do Capital Social

(estrutural), a qual se realiza por meio do estabelecimento de redes sociais ou outros

mecanismos de participação que possam acionar o estado (SILVEIRA, 2005, pg.31).

A questão da confiança possui papel de destaque também para Putnam (2001), o qual afirma

que esta tem papel fundamental na formação do capital social, e mais, tal indicador possuiu a

capacidade de diferenciar outros tipos de capital social, isto porque quando há confiança esta gera

cooperação, o que gera ainda mais confiança.

Ainda, para Baquero (2001), a confiança interpessoal é a base para o desenvolvimento do

capital social, possibilitando o surgimento de ações coletivas.

Feitas breves considerações sobre o conceito de capital social, tem-se que tal conceito foi

alvo de várias críticas feitas por diversos autores, tais como Fox (1994), Peter Evans (1995) e Pontes

(1998).

As críticas consistiam em diversos argumentos, como ao fato da causalidade e do

determinismo cultural defendido por Putnam, reação essa dos neoinstitucionalistas ao afirmarem que,

segundo o determinismo cultural, sociedades que não possuíssem ingredientes culturais não

alcançariam o engajamento cívico.

Nesse sentido, Peter Evans (1994) afirmou que a falta de associativismo cultural é fruto das

ações políticas proferidas por regimes autoritários ou por instituições democráticas defeituosas. Para

o autor a mudança social aconteceria na medida em que o Estado fosse eficiente quanto as suas

instituições.

Da sua análise, o autor relata que a sinergia entre Estado e sociedade pode ser catalisada para

o desenvolvimento. Sendo assim, o estado deve ter a habilidade de construir um aparato burocrático

para gerir as demandas sociais. Portanto, a cooperação e o engajamento cívico podem ser incentivados

através de políticas públicas (LIMA, 2001).

Evans afirmou ainda, que existiriam três tipos de intervenção pública: a predatória, que

seriam intervenções arbitrárias que destroem a sociedade e a possibilidade de formação de capital

social, a desenvolvimentista que seria mais eficiente na mobilização dos recursos sociais, e a

intermediária que seria o caráter híbrido entre as duas formas anteriores, caracterizada por atividades

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sociais, mas em contrapartida, por inúmeros casos de apropriação de recursos públicos (ABU-EL-

HAJ, 1999).

Nesse mesmo sentido, Fox (1994), em seu estudo sobre o México, conclui que instituições

defeituosas e corruptas destruíram o capital social existente na sociedade, ressaltando que as

instituições podem tanto fomentar o capital social, como podem destruí-lo, com práticas corruptas e

intervenções mal sucedidas.

Outra crítica feita ao conceito de capital social foi feita por Pontes (1998) chamando atenção

ao fato da dificuldade de mensurar e encontrar provas empíricas de que o comportamento

participativo e associativo de uma nação, em ausência de outros fatores, produziria efeitos com

relação a estabilidade e consolidação da democracia e efeitos econômicos favoráveis.

Capital Social e participação política da juventude

Conforme já mencionado acima, o capital social tem como um de seus principais indicadores

a confiança, aspecto este que está intimamente ligado à cultura política. Nesse sentido, o conceito de

capital social torna-se muito importante para a percepção da cultura política existente.

O capital social, na forma de associativismo horizontal cria redes de solidariedade e

reciprocidade que ajudam a consolidar a cidadania entre os indivíduos aumentando as chances da

concretização de ações coletivas, pensadas no bem estar comum e não apenas no individualismo.

Observa-se então, que o capital social está intimamente ligado a participação política, pois a

participação pode ser considerada como efeito do capital social.

Segundo, Cunha (2011), o conceito de participação política vincula-se quase que diretamente

ao conceito de cidadania participativa, que implica em cidadãos informados e engajados na

comunidade.

Nesse sentido, em relação a cultura política, conforme Baquero (2003) é notório que nos

últimos anos se observa um grande esforço do governo brasileiro para que a democracia seja

considerada legítima através da criação de uma base institucional de crenças e valores de apoio à

democracia. Entretanto, a desigualdade social, o aparecimento de grandes escândalos de corrupção,

tem tido efeito negativo culminando com a frustração e a decepção da população, principalmente dos

jovens, para com o regime democrático.

Essa frustração é demonstrada através da percepção dos jovens à respeito da política,

contidas em diversas pesquisas realizadas na última década, tais como Latinobarômetro e World

Values Surveys. A maioria destas pesquisas possuiu como conclusão que a juventude tem perdido a

fé no sistema democrático, bem como acreditam que os políticos e o governo não possuem capacidade

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para resolver os problemas no país, como a diminuição das desigualdades, e a garantia de direitos

relacionados à cidadania.

Ainda, segundo pesquisa Capital Social e Juventude, Nupesal e Niem, 2001 e 2004 apud

Silveira (2003), perguntados aos jovens se os mesmos tinham interesse pela política, se apenas se

informavam às vezes sobre o assunto ou se não se interessavam pela política, os dados obtidos

informaram que 25% em 2001 e 14% em 2004 são os percentuais de jovens com interesse pela

política, 56% em ambos os anos, costumavam às vezes se informar, e 19% e 30% não se interessavam

por política. Portanto, percebe-se que existe uma juventude descrente e desconte com a política.

A mesma pesquisa, realizou teste a respeito da percepção dos jovens sobre a participação

política, os jovens foram questionados se acreditavam que a participação política é importante. Os

dados apontaram que 53% dos jovens, em 2001, e 65% em 2004 consideraram ser importante a

participação, 41% e 28% consideraram que depende, e 6% e 7% não acham importante a participação

dos jovens na política.

Os dados demonstraram também que os jovens quando indagados a respeito da confiança

nos políticos (presidente, governadores, prefeitos, senadores, deputados e vereadores), 50%

afirmaram não confiar, e acreditam que as promessas realizadas pelos políticos na maioria das vezes

não são cumpridas.

Os jovens não se sentem representados pelos políticos, bem como não acreditam que o

Estado chegue até eles. Os jovens não creem na capacidade do Estado em produzir políticas públicas

para melhorar a qualidade de vida e para garantir mais oportunidades para a juventude.

Constata-se, dessa forma, que a descrença e a frustração dos jovens para com a democracia,

demonstra uma crise formal, pois os jovens não confiam nas instituições políticas institucionalizadas

e não possuem participação formal na política brasileira, nesse sentido afirma Souza (1999):

[...] Observa-se, presentemente, entre os jovens, uma insurgência juvenil contra o

instituído, questionadora do valor da política moderna. Há uma tendência crescente ao

descrédito institucional (SOUZA, 1999, pg.23).

Entretanto, em que pese a conclusão negativa de que os jovens tendem a não confiar nas

instituições formais democráticas, e se interessam pouco pela política, algumas pesquisas tem

destacado que tem surgido novos padrões de participação entre os jovens, materializados em

movimentos sociais não institucionalizados como movimento negro, movimento ecológico,

movimento feminista dentre outros.

Assim, segundo Baquero (2003) vislumbra-se que outra relação com a política vem sido

percebida entre os jovens, marcada por traços de participação política que vão em contramão do apoio

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a política institucional e se encaminham na construção de um novo cenário baseado em parâmetros

ético-existenciais, no qual a mudança pessoal faz parte da mudança coletiva.

Conforme assinala o Diálogo Nacional para uma Política Pública da juventude apud Baquero

(2003), as formas de participação política e social presentes são frequentemente percebidas pelos

jovens como muito distantes de sua realidade cotidiana, constituindo essa exclusão um problema não

somente da juventude e sim de toda sociedade.

Analisando o papel da escola na formação de capital social e cultura política dos jovens

Já foi visto acima, que o capital social encontra-se intimamente ligado com a variável

confiança e com a participação política, pois na criação de um associativismo horizontal são

propiciadas as relações de solidariedade que possibilitam o surgimento de ações coletivas,

incentivando a cidadania.

Sabe-se ainda, que os jovens tem se decepcionado cada vez mais com a política e suas

instituições formais, pois acreditam que tais instituições são muito distantes de sua realidade. Os

jovens não se sentem representados, bem como não acreditam que o Estado se interesse na criação de

políticas públicas voltadas para os mesmos.

Dessa forma, considerando a descrença dos jovens nas instituições e na política, e

considerando ainda o papel importante da escola na formação educacional, profissional e pessoal dos

jovens surge a seguinte indagação: A escola, como entidade institucionalizada, possui um papel de

relevância na formação de capital social e de uma cultura política de fomento a cidadania entre os

jovens?

A escola é a primeira instituição formal de socialização entre crianças e jovens, portanto, é

uma instituição de grande importância na formação social, pessoal e educacional dos indivíduos.

Conforme Schmidt (2000) a escola também pode ter papel de relevância em apresentar a

política aos jovens através dos conteúdos programáticos e por transmissão não intencional, bem como

influenciar sobre a cidadania através da informação sobre o direito a ter direitos. A escola tem o poder

de incentivar também a criação de laços coletivos e a criação de redes de solidariedade entre colegas,

professores e funcionários, visando o bem comum.

Assim, a escola poderia fomentar o desenvolvimento da cidadania através engajamento

cívico dos jovens, podendo este se materializar através de serviços comunitários voluntários,

engajamento nas atividades e no contexto escolar, o que poderia ser o começo de uma vida visando

as relações de confiança interpessoal e o bem comum da comunidade.

Em pesquisa realizada por Silveira (2003), juntamente com os jovens das escolas do

município de Porto Alegre/RS, da análise dos dados foi constatado que os jovens apresentam alto

nível de desconfiança à quase todos os níveis do poder público, enquanto parecem confiar mais nas

instituições da esfera privada, evidenciando o descrédito desta parcela da sociedade pela vida política

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e comunitária. Embora favoráveis a participação política, os jovens porto-alegrenses demonstraram

baixo grau de envolvimento na esfera política, associativa, voluntária, e de participação em grêmios

estudantis nas escolas.

Este distanciamento da política, sugere que os jovens não são necessariamente alienados e

apáticos, mas sim a existência de uma cultura política, assim como constatado por Moisés (2008),

ambivalente com atitudes autoritárias e apoio a valores e princípios democráticos.

No que se refere ao papel das Instituições de Ensino, os jovens apontaram a importância de

participar nas decisões da escola que afetem a coletividade, mas na prática a maioria dos jovens afirma

não ter interesse pelo envolvimento nos grêmios estudantis que visam garantir que os alunos tenham

participação netas decisões. Também, foi constado que a escola como agente socializador não tem

desempenhado a função de apresentar os conteúdos sobre democracia, cidadania e participação

política, isto porque, os jovens em sua grande maioria, afirmaram que não possuem o hábito de

discutir e buscar a solução para os problemas os quais estão inseridos. O mesmo comportamento é

verificado quanto a participação em associações e atividades voluntarias, onde os jovens afirmam que

acham positivo e importante a participação mas que, segundo eles não participam destas atividades

por falta de oportunidades e de incentivo.

Sendo assim, segundo o estudo da pesquisadora, concluiu-se que pelo menos, com relação

aos jovens porto-alegrenses o estoque de capital social proporcionado pela escola é muito baixo, bem

como há uma grande desilusão com as instituições formais democráticas e até mesmo com a escola

em si, pois os jovens afirmam que a escola não é um lugar que permite a socialização e a participação,

tanto no âmbito de decisões quanto no âmbito de propiciar meios de formação de associativismo

horizontal.

Conclusão

Neste breve artigo analisou-se a cultura política, a participação política da juventude e o

capital social. Para tanto, o artigo foi iniciado com uma breve revisão sobre as abordagens em Ciência

Política do neoinstitucionalismo e da cultura política para que pudesse ser feita uma revisão

bibliográfica contemplando o conceito de capital social, cultura política e em especial a cultura

política da juventude.

Além dos aspectos revisados e analisados com relação as teorias e conceitos acima dispostos,

foram analisados dados de pesquisas realizadas ( SILVEIRA, 2003 e CUNHA, 2011) à respeito da

percepção dos jovens sobre a democracia, a confiança nas instituições democráticas, e o papel da

escola, como instituição formal, de fomentar a legitimidade e a consolidação da democracia e da

cidadania, bem como seu papel no fomento ao capital social entre os jovens.

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Do estudo realizado, consta-se que os jovens estão decepcionados com a democracia. Os

jovens desconfiam das instituições formais democráticas e acreditam que o governo seja algo muito

distante de suas realidades. Ademais os mesmos não acreditam que o Estado tenha capacidade de

realização de políticas públicas destinadas a juventude.

Entretanto, consta-se também, que apesar da percepção negativa dos jovens quanto ao

regime democrático, verifica-se que os mesmos mostraram nas pesquisas realizadas, que acham

importante a participação política e demonstraram também, a vontade de participação em associações

coletivas, entretanto, alegam não ter incentivo por parte das instituições para tanto.

A realidade encontrada, portanto, não aponta para uma juventude apática e alienada quanto

à democracia, e sim para uma juventude sem incentivo institucionais para o associativismo, tanto por

parte das instituições democráticas, quanto por parte da escola.

Por fim, vimos que a escola não possuiu um papel de relevância na formação de uma cultura

política da juventude. Os jovens estão cada vez mais céticos as instituições formais democráticas, o

que demonstra perigo para a estabilidade e legitimidade da democracia. Dessa forma, os educadores

e até mesmo a classe política deveria engajar-se na formação democrática dos jovens dentro das

escolas, através de incentivos à programas que estimulem ações coletivas que poderiam ser voltadas

até mesmo para a própria comunidade escolar, como atividades em que os próprios jovens pudessem

oferecer ajuda mútua uns aos outros, por exemplo através de grupos de estudos, incentivo ao jovens

para que ministrem aulas de alguma habilidade pessoal de cada um que fosse passada aos demais,

fomentando assim a criação de capital social que seria refletido em uma cultura e participação política.

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