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Ministério da Educação e do Desporto UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação Setor de Tecnologia
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA QUÍMICA
EN734 – Termodinâmica Profª. Drª. Regina Maria Matos Jorge
Equação de Transferência de Massa em Sistemas Multicomponentes
Estudo de caso: Difusão multicomponente durante a maturação do queijo tipo prato[1].
João Augusto Cruza, Regina Maria Matos Jorgeb.
a Aluno do curso de Mestrado acadêmico em Engenharia Química, PPGEQ, Universidade Federal do Paraná, Paraná, Brasil. b Professora Doutora adjunta do curso de Mestrado acadêmico em Engenharia Química, PPGEQ, Universidade Federal do Paraná, Paraná, Brasil.
INTRODUÇÃO
Estudo de caso de dissertação sobre difusão multicomponente durante maturação do
queijo tipo prato desenvolvida por FIDELIS et al (2006), como requisito para obtenção
do título de mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Estadual
de Londrina (Paraná).
A referida dissertação teve como objetivos a modelagem e simulação do processo de
maturação (salga) do queijo como um processo de transferência de massa
multicomponente, utilizando um sistema ternário (NaCl/KCl/água no queijo), de um
queijo regional do tipo Prato, aplicando a segunda lei de Fick generalizada e
empregando o método dos elementos finitos.
Além disso, a dissertação objetivou determinar os coeficientes difusivos, estabelecer
as interações entre os fluxos de solutos/solvente, propor e validar o modelo
matemático para modelagem deste sistema e, ainda, comprovar a aceitabilidade do
queijo Prato formulado com teor de sódio reduzido, como alternativa à para reduzir os
problemas de hipertensão arterial. Esta dissertação englobou uma área de interesse
para indústria de laticínios da região.
Objetivou-se com este estudo de caso analisar:
Os fenômenos físico-químicos envolvidos no processo;
A modelagem adotada, suas considerações e simplificações;
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O método matemático adotado para resolução da modelagem;
E, ainda, os resultados obtidos e o poder preditivo do método em detrimento
de resultados experimentais.
Processamento do queijo tipo Prato
A fabricação de um queijo é essencialmente um processo de desidratação, onde a
gordura e a caseína do leite são concentradas. A desidratação é tradicionalmente
alcançada pela coagulação da caseína enzimaticamente, isoeletricamente ou pela
combinação de acidez e aquecimento.
O processo de salga é, juntamente com a maturação, essencial para o queijo atingir
suas características organolépticas tradicionais. Desde os tempos pré-históricos, a
adição de sal, junto com a fermentação e a secagem são usadas como métodos
clássicos de preservação de alimentos. No queijo, além da conservação, o processo
de salga auxilia na remoção do soro, a retardar o desenvolvimento da acidez e a
desenvolver e acentuar o sabor.
FENÔMENOS DE TRANSFERÊNCIA ENVOLVIDOS NA SALGA
Quando o queijo é mergulhado na salmoura verifica-se uma diferença entre a
concentração da solução aquosa no interior do queijo e do banho de sal. Há diferença
na pressão osmótica de ambos os líquidos e diz-se que a salmoura é hipertônica em
relação ao queijo. A superfície do queijo faz o papel de membrana semipermeável que
permite a migração de sal para o interior do queijo por meio do fenômeno de difusão,
ao mesmo tempo em que libera a saída de parte da fase aquosa do queijo com seus
elementos solúveis, principalmente ácido lático, lactose e nitrogênio não-proteico.
Pode-se dizer, então, que ocorre diálise no processo da salga do queijo em salmoura.
Como a transferência de água é maior, o queijo durante a salga perde peso. Para o
caso do queijo Prato essa perda foi determinada ficando ao redor de 2% em uma
salmoura com concentração de 20%.
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Ou seja, podem ser observados os seguintes fluxos de massa neste processo:
1. Fluxo de solutos da solução para o biossólido (massa qualhada);
2. Fluxo de água do biossólido para a solução;
3. Fluxo de sólidos solúveis para um nível osmótico médio próximo às camadas
superficiais da massa (este efeito foi considerado desprezível para a
modelagem, tendo em vista que não interfere significativamente nos fluxos dos
solutos e já é computado nos efeitos do fluxo de água)
Este sistema pode ser, então, classificado como ternário, composto por: NaCl, KCl e
água. A modelagem e simulação deste processo de difusão tornam-se necessárias
para permitir um controle adequado da composição da massa desidratada e, ainda,
possibilitar a redução do tempo de processamento, através da determinação de um
tempo ótimo para esta etapa.
MODELAGEM
Difusão é o processo no qual a matéria é transportada de uma parte de um sistema
para outros diferentes como o resultado de movimentos moleculares aleatórios. A
difusão molecular ou Fickiana em uma fase fluída é amplamente aceito como sendo
um mecanismo de transferência de massa dentro de sólidos alimentares, onde a força
de direção para o processo de difusão é o gradiente de concentração, ou de atividade
química. A relação entre o fluxo de matéria e o gradiente de concentração é
denominada primeira lei de Fick, mostrando que a concentração varia notavelmente
com a posição do material. A segunda lei de Fick, também chamada de equação da
difusão, indica que a taxa onde esse processo ocorre em um ponto do espaço para
sistemas binários diluídos (soluto e uma grande quantidade de solvente) é
proporcional à variação do gradiente de concentração. A forma da segunda lei de Fick
generalizada foi desenvolvida por Onsager, sendo uma equação constitutiva do fluxo
de massa de soluto usado para modelos de processos de difusão.
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O procedimento de amostragem adotado, para o estudo da difusão multicomponente
do NaCl e KCl, consistiu na retirada de duas amostras cilíndricas ao longo do eixo X
de 1,5cm de diâmetro e 4cm de comprimento, posicionadas conforme descrito na
Figura 01. Após a amostragem, a parte remanescente dos queijos foi reposta na
salmoura apenas para manter constante a relação entre o volume de salmoura e o de
queijo. Com a mesma finalidade, foi subtraída uma fração de salmoura
correspondente ao volume das amostras cilíndricas retiradas. Os intervalos de tempo
de amostragem escolhidos foram de 1, 2, 3, 5, 7, 9 e 11 horas de salga.
Figura 01. Amostragem adotada para o estudo da difusão multicomponente[1].
Na modelagem foram adotadas as seguintes considerações:
Difusão multicomponente unidimensional no eixo X;
Sistema não reacional;
Coeficiente de difusão constante em relação a concentração (independente de
X e t);
Resistência externa igual para os dois solutos;
Contração da amostra desprezível (devido à ser menor que 2,0%).
A Equação 1 descreve a variação de concentração unidimensional do soluto em uma
placa plana finita através da Lei de Fick.
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Onde, ± R (cm) é a distância até o centro do eixo analisado, D (cm/dia) é a matriz dos
coeficientes de difusão, e C (g/100g de água no queijo) o vetor que contém a
concentração dos dois solutos, representados respectivamente como:
Sendo, por convenção, C1 a concentração de NaCl e C2 a concentração de KCl. Os
símbolos D11 e D22 representam os coeficientes de difusão principais de cada soluto
em relação ao próprio gradiente de concentração. Os termos D12 e D21 referem-se aos
coeficientes de difusão cruzados que acoplam o fluxo de um soluto com o gradiente
do outro soluto. Foi utilizada como condição inicial Ci(x,0)=C0, onde C0 é vetor que
contém as já conhecidas concentrações iniciais do cloreto de sódio e cloreto de
potássio no queijo. E, uma condição de contorno específica para a salmoura com
ausência de agitação foi especificada conforme a Equação 2.
Onde, hm (g/cm.h) é o coeficiente de transferência de massa, λm (g/cm.h) é a
condutividade mássica, e C é o vetor que representa a concentração dos sais na
salmoura. A solução do sistema de equações formado pelas condições de contorno,
condições iniciais e pela lei de Fick aplicável, inicia-se com a transformação da
variável concentração empregando procedimentos clássicos de álgebra linear. O
objetivo da transformação é desacoplar as equações que representam a difusão de
cada soluto. A transformação de variável está baseada no teorema das matrizes
semelhantes. Através da transformação, obtêm-se a Equação 9, em termos matriciais,
e as Equações 10 e 11, de maneira desacoplada em termos das variáveis
transformadas.
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Onde: e
O vetor de concentração pode ser obtido através da Equação 5.
Onde:
A solução aproximada para pequenos valores de Fourier (Fo<0,1), ou seja, para
tempos curtos, pode ser descrita pela Equação 12.
Onde, , com λ representando os autovalores, erfc indica a função erro
complementar e o número de Biot para transferência de massa (Bi) é igual a
O número de Biot para massa pode ser interpretado como a razão entre a resistência
interna e a resistência externa. Quanto maior Bi, menor será a influência da resistência
externa sobre o mecanismo de difusão. Se Bi>200, o erro relativo no coeficiente de
difusão, devido ao fato de se desprezar a resistência externa, é menor do que 1%.
A aplicação do modelo foi construída num programa computacional em linguagem
Fortran 90. Os coeficientes de difusão e o número de Biot foram ajustados através do
método de otimização simplex, minimizando os erros em relação aos valores
experimentais.
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Para comparação com os dados de concentração experimentais, os quais
representam a concentração média da amostra cilíndrica, foi necessário calcular as
concentrações médias em relação ao volume em cada ponto simulado através de
integração numérica usando o método de Gauss.
Para a realização do procedimento da solução numérica, foi projetada uma malha,
com as mesmas dimensões do queijo trabalhado, para encontrar o elemento de
interpolação que coincide com o local da amostragem para a realização do
procedimento experimental. O Método dos Elementos Finitos (MEF) serviu para
prever a concentração final do soluto em equilíbrio, bem como a concentração em um
determinado instante e/ou posição.
RESULTADOS
A variação de concentração de NaCl e KCl experimentais e modeladas em função dos
dias de maturação pode ser observada na Tabela 6.
As estimativas para os coeficientes aparentes de difusão e o número de Biot
encontram-se na Tabela 7.
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O perfil dos valores experimentais e o perfil dos valores estimados para os sais NaCl
e KCl pode ser visto na Figura 4.
A Figura 5 a seguir, mostra o perfil de distribuição salina para o NaCl, e a Figura 6
mostra o perfil de distribuição salina para o KCl, durante 60 dias de maturação, ambos
estimados pelo MEF.
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CONCLUSÕES
O valor do número de Biot foi considerado pequeno (menor do que 100), indicando
que a resistência externa à transferência de sais durante a salga influencia o
mecanismo de difusão, quando se utiliza uma salmoura estática.
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O coeficiente aparente de difusão principal do NaCl (D11) é menor do que o do KCl
(D22), indicando que como os íons potássio são maiores, formam redes mais fracas
com a matriz protéica do queijo, pode-se especular ainda a existência de um maior
poder polarizante do sódio em relação ao potássio, permitindo assim uma maior
fluidez do potássio na água do queijo. Além disso, a proporção de KCl foi menor na
salmoura, sugerindo que a migração do KCl seja mais rápida (fácil) do que a do NaCl.
Os valores dos coeficientes cruzados foram menores do que os dos coeficientes
principais, indicando que a difusão em relação ao próprio gradiente é mais importante
do que a interferência de um soluto em relação ao fluxo do outro, podendo também
ser considerados praticamente dissociáveis.
A estimativa para o coeficiente aparente (ou efetivo) de difusão do NaCl ficou de
acordo com os valores citados, ou seja, entre 0,18 a 0,25 cm2/dia. O coeficiente
correspondente para o KCl, tanto quanto se sabe, na maturação do queijo Prato, como
estimativa é uma informação nova.
Apesar dos perfis estimados, para o NaCl e o KCl, serem superestimados em relação
aos dados experimentais respectivos é notável que a difusão multicomponente tenha
sido satisfatoriamente simulada na maturação, considerando-se a hipótese
simplificadora de um sistema não reacional. Os valores experimentais, tanto para o
NaCl quanto para o KCl, apresentaram comportamento análogo relativamente aos
valores estimados pelo MEF. O fato de estarem superestimados pode estar
relacionado com as transformações bioquímicas (proteólise, lipólise e glicólise) que
ocorrem durante a maturação.
Como pode ser observado na Figura 5, estabelecida por simulação, uma distribuição
salina uniforme para o NaCl se daria em torno de 25 dias de maturação. A Figura 6
mostra o perfil simulado de distribuição salina para o KCl durante 60 dias de
maturação, obtendo um comportamento análogo ao NaCl. Observa-se que 25 dias de
maturação seria o suficiente para garantir uma distribuição homogênea de sal no
queijo. Na prática, porém, o período legal (de 20 a 30 dias) já haveria suficiente
homogeneidade salina para um período de validade entre 4 e 6 meses.
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Os resultados obtidos nos testes sensoriais aplicados indicaram uma ótima
aceitabilidade do queijo formulado, tornando-se, portanto, uma opção viável para
consumidores que necessitam de um queijo Prato com reduzido teor de sódio, que
corresponde a uma redução de cerca de 30% de sódio numa porção de 30g.
Para efeito deste estudo de caso, puderam ser observados e analisados:
Os fenômenos de transferência de massa envolvidos;
A aplicação de equações de transferência de massa em um caso prático;
A resolução destas equações para sistemas multicomponentes;
A abordagem e resolução computacional destas equações.
REFERÊNCIAS
[1] FIDELIS, D.A.S. Difusão multicomponente durante a maturação do queijo tipo prato. 2006. 106f. Dissertação (Mestrado em Ciência de Alimentos) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2006.
[2] BONA, E.; SILVA, R.S.S.F.; BORSATO, D.; SILVA, L.H.M. ; FIDELIS, D.A.S. Multicomponent diffusion during Prato cheese ripening: mathematical modeling using the finite element method. Ciência e Tecnologia de Alimentos, Campinas, v.30, n. 4, p. 955-963, 2010.
[3] BONA, E.; SILVA, R.S.S.F.; BORSATO, D.; SILVA, L.H.M. Difusão multicomponente durante a salga mista de queijo prato. Ciência e Tecnologia de Alimentos, Campinas, v.25, n. 2, p. 394-400, 2005.
[4] BONA, E.; SILVA, R.S.S.F.; BORSATO, D.; SILVA, L.H.M. ; FIDELIS, D.A.S.; ARAÚJO, A. Optimization of space and time discretization during the finite elemento method application to multicomponente diffusion simulation. Acta Sci. Technol., Maringá, v. 28, n. 2, p. 141-150, 2006.
[5] BONA, E.; CARNEIRO, R.L.; SILVA, R.S.S.F.; BORSATO, D.; SILVA, L.H.M. ; FIDELIS, D.A.S.; MONKEN E SILVA, L.H. Simulation of NaCl and KCl mass transfer during salting of prato cheese in brine with agitation: a numerical solution. Brazilian Journal of Chemical Engineering, v. 24, n. 3, p. 337-349, 2007.