26
Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti 1 LAZER COMO OBRA DE ARTE E A AUTOFORMAÇÃO HUMANESCENTE DO ANIMADOR SOCIOCULTURAL Profa. Dra. Katia Brandão Cavalcanti Universidade Federal do Rio Grande do Norte Brasil Recebido em 3 de abril de 2007 Aprovado em 18 de abril de 2007 Resumo O que significa fazer do lazer uma obra de arte? Este estudo, de natureza filosófica, considera como pressuposto fenomenológico a Vida como Obra de Arte, apresentando o lazer com o mesmo sentido estético atribuído à Arte e à Vida. Partindo da metáfora da obra de arte, foram concebidos alguns desenhos coreográficos para a composição de uma Dança Humanescente da Autoformação do Animador Sociocultural: 1.Simplicidade; 2.Confiança; 3.Alegria; 4.Coragem; 5.Persistência; 6.Serenidade; 7.Autotranscendência. Esses desenhos ou momentos coreográficos existenciais foram associados a sete hexagramas do I Ching respectivamente, para configurar a presença da luminosidade nas diferentes estruturas hexagramáticas que revelam conteúdos ontológicos específicos, necessários à Autoformação do Animador Sociocultural. Palavras-chave: Lazer, Autoformação Leisure as a work of art and the humanescent selformation of the sociocultural animator What is the meaning of transforming leisure into art? This philosophically- oriented study is based on the phenomenological assumption that life is comparable to a work of art, and it presents leisure with the same aesthetical sense attributed to Art and to Life. Some choreographic sketches based on the work of art metaphor were created for a Humanescent Dance of Self-Formation of the Socio-Cultural Entertainer: 1. Simplicity; 2. Confidence; 3. Joy; 4. Courage; 5. Persistence; 6. Serenity; 7.Self- Transcendence. These sketches or existential choreographic moments were respectively associated with seven I Ching hexagrams in order to frame the presence of luminosity in different hexagramatic structures that reveal specific ontological content, necessary to the Self-Formation of the Sociocultural Animator. Keywords: Leisure, Selfformation

LAZER COMO OBRA DE ARTE E A AUTOFORMAÇÃO … · diz que a visão científica e a visão poética do mundo, longe de se excluírem, se ... France11 – e a Teia da Corporeidade que

Embed Size (px)

Citation preview

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

1

LAZER COMO OBRA DE ARTE E A AUTOFORMAÇÃO

HUMANESCENTE DO ANIMADOR SOCIOCULTURAL

Profa. Dra. Katia Brandão Cavalcanti

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Brasil

Recebido em 3 de abril de 2007

Aprovado em 18 de abril de 2007

Resumo

O que significa fazer do lazer uma obra de arte? Este estudo, de natureza filosófica, considera como pressuposto fenomenológico a Vida como Obra de Arte, apresentando o lazer com o mesmo sentido estético atribuído à Arte e à Vida. Partindo da metáfora da obra de arte, foram concebidos alguns desenhos coreográficos para a composição de uma Dança Humanescente da Autoformação do Animador Sociocultural: 1.Simplicidade; 2.Confiança; 3.Alegria; 4.Coragem; 5.Persistência; 6.Serenidade; 7.Autotranscendência. Esses desenhos ou momentos coreográficos existenciais foram associados a sete hexagramas do I Ching respectivamente, para configurar a presença da luminosidade nas diferentes estruturas hexagramáticas que revelam conteúdos ontológicos específicos, necessários à Autoformação do Animador Sociocultural. Palavras-chave: Lazer, Autoformação Leisure as a work of art and the humanescent selformation of the sociocultural animator

What is the meaning of transforming leisure into art? This philosophically-oriented study is based on the phenomenological assumption that life is comparable to a work of art, and it presents leisure with the same aesthetical sense attributed to Art and to Life. Some choreographic sketches based on the work of art metaphor were created for a Humanescent Dance of Self-Formation of the Socio-Cultural Entertainer: 1. Simplicity; 2. Confidence; 3. Joy; 4. Courage; 5. Persistence; 6. Serenity; 7.Self-Transcendence. These sketches or existential choreographic moments were respectively associated with seven I Ching hexagrams in order to frame the presence of luminosity in different hexagramatic structures that reveal specific ontological content, necessary to the Self-Formation of the Sociocultural Animator. Keywords: Leisure, Selfformation

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

2

“A arte da vida consiste em

fazer da vida uma obra de arte”.

Ghandi

LAZER COMO OBRA DE ARTE E A AUTOFORMAÇÃO HUMANESCENTE DO ANIMADOR SOCIOCULTURAL

Katia Brandão Cavalcanti

O que significa fazer do Lazer uma Obra de Arte? Este estudo filosófico e epistemológico considera como pressuposto fenomenológico a Vida como Obra de Arte, apresentando o lazer com o mesmo sentido estético atribuído à Arte e à Vida. Partindo da metáfora da Obra de Arte, foram concebidos alguns desenhos coreográficos para a composição de uma Dança Humanescente da Autoformação do Animador Sociocultural: 1.Simplicidade; 2.Confiança; 3.Alegria; 4.Coragem; 5.Persistência; 6.Serenidade; 7.Autotranscendência. Esses desenhos ou momentos coreográficos existenciais foram associados a sete hexagramas do I Ching respectivamente, para configurar a presença da luminosidade nas diferentes estruturas hexagramáticas que revelam conteúdos ontológicos específicos, necessários à Autoformação do Animador Sociocultural.

LEISURE AS A WORK OF ART AND THE HUMANESCENT SELFORMATION OF THE SOCIOCULTURAL ANIMATOR

What is the meaning of transforming leisure into work of art? This philosophically-oriented study is based on the phenomenological assumption that life is comparable to a work of art, and it presents leisure with the same aesthetical sense attributed to Art and to Life. Some choreographic sketches based on the work of art metaphor were created for a Humanescent Dance of Self-Formation of the Sociocultural Animator: 1. Simplicity; 2. Confidence; 3. Joy; 4. Courage; 5. Persistence; 6. Serenity; 7.Self-Transcendence. These sketches or existential choreographic moments were respectively associated with seven I Ching hexagrams in order to frame the presence of luminosity in different hexagramatic structures that reveal specific ontological content, necessary to the Self-Formation of the Sociocultural Animator.

“A arte da vida consiste em

fazer da vida uma obra de arte”.

Ghandi

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

3

Fluindo com a metáfora da “Vida como uma Obra de Arte” e permitindo-

nos mergulhar nas profundezas das nossas emoções e sentimentos quando dançamos,

podemos reconhecer também com a lição de Mahatma Gandhi que a Arte do Lazer

consiste em fazer do Lazer Uma Obra de Arte.

O que significa fazer da Vida uma Obra de Arte? O que significa fazer

do Lazer uma Obra de Arte? Aprendemos com o sociólogo francês Joffre Dumazedier,

no início dos nossos estudos de pós-graduação na área do lazer, em 19751, que as

hipóteses científicas podem ter uma roupagem poética. Naquela época, Dumazedier nos

falava do lazer como se fosse uma flor que desabrochasse subitamente, podendo estar

envenenada ou plena de felicidade2. O rigor do seu espírito científico não impedia o uso

de metáforas e da linguagem poética para as suas explicações sociológicas sobre o lazer.

Tendo estudado com afinco as lições da Formação do Espírito Científico com um

Mestre como Bachelard, Dumazedier vivia profundamente a ciência como a “estética da

inteligência”3. Somente um profundo amor à ciência é capaz de fazer compreender e

praticar sistematicamente uma “catarse intelectual e afetiva” tão necessária ao avanço

do conhecimento para poder oferecer à razão “razões para evoluir”4.

Aprendemos também com Dumazedier a utilizar a licença poética tão

necessária à concretização de uma Imaginação Sociológica para fazer o campo

epistemológico do lazer florescer e frutificar. Às vésperas da celebração das Bodas de

Ouro da obra de Wright Mills5, é uma grande honra poder conceber e ensaiar alguns

desenhos coreográficos para uma Dança Humanescente da Autoformação do Animador

Sociocultural,6 com a mesma confiança do astrônomo-poeta Hubert Reeves quando nos

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

4

diz que a visão científica e a visão poética do mundo, longe de se excluírem, se

associam para nos fazer perceber o mundo na sua verdadeira riqueza.7

Como fazer brotar uma epistemologia do lazer centrada na emoção da

vida, no sentimento da Alegria de Viver? Como adubar cientificamente as sementes

humanescentes do lazer para poder florescer nos novos jardins das Ciências Humanas?

Um epistemólogo-poeta como Bachelard dirá: É preciso sonhar os sonhos dos poetas!

Somente sonhando com a beleza dos novos jardins floridos, os cientistas-poetas, como

floricultores, poderão vislumbrar novas formas de preparo da terra para acolher as

sementes da vivência humanescente do lazer nos campos epistemológicos das

Humanidades que valorizam o pulsar da Vida como Obra de Arte.

Uma Epistemologia Humanescente do Lazer8 deve ser sonhada. Deve ser

desejada... Deve florescer na imaginação dos cientistas-poetas para depois ser cultivada

amorosamente pelos Animadores Socioculturais. Como artistas da Alegria de Viver,

esses animadores devem aprender a trilhar com alegria pelos desafiantes percursos que a

vida nos oferece para sermos felizes. Qualquer que seja a formação institucionalizada

do Animador Sociocultural9 não é possível prescindir de uma autoformação

humanescente permanente10.

Ser Animador é assumir a responsabilidade de tornar-se fonte geradora

de alegria. Ser Animador é Ser Luminescente, capaz de irradiar luminosidade sobre si

mesmo e ao seu redor, emitindo ondas luminescentes de alegria para além do ambiente

circundante. Sua presença irradiante no mundo viaja nas emoções e sentimentos,

tornando-se memória-viva no arquivo existencial daqueles que compartilham de sua

alegria. Ser Animador é ousar fazer de sua Vida uma Obra de Arte para com a sua

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

5

beleza encantar o mundo. Como um artista dedicado, a sua tarefa estética humanescente

para consigo mesmo deverá ser permanente.

Tomamos como referências epistêmicas estruturais a Galáxia da

Autoformação apresentada pelo GRAF – Groupe de Recherche sur L’Autoformation en

France11 – e a Teia da Corporeidade que encontra-se em desenvolvimento pela

BACOR – Base de Pesquisa Corporeidade e Educação da UFRN/Brasil12. Por se tratar

de um estudo de natureza filosófico-epistemológica, optamos por estabelecer como

pressuposto fenomenológico a Vida como Obra de Arte, apresentando o lazer com o

mesmo sentido estético atribuído à Arte e à Vida. Partindo da metáfora da Obra de

Arte, foram concebidos alguns desenhos coreográficos para a composição de uma

Dança Humanescente da Autoformação do Animador Sociocultural13. Apresentamos

um conjunto de sete categorias de aprendizagem vivencial em valores humanos que,

como numa estrutura galáxica devem girar em torno de uma Fonte Luminosa, o Ser

Luminescente: 1. Simplicidade; 2. Confiança; 3. Alegria; 4. Coragem; 5. Persistência; 6.

Serenidade; 7. Autotranscendência. Esses desenhos ou momentos coreográficos

existenciais foram associados a sete hexagramas do I Ching respectivamente para

configurar a presença da luminosidade nas diferentes estruturas hexagramáticas que

revelam conteúdos ontológicos específicos, necessários à Autoformação do Animador

Sociocultural.14

A estrutura coreográfica da Dança Humanescente da Autoformação do

Animador Sociocultural foi inspirada na Dança Cósmica de um sistema planetário, no

qual os planetas giram em torno de um sol. Como corpos celestes, essas sete categorias

de aprendizagens humanescentes exercem influência recíproca simultaneamente,

formando uma corrente de energia em constante fluxo e evolução. No centro dessa

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

6

movimentação cósmica, está o Ser Luminescente que é pura energia ontológica.

Conforme evolui cada orbe de aprendizagem humanescente, torna-se capaz de irradiar

luminosidade para o conjunto do sistema. À semelhança das cores do espectro solar, a

vibração provocada pelos movimentos dançantes dessa coreografia humanescente

produzirão a luz branca do Amor, e sua intensidade dependerá da harmonia vibratória

entre os componentes do sistema.15

Para descrever e interpretar a estrutura e a dinâmica de cada componente

coreográfico dessa dança humanescente necessária à autoformação do Animador

Sociocultural, buscamos estabelecer associações específicas com sete hexagramas do I

Ching, O Livro das Mutações16. Nesta obra milenar da sabedoria oriental encontram-se

fundamentos éticos essenciais para orientar a existência humana. Com dois elementos

gráficos que representam a energia forte – Yang e a energia fraca – Yin, oito trigramas

básicos são formados, dando origem aos 64 hexagramas que constituem representações

da vida. A energia forte, luminosa, Yang é representada por uma linha contínua. A

energia fraca, ambígua, Yin é representada por uma linha fragmentada17.

Ao considerarmos o Lazer Uma Obra de Arte e o Animador

Sociocultural aquele que faz de sua Vida Uma Obra de Arte, o artista capaz de irradiar a

luminosidade da alegria para si mesmo e por uma intencionalidade humanescente,

precisamos reconhecer a Beleza como fundamental. Com Schiller aprendemos que a

“tarefa da educação estética é fazer das belezas a beleza”.18 Assim, podemos dizer que a

tarefa do Animador Sociocultural é fazer dos lazeres o lazer. Fazer do Lazer Uma Obra

de Arte!

Ter como pressuposto fenomenológico a Vida como Obra de Arte,

obriga-nos a reconhecer a Arte da Vida e a Vida da Arte, assim como a Beleza da Vida e

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

7

a Vida da Beleza. Tomamos o hexagrama 22, a Graciosidade, a Beleza, para representar

a nossa concepção da musicalidade dessa dança autoformativa do Animador

Sociocultural que bem caracteriza o Espírito da Arte, o Espírito da Alegria de Viver.

A Beleza Humanescente

Hexagrama 22 – PI

Graciosidade (Beleza)

O princípio da Beleza Humanescente representado pelo hexagrama 22,

denominado Graciosidade, Beleza, é constituído pelo trigrama do fogo abaixo e pelo

trigrama da montanha acima. Abaixo, duas linhas contínuas, fortes, envolvem uma linha

fragmentada, fraca que se posiciona no centro desse trigrama. Acima, duas linhas fracas

têm uma linha forte fazendo a ligação na terceira posição. Este hexagrama mostra um

fogo que irrompe das profundezas da terra e cujas chamas ascendem iluminando e

embelezando a montanha. A beleza da forma é necessária em todo tipo de relação entre

os seres para que a vida se realize de modo harmonioso e não desordenado ou caótico.

Trazendo esta representação do fogo que irrompe das profundezas da

terra, procurando iluminar e embelezar a montanha para a nossa interpretação da Vida

do Animador Sociocultural como Obra de Arte, podemos dizer que esta força luminosa

que irrompe do interior mais profundo do Ser é a força do amor, do afeto, das paixões,

como tão bem definiu Spinoza19 em sua Ética, no século XVII, para ser confirmado pela

Biologia do Amor com Maturana e Varela20 e pela Ciência dos Sentimentos com

Damásio21 na contemporaneidade. O Ser Luminescente que está no centro da estrutura

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

8

galáxica, em torno do qual dançam os planetas da autoformação humanescente, ao

buscar das profundezas da alma essa chama do amor, ilumina-se, irradiando

luminosidade e beleza capaz de harmonizar o ambiente a sua volta.

No trigrama fogo, a chama está representada por uma linha fraca que

movimenta-se suavemente entre as duas linhas fortes, embelezando a sua essência

forte. No trigrama montanha, a força na terceira posição significa liderança. Na

natureza, observamos que a luz forte do sol, da qual depende a vida na Terra, modifica-

se com a beleza dos movimentos da lua e das estrelas. Na vida humana, essa luz interior

suave do amor manifesta-se através da solidez dos nossos corpos e ações, expressando

emoções e sentimentos que harmonizam e embelezam o espaço-tempo de nossa

existência no mundo e com o mundo.

Para o Animador Sociocultural, é fundamental aprender a cultivar as

sementes dessa beleza interior para fazê-la brotar nos imensos jardins floridos do lazer,

onde pessoas do mundo inteiro buscam encontrar uma nova musicalidade para as suas

vidas. Esta é a primeira exigência que irá se configurar como a estrutura energética

primordial para que a Vida como Uma Obra de Arte se faça com autenticidade. Somente

vivenciando esta dinâmica estética na sua própria vida, o Animador Sociocultural será

capaz de abraçar com amor o desafio da tarefa coletiva de trabalhar para a construção de

uma Obra de Arte Aberta como é a Alegria de Viver.

A Simplicidade Humanescente

Hexagrama 61 – CHUNG FU

Verdade Interior

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

9

A Simplicidade como vivência humanescente proposta para a

autoformação do Animador Sociocultural está representada pelo hexagrama 61,

Verdade Interior, que é constituído pelo trigrama do lago abaixo e pelo trigrama do

vento acima. O lago representa a alegria e o vento representa a suavidade. Esse

hexagrama sugere a imagem do vento que sopra sobre o lago, produzindo movimentos

na superfície da água. Assim, o invisível manifesta-se em efeitos visíveis. Este

hexagrama constituído por dois trigramas que se sobrepõem de modo inverso, deixa um

espaço no centro formado por duas linhas suaves que se abrem à verdade do Ser. Esta

configuração indica a movimentação de um coração livre de preconceitos,

verdadeiramente puro em sua intencionalidade mais profunda. Ambos os trigramas

possuem uma linha forte, luminosa no meio, indicando a força da Verdade Interior.

Seus atributos são a alegria para reconhecer os propósitos existenciais mais elevados e a

suavidade para aceitar as fragilidades humanas. Para a filosofia chinesa, o ideograma Fu

– Verdade, simboliza a pata de uma ave sobre o filhote, sugerindo a idéia de chocar.

Assim, o poder vivificante do luminoso deve agir do exterior, mas é necessário que haja

um núcleo de vida no seu interior para que esta vida possa ser despertada.

A autoformação permanente do Animador Sociocultural, no que se refere

à simplicidade, significa abrir-se cada vez mais à renovação da consciência de si

mesmo. Empenhar-se cada vez mais no desapego à artificialidade da vida para valorizar

sobretudo a essência luminescente que existe em si mesmo e nos outros.

A orientação existencial implicada neste hexagrama nos conduz para

refletirmos sobre a necessidade de desenvolvermos esta força da Verdade Interior para

podermos exercer o nosso papel de Animadores Socioculturais com uma ética

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

10

humanescente. Assim, os contatos que se realizarão com os outros Seres Luminescentes

serão contatos de coração para coração, conectando-se energeticamente às essências e

não mais às aparências. Isto fortalece não só as próprias fontes luminescentes como a

própria conexão se tornará mais resistente, exatamente por sua maleabilidade

energética. Este é o poder da Simplicidade Humanescente, da Verdade Interior, que fará

desaparecer obstáculos intransponíveis nas relações entre os seres da Terra. Isto porque

será fortalecida a solidariedade luminescente da Alegria de Viver entre todos aqueles

envolvidos nessa busca de harmonia para si e para o planeta.

A Confiança Humanescente

Hexagrama 16 – YU

Entusiasmo

A Confiança como vivência humanescente necessária à autoformação

permanente do Animador Sociocultural está representada pelo hexagrama 16,

Entusiasmo, que é constituído pelo trigrama terra abaixo e pelo trigrama trovão acima,

simbolizando, respectivamente, o receptivo e o incitar. Este hexagrama é formado por

cinco linhas fragmentadas, fracas e apenas uma linha contínua, forte, representando a

possibilidade e firmeza para seguir. O trigrama abaixo, totalmente aberto, simboliza o

acolhimento da Terra aos seus filhos. O trigrama acima, com a base contínua,

representando o trovão, indica a firmeza interior necessária para que possamos nos abrir

aos mais elevados propósitos humanescentes. Abaixo está a devoção, acima está o

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

11

movimento, representando no seu conjunto a devoção ao movimento. Para a nossa vida,

isto significa o necessário envolvimento com a nossa própria humanescência.

A autoformação permanente do Animador Sociocultural através de vivências

humanescentes de Entusiasmo deve considerar as emoções que brotam das profundezas

do Ser Luminescente e que possuem uma musicalidade peculiar. Quando o Entusiasmo

canta, traz consigo a intencionalidade do compartilhar. É da própria natureza do

Entusiasmo o desejo do solidarizar-se. O irromper que produz essa canção da Vida por

mais Vida, quer celebrar a Felicidade, a Alegria de Viver!

Animar-se, antes de pretender animar qualquer ambiente ou situação, é um

grande desafio para o Animador Sociocultural. Entusiasmar-se com a Vida para tornar-

se autoconfiante do seu papel na sociedade. A tarefa de despertar o Entusiasmo, de criar

um ambiente harmonioso, pleno de Vida, começa por si mesmo. É preciso confiar na

Vida, na sua generosidade. A Vida sempre retribui cantando as nossas canções. Assim,

devemos procurar cantar com mais beleza, para que sejamos retribuídos com as mais

belas canções que a Vida pode nos oferecer.

Ao Animador Sociocultural que cabe a tarefa de entusiasmar-se com os

outros para poder gerar mais Entusiasmo para o mundo, cabe também assumir o desafio

da autoconfiança humanescente na autoprodução do seu próprio entusiasmo pela Vida.

Confiança e Entusiasmo formam um dueto que cantam e dançam as emoções e os

sentimentos da Alegria de Viver.

A Alegria Humanescente

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

12

Hexagrama 58 – TUI

Alegria (Lago)

A Alegria como uma vivência humanescente que deve compor o processo da

autoformação permanente do Animador Sociocultural está representada pelo hexagrama

58, também identificado no I Ching por Alegria, sendo constituído pelo trigrama do

lago abaixo e acima, formando assim dois lagos sobrepostos. Tui significa filha mais

nova, tendo como símbolo um lago sorridente e como atributo a alegria. Essa

jovialidade não se origina na maleabilidade das duas linhas Yin que se apresentam na

última posição de cada trigrama. A alegria se configura pelo fato de haver duas linhas

fortes no interior de cada trigrama que se expressam através da suavidade e da gentileza.

A autoformação permanente do Animador Sociocultural deve privilegiar a

vivência humanescente da alegria, como uma emoção, como um sentimento que brota

do cultivo da harmonia interior, capaz de envolver a própria fonte com ternura,

irradiando intensa beleza a sua volta. Tui é o lago que alegra e refresca todos os seres.

Tui é também a boca que comunica os sentimentos de alegria do Universo. Nessa

perspectiva, o Animador Sociocultural deve ter presente cada vez mais em sua

consciência, em seu coração, a sua função como fonte geradora de beleza que irradia o

sentimento da Alegria de Viver.

Sendo alegria um estado de ânimo contagiante, promove a realização, o

êxito. No entanto, devemos considerar como referência fenomenológica primordial, a

serenidade própria da imagética do lago para que este estado de vibração prazerosa não

se degenere em euforia sem sentido. A verdade e a força devem ser cultivadas nas

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

13

profundezas do coração para que a suavidade possa desabrochar alegremente nas

relações do Ser Luminescente consigo mesmo, com o outro, com a natureza e com o

mundo. O poder da alegria como uma vivência humanescente é o poder de fazer vibrar

o nosso mais puro sentimento de amor à vida.

A imagem do hexagrama da Alegria, lagos que repousam um sobre o outro,

representa também a sociabilidade e a busca do conhecer e do sentir. Um lago pode se

evaporar aos poucos até se esgotar. Mas, quando dois lagos estão unidos, não secam tão

facilmente porque um alimenta o outro. Para a autoformação humanescente do

Animador Sociocultural, esta imagem sugere que no campo do conhecimento de si, este

saber deve se transformar em força renovadora e vitalizadora, sendo possível quando se

propicia um ambiente criativo com pessoas abertas às novas experiências com o outro

para conhecer e sentir as novas verdades da vida. Assim, o autoconhecimento se amplia

incorporando múltiplas perspectivas, tornando-se mais leve e jovial, portanto, mais

lúdico. Toda a simbologia implicada na imagem da união dos lagos, traduz o sentimento

de alegria cultivado na plenitude do coração que desabrocha para encantar-se cada vez

mais com a vida.

A Coragem Humanescente

Hexagrama 51 – CHÊN

O Incitar (Comoção, Trovão)

A Coragem na autoformação humanescente do Animador Sociocultural

está representada pelo hexagrama 51, o Incitar – Comoção, Trovão, sendo constituído

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

14

pelo trigrama trovão, tanto abaixo como acima. A imagem de um trovão seguido de

outro, desencadeando um contínuo trovejar é algo ameaçador. O trigrama trovão é

formado por uma linha Yang, forte abaixo de duas linhas Yin, fracas, elevando-se com

bastante vigor num movimento tão violento que provoca terror. Nesta simbologia, o

trovão irrompe da terra causando com seu impacto temor e tremor. Quando o Ser

Luminescente, das profundezas de sua alma, compreende o significado de temor e

tremor, torna-se livre de qualquer medo provocado por condições externas.

O que significa a vivência humanescente da coragem na autoformação

permanente do Animador Sociocultural? A coragem não é um saber que se adquire

conhecendo episódios heróicos da vida das pessoas. Coragem é uma expressão humana

de firmeza diante dos enfrentamentos adversos da vida. Coragem implica atitude diante

dos desafios que a vida oferece para crescermos, para Humanescermos. É preciso

coragem para que possamos nos reconhecer como Seres Luminescentes, geradores de

luz que ilumina não só a própria caminhada, mas também compartilha intencionalmente

ou não, com a sua irradiação luminosa, da caminhada do outro.

A coragem de se afirmar como um Ser Luminescente num contexto

imagético em que o eclodir dos trovões de forma contínua, atingindo grandes distâncias,

espalha temor a milhares de pessoas, somente um espírito autoconfiante e entusiasmado

com a tarefa da construção de sua Obra de Arte Ontológica, poderá seguir sua

caminhada sem se abalar interiormente porque já compreendeu as conexões cósmicas

do seu existir, implicadas na sua corporeidade.

A imagem de tremor e temor trazida pelo hexagrama do Incitar, refere-se à

necessidade de se aprender a lidar com a perplexidade e com as perdas. Para enfrentar

tais situações de perigo, é preciso ter agilidade para saber tomar decisões de impacto

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

15

que repercutem no próprio projeto de vida. Aprender a enfrentar situações de risco, não

só corporais mas também espirituais, eis a proposta para o Animador Sociocultural

incluir na sua autoformação permanente.

A Persistência Humanescente

Hexagrama 53 – CHIEN

Desenvolvimento (Progresso Gradual)

A Persistência como vivência humanescente na autoformação permanente

do Animador Sociocultural está representada pelo hexagrama 53 do I Ching,

denominado Desenvolvimento – Progresso Gradual, sendo constituído pelo trigrama

Quietude – Montanha abaixo e pelo trigrama Suavidade – Vento – Madeira acima. O

hexagrama 53 traz a imagem de uma árvore que se desenvolve lentamente na montanha,

mantendo-se firmemente enraizada. Esta representação sugere a idéia de um

desenvolvimento que avança gradualmente, passo a passo. Os atributos constituintes

dos trigramas indicam a tranqüilidade interior como proteção para evitar atitudes

precipitadas e o poder penetrante da suavidade que possibilita o desenvolvimento e o

progresso.

Vivenciar a Persistência Humanescente no decorrer do processo de

autoformação permanente do Animador Sociocultural significa exercitar continuamente

pequenas mudanças na estrutura do seu Ser Luminescente como a sutileza de detalhes

que fazem a diferença numa Obra de Arte. Como as formalidades que devem ser

cumpridas para que uma cerimônia de casamento se realize, as aprendizagens vivenciais

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

16

de Persistência exige constante aprimoramento moral. É importante saber fluir, porque a

precipitação não contribui para resultados humanescentes duradouros. A tranqüilidade

interior deve manifestar-se exteriormente como suavidade, capaz de adaptar-se a

diferentes situações desafiantes da vida, ao mesmo tempo que sabe ser penetrante. Para

o Animador Sociocultural, trata-se de um aprendizado que precisa constantemente

mobilizar nas suas ações para fazer fluir a Alegria de Viver.

A Persistência Humanescente como uma árvore que cresce sobre a

montanha, pode ser vista de longe, e o seu desenvolvimento exerce uma influência

positiva na paisagem do local. Não podendo crescer rapidamente como as plantas do

pântano, o seu desenvolvimento é gradual. Assim, para que o Ser Luminescente exerça

uma influência positiva sobre o mundo, é necessário que a sua personalidade adquira

autoridade pelo exemplo de aperfeiçoamento moral que se alcança no decorrer de um

longo percurso de vida.

A Serenidade Humanescente

Hexagrama 57 – SUN

A Suavidade (O Penetrante, O Vento)

A Serenidade como uma vivência humanescente da autoformação do

Animador Sociocultural, está representada pelo hexagrama 57 – SUN, que significa a

Suavidade, o Penetrante, o Vento. Este hexagrama é constituído pelo trigrama Vento,

Suavidade, Madeira, tanto abaixo como acima. Como atributo desse hexagrama, a

suavidade é tão penetrante como o vento ou como a madeira através de suas raízes.

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

17

Assim, o princípio da escuridão é dissolvido pelo penetrante princípio do luminoso,

como o vento dispersa as nuvens acumuladas no céu, deixando-o claro e sereno. Na

autoformação humanescente do Animador Sociocultural, a viagem interior para a sua

contínua autotransformação como Ser Luminescente vai removendo as sombras no seu

coração, tornando os seus sentimentos cada vez mais irradiantes da luz da Alegria de

Viver. Para a sua tarefa de animação, esta irradiação de alegria é como o vento,

penetrando suavemente nos corações e despertando emoções que passam a vibrar com

mais harmonia e beleza.

O aprendizado permanente da Serenidade Humanescente pelo Animador

Sociocultural é algo extremamente necessário para que a sua intervenção na sociedade

não se confunda com a simples movimentação ou agitação de pessoas e grupos com

aparência de alegria. A sua penetrante clareza da perspectiva humanescente do lazer

poderá dissolver muitas das sombrias expectativas artificiais criadas pela cultura de

consumo. A sua serena personalidade contribuirá para elevar o valor ético da Alegria de

Viver plenamente humanescente.

A suavidade penetrante produz efeitos graduais e imperceptíveis. Para isso, é

preciso ter clareza de propósitos, de modo que a ação constante na mesma direção possa

favorecer a obtenção de resultados humanescentes esperados. Aprender com a

suavidade do vento a serenar o coração, para que este possa então irradiar sentimentos

de Serenidade para acolher corações aflitos que perderam o verdadeiro sentido da vida e

da Alegria de Viver.

A Serenidade Humanescente na Vida do Animador Sociocultural é uma

conquista de elevado valor ontológico. A sua harmonização interior é fundamental para

que possa fluir suavemente com a diversidade cultural dos ventos que sopram no campo

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

18

das vivências do lazer. Tal como um artista, a sua tarefa estética é fazer das alegrias da

vida a Alegria de Viver.

A Autotranscendência Humanescente

Hexagrama 10 – Lu A Conduta (Trilhar)

A Autotranscendência Humanescente como vivência da autoformação

permanente do Animador Sociocultural está representada pelo hexagrama 10 – LU,

denominado de A Conduta – Trilhar, sendo constituído pelo trigrama Alegria abaixo e

pelo trigrama O Criativo acima. O significado desse hexagrama refere-se ao modo ético

de se comportar em sociedade. Acima o céu, o pai e abaixo o lago, a filha mais moça.

Os dois trigramas realizam movimentos ascendentes.

Para o Animador Sociocultural, a vivência de autotranscendência

humanescente na sua autoformação permanente significa a manutenção do contínuo

diálogo entre o poder da alegria e o poder do criativo. Como ambos se abrem à

verticalidade, dependendo da intensidade do movimento de cada um e do momento em

que se encontram, definem um tipo de envolvimento específico entre os dois. Nessa

dança entre a alegria e o criativo, é a alegria que impulsiona o criativo para ir mais

além. Há, portanto, uma direcionalidade ascendente que busca o céu, o infinito.

Na Dança Humanescente da Autoformação do Animador Sociocultural, a

coreografia do trilhar entre a alegria e o criativo tem um valor ontológico peculiar por

conduzir o Ser Luminescente ao encontro com o Infinito Espiritual, com a Obra de Arte

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

19

Maior. A alegria que é vivenciada com a totalidade do nosso Ser Luminescente é capaz

de produzir um determinado padrão vibratório de harmonia cósmica nos conduzindo

naturalmente a autotranscendência, a auto-iluminação da nossa própria Obra de Arte

Ontológica.

Para dar vida a esta concepção de autotranscendência humanescente que

celebra com Dionísio o encontro da Alegria e do Criativo para além das culminâncias

montanhosas, trazemos Nietzsche que tão bem soube esculpir com sangue o sonho de

Viver a Vida como Uma Obra de Arte.

Em janeiro de 1882, após conceber inicialmente o personagem Zaratustra

para a sua futura obra-prima, e estando envolvido com a criação do livro “A Gaia

Ciência”, Nietzsche refletia sobre sua época em que todos se permitiam expressar os

seus mais elevados desejos e pensamentos e então ele gostaria também de revelar o que

mais desejava e qual tinha sido o primeiro pensamento a brotar do seu coração naquele

início de ano. Pensamento que deveria tornar-se razão, garantindo a doçura de toda a

existência que acreditava ainda ter, expressando-se assim: “Desejo aprender cada vez

mais a ver o belo na necessidade das coisas: É assim que serei sempre daqueles que

tornam as coisas belas. Amor fati (amor ao destino): seja assim, de agora em diante, o

meu amor”22. Explicava o seu pensamento, afirmando que não pretendia fazer guerra ao

que fosse feio, nem acusar, mesmo os acusadores. Sua atitude implicava em desviar o

olhar como única forma de negação. A partir daquele momento pretendia se tornar

simplesmente uma pessoa que dizia Sim à Vida.

Um filósofo, um poeta, um educador que disse sim à vida, que compôs um

Hino à Vida, que concebeu sua obra-prima Zaratustra como um Musical da Vida para a

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

20

Vida, tornou-se um símbolo extraordinário de autotranscendência, tendo demonstrado

com a própria vida o profundo significado da sua “vontade de potência”.

A Alegria de Viver e o Animador Sociocultural:

Para Fazer da Vida Uma Obra de Arte

Fazer da Vida uma Obra de Arte! Convidamos Nietzsche para ser o nosso

guia nessa aventura epistemológica que busca configurar o Lazer como Obra de Arte e

propor uma autoformação humanescente para o Animador Sociocultural, de modo que

este possa corajosamente desbravar as trilhas sinuosas da Alegria de Viver e assim

poder contribuir para transformar a enorme diversidade cultural de vivências do lazer

em autênticas Obras de Arte da Vida.

Nietzsche é um filósofo-poeta da Vida. O seu filosofar existencial sobre a

vida humana não pode ser separado de uma compreensão da história, da cultura e da

política,23 mas sob um novo paradigma estético. O ser humano ressurge como “Obra de

Arte da Vida”, contrapondo-se a “um logocentrismo dogmático do princípio da razão”,

que o afastou da relação com o seu ser interior, ou seja, que o distanciou das

profundezas da sua natureza.24 Para Nietzsche, “só como fenômeno estético podem a

existência e o mundo justificar-se eternamente”25. Sobre a essência da arte, expressava-

se assim o filósofo-poeta:

Somente na medida em que o gênio, no ato da procriação artística, se funde com o artista primordial do mundo, é que ele sabe a respeito da perene essência da arte; pois naquele estado assemelha-se, miraculosamente, à estranha imagem do conto de fadas, que é capaz de revirar os olhos e contemplar-se a si mesma; agora ele é ao mesmo tempo sujeito e objeto, ao mesmo tempo poeta, ator e espectador26.

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

21

Para Nietzsche, só uma revolução dionisíaca da existência humana na

contemporaneidade faria emergir uma nova cultura do vivido, onde a arte retornaria às

fontes do seu impulso metafísico, podendo “reassumir o seu papel no jogo estético da

existência”, e o ser humano retomaria “o poder de vivenciar-se e mirar-se na plenitude

de seu ser e seu devir”. A Obra de Arte do futuro deveria adquirir “o sentido de uma

totalização utópica da Vida pela Arte, com o espetáculo de sua celebração...”27.

“Humano, Demasiado Humano” não é apenas o título de uma obra filosófica

de Nietzsche, mas simboliza a sua “vontade de potência” para a autotranscendência: “é

o monumento comemorativo de uma crise”. Um livro dedicado aos “espíritos livres”28.

Declara o filósofo-poeta que nunca foi mais feliz do que no período em que sua saúde

esteve gravemente ameaçada por doenças. Só assim pôde compreender o retorno a si

mesmo: “uma forma superior de cura! A outra cura foi uma conseqüência dessa”.29

Um filósofo que passou e volta a passar por numerosos estados de saúde, passa igualmente por outras tantas filosofias: não pode fazer, de cada vez, outra coisa senão espiritualizar seu estado. [...] Viver é para nós transformar em luz e flama tudo aquilo que somos e também tudo aquilo que nos atinge; não podemos agir de outra maneira [...] Duvido que semelhante sofrimento nos aperfeiçoe... mas sei que nos torna mais profundos [...] Ainda lhe é possível amar a vida; apenas de modo diferente [...] Conhece-se uma felicidade nova...30

Fazer da Vida uma Obra de Arte! Eis o princípio norteador para a aventura

epistemológica nos terrenos montanhosos do Lazer. Um convite aos animadores-poetas

que desejam mais Vida para as suas Vidas, mais Vida para a Animação Sociocultural.

Imaginar e vivenciar as emoções mais profundas do Ser Luminescente no

topo da montanha! É uma aventura para aqueles que sabem sonhar o sonho dos

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

22

desbravadores. A metáfora da altura é por excelência uma metáfora axiomática. Aos

Animadores Socioculturais:

Não se pode dispensar o eixo vertical para exprimir os valores morais. Quando tivermos compreendido melhor a importância de uma física da poesia e de uma física da moral, chegaremos a esta convicção: toda valorização é verticalização. [...] É na viagem para cima que o impulso vital é o impulso hominizante.31

Nietzsche é o filósofo que bem representa o complexo da altura. Na

dinâmica simbólica da ascensão, com muita naturalidade, o gênio uniu o pensamento à

imaginação para produzir mais pensamento. Bachelard traz a expressão de Milosz,

“Superior, ele sobrepuja”, para reverenciá-lo: “Ele nos ajuda a sobrepujar porque

obedece com maravilhosa fidelidade à imaginação dinâmica da altura”.32

Subir a montanha para epistemologizar o Lazer como Obra de Arte!

Montanha que simboliza transcendência, encontro cósmico entre o céu e a terra. Subida

rumo ao desconhecido, ao inusitado. É preciso desapegar-se de idéias e sentimentos

pesados. Escalar a montanha da Epistemologia da Vida pressupõe leveza de corpo e

alma. Desejo de transmutar valores que envolvem o Ser Luminescente na sua totalidade.

A nossa imaginação nos conduziu ao topo da montanha. Aqui, Ciência,

Filosofia, Arte e Espiritualidade se misturam como realidade e virtualidade. Juntamente

com outros animadores-desbravadores, estamos prontos para a tarefa epistemológica

que aceitamos como desafio.

Na montanha da Beleza representada pelo hexagrama 22 do I Ching, é o

fogo que a ilumina, que a embeleza e que simboliza a Vida. Estando no alto da

montanha, sentimos o poder dessa luminosidade que irrompe das profundezas da Terra.

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

23

Como seres da Natureza que somos, temos plena consciência do poder da nossa chama

interior, mas ainda não sabemos mobilizá-la adequadamente para um Bem Maior.

Com Nietzsche, aprendemos que aqueles que pensam sobre a vida como

filósofos deveriam ser os mais importantes Animadores da Vida, da Vontade da Vida,

devendo mostrar sua Vida concretamente vivida como exemplo de sua Filosofia de

Vida. Assim, a Filosofia e a Vida de um pensador deveriam ser apreciadas como Obra

de Arte, por sua beleza e por servir como modelo de uma “bela possibilidade de vida”.

Animadores Socioculturais, como os filósofos de Nietzsche, deveriam se

aprimorar na Arte da Alegria de Viver para assim poderem exibir com dignidade a sua

autêntica Obra de Arte Viva, corporalizada no seu existir humanescente.33

Referências

ANSELL-PEARSON, Keith. 1997. Nietzsche como pensador político: uma introdução. Trad.: Mauro Gama, Cláudia Martinelli. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. BACHELARD, Gaston. 1996. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Trad: Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Contraponto, BACHELARD, Gaston. 2001. O ar e os sonhos: ensaio sobre a imaginação do movimento. 2ª ed. Trad: Antônio de Pádua Danesi. São Paulo: Martins Fontes. DAMÁSIO, António. 2004. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos sentimentos. Adaptação para o português do Brasil: Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras. GUINSBURG. Jacob. 2003. Nietzsche no teatro. In: NIETZSCHE, Friedrich Willhelm. O nascimento da tragédia ou helenismo e pessimismo. Trad.: J. Guinsburg. São Paulo: Companhia das Letras. MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. 1997. De máquinas e seres vivos: autopoiese – a organização do vivo. Porto Alegre: Artes Médicas. NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. 2004. A gaia ciência. Trad: Jean Melville. São Paulo: Martin Claret.

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

24

SCHILLER, Friedrich. 1995. A educação estética do homem, numa série de cartas. 3ª ed. Trad.: Roberto Schwartz, Márcio Suzuki. São Paulo : Iluminuras. SPINOZA, Baruch. 2003. Ética, demonstrada à maneira dos geômetras. São Paulo: Martin Claret. WILHELM, Richard. 1991. A sabedoria do I Ching. Mutação e permanência. São Paulo: pensamento. WRIGHT MILLS, Charles. 1975. A imaginação sociológica. Rio de Janeiro: Zahar

Dados da autora

Licenciada em Educação Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1974, fez Especialização em Lazer e Recreação na PUC do Rio Grande do Sul em 1976; Mestrado em Educação Física na UFRJ em 1982; Doutorado em Filosofia na UGF em 1984; Pós-Doutorado em Motricidade Humana na Universidade Técnica de Lisboa em 1994. Coordena a Linha de Pesquisa Corporeidade e Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN, Brasil, desde 1996. É Bolsista de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq (2003-2007). E-mail para contato: [email protected]

Notas

1 Curso de Especialização em Lazer e Recreação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 2 Concepção publicada no livro Questionamento Teórico do Lazer que resumiu as palestras proferidas no Curso de Especialização em Lazer e Recreação, em 1975. 3 Para Bachelard, “no estado de pureza alcançado por uma psicanálise do conhecimento objetivo, a ciência é a estética da inteligência” (Bachelard, 1996, p. 13, publicado em 1938). 4 ibid, p. 24: “colocar a cultura científica em estado de mobilização permanente, substituir o saber fechado e estático por um conhecimento aberto e dinâmico, dialetizar todas as variáveis experimentais, oferecer enfim à razão razões para evoluir”. 5 A Imaginação Sociológica de Wright Mills publicada em 1958. 6 A metáfora da Dança Humanescente da Autoformação do Animador Sociocultural envolve três conceitos fundamentais: Dança, Humanescência e Autoformação. Esses conceitos são expressões da Vida que se articulam em torno da Humanescência, que se refere ao processo de desenvolvimento do Ser através da mobilização de sua energia luminescente. Escolhemos a dança por representar uma estrutura estética fluida de manifestação da Vida, como tão bem demonstrou Isadora Duncan. A Autoformação como uma dança humanescente pretende captar o sentido atribuído por Joffre Dumazedier ao longo de toda sua militância política, científica e educativa quando destacava o papel da autoformação como lazer e vice-e-versa. Ver Penser l’autoformation: société d’aujourd’hui et pratiques d’autoformation. 7 Hubert Reeves em Malicorne: reflexões de um observador da natureza. Na apresentação de sua obra dedicada aos enamorados da Ciência e da Poesia, Reeves ressalta que ao longo de todo o livro a noção do jogo se faz muito presente na elaboração da complexidade cósmica. Denomina de “espaços de liberdade”, onde esses jogos podem ser jogados, tanto na dimensão cósmica como na dimensão humana. 8 Para sonhar uma Epistemologia Humanescente do Lazer, Dumazedier nos deixou inúmeras pistas. Uma obra recente, organizada por Georges Le Meur, vários pesquisadores que conviveram com Dumazedier apresentam depoimentos emocionantes sobre sua marcante personalidade como Homem e Pesquisador do Humano. 9 Ver Le métier d’animateur e Guide de l’animateur socio-culturel.

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

25

10 A Autoformação Permanente do Educador e do Animador Sociocultural sempre foi uma preocupação de Dumazedier que complementava os seus estudos da Sociologia do Lazer. Na sua obra La Leçon de Condorcet, fruto de uma jornada acadêmica para celebrar os duzentos anos do Rapport Condorcet (1792-1992), pode-se encontrar essas reflexões ao longo das suas exposições e comentários. 11 A Galáxia da Autoformação é uma estrutura conceitual adotada pelo GRAF, sendo constituída por um núcleo central que representa a Autoformação por Si Mesmo, e mais cinco categorias específicas que giram em torno desse núcleo central: Autodidaxia (apropriação dos saberes fora dos sistemas educativos); Autoformação Cognitiva (aprender a aprender); Autoformação Educativa (aprender nos dispositivos abertos); Autoformação Social (aprender no e para o grupo social); Autoformação Existencial (aprender a ser). 12 A Teia da Corporeidade é uma metáfora epistemológica que encontra-se em desenvolvimento pelo Grupo BACOR/UFRN/Brasil, articulando princípios como a ludicidade, a criatividade, a sensibilidade, a reflexividade para a construção de saberes e sentimentos humanescentes. 13 A Dança Humanescente concebida para representar epistemologicamente a Autoformação do Animador Sociocultural foi inspirada em Isadora Duncan que fez da Dança sua Vida, sua Obra de Arte. Uma composição coreográfica com oito estruturas corpóreas em movimento contínuo que giram em torno de uma estrutura luminescente primordial, interagindo reciprocamente. 14 Para cada componente da Galáxia da Autoformação Humanescente foi associado um hexagrama do I Ching como metáfora para caracterizar poeticamente aquele princípio humanescente. Para o núcleo central que traz condensada a energia da Beleza Humanescente da Obra de Arte, associamos o hexagrama 22, Graciosidade (Beleza). Para a Simplicidade Humanescente – o hexagrama 61, Verdade Interior; para a Confiança Humanescente – o hexagrama 16, Entusiasmo; para a Alegria Humanescente – o hexagrama 58, Alegria (Lago); para a Coragem Humanescente – o hexagrama 51, O Incitar (Comoção, Trovão); para a Persistência Humanescente – o hexagrama 53, Desenvolvimento (Progresso Gradual); para a Serenidade Humanescente – o hexagrama 57, A Suavidade (O Penetrante, O Vento); para a Autotranscendência Humanescente – o hexagrama 10, A Conduta (O Trilhar). 15 A intensidade do brilho do Ser Luminescente depende, portanto, da harmonia de cada estrutura de autoformação humanescente como da beleza do seu conjunto. 16 Richard Wilhelm inicia a introdução de sua tradução do I Ching com essas palavras: “É sem dúvida, uma das mais importantes obras da literatura mundial. Sua origem remonta a uma antiguidade mítica, tendo atraído a atenção dos mais eminentes eruditos chineses até os nossos dias. Tudo o que existiu de grandioso e significativo nos três mil anos de historia cultural da China ou inspirou-se nesse livro ou exerceu alguma influência na exegese do seu texto” (Wilhelm, 1989). 17 De acordo com Richard Wilhelm (1991), o fator decisivo no pensamento chinês é o reconhecimento da mutação como essência primordial. Esta concepção se coloca numa posição intermediária entre o Budismo e a Filosofia Existencial Ocidental: oposição e união são geradas em conjunto no tempo. Para se encontrar a harmonia entre o interior e o exterior é necessário encontrar o posicionamento devido e este está no centro. 18 Em A Educação Estética do Homem, Schiller vai afirmar que “não errará jamais quem buscar o ideal de beleza de um homem pela mesma via em que ele satisfaz seu impulso lúdico”. Buscando inspiração em Vênus, Juno e Apolo, Schiller vai trazer a razão para anunciar com ela: “o homem deve somente jogar com a beleza e somente com a beleza deve jogar”. E tendo a beleza como aliada da razão, Schiller vai esculpir para a eternidade um pensamento lapidar: “o homem joga somente quando é homem no pleno sentido da palavra, e somente é homem pleno quando joga”. O seu entusiasmo pela Beleza Ideal era tão presente na sua vida, manifestando-se com clareza nesta afirmação: “o belo ideal, embora indivisível e simples, em contextos diversos apresenta tanto uma propriedade suavizante quanto uma enérgica; na sua experiência existe uma beleza suavizante e outra enérgica. Isso é e será assim sempre que o absoluto seja posto nos limites do tempo e as Idéias da razão devam ser realizadas na humanidade”. E assim para Schiller, “a tarefa da educação estética é fazer das belezas a beleza”. 19 Spinoza usa o termo “afecções” para tratar da vida das emoções. Iniciando a discussão sobre a origem e natureza das emoções na parte III da Ética, o filósofo afirma categoricamente que: “a maior parte daqueles que escrevem sobre as afecções e a maneira de viver dos homens parecem ter tratado, não das coisas naturais que seguem as leis comuns da Natureza, mas de coisas que estão fora da Natureza”. A sua definição de emoção aceita hoje pela Neurociência, traz também a noção da “potência de agir” que aumenta ou diminui conforme a natureza positiva ou negativa da emoção. 20 Maria Cândida Moraes, na sua obra Educar na Biologia do Amor e da Solidariedade desenvolve conceitos da teoria de Maturana e Varela para o campo da educação. Ao apresentar a sua obra, destaca

Animador Sociocultural: Revista Iberoamericana vol.1, n.2, mai.2007/set.2007 Lazer e autoformação do animador sociocultural Cavalcanti

26

que: “educar e aprender são fenômenos biológicos fundamentais que envolvem todas as dimensões do ser humano, em total integração do corpo e do espírito, e do ser com o fazer”. Acrescenta ainda que “educar na biologia do amor e da solidariedade implica a integração entre o sentir, o pensar e o agir, a integração entre razão e emoção, o resgate do sentimento como expressão da nossa verdade interior”. 21 António Damásio tratou das emoções em três obras que se complementam: O Erro de Descartes, O Sentimento de Si e Em Busca de Espinosa. Nesta última, o autor focaliza especificamente os sentimentos, o que são e o que fazem, procurando descrever o progresso que se tem feito no entendimento da natureza e significado humano dos sentimentos como neurologista e neurocientista. 22 Nietzsche, 2004a, A Gaia Ciência, p. 143 23 Ansell-Pearson, 1997, p. 17. 24 Guinsburg, 2003, p. 156. 25 Nietzsche, em O Nascimento da Tragédia, p. 47. 26 ibid, p. 48. 27 A Vida pela Arte (o grifo é nosso) Guinsburg, op. cit., pp. 170-171. 28 Nietzsche em Humano Demasiado Humano faz uma representação da Filosofia como o “desmancha-prazeres da ciência”: “A filosofia se divorciou da ciência ao indagar com qual conhecimento da vida e do mundo o homem vive mais feliz. Isso aconteceu nas escolas socráticas: tomando o ponto de vista da felicidade, pôs-se uma ligadura nas veias da investigação científica - o que se faz até hoje”. 29 Nietzsche, 2004b, p. 89. 30 Nietzsche, 2004a, pp. 16-17. 31 Bachelard, 2001, p. 11. Para o autor, “o dinamismo positivo da verticalização é tão nítido que se pode anunciar este aforismo: quem não sobe, cai”. 32 ibid, pp. 16-17. 33 Sobre a temática da corporeidade, humanescência e lazer, ver artigo publicado pela Associação de Estudos do Lazer – LSA, março, 2007.