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COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS XXV SEMINÁRIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS SALVADOR, 12 A 15 DE OUTUBRO DE 2003 1 T92– A21 MODELAÇÃO NUMÉRICA E EXPERIMENTAL DA ROTURA PELA FUNDAÇÃO DA BARRAGEM DE ALQUEVA Jorge P. Gomes J. Vieira de Lemos Carlos B. Pina LABORATÓRIO NACIONAL DE ENGENHARIA CIVIL DEPARTAMENTO DE BARRAGENS DE BETÃO RESUMO A validação dos resultados de modelos matemáticos utilizados no estudo de cenários de rotura de barragens de betão, é por vezes difícil, devido à inexistência de resultados provenientes da observação de situações reais de colapso. Assim, os modelos experimentais são uma eficiente via para a obtenção de resultados comparáveis com os modelos matemáticos. Neste artigo, apresenta-se um exemplo de aplicação conjunta de métodos experimentais e numéricos para determinação do coeficiente de segurança da barragem de Alqueva num cenário de rotura por deslizamento de parte do maciço de fundação. São apresentados os resultados do modelo matemático desenvolvido baseado no método dos elementos discretos (discretização do maciço de fundação) e elementos finitos (na barragem). Este modelo tem por objectivo, numa primeira fase, apoiar a preparação do ensaio e, após a validação deste, interpretar os resultados experimentais, através do ajustamento dos parâmetros do modelo matemático. ABSTRACT The validation of the results of the mathematical models used in the study of rupture scenarios of concrete dams is sometime difficult, due to inexistence of results from real situations of collapse. So, the experimental models are an efficient way to obtain results to compare with the mathematical models. In this article, it is presented an application with experimental and numerical methods for the determination of the safety coefficient of Alqueva dam, in a rupture scenario of sliding of part of the rock foundation. The results of the developed mathematical model, based on the distinct element method (for the representation of the rock foundation) and finite elements (in the dam), are presented. This model is intended in a first phase to support the execution of the test and in a second phase to calibrate the mathematical model with the experimental results.

MODELAÇÃO NUMÉRICA E EXPERIMENTAL DA ROTURA … · experimentais e numéricos para determinação do coeficiente de segurança da barragem de Alqueva num cenário de rotura por

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COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS XXV SEMINÁRIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS SALVADOR, 12 A 15 DE OUTUBRO DE 2003

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T92– A21

MODELAÇÃO NUMÉRICA E EXPERIMENTAL DA ROTURA PELA FUNDAÇÃO DA BARRAGEM DE ALQUEVA

Jorge P. Gomes J. Vieira de Lemos

Carlos B. Pina

LABORATÓRIO NACIONAL DE ENGENHARIA CIVIL DEPARTAMENTO DE BARRAGENS DE BETÃO

RESUMO A validação dos resultados de modelos matemáticos utilizados no estudo de cenários de rotura de barragens de betão, é por vezes difícil, devido à inexistência de resultados provenientes da observação de situações reais de colapso. Assim, os modelos experimentais são uma eficiente via para a obtenção de resultados comparáveis com os modelos matemáticos. Neste artigo, apresenta-se um exemplo de aplicação conjunta de métodos experimentais e numéricos para determinação do coeficiente de segurança da barragem de Alqueva num cenário de rotura por deslizamento de parte do maciço de fundação. São apresentados os resultados do modelo matemático desenvolvido baseado no método dos elementos discretos (discretização do maciço de fundação) e elementos finitos (na barragem). Este modelo tem por objectivo, numa primeira fase, apoiar a preparação do ensaio e, após a validação deste, interpretar os resultados experimentais, através do ajustamento dos parâmetros do modelo matemático. ABSTRACT The validation of the results of the mathematical models used in the study of rupture scenarios of concrete dams is sometime difficult, due to inexistence of results from real situations of collapse. So, the experimental models are an efficient way to obtain results to compare with the mathematical models. In this article, it is presented an application with experimental and numerical methods for the determination of the safety coefficient of Alqueva dam, in a rupture scenario of sliding of part of the rock foundation. The results of the developed mathematical model, based on the distinct element method (for the representation of the rock foundation) and finite elements (in the dam), are presented. This model is intended in a first phase to support the execution of the test and in a second phase to calibrate the mathematical model with the experimental results.

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1 - INTRODUÇÃO O estudo de cenários de rotura em barragens de betão é hoje possível utilizando modelos matemáticos bastante elaborados: modelos tridimensionais representando pormenorizadamente as características geométricas e considerando o comportamento não-linear dos materiais de forma também bastante sofisticada, por exemplo, através de formulações de dano. No entanto, a experiência de comparação destes resultados com situações reais é muito reduzida. Tem sido pequeno o número de acidentes ocorridos e, mesmo nestes, o volume de informação disponível é reduzido. Assim, para aumentar a confiança sobre os resultados e conclusões decorrentes da análise de modelos matemáticos é importante o recurso a métodos experimentais, quer analisando os mesmos modelos e cenários de rotura, quer utilizando os modelos reduzidos como protótipos (restará, então, o efeito de escala). Aliás, os resultados de ensaios de modelos reduzidos de barragens de betão têm sido freqüentemente utilizados para validar análises numéricas de cenários de rotura condicionados pela degradação do betão: o Laboratório Nacional de Engenharia Civil tem uma tradição na realização deste tipo de ensaios muito antiga, bastante anterior à capacidade dos modelos matemáticos para a realização do mesmo tipo de estudos [1]. No entanto, as situações de acidente que têm ocorrido até hoje em barragens de betão têm sido, em geral, condicionadas pelo comportamento da fundação e, designadamente, por deslizamentos ao longo de superfícies de descontinuidade existentes no maciço rochoso de fundação. Assim, a utilização e o aperfeiçoamento dos métodos experimentais para validar adequadamente os modelos matemáticos utilizados no estudo de cenários de rotura envolvendo a fundação é, actualmente, de grande importância [2]. Neste artigo, apresenta-se um exemplo de aplicação conjunta de métodos experimentais e numéricos para determinação do coeficiente de segurança da barragem de Alqueva num cenário de rotura por deslizamento de parte do maciço de fundação. Para a preparação e posterior interpretação dos resultados dos ensaios a realizar foi elaborado um modelo matemático, com uma discretização mista em elementos discretos (no maciço de fundação) e elementos finitos (no corpo da barragem) [3]. As simulações numéricas foram realizadas com o programa de elementos discretos 3DEC [4]. Não se tendo ainda realizado os ensaios previstos, descreve-se neste artigo as características do modelo reduzido que se encontra em construção e são apresentados os resultados obtidos com o modelo numérico na fase de preparação do ensaio em que foram analisados vários cenários de rotura provocados por uma subida excepcional do nível da água. 2 - CARACTERÍSTICAS DA BARRAGEM E MACIÇO ROCHOSO DE FUNDAÇÃO A barragem de Alqueva, situada no rio Guadiana, é constituída por uma abóbada de dupla curvatura, com encontros artificiais em betão nas duas margens. As suas principias características são as seguintes (Figuras 1 e 2):

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• Cota do coroamento 154 m • Desenvolvimento no coroamento (incluindo os encontros) 458 m • Altura máxima acima da fundação 96 m • Espessura mínima no coroamento 7 m • Espessura máxima na inserção na fundação 33 m

FALHA 22

100 m500

ESCALA

126

147

154

58

73

10

ESCALA

0 20 m

61

84

105

FIGURA 1 - Planta e consola central da barragem do Alqueva

FIGURA 2 - Vista do paramento de jusante da Barragem do Alqueva

No local de construção da barragem o vale é largo, de margens abruptas e fundo chato. O maciço rochoso é, em geral, de boa qualidade, especialmente na margem direita e no fundo do vale. Na margem esquerda, dominam os filádios com duas intercalações cartografáveis de xistos verdes, e, na margem

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direita e fundo do vale, predominam os xistos verdes com intercalações de filádios [5]. O diaclasamento é muito pronunciado, em especial, nos filádios. São numerosas as famílias de diaclases, mas as dominantes são as paralelas à xistosidade com a seguinte atitude N40º-60ºW, 12º-45ºNE. Com apreciável ocorrência foram também catalogadas as seguintes famílias: N25º-55ºE, 70º-90ºSE; N65º-90ºW, 15º-45ºNE; N23ºE - N20ºW, 60º-90ºE; e N60º-90ºW, 55ºNNE-90º-75ºSSW. Para além da xistosidade e diaclasamento, existem no maciço rochoso de fundação da barragem, em particular na margem esquerda algumas famílias de falhas, a maioria com atitudes similares às famílias das diaclases. Ás duas famílias mais numerosas são: N40º-65ºW, 15º-60ºNE, com caixas de espessura variando entre 0,02 m e 2,40 m, e N75ºW-S75ºW, 65ºN-90º-55ºS, com caixas de 0,02 m a 1,80 m. As caixas das falhas estão preenchidas por milonite argilosa em que nos minerais da argila aparece, ilite, montmorillonite (expansiva), clorite e atapulgite. A falha mais importante que existe no maciço de fundação é a chamada falha 22 que apresenta uma possança considerável, variando entre 0,80 m e 6,40 m, e com uma atitude N63ºW, 29º-40ºNE. Foram realizadas diversas campanhas de ensaios de caracterização do maciço rochoso, que visaram essencialmente a determinação da deformabilidade das rochas e a identificação dos parâmetros mecânicos das principais diaclases e xistosidade. Os xistos verdes apresentam módulos de deformabilidade de 60 a 100 GPa, enquanto que para os filádios se obtiveram valores entre 6 e 20 GPa. Para as diaclases segundo a xistosidade do filádio e do xisto verde, obtiveram-se valores de coesão de 100 a 110 kPa e ângulos de atrito de interno de 22º a 24º. Para outras diaclases, no filádio, a coesão é em média de 130 kPa e o ângulo de atrito interno varia entre 29º e 36º, enquanto que, no xisto verde, estes valores são respectivamente de 170 a 180 kPa e 38º a 43º. Em resumo, o estudo do conjunto barragem-fundação para cenários de rotura pela fundação apresenta uma importância acentuada nesta barragem tendo em conta as características do maciço de fundação referidas, dos quais se destacam: a acentuada diferença de deformabilidade e de propriedades mecânicas existente entre o maciço da margem esquerda, por um lado, e o maciço da margem direita e fundo do vale, por outro; a atitude desfavorável evidenciada por algumas famílias de diaclases da margem direita; o acentuado diaclasamento e a presença da falha 22 na margem esquerda que apresenta uma espessura muito significativa.

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3 - MODELO FÍSICO Com o objetivo de avaliar a segurança da barragem de Alqueva para cenários de rotura por deslizamento da fundação, está a ser construído um modelo físico geomecânico, do tipo daqueles que têm sido utilizados no LNEC para estudos semelhantes [6]. O modelo executado à escala 1/250, representará a barragem e o maciço de fundação, e neste, procurar-se-á representar os acidentes geológicos mais significativos e desfavoráveis para a segurança global da obra. Assim, será representada a xistosidade do maciço rochoso, a falha 22, e as famílias de diaclases que poderão provocar o deslizamento de blocos da fundação. Esta representação será feita, no modelo físico, através de paralelepípedos com as seguintes orientações (Figura 3): • N64,5ºW, 34,5ºNE, que representa a falha e a xistosidade existente com

pendente para a margem esquerda. • N64,5ºW, 75ºSW, que representa um diaclasamento com pendente para a

margem direita. • N40ºE, 79ºSE, que representa um diaclasamento aproximadamente

subvertical e perpendicular ao eixo do rio. Foram adotados blocos com cerca de 0,10 m de aresta, representando um afastamento entre as diaclases de 25 m, o que corresponde à representação do maciço de fundação por cerca de 900 blocos.

FIGURA 3 - Vista de jusante da base do modelo geomecâncio da barragem

de Alqueva Em ensaios de verificação da estabilidade de estruturas, a correcta representação da distribuição do peso dos materiais é muito importante, pois tem influência determinante nos mecanismos de colapso que se podem verificar. Assim, o peso próprio do material do modelo representará o peso do

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protótipo, pelo que deverá respeitar as relações de semelhança consideradas. Em geral, utilizam-se materiais com densidades o mais altas possível para que, dado o factor de redução da escala geométrica pretendido, a resistência necessária não seja demasiado baixa, impossibilitando a sua manuseabilidade. Para a construção deste modelo vai ser utilizada uma mistura de materiais de alta densidade, composta por areia de ilmenite, zarcão, gesso e água, desenvolvida por forma a respeitar as relações de semelhança entre as escalas de tensões ( σK ), de pesos específicos ( γK ), e geométrica ( LK ) LKKK γσ = (1)

Serão utilizadas composições distintas para os blocos de fundação e da barragem, de modo a tentar reproduzir as características mecânicas do betão e do maciço rochoso. Os valores dos ângulos de atrito entre as faces dos blocos construídos com este material apresentam valores médios de 35º. Devido à sua composição e possança, a falha 22 será reproduzida no modelo com características diferentes das restantes. Assim, nas faces dos blocos que simulam esta falha foram coladas inferiormente placas de teflon e superiormente uma rede plástica, o que permite obter valores médios de 11º para o ângulo de atrito (Figura 4).

FIGURA 4 - Pormenor do tratamento das faces dos blocos que simulam a

falha 22 A ação da água sobre a barragem é simulada através da aplicação de uma pressão no paramento de montante do modelo por meio de um fluido, contido num saco de borracha, com densidade de 1,3, de modo a respeitar as relações de semelhança ( γK =1,3). Enchendo o saco até à cota pretendida, é possível

representar não só o diagrama de pressão correspondente à cota de água do coroamento da barragem, mas também diagramas de pressão simulando cotas de água superiores [7]. O ensaio será conduzido subindo sucessivamente o

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nível de fluido no saco de borracha até se verificar a rotura do modelo, quantificando, assim, a segurança da estrutura em relação ao colapso para uma subida excepcional do nível da água na albufeira. Na Figura 5 pode-se ver um aspecto geral do modelo geomecânico da barragem de Alqueva com indicação do acidente geológico correspondente à falha 22.

Falha 22

FIGURA 5 - Vista de jusante do modelo geomecâncio da barragem de Alqueva 4 - MODELO NUMÉRICO 4.1 - PROGRAMA DE ELEMENTOS DISCRETOS 3DEC O método dos elementos discretos tem larga utilização em problemas de Mecânica das Rochas, uma vez que permite uma fácil representação da natureza essencialmente descontínua dos maciços rochosos. Este método é extremamente potente e robusto na análise de meios em que a resposta global depende essencialmente do comportamento das juntas, zonas localizadas de menor resistência e maior deformabilidade, e em que os mecanismos de rotura podem estar associados a grandes deslocamentos, dado que altera a geometria em cada passo. Os modelos mais simples adoptam formulações de elementos discretos (blocos) rígidos; contudo, no programa 3DEC [4] é possível considerar elementos discretos (blocos) deformáveis. Os blocos deformáveis consistem em volumes de forma poliédrica discretizados numa malha interior de elementos finitos tetraédricos. Na maioria dos casos, esta discretização conduz a uma aproximação com rigor suficiente, sendo sempre possível refinar a malha em zonas onde se antevê um estado de tensão mais complexo. Para

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modelar uma estrutura como uma abóbada de betão, os elementos finitos tetraédricos não são eficientes, sendo preferível utilizar elementos com funções de interpolação de ordem superior. No modelo apresentado neste trabalho, na barragem foram utilizados elementos finitos isoparamétricos do 2º grau, com 20 pontos nodais [8], sendo os blocos de fundação discretizados com elementos tetraédricos. 4.2 - REPRESENTAÇÃO DO MODELO FÍSICO No modelo de elementos discretos utilizado para simular o comportamento do modelo físico (Figura 6), a barragem foi discretizada numa malha de 98 elementos finitos quadráticos. Para efeitos de representação gráfica de dados e resultados, as faces destes elementos curvos são decompostas em triângulos. Na barragem, considerou-se um comportamento elástico - perfeitamente plástico limitado pelo critério de Mohr-Colomb para tensões de compressão e pelo critério de Rankine para a tracção. Os parâmetros que se utilizaram para caracterizar este comportamento, referidos à escala real da barragem, foram os seguintes: • Módulo de elasticidade 35 Gpa • Coeficiente de Poisson 0,2 • Coesão 6,7 MPa • Resistência à compressão 30 MPa • Resistência à tracção 3 MPa • Ângulo de atrito 41,8º • Ângulo de dilatância 0º

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Figura 6. Vistas de montante e jusante do modelo de elementos discretos

Os blocos da fundação foram considerados elásticos, com as seguintes propriedades: • Módulo de elasticidade 35 GPa • Coeficiente de Poisson 0,2

Todas as descontinuidades da fundação foram consideradas com dilatância nula, e com uma deformabilidade elástica de 350 GPa/m, tanto na direcção normal como tangencial. Foi adoptado um modelo constitutivo de Mohr-Colomb diferenciado para as várias descontinuidades: • Diaclases:

• Ângulo de atrito 35º

• Coesão e resistência à tracção nulas • Falha 22:

• Ângulo de atrito 11º

• Coesão e resistência à tracção nulas

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• Superfície de fundação:

• Ângulo de atrito 45º

• Coesão 10 GPa

• Resistência à tracção 10 Gpa 5 - RESULTADOS DOS CÁLCULOS EFECTUADOS PARA PREPARAÇÃO DO ENSAIO Na fase atual, em que se encontra em preparação o modelo a ensaiar, foram efectuadas diversas análises numéricas com o objectivo de definir quais as características do modelo físico a construir que melhor satisfizessem o objectivo do estudo (análise do cenário de rotura por deslizamento da fundação pela zona mais provável). Como cálculo de referência, foi determinada a subida do nível da água acima do coroamento necessária para provocar o colapso da barragem, admitindo que não há deslizamentos no maciço de fundação, isto é, que a rotura se dá no betão. Foi considerado portanto, um comportamento não-linear no betão da barragem e um comportamento elástico na fundação. Nesta situação o colapso da barragem ocorre para uma subida de cerca de 100 m acima do coroamento, por esmagamento do betão na zona central dos arcos superiores (Figura 7), tal como é habitual para este tipo de rotura [9].

rotura por tracção

rotura por compressão

FIGURA 7. Rotura da barragem para uma altura de água de 100 m acima do

coroamento Admitindo que podem ocorrer deslizamentos na fundação (isto é, considerando comportamento não-linear em todo o modelo) verifica-se uma redução do coeficiente de segurança da barragem para este cenário de rotura já que existe colapso para uma altura de água de cerca de 70 m acima do coroamento. Nas Figuras 8, 9 e 10 apresentam-se, para este último caso, os deslocamentos dos arcos às cotas 150 m, 100 m e 80 m para uma altura de água acima do coroamento ligeiramente abaixo da que provoca o colapso.

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Deslocamentos

0 0,10 0,20 0,30 m

FIGURA 8 - Deslocamentos no arco à cota 150 m (coroamento), para uma

altura de água a montante de 60 m acima do coroamento

Deslocamentos

0 0,10 0,20 0,30 m

FIGURA 9 - Deslocamentos no arco à cota 100 m, para uma altura de água a montante de 60 m acima do coroamento

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Deslocamentos

0 0,10 0,20 0,30 m

FIGURA 10 - Deslocamentos no arco à cota 80 m, para uma altura de água a montante de 60 m acima do coroamento Pode observar-se, na figura 10, que nas cotas inferiores os deslocamentos da barragem junto à inserção na fundação são um pouco superiores na margem esquerda devido aos deslizamentos que ocorrem na falha 22. No entanto, são os deslizamentos que se verificam nas cotas superiores do maciço de fundação da margem direita, devido à orientação mais desfavorável das diaclases, que condicionam o colapso da barragem. Nas Figuras 11, 12 e 13 apresentam-se as zonas em rotura dos arcos às cotas 150 m, 100 m e 80 m para a mesma altura de água acima do coroamento a que se referem as figuras anteriores (próximo do colapso).

rotura por tracção

rotura por compressão

FIGURA 11 - Zonas em rotura no arco à cota 150 m, para uma altura de

água de 60 m acima do coroamento

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rotura por tracção

rotura por compressão

FIGURA 12 - Zonas em rotura no arco à cota 100 m, para uma altura de

água de 60 m acima do coroamento

rotura por tracção

rotura por compressão

FIGURA 13 - Zonas em rotura no arco à cota 80 m, para uma altura de água

de 60 m acima do coroamento Pode observar-se que o colapso da barragem ocorre devido a roturas por tracção que se verificam nos arcos superiores junto à margem direita, causados pelos deslizamentos na fundação já referidos (Figura 8). Nos arcos inferiores, também se verificam roturas por tracção, mas apenas a montante, não condicionando o colapso da barragem. Estas roturas são devidas ao aumento dos esforços de flexão a que fica sujeita a inserção da barragem na fundação causada pela subida das pressões no paramento de montante da barragem.

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6 - CONCLUSÕES As barragens abóbada apresentam uma segurança significativa para um cenário de rotura correspondente a uma eventual onda de cheia que passe por cima da barragem, como já foi comprovado no acidente ocorrido na barragem de Vajont [10]. No entanto, esta segurança pode ser fortemente reduzida se existirem características do maciço rochoso de fundação desfavoráveis. A avaliação deste e doutros cenários de rotura deve ser realizada com o apoio de ensaios em modelos reduzidos. A informação obtida neste tipo de ensaios é fundamental para a validação de modelos numéricos complexos e a definição das suas condições de utilização prática. Apresentou-se neste artigo parte de um estudo, que se encontra em curso, relativo à avaliação da segurança da barragem de Alqueva para um cenário de subida do nível da água na albufeira e que poderá ser condicionado por deslizamentos na fundação. Com o recurso a um modelo matemático de elementos discretos procurou definir-se qual o cenário de rotura mais desfavorável. Efectivamente, os modelos de elementos discretos constituem uma ferramenta muito útil no estudo de fundações de barragens, permitindo analisar com facilidade os efeitos do diaclasamento e da existência de falhas ou outras descontinuidades de baixa resistência. Os resultados obtidos com este modelo matemático permitem prever que as diaclases existentes na fundação reduzem o coeficiente de segurança desta barragem para este cenário de rotura, mantendo-se, no entanto, uma margem de segurança significativa. Encontra-se agora em execução a segunda fase do estudo que consiste na construção e ensaio de um modelo reduzido da barragem e fundação adjacente que permitirá validar os resultados obtidos com o modelo matemático. 7 - REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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2. C.A.B. PINA; C.P. COSTA, Failure analysis of rock foundation by

experimental and numerical methods, In Dam foundations in rock masses, LNEC, 1993.

3. J.V. LEMOS, Discrete element analysis of dam foundations, Distinct

Element Modelling in Geomechanics (Eds. Sharma, Saxena & Woods), Balkema, Rotterdam, 1999.

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4. ITASCA, 3DEC - 3-Dimensional Distinct Element Code, Version 2.0, User’s Manual, Itasca Consulting Group, Minneapolis, 1998.

5. J.M. COTELO NEIVA, D. SILVA MATOS, Celso LIMA, Fernando

FERREIRA, Geologia e geotecnia do local da barragem do Alqueva no Rio Guadiana.

6. M. Cruz AZEVEDO; M.J. Esteves FERREIRA; C.P. COSTA, The use of

geomechanical physical models at LNEC, Memória nº 731, LNEC, 1988.

7. J.P. GOMES, Ensaios em modelos geomecânicos de barragens de betão, Trabalho de síntese, LNEC, 1995.

8. J.V. LEMOS, Desenvolvimento de um módulo do programa 3DEC para

estudo de fundações de barragens abóbada, Relatório 319/98, LNEC, 1998.

9. C.A.B. PINA, Modelos de elementos finitos para o estudo de barragens de

betão, Tese de Especialista, LNEC, 1988.

10. ICOLD, Lessons from dam incidents, International Commission on Large Dams, Paris, 1974.