peter drucker gestão

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  • 8/2/2019 peter drucker gesto

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    O que estERRADO na GESTO

    Grande parte do que hoje se ensina nas universidades de gesto est errado ou seriamente

    desactualizado. Quem o diz Peter Drucker, o homem que inventou a disciplina. Saibaporque deve levar a srio o seu alerta

    Por: Peter F. Drucker carreira

    medida que a economia do conhecimento evoluiu e se aprofunda, cada vez maisevidente que os pressupostos bsicos de grande parte do que se ensina e se pratica em nomeda gesto est errado ou irremediavelmente desactualizado.Como qualquer executivo experiente sabe, poucas regras permanecem actuais mais de 20 ou30 anos. No entanto, as premissas inerentes economia, aos negcios ou tecnologia tm

    pelo menos 50 anos. Logo, j perderam o seu prazo de validade. Consequentemente, estamosa pregar, a ensinar e a praticar polticas cada vez mais distantes da realidade e, por isso,contraproducentes. Se as premissas estiverem erradas, tudo o que as segue estar igualmenteerrado. Para uma disciplina social como a gesto, as premissas so bem mais importantes doque as relativas a uma cincia exacta. O paradigma a teoria geral prevalecente noexerce qualquer impacte sobre o universo. Quer se afirme que o sol gira em torno da terra, ouvice-versa, isso no tem efeito algum sobre o sol ou a terra. Uma disciplina social como agesto diz respeito ao comportamento de pessoas. O universo social no possui leisnaturais como as que regem as cincias fsicas. Est sujeito a mudanas contnuas. Istosignifica que as premissas vlidas de ontem podem-se tornar invlidas, ou at enganosas,hoje. neste ponto que nos encontramos na disciplina da gesto. Quais so as premissas que estoa conduzir a gesto para um caminho errado? Subjacente ortodoxia actual est, porexemplo, a premissa defendida por todos os tericos da administrao e pela maioria dospraticantes desde Henri Fayol, em Frana, e Walter Rathenau, na Alemanha, por volta de1900 de que existe uma forma correcta de organizao.Fayol enunciou o princpio de que existe uma nica estrutura correcta para todas as empresasindustriais: a diviso funcional em engenharia, produo, vendas, finanas e pessoal. Cadadiviso deveria ser administrada separadamente, unindo-se s restantes apenas ao nvel dopresidente da empresa.Esta apenas uma entre as sete premissas (as trs primeiras relativas teoria da gesto, asrestantes sua prtica) que esto desactualizadas:

    Os princpios de gesto aplicam-se somente s organizaes empresariais; Existe apenas uma forma correcta de organizar uma empresa; Existe uma nica maneira correcta de gerir as pessoas; Cada indstria tem a sua tecnologia e os seus mercados fixos; O mbito legalmente definido da gesto restringe-se aos activos e aos funcionrios da

    organizao; O trabalho da gesto o de gerir a empresa, no o que acontece fora dela; As fronteiras nacionais definem o ambiente da empresa e da sua gesto.

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    At ao incio da dcada de 80, estas premissas estavam suficientemente prximas darealidade para serem teis. Neste ensaio, procurarei mostrar por que cada uma delas hojeincorrecta, desactualizada, ou ambas as coisas. No as abandonar em face da realidade emrpida transformao pode levar a sua empresa falncia ou a sua carreira ao fracasso.

    1. A gesto no s para as empresasHoje em dia, temos tendncia para pensar na gesto apenas como gesto de empresas. Estapremissa tem uma origem mais ou menos recente. At dcada de 30, os poucos escritores epensadores que se preocupavam com a gesto a comear por Frederick Winslow Taylor(1856-1915), na viragem do sculo, e a terminar com Chester Bernard, antes da SegundaGuerra Mundial presumiam que a disciplina se aplicava a qualquer tipo de organizao eno apenas s empresas. Uma organizao era sempre uma organizao, e estas diferiamentre si apenas na mesma medida em que um co difere de raa para raa.A primeira aplicao consciente e sistemtica dos princpios da gesto no ocorreu numaempresa. Foi feita na reorganizao do exrcito dos Estados Unidos, em 1901, por Elihu Root(1845-1937), o secretrio da Guerra de Theodore Roosevelt. O primeiro congresso de gesto

    em Praga, em 1922 foi organizado no por empresrios, mas por Herbert Hoover,ento secretrio do Comrcio americano, e Thomas Masaryk, o presidente fundador darecm-criada Repblica da Checoslovquia.A associao da gesto ao mundo das empresas comeou com a Grande Depresso, quegerou uma grande hostilidade e desprezo pela figura do executivo. Por esse motivo, a gestono sector pblico foi rebaptizada como administrao pblica e proclamada comodisciplina distinta com departamentos universitrios, uma terminologia e uma hierarquiaprofissional prprios.No ps-guerra a moda sofreu alteraes. Em 1950, o termo negcios (business) voltou aser bem visto em grande parte devido ao bom desempenho das empresas norte-americanasdurante a Segunda Guerra Mundial. Hoje, importante afirmar em alto e bom som quea gesto no gesto de empresas, assim como a medicina no , por exemplo, obstetrcia.Por que motivo assim to importante acabar com a distino artificial entre organizaesempresariais e no empresariais? Porque pouco provvel que o sector que mais cresa nassociedades desenvolvidas no sculo xxi seja o das empresas. Na verdade, isso j noaconteceu neste sculo. Actualmente, a percentagem da populao activa dos pasesdesenvolvidos que trabalha em empresas menor do que a existente h 100 anos atrs.Naquela poca, a esmagadora maioria das pessoas ganhava a vida em actividades econmicas em regra, agrcolas. Os sectores que mais cresceram no sculo xx foram o governamental,o dos profissionais liberais, o da sade e o da educao.Esta tendncia ir manter-se e intensificar-se no sculo xxi. O sector social sem finslucrativos aquele em que a gesto ser ainda mais necessria. Basta pensar nos enormesproblemas com os quais o mundo se defronta pobreza, sade, educao, tensesinternacionais para que a necessidade de solues de gesto se torne clara.

    2. No h uma s forma correcta de organizao

    A preocupao com a gesto e o seu estudo comeou com o despertar repentino das grandesorganizaes, no final do sculo xix. Desde essa altura que o estudo da gesto se baseou napremissa de que existe, ou dever existir, uma nica forma correcta de organizao.A estrutura organizacional das empresas foi estudada pela primeira vez em Frana, naviragem do sculo, por Henri Fayol. Ele era presidente de uma empresa de extraco de

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    carvo que, embora sendo uma das maiores empresas da Europa, era totalmentedesorganizada (o seu livro s foi, contudo, publicado em 1916). O que aconteceu na Europarepetiu-se nos Estados Unidos: os primeiros tericos da gesto eram empresrios praticantes,tais como John D. Rockefeller, J. P. Morgan e, especialmente, Andrew Carnegie, que exerceuo impacte mais duradouro e ainda merece ser estudado. Um pouco mais tarde,

    Elihu Root aplicou a teoria da organizao ao exrcito norte-americano. No foi coincidnciao facto de Root ter sido assessor jurdico de Carnegie.Vivia-se na poca em que as organizaes empresariais em larga escala estavam a despontar.Os seus administradores tiveram de desenvolver a gesto sua custa, pois no havia textospara consultar nem consultores. De certo modo, eles foram aprendendo uns com os outros.Em 1895, Georg Siemens (1839-1901), fundador do Deutsche Bank, adoptou os conceitosorganizacionais do seu amigo Fayol para salvar a Siemens Electric. A Siemens tinha sidofundada pelo seu primo Werner von Siemens (1816-1892), mas deixada deriva depois damorte deste. A Primeira Guerra Mundial deixou clara a necessidade de uma estruturaorganizacional formal. Administrar milhes de soldados e reorientar economias inteiras emtorno da produo para a guerra tornou imprescindvel a organizao formal. A guerraprovou, porm, que a estrutura funcional defendida por Fayol (e Carnegie) no era aadequada para grandes empreendimentos. A gesto altamente centralizada no resultava emempresas de grande dimenso. O processo de deciso tinha de ser alargado aos escales maisbaixos da organizao.Assim, imediatamente aps a Primeira Guerra Mundial, Pierre du Pont (1870-1945) e depoisAlfred Sloan (1875-1966) desenvolveram a ideia da descentralizao. Esta no demorou atransformar-se no ltimo grito da gesto, o nico caminho tido como adequado. Hoje,passmos a defender o trabalho em equipa como a organizao correcta para qualquer coisa.Contudo, j dever ter ficado claro que a organizao certa no existe. Cada qual tem pontosfortes, limitaes distintas e aplicaes especficas. A organizao apenas uma ferramentapara tornar as pessoas produtivas quando trabalham em conjunto. Logo, uma estruturaorganizacional s a adequada para determinadas tarefas, condies ou pocas.Por exemplo, hoje falamos muito sobre o fim da hierarquia, o que um perfeito disparate.Qualquer instituio precisa de uma autoridade final ou seja, de um chefe, algum que,numa situao de perigo comum, toma a deciso final e espera ser obedecido. Se o navio esta afundar, o capito no convoca uma reunio d ordens. A hierarquia e a sua aceitaosem reservas por todos a nica esperana de salvao numa situao de crise.Contudo, a organizao indicada para lidar com emergncias no a apropriada para lidarcom todas as tarefas. Por vezes, a abordagem de equipa a resposta certa. Desde 1950,primeiro na Sua e depois nos Estados Unidos, as empresas farmacuticas tm vindo autilizar equipas para desenvolver e lanar novos medicamentos. Logo que a cincia bsicaesteja desenvolvida, o pessoal mdico, o da produo, o financeiro, o de marketing e osespecialistas em patentes trabalham em conjunto, em equipas de desenvolvimento. Depois deatingido o objectivo, a equipa s se desfaz quando o medicamento est no mercado. Noentanto, no interior dessas mesmas empresas farmacuticas, outros projectos como, porexemplo, a converso de um remdio vendido com receita mdica em produto vendido semreceita so conduzidos pela organizao funcional tradicional.J vimos ser necessrio que exista algum na organizao com autoridade para assumir ocomando em momentos de crise. Tambm um princpio geral vlido para as organizaesde todos os tipos que qualquer membro da organizao se deve submeter a apenas umchefe. Ningum deve ser sujeito a um conflito de lealdades.

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    E neste ponto que erram as denominadas equipas inspiradas nas bandas de jazz, to namoda actualmente. O membro que engenheiro, por exemplo, reporta-se ao lder da equipa,mas tambm ao chefe da sua funo especfica. Parece um princpio estrutural correcto ter omenor nmero possvel de camadas, ou seja, ter uma organizao o mais achatadapossvel. Mas uma das implicaes deste princpio a de que todos os indivduos tero de

    aprender a trabalhar ao mesmo tempo em diferentes estruturas organizacionais. Umas vezes,em equipa, outras, numa estrutura de comando e controlo. Ou seja, o executivo do futuroprecisar de uma caixa de ferramentas repleta de estruturas organizacionais e de seleccionar amais apropriada para cada tarefa especfica.Qual o papel do presidente no meio desta discusso? Todos os estudos concluem que ospresidentes precisam do auxlio de uma equipa. Mas aqui que a retrica se distanciainteiramente da realidade: hoje praticamos o mais absoluto culto personalidade quanto apresidentes super-homens: Bill Gates, Jack Welch, Louis Gerstner.Mas de que forma escolhemos estas pessoas? Quem lhes vai suceder e por que meio? Quegarantias asseguram que o sucessor ser a melhor pessoa para ocupar o cargo? Os indivduosdo pouca ateno ao processo sucessrio, mas ele, na verdade, o teste final de uma boagesto. Neste ponto as organizaes no empresariais levam a melhor. A primeira tentativaconsciente para lidar com o problema sucessrio foi feita pelos criadores da Constituio dosEstados Unidos. Eles descobriram como garantir uma sucesso ordenada sem os assassinatos,conspiraes, envenenamentos e golpes de Estado que mancharam a histria das sucessesreais. No mundo empresarial eu no conheo nenhum sistema que garanta o sucesso de umapassagem de testemunho.

    3. No h uma forma ideal para gerir as pessoas

    No livro The Human Side of Enterprise (1960), Douglas MacGregor afirmou que a gesto spode optar por duas formas de gerir pessoas: a teoria X e a teoria Y. A primeira resultada premissa de que as pessoas no querem trabalhar, logo, precisam de ser punidas econtroladas. J a segunda pressupe que as pessoas querem trabalhar e s precisam damotivao adequada.MacGregor acreditava que a nica teoria vlida era a Y. Em 1954, eu tinha escrito algosimilar no livro The Practice of Management. A viso dominante continua a ser a de que aspessoas precisam realmente de ser geridas s que est errada. Alguns anos mais tarde,Abraham H. Maslow (1908-1970) demonstrou no seu livro Eu-psychian Management, de1962 (reeditado, em 1998, sob o ttulo Maslow on Management), por que motivo eu eMacGregor estvamos redondamente enganados. Maslow demonstrou de forma conclusivaque diferentes pessoas precisam de ser geridas de diferentes maneiras. Converti-meimediatamente a este raciocnio. As provas so avassaladoras, embora poucas pessoas tenhamprestado ateno ao que ele professava.Todas as outras premissas sobre o assunto tm por base esse pressuposto errado de que existeapenas uma forma correcta de gerir pessoas. Uma delas a de que as pessoas que trabalhampara uma organizao o fazem a tempo inteiro e dependem dela para o seu sustento. Outra ade que os trabalhadores so meros subordinados, dos quais se espera que faam o que lhes mandado nada mais. H 70 anos tais premissas eram vlidas. Hoje so insustentveis.Uma parcela significativa da fora de trabalho actual composta por funcionrios que notrabalham a tempo inteiro. Os empregadores so as empresas de outsourcing em reas quevo desde os servios de limpeza at s tecnologias de informao. Por outro lado, as grandesconstrutoras de automveis dependem cada vez mais dos fornecimentos externos de peas.

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    Logo, grande parte do trabalho feito por pessoas que no trabalham directamente para aempresa. Igual situao ocorre, por exemplo, na indstria informtica. Outra parcelasignificativa da fora de trabalho da organizao so os indivduos que trabalham porperodos contratuais fixos. Este frequentemente o caso das pessoas com maiores nveis deconhecimentos e que tm mais valor para a empresa.

    Mesmo quando empregadas a tempo inteiro, todas as pessoas mesmo as dos escales maisbaixos se tornaram trabalhadores do conhecimento. E estes no podem ser geridoscomo subordinados, mas sim como associados. Podero ser juniores ou seniores, mas j nosubordinados ou chefes.Esta diferena no mera cosmtica. Depois de ultrapassar a etapa da aprendizagem, otrabalhador do conhecimento precisa de saber mais sobre o seu trabalho do que o prpriochefe se assim no fosse, qual seria a sua utilidade? A definio de trabalhador doconhecimento algum que sabe mais sobre o seu trabalho do que qualquer outra pessoa naorganizao. Por exemplo, o engenheiro que atende um cliente no sabe mais sobre o produtodo que o responsvel pela engenharia. Mas sabe mais sobre o cliente e isso pode ser maisimportante do que o know-how do produto. Do mesmo modo, um vice-presidente demarketing poder ter subido toda a hierarquia de vendas e saber muito sobre o assunto, masquase nada sobre estudos de mercado, polticas de preos, embalagem, atendimento ao clienteou previso de vendas. Logo, ele no poder dizer aos especialistas do departamento demarketing o que devem fazer. Em suma, um executivo no est apenas a ser corts quando serefere a um funcionrio como scio, mas a admitir um facto real. Ou, por outras palavras, orelacionamento entre eles ser similar ao do caso j referido de uma orquestra. O maestro atpode no saber tocar violino, mas o xito depender da qualidade dos seus scios, osmsicos. E, tal como a orquestra pode sabotar o mais capaz dos maestros especialmente seele for autocrtico , o mesmo acontecer na organizao empresarial.Por outro lado, a motivao dos trabalhadores, especialmente os do conhecimento, ter de sera mesma dos voluntrios. Como sabido, estes precisam de uma maior satisfao para com oseu trabalho do que os funcionrios pagos, precisamente pelo facto de no receberem salrio.Precisam, sobretudo, de um desafio, de conhecer a misso da sua organizao e acreditarnela. Precisam igualmente de formao contnua e de conhecer os resultados do seu esforo.A concluso que os funcionrios precisam de ser geridos na prtica, no na teoria como scios. A definio de sociedade diz que todos os scios so iguais e no podemreceber ordens. Eles tm que ser persuadidos.E isto no a teoria X, nem a Y, nem qualquer outra de gesto de pessoas. algo quevai alm destes conceitos e que envolve o alinhamento das metas dos funcionrios com as daorganizao, e vice-versa. Hoje, no se gerem, lideram-se pessoas. Para maximizar o seudesempenho, a soluo capitalizar os seus pontos fortes e os seus conhecimentos, em vez deas forar a adequar-se a modelos de comportamento previamente definidos.

    4. Cada indstria no tem uma tecnologia nica

    Nos primrdios da Revoluo Industrial quando a indstria txtil foi criada, a partir deantigas indstrias familiares , presumia-se que cada actividade tinha a sua tecnologiaprpria e singular. O mesmo se aplicava extraco mineira de carvo e a outras indstriasque surgiram no final do sculo xviii e na primeira metade do sculo xix.O alemo Werner von Siemens (1816-1892) construiu uma das primeiras organizaesgigantescas. Para conquistar uma vantagem na tecnologia utilizada pela sua indstria,contratou o primeiro cientista formado numa universidade. Ele foi convidado a inaugurar um

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    moderno laboratrio de pesquisas. Destes laboratrios nasceram as indstrias qumicas eelctricas alems. E estas assumiram a posio de liderana mundial apenas porque souberamdesenvolver a melhor tecnologia da indstria.Da compreenso desta necessidade da indstria a pesquisa cientfica nasceram todas asoutras grandes empresas lderes mundiais em outras reas no ligadas qumica: automvel,

    telefnica e, mais tarde, farmacutica e dos computadores.Durante o sculo xix e a primeira metade do sculo xx, era possvel dar-se como garantido ofacto de que as tecnologias estranhas a uma indstria exerceriam um impacte mnimo sobreaquela mesma indstria. Quem conhecesse bem a sua tecnologia prosperava. Estaespecificidade por indstria foi o trunfo do mais bem sucedido de todos os laboratrios dosltimos 100 anos o Bell Labs. Fundado no incio da dcada de 20 como parte da AT&T,at ao final dos anos 60 o Bell Labs produziu praticamente todos os novos conhecimentos etecnologias de que a indstria telefnica precisou. Mas esta ateno exclusiva na sua prpriaindstria acabou por custar caro. A maior conquista cientfica do Bell Labs foi o transstor.Como as suas principais utilizaes estavam fora do sistema telefnico, a grande inveno doBell Labs foi vendida pela quantia irrisria de 25 mil dlares. A Sony, a Intel e a Compaq sohoje grandes empresas devido, em parte, miopia estratgica do Bell Labs, que simplesmenteno percebeu que os muros tecnolgicos que antes separavam as indstrias tinham cado porterra.A premissa inicial correcta hoje que as tecnologias que provavelmente vo exercer o maiorimpacte sobre a sua empresa so as externas ao seu prprio campo de aco. Diferentementedas tecnologias do sculo xix, as tecnologias da actualidade no percorrem caminhosdistintos, ao invs, cruzam-se constantemente. Antes, as empresas competiam dentro de ummesmo sector. Hoje compete-se entre sectores.Foi s depois da Segunda Grande Guerra que tambm passou a ficar claro que as utilizaesfinais no esto ligadas a um determinado servio ou produto. A gesto de empresas que noo souber no durar muito.At ao final dos anos 20, a venda de notcias era basicamente um monoplio dos jornais.Hoje essa necessidade tambm satisfeita pela televiso, pela rdio e pela Internet. Embora oWall Street Journal domine o mercado de notcias comerciais e de negcios dirios emformato impresso, ningum poder dizer que seja o monopolista desse negcio. bom que os gestores compreendam as implicaes desta mudana. Uma delas que os noclientes tornaram-se to ou mais importantes do que os actuais clientes. A nossa experinciamostra que o cliente nunca compra o que o fornecedor vende. O valor para o cliente algodiferente daquilo que o fornecedor considera como valor ou qualidade.Por outro lado, a gesto ter de aprender que a compreenso do mercado comea pelo estudode como os consumidores distribuem o seu rendimento disponvel algo que oseconomistas vm defendendo h 100 anos.Quando a televiso foi lanada, no incio da dcada de 50, o maior executivo da indstriaelectrnica japonesa afirmou que o Japo no ter televiso por muitos anos, porque osjaponeses no tm dinheiro para comprar os respectivos aparelhos. Dois anos mais tarde, apenetrao da TV no Japo era quase to grande como nos Estados Unidos. Os japonesespassaram a destinar uma parte cada vez maior dos seus rendimentos para a compra detelevisores, porque estes davam acesso a um mundo do qual estavam isolados havia sculos.Eles no compravam um produto, mas sim um modo completamente novo de vida.Do mesmo modo, o fax foi inventado nos Estados Unidos, mas a sua produo sempre foidominada pelas rivais japonesas. Os fabricantes norte-americanos fizeram vrios estudos de

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    mercado que demonstraram que as pessoas no pagariam o alto custo das mquinas de faxoriginais apenas devido razo de que iriam poupar dinheiro com o correio. Os japoneses recordando o que acontecera com a compra de televisores compreenderam que osconsumidores mostram uma disposio quase infinita para transferir o seu rendimentodisponvel para as telecomunicaes mesmo que isso significasse economizar em outras

    reas. Por isso, resolveram lanar o aparelho de fax, com o sucesso que hoje se conhece.Poucas inovaes na histria econmica tiveram uma aceitao to rpida e universal.A moral desta histria a de que nem a tecnologia nem a sua utilizao final constituempremissas para uma poltica de gesto. O valor atribudo pelo consumidor que faz adiferena.

    5. O fim do comando e do controlo

    O conceito tradicional de gesto baseia-se no princpio do comando e do controlo, definidoem termos legais. O presidente da General Motors pode dizer a milhares de pessoas o quefazer, mas no pode dar ordens a ningum no exterior da empresa.Foi h quase 100 anos que pela primeira vez ficou claro que a simples definio legal no

    basta para gerir uma grande organizao. Para conseguir o mximo retorno a um customnimo, a gesto precisa de organizar o processo econmico em toda a cadeia de produo eexercer a autoridade alm dos limites legais da sua prpria organizao.Costuma ser atribuda aos japoneses a inveno do keiretsu os conglomeradosempresariais que integram a empresa com os seus fornecedores ao nvel do planejamento,logstica, controlo de custos, etc. Na verdade, o keiretsu uma criao muito mais antiga e deorigem americana. Remonta a 1910 e ao homem que primeiro percebeu que os automveisseriam uma poderosa indstria: William C. Durant (1861-1947).Foi ele quem criou a General Motors, ao adquirir pequenas e bem sucedidas empresas, comoa Buick, fundindo-as numa nica grande construtora automvel. Alguns anos depois, Durantpercebeu que precisava de integrar os principais fornecedores na sua empresa. Comeouento a comprar fabricantes de acessrios, tal como, em 1920, a Fisher Body, o maiorfabricante nacional de carroarias para automveis. Durante 20 anos, a GM desfrutou de umavantagem de custos na ordem dos 30% em relao s suas concorrentes, incluindo a Ford e aChrysler. Mas o keiretsu praticado por Durant colocou os fornecedores dentro do contextolegal da GM a sua zona de comando e controlo.Com este sistema, as divises da GM eram obrigadas a manter-se atentas aos seus custos equalidade. Mas depois da Segunda Guerra Mundial muitas das produtoras concorrentesdesapareceram. Assim perdeu-se o factor de incentivo competitividade das divises depeas para automveis que pertenciam integralmente GM. Alm disso, com asindicalizao dos trabalhadores da indstria automvel, que ocorreu em 1936 e 1937, a GMficou em grande desvantagem em termos de custos face s fornecedoras independentes e nosindicalizadas. Deste modo, o keiretsu, criado por Durant, passou de uma vantagem tremendapara um tremendo fracasso. O erro de Durant foi ter trazido as suas fornecedoras para ointerior da sua esfera de comando e controlo.A empresa que seguidamente aplicou o conceito de keiretsu sendo a mais bem sucedidaat hoje foi a inglesa Marks & Spencer. A partir da dcada de 30, a empresa integroupraticamente todos os fornecedores no seu prprio sistema de gesto, mas atravs decontratos, no da posse dessas mesmas empresas. Foi o modelo da Marks & Spencer que osjaponeses copiaram na dcada de 60, e foi esse que lhes deu vantagens.O keiretsu, independentemente da sua origem, baseado no poder. A Sears, a Roebuck, a

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    Marks & Spencer ou a Toyo-ta possuem um poder econmico avassalador. O keiretsu no uma parceria entre iguais. Cada vez mais, porm, a cadeia econmica est a juntar parceirosgenunos. o que acontece, por exemplo, na parceria entre uma empresa farmacutica e odepartamento de pesquisas de uma faculdade de biologia. Hoje, at uma empresa minsculapode tornar-se parceira genuna de uma gigante sem depender dela. o caso das parcerias

    entre empresas qumicas e farmacuticas e as que trabalham com gentica, biologia ouelectrnica mdica. O mesmo se aplica aos bancos ou indstria informtica. Quando estasempresas formam parcerias, a maior no traz necessariamente a menor para o interior da suarea de comando e controlo.

    6. A morte de todas as fronteiras nacionais

    Ainda se presume na disciplina da gesto que as fronteiras nacionais definem o ambiente noqual as empresas operam. Esta premissa vlida at para a multinacional tradicional.No passado elas tendiam a produzir fora do seu pas de origem. Por exemplo, a maiorfornecedora de material de guerra para o exrcito italiano durante a Primeira Guerra Mundialfoi uma empresa jovem e em rpida ascenso chamada Fiat, de Turim. Esta produzia os

    automveis e camies de que o exrcito italiano precisava. A maior fornecedora de materialde guerra do exrcito austro-hngaro tambm era uma empresa chamada Fiat em Viena.Subsidiria de propriedade integral da empresa italiana, a Fiat austraca era uma rplica daFiat italiana, embora fosse maior do que esta. Os seus projectos vinham de Turim, tudo omais era fabricado ou comprado na ustria. Tambm os produtos eram vendidos na ustria etodos os funcionrios, incluindo o presidente executivo, eram austracos. Quando a ustria ea Itlia se tornaram inimigas, na Primeira Guerra Mundial, tudo o que a Fiat austracaprecisou de fazer foi mudar a sua conta bancria. De resto, continuou a funcionar comosempre funcionara. Era, na verdade, uma empresa separada.Hoje em dia, as multinacionais j no so organizadas desta forma. As posteriores SegundaGuerra Mundial, tais como as da indstria farmacutica e as de informtica, nem sequer soorganizadas em unidades nacionais e internacionais, mas geridas como um sistema mundialno qual cada uma das tarefas distintas pesquisa, projecto, engenharia, desenvolvimento,testes e, cada vez mais, produo e marketing organizada de forma transnacional.Esta nova realidade causa srios problemas. Qual a nacionalidade de uma transnacional?Existem dilemas novos e muito reais relativos a investimentos, impostos e propriedade. Emcaso de guerra, estas questes criariam conflitos enormes. O que faria se o seu laboratrio depesquisa estivesse num lado da guerra e a fbrica que produz aquela linha de produtosestivesse do outro? Tambm para a administrao as novas realidades criam problemas queainda no foram resolvidos. Cada vez mais as empresas organizam-se por especialidade, nopor critrios geogrficos. Quais so os relacionamentos entre estas diferentes unidades?Como que trabalham em conjunto? Qual a jurisdio de cada uma delas? Quem resolve osconflitos entre elas? Todas estas questes no tm ainda respostas satisfatrias. Mas sabemosqual a nova realidade: a gesto j no pode ser definida politicamente. As fronteirasnacionais vo continuar a ser importantes, mas como limites prtica da gesto e no comofactores que definem essa prtica.

    7. Gerir no olhar para o umbigo

    Todas as premissas examinadas se baseiam num pressuposto ainda maior: o de que a rea deactuao da gesto dentro da empresa; que o principal trabalho da gesto gerir aorganizao.

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    Tambm isso j no se aplica ao mundo de hoje. Esta premissa leva a uma distinoincompreensvel entre a gesto e o esprito empreendedor e entre as funes da gesto e dainovao. Esta diviso no faz sentido algum. Um empreendimento que no inova quer setrate de uma empresa ou de qualquer outra instituio no ir sobreviver por muito tempo.A implicao desta realidade clara: as foras que exercem maior influncia sobre as

    organizaes vm do seu exterior, e no de dentro.As ferramentas de gesto que crimos foram todas baseadas pelo enfoque interno daadministrao. Transformaram-se em ferramentas usadas para a gesto ignorar o exterior.Pior ainda, fazem o gestor acreditar que pode manipular o exterior e direccion-lo para asfinalidades da organizao.Veja-se o caso do marketing. Este termo foi cunhado h 50 anos para enfatizar que oobjectivo e os resultados da empresa esto inteiramente fora dela. O marketing ensina que sonecessrios esforos organizados para levar uma compreenso do ambiente externo dasociedade, da economia, do cliente para o interior da organizao, bem como para atransformar numa base para estratgias e polticas.No entanto, o marketing raramente desempenhou esta tarefa grandiosa, transformando-seantes numa ferramenta de apoio s vendas. Os gestores no perguntam quem o cliente?,mas sim que produto queremos vender?. Foi assim que a indstria americana perdeu osaparelhos de fax.A ascenso das tecnologias de informao veio agravar essa focalizao para o interior dagesto. At possvel que tenha prejudicado seriamente a gesto, porque prdiga em obterinformaes adicionais do tipo errado. As tecnologias de informao raramente geraminformaes sobre o que acontece fora da empresa. Ningum at agora criou uma formasistemtica de conseguir dados externos significativos. Podemos prever que, nos prximos 30anos, esse ser o grande desafio que as tecnologias de informao tero de enfrentar.

    Concluso

    O novo paradigma no qual se deve basear a gesto, tanto enquanto disciplina como enquantoprtica, que a gesto deve definir os resultados que espera alcanar e depois organizar osrecursos internos, visando obter esses resultados.A Kyocera, empresa japonesa que se tornou lder mundial na criao e desenvolvimento demateriais inorgnicos, define resultados como a liderana na inovao. Mas a sua maiorconcorrente mundial, a alem Metallgesellschaft, define resultados em termos da posiorelativa no mercado. Ambas so definies racionais, mas geram estratgias muito diferentes.Neste artigo levantei muitas questes, mas evitei, propositadamente, tentar dar respostas.Porm, existe uma questo central, simples e bvia, subjacente a estas reflexes: o centro deuma sociedade, de uma economia e de uma comunidade moderna no a tecnologia, nem ainformao, nem sequer a produtividade. O centro da sociedade moderna a instituio. E agesto a ferramenta, a funo e o instrumento especfico para tornar as organizaescapazes de gerar resultados.Em suma: a instituio no existe simplesmente dentro da sociedade para reagir sociedade.Ela existe para produzir resultados no interior da sociedade e para a modificar... para melhor.

    Condensado de Managements new paradigms. 1999 by Forbes. Publicado com permisso de Forbes.Este texto um resumo do primeiro captulo de Management Challenges for the 21st Century, de PeterDrucker. Adaptado por Helena Oliveira e Jaime Fidalgo Cardoso.

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    Como gerir a sua carreiraUm dos captulos mais interessantes do novo livro de Drucker o relativo ao sucesso

    pessoal. Este depender da sua autogesto em trs pontos: conhecer os seus pontos fortes,

    analisar o seu desempenho e descobrir se os seus valores pessoais so compatveis com os

    da empresa

    Por Peter Drucker

    Os grandes lderes da histria, como Napoleo, Da Vinci e Mozart, souberam gerir os seustalentos naturalmente. Mas eles so as excepes. A maioria de ns precisa de aprender adesenvolver as suas competncias. Isso significa estar permanentemente alerta durante os 50anos da nossa carreira, para saber como e quando devemos mudar o trabalho quefazemos.

    Quais os meus pontos fortes?A maioria das pessoas julga conhecer os seus pontos fortes. Nada mais enganoso. Muitasvezes nem sequer acertam na opinio sobre as suas debilidades. Ao longo da histriararamente foi necessrio possuir esse conhecimento. As pessoas herdavam uma certa posiosocial e, em regra, seguiam a profisso dos seus pais. Hoje, as opes aumentaram. Umaforma de descobrir os pontos fortes atravs da anlise de feedback. Sempre que tomar umadeciso importante escreva-a. Um ano depois compare os resultados com as suasexpectativas. H 15 anos que pratico este mtodo. Demonstrou-me, por exemplo, quetrabalho muito melhor com especialistas do que com generalistas, algo que foi uma surpresa.Conhecer os pontos fortes permite concentrar esforos nas actividades que podem gerarmelhores resultados e descobrir as reas prioritrias de melhoria ou mesmo aquelas em queno vale a pena continuar a apostar.

    Qual o meu desempenho?

    Muitas pessoas no sabem como fazem, de facto, as coisas. Pior do que isso, grande parte obrigada a trabalhar de uma forma imposta, que no a sua. Tal como na questo dos pontosfortes, estamos a falar de algo que tem a ver com a nossa personalidade. Por isso, qualquermudana difcil, mas no impossvel. Ajudar se descobrir, em primeiro lugar, se voc umouvinte ou um leitor. O presidente Eisenhower, por exemplo, era excelente a responder sperguntas pr-preparadas da imprensa. Mas nas sesses sobre temas inesperados era umperfeito desastre. J o presidente Johnson era brilhante nos improvisos, mas tudo corria malquando lhe escreviam os discursos.Em seguida, deve descobrir qual a forma de aprender mais eficaz para o seu caso pessoal.Muitos escritores de nomeada caso de Churchill tiveram notas baixas na escola. Aexplicao que os escritores, em regra, no aprendem ao ouvir ou ao ler. Eles tmnecessidade de escrever para apreender conhecimentos e o actual sistema de ensino no estpreparado para isso. Beethoven, por exemplo, precisava de anotar todas as notas queimaginava numa pauta, caso contrrio jamais as recordava. Em suma, algumas pessoasaprendem ao ouvir ou ao ler. Outras ao escrever. Outras apenas ao fazer.H ainda outras questes relevantes. Voc actua melhor em equipa ou sozinho? Sente-semelhor no papel de decisor, de consultor ou de subordinado? Trabalha melhor sob stress ou

  • 8/2/2019 peter drucker gesto

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    obedecendo a planos e a objectivos? Descobrir qual o seu caso pode ser uma excelenteoportunidade para melhorar o desempenho. A concluso a mesma: no tente mudar a suapersonalidade; apenas melhore o modo como est a trabalhar e abandone o que no seenquadra no seu perfil.

    Quais so os meus valores?Gerir a carreira tambm implica conhecer os seus valores. Isso no uma questo tica. Estadepende apenas da sua conscincia e auto-estima. A tica s uma parte dos sistemas devalores de uma empresa. Aqui reside o problema: se voc cr que os valores da suaorganizao no so compatveis com os seus, o resultado ser sempre frustrao e maudesempenho. Por exemplo, ter uma perspectiva de curto ou longo prazo uma opo defundo de uma empresa. A rival poder ter outra diferente. Ter uma atitude responsvelperante a comunidade outro exemplo. No necessrio que os valores da organizaosejam similares aos seus. Mas preciso que coexistam. No meu caso pessoal, deixei a minhacarreira na banca de investimentos porque no me interessava ser o homem mais rico docemitrio. Os meus valores prevaleceram.